Forças-Tarefa E Investigação Criminal: A Integração Institucional No Combate À Macrocriminalidade

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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DO RIO GRANDE DO SUL

FACULDADE DE FILOSOFIA E CIÊNCIAS HUMANAS


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM CIÊNCIAS SOCIAIS
MESTRADO EM CIÊNCIAS SOCIAIS

SANDRA GOLDMAN RUWEL

FORÇAS-TAREFA E INVESTIGAÇÃO CRIMINAL:


A INTEGRAÇÃO INSTITUCIONAL NO COMBATE À MACROCRIMINALIDADE

Orientador: Prof. Dr. Rodrigo Ghiringhelli de Azevedo

PORTO ALEGRE
2008
1

SANDRA GOLDMAN RUWEL

FORÇAS-TAREFA E INVESTIGAÇÃO CRIMINAL:


A INTEGRAÇÃO INSTITUCIONAL NO COMBATE À MACROCRIMINALIDADE

Dissertação apresentada ao Programa


de Pós-Graduação em Ciências Sociais
da Faculdade de Filosofia e Ciências
Humanas da Pontifícia Universidade
Católica do Rio Grande do Sul como
requisito parcial para obtenção do grau
de Mestre em Ciências Sociais.

Orientador: Prof. Dr. Rodrigo Ghiringhelli de Azevedo

PORTO ALEGRE
2008
2

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)

R983f Ruwel, Sandra Goldman


Forças-tarefa e investigação criminal: a integração institucional no combate à macrocriminalidade/
Sandra Goldman Ruwel – Porto Alegre, 2008.
209 f.
Diss. (Mestrado) – Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas. Programa de Pós-Graduação Ciências
Sociais. Mestrado em Ciências Sociais. PUCRS, 2008.

Orientação: Prof. Dr. Rodrigo Ghiringhelli de Azevedo.

1. Segurança Pública. 2. Justiça Criminal. 3. Investigação


Criminal. 4. Organização - Aspectos Sociais. I. Título.

CDD 341.5903

Bibliotecário Responsável
Ednei de Freitas Silveira
CRB 10/1262
3

SANDRA GOLDMAN RUWEL

FORÇAS-TAREFA E INVESTIGAÇÃO CRIMINAL:


A INTEGRAÇÃO INSTITUCIONAL NO COMBATE À MACROCRIMINALIDADE

Dissertação apresentada ao Programa


de Pós-Graduação em Ciências Sociais
da Faculdade de Filosofia e Ciências
Humanas da Pontifícia Universidade
Católica do Rio Grande do Sul como
requisito parcial para obtenção do grau
de Mestre em Ciências Sociais.

Orientador: Prof. Dr. Rodrigo Ghiringhelli de Azevedo

Aprovada em 24 de março de 2008.

BANCA EXAMINADORA:

__________________________________
Prof. Dr. Rodrigo Ghiringhelli de Azevedo

__________________________________
Prof. Dr. Hermílio Pereira Santos Filho

__________________________________
Prof. Dr. Mauro Fonseca Andrade
4

DEDICATÓRIA

Há 15 anos ele morreu, deixando-me


valores que procuro sempre seguir:
integridade, honestidade, transparência e
a eterna vontade de lutar e nunca desistir,
pois “perder uma batalha não significa
que a guerra não será vencida”. Aquele
que lutou pelo seu país, pela sua raça,
numa guerra estúpida, mas que nunca
perdeu a esperança, morrendo com a
certeza da missão cumprida: Meu Pai,
Abusz Goldman – o legítimo “Homem de
Ouro”.
5

AGRADECIMENTOS

Ao meu orientador, Rodrigo Ghiringhelli de Azevedo, por ter acreditado em


mim, num momento em que muitos resistiam, demonstrando que o verdadeiro
homem acredita na diferença e aceita a diversidade. Isso é berço, integridade e
caráter: qualidades que diferenciam Rodrigo de tantos outros.
À minha família, que soube me apoiar nos momentos mais difíceis dessa
jornada, sempre me encorajando a seguir em frente: minha mãe, meu marido e
meus filhos: Regina, Daniel, Alex e Andressa.
Aos integrantes do Ministério Público, Polícia Militar, Polícia Civil e do
Governo do Estado de Minas Gerais, pelo apoio decisivo à viabilização dessa
dissertação.
Ao Mestrado em Ciências Sociais da PUCRS, pela qualidade ímpar de
iluminar e abrir os horizontes de seus alunos de forma imparcial.
À Instituição do Ministério Público do Rio Grande do Sul, pela colaboração
e confiança em mim depositadas.
A todos os Amigos, Colegas, Professores, Policiais Militares e Policias
Civis do Rio Grande do Sul que contribuíram, de alguma forma, para a
concretização desse sonho.
6

RESUMO

Nesta pesquisa, objetivou-se estudar a atuação das Forças-Tarefas como


mecanismo de investigação que procura integrar diferentes instituições para o
enfrentamento da criminalidade e da violência, em especial quanto à
macrocriminalidade.
Para tanto, realizou-se uma pesquisa qualitativa, pelo método do Estudo de
Caso, circunscrito ao Centro de Apoio Operacional de Combate ao Crime
Organizado – CAOCRIMO, Grupo de Combate às Organizações Criminosas –
GCOC, e Grupo Integrado de Segurança Pública-GISP, de Minas Gerais, à
Promotoria Especializada Criminal do Ministério Público do Rio Grande do Sul, à
Força-Tarefa do Ministério Público Federal e à Task Force – Força-Tarefa
Americana.
A pesquisa foi conduzida em duas etapas. Uma etapa preliminar foi destinada
a contextualizar a criminalidade e a violência nos dias atuais. A partir dessa
realidade, com base na Sociologia das Organizações (em especial, na análise da
estratégia, poder e cultura organizacional), buscou-se analisar o impacto do crime
organizado na sociedade atual e a experiência de algumas Forças-Tarefa que atuam
no combate à macrocriminalidade. Para tanto, os órgãos que compõem a Segurança
Pública e o Sistema de Justiça Criminal, em especial as Polícias Civil e Militar e o
Ministério Público, foram objetos de análise.
A segunda etapa constituiu-se da abordagem dos sujeitos centrais da Força-
Tarefa, com a utilização de algumas técnicas de pesquisa, como a entrevista semi-
estruturada, a pesquisa documental e a observação participante junto à “Operação
Caminhada” da Força-Tarefa de Combate ao Crime Organizado do Estado de Minas
Gerais na cidade de Passos.
A partir dessa análise foi possível perceber que a Força-Tarefa pode ser
utilizada como mecanismo válido e eficaz de combate à macrocriminalidade, sendo
necessário, no entanto, identificar e superar dificuldades e equívocos que obstam o
processo de integração institucional, verificados em algumas das situações
investigadas.

