As Guerras Coloniais: A Guerra E

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A GUERRA E

AS GUERRAS
COLONIAIS
NA ÁFRICA
SUBSAARIANA

JOSÉ LUÍS LIMA GARCIA


JU LI ÃO SOA R ES SOUSA
SÉRGIO NETO
COORD.

Versão integral disponível em digitalis.uc.pt


H I S TÓ R I A C O N T E M P O R Â N E A

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Diretor Principal Edição
Maria Manuela Tavares Ribeiro Imprensa da Universidade de Coimbra
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a apreciação científica por referees. Vendas online: http://livrariadaimprensa.uc.pt

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Universidade Eötvös Loránd (Budapeste)
Alice Kessler-Harris Infografia
Columbia University Imprensa da Universidade de Coimbra
Álvaro Garrido
Impressão e Acabamento
Universidade de Coimbra
Simões & Linhares, Lda
Daniel Innerarity
Universidad de Zaragoza ISBN
Hipólito de la Torre Gómez 978-989-26-1631-5
UNED – Madrid
ISBN Digital
Ioan Horga
978-989-26-1632-2
Universidade de Oradea – Oradea
Jean Garrigues DOI
Universidade de Orléans https://doi.org/10.14195/978-989-26-1632-2
João Paulo Avelãs Nunes
Universidade de Coimbra Depósito Legal
Jorge Alves 455844/19
Universidade do Porto
O Autor declara a sua não concordância
Luís Reis Torgal
com a ortografia adotada.
Universidade de Coimbra
Maria da Conceição Meireles
Universidade do Porto © MAIO 2019,
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Mariano Esteban Vega
Universidade de Salamanca
Maurizio Ridolfi
Università della Tuscia (Viterbo)
Rui Cunha Martins
Universidade de Coimbra
Sérgio Campos Matos
Universidade de Lisboa

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JOSÉ LUÍS LIMA GARCIA
JULIÃO SOARES SOUSA
SÉRGIO NETO
COORD.

A GUERRA E AS
GUERRAS COLONIAIS
NA ÁFRICA
SUBSAARIANA

2 0 1 9 • C O I M B R A

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Í ndice / C ontents

Introdução / Introduction.................................................................................. 7
José Luís Lima Garcia, Julião Soares Sousa e Sérgio Neto

The opportunity of war. South A frica in World War I: a case study............. 13


Anne Samson

O R egimento de Infantaria 14 nas campanhas do Sul de A ngola


da I Guerra Mundial / The 14th Infantry R egiment in the

Southern A ngola Campaigns of World War I............................................. 41


Vítor Manuel Lourenço Ortigão Borges

Ir para a guerra /emigrar para o Brasil: dois cenários, duas realidades

em Vila Nova de Famalicão / Go to war /emigrate to Brazil:


two scenarios, two realities in Vila Nova de Famalicão............................. 63
Odete Paiva

A s Mulheres entre a Guerra e a Paz (1914–1920) / Women between

War and Peace (1914­‑1920)........................................................................... 85


Adília Fernandes

O final da Primeira Guerra Mundial e o reavivar das pretensões

territoriais sobre a Á frica Austral portuguesa / The end of

World War I and the revival of territorial claims on

Portuguese Southern A frica.......................................................................101


José Luís Lima Garcia

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Colonial Office policy towards British West A frica in World Wars............121
Fewzi Borsali

Bosbefok and Koevoet – The Border War in Namibia and A ngola


in South A frican Soldiers’ Memory............................................................157
Nils Schliehe

Guiledje no horizonte político e militar de A mílcar Cabral.


«Guerra de fronteira» ou uma projetada «Ofensiva Final » / Guiledje
on the political and military horizon of A mílcar Cabral.
«Frontier War» or a projected «Final Offensive»........................................191
Julião Soares Sousa

A arma que mudou a guerra / The weapon that changed the war.................221

José A. Matos e Matthew M. Hurley

O futebol português e a Guerra Colonial: o império em jogo /


Portuguese football and the Colonial War: the empire at stake.............245

César Rodrigues

O Automóvel Touring Club de A ngola e o automobilismo ao serviço

do império (1961­‑1974) / The Automobile Touring Club of A ngola


and motorsports at the service of the empire (1961­‑1974).........................267
Pedro Cerdeira

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INTRODUÇÃO

O despontar do século xx não começou da forma mais pacífica na


Europa, apesar dos esforços que alguns dos países da comunidade
internacional haviam feito para que, segundo Aniceto Afonso, a «paz
armada» não descambasse num conflito receado, mas ao mesmo tem‑
po ansiado1. O temor não afugentava os céticos, nem os cobardes,
quanto mais os grandes sempre iludidos em teias de mesquinhas
rivalidades. O imperialismo britânico coabitava com o militarismo
alemão e o revanchismo francês, desanuviando a política negocial o
grau de tensão que se apoderara entretanto das principais potências
do «velho» continente.
A gestão destes interesses localizados numa pequena parte da
Humanidade não impediu que um fait­‑ divers sangrento em Sarajevo
lançasse o rastro incendiário numa atribulada sequência de inciden‑
tes que culminaria na primeira guerra à escala planetária. Segundo
Rui Cardoso, a ironia para que tal acontecesse resultaria dos «meca‑
nismos de dissuasão postos em prática pelas grandes potências para
evitar a guerra, que acabaram por ser, eles próprios, a peça­‑ chave de
uma engrenagem que arrastou o mundo para uma guerra que nin‑
guém queria» 2 . Não era agora apenas a extensão territorial que

1  AFONSO, Aniceto – «O Quadro Europeu Antes da Guerra». In Grande Guerra.


Angola, Moçambique e Flandres. 1914 | 1918. Matosinhos: QuidNovi, 2006, p. 9­‑10.
2  CARDOSO, Rui – «A Guerra dos Mundos». Courrier Internacional. Paris: Courrier
International SA. N.º 223, set. de 2014, p. 3.

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A Guerra e as Guerras Coloniais na África subsaariana (1914-1974)

constituía o perigo deste confronto, mas a duração temporal do mes‑


mo. O que era para durar apenas umas semanas, prolongou­‑se por
meses e anos.
Na sequência do final desse conflito desapareceriam três impérios,
o austro­‑húngaro, o otomano e o prussiano. A criação de novos paí‑
ses foi feita com a redefinição de limites movediços, naquilo que Tim
Butcher apelidava de «fronteiras de areia» 3. E se em 1918 o Armistício
foi assinado, esse facto não era mais do que uma trégua que duraria
duas décadas, período no qual emergiria uma onda de nacionalismos
e os contendores recarregariam as «baterias» para em 1939 recome‑
çarem um novo conflito que só terminaria a 2 de setembro de 1945 4.
Assim, a guerra que começara na Polónia e acabaria com a rendição
do Japão deixara de ser apenas preocupação da diplomacia europeia,
para se tornar um problema com repercussões planetárias.
Com todas as suas complexidades, desafios e tragédias, coube
também ao século xx ditar as regras da consolidação das indepen‑
dências no continente africano, algumas décadas de ocupação após
os ditames aprovados pela Conferência de Berlim de 1884-1885. Na
verdade, a colonização e o colonialismo, conceitos paralelos e, para
alguns, indistinguíveis, marcaram a Época Moderna e os tempos
contemporâneos, tendo talvez a guerra – a par da escravatura até ao
terceiro quartel de Oitocentos –, constituído um dos seus processos
mais significativos. Tanto assim que o século xx se iniciou com «cam‑
panhas coloniais» de ocupação do hinterland (Alves Roçadas em
Angola, em 1905-1907), combates entre colonizadores (Segunda Guer‑
ra dos Bóeres, em 1898–1902), o genocídio dos Hereros, em 1904-1907,
e a Primeira Guerra Mundial, em 1914-1918, combinando todos estes
cenários.

3  BUTCHER, Tim cit. por Guillermo Altares – «O conflito que nunca acabou».
Ibidem, p. 9.
4  Idem – Ibidem, p. 90.

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Introdução

De resto, o centenário deste embate bélico, que tem vindo a ser


assinalado em muitas manifestações nos últimos anos, não esqueceu
o palco de combates africanos, procurando dar voz àqueles que ra‑
ramente tiveram possibilidade de a fazer escutar. Ainda neste âmbi‑
to, e sem perder de vista as desencantadas reflexões de António de
Cértima (1894-1983) acerca da (pouca) visibilidade do conflito em
África, dir­‑ se­‑ia que alguns estudos (mais ou menos) recentes, como
os de Marco Fortunato Arrifes e de Manuel Carvalho, têm buscado
ilustrar esse aspeto menos visível da contenda de 1914-1918.
Com o emergir do pós­‑guerra no final da primeira metade do
século  xx, a ordem internacional torna­‑se mais justa com a fase da
descolonização em que se passa da dependência colonial para uma
situação de independência e de eliminação de barreiras entre conti‑
nentes. Os confrontos bélicos desagregariam a política de dominação,
de conquista e de exploração das metrópoles, sobretudo europeias.
Surgiria com a carta da Organização das Nações Unidas um conjun‑
to de países que embora politicamente livres, continuaram a sobre‑
viver a antigas dinâmicas ocidentais que plastificaram uma África
negra com limites pouco coincidentes com as etnias locais tradicionais,
mas sim com os interesses e as rivalidades imperiais, agora só for‑
malmente desfeitas pelos armistícios e os novos tratados do direito
internacional público.
Nos despojos destas comunidades imaginadas de longe, sob o
periscópio do eurocentrismo, ficaram as particularidades identitárias
que muitos autores atribuem apenas ao tribalismo autóctone, mas
que a obra Colonisation: droit d’ inventaire imputa especialmente à
estratégia divisionista do colonialismo 5. Esta perspetiva sendo redu‑
cionista e unilateral apenas analisa a sociedade pós-colonial com a
formatação dos agentes colonizadores, não atribuindo protagonismo

5  LIAUZU, Claude – «Des Sociétés Postcoloniales». In LIAUZU, Claude (Dir.) –


Colonisation: droit d’inventaire. Paris: Armand Colin, 2004, p. 295­‑314.

