Emprad Inovação No Setor Da Construção Civil Cearense - Rev
Emprad Inovação No Setor Da Construção Civil Cearense - Rev
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Resumo
A Inovação é geralmente percebida por meio do sucesso dos seus resultados, tendo estreita
relação com a competitividade, por um lado, e com a novidade e a satisfação do cliente, por
outro. Com o intuito de se compreender melhor este fenômeno no âmbito da construção civil,
este relato tem o objetivo de descrever as percepções sobre inovação no setor. Por meio de uma
pesquisa qualitativa, envolvendo entrevistas semiestruturadas junto a atores relevantes na
cadeia produtiva do setor – empresários e gestores de empresas construtoras e
arquitetos/projetistas – e posterior análise textual, verificou-se que a inovação na construção
civil, de maneira geral, ocorre de maneira incremental, focada no aperfeiçoamento de novas
técnicas construtivas com o objetivo de aumento de produtividade/economia de custos. Quanto
a outras categorias específicas de inovação no setor, voltadas a processos internos e negócios e
mercadológicas, ainda há grande lacuna a ser preenchida. Como contribuição, o relato sugere a
necessidade de integração entre empresários/gestores, arquitetos e clientes para que a inovação
seja obtida no sentido de gerar valor ao cliente.
1 Introdução
2 Revisão da Literatura
Para o setor da construção civil, a inovação pode ser definida como o conjunto das
atividades as quais resultam em novos produtos e/ou processos ou, ainda, nas melhorias
substanciais dos produtos e/ou processos já existentes.
O Manual de Oslo (OCDE, 2005) ao falar especificamente sobre as empresas do setor
da construção civil, afirma que:
O conhecimento científico e a capacidade em engenharia são sustentáculos
primários da inovação comercial. Na maioria dos países, eles residem, e
passam por desenvolvimento adicional, em instituições de ciência e tecnologia
do setor público. (p. 38).
O Manual reforça a ideia de que as empresas da construção civil são importantes fontes
de inovação, requerendo, assim, tão somente da abordagem adequada para trazer mais
progresso e benefícios à sociedade. Nesse sentido, a distinção entre inovação técnica e inovação
organizacional, uma vez que a primeira é altamente influenciada pela forma com a qual a
economia e a empresa estão organizadas e porque o treinamento e a mudança organizacional
são pré-requisitos importantes para transformar a inovação técnica em economia de resultados
(Lundvall, 2007).
Segundo Winch (1998) a indústria da construção possuía alto potencial para melhoria
no desempenho da taxa de inovação, apesar da discussão sobre a pertinência das medidas
tradicionais de inovação às características da construção. Uma dessas características é a
natureza interorganizacional do setor, que por si só já se configura como fonte de análise das
condições para a inovação. Contudo, em vários países é observado que a indústria da construção
obtém baixas despesas com P&D – o que caracteriza o nível de inovação preponderantemente
incremental – e que poucas empresas de construção aproveitam programas de P&D ou de
inovação oferecidos pelos governos (Miozzo & Dewick, 2002; Seaden & Manseau, 2010;
Carvalho, Silva, Carvalho, Cavalcante & Cruz, 2017). Além disso, Winch (2003) acrescenta
que o padrão das classificações industriais categoriza as partes mais inovadoras da construção,
ou seja, o design e o desenvolvimento de produto como “outros serviços empresariais” e não
como construção.
3
As empresas de construção dependem da interação com outros atores para
desenvolverem e implementarem novas soluções. De acordo com Blayse e Manley (2004), os
clientes são frequentemente receptores de novas soluções, mas, se não souberem sobre o
encaixe destas, no contexto do usuário, torna-se difícil a implementação de novas soluções e a
capacidade em se criar benefícios econômicos.
Nesse contexto, empresas de manufatura são fontes-chave de inovação, pois podem
fornecer e, também, desenvolver novas soluções para que as empresas da construção civil
possam utilizar. As empresas de fabricação, como as de revestimentos e instalações prediais,
por exemplo, muitas vezes, operam de forma mais estável, o que significa que elas podem
manter programas de P&D, aprendendo com as experiências para, em seguida, criarem bases
de conhecimento que facilitem a inovação. Assim, a inovação é influenciada pelas relações
entre indivíduos e empresas dentro da indústria e entre a indústria e entidades externas a ela.