Palavras-chave: Segurança Pública - Justiça Criminal - Investigação –


Macrocriminalidade - Força-Tarefa – Integração Institucional
7

ABSTRACT

In this research, one aimed to study the performance of Task-Force as a


mechanism of inquiry which seeks to integrate different institutions for the
confrontation of crime and violence, mainly in terms of the macro criminality.
For such, a qualitative research was performed throughout the method of the
“Case Study”, restricted to the Center of Operational Support of Combat to the
Organized Crime - CAOCRIMO, Group of Combat to the Criminal Organizations -
GCOC and Integrated Group of Public Security - GISP of the State of Minas Gerais
to the Criminal Specialized Public Prosecutor's Office of the Criminal Public
Prosecution Service of the State of Rio Grande do Sul, to the Task-Force of the
Federal Public Prosecution Service and to the American Task-Force.
The research was developed in two stages. A preliminary stage was destined
to analyze the crime and the violence in the current days. From this reality and based
on the Sociology of the Organizations (mainly in the analysis of the strategy, power
and organizational culture), one searched to analyze the impact of the organized
crime in the current society and the experience of some Task-Force that act in the
combat to macro criminality. For in such, the agencies that compose the Public
Security and the Criminal Justice System, in special the Civil and Military Policies and
the Public Prosecution Service were objects of analysis.
The second stage consisted of the approach of the central characters of the
Task-Force with the use of some research techniques as the half-structuralized
interview, documentary research and the participant observation next to the “Walked
Operation” of Task-Force of Combat to the Organized Crime of the State of Minas
Gerais, in the city of Passos.
From this analysis was possible to perceive that the Task-Force can be used
as a valid and efficient mechanism of combat to macro criminality, being needed,
however, to identify and overcome difficulties and mistakes that make difficult the
process of institutional integration, verified in some investigated situations.

Keywords: Public Security - Criminal Justice - Inquiry - Macro Criminality- Task


Force - Institutional Integration
8

ABREVIATURAS

BM: Brigada Militar


CAOCRIMO: Centro de Apoio Operacional de Combate ao Crime Organizado
CF: Constituição Federal
CPI: Comissão Parlamentar de Inquérito
FT: Força-Tarefa
FTMG: Força-Tarefa de Minas Gerais
FTMPF: Força-Tarefa do Ministério Público Federal
FTRS: Força-Tarefa do Rio Grande do Sul
GCOC: Grupo de Combate às Organizações Criminosas
GISP: Grupo Integrado de Segurança Pública
Gov. Est. MG: Governo do Estado de Minas Gerais
IP: Inquérito Policial
MG: Minas Gerais
MJ: Ministério da Justiça
MP: Ministério Público
MPF: Ministério Público Federal
MPMG: Ministério Público de Minas Gerais
MPRS: Ministério Público do Rio Grande do Sul
PC: Polícia Civil
PCC: Primeiro Comando da Capital
PCMG: Polícia Civil de Minas Gerais
PCRS: Polícia Civil do Rio Grande do Sul
PJ: Poder Judiciário
PM: Polícia Militar
PMMG: Polícia Militar de Minas Gerais
PMRS: Polícia Militar do Rio Grande do Sul
PRONASCI: Programa Nacional de Segurança Pública com Cidadania
9

SEDS: Secretaria de Estado de Defesa Social de Minas Gerais


SENASP: Secretaria Nacional de Segurança Pública
SJS: Secretaria de Justiça e da Segurança
SUSP: Sistema Único de Segurança Pública
10

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO.................................................................................................................................... 12
1 CONCEITOS BÁSICOS: SEGURANÇA PÚBLICA, JUSTIÇA CRIMINAL, FORÇA-
TAREFA E CRIME ORGANIZADO ................................................................................................ 20
1.1 SEGURANÇA PÚBLICA ........................................................................................................ 20
1.2 JUSTIÇA CRIMINAL ............................................................................................................... 21
1.3 FORÇA-TAREFA..................................................................................................................... 22
1.4 CRIME ORGANIZADO ........................................................................................................... 23
2 DA CRIMINALIDADE E DA VIOLÊNCIA ................................................................................... 26
2.1 DISTINÇÃO ENTRE VIOLÊNCIA E CRIMINALIDADE..................................................... 27
2.2 DA REALIDADE DA CRIMINALIDADE E DA VIOLÊNCIA............................................... 28
2.2.1 Da Pobreza, Exclusão e Desigualdade Social ....................................................... 29
2.2.2 Da Violência como Meio de Solução de Conflito .................................................. 32
2.2.3 Da Transição Democrática.......................................................................................... 33
2.2.4 Da Impunidade ............................................................................................................... 35
2.3 DILEMAS DE GESTÃO.......................................................................................................... 39
2.3.1 Da Escassez de Informações e das Estatísticas................................................... 39
2.3.2 Ausência de Pesquisa de Vitimização ..................................................................... 43
2.3.3 Do “Efeito Funil” no Sistema de Justiça Criminal................................................ 44
2.3.4 Falta de Gestão e de Prioridade Política ................................................................. 45
2.3.5 Ineficiência do Sistema de Inteligência ................................................................... 50
3 SOCIOLOGIA DAS ORGANIZAÇÕES....................................................................................... 53
3.1 CONCEITO DE ORGANIZAÇÕES....................................................................................... 54
3.2 A DINÂMICA DAS ORGANIZAÇÕES.................................................................................. 55
4 DOS ÓRGÃOS QUE INTEGRAM O SISTEMA DE SEGURANÇA PÚBLICA E JUSTIÇA
CRIMINAL ........................................................................................................................................... 73
4.1 DA SEGURAÇA PÚBLICA..................................................................................................... 73
4.2 DA JUSTIÇA CRIMINAL ........................................................................................................ 77
4.3 DAS POLÍCIAS ........................................................................................................................ 82
4.3.1 Da Polícia Civil ............................................................................................................... 84
4.3.2 Da Polícia Militar ............................................................................................................ 86
4.4 DO MINISTÉRIO PÚBLICO................................................................................................... 93
5 DA MACROCRIMINALIDADE.................................................................................................... 101
5.1 DO DESENVOLVIMENTO DA CRIMINALIDADE ORGANIZADA NO BRASIL.......... 102
5.2 DA MACROCRIMINALIDADE ATUAL ............................................................................... 105
6 DA ORDENAÇÃO METODOLÓGICA ...................................................................................... 114
6.1 ESTUDO DE CASOS ........................................................................................................... 115
6.2 DAS ENTREVISTAS SEMI-ESTRUTURADAS ................................................................ 116
6.3 PESQUISA DE CAMPO COM OBSERVAÇÃO PARTICIPANTE ................................. 119
6.3.1 “Operação Caminhada” ............................................................................................. 120
6.3.2 Do GISP .......................................................................................................................... 123
6.3.3 Do CAOCRIMO e GCOC – MPE- MG ....................................................................... 126
7 DA FORÇA-TAREFA................................................................................................................... 128
7.1 CONCEITO DE FORÇA-TAREFA...................................................................................... 130
11