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A Guerra e as Guerras Coloniais na África subsaariana (1914-1974)

às rivalidades tribais anteriores ao domínio europeu, nomeadamente


a cumplicidade dos negreiros locais, com os estrangeiros que vieram
depois. Logo, a elaboração dessa identidade de matriz ancestral não
pode ser vista como uma entidade fechada que não está aberta a
recomposições e a mestiçagens permanentes, mas que funciona como
uma «política de raças» de uma considerada ascendência «pura».
Este tipo de dogmatismo quanto à considerada pureza da «raça»
conduziu ao holocausto judeu, e a de outras minorias, por parte do
sistema de repressão nazi banalizando, como afirmava Hannah Aren‑
dt, o mal por todas as latitudes e continentes.
Mas as sociedades pós-coloniais de África não enfermam só dos
seus problemas de identidade e de recomposição étnica. Há outras
dificuldades neste antigo continente, onde novos países artificialmen‑
te construídos enfrentam outros obstáculos tão ou mais pertinentes
que o primeiro que aflorámos. Deste modo, os ex­‑colonizados na
edificação de Estados­‑Nação ou dizendo melhor, de países com mui‑
tas nações, caminham defrontando questões variadas como a cultu‑
ral, demográfica, económica e política.
O pressuposto do grau de desenvolvimento tecnológico, da menos­
‑valia das matérias­‑primas agrícolas e de uma mão de obra treinada
conduzem os Estados independentes africanos para uma proto­
‑industrialização quase inexistente na maior parte da sua geografia
económica, que os tornou e tornará quase sempre dependentes dos
centros industriais do Ocidente e, agora, também, dos países emer‑
gentes do Oriente como a China, Coreia e Índia. A demografia será
sempre pertinente para a implementação de uma economia compe‑
titiva e concorrencial, pelo que as guerras internas, a insalubridade
e as epidemias endémicas concorrerão para um refluxo da natalida‑
de e para as migrações intercontinentais.
Ainda, os pressupostos políticos e culturais, que são fundamentais
para a afirmação dos Estados africanos independentes, pois condi‑
cionam toda a formatação da polis negra e da intervenção cívica das

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Introdução

suas elites dirigentes e da restante massa populacional. A pobreza e


a ignorância continuam hoje a sustentar os maus exemplos de gover‑
nação, especialmente sobre a gestão adequada do bem público, da
maior parte destes países. A promiscuidade entre o interesse de todos
e os interesses privados e pessoais dos políticos e das elites gover‑
nantes tem levado a uma delapidação das riquezas desses territórios,
tornando­‑os nalguns casos ainda mais pobres do que no tempo da
dominação colonial. Daí que continue a ser muito importante a edu‑
cação e a alfabetização das sociedades tradicionais, mas também das
elites dirigentes locais sem a perda do elã tribal e étnico, que refor‑
ça a pluralidade e a riqueza pós-colonial. A dificuldade de conciliar
essa cultura tradicional de um sítio, com o da cultura global de todos
os outros lugares, é a questão que se continua a pôr a estas socieda‑
des, que foram fracionadas, divididas e vilipendiadas pela dominação
estrangeira.
Mas esta doxa tem e deve ser relativizada, porque apesar de a
colonização ter sido feita pelos colonizadores que aceitaram sempre
a predominância dos interesses metropolitanos, aqueles que Albert
Memmi considerava os verdadeiros colonialistas, muitos outros não
perfilhavam desta idiossincrasia de dominação e exploração social6 .
Apelavam sim à união e à reconversão de sociedades dinâmicas
onde a miscigenação e a diversidade étnica poderiam ser uma mais­
‑valia de modernidade e integração destes Estados africanos pós‑
-coloniais, no conjunto da nova ordem internacional emergida com
as guerras fratricidas entre impérios europeus e asiáticos durante
toda a primeira metade do século passado, sedentos de manterem
ad eternum o estatuto de arbitrariedade e de poder ilimitado sobre
territórios e populações nos antípodas geográficos da sua matriz
inicial de mando.

6  MEMMI, Albert – Retrato do Colonizado Precedido de Retrato do Colonizador. Rio


de Janeiro: Civilização Brasileira, 2007, 190 p.

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O Regimento de Infantaria 14 nas campanhas do Sul de Angola
da I Guerra Mundial

de maio, o Batalhão deslocou­‑se para Chibia. O estado de saúde do


pessoal do Batalhão era de tal modo grave que foi reunida uma jun‑
ta médica para avaliar a condição dos militares, concluindo que mais
de 70% estavam incapazes para o serviço, aumentando o número de
mortes diariamente105.
Em 17 de junho de 1915, o Major Alberto Salgado assumiu o co‑
mando do 3.º Batalhão do RI 18, passando o Batalhão a ser coman‑
dado interinamente pelo Capitão Jorge Frederico Velez Caroço106 . Tal
como o Major Salgado, individualmente houve outros militares que
continuaram no teatro, como por exemplo o Capitão Lopes Mateus,
que foi comandante de companhia também no Batalhão do RI 18 e
que integrou o destacamento do Cuamato107.
De Chibia o Batalhão deslocou­‑se para Lubango e por fim Moçâ‑
medes, onde começou a embarcar para a metrópole em princípios
de agosto, tendo terminado a sua participação nas Campanhas do
Sul de Angola da I GM108 .

Conclusões

A participação do Batalhão do RI 14 nas Campanhas do Sul de


Angola foi marcada por pesadas baixas e grandes dificuldades, fruto
dos combates e da dureza do clima africano, em especial da seca e
das doenças que assolam esta parte do mundo, bem como da falta
de treino e de material. Apesar destas circunstâncias adversas, alguns
Viriatos deram provas de valor e heroísmo, tendo regressado à me‑
trópole de «cabeça erguida» e contribuindo de forma indelével para

105  Idem – Ibidem.


106 AHM. 2.ª Divisão. 2.ª Secção – Angola. Caixa 042, n.º 015 «Ordem de Batalha,
unidades e serviços que constituem as forças em operações».
107  SALGADO, Arlindo – Ibidem.
108  CID, António José do Amaral Balula – Ibidem.

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A Guerra e as Guerras Coloniais na África subsaariana (1914-1974)

a integridade territorial da nação, que manteve a sua colónia por mais


60 anos, até 1975. Sobre estas campanhas, o Major António Fernandes
Varão, capitão­‑mor do Cuamato, refere

A História alicerçará a glória de Portugal, gritando aos


quatro cantos do Mundo que o extenso território colonial
– que ainda hoje possuímos – é nosso, é três vezes nosso:
­‑ porque o descobrimos, porque o conquistámos e porque
o regámos com o nosso sangue, defendendo­‑o 109 .

Mais de 208 anos após a sua criação em Tavira e 176 anos depois
da sua implantação em Viseu, o RI 14 é um dos Regimentos do Exér‑
cito Português com história mais ilustre e o que está há mais tempo
implantado no mesmo local, com a mesma designação. Hoje, como
no passado, no Sul de Angola ou bem recentemente no norte do
Kosovo, o RI 14 continua a ser chamado a defender a soberania e a
honrar os compromissos internacionais da nação. Com igual valor e
abnegação, os seus soldados cumprem a missão e elevam o nome de
Portugal.

Fontes arquivísticas

Arquivo Histórico Militar (AHM). 2.ª Divisão. 2.ª Secção – Angola:

Caixa 021, n.º 012 «Relatório sobre o combate de Naulila pelo Capitão José Mendes dos
Reis, comandante do destacamento».
Caixa 022, n.º 002 «Informações prestadas pelo Governador­‑Geral de Angola ao Minis‑
tro das Colónias».
Caixa 022, n.º 003 «Ordens de Serviço do Quartel­‑ General das Forças em Operações no
Sul de Angola, entre 9 de set. de 1914 e 27 de abr. de 1915».

109  VARÃO, António Fernandes – Ibidem, p. 9.

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O Regimento de Infantaria 14 nas campanhas do Sul de Angola
da I Guerra Mundial

Caixa 022, n.º 005 «Elementos do Adjunto do TCor Alves Roçadas, entre 1 de out. de
1914 e 7 de jun. de 1915».
Caixa 023, n.º 002 «Instruções e Ordens de Operações das Operações no Sul de Angola,
entre 8 de nov. de 1914 e 3 de mar. de 1915».
Caixa 042, n.º 015 «Ordem de Batalha, unidades e serviços que constituem as forças em
operações».

Biblioteca do Exército (BE) – Ordem do Exército (OE):

OE n.º 20. 2.ª Série, de 22 de ago. de 1914.


OE n.º 22. 2.ª Série, de 05 de set. de 1914.

Referências bibliográficas

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ponível em http://exhibitions.nypl.org/africanaage/maps.html [acedido em 21 jul.
de 2014].
«As expedições portuguesas à Africa». Ilustração Portugueza. Lisboa: Empreza do Jornal
O Seculo. 2.ª Série. N.º 448, 21 de set. de 1914, p. 374­‑381.
CID, António José do Amaral Balula – O N.º 14 na infantaria portuguesa ­‑ estudo
histórico. Viseu: Edição do Regimento de Infantaria N.º 14, 1951, 101 p.
«Expedição a Angola». Ilustração Portugueza. Lisboa: Empreza do Jornal O Seculo.
2.ª Série. N.º 446, 7 de set. de 1914, p. 307­‑308.
MARTINS, Ferreira – História do Exército Português. Lisboa: Editorial Inquérito Lim‑
itada, 1945, 576 p.
MARTINS, Ferreira – Portugal na Grande Guerra. 2 Vols. Lisboa: Editorial Ática, 1934.
MOURA, Rui Moura e DIAS, Anselmo (Dir.) – O 14 de Infantaria. Viseu: Regimento de
Infantaria N.º 14, 2009. ISBN 978­‑989­‑20­‑173­‑3.
OLIVEIRA, A. N. Ramires – A História do Exército Português. 1910–1945. Vol. III. Lis‑
boa: Estado­‑Maior do Exército, 1994, 638 p.
PIRES, Nuno Lemos – «Portugal na Grande Guerra de 1914–1918». Academia. Lisboa:
Comissão Coordenadora das Evocações do Centenário da I Guerra Mundial, 2013,
6 p. Disponível em https://www.academia.edu/9895497/Portugal_em_Guerra_
na_Grande_Guerra_1914­‑1918.
ROÇADAS, J. A. Alves – Relatório sobre as Operações no Sul de Angola em 1914. Lisboa:
Imprensa Nacional, 1919, 350 p.
SALGADO, Arlindo – O Sul de Angola no início do Século XX. Cadernos de Guerra do
Coronel Alberto Salgado. Braga: CEPCEP ­ ‑ Universidade Católica Portuguesa,
2011, 327 p. ISBN 978­‑9729045301.
SANTOS, Ernesto M. – Cobiça de Angola, Combate de Naulila, seus heróis e seus inimi‑
gos. Memórias. Guimarães: Livraria Cruz, 1957, 148 p.

