Jornal Brasil de Fato - 30 de Julho A 05 Agosto de 2015
Jornal Brasil de Fato - 30 de Julho A 05 Agosto de 2015
Jornal Brasil de Fato - 30 de Julho A 05 Agosto de 2015
Caminhos e desencontros
ABr
na Pátria Educadora
Em reportagem especial, educadores e militantes discutem as bases da
proposta de reforma educacional elaborada pela Secretaria de Assuntos
Estratégicos por encomenda da Presidência da República. Prioridade
da lógica empresarial na gestão e no currículo e falta de diálogo com o
PNE são algumas das principais críticas. Págs. 4, 5 e 6
ISSN 1978-5134
editorial
Bob May/CC
Uma conversa de bar
PORTO ALEGRE, NOITE DE CHUVA e frio. Saí para um café e um
pão com manteiga. Na lancheria (que é como os porto alegrenses cha-
mam lanchonete) próxima à Farrapos encontrei guarida. Uma mulher
atendendo e outra tomando cerveja, sozinha. Fiz o pedido e aguar-
dei. As duas iniciaram um papo louco sobre ratos. “Porto Alegre es-
tá infestada de ratos. Estão por todo lugar. Aqui no centro mesmo, é
um horror. E são enormes, parecem até uns coelhos”, dissertava Deni-
se, a atendente. A outra, de nome Bia, assentia fazendo cara de apavo-
ramento. “E o pior é que esses ratos aqui do centro sobem nos aparta-
Editor-chefe: Nilton Viana • Editores: Aldo Gama, Marcelo Netto • Repórter: Marcio Zonta• Correspondentes nacionais: Maíra Gomes (Belo Horizonte – MG),
Pedro Carrano (Curitiba – PR), Pedro Rafael Ferreira (Brasília – DF), Vivian Virissimo (Rio de Janeiro – RJ) • Correspondentes internacionais: Achille Lollo (Roma – Itália),
Baby Siqueira Abrão (Oriente Médio), Claudia Jardim (Caracas – Venezuela) • Fotógrafos: Carlos Ruggi (Curitiba – PR), Douglas Mansur (São Paulo – SP),Flávio Cannalonga (in memoriam), João R. Ripper
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Márcio Baraldi, Maringoni • Editora de Arte – Pré-Impressão: Helena Sant’Ana • Revisão: Maria Aparecida Terra • Jornalista responsável: Nilton Viana – Mtb 28.466 • Administração: Valdinei Arthur Siqueira •
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de 30 de julho a 5 de agosto de 2015 3
Papa acerta
a jugular do
capitalismo
TAL COMO NA HISTÓRIA bíblica do pequeno Da-
vi diante do gigante Golias, Papa Francisco, saído do
“fim do mundo”, vem arremessando petardos contra
o capitalismo. E não os atira a esmo. Mira-os bem na
jugular. E fá-lo de maneira inteligente e genial, sabe-
dor de que não basta constatar os problemas que afli-
gem a humanidade e correr atrás dos prejuízos. É pre-
ciso ir às causas. Não só às causas eventuais e conjun-
turais, senão também e necessariamente àquelas mais
profundas, universais, estruturais.
Com seu inconfundível sorriso de menino, sabedo-
ria de um profeta amadurecido, humildade marcada-
mente franciscana e coragem sempre refeita diante
dos desafios, o Papa não hesita em dizer o que pre-
cisa ser dito. Põe o dedo nas jugulares do sistema ca-
pitalista, que assenta suas bases em duas graves con-
tradições: uma socioeconômica e outra socioambien-
tal. A primeira, relacionada à exploração da mão de
obra, ao trabalho precário, instável, escravo, às desi-
gualdades, injustiças e exclusão social. A segunda, re-
lativa à extorsão e destruição dos bens naturais, ge-
rando com isso muitos problemas ambientais e dis-
tribuindo-os de maneira desigual na sociedade. Aos
pobres, como sempre, os maiores impactos e aos ri-
cos as maiores benesses.
Na recente visita a alguns países da América do Sul,
condenou a economia do descarte, regra de ouro do ca-
pitalismo neoliberal. Na Bolívia, Francisco não mediu
Altamiro Borges palavras. Foi contundente, ao afirmar que hoje “reina
a ambição desenfreada de dinheiro, o que conduz a um
planeta ignorante, envenenado com o ‘esterco do dia-
“Diálogo” com FHC? bo’”. Ainda na Bolívia, durante o encontro com repre-
sentantes dos movimentos populares bradou em favor
dos direitos dos pobres: “Terra, teto e trabalho para to-
dos os nossos irmãos e irmãs. Disse-o e repito: são di-
NA SEMANA PASSADA, com base em mais um patéti- odiados na história do Brasil, é realmente muito arrogan- reitos sagrados. Vale a pena lutar por eles. Que o cla-
co vazamento, a mídia tucana especulou que o ex-presi- te. Sua postura confirma que o tal “diálogo” com os tuca- mor dos excluídos seja escutado na América Latina e
dente Lula pretendia “abrir o diálogo” com o grão-tuca- nos seria pura perda de tempo! em toda a terra”.
no FHC. A notícia plantada serviu apenas para criar con- É certo que o PSDB está dividido na sua leitura do ce-
fusão política e gerar cizânia nas bases governistas. De nário político e que suas contradições devem ser explo-
imediato, o Instituto Lula negou a intenção. Mesmo as-
sim, setores do Palácio do Planalto caíram na armadilha
radas – o que faz parte do jogo político. Há setores, co-
mo os liderados pelo governador Geraldo Alckmin, que
Para enfrentar o pecado capital
da mídia, que agora se diverte com a recusa dos tucanos
ao fantasioso diálogo. “PSDB diz que é ‘tarde’ para ace-
não enxergam a possibilidade imediata da queda de Dil-
ma. Pragmáticos, apostam no seu lento desgaste para ca-
e estrutural, convoca a todos
no do PT à oposição”, afirma a Folha no sábado (25/7).
Colunistas “cheirosos”, como Eliane Cantanhêde e Dora
cifar o sonho presidencial do tucano paulista. Já os aecis-
tas, desesperados, sabem que o cambaleante Aécio Neves
para repensar os atuais modelos
Kramer, também tiraram uma casquinha da cena ridícu- caminha para o isolamento e têm pressa. Daí se unirem de desenvolvimento, de
la. Por último, o vaidoso FHC aproveitou para posar de aos grupelhos fascistas nas marchas pelo “Fora Dilma” e
valentão, recusando o “conchavo... para salvar o que não rosnarem que querem “distância dos bandidos”. produção e de consumo
deve ser salvo”. No caso de FHC, metido a genial ideólogo e mentor
Nos estertores do seu triste governo, o rejeitado FHC do tucanato, ele sempre fez jogo duplo. Num primeiro
procurou várias vezes a oposição para discutir sobre a momento, ele até estimulou as marchas golpistas contra
grave crise econômica e política no país – com recordes Dilma. Na sequência, diante do esvaziamento dos pro- Advertiu para que os movimentos populares que lu-
de desemprego, falência de empresas, alta desenfreada da testos, ele abandonou os fascistas mirins. Seus artigos tam por direitos e dignidade humana não se acanhem.
inflação e outros males. Na época, o tucano não se tra- nos jornalões confirmam o seu oportunismo visceral. Antes sim, que sejam semeadores de mudanças. Que
vestiu de valentão. Agora, totalmente envolvido nas ações Ora pede calma aos golpistas, alertando que as condi- combatam a lógica da exclusão e da destruição da na-
golpistas para desgastar e, se possível, derrubar a presi- ções políticas não estão maduras para o fim do “lulope- tureza. Sem rodeios, acrescentou: “Queremos uma
denta Dilma, ele afirma que rejeita o “conchavo... para tismo”; ora exige pressa – e até solicita um parecer jurí- mudança, real, uma mudança de estruturas. Este sis-
salvar o que não de ser salvo”. FHC, que nas pesquisas dico que justifique o impeachment da presidenta. Ou se- tema é insuportável”. Propôs substituir a globalização
de opinião pública segue como um dos presidentes mais ja: FHC não merece nenhuma confiança! da morte por uma globalização da esperança. E convo-
cou todos para três tarefas concretas: pôr a economia
a serviço dos povos; unir os nossos povos no caminho
Igor Fuser da paz e da justiça e defender a Mãe Terra.
