Introducao A Astronomia

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Sérgio Mascarello Bisch

Universidade Aberta do Brasil Física


Universidade Federal do Espírito Santo
Licenciatura
A Astronomia é a mais antiga das ci-
ências e, ao mesmo tempo, uma das
mais atuais e desafiadoras, despertan-
do fascínio, curiosidade e interesse dos
estudantes e público em geral. Isso faz
com que ela seja uma excelente porta
de entrada para uma iniciação à Ciência,
encerrando um enorme potencial didáti-
co-pedagógico. Contudo, fazer uma boa
exploração desse potencial não é algo
trivial, exigindo do professor um domí-
nio de conteúdos, que também não são
triviais, e de estratégias e metodologias
de ensino adequadas a uma introdução
a essa fascinante ciência.

O presente texto visa dar subsídios nes-


se sentido, abordando dois dos grandes
temas básicos da Astronomia, ligados às
suas origens: o estudo dos movimentos
dos astros, quando observados da super-
fície da Terra, e do Sistema Solar, sua
estrutura e composição. A apresentação
do conteúdo é acompanhada da indica-
ção da utilização de TICs no ensino e
segue uma estratégia que usa como fio
condutor uma exploração gradual do
espaço, a partir de nosso lar – a espaço-
nave Terra.
UNIVERSIDADE F EDER AL DO ESPÍR I TO SAN TO
Núcleo de Educação Aberta e a Distância

Introdução à
Astronomia
Sérgio Mascarello Bisch

Vitória
2012
U NI V E R S ID A D E F E D E RA L D O E S P Í RI TO S A N TO

Presidente da República Reitor Diretor do Centro de Ciências Exatas


Dilma Rousseff Reinaldo Centoducatte Armando Biondo Filho

Ministro da Educação Diretora Geral do Núcleo de Educação Coordenador do Curso de Graduação


Aloizio Mercadante Aberta e a Distância - ne@ad Licenciatura em Física - EAD/UFES
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Diretoria de Educação a Distância
DED/CAPES/MEC Coordenadora UAB da UFES Revisor de Conteúdo
João Carlos Teatini de Souza Climaco Teresa Cristina Janes Carneiro Carlos Augusto Cardoso Passos

Coordenadora Adjunta UAB da UFES Design Gráfico


Maria José Campos Rodrigues LDI - Laboratório de Design Instrucional

Diretora Administrativa do ne@ad ne@ad


Maria José Campos Rodrigues Av. Fernando Ferrari, n. 514 -
CEP 29075-910, Goiabeiras
Diretor Pedagógico do ne@ad Vitória - ES
Júlio Francelino Ferreira Filho (27) 4009-2208

Dados Internacionais de Catalogação-na-publicação (CIP)


(Biblioteca Central da Universidade Federal do Espírito Santo, ES, Brasil)


Laboratório de Design Instrucional Bisch, Sérgio Mascarello.
LDI coordenação B621i    Introdução à astronomia / Sérgio Mascarello Bisch. - Vitória : UFES,
Heliana Pacheco Núcleo de Educação Aberta e a Distância, 2012.
José Octavio Lobo Name    112 p. : il. ; 28 cm
Letícia Pedruzzi
Ricardo Esteves   Inclui bibliografia.
  ISBN: 978-85-60312-65-8
Gerência
Daniel Dutra
   11. Astronomia. I. Título.
Editoração
Heinrich Kohler
CDU: 52
Capa
Heinrich Kohler
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Impressão comerciais, desde que atribuam ao autor o devido crédito e que licenciem as novas criações
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indicando-se o nome do autor e a origem da obra). Toda reprodução foi realizada com amparo legal do regime geral de
direito de autor no Brasil.
Índice

Introdução------------------------------------------------------------------------ 6

Capítulo I: Os Movimentos dos Astros e a Astronomia de Posição ----- 8

1.1 Movimentos dos astros: qual a sua importância?------------------------------ 9

1.2 Localização dos Astros no Céu: a Astronomia de Posição e a Esfera Celeste----12


1.2.1 A Esfera Celeste e as Constelações--------------------------------------13
1.2.1.1 As Origens--------------------------------------------------------13
1.2.1.2 As estrelas de fato são fixas?-------------------------------------16
1.2.1.3 Os conceitos atuais de esfera celeste e constelação---------------19
1.2.2 Sistemas de referência--------------------------------------------------24
1.2.2.1 O Referencial Horizontal Local-----------------------------------24
1.2.2.2 O Referencial Equatorial------------------------------------------26

1.3 Os movimentos dos astros quando observados da Terra----------------------27


1.3.1 Instalando e inicializando o Stellarium-------------------------------- 28
1.3.2 Movimento das estrelas------------------------------------------------ 31
1.3.3 O Céu em diferentes locais---------------------------------------------34
1.3.4 Movimentos do Sol-----------------------------------------------------37
1.3.5 Movimentos da Lua ----------------------------------------------------42
1.3.6 Movimentos dos planetas----------------------------------------------46

1.4 Atividades Complementares--------------------------------------------------55


1.4.1 Atividades propostas no capítulo 2 do livro “O Céu”-------------------55
1.4.2 Oficinas de Astronomia------------------------------------------------56
1.4.3 Eclipses: mais uma atividade com o Stellarium------------------------ 57
1.4.3.1 Geometria dos eclipses--------------------------------------------57
1.4.3.2 A visibilidade dos eclipses----------------------------------------59
1.4.3.3 Aspecto da Lua durante um eclipse.------------------------------60

1.5 Questões----------------------------------------------------------------------68

Capítulo II: O Sistema Solar --------------------------------------- 73

2.1 O que é o sistema solar?------------------------------------------------------74

2.2 Como são classificados os astros do sistema solar?---------------------------77

Introdução à Astronomia 3
2.3 De que são feitos os astros do sistema solar?--------------------------------- 81

2.4 O Sol-------------------------------------------------------------------------83

2.5 O Sistema Solar Interior------------------------------------------------------86


2.5.1 Os Planetas Terrestres--------------------------------------------------86
2.5.2 Os Asteróides-----------------------------------------------------------87
2.5.3 O sistema solar interior e a formação do sistema solar-----------------89
2.5.4 A Terra e a Lua: uma comparação-------------------------------------- 91

2.6 O sistema Solar Exterior------------------------------------------------------94


2.6.1 Os planetas gigantes----------------------------------------------------95
2.6.2. Cometas---------------------------------------------------------------97
2.6.3 Centauros-------------------------------------------------------------100

2.7 Região Transnetuniana------------------------------------------------------102


2.7.1. Cinturão de Kuiper----------------------------------------------------103
2.7.2. Disco Disperso--------------------------------------------------------103
2.7.3 A Nuvem de Oort------------------------------------------------------104
2.7.4 Sedna-----------------------------------------------------------------105

2.8 Atividades Complementares-------------------------------------------------107


2.8.1 Montagem de um sistema solar em escala.----------------------------107
2.8.2 Uso do softwares para exploração do sistema solar--------------------107

Referências----------------------------------------------------------------------108

4 Introdução à Astronomia
Introdução à Astronomia 5
Introdução

É notório o fascínio e curiosidade que a Astronomia costuma despertar entre os es-


tudantes e junto ao público, de uma forma geral. Esse fato, por um lado, pode tornar
o seu ensino altamente estimulante e motivador, fazendo com que a Astronomia seja
uma excelente porta de entrada para uma iniciação à Ciência. Por outro lado, também
coloca o professor frente a um grande desafio: a Astronomia é uma área vasta e mui-
to dinâmica, está na fronteira do conhecimento, apresenta avanços e novidades que
se sucedem a cada dia, muitas delas noticiadas pela grande mídia, causando grande
curiosidade junto aos estudantes e público em geral, e mesmo fenômenos astronômi-
cos mais básicos, como as estações do ano, ou os movimentos aparentes dos astros
quando observados da superfície da Terra, não apresentam explicações triviais, ao
contrário, em geral envolvem um raciocínio espacial e físico mais elaborado. Estaria
o professor da Educação Básica preparado, com um razoável domínio de conteúdos
dessa área, para aproveitar o grande potencial didático-pedagógico da Astronomia e
atender à demanda de curiosidade e interesse por ela despertado? Infelizmente, em ge-
ral, a resposta a esta pergunta é negativa. Via de regra, em nosso país, o professor não
passou por uma formação inicial adequada e não tem o domínio de conteúdos básicos
nessa área. É importante lembrar, também, que a grande referência em se tratando de
Astronomia e esclarecimento de dúvidas a ela relacionadas, numa escola da Educação
Básica, é o professor de Física, uma vez que as duas ciências tem estreita relação e a
compreensão dos fenômenos astronômicos ocorre, invariavelmente, mediante aplica-
ções de leis e princípios físicos. Esse fato reforça a responsabilidade do licenciado em
Física, quando o assunto é o ensino de Astronomia na Educação Básica.

As considerações acima já constituem uma boa justificativa para a presença da dis-


ciplina “Introdução à Astronomia” no currículo do curso de Licenciatura em Física a
Distância da UFES, mas há outras, como a tradicional presença do tópico “Gravitação”
no currículo de Física do Ensino Médio, que guarda estreitíssima relação com a As-
tronomia. Como é dito nas “Orientações Curriculares para o Ensino Médio” publicadas
pelo MEC: “O estudo da gravitação é uma excelente oportunidade para discutir temas
da astronomia em seus aspectos físicos, históricos e filosóficos.” (BRASIL, 2006, p. 56);
mais que isso, nessas mesmas “Orientações Curriculares”, que correspondem à orien-
tação oficial de como deve ser conduzido o ensino médio em nosso país, é destacada
a importância de adoção, no ensino de Física deste nível, de “... temas estruturadores
que articulam competências e conteúdos e apontam para novas práticas pedagógicas.”
(BRASIL, 2006, p. 57), sendo que um dos seis temas estruturadores sugeridos é: “Tema
6: Universo, Terra e vida (unidades temáticas: Terra e sistema solar, o universo e sua
origem, compreensão humana do universo).” (BRASIL, 2006, p. 57).

6 Introdução à Astronomia
Desta forma, percebemos que é extremamente pertinente e adequada a inclusão de
uma disciplina de introdução à Astronomia no currículo de cursos de licenciatura em
Física, como forma de propiciar ao licenciando uma formação básica que lhe permita
um domínio mínimo de conteúdos de Astronomia, e/ou outros conteúdos a ela asso-
ciados, bem como o uso de boas referências, bibliográficas e da internet, que sirvam
como fontes confiáveis e atuais para pesquisas, aprofundamentos de estudos e atuali-
zação acerca das novidades e avanços na área – e eles não faltam, pelo contrário: com
o avanço das tecnologias de exploração do espaço, tanto baseadas em observatórios
situados na superfície da Terra, como em observatórios e telescópios espaciais, novas
descobertas, como a de inúmeros planetas extra-solares, vêm se sucedendo num ritmo
cada vez mais intenso. .

A intenção da disciplina, e deste texto que a acompanha, é, portanto, contribuir para


uma boa formação básica em Astronomia do futuro professor de Física do Ensino Mé-
dio, bem como lhe indicar o “caminho das pedras” para o necessário aprofundamento
e atualização de conteúdos, ou seja, para uma boa formação contínua – essencial ao
seu bom desempenho profissional como professor – mediante o contato e acesso a
boas referências, bibliográficas e na internet. Essa orientação é essencial, consideran-
do o excesso de informações ao dispor atualmente, sobretudo na internet.

Ao longo do texto e, sobretudo, ao final do capítulo I são apresentadas diversas ques-


tões e sugestões de atividades, algumas delas utilizando o software livre Stellarium,
ou envolvendo a pesquisa ou consulta a alguns dos ótimos websites sobre Astronomia
disponíveis na web. A ênfase no uso destas novas ferramentas é proposital, dada a sua
crescente relevância no ensino e a motivação adicional que proporcionam aos jovens
estudantes, sem falar na atualidade das informações que podem ser obtidas mediante
seu uso. Esperamos que, com estas sugestões, o futuro professor torne-se familiarizado
com esses recursos e os utilize com seus próprios alunos.

Introdução à Astronomia 7
Os Movimentos dos Astros
e a Astronomia de Posição

8 Introdução à Astronomia
1.1 Movimentos dos astros: qual a sua importância?

Um dos fatos mais significantes para nós, humanos, relacionado ao


céu e aos astros, é a existência de ciclos e regularidades em seus
movimentos. De fato, esses ciclos, como o movimento diário do Sol,
nascendo a leste e se pondo a oeste, as estações do ano e as fases da
Lua, determinam o próprio ritmo de nossas vidas e dos demais seres
vivos na Terra, servindo de base a todos os calendários já inventados
pelos diversos povos e culturas.

A busca de explicação para os movimentos dos astros, especialmen-


te, como veremos, dos chamados “astros errantes” – o Sol, a Lua e
os cinco planetas visíveis a olho nu: Mercúrio, Vênus, Marte, Júpiter
e Saturno – desafiou a inteligência humana durante séculos, consis-
tindo numa das mais importantes e fascinantes páginas da história
da Ciência. Ela esteve na raiz da revolução científica ocorrida nos
séculos XVI e XVII, quando houve a passagem de uma concepção
geocêntrica para uma concepção heliocêntrica de universo, com a
Terra deixando de ser encarada como o centro do universo e pas-
sando a ser apenas mais um dos planetas, dentre vários, que giram
ao redor do Sol. Essa grande mudança de visão ocorreu graças às
contribuições de diversos cientistas, como Copérnico, Tycho Brahe,
Kepler, Galileu e Newton.

Após Newton, suas leis gerais do movimento e sua lei da gravita-


ção universal, a descrição e previsão dos movimentos dos astros
do sistema solar tornou-se bastante satisfatória. Mais recentemente,
no início do século XX, graças à contribuição de Einstein, com sua
Teoria da Relatividade, foi possível refinar ainda mais o modelo ex-
plicativo dos movimentos dos astros de nosso sistema solar. Uma
previsão detalhada e precisa, por exemplo, do movimento de Mercú-
rio – o mais próximo do Sol e mais rápido dos planetas – tornou-se
ainda mais exata¹.

No âmbito de nosso sistema solar, podemos dizer que nossa compre-


ensão atual dos movimentos dos corpos que o compõem, seja por

¹ O movimento de precessão do periélio de Mercúrio, que apresentava des-


vios com relação ao que era previsto pelo Mecânica Clássica, é bem expli-
cado pela Relatividade Geral.

Os Movimentos dos Astros e a Astronomia de Posição 9


meio da Mecânica Clássica ou, quando necessário, da Relatividade
Geral, é muito satisfatória, levando a previsões em excelente acordo
com o que é observado, isto é, perfeitamente dentro do limite de
precisão das medidas atualmente realizadas.

Entretanto, embora possamos nos orgulhar dessas conquistas, de


termos sido capazes de formular, por meio de belas teorias físicas,
como a Mecânica Clássica e a Relatividade, modelos que fornecem
uma descrição e previsão detalhada e muito precisa dos movimen-
tos dos astros do sistema solar, isso não é o fim. Na verdade é só o
começo. Nem tudo está bem explicado com relação ao movimen-
to dos astros. O universo vai muito além do nosso sistema solar...
Quando comparado à nossa galáxia, a Via Láctea, o nosso sistema
solar é como um minúsculo grão de poeira em meio a uma grande
nuvem de pó (nossa galáxia). A estimativa é de que, só na Via Lác-
tea, existam mais de 200 bilhões de estrelas, equivalentes ao nosso
Sol, grande parte delas possuindo seus próprios sistemas planetários,
conforme já comprovado por pesquisas recentes2, e em todo o uni-
verso existem centenas de bilhões de galáxias!

Quando passamos a analisar o movimento dos astros em grande


escala, nos defrontamos com fatos surpreendentes e ainda sem ex-
plicação. De fato, a compreensão do movimento dos astros, e do pró-
prio universo, em grande escala continua a apresentar enormes pro-
blemas e desafios. Em verdade, apresenta o que parece ser o maior
de todos os desafios da Física atual: explicar o fato de o universo
não só estar em expansão, com todas as galáxias mais distantes se
afastando umas das outras, mas de a velocidade desta expansão es-
tar aumentando, ou seja, de a expansão ser uma expansão acelerada!

De fato, em 1998, dois grupos de cientistas, trabalhando de maneira


independente, analisando a explosão de estrelas supernovas do tipo
Ia em galáxias distantes, publicaram resultados de suas pesquisas
que levavam a uma conclusão surpreendente, até para os próprios
pesquisadores envolvidos: o universo se encontra em expansão ace-
lerada! Quando o esperado seria exatamente o contrário: pelo conhe-

2
Segundo dados do dia 28/02/2012, já há 760 planetas extra-solares com
descoberta confirmada (fonte: Enciclopédia dos Planetas Extra-Solares,
<http://exoplanet.eu/index.php>, acesso em 28 fev 2012).

10 Introdução à Astronomia
cimento que se tinha até então, devido à ação da gravidade – uma
força sempre atrativa, gerada pela massa dos objetos que compõe o
universo – era de se esperar que a expansão estivesse sendo freada,
não acelerada.

Dada a enorme importância e impacto dessa conclusão para o estudo


do universo como um todo e sua evolução – área da ciência deno-
minada Cosmologia –, obtida com forte base observacional, por dois
grupos independentes, os líderes destas duas equipes foram laureados
com o Prêmio Nobel de Física no ano 2011 (NOBELPRIZE.ORG, 2011).

Atualmente, a interpretação predominante com relação a esse es-


pantoso resultado é de que há uma força repulsiva que atua em
grande escala no universo, que não só se opõe, mas está vencendo
a força atrativa da gravidade. Essa força repulsiva seria produzida
por uma chamada “energia escura” (dark energy, em inglês), a qual
constituiria a maior parte da matéria-energia de todo o universo, e
cuja natureza ainda é totalmente desconhecida...

Ainda há um longo caminho a se percorrer até se conseguir lançar


mais luz sobre essa questão. Essa descoberta surpreendente e seu
impacto mostram, por um lado, a importância da Astronomia, da
observação do céu, dos astros e de seus movimentos, e, por outro,
ilustram bem a natureza da própria Ciência: ela é um processo em
aberto, sempre sujeita a reformulações, mudanças de visão ou ver-
dadeiras revoluções no pensamento, sempre com base no método
científico, cujo critério máximo é a adequação da teoria à realidade
observada. Como é dito na nota publicada no site oficial do prêmio
Nobel, acerca da premiação em Física em 2011:

“The acceleration is thought to be driven by dark energy,


but what that dark energy is remains an enigma - perhaps
the greatest in physics today. What is known is that dark
energy constitutes about three quarters of the Universe.
Therefore the findings of the 2011 Nobel Laureates in Phy-
sics have helped to unveil a Universe that to a large extent
is unknown to science. And everything is possible again.”
(NOBELPRIZE.ORG, 2011)

Os Movimentos dos Astros e a Astronomia de Posição 11


1.2 Localização dos Astros no Céu: a Astronomia de
Posição e a Esfera Celeste

Como primeiro passo, antes de abordarmos a explicação dos ciclos


astronômicos básicos, que regem a vida na Terra, optamos por co-
meçar abordando como é feita a localização dos astros no céu, e, na
seção seguinte (I.3), quais são os principais movimentos que eles
apresentam quando observados da superfície da Terra, propondo a
realização de exercícios “práticos” (na verdade virtuais) com o ex-
celente software Stellarium, bem como observações diretas do céu.
Essa será uma abordagem mais intuitiva e sensível, que começará
ilustrando, por meio de visualizações, que movimentos dos astros
efetivamente podemos observar no céu, quando o olhamos da su-
perfície da Terra. Essa abordagem, que adota um referencial geocên-
trico, terá a grande vantagem de estimular um maior contato com o
céu/natureza, bem como dará uma idéia bem mais precisa do difícil
desafio que foi enfrentado (e vencido) pelos cientistas antigos e do
início da Idade Moderna, para desvendar a intrigante “dança” dos
astros, especialmente dos planetas, com seus misteriosos movimen-
tos retrógrados.

O tema da localização e descrição do movimento dos astros faz parte


de uma das mais tradicionais e importantes partes da Astronomia,
denominada “Astronomia de Posição” ou “Astrometria”. Conhe-
cimentos básicos de Astronomia de Posição são importantes para
quem utilizará atividades – fortemente recomendáveis – de reali-
zação de observações diretas do céu, ou de uso de um planetário
(mesmo que virtual3) para ensinar Astronomia.

Em Física aprendemos que todo o movimento sempre é relativo, ou


seja, depende do referencial em relação ao qual ele é observado. Para
a descrição dos movimentos dos astros no céu não é diferente. Será
imprescindível definirmos os referenciais que utilizaremos para a
localização e descrição dos movimentos dos astros. Para tanto intro-
duziremos, a seguir, dois dos sistemas de referência mais utilizados
em Astronomia: o sistema horizontal local e o sistema equatorial.
O primeiro baseado na superfície da Terra, o segundo, nas estrelas,
ou, mais precisamente, na esfera celeste, um dos conceitos mais im-

3
Podemos considerar o software Stellarium, como um planetário virtual.

12 Introdução à Astronomia
portantes da Astronomia de Posição, que apresentaremos a seguir,
juntamente com o também útil e histórico conceito de “constelação”,
usado no mapeamento do céu.

1.2.1 A Esfera Celeste e as Constelações

1.2.1.1 As Origens

O conceito de esfera celeste tem suas origens na Antiguidade: várias


civilizações concebiam a Terra como plana e recoberta por uma abó-
bada celeste, ou firmamento, no qual estavam situados os astros. Já
os gregos antigos, após Pitágoras, concebiam o universo como um
cosmos (universo ordenado) no qual, aos astros, estava associada a
forma geométrica mais perfeita e simétrica: a esfera. Segundo essa
concepção, a própria Terra seria esférica e estaria localizada no cen-
tro do universo (um universo geocêntrico). A Lua, o Sol e cada um
dos cinco planetas então conhecidos estariam localizados em esferas
concêntricas, encaixadas uma dentro da outra. A oitava esfera seria
a do firmamento, na qual se encontrariam fixas as estrelas e que
realizaria um movimento diário, de leste para oeste, em torno da
Terra, o que explicaria o nascer e ocaso diário dos astros (figura 1.1).

Figura 1.1: Concepção geocên-


trica de universo, com cada um
dos sete astros errantes (planetas)
associado a uma esfera. As es-
trelas ficariam situadas na oitava
esfera, a do firmamento.

Fonte:<http://commons.
wikimedia.org/wiki/
File:Ptolemaicsystem-small.png>.

Os Movimentos dos Astros e a Astronomia de Posição 13


Para os antigos gregos, essa esfera celeste não era nada fictícia,
ao contrário, eles acreditavam na existência, de fato, de uma cas-
ca esférica cristalina, sobre cuja superfície as estrelas estariam
incrustadas e presas em posições fixas. Essa noção foi a domi-
nante por vários séculos na cultura ocidental, e só começou a ser
suplantada em 1543, com a publicação do livro De revolutionibus
orbium coelestium (“Da revolução de esferas celestes”), de Nico-
lau Copérnico, onde, pela primeira vez em muitos séculos4, era
proposto um modelo heliocêntrico de universo.

O fato de as estrelas permanecerem fixas, umas em relação às


outras, foi também o que deu origem, na mais remota Antiguida-
de, à concepção de “constelação”, como sendo um agrupamento
de estrelas ao qual era associada alguma entidade mitológica.
Com efeito, o fato de as estrelas se manterem na mesma posição,
umas em relação às outras, é o que faz com que os agrupamentos
mantenham sempre o mesmo padrão e forma, permitindo que os
mesmos sejam reconhecidos e a eles associados sempre a mesma
figura mitológica. A posição da constelação com relação ao ho-
rizonte pode variar, mas sua forma se mantém a mesma (figura
1.2). A invenção das constelações ocorreu praticamente em todos
os povos e culturas, seja da antiguidade ou contemporâneos, com
cada povo associando aos agrupamentos algum objeto ou enti-
dade mitológica de importância em sua própria cultura5. Sua
utilidade prática, para todas as antigas culturas, foi enorme, pois
graças a elas foi possível fazer um mapeamento e reconhecimen-
to do céu, criando-se referências que permitem a orientação e a
identificação de ciclos astronômicos básicos, como a duração do
ano. O nascer helíaco das Plêiades, por exemplo, era e é usado

4
Aristarco de Samos, filósofo grego do século II a.C., já havia proposto um
modelo heliocêntrico de universo, contudo esta sua idéia teve pouca acei-
tação entre seus contemporâneos.

5
O tema das constelações concebidas em diversas culturas, antigas e mo-
dernas, é abordado dentro da grande área de estudos chamada Astronomia
Cultural e, mais especificamente, dentro das áreas da Arqueoastronomia e
Etnoastronomia. Com relação às constelações de culturas indígenas brasi-
leiras ver, p. ex., Afonso (acesso em 23 jan 2012, acesso em 20 fev 2012).

14 Introdução à Astronomia
por vários povos indígenas brasileiros para marcar o início de um
novo ano6.

Figura 1.2: Constelação do Cru-


zeiro do Sul observada em três
instantes de uma mesma noite.
De cima para baixo, às 19:30 h,
01:30 h e 04:30 h. A constelação
muda de posição em relação ao
horizonte, mas não de forma.

Fonte: software Stellarium,


www.stellarium.org.

6
Na cultura ocidental as Plêiades não são consideradas propriamente uma
constelação, mas um asterismo (grupo de estrelas que formam um padrão
facilmente reconhecível, dentro de uma mesma constelação, ou reunindo
estrelas de mais de uma constelação), fazendo elas parte da constelação do
Touro. Sobre o significado do nascer helíaco das Plêiades para os índios
brasileiros, veja o artigo de Afonso (acesso em 25 fev 2012).

Os Movimentos dos Astros e a Astronomia de Posição 15


1.2.1.2 As estrelas de fato são fixas?

Neste ponto, cabe fazer uma importante pergunta: afinal, por que os
antigos consideravam que as estrelas permaneciam fixas, umas em
relação às outras7? Será que, efetivamente, elas permanecem paradas
no espaço, umas em relação às outras? E se isso não fosse verdade e
elas se movessem, como se explicaria que as constelações não mu-
dam de forma, mesmo com o passar de séculos?

