Scena Crítica, N. 02, Ano 1
Scena Crítica, N. 02, Ano 1
Scena Crítica, N. 02, Ano 1
SCENA
JULHO-SETEMBRO 2023
Nº 02
ANO 1
CRÍTICA
SCENA
Editorial S
A segunda edição de Scena Critica surge como um memorial, já que neste mês
Scena Crítica
de agosto se faz memória dos 40 anos da páscoa de Alceu Amoroso Lima, um de Filosofia, literatura, artes, cultura
nossos egrégios patronos.
Amoroso Lima foi um homem de muitas frentes: crítico literário, literato,
acadêmico, líder do laicato nacional. No entanto, o mais notável de seus
Scena Crítica é uma publicação
trimestral, sem fins lucrativos
predicados é certamente o de católico, e é isto que o garante no panteão dos
nossos inspiradores.
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Tristão de Athayde, no campo da literatura, manteve intensa correspondência
com os grandes intelectuais de seu tempo, de modo a estabelecer, numa época scenacritica.wixsite.com
em que isto ainda não estava institucionalizado, o diálogo com personalidades
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dos mais variados espectros ideológicos.
Como colaborador de Dom Leme no projeto de resgatar a hegemonia do
catolicismo nacional, consagrou-se como o grande líder do laicato católico, com
especial ênfase na liderança da Ação Católica. No Concílio Vaticano II,
Editor
representou o Brasil como emissário leigo, sendo, ao retornar, um dos maiores
entusiastas das reformas propostas, seja no que tange o culto, como também na Filipe Machado
dinâmica da pastoral pós-conciliar.
No cenário nacional foi um homem de profunda participação na idealização do Colaboradores desta edição
espaço político brasileiro e, apesar de nunca ter se filiado a uma agremiação
partidária, foi entusiasta da formação do partido democrata cristão. Muito André Marcelo Soares
influenciado pelo pensamento de Jacques Maritain, impulsionou o humanismo Alessandro di Borgia
cristão de modo a consagrá-lo como uma das correntes que protagonizaram o Eduardo Silva
pensamento social brasileiro. Jeremy Boot
Além da ode a Alceu Amoroso Lima, nesta edição damos continuidade às colunas Jessiandro Pessoa
temáticas, algumas pela pena dos mesmos autores, outras pela de novos Josué Matos
colaboradores de mesmo rigor e qualidade literária. Marcos Paulo Galvão
Neste momento de inquietação na sociedade civil e eclesiástica é de nosso maior Natananel de Abreu
interesse proporcionar uma leitura sobre as questões hodiernas e pretéritas à luz
Pedro Henrique Abreu
da sã doutrina, reprisando e contextualizando o pensamento católico às mais
Pedro Ribeiro
diversas facetas da cultura humana.
Rafael Santos
Yasmin Ramos
Filipe F. Machado
Eduardo D. S. Silva
Editores
Abril-junho 2023 | Scena Crítica 3
I T I N E R Á R I O
I T I N E R Á R I O
Prosseguindo
Vem a lume o segundo número de Scena Crítica, que Do latim ao anglo-saxão, nosso correspondente britânico
avança qual peregrino, de bordão à mão, pelos caminhos Jeremy Boot nos guia entre as Línguas mortas e vivas,
um tanto tortuosos e pedregosos do nosso tempo. uma instigante análise da história de nossos idiomas.
Mantendo a variedade temática dentro de um ideal Seguindo para a filosofia, o prof. Marcos Paulo Galvão traz
comum, a presente edição traz também a memória dos ao debate a tematica Conhecimento e poder segundo
40 anos da morte de Alceu Amoroso Lima. Além da capa Michel Foucalt, e Josué Matos, aproveitando a
que o homenageia, a coluna Vox Patroni traz o belíssimo oportunidade da publicação da carta do Papa Francisco
elogio fúnebre proferido pelo monge beneditino e imortal por ocasião dos quatro séculos do nascimento de Blaise
da Academia Brasileira de Letras, D. Marcos Barbosa, na Pascal, convida-nos a perceber as nuances e
ocasião do sepultamento de Tristão de Athayde. particularidades na ocasião peculiar em que Um Papa
Alceu também se faz presente no Dossiê, uma entrevista jesuíta analisa Pascal
com o Prof. Leandro Garcia (UFMG), especialista na obra No Caderno de Cinema quem marca presença nesta
de Amoroso Lima, tendo publicado há pouco as cartas edição é o diretor Frederico Fellini, recordado por Filipe
trocadas entre Alceu e o poeta Jorge de Lima. Machado na efeméride dos 30 anos de sua morte. E Rafael
Nas Crônicas de um tempo peculiar, Eduardo Silva Santos, em mais um de seus Ensaios do cotidiano,
reflete sobre o "adeus à disponibilidade", convidando a analisa a tão atual relação entre sexo, liberdade e
geração atual a imitar a coragem de Alceu Amoroso Lima consumo.
em sua conversão e radical tomada de posição diante da Na coluna Livro Aberto, Jeciandro Pessoa lança um olhar
realidade. sobre Anchieta, o apóstolo do Brasil, resenha da biografia
Nesta edição, no artigo A cafeicultura e o Brasil, Pedro do grande jesuíta missionário. E o prof. André Marcelo
Henrique Abreu traz uma análise histórico-social da Soares em seu artigo chama atenção para a necessidade
bebida que não falta à mesa dos brasileiros. Pedro Ribeiro, em se Eduacar para a vida ética e para a democracia.
o jovem fundador e presidente do crescente movimento E não poderia faltar nesta edição a nossa praça de
Comunhão Popular, por sua vez, enriquece-nos com a divulgação literária, a Ágora, onde a poesia marca
abordagem de uma tema de importância capital: a presença mais uma vez, com os talentosos Natanael de
preocupação de que deve estar munida a política social Abreu, Alessandro di Borgia e Yasmin Ramos.
em estar sempre À procura do salário justo. Que os todos possam aproveitar a qualidade dos trabalhos
apresentados. Boa leitura!
ÍNDICE
Dossiê, pág. 15
Um ano jubilar
Ágora, pág. 19
Praça de divulgação literária
GUSTAVO CORÇÃO
Abril/junho 2023 | Scena Crítica 6
CRÔNICAS DE UM
TEMPO PECULIAR
Em diversas ocasiões, Tristão de Athayde destacou a falta
de um ideal profundo em sua geração, marcada por um
juventude sob as luzes da belle époque, a qual viu
escurecer com o início da primeira guerra em 1914.
Passado um século, a geração de hoje parece sofrer de
algo semelhante. Há uma clara apatia diante das
realidades metafísicas e existenciais sérias. Uma geração
que nasceu sob a égide do avanço tecnológico e que se
deslumbra com o mundo das redes sociais, mas que ao
mesmo tempo enfrenta as frustrações de um país e de um
mundo imerso na desordem política e social, vivendo as
consequências de uma pandemia mundial e com focos de
guerra a recordar que a humanidade continua apostando
em métodos já provados pela história como infrutíferos, ou
antes, estéreis e destruidores.
A geração de Alceu, nascida no final do séc. XIX, reagiu na
década de 1920. No âmbito artístico e literário, surge o
modernismo da Semana de 22 que deu para o Brasil
nomes memoráveis como Mário de Andrade, Tarcila do
Amaral e Heitor Villa-Lobos. Também houve a reação
metafísica: o movimento intelectual católico, onde se
insere Tristão. Junto a seu nome pode-se acrescentar o de
Jackson de Figueiredo (1891-1928), responsável por fundar
em 1922 o lugar de agremiação desses intelectuais, o
Centro Dom Vital; Sobral Pinto (1893-1991), o célebre jurista
a quem coube a alcunha de “Sr. Justiça”; o Padre Leonel
DISPONIBILIDADE
Franca (1893-1948), que deu à sua geração, nas palavras de
Alceu, “o sentido profundo da Ordem sobrenatural”; o
grande poeta Jorge de Lima (1893-1953); Gustavo Corção
PARA O ADEUS
(1896-1978), o converso, quase um cruzado, cuja escrita e
luta marcou época. Enfim, toda uma brilhante constelação
que reagiu, que superou a apatia pelo compromisso, que
A
deixando de estar disponível para tudo, dispôs-se a
gosto deste ano marca não apenas os 40 anos da abraçar um ideal sólido, firme e eivado de esperança.
morte de Alceu Amoroso Lima (1893-1983), mas Diante da geração atual, que temos nas mãos a
também os 95 anos de sua conversão. De forma possibilidade de superar a apatia reinante, de dizer adeus
muito poética, pois poética foi toda sua vida, quis Deus, à disponibilidade para tudo, que se torna, se me permitem
que é mais poético ainda, que Alceu fosse ao seu encontro o paradoxo, disponibilidade para o nada, só posso evocar
em 14 de agosto de 1983, véspera do dia em que, diante do as palavras de Alceu na já citada carta a Sérgio Buarque: “o
Pe. Leonel Franca, expôs sua alma no tribunal da erro é pensar que a realidade se prende em qualquer
misericórdia e se aproximou da mesa da ceia sacrifical de sistema humano apenas, ou em qualquer ausência
Cristo. sistemática de um sistema qualquer”. É a tentação da
A morte de Alceu, disso me convenço cada vez mais, imanência, de querer, tal e qual o velho Barão de
deixou uma lacuna em diversos âmbitos da vida nacional. Münchausem, puxar-se pela trança para não cair no fosso.