Há pouco também o Papa ecológico lançou a Encí-
fatos em foco
Perdemos um grande camarada! permanentemente as histórias das lutas de massa do Brasil, da e operárias, construiu pontes que, por meio da comunicação,
Perdemos na sexta-feira, dia 24 de julho, o companheiro Vito América Latina e do mundo. ligassem lideranças sociais e intelectuais e suas ideias ao cida-
Giannotti. Era membro fundador de nosso jornal e do conselho Seu vozeirão de Pavarotti o deixava ainda mais contundente. dão comum exposto à indecência da imprensa hegemônica.
editorial do Brasil de Fato. Viveu uma vida simples, coerente e dedicada unicamente aos Obstinado, Vito deixa mais de duas dezenas de livros. E a
Vito Giannotti chegou da Itália, em 1964, com 21 anos. Tor- interesses da classe trabalhadora. experiência singular do Núcleo Piratininga de Comunicação,
nou-se um brasileiro legítimo. O povo brasileiro o adotou. Ope- Todos aprendemos muito com ele. Era um militante das no Rio de Janeiro. Um centro de estudos, de memória, de de-
rário metalúrgico, fez militância sindical durante toda ditadura ideias socialistas, no meio sindical, no meio popular, na univer- bates, de produção e troca de conhecimento. E de amizades.
militar. Sábio, e autodidata, se transformou em jornalista. sidade e entre os jovens. Foi exemplo de dedicação militante. Suas palestras eram movidas a sonho e convicção. Com a
Era um defensor intransigente, seguindo o mestre Gramsci, O Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) mesma fluidez de suas prosas. Era crítico ácido de sindicatos
de que a classe trabalhadora precisa construir seus próprios e seus militantes devemos muito a ele, e temos orgulho de seu e movimentos que desprezam a necessidade de produzir co-
meios de comunicação. Ajudou a formar diversos jornais e exemplo e de sua amizade. Perdemos fisicamente, porém abra- municação de qualidade com a sociedade – com linguagem
boletins da classe, entre eles o Brasil de Fato nacional e o tab- çaremos com amor, seu legado. (João Pedro Stedile – MST) respeitosa e clara, com elegância, com profissionalismo. E
lóide regional do Brasil de Fato RJ. Deve ter dado milhares de mesmo quando “chutava o balde” ao desferir crítica a um
palestras por esse Brasil a fora incentivando a comunicação da Vito Giannotti, operário da memória e jornal malfeito, o fazia com o objetivo nítido de construir,
classe. da liberdade, sempre em construção de impelir as esquerdas e movimentos, qualquer que fosse
Estudioso, transformou-se num professor didático e num Pesquisador da história das lutas operárias e sociais, escritor a corrente, a deixar de falar para o umbigo e disputar a opi-
grande propagandista dos livros. Cultivou sempre a máxima e criador do Núcleo Piratininga de Comunicação, Vito se foi dia nião pública.
“de que só o conhecimento liberta verdadeiramente a classe 24 de julho, deixando um rastro de energia e esperança Vito foi tudo isso. Intenso, propositivo e agregador. Sua ale-
trabalhadora e todo povo!” Vito era filho de italianos. Chegou a São Paulo aos 21 anos, gria, sua energia, sua contundência, e sobretudo sua esperança
Agitador, defendia as ideias da igualdade social e da necessi- em 1964, e passou a vida toda construindo. Construiu resis- e prazer de lutar, contagiantes, farão uma falta danada – ainda
dade de indignar-se contra qualquer injustiça como ninguém. tência à ditadura, construiu a oposição metalúrgica de São mais nesse momento sombrio de nossa política. Valeu, Vito.
Foi um exemplo de internacionalista. Preocupava-se com Paulo ante sucessivas direções indignas de representar traba- Façamos nossa sua frase clássica: “A luta continua, porra!”
as lutas da classe trabalhadora em todos os países, e difundia lhadores, construiu a pesquisa e a memória das lutas sociais (Paulo Donizetti de Souza – da Rede Brasil Atual)
4 de 30 de julho a 5 de agosto de 2015 brasil 5
ESPECIAL Educadores
Professores e diretores
e militantes discutem
as bases da proposta
de reforma educacional
elaborada pela Secretaria Agência Minas
lo Renato [ministro da educação do go-
de Assuntos Estratégicos do Rio de Janeiro (RJ) verno Fernando Henrique Cardoso] as-
sinaria embaixo do diagnóstico que ele
por encomenda da No tópico referente aos diretores e apresenta: a educação vai mal porque as
Presidência da República. professores, o “Pátria Educadora” apre-
senta um diagnóstico em que se encon-
escolas não estão ensinando o que deve-
riam, porque os professores são mal pre-
Prioridade da lógica tram “dificuldades de toda a ordem”. Os parados e porque elas têm problemas de
professores dizem “vêm comumente dos gerência. E adicionou-se um componen-
empresarial na gestão e no alunos mais fracos do ensino médio”, a te que não estava previsto na década de
maior parte provavelmente sofreu pe- 1990, de que as relações federativas são
currículo e falta de diálogo lo menos uma reprovação na condição precárias”, opina.
com o PNE são algumas de aluno e, sendo assim, eles escolhem “A visão é que, aperfeiçoando os ins-
as escolas de pedagogia, principalmen- trumentos de avaliação para premiar e
das principais críticas te as privadas, porque nelas o ingresso punir, se intervém na educação. Pelas
é mais fácil. avaliações se muda o currículo, e isso fica
No ensino superior, o drama se repete: claro na formação de professores: faz-se
a maioria se forma em instituições par- uma prova nacional, ela vira uma neces-
Cátia Guimarães ticulares, “muitas de seriedade duvido- sidade social para o professor exercer a
do Rio de Janeiro (RJ) sa, dedicadas ao lucro e carentes de re- profissão, para ser aprovado ele tem que
cursos intelectuais”. E mesmo a minoria estudar o que a prova vai pedir e, com is-
NO DIA 1º DE JANEIRO deste ano, a que ingressa nas universidades públicas so, altera-se o currículo das universida-
presidente recém-eleita Dilma Rousseff é submetida a um processo que, embo- des sem precisar intervir nelas. E se isso
anunciou o lema do seu novo governo: ra apresente “ao menos alguns elemen- não der certo, se intervém”, resume.