A resposta que esclarece estas questões reside exclusivamente no


seguinte ponto: nós humanos somos muito pequenos e efêmeros
frente ao universo. Como somos pequenos, a distância entre nossos
olhos também o é. Como é essa separação que nos permite uma vi-
são binocular, estereoscópica, com base na qual conseguimos avaliar
a distância aos objetos que estão a nossa volta, percebendo-os em
três dimensões, o fato de a separação entre nossos olhos ser pequena
(no máximo uns 10 cm) faz com que nossa visão tridimensional,
baseada nesta nossa visão binocular, só funcione bem até uma dis-
tância de uns poucos metros, ou, no máximo, de algumas dezenas
de metros. Além disso, nosso cérebro só consegue avaliar distâncias
usando outras referências, como o tamanho de objetos familiares,
que já foram vistos de perto, quando avistados ao longe. Mas no
caso dos astros, que referência familiar teríamos para poder avaliar
sua distância? A resposta é: nenhuma! Em consequência, usando
apenas o instrumento com que fomos naturalmente dotados – nos-
sos olhos – é impossível perceber a que distância se situam os astros
e a sua tridimensionalidade. Perdemos completamente nossa visão
3D quando olhamos para o céu. Somente usando nossa inteligência
e instrumentos é que, indiretamente, se torna possível determinar as
distâncias até os astros – o que, aliás, consiste num dos principais
problemas da Astronomia. Ao observar o céu a olho nu, nossa visão
se torna planificada, bidimensional, 2D: o Sol e a Lua nos pare-
cem discos, não esferas, e as estrelas, sem a noção de profundidade,
nos parecem estar todas situadas aproximadamente a uma mesma
distância, sobre uma abóbada celeste, cuja aparência é de uma su-
perfície curva que recobre a Terra. Isso explica porque os antigos
acreditavam que as estrelas estivessem todas situadas a uma mesma
distância, sobre a superfície interna de uma ampla esfera celeste.

7
Mas não em relação ao horizonte, conforme mostrado no figura 1.2.

16 Introdução à Astronomia
Muito bem, mas nossa questão principal era: por que as estrelas,
além de parecerem situadas a uma mesma distância, também pare-
cem fixas umas em relação às outras? Mais uma vez, o que explica
esta sensação é não apenas o nosso tamanho ínfimo, quando com-
parado à Terra, aos demais astros e suas distâncias, mas o tamanho
diminuto da própria Terra, bem como de sua órbita em torno do Sol,
quando comparado à imensa distância que nos separa das estrelas.
Em verdade, nada no universo está parado. Se usarmos como refe-
rência o Sol, todas as estrelas mais próximas movem-se, em relação
a ele, com uma velocidade da ordem de dezenas de quilômetros por
segundo. As mais distantes se movem a velocidades ainda maiores.
Por que então elas aparentam estar paradas? O que acontece é que,
devido à imensa distância a que estão situadas, mesmo que o des-
locamento que elas sofram, digamos em um ano, seja de alguns bi-
lhões de quilômetros, como a distância das estrelas, mesmo as mais
próximas, é da ordem de dezenas de trilhões de quilômetros8, em
termos de deslocamento angular, isso significará, no máximo, um
deslocamento de apenas alguns poucos segundos de arco por ano,
quando a estrela é observada da Terra9. Algo imperceptível a olho nu.
Ou seja, mesmo que a velocidade linear das estrelas em relação a nós
seja grande, seu afastamento de nós é tão grande que sua velocidade
angular, para um observador situado na Terra, é muito pequena, pra-
ticamente imperceptível a olho nu. Razão pela qual elas nos parecem
fixas, umas em relação às outras. É claro que, atualmente, com o uso
dos telescópios, o chamado “movimento próprio”, que é definido pe-
los astrônomos como o sendo o deslocamento angular por unidade
de tempo, na direção transversal à nossa linha de visada, geralmente
expresso em segundos de arco por ano, é perfeitamente perceptível
no caso das estrelas mais próximas. Porém, a olho nu, ele é imper-
ceptível, e é nesta nossa incapacidade de perceber pequeníssimos
deslocamentos angulares, consequência da imensa distância a que se
encontram as estrelas, que reside o fundamento para a crença de que
as estrelas permanecem fixas umas em relação às outras, ocupando,

8
Até alfa do Centauro, a estrela mais próxima de nós, a distância é de cerca
de 40 trilhões de quilômetros (4,3 anos-luz).

9
Supondo ainda que esse deslocamento seja na direção transversal à linha
de visada, pois se ele fosse na direção radial, não perceberíamos qualquer
deslocamento angular.

Os Movimentos dos Astros e a Astronomia de Posição 17


portanto, sempre a mesma posição no firmamento. Na verdade, essa
não deixa de ser uma ótima aproximação, principalmente para as
estrelas mais distantes. Em várias situações, sem maiores prejuízos,
podemos esquecer efeitos produzidos pelo movimento próprio das
estrelas e as considerarmos fixas.

Até aqui abordamos a questão da aparência de imobilidade das estre-


las, umas em relação às outras, considerando, sobretudo, as enormes
distâncias envolvidas, ou seja, considerando as dimensões espaciais.
Contudo, também é interessante analisarmos a questão sob o ponto
de vista do tempo. Conforme dissemos anteriormente, somos não só
muito pequenos, mas também muito efêmeros quando comparados
ao universo. Isto é, o tempo de uma vida humana, digamos cerca de
100 anos, não é nada em comparação com o tempo cósmico. Nosso
universo tem cerca de 14 bilhões de anos e o sistema solar e o plane-
ta Terra, cerca de 5 bilhões de anos. Comparada e estes valores, uma
vida humana é como um flash no tempo cósmico. A longo de uma
vida só conseguimos capturar um instantâneo do cosmos: todos os
astros mais distantes nos parecem parados. Se vivêssemos milênios,
em vez de, no máximo, um século, então poderíamos perceber, com
nossos próprios olhos, o movimento das estrelas e observar que as
próprias formas das constelações iriam se modificando com o passar
do tempo (figura 1.3).

Figura 1.3: Deslocamento


previsto para a estrela mais
próxima a nós, α do Centauro:
daqui a 4.000 anos ela deverá
se situar próxima à β do Cen-
tauro. A direita se vê a conste-
lação do Cruzeiro do Sul.

Fonte: <en.wikipedia.org/wiki/
File:Motion-of-Alpha-Cen.jpg>.

18 Introdução à Astronomia
1.2.1.3 Os conceitos atuais de esfera celeste e constelação

Por estranho que pareça, embora atualmente saibamos que uma es-
fera celeste cristalina, onde estariam incrustadas e fixas as estrelas,
como acreditavam os antigos, não existe, ela deu origem a uma
concepção puramente abstrata e conceitual, muito utilizada e impor-
tante na Astronomia de Posição. O conceito atual de esfera celeste é:

Esfera celeste: casca esférica fictícia, centrada na Terra, com raio


tendendo ao infinito, sobre cuja superfície podemos imaginar pro-
jetados todos os objetos celestes, em relação à qual as estrelas mais
distantes estão paradas, e cujo movimento, em relação à superfície
da Terra, corresponde ao movimento destas estrelas fixas (figura 1.4).

Figura 1.4: Representação


esquemática do conceito atual
de esfera celeste. Na figura ela
aparece com um raio pouco
maior que o da Terra, mas, por
definição, seu raio é muitíssimo
maior que o da Terra, tendendo
ao infinito, de tal modo que
nosso planeta e observado-
res situados em sua superfície
possam ser considerados como
pontos, localizados bem no cen-
tro da esfera celeste.

Fonte: <http://astro.if.ufrgs.br/
esf.htm>

Os Movimentos dos Astros e a Astronomia de Posição 19


A grande utilidade deste conceito, originado numa concepção ge-
ocêntrica de universo, é que, por meio de sua utilização, podemos
fazer a indicação precisa da posição dos astros no céu, quando ob-
servados da superfície Terra, referencial ao qual, inevitavelmente,
estamos presos (exceto no caso dos astronautas, quando estão no
espaço) e somos forçados a utilizar. Embora saibamos que a Terra
não é o centro do universo, ela é a nossa base de observação do uni-
verso. A indicação da posição dos astros é feita, então, por meio da
definição de algumas referências sobre a esfera celeste e de sistemas
de coordenadas nelas baseados, como veremos logo a seguir.

Será então possível localizar, precisamente, qualquer ponto sobre


ela, ou seja, qualquer ponto que apareça no céu, por meio da in-
trodução de duas coordenadas angulares, da mesma forma que o
fazemos quando definimos as coordenadas latitude e longitude e,
por meio delas, conseguimos indicar a posição de qualquer ponto
sobre a superfície do globo terrestre. De acordo com a definição,
o movimento da esfera celeste, com relação à superfície da Terra,
corresponde ao movimento descrito pelas estrela fixas. E qual é esse
movimento? Para responder a esta pergunta, vale a pena observar-
mos com atenção a imagem que aparece na figura 1.5.

Figura 1.5: Foto tirada com


uma câmera fotográfica apon-
tada para o céu junto ao hori-
zonte sul, a noite, mantendo seu
obturador aberto durante várias
horas. O que são os arcos lumi-
nosos circulares e concêntricos
registrados na foto? Que ponto
especial é aquele situado bem
no centro, em torno do qual as
luzes parecem girar?

Fonte: <www.aao.gov.au/ima-
ges/captions/aat006.html>.

20 Introdução à Astronomia
A imagem, tirada junto ao Siding Spring Observatory, na Austrália,
foi obtida a noite, deixando-se uma máquina fotográfica parada, so-
bre um tripé, apontando na direção sul e mantendo o seu obturador
aberto durante várias horas, captando a luz da paisagem para a qual
estava apontada, junto ao horizonte sul.

Podemos ver o perfil do observatório e algumas árvores, mas o que


aparece registrado no céu?... É a trajetória das estrelas em seu movi-
mento com relação ao horizonte sul! Que ponto misterioso é aquele
em torno do qual todos as estrelas parecem girar?... Vamos pensar
juntos: a máquina fotográfica permaneceu parada com relação ao
solo, em seu tripé, porém o solo permaneceu parado? Não! O solo
gira junto com a Terra em torno de seu eixo de rotação, no sentido
de oeste para leste, fazendo com que, em relação ao solo, as estrelas
aparentem girar no sentido contrário, descrevendo trajetórias circu-
lares no céu. O que aparece registrado na foto, portanto, nada mais
é do que o movimento que, em Astronomia, se costuma chamar de
“movimento aparente” das estrelas com relação ao horizonte, des-
crevendo uma rotação no sentido contrário ao da rotação da Terra.
Como, por definição, o movimento das estrelas é o movimento da
esfera celeste, também podemos dizer que o que está registrado no
céu desta foto é o movimento da esfera celeste. E o ponto em torno
do qual todas as estrelas giram, o que é?... Simplesmente correspon-
de ao ponto do céu para onde aponta o eixo de rotação da Terra,
ou seja, indica a direção em que está orientado o eixo de rotação
terrestre. Usando o conceito de esfera celeste, podemos dizer que ele
corresponde ao ponto em que o prolongamento do eixo de rotação
da Terra “fura” a esfera celeste. Ou que ele corresponde à projeção
de um dos pólos da Terra no céu, ou seja, na esfera celeste. Qual dos
pólos da Terra? Ora, se a foto foi tirada na Austrália, isso significa
que o observatório está situado no hemisfério sul da Terra. Portanto,
o pólo cuja projeção podemos visualizar no céu, a partir deste local,
corresponde ao pólo sul da Terra. Sua projeção no céu – aquele pon-
to misterioso ao qual nos referimos inicialmente – é então definido
como sendo o pólo sul celeste. Da mesma forma, o ponto da esfera
celeste que corresponde à projeção do pólo norte da Terra no céu
(ponto em que o prolongamento do eixo de rotação da Terra “fura”
a esfera celeste no extremo oposto, ao norte) é definido como sendo
o pólo norte celeste. De maneira semelhante, também é definido
o equador celeste como sendo a projeção do equador terrestre na

Os Movimentos dos Astros e a Astronomia de Posição 21


Figura 1.6: Foto tirada do mesmo
local e da mesma forma que a
apresentada na figura 1.5, mas
com a câmera voltada para o
horizonte norte.

Fonte: <www.aao.gov.au/images/
captions/misc018.html>.

esfera celeste, ficando situado a 90º dos pólos (veja figura 1.4). O
equador celeste divide a esfera celeste em dois hemisférios: o hemis-
fério celeste norte e o hemisférico celeste sul. Desta forma ficam de-
finidas referências na esfera celeste, a partir das quais será definido
o sistema equatorial de coordenadas celestes, que será precisamente
definido no item 1.2.2.2.

Na figura 1.6 apresentamos uma imagem obtida do mesmo local e


de maneira semelhante à da figura 1.5, mas com a câmera apontada
para o norte. Como era de se esperar, devido à rotação da esfera ce-
leste, novamente as estrelas deixam marcadas suas trajetórias circu-
lares em relação ao horizonte, só que agora o pólo norte celeste não
fica visível, mas está abaixo do horizonte, já que o local (Austrália)
está situado no hemisfério sul da Terra.

E quanto às tradicionais constelações, elas continuam sendo utilizadas


pelos astrônomos? Sim, e muito, de maneira semelhante aos antigos,
como um recurso para efetuar o mapeamento e reconhecimento do
céu, porém sem qualquer conotação mitológica ou mística, mas sendo
encaradas simplesmente como regiões bem definidas e delimitadas
da esfera celeste, cuja localização busca guardar correlação com as
tradicionais constelações da cultura ocidental. O conceito atualmente
utilizado pelos astrônomos é:

22 Introdução à Astronomia
Constelação: uma dada região da esfera celeste com limites bem defi-
nidos, sendo a posição dos limites indicada por meio de coordenadas
celestes (figura 1.7).

Em 1930 a União Astronômica Internacional (International Astro-


nomical Union) convencionou e delimitou precisamente as atuais
88 constelações oficiais utilizadas pelos astrônomos, cada uma delas
ocupando uma região bem definida da esfera celeste10. Toda a esfera
celeste foi “loteada” nestas 88 regiões. Qualquer estrela ou outro astro
no céu sempre estará localizado dentro de uma dada constelação

Figura 1.7: Constelação do Órion:


região do céu com limites bem
definidos, indicados por meio de
coordenadas celestes.

Fonte: <www.iau.org/static/pu-
blic/constellations/gif/ORI.gif>.

10
Veja a página da IAU indicada nas referências (IAU, acesso em 26 fev 2012).

Os Movimentos dos Astros e a Astronomia de Posição 23


1.2.2 Sistemas de referência

Indicar a posição no céu (esfera celeste) na verdade corresponde a


indicar a direção em que devemos olhar, ou apontar nosso telescó-
pio, para avistá-lo, sem entrar em consideração sobre qual seria sua
distância até nós. Pensando em termos de coordenadas esféricas, isso
significa não considerarmos a coordenada radial dessa sua posição.
Portanto, como basta apenas indicar a direção, sempre serão suficien-
tes duas coordenadas angulares. A seguir apresentamos e definimos
dois dos sistemas de referência mais utilizados em Astronomia – o
horizontal e o equatorial – e suas respectivas coordenadas angulares.

1.2.2.1 O Referencial Horizontal Local

O referencial horizontal local é um referencial fixo à superfície da


Terra, com origem no observador e que usa como referências bási-
cas a direção vertical e o plano do horizonte. A direção vertical é
definida como sendo a direção para a qual aponta um fio de prumo
colocado no local do observador. O plano do horizonte, por sua
vez, corresponde ao plano perpendicular à vertical e que passa pelos
olhos do observador. Caso o observador estivesse situado num local
com um horizonte ideal, totalmente desimpedido, como em alto-
mar, com mar calmo, ou numa imensa planície, o plano do horizonte
poderia também ser definido como o plano que contém a linha do
horizonte (BOCZKO, 1984).

O ponto sobre a cabeça do observador em que a vertical “fura” a


esfera celeste é denominado zênite. O ponto em que a vertical “fura”
a esfera celeste do lado oposto, sob os pés do observador, é denomi-
nado nadir. O plano do horizonte divide, portanto, a esfera celeste
em dois hemisférios: o zenital, com contém o zênite, e o nadiral, que
contém o nadir.

O plano que contém a vertical e a linha norte-sul é denominado plano


meridiano (figura 1.8). A circunferência formada pela intersecção des-
te plano com a esfera celeste é chamada de meridiano local. Qualquer
semi-plano delimitado pela vertical do local é denominado plano ver-
tical e a intersecção de um plano vertical com a esfera celeste define

24 Introdução à Astronomia
uma semi-circunferência denominada circunferência vertical, que de-
fine um semi-círculo chamado círculo vertical. (BOCZKO, 1984).

Figura 1.8: Sistema horizontal


local de referência e suas coorde-
nadas: azimute (A) e altura (h).

Fonte: <http://www.if.ufrgs.
br/oei/santiago/fis2005/livro_
v1.pdf>.

Uma vez apresentadas essas definições e referências, podemos defi-


nir as duas coordenadas angulares utilizadas para indicar a posição
de um astro neste referencial:

• Azimute (A): é o ângulo, medido em graus, contado sobre o


plano do horizonte, desde o norte, no sentido para o leste, até o
vertical do astro (figura 8).

• Altura (h): é o ângulo, medido em graus, contado sobre o plano


vertical do astro, desde o plano do horizonte até o astro, sendo
considerado positivo, quando o astro está acima do horizonte,
ou negativo, quando o astro está abaixo do horizonte. Em lugar
da altura (h), também pode ser utilizada a distância zenital (z),
que é o ângulo, medido sobre o vertical do astro, desde o zênite
até o astro (figura 1.8).

A enorme importância deste referencial local, geocêntrico, é que ele


corresponde ao referencial real a partir do qual efetivamente fa-
zemos nossas observações do céu. Num planetário também: o céu
projetado em sua cúpula corresponde, normalmente, a esse céu visto
da superfície da Terra, ou seja, a partir de um referencial local, que

Os Movimentos dos Astros e a Astronomia de Posição 25


pode estar situado em qualquer ponto da superfície da Terra, seja
próximo ao equador ou aos pólos, mas que sempre se acha preso à
sua superfície.

1.2.2.2 O Referencial Equatorial

O referencial equatorial é um referencial fixo na esfera celeste, ou


seja, nas estrelas, e tem como grande vantagem o fato de as coorde-
nadas das estrelas não variarem com o tempo (a menos que a estrela,
eventualmente, apresente um movimento próprio11 não desprezível).
Analogamente ao que é feito para indicação de posição na superfície
da Terra, por meio das coordenadas geográficas latitude e longitude,
definem-se, sobre a esfera celeste, paralelos celestes, que são linhas
de intersecção entre planos paralelos ao plano do equador e a esfera
celeste, e meridianos celestes, denominados círculos horários. Para
completar a analogia, é necessário definir qual meridiano desempe-
nhará um papel semelhante ao do Meridiano de Greenwich na Terra.
Para este fim é escolhido como referência o círculo horário que passa
pelo chamado ponto γ (gama), que é o ponto de intersecção entre o
equador celeste e a linha da eclíptica12 no qual o Sol cruza o equador
celeste movendo-se no sentido do sul para o norte.

Figura 1.9: Sistema equatorial de


referência e suas coordenadas:
ascensão reta (α) e declinação (δ).

Fonte: <http://www.if.ufrgs.
br/oei/santiago/fis2005/livro_
v1.pdf>.

11
Conforme definido no ítem 1.2.1.2.
12
A linha eclíptica corresponde à trajetória anual seguida pelo Sol na esfera
celeste, como veremos mais detalhadamente no item 1.3.4.

26 Introdução à Astronomia
Introduzidas essas definições, podemos definir as duas coordenadas
utilizadas no sistema equatorial:

• Ascensão reta (α): é o ângulo, tradicionalmente medido em horas


(24h = 360º), contado sobre o equador, desde o círculo horário
que passa pelo ponto γ até o círculo horário que passa pelo astro,
sendo a medida do ângulo feita no sentido anti-horário quando
vista desde o pólo norte (figura 1.9).

• Declinação (δ): é o ângulo, medido em graus, contado sobre o


círculo horário que passa pelo astro, desde o equador até o astro,
sendo positiva quando o astro está no hemisfério celeste norte,
e negativa quando ele está no hemisfério sul. De maneira equi-
valente, também é utilizada a distância polar (p), que é o ângulo
medido sobre o círculo horário do astro, desde o pólo norte ce-
leste, até o astro (figura 1.9).

1.3 Os movimentos dos astros quando observados da Terra

Nesta seção faremos uma descrição dos principais movimentos dos


astros quando observados da Terra. Conforme já salientamos, ela é
o nosso referencial natural, ao qual estamos inevitavelmente presos.
É a partir de sua superfície que, concretamente, observamos o uni-
verso. O céu é a nossa janela para o universo. Vamos então falar dos
principais movimentos que podemos observar quando olhamos atra-
vés desta janela da espaçonave Terra. Foi assim, a partir deste ponto
de vista geocêntrico e dos movimentos nele observados, e após mui-
ta reflexão, trabalho observacional cuidadoso, formulação e teste de
hipóteses, que os astrônomos dos séculos XVI e XVII foram capazes
de formular e sustentar o modelo heliocêntrico de universo, com os
planetas descrevendo órbitas elípticas com o Sol posicionado num
dos focos.

A seguir passamos a apresentar uma descrição do que podemos ob-


servar, a olho nu, no céu, acompanhada de sugestões de atividades a
serem realizadas utilizando o software Stellarium, que permitirá vi-
sualizar, de maneira bastante realista, o que se pode observar no céu.

Os Movimentos dos Astros e a Astronomia de Posição 27


1.3.1 Instalando e inicializando o Stellarium

Como primeira providência para realização das atividades que su-


geriremos a seguir, consiga um computador que tenha acesso à
internet, para baixar o programa, e que você possa continuar uti-
lizando durante o estudo. Baixe o software a partir de seu site ofi-
cial: <www.stellarium.org>. Existe, inclusive, uma tradução desta
página em português: <www.stellarium.org/pt>. Note que ele é um
programa multiplataforma. Baixe a versão compatível com o siste-
ma operacional instalado em seu computador (Windows, Mac OS
X ou Linux). Abra o arquivo executável e siga os passos indicados
para sua instalação.

Logo após completar a instalação, abra o programa. Note que ele


apresenta duas barras de menu, uma embaixo, outra na lateral es-
querda. Para que elas apareçam você deve mover o mouse até bem
embaixo, ou até bem a esquerda. Clique na opção “Localização”
(Location) do menu à esquerda, ou tecle F6, para abrir a janela de
localização, e situe a localidade em que você está (esta indicação
é fundamental, pois o céu visível muda de acordo com a posição
do observador na superfície da Terra). Se você estiver, p. ex., na
cidade de Vitória, você pode clicar diretamente na sua posição no
mapa-mundi que aparece nesta janela, ou procurar pelo nome da
cidade na lista à direita (Vitória, Brazil) e marcá-la, ou então entrar
diretamente com os valores das coordenadas geográficas latitude
e longitude do seu local de observação13 nos campos destinados a
isso, embaixo à esquerda. Note que, mesmo que você não more em
Vitória, mas numa localidade relativamente próxima a ela, como
em qualquer localidade do estado do Espírito Santo, não há pro-
blema que você escolha Vitória como localidade, pois o céu varia
pouco entre localidades relativamente próximas. Uma vez feita a
sua indicação, convém clicar na opção de usar essa localização
como default, no canto inferior esquerdo da janela de localização.
Feito isso, na próxima vez que abrir o programa, você já estará
posicionado na sua localidade.

13
No caso de Vitória, as coordenadas aproximadas são: latitude: 20º Sul (S);
longitude: 40º Oeste (W).

28 Introdução à Astronomia
Comece explorando as funções básicas do programa quanto ao
campo de visão e informações sobre os astros:

• Altere o campo de visão clicando com o botão esquerdo do


mouse em qualquer ponto da tela e arrastando, levando a visão
para a direção que você deseja, ou então usando as teclas com
as setas ↑↓→← para mover o campo de visão para cima ou
para baixo, para a direita ou para a esquerda.

• Use o botão de rolamento do seu mouse, as teclas Ctrl+↑ ou


Ctrl+↓, ou ainda Page Up/Down, para fazer zoom in/out e am-
pliar ou reduzir o campo de visão.

• Clique com o botão esquerdo do mouse em qualquer objeto que


estiver aparecendo. Ele ficará marcado e uma janela no alto à
esquerda é aberta com diversas informações sobre o mesmo,
como sua magnitude (brilho), coordenadas e distância à Terra.
Clicando com o botão direito do mouse em qualquer ponto
da tela o objeto é desmarcado e desaparece a janela com in-
formações. Sempre que quiser ter o campo de visão livre de
janelas, clique com o botão direito do mouse em qualquer
ponto fora das janelas. Eventuais janelas do menu que estive-
rem abertas ficarão transparentes.

• Se um objeto estiver marcado e você teclar a barra de espaço, o


campo de visão será centralizado no objeto, o que será bastante
útil se você desejar fazer, por exemplo, um zoom sobre ele.

• Você também pode fazer zoom in/out num objeto que já esteja
marcado usando, respectivamente, as teclas / e \. Experimente
fazer isso, p. ex., com a Lua ou com um planeta. Depois de
fazer zoom in num planeta, como Júpiter ou Saturno, que pos-
suem várias luas, também é interessante fazer zoom in sobre
uma de suas luas, para vê-la de perto. Experimente.

A seguir explore as opções básicas da barra de menu que fica em-


baixo, em especial a que coloca ou retira o efeito da atmosfera
(sem ela, mesmo de dia o céu seria negro e as estrelas, visíveis); a
que coloca e retira o solo (ao retirá-lo, você poderá ver astros que

Os Movimentos dos Astros e a Astronomia de Posição 29


estão abaixo do horizonte); as que colocam ou retiram os nomes,
as figuras mitológicas e as linhas indicativas das constelações e
as que inserem ou retiram as grades dos sistemas de coordenadas
equatorial e azimutal14.

Quanto ao ponto chave de domínio do tempo, quase tudo é possí-


vel nesse ambiente virtual, como o é nos planetários reais15:

• Você pode introduzir qualquer data e horário, para que o progra-


ma mostre o céu visível da sua localidade em qualquer ocasião
desejada, no passado, presente ou futuro, por meio da opção
disponível na barra de menu da esquerda, que abre uma janela
com data e hora, as quais podem ser alteradas à vontade.

• Há comandos para acelerar e retardar a passagem do tempo


na barra de menu que fica embaixo. A mesma coisa pode ser
feita, de maneira mais prática, apertando as teclas J, K e L: J
reduz a taxa de passagem do tempo, K faz o tempo passar à
sua taxa normal, L acelera a taxa de passagem do tempo. Te-
clando repetidamente J e L você pode acelerar/diminuir cada
vez mais a taxa de passagem do tempo. Experimente. O efeito
de aceleração da passagem do tempo será importantíssimo para
a visualização dos movimentos dos astros nas atividades que
proporemos a seguir.

O Stellarium possui diversos outros recursos que você pode ex-


plorar seguindo as demais opções do menu, ou consultando a sua
ajuda, na qual também há links para baixar o seu guia de usuário,
e consultar suas FAQs, fórum e Wiki, mas para a realização das
atividades que a seguir proporemos, o uso das opções e recursos
que acima citamos é mais do que suficiente.