Outro ponto importante está na relação entre os “promotores de inovação”, tais como
instituições profissionais, universidades e entidades de pesquisa e o setor da construção civil
(Blayse, & Manley, 2004). Contudo, estas fontes externas de inovação são geralmente
consideradas, pela indústria da construção, como sendo pouco relevantes (Bygballe, &
Ingemansson, 2011).
Fearne e Fowler (2006) argumentam que para melhorar o desempenho da construção,
uma mudança fundamental na gestão de relacionamentos entre clientes, de contratados e de
subcontratados é necessária. Integração da cadeia de suprimentos (Bankvall et al. 2010) e
parceria (Bygballe, Jahre, & Swärd, 2010) foram sugeridas, mesmo que as raízes profundas das
atitudes na indústria sejam consideradas difíceis de mudar (Bresnen, & Marshall, 2000). No
contexto brasileiro, trata-se de uma importante questão, uma vez que a indústria da construção
civil brasileira ainda dispõe de mão de obra barata em comparação a outros países associada a
tecnologias razoavelmente tradicionais.
Usualmente, a inovação depende de relações de longo prazo entre produtores e usuários
(Harrison, & Waluszewski, 2008). O foco no preço e a cultura para oferta competitiva resultam
numa mudança constante na variedade de atores em diferentes projetos de construção. Isso
dificulta a continuidade e os desenvolvimentos em longo prazo, resultando em "conexões
soltas" entre os atores da construção e uma incapacidade de criar efeitos de rede para melhorar
a produtividade e a inovação (Dubois, & Gadde, 2002).
Vale ainda ressaltar que, mesmo com as “conexões soltas”, a indústria da construção,
historicamente, continuou obtendo lucros, fato que pode inibir melhorias por parte dos
construtores em uma forma diferente de pensar.
3 Metodologia
A pesquisa de que trata este relato parte de uma epistemologia fenomenológica, filosofia
do conhecimento que enfatiza a importância dos fenômenos em si mesmos e em sua plenitude. Tendo
em vista a pergunta de pesquisa e do respectivo objetivo de investigação, esta pesquisa é
caracterizada como descritiva e de abordagem qualitativa segundo as considerações de Gil
(2002). A pesquisa descritiva
[...] tem como objetivo primordial a descrição das características de
determinada população ou fenômeno ou, então, o estabelecimento de relações
entre variáveis. São inúmeros os estudos que podem ser classificados sob este
título e uma de suas características mais significativas está na utilização de
técnicas padronizadas de coleta de dados, tais como o questionário e a
observação sistemática. (GIL, 2002, p.42)
Como estratégia de coleta de dados utilizou-se de entrevistas semiestruturadas e um
breve questionário, tendo-se como sujeitos empresários e gestores de empresas de construção
4
civil e arquitetos/projetistas atuantes na cidade de Fortaleza, Ceará. A seleção dos respondentes
teve como critério o vínculo a empresas de construção que produzem unidades residenciais de
médio e alto padrão na referida cidade (Tabela 1). A pesquisa envolveu empresários e gestores
de onze empresas.
Tabela 1: Perfil das empresas com as quais os sujeitos (empresários e gestores) possuem
vínculo profissional
VGV anual
Número de
Ano de Número de (estimado)
projetos
fundação empregados (em R$
residenciais
1.000,00)
1 1984 450 40000 47
2 1977 600 90000 21
3 1986 220 180000 128
4 2003 400 150000 13
5 1978 200 50000 45
6 1974 500 80000 200
7 1985 800 200000 100
8 1979 160 200000 37
9 2008 1100 200000 20
10 1999 100 50000 10
11 1983 900 400000 150
5
Quanto ao roteiro de entrevistas, este abordou um conjunto de sete categorias de
inovação comentados pelos sujeitos e baseadas no Manual de Oslo (OCDE, 2005) e em Kahn
(2018): (a) inovação tecnológica, (b) inovação de produto, (c) inovação em serviço, (d)
inovação em processo, (e) inovação em marketing, (f) inovação organizacional, (6) inovação
em modelo de gestão.
O período de realização e gravação das entrevistas se deu em múltiplas datas entre os
meses de março, abril e no início de maio de 2018 e foram realizadas pessoalmente. As
entrevistas geraram um total de 388 minutos de gravação. Para a análise dos dados
qualitativos extraídos das entrevistas, procedeu-se à análise de conteúdo por meio do software
NVivo 12.
4 Análise de Resultados
Dentro da Análise de Conteúdo, a seguir, categorias foram geradas para cada tipo de
inovação e, na maioria dos casos, a quantidade de categorias foram reduzidas a fim de evitar
redundâncias desnecessárias.