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A Guerra e as Guerras Coloniais na África subsaariana (1914-1974)

TEIXEIRA, A. Almeida – Naulila. Lisboa: Agência Geral das Colónias | Agência Geral
do Ultramar, 1935, 37 p. [Coleção «Pelo Império», n.º 13].
VARÃO, António Fernandes – Investidas Alemãs ao Sul de Angola. Subsídios para a
História. Lisboa: Imprensa Lucas & C.ª, 1934, 203 p.

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Ir para a guerra /emigrar para o Brasil:
dois cenários , duas realidades
em Vila Nova de Famalicão

Odete Paiva
0000­‑ 0003­‑ 0414­‑ 6528

Resumo: O Minho foi uma das regiões onde a emigração para


o Brasil, sobretudo entre a segunda metade de Oitocentos e a
eclosão da I Guerra Mundial, fez parte integrante do padrão
de vida da população. Anos houve em que a hemorragia de
homens em idade anterior à do cumprimento do serviço militar
foi de tal monta que deu origem a grandes debates na impren‑
sa e no Parlamento, conduzindo à produção de legislação re‑
guladora, muita dela dissuasora da partida de Portugal. A exis‑
tência de um corpus legislativo, tanto no período do
liberalismo como da vigência de um estado de matriz republi‑
cana, em fases marcadas axialmente a favor da migração para
as colónias africanas portuguesas, embora enformasse as prá‑
ticas da população, não determinou a mudança de certa reali‑
dade já instituída, ou seja, a ida de muitos rapazes púberes
cuja família nuclear lhes preparava a viagem para que eles
pudessem partir antes do recenseamento militar. O nosso es‑
tudo tem como objeto a atual cidade de Vila Nova de Famalicão

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A Guerra e as Guerras Coloniais na África subsaariana (1914-1974)

que foi até aos anos sessenta do século passado, uma vila.
Inserida na região do Baixo Minho é protótipo de uma locali‑
dade em que a emigração para o Brasil foi soberana e onde
deixou marcas. Conquanto nesta localidade fosse até ao início
da Primeira Grande Guerra proporcionalmente muito signifi‑
cativa a partida de rapazes em idade anterior à exigida para o
serviço militar, casos houve em que a família teve de arranjar
estratégias para o jovem sair do país iludindo a lei, pois a ida‑
de já não permitia que fosse sem um ónus significativo, isto é,
com passaporte falso ou outra via clandestina. Ao analisarmos
os livros de recenseamento militar damo­‑nos conta do volume
do êxodo desta massa populacional, confirmado quando com‑
pulsamos outras fontes civis ou eclesiásticas e as cruzamos,
por exemplo, registos dos atos vitais, róis de confessados e
correspondência privada. A sociedade civil sofreu com o esfor‑
ço de guerra, tal como no resto do País e as mulheres consti‑
tuíram um movimento para ajudar as famílias dos militares que
foram para o teatro de operações.

Palavras ­‑ chave: Guerra de 1914­‑1918, Emigração de jovens,


Minho, Brasil

Abstract: Minho was one of the regions where emigration to


Brazil, especially between the second half of the 19th century
and the outbreak of World War I, was an integral part of the
population’s standard of living. Years ago, the haemorrhage of
men before the age of military service was such that it gave
rise to great debates in the Press and in Parliament and led to
the production of legislation, which tried to prevent the exits
of the country. The existence of legislation in the liberal and
republican periods in stages marked by migration especially
to the Portuguese colonies in Africa, did not determine the

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Ir para a guerra/emigrar para o Brasil: dois cenários, duas realidades
em Vila Nova de Famalicão

change of a certain reality already established, i.e., the depar‑


ture of many pubescent boys whose nuclear family prepared
the trip so that they could leave before the military census.
Our study focuses on the current town of Vila Nova de Famal‑
icão which was until the 60th of last century, a village. Insert‑
ed in the Minho region is an example of a locality in which
emigration to Brazil was sovereign and where it left marks.
Although in this locality there was, until the beginning of World
War I, a very significant departure of young men before the
required age for the military service, cases had in which the
family had to arrange strategies for the young person to leave
the country deceiving the law, since the age would no longer
allow it to go without a significant burden, that is, with a false
passport or other clandestine route. In analysing the military
census books, we are reminded of the volume of the exodus
from this mass of population, confirmed when we compile
other civil or ecclesiastical sources and cross them. Civil soci‑
ety suffered with the war effort, just as in the rest of the coun‑
try, and the women constituted a movement to help the families
of the military who went to the theatre of operations.

Keywords: World War I, Youth Emigration, Minho, Brazil

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A Guerra e as Guerras Coloniais na África subsaariana (1914-1974)

Introdução

A trilogia República, Pátria e Nação, como que formando um po‑


lígono perfeito e de faces interdependentes, ganhou terreno no seio
dos políticos do jovem regime implantado com o 5 de outubro de
1910, com especial relevo entre os democráticos de Afonso Costa.
A Guerra de 1914­‑1918 panejou este desiderato que serviu os demo‑
cráticos no seu intento intervencionista.
Já em 10 de novembro de 1912, Afonso Costa, considerava que a
haver uma conflagração europeia, como admitia poder dar­‑se, «pois
as grandes potências preparam­‑se para a luta»1, Portugal tinha que
se definir sem demoras, «para que não tenhamos dolorosas, horríveis
surpresas»2 .
Daqui se infere que a entrada na beligerância era para a linha
afonsista uma inevitabilidade, como salvaguarda da nossa integrida‑
de territorial, da autonomia e do nosso lugar na Europa aquando da
paz final.
E a guerra eclodiu nesse verão de 1914. Portugal vivia um pro‑
cesso difícil e conturbado, com brechas e divisionismos a nível po‑
lítico e agitação e descontentamento social.
Após uma longa fase de incertezas, de avanços e de recuos, de
várias ações político­‑ diplomáticas, do extremar de posições político­
‑partidárias, de cedências perante uma Inglaterra que parecia querer­
‑nos fora da guerra, mas beneficiar das condições geoestratégicas
portuguesas, Portugal saiu da sui generis neutralidade em que estava.
A requisição pelo governo português a 24 de março de 1916 dos
navios alemães surtos no Tejo foi o casus belli. Encontravam­‑ se aber‑
tas as hostilidades luso­‑germânicas que romperiam as relações já de

1  MARQUES, A. H. de Oliveira – Afonso Costa. 2.ª Ed. Lisboa: Arcádia, 1975, p. 354.
2  Idem – Ibidem.

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Ir para a guerra/emigrar para o Brasil: dois cenários, duas realidades
em Vila Nova de Famalicão

si precárias entre os dois países, dada a posição que a Alemanha


vinha assumindo em Angola e Moçambique.
O breve encontro entre o Barão de Rotsen e o ministro dos negó‑
cios estrangeiros português, Augusto Soares, foi o epílogo. A Alema‑
nha declarou­‑nos guerra a 9 de março de 1916. Os germânicos re‑
gressavam à sua Pátria e Sidónio Pais a Portugal. Era o fim de um
ciclo. Havia que fazer a mobilização geral. Caiu o Ministério e reuniu­
‑se o Congresso.
O governo da União Sagrada constituído por democráticos e evo‑
lucionistas foi o que se conseguiu do apelo dos republicanos à união
perante um facto consumado, o da nossa entrada na cena bélica
europeia.
Se até então Portugal vivia um clima social conturbado, passou a
experienciar um avolumar de tensões aos mais diversos níveis, de
que salientamos: a instabilidade política, a crise económica, a dupli‑
cidade de colocação face à guerra e a radicalização das posições, a
trama político­‑militar anti intervencionista e anti regime e a deficien‑
te legitimação da guerra europeia conseguida pela corrente defenso‑
ra da intervenção no campus belli.
Neste cenário, marchou já em janeiro de 1917 para o teatro de
operações europeu, uma divisão do Corpo Expedicionário Português,
após o denominado milagre de Tancos.
O esforço de guerra foi sentido em todo o país e Famalicão3 , caso
que iremos estudar, contribuiu com uma quota desse sacrifício, tan‑
to através de homens, como dos encargos extraordinários advindos
da situação belicista.
Como foi uma região em que a emigração atingiu cifras volumo‑
sas, num padrão maioritariamente masculino, iremos discutir a

3  Utilizaremos de forma indiferenciada a designação de Vila Nova de Famalicão e


Famalicão.

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A Guerra e as Guerras Coloniais na África subsaariana (1914-1974)

questão e debruçar­‑nos sobre essa dicotomia, emigrar ou partir para


a guerra 4 .
Conquanto nesta localidade fosse até ao início da Primeira Gran‑
de Guerra muito significativa a emigração para terras brasileiras de
rapazes em idade anterior à exigida para o serviço militar que se
ausentaram pela via legal, casos houve de emigração clandestina.
Com a entrada de Portugal na campanha belicista ao lado dos alia‑
dos, a legislação reduziu as possibilidades de saída legal do País,
restringindo­‑a grosso modo às mulheres, o que levou a que a via
ilegal fosse quase a única para os homens que podiam integrar
o exército.

Caraterização sucinta do objeto de estudo

Vila Nova de Famalicão é uma cidade portuguesa da região Norte


e sub­‑região do Ave integrada no distrito de Braga. Nos anos trinta
do século xix , passou a sede de concelho e na década de quarenta
foi elevada a vila, tendo passado a cidade em 1985.
É sede de um município formado por 49 freguesias, com 201,85Km2
e 134 969 habitantes, segundo dados do Instituto Nacional de Esta‑
tística (INE) de 2009. Em 2011, a cidade tinha 33 045 habitantes.
O concelho é limitado a norte pelo município de Braga, a este
pelo de Guimarães, a sul pelos de Santo Tirso e da Trofa, a oeste
pelos de Vila do Conde e da Póvoa de Varzim e a noroeste pelo de
Barcelos. A sua localização, como que formando uma estrela radial,

4  Não estamos em condições de fazer a quantificação exata dos que emigraram e


não mais regressaram, tendo em conta diversas variáveis, uma delas derivada de não
se conseguir saber qual a cota e os sujeitos da emigração não legal, embora se tenha
conhecimento de alguns casos. Acresce ainda, por exemplo, a circunstância de não
termos a indicação precisa de quem foi para os territórios em beligerância.