Onde hoje o crítico literário de presença marcante como Ou a da alienação, fugindo de todo e qualquer
aquele que em 1919 deu vida a Tristão de Athayde, o compromisso sério com a realidade, consigo mesmo e
pseudônimo mais célebre da história brasileira, no rodapé com o mundo, refugiando-se num ideal fantasioso. É o que
d’O Jornal? Onde a figura pública a levar a voz da Igreja, diz Alceu em seguida: “Pois o amor da evasão pela evasão
de sua doutrina social, de seu contributo às artes e às é a pior das servidões. Nunca nos sentimos tão presos
letras, para o debate social, cultural e acadêmico? Onde o como ao pretendermos forçar todas as portas. Nunca
defensor apaixonado da liberdade e dos valores mais caros somos tão limitados como quando nos limitamos à
de um humanismo integral e fecundo, trabalhando por extralimitação.”
um projeto real de Brasil? Todas essas perguntas têm Ainda há tempo, embora ele seja curto. É necessário
como resposta um triste e sonoro “não há”. coragem e espírito de renúncia para estar disponível a
Logicamente, muito da obra de Alceu é fruto de sua dizer adeus ao espírito descompromissado. Apesar do
personalidade, de sua dedicação, de seu empenho pessoal cenário crítico, há esperança. Como, aliás, era lema do
com seus ideais. Ao dar em 1928 adeus à disponibilidade – próprio Alceu: contra spem spes. Ter fundada esperança,
título dado à carta em que expôs as razões de sua mesmo diante da desesperança reinante.
conversão a Sérgio Buarque de Holanda –, Alceu
abandonou o princípio gideano para abraçar um ideal
mais amplo, mais universal, embora aos olhos da maioria
parecesse antes um estreitamento, um “adeus” de fato. Eduardo Silva, graduado em
“Tristão é um dos nossos que agora acredita em anjo...”, vai História pela UFRRJ e em Filosofia
dizer acidamente Oswaldo de Andrade. Porém, não deixa pela PUC-Rio, encaminha os
estudos também para a literatura e
de ser surpreendente o fato de que tal personalidade não
a teologia, sempre a partir de um
tenha hoje uma eficaz presença de seu pensamento, nem diálogo entre o pensamento
continuadores empenhados em seu legado a trilhar seu tomista e as diversas correntes
exemplo. contemporâneas.
Abril-junho 2023 | Scena Crítica 7
A cafeicultura
e o Brasil na, sendo que já na década de 1850, o café passara a ser o
principal produto de exportação do país, uma vez que até
em tão, representava somente 18% das exportações
O
brasileiras.
s meses de maio a agosto costumam ser agitados A expansão da área cultivada conheceria quatro
nas regiões cafeeiras do Brasil. Durante este perí- momentos importantes. De 1850 a 1880, a maior
odo acontece a colheita do fruto que por décadas concentração das lavouras encontrava-se próxima à capital
fora o principal produto de exportação do país. Se hoje o Rio de Janeiro e no Vale do Paraíba, sendo esta última a
café ainda abunda nas montanhas do sul de Minas Gerais, principal região produtora na época. Tratava-se de uma
no cerrado mineiro, no norte de São Paulo, só para citar exploração muito dependente da mão-de-obra escrava e
algumas regiões produtoras, o arbusto da família das condições do solo da região, que não eram corrigidos
rubiaceae, já fora cultivado em uma vasta extensão de e fertilizados, sendo que as lavouras eram simplesmente
terra que compreendia do Estado do Paraná até o Espírito abandonadas quando a produtividade começava a
Santo. Apelidado de “ouro negro” na segunda metade do diminuir. Além do mais, os produtores fluminenses e vale-
século XIX, o café iria moldar a economia e a sociedade paraibanos formavam uma base política importante de
brasileira nos anos finais do Segundo Reinado (um ramo apoio a monarquia brasileira, que a partir dos anos 1870
de café fora posto na bandeira imperial) e nos anos da passava a ser contestada, principalmente em meios
chamada República Velha (1889-1930), sendo que o militares. Desta maneira, após ter atingido o pico de
sistema de alternância do poder entre políticos da elite produção na década de 1880, a cafeicultura nestas regiões
paulista e mineira, durante o período, passaria para a começara a declinar, também em razão da abolição da
história como a política do “café com leite”. escravatura em 1888 e a queda do império em 1889.
Se a relevância econômica do produto só seria sentida Seria, no entanto, a segunda fase de expansão da
após a década de 1850, a planta do café chegaria ao Brasil cafeicultura que mais representaria o chamado “ciclo do
ainda durante o ciclo do ouro no século XVIII. Seria o café”. Esta fase iniciara-se ainda na década de 1880 e
militar luso-brasileiro Francisco de Melo Palheta que em duraria até 1930, sendo o oeste paulista e o sul mineiro as
1727 traria para o país as primeiras sementes e mudas do regiões que se destacariam como principais produtores.
cafeeiro. Palheta teria sido encarregado pelo governador Este momento histórico conheceria os chamados barões
do Maranhão e do Grão-Pará, João de Maia Gama, de do café, que além de grandes produtores, foram
chefiar uma missão até a Guiana Francesa com um intuito personagens centrais de toda política brasileira durante a
de resolver um litígio territorial. Durante esta missão, o República Velha. De certa forma, as principais decisões
sargento-mor lograria cerca de mil sementes da planta e econômicas e políticas adotadas durante este período
quatro mudas, que seriam cultivadas pela primeira vez em buscavam favorece e defender a cafeicultura. Um exemplo,
solo brasileiro na cidade de Belém do Pará. A forma como seria o convênio de Taubaté de 1906, no qual o governo
estas sementes e mudas foram conseguidas permanecem republicano viu-se forçado a comprar sacas do produto e
um mistério, visto que numa carta do próprio Palheta jogá-las no mar ou queimá-las, como forma de combater a
datada de 1733, não há menção de como este material fora queda dos preços, devido a superprodução das safras
adquirido. Apesar de as especulações terem sido anteriores. Tal política ainda seria adotada na década de
abundantes no decorrer da história, o mistério permanece. 20, quando uma nova onda de baixa de preços, motivada
O ciclo do ouro declinaria a partir de 1760, quando as
jazidas começaram a exaurir-se, principalmente na então
província das Minas Gerais, principal local de exploração
do minério. Já após os eventos da inconfidência mineira
(1789), a economia brasileira voltara-se outra vez para a
agricultura de exportação, sendo que os principais
produtos seriam a cana-de-açúcar e o algodão, este último
produzido principalmente na região do Maranhão. No
entanto, as reviravoltas políticas na Europa acontecidas
por decorrência das guerras napoleônicas, a técnica de
produção do açúcar a partir da beterraba e a
superprodução em outros países produtores, fizeram com
que a produção brasileira perdesse espaço no mercado
internacional. Além do mais, o preço destes produtos
diminuiu consideravelmente, fazendo com que o lucro de
produtores brasileiros fosse reduzido. Já outros artigos
brasileiros como o fumo, o couro e o arroz não
encontravam espaço no mercado externo, sendo estes
destinados ao consumo interno. Nesta situação o
desenvolvimento da atividade cafeeira viria como possível
solução para que o Brasil voltasse a ganhar mercados
estrangeiros.
A planta do café se adaptara facilmente as condições
edafoclimáticas do sudeste brasileiro. A grande
quantidade de latossolos vermelhos, popularmente
conhecidos por “terra roxa”, favoreceram a expansão do
cultivo, bem como o clima ameno e a regularidade
pluviométrica da região. O exploração brasileira do café
também seria favorecida pela conjuntura internacional,
uma vez que o grande produtor da época, o Haiti, ex-
colônia francesa que lograra sua independência em 1791,
estava com a produção desorganizada e drasticamente
diminuída em decorrência do turbulento processo de
independência. O Brasil viria substituir a produção haitia-
Abril-junho 2023 | Scena Crítica 8
ALCEU, AO CÉU
D. Marcos Barbosa OSB, 1983
N
ão celebramos a Eucaristia que ainda jaz entre nós, não
em honra dos mortos, mas proclamaremos os nomes das
de Jesus Cristo, que disse famílias a que pertenceu, nem o
expressamente: "Fazei isto em pseudônimo literário que ele
minha memória...". Mas a cobriu de honra, nem os seus
celebramos, isto sim, em sufrágio, pontos altos de pensador e líder
em auxílio dos que morrem; para católico. Queremos recordar
que se vejam o quanto antes simplesmente Alceu, que se nutriu
purificados das impurezas que aqui na tera com o pão da Vida
ainda levam da terra, e que os Eterna.
impedem, como a ganga ao O menino, cujos cabelos Machado
diamante, de serem logo invadidos de Assis acariciava entre as grades
pela plenitude da luz divina. Mas a do jardim ao passar pela Casa Azul
Eucaristia - que significa ação de da rua das Laranjeiras.
graças, e que é antes de tudo Tinha tudo para ser feliz: pais
Memorial do Sernhor, se não abastados e extremosos, um
sugere o elogio dos mortos, pode jardim na frente eum pomar atrás,
dar lugar aos nossos louvores um regato, uma galinha de
agradecidos, pelas grandezas que pintos...
Deus tenha operado na humildade A esse cromo veio juntar-se a
dos seus servos. Sobretudo quando Primeira Comunhão um pouco
a vida de um deles realizou uma folclórica em Sião de Petrópolis,
parábola perfeita, que pode Mas na qual Jesus deve ter
transformar-se, quase, numa acariciado, como o insigne
parábola evangélica. romancista ao passar, os cabelos
Ontem, no Dia dos Pais, Alceu do menino triste.