6
Por último, salienta-se a questão do risco, revelado pelo receio de se investir em
inovações que venham a ter baixa aceitação, principalmente, num cenário de crise e retração.
Este último item complementa a ideia da dificuldade de se inovar no setor, principalmente, em
Fortaleza.
O item “inovação em processo” gerou sete categorias iniciais reduzidas a seis que
refletem invariavelmente um entendimento sobre melhorias de processos construtivos
(categoria SIG, gestão e aperfeiçoamento de processos) sempre focando em qualidade e
eficiência operacional (Tabela 6). No entanto, sabe-se que eficiência operacional e processos
de melhoria contínua não necessariamente são considerados inovações. Isso quer dizer que,
8
ainda, não há um entendimento profundo sobre o que é realmente o conceito de inovação, neste
caso.
9
Marketing digital 2 7 9
Marketing vs Substância 1 0 1
Mimetismo 1 0 1
Total 5 19 24
Quanto a inovação organizacional, cinco categorias foram geradas (Tabela 8), uma delas
mencionando compliance que, segundo um dos entrevistados, até recentemente era algo
desconhecido pelas empresas, mas crescentemente adotada desde o fim dos anos 2010.
10
processos do poder público, notadamente, pela Prefeitura de Fortaleza, na pasta de urbanismo
e meio ambiente, ponto positivo levantado pelos construtores.
Destaca-se também o aspecto “estrutura organizacional e tomada de decisão”,
mencionado por ambos os grupos. O grupo de arquitetos revela a importância de que a alta
direção esteja diretamente envolvida na tomada de decisão para que projetos inovadores possam
acontecer.
Quem tem tentado inovar [...] não tem se dado muito bem porque a questão
básica de tudo isso se chama decisão. E as pessoas que estão à frente e tomam
decisão e marcam, pautam o que querem, são muito mais fáceis de trabalhar
do que termos imensas estruturas técnicas onde têm muitas pessoas que sabem
de tudo, mas não há quem decida (Sujeito 5).
Já os empresários/gestores, acerca dessa categoria, mencionam a questão da crise
econômica e da necessidade de reestruturação de diversos setores, com menos trabalhadores,
“forçando” uma reorganização. Outro ponto importante, é a busca por uma forma de
profissionalizar as empresas de construção que, em sua maioria, são de estrutura familiar.
Também é revelada a importância da implantação da gestão à vista com a menor
departamentalização possível.
Sobre inovação em modelo de gestão, foram formadas seis categorias inicialmente, mas
reduzidas para duas (Tabela 9).
Mas se as cabeças que lideram não entendem que isso serve para dar um
resultado no fim da obra, não serve pra nada. A construtora onde eu trabalhava
tentou implementar, mas nunca se chegou a um fim. Se o dono não estiver
convencido, não adianta (Sujeito 13)
A partir das considerações expostas nesta seção, são tecidas conclusões na seção
seguinte.
11
5 Conclusão
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Referências
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O Mapa das Construtechs e Proptechs é disponibilizado pela Terracotta Ventures, uma empresa de venture capital
que busca investir em startups nos setores da construção civil e imobiliário. O mapa de Construtechs e Proptechs
se tornou a maior cobertura do ecossistema de startups do segmento no Brasil.. Disponível em
https://www.terracotta.ventures/mapa-de-startups-2021 Acesso em 09/11/2021.
ii
Residência equipada com computação e tecnologia da informação que antecipa e responde às necessidades de
seus ocupantes, operando para promover seu conforto, conveniência, segurança e entretenimento via gestão da
tecnologia dentro de casa e conexões com o exterior (Aldrich, 2003).
iii
Em 1990 foi editada pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) a primeira
edição do Manual de Oslo - Proposta de Diretrizes para Coleta e Interpretação de Dados sobre Inovação
Tecnológica, que tem como objetivo orientar e padronizar conceitos, metodologias e construção de estatísticas e
indicadores de pesquisa de P&D (Pesquisa e Desenvolvimento) de países industrializados.
iv
O Inovacon (Programa de Inovação da Indústria da Construção Civil) apoiado pela Coopercon-CE e Sinduscon-
CE é um evento em que gestores da construção civil se encontram para a troca de experiências, levantando as
melhores práticas que abrangem diferentes domínios do gerenciamento da construção, agrupadas em três
categorias: projeto, planejamento e controle de construção, logística, processos e sistemas construtivos.
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