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O final da Primeira Guerra Mundial e o reavivar das pretensões territoriais
sobre a África Austral portuguesa

tar um conjunto de metrópoles da Tríplice Entente, tradicionalmente


colonialistas, como a Bélgica, França, Grã­‑Bretanha e Portugal, para
evitar a divergência e recuperar a preponderância que estes países
perderam junto das populações africanas, depois desse conflito mun‑
dial. Igualmente em Portugal se fizera sentir os efeitos desta campa‑
nha de especulação sobre a revisão de mandatos. Uns meses antes
também o jornal Diário de Notícias levantava a questão sobre os
malefícios que a extensão desta administração a outras possessões
não alemãs poderia ocasionar na ordem internacional:

Nesta questão dos mandatos, por exemplo, o que deve cons‑


tituir, para os portugueses, o principal esteio da sua serenidade
e da sua confiança, é a convicção essencial de que esse problema
não lhe diz respeito… Na impossibilidade em que a paz wilso‑
niana colocou as potências vencedoras de resolverem, quanto a
esses territórios, o problema fundamental da soberania política,
inventou­‑se um sistema que iludia a gravidade e a delicadeza
desse problema, sem tirar definitivamente aos vencedores uma
espécie de «domínio eminente» sobre os despojos da vitória.
A atribuição dos mandatos foi dada pelo Tratado de Versailles às
potências aliadas e associadas, foi destas que as potências man‑
datárias receberam os seus mandatos; e à própria Sociedade das
Nações só está sujeito o exercício desses mandatos. Nem pelo
seu objeto, nem pela natureza jurídica ou política dos problemas
que constituem a sua razão de ser nos interessa, pois, qualquer
discussão em torno do problema dos mandatos, a não ser que,
abonando­‑nos com os documentos probantes da nossa capacidade
colonizadora, e pretendêssemos partilhar, com outras nações, os
encargos que do exercício desses mandatos derivam 16 .

16  Vide «Portugal e a questão dos mandatos». Diário de Notícias. Lisboa: Empresa
Nacional de Publicidade (ENP). Ano 66, 19 de mai. de 1930, p. 3.

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A Guerra e as Guerras Coloniais na África subsaariana (1914-1974)

As metrópoles colonizadoras, entretanto, temerosas que a inter‑


nacionalização dos mandatos lhes pudesse afetar a perda dos seus
territórios resolveram constituir uma associação de potências, para
em bloco defenderem os direitos históricos de cada um desses países.
A propósito deste corporativismo imperialista, em 1931 o Primeiro­
‑Ministro da Bélgica Henri Jaspar afirmava que era chegado

O momento de sabermos se a raça branca continuará a pre‑


dominar nas colónias ou se nos deixaremos absorver pelas raças
de cor, mais numerosas e sobretudo mais prolíficas. Depois da
Grande Guerra de 1914–1918, a raça branca perdeu grande par‑
te do prestígio que conquistara junto da raça negra. Os negros,
perante a desordem política, as dificuldades económicas e outras
contingências que embaraçam os brancos, exaltam­‑se facilmente
e creem no próximo fim da hegemonia da raça branca. É esta a
origem das revoltas do Congo Belga. Os brancos devem, pois, im‑
por o seu prestígio, não só pela força, mas usando novos sistemas
de colonização. Só a cooperação das quatro potências brancas da
África Equatorial – Portugal, Bélgica, França e Inglaterra – poderá
evitar a eclosão de novas revoltas 17 .

A rediscussão do património colonial em África tinha deixado em


aberto uma questão que iria ser um dos fatores determinantes do
acelerar da tensão entre as duas potências militarmente mais fortes
da Europa, a Alemanha e a Grã­‑Bretanha. Para ultrapassar este mal­
‑estar diplomático só haveria duas soluções, as negociações pacíficas
a entabular pelas chancelarias dos dois países ou a corrida às armas,
para pela via da força se poder impor os princípios defendidos por
cada um dos protagonistas. No fim de contas, a teoria do «espaço

17  JASPAR, Henri – «Uma Sociedade das Nações Coloniais». Boletim Geral das
Colónias. Lisboa: Agência Geral das Colónias. Ano VIII, n.º 79, jan. de 1932, p. 192.

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O final da Primeira Guerra Mundial e o reavivar das pretensões territoriais
sobre a África Austral portuguesa

vital» era o pressuposto defendido por cada um dos beligerantes e


que o Tratado de Versailles não conseguira solucionar. Londres não
queria perder a vastidão da zona marítima mundial obtida desde o
século  xvii, e a nova Alemanha, emergida da Prússia bismarckiana,
desejava cada vez mais área para aí colocar os seus excedentes po‑
pulacionais. Vinte e sete anos depois do primeiro Armistício, a Se‑
gunda Guerra Mundial haveria, com todas as atrocidades, de resolver
este conflito de interesses entre os dois parceiros anglo­‑saxónicos,
criando uma atmosfera duradoura de paz e estabilidade entre os
principais países do denominado «Velho Continente», permissível aliás
à autodeterminação e à independência de territórios que até então
haviam vivido sob a tutela das ditas «nações mais adiantadas»18 .

Fontes manuscritas

Dossier n.º 2. Délégation Portugaise au Congrès de la Paix. Anexos D a M. Arquivo par‑


ticular do general Freire de Andrade.
ANDRADE, A. Freire de – «Ambições da África do Sul. Memorandum para o Go‑
verno Português», 25 de fev. de 1919.
«Ata da Conferência com o General Smuts». 29 de mar. de 1919.
«Ata de uma Conferência Secreta que teve lugar no Hotel Majestic com a presença
dos generais Botha e Smuts pela União Sul­‑Africana e Dr. Álvaro de Castro
(Governador­‑Geral de Moçambique) e ao tempo o ainda coronel A. Freire
de Andrade». 21 de abr. de 1919.
«Intervenção do Dr. Afonso Costa na Conferência do Hotel Majestic». 21 de mar.
de 1919.
Dossier Colónias. Conferência da Paz. Delegação Portuguesa à Conferência da Paz.
1918. Lisboa: Arquivo Histórico­‑Diplomático do Ministério dos Negócios Estran‑
geiros (AHD/MNE). 3.º Piso: Armário 12, Maço 13, Documento 31 a).
«Ofício do Presidente da Conferência da Paz Georges Clémenceau ao Presidente
da Delegação Portuguesa da Conferência da Paz sobre o Reconhecimento
na Conferência da Paz dos direitos de soberania de Portugal ao triângulo
de Kionga», 25 de set. de 1919.

18  GARCIA, José Luís Lima – «O reativar das pretensões territoriais sobre
Moçambique com o final da Primeira Guerra Mundial». Moçambique e as relações com
os territórios vizinhos…, p. 570.

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A Guerra e as Guerras Coloniais na África subsaariana (1914-1974)

Bibliografia

ALEXANDRE, Valentim – Origens do Colonialismo Português Moderno. Lisboa: Livraria


Sá da Costa, 1979, 232 p. ISBN 9789725622254.
CAETANO, Marcello – Portugal e a Internacionalização dos Problemas Africanos. His‑
tória duma Batalha: da Liberdade dos Mares às Nações Unidas. Lisboa: Edições
Ática, 1971, 272 p.
COSTA, Rui da Cunha e – «Mandatos Coloniais». A Província de Angola. Luanda. Ano 7.º,
24 de set. de 1930.
GARCIA, José Luís Lima – Moçambique e as relações com os territórios vizinhos: elemen‑
tos para o estudo da natureza jurídico­‑ diplomática e económico­‑ social das rela‑
ções de Moçambique com os territórios vizinhos, no período compreendido entre
as duas guerras mundiais (1919–1939). 2 Vols. Lisboa: Universidade Nova de
Lisboa, 1987. Dissertação de Mestrado.
JASPAR, Henri – «Uma Sociedade das Nações Coloniais». Boletim Geral das Colónias.
Lisboa: Agência Geral das Colónias. Ano VIII, n.º 79, jan. de 1932, p. 189­‑195.
MARQUES, A. H. de Oliveira Marques – História de Portugal. 3 Vols. 3.ª Ed. Lisboa:
Palas Editores, 1986.
«Portugal e a questão dos mandatos». Diário de Notícias. Lisboa: Empresa Nacional de
Publicidade (ENP). Ano 66, 19 de mai. de 1930.
TILMANT J. – «Éditorial». L’Essor Colonial et Maritime. Bruxelles: Essorial, n. d., 17 de
dez. de 1931.

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C olonial Office policy towards
British West A frica in World Wars

Fewzi Borsali
0000­‑ 0002­‑7703­‑1564

Resumo: O contacto entre grupos diferentes é uma caracte‑


rística imutável ​​da existência humana, que pode conduzir a
tentativas de domínio de alguns grupos sobre outros o que,
inevitavelmente, conduz a conflitos. A Primeira e a Segunda
Guerras Mundiais, bem como as guerras coloniais, constituíram­
‑se como um verdadeiro desafio ao poder estabelecido de
alguns países europeus, cuja sobrevivência dependia, em gran‑
de parte, da contribuição das respetivas colónias. As colónias
britânicas da África Ocidental, tal como outras, tiveram que
participar no esforço de guerra com recursos humanos, finan‑
ceiros e materiais, de tal forma que se pode afirmar que a sua
exploração e o seu desenvolvimento corresponderam a uma
verdadeira «Luta pela Independência» por parte da Grã­
‑Bretanha. Lord Milner, Secretário de Estado da Guerra de
1918­‑1919, e das Colónias de 1919­‑1921, insistiu que «os bens
coloniais tiveram que ser tomados e explorados em grande
escala pelo governo britânico e lucros usados ​​para pagar a
dívida da Grã­‑Bretanha». O seu sucessor, Leo Amery, acredi‑

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A Guerra e as Guerras Coloniais na África subsaariana (1914-1974)

tava que a tarefa da Grã­‑Bretanha era multiplicar os mercados


no exterior e, particularmente, desenvolver as vastas poten‑
cialidades do continente africano. Lord Moyne, Secretário de
Estado do Colonial Office, solicitou, em junho de 1941, aos
governadores das diferentes colónias que mobilizassem todos
os recursos para o esforço de guerra, o que provocou um
desvio de fundos que estavam, inicialmente, destinados para
o Colonial Development and Welfare. A mobilização desses
recursos requereu a colaboração colonial; e os britânicos ti‑
veram que fazer concessões a nível governativo a alguns dos
seus domínios após a Primeira Guerra Mundial e a outros
após a Segunda Guerra. Contudo, não consideravam as coló‑
nias suficientemente «maduras» para lhes serem concedidos
os mesmos direitos políticos. Em 1938, MacDonald, Secretário
de Estado do Trabalho (1938–1940), mostrava­‑se convencido
de que «podia ​​levar gerações ou mesmo séculos para que
algumas colónias se pudessem posicionar sozinhas». As elites
tradicionais eram subservientes. As novas elites formadas no
Ocidente rapidamente passaram do reformismo ao inconfor‑
mismo revolucionário. No entanto, as duas guerras pressio‑
naram os governos a mudar a sua atitude em relação a estas
últimas, da apatia (devido à sua exclusão da política e do
mecanismo de tomada de decisões) para uma perspetiva de
colaboração, procurando assim evitar uma espécie de resis‑
tência armada colonial. Este artigo procura examinar os con‑
tributos da África Ocidental Britânica nas duas Guerras Mun‑
diais e a política do Colonial Office em relação à oposição
colonial, baseando­‑se a pesquisa em fontes oficiais algumas
delas inéditas, outras já publicadas.