Amoroso Lima, que o foi para Pois era um menino triste, que
tantos, segundo a carne e segundo dizia consigo mesmo, que
o espírito, entregava ao Pai Nosso prometia a si mesmo: "Quando
a sua vida. Em Petrópolis, sua ficar grande vou protestar contra
bem-amada cidade, num hospital essa balela de que as crianças é
com um nome duas vezes querido, que são felizes!"
à hora, justamente à hora do Ah, como sofrem as crianças!
Angelus, que já era liturgicamente Confidenciava-nos mais tarde
Festa da Assunção de Maria, Alceu Amoroso Lima, em Primeiros
quinquagésimo quinto aniversário Estudos e Idade, Sexo e Tempo,
de sua conversão, selada pela sua segunda Primeira quando o menino triste já se tornara Tristão de Athayde...
Comunhão, que ele considerava a verdadeira. A essa hora Sofrem as crianças por motivos que só a nós, adultos,
do Angelus, ao anoitecer no Dia do Senhor, nos braços de parecem ridículos,
sua filha Abadessa, transpôs Alceu Amoroso Lima o que a e sofrem então de um modo absoluto, ainda que por
mulher de Léon Bloy chamou "La Porte des Humbles", a breves instantes,
Porta dos Humildes, que coincidiu, para ele, com a porque não sabem, como a gente grande, que o
Assunção de Maria, Janua Coeli, Porta Azul do Céu, que sofrimento passa...
nos abre o caminho. Mas será necessariamente feliz a mocidade?
Porta dos Humildes. Ouvi certa vez que um grande de O moço rico, que já atravessara o Equador como menino
Espanha, quando pretendia transpô-la após a morte, ouviu e julgara ler o nome da distante Babá num dos letreiros de
de dentro a voz que perguntava: "Quem bate?" Declinou Paris,
ele todos os seus nomes e títulos de nobreza e seus está agora sentado à mesa de um hotel da portentosa
esplêndidos feitos, e teve apenas como resposta: "Não te Veneza.
conheço!" Confuso e perplexo, bate de novo e ouve de E Jesus, que já o acariciara em criança, o viu e o amou
novo: "Não te conheço!" Pela terceira vez, cheio de aflição como ao moço rico do Evangelho...
ousa bater ainda; e, à voz que Ihe pergunta quem é, E acendeu-lhe no coração aquela mesma pergunta
responde apenas, tremendo, o seu nome de batismo, o seu que se fizeram Jacques e Raissa Maritain no Jardim das
singelo nome de cristāo e filho de Deus. E o seu nome de Plantas de Paris;
cristão e filho de Deus sabre-lhe a Porta do Céu, a Porta do ou o jovem Inácio, ferido como Jacó, ao lutar com o Anjo,
Pai. Também nós agora, encomendando a Deus aquele num Castelo de Espanha;
Abril-junho 2023 | Scena Crítica 10
ou o jovem Bento na corrupta Roma, antes de partir para quando o Mestre vem caminhando ao nosso encontro:
Subiaco; ou o moço rico de Assis antes de beijar o leproso: "Não tenhais medo; sou Eu!"
"De que vale o homem ganhar o mundo inteiro, se perde a E assim pôde realizar a velhice generosa, de que fala Olavo
sua alma?" Bilac em célebre soneto:
A pergunda, é verdade, não assumia ainda esta forma, mas
"Não choremos jamais a mocidade!
a do Eclesiastes, tão presente em Machado de Assis:
Envelheçamos rindo, envelheçamos
"Vanitas vanitatum!" Vaidade das vaidades, tudo é vaidade!
como as árvores fortes envelhecem,
E o jovem brasileiro faz, como Jacques e Raissa Maritain,
que ainda não conhece, não um pacto, mas um voto de
suicídio caso não encontre também um sentido para a na glória da alegria e da bondade
vida e o segredo da felicidade absoluta e eterna. agasalhando os pássaros nos ramos
Devorará a Esfinge o jovem peregrino? Não: é ele que vai dando sombra e consolo aos que padecem!"
devorar o Mistério...
Dir-se-ia que ele cumpriu também
O jovem rico continua a viver quand même, embalado
um pequeno poema que traduzi
pela belle époque. do inglês e cujo autor ignoro:
Mas o conforta, em seu Paraíso Perdido, o não estar mais
sozinho: caminha a seu lado frágil Mulher Forte, que ele "Conta no teu jardim flores e frutos,
afirmava aos quarenta anos de casamento, ter sido quem o mas não conte as folhas que
chamava à realidade, quem fazia o já famoso crítico tombaram.]
literário, sempre de pena na mão, colocar os pés na terra. Conta os teus dias pelas horas de
pois é antes na humildade da terra ("ganharás o pão com o ouro,]
suor do teu rosto!") que se encontra Aquele que o criou. não pelas que falharam.
E veio então o encontro com o amigo, por enquanto com a Pelas estrelas conta a noite. E
minúsculo. a vida,]
Que em breve desapareceria para sempre nas águas do pelos triunfos, não pelos perigos,
oceano. não contes tua idade pelos anos,
Jackson de Figueiredo tornara-se um pescador de homens. mas sim pelos amigos."
E aquele que já ouvira a palavra de Léon Bloy: "Só há uma
tristeza: não ser santo!" Entre estes se encontravam o grande
Se convence também do pensamento que Pascal pôs nos Georges Bernanos, um instante pou-
lábios de Cristo: "Tu não me procurarias, se já não me sado em Itaipava, e que foi visitar um
houvesse encontrado!" dia. com seu jovem secretário, levando
E na glória de um quinze de agosto, na Capela de Nossa doce e manteiga.
Senhora das Vitórias, em Santo Inácio, dá-se o encontro Georges Bernanos escreveria mais tar-
corpo a Corpo do homem com seu Deus, que se tornam de que, ao morrer, o menino que ele
uma só carne, e um só coração, e uma só alma. fora é que tomaria o comando
Recebe das mãos do Padre Leonel Franca sua segunda de todos os anos que
Primeira Comunhão. vivesse, para entrar à
"E preciso que eu diminua e que ele cresça!'" sugere-lhe frente deles, como
João Batista, seu nome como oblato beneditino. um jovem capitão,
"Já não vivo eu, mas vive o Cristo em mim!" sopra-lhe o no Reino dos Céus...
Doutor das Nações, cujo nome quis colocar num de seus Também Tristão de
filhos... Athayde traz nos
Como antes, em companhia da mulher, já oferecera a braços, velho
Deus, na Igreja da Glória, a Lia, que se tornaria Raquel, Simeão, o menino
esposa de Cristo sob o nome de Teresa, e que, ao contrário Alceu, comos os
da filha de Jefté, não foi chorar com as amigas a sua baixos-relevos das
virgindade, mas celebrá-la cantando com as monjas de catedrais góticas,
Escolástica. onde Maria, morta
Cessaram para o Peregrino do Absoluto ("é andando que ou adormecida, oferece a Deus uma miniatura de si
se faz o caminho") as tentativas de itinerário. Estava mesma.
descoberto não só o Caminho, mas a Verdade e a Vida. O menino outrora triste, que começou a devorar a Esfinge
E o Pão da Vida, que o fazia ir e vir cada manhā, ao receber pela segunda vez o Corpo de Cristo na festa da
surpreendendo o poeta Augusto Frederico Schmidt. Assunção da Virgem, na Capela de Nossa Senhora das
Descobrira o pāo quotidiano, dado pelo Pai, que sacia a Vitórias, se oferece e é oferecido por nós.
fome de cada dia, abrindo mais ainda, agora em Chegou para ele o momento de entrar num Templo não
esperança, a fome do Absoluto. feito pela mão dos homens, mas na Casa Azul que o
O moço rico e o menino triste haviam descoberto, com Apocalipse em vão procura descrever.
Tristão de Athayde, que ldade, Sexo e Tempo encontram É a terceira grande Comunhão de sua vida, agora eterna.
resposta não no Homem Moderno, mas no Eterno, Alceu disse adeus em artigos a muitos que ele chamou
de que tanto lhe falaram Chesterton e Newman. Companheiros de viagem, seis dos quais nascidos no
O homem, agora de parcos cabelos cingidos pelo louro das mesmo ano que ele.
Letras, Hoje nós, que ficamos no vale de lágrimas, é que nos
caminha os passos seguros da plena maturidade em despedimos dele, dizendo-lhe, no seu sentido mais forte, o
Cristo. adeus em duas palavras: A Deus!
A velhice não o aflige e o torna para sempre jovem e E dizemos ao menino que encontrou o segredo da
menino. felicidade: Ao Céu, Alceu!
Nem a morte da metade de sua alma, que o fere
profundamente, consegue derrubá-lo, pois descobre "a
presença na ausência" no mistério da saudade e da fé; Ele,
D. Marcos Barbosa (1915-
que afirmara que não há idade ideal, descobre que a
1997), monge beneditino,
velhice é a vida em ascensão, pois a vida humana não é
poeta, dramaturgo e
montanha terminando em descida e abismo, nem as
imortal da Academia
quatro estações do ano terminando em inverno, mas a
Brasileira de Letras,
quarta vigília da noite bíblica que precede o amanhecer,
proferiu essas palavras na
missa exequial de Alceu
Amoroso Lima em agosto
de 1983.
Abril-junho 2023 | Scena Crítica 11
simplificada e com vocabulário fortemente influenciado Jean-François Champollion, o decifrador dos hieroglifos
pelo francês (O inglês moderno atribui cerca de 45% do
seu vocabulário ao francês).
Por esta altura, já se tinham passado três séculos e meio
desde Hastings. O suficiente para estabelecer um governo
estável e uma dinastia, para que as classes se
estabelecessem e o conceito de conquista por estrangeiros
tivesse recuado. A sociedade tinha mudado e a linguagem
também. As invasões haviam cessado. Este foi também o
início da imprensa e o efeito disso em todos os países foi
considerável. A Igreja, como sempre antes da Reforma, foi
poderosa, universal e influente.