Brasil, Pátria Educadora. A motivação, tos de formação aceitável”, nem de lon-
segundo ela, era deixar claro que a prio- ge oferece um “ensino compatível com o Realidade
ridade dos seus próximos quatro anos à rumo” proposto na reformulação educa- Para o professor da UnB, é preciso dis-
frente do país seria a educação. Menos cional proposta pela SAE. “É voz corren- cutir se esse diagnóstico está ancorado
de seis meses depois, no dia 22 de maio, te nas universidades e no professorado em dados da realidade já que, no caso do
como parte das medidas de ajuste fiscal, que os melhores alunos costumam não documento preliminar da SAE, não são
o Ministério do Planejamento anunciou ficar na docência”, resume o texto. citadas fontes nem referências. Em pri-
um corte de R$ 9,4 bilhões no orçamen- Para piorar o cenário, o documento Renda, moradia e taxa de escolarização local, influenciam mais do que existência de biblioteca, laboratórios e quadras de esporte meiro lugar, ele levanta dúvidas sobre as
to da educação. afirma que, entre os que permanecem na informações “primárias” apontadas pelo
Entre um momento e outro, a Secre- O elogio à meritocracia é um dos aspectos mais criticados do projeto apresentado profissão, “muitos procuram minimizar, Elas formam, no máximo, teóricos, filó- a irresponsabilidade e a indiferença ao documento. Embora aponte como real e
taria de Assuntos Estratégicos (SAE) da a qualquer custo, tempo na sala de aula”, sofos da pedagogia, não licenciados”, diz. mérito”. Perguntada por e-mail se essa legítimo o debate sobre a atratividade do
Presidência da República elaborou um Para exemplificar essa relação, o pro- “O documento sistematiza um conjunto das e meritocracia deram errado em ou- preferindo tarefas administrativas e, in- A segunda proposta do documento pa- constatação sinalizaria que a SAE defen- magistério, ele explica que, ancorado em
documento com análises e propostas que fessor cita o elogio à meritocracia, um tros lugares do mundo. clusive, faltando ao trabalho “alegando ra resolver o cenário de má formação dos de a eleição para escolas públicas, que é pesquisas, o máximo que se pode dizer
tinham como objetivo suscitar a discus- dos aspectos que mais têm sido citados de ideias que estão em debate, sendo “Esse documento vai na contramão doença”. Mas o texto avisa: “Não se trata docentes da educação básica é a criação uma histórica bandeira de muitos mo- é que a linha de corte dos cursos de li-
são sobre um “projeto nacional de quali- nos debates públicos de crítica ao do- praticadas por diferentes governos, e dá uma das lutas da educação, na contramão de demonizar o professorado, que é tam- de Centros de Qualificação Avançada on- vimentos sociais da educação, a assesso- cenciatura é baixa em relação a outros,
ficação do ensino básico”. Não por acaso, cumento. “Nenhuma novidade: várias de todos nós que resistimos à onda ne- bém produto e vítima de uma história de de os professores fariam cursos de com- ria de imprensa também não respondeu. como medicina e engenharia, mas res-
o documento, apresentado como uma propostas meritocráticas que estão no coerência a elas. Ao fazer isso, ele ajuda no oliberal mas, mais do que isso, ele de- descalabro”. Questionada por e-mail so- plementação à formação recebida no en- salta que isso acontece também em cur-
versão preliminar, recebeu o nome de documento têm sido defendidas pelos fende um modelo que, de certa forma, bre a fonte desses dados, que não cons- sino superior e aprenderiam a desenvol- O “ideário” sos que não formam para a docência, co-
‘Pátria Educadora’. “Minha tarefa prin- organismos internacionais, estimula-
contraponto porque exige que você discuta a já demonstrou sua falência, como ficou tam do documento, a assessoria de im- ver “as práticas e os protocolos exigidos O fato é que o “ideário” expresso no mo administração e ciências contábeis.
cipal no governo é ajudar a presidenta a das pela OCDE [Organização para Coo- proposta global e não apenas programas” bem evidenciado na autocrítica feita pe- prensa da SAE não respondeu. pelo Currículo Nacional” – numa refe- documento aposta que “tudo pode come- “Não conheço estudos que mostrem que
construir uma agenda pós-ajuste fiscal”, peração e Desenvolvimento Econômico] la Diane Ravitch”, analisa. rência ao resultado da construção da Base çar a mudar numa escola com bom dire- o aluno ingressante na licenciatura é re-
explica o ministro Roberto Mangabeira e praticadas por estados como São Pau- Saviani está se referindo à ex-secretá- Propostas Nacional Comum, que está sendo tocada tor” e, para isso, propõe duas iniciativas petente”, exemplifica.
Unger, responsável pela SAE. No dia do lo, Minas Gerais, Rio de Janeiro e Per- ria adjunta de educação dos Estados Uni- Para mudar esse quadro, o documen- pelo MEC e deve estar concluída até mea- capazes de mudar o cenário nacional. A Para contestar o cenário apresentado,
fechamento desta edição, a SAE lançou a nambuco já há mais de uma década. O posta é inteiramente atravessada por es- dos, que liderou o movimento pela cria- to propõe três caminhos. Um é a criação dos de 2016 –, além de discutirem as “ex- primeira é exatamente a premiação das ele cita como exemplo um estudo publi-
versão preliminar de um novo documen- que o documento faz é propor um ganho sa lógica e “tira consequências dela”. ção de um currículo nacional no governo de uma carreira nacional para o magisté- periências e inovações do professorado”. escolas que alcançarem metas de desem- cado em 2013 pelo Instituto de Pesqui-
to para discussão, focado especificamen- de escala para essas políticas”, explica. O professor-pesquisador da Escola George Bush e foi indicada por Bill Clin- rio, vinculada ao piso salarial, e que se- O documento também aponta como penho avaliadas por “comissões inde- sa Econômica Aplicada (Ipea), vincula-
te na instituição do Sistema Nacional de Foi ao ministro da educação, Renato Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio ton para coordenar os institutos respon- ja acompanhada por uma Prova Nacio- terceira prioridade a “transformação” pendentes”. Mas como não se pode ape- do à própria SAE, com condução de Pau-
Educação e na regulamentação dos arti- Janine Ribeiro, no entanto, que o pro- (EPSJV/Fiocruz), Murilo Vilaça, exem- sáveis pelos testes federais naquele país. nal Docente. A ideia é que, após a conclu- dos cursos de pedagogia e licenciatu- nas “confiar no efeito dos incentivos”, lo Roberto Corbucci e Eduardo Zen, que,
gos 23 e 211 da Constituição. fessor Luiz Carlos de Freitas apelou atra- plifica: “O documento afirma categori- Depois de protagonizar essa experiên- são dos cursos de nível superior, os ex- ra, apontando que os instrumentos ho- diz o documento, é preciso criar Cen- cruzando as notas do Índice de Desen-
Foi amplamente noticiado pela gran- vés de uma carta aberta apresentada du- camente que uma nova política de re- cia, ela escreveu um livro chamado Vida -estudantes de pedagogia e licenciatura je disponíveis para qualificar as institui- tros de Formação de Diretores, a partir volvimento Educacional (Ideb) e indica-
de imprensa o fato de o documento ter rante um seminário realizado em maio muneração dos professores não resolve- e morte do grande sistema escolar ame- se submetam a uma prova, com questões ções privadas, que formam a maioria dos do esforço conjunto da União e dos esta- dores de condições sociais, mostra, com
sido não só elaborado como apresenta- na Unicamp e que recebeu mais de duas ria os problemas da educação, o que é de ricano: como os testes padronizados e o teóricas e práticas, através da qual eles professores, são insuficientes. O diag- dos. Esses Centros formariam não ape- dados reais dos municípios brasileiros,
do sem a participação (e a presença) do mil assinaturas. um truísmo absurdo porque é óbvio que modelo de mercado ameaçam a educa- terão que demonstrar que estão prepa- nóstico, no entanto, não inclui comentá- nas os diretores em exercício, mas tam- que “fatores extrínsecos” à escola, como
Ministério da Educação (MEC). Man- Depois de desenvolver severas críticas nenhum problema complexo se resolve ção, em que explica o quanto esse siste- rados para se tornarem futuros professo- rios sobre os programas do próprio go- bém os “candidatos” a diretor – embo- renda, condições de moradia e taxa de
gabeira minimiza a crise, explicando, ao “Pátria Educadora” e elencar suges- com uma medida isolada. E depois se- ma foi danoso para a educação do país. res. O objetivo principal, segundo a pro- verno federal que têm incentivado, com ra, aqui, a palavra “candidato” nada te- escolarização local, influenciam muito
primeiro, que, por não ter uma “juris- tões alternativas, a carta convida o mi- gue com algumas informações que suge- “Qualquer ênfase exagerada em proces- posta, é “valorizar a carreira e atrair para subsídios públicos, a ampliação da ofer- nha a ver com eleição, já que o texto, na mais os resultados educacionais do que
dição específica”, as ações da SAE aca- nistro a se juntar à luta contra a concep- rem que a política de incentivos vai ser sos de responsabilização é danosa para a ela número maior de vocações docentes”. ta de vagas nessas instituições privadas sequência, explica que isso deveria resul- os fatores relacionados à “infraestrutu-
bam sempre caindo na área de algum ção expressa no documento elaborado mantida na educação básica. Esse é um educação. Isso leva apenas a um esforço O senador Cristovam Buarque (PD- – o Programa Universidade para Todos tar num acordo para que os estados es- ra pedagógica da escola”, como existên-
ministério. pela SAE. jogo perverso. A lógica é: eu te pago pou- grande em ensinar a responder testes, a T-DF), que já foi ministro da educação, (Prouni), inclusive, destaca entre o seu colhessem os diretores entre aqueles que cia de biblioteca, laboratórios e quadras
Segundo ele, além disso, as propostas “Vossa Excelência será chamada, pe- co e, para que você saia desse estado de diminuir as exigências e outras maneiras concorda com o diagnóstico apresenta- público-alvo os professores da rede pú- foram “habilitados” por esses espaços. de esporte.