14
Que correspondem aos sistemas que definimos nos itens 1.2.2.2 e 1.2.2.1,
sendo que o sistema chamado de “azimutal” (azimuthal) no Stellarium cor-
responde ao sistema que denominamos “horizontal local”, no qual uma das
coordenadas é o azimute.

15
O Stellarium é um software do tipo “planetário”, ou seja, tem recursos e
permite visualizações semelhantes às obtidas nos planetários reais.

30 Introdução à Astronomia
1.3.2 Movimento das estrelas

Na próxima vez que tiver a oportunidade de observar um céu estrela-


do de um local que tenha um horizonte razoavelmente desimpedido e,
de preferência, longe das luzes da cidade, além de apreciar sua beleza,
também aproveite para fazer uma observação mais atenta com rela-
ção às mudanças que ele sofre durante uma noite. Você poderá notar
que as estrelas não ficam paradas. Para perceber isso, será necessário
que você preste atenção na posição de algumas estrelas brilhantes,
ou conjunto de estrelas, como uma constelação ou asterismo conhe-
cidos, p. ex., as “Três Marias”, ou o Cruzeiro do Sul. Observe estrelas
brilhantes que estejam junto ao horizonte, tanto a leste como a oeste,
de modo que você possa utilizar algumas referências nestes horizon-
tes para localizá-las e marcar sua posição. Observe essas estrelas, por
exemplo, num dado instante no início da noite, antes do jantar, e
noutro instante, cerca de 2 ou 3 horas depois, e compare as duas ob-
servações. Você perceberá, nitidamente, que todas as estrelas se move-
ram. Algumas que estavam próximas do horizonte oeste já podem ter
desaparecido e, as que estavam próximas do horizonte leste, estarão
mais altas. Possivelmente, outras estrelas, que antes não apareciam,
já terão também nascido a leste. Note também que, apesar do movi-
mento, elas mantém suas posições relativas, conforme já discutimos
extensamente na seção 1.2. Mas qual foi exatamente o movimento
que elas descreveram? As que nascem sobem em trajetórias perpendi-
culares ao horizonte e, as que se põem, descem perpendicularmente a
ele? Algumas se movem paralelamente ao horizonte? Se você lembrar
da discussão realizada no item 1.2.1.3 e das imagens que aparecem
nas figuras 1.5 e 1.6, talvez já saiba a resposta, mas vamos aproveitar
a possibilidade para simular o que acontece usando o ambiente virtual
do software Stellarium:

►►Atividade 1.1: O movimento diário das estrelas

Abra o programa Stellarium que já deve estar configurado para


mostrar o céu do local em que você está, conforme instruções dadas
no item 1.3.1. Sem alterar o zoom, volte seu campo de visão para o
leste. Os pontos cardeais aparecem indicados junto ao horizonte por
meio de letras: S (sul), E (leste), N (norte) e W (oeste). Se o relógio de

Os Movimentos dos Astros e a Astronomia de Posição 31


seu computador estiver sincronizado com a hora correta, a hora que
estará sendo indicada pelo programa deverá corresponder ao hora
real em que você o estiver usando. Portanto, se você estiver fazendo
isso de dia, o céu mostrado deverá ser um céu claro, no qual não se
vê nenhuma estrela. Use então a opção Atmosfera (Atmosphere), da
barra de menu inferior, para retirar o efeito da atmosfera terrestre, o
que tornará o céu negro e recheado de estrelas. Agora, para visuali-
zar qual é o movimento das estrelas com relação ao horizonte leste,
use o recurso de acelerar a passagem do tempo apertando a tecla L
cerca de três vezes, até obter um velocidade em que o deslocamento
das estrelas seja facilmente perceptível, mas não exagerado. Observe
atentamente e veja que a trajetória delas não é nem perpendicular,
nem paralela ao horizonte, mas inclinada de um certo ângulo em re-
lação à vertical. Para visualizar isso com mais clareza, aperte a tecla
E que liga a grade do sistema de coordenadas equatorial. Lembre que
o sistema equatorial é ancorado na esfera celeste, ou seja, nas estre-
las (item 1.2.2.2). Você perceberá que a trajetória de todas as estrelas
é paralela aos paralelos celestes e que estes, por sua vez, aparecem
inclinados com relação ao horizonte. Qual é o ângulo dessa inclina-
ção e o que o determina?... Por enquanto deixaremos esta pergunta
em aberto. Mais tarde a responderemos.

Sem alterar mais nada, apenas volte agora sua visão para o hori-
zonte sul, movendo o seu campo de visão para a direita, apertando
a tecla →, ou arrastando a paisagem com o mouse (clicando com o
botão esquerdo do mouse e arrastando). Compare o que você vê com
a imagem da figura 1.5. Como a grade equatorial está ligada, você
pode visualizar perfeitamente, no Stellarium, o pólo sul celeste. Note
como todas as estrelas giram em torno dele, ou seja toda a esfera
celeste, indicada pela grade equatorial, gira em torno de um eixo que
nada mais é do que o prolongamento do eixo de rotação da Terra. A
origem deste movimento das estrelas e da esfera celeste, conforme
já discutimos no item 1.2.1.3, nada mais é do que a rotação da Terra
no sentido contrário. O movimento que você está visualizando no
Stellarium é o chamado movimento diário das estrelas, cujo período,
chamado dia sideral, é de cerca de 23 horas e 56 minutos, que cor-
responde ao período real de rotação da Terra em torno de seu próprio
eixo. Ele é cerca de 4 minutos menor que as 24 horas de duração do
dia solar. Essa diferença ocorre devido ao fato de o Sol, observado
da superfície da Terra, não apenas se movimentar com relação ao

32 Introdução à Astronomia
horizonte, mas também com relação às estrelas, atrasando-se cerca
de 4 minutos por dia em relação a elas. Isso ocorre devido ao mo-
vimento de translação da Terra em torno do Sol, como veremos em
mais detalhe na atividade 1.3.

Gire novamente seu campo de visão usando a tecla → e veja o mo-


vimento das estrelas em relação aos horizontes oeste e norte. Note
que, ao girar seu campo de visão com a grade equatorial ligada, você
poderá ter a nítida sensação de estar, de fato, no interior de uma
esfera celeste (cuja superfície é esboçada pela grade) com as estrelas
fixas a ela, como os antigos imaginavam. Se conseguir ter esta per-
cepção, isso ajudará bastante na compreensão desta atividade e na
das seguintes. Veja como, ao se porem no horizonte oeste, as estrelas
também descrevem trajetórias inclinadas com relação a este hori-
zonte, e que, ao norte, não é possível visualizar o pólo norte celeste,
pois ele fica abaixo do horizonte. Compare isso com a foto mostrada
na figura 1.6. Note que as estrelas que aparecem mais próximas do
ponto cardeal norte descrevem trajetórias bem pequenas e logo se
põem, ficando bem pouco tempo acima do horizonte. De fato, há as
estrelas que ficam mais próximas do pólo celeste norte, como a fa-
mosa Estrela Polar, que jamais aparecem acima deste seu horizonte.
Por quê? Ora, porque você está no hemisfério sul da Terra e o seu
plano do horizonte sempre encobre a região mais próxima do pólo
norte celeste (que é a projeção, no céu, da pólo norte da Terra). Para
quem está localizado no hemisfério norte da Terra, ocorre justamen-
te o oposto: o pólo norte celeste fica acima do seu horizonte e o sul,
abaixo. Esse observador jamais verá estrelas próximas ao pólo sul
celeste. Em compensação, cada um destes observadores verá estrelas
que ficam permanentemente acima do horizonte, são as chamadas
estrelas circumpolares. Volte a visão do Stellarium para o sul e ob-
serve essas estrelas. A diferença é que, no sul, não temos nenhuma
estrela brilhante bem próxima ao pólo celeste, enquanto que, no
norte, bem junto ao pólo norte celeste, há a Estrela Polar. Mas temos
o Cruzeiro do Sul, cujo braço maior sempre aponta em direção ao
pólo sul celeste, como você pode visualizar no Stellarium, você o
localizou? Caso não o tenha localizado, simplesmente use uma das
diversas opções do menu inferior que permitem a identificação das
constelações. Ele aparece indicado com o nome latino “Crux”, de
acordo com nomenclatura oficial adotada pela IAU (International
Astronomical Union). Note que, na latitude de Vitória, ou de outras

Os Movimentos dos Astros e a Astronomia de Posição 33


localidades do Espírito Santo, as estrelas do Cruzeiro não chegam
a ser circumpolares, mas passam a maior parte do tempo acima do
horizonte, pois estão relativamente próximas do pólo sul celeste.

OOutra observação interessante que pode ser feita nesta atividade é


comparar o sentido em que se movem as estrelas que estão junto ao
pólo sul celeste. Note que elas giram no sentido horário. E as que
ficam próximas ao pólo norte celeste, em que sentido giram? Talvez
você já consiga responder esta pergunta, mas vamos à próxima ati-
vidade, em que faremos uma viagem ao hemisfério norte.

1.3.3 O Céu em diferentes locais

Possivelmente você já ouviu falar que o céu visto de diferentes


locais também é diferente. Por exemplo, o céu de visto de Paris é
diferente do céu que é visto que no Rio de Janeiro. Será verdade?
E o céu de Vitória, seria diferente daquele do Rio de Janeiro? De
que depende esta variação?

O que acontece é que, ao observarmos o céu da superfície da


Terra, supondo que façamos isso de um ponto com horizonte to-
talmente desimpedido, sem prédios ou árvores, o plano do hori-
zonte sempre limitará nossa visão – só veremos metade da esfera
celeste, a outra metade sempre ficará abaixo de nosso horizonte
(figura 1.10). Como a Terra gira, descrevendo seu movimento de
rotação em torno do próprio eixo, sempre haverá um “cone de
invisibilidade” da esfera celeste que conterá estrelas que jamais
serão visíveis daquele local. Note que apenas uma variação em
longitude, sem alterar a latitude, não afetará este cone e a apa-
rência do céu, exceto por uma defasagem no horário em que os
mesmos astros serão visíveis acima do horizonte. Se quiser, pos-
teriormente, verifique isso, usando o Stellarium.

Na atividade a seguir, como auxílio do Stellarium, poderemos


visualizar melhor o efeito da variação do céu visível em função
da latitude de local, além de outros fatos marcantes acerca do
movimento dos astros quando observados da superfície da Terra.

34 Introdução à Astronomia
Figura 1.10: O plano do horizon-
te limita a visibilidade da esfera
celeste de maneira distinta em
locais situados em latitudes dife-
rentes na superfície da Terra.

Fonte: <http://www.if.ufrgs.
br/oei/santiago/fis2005/livro_
v1.pdf>.

►►Atividade 1.2: O céu em diferentes latitudes

Reinicie o programa Stellarium. Se você tiver seguido as instruções


do item 1.3.1, ele deve abrir mostrando o céu de sua localidade, no
horário real do momento em que você o estiver utilizando e com o
campo de visão voltado para o sul. Como na atividade anterior, será
conveniente desligar o efeito atmosfera para poder visualizar as es-
trelas, mesmo durante o dia. Você pode fazer isso rapidamente aper-
tando a tecla A. Ligue também a grade equatorial, teclando E, para
visualizar a esfera celeste e o pólo celeste sul. Vamos agora viajar e
ver como seria o céu visto de outro ponto da Terra, especialmente
pontos situados em outras latitudes, mais ao sul, próximo ao pólo
sul da Terra, e depois ao norte. Abra a janela da localização na bar-
ra de menu à esquerda. Arraste-a para baixo, mas deixando ainda
visível o campo “Latitude”. Zere os minutos e segundos do campo
“Latitude”, clicando em seus respectivos campos, digitando zero nos
mesmos e teclando Enter . Depois clique sobre a posição em que são
indicados os graus e, usando o botão ▼ da janela, ou a tecla ↓, vá
aumentando, de um em um grau, a latitude sul da localidade. Note
o que acontece com a posição do pólo sul celeste a medida que a
latitude vai crescendo: a sua altura vai aumentando cada vez mais.
Estrelas que estavam abaixo do horizonte sul, começam a aparecer
e a ficarem cada vez mais altas. O pólo sul celeste acabará saindo

Os Movimentos dos Astros e a Astronomia de Posição 35


do seu campo de visão. Use então o recurso de zoom: feche a janela
da localização e tecle Ctrl+↓ ou Page Down para fazer o zoom out,
aumentando o campo de visão o suficiente para continuar visuali-
zando o pólo. Abra novamente a janela da localização e prossiga
aumentando a latitude até chegar a 90º sul. Pronto estamos no pólo
sul da Terra! Onde está o pólo celeste? Se você tiver zerado os cam-
pos dos minutos e segundos na latitude, ele estará bem na vertical,
sobre a sua cabeça, bem no zênite! No pólo você estará exatamente
sobre o ponto onde o eixo de rotação “fura” a superfície da Terra, e
seu prolongamento até o céu “furará” a esfera celeste bem no zênite.
E o equador celeste? Ficará exatamente sobre o horizonte, já que fica
a 90º do pólo.

Feche a janela da localização e acione a tecla L umas três vezes para


acelerar a passagem do tempo (mas não muito) e observe qual será
o movimento das estrelas. Percebeu que elas descrevem trajetórias
paralelas à linha do horizonte e jamais nascem ou se põem? Todas
as estrelas visíveis serão circumpolares! Em compensação você não
verá nenhuma estrela do hemisfério celeste oposto. Note o sentido
de giro das estrelas em torno do pólo sul celeste: como antes, elas
giram no sentido horário. A Terra gira no sentido contrário.

Vamos agora viajar até o equador. Volte a passagem do tempo para


a sua taxa normal, apertando a tecla K. Abra novamente a janela
da localização e tecle ↑ repetidas vezes para ir reduzindo a latitude
sul, de um em um grau, até chegar a zero. Observe como a altura
do pólo celeste irá ficando cada vez menor, a medida que diminui a
latitude. Quando a latitude chegar a zero, feche a janela da localiza-
ção e use o zoom in, teclando Ctrl+↑ ou Page Up, para voltar a um
tamanho normal do campo de visão (semelhante ao que você tem,
logo que abre o programa). Percebeu que agora que você está no
equador o pólo sul celeste está sobre o horizonte? Volte o campo de
visão para o norte e veja que, com o pólo norte celeste, aconteceu a
mesma coisa, também está sobre o horizonte. Olhe agora para o leste
e acelere o tempo, apertando a tecla L umas 3 vezes para visualizar
o movimento das estrelas. Note que agora suas trajetórias ao nascer
são exatamente perpendiculares ao horizonte. Isso só acontece em
localidades sobre o equador da Terra, como, por exemplo, na cidade
de Belém do Pará, que está quase sobre o equador (latitude 1,5º sul).

36 Introdução à Astronomia
Por fim, vamos viajar ao hemisfério norte. Aperte na tecla K para a
que a taxa de passagem do tempo volte ao normal. Volte sua visão
para o horizonte norte, abra a janela de localização, tecle ↑ e vá
aumentando a latitude norte de um em um grau. Você verá a altura
do pólo norte celeste aumentando gradualmente. Perceba a Estrela
Polar praticamente em cima do pólo norte celeste. Isso facilita tre-
mendamente a orientação com base nas estrelas, para quem vive
no hemisfério norte. Continue a viagem até chegar ao pólo norte,
na latitude 90º. Novamente você estará exatamente em cima de um
dos pólos da Terra e o pólo celeste norte estará bem na vertical, no
zênite. Acione agora a tecla L uma três vezes e observe o movimento
das estrelas. Novamente elas descreverão trajetórias paralelas ao ho-
rizonte e jamais nascerão nem irão se pôr. Todas as estrelas visíveis
serão circumpolares, mas você não verá nenhuma estrela do hemis-
fério sul celeste. Mais uma vez o equador celeste ficará exatamente
em cima do horizonte. E quanto ao sentido de giro das estrelas em
torno do pólo norte celeste? É anti-horário, exatamente o contrário
do que ocorre em torno do pólo sul celeste.

Um outra observação interessante que pode ser feita nesta viagem de


pólo a pólo é quanto à posição do Sol. Note que, numa mesma data
ele só será visível a partir de um dos pólos e sua trajetória diária no
céu será semelhante a das estrelas: não nascerá nem irá se pôr, mas
será paralela ao horizonte. Apenas lentamente, a medida que ele se
movimenta com relação às estrelas é que sua posição com relação ao
horizonte irá mudando. Nos dias dos equinócios, quando ele estiver
cruzando o equador celeste, ocorre a sua passagem de um hemisfério
celeste para outro, gerando um “dia” claro de cerca de 6 meses no
hemisfério para o qual estiver se deslocando e uma noite de 6 meses
no hemisfério que estiver deixando. No equinócio subsequente a
situação se inverte. Na próxima atividade examinaremos em detalhe
esse movimento do Sol.

1.3.4 Movimentos do Sol

O Sol compartilha do movimento diário das estrelas: nasce no hori-


zonte leste e se põe no oeste todos os dias, devido à rotação da Terra,
contudo, há uma diferença importante: ele também, lentamente, se
desloca com relação às estrelas, se “atrasando” em relação a elas,
movendo-se no sentido de oeste para leste com relação às estrelas

Os Movimentos dos Astros e a Astronomia de Posição 37


e descrevendo uma trajetória na esfera celeste (enquanto as estrelas
permanecem fixas com relação a ela, veja item 1.2.1.2), chamada “li-
nha da eclíptica”, ou simplesmente “eclíptica”. Na próxima atividade,
com auxílio do software Stellarium, vamos verificar em mais detalhe
como é esse movimento do Sol.

►►Atividade 1.3: O movimento anual do Sol

Reinicie o Stellarium. Volte seu campo de visão para o oeste e, aper-


tando as teclas J ou L, adiante ou volte o tempo até um horário pró-
ximo das 16:00 horas. O Sol deve então aparecer no seu campo de
visão, que está voltado para o oeste. Mais uma vez desative o efeito
da atmosfera apertando a tecla A, para poder ver o Sol juntamente
com as estrelas. Aperte então a tecla = cuja ação é adicionar exata-
mente um dia solar ao tempo, com isso você verá, instantaneamente,
a posição do Sol à mesma hora, mas no dia seguinte. Aperte mais de
uma vez a tecla e observe o deslocamento que ele sofre com relação
às estrelas de fundo. Note que, a cada dia que passa, as estrelas vão
ficando mais baixas em relação ao horizonte oeste, e acabam desa-
parecendo neste horizonte, enquanto que a altura16 do Sol não varia
muito. Isso acontece porque a nossa hora legal e a duração do dia
são baseadas no movimento diário do Sol, por isso, quando o olha-
mos no dia seguinte, no mesmo horário, sua altura é praticamente
a mesma. O Sol, em média, gasta 24 horas entre duas passagens su-
cessivas pelo meridiano local17. Na verdade, por definição, a duração
do dia, de exatamente 24 horas, corresponde ao tempo médio gasto
pelo Sol, ao longo do ano, entre duas passagens sucessivas pelo me-
ridiano local. Já as estrelas, como vimos na atividade 1.1, levam 4
minutos a menos, demorando cerca de 23 horas e 56 minutos entre
duas passagens sucessivas pelo meridiano local, se adiantando em
relação ao Sol. Por isso, quando somamos exatamente um dia so-
lar ao tempo, teclando = no Stellarium, as estrelas aparecerão mais
baixas no horizonte oeste. Elas sempre se adiantam em relação ao
Sol e aparecerão mais baixas e mais a oeste em relação a ele, ou,

16
O conceito de altura, aqui e nas próximas páginas, é usado no sentido
preciso definido no item 1.2.2.1, como uma das coordenadas do sistema
horizontal local, veja a figura 1.8.

17
Veja a definição de meridiano local no item 1.2.2.1.

38 Introdução à Astronomia
equivalentemente, usando as estrelas como referência, percebemos
que o Sol se moveu, com relação a elas, no sentido contrário, de
oeste para leste18.

Note também que, embora o maior movimento do Sol em relação às


estrelas seja na direção leste-oeste, no sentido de oeste para leste,
ele também se desloca na direção norte-sul, tanto em relação às
estrelas como ao horizonte. A trajetória exata descrita pelo Sol na
esfera celeste é muito bem definida e recebe o nome de eclíptica.
Você pode visualizá-la no Stellarium apertando a tecla , (vírgula).
Ligue também a grade equatorial, teclando E, para visualizar melhor
a esfera celeste e a posição da eclíptica com relação a ela. Note que
a eclíptica não é paralela aos paralelos celestes19, mas inclinada com
relação a eles. Por esse motivo, além de se deslocar na direção leste-
-oeste, no sentido de oeste para leste, o Sol também se desloca na
direção norte-sul, as vezes no sentido do sul para o norte, outras do
norte para o sul. Aperte repetidas vezes a tecla = ou, se quiser andar
mais rápido, a tecla ] , que faz o tempo avançar de uma semana, para
acompanhar este movimento do Sol na direção norte-sul.

Uma possibilidade interessante de observação do movimento do


Sol ao longo da eclíptica por meio do Stellarium é você mudar sua
localização para um dos pólos, quando então, como já vimos na
atividade 1.2, o equador celeste ficará situado sobre o horizonte e
você poderá perceber claramente a posição do Sol se deslocando
em relação a este horizonte que coincide com o equador celeste.
Para tanto continue com seu campo de visão voltado para o ponto
cardeal oeste e mantenha o horário em torno das 16:00 horas, mas
mude sua localização para um dos pólos, p. ex., o pólo sul da Ter-
ra, acessando a janela de localização na barra de menu que fica na
lateral esquerda. Mantenha a grade equatorial, teclando E, retire o
efeito atmosfera, teclando A, e o chão, teclando G (ground). Insira a
eclíptica, teclando , (vírgula), e o equador celeste, teclando . (ponto).

18
Não confunda este pequeno movimento do Sol em relação às estrelas em
um dia, no sentido de oeste para leste, com o seu movimento diário em
relação ao horizonte devido à rotação da Terra, que é muito mais rápido e
sempre ocorre no sentido de leste para oeste.

19
Veja a definição de paralelo celeste no item 1.2.2.2.

Os Movimentos dos Astros e a Astronomia de Posição 39


Procure deixar o equador alinhado horizontalmente no seu campo
de visão, clicando com o botão esquerdo do mouse no centro da tela
e arrastando. Você pode também desativar a indicação dos pontos
cardeais – elas deixam de fazer sentido quando você está sobre um
dos pólos da Terra – teclando Q. Acione então repetidamente as te-
clas = ou ] para avançar no tempo um dia ou uma semana e observe
o movimento no Sol na eclíptica com relação à esfera celeste (grade
equatorial e estrelas).

Note que o movimento do Sol na direção norte-sul é um movimento


cíclico (ao contrário do movimento para leste, que é sempre pro-
gressivo) e que, após atingir um deslocamento máximo ao norte, por
volta do dia 21 de junho, retorna e atinge um afastamento máximo
ao sul, por volta do dia 21 de dezembro. Os instantes em que ocor-
rem esses deslocamentos máximos, são denominados “solstícios”. No
meio do caminho entre os soltícios, temos os instantes em que o Sol
cruza o equador celeste, são os chamados “equinócios“, que ocorrem
por volta dos dias 21 de março e 23 de setembro. Comprove isso
usando a Stellarium (bem no pé da janela do programa sempre apa-
recem a data e a hora).

Vimos, antes, que o movimento diário das estrelas é explicado pela ro-
tação da Terra em torno de seu próprio eixo e, neste ponto, cabe fazer
uma outra pergunta que, possivelmente, você já se fez e talvez até já
tenha respondido: esse curioso movimento cíclico que o Sol descreve
na esfera celeste quando observado da Terra (referencial geocêntrico),
movendo-se sempre para o leste, mas também para o sul e o norte,
ao longo da eclíptica, está relacionado a qual movimento da Terra,
quando observada desde um referencial heliocêntrico?

Ele nada mais é do que consequência do movimento de translação


da Terra em torno do Sol. Como o período desse movimento do Sol
na eclíptica é de um ano (na verdade é esse movimento que define o
próprio ano), ele é denominado movimento anual do Sol.

Mas por que, além de se deslocar na direção leste-oeste, o Sol tam-


bém faz essa dança, acima e abaixo do equador celeste, na direção
norte-sul?

40 Introdução à Astronomia
É uma consequência do fato de o eixo de rotação da Terra ser incli-
nado em relação ao plano de sua órbita em torno do Sol. Note que
dizer “acima e abaixo do equador celeste” é o mesmo que dizer “aci-
ma e abaixo do plano do equador da Terra” – lembre que o equador
celeste nada mais é do que a projeção do equador da Terra no céu/
esfera celeste –, portanto, como o eixo terrestre é inclinado cerca de
23,5º em relação à direção perpendicular ao plano de sua órbita e a
orientação deste eixo se mantém constante (sempre paralela à mes-
ma direção) enquanto a Terra gira em torno do Sol, isto faz com que,
durante cerca de metade do ano, o Sol esteja ao norte deste plano
(ao norte do equador celeste), enquanto que, na outra metade, estará
ao sul (ao sul do equador celeste). Em dois instantes, o centro do Sol
ficará sobre o plano do equador da Terra (sobre o equador celeste) –
estes instantes serão os equinócios.

É fácil perceber a relação deste fato com o maior ou menor aqueci-


mento da cada hemisfério da Terra pelo Sol e, portanto, com as esta-
ções do ano: quando o Sol estiver ao norte do equador celeste, ilu-
minará e aquecerá mais o hemisfério norte da Terra, e menos o sul;
quando o Sol estiver ao sul, iluminará e aquecerá mais o hemisfério
sul, e menos o norte. De fato, os solstícios e equinócios são usados
para marcar o início das estações do ano na Terra, que ocorrem de
maneira alternada em seus dois hemisférios. Em geral, temos:

21 de março: equinócio da primavera para o hemisfério norte, de outo-


no para o sul;

21 junho: solstício de verão para o hemisfério norte, de inverno para o sul;

23 de setembro: equinócio de outono para o hemisfério norte, de pri-


mavera para o sul;

21 de dezembro: solstício de inverno para o hemisfério norte, de verão


para o sul.

As datas exatas podem variar um pouco em torno das acima indi-


cadas, devido ao fato de a duração do ano não corresponder a um
número inteiro de dias, mas sim cerca de 365 dias e um quarto, e a
consequente necessidade de introdução de anos bissextos.

Os Movimentos dos Astros e a Astronomia de Posição 41


A linha da eclíptica também tem uma relação direta com a órbita da
Terra em torno do Sol: como o centro do Sol sempre está sobre o plano
que contém a órbita da Terra, o caminho do Sol entre às estrelas, quando
observado da Terra, corresponde à linha de intersecção entre este plano
e a esfera celeste, ou seja a linha da eclíptica é a linha de intersecção do
plano da órbita terrestre com a esfera celeste. Por este motivo, o próprio
plano da órbita da Terra também é denominado “plano da eclíptica”.