O resto (para o inglês) é história, como se costuma dizer.
Com as explorações do século XVI em diante, as guerras e
o Império, o inglês moderno se espalhou rapidamente.
O título menciona línguas mortas: latim, grego antigo,
sânscrito e hebraico vêm à mente como exemplos. A pedra
de Roseta foi a chave para resolver os hieróglifos egípcios
antigos que intrigaram o homem por milhares de anos, até
que esta pedra foi encontrada no final do século XVIII e
então – porque tinha sido traduzida para o grego antigo na
época de Ptolomeu V (204-181 a.C.) – sua escrita demótica
(cotidiana) e os hieróglifos puderam ser finalmente
decodificados. Napoleão encontrou a pedra, que foi
decifrado graças ao trabalho de Thomas Young e Jean-
François Champollion no século XIX. Reside agora no
Museu Britânico, em Londres.
Tanto a língua copta como a grega estavam “mortas”.
Grande parte das escrituras sagradas está em línguas
mortas, mas podemos saber com certeza como se
escreviam e o que significaram. Hindus, budistas e outros
adeptos de textos antigos leem diariamente exatamente o
que seus autores pretendiam que fosse lido. Os judeus
ortodoxos usam o hebraico e seus estudiosos as línguas
mortas. A nossa erudição católica, bem como a liturgia,
durante séculos, teve igualmente os seus sacramentos, a óbvio que a maioria das línguas europeias e indianas, do
missa e os ofícios na língua latina até à década de 1970 e, extremo oriente e algumas outras, tinham palavras com
ao contrário da propaganda de que isso era inevitável, não origem comum, embora agora tão variadas que são, pelo
houve intenção por parte do Concílio Vaticano II de a menos em suas extremidades, totalmente ininteligíveis. As
abolir: apenas de permitir uma maior abertura ao minhas competências linguísticas são o inglês, o latim e as
vernáculo (Cf. Sacrosanctum Concilium). Toda esta questão línguas de base latina, pelo que, como linguista, sou um
tornou-se muito controversa, mesmo nos dias de hoje. pouco uma fraude. Se tivesse tempo, viveria para me
Nós, na compreensão quotidiana das nossas línguas familiarizar com o lituano – considerado o mais próximo
modernas, não precisamos ir mais longe do que o latim do PIE –, com a gramática mais obstruída e casos há muito
vulgar que mencionei acima. Mas há um tataravô das esquecidos, herdados do proto-balto-eslavo. Quanto às
línguas (não todas, mas de um número considerável) que é línguas indianas, isso é outra história, mas todas elas têm
o protoindo-europeu (PIE). Reunidas a partir de esse parente distante. Mas não todas. Mesmo na Europa
fragmentos no século XVIII por estudiosos, tornou-se muito existem línguas “isoladas” que parecem não ter origem
comum. Tal seria o basco, que antecede o latim. Vá para
as Américas, Indonésia e o Novo Mundo e há muitas mais.
Como não é prático traduzir um artigo do inglês para o
português, vou parar por aqui, pois exemplos não “viajam”,
neste caso. Mas uma das formas mais simples de
comparar as ligações entre línguas é contar de uma a dez.
Russo, latim, línguas PIE. Você tem que muitas vezes
ultrapassar a ortografia e olhar para as raízes. Como
pensamento final, no norte e em algumas outras áreas
remotas da Inglaterra, alguns agricultores ainda usam um
antigo sistema de rimas (“Yan, tan, tethera”) para contar
ovelhas. É muito parecido com o galês (que não é falado
na Inglaterra), mas acontece que é muito próximo do
britônico. Tais oradores remontam à idade do ferro.
Não posso falar em nome das ovelhas, mas elas não
podem queixar-se de falta de coerência. As línguas têm
raízes muito profundas e longas.
Dossiê
Um ano jubilar
Entrevista com o prof. Leandro Garcia Rodrigues
três anos antes do modernismo. contexto em que a cultura religiosa era SC: Por que um recém converso foi
Em fevereiro de 1922 ocorre a Semana de muito presente na formação dos considerado o nome ideal para o
Arte Moderna de São Paulo, e o Alceu indivíduos. Cardeal Leme elegê-lo com líder do
toma ciência do acontecimento, ainda que O que ocorreu com o Alceu, que vindo de laicato após Jackson de Figueiredo?
não tenha havido repercussão no Rio de uma família abastada, é que recebeu parte
Janeiro, exceto por um release de 5 linhas de sua formação no Colégio Pedro II, onde Leandro Garcia: Parece que era natural.
em uma pequena revista popularesca boa parte da elite frequentava, e neste Com a morte de Jackson de Figueiredo em
chamada “Para todos”, que a chamou de momento do início do século XX o colégio 1928, o Alceu aparecia como o único com
Semana Futurista. era um grande centro de irradiação do as capacidades de articulação no campo
O Alceu já reconhecia que o que havia positivismo, pelo qual o Alceu foi muito da cultura e da vida social para
acontecido em São Paulo marcava um influenciado nesse período. desempenhar a árdua tarefa de conduzir o
divisor de águas na modernidade literária Já na década de 1920 ele inicia sua laicato nacional. Isto ele fez no Centro
brasileira. Então, a partir deste momento, correspondência com Jackson de Dom Vital, que nesse período reunia filiais
ele irá mapear o contexto literário Figueiredo e, ainda que, curiosamente, por todo o Brasil, chegando mesmo a
brasileiro, mantendo correspondências tenham se encontrado pouquíssimas reunir intelectuais que a priori eram
com os maiores expoentes da literatura vezes, foi ele o tutor da reconversão do absolutamente hostis à religião, como foi o
naquele momento em todas as regiões do Alceu que culminará em 1929. caso de Mario de Andrade, por muitos
país. É preciso distinguir pelo menos três fases anos sócio e frequentador ativo das
Nessa época o Alceu escrevia para três do pensamento religioso de Alceu reuniões no Centro Dom Vital, além de
revistas especializadas, além de jornais de Amoroso Lima. O primeiro, que é uma fase colaborador esporádico da revista A
grande circulação no Rio de Janeiro, mais influenciada por Jackson de Ordem.
recordando que tratava-se de um Rio de Figueiredo, é o de uma catolicismo mais Creio que a função mais importante no
Janeiro ainda capital federal, onde toda ultramontano e apologética que se contexto do laicato era a liderança da
efervescência cultural tinha lugar, onde estende desde a sua conversão até Ação Católica, e creio que a experiência do
praticamente todas as instituições meados dos anos de 1940, quando Alceu Alceu no contexto da universidade
relevantes para a cultura estavam começa a ter contato com o humanismo proporcionou uma dinâmica toda nova e
presentes.Por isso, me atrevo a dizer que o de Jacques Maritain, que definitivamente muito eficiente para o movimento. O
Alceu é o crítico literário de maior lhe será paradoxal, além da morte de Dom Alceu comandava as associações ligadas à
importância no período do modernismo, Sebastião Leme em 1942 que concede Ação Católica como se comanda uma
pois ele mapeou o cenário literário certa liberdade de consciência a ele para universidade, lembrando que neste
brasileiro de modo a divulgar mais especular mais no campo da consciência período ele era reitor da Universidade do
efetivamente esses novos nomes. religiosa na vida social.Outro nome que Distrito Federal. As associações eram para
pode ser citado neste período é o do ele como que os vários departamentos de
SC: Como o senhor enxerga o processo monge trapista Thomas Merton, com uma universidade com particularidades,
de conversão dele? quem Alceu manteve intensa hierarquia e áreas afins no saber, o que
correspondência, e com quem ele teve os dinamizou muitíssimo o funcionamento
Leandro Garcia: O correto a falar seria primeiros contatos com a ideia do dessas muitas associações de leigos.
“reconversão”, uma vez que o Alceu, como ecumenismo e do diálogo inter-religioso.
qualquer outro brasileiro de seu tempo, A terceira e última fase brota nos anos SC: Uma questão um pouco fora do
havia sido batizado, além de estar em um 1960, quando Alceu foi emissário leigo no
escopo. O senhor como docente em
Concílio Vaticano II e retorna de Roma
uma grande universidade, como
entusiasmado com as mudanças advindas
enxerga os esforços e os desafios no
quer no campo da liturgia quer na
campo do apostolado para o público
dinâmica da pastoral. Há a partir daí um
estreitamento das relações, universitário?
especialmente, com Dom Hélder Câmara,
e outros nomes da ala progressista da Leandro Garcia: O contexto das
Igreja no Brasil. Houve, sem dúvida uma universidades é certamente de muita
aproximação com a teologia da libertação aridez no que diz respeito à religião, e não
nesse período. raramente um ambiente de hostilidade a
Então são três fases bem distintas de um ela. No entanto, me parece haver uma
homem que ao referir-se à sua vida ausência de lideranças intelectuais
costumava dizer que foi “de bombeiro a advindas do clero, em um momento em
incendiário”. que os jovens têm acesso farto à
informação. É mais do que urgente que o
sacerdote possua a expertise para
responder às diversas demandas que
advém nesse contexto.
Me parece também que no campo da
estratégia, não é pertinente neste
momento e neste contexto que o discurso
inicie pela conversão. Na verdade, me
parece que se deva inicialmente pensar na
convivência como um meio mais efetivo
para se dar passos. Inclusive, creio que se
devam procurar pautas que possar criar
uma intercessão entre a religião e as
necessidades e questões objetivas do
ambiente da universidade. Eu creio que a
única postura possível é a do convívio.