Palavras­‑ chave: Colonial Office, Guerras, Recursos, Política de


oposição

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Colonial Office policy towards British West Africa in World Wars

Abstract: Contact between human groups and subsequent


changes constitute immutable characteristics of human exist‑
ence, resulting in the domination of some groups and subju‑
gation and subordination of others, whose preservation and
challenge and lead to and result from wars. The First and Sec‑
ond World Wars as well colonial wars expressed a challenge
to the prevailing balance of power among some imperial Eu‑
ropean countries, whose survival depended on their respective
colonies’ contribution. British West African colonies, like oth‑
ers, had to assist with human, financial and material resources
in both World Wars, their exploitation and development was
the British «War of Independence». Lord Milner, Secretary of
State for War 1918­‑1819, and for the Colonies 1919­‑1921, insist‑
ed that «the colonial assets had to be taken over and exploited
on a large scale by the British Government and the profits to
be used to pay off Britain’s debt». His successor, Leo Amery,
believed that Britain’s task was to multiply markets overseas,
and particularly develop Africa’s vast potentialities. Lord Moyne,
the Colonial Office Secretary of State, instructed colonial gov‑
ernors in June 1941 to mobilize colonial resources for the war
effort causing diversion of resources aimed initially at the 1940
declared policy of Colonial Development and Welfare. Mobili‑
sation of such resources required colonial collaboration; and
the British had to concede self­‑government to some of her
dominions after the First World War (WWI) and to others after
the Second War (WWII). But they did not consider the colonies
mature enough so as to grant them the same political rights.
By 1938, MacDonald, Labour Secretary of State (1938­‑1940),
was convinced that «it might take generations or even centuries
for some colonial people to stand on their own feet». The tra‑
ditional elites were subservient whereas the new western ed‑
ucated elite was initially reformist to gradually become to some

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A Guerra e as Guerras Coloniais na África subsaariana (1914-1974)

extent revolutionary. However, both wars pressed Colonial of‑


ficials to change their attitude towards the latter from apathy
(due to their exclusion from policy and decision making ma‑
chinery) to a reconstruction of collaboration, avoiding thus a
kind of colonial armed resistance. This paper attempts to ex‑
amine British West African contribution in both World Wars,
and the Colonial Office policy towards colonial opposition,
basing the research on primary official unpublished and pub‑
lished sources.

Keywords: Colonial Office, Wars, Resources, Opposition­‑policy

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Colonial Office policy towards British West Africa in World Wars

Introduction

Following 19th century rivalry for the world’s material resources,


Europeans’ ambitious desire for domination and their subsequent
colonizing process, world relations became exacerbated resulting
consequently in two world wars during which their respective colo‑
nized dependencies became forcibly involved and had to contribute
to the war effort. Challenge to British imperial supremacy from en‑
emy powers, increasing United States (US) criticism and stronger
colonial claims on one hand, and the mobilisation of imperial re‑
sources for the war effort on the other, pressed then the Colonial
Office to adjust and reconstruct imperial relations during and after
the wars. British West Africans had to face the potential threat from
the German colonies of Togoland and Cameroons in WWI, pro­‑Vichy
French colonies in addition to their being required for other African
and Asian military campaigns against Italian, German and Japanese
attacks in WWII, and to provide financial and material and resourc‑
es as well. The paper attempts to assess such challenge, and examine
the corresponding Colonial Office measures and policies with respect
to British West Africa during these two world catastrophes.

The Colonial Office and regional machinery in the War Periods

Wars during and after the Industrial Revolution resulted in grad‑


ual colonial establishment initially on coastal areas and then extend‑
ed to the hinterland as in the case of West Africa1. Control over such
vast areas logically necessitated the creation and development of either

1  Sierra Leone: Freetown Colony 1807, Protectorate 1896 – Gambia: Bathurst 1843,
Protectorate 1888 – Gold Coast: Colony 1821, Ashanti 1896, Northern Territories 1902
– Nigeria: Lagos in 1860s, Oil Rivers Protectorate 1880s, Northern Protectorate 1900.

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A Guerra e as Guerras Coloniais na África subsaariana (1914-1974)

central or local machinery with a view to managing them; various


bodies had been in charge of colonial affairs before 1801 when they
were entrusted to the War and Colonial Office, which half a century
later, was divided into India Office and the Colonial Office under its
own Secretary of State, Sir George Grey, to deal with all British pos‑
sessions overseas. The evolution of some territories led to the creation
of the Dominion Division within the Colonial Office in 1907, developed
into a separate Dominion Office in 1925 with its own Secretary of
State for Dominion Affairs. During WWI Dominion matters were more
important than colonial ones; the membership of both the War Office,
already established in 1902, and the British War Cabinet created in
December 1916 and extended in the spring of 1917 to become the
Imperial War Cabinet as a means of coordinating the British Empire’s
military policy, comprised essentially the British and Dominion Prime
Ministers but not the Secretary of State for the Colonies because col‑
onies were not regarded mature enough so as to deserve the fully
recognized status of an autonomous nation of an Imperial Common‑
wealth with an adequate voice in foreign policy that was granted to
the Dominions during the 1917 Imperial Conference2 .
The Colonial Office had three Secretaries of State during WWI:
Liberal L. Harcourt (1910­‑1915), Conservative Bonar Law (1915­‑1916),
and Conservative Walter Long (1916­‑1919), they were assisted by a
Permanent Under­‑Secretary of State (a post created from 1825) and
a Parliamentary Under­‑Secretary of State (from 1830), in charge of
six Geographical Departments dealing respectively with the West
Indies, the East, Nigeria, West Africa, the Mediterranean and East
Africa, together with a General Division concerned with library, print‑

2  The War Office, already established in 1902 by Prime Minister Arthur Balfour,
was assisted by the Committee of Imperial Defence under Lord Kitchener, comprising
the British Cabinet members, the heads of the military services together with the
Dominions’ Prime Ministers. The Imperial War Cabinet consisted of the British Prime
Minister, Lloyd George, and the Prime Ministers of Canada, South Africa, Australia,
New Zealand, and the Lieutenant­‑ Governor of the United Provinces of Agra and Oudh.

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Bosbefok and Koevoet
The Border War in Namibia and Angola in South African Soldiers’ Memory

received a letter from home Anthony Feinstein noticed that: «This


was a further proof of the great South African amnesia that had en‑
veloped us all» 51. The secrecy of the military operations led to strange
situations like this: «In fact we were listening to the radio while inside
Angola with Pik Botha [South African secretary of foreign affairs
from 1977-1994] insisting that no South African troops were inside!52 ».
For a long time the only news the South African public received
about the events in Namibia and Angola were the numbers of killed
«terrorists». But in the end of the 1980s the government released more
and more news about the war. Tim Ramsden noticed: «It seemed that
suddenly the public was being allowed to read about what was hap‑
pening in the operational area» 53 .
For the soldiers serving in Namibia and Angola news from home
were the only connection to the outside world and «vital links» to
family and friends at home and the life they led before becoming
soldiers. Letters were read again and again while every packet caused
great joy and often helped to improve the boring menu of the army54.

The Civil Population

The civil population of the Operational Area consisted mostly of


people from the Ovambo ethnic group who settled in Northern Na‑
mibia as well as across the border in Southern Angola55. The civil
population was often caught between the fronts of the conflict. The

51  Idem – Ibidem, p. 67.


52  An unnamed former serviceman quoted from BLAKE, Cameron – Troepie – From
Call­‑Up…, p. 187.
53  RAMSDEN, Tim – Border­‑Line Insanity…, p. 252.
54  Idem – Ibidem, p. 138, p. 146 and p. 150 as well as FEINSTEIN, Anthony – In
Conflict, p. 96.
55  WALLACE, Marion – A History of Namibia, p. 97­‑98.

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A Guerra e as Guerras Coloniais na África subsaariana (1914-1974)

guerrilha strategy of SWAPO depended on the help of the local pop‑


ulation and often the SWAPO fighters received food and shelter if
needed. If the locals did not cooperate SWAPO used force to achieve
their aims. Forced conscription, amongst others, seems to have been
a common practise56 . While the South African propaganda justified
the presence of SADF­‑ troops with the protection of the civil popula‑
tion they rather caused destruction and death among the civilians.
As Arn Durand describes it very clear:

It was always the local population, the civilians, who suffer


most during any war or conflict. […] The Ovambos, especially
those in southern Angola, get fucked up by SWAPO and then
by us, and then by us again and then by SWAPO again and then
by UNITA and then by FAPLA [Forças Armadas Populares de
Libertação de Angola – armed wing of the MPLA] 57 .