contidas preliminarmente no documen- las gerações futuras, a prestar contas penúria absoluta do seu salário baixíssi- de melhorar a nota dos estudantes sem, do no documento e defende uma propos- blica de ensino para formação em cursos Em outro trecho, que trata da constru- Ignorando esses dados reais, diz Luiz
to só foram lançadas depois de ele ter dos caminhos que vier a pavimentar mo, proponho o cumprimento de algu- necessariamente, melhorar a educação”, ta de carreira federal do magistério, com de pedagogia, licenciatura e normal su- ção de um “federalismo cooperativo” pa- Araújo, a proposta da “Pátria Educa-
ouvido “dezenas de interessados na edu- neste momento decisivo para o futuro mas metas; se resistir, você deixa de ga- disse Diane em 2010, em entrevista con- termos mais específicos do que o que é perior nessas instituições. Na verdade, o ra a educação básica, o documento diz dora” – e as políticas públicas em cur-
cação” e ter “trabalhado intensivamente da educação brasileira. A área de edu- nhar um complemento do seu salário”. cedida ao jornal Estado de S. Paulo, em sugerido nessa versão preliminar do do- documento propõe a construção de um ainda que os “diretores de escolas com so, ele acrescenta – aposta que a forma-
com a presidenta e com o Ministério da cação, através de suas entidades cientí- No texto da SAE, essa referência à fra- que ela resume as conclusões apresenta- cumento da SAE. “Estou totalmente de novo programa de bolsas, “por analogia desempenho insatisfatório receberiam ção dos professores e a gerência da es-
Educação”. ficas e sindicais, deve se mobilizar para ca relação entre o salário do professor e das no livro. E completou: “(...) as evi- acordo com essa descrição. Mas qual é extensiva ao Prouni”, condicionando a apoio e orientação” e que, “em último ca- cola são os fatores determinantes para a
Contatado pela Poli, o MEC não acei- que lhe seja fornecido o apoio necessá- a qualidade da educação é apresentada dências acumuladas nesse período sobre a raiz disso? Ele não aponta. Primeiro, é participação da instituição à adaptação so, seriam afastados e substituídos”. nota dos alunos. Ele não tem dúvida de
tou comentar a proposta, explicando, via rio para enfrentar a cultura de audito- como resultado de “abundante evidência os efeitos de todas essas políticas me fi- que no Brasil o magistério é uma profis- dos seus cursos a “protocolos curricula- Na avaliação do professor Luiz Araú- que uma péssima formação e um péssi-
assessoria de imprensa, que “apesar de o ria e as políticas de mercantilização em empírica”. O professor Dermeval Savia- zeram repensar. Não podia mais conti- são muito mal remunerada. Então, quem res e ao cumprimento de metas”. jo, o cenário desenhado pelo documento mo professor “pioram a situação”, mas
ministro Mangabeira ter se reunido com curso na proposta do documento preli- ni, da Universidade Estadual de Campi- nuar apoiando essas abordagens. O ensi- vai fazer o magistério, salvo uns heróis Sobre os diretores de escolas de educa- não tem respaldo em dados concretos e a questão, diz, é como se atribui o pe-
secretários do MEC e o então ministro minar da Secretaria da Presidência da nas (Unicamp), no entanto, lembra que no não melhorou e identificamos apenas missionários, é quem não consegue pas- ção básica, o documento destaca apenas as propostas apresentadas não dialogam so adequado a cada uma das determi-
Cid Gomes (...) o documento não foi fei- República. Some-se a essa luta”, convi- outras evidências empíricas mostram, muitas fraudes no processo”. (Revista sar em direito, engenharia, medicina, in- que, em grande parte do país, eles “são com as lutas que vêm sendo travadas na nações. (CG) (Revista Poli nº 41 – Es-
to em parceria com o MEC”. da, caracterizando a reforma educacio- na verdade, que as reformas educacio- Poli nº 41 – Escola Politécnica de Saúde formática. Segundo, a formação dos pro- nomeados por apadrinhamento político educação a partir do conhecimento e da cola Politécnica de Saúde Joaquim Ve-
Para o professor Luiz Araújo, da Uni- nal incentivada pelo documento como nais pautadas por avaliações padroniza- Joaquim Venâncio – EPSJV/Fiocruz) fessores está péssima nas faculdades. ou eleitos em processos que favorecem experiência acumulada no país. “O Pau- nâncio – EPSJV/Fiocruz)
versidade de Brasília (UnB), no entan- de cunho empresarial.
to, essa divergência com o MEC é mais De fato, o documento reconhece que
de trâmite do que de concepção políti- muitos dos “experimentos” que tenta-
Hackeando o Brasil
ESPIONAGEM Vazamento
Reprodução
Assim, Luppi decidiu cortar o inter-
mediário e negociou diretamente com o
do WikiLeaks detalha Centro de Instrução de Guerra Eletrô-
nica (CIGE) numa visita no dia 19 da-
investidas da empresa quele mês, comunicando-se com o ca-
italiana Hacking Team para pitão instrutor Flávio Augusto Coelho
Regueira Costa.
vender software espião Procurada pela reportagem da Públi-
ca, a assessoria do Comando do Exér-
à polícias de todo o país, cito reconheceu ter feito contatos com
de olho nas Olimpíadas; a Hacking Team para avaliar os produ-
tos da empresa, mas disse que não hou-
primeiro cliente, PF teria ve aquisição.