Abril-junho 2023 | Scena Crítica 17
Conhecimento e poder
segundo Michel Foucault
presente na sociedade. Assim sendo, as ciências humanas,
como a psicologia, por exemplo, são instrumentos
desenvolvidos e controlados por uma intenção clara de
disciplinação.
Assim sendo, a grande novidade apresentada por Foucault
reside na análise das instituições como produtoras de uma
noção de homem que se afasta da tradição filosófica.
Nesse sentido, a filosofia é considerada por Foucault
como uma prática aberta que não se reduz aos
considerados signos filosóficos. A função da filosofia está
em acompanhar os ritmos da história, não tentando
enquadrá-la em um sistema, mas acompanhar o seu
movimento de tal forma que os acontecimentos acabam
por se apresentar como uma fonte inesgotável de
renovação para o nosso conhecimento e para moral.
(Pestaña 2011, 23-24)
Essa visão aberta sobre a história faz perceber que ela não
pode ser pensada como uma disciplina neutra, mas é
profundamente influenciada e ligada a uma concepção
jurídica de poder. A história enquanto disciplina que se
volta ao passado tem uma função de legitimação de um
O
conceito jurídico de poder. Assim sendo, o poder é o
presente artigo está voltado para a discussão encontrada na substrato que permite contar a história. O poder
produção filosófica de Michel Foucault identificada pelos estabelece a episteme, ou seja, o saber da política.
estudiosos do seu pensamento como a fase do "segundo A análise da conexão entre as relações de poder e o
Foucault", na qual se destaca uma reflexão que pretende superar o conhecimento científico leva Foucault a uma reflexão
formalismo atestado pelas estruturas do a priori histórico próprias sobre o processo de governamentalização responsável pelo
da primeira fase do seu pensamento. De fato, no segundo Foucault nascimento de uma forma de cultura geral. A pergunta
se evidencia as relações de poder como fomentadoras do sobre o que significa governar exige uma pergunta
conhecimento, e sendo o poder uma realidade não substancial, ou anterior, que reside na questão de como não ser
seja, algo que não existe em si, mas nas mais variadas relações governado. Dessa forma, podemos considerar a história da
existentes, sendo elas instáveis, consequentemente o poder não governamentalidade como uma “análise que pretende
pode ter um caráter formal, e ao engendrar o conhecimento, por indicar o tipo específico de racionalidade política e
conseguinte, faz com que este não esteja fundado em uma tecnologia do poder que foi implementado no exercício do
estrutura estável de caráter formal, mas seja uma realidade dispersa poder do Estado moderno”. (Oskala 2011, 104)
(DELEUZE, 1995, p. 35). Foucault também indica o poder individualizante
Para Foucault, a relação entre conhecimento científico e poder característica da governamentalidade. Segundo Foucault,
político não pode ser entendida como uma relação externa incapaz a característica individualizante que se desenvolve no
de afetar o conteúdo da própria ciência. Segundo essa concepção, Estado moderno é antagônica, e tem por objetivo manter
por mais que os contextos sociais e políticos apresentem as a centralização do poder não por meio do controle de um
questões sobre as quais o conhecimento irá se debruçar, a política objeto geral, como é o caso da população, mas se refere
não é capaz de influenciar as respostas oferecidas pela ciência. “ao desenvolvimento de tecnologias de poder orientadas
Neste caso, as respostas dadas pela ciência são tomadas como para indivíduos numa tentativa de orientar-lhes a conduta
objetivas e verdadeiras seja qual for o contexto envolvido. de maneira contínua e permanente”.(Oskala 2011, 104)
Ao contrário, Foucault vai admitir que a relação entre conhecimento Em suma, verifica-se no segundo Foucault uma análise do
científico e político é, sobretudo, uma relação interna: poder político por meio da racionalidade que se inscreve
A afirmação de Foucault sobre o entrelaçamento de poder e saber é em suas práticas. Aqui, deveremos considerar que a
por vezes mais forte. A seu ver, a relação entre ambos é interna: o relação saber e política é responsável por estabelecer a
contexto social e político do conhecimento científico também molda o política da verdade, isto é, organizar e controlar por meio
conteúdo do próprio conhecimento científico... Ele (Foucault) sustenta
dos regimes políticos os indivíduos através de uma
com toda clareza que a ciência é uma prática social. Todas as
sociedades têm práticas e instituições para a produção do saber, e o
representação da ordem das coisas que é apresentada
desenvolvimento da ciência é uma atividade necessariamente social, como sendo verdadeira.
não individual. Os elementos do saber têm de se conformar a um
conjunto de regras e limitações características de um dado tipo de Bibliografia
discurso científico num dado período (OSKALA, 2011, p. 64-65).
FOUCAULT, M. Les mots et les choses. Paris: Gallimard 1966.
Posto isso, podemos verificar a posição de Foucault sobre o
DELEUZE, G. Foucault. Madrid 1995.
indivíduo como uma realidade que não é princípio nem condição de OKSALA, J. Como ler Foucault. Rio de Janeiro: Zahar, 2011.
possibilidade, mas como conseqüência do complicado aparato que PESTAÑA, J. L. M. Foucault y la política. Madrid: Tierradenadie, 2011.
define a modernidade. Daí entendermos a célebre frase cunhada
por Foucault em Les mots et les choses: o homem é uma invenção
recente na história de nosso pensamento, e talvez o seu fim esteja
próximo (FOUCAULT, 1966, p. 398).
Destacamos, assim, a reflexão feita por Foucault que se afasta de Marcos Paulo Galvão é doutor em
uma perspectiva mais discursiva e epistemológica propriamente Filosofia pela Pontificia Università
dita para voltar-se a uma reflexão sobre a prática política. Nesse Gregoriana, onde defendeu a tese A
caso, o tema da epistemologia está diluído na prática exercida pela política do saber e o saber da
política: a dialética de resistência e
política, principalmente no que se refere à dimensão disciplinar liberdade segundo Michel
Foucault.
Abril-junho 2023 | Scena Crítica 18
Livro aberto
ANCHIETA, O APÓSTOLO DO BRASIL
Joaquim Tomás
Juan
Quando juntar-te aos bêbados
Oso
Para que um outro desgraçado seja motivo de
rno
riso para ti.
E assim esse mundo gira até que a morte nos
separe.
Alessandro di Borgia
N
o dia 19 de junho de 2023, o Papa Francisco ciamento público do atual pontífice sobre Blaise Pascal.
apresenta à Igreja a carta apostólica Sublimitas et Em entrevista publicada no jornal italiano La Reppublica,
miseria hominis, sobre o filósofo francês Blaise em junho de 2017, Eugenio Scalfari perguntara ao papa o
Pascal. É deveras curioso que seja justamente um que ele achava do filósofo francês, e a resposta
papa da Companhia de Jesus, os inimigos de Francisco surpreenderia o próprio Pascal:
históricos de Pascal, que tenha escrito um “anch'io penso che [Pascal] meriti la beati-
documento com o intuito de prestar-lhe ficazione”[1]. Como? Um jansenista, mere-
“uma especial homenagem”, nas palavras cer? Aqui se faz necessário também
do Romano Pontífice. Francisco propõe explicar o que é o jansenismo.
o filósofo como um fiel leigo que teste- É complexo categorizar o que seja a
munhou a alegria do Cristo. heresia jansenista, pois seus adeptos
Antes de entrar no conteúdo da refe- inauguraram um novo modo de ser
rida carta apostólica, é necessário herege. Quando Nestório, patriarca de
um pequeno resumo da sua vida. Constantinopla, começou a negar, no
Pascal nasceu em Clermont- século V, que a Virgem Maria fosse mãe
Ferrand na província de de Deus, o bispo de Roma na época,
Auvergne, em 19 de junho São Leão Magno, condenou sua tese
de 1623, filho de Étienne como heresia; Nestório, porém recu-
Pascal e Antoinette sou submeter-se à Santa Sé. O mesmo
Begon. Seu pai era se deu com os monofisistas, que negavam
matemático e desde ce- que Jesus tivesse duas naturezas, e os
do ensinou-lhe as línguas monotelistas, que negavam que Jesus
clássicas e a matemática. tivesse duas vontades. Uma vez condenados
O menino demonstrou por Roma, preferiram sair e fundar
ser um prodígio, escre- suas próprias igrejas. Ao longo da
vendo em tenra idade história foi o que aconteceu
tratados sobre o som, com todos aqueles que foram
sobre as cônicas, fazendo considerados hereges, até
experimentos com o vácuo surgir o Jansenismo. Os
e inventando antes dos 20 adeptos da heresia
anos a primeira máquina jansenista, por mais
de calcular. que fossem conde-
Em 1646 Pascal toma nados por Roma,
contato com o recusavam-se a
jansenismo, que iria sair da Igreja
marcar profunda- Católica[2].