Por fim, explorando mais um pouco a visualização proporcionada


pelo Stellarium, ligue a opção de apresentação dos nomes das cons-
telações e das figuras mitológicas a elas associadas, teclando R e V, e
veja por onde o Sol passa em seu caminho pelo eclíptica, acionando
a tecla ]. Esta faixa do céu, em torno da eclíptica, é denominada
“faixa do zodíaco”. Nela encontramos as famosas e tradicionais doze
constelações zodiacais, que deram origem aos signos da Astrologia.
Verifique. Ao realizar as atividades sobre os movimentos da Lua e
dos planetas, a seguir, veremos que esta é uma região muito impor-
tante do céu.

1.3.5 Movimentos da Lua

Assim como o Sol, a Lua também compartilha com as estrelas o movi-


mento diário, nascendo a leste e se pondo a oeste, contudo, de maneira
semelhante ao Sol, ela também se desloca com relação às estrelas, e
muito! A Lua, assim como o Sol, também é um “planeta” no sentido que
os antigos gregos davam a esta palavra, que significa “astro errante”,
devido ao fato de não ficarem fixos no firmamento, mas se deslocarem
entre as estrelas. Num único dia, o deslocamento da Lua é de cerca de
13º na direção leste-oeste e no mesmo sentido que o Sol, de oeste para
leste20. Seu movimento em relação às estrelas é o mais rápido de todos
os astros. Numa única noite ele é perfeitamente perceptível, ocorrendo
com uma velocidade de cerca de 0,5º a cada hora. Como, por coinci-
dência, o diâmetro angular da Lua, quando vista da Terra, também é
de 0,5º, isso quer dizer que, a cada hora, ela sofre um deslocamento

20
Mais uma vez, não confunda estes movimentos da Lua e do Sol em re-
lação às estrelas, que ocorrem no sentido de oeste para leste, como o mo-
vimento diário, muito mais rápido, que descrevem no sentido de leste para
oeste em relação ao horizonte, juntamente com as estrelas, todos os dias
nascendo a leste e se pondo a oeste, devido à rotação da Terra.

42 Introdução à Astronomia
angular aproximadamente igual ao seu próprio diâmetro angular. Você
pode observar isso perfeitamente numa noite em que a Lua esteja vi-
sível, quando ela estiver passando próximo a alguma estrela brilhante
ou constelação de fácil reconhecimento: marque a posição que a Lua
ocupava com relação às estrelas num dado instante. Depois de cerca de
uma hora volte a observá-la novamente. Será fácil perceber que ela se
deslocou cerca de um diâmetro lunar durante este tempo.

Vejamos, a seguir, o que mais podemos aprender sobre o movimento da


Lua, usando o Stellarium.

►►Atividade 1.4: O movimento mensal da Lua

Reinicialize o Stellarium. Desligue o efeito atmosfera, teclando A, para


ver as estrelas e a Lua, mesmo de dia. Como, ao inicializar, o seu
campo de visão está voltado para o sul, você não deve estar vendo a
Lua. Como você não sabe onde a Lua está21, desta vez utilize o recurso
de busca do Stellarium: vá até a barra de menu na lateral esquerda
e abra a janela de busca (Search window). No campo de busca desta
janela digite Moon (Lua em inglês) e dispare a busca. O programa irá
buscar a Lua, marcá-la e centralizar nela o campo de visão. Note que,
após o programa fazer isso, talvez você esteja olhando para o chão!
Por quê? Ora, porque pode acontecer de a Lua ainda não ter nascido
e, portanto, ainda estar abaixo do horizonte. Na hora de o programa
centralizar o campo na posição em que ela se encontra, ele mostrará
o chão. Mas o Stellarium tem vários recursos, um deles é o de retirar
o chão, teclando G (ground). Faça isso, caso tenha acontecido de você
estar visualizando o chão. Pronto! Você verá a Lua como se a Terra
fosse transparente e você pudesse enxergar, através dela, pontos abai-
xo da linha do horizonte. Fantástico!

21
Como foi dito antes, a Lua se move muito rápido, está sempre mudando
de posição. Seus horários de nascimento e ocaso variam todo dia. Somente
se você já tivesse em mãos uma informação sobre a fase em que ela se en-
contra, seria possível conhecer estes horários e, a partir deles, ter uma idéia
da sua posição. P. ex., se o dia fosse de Lua Cheia, ela nasceria em torno
das 18 h e se poria por voltas das 6 h, ficando a noite inteira no céu, mas
isso só acontece na Lua Cheia.

Os Movimentos dos Astros e a Astronomia de Posição 43


Para prosseguir na atividade e visualizar o movimento da Lua, será in-
teressante ter algumas referências por perto. Por isso, usando as teclas
J ou L, atrase ou adiante o tempo de modo que a Lua fique logo acima
do horizonte, de preferência a oeste, por uma razão que você já vai ficar
sabendo. Note que, mesmo com o chão “desligado”, o Stellarium mostra,
de maneira tênue, a linha do horizonte, e você também tem os pontos
cardeais sendo mostrados, em letra vermelha, para poder saber onde está
horizonte e qual ele é. Quando você usar as teclas J ou L, como a Lua
está marcada e o campo nela centralizado, ao acioná-las você retardará
ou acelerará o tempo, mas o programa manterá a Lua no centro (ela
será o referencial) e o que você verá será a linha do horizonte subindo
ou descendo. Quando a Lua estiver um pouco acima do horizonte oeste,
volte o tempo à sua passagem normal, teclando K. Tecle novamente G
para que o solo apareça e você passe a tê-lo como referência. Aproveite
que a Lua está marcada e faça um zoom in para vê-la mais de perto e
saber em que fase ela se encontra. Para isso use a tecla / (ela só funcio-
na, fazendo zoom in se o objeto estiver marcado). Depois volte à visão
normal, teclando \ .

Agora chegamos ao ponto principal da atividade: com a Lua um pouco


acima do horizonte oeste, primeiro desmarque a Lua (senão ela conti-
nuará centralizada), clicando em qualquer ponto da tela com o botão
direito do mouse, depois tecle = para adiantar o tempo de um dia solar.
Você verá então a posição em que a Lua se encontrará, no mesmo horá-
rio, mas no dia seguinte. Note o seu grande deslocamento com relação
ao horizonte e às estrelas, aumentando muito a sua altura. Tecle - , para
retornar ao dia anterior. Faça isso mais de uma vez, avançando e retro-
cedendo um dia solar no tempo, para observar bem o deslocamento da
Lua em apenas um dia. Como dissemos antes, ele é notável, cerca de 13º
na esfera celeste.

Você pode notar também um pequeno deslocamento das estrelas em


relação ao horizonte: elas estarão um pouco mais baixas no horizonte
oeste a cada dia que passa, se as observarmos sempre na mesma hora.
Já vimos este efeito e sua explicação na atividade anterior, sobre o mo-
vimento do Sol: é que nosso horário é baseado no Sol, e todos os dias as
estrelas se adiantam cerca de quatro minutos em relação ao Sol. Se num
dado dia e num certo horário, digamos às 20:00 h, observarmos uma
constelação junto ao horizonte oeste, no dia seguinte, à mesma hora, ela
já estará um pouco mais baixa, e assim sucessivamente a cada dia que

44 Introdução à Astronomia
passa, até que desaparecerá atrás do horizonte e não será mais visível às
20:00 h. É fácil verificar isso com o Stellarium.

Mas voltemos nossa atenção para a Lua. Em qual sentido ela se desloca
com relação às estrelas? Como você está observando o horizonte oeste e
a Lua, de um dia para o outro, aparece cada vez mais alta, se afastando
deste horizonte, concluímos que ela está se movendo no sentido de oeste
para leste. Comece na posição em que a Lua está junto ao horizonte oeste
e tecle = mais de uma vez, para avançar mais de uma dia. Provavelmente
na terceira vez que você teclar a Lua já sairá de seu campo de visão, tão
grande é o seu deslocamento para leste. Note que este sentido, de oeste
para leste, é o mesmo em que o Sol também se movimenta em relação
à esfera celeste. O tempo que a Lua leva para completar um ciclo nesse
movimento, dando uma volta completa na esfera celeste, é denominado
período sideral da Lua, ou mês sideral, e tem uma duração aproximada
de 27,3 dias. Ele corresponde ao período de translação da Lua em sua
órbita em torno da Terra.

O movimento da Lua em relação às estrelas (esfera celeste) acontece só


na direção leste-oeste ou também na direção norte-sul, como o Sol?
Verifique isso usando o Stellarium: insira a grade equatorial, teclando
E, e alterne a posição da Lua em dois dias distintos, à mesma hora, te-
clando = (para avançar um dia) e - (para retornar um dia). Ela se move
paralelamente aos paralelos celestes, ou não? É possível verificar que ela
acaba cruzando os paralelos celestes, ou seja, embora ela apresente um
deslocamento maior direção na direção leste-oeste, também se desloca
um pouco na direção norte-sul. Por quê? Pela mesma razão que o Sol,
conforme discutido na atividade 1.3: o plano da órbita da Lua em torno
da Terra é quase coincidente com o plano da órbita da Terra em torno do
Sol (são inclinados de apenas 5º, um em relação ao outro), mas o eixo de
rotação da Terra é inclinado em relação à perpendicular ao plano de sua
órbita cerca de 23,5º. Como no caso do Sol, isso faz com que a Lua as
vezes fique acima do plano do equador da Terra, outras abaixo, a medida
que ela descreve sua órbita em torno de nosso planeta. Portanto, quando
observada da Terra, a veremos se deslocando também na direção norte-
-sul, às vezes no sentido do norte para o sul, outras no sentido do sul
para o norte, num movimento cíclico, como o Sol.

O fato de o plano da órbita da Lua em torno da Terra ser quase coin-


cidente com o da órbita da Terra em torno do Sol também tem uma

Os Movimentos dos Astros e a Astronomia de Posição 45


consequência interessante: sempre veremos a Lua próxima à linha de
eclíptica. No máximo ela se afastará 5º desta linha, que é o ângulo entre
os planos das órbitas da Lua e da Terra22. Verifique isso no Stellarium:
tecle , (vírgula) para visualizar a eclíptica, marque a Lua, clicando nela
com o botão esquerdo do mouse, e centralize o campo nela, teclando a
barra de espaço, para poder acompanhá-la à medida que ela se deslo-
ca na esfera celeste. Faça, então, avanços ou retrocessos de um dia no
tempo, teclando = ou - , e observe o movimento da Lua com relação à
linha eclíptica. Como ela nunca se afasta muito dessa linha, ela sempre
se moverá sobre a faixa do céu centrada na eclíptica – o zodíaco. A Lua
sempre será encontrada na faixa do zodíaco e se moverá sobre as cons-
telações desta faixa.

1.3.6 Movimentos dos planetas

Possivelmente você já ouviu falar que os planetas descrevem órbitas


elípticas em torno do Sol, com este situado num dos focos da elipse,
como diz a 1a Lei de Kepler, e isso está correto, porém este é um mo-
vimento que só é observando quando se adota um referencial helio-
cêntrico. Mas quando os observamos da superfície da Terra, referencial
de onde efetivamente fazemos nossas observações, o que vemos? Os
planetas descrevendo elipses no céu?

Não é o que devemos esperar, pois, como dissemos no início da seção 1.2,
a Física nos ensina que todo o movimento sempre é relativo, ou seja, de-
pende do referencial usado para observá-lo. Se adotarmos a superfície da
Terra como referência (somos forçados a isso, pois estamos presos a ela),
e não o Sol, o que veremos? Primeiramente, assim como no caso do Sol
e da Lua, veremos que os planetas compartilham do movimento diário
da esfera celeste, nascendo a leste e se pondo o oeste, devido à rotação
da Terra, mas, como o Sol e a Lua, eles também apresentam movimentos
com relação às estrelas, e bem mais complicados! Eles são astros errantes.
Como já dissemos anteriormente, a palavra “planeta” em sua origem gre-
ga, significa “errante”, “que vaga”. Mais uma vez, usaremos o Stellarium
para visualizar quais são suas trajetórias na esfera celeste.

22
Como vimos, a eclíptica, definida como sendo o caminho do Sol na esfera
celeste, corresponde também à linha de intersecção entre o plano da órbita
da Terra e a esfera celeste, ou seja, podemos encará-la como sendo a proje-
ção da órbita da Terra na esfera celeste.

46 Introdução à Astronomia
►►Atividade 1.5: O movimento enigmático dos planetas

Reinicialize o Stellarium. Para facilitar a visualização, mude a sua lo-


calização para um dos pólos da Terra. Vamos ao pólo norte desta vez.
Para tanto abra a janela de localização. Para ir mais rápido, clique no
mapa, bem ao norte, onde deve estar o pólo. Se o indicador de lati-
tude ainda não estiver indicando N 90º 0’ 0.00”, aumente a latitude
clicando usando a tecla ↑ , o botão ▲ da janela de localização ou
digitando diretamente N 90º 0’ 0.00” no campo da latitude e dando
Enter. Relembre que, ao se situar no pólo, o equador celeste coincidirá
com a linha do horizonte. Se quiser ressaltá-lo, tecle . (ponto) que
surgirá um linha azul mais forte mostrando sua localização. Desabilite
a indicação dos pontos cardeais teclando Q. Como já dissemos, essa
indicação não faz sentido se você estiver exatamente sobre o pólo.
Retire a atmosfera e o solo, teclando A e G. Ligue a grade equatorial
teclando E, para que você tenha uma boa referência fixa na esfera ce-
leste. Pronto, você pode se imaginar bem sobre o pólo norte da Terra,
acima da atmosfera, contemplando um céu totalmente desimpedido.

Vamos começar visualizando o movimento de Mercúrio, que é o mais rá-


pido dos planetas, por ser o mais próximo ao Sol23. Vamos escolher uma
data e ponto de referência na esfera celeste que nos permita acompanhar
bem o movimento descrito por Mercúrio durante algumas semanas. Nos-
sa referência será a estrela Procyon, a alfa da constelação do Cão Menor
(Canis Minoris, em latim): abra a janela de busca (Search Window) na
barra de menu na lateral esquerda, ou simplesmente teclando Ctrl+F.
Digite “Procyon” no campo de busca e dê Enter, ou clique na lupa que o
Stellarium irá localizar Procyon, marcá-la e nela centralizar o campo de
visão. Mude a data para o dia 20 de junho de 2012, abrindo a janela de
data e hora (Date and Time) na barra de menu na lateral esquerda. Note
que, nesta janela, a indicação de data está na sequência ano/mês/dia. Use
os botões da janela para fazer a data chegar em 2012/6/20. Não se pre-
ocupe com a hora, ela não fará muita diferença. Feche a janela de data
e observe o seu campo de visão: o Sol está acima à direita e Mercúrio
bem acima de Procyon, que deve estar marcada24. Vale a pena destacar

23
Na mitologia greco-romana Mercúrio é o deus mensageiro, muito veloz.

24
Se não estiver, marque-a clicando com o botão esquerdo do mouse sobre ela e te-
clando a barra de espaço para nela centralizar o campo. Ela será a nossa referência.

Os Movimentos dos Astros e a Astronomia de Posição 47


Mercúrio: abra a janela “Céu e opções de visualização” (Sky and viewing
options window) na barra de menu da lateral esquerda. Na aba Sky (a ja-
nela já deve abrir nela), no grupo de opções Planets and satellites, deixe
marcados os itens Show planets e Show planets markers. Feche a janela.
O planeta Mercúrio deverá estar marcado com um círculo à sua volta e
seu nome escrito ao lado.

Antes de começar a movimentar o planeta, manipulando o tempo,


vale a pena explorar um pouco mais o campo de visão:

Note que a Lua (Moon) está por perto, à direita de Mercúrio e próxima
ao Sol. Em que fase ela está, já que a estamos vendo quase alinhada
ao Sol? Pense... Já sabe a resposta? Vamos conferir: marque a Lua,
clicando nela com o botão esquerdo do mouse, e faça um zoom in te-
clando / . Acertou a resposta? A Lua está na fase de Lua Nova. Como
ela está quase alinhada e à frente do Sol, a face dela voltada para nós
é justamente a sua face que está na sombra, portanto, Lua Nova.

Vamos agora dar uma olhada nas constelações: clique nas opções
Constellation art e Constellation labels da barra de menu inferior, ou
simplesmente tecle R e V, que surgirão no campo de visão os desenhos
das figuras mitológicas associadas às constelações e seus respectivos
nomes, em latim. Veja que Mercúrio e a Lua estão na constelação de
Gêmeos e Procyon na constelação do Cão Menor. A direita temos
Órion, o gigante caçador, com três estrelas alinhadas, popularmente
chamadas “As Três Marias” marcando sua cintura. As estrelas bri-
lhantes Betelgeuse e Rigel marcam o ombro direito e o pé esquerdo
de Órion. Outras duas estrelas, um pouco menos brilhantes, indicam
o ombro esquerdo e o pé direito do gigante, ajudando a definir, junto
com Betelgeuse e Rigel, um quadrilátero que contém as Três Marias
em seu centro. Órion é tida como a constelação mais bela do céu, sen-
do uma constelação típica do céu de verão no hemisfério sul. Tente
identificá-la no céu no início de uma noite de verão, usando as Três
Marias e o quadrilátero de estrelas como referência. Não é difícil.

Tecle , (vírgula) para também mostrar a linha da eclíptica e tê-la como


referência. Note que, neste campo de visão, ela está passando pelas
constelações zodiacais do Touro, Gêmeos, Câncer e Leão. O centro
do Sol, por definição, sempre está sobre esta linha, mas observe que
também a Lua e Mercúrio estão próximos a ela. Quando aparecerem

48 Introdução à Astronomia
outros planetas você poderá verificar que também eles se mantém
próximos à eclíptica, sempre percorrendo o céu na faixa do zodíaco.
Qual a razão para que isso aconteça? Lembre que a linha da eclíptica
também corresponde à projeção da órbita da Terra na esfera celeste:
é a intersecção do plano da órbita da Terra, também chamado “plano
da eclíptica”, com a esfera celeste. Se as trajetórias de todos os demais
planetas, bem como a da Lua, na esfera celeste se situam sempre pró-
ximas a essa linha, forçosamente isso significa que as órbitas de todos
os demais planetas e da Lua situam-se em planos bem próximos ao
plano da eclíptica. De fato, essa é um das características mais marcan-
tes do arranjo espacial dos planetas do nosso sistema solar: as órbitas
de todos os planetas são praticamente coplanares, isto é, situam-se,
todas elas, muito próximas do mesmo plano, muito próximas do
plano da eclíptica, que costuma ser usado como referência. Este im-
portante dado observacional é uma forte evidência a favor da teoria
de formação dos planetas a partir de um disco de matéria (gás e
poeira) que girava em torno do Sol primitivo: como se formaram a
partir de um mesmo disco, situado num plano bem definido, todos
os planetas mantiveram sua órbitas aproximadamente sobre este
mesmo plano.

Finalmente, vamos visualizar o movimento de Mercúrio: mantenha


todas as referências ligadas (eclíptica, equador celeste, grade equato-
rial, constelações), Procyon marcada e centralizada e a data no dia 20
de junho de 2012. Adicione, então, um dia solar ao tempo, teclando
= . Veja que a Lua se movimenta muito (já vimos isto na atividade
anterior) e Mercúrio também, apresentando um deslocamento bem
perceptível em apenas um dia. Continue teclando = várias vezes e
vá acompanhando o deslocamento de Mercúrio. A Lua rapidamente
desaparecerá do campo de visão. Daqui a cerca de um mês ela estará
de volta. Mercúrio vai se deslocando da constelação de Gêmeos para
a de Câncer. Em que sentido ele está se movendo? O mesmo da Lua e
do Sol, para leste em relação às estrelas. Neste campo de visão o norte
está para cima, o sul para baixo, o leste à esquerda, o oeste à direita25.

25
Note que o leste e o oeste parecem invertidos em relação ao que vemos
em mapas da Terra. A diferença é que este não é um mapa (imagem) da
Terra, mas do céu e, quando olhamos para o alto, se o norte estiver, p. ex.,
nas nossas costas, o sul estará na nossa frente, o leste à esquerda, o oeste
à direita. Verifique.

Os Movimentos dos Astros e a Astronomia de Posição 49


Por volta do dia 02 de julho26, Mercúrio já estará bem no centro da
constelação de Câncer, o Sol estará em Gêmeos. Mercúrio continua
se movendo para leste, mas continue avançando mais alguns dias e
verifique que o movimento de Mercúrio passa a se alterar: ele reduz
sua velocidade para leste e começa a descer para o sul. Por volta do
dia 14 de julho ele pára de se mover para leste, ainda se move para
o sul e passa a se mover para o oeste, invertendo o sentido de seu
movimento na direção leste-oeste! Este é um exemplo do chamado
movimento retrógrado de Mercúrio, que também é apresentado por
todos os demais planetas: embora todos eles tenham um movimento
predominante de deslocamento para o leste, em relação às estrelas,
em determinadas épocas eles invertem este sentido e seguem para o
oeste. Vamos continuar acompanhando a movimentação de Mercú-
rio, avançando o tempo de um em um dia. Note que a Lua voltou.
No dia 20 de julho ela passa bem próxima a Mercúrio e rapidamente
vai embora. Note que à direita também já aparece o planeta Vênus,
na constelação de Touro, se movendo para leste. Por volta do dia
28 de julho, Mercúrio é ultrapassado pelo Sol e ainda se move para
oeste. Somente por volta do dia 07 de agosto ele pára de se mover
para oeste, move-se um pouco para o norte, reaproximando-se da
eclíptica, e passa a retomar seu movimento para leste, seguindo o
Sol que já vai entrando na constelação do Leão.

Vale a pena utilizarmos o recurso do Stellarium de marcarmos o


caminho descrito pelos planetas para visualizarmos a trajetória exa-
ta descrita por Mercúrio durante estas semanas que o observamos.
Volte a data para o dia 20 de junho de 2012 (use a tecla [ para voltar
mais rapidamente, de semana em semana). Tecle Shift+T para que os
planetas deixem os seus rastros e vá aumentando o tempo de um em
um dia, teclando = , para registrar a trajetória. Prossiga até o final
do mês de agosto, por volta do dia 25, e veja o resultado: o planeta
Mercúrio deu uma laçada no céu! Você deve ter obtido um resultado
semelhante ao indicado na figura 1.11. Você também pode salvar
num arquivo a imagem exibida na tela do Stellarium: Tecle Ctrl-S e
a imagem que você obteve com a simulação do movimento retrógra-
do de Mercúrio será gravada na área de trabalho do seu computador.

26
Note que a data e a hora sempre aparecem indicadas bem embaixo na
janela do Stellarium.

50 Introdução à Astronomia
Como dissemos antes, não é só Mercúrio que realiza este tipo de
movimento, todos os demais planetas também o fazem! As vezes
eles não chegam a fechar a laçada, mas fazem um ziguezague (mo-
vimento em forma de Z) no céu, durante o movimento retrógrado27.
Como explicar esse estranhíssimo movimento apresentado pelo pla-
netas? Ainda mais se considerarmos que a duração e a forma exata
da trajetória descrita durante o movimento retrógrado, laçada ou zi-
guezague, é bastante variável? Você percebe o imenso trabalho que
este enigma deu aos astrônomos, durante séculos, para desvendá-lo?

Figura 1.11: Tela do Stellarium


mostrando a trajetória na forma
de laçada executada pelo planeta
Mercúrio na esfera celeste entre
os dias 20 de junho a 25 de agos-
to de 2012.

Na antiguidade foi formulado um engenhoso modelo geocêntrico,


proposto inicialmente por Hiparco, que viveu em Rodes, no século
II a.C., e foi aprimorado por Cláudio Ptolomeu, de Alexandria, por
volta do século II d.C., tendo sido publicado em seu famoso tratado
sobre Astronomia, conhecido por Almagesto, que foi a maior e mais
influente referência sobre Astronomia da Antiguidade, sendo utili-
zada por europeus e árabes durante séculos (ZEILIK, 1997; MAR-
TINS, 1994).

27
Mais uma vez chamamos a atenção para não confundir este movimento
que é descrito com relação às estrelas, ao longo de vários dias, com o mo-
vimento diário do astros, que é muito mais rápido e sempre ocorre de leste
para oeste. Jamais veremos um movimento retrógrado, uma laçada ou um
Z no céu descritos por um planeta numa única noite. No Stellarium esta-
mos usando o artifício de aumentar o tempo um dia inteiro de cada vez,
deixando a esfera celeste parada. No movimento em relação ao horizonte, o
planeta e a esfera celeste já teriam dado uma volta completa num dia solar.

Os Movimentos dos Astros e a Astronomia de Posição 51


Para explicar o movimento retrógrado dos planetas, este modelo
fazia uso de dois principais elementos: os “deferentes” e “epiciclos“.
O epiciclo era uma circunferência menor, sobre a qual se movimen-
tava o planeta, e o deferente, uma circunferência maior, centrada,
ou quase centrada, na Terra, sobre a qual o centro do epiciclo se mo-
vimentava. Com a composição destes dois movimentos: do planeta
sobre o epiciclo e do centro do epiciclo sobre o deferente, era possí-
vel reproduzir um movimento retrógrado (figura 1.12). Em verdade
o modelo era mais elaborado: para explicar a velocidade variável
dos planetas na esfera celeste, Hiparco e Ptolomeu, consideravam
a possibilidade de a Terra não estar situada exatamente no centro
do deferente, mas um pouco fora do centro. O deferente era então
“excêntrico”. Além disso, para dar conta das variações que haviam
no próprio movimento retrógrado, Ptolomeu também supôs que, si-
metricamente disposto à posição da Terra em relação ao centro do
deferente, havia um ponto – o equante – em relação ao qual o mo-
vimento angular do planeta seria uniforme, enquanto que, visto da
Terra, não o seria, o que explicaria as variações.

Figura 1.12: Modelo geocêntrico


que explica o movimento retró-
grado de um planeta por meio da
composição de um movimento
do planeta sobre um epiciclo e
do centro do epiciclo sobre um
deferente.

Fonte: <http://www.luispontes.
com/ast_e.html#epiciclos>

A engenhosidade deste modelo e a razoável precisão das previsões


nele baseadas com relação às posições planetárias (erro de no má-
ximo 5º, bastante bom para a época) fez com que ele fosse adotado
durante séculos na Antiguidade e durante toda a Idade Média.

Contudo, hoje sabemos muito bem que o modelo correto para o


sistema solar não é o geocêntrico, mas o heliocêntrico. A luz deste

52 Introdução à Astronomia
modelo, como se explicam as laçadas ou ziguezagues feitos pelos
planetas em seus movimentos retrógrados?

A explicação acaba sendo bem mais simples e elegante que no caso


do modelo geocêntrico, sem a necessidade introdução de epiciclos,
deferentes, círculos excêntricos e equantes – o que foi um bom mo-
tivo que favoreceu a adesão ao modelo heliocêntrico proposto por
Copérnico28 em detrimento do modelo geocêntrico.