“A prospecção de ferramentas que per-
começado a usar o produto mitem a realização de testes de penetra-
em maio deste ano ção em sistemas de informática é um fa-
to cotidiano que é realizado para manter
o CIGE atualizado e identificar novas fer-
ramentas que possam simular para seus
Natalia Viana alunos o ambiente real de ataques que
de São Paulo (SP) Após vazamento, segurança dos produtos da Hacking Team tem sido ainda mais questionada ocorrem nos sistemas informacionais”,
disse o CIGE por meio de nota.
A NOTÍCIA de que a empresa Hacking lhares de aparelhos monitorados ape- reunião seja no dia 25 de julho entre as
Team teve seus e-mails hackeados em nas adicionando hardware.” No mesmo 14 e as 17 horas. Embora haja agora uma Sem legislação
junho foi um choque para o mercado da e-mail, ele diz ainda que “dentre as insta- discussão sobre os poderes do Procu- A partir de 2014, outro representan-
vigilância digital. Normalmente acostu- lações que temos atualmente no mundo rador-Geral para investigações. Apesar te brasileiro, Luca Gabrielli, da empresa
mada a espionar e-mails alheios, a com- todo, mais de três têm aproximadamen- desse debate, o procurador segue investi- 9isp (e, posteriormente, da YasniTech),
panhia viu suas comunicações internas te dois mil aparelhos monitorados cada”. gando e nós acreditamos que o debate vai assume as negociações com as polícias
vazarem a conta-gotas na internet. Em O e-mail de Bettini foi enviado em res- acabar fortalecendo a PGR”, diz Gualter brasileiras, com um approach bastan-
8 de julho, o WikiLeaks publicou nada posta ao então representante brasileiro em e-mail no dia 19 de junho de 2013. Na te diferenciado, como detalha um e-mail
menos que 1 milhão de e-mails, organi- Gualter Tavares Neto, ex-secretário ad- mesma visita, Massimiliano esteve com a em italiano, de 28 de maio de 2014.
zados em um banco de dados que pode junto de Transporte do Distrito Federal Polícia Civil do Distrito Federal, após in- A nova estratégia de entrada no mer-
ser explorado através de buscas por pa- (DF) e sua empresa DefenceTech, a pri- tervenção junto ao gabinete do governa- cado brasileiro foi traçada com a cola-
lavras-chave. meira a trazer a tecnologia da Hacking dor, diz outro e-mail. boração do advogado Antenor Madruga,
Os documentos mostram como a em- Team ao Brasil, em 2011. Nas correspondências, o brasileiro ex-secretário Nacional de Justiça e ex-di-
presa – que vende somente para gover- No final de 2012, Gualter Tavares orga- mostrava preocupação em convencer as retor do Departamento de Recuperação
nos e tem entre seus clientes desde o FBI nizou um verdadeiro roadshow dos pro- polícias nacionais sobre a superiorida- de Ativos e Cooperação Internacional.
e o exército americano até regimes que dutos entre polícias e militares brasilei- de da Hacking Team contra concorren- “Não há nenhuma legislação específica
reprimem e perseguem oposicionistas ros. Para isso, dois membros da Hacking tes, como os softwares espiões da em- para o uso de um produto como esse e/
como Marrocos, Arábia Saudita, Emi- Team vieram ao Brasil, o gerente de con- presa israelense Elbit Systems e o Fin- ou uma doutrina legal clara. Por isso, te-
rados Árabes, Bahrein e Azerbaijão – tas Massimiliano Luppi e o engenheiro fisher, do britânico Gamma Group, tam- mos que construir uma estratégia de ven-
atua para fazer lobby e conquistar novos de sistemas Alessandro Scarafile. bém conhecido e apreciado pelos poten- das para impedir a venda antes de quei-
clientes. Foram feitas exibições de uso dos pro- ciais clientes. mar o produto (isso inclui todos os ato-
No Brasil, a Hacking Team tem atua- dutos para o Comando da Aeronáutica res: políticos – nossos apoiadores –, jor-
do fortemente junto à Polícia Federal, no dia 27 de novembro, com a presença Negociações nalísticos, comerciais, etc.).”
o Exército e diversas polícias estaduais do chefe de inteligência; no dia 28, às 2 As negociações, no entanto, avançaram Luca Gabrielli sugere ter cuidados com
desde 2011. Por outro lado, diversas for- da madrugada, a equipe esteve na sede pouco. No ano seguinte, a Hacking Team órgãos que poderiam fazer uso ilegal do
ças policiais brasileiras procuraram os do Departamento de Inteligência da Po- ainda não havia concretizado nenhuma software, como as polícias civis do Rio
italianos em busca dos seus produtos. lícia Civil do Distrito Federal, com pre- venda. “Durante todo esse tempo, nós ti- de Janeiro e do Amazonas. “Todo mundo
Em maio deste ano, através de um con- sença de toda a equipe; no mesmo dia, vemos a chance de estar em Brasília di- concorda que o produto será bem-suce-
trato com a representante nacional Yas- às 17h30, fizeram uma demonstração versas vezes e fizemos algumas demons- dido, mas vendê-lo antes das eleições em
niTech, os polêmicos softwares de es- na sede do Departamento de Polícia Fe- trações”, escreveu Massimiliano Luppi outubro é um risco alto, com grande pro-
pionagem da Hacking Team foram usa- deral, em Brasília. Estiveram também no final de fevereiro de 2014. babilidade de abusos.”
dos para uma investigação da PF, em um na sede do Centro de Comunicações e Ele afirma ter feito mais de três de- A consequência, explica ele, é que co-
projeto piloto de três meses, segundo os Guerra Eletrônica do Exército Brasileiro monstrações à PF, mais de três à Polícia mo intermediária sua empresa poderia
e-mails. (CCOMGEX) no dia 29. O grupo foi ain- Civil do Distrito Federal, além do Exérci- ser corresponsabilizada nesse caso. “Pre-
da recebido na sede da Abin no dia 30 de to, a PGR e a Abin. “Depois das ‘demos’, cisamos realmente construir uma estra-
Controle de celulares e computadores novembro às 8h30. não houve nenhum follow-up”, reclama. tégia de comercialização completa, sa-
O negócio da Hacking Team é desen- Em meados do ano seguinte, Gualter Em especial, lhe desagradava o sobrepre- bendo que, como provavelmente aconte-
volver maneiras de “infectar” diferentes organizou mais uma rodada de reuni- ço do “parceiro” brasileiro na negociação cerá no Brasil, pode haver tanto uso im-
aparelhos digitais para permitir seu mo- ões pessoais em Brasília, inclusive com a com a PF: “Eles vieram com um preço próprio quanto uma publicação em al-
nitoramento ao vivo, 24 horas por dia, a Procuradoria-Geral da República (PGR), extremamente alto se comparado com o gum jornal.”
chamada “tecnologia de segurança ofen- segundo os e-mails. “Ontem nós recebe- nosso orçamento para eles”. Enquanto a A solução, para ele, era identificar um
siva” – ou espionagem digital. Seus equi- mos um pedido do Sr. Marcelo Beltrão Hacking Team teria pedido 700 mil eu- primeiro cliente “que não impacte nega-
pamentos permitem às polícias realizar Caiado (chefe da Divisão da Seguran- ros, a DefenseTech teria enviado um or- tivamente a opinião pública” – a Polícia
vigilância seletiva e também vigilância ça da Informação da Procuradoria-Geral çamento de “mais de 1,5 milhão [de eu- Federal. (NV) (Agência Pública – www.
massiva, em milhares de celulares e com- da República – PGR) requisitando que a ros] para o usuário final”. apublica.org)
putadores ao mesmo tempo.