7.2 FORÇA-TAREFA AMERICANA: TASK FORCE - USA .................................................. 136


7.3 FORÇA-TAREFA NO RIO GRANDE DO SUL ................................................................. 142
7.4 FORÇA-TAREFA DO MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL ............................................. 151
7.5 FORÇA-TAREFA DE MINAS GERAIS .............................................................................. 154
7.6 DA FORÇA-TAREFA PARALELA AO GISP, SOB O COMANDO DO MINISTÉRIO
PÚBLICO MINEIRO..................................................................................................................... 168
7.6.1 Prováveis causas do descrédito e da inoperância do GISP ............................ 171
7.7 DO PODER DE INVESTIGAÇÃO POR PARTE DO MINISTÉRIO PÚBLICO............. 176
CONCLUSÃO ................................................................................................................................... 188
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS............................................................................................. 194
ANEXOS............................................................................................................................................ 210
12

INTRODUÇÃO

Vencerá aquele que souber quando lutar e quando não lutar.


Vencerá aquele que souber empregar tanto forças com superioridade como em desvantagem.
Vencerá aquele que, preparado aguardar para surpreender o inimigo despreparado.
Vencerá aquele cujo exército estiver animado pelo mesmo espírito em todos os escalões.
Vencerá aquele que tiver generais competentes, que não sofram interferência indevida do soberano.
Sun Tzu

A presente dissertação tem a pretensão de produzir conhecimento acerca da


atuação das Forças-Tarefa como mecanismo de investigação que procura integrar
diferentes instituições para o enfrentamento da criminalidade e da violência, em
especial quanto ao crime organizado. Para tanto, analisa o Sistema de Segurança
Pública e Justiça Criminal, levando-se em conta as Instituições do Ministério Público,
Polícia Civil e Polícia Militar e as experiências de Forças-Tarefa ocorridas no Rio
Grande do Sul (desde 2000), em Minas Gerais (desde 2002), junto ao Ministério
Público Federal (desde 2003) e nos Estados Unidos (desde 1982).
Percebe-se que nas últimas décadas houve um aumento da criminalidade e
da violência (ZALUAR, 2004; ADORNO, 1996b, 1998b, 1999, 2002a, 2002d; KAHN,
1997, 2001, 2002; LEAL, 2003; LEMGRUBER, 2001; PERALVA, 2000; PINHEIRO,
1997; SANTOS, 1997, 2002, 2004; SOARES, 2000b, 2001f, 2001h, 2002c, 2004b,
2005, 2006a, 2006b, 2006c; LEMOS JUNIOR, 2002 e MEDEIROS, 2006)1.
O crescimento dos crimes e da violência no Brasil é, em grande medida,
conseqüência da disseminação da criminalidade organizada (ZALUAR, 2000, 2001,
2002, 2005; CASTELLS, 1999c, 2003; AZEVEDO, 1999; DUARTE, 2001;
HASSEMER, 1993; MENDRONI, 2002; MINGARDI, 1991, 1998, 2007; NAIM, 2006;
SOUZA, 2002, 2006; FILHO, 2002; ZIEGLER, 2003 e LUCAS, 2007).

1
A revisão da literatura apresenta e conceitua temas indispensáveis à pesquisa proposta. Tais
abordagens foram vitais para se entender a construção do referencial teórico relevante para obtenção
da resposta ao problema, conforme ensina Minayo. Deslandes (apud MINAYO, 2007) esclarece que
não se trata de reescrever obras dos autores que embasam o quadro teórico escolhido, e sim
estabelecer um foco sobre o que adotamos como as balizas de nossos estudos.
13

Nessa realidade, observa-se a forte influência de algumas das principais


causas macrossociais, como a pobreza e a desigualdade (ADORNO, 1995 e KANT
DE LIMA, 2005), a discriminação (BEATO, 2001 e DIAS e ANDRADE, 1997), a
violação dos direitos humanos (CARDIA, 2003), a exclusão (ADORNO, 2002c,
2003b), aliadas à crise da Segurança Pública e à frouxa articulação do Sistema de
Justiça Criminal (SAPORI, 1995, 2002, 2006; ADORNO, 2002b, 2006; KAHN, 1997,
2002, 2006; KANT DE LIMA, 1983a, 1989, 1997, 2002, 2003b, PINHEIRO, 1997,
1998 e MISSE, 2006) para o referido crescimento.
Os mecanismos ordinários de investigação policial (instruídos através dos
inquéritos policiais, sob a presidência de um Delegado da Polícia Civil, sem a
participação de outras instituições) não são suficientes para fazer frente à
macrocriminalidade (MENDRONI, 2002).
Para tanto, analisa-se, nesse contexto, se as Forças-Tarefa, até então criadas
para situações pontuais, poderiam ser um novo mecanismo permanente de
investigação de crimes da macrocriminalidade, levando-se em conta a necessidade
da participação das diversas instituições que integram o Sistema de Justiça Criminal,
partindo-se das análises já realizadas por Mingardi (1998), Mendroni (2002),
Machado (2007), Brindeiro (2004), Leite (2004), Sapori (2006), Soares (2002a), Blat
(2003) e Sadek (2002). Destaca-se, nessa realidade, o poder de investigação do
Ministério Público (ANDRADE, 2006).
O tema, objeto de investigação, é abordado a partir do referencial teórico da
Sociologia das Organizações, nos enfoques referentes à estratégia, ao poder, ao
modelo ideal e à cultura organizacional, para melhor compreensão dos fenômenos
da criminalidade, da violência e das Forças-Tarefa (onde várias instituições estão
agregadas para determinada finalidade). Para tanto, são utilizados autores como
Bernoux (s/d), Boudon (1995), Friedberg (1993), Merton (1970), White (s/d), Freitas
(2000), Muniz (2007), Gareth (1996), Kant de Lima (2003a), Crozier (1981), Weber
(1982), Castells (1999b, 1999c, 2003), Berger e Luckmann (2005), Douglas (2007),
Consul (2005), Fleury (2002), Churchman (1972), Schein (1995) e Motta (1997).
Opta-se por mediar teoria e experiência, através do método do estudo de
caso. Procura-se discutir a Força-Tarefa enquanto instrumento potencialmente
capaz de auxiliar nas investigações de crimes da macrocriminalidade, analisando-se
as alianças intra e interorganizacionais que são implementadas pelos atores nas
14