Because of loyalty towards SWAPO or fear of their revenge most


civilians did not cooperate with the SADF, which in turn caused the
anger of the South African soldiers: «As far as we believed most of
the locals were loyal to SWAPO, so they also became the enemy be‑
cause they were offering silent support to the terrs [terrorists] who
were trying to kill us» 58 .
Experiences of a war in which an attacker might disappear among
the civil population spread suspicion and anger against the civilians
among the Troepies. «The local population was no longer viewed as

56  RAMSDEN, Tim – Border­‑Line Insanity…, p. 139, p. 145, p. 155 and DURAND,
Arn – Zulu Zulu Golf – Life and Death…, p. 65­‑ 66 as well as STAPLETON, Timothy J. –
A Military History of South Africa..., p. 172.
57  DURAND, Arn – Zulu Zulu Golf – Life and Death…, p. 9.
58  RAMSDEN, Tim – Border­‑Line Insanity…, p. 136.

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Bosbefok and Koevoet
The Border War in Namibia and Angola in South African Soldiers’ Memory

innocuous for behind the disarming, friendly smile may have been
the hand that fired the missile» 59.
The refusal to cooperate was often described as stoic and caused
many National Servicemen to have no feelings of sympathy or even
empathy towards civilians. Therefore abuse and violence coined the
contact with the civil population. How many civilians died because
of mistreatment, violence from SWAPO or South African forces, fam‑
ine, landmines and unexploded ammunition is impossible to say60.
The poverty and simple living of the Ovambos was an odd expe‑
rience for most white South Africans. The brutal treatment and de‑
structions of war could worsen their conditions within minutes. After
surviving a fire fight close to an Ovambo settlement Anthony Feinstein
noticed: «Granted it was a barren, desolate area, but they had man‑
aged to build their village and support themselves the way most of
the Ovambo people did. In the space of twenty­‑five minutes it had
all been wiped away» 61. Innocent victims and the results of their
ruthless and violent action caused doubts among some Troepies about
the sense of their mission:

Our propaganda told us that we were in Namibia to protect


the local population from the dangers of terrorism and a godless
society. With a village destroyed, the area smouldering and lit‑
tered with pieces of human flesh, how was it possible to justify
our presence there? 62

59  FEINSTEIN, Anthony – In Conflict, p. 59.


60 
RAMSDEN, Tim – Border­‑Line Insanity…, p. 136, p. 149­‑150 and p. 271 and
DURAND, Arn – Zulu Zulu Golf – Life and Death…, p. 9 and p. 93­‑94.
61  RAMSDEN, Tim – Border­‑Line Insanity…, p. 148 and p. 271 and FEINSTEIN,
Anthony – In Conflict, p. 39 and p. 58.
62  FEINSTEIN, Anthony – In Conflict, p. 58.

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A Guerra e as Guerras Coloniais na África subsaariana (1914-1974)

Following British and French experiences in counterinsurgency


wars the SADF wanted to win the «hearts and minds» of the local
population to weaken SWAPO’s popularity. After 1977 a number of
development programs were started. National Servicemen and mem‑
bers of the Citizen Force were ordered to work in their civilian pro‑
fession as doctors or teachers to improve medical care and education63.
Army medic Anthony Feinstein experienced that the locals urgently
needed medical care but they disliked the military distribution. A com‑
mon reaction was: «We don’t want you, your knowledge or your
medicines. We want nothing from the Army» 64 . It seems that the
«hearts and minds» – operations of the SADF did not succeed, because
until their final withdrawal from Namibia the presence of South Af‑
rican troops was refused by the majority of the Namibian population65.

Consume of legal and illegal drug

«Any downtime in the operational area went hand­‑in­‑hand with


drinking – in our case through boredom. Those who had seen fight‑
ing turned to booze as a stress­‑reliever and medicine; for them it
became a tool to keep the tormenting demons at bay» 66 . Alcohol as
a legal and accessible drug was widespread among the South African
troops. In the remote bases and camps in the African bush it was
often the only leisure time activity. Others – having experienced
violence and war – used alcohol to cope with their burden. Officials

63  ESTERHUYS, Abel and JORDAAN, Evert – «The South African Defence…», p. 117
and STEENKAMP, Willem – South Africa’s Border War,…, p. 232.
64  FEINSTEIN, Anthony – In Conflict, p. 88
65  GORDON, Robert J. – «Oh Shucks, Here Comes UNTAG!. Peacekeeping as
Adventure in Namibia». In BAINES, Gary et alii. (Ed.) – Beyond the Border War – New
Perspectives on South Africa’s Late­
‑ Cold War Conflict. Pretoria: Unisa Press, 2008,
p. 233.
66  RAMSDEN, Tim – Border­‑Line Insanity…, p. 130.

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Bosbefok and Koevoet
The Border War in Namibia and Angola in South African Soldiers’ Memory

tried to limit or reduce the drinking among the troops while some
commanders tolerated no drop of alcohol among their subordinates 67.
Although strictly forbidden, Marijuana was also widespread among
the troops. Tim Ramsden reports that of the 37 soldiers of his platoon
30 frequently smoked marijuana, developing tricks how to hide their
drug consumption from their officers 68 . Missions in the Operational
Area made the drug use easier because there rules were not kept that
strict. Especially Angola seems to have been an «extra­‑legal area»
where acquisition and use of marijuana was even easier69.
Other soldiers tried to get high on whatever they could find. Med‑
ic Anthony Feinstein observed that the narcotics of his medical sup‑
plies mysteriously disappeared until he noticed that a colleague suf‑
fering from depression was the culprit: «Being a doctor, he had easy
access to the narcotics cupboard and the drug had helped him through
what by his own admission had been the hell of an infantry base»70.
For some the drug abuse led to a stay in the detention barracks.
Others finished their military career in rehab or the psychiatry of a
military hospital71.

67  BLAKE, Cameron – Troepie – From Call­


‑Up…, p. 162­ ‑163: Interview with an
unnamed former serviceman; FEINSTEIN, Anthony – In Conflict, p. 44 and p. 210.
68 
RAMSDEN, Tim – Border­‑Line Insanity…, p. 40, p. 48, p. 70, p. 75, p. 191 and
DURAND, Arn – Zulu Zulu Golf – Life and Death…, p. 265.
69  BLAKE, Cameron – Troepie – From Call­‑ Up…, p. 115, p. 157 and p. 247: Interviews
with unnamed former servicemen.
70  FEINSTEIN, Anthony – In Conflict, p. 66 and p. 139.
71 
BLAKE, Cameron – Troepie – From Call­‑Up…, p. 116 and p. 157: Interviews with
unnamed former servicemen and FEINSTEIN, Anthony – In Conflict, p. 139.

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A Guerra e as Guerras Coloniais na África subsaariana (1914-1974)

«Bosbefok»: The Post Traumatic Stress Disorder (PTSD)

Drugs could not protect from the invisible scars of war. Because
of the physical and mental pressure and the experience of violence
and war several of the homecoming soldiers suffered from Post­
‑Traumatic Stress Disorder (PTSD). In South Africa it became com‑
monly known as «bosbefok» (sometimes spelled «bosbevok»), which
can literally be translated as «bush crazy» and has its origin in the
military slang 72 .
The death of a good friend or a comrade, steady mental pressure
as well as other traumatising experiences of fights and violence could
cause symptoms of PTSD. Some Troepies suffered so heavily that
they decided to go AWOL: «When I came back I didn’t talk about
things anymore. I totally withdrew. […] I refused to go back. I just
said, ‘No more. That’s it’»73 .
Traumatising experiences and the physical and mental pressure
also caused a fatalistic carelessness among some soldiers. Enforced
by the boredom and a feeling of senselessness simple security rules
were disobeyed and the own life was risked: «We had developed a
fatalistic attitude that whatever happened, happened. We shrugged
and treated it like a training exercise»74.
During training soldiers were already pushed to their limits to
prepare them for combat. Bullying by superiors was also common
and raised the tension. The thin red line that marked how much
pressure and harassment someone could bear was called «breaking
point». Once the breaking point was reached, conflicts between troops

72  CONWAY, Daniel – «Somewhere on the Border­ ‑ of Credibility…», p. 84 and


BLAKE, Cameron – Troepie – From Call­‑Up…, p. 295.
73  An unnamed former serviceman quoted from BLAKE, Cameron – Troepie – From
Call­‑Up…, p. 248 ­‑249.
74  RAMSDEN, Tim – Border­‑Line Insanity…, p. 115, p. 135, p. 142 and p. 194;
BLAKE, Cameron – Troepie – From Call­‑Up…, p. 248: Interview with an unnamed
former serviceman.

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Bosbefok and Koevoet
The Border War in Namibia and Angola in South African Soldiers’ Memory

and their officers or among the soldiers would escalate, often violent.
Some soldiers had to face military courts for attacking superiors or
comrades75.
The number of soldiers affected of mental disorder and PTSD was
so high that the military command could not ignore it. Tim Ramsden
remembers about his return from the Operational Area in 1988:

We had to go through seven tents, which they pointed out


to us. In each there was a table, a few chairs, and a couple of
military counsellors, more appropriately called head doctors […].
Maybe they thought that everybody coming back from the border
was bosbevok – suffering from borderline insanity. Well, maybe
they were right 76 .

Having studied psychology before being drafted, Anthony Feinstein


noticed that he himself featured some of the evidence of the stress
disorder:

Suddenly and unexpectedly I found myself in the unpleasant,


although interesting, position of reviewing the case history of
my own experience. And for my company I had a base full of
prospective clients. I was in the unique position of being able to
document PTSD symptomatology in our unit over time 77 .

75  BLAKE, Cameron – Troepie – From Call­‑ Up…, p. 50, p. 60 and p. 63: Interviews
with unnamed former servicemen; DURAND, Arn – Zulu Zulu Golf – Life and Death…,
p. 44­‑ 45 and RAMSDEN, Tim – Border­‑Line Insanity…, p. 20, p. 93­‑94, p. 158­‑159 and
p. 170­‑171.
76  RAMSDEN, Tim – Border­‑Line Insanity…, p. 277.
77  FEINSTEIN, Anthony – In Conflict, p. 90.