mente sua vida e Apelando a
seu pensamento. tantos subter-
Entrou em polê- fúgios, ora
mica com os negando, ora
jesuítas em afirmando,
questão de moral ora negando
e casuística, que houves-
legando à poste- sem negado
ridade as Cartas ou afirmado,
provinciais, os sequazes da
verdadeiro mo- tal doutrina
numento da fizeram com
língua francesa. que a própria
Mas a obra pela heresia apre-
qual ele é mais sentasse aspe-
conhecido é aquela que ele nunca terminou. Na tentativa ctos camaleônicos. O meio mais seguro para conhecer o
de defender a fé contra os racionalistas e libertinos, o que foi o Jansenismo é através das cinco proposições
filósofo escreveu seus pensamentos em folhas avulsas no contidas no Augustinus, escrito pelo bispo Cornélio
intuito de reuni-los depois em uma única obra. Morreu em Jansênio, e condenadas pelo papa Inocêncio X, na bula
Paris, no dia 19 de agosto de 1662 sem que pudesse Cum occasione, de 1658. Cinco foram as proposições
completar sua desejada obra. Sua irmã e seus amigos condenadas: que alguns mandamentos divinos nem pelos
juntaram os fragmentos e deram ao público em 1670 a justos podem ser cumpridos, por falta de necessária graça;
primeira edição dos Pensamentos, que até hoje são lidos que o homem não pode resistir à graça interior; que para o
e discutidos. mérito, no estado de natureza decaída, basta a isenção da
O documento papal não é, entretanto, o primeiro pronun- violência física, ainda que sob a pressão da necessidade;
Abril-junho 2023 | Scena Crítica 21
que é erro semipelagiano julgar que a vontade humana um mero fantoche, ele salvaguarda sua autonomia e
pode seguir ou repelir a graça e que é semipelagiano dizer liberdade. Mesmo assim, na história, ele permanece com os
jansenistas. Ele não pode ser dissociado deles. Por quê?
que Jesus morreu por todos os homens. Segundo Jackson
Principalmente por causa da moralidade.[5]
de Figueiredo, todas essas proposições “se poderiam
resumir em uma só: A graça de Deus é predestinada e É difícil dizer algo definitivo, afinal, o autor nunca
eficaz – o que quer dizer: Deus tem eleitos e estes sempre conseguiu terminar sua Apologia. O fato é que ele admite
o foram de toda a Eternidade”[3]. Era, dessa forma, uma que o ser humano pode ter alguma participação na
espécie de “calvinismo católico”. obtenção da fé, e isso já soa bem estranho para um
Porém, ainda há debates sobre até que ponto Pascal adepto do jansenismo.
aderiu aos aspectos dogmáticos do jansenismo, sobretudo Sabe-se que o jansenismo era extremamente austero e
no que diz respeito à predestinação e à participação do rigorista e que Pascal se interessou por essa moral; por
homem na obtenção da graça. Ele acredita que mesmo o isso, alguns pensam, erroneamente, que o jansenismo
descrente pode obter a fé quando age como se possuísse influenciou Pascal nos trechos em que este defendeu o
fé. Aqui surge uma discussão interessante. Se ele era ódio por si mesmo: “o eu é odioso [...] odiá-lo-ei
jansenista, como pode aceitar que haja alguma sempre”[6]; “é preciso amar só a Deus e só odiar a si
participação do homem na obtenção da graça divina, da mesmo”[7]; “devemos odiar-nos a nós mesmos, e a tudo
graça da fé? Os comentadores do filósofo ainda debatem que nos excite a outro liame que não seja Deus
quanto a isso. A questão da predestinação também é um somente”[8]; “a verdadeira e única virtude consiste, pois,
assunto espinhoso, alguns defendem que ele acreditava, em odiar a si mesmo”[9]; “quem não odeia em si o seu
outros que não. amor-próprio, e esse instinto que o leva a fazer-se Deus, é
Souriau diz que: bem cego”[10].
No entanto, por incrível que pareça, a espiritualidade do
Seus Pensamentos são sobretudo uma exposição do
ódio a si não é algo próprio ao jansenismo, mas algo
jansenismo exasperado, um novo Augustinus, revisto e
prevalente nos autores espirituais daquele período. Por
consideravelmente agravado. Se tivesse tido tempo de
terminar seu livro, estamos no direito de afirmar que, na exemplo, o maior pregador antijansenista do século XVIII,
parte dogmática, ele teria tentado mostrar nos jansenistas Luís Maria Grignion de Montfort, canonizado em 1947,
os únicos verdadeiros discípulos de Jesus; [...] ele estaria escreveu numa de suas obras de polêmica antijansenista:
obstinado em convencer o público geral que os adversários
Por que nos admirar de ter Nosso Senhor dito que quem
de Port-Royal não eram verdadeiros cristãos.[4]
quisesse segui-lo devia renunciar a si mesmo e odiar a
Enquanto Stewart defende que Pascal permaneceu do própria alma; que aquele que amasse sua alma a perderia e
lado dos jansenistas mais por causa da moral que por quem a odiasse se salvaria? (Jo 12, 25) A Sabedoria infinita,
que não dá ordens sem motivo, só ordena que nos odiemos
causa da doutrina:
porque somos grandemente dignos de ódio: só Deus é
Pascal não era, ao menos em doutrina, um completo digno de amor, enquanto nada há mais digno de ódio do
jansenista. No profundo drama que está sempre sendo que nós.[11]
representado entre a alma e Deus, ele parece, enquanto
Do mesmo modo, o livro espiritual mais lido da história, A
confessa ignorância do processo, permitir alguma parte da
vontade humana, enxergar uma centelha no seio humano, Imitação de Cristo, escrito no século XV, ensina que “o
que pode ser soprada até as chamas pela operação do amor de Jesus faz com que o homem se despreze a si
espírito divino. Ele se recusa a considerar o homem como mesmo”[12] e que “aquele que se conhece bem despreza-
se e não se compraz em humanos louvores”[13] e também
que “não há melhor e mais útil estudo que conhecer-se
perfeitamente e desprezar-se a si mesmo”[14].
Claro que não se pode negar que o jansenismo foi uma
resposta austera contra o laxismo de alguns jesuítas, mas
não é a austeridade que faz o jansenismo ser o que ele é.
Também quem enxerga nesse sistema simplesmente a
corrupção total da natureza humana ainda não chegou ao
âmago do que é o jansenismo. Mais uma vez, um texto
que poderia ser repetido pela pena de qualquer jansenista
é, na verdade, um texto de um ardoroso antijansenista:
Para despojarmo-nos de nós mesmos, é preciso conhecer
primeiramente e bem, pela luz do Espírito Santo, nosso
fundo de maldade, nossa incapacidade para todo bem,
nossa fraqueza em todas as coisas, nossa inconstância em
todo tempo, nossa indignidade de toda graça e nossa
iniquidade em todo lugar. O pecado de nossos primeiros
pais nos estragou completamente, nos azedou, inchou e
corrompeu, como o fermento azeda, incha e corrompe a
massa em que é posto [...] toda nossa herança é orgulho e
cegueira no espírito, endurecimento no coração, fraqueza e
inconstância na alma, concupiscência, paixões revoltadas e
doenças no corpo [...] tudo que temos em nosso íntimo é
nada e pecado, e só merecemos a ira de Deus e o inferno
eterno.[15]
O ponto capital da doutrina cristã em geral e de Jansênio
em particular no qual Pascal irá basear sua visão da
humanidade é o “dogma da queda, base de toda a sua
filosofia, como que o centro da sua concepção da vida”.
Mas há outro ponto do jansenismo no qual Blaise irá
fundamentar sua antropologia, filosofia e teologia: o
cristocentrismo radical. Como se verá mais a frente, Pascal
vê em Jesus Cristo a única solução para o problema da
condição humana. Para os jansenistas de nada valiam a
devoção aos santos e à Virgem Maria. Para os sequazes de
Jansênio, como a graça de Deus é predeterminada e o
homem nada pode fazer para merecê-la, só Jesus Cristo e
Abril-junho 2023 | Scena Crítica 22
nada nem ninguém mais importava, fosse santo ou Três pontos podem se destacar nesse parágrafo de
pecador, vivo ou morto. Francisco. Primeiro, ele reconhece a validade dos
Deixando à parte essas polêmicas da obra pascaliana, argumentos jansenistas em favor da não condenação do
Francisco se debruça sobre o legado do grande filósofo. É Augistinus de Jansênio, isto é, que as proposições
justamente por colocar Jesus Cristo no centro da sua obra condenadas pela bula Cum occasione não se encontravam
filosófica que o romano pontífice pôde chamar Pascal de no livro. Por muitos anos a controvérsia jansenista girou
“um enamorado de Cristo”. O papa vai traçando então os não em torno da verdade ou falsidade das proposições
principais pontos da vida e obra do gênio francês. condenadas, mas se elas estavam realmente presentes no
Na referida carta apostólica há algumas passagens que livro escrito por Jansênio. Os jansenistas defendiam que
chamam a atenção. Primeiro o fato de o papa reconhecer não estavam enquanto os seus adversários defendiam que
que a análise que Pascal faz da condição humana é sim.
correta. Já se disse que Pascal atacou a humanidade com Em segundo lugar, Francisco parece reconhecer que a
mais violência nos Pensamentos do que atacara os interpretação de Jansênio sobre a doutrina agostiniana da
jesuítas nas Provinciais. Aos olhos do atual líder da Igreja predestinação é legítima, um “aperfeiçoamento” do
Católica, porém, o quadro que o filósofo pintou da pensamento agostiniano. É preciso frisar que isso não
humanidade não está carregado de um exagero jansenista, significa que essas ideias estivessem corretas do ponto de
como alguns no passado já o acusaram, mas corresponde vista da ortodoxia católica, mas tão somente que o
à realidade da condição dos filhos de Adão. Jansênio não era um falsificador da doutrina agostiniana
A escusa que o pontífice faz da decisão de Pascal de
como alguns pensaram. O papa reconhece que tais
defender os jansenistas também é digna de nota. Prestes a
fórmulas, apesar de incorretas, seriam conclusões lógicas
concluir seu escrito, o Santo Padre escreve:
das premissas agostinianas.