diversas organizações que compõem o Sistema de Segurança Pública e Justiça


Criminal.
Para tanto, procura-se situar o tema dentro das linhas de pesquisa do
Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais da PUCRS, buscando uma visão
interdisciplinar, que vem caracterizando o Mestrado, a partir de referenciais teóricos
oriundos das Ciências Sociais e do Direito, assumindo a pluralidade de concepções
encontradas nessas áreas.
Trabalha-se com o pressuposto de que a cultura organizacional, as
estratégias de poder e a resistência a mudanças das diferentes instituições que
compõem o Sistema de Segurança Pública e Justiça Criminal, bem como a frouxa
articulação que as caracteriza, têm forte influência no crescimento da criminalidade e
da violência em nosso país, em especial quanto à proliferação do crime organizado
(SAPORI, 2006; CASTELLS, 2003 e FLEURY, 2002).
É importante destacar que o trabalho não tem a pretensão de abordar a
diferença entre organização e instituição, por não ser relevante para a presente
investigação, muito embora parte da literatura tenha analisado essa diferença2.
Da mesma forma, não se busca identificar a diferenciação entre crime
organizado e macrocriminalidade3, principalmente pelo fato do próprio termo “crime
organizado” sequer ter uma definição legal. Opta-se convencionar a
macrocriminalidade como objeto de investigação das Forças-Tarefa pela sua
natureza sistêmica e estrutural e por ser um termo considerado mais abrangente,
visto que compreende os crimes de colarinho branco e o crime organizado, ambos
em suas várias formas (COSTA, 2000).

2
Lapassade (1989, p. 287-288) refere que o termo “Organizações” assume um duplo sentido: por um
lado, é um sistema de normas que estrutura um grupo social, regula a sua vida e o seu
funcionamento; por outro lado, significa um ato: instituir é fazer ingressar na cultura. Etzioni (1972, p.
10-11) diferencia “organização” de “instituição”, ao afirmar: “[...] instituição é utilizada às vezes para
alguns tipos de organizações, umas muito respeitáveis – como no caso de ‘a General Motors é uma
Instituição’, - outras pouco respeitáveis, como ‘ele está numa Instituição’. Às vezes, instituição se
refere a um fenômeno muito diferente – isto é, a um princípio normativo, como o casamento [...] essa
palavra provavelmente causou mais confusão do que organização formal e burocracia reunidas. As
três podem ser evitadas, dando-se preferência à palavra simples – organização [...]”. Castells (1999)
ressalta que as culturas se manifestam por meio de sua inserção nas instituições e organizações,
diferenciando organização (sistema específico de meios voltados para a execução de objetivos
específicos) de instituição (organizações investidas de autoridade necessária para desempenhar
tarefas específicas em nome da sociedade como um todo). Reportando-se à Nicole Biggart: “Por
lógicas organizacionais, refiro-me a um princípio legitimador elaborado em uma série de práticas
sociais derivativas. Em outras palavras, lógicas organizacionais são as bases ideacionais para as
relações das autoridades institucionalizadas” (Grifo nosso).
3
Doutrinariamente, são dados como sinônimos (LEMOS JUNIOR, 2002).
15

O trabalho inicia-se com um delineamento do estudo, tendo por finalidade


situar o leitor com conceitos como “Força-Tarefa, Segurança Pública, Sistema de
Justiça Criminal e Crime Organizado”.
A pesquisa inspira-se na proposta teórica que privilegiou o estudo das
Organizações do Sistema Judicial. Assim como as organizações, as Forças-Tarefa
são construções formadas pela interação entre os homens, às quais conjugam
interesses comuns e outros particulares, resultando numa dinâmica de tensão e
conflito, possibilitando, como destaca Machado (2007), distintas perspectivas de
análise.
Na presente dissertação é possível pensar-se nas diversas organizações que
compõem o Sistema de Segurança Pública e Justiça Criminal como organismos
vivos, que existem em um ambiente mais amplo e que dependem de outros para
suas várias necessidades (GARETH,1996).
A motivação4 acerca do tema justifica-se na medida em que a mestranda atua
há mais de dezessete anos como Promotora de Justiça, na área criminal,
trabalhando com as diversas agências de controle da Justiça e da Polícia (Poder
Judiciário, Polícia Civil, Brigada Militar, Superintendência dos Serviços Penitenciários
e Polícia Federal) e não mais se contenta, tão-somente, com a abordagem jurídica
sobre o fenômeno da criminalidade e da violência, buscando ampliá-la à luz das
Ciências Sociais.
Nessa realidade, Azevedo (2000, p. 61) destaca:

Os modelos sociológicos constituem hoje o paradigma dominante para o


conhecimento do problema criminal. Colocam em relevo a natureza social
do problema, assim como a pluralidade de fatores que nele interatuam;
mostram sua conexão com fenômenos normais da vida cotidiana e a
incidência de variáveis ambientais em sua dinâmica e distribuição espacial
[...]. Mostram também [...] a dinâmica de funcionamento do Sistema Estatal
de Administração da Justiça.

O estudo aqui proposto possui uma peculiaridade: a mestranda é parte


integrante de uma das unidades pesquisadas, o que, se por um lado, apresenta-se
como facilidade para a pesquisa de campo (no tocante ao acesso às informações),
por outro lado, mostra-se prejudicial, pois a mestranda teve que cuidar para que
interesses e valores pessoais não influenciassem no estudo, procurando imbuir-se

4
A justificativa, de ordem pessoal, demonstra a relevância da escolha do estudo em face da trajetória
do pesquisador, conforme Minayo (2007).
16

de uma postura crítica através de um raciocínio lógico e de uma neutralidade


axiológica.
A relevância do trabalho consiste em dar contribuição a um tema, no contexto
da Segurança Pública e do Sistema de Justiça Criminal, que vem se destacando
como um sério problema, que é a criminalidade organizada, mormente quanto à sua
investigação e eventuais influências no tocante à segurança da sociedade.
O recorte restrito à investigação criminal deve-se à sua importância enquanto
mecanismo indispensável para a realização das finalidades de todo o Sistema de
Segurança Pública e Justiça Criminal, pois uma investigação eficiente é de
fundamental importância para a efetividade do Direito Penal.
Ainda é possível afirmar-se que o número de estudos a respeito da Instituição
Judiciária é pequeno nas Ciências Sociais, fruto tanto do desconhecimento de sua
realidade empírica, quanto das dificuldades teóricas de um campo necessariamente
multidisciplinar, em que poucos interlocutores são capazes de transitar com
desenvoltura entre os saberes jurídicos e sociológicos (AZEVEDO, 1999). Há,
igualmente, escassas pesquisas e estudos no âmbito antropológico, o que seria
indispensável, pois pesquisas sobre a aplicação real da lei nas ruas e nas
comunidades, e não nas bibliotecas e escritórios, podem revelar os verdadeiros
problemas do direito na sociedade (SHIRLEY, 1987). Além disso, as organizações
do Sistema de Segurança Pública e Justiça Criminal são, em geral, negligenciadas
pela Sociologia brasileira, havendo escassez de pesquisas comparativas (BEATO,
2001). Enfim, são poucas as pessoas e as instituições dedicadas aos problemas da
Segurança Pública no Brasil, assim como são precários os dados disponíveis para
fundamentar diagnósticos precisos e políticas eficazes de redução da violência e do
crime (LEMGRUBER, 2001).
Parte-se da hipótese5 de que o modelo das Forças-Tarefa pode ser um
mecanismo importante para a melhoria na efetividade da investigação criminal e na
gestão da Segurança Pública.
Como problema de pesquisa, a partir dos elementos que justificariam a
implementação das Forças-Tarefa, questiona-se: a Força-Tarefa interinstitucional,
que compõe o Sistema de Segurança Pública e Justiça Criminal, constitui-se em