Trata-se apenas de uma questão de movimento relativo: no modelo


heliocêntrico, todos os planetas, inclusive a Terra, giram em torno Figura 1.13: Movimento retró-
do Sol, só que o fazem com velocidades variáveis: quanto mais dis- grado de Marte: ele é produzido
tante o planeta, mais lento é seu movimento. Sendo assim, sempre em consequência do movimento
haverá momentos em que a Terra será “ultrapassada” por um planeta relativo de Marte (mais lento)
mais rápido, interno à sua órbita, como Mercúrio ou Vênus, e ou- com relação à Terra (mais rápi-
tros em que a Terra “ultrapassará” um planeta externo à sua órbita da): no momento em que a Terra
(Marte, Júpiter ou Saturno, considerando apenas os planetas visíveis ultrapassa Marte, o sentido de
a olho nu, conhecidos desde a Antiguidade). Nestes momentos de seu movimento, com relação às
ultrapassagem, tanto no caso de planetas externos como de internos, estrelas distantes (esfera celeste),
o movimento que a projeção do astro na esfera celeste realizará terá se inverte e sua trajetória, vista
seu sentido invertido, e a trajetória do planeta com relação às estre- da Terra, dá uma laçada, ou faz
las distantes (esfera celeste), quando vista da Terra, apresentará uma um ziguezague no céu. No caso
laçada ou ziguezague (figura 1.13) de um planeta interno à órbita
da Terra, que é mais rápido que
ela, como Mercúrio, o mesmo
efeito acontece quando o planeta
interno ultrapassa nosso planeta.
É possível perceber isso a partir
do diagrama acima simplesmente
invertendo a ordem e conside-
rando que a Terra é o planeta
externo, em vermelho, e Mercú-
rio o planeta interno, em azul,
imaginando a projeção da linha
de visada na esfera celeste no
sentido oposto.

28
Copérnico apresentou seu modelo heliocêntrico de universo em sua obra Fonte: <www.luispontes.com/
De revolutionibus orbium coelestium  (“Da revolução das esferas celestes”), ast_r.html#retrogradacao>.
publicada no ano de sua morte, em 1543.

Os Movimentos dos Astros e a Astronomia de Posição 53


Com esta atividade sobre o movimento dos planetas, encerramos
nossa série de cinco atividades utilizando o software Stellarium29. Ao
longo delas fizemos uso de grande parte dos recursos básicos ofere-
cidos pelo programa. Você pode continuar a explorá-lo e a utilizá-lo,
futuramente, seja por interesse próprio ou com fins didáticos, para
o trabalho com estudantes, como foi feito aqui. Uma vez dominados
seus recursos você pode criar seus próprios roteiros de atividades.
Nesta série buscamos mostrar a grande utilidade do programa para
um trabalho de iniciação à Astronomia que tem como tema a obser-
vação, descrição e explicação dos movimentos dos astros a partir de
um referencial local, da superfície da Terra, ou seja, do que realmente
observamos através desta nossa janela para o universo que é o céu do
nosso planeta. Uma aplicação interessante que não usamos, mas será
explorada nas atividades recomendadas que seguem ao final deste ca-
pítulo, é a simulação de eclipses lunares e solares. Nessas simulações
se destaca aquilo que é um dos pontos fortes do Stellarium: o grande
realismo das imagens, muito semelhantes ao que, efetivamente, é ob-
servado no céu. Outro uso interessante do Stellarium, que foi pouco
explorado nesta nossa série de atividades, é sua utilização como auxí-
lio ao reconhecimento do céu. Com ele é possível saber exatamente o
que estará visível no céu de sua localidade a qualquer hora, do dia ou
da noite. Você pode usá-lo como ferramenta para identificar e locali-
zar constelações, estrelas, planetas e outros objetos visíveis a olho nu,
ou com telescópios. O céu real ainda é muito mais belo que o virtual.
Aprecie sua beleza e aproveite para ampliar o conhecimento que dele
você tem, usando o Stellarium como apoio. Boas observações!

A seguir recomendamos uma série de atividades que complementam e


aprofundam o conteúdo que abordamos neste capítulo, especialmente
as apresentadas no livro “O Céu” do Prof. Rodolpho Caniato (1993),
que utiliza um modelo de esfera celeste de vidro, feito com um balão
de fundo redondo utilizado em laboratórios de Química. Depois apre-
sentamos uma série de questões que você deverá responder com base
no que aprendeu. Se necessário, para tirar dúvidas a respeito delas,
você pode recorrer novamente às simulações realizadas com o Stella-
rium e/ou com o modelo de esfera celeste proposto por Caniato.

29
Nas atividades complementares será indicada mais uma interessante ati-
vidade com o Stellarium, envolvendo simulações de eclipses.

54 Introdução à Astronomia
1.4 Atividades Complementares

1.4.1 Atividades propostas no capítulo 2 do livro “O Céu”

É fortemente recomendável uma leitura atenta do Capítulo 2 –


Olhando para o Céu, do Prof. Rodolpho Caniato (1993) e a rea-
lização das atividades práticas por ele sugeridas, especialmente
as que utilizam um modelo tridimensional de esfera celeste feito
com um balão de vidro de fundo redondo, utilizado em laborató-
rios de Química. As atividades são as seguintes:

Atividade 2.1 – O Gnômon: atividade que mostra como determi-


nar os pontos cardeais e o meridiano local (veja definição no item
1.2.2.1) a partir da observação da sombra projetada para uma
haste vertical sobre uma superfície plana (gnômon).

Atividade 2.2 – O movimento diurno aparente das estrelas: ati-


vidade que explora o conceito de esfera celeste e o movimento
diurno das estrelas, utilizando o modelo de esfera celeste feito
com balão de vidro de fundo redondo

Atividade 2.3 – Posições do Sol durante o dia: registro e análise


gráfica do movimento diurno do Sol por meio da determinação de
suas coordenadas horizontais altura e azimute a partir da sombra
projeta por um gnômon em vários instantes do mesmo dia.

Atividade 2.4 – Localizando “estrelas no céu”: marcação da posi-


ção de diversas estrelas na esfera celeste representada pelo balão
de vidro de fundo redondo por meio de suas coordenadas equato-
riais, ascensão reta e declinação.

Atividade 2.5 – A “manobra” de um planeta no céu: análise do


movimento retrógrado realizado por Mercúrio por meio de mar-
cação de sua posição numa carta celeste, dada por meio de suas
coordenadas ascensão reta e declinação, em diversos dias, ao lon-
go de cerca de três meses.

Atividade 2.6 – A caminhada do Sol pelo céu durante o ano:


análise do movimento anual do Sol na eclíptica por meio do uso

Os Movimentos dos Astros e a Astronomia de Posição 55


do modelo de esfera celeste feito com balão de vidro de fundo
redondo.

1.4.2 Oficinas de Astronomia

Há uma série de excelentes oficinas de Astronomia, cuja ela-


boração foi coordenada pelo Prof. João Batista Garcia Canalle,
cujos textos foram compilados numa apostila disponível para ser
baixada da internet, achando-se indicada nas nossas referências
(CANALLE, acesso em 24 fev. 2012). Várias dessas oficinas são
destinadas ao Ensino Fundamental, mas algumas delas também
são bem adequadas ao Ensino Médio. O estudante de licenciatura
e futuro professor que as realizar certamente tirará grande pro-
veito. Em especial recomendo a realização das seguintes oficinas:

• O sistema solar em escala: montagem, com materiais simples,


de um modelo tridimensional do sistema solar em escala cor-
reta de tamanhos e distâncias. Consiste numa atividade exce-
lente para que o estudante perceba, de maneira bem concreta,
o enorme espaço existente entre os planetas e a imensidão do
sistema solar, propiciando uma noção mais realista da estru-
tura espacial deste sistema.

• Explicando Astronomia Básica com uma bola de isopor: mon-


tagem e utilização de um modelo tridimensional do sistema
Sol-Terra-Lua, por meio de uso de uma lâmpada e bolas de
isopor. A atividade com modelos tridimensionais é a melhor
maneira de se propiciar uma aprendizagem correta de fenô-
menos básicos de Astronomia, como as estações do ano, fases
da Lua e eclipses, para cuja compreensão a consideração do
posicionamento e movimentação dos astros no espaço tridi-
mensional é fundamental. É notória a dificuldade de entendi-
mento desses fenômenos quando o ensino é feito apenas com
base em figuras bidimensionais.

Além destas oficinas também é fortemente recomendável a leitura


do seguinte texto que integra a apostila do Prof. Canalle:

56 Introdução à Astronomia
• Professor, a Lua não tem quatro fases! – neste texto é bem
discutida e esclarecida a questão das fases da Lua e de que
elas, contrariamente ao que o senso comum concebe, não são
apenas quatro, mas infinitas, já que a Lua está continuamente
mudando de aspecto. A leitura deste texto é especialmente
recomendada antes da realização da atividade sobre eclipses,
a seguir.

1.4.3 Eclipses: mais uma atividade com o Stellarium

Uma das simulações mais interessantes que podem ser feitas,


usando o software Stellarium, é a que permite a visualização de
um eclipse, seja lunar ou solar. Os eclipses são fenômenos que
ocorrem sempre que um astro entra na sombra de outro. Quando
o cone de sombra projetado pelo Lua toca a superfície da Terra,
há um eclipse solar. Quanto a Lua penetrar na sombra da Terra, há
um eclipse lunar. Eles são os fenômenos mais espetaculares que
se pode assistir no céu, especialmente os eclipses solares totais.
Antes da indicação das atividades propriamente ditas, apresenta-
mos, a seguir, uma explicação sobre o que são os eclipses lunares
e solares e algumas de suas principais características, para melhor
compreensão da atividade:

1.4.3.1 Geometria dos eclipses

Um eclipse solar ocorre quando há um alinhamento entre o Sol,


a Lua e Terra, nesta sequência, com a Lua se interpondo entre a
Terra e o Sol, mantendo sua face que está na sombra completa-
mente voltada para a Terra (figura 1.14.).

Figura 1.14: Geometria do eclipse


solar. O eclipse será total para um
observador situado numa região
no interior da umbra, e apenas
parcial para observadores na
região da penumbra.

Fonte: <http://www.luispontes.
com/ast_e.html#eclipse>.

Os Movimentos dos Astros e a Astronomia de Posição 57


Um eclipse lunar só acontece quando a Lua está na fase de Lua
Nova30. Um eclipse lunar, por sua vez, ocorre quando o alinhamento
ocorre entre o Sol, a Terra e a Lua, nesta sequência, com a Terra se
interpondo entre o Sol e a Lua (figura 1.15). Isso só acontece quando
a Lua está na sua fase de Lua Cheia, com a mesma face voltada para
a Terra e para o Sol.
Figura 1.15: Geometria do eclipse
lunar. O eclipse será total se a
Lua penetrar inteiramente na um-
bra projetada pela Terra e apenas
parcial se ela apenas tangenciar o
cone de sombra da Terra. Qual-
quer observador que esteja na
face da Terra voltada para a Lua,
onde será noite, verá o eclipse.

Fonte: <http://pt.wikipedia.org/ Dissemos que a Lua necessariamente tem que estar na fase de Lua
wiki/Ficheiro:Eclipse_lunar.svg>. Nova, para que ocorra um eclipse solar, e na de Lua Cheia, para que
ocorra um eclipse lunar, pois é só nestas fases da Lua que ocorre um
alinhamento entre o Sol, a Terra e a Lua, mas, se estes astros ficam
alinhados, não deveríamos ter eclipses em toda a Lua Nova e em
toda Lua Cheia? Por que isso não acontece?

O que ocorre é que o plano da órbita da Lua em torno da Terra não


coincide exatamente com o plano da órbita da Terra em torno do
Sol, mas eles apresentam entre si um ângulo de cerca de 5,2º Isso
faz com que, na maioria das vezes em que a Lua atinge as suas fa-
ses de Lua Nova ou Lua Cheia, o alinhamento não seja perfeito. Em
geral, o cone de sombra da Lua não toca a Terra, quando ela atinge
a Lua Nova, nem o cone de sombra da Terra atinge a Lua, quando

30
Na exposição que segue, utilizamos os termos “fase de Lua Nova” e “fase
de Lua Cheia” nos referindo ao momento exato em que a Lua fica, respecti-
vamente, em conjunção com o Sol e em oposição ao Sol, o que significa, no
primeiro caso, que ela está no mesmo meridiano celeste que o Sol (mesma
ascensão reta) e, no segundo, que está no meridiano oposto ao Sol, ou seja
a 180o do meridiano celeste em que se encontra o Sol. Sobre a noção de
fases da Lua é fortemente aconselhável a leitura do texto “Professor, a Lua
não tem quatro fases!”, de Rodrigo Moura na apostila de Canalle (acesso em
26 fev 2012), indicada nas referências e disponível on-line.

58 Introdução à Astronomia
esta está na Lua Cheia (figura 1.16, pontos A e C). Somente quando
a Lua estiver cruzando o plano da eclíptica (plano da órbita da Terra)
na fase de Lua Nova ou Lua Cheia é que o alinhamento será perfeito e
ocorrerá um eclipse (figura 1.16, pontos B e D). Aliás é por isso que o
plano e a linha da eclíptica levam este nome, pois só ocorrem eclipses
quando a Lua estiver justamente cruzando por eles, quando na fase de
Lua Nova ou Lua Cheia. Observando a figura 1.16 também podemos
concluir que os eclipses só podem ocorrer quando a chamada “linha
dos nodos”, que corresponde à linha de intersecção entre os planos
das órbitas de Terra e da Lua, estiver passando pelo Sol, como nos
pontos B e D, o que só ocorrerá duas vezes em cada volta da Terra em
torno do Sol, ou seja, só duas vezes por ano haverá alguma chance
de ocorrer um eclipse. Note também que, para que de fato ocorra um
eclipse, além de a linha dos nodos ter que estar passando pelo Sol, é
necessário que, quando isto ocorrer, a Lua também esteja passando
pelo ponto de sua trajetória em que fica em conjunção, ou oposição
ao Sol, ou seja, que ela esteja na sua fase de Lua Nova ou Lua Cheia.
Por este motivo os eclipses não são tão frequentes. Figura 1.16: Os plano da ór-
bita da Lua em torno da Terra
B
apresenta um pequena inclina-
ção de 5,2º em relação ao plano
da órbita da Terra em torno do
A C Sol (plano da eclíptica), o que
faz com que na maioria das
Luas Novas ou Cheias o cone de
sombra da Lua não atinja a Ter-
ra, nem o da Terra atinja a Lua.
D
Fonte: <http://astro.if.ufrgs.br/
1.4.3.2 A visibilidade dos eclipses eclipses/eclipse.htm>.

Há uma diferença marcante entre os eclipses lunares e solares quan-


to à sua visibilidade, como é possível verificar observando as figuras
1.14 e 1.15: quando ocorre um eclipse da Lua, a partir de qualquer
ponto da Terra que esteja na sombra, ou seja, em que seja de noite,
será possível observar o eclipse, ou seja, metade da Terra poderá
assistir ao eclipse da Lua. Já no caso de um eclipse do Sol, como é
possível verificar na figura 1.14, apenas observadores que estejam
numa pequena faixa da Terra que fique no interior da umbra verão
um eclipse total, os que estiverem na penumbra verão apenas um

Os Movimentos dos Astros e a Astronomia de Posição 59


eclipse parcial, e os que estiverem fora destas regiões, mesmo que
estejam na face da Terra que esteja voltada para o Sol e a Lua, nada
verão. Conclusão: de qualquer ponto da Terra, os eclipses lunares
serão visíveis com muito maior frequência que os solares, especial-
mente os solares totais, que, a cada vez que ocorrem, só são visíveis
numa estreita faixa da superfície da Terra.

1.4.3.3 Aspecto da Lua durante um eclipse.

Um fato curioso que ocorre num eclipse lunar total é que, contrariamente
ao que poderíamos imaginar, a Lua não fica totalmente escura. Pelo con-
trário, em geral ela apresenta uma coloração avermelhada e permanece
perfeitamente visível no céu (figura 1.17). Como isso se explica?

Figura 1.17: Eclipse total da Lua


de em junho de 2011.

Fonte: Wikipedia, <http://


en.wikipedia.org/wiki/
File:Lunar_eclipse_June_2011_
Total.jpg>

O que acontece é que a Terra possui atmosfera, a qual funciona


como se fosse uma lente e um filtro: como uma lente, ela desvia,
por refração, os raios de luz vermelha do Sol para o interior do cone
de sombra da Terra e, agindo como um filtro, bloqueia a luz solar
azul, espalhando-a em outras direções (figura 1.18). Um astronauta
que estivesse na Lua, olhando para a Terra durante um eclipse lunar
total, veria o nosso planeta como um disco negro circundado por um
anel vermelho brilhante. Esse anel nada mais seria do que a luz dos

60 Introdução à Astronomia
crepúsculos e auroras ocorrendo ao redor de toda a Terra. É essa
luz que incide sobre a Lua durante o eclipse total, produzindo a sua
coloração vermelho-alaranjada. Se a Terra não possuísse atmosfera,
não teríamos este efeito. Cada eclipse lunar total é único e diferente
dos outros. A coloração exata que a Lua apresenta nestas ocasiões é
variável, dependendo do tipo e quantidade de poeira existente na
alta atmosfera da Terra e das nuvens nas regiões onde ocorrem as
auroras e crepúsculos no instante do eclipse. A luz da Lua, durante o
eclipse, nos informa não sobre ela, mas sobre a atmosfera da Terra. Figura 1.18: A luz branca do Sol
é uma mistura de todas as cores
Após essas considerações sobre os eclipses, vamos à atividades com do arco-íris. Quando um raio
o Stellarium. de luz solar “branca” incide na
atmosfera da Terra, as moléculas
do nosso ar espalham a luz azul
em todas as direções (por isso
o céu da Terra é azul!...). A luz
avermelhada que restou após a
“filtragem” do azul é desviada
(refratada) para dentro do cone
►►Atividade 1.6: Eclipses lunares e solares de sombra da Terra, iluminando
a Lua e produzindo a sua típica
Primeiramente, consulte um bom site que informe sobre datas, horá- coloração avermelhada durante
rios e locais, na superfície da Terra de onde os eclipses, seja lunares um eclipse total.
ou solares, serão visíveis. Sugestão: consulte o website da NASA,
<http://eclipse.gsfc.nasa.gov/eclipse.html>, que parece ser o melhor Imagem: Tony Phillips, NASA.
e mais completo do mundo sobre o assunto31.

Escolha uma data e local de ocorrência de eclipse. Por exemplo, você


pode escolher a próxima data em que um eclipse total da Lua seja
visível da sua cidade. Isso certamente não é um evento muito raro,
conforme explicação dada no item 1.4.2.2. Já um eclipse solar total
que seja visível de sua cidade, ou de qualquer outro local específico
da Terra, este sim, será muito mais raro. Todo ano acontece algum
eclipse solar, só que a região em que eles são visíveis, especialmente
a faixa de totalidade, é muito estreita.

31
Nele há informações precisas sobre eclipses solares desde 1851 até 2100 e
de lunares durante 5 milênios, desde 1999 A.C. até 3.000 D.C

Os Movimentos dos Astros e a Astronomia de Posição 61


Para exemplificar, vamos começar escolhendo o primeiro eclipse lu-
nar total que seja visível de Vitória, ES, a partir do ano de 2012. Na
página inicial da NASA, anteriormente indicada, podemos achar um
link para a página com a lista de eclipses lunares que ocorrerão
durante a década 2011-2020, no endereço: <http://eclipse.gsfc.nasa.
gov/LEdecade/LEdecade2011.html>.

Neste lista é possível verificar que em 2012 não ocorrerá nenhum


eclipse total, apenas um parcial e um penumbral32, em 2013 tam-
bém, apenas um parcial e dois penumbrais, mas em 2014 haverá
dois eclipses totais, o primeiro no dia 15 de abril, outro no dia 8 de
outubro33. O primeiro será visível na Austrália, Oceano Pacífico e
Américas. Clicando na data, abre-se uma página com informações
detalhadas sobre o eclipse. Consultando as informações sobre o pri-
meiro deles, do dia 15 de abril, <http://eclipse.gsfc.nasa.gov/LEplot/
LEplot2001/LE2014Apr15T.pdf>, verificamos, na tabela Eclipse Con-
tacts, que fica embaixo à direita, que o horário em que acontece o
primeiro contato da Lua com a umbra, denominado U1, que é quan-
do efetivamente se poderá perceber que o eclipse está em andamen-
to34, ocorrerá às 05:58:19 UT, o que significa 5 horas, 58 minutos e
19 segundos do tempo universal (Universal Time). O tempo universal
é a hora (Tempo Solar Médio Local) de Greenwich, na Inglaterra,
que é usada como referência. Para converter para a sua hora local,
basta saber a diferença, em horas, da hora legal da sua localidade
para a hora de Greenwich, ou seja, você deve saber qual o seu fuso
horário e somá-lo ao horário UT. No caso de localidades situadas no
Espírito Santo, onde se segue a hora legal de Brasília, utilizada na
maior parte de nosso país, nosso fuso horário corresponde a –3 h

32
Um eclipse penumbral ocorre quando a Lua não penetra a umbra, mas
apenas a penumbra (veja figura 1.15). Esse tipo de eclipse é praticamente
imperceptível a olho nu.

33
Note o espaçamento de quase seis meses entre uma data e outra. Isso se
deve ao fato de que decorrerão cerca de seis meses entre duas ocasiões em
que a linha dos nodos passe pelo Sol, que ocorrem em pontos opostos da
órbita da Terra (pontos B e D na figura 1.16).

34
Conforme informanos antes, a passagem da Lua pela penumbra é pratica-
mente imperceptível a olho nu.

62 Introdução à Astronomia
(menos três horas), ou seja nossa hora legal acha-se atrasada de 3
horas em relação à hora de Greenwich (pois estamos situados a oeste
de Greenwich), portanto, se o início do eclipse (início da penetração
da Lua na umbra) ocorre às 5 horas e 58 minutos UT, ele ocorrerá às
2 horas e 58 minutos da hora legal de Brasília, no dia 15 de abril de
2014. Pronto, temos a informação que precisávamos para simular o
eclipse no Stellarium! O eclipse iniciará na madrugada da noite de
14/15 de abril de 2014 e, portanto, será visível de Vitória, desde que
o céu não esteja encoberto por nuvens, evidentemente.

Consultando a tabela de informações da NASA também vemos que


a Lua deverá sair totalmente da umbra (contato U4) às 6 h 33 min
no horário de Brasília, quando então o dia já terá amanhecido e,
muito provavelmente, a Lua já estará abaixo do horizonte, para um
observador em Vitória (poderemos verificar isso tudo por meio do
Stellarium). A duração do eclipse, desde a entrada até a saída da
Lua da umbra, será, portanto, bastante longa, cerca de 3 h 35 min.
Os eclipses solares são muito mais rápidos, você saberia explicar o
porquê desta diferença35?.

Vamos então à visualização por meio do Stellarium. Inicie o pro-


grama e clique na opção Date/Time window do menu da lateral es-
querda e mude a data para o dia 15 de abril de 2014 (note que os
dados devem ser inseridos no campo da data no formato ano/mês/
dia) e a hora para, p. ex., as 2 h e 50 min, um pouco antes do início
do eclipse. Depois abra a janela de busca (Search window) no menu
da lateral esquerda e digite Moon (Lua, em inglês), para centralizar
o campo de visão na Lua. Note que ela aparecerá relativamente pró-
xima ao horizonte oeste, na constelação de Virgem, bem ao lado da
estrela Spica36, com Marte também aparecendo um pouco abaixo

35
No fundo, a razão é que a Terra é maior que a Lua. Consequentemente, o
cone de sombra da Terra é maior que o cone de sombra da Lua. O primeiro
é quem produz o eclipse lunar, o segundo, o solar.

36
Spica é a estrela mais brilhante da constelação da Virgem, é a α (alfa) da
Virgem, seu nome significa espiga, pois indica a posição da espiga de trigo
segurada pela virgem, como pode ser visto usando o recurso do Stellarium
de exibir as figuras mitológicas associadas às constelações (Constellation
art), disponível no menu inferior, ou teclando R.

Os Movimentos dos Astros e a Astronomia de Posição 63


dela. Tecle , (vírgula) para também ser mostrada a linha da eclíptica.
Note que, conforme discutido no item sobre a geometria do eclipse,
a Lua estará bem próxima, quase cruzando a eclíptica no início do
eclipse, como tinha que ser: a umbra – cone de sombra da Terra – na
qual ela irá penetrar sempre se encontra centralizada na eclíptica, ou
seja, no plano da órbita da Terra.

Tecle /, ou outro comando de zoom37 para ver a Lua mais de perto


e observar o eclipse. Aperte a tecla L umas duas ou três vezes para
acelerar o tempo e visualizar o eclipse mais rapidamente (no tempo
real, o eclipse demorará mais de 3 horas...). Note como a Lua adqui-
rirá uma coloração avermelhada38. Quando ela estiver totalmente no
interior da sombra o Stellarium mostrará estrelas adicionais, uma
vez que o brilho, bem mais fraco, da Lua, não ofuscará mais o destas
estrelas. Você poderá perceber nitidamente o deslocamento da Lua
com relação a estas estrelas e à eclíptica. Tente perceber a forma
circular do cone de sombra da Terra, cujo diâmetro é bem maior que
o da Lua.

Vamos agora buscar um exemplo de eclipse solar. Consultando o


website da NASA sobre eclipses, <http://eclipse.gsfc.nasa.gov/eclip-
se.html>, podemos verificar que, em 2012, haverá um eclipse so-
lar total no dia 13 de novembro, cuja estreita faixa de totalidade
cruzará o Oceano Pacífico, e que, em terra, passará apenas por um
pequeno pedaço do nordeste da Austrália, como pode ser melhor ob-
servado na página <http://eclipse.gsfc.nasa.gov/SEmono/TSE2012/
TSE2012.html>. Vamos então imaginar que nos deslocaremos para o
nordeste da Austrália para assistí-lo. Para saber de onde poderemos
observá-lo, podemos voltar à página principal da NASA, <http://
eclipse.gsfc.nasa.gov/eclipse.html>, e seguir o link para o período
2001-2021 indicado no item Solar Eclipses on Google Maps, que
nos levará à página <http://eclipse.gsfc.nasa.gov/SEgoogle/SEgoo-

37
Lembre que você pode usar o botão de rolamento do seu mouse, as teclas
Ctrl+↑ ou Ctrl+↓, ou ainda Page Up/Down, para fazer zoom in/out e ampliar
ou reduzir o campo de visão.

38
Como dissemos antes, esta coloração é variada, pois depende das condi-
ções da atmosfera da Terra no momento. Alguns eclipses podem ser mais
acinzentados, outros mais avermelhados.