Muitas propostas ditas «jansenistas» eram realmente O último ponto é o reconhecimento da sinceridade de
contrárias à fé, e Pascal reconhecia-o, mas contestava que
Pascal. E aqui Francisco agiu como um casuísta do século
elas estivessem presentes no Augustinus e fossem seguidas
pelos membros de Port-Royal. Entretanto algumas das suas
XVII: se não pôde desculpar a ação, ao menos desculpou a
próprias afirmações, relativas por exemplo à predestinação, intenção de Blaise Pascal. Sim, é possível ser jesuíta e
tiradas da teologia do último período de Santo Agostinho, pascaliano afinal.
cujas fórmulas foram aperfeiçoadas por Jansénio, não soam
como verdadeiras. Todavia é preciso compreender que, __________________________________
assim como Santo Agostinho quis combater no século V os
pelagianos, que afirmavam que o homem pode, por suas
[1]https://www.repubblica.it/vaticano/2017/07/08/news/scalfari_inter
próprias forças e sem a graça de Deus, fazer o bem e ser
vista_francesco_il_mio_grido_al_g20_sui_migranti_-170253225/.
salvo, assim também Pascal acreditava sinceramente que
Consultado em 03/08/2023.
então estava a atacar o pelagianismo ou o
[2] O próprio Pascal, depois de ter escrito centenas de páginas
semipelagianismo, que ele julgava identificar nas doutrinas
contra os jesuítas, contra os teólogos da Sorbonne, contra os
seguidas pelos jesuítas molinistas (do nome do teólogo Luís
documentos condenatórios ao jansenismo, escreve na carta 17 das
de Molina, falecido em 1600, mas cuja influência ainda
provinciais: “Não tenho qualquer vínculo com comunidade alguma,
estava viva a meados do século XVII). Demos crédito à
exceto com a Igreja, Católica, Apostólica, Romana, em cujo seio
franqueza e sinceridade das suas intenções.
desejo viver e morrer, em comunhão com o papa, o cabeça da
Igreja, e fora da qual estou persuadido de que não há salvação.”
Pascal. The provincial letters of Blaise Pascal. Tradução de
Thomas M’Crie. Cambridge: Riverside Press, 1880, p. 421.
[3] FIGUEIREDO, Jackson. Pascal e a inquietação moderna, Rio de
Janeiro: Centro Dom Vital, 1922, p. 95s.
[4] SOURIAU, Maurice. Pascal. Paris: Société Française d'Imprimerie
et de Librairie, 1898, p. 183.
[5] STEWART, Hugh Fraser. The Holiness of Pascal. Cambridge:
Cambridge University Press, 1915, p. 72.
[6] PASCAL. Pensamentos. São Paulo: Abril, 1973, fr. 455, p.155.
[7] Ibidem. fr. 476, p. 158.
[8] Ibid. fr. 479, p. 159.
[9] Ibid. fr. 485, p. 160.
[10] Ibid. fr. 492, p. 161.
[11] MONTFORT, São Luís Maria Grignion de. Tratado da verdadeira
devoção à Santíssima Virgem. 46 ed., Petrópolis: Vozes, 2015, p. 82.
[12] KEMPIS, Tomás de. Imitação de Cristo. Petrópolis: Vozes, 2015,
p.84.
[13] Ibid. p. 23.
[14] Ibid. p. 24.
[15] MONTFORT, São Luís Maria Grignion de. Tratado da verdadeira
devoção à Santíssima Virgem. 46 ed., Petrópolis: Vozes, 2015, p. 81s.
CADERNO
CINEMA
DE
Sonhos em evidência
Uma retrospectiva do cinema de Federico Fellini nos 30 anos de sua morte
ravam algo que sucedesse na mesma medida que “A doce nos leva a vislumbrar melhor suas crises e motivações.
vida” havia surpreendido. Fellini se vê, então, diante da grande O sonho é um dos grandes personagens do filme. O
responsabilidade que lhe pesava, contemplando o abismo que expectador desde a primeira cena é imerso dentro desta
todo autor teme experimentar, a crise criativa. realidade, já que Fellini acreditava que o processo de
E é a partir desse abismo, que Fellini irá tirar a inspiração um criação nascia justamente do sonho, da investigação do
de seus trabalhos mais ousados, um filme extremamente subconsciente. Fellini era paciente de psicanálise desde
autobiográfico e mais do que isso, metalinguístico. Em 1963, 1960 quando ele começou a buscar inspiração para suas
Fellini brinda o mundo com 8 ½ . O estranhamento já inicia obras através da investigação dos sonhos.
pelo título da obra, que já demonstrava sua íntima relação Fellini não se preocupava em dar um sentido concreto
com a biografia do diretor, acontece que àquela altura Fellini para cada milímetro de sua obra, não, pelo contrário ele
havia dirigido sete longas e um curta-metragem. esperava que a obra se completasse no próprio
Fellini estava a volta com os produtores sem saber ao certo espectador. Fellini não era rigorista nem mesmo com suas
que rumo tomar com seu projeto, até que encontrou na crise, memórias, em mais de uma ocasião ele afirmou o seu
a receita para o bom andamento do filme. Criar um filme que descompromisso com o passado, por não saber distinguir
fala sobre o processo de criação de um filme, talvez seja o o que era recordação e o que era imaginação e criação.
maior e mais elegante uso da metalinguagem na história do É absolutamente ímpar na história do cinema moderno o
cinema. modus felliniano de se construir uma narrativa e
Fellini retoma sua parceria com Marcello Mastroianni para apresentá-la esteticamente através da tela, a consistência
novamente interpretar seu alter ego, dessa vez ele interpreta da obra encontra seu êxito justamente ao não se prender
Guido, um diretor em meio a uma crise criativa que busca às amarras de pretender-se dentro de um movimento, mas
refugiar-se em um hotel de fontes medicinais para escapar da sendo genuinamente único.
pressão dos produtores, contudo, sem sucesso.
A narrativa continua na mesma linha de A doce vida,
contando com episódios que não necessariamente possuem
uma conexão lógica e cronológica com as cenas subsequentes,
mas dessa vez com um agravante que são as cenas que
Com especialização em roteiro pela
revelam o subconsciente do personagem, fator que
Escola de Cinema Darcy Ribeiro,
Filipe Machado é bacharel em
filosofia pela PUC-Rio e licenciado
em História. Atualmente suas
pesquisas estão centradas nos
autores que compuseram a cena
intelectual católica do século XX
com especial ênfase em Gustavo
Corção.
Ensaios do
Abril-junho 2023 | Scena Crítica 25
liberdade e consumo
liberdade sexual, mas de uma guerra do comunismo
contra o capital. A dita revolução deve destruir o opressor
que só visava o lucro. Bem ilustra esse pensamento a frase
que se tornou hino da geração woodstock: faça amor, não
faça guerra.
Quando Alvin Toffler em 1971 mostrou ao mundo a relação
D
entre a sociedade de consumo e a banalização da
esde o popular livro de Wilhelm Reich, La sexualidade ou, em suas palavras, a sociedade do “prê-à-
révolution Sexuelle, de 1931, o tema tem ocupado porter”, do descartável, que favorece a aventura sem
todos os cenários da vida social. Não é preciso consequências, o amor breve, o amor a frio, toda essa
muito esforço para constatar isso. Quem acompanhou os mirabolante teoria de que a repressão sexual era apenas
jornais, as revistas, as telinhas e passou boa parte de sua uma forma de poder e controle econômico cai por terra.
vida de olho nas telonas é testemunha de que alguns Se apresenta o contrário: A chantagem, a pressão de
costumes e ideias sofrem mudanças. Mesmo aqueles que grupos e da opinião pública impuseram comportamentos
nasceram nos tempos da internet já conseguem perceber que aumentaram as vendas de grandes empresas. No
significativas mutações no comportamento ou trato de mundo em que as coisas eram feitas para durar, agora
determinados assuntos, dentre eles o sexo. Até a arte tudo é descartável. O sexo livre e a mentalidade
eterna, os livros, são prova deste fato civilizatório. Títulos erotizada se tornam um motor econômico e direcionam
os olhos para o consumo.
A nova civilização erotizada não só pas-sou a
con-sumir mais, como tam-bém virou
produto. O fenômeno das coisas dadas de
graça é uma marca desse novo mundo dos
negócios. Corpos, desejos e drogas
tomam conta das vitrines, e a quantidade e
rotatividade dessas mercadorias são
espantosas. A sexualidade transformou-se
em um instrumento, foi coisificada,
fragmentada, reduzida a mero objeto. A
indústria pornográfica ganha espaço e se
torna rentável. Nasce assim um machismo
radical e a famosa guerra dos sexos que mais
tarde é responsável pelo surgimento de um
feminismo radical.