5
Reportando-se a Santos (2004), Minayo (2007) destaca que as hipóteses são afirmações
provisórias ou uma solução possível a respeito do problema colocado em estudo. No final, o
pesquisador terá que responder se houve evidências para sua confirmação ou refutação.
17

mecanismo eficaz de integração dos Órgãos Públicos para o aumento da eficiência


na investigação da macrocriminalidade e melhoria na gestão da Segurança Pública?
Considerando que o objetivo geral6 traçado é o de verificar e avaliar se elas,
efetivamente, podem ser vistas como modelo viável para melhorias na investigação
da macrocriminalidade, na integração dos diversos órgãos de controle da Polícia e
da Justiça e na gestão da Segurança Pública, os objetivos específicos são:
identificar as principais características das diferentes Forças-Tarefa existentes,
segundo suas visões e dimensões, levantar dados sobre a atuação e o resultado
das Forças-Tarefa no Rio Grande do Sul, em Minas Gerais, junto ao Ministério
Público Federal e junto à Task Force nos Estados Unidos; analisar a percepção
daqueles que atuam nas Forças-Tarefa sobre eventuais resultados e problemas;
comparar as diferentes visões de seus integrantes e investigar a efetividade de suas
atuações e a viabilidade de sua implementação no Rio Grande do Sul.
Para a pesquisa de campo, a mestranda deslocou-se ao Estado de Minas
Gerais, objetivando conhecer o trabalho do GISP (Gabinete Integrado de Segurança
Pública), criado por decreto, que prevê a atuação de uma Força-Tarefa pertencente
à Secretaria de Defesa Social, bem como acompanhar o trabalho do Ministério
Público mineiro, que, de forma paralela, também atua integrando instituições no
combate ao crime organizado, através do GCOC. A escolha do campo de pesquisa
recaiu sobre Minas Gerais, em razão de recente implantação de um “Choque de
Gestão na Segurança Pública” que redundou numa queda do índice de
criminalidade de 2004 a 2006, sendo a criação de uma Força-Tarefa permanente
uma de suas metas.
Para dar conta de tais propostas, adota-se a metodologia7 do estudo de caso
(experiências realizadas em Minas Gerais, Rio Grande do Sul, Ministério Público
Federal e Estados Unidos), da coleta e análise de documentos, das entrevistas
semi-estruturadas e da pesquisa de campo com observação participante.
A pesquisa segue três etapas: fase exploratória, trabalho de campo, análise e
tratamento do material empírico e documental. Como universo de pesquisa, foram

6
Deslandes (apud MINAYO, 2007) refere que, com o objetivo, busca-se responder ao que é
pretendido com a pesquisa e que propósitos almejamos alcançar ao término da investigação.
7
Minayo (2007, p. 16) salienta que a metodologia é o caminho do pensamento e a prática exercida na
abordagem da realidade. Reportando-se à Dilthey (1956), Minayo refere que o método “é necessário
por causa da nossa ‘mediocridade’ [...] precisamos de parâmetros para caminhar na produção do
conhecimento. No entanto e apesar de tudo, a marca da criatividade é nossa ‘grife’ (ou seja, nossa
18

consideradas as instituições e os respectivos componentes que atuam junto às


Forças-Tarefa, em especial, Ministério Público, Polícia Civil e Polícia Militar.
A primeira parte da dissertação aborda conceitos sobre Segurança Pública,
Sistema de Justiça Criminal, Crime Organizado e Força-Tarefa, objetivando situar o
leitor acerca dos pontos principais que serão tratados na pesquisa.
A dissertação é estruturada de forma a construir um quadro teórico capaz de
dar conta do fenômeno da violência e da criminalidade. Busca-se, assim, examinar a
atual realidade da criminalidade e da violência (levando-se em conta o período da
transição democrática) que envolve a exclusão, a desigualdade social, a pobreza, a
impunidade e a violência como meio de solução de conflito. Após, analisam-se os
principais dilemas de gestão (AZEVEDO, 1999, 2000, 2004; KANT DE LIMA, 1989,
1997; KAHN, 1997, 1998, 2002, 2006 e ADORNO, 1998b), e se podem ser
considerados como entraves para a criação da Força-Tarefa (LIMA, 2005 e KANT
DE LIMA, 2003b), como a escassez de informação e de estatísticas, ausência de
pesquisas de vitimização, o “efeito funil” do Sistema de Justiça Criminal, a falta de
gestão e de prioridade política e a ineficiência do Sistema de Inteligência.
Faz-se uma análise do conceito de organizações, bem como dos
fundamentos acerca do modelo ideal de organização, das suas disfunções,
estratégias, poderes e diferentes culturas organizacionais, já que a Sociologia das
Organizações foi utilizada como pano de fundo da pesquisa. Para tanto, foram
utilizados como referenciais teóricos autores como Crozier (1981), Friedberg (1993),
Weber (1982), Boudon (1995), Champion (1979), Churchman (1972), Delorenzo
(1975), Lapassade (1989), Merton (1970), Schein (1996), entre outros.
A seguir, busca-se conceituar o Sistema de Segurança Pública e a Justiça
Criminal para, após, analisar as Polícias Civil e Militar e o Ministério Público
(ADORNO, 1996b, 1998b, 2000b, SOARES, 2000a, 2001a, 2001c, 2001e, 2001h,
2004a e 2006a).
Em seguida, aborda-se a macrocriminalidade, analisando-se eventual
necessidade de um trabalho investigativo diferenciado no combate às redes do
crime organizado (MINGARDI, 1998; MENDRONI, 2002; ZIEGLER, 2003 e
MEDEIROS, 2006).

experiência, intuição, capacidade de comunicação e de indagação) em qualquer trabalho de


investigação”.
19

O capítulo referente à Força-Tarefa busca conceituar suas diversas formas,


bem como analisar as já existentes, destacando o papel da Instituição do Ministério
Público no seu contexto, em especial no tocante ao poder de investigação
(ANDRADE, 2006). Nesse capítulo também são analisadas as entrevistas
realizadas, os documentos juntados e a observação participante levada a efeito em
Minas Gerais.
No último capítulo são trazidas as discussões teóricas apresentadas nos
primeiros capítulos, buscando articulá-las com as informações até então obtidas.
Busca-se, no final, verificar se a pesquisa8 realizada permite concluir se uma
Força-Tarefa permanente seria, efetivamente, um mecanismo viável para uma
investigação eficaz da macrocriminalidade, integrando órgãos e trazendo melhorias
à gestão da Segurança Pública.