64 Introdução à Astronomia
gle2001.html>, onde, numa grande tabela encontraremos uma linha
referente ao eclipse de 13 de novembro de 2012. Nesta linha clique
na palavra Total (que indica que o eclipse é total) que você será
encaminhado à página: <http://eclipse.gsfc.nasa.gov/SEgoogle/SE-
google2001/SE2012Nov13Tgoogle.html>,onde aparecerá um Google
Map da região do eclipse, no qual você poderá fazer um zoom sobre
a região do nordeste da Austrália por onde passará a faixa de totali-
dade. Nela você poderá verificar que a única cidade maior próximo
ao centro da faixa é a cidade de Cairns. Ela para lá que iremos!

Resta saber o horário do eclipse. Note que, bem diferentemente de


um eclipse lunar, em que o horário em que ocorrem a entrada ou
saída da Lua do cone de sombra da Terra é a mesma para todos
os observadores, qualquer que seja sua localização na superfície da
Terra – todos vêem o mesmo fenômeno simultaneamente –, no caso
de um eclipse solar é o cone de sombra da Lua que se desloca sobre
a superfície da Terra, e cada local por onde ele passar verá o eclipse
num hora diferente, as observações do eclipse não serão simultâne-
as, mas dependerão do local da superfície da Terra em que se encon-
tra o observador.

Na mesma página do Google Map em que é mostrada a faixa de


totalidade, você pode notar que bem no meio da trajetória, há um
balão verde indicando a posição, bem no meio do Pacífico Sul, onde
o eclipse terá a máxima duração39. Passando o mouse por sobre este
balão aparecem várias informações, como as coordenadas do pon-
to, a duração da totalidade e horários de início, máximo e final do
eclipse nesta localização, sendo a hora indicada em termos do tempo
universal (UT), que é a hora de Greenwich. Mas qual será o horário
do eclipse em Cairns? Você pode novamente dar um zoom sobre
o nordeste da Austrália no Google Map e clicar sobre a cidade de
Cairns. Surgirá, então, um balão com informações sobre o eclipse
nesta cidade. Aparecerão indicadas as coordenadas latitude e longi-
tude do local que foi clicado, a duração da totalidade neste local, que
será de cerca de 2 minutos, com máximo em torno das 20 h 40 min
UT. Pronto, já temos os dados que necessitamos para o Stellarium!

39
No balão aparecem as letras GE, sigla para Greatest Eclipse, que significa
“eclipse máximo”.

Os Movimentos dos Astros e a Astronomia de Posição 65


Inicie o Stellarium, abra a janela de localização (Location window)
e, no campo de busca (ao lado de um ícone que representa uma
lupa), digite o nome da cidade australiana “Cairns”. Você verá que,
felizmente, essa cidade já está no banco de dados do Stellarium, com
suas coordenadas, que serão preenchidas automaticamente (senão,
teríamos que digitar a latitude e longitude de Cairns nos respectivos
campos). Quanto ao horário, lembre que nossa localização será em
Cairns, mas o Stellarium utiliza a hora do seu computador, que é a
hora legal de Brasília, a qual, em relação a hora de Greenwich, nor-
malmente está 3 horas atrasada, mas que, no período de meados de
outubro a meados de fevereiro, quando se utiliza o horário de verão,
fica 2 horas atrasada. Como o eclipse será em novembro, utilizare-
mos como hora aproximada do eclipse UT – 2 h. Sendo assim, é de
se esperar que o eclipse em Cairns, cujo máximo deve ocorrer em
torno das 20 h 40 min UT, no horário de Brasília irá ocorrer às 18
h 40 min. No horário local, de Cairns, que fica no fuso de +10 h em
relação à Greenwich, a hora da eclipse será às 30 h 40 min do dia 13
de novembro, ou seja, 6 h e 40 min do dia 14 de novembro! A data
já será a do dia seguinte em Cairns.

Abra então a janela de data e hora do Stellarium, mude a data para


o dia 13 de novembro e ajusta a hora para cerca de 18 h 30 min, um
pouco antes do horário do eclipse.

Para centralizar o campo de visão no eclipse, use a janela de busca


do menu da lateral esquerda (ou digite Ctrl+F) e escolha: procure
pelo Sol ou pela Lua, é indiferente já que os dois estarão se alinhan-
do na hora do eclipse. Se escolher a Lua, digite Moon, se o Sol, digite
Sun no campo de busca, e tecle enter.

Pronto, você deverá estar vendo o eclipse já ocorrendo, junto ao ho-


rizonte leste, e já quase chegando à sua totalidade. Faça um pouco
de zoom in para ver o eclipse de perto. Não acelere muito o tempo,
pois este eclipse, ao contrário do da Lua, é muito rápido. Clique
apenas duas vezes a tecla L para acelerar um pouco o andamento do
eclipse. Assim que chegar ao horário das 18 h 39 min, tecle K para
voltar ao normal o ritmo de passagem do tempo e assista ao espetá-
culo, serão só dois minutos de totalidade!

66 Introdução à Astronomia
Note que a medida que o eclipse avança, o Stellarium consegue si-
mular o escurecimento do céu e o surgimento de estrelas à volta do
Sol. Para observar melhor este efeito, faça um zoom out suficiente
para ver um pedaço do horizonte e os astros que “surgirão” a volta
do Sol. Aos poucos aparecerão os planetas Saturno e Mercúrio e,
quando o Sol finalmente ficar todo encoberto, várias estrelas. Li-
gue as opções que mostram as linhas da constelações, seus nomes
e figuras mitológicas a elas associadas. Você verá que o eclipse está
ocorrendo na constelação da Libra, que fica à frente da do Escorpião.
Ligue também a linha da eclíptica, teclando , (virgula) e verifique
que o eclipse está ocorrendo exatamente em cima desta linha.

Um eclipse solar total é tido como o espetáculo mais deslumbrante


que se pode assistir no céu. Só que são raríssimas as vezes em que
são visíveis exatamente das localidades em que moramos, ou próxi-
mo a elas. Em 03 de novembro de 1994 houve um eclipse cuja faixa
de totalidade cruzou o sul do Brasil e pode ser visto muito bem das
cidades catarinenses de Chapecó e Criciúma, que ficaram bem próxi-
mas do centro da faixa de totalidade. Em 29 de maio de 1919 houve
um outro eclipse total visível da cidade cearense de Sobral que teve
enorme importância histórica, pois a partir da observação precisa da
posição em que as estrelas que estavam próximas à linha de visada do
Sol apareceram naquela ocasião, pela primeira vez foi possível per-
ceber que elas tinham suas posições desviadas exatamente conforme
previsões feitas pela Teoria da Relatividade Geral, que afirmava que
a luz sentiria o efeito da presença do Sol, desviando sua trajetória em
consequência da curvatura do espaço-tempo produzida pela presença
da sua grande massa, confirmando assim as previsões desta Teoria.

Se quiser, você pode simular estes dois eclipses que acima citamos, ou
outro qualquer, lunar ou solar, utilizando os ótimos dados informa-
dos no website da NASA, o Stellarium, seguindo os mesmos passos
que utilizamos nos dois exemplos que trabalhamos. Esperamos que a
realização desta atividade sobre eclipses, além de promover a apren-
dizagem de vários conceitos de Astronomia, também tenha lhe pro-
porcionado suficiente autonomia para isso. Nossa intenção foi essa.

Os Movimentos dos Astros e a Astronomia de Posição 67


1.5 Questões

Boa parte das questões a seguir são versões ou adaptações a partir


de perguntas originalmente formuladas no capítulo 2 do livro de
Caniato (1993) ou no livro de Boczko (1984). Em muitas delas será
importante você utilizar como apoio para a compreensão e/ou simu-
lação do que nela é proposto o programa Stellarium, ou o modelo de
esfera celeste feito com balão de vidro de fundo redondo proposto
por Caniato (1993).

1. Como é o movimento das estrelas em relação ao horizonte?

2. As estrelas sempre mantêm suas posições relativas fixas? Por quê?

3. As estrelas gastam todas o mesmo tempo se movendo acima do


horizonte, isto é, para ir da posição de onde nascem (aparecem
no horizonte) até o ocaso (quando desaparecem no horizonte)?
Se levarem tempos diferentes, explique qual a razão e do que
depende estes tempos.

4. Ao longo de um dia completo (24 horas), todas as estrelas serão,


em algum momento, visíveis do lugar em que você está (des-
considere a luz do Sol e imagine que, mesmo de dia, se a estrela
estiver acima do horizonte, ela será visível)? Explique.

5. Existem estrelas que ficam sempre acima do horizonte? Explique.

6. Existe algum lugar da superfície da Terra em que um observador


possa ver todas as estrelas ao longo de um dia (novamente des-
considere a luz do Sol e imagine que, mesmo de dia, se a estrela
estiver acima do horizonte, ela será visível)?

7. Há algum lugar, da superfície da Terra, no qual o observador não


vê nem o nascimento, nem o ocaso das estrelas? Qual(is) é(são)
esse(s) lugar(es)?

8. Que região do céu o observador situado no(s) lugar(es) indicado(s)


na questão anterior teria sempre visível: um hemisfério celeste,
ou mais, ou menos que um hemisfério celeste? Explique.

68 Introdução à Astronomia
9. Há, para o observador situado no(s) lugar(es) indicado(s) no item
7, estrelas que nunca são visíveis? De que região do céu?

Figura 1.19: Questão 10: dese-


nho esquemático, representando
a Terra e a metade da esfera ce-
leste visível para um observador
em sua superfície.

Figura 1.20: O raio da Terra é


muito menor que o da esfera ce-
leste, o que faz com que a Terra
e o observador possam ser con-
siderados como pontos situados
bem no centro da esfera celeste.

10. Utilize a figura 1.19, na qual se acham representados, de manei-


ra esquemática: a Terra, com os seus pólos; a linha do equador;
um observador na superfície da Terra numa latitude semelhante
à de Vitória (cerca de 20º Sul); o plano do horizonte deste obser-
vador e a metade da esfera celeste visível para este observador (a

Os Movimentos dos Astros e a Astronomia de Posição 69


outra metade fica oculta pelo plano do horizonte). Nesta figura,
na metade da esfera celeste visível para o observador, represente
o eixo da esfera celeste40, o equador celeste e o pólo celeste visí-
vel para este observador. Identifique por escrito essas referências
que você desenhará sobre a figura.

Importantíssimo: ao traçar essas referências, é essencial notar que


a representação apresentada na figura 1 é esquemática, e que, na
verdade, conceitualmente, a esfera celeste tem um raio muito grande
(tendendo ao infinito) e que a Terra e o observador, comparados a
ela, podem ser considerados apenas pontos situados bem no centro
da esfera celeste, conforme procuramos indicar na figura 1.20, mos-
trando que podemos imaginar um zoom out, no qual a Terra vai se
tornando minúscula em comparação à esfera celeste, até se tornar
apenas um ponto em seu centro.

Após traçar as referências, use a figura 1 para demonstrar, geome-


tricamente, que a latitude local (do observador) φ é igual à altura h
do pólo celeste visível para este observador, onde a altura h do pólo
é definida como sendo o ângulo entre a direção do pólo e o plano
do horizonte do observador, medido sobre o plano vertical que passa
pelo pólo celeste. Indique, por escrito, seu raciocínio.

11. Como um observador poderia definir o plano do horizonte nos


seguintes casos:

• (a) o observador está situado num local muito plano (num mar
calmo, ou num deserto);

• (b) o observador está situado numa cidade, com vários prédios


ou árvores à sua volta.

12. O que é o chamado movimento diário aparente do Sol e das es-


trelas? Esse movimento é de fato só “aparente”? Explique.

13. Descreva uma maneira de se obter os 4 pontos cardeais com um


gnômon.

40
Denominado “eixo do mundo” por Caniato (1993).

70 Introdução à Astronomia
14. Imagine o plano vertical que passa pelo observador e contém a
direção leste-oeste. Ao observar um certa estrela, um observador
nota que, antes de atingir o ponto mais próximo “do alto de sua
cabeça”, ou seja, do zênite, a estrela corta este plano vertical
vindo do Sul para o Norte. Em que hemisfério da Terra esse ob-
servador se encontra? Explique. (Sugestão, não deixe de utilizar
o modelo de esfera celeste feito com balão de vidro ou o softwa-
re Stellarium para uma simulação do movimento desta estrela.)

15. Qual a diferença entre o movimento diário das estrelas para um


observador situado num dos pólos e outro no equador?

16. Enuncie o conceito de esfera celeste. Como se chegou a esse


conceito?

17. Como podemos saber se um pólo celeste visível é norte ou sul,


observando o movimento das estrelas em torno dele?

18. (a) O ponto do horizonte em que o Sol nasce é sempre o mesmo,


todos os dias? Se não for, diga quando o Sol nasce exatamente
no ponto cardeal leste.

• (b) Na época em que o Sol nasce exatamente a leste, em que


ponto se dá o ocaso?

19. Em que época (ou épocas) do ano o dia e a noite têm igual duração?

20. Em que época do ano os dias são mais longos? Quando são mais
curtos?

21. Que fenômeno(s) astronômico(s) determina(m) o início oficial


de cada uma das estações do ano? Por volta de que data ele(s)
ocorre(m)?

22. Todos os dias, ao meio-dia, o Sol passa pelo zênite?

23. Existem pontos na Terra em que o dia e a noite têm sempre a


mesma duração? Explique.

Os Movimentos dos Astros e a Astronomia de Posição 71


24. Descreva o movimento do Sol com relação ao horizonte e a du-
ração do dia e da noite para um observador situado exatamente
sobre um dos pólos geográficos da Terra. (Sugestão: não deixe de
utilizar o modelo de esfera celeste feito com balão de vidro ou o
software Stellarium para uma simulação do movimento do Sol.)

25. Qual é cidade em que você mora? Nesta sua cidade, quantas
horas tem o dia mais longo e o mais curto? (Sugestão: use o sof-
tware Stellarium para simular a duração do dia claro (Sol acima
do horizonte), na época certa, para obter a resposta à questão.)

26. Em Vitória, durante um ano, em quantos dias o Sol passará pelo


zênite? Em nenhum dia, apenas num dia, em dois dias ou em
mais de dois dias? Justifique a sua resposta.

27. Você já ouviu falar que o pôr-do-sol é mais rápido na região


norte, ou nordeste do Brasil que na região sudeste, ou sul? Ou
seja, a duração do crepúsculo seria menor no Norte e Nordeste
que no Sul e Sudeste. Seria isso verdade? Justifique.

28. Por que a Lua é o mais rápido dos astros em seu movimento na
esfera celeste?

72 Introdução à Astronomia
O SISTEMA SOLAR

O Sistema Solar 73
2.1 O que é o sistema solar?

Imagem: NASA

O sistema solar é a nossa vizinhança cósmica mais próxima, que


consiste num sistema dominado por um astro – o Sol – cuja massa
representa mais de 99% do total e é, portanto, o centro do sistema.
Devido à sua imensa massa, cerca de 2,0 x 1030kg, e a forte atração
gravitacional que consequentemente exerce, o Sol mantém ligada
a si uma imensa quantidade de objetos menores, dentre os quais
os mais notáveis são os planetas, um deles a própria Terra. Os ob-
jetos que compõem esse sistema interagem gravitacionalmente não
só com o Sol, mas também entre si, constituindo, desta forma, não
apenas um conjunto, mas, de acordo com o significado mais preci-
so da palavra “sistema”, um conjunto de elementos interligados. O
nome que recebe, de “sistema solar”, é, portanto, bem apropriado,
destacando o papel proeminente desempenhado pelo Sol e o fato de
ser constituído por um conjunto de corpos interagentes. Podemos
defini-lo, de maneira sucinta, como sendo:

Sistema solar: sistema formado pelo Sol e todos os corpos que a


ele permanecem ligados devido à sua atração gravitacional.

Além do Sol, o sistema solar é composto por oito planetas – Mer-


cúrio, Vênus, Terra, Marte, Júpiter, Saturno, Urano e Netuno –,

74 Introdução à Astronomia
suas luas e anéis, planetas anões41, uma miríade de corpos me-
nores, tais como asteróides, cometas, objetos transnetunianos e
meteoróides, e ainda o meio interplanetário, composto de poeira e
gás. Embora todos esses demais corpos juntos representem menos
de 1% da massa do sistema solar, eles apresentam uma imensa di-
versidade de aspectos, ambientes, condições físicas e composição
química, tais como tamanhos que vão desde milhares de quilô-
metros, no caso dos planetas, até grãos microscópicos da poeira
interplanetária; temperaturas que vão desde centenas de graus
Celsius até próximo ao zero absoluto; alguns apresentam for-
te gravidade e atmosfera, outros não; alguns são essencialmente
rochosos, enquanto outros são gasosos ou compostos por gelos.

A exploração desta imensa diversidade vem sendo realizada a


distância pelo homem, por meio de telescópios, desde os tempos
de Galileu Galilei, que em 1609 fez as primeiras observações te-
lescópicas sistemáticas de astros do sistema solar, descobrindo, p.
ex., as quatro maiores luas de Júpiter, as fases de Vênus e as man-
chas solares42. Desde os anos 60 do século XX, essa exploração
vem sendo feita de maneira mais direta e próxima, por meio de
astronaves, algumas tripuladas, como no caso do projeto Apollo
de exploração da Lua, mas a maioria não-tripuladas, porém cada
vez mais bem equipadas e eficientes na coleta de informações de
valor científico, como, p. ex., as bem sucedidas missões da NASA
a Marte, com envio de robôs (figura 2.1), uma delas em pleno
andamento, a missão Mars Science Laboratory, que conduzirá a
Marte o robô Curiosity, o maior e mais bem equipado de todos
até o momento, com previsão de pouso em Marte para o dia 06 de
agosto de 2012 (NASA, acesso em 08 fev 2012).

41
Cinco astros já foram incluídos nesta categoria, inclusive Plutão, e há
vários outros candidatos. Muito provavelmente algumas centenas, ou mes-
mo milhares, de planetas anões ainda serão descobertos nas regiões mais
remotas do sistema solar, além da órbita de Netuno.

42
Em homenagem aos 400 anos destas primeiras observações telescópicas
feitas por Galileu, o ano de 2009 foi decretado pela ONU como o Ano In-
ternacional da Astronomia. Veja, p. ex., <www.astronomia2009.org.br/>.

O Sistema Solar 75
Figura 2.1: Três gerações de robôs
enviados a Marte pela NASA,
mostrando sua evolução tanto
em tamanho como em recursos e
quantidade de equipamentos. Na
imagem são mostradas réplicas do
Sojourner (o menor), pousado em
Marte em 1997, do Spirit e Oppor-
tunity (à esquerda), que chegaram
a Marte em 200443, e do Curiosity
(o maior), que deverá pousar em
Marte no dia 06/08/12.
Um dos grandes temas científicos na exploração do sistema solar
Fonte: NASA, <www.nasa.gov/ vem sendo a busca e investigação de locais, além da Terra, onde
multimedia/ possa existir ou já ter existido vida. O grande objetivo da missão
imagegallery/image_featu- Mars Science Laboratory, p. ex., será investigar se Marte apresenta,
re_2154.html>. ou já apresentou condições favoráveis à vida microbiana e descobrir
pistas, em suas rochas, sobre a possível ocorrência de vida no pas-
sado deste planeta.

Nas próximas duas seções, apresentaremos, primeiramente, a impor-


tante padronização recomendada pela IAU44 com relação aos termos
utilizados na classificação dos astros do sistema solar, conforme sua
famosa resolução 5 de 2006, que reclassificou Plutão como planeta
anão. A seguir, apresentaremos a definição de alguns termos muito
usados pelos astrônomos na especificação do tipo de material de que
são feitos os astros, como gases, gelos, voláteis e rochas. Como isso,
nossa intenção, é pavimentar o caminho para deixar mais clara a
descrição e panorama geral que apresentaremos no restante do ca-
pítulo, sobre a estrutura e composição do nosso sistema solar. Nessa

43
De acordo com o planejamento inicial da missão, era esperado que os ro-
bôs gêmeos funcionassem durante 3 meses, mas, surpreendentemente, am-
bos foram muito além: o Spirit funcionou até 2010 e o Opportunity, até o
momento da redação deste texto, ainda continua ativo, explorando Marte.

44
International Astronomical Union (União Astronômica Internacional):
associação internacional que congrega os astrônomos profissionais e é a
maior responsável pela nomenclatura e padronização de termos, conceitos
e definições utilizados em Astronomia.

76 Introdução à Astronomia
exposição, usaremos como fio condutor a distribuição espacial dos
diversos componentes desse sistema, numa sequência que vai desde
as regiões mais próximas ao Sol até as mais remotas, começando
pelo próprio astro rei45. Acreditamos que esta forma de abordar o
tema contribui para uma melhor compreensão da estrutura e orga-
nização dos astros do sistema solar, de nossa posição dentro dele,
bem como das perspectivas com relação a futuros estudos, avanços
e descobertas a serem feitos na exploração deste sistema do qual
fazemos parte.

2.2 Como são classificados os astros do sistema solar?

O avanço na exploração do sistema solar, com a descoberta, a partir


dos anos 1990, de um número cada vez maior de astros (mais de mil)
integrantes deste nosso sistema, a maioria situados em regiões remo-
tas, além da órbita de Netuno, denominada região transnetuniana,
fez com que a comunidade internacional dos astrônomos sentisse a
necessidade de um definição mais precisa a respeito da classificação
dos objetos que o compõem, em especial dos astros que, efetivamen-
te, devem ser considerados planetas. Essa necessidade de definição
era bem pertinente, uma vez que Plutão, até então considerado um
planeta, como se percebeu, era apenas um dos membros de um gran-
de conjunto de milhares de corpos, semelhantes a ele, que orbitam
o Sol numa região atualmente denominada “Cinturão de Kuiper”,
situada além da órbita de Netuno.

Plutão foi descoberto em 1930, por Clyde Tombaugh, à época jovem


astrônomo americano que atuava no Lovell Observatory, num pro-
jeto que buscava descobrir o nono planeta do sistema solar, pois se
supunha, erradamente, àquela época, que haveria um planeta mais
externo que estaria perturbando as órbitas de Urano e Netuno (IAU,
acesso em 20 mar 2012). A partir de sua descoberta, Plutão passou
a ser considerado esse nono planeta, e, suponha-se então, ele teria
tamanho e massa suficientes para perturbar as órbitas de Urano e
Netuno. Contudo, com o avanço das técnicas de observação astro-
nômica, estimativas cada vez mais precisas acerca de seu tamanho

45
A expressão “astro rei” costuma ser utilizada, com propriedade, para fazer
referência ao Sol, considerando que ele é, sem sombra de dúvida, o astro
dominante do sistema.

O Sistema Solar 77
e massa foram feitas, especialmente após a descoberta de sua lua
Caronte, em 1978, demonstrando que seu diâmetro era de apenas
cerca de 2.300 km e sua massa correspondendo a apenas 0,2% da
massa da Terra. De fato Plutão é muito pequeno quando comparado
aos demais planetas e até a algumas de suas luas. Por exemplo: seu
tamanho é menor que o da nossa Lua, cujo diâmetro mede 3.475 km,
e sua massa é cerca de 6 vezes menor que a do nosso satélite natu-
ral. Com tão pouca massa, Plutão não consegue exercer influência
gravitacional suficiente para perturbar as órbitas de Urano e Netuno
conforme se supunha.

Contudo, outros fatos interessantes foram descobertos a respeito desse


astro: além da descoberta de sua lua Caronte, em 1978, com tamanho
comparável ao dele próprio, com um diâmetro de 1.043 km – cerca de
metade do de Plutão –, mais recentemente, graças a imagens obtidas
com o telescópio espacial Hubble, descobriram-se mais três luas me-
nores: Nix e Hydra, em 2005, e outra, provisoriamente denominada
P4, descoberta em 2011 (NASA, acesso em 06 fev 2012). A astronave
New Horizons – a primeira destinada ao estudo de Plutão e de outros
objetos transnetunianos –, lançada em 2006, está a caminho, deven-
do chegar a Plutão em 2015, quando então novos fatos interessantes
acerca deste mundo distante e gelado certamente serão revelados.

O avanço dos recursos tecnológicos a disposição dos astrônomos,


com novas gerações de telescópios, tanto baseados em terra como
espaciais, detectores muito mais sensíveis, e ainda diversas astronaves
automáticas enviadas para a exploração de nosso sistema solar vêm
aumentando nosso conhecimento e transformando nossa visão acerca
dele. Em 1992, pesquisadores da universidade do Havaí descobriram o
primeiro de uma série de mais de 1.000 astros atualmente conhecidos
com órbitas que, como Plutão, ficam além da de Netuno, sendo, por
este motivo, genericamente denominados “objetos transnetunianos”
(em inglês: transneptunian objects, sigla TNOs), inclusive um deles,
Eris, cuja descoberta foi confirmada em 2005, com tamanho e massa
comparáveis, senão um pouco maiores, que os de Plutão. Essas no-
vas descobertas revelaram que, após a órbita de Netuno, entre 30 e
50 UA46 há um verdadeiro cinturão de pequenos astros, denominado

46
Unidades Astronômicas. 1 UA corresponde à distância média entre a Terra
e o Sol.

78 Introdução à Astronomia
Cinturão de Kuiper, assim chamado em homenagem ao astrônomo
Gerard Kuiper, um dos primeiros a especular sobre sua existência, em
artigo científico publicado em 1951 (WIKIPEDIA.ORG, acesso em 12
mar 2012).

Como resultado dessas descobertas, sobretudo após Eris, o status de


Plutão como planeta foi posto em cheque: se Plutão continuasse a
ser considerado planeta, tanto Eris como outros TNOs, de tamanho
comparável ao de Plutão, também mereceriam ser assim classificados.
Entretanto, nenhum deles tem um papel dominante na região de sua
órbita, pelo contrário, fazem todos parte de um grande conjunto de
milhares de astros48 que constituem o cinturão de Kuiper.

Essa polêmica rendeu uma acirrada discussão durante a 26a Assem-


bléia Geral da IAU, que ocorreu em Praga, em 2006 – ano seguinte
ao da confirmação da descoberta de Eris. Essa discussão resultou na
votação de uma resolução que define o que é um planeta e como de-
vem ser classificados os demais corpos que compõem o sistema solar,
sendo criadas as categorias “planeta anão” e “pequenos corpos do sis-
tema solar”. Segundo as normas apresentadas nessa resolução, Plutão
deixou de ser considerado planeta e foi reclassificado como planeta
anão, juntamente com Éris e o asteróide Ceres.

A resolução 5 aprovada na Assembléia Geral da IAU de 2006, numa


tradução fiel, diz o seguinte (IAU, acesso em 17 mar 2012):

“1) Um planeta é um corpo celeste que:

a) está em órbita em torno do Sol,

b) tem massa suficiente para que sua autogravidade supere as forças


de corpo rígido, de modo que ele assuma uma forma (quase redonda)
de equilíbrio hidrostático, e

c) tenha limpado a vizinhança em torno de sua órbita.