Seu principal produto é o Sistema de
Controle Remoto “Da Vinci”, que permi-
Olimpíadas vigiadas
que transcende fronteiras”, disse a orga-
nização na ocasião.
O software é vendido sob uma licen-
ça para o “usuário final” durante deter-
minado tempo, com um contrato de con-
fidencialidade. Segundo reportagem da bro de 2015). Tudo depende do sucesso bro de 2013. Ali, um agente do Departa-
revista alemã Der Spiegel, o porta-voz de São Paulo (SP) do projeto-piloto.” mento de Estado americano o procurou
da Hacking Team afirmou durante um Não foi a primeira vez que a SESGE de- para falar da necessidade de vigilância
debate que a empresa pode compreen- Levado pelas mãos da PF, o represen- monstrou interesse nos softwares espi- nas Olimpíadas.
der “até certo limite” o que os clientes fa- tante da Hacking Team manteve con- ões. Pouco depois da Copa do Mundo, no “O Brasil quer um sistema para a Copa
zem com seu software, já que o progra- versas com representantes da Secreta- dia 4 de setembro de 2014, o coordena- do Mundo da FIFA e as Olimpíadas. Eles
ma mantém contato “constante e não es- ria desde o começo deste ano. “Nós (eu e dor-geral de Contrainteligência da secre- vão trabalhar junto com o Departamen-
pecificado” com seus criadores. Após o Hugo) discutimos com o Secretário Es- taria, Rogerio Giampaoli, escreveu para to de Estado dos EUA para conseguir fi-
vazamento, a segurança dos produtos da pecial da SESGE uma implantação glo- o gerente de vendas da Hacking Team, nanciamento. É do interesse dos EUA es-
Hacking Team tem sido ainda mais ques- bal no país para auxiliar na segurança Alex Velasco: “Prezado Senhor Alex, gos- tar em boa cooperação com o Brasil, não
tionada. dos Jogos Olímpicos; as licenças, então, taríamos de conhecer um pouco mais so- apenas pelas relações internacionais mas
seriam doadas para a PF em vários esta- bre a ferramenta GALILEO de vossa em- também por razões de segurança. Isso é o
Roadshow no Brasil dos. Eu fiz uma apresentação para o de- presa, tais como funcionalidade e opera- que o agente do Departamento de Estado
“Os produtos de nossos competido- partamento de inteligência da SESGE, cionalidade. Teriam algum representan- Peter MacDonald mencionou para mim”,
res só conseguem gerenciar algumas de- que quer uma demonstração durante o te no Brasil?”. escreveu aos chefes. Procurada pela Pú-
zenas de alvos ao mesmo tempo”, expli- piloto [da PF]. Nesta fase, há a possibi- Um ano antes Alex Velasco já tinha fei- blica, a assessoria de comunicação da Po-
cou o gerente de vendas da Hacking Te- lidade de expansão para até 1.000 agen- to sucesso na maior feira de venda de lícia Federal não respondeu à publicação.
am, Marco Bettini, em um e-mail de ou- tes em todo o país (a SESGE confirmou equipamentos para inteligência e vigi- A SESGE também não respondeu às per-
tubro de 2012. “Já com o ‘Da Vinci’ vo- a disponibilidade de orçamento, mas lância do mundo, a ISS World, que ocor- guntas da reportagem. (NV) (Agência
cê pode aumentar para centenas de mi- apenas se executada em agosto/setem- rera em Washington de 25 a 27 de setem- Pública – www.apublica.org)
brasil de 30 de julho a 5 de agosto de 2015 9
RECONHECIMENTO
Homenagem a Vito Giannotti, falecido
no dia 24 de julho, no Rio de Janeiro.
Vito foi um dos fundadores do Brasil
de Fato, era membro do conselho
editorial e colunista do nosso jornal
Sebastião Neto
Governo expulsa da floresta comunidades que mais a preserva Fotos: Daniela Alarcon
ENTREVISTA
Mauricio Torres denuncia
ações de violência
praticadas pelo Ibama
e ICMBio contra os
ribeirinhos do Pará,
populações que têm
uma relação de equilíbrio
com o meio ambiente
Carolina Motoki
de Santarém (PA)
Virgínia Fontes
www.malvados.com. br dahmer
PALAVRAS CRUZADAS
Horizontais: 1.Valor – Críticos do PT insistem no discurso seletivo de que ela não existia
1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 13 14 15 16 17 18
no Brasil antes de Lula e Dilma assumirem o comando do país. 2.O equivalente a grêmio 1
estudantil no âmbito universitário – Região do país que conta com 9 estados (sigla),
possui área equivalente à da Mongólia ou do estado do Amazonas e população equiva- 2
lente à da Itália. 3.Regionalismo sulista para “garoto” – No Brasil, elas são 27 (sigla) – De-
3
saba. 4.Entidades da sociedade civil teoricamente “sem finalidade econômica” que têm
desempenhado funções do Estado – Filme chileno que trata de um plebiscito que foi 4
feito no país para que fosse decidido se o ditador Pinochet permaneceria no comando
– Carta do baralho. 5.Alternativa ao agronegócio – Em inglês, a abreviação equivalente 5
é Mr. – A ONU já recomendou a sua extinção no Brasil. 6.Portal de notícias na internet.
7.Sacerdote – esquema ilícito ou de má-fé criado para obter ganhos pessoais. 8.Aliança 6
militar que já conta com 28 países que concordam com a defesa mútua em resposta a
7
um ataque por qualquer entidade externa – Aqui – Colocar. 9.Único estado brasileiro (si-
gla) que tem sua capital totalmente no hemisfério Norte – Regionalismo mineiro – Tome 8
nota – Predecessor do DVD. 10.Pronome da língua inglesa usado para “coisas e animais”
– Sua capital é Teresina (sigla). 11.O oposto de “estatizações”. 9
tica que começara duas semanas antes, riamente com a ameaça de Grexit, eles tem cheiro de sangue. Ouvi de Aristi- prognóstico é arriscado. Syriza, do qual não sabemos nem se op- ra evitar? Ela era a promessa do fim das
com a recusa de uma versão anterior precisariam ter um plano. Não somente des Baltas, ministro da Educação, que O que há de certo até aqui é que Tsi- tará de fato por esta estratégia. Quan- guerras dentro da Europa, a realiza-
deste memorando e a convocação do re- um plano de médio prazo, mas um pla- Tsipras foi à Bruxelas negociar saben- pras já declarou que não pretende in- do das recentes eleições municipais es- ção de um imaginário do continente co-
ferendo em que o oxi [não] à proposta no de contingência imediato, capaz de do que dali a dias acabaria, por falta de corporar novos partidos à coalizão e panholas, escrevi um texto em que fala- mo força civilizatória e progressista no
feita pela Troika saiu vitorioso. responder como, amanhã, setores-cha- combustível, o abastecimento de água que, diante da rebelião nas duas vo- va da vantagem de lideranças “frágeis”, mundo. E o que se viu foi o governo de-
É preciso, entretanto, entender que ve da economia continuarão funcionan- para algumas das ilhas. Quer dizer, Tsi- tações, houve mudanças ministeriais, que não estão seguras de ser seguidas. mocraticamente eleito de um país euro-
isto não é “a crise” para os gregos. A cri- do e não haverá caos. Justiça seja fei- pras estava definitivamente negocian- mas ainda não se falou em expulsões. Este é o tipo de relação que o Syriza tem peu ser tratado com a mesma truculên-
se, para eles, é uma realidade que já du- ta, a Plataforma de Esquerda – segunda do com uma arma na cabeça. O que não Além disso, houve um realinhamento com os movimentos gregos, que estão cia que este projeto “civilizatório” nor-
ra cinco anos e que não tem nenhuma maior corrente do Syriza, que se opõe quer dizer que era inevitável que ele interno no partido, com um grupo rom- longe de ser “correia de transmissão” do malmente exportou para fora de suas
perspectiva de terminar – pelo contrá- ao novo memorando e desde o início chegasse a este ponto tão fragilizado e pendo com a ala majoritária, o que sig- governo. É verdade que houve uma re- fronteiras, ser sujeitado a uma condi-
rio, que tende a se agravar com as no- defendia a necessidade de preparar-se que, com outra estratégia, o resultado nifica que esta perdeu o controle sobre lativa desmobilização após as eleições, ção praticamente neocolonial.