8
Minayo (2007, p. 16) entende por pesquisa “[...] a atividade básica da ciência na sua indagação e
construção da realidade [...] nada pode ser intelectualmente um problema se não tiver sido, em
primeiro lugar, um problema da vida prática”. “Os conhecimentos que foram construídos
cientificamente sobre determinado assunto, por outros estudiosos que o abordaram antes de nós e
lançam luz sobre nossa pesquisa, são chamados Teorias”. Uma pesquisa sem teoria corre o risco de
ser uma simples opinião pessoal sobre a realidade. Por isso buscamos nos aprofundar nas obras dos
diferentes autores que trabalham com esses temas, inclusive com aqueles que desenvolvem teorias
com às quais ideologicamente não concordamos.
20

1 CONCEITOS BÁSICOS: SEGURANÇA PÚBLICA, JUSTIÇA CRIMINAL,


FORÇA-TAREFA E CRIME ORGANIZADO

Quanto mais aumentam os conhecimentos do homem, mais aumentam suas


dúvidas, seu isolamento e sua solidão.
Mohamed As-Sabbagh

Para tornar mais acessível a apreensão da dimensão à qual este estudo se


propõe e objetivando situar o leitor, é necessário iniciar-se com as implicações e os
conceitos relativos à Segurança Pública, Sistema de Justiça Criminal, Forças-Tarefa
e Crime Organizado.
A organização desse capítulo apresenta e conceitua temas indispensáveis à
pesquisa proposta, mas, por óbvio, é impossível esgotar-se toda bibliografia
pertinente.
É importante ressaltar que o estudo se focaliza, basicamente, no Sistema de
Justiça Criminal, e não na Segurança Pública, que possui um conceito bem mais
amplo. Minayo (2007) já afirmava que o conceito é delimitador e focalizador do tema
em estudo9.

1.1 SEGURANÇA PÚBLICA

Conforme a Constituição Federal de 1988, a Segurança Pública “[...] é dever


do Estado, direito e responsabilidade de todos”10.
Para a Secretaria Nacional de Segurança Pública (SENASP/MJ)11,

9
“Noutras palavras, teorias e conceitos não são camisa-de-força, são camisa sim, de um tecido que
adéqua o corpo ao ambiente e protege o pesquisador das intempéries de seus julgamentos solitários,
embora valorizando sua contribuição” (MINAYO, 2007, p. 21).
10
Artigo 144 da Constituição Federal.
21

[...] Segurança Pública é uma atividade pertinente aos órgãos estaduais e à


comunidade como um todo, realizada com o fito de proteger a cidadania,
prevenindo e controlando manifestações de criminalidade e da violência,
efetivas ou potenciais, garantindo o exercício pleno da cidadania nos limites
da lei.

Ainda conforme o documento da SENASP/MJ, são os seguintes os órgãos


que compõem o Sistema de Segurança Pública:

As Polícias Militares são os órgãos do Sistema de Segurança Pública aos


quais competem as atividades de Polícia ostensiva e preservação da ordem
pública. As Polícias Civis são os órgãos do Sistema de Segurança Pública
aos quais competem, ressalvada competência específica da União, as
atividades de Polícia Judiciária e de apuração das infrações penais, exceto
as de natureza Militar. Os Corpos de Bombeiros Militares são os órgãos
do Sistema de Segurança Pública aos quais competem a execução das
atividades de defesa civil, além de outras atribuições específicas
estabelecidas em lei.

1.2 JUSTIÇA CRIMINAL

O Sistema de Justiça Criminal é um conjunto de agências que intervém desde


a elaboração da lei penal (criminalização primária), o policiamento preventivo e
repressivo, até o processo de apuração da responsabilidade e execução penal -
Ministério Público e Judiciário (criminalização secundária), sendo todas
consideradas “agências formais de controle”.
Trata-se, portanto, de um “sistema”, ou seja, de um processo dinâmico e
coerente dotado de um objetivo social e operando num contexto de mudança social,
sendo as instâncias formais “subsistemas” do sistema formalmente legitimado para
responder ao crime12 (DIAS e ANDRADE, 1997).
No Brasil, o Sistema de Justiça Criminal tem como momento chave a
realização do inquérito policial, através do qual se busca a autoria e a materialidade
do crime. Registrada a ocorrência de um crime, em tese, deve ser instaurado o
inquérito policial. Esse procedimento confere acentuado poder à agência policial.
Além disso, a massificação de inquéritos e a falta de estrutura policial enseja a

11
Disponível em: <http://www.mj.gov.br>.
12
Ao contrário das instâncias informais que podem ser consideradas desde a difusa tolerância social
perante certas formas de criminalidade às formas mais organizadas de reação, como a que resulta da
‘justiça’ informal exercida por Associações, Escolas, Igrejas, etc. (DIAS e ANDRADE, 1997).
22

seletividade. Concluído o inquérito, ele é encaminhado ao Ministério Público que,


geralmente, limita-se a denunciar somente os crimes enviados pela Polícia. Os
Juízes, por sua vez, possuem grande margem de discricionariedade o que, muitas
vezes, presta-se a alimentar sentimentos coletivos de justiça.

1.3 FORÇA-TAREFA

A expressão Força-Tarefa deriva do inglês Task Force e teve sua origem no


âmbito militar, quando, durante a 1ª Guerra Mundial, foi considerada como unidade
formada para o cumprimento de determinada função. A partir dos anos 60, a idéia
foi incorporada pela Polícia norte-americana para a persecução de crimes de
colarinho branco e fraudes diversas - por envolver informações esparsas de distintos
órgãos (LEITE, 2004).
Nos Estados Unidos, normalmente integram os grupos de Força-Tarefa todas
as Polícias com atribuições locais e as Agências Federais, como as Polícias
Municipais, as Polícias dos Condados, as Polícias Estaduais e ainda as chamadas
Agências Federais, como FBI, DEA, US-Customs, US-Marshals, IRS, etc.
No Brasil, o termo é utilizado das mais diversas formas, trazendo confusões
quanto ao seu conceito.
Blat (2003) refere:

O que é a força-tarefa? Isto não está na lei. Por exemplo, a gente pega o
pessoal do Ministério Público Estadual, da Polícia Civil, Polícia Militar,
Secretaria da Fazenda, Receita Federal, Polícia Federal, Ministério Público
Federal, sentamos todos numa mesa. Então, vamos combater determinada
organização criminosa [...].