A dita “liberdade sexual” gerou uma
angustiosa ditadura sexual. O costume
americano do dating transformou
rapidamente a ligação entre os adolescentes
numa obrigação. Quem se relaciona sexual-
como O segundo sexo, A dialética do sexo, Política sexual, mente é tido como descolado, enquanto o outro não é
O outro sexo e Eros e revolução se tornaram best-sellers, bom o bastante. Estes segundos se transformam em mais
ocupando lugares nas prateleiras e na construção do um nicho de consumidores, agora desesperados para
pensamento de nossa geração. alcançar os primeiros. O cúmulo é a propensão para
Estudos etnológicos mostram que muitas civilizações relações cada vez mais prematuras e variadas. Em cadeia
tinham códigos sexuais diversos que, ao serem se colhe uma série de problemas que vão desde a perda
confrontados, geraram uma devastadora relativização da infância, o surgimento de cataclísmicas formas de
desses costumes, criando o produto dessa revolução relações, até o surgimento de famílias desestruturadas,
intelecto-cultural, por nós conhecida como “revolução pais ausentes e abortos.
sexual”, que entende a cultura sexual como permissividade Diante disso tudo, cabe-nos indagar sobre as exigências
e liberdade sem limites ou contrassensos. Tudo isso foi atuais da fé. O cristão não pode ignorar a realidade e as
recebido por alguns como decadência ou perda do senso mudanças ao seu redor. Também não é um cego seguidor
moral, para outros como progresso humano. O que há em da última moda, mas é alguém que se mantém lúcido e
comum entre um e outro é a profunda ligação existente assume responsavelmente seu papel na construção da
entre a sexualidade e a cultura. sociedade, principalmente durante as grandes convulsões
A civilização defensora de uma família numerosa, de da história. Cabe a ele, no meio das tensões inevitáveis,
uniões monogâmicas e entre pessoas do mesmo sexo, de elaborar uma nova síntese em conformidade com
relações intimas depois do casamento e de uma conduta adignidade da pessoa humana e a lei do Criador.
moral legitimada por um legislador Divino estava sendo
contrariada por um pequeno grupo organizado com a
bandeira da “libertação sexual”. Essa revolução foi aos
poucos ganhando aliados na moda, um exemplo disso é a
invenção da minissaia, na indústria farmacêutica com a
criação de anticoncepcionais, mais tarde com a venda em Rafael dos Santos, sacerdote da
massa de preservativos e pílulas, chegando a ocupar lugar Arquidiocese de São Sebastião do
de destaque em todas as áreas de consumo: no cinema, na Rio de Janeiro. Possui Formação em
musica, na literatura, na farmácia até no auxílio de venda Filosofia, Direito, Teologia e é
mestrando em Direito Canônico no
de outros produtos em comerciais. PISDC/Pontifícia Universidade
Gregoriana.
Abril-junho 2023 | Scena Crítica 26
D
(1220-1292), que colocou a moral em destaque no contexto da
sua obra, insistia no fato de que “nada há mais digno do que a
esde a segunda metade do século XX até nossos dias, busca do saber, pelo qual se desterra a névoa da ignorância e
tornou-se um imperativo, neste mundo globalizado, se ilumina a mente humana para poder estar em condição de
fazer uma reflexão cuidadosa sobre a tarefa de educar para escolher o bem e detestar o mal”[2].
uma vida ética e para a democracia. Como ressalta o Papa Educar para a democracia significa, sobretudo, que “não é
Francisco (1936-), a sociedade contemporânea entrou em um possível amar o próximo como a si mesmo e perseverar nesta
período de degradação, onde “vai-se ‘nivelando por baixo’ atitude sem a firme e constante determinação de empenhar-
mediante um consenso superficial e comprometedor” (Fratelli se em prol do bem de todos e de cada um, porque todos nós
tutti, 210). somos verdadeiramente responsáveis por todos” (Sollicitudo
Reacendem-se conflitos anacrônicos que se consideravam rei socialis, 38). É sob esta exigência que se forma o
superados, ressurgem nacionalismos fechados, entendimento da relação entre práticas políticas e
exacerbados, ressentidos e agressivos. Em vários países, moralidade pública, que sofreu uma mudança significativa na
uma certa noção de unidade do povo e da nação, virada do século XVI, quando Nicolau Maquiavel (1469-1527),
penetrada por diferentes ideologias, cria novas formas de
ao procurar soluções para os problemas das cidades italianas,
egoísmo e de perda do sentido social mascaradas por uma
suposta defesa dos interesses nacionais (Fratelli tutti, 11). orienta a política para a eficácia, recusando todo o
comprometimento com a moral no exercício do poder.
O “debate saudável sobre projetos a longo prazo para o Através da teoria da necessitas (necessitas legem non habet)
desenvolvimento de todos e o bem comum” (Fratelli tutti, 15) entende que o príncipe, diante de um perigo iminente, tem o
vai perdendo espaço para “o mecanismo político de exasperar, direito pleno de agir contra a moral, cometendo delitos e
exacerbar e polarizar” (Fratelli tutti, 15). “A melhor maneira de crimes. Deste modo, inaugura um hiato entre a ação política
dominar e avançar sem entraves é semear o desânimo e e a vida ética.
despertar uma desconfiança constante, mesmo disfarçada por
Ao considerar as questões postas aqui, não é difícil afirmar
detrás da defesa de alguns valores” (Fratelli tutti, 15). Como o
que o futuro da humanidade e, por conseguinte, do planeta,
diálogo se tornou ineficaz e obsoleto para alguns, então
inclui necessariamente uma atenção especial para a
“triunfa a lógica da força” (Fratelli tutti, 210). Nesta sociedade
educação. Com o auxílio dela, o egoísmo pragmático se
carente de referências, os valores mais fundamentais vão
transforma em uma ponte entre os diferentes morais e as
sendo dissolvidos no caldeirão em que se misturam
diferentes gerações. A educação será sempre a vocação para
extremismos e opiniões infundadas.
o entendimento e o empenhamento em prol de uma
Em sua encíclica Fides et ratio (1998), o Papa João Paulo II
sociedade que deseja viver o genuíno sentido da fraternidade.
(1920-2005) observa que para alguns pensadores da pós-
Para que isto ocorra, é necessário estabelecer um pacto
modernidade “o tempo das certezas teria irremediavelmente
global pela educação, mas como observa o Papa Francisco
passado” (Fides et ratio, 91). Isto acarretaria, como efeito, a
na exortação apostólica pós-sinodal Christus vivit (2019):
“ausência total de sentido, sob o signo do provisório e do
efêmero” (Fides et ratio, 91). Há um pacto quando, mantendo as recíprocas diferenças,
É fato que a globalização trouxe conquistas novas e opta-se por colocar as próprias forças ao serviço do mesmo
projeto. Há um pacto quando somos capazes de
importantes, mas é igualmente verdadeiro que, em muitos
reconhecer no outro, diferente de nós, não uma ameaça
aspectos, ela nos torna “vizinhos, mas não nos faz irmãos” contra a nossa identidade, mas um companheiro de
(Caritas in veritate, 19), como enfatiza o Papa Bento XVI (1927- viagem, para que “se descubra nele o esplendor da imagem
2022). As batalhas que outrora ocorriam nas fronteiras, hoje de Deus” (Christus vivit, 165).
ocorrem no ciberespaço. Muitos se aproximam para atacar e
A emergência educativa[3] se impõe a todos como dever
detratar até a destruição. A consequência do cyberbullying moral de restabelecer a fraternidade através dos vínculos da
tem sido o sepultamento moral e, em alguns casos, o suicídio. solidariedade e do reconhecimento das diferenças. Esta
No lugar da globalização da fraternidade, nos deparamos atitude nos recoloca no centro das preocupações éticas,
com a globalização da indiferença que, paradoxalmente, nos porque a fraternidade transcende o caráter privado do
“leva a perder o sentido da totalidade” (Laudato si’, 110). egoísmo em favor da alteridade. “É necessário educar e
É necessário voltar a atenção para as relações humanas e para educar-se para não considerar o próximo como um inimigo
isto todos somos convocados, especialmente o Cristianismo, nem um adversário a eliminar”[4].
porque a sua mensagem se identifica com a responsabilidade ___________________________________
de reconhecer, como irmão, o outro em suas diferenças e
respeitar a dignidade da sua vida. É neste sentido que a [1] PONTIFÍCIO CONSELHO JUSTIÇA E PAZ. Compêndio da doutrina
educação para uma vida ética se torna fundamental. Para social da igreja, n. 48.
[2] “Et ideo nihil est dignius studio sapientiae, per quam omnis
Cristo, a vida está posta acima de todas as preocupações (cf.
ignorantiae caligo fugatur, et mens humana eligat, et mala singula
Mt 6, 25). Foi por este o motivo que Ele se entregou à morte detestetur”: BACON, R. Opus tertium. London: University Press, 1912, 10-
para que a humanidade pudesse ter a vida em plenitude. Ele 11.
comprova que Deus “não é um Deus de mortos, mas sim de [3] Expressão utilizada pelo Papa Bento XVI em sua carta à Diocese de
vivos” (Mc 12, 27). A defesa da vida, como princípio ético, se Roma sobre a tarefa urgente da educação, de 21 de janeiro de 2008.
inscreve na capacidade de amar. Se a criação é um ato do [4] FRANCISCO, PP. Mensagem para o dia mundial da paz, dia 1 de
janeiro de 2014.
amor de Deus, então a defesa da vida deve ser a expressão
humana deste amor.
Ao falar de democracia, o olhar se volta para a justiça social.
Pós-doutor com pesquisas em ética
Boa parte do ensinamento social da Igreja é determinado biomédica, André Marcelo Soares é
pelas grandes questões sociais, para as quais deseja ser uma professor do departamento de
resposta a partir da mensagem de Jesus Cristo. Em razão Teologia da PUC-Rio. É também
disso, o Magistério Católico sempre ensinou que “a pessoa secretário geral da Academia Fides
et Ratio e membro honorário da
humana não pode e não deve ser instrumentalizada por Academia Brasileira de Medicina de
estruturas sociais, econômicas e políticas, pois todo homem reabilitação e do Centro de Estudos
tem a liberdade de orientar-se para o seu fim último” [1]. Não de Bioética (Portugal). É autor de
Bioética: você sabe o que é?
(Benedictus, 2022).
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In scena
No mês de agosto o Centro Dom Vital, no Rio de Janeiro, retorna com suas
atividades, começando no dia 14 com uma missa pelos 40 anos da morte de
Alceu Amoroso Lima, que durante décadas foi presidente do Centro.
centrodomvital.com.br
instagram.com/centrodomvital
[email protected]
Tel.: 21 2516-2046
SCENA