vas medidas. A crise, para eles, é uma para esta possibilidade – também não não pudesse ter sido diferente. o Comitê Central do partido – de onde mas isto foi menos por “ordens superio-
contração econômica de 25%, desem- pôs nada na mesa. este último tenha se manifestado contra res” que porque as pessoas decidiram Raiva X medo
prego acima de 25% (acima de 53% en- E qual tem sido a posição de o memorando, com 109 votos num to- pagar para ver. Até uma parte dos anar- Isto também gera raiva, que é um afe-
tre os jovens), um aumento de 43% da A falta de um plano B Tsipras e do Syriza depois da tal de 201. Isto pode fazer com que se- quistas gregos, notórios por seu mili- to capaz de superar o medo. Há uma sé-
mortalidade infantil, 21% da população Quando ficou claro que não havia pla- assinatura do novo memorando? ja impossível expulsar os rebeldes; tam- tantismo, deram um voto de confiança rie de fissuras que se abriram neste pro-
abaixo da linha da pobreza, um cresci- no B, o governo grego passou a ser co- Uma coisa que não deixa de ser lou- bém significa uma ameaça ao controle público ao governo. cesso, entre França e Alemanha, dentro
mento de 32% no número de suicídios. mo um jogador de pôquer que todo vável é que Tsipras não tentou vender de Tsipras. da Alemanha (entre Merkel e Schäub-
Ou seja: é a lenta transformação de um mundo sabe ter uma mão fraca. E isto o novo memorando como uma vitória. le), sobretudo dentro da cabeça de mui-
país desenvolvido num failed state, não ficou claro logo após o referendo. Pelo contrário, ele já disse abertamen- E qual será o papel dos “A saída do Euro é, para quem a defende, tas pessoas: esta não é a Europa que nos
apenas diante dos olhos de seus parcei- O referendo servia para pedir um no- te não acreditar que ele seja bom, nem movimentos sociais e da prometeram, não é a nossa Europa.
ros de União Europeia (EU), mas pela vo mandato, ou uma clarificação do que vá funcionar. Aliás, o FMI já disse população grega nisso? uma consequência da necessidade de uma Qual afeto vencerá, se o medo ou a
ação direta destes, que têm por artigo mandato concedido pelas eleições. Mas o mesmo, e o próprio fato de que eles Voltemos à questão do mandato. Dis- raiva, dependerá da capacidade de res-
de fé que um governo democraticamen- ele também envolvia uma jogada de alto o afirmem publicamente já põe o acor- se que “provavelmente” teria havido
moratória. É uma avaliação da conjuntura posta dos movimentos em toda a Euro-
te eleito não pode interferir com os in- risco, porque marcá-lo para uma sema- do em dúvida. Ninguém acredita que apoio popular para o Grexit após o re- atual. Não é uma tomada de posição pa. O próprio presidente do Conselho
teresses do mercado financeiro. na depois de 27/06 implicava depender o fundo de privatizações possa de fato ferendo porque toda a campanha do Europeu disse há alguns dias que sente,
Além disso, dada sua posição geográ- Tsipras e Merkel: esta não é a Europa que nos prometeram de uma extensão do acordo então em vi- atingir os €50 bilhões esperados, por governo foi de que o “não” não implica- ideológica, soberanista, contra a EU” “se não um estado de espírito revolucio-
fica e a crise no Oriente Médio após a gor para além da data final de 30/06. exemplo. va necessariamente sair do Euro – ou nário, algo como uma impaciência dis-
invasão do Iraque pelos EUA e a reação zes conservadoras já sugeriram. O fa- subalternidade: ele era o pequeno Davi Este acordo era necessário para que o Dizer isto é simplesmente manter-se seja, continuava operando dentro da- seminada. Quando a impaciência deixa
à Primavera Árabe, a crise humanitária to de que ninguém tenha muita clare- que ia enfrentar o Golias europeu. As- Banco Central Europeu (BCE) continu- coerente com a análise de que a Grécia quilo em que todo mundo queria acre- de ser um sentimento individual para se
grega se inscreve no quadro de uma cri- za do que pode acontecer tem, me pare- sim, quando ele volta derrotado, as pes- asse garantindo a liquidez dos bancos chegou a um limite de depressão econô- ditar. Retrospectivamente, penso que Estado X organizações de baixo tornar uma experiência individual, para
se humanitária mais ampla. Há hoje o ce, um sentido positivo: tudo está ain- soas não só não o culpam – ele sempre gregos, que estava se esgotando. mica e crise de reprodução social (isto teria sido melhor que houvessem duas É fácil agora olhar para estes movi- se tornar uma experiência compartilha-
maior número de refugiados em terri- da em aberto. A história ainda está sen- foi o lado mais fraco –, como reconhe- A aposta, algo desesperada, era: a Eu- é, das próprias condições de vida da po- perguntas: uma sobre aceitar ou não o mentos e chamá-los de ingênuos, dizer da, é o anúncio de uma revolução”.