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A Guerra e as Guerras Coloniais na África subsaariana (1914-1974)

War Crimes and Acts of Torture

As it has been shown, war crimes against the civil population were
committed by both SWAPO and the South African troops. The sights
of murder and innocent victims created situations that even the hard‑
ened Troepies were not prepared for. Discovering murdered civilians
during a patrol in Southern Angola Tim Ramsden recognized that:
«When I closed my eyes, I could almost hear the screams and feel the
tension of what had occurred»78 . This memory should stay forever:
«We knew, however, that we would never be able to cleanse our minds
of it. It would haunt us forever»79.
Abuse and torture of captured suspects was a common practise
among the South African security forces in Namibia and Angola. To
gain information about weapons caches or marching routes suspects
were beaten and mistreated. Some were put into earth holes without
food or water to let them suffer in the harsh Namibian climate that
ranges from burning hot during the day to sub­‑zero temperatures
during the night. Others report that captured suspects were bound
to the fenders or the front of a military vehicle that would then break
through the thick bush to cause multiple injuries and heavy pain for
the victim until he revealed his information 80.
Torture is often blamed on the Special Forces of the army and the
«Koevoet» Police Counterinsurgency unit, but mistreatment of captured
suspects was also practised by regular army units. The victims of
torture and captives that seemed to have no value for the security

78  Idem – Ibidem, p. 94.


79  Idem – Ibidem, p. 168 and p. 282.
80  Idem – Ibidem, p. 103; BLAKE, Cameron – Troepie – From Call­‑Up…, p. 165,
p. 168 and p. 181: Interviews with unnamed servicemen and DURAND, Arn – Zulu Zulu
Golf – Life and Death, p. 1. For testimonies in court about torture by the South African
police force in Namibia see: «Torture in Namibia». South African Outlook. Rondebosch.
Vol. 116, no. 1366, April 1985, p. 57­‑59.

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Bosbefok and Koevoet
The Border War in Namibia and Angola in South African Soldiers’ Memory

forces were executed and murdered in the bush 81. The Operational
Area again proofed to be a lawless, extrajudicial area where platoon
leaders or even common soldiers felt authorized to execute a self­
‑condemned death­‑ sentence or at least could be sure that war crimes
would not be discovered and brought to court.
«The cutting off of ears, fingers and even scrotums was practised
by some members of the armed forces and Koevoet» 82 . As it is also
known to be practised by American GIs in Vietnam, some South
African soldiers in Namibia and Angola mutilated the bodies of killed
enemies too 83 . Anthony Feinstein remembers that human remains
were kept as trophies: «I was told with a good deal of mirth that the
clothing and bones had been taken from guerrilhas, killed in com‑
bat» 84. Not every officer tolerated such misdeed. The execution of
captives however seems to have been a common practise among the
South African forces 85.

«Koevoet»: The Counterinsurgency Unit of the South African Police


in Namibia

The Special Operations (K) Unit of the South African Police in


Namibia became known as «Koevoet». Koevoet is an Afrikaans slang
word and literally means «cow foot» but describes the «crow bar» or

81  BLAKE, Cameron – Troepie – From Call­‑ Up…, p. 173, p. 189 and p. 296: Interviews
with unnamed servicemen and DURAND, Arn – Zulu Zulu Golf – Life and Death, p. 1­‑3,
p. 189 and p. 245.
82  BLAKE, Cameron – Troepie – From Call­‑Up…, p. 188.
83  DURAND, Arn – Zulu Zulu Golf – Life and Death, p. 188­ ‑189 and BLAKE,
Cameron – Troepie – From Call­‑Up…, p. 151: Interview with an unnamed serviceman.
For US­‑war crimes in Vietnam compare: GREINER, Bernd – Krieg ohne Fronten – Die
USA in Vietnam. Bonn: Bundeszentrale für politische Bildung, 2007, p. 183­‑184 and
p. 240­‑242.
84  FEINSTEIN, Anthony – In Conflict, p. 32.
85  DURAND, Arn – Zulu Zulu Golf – Life and Death, p. 188­‑189.

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A Guerra e as Guerras Coloniais na África subsaariana (1914-1974)

«pinch bar» tool that is used to violently open doors, windows, etc.
Established in 1979 the Koevoet units were at first treated like an
open secret until they became a formal branch of the 1982 founded
South West African Police (SWAPOL). Recruited mainly from the local
population and former SWAPO fighters who had been turned to fight
their former comrades they were commanded by white police officers
of the SAP or SWAPOL or volunteers from the SADF reserve. In fact
they were nothing but bounty hunters in service of the South African
Security Forces because they received rewards for every killed «ter‑
rorist» 86 . Attracted by the bounty and the notorious reputation, many
Koevoet fighters were very young. Anthony Feinstein remembers a
Koevoet officer during recruiting: «As long as they were able to pull
a trigger that was fine with him» 87.
Koevoet was between 1000 and 2000 man strong and equipped
with the typical Casspir armoured cars of the South African Police.
The unit claimed to have the highest «kill­‑ratio» of all South African
troops, meaning they had the highest number of killed enemies com‑
pared to own losses 88 . Koevoet soon had a notorious reputation as a
merciless fighting unit consisting of adventurers, dare devils and

86  STEENKAMP, Willem – South Africa’s Border War, p. 208; DURAND, Arn – Zulu
Zulu Golf – Life and Death, p. 77, p. 82­‑ 84 and p. 90; BLAKE, Cameron – Troepie – From
Call­‑Up…, p. 165: Iinterview with an unnamed former serviceman and RAMSDEN, Tim
– Border­‑Line Insanity…, p. 175.
87  FEINSTEIN, Anthony – In Conflict, p. 16 and see also DURAND, Arn – Zulu Zulu
Golf – Life and Death, p. 111.
88  RAMSDEN, Tim – Border­‑Line Insanity…, p. 124, p. 132 and p. 142 and DURAND,
Arn – Zulu Zulu Golf – Life and Death, p. 180, p. 184, p. 189, p. 249 and p. 267­‑268.
Arn Durand figures Koevoet‘s «kill ratio» at 25:1, what would signify Koevoet as the
most efficient combat unit in the history of military conflicts (seep. 82). «Body Count»
was also common among the American forces in Vietnam, see GREINER, Bernd, Krieg
ohne Fronten – Die USA in Vietnam, p. 75­‑76. In Vietnam for example Special Forces
of the US­‑Army had a «kill ratio» of 22:1 that was seven times higher than the ratio of
average units. Here it is also not clear how many killed civilians were counted as enemy
casualties (see GREINER, Bernd, Krieg ohne Fronten – Die USA in Vietnam, p. 166).
RAMSDEN, Tim – Border­‑ Line Insanity…, p. 132; «Torture in Namibia», p. 58 and
DURAND, Arn – Zulu Zulu Golf – Life and Death, p. 9.

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A Guerra e as Guerras Coloniais na África subsaariana (1914-1974)

medes e os seus arredores surgem em dois artigos como destino


turístico, retratados com o habitual discurso de êxtase59.
Os artigos sobre turismo continuam ao longo de todo o período,
fosse apresentando propostas e um pensamento crítico sobre a ques‑
tão turística (eles próprios indícios dessa continuidade), fosse divul‑
gando destinos turísticos em Angola, que convidavam os leitores a
visitarem pontos espalhados por todo o território, de preferência ao
volante do seu automóvel. Para além da constatação da normalidade,
a revista convida o leitor a verificá­‑la por si próprio, viajando. Entre
os destinos elencados, encontramos Luanda e arredores, Lobito, Sá
da Bandeira e arredores, Cabinda, Malange, o Parque Nacional da
Quiçama.
Um outro convite à viagem é feito em setembro de 1970, com a
publicação de uma lista das festas e romarias que acontecem por
todo o território 60, das quais apenas as de Teixeira de Sousa, no dis‑
trito do Moxico, «devido à situação atual têm­‑ se limitado à tradicional
festa de 15 de agosto, que está muito longe de atingir o brilhantismo
de outrora» 61.
No número de janeiro de 1966, Cruz Leal define a necessidade do
conhecimento do território pelos seus habitantes, a par da atração
de estrangeiros 62 . Já em 1964, Mário Pirelli, um especialista em caça
e colaborador regular da revista, é bastante claro: os visitantes es‑
trangeiros «chegam todos à conclusão, que um país onde se pode
efetuar safaris tão excelentes e tranquilos não pode ser, de maneira

59  Idem – Ibidem, p. 11­‑12 e p. 25.


60  ATCA. III Série. Luanda: Automóvel Touring Club de Angola. N.º 50, set. 1970,
p. 28­‑29.
61  Idem – Ibidem, p. 29.
62  ATCA. III Série. Luanda: Automóvel Touring Club de Angola. N.º 38, jan. 1966,
p. 6­‑9. «Todos nós amamos muito esta nossa terra. Mas a maioria ama­‑a porque ‘é nossa’
e porque a sente na alma e no sangue. Muito mais a amaria se a conhecesse tal e qual
ela é, exuberante, rica, colorida, progressiva, exótica e até fantástica e sem dúvida,
grandiosa». Idem – Ibidem, p. 7.

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O Automóvel Touring Club de Angola e o automobilismo
ao serviço do império (1961–1974)

nenhuma, teatro duma guerra generalizada de subversão» 63 , numa


lógica que já vimos ser utilizada também a propósito do Grande
Prémio. Na linha dessa ideia de atração de turistas estrangeiros, a
revista publica em 1967 pequenas brochuras com vistas de Luanda a
cores, legendadas em português, francês, inglês e alemão.
A título de curiosidade, refira­‑se que o CITA – um organismo
oficial – publicou em 1966 um guia intitulado Itinerários de Angola,
organizado pelo presidente do ATCA, Acácio Pereira de Matos, con‑
sistindo num conjunto de rotas que cobriam todo o território, acom‑
panhado de uma série de informações úteis aos viajantes, como for‑
malidades de safaris ou hotéis 64 . Ou seja, há de facto uma ideia
generalizada de normalidade e de abstração em relação ao conflito,
sendo a apropriação do território feita pelo turismo e o automobilismo
a derradeira negação, algo que também é visível na ampla cobertura
das provas automobilísticas que por toda a Angola se realizam. São
noticiadas provas em Nova Lisboa, Cela, Moçâmedes, Lobito, Malan‑
ge, Sá da Bandeira, Cabinda, Salazar, Carmona, Novo Redondo, Ben‑
guela, bem como o rali universitário entre Luanda e Malange e o

63  ATCA. III Série. Luanda: Automóvel Touring Club de Angola. N.º 25, jul. 1964,
p.  41. O mesmo Pirelli alertaria depois para os inconvenientes que a entrada de
clientes de safari em Angola pela recém­‑independente Zâmbia, «o mais novo Estado
africano a entrar seguramente mais tarde ou mais cedo no coro daqueles que tentam
desacreditarem­‑nos perante o Mundo», poderia trazer à propaganda da província. Ver
ATCA. III Série. Luanda: Automóvel Touring Club de Angola. N.º 27, set. 1964, p. 26­‑27 e
p. 29. A questão é novamente abordada em ATCA. III Série. Luanda: Automóvel Touring
Club de Angola. N.º 38, jan. 1966, p. 11 e p. 13.
64  O ATCA publicara uma primeira versão do Itinerários de Angola em 1960. Os
itinerários aí contidos coincidem com a rede de estradas de 1.ª classe (conforme o
mapa em GALVÃO, Henrique e SELVAGEM, Carlos – Império Ultramarino Português.
Monografia do Império. Vol. III. Lisboa: Empresa Nacional de Publicidade, 1951, p. 305),
confirmando essa ligação entre turismo e automobilismo. O CITA teria comprado mil
exemplares para distribuição no estrangeiro. Ver ATCA. III Série. Luanda: Automóvel
Touring Club de Angola. N.º 13, jul.­‑set. 1961, p. 25. Uma outra publicação do CITA,
Visite Angola, terra de Portugal, inclui na sua síntese histórica uma alusão a 1961, cuja
pronta resposta demonstra a tenacidade dos portugueses e que a província «regressará
vitoriosa ao passo glorioso da paz». Ver Visite Angola, terra de Portugal. Luanda: CITA/
Fundo de Turismo e Publicidade, 1970, 104 p.