2) Um ‘planeta anão’ é um corpo celeste que

47
Estima-se que devam existir centenas de milhares de objetos com diâmetro
acima de 100 km no cinturão de Kuiper (NASA, acesso em 06 fev 2012)

O Sistema Solar 79
a) está em órbita em torno do Sol,

b) tem massa suficiente para que sua autogravidade supere as forças


de corpo rígido, de modo que ele assuma uma forma (quase redonda)
de equilíbrio hidrostático,

c) não tenha limpado a vizinhança em torno de sua órbita, e

d) não é um satélite.

3) Todos os outros objetos, exceto satélites, orbitando o Sol devem


ser coletivamente denominados ‘Corpos Menores do Sistema Solar’ ”.

Em nota de roda-pé da resolução 5 ainda é dito, explicitamente, que:

“Os oito planetas são: Mercúrio, Vênus, Terra, Marte, Júpiter, Saturno,
Urano e Netuno.”

Na resolução 6, que a segue, também é explicitamente afirmado:

“Plutão é um ‘planeta anão’, pela definição anterior, e deve ser con-


siderado como o protótipo de uma nova categoria de Objetos Trans-
netunianos”.

Desta forma, a União Astronômica Internacional definiu, de maneira


categórica, que deve se considerar que o sistema solar só possui oito
planetas48 e que Plutão é um planeta anão.

O critério da definição de planeta que não é atendido por Plutão é o


último: “… (c) tenha limpado a vizinhança em torno de sua órbita.”,
uma vez que a órbita de Plutão está dentro do cinturão de Kuiper,
onde há inúmeros outros astros semelhantes a ele. Com esta resolução
aprovada, ainda em 2006 mais dois astros conhecidos foram classifi-
cados pela IAU como planetas anões: Ceres, que faz parte do cinturão
de asteróides, com órbita entre Marte e Júpiter, e Eris, que fica na
região transnetuniana. Em 2008, a IAU, por meio de seu grupo de

48
A chance de existência de um novo astro, ainda não descoberto, que
atenda aos critérios definidos na resolução e possa ser considerado um
planeta é considerada remotíssima.

80 Introdução à Astronomia
trabalho encarregado da nomenclatura do sistema planetário, incluiu
oficialmente mais dois astros na categoria de planeta anão: Haumea
e Makemake, ambos da região transnetuniana, com nomes derivados
das mitologias dos povos nativos do Havaí e da Ilha da Páscoa, res-
pectivamente.

Outra diretriz importante indicada pela resolução 5 é a de que todos


os astros do sistema solar devem passar a ser classificados em três ca-
tegorias gerais: planetas, planetas anões e corpos menores do sistema
solar, ou então como satélites, caso orbitem um astro de maior massa.

2.3 De que são feitos os astros do sistema solar?

Figura 2.2. Nuvem molecular


Barnard 68, cuja concentração de
gás e poeira absorve a luz emitida
pelas estrelas de fundo, que ficam
atrás dela. Em cerca de cem mil
anos ela deverá sofrer um colapso
gravitacional e formar uma ou
mais estrelas com seus respec-
tivos sistemas planetários. Ela
fica localizada na constelação do
Ofiúco, a uma distância de 500
anos-luz e com cerca de meio
ano-luz de extensão.

Fonte: NASA, <http://apod.


nasa.gov/apod/ap120129.html>.

O sistema solar se formou a partir de uma grande nuvem de gás


e poeira, escura e fria, denominada pelos astrônomos de “nuvem
molecular” (figura 2.2), como muitas que existem em nossa galáxia
e em inúmeras outras galáxias, sobretudo naquelas semelhantes à
nossa, do tipo espiral. Essas nuvens são denominadas “molecula-
res” porque, devido à sua baixa temperatura, nelas há a presença
de moléculas, sobretudo de hidrogênio (H2). Os elementos químicos

O Sistema Solar 81
presentes nesta nuvem primordial eram principalmente hidrogênio
e hélio – os mais abundantes no universo – e quantidades bem me-
nores de outros elementos mais pesados, principalmente oxigênio,
carbono, neônio, ferro, nitrogênio, silício, magnésio, enxôfre, cálcio
e níquel. Isso acontece devido ao fato de as nuvens do disco de
nossa galáxia acharem-se “contaminadas” por elementos mais pe-
sados formados no interior de estrelas das primeiras gerações que se
formaram em nosso galáxia e em explosões de supernovas49. Esses
elementos e as moléculas mais simples formadas pela sua combi-
nação, como o hidrogênio molecular (H2), a água (H2O), o metano
(CH4), a (H2), a água (H2O), o metano (CH4), a amônia (NH3), silica-
tos (compostos envolvendo silício, oxigênio, metais e hidrogênio), o
sulfeto de hidrogênio (SH2), o gás carbônico (CO2), são os principais
constituintes dos corpos do nosso sistema solar.

Ao descrever a constituição dos planetas, seus satélites, planetas


anões e corpos menores do sistema solar (asteróides, cometas e obje-
tos transnetunianos) os astrônomos costumam usar os termos:

• rochas – para designar uma constituição em que predominam


compostos com alto ponto de fusão, como os silicatos, o ferro e
o níquel, que tendem a permanecer no estado sólido, desde que
a temperatura não seja excessivamente alta;

• gases – para indicar materiais com ponto de fusão extremamen-


te baixo e alta pressão de vapor50, tais como o hidrogênio mo-
lecular, o hélio e o neônio, que tendem a permancer no estado
gasoso, a não ser que sejam submetidos a pressões muito altas,
como as existente no interior dos planetas gigantes;

49
Segundo a teoria padrão de formação do universo, conhecida como Teo-
ria do Big Bang, apenas hidrogênio, hélio e pequenos traços de Lítio foram
formados na nucleossíntese primordial, alguns minutos após a “Grande
Explosão” (Big Bang) que originou o universo. Todos os elementos mais pe-
sados foram formados posteriomente, por meio de reações termonucleares
que ocorrem no núcleo das estrelas, ou em explosão de supernovas.

50
A pressão de vapor é uma medida da tendência de evaporação de um
líquido: quanto maior sua pressão de vapor, mais volátil é o líquido.

82 Introdução à Astronomia
• gelos – para designar compostos como a água, metano, amônia,
sulfeto de hidrogênio e gás carbônico, que tem ponto de fusão
de algumas poucas centenas de Kelvins e cujo estado depende
das condições de pressão e temperatura do ambiente, sendo en-
contrados nos três estados sólido (gelo), líquido ou gasoso em
diversos locais do sistema solar.

• voláteis – termo usado para designar, genericamente, tanto os


gases como os gelos, os quais, submetidos a temperaturas me-
dianas, como as encontradas na superfície da Terra, e pressões
não muito altas “volatilizam”, ou seja, tendem a permanecer no
estado gasoso.

2.4 O Sol

Figura 2.3: imagem do Sol no


dia 07/03/12, obtida na faixa
do visível, mostrando algumas
manchas solares.

Fonte: <www.spaceweather.
com>.

O Sol é a estrela mais próxima da Terra, tão próxima que perma-


necemos ligados a ela. Ele se situa a uma distância de cerca de
150 milhões de quilômetros da Terra, a qual é usada para definir
uma unidade de distância muito utilizada no estudo do sistema

O Sistema Solar 83
solar: a “unidade astronômica”, abreviada como “UA”, ou “AU”
(em inglês)51.

Como todo estrela, o Sol é uma imensa esfera de gás incandescente,


em sua maior parte ionizado, constituindo assim um plasma52, no
qual efeitos magnéticos são muito importantes, sendo os respon-
sáveis, p. ex., pelas manchas solares, mais escuras, que se mantém
mais frias que o entorno devido à presença de campos magnéticos
intensos que mantém a região da mancha relativamente isolada do
restante, recebendo menos calor do interior solar (figura 2.3).

No núcleo do Sol ocorre o processo físico que é a principal ca-


racterística de uma estrela durante sua vida normal e o grande
responsável pelo sua fantástica emissão de energia: reações nucle-
ares de fusão de elementos mais leves em elementos mais pesados,
que transformam massa em energia de maneira muito eficiente, de
acordo com a famosa equação formulada por Einstein: E = mc2. No
caso do Sol, a temperatura no núcleo chega a 15 milhões de graus
Celsius e é suficiente para sustentar reações termonucleares de fu-
são de hidrogênio em hélio, liberando uma imensa quantidade de
energia. A potência radiante total emitida pelo Sol, chamada pelos
astrônomos luminosidade, é de 3,90 x 1026 W.

Essa energia liberada pelo Sol ilumina e aquece os demais astros que
compõem o sistema solar, e, chegando à Terra, constitui a grande
fonte de energia necessária ao sustento da vida em nosso planeta.

A superfície visível do Sol é delimitada por uma camada denomina-


da “fotosfera”, a partir da qual o plasma solar se torna mais trans-
parente e a luz emitida pelas camadas interiores consegue escapar
para o espaço, chegando a Terra em cerca de 8 minutos. A espessura
da fotosfera é de cerca de 500 km – muito fina em comparação ao
tamanho do Sol – e sua temperatura é de cerca de 5.500 ºC.

51
Mais precisamente, 1 AU = 1,4959789 x 1011m, que corresponde à distân-
cia média da Terra ao Sol.

52
Gás de partículas ionizadas.

84 Introdução à Astronomia
O Sol apresenta seis camadas principais: núcleo, onde ocorrem as
reações termonucleares de geração de energia a partir da matéria;
zona radiativa, na qual a energia é transportada principalmente por
meio da radiação; zona convectiva, onde a energia é predominan-
temente transportada por convecção; fotosfera; cromosfera e coroa
(figura 2.4).

A cromosfera e coroa são regiões mais externas pouco densas e que


emitem bem menos luz que a fotosfera na faixa do visível, sendo
normalmente ofuscadas por esta. Contudo, durante os eclipses sola-
res totais é possível observá-las (figura 2.5)

Figura 2.4: Principais camadas


do Sol.

Fonte: <http://astro.if.ufrgs.br/
esol/esol.htm>

Figura 2.5: Imagens da cromosfe-


ra e coroa solares durante eclipse
solar total. A cromosfera é a fina
camada rosada que aparece na
imagem à esquerda e a coroa é
vista na imagem à direita.

Fonte: MrEclipse.com, <http://


www.mreclipse.com/SEphoto/
TSE2001/TSE2001galleryB.html>

O Sistema Solar 85
O Sol tem um raio de aproximadamente 6,96 x 105 km ≈ 700.000
km – bem maior que o radio da órbita da Lua em torno da Terra (≈
380.000 km) – sendo cerca de 110 vezes maior que o terrestre, o que
significa que seu volume é mais de um milhão de vezes maior que o
da Terra (V ∞ R3). Por sua vez, sua massa, de 2,0 x 1030 kg, é cerca
de 300.000 vezes maior que a terrestre.

O Sol é uma estrela mediana. Na verdade, ele se acha um pouco aci-


ma da média em termos de massa, pois a grande maioria das estrelas
são anãs vermelhas, com massas menores que a do nosso Sol, mas
há também estrelas bem maiores que ele.

2.5 O Sistema Solar Interior

O sistema solar interior corresponde à região do sistema solar mais


interna e mais próxima ao Sol, cujo limite externo é constituído pelo
cinturão principal de asteróides, que fica entre as órbitas de Marte
e Júpiter. Os astros desta região, planetas, suas luas, e asteróides,
se caracterizam por serem constituídos principalmente de rochas e
metais e quase não apresentarem substâncias voláteis, como gases e
gelos (veja seção 2.3).

2.5.1 Os Planetas Terrestres

Devido à sua composição predominantemente rochosa, os quatro


planetas dentro desta região – Mercúrio, Vênus, Terra e Marte – pos-
suem densidades relativamente altas, da ordem de 4 x 103 kg/m3 ou
mais. Eles também apresentam tamanhos relativamente semelhantes
(figura 2.6), sendo bem menores que os 4 gigantes gasosos – Júpiter,
Saturno, Urano e Netuno – situados no sistema solar exterior. Eles
possuem poucas ou nenhuma lua e não possuem anéis. Sua estrutura
geológica apresenta crosta, manto e núcleo, os dois primeiros for-
mados tipicamente por silicatos e o núcleo sendo metálico, constitu-
ído principalmente por ferro e níquel. Três deles possuem atmosfera
suficiente para produzir fenômenos meteorológicos – Vênus, Terra e
Marte. Todos apresentam algum sinal de tectonismo, como vulcões
ou fraturas na crosta.

86 Introdução à Astronomia
Figura 2.6: Planetas do sistema
solar interior: Mercúrio, Vênus,
Terra e Marte, na mesma escala
de tamanho.

Fonte: <http://en.wikipedia.
org/wiki/File:Terrestrial_pla-
net_size_comparisons.jpg>

A Terra, o nosso planeta, é o maior dos quatro planetas rochosos. Por


ser considerada um protótipo desta categoria, os planetas do sistema
solar interior também costumam ser denominados, de maneira ge-
nérica, como “planetas terrestres” ou “planetas telúricos”. Contudo, a
Terra apresenta características únicas: só ela apresenta, atualmente,
atividade geológica e movimento de placas tectônicas, água líquida
em sua superfície, oxigênio livre em sua atmosfera e, sobretudo, é o
único em que há a comprovada presença de vida53.

Quanto aos satélites naturais, a Terra também é única: somente ela


apresenta um satélite natural de tamanho considerável, com autogra-
vidade suficiente para assumir forma esférica e de tamanho compa-
rável ao do planeta – a nossa Lua, cujo diâmetro é apenas cerca de 4
vezes menor que o terrestre. Marte apresenta dois satélites naturais:
Fobos e Deimos, mas estes são de pequenas proporções e parecem ser
apenas pequenos asteróides que foram capturados pelo planeta.

2.5.2 Os Asteróides

Constituindo o cinturão de asteróides há milhões de corpos rocho-


sos e/ou metálicos de proporções que vão desde algumas centenas
de quilômetros, até algumas dezenas de metros, sendo os menores
muito mais abundantes. Ceres, o maior deles, como 952 km de diâ-

53
Vale a pena notar que ainda acha-se em aberto a possibilidade de pre-
sença de vida microscópica em Marte, sobretudo porque foram descobertas
fortes evidências de que já houve água liquida em sua superfície e que ela
continua existindo ainda hoje em alguns locais de seu subsolo (WIKIPEDIA.
ORG, acesso em 27 mar 2012). A investigação sobre a possível presença de
vida em Marte, e em outros astros do sistema solar, é um dos principais
temas de interesse na exploração do sistema solar.

O Sistema Solar 87
metro, recentemente, em 2006, foi classificado como planeta anão
pelo fato de possuir autogravidade suficiente para assumir uma for-
ma esférica. Quase todos os demais possuem formas irregulares, com
grande quantidade de crateras em suas superfícies (figura 2.7). A
grande maioria fica situada entre as órbitas de Marte e Júpiter, entre
2,3 a 3,3 AU, contudo alguns possuem órbitas mais excêntricas e
cruzam a região onde ficam situados os planetas do sistema solar
interior, havendo risco de colisão, inclusive com a Terra. Por esse
motivo, aqueles cujas órbitas interceptam a da Terra, denominados
NEOs (Near Earth Objects) vem sendo monitorados para se avalie
com antecedência a possível ameaça que possam trazer. Acredita-se
que colisões com asteróides de grande tamanho, ocorridas no pas-
sado, tenham desempenhado um papel crucial na evolução da vida
na Terra, promovendo a extinção de diversas espécies, como as dos
dinossauros, há 65 milhões de anos atrás.

Figura 2.7: Asteróide Gaspra:


um asteróide típico, com forma
irregular, dimensões da ordem
de 19x12x11 km, coberto de
crateras.

Fonte: NASA, <http://solarsys-


tem.nasa.gov/multimedia/dis-
play.cfm?Category=Planets&IM_
ID=1925>

Acredita-se que os asteróides sejam fragmentos que restaram da


época de formação do sistema solar, a 4,6 bilhões de anos atrás,
os quais, devido à forte influência gravitacional de Júpiter, jamais
puderam se juntar para formar um planeta. Devido à influência de
Júpiter, os embriões de planetas em formação, denominados “pla-
netesimais”, que existiam na região entre as órbitas de Marte e Jú-
piter à época da formação do sistema solar, teriam colidido entre
si, fragmentando-se e originando o atual cinturão de asteróides. A

88 Introdução à Astronomia
atual massa total dos asteróides é pequena. Mesmo que juntássemos
todos eles, a massa total seria menor que a da nossa Lua.

Curiosamente, já são conhecidos mais de 150 asteróides que apre-


sentam luas, ou seja, pequenos corpos que os acompanham e se
mantém a eles ligados por atração gravitacional, ou então forman-
do sistemas de mais de um corpo de tamanho semelhante que se
mantém ligados, orbitando em torno do centro de massa do sistema
(figura 2.8).

Figura 2.8: Asteróide Ida acom-


panhado de sua lua Dáctil, à di-
reita. Ida tem dimensões de cerca
de 58 km de comprimento por 22
km de largura, enquanto Dactyl
tem um diâmetro da ordem de
1,5 km.

Fonte: NASA, <http://solarsys-


tem.nasa.gov/multimedia/display.
cfm?IM_ID=2083>.

2.5.3 O sistema solar interior e a formação do sistema solar

O fato de os astros do sistema solar interior serem constituídos prin-


cipalmente por rochas e metais e poucos elementos voláteis (veja se-
ção 2.3) é bem explicado pela chamada teoria (ou hipótese) nebular
de formação do sistema solar, segundo a qual o sistema se formou a
partir de uma grande nuvem fria de gás e poeira interestelar (uma nu-
vem molecular, veja seção 2.3) que, por colapso gravitacional, se con-
traiu, formando uma concentração maior de matéria em seu centro, a
qual se aqueceu pela conversão de energia potencial gravitacional em
energia térmica durante a queda em direção ao centro, originando o
Sol. Em torno do proto-sol, devido à conservação do momento
angular durante a queda em direção ao centro, a nuvem passou a girar
mais rápido, se achatando e originando um disco de gás e poeira em
rotação em torno do proto-sol, chamado disco protoplanetário (figura

O Sistema Solar 89
2.9). Quando o Sol começou a brilhar com mais intensidade, devido
ao início das reações termonucleares de fusão de hidrogênio em hélio
em seu núcleo, a intensa radiação luminosa, o vento solar54 e a alta
temperatura varreram os elementos e substâncias mais voláteis da
região central do disco, onde se formaram os planetas terrestres e os
planetesimais55 que originaram os asteróides, fazendo com que a ma-
téria que se agregou e os formou nesta região – o atual sistema solar
interior – fosse constituída primordialmente por rochas e metais. A
distâncias maiores do Sol, a partir da atual órbita de Júpiter, os gases
mais leves e abundantes, como o hidrogênio, o hélio e outros mate-
riais voláteis, como o metano, a amônia e a água, não foram varridos
e se acumularam, originando os planetas gigantes e suas luas.

Figura 2.9: Concepção artística


do processo de formação de pla-
netas e planetesimais a partir de
um disco de gás e poeira girando
em torno de um proto-sol.

Fonte: NASA, <http://photo-


journal.jpl.nasa.gov/catalog/
PIA07335>.

54
O vento solar é formado por partículas, principalmente prótons
e elétrons, constantemente emitidas pelo Sol, bem como por outras
estrelas, sendo então chamado vento estelar.

53
Segundo a teoria de formação dos planetas por acreção de matéria
a partir de um disco protoplanetário, diversos corpos, denominados
planetesimais, com tamanho da ordem de alguns quilômetros, se
formaram por aglutinação de matéria e corpos menores deste disco.
A aglomeração e fusão de planetesimais por atração gravitacional,
por sua vez, teria originado os protoplanetas e os asteróides maiores.
Os asteróides menores teriam se originado de colisões fortes entre
planetesimais, induzidas por Júpiter, nas quais o resultado, em vez de
aglutinação, foi de fragmentação.

90 Introdução à Astronomia
2.5.4 A Terra e a Lua: uma comparação

A Lua é o corpo celeste mais próximo de nós. Sua forma é esférica e


ela acha-se, de fato, tão próxima, em comparação com as distâncias
que separam a Terra dos demais astros, que se mantém permanen-
temente ligada ao nosso planeta, pela ação de forças gravitacio-
nais, descrevendo uma trajetória quase circular em torno da Terra,
levando cerca de um mês para completá-la. Ela fica situada a uma
distância média de 380.000 km, o que representa cerca de 30 vezes
o diâmetro terrestre (figura 2.11).

Figura 2.10: O sistema Terra-Lua


visto do espaço, pela astronave
Galileu, em 1992. Note como
seus tamanhos são comparáveis,
formando um “planeta duplo”.

Fonte: NASA, <http://solarsys-


tem.nasa.gov/multimedia/
display.
cfm?Category=Planets&IM_
ID=1879>.

Como ela gira em torno da Terra, ela é um satélite de nosso plane- Figura 2.11: Sistema Terra-Lua
ta − o único satélite natural da Terra −, embora alguns astrônomos visto em escala correta de ta-
atuais prefiram considerá-la não mais como apenas um satélite, mas manhos e distância. A distância
como um verdadeiro planeta irmão da Terra. Isso porque seu tama- entre elas corresponde a cerca de
nho é menor que o do nosso planeta, mas não muito: seu 30 vezes o diâmetro da Terra.
diâmetro, que é de 3.476 km, é cerca de 4 vezes menor que o da
Terra, cujo diâmetro mede 12.756 km, e sua massa é cerca de 80 Fonte: Wikipedia, <http://
vezes menor que a do nosso planeta. Comparando-se esta proporção en.wikipedia.org/wiki/File:Earth_
de tamanhos com a que existe no caso de outros planetas do sistema Moon_Scale.jpg>.
solar e seus satélites, constatamos que ela é uma exceção: em geral
os planetas são muito maiores que suas respectivas luas. Por isso
alguns astrônomos, atualmente, preferem pensar na Terra e na Lua
como se fossem um sistema de dois planetas, ou seja um “planeta

O Sistema Solar 91
duplo” (figura 2.10). De fato, a nossa Lua é maior que Plutão – atu-
almente classificado como planeta anão – e apenas um pouco menor
que Mercúrio, o menor dos planetas do sistema solar. É interessante
notar também que, rigorosamente, devido à proporção que há entre
suas massas, a Lua não gira em torno do centro da Terra, mas sim
Terra e Lua giram em torno de um ponto que, em Física, é de-
nominado “centro de massa” do sistema (Terra-Lua), o qual se situa
sempre abaixo da superfície da Terra (cerca de 1.700 km), mas não
coincide exatamente com o seu centro.

Figura 2.12: Paisagem lunar típi-


ca: um deserto cheio de crateras.
A cratera Copérnico, com 93
km de diâmetro, é vista no topo,
quase no horizonte. Em primeiro
plano, a cratera Pytheas, com 20
km de diâmetro.

Fonte: NASA, <http://solarsys-


tem.nasa.gov/multimedia/gallery/
Copernicus.jpg>

Entretanto as diferenças entre Terra e Lua são notáveis, como se


pode perceber, por exemplo, quando comparamos fotos da superfí-
cie da Lua com as paisagens que observamos na Terra. O aspecto da
superfície da Lua é o de um deserto, completamente seco e sem ar,
com um céu negro e um solo completamente coberto por crateras de
todos os tamanhos (figura 2.12). Qual a razão de tanta diferença com
relação à Terra?... Há apenas uma razão física principal: o fato de a
massa da Lua ser menor que a da Terra, o que faz com a sua gravi-

92 Introdução à Astronomia
dade seja cerca de 6 vezes menor que a terrestre, e também com que
o núcleo da Lua já tenha esfriado, há bilhões de anos atrás, enquanto
que o da Terra até hoje permanece aquecido, há uma temperatura de
cerca de 5.000 ºC.

O fato de o núcleo da Lua já ter esfriado, faz com qualquer atividade


vulcânica ou tectônica (tão importantes como agentes de transfor-
mação da superfície da Terra) já tenham cessado de ocorrer na Lua a
bilhões de anos atrás. Por sua vez, a gravidade pequena da Lua não
é suficiente para reter uma atmosfera. Os gases (inclusive o vapor
d’água) que eventualmente possam ter existido quando de sua for-
mação, ou no tempo em que ela era mais jovem, foram totalmente
perdidos para o espaço, há bilhões de anos. Assim, sem atmosfera,
sem ventos, sem chuvas, sem erosão pela água ou pelo gelo, e sem
qualquer atividade vulcânica ou tectônica, a superfície da Lua per-
manece deserta e praticamente inalterada há muitos milhões de anos,
evidentemente sem oferecer quaisquer condições favoráveis à vida.
O único evento que atualmente concorre para uma lentíssima trans-
formação de sua superfície e para uma pequena erosão é a queda
de meteoritos, a maioria deles muito pequenos, microscópicos (que,
aqui na Terra, nem chegariam a atingir a superfície, uma vez que se
desintegrariam ao atravessar a atmosfera) e que são os responsáveis
pela aparência típica de sua superfície: repleta de crateras. Toda a
superfície lunar é recoberta por uma camada de regolito, constituída
de pequenos fragmentos de rocha, poeira e minúsculas esferas de
vidro, originados no impacto destes meteoritos e micrometeoritos
sobre a sua superfície. A profundidade desta camada varia desde
alguns poucos metros, nos chamados “mares” (grandes planícies que
foram recobertas por lava a bilhões de anos atrás), até dezenas de
metros, nas terras altas e montanhosas mais antigas.

Na Terra também já caíram e ainda caem muitos meteoritos, porém


sua atmosfera e o dinamismo de sua superfície, ao longo de alguns
milhares ou poucos milhões de anos (um tempo muito curto quando
comparado com a idade da Terra, estimada em 4,5 bilhões de anos)
é suficiente para apagar quase completamente os vestígios destas
colisões, mesmo das maiores.

O Sistema Solar 93
2.6 O sistema Solar Exterior

O sistema solar exterior corresponde à região que se inicia após o


cinturão de asteróides e vai até a órbita de Netuno, o último dos pla-
netas. Nela se destacam os quatro planetas denominados “gigantes
gasosos” – Júpiter, Saturno, Urano e Netuno (figura 2.13) –, suas
inúmeras luas e anéis. Além desses astros principais, também ha-
bitam essa região diversos corpos menores do sistema solar, como
cometas de curto período e os chamados centauros – astros cuja
natureza é intermediária entre a dos asteróides e dos cometas.