tório europeu desde a Segunda Guerra do escrita. Aliás, é importante salientar cem nele um esforço de ir até o fim na ropa vai respeitar o processo democrá- pulação) e não há mais o que tirar daí. memorando então proposto, outra so- que eles deveriam saber que aquilo que Bom, se há alguma coisa que as insti-
Mundial, e a Grécia é uma de suas prin- que as medidas sendo introduzidas são tentativa de representá-las. tico, não vai deixar o país quebrar en- Isto significa que as novas medidas (au- bre o que fazer caso não fosse possível aconteceu estava fadado a acontecer. tuições europeias demonstraram nas úl-
cipais rotas de entrada, portanto tam- preliminares à concessão de um novo Falou-se muito em “capitulação” e quanto a população é consultada. Mas mento de impostos, mudanças na pre- acabar com a austeridade mantendo a Mas não há ingenuidade nenhuma. Se timas semanas, é que elas estão precisan-
bém profundamente afetada pelo con- empréstimo; o empréstimo em si ainda “traição”, como se fossem sinônimos. foi exatamente o que aconteceu, por- vidência, privatizações, etc.) não levan- moeda comum. Só assim teria emergi- você está há anos trabalhando numa co- do de uma boa chacoalhada. Tomara, en-
trole de fronteiras que tem causado tan- não está resolvido. Ora, é evidente que houve capitulação: que havia um interesse direto na vitó- tarão os fundos necessários e deverão do um mandato claro. zinha coletiva ou numa clínica de saúde tão, que ele tenha razão. (IHU On-Line)
tas mortes no Mediterrâneo. “capitular” é justamente aquilo que faz ria do “sim” e na queda do governo – encontrar fortes resistências na socie- Desde então, vi uma pesquisa apon- gratuita, como existem várias na Gré-
Como interpreta a mudança de um general quando é derrotado. Não a oposição grega chegou a ser chamada dade e dentro do próprio governo, tal- tar que 70% dos gregos continuam pró- cia, sem ver perspectiva de um fim pa-
IHU
postura do Tsipras, ao negociar há qualquer contradição entre ser víti- a Bruxelas para discutir um futuro “go- vez ao ponto de impossibilitar sua im- -Euro e outra em que 42% (contra 45%) ra a crise, e há um aceno de possibilida-
“A crise, para eles, é uma realidade novamente com a Troika, após ma de um golpe, como afirmava a hash- verno de união nacional”. Então, não plementação. dizem que o país deve se preparar pa- de de mudança institucional, é natural
sugerir um referendo a partir do tag #ThisIsACoup, que virou trending há extensão, e o BCE se nega a garan- Quando isto acontecer, vamos po- ra o Grexit... (esta última, uma pesqui- que você queira explorá-la. É muito fá-
que já dura cinco anos e que não tem qual a população apoiou o não topic global durante as negociações de tir a liquidez dos bancos, o que aumen- der conhecer a resposta àquela que é sa online). Nas ruas, ouve-se de tudo: cil, olhando de longe, dizer que as pes-
pagamento da dívida grega? 12 e 13/07, e capitular. Falar em “trai- ta a pressão sobre o governo grego, que a grande pergunta agora: que tipo de que não havia outro jeito e Tsipras fez o soas deveriam ignorar o Estado e seguir
nenhuma perspectiva de terminar – Uma das grandes questões em aber- ção”, por outro lado, está longe de dar precisa impor controle de capitais. Daí relação o governo vai manter com um que dava, mas também que até a oferta se organizando desde baixo. Mas, se vo-
pelo contrário, que tende a se agravar to, tanto do ponto de vista interpretati- conta da complexidade do caso. para frente, eles “negociarão” sabendo acordo que é péssimo sob todos os as- de uma saída controlada oferecida pe- cê está lá, isto é a sua vida, o seu tem-
vo quanto do político, é que mandato ti- que o país está quebrando, e rápido. po, a sua energia, e ninguém tem fontes
com as novas medidas” nham, têm e podem vir a ter Tsipras e Em que sentido? Afinal de contas, Ou seja: a partir da convocação do re- inesgotáveis de energia, especialmente
G7
o Syriza. Tsipras foi contra a vontade ferendo há um risco palpável de saída do se não há saída à vista no horizonte.
O Syriza se elegeu com a linha da ala expressa no referendo. Euro, talvez até mesmo apoio popular O que farão agora estas experiências
moderada, majoritária, do partido: aca- Vamos continuar com a questão do para tanto – mas não há um plano. Pior: de auto-organização, que já foram cha-
Também por conta desta temporali- bar com a austeridade sem sair do Eu- mandato: acabar com a austeridade sem você tem um país às vésperas da bancar- madas de Plano C, por oposição ao A
dade longa, as reações em Atenas me ro. Se olharmos todas as pesquisas da sair do Euro. Qual foi o grande erro da rota, em que 61% da população concede (austeridade) e ao B (Grexit)? Esta é ou-
pareceram como em câmera lenta. Em época até hoje, parece ser este o dese- direção do Syriza? Eles nunca quiseram ao governo um mandato para endurecer tra das perguntas em aberto. Idealmen-
certo sentido, eles não têm porque ter jo da maioria dos gregos. Não há dúvida considerar, menos ainda preparar a po- nas negociações, mas este não tem ideia te, o governo, agora que tem restrições QUEM É
pressa; um amigo, muito ativo politica- que, caso tivesse assumido na campa- pulação para a hipótese de que apenas do que fazer daqui a alguns dias, que di- orçamentárias ainda mais duras, da- Rodrigo Guimarães Nunes é doutor
mente, foi passar as férias numa ilha, nha uma linha pró-Grexit, o partido di- uma destas coisas fosse possível, de que rá meses. Estamos falando de questões ria mais apoio a estas alternativas, sem em Filosofia pelo Goldsmiths College, Univer-
dizendo que preferia descansar para es- ficilmente teria sido eleito, ou pelo me- seria preciso escolher: ou acabar com a básicas, como qual fonte alternativa de tentar aparelhá-las, ao mesmo tempo sidade de Londres, e professor da Pontifícia
tar pronto para o que virá. Mas esta len- nos não com uma margem que lhe per- austeridade ou continuar na zona do Eu- crédito pagará pelo funcionamento de em que estas se afirmariam como pólos Universidade Católica do Rio de Janeiro (PU-
tidão tem outros sentidos: assimilar o mitisse governar. ro. Assim, eles não assumiram responsa- áreas-chave até as coisas se normaliza- de politização e resistência. C-Rio). É colaborador de diversas publicações
golpe e entender o que aconteceu, ver A questão é: é possível ter as duas coi- bilidade nem de puxar o debate, de ma- rem. Tsipras tinha chegado a fazer apro- nacionais e internacionais, como Radical Phi-
como diferentes atores reagem, obser- sas ao mesmo tempo? A maioria da po- neira a forjar um novo consenso social ximações com a Rússia, mas ou estas A melhor opção para a Grécia losophy, Mute, Le Monde Diplomatique, Serrote,
var que novos alinhamentos ocorrerão. pulação acreditou ou quis acreditar nis- que lhes assegurasse um mandato mais conversas não avançaram, ou eram ape- seria abandonar o Euro? The Guardian e Al Jazeera. Como organizador
Por isto, não tomaria o tamanho relati- to, e a direção do Syriza também. Este é claro (e viável), nem de preparar-se para nas um gesto para fortalecê-lo diante da Esta dívida é imoral, porque é essen- e educador popular, participou de diferentes
vamente pequeno dos protestos de 15 e um dos motivos pelos quais Tsipras se- a possibilidade real de um Grexit. Europa. Como revelou Yannis Varou- cialmente uma dívida de bancos recicla- iniciativas ativistas, como as primeiras edições
22/07 (quando da votação dos dois pa- gue sendo popular: se errou ou se ilu- Na prática, isto implicou colocar-se fakis, logo depois do referendo ele pro- da como dívida soberana, mas é, sobre- do Fórum Social Mundial e a campanha Justice
cotes) como nada definitivo. diu, seu erro e ilusão foram os mesmos numa posição em que, na hora H, eles pôs um plano, mas a maioria do “peque- tudo, impagável, porque não há mais o for Cleaners, em Londres. Além disso, foi mem-
O novo memorando pode se demons- de quase todo mundo. Uma amiga gre- seriam obrigados a optar pelo Euro ao no gabinete” de Tsipras preferiu a outra que extrair de uma economia enfrentan- bro do coletivo editorial de Turbulence, uma
trar impossível de aplicar, e aí ou te- ga contou-me que, logo após a eleição, invés do fim da austeridade – optar pe- opção – entre outras razões, porque já do a recessão mais longa num país de- revista influente entre os movimentos sociais
remos uma negociação de verdade, ou os mais velhos falavam dele como se lo Euro a qualquer custo, como foi o ca- era tarde demais. senvolvido desde a Grande Depressão. da Europa e da América do Norte na segunda
um Grexit acordado, ou um “Grexit me- fosse um filho. Ao mesmo tempo, isto so. Por quê? Porque para poder jogar É por isso que, já no dia seguinte ao Acontece, porém, que a Eurozona metade da década passada.
diante insurreição”, como mesmo vo- sempre foi acompanhado de uma certa com tudo, eles precisariam jogar com referendo, Tsipras começa a dar sinais O ministro das finanças alemão Wolfgang Schäuble tal como é hoje jamais permitiria que
16 de 30 de julho a 5 de agosto de 2015 internacional
Janaina Cesar
enviada especial a Bolzano (Itália)
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