Consoante Mendroni:

[...] os grupos denominados Task-Force (Força-Tarefa) são considerados


pelos agentes norte-americanos o melhor sistema para o efetivo combate às
organizações criminosas [...]. Concebidos sob a ideologia de mútua
cooperação entre os diversos órgãos de persecução detentores de
atribuições variadas para a atuação na área penal, reúnem-se e passam a
trabalhar em conjunto, com unidade de atuação e de esforços, com o
direcionamento para a investigação, análise e iniciativa de medidas
coercitivas voltadas para o desmantelamento das estruturas criminosas,
utilizando-se dos mais variados instrumentos de investigação e mecanismos
23

legais [...]. Trata-se de esforço concentrado, harmonioso e direcionado para


o objetivo comum da luta contra a criminalidade (p. 30). [...] Não é mais do
que uma força conjunta, união de esforços, uma reunião de grupo de
trabalho que tem as suas diretrizes preestabelecidas e organizadas, assim
como o crime organizado, ela deve ser organizada, de forma a combater o
problema pontual (p. 29-31). [...] Considerando-se o alto grau de
organização das chamadas “Empresas Criminosas”, não se conhece
atualmente melhor forma de combatê-las que a união das forças do Estado
pré-determinadas e com objetivo definido e concentrado (2002, p. 38).

Mariano (2004) ressaltou a importância da Força-Tarefa, referindo que a


atuação integrada de Órgãos Federais, Estaduais e Municipais é imprescindível para
alcançar um resultado efetivo.
Verifica-se que, em geral, o conceito de Força-Tarefa nos remete a uma idéia
de provisoriedade. Isto é, ela perdura enquanto persistir a demanda que originou sua
criação.

1.4 CRIME ORGANIZADO

A legislação brasileira não tem uma definição clara sobre o conceito de crime
organizado. Temos conceituações para “formação de quadrilha”, “associação para o
crime”, mas para a categoria “crime organizado”, não. A lei n. 9.034, de 3 de maio de
1995, limitou-se a dispor sobre a utilização de meios operacionais para a prevenção
e repressão de ações praticadas por organizações criminosas.
O termo é de difícil conceituação. São inúmeras as organizações criminosas
que existem atualmente. Cada uma assume características próprias e peculiares,
amoldadas às próprias necessidades e facilidades que encontram no âmbito
territorial em que atuam. Condições políticas, policiais, territoriais, econômicas,
sociais, todas influenciam decisivamente para delinear suas características e
evoluem em velocidade muito maior do que a capacidade da Justiça de percebê-las,
analisá-las e combatê-las13 (MENDRONI, 2002).

13
Mendroni (2002) ressalta a diferenciação do crime organizado com o tipo penal previsto no artigo
288 do Código Penal que refere “quadrilha ou bando”, pois este evidencia-se apenas pela reunião de
pessoas para a prática de crimes, ao contrário daquela que exige a mínima organização para a
mesma finalidade. Na primeira, inexiste prévia organização para a prática do crime e os integrantes
executam suas ações de forma improvisada ou desorganizada.
24

Para Mendroni (2002), o crime organizado é aquela organização criminosa


que substitui o Estado em qualquer de suas funções inerentes, seja porque não
funcionam ou funcionam mal. A ausência ou má prestação de um serviço público
acarreta a criação de um “Estado paralelo” que passa a executar e controlar aquele
serviço. Assim, a organização infiltra-se nas veias estatais e passa, com o Estado, a
estabelecer uma disputa como se fosse uma concorrência num negócio.
Ao contrário, Mingardi (1991) sustenta que o crime organizado não possui o
status de “Estado paralelo”, pois, linhas paralelas são aquelas que nunca se
encontram. Isso significaria que Estado e crime organizado caminhariam lado a lado
sem nunca verem seus caminhos se cruzarem. Não é o que acontece, basta notar o
número de funcionários públicos mantendo relações com organizações criminosas.
Em nenhum momento essas organizações poderiam prescindir de um apoio de
setores do Estado.
Mingardi conceitua crime organizado como:

Grupo de pessoas voltadas para atividades ilícitas e clandestinas que


possui uma hierarquia própria e capaz de planejamento empresarial, que
compreende a divisão do trabalho e o planejamento de lucros. Suas
atividades se baseiam no uso da violência e da intimidação, tendo como
fonte de lucros a venda de mercadorias ou serviços ilícitos, no que é
protegido por setores do Estado. Tem como características distintas de
qualquer outro grupo criminoso um sistema de clientela, a imposição da lei
do silêncio aos membros ou pessoas próximas e o controle pela força de
determinada porção de território (1998, p. 82-83).

Já o conceito de “crime do colarinho branco” nasceu dentro da criminologia14,


estando no interior do sistema social e alicerçada na certeza, ou quase certeza, da
impunidade e buscando basicamente o lucro.
Azevedo (1999, p. 19) destaca que:

No tocante aos delitos de colarinho branco, é preciso reconhecer que, de


meados da década de oitenta até hoje, buscou-se uma melhor tipificação

14
O termo ‘white collar crimes' – expressão inglesa a designar os cognominados 'crimes do colarinho
branco' – foi cunhado por Edwin H. Sutherland, a 27 de dezembro de 1939, quando de sua exposição
perante a 'American Sociological Society'. De trânsito comum em todos os idiomas, o termo batizou a
clássica obra de Sutherland – "White Collar Crime" – em torno da delinqüência do 'colarinho branco'.
Conquanto construída, em meados do século XX, a partir de uma perspectiva sociológica, a tese veio
a tornar-se referência no âmbito da criminologia, fixando-se como um marco científico. Sutherland
define os “white collar”, crimes à luz de uma perspectiva subjetivo-profissional, identificando-os como
sendo os delitos cometidos por pessoas dotadas de respeitabilidade e elevado status social, no
âmbito de seu trabalho. São dois, portanto, os pontos de apoio do conceito proposto: o 'status' do
autor e a conexão da atividade criminosa com sua profissão (FELDENS, 2000, p. 225).
25

dos delitos, com vistas a abarcar uma realidade cambiante e extremamente


específica e difícil de ser controlada por parte das instâncias de controle
penal. Limitou-se também as possibilidades de isenção de punibilidade, e
elevou-se o apenamento, acreditando-se na capacidade dissuasória das
normas legais. Isso não significa a diminuição da impunidade para este tipo
de delito, já que a maior ou menor eficácia desses novos tipos penais
depende, evidentemente, da vontade política, por parte do Poder Executivo,
em de fato levar a julgamento delitos desta natureza, em que as partes
envolvidas são freqüentemente grandes empresários e altos funcionários do
Estado. Mas já não se pode colocar sobre a legislação a responsabilidade
pelo fato de que a maioria destes delitos permanece impune.