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A Guerra e as Guerras Coloniais na África subsaariana (1914-1974)

Grande Rali de Angola, este último organizado pelo Clube Ferroviá‑


rio de Luanda 65.
A ideia de normalidade é bastante difundida, mas a revista não
perde de vista a necessidade de fazer acompanhar essa normalidade
de uma ativa aposta no fomento. A questão do fomento é algo que
vai estar sempre presente na política ultramarina deste período, for‑
temente impulsionada pela guerra, como forma de invalidar a liber‑
tação 66 . Ou seja, também aqui o clube se coloca ao lado da política
oficial e a revista vai dando conta do desenvolvimento que se verifi‑
ca em Angola.
Logo no número que reagira contra os massacres de março de
1961, encontramos um artigo, da pena de Cruz Leal, dedicado à
construção da barragem de Cambambe 67, cuja imagem figura na capa.
Esse artigo sintetiza bem o discurso relativamente ao ultramar em
tempo de guerra: ao desenvolvimento da economia ultramarina, aliam­
‑se referências à secular presença portuguesa. O artigo contém mes‑
mo uma fotografia de uma antiga fortaleza do tempo dos primeiros
portugueses no local e outras da barragem em construção, símbolos
de uma mesma luta – a dos portugueses – na defesa da pátria 68 .
Dois números depois, o editorial versa sobre a questão da aposta
no turismo em Angola, tema que os acontecimentos de março alega‑
damente teriam posto de parte. O conflito é mesmo visto como um

65  Prova internacional que cobria quase 5 000 quilómetros, foi, segundo um
corredor, «o expoente máximo do calendário de ralis angolano». SOUSA, Hélder de –
«Ultramar. O lento despertar». In RODRIGUES, José (Dir.) – História do Automobilismo
Português. Algés: Edições Talento, 2004, p. 170.
66  A constatação desse paradoxo entre guerra e crescimento é feita em WHEELER,
Douglas e PÉLISSIER, René – Ibidem, p. 327­‑331 e MURTEIRA, Mário – «Formação
e colapso de uma economia colonial». In BETHENCOURT, Francisco e CHAUDHURI,
Kirti (Dir.) – História da Expansão Portuguesa. Vol. V. Último Império e recentramento
(1930–1998). Lisboa: Círculo de Leitores, 1998, p. 124­‑125.
67  ATCA. III Série. Luanda: Automóvel Touring Club de Angola. N.º 11, fev.­
‑mar.
1961, p. 15­‑18.
68  Também aqui não deixa de ser feita a apologia da estrada que «agora construída
de novo é ampla e lisa». Ver Idem – Ibidem, p. 15.

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O Automóvel Touring Club de Angola e o automobilismo
ao serviço do império (1961–1974)

pretexto para o investimento: «talvez não seja mau que, neste mo‑
mento de patriotismo se procure, em velocidade, ganhar o que temos
perdido». O discurso em prol de realizações e iniciativas é constante
e os ataques a Portugal só devem é aumentar o empenho no desen‑
volvimento como prova da boa ação civilizadora dos portugueses.
Assim, nos vários artigos que a revista dedica aos destinos turísticos
são constantes as alusões, tanto à história da presença portuguesa
nos locais, como ao desenvolvimento que atravessam.
O próprio ATCA se vê a si próprio como um agente de desenvol‑
vimento. Por ocasião da inauguração da estação de serviço do ATCA,
em 1 de março de 1962, o presidente, Pereira de Matos, dirá que:

Na hora que passa, em que os abutres internacionais se pre‑


param, para nos espoliarem do que só a nós pertence, o A.T.C.A.
está a dar um exemplo firme, da nossa indomável vontade de não
alienarmos o património nacional, de que Angola é uma parcela
indivisível 69 .

O contributo do ATCA em prol da manutenção do império é feito


a vários níveis. Nessa mesma inauguração, o melhoramento introdu‑
zido merece do governador do distrito considerações que negam a
existência de conflitos raciais, religiosos ou sociais e reitera a «firme
determinação de todos nós portugueses de aqui nos mantermos a
todo o transe», combatendo «essa alcateia feroz de comunistas e seus
apaniguados»70.
A revista vai noticiando outros melhoramentos, mesmo quando
são levados a cabo por outros, desde que relacionados com as suas
atividades. Por exemplo, dá conta da instalação de um serviço de

69  ATCA. III Série. Luanda: Automóvel Touring Club de Angola. N.º 15, fev.­‑abr.
1962.
70  Idem – Ibidem, p. 13.

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A Guerra e as Guerras Coloniais na África subsaariana (1914-1974)

aluguer de automóveis na estação de serviço do ATCA71 e noticia a


apresentação da maquete de um novo hotel para Luanda72 .
Em 1968, dedica um longo artigo à inauguração da fábrica de
pneus da Mabor Angolana – acontecimento apontado como decisivo
no desenvolvimento dos meios de transporte e na industrialização
do território73 – largamente ocupado pelos discursos inaugurais de
Miguel Quina, vice­‑presidente do conselho de administração da em‑
presa, e de Rui Patrício, o subsecretário de Estado do Fomento Ul‑
tramarino. O primeiro refere que a constituição da Mabor Angolana,
a 15 de junho de 1961, teve lugar quando «Angola já estava a ser
magoada na sua carne e perturbada no sossego da sua vida normal»,
algo que não fez os autores da iniciativa hesitar. Partindo de uma
visão do empresário enquanto dono de empresa e mandatário do
interesse geral, houve nos autores do projeto um «novo estímulo,
quando o terrorismo lançou ingloriamente o seu repto»74. O discurso
do subsecretário de Estado vai também no sentido da unidade e da
continuidade portuguesa como demonstração do seu valor. Mais elo‑
quente acerca do significado da fábrica de pneus é o anúncio da
mesma no mesmo número da revista, que afirma que «os pneus acom‑
panham e apoiam o desenvolvimento do território, nas rodas labo‑
riosas dos transportes automóveis, que são o palpitar incessante de
uma economia em expansão. Continuando a unir os mais distantes
pontos da Província os nossos pneus servem o anseio de progresso

71  ATCA. III Série. Luanda: Automóvel Touring Club de Angola. N.º 19, ago. 1963,
p. 19.
72  ATCA. III Série. Luanda: Automóvel Touring Club de Angola. N.º 33, abr. 1965,
p. 35.
73  A Mabor fora um dos patrocinadores da publicação dos Itinerários de Angola
de 1960. Sobre a Mabor Angolana, ver MARCELINO, José (Coord.) – Mabor: 50 anos de
sucesso. Algés: Arte Mágica, 2005, p. 96.
74  ATCA. III Série. Luanda: Automóvel Touring Club de Angola. N.º 48, mai.­
‑jul.
1968, p. 29.

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O Automóvel Touring Club de Angola e o automobilismo
ao serviço do império (1961–1974)

de toda a população»75. O fomento é um antídoto contra a guerra,


um serviço prestado ao império e à civilização e o automobilismo
um seu poderoso agente. De novo a ideia do automobilismo como
agente de dominação.

Conclusão

A ideia sempre presente da normalidade associa­‑se a aposta no


fomento e uma estratégia de propaganda, numa combinação de ele‑
mentos que tentam negar a guerra e tudo o que vá contra os princí‑
pios do colonialismo português. Ou seja, o discurso e as realizações
são combinados e utilizados como forma de invalidar os ataques
internacionais e a ação dos movimentos de libertação e o ATCA (uma
associação da sociedade branca, alinhada com o poder) não deixa
de difundir essa lógica na sua revista, criando uma imagem de tran‑
quilidade e progresso, em que o automóvel é parte importante. Isso
ficou bastante claro a propósito do Rali do Congo de 1964, em que
o automóvel consagrara a pacificação de uma região de conflito,
conflito esse que merece reações assertivas enquanto se trata de um
ataque inicial, mas que é depois desvalorizado, também com compa‑
rações com o automobilismo. De resto, toda a atividade do ATCA vai
no sentido de invalidar essa guerra: fazendo propaganda de uma
Angola tranquila e luso­‑tropical através da divulgação de provas e
do apelo à viagem. O automobilismo é uma atividade politizada,
agente de um império, e serve a manutenção desse império e até a
construção de uma identidade nacional pluricontinental.

75  Idem – Ibidem, p. 3.

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A Guerra e as Guerras Coloniais na África subsaariana (1914-1974)

Fontes

ATCA. III Série. Luanda: Automóvel Touring Club de Angola (1960–1970).


Boletim Oficial da Colónia de Angola, II Série, n.º 23. Luanda: Imprensa Nacional (1936­
1944).
Itinerários de Angola. Luanda: Edição do Automóvel Touring Club de Angola­‑Luanda,
1960, 22 p.
MATOS, Acácio Pereira de (Org.) – Itinerários de Angola, Luanda: Centro de Informação
e Turismo de Angola, Fundo de Turismo e Publicidade, 1966, 112 p.

Referências bibliográficas

ADAS, Michael – Machines as the Measure of Men: Science, Technology, and Ideologies
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