Os corpos desta região apresentam uma constituição em que predo-


minam substâncias que os astrônomos costumam, genericamente,
denominar “voláteis”, que possuem baixo ponto de fusão, como o
Figura 2.13: Interior dos plane- hidrogênio, hélio, amônia, metano e água (figura 2.13).
tas gigantes do sistema solar:
Júpiter e Saturno são compostos
principalmente por hidrogênio e
hélio com uma extensa camada
interna composta principalmente
por hidrogênio molecular (H2)
líquido e outra, mais interna,
onde, devido à altíssima pressão,
há hidrogênio metálico. Urano e
Netuno, embora também tenham
bastante hidrogênio e hélio,
possuem um percentual maior
de “gelos” – água (H2O), amônia
(NH3) e metano (CH4). No centro Eles contrastam, neste aspecto, com a constituição dos astros que
de todos eles, se supõe, deve habitam o sistema solar interior, predominantemente formados por
haver um núcleo rochoso. Uma rochas e metais. Essa segregação em termos de constituição se expli-
imagem da Terra é mostrada no ca pela proximidade maior ou menor ao Sol: mais próximo ao Sol,
topo, à direita, numa escala real tanto atualmente como na época de formação do sistema solar, a
de tamanho, para comparação temperatura é mais alta, tornando mais difícil aos elementos voláteis
com os gigantes. se condensarem e serem incorporados aos astros que ali se forma-
ram; já nas regiões mais afastadas do Sol, a temperatura é menor e
Fonte: NASA, <http://sse.jpl.nasa. os voláteis – muito abundantes no universo – puderam se condensar
gov/multimedia/display.cfm?IM_ e/ou serem incorporados à constituição dos astros, originando os
ID=166>. planetas com maior massa do sistema solar – os gigantes gasosos.

94 Introdução à Astronomia
2.6.1 Os planetas gigantes

Os quatro gigantes gasosos, em verdade, podem ser divididos em


dois subgrupos: um deles formado por Júpiter e Saturno, que real-
mente merecem ser denominados “gasosos”, uma vez que são predo-
minantemente constituídos por hidrogênio e o hélio, e o outro sub-
grupo, formado por Urano e Netuno, que apresentam um percentual
maior de voláteis que os astrônomos costumam denominar “gelos”
(seção 2.3), como a água, amônia e metano (figura 2.13), sendo, por
este motivo, também denominados “gigantes gelados”.

Figura 2.14: Planetas do sistema


solar exterior: os quatro gigan-
tes gasosos – Júpiter, Saturno,
Urano e Netuno em escala cor-
reta de tamanhos.

Fonte: NASA, <http://sse.jpl.


nasa.gov/multimedia/display.
cfm?IM_ID=166>.

Todos os quatro gigantes têm tamanho e massa bem maiores que os


planetas terrestres. Júpiter, o maior de todos os planetas do sistema
solar, tem diâmetro 11 vezes maior que o da Terra e massa 318 vezes
maior que a terrestre. Sua massa é 2,5 vezes maior que a de todos os
demais planetas juntos. Por ser o mais notável dos planetas gigantes
e servir de modelo para estes, os quatro gigantes gasosos também
são denominados planetas “jovianos”, em referência à Júpiter, tam-
bém chamado Jovis, em latim, assim como os quatro planetas do sis- Figura 2.15: Saturno e seu espe-
tema solar interior também são chamados “terrestres”, em referência tacular sistema de anéis, foto-
à Terra, que lhes serve de modelo. grafado pela astronave Cassini,
em 2004. No alto percebe-se
a sombra dos anéis projetada
sobre o planeta e, à esquerda,
a sombra do planeta projetada
sobre os anéis.

Fonte: NASA, <http://solarsys-


tem.nasa.gov/multimedia/dis-
play.cfm?IM_ID=8983>.

O Sistema Solar 95
Saturno tem massa 95 vezes maior que a terrestre e tem como ca-
racterística mais marcante a presença de um extenso e complexo
sistema de anéis (figura 2.15), constituído de fragmentos de gelos e
rochas, principalmente gelo de água, que orbitam o planeta como se
fossem pequenas luas, ou seja, os discos não apresentam uma estru-
tura sólida, ou contínua, mas sim são feitos de inúmeros fragmentos
que orbitam o planeta. Os tamanhos desses fragmentos variam desde
mícrons até alguns metros. Os anéis se estendem por centenas de mi-
lhares de quilômetros, mas são extremamente finos, apresentando,
em geral, um espessura da ordem de apenas uma dezena de metros
(NASA, acesso em 6 fev 2012). Todos os demais gigantes também
apresentam anéis, porém muito menores e menos notáveis que os
de Saturno.

Urano e Netuno – os gigante gelados – apresentam, respectivamente,


massas cerca de 14 e 17 vezes maiores que a da Terra. Urano, embora
tenha um diâmetro um pouco maior que o de Netuno, apresenta me-
nor densidade que este e tem um núcleo mais frio que os dos demais
gigantes, irradiando muito pouco calor para o espaço. Ele apresenta
como característica única um eixo de rotação extremamente incli-
nado, situando-se praticamente sobre o plano de sua órbita, possi-
velmente consequência de uma colisão com outro astro com dimen-
sões de um planeta no período inicial de formação do sistema solar.
A grande inclinação de seu eixo produz uma enorme diferença de
iluminação de seus hemisférios pelo Sol ao longo de sua órbita em
torno deste astro, que leva 84 anos para ser completada.

Netuno, apesar de ser o mais distante dos planetas e receber menos


energia do Sol, irradia mais calor para o espaço que Urano e apre-
senta uma surpreendente atividade em sua atmosfera, onde surgem
ciclones com ventos de até 1.200 km/h (figura 2.16).

A coloração azulada, tanto de Netuno como de Urano deve-se à


presença de metano em suas atmosferas, o qual absorve a parte ver-
melha do espectro visível e reflete o azul.

96 Introdução à Astronomia
Figura 2.16: Netuno em imagem
obtida pela astronave Voyager
II, a única que passou próxi-
mo a ele, em 1989. No centro,
bem visível, a chamada grande
mancha escura de Netuno, um
grande ciclone, do tamanho da
Terra, com ventos de até 1.200
km/h, que havia na atmosfera do
planeta na ocasião desta passa-
gem da Voyager II. Atualmente
essa mancha não existe mais,
mas outras manchas similares já
surgiram e desapareceram.

2.6.2. Cometas Fonte: NASA, <http://solarsys-


tem.nasa.gov/multimedia/display.
Os cometas, também considerados corpos menores do sistema solar, cfm?IM_ID=2424>.
são astros que possuem um núcleo da ordem de alguns quilômetros
ou poucas dezenas de quilômetros, constituído, por gelos, poeira e pe-
quenos fragmentos rochosos fracamente ligados (seguindo o modelo
da chamada “bola de neve suja”), cuja origem remonta ao período de
formação do sistema solar. Por esse motivo, seu estudo tem grande Figura 2.17: Núcleo do cometa
importância no sentido de revelar a constituição e as condições exis- Halley, o mais famoso dos co-
tentes na chamada nebulosa solar primitiva e no disco protoplanetário56, metas. Imagem obtida pela as-
a partir do qual se formaram o sistema solar e os planetas. tronave Giotto, a primeira a se
aproximar e fotografar o núcleo
de um cometa, em 1986. Gases
e poeira aparecem, à esquer-
da, sendo ejetados pelo núcleo
do cometa para a sua coma. O
núcleo tem um comprimento de
cerca de 15 km.

Fonte: NASA, <http://solarsys-


tem.nasa.gov/multi media/dis-
play.cfm?Category=Planets&IM_
ID=11423>

56
Ver item 2.5.3.

O Sistema Solar 97
A órbita dos cometas, tipicamente, é uma elipse com grande ex-
centricidade (grande achatamento), cujo ponto de maior apro-
ximação ao Sol, denominado periélio, acha-se no sistema solar
interior. Ao se aproximarem do periélio, o aquecimento do núcleo
cometário produzido pela radiação solar mais intensa faz com
que os gelos em sua superfície sublimem, passando para o estado
gasoso, carregando consigo poeira e formando, em torno do nú-
cleo, uma imensa e tênue atmosfera, chamada cabeleira (coma).
Os gases e poeira da cabeleira são empurrados pela pressão da
radiação e pelo vento solar no sentido contrário ao que se encon-
tra o Sol, formando uma imensa cauda, que pode se estender por
milhões de quilômetros, mas é extremamente rarefeita (figuras
2.18 e 2.19).
Figura 2.18: Cometa NEAT, des-
coberto em 2001 pelo sistema de
monitoramento Near Earth Aste-
roid Tracking (NEAT). Na imagem
é possível perceber as principais
partes de um cometa: núcleo,
coma e cauda.

Fonte: NASA, <http://solarsys-


tem.nasa.gov/multimedia/display.
cfm?IM_ID=2323>.

Figura 2.19: Cometa McNaught,


o mais brilhante das últimas
décadas, com sua imensa cauda
(mais de 100 milhões de km), fo-
tografado ao pôr-do-sol sobre o
Oceano Pacífico, em 2007. O Sol
é o astro à direita.

Fonte: NASA, <http://solarsys-


tem.nasa.gov/multimedia/display
.cfm?Category=Planets&IM_
ID=10194>.

98 Introdução à Astronomia
Os cometas são divididos em cometas de período curto, que demo-
ram menos de 200 anos para completar uma volta em torno do Sol,
como o Halley, que demora cerca de 76 anos57, e os de período lon-
go, que podem levar milhares ou milhões de anos para retornar. Há
ainda cometas com trajetórias hiperbólicas, cuja órbita deve ter sido
perturbada por algum planeta, e que jamais retornam ao sistema
solar interior, sendo ejetados do sistema solar.

Acredita-se que os cometas de curto período, que passam a maior par-


te do tempo na região do sistema solar exterior, são corpos originários
da região onde se situa Plutão, o chamado Cinturão de Kuiper58, os
quais, por alguma eventual perturbação gravitacional, como o encon-
tro com outro astro do Cinturão de Kuiper, tem sua órbita desviada
para o sistema solar interior. Já os cometas de período longo devem
provir da região mais afastada do sistema solar – a nuvem do Oort59.

Os cometas periódicos são efêmeros já que a cada passagem próximo


ao Sol se desgastam, perdendo parte de sua massa ao ejetar gás e
poeira, deixando fragmentos ao longo de sua órbita, os quais podem
colidir com a Terra, dando origem às chamadas “chuvas de meteo-
ros“, se a órbita de nosso planeta cruzar com a do cometa. Após um
certo número de passagens o próprio cometa pode se fragmentar e/
ou acabar caindo no Sol ou colidindo com um dos planetas (figura
2.20). Há cerca de 4 bilhões de anos atrás, quando o sistema solar
ainda era jovem60, houve uma fase de grande bombardeamento dos
planetas e suas luas por cometas. Acredita-se que a maior parte das
águas dos nossos oceanos, se não toda, tiveram origem na água
trazida à Terra pelos cometas que com ela colidiram nesta época.
Até mesmo a Lua deve ter recebido água dos cometas dessa mesma
forma, o que explicaria a origem do gelo existente no fundo de al-

57
Sua última passagem pelo periélio ocorreu no início de 1986. A próxima
deverá ocorrer em 2061.

58
Veja item 2.7.1.

59
Veja item 2.7.3.

60
A idade do sistema solar é estimada em 4,5 bilhões de anos.

O Sistema Solar 99
gumas das crateras lunares situadas nas regiões polares, conforme
evidências recentemente obtidas (NASA, acesso em 27 mar 2012).

Figura 2.20: Em 1994 o cometa


Shoemaker-Levy 9 fragmentou-
se (imagem acima) e seus frag-
mentos colidiram com Júpiter,
deixando marcas marrons em sua
alta atmosfera (imagem à direita).

Fontes: NASA, <http://apod.


nasa.gov/apod/ap980728.html>;
Wikimedia, <http://commons.
wikimedia.org/wiki/File:Jupiter_
showing_SL9_impact_sites.jpg>.

2.6.3 Centauros

Os centauros são corpos menores do sistema solar que apresentam


uma natureza dual: ao mesmo tempo possuem características de
asteróides e de cometas, o que os levou a serem batizados com
o nome dos seres mitológicos que eram metade homem, metade
cavalo. Como os asteróides apresentam órbitas que não são ex-
cessivamente excêntricas, mas que, à semelhança dos cometas de
período curto, cruzam órbitas dos planetas gigantes. Por definição
os centauros são astros gelados, a semelhança dos cometas, que se
situam entre os extremos do sistema solar exterior, entre as órbi-
tas de Júpiter e Netuno, e que cruzam a órbita de um ou mais dos

100 Introdução à Astronomia


planetas gigantes. Devido a esse fato, suas órbitas são instáveis em
razão da influência gravitacional dos planetas gigantes, e, com o
passar de alguns milhões de anos, ou são desviados para o siste-
ma solar interior, quando se transformam em cometas, ou colidem
com algum planeta, ou são ejetados para regiões mais distantes do
sistema solar, após um encontro próximo com um dos gigantes,
especialmente Júpiter.

Figura 2.21: Órbita do centauro


Chiron, que cruza as órbitas de
Saturno e Urano, o que a torna
instável.

Fonte: Wikipédia, <http://en.


wikipedia.org/wiki/File:Chiron_
orbit.PNG>

Os centauros passaram a ser considerados como um grupo dis-


tinto a partir da descoberta de 2060 Chiron, em 1977, cuja órbita
situa-se entre as de Saturno e Urano (figura 2.21), com diâmetro
de cerca de 200 km. Ao ser descoberto ele foi classificado como
asteróide, mas em 1989, quando estava próximo de seu periélio,
se observou que ele apresentava uma coma, passando então a ser
classificado também como cometa. Em outros centauros, também
foi observado comportamento semelhante, reforçando a sua natu-
reza dual. A estimativa é de que devam existir cerca de 40.000 cen-
tauros com diâmetro superior a 1 km. O maior deles já descoberto,
10199 Chariklo, possui diâmetro de 258 km.

O Sistema Solar 101


2.7 Região Transnetuniana

Além da órbita de Netuno, situada a 30 UA do Sol, há uma vastíssima


região do sistema solar, em sua maior parte desconhecida e inexplora-
da, denominada região transnetuniana61. Os astros situados nesta re-
gião são genericamente denominados objetos transnetunianos, sendo
conhecidos pela sigla em inglês TNOs (Trans-Neptunian Objects). O pri-
meiro destes objetos a ser descoberto foi Plutão, em 1930, cuja maior
lua, Caronte, só foi detectada em 1978. Somente em 1992 um novo
TNO, denominado 1992 QB1, foi descoberto por astrônomos do Mauna
Kea Observatories, no Havaí. Após essa descoberta, projetos sistemáti-
cos de pesquisa, visando a descoberta de novos astros desta região, co-
meçaram a ser desenvolvidos. Atualmente, mais de mil destes objetos,
como diâmetros variando entre 50 e 2.500 km e constituídos de rochas
e, principalmente, gelos62, já são conhecidos, dos quais os maiores são
Plutão, Eris, Makemake e Haumea, já oficialmente classificados pela
União Astronômica Internacional como planetas anões (figura 2.22).

A região transnetuniana, por sua vez, costuma ser subdividida em


três regiões: o Cinturão de Kuiper, o Disco Disperso e a nuvem de
Oort, que passaremos a descrever.

61
O prefixo “trans” significa “além de” ou “para além de”, o significado de
“região transnetuniana” é, portanto, literalmente “região que fica além de
Netuno”.

62
Veja seção 2.3.

102 Introdução à Astronomia


2.7.1. Cinturão de Kuiper

O cinturão de Kuiper é um anel formado por milhares de objetos feitos


de rochas e gelos que seriam remanescentes da época de formação do
sistema solar, ficando situados a uma distância entre 30 e 55 UA do Sol.
O nome do cinturão é uma homenagem ao astrônomo Gerard Kuiper
que, em artigo de 1951, foi um dos primeiros a apresentar a hipótese de
sua existência. Os objetos que o compõem costumam ser denominados
KBOs, sigla retirada do seu nome em inglês: Kuiper Belt Objects. Os
corpos deste cinturão apresentam órbitas não muito alongadas e que se
concentram em torno do plano da eclíptica, à semelhança do cinturão
de asteróides, entre Júpiter e Marte. Estima-se que existam mais de
100.000 KBOs com mais de 50 km de diâmetro. Sua massa total, contu-
do, não ultrapassaria um décimo da massa da Terra. Os maiores astros
conhecidos deste cinturão são os planetas anões Plutão, Makemake e
Haumea. Acredita-se que os cometas de período curto tenham sua ori-
gem neste cinturão e/ou no disco disperso (veja a seguir). A astronave
New Horizons, que deverá chegar a Plutão em 2015, será a primeira a
explorar de perto alguns corpos desta região.

2.7.2. Disco Disperso

O disco disperso é formado por astros gelados que se supõe tenham


sido lançados (dispersados) para órbitas elípticas mais excêntricas na
região transnetuniana devido à interação gravitacional com os plane-
tas gigantes, e que ainda teriam sua órbitas perturbadas por Netuno.
O periélio63 dos corpos que compõem esse disco em geral situa-se
no interior do cinturão de Kuiper, entre 30 e 35 UA, porém seu afé-
lio64 vai bem além, chegando até a 150 UA. Suas órbitas, em geral,
apresentam grande inclinação com relação ao plano da eclíptica. O
maior dos representantes conhecidos deste disco é Eris, com tamanho
semelhante ao de Plutão65, e também oficialmente classificado como
planeta anão.

63
Ponto da órbita mais próximo ao Sol.

64
Ponto da órbita mais distante do Sol.

65
O que contribuiu fortemente para a reclassificação de Plutão como pla-
neta anão (veja seção 2.3).

O Sistema Solar 103


2.7.3 A Nuvem de Oort

Em 1950, o astrônomo holandês Jan Hendrik Oort, para explicar


a origem dos cometas de período longo (item 2.6.2), cujas órbitas
apresentam uma orientação aleatória que não se situa no plano da
eclíptica, formulou a hipótese de que os mesmos seriam originá-
rios de uma região muito distante, com simetria esférica e raio de
cerca de 20.000 UA, que seria o repositório de milhões de núcleos
cometários. Como as órbitas cometárias são instáveis e os cometas
se desgastam a cada passagem66, eles não poderiam ter se formado
nas atuais órbitas, sendo necessário presumir a existência desse re-
positório, que passou a ser denominado Nuvem de Oort (figura 2.23).

Figura 2.23: Nuvem de Oort:


imensa “nuvem” esférica con-
tendo até um trilhão de núcleos
cometários. Segundo se acredita
eles teriam sido formados em
regiões mais internas, mas foram
ejetados para esta região distante
em consequência de interações
gravitacionais com os planetas
gigantes. O zoom no centro da
nuvem mostra como as dimen-
sões do sistema solar exterior
e do cinturão de Kuiper seriam
modestas em comparação com a
nuvem do Oort, que se estenderia
até cerca 100.000 UA, que cor-
responde a quase dois anos-luz,
distância que representa o limite É importante notar que a nuvem de Oort consiste apenas numa hipótese
de nosso sistema solar, a partir da plausível, mas cuja comprovação observacional ainda não existe, dada
qual a influência gravitacional do sua imensa extensão, enorme distância ao Sol e pequenas dimensões
Sol não mais seria predominante. dos núcleos cometários, que impedem sua detecção. Segundo se acredi-
ta atualmente, a nuvem de Oort poderia conter até um trilhão de núcle-
Fonte: NASA, <http://solarsys- os cometários, teria uma região mais interna, situada a cerca de 20.000
tem.nasa.gov/multimedia/display. UA, cuja simetria seria semelhante a de um anel grosso ou “rosca”, e
dfm?Category=Planets&IM_ uma região mais externa, com simetria esférica, que se estenderia até
ID=10195>.
66
Veja item 2.6.2.

104 Introdução à Astronomia


100.000 UA (figura 2.23). O limite externo da nuvem de Oort correspon-
deria ao próprio limite externo do sistema solar.

Segundo as teorias atuais acerca da formação do sistema solar, acredita-


-se que o núcleos cometários da nuvem de Oort não teriam se formado
na região remota em que se encontram atualmente, uma vez que a den-
sidade de matéria nesta região seria muito baixa, mas, ao contrário, em
regiões bem mais internas, onde também se encontravam os planetas
gigantes, os quais, devido à sua grande massa e gravidade, ao ocorrer
encontros próximos com os núcleos cometários, seriam os responsáveis
por lançá-los até a região da nuvem de Oort (MORBIDELLI, acesso em
30 mar 2012). Segundo esta hipótese, os bilhões de núcleos cometários
da nuvem de Oort nada mais seriam do que planetesimais formandos
em regiões mais internas do sistema solar que foram ejetados para lon-
ge durante o processo em que os planetas gigantes “limparam” suas
órbitas. Processo esse que também teria produzido uma migração dos
planetas gigantes, especialmente, Netuno, de uma formação com órbi-
tas mais compactas e próximas ao Sol para suas posições atuais67.

2.7.4 Sedna

Sedna, descoberto em 2003, é um objeto transnetuniano, com mais de


1.000 km de diâmetro, que, de todos os objetos atualmente conhecidos
do sistema solar, afora objetos menores, como os cometas de período
longo, é o que atinge a maior distância ao Sol. Sua órbita elíptica apre-
senta grande excentricidade (0,85). Seu periélio fica a uma distância de
76 UA que é cerca de 2.5 vezes o raio da órbita de Netuno e seu afélio
fica a quase 1.000 UA – muito além do cinturão de Kuiper e dos astros
do disco disperso (figura 2.24) –, levando mais de 10.000 anos para
completar uma volta em torno do Sol. Contudo, ainda assim, ele não
atinge a região da hipotética nuvem do Oort. Desta forma não é possível
classificá-lo, legitimamente, como objeto pertencente a qualquer uma
das três principais sub-regiões da região transnetuniana anteriormente
apresentadas. Com órbita semelhante a dele, há apenas pouquíssimos
outros objetos transnetunianos menores atualmente conhecidos. Em
verdade, como dissemos no inicio desta seção, a imensa região transne-

67
Veja, por exemplo, artigos sobre o chamado Modelo de Nice (WIKIPEDIA.
ORG, acesso em 30 mar 2012; GOLDMAN, acesso em 30 mar 2012; MORBI-
DELLI, acesso em 30 mar 2012).

O Sistema Solar 105


tuniana ainda é pouquíssimo conhecida e explorada. Afora a descoberta
de Plutão, em 1930, praticamente, só a partir dos anos 1990 essa região
começou a ser revelada e investigada. Como os astros que nela se situ-
am são remanescentes da época da formação do sistema solar, o estudo
de suas características dinâmicas, físicas e químicas deverá fornecer,
e já vem fornecendo, pistas importantíssimas para a compreensão do
processo de formação e evolução do nosso sistema solar.

Figura 2.24: Regiões do sistema A figura 2.24, a seguir, que visa localizar a órbita de Sedna no contexto
solar em escalas de distância do sistema solar, com quatro quadros em diferentes escalas de distância,
cada vez maiores, situando a evidenciando o quanto se deve ampliar a escala de distâncias quando
órbita de Sedna. A partir do topo, passamos de cada uma regiões mais internas para a região seguinte,
à esquerda, no sentido horário: mais externa, representa uma boa síntese da estrutura espacial do siste-
sistema solar interior; sistema so- ma solar que apresentamos neste capítulo.
lar exterior e cinturão de Kuiper,
com indicação da atual posição Após a figura, como fechamento do capítulo, visando complementar
de Sedna, perto de seu periélio, a e aprofundar o estudo do conteúdo nele abordado, apresentamos duas
uma distância do Sol maior que sugestões de atividades.
duas vezes o raio da órbita de
Netuno; órbita elíptica de Sedna,
bastante excêntrica, que vai mui-
to além do cinturão de Kuiper;
órbita de Sedna em comparação
com a região mais interna da
nuvem de Oort. A sucessão de
quadros apresentados têm lados
medindo, respectivamente, cerca
de 10 UA, 100 UA, 1000 UA e
20.000 UA. Acredita-se que a
região mais externa da nuvem do
Oort tenha um raio de 100.000
UA. Para mostrá-la seria neces-
sário mais um quadro com escala
de distâncias 10 vezes maior que
a do último.

Fonte: <http://commons.wikime-
dia.org/wiki/File:Oort_cloud_Sed-
na_orbit.jpg>.

106 Introdução à Astronomia


2.8 Atividades Complementares

2.8.1 Montagem de um sistema solar em escala.

Como forma de tornar mais sensível e concreta a noção da escala


correta de tamanhos e distâncias do sistema solar, permitindo per-
ceber a enorme dimensão do universo, mesmo quando nos atemos
somente à nossa vizinhança cósmica mais próxima, representada
pelos astros do sistema solar, uma atividade excelente é a montagem
de um sistema solar com objetos tridimensionais em escala correta
tanto de tamanho como de distâncias. Orientações com relação a
essa atividade podem ser encontradas em diversas fontes como:

CANALLE, João Batista Garcia. Oficina de Astronomia. Disponível


em: <www.telescopiosnaescola.pro.br/oficina.pdf>. Acesso em 24
fev 2012.

MEES, A. A.; ANDRADE, C. T. J.; STEFFANI, M. H. Textos de Apoio


ao Professor de Física – Atividades de Ciências para a 8a Série do En-
sino Fundamental: Astronomia, Lua e Cores. Disponível em: <http://
www.if.ufrgs.br/tapf/v16n4_Mess_Jraige_Steffani.pdf>. Acesso em
24 fev 2012.

2.8.2 Uso do softwares para exploração do sistema solar

Como forma de explorar virtualmente o sistema solar existem pelo


menos duas excelentes opções:

• Software Celestia, <http://www.shatters.net/celestia/>, que é um


programa livre e multiplataforma, que pode ser baixado gratui-
tamente e permite fazer uma viagem através de um modelo 3D
do sistema solar a qualquer velocidade, em qualquer direção e
em qualquer época.

• Aplicativo Eyes on the Solar System, <http://solarsystem.nasa.


gov/eyes/>, que pode ser utilizado acessando o endereço acima
indicado, mas exige uma conexão de banda larga à internet.
Como o Celestia permite viajar através de um modelo 3D do sis-
tema solar, utilizando dados de missões reais da NASA.

O Sistema Solar 107


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O Sistema Solar 111


112 Introdução à Astronomia
Sérgio Mascarello Bisch é Bacharel em
Física pela Universidade Federal do Rio
Grande do Sul (1979), Mestre em Físi-
ca também pela Universidade Federal
do Rio Grande do Sul (1984), com dis-
sertação na área de Astrofísica, e Dou-
tor em Educação pela Universidade de
São Paulo (1998), com tese na área da
Educação em Astronomia. Atualmente
é professor associado do Departamen-
to de Física da Universidade Federal do
Espírito Santo, Coordenador do Obser-
vatório Astronômico da UFES e Dire-
tor Técnico-Científico do Planetário de
Vitória. Desenvolve projetos de ensino,
extensão e pesquisa nas áreas da Edu-
cação em Astronomia, Educação em Es-
paços Não-Formais e Formação Inicial
e Continuada de Professores, bem como
de Mediadores de Espaços de Educação
Não-Formais, em Ciências.
9 788560 312658

www.neaad.ufes.br
(27) 4009 2208

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