Partindo-se para um conceito mais abrangente, tem-se que o crime


organizado também compreende a estrutura da macrocriminalidade, pois:

tem a estrutura de uma poderosa empresa econômica, dedicada


fundamentalmente às atividades ilegais e delitivas. É uma forma de
delinqüência que explora corporativamente atividades ilícitas e outras
aparentemente lícitas, nelas empregando pessoas e capitais, com o auxílio
de meios criminosos comuns. Ajustam-se sob medida a esse tipo de
macrocriminalidade especialmente o tráfico de drogas, a exploração do
jogo, o contrabando e a exploração do lenocínio (FERNANDES e
FERNANDES, 2002, p. 526-527).
26

2 DA CRIMINALIDADE E DA VIOLÊNCIA

A história do direito penal é a história da humanidade. Ela surge com o homem e o


acompanha através dos tempos, isso porque o crime, qual sombra sinistra, nunca
dele se afastou.
Magalhães Noronha

Esse capítulo traz reflexões sobre temas que têm sido objeto de discussão
entre os operadores do direito e Cientistas Sociais que se dedicam aos fenômenos
da criminalidade e da violência. A abordagem adotada procura situar a realidade
brasileira, destacando suas distinções, causas, dilemas, especificidades e
problemas.
Conde (2005) alerta que enquanto existir direito penal (acreditando que ainda
vai existir por muito tempo) é necessário que seja estudado e analisado
racionalmente para convertê-lo em um instrumento de mudança para o progresso de
uma sociedade mais justa e igualitária. Se a técnica de interpretação e de
sistematização do direito penal permite pôr em relevo as graves injustiças e
desigualdades que lhe são inerentes, impõe-se estudá-lo de forma sistêmica e, em
especial, levando-se sempre em conta problemas relacionados com as organizações
que compõem todo o Sistema de Justiça e de Segurança.
Sapori (2006) acredita que, em que pese o arcabouço estrutural da
sociedade, os indicadores sociais e a renda da população que se apresentam tão
desiguais, podem ser efetivadas medidas visando garantir o direito à segurança de
todos os cidadãos. Por certo que as mazelas sociais, a morosidade da Justiça, a
exclusão social, a pobreza e outros fatores devem ser devidamente considerados.
Mas a tomada de medidas emergenciais é inconteste e, para a busca de soluções a
curto prazo, deve-se sair da dimensão estrutural e ingressar na dimensão gerencial.
Não no sentido de gerenciar crises (o que se vem fazendo: reagindo conforme
provocado, objetivando legitimar as atuações), que redunda em ineficácia e
27

ineficiência. Impõe-se gerenciar racionalmente as diversas organizações, para que


um verdadeiro sistema integrado de Justiça se efetive.

2.1 DISTINÇÃO ENTRE VIOLÊNCIA E CRIMINALIDADE

Atualmente, é muito comum conceituar violência e criminalidade como


sinônimos e usá-los indistintamente. Esse subitem procura demonstrar sua
diferenciação.
Por óbvio que existe uma ligação entre os dois fenômenos, uma vez que a
violência alimenta a criminalidade, e o combate à criminalidade transita pelo
combate à violência “mas se trata de questões distintas que exigem tratamento
diferenciado, mas nunca isoladas uma da outra” (DIAS FILHO, 2002, p. 25).
Zaluar (2001) cita que o termo violência vem do latim violentia (força, vigor),
sustentando que uma ação se torna violenta quando ultrapassa limites ou perturba
acordos tácitos e regras, adquirindo carga negativa ou maléfica. É a percepção do
limite da perturbação que vai caracterizar o ato como violento.
Santos (1997) conceitua violência como uma relação social, caracterizada
pelo uso real ou virtual de coerção, que impede o reconhecimento do outro como
diferente, seja pessoa, classe, gênero, raça, provocando algum tipo de dano. Seria
um ato de excesso, verificado em cada relação de poder presente nas relações
sociais15.
Souza conceitua violência a partir da relação entre as categorias de
“violência” e “alteridade”, destacando que:

Tudo aquilo que entendemos por violência, em todos os níveis, do mais


brutal e explícito à violência coercitiva e socialmente sancionada do direito
positivo, e, inclusive, a violência auto-infligida, repousa no fato exercido de
negação de uma alteridade (2001, p. 9).

15
Partindo-se do conceito de que violência é algo heterogêneo, pois varia de acordo com o grupo,
espaço social, etc., ela pode se manifestar como: a) uma violência política e do Estado (do Estado ou
contra ele, como o terrorismo); b) costumeira ou difusa (quebra das relações sociais como o crime
organizado); c) simbólica (exercida pelos discursos que negam o lugar do outro, como por exemplo,
as classes populares) e d) como negação da condição humana e restrição dos direitos dos cidadãos
(fome, miséria, exclusão), conforme Santos (1993).
28

Hoje temos a violência dos conflitos interétnicos, dos conflitos raciais, dos
conflitos religiosos, nas ruas, nas escolas e entre gerações. A Justiça não consegue
lidar com isso porque as fórmulas e os instrumentos que ela herdou do século XIX,
do modelo liberal de justiça, são incapazes de dar conta dessas formas coletivas e
organizadas de produzir violência (ADORNO, 2000a).
Dias Filho destaca:

À violência devem ser reservadas ações voltadas para a recuperação dos


valores morais até aqui negligenciados, se não abandonados, propiciando-
se a prevalência do SER sobre o TER, e, assim, revigorando-se a dignidade
da formação moral. No combate à criminalidade, impõem-se, por outro lado,
ações objetivas no campo da segurança pública, cometendo-se à Polícia
Militar o trabalho ostensivo e preventivo, e reestruturando-se a Polícia Civil
[...]. Não bastará apenas a reestruturação da polícia judiciária [...]. Faz-se
necessária, portanto, a concomitante reestruturação desses outros sistemas
que compõem o aparelho da justiça, sem se desprezar, ainda, a necessária
modernização da legislação pertinente (2002, p. 67-68).

Adorno et al. (2003c) esclarecem que nem todo fenômeno socialmente


percebido como violento é crime. Há modalidades de violência que, embora
codificados como crime, não encontram adequado enquadramento na legislação
penal. A criminalidade caracteriza os atos que transgridem as normas sociais. Nem
todo crime é violento. O crime é um viés da violência, essa, por sua vez, é gênero
que comporta diversas modalidades.
Percebe-se que a violência e a criminalidade são fenômenos multicausais,
complexos, sendo influenciados por vários fatores que merecem uma breve análise.

2.2 DA REALIDADE DA CRIMINALIDADE E DA VIOLÊNCIA

O presente subitem busca enfocar os fenômenos da criminalidade e da


violência na atualidade. É certo que a criminalidade e a violência têm várias causas,
entre as quais se destacam os fatores sociais, os culturais, os políticos e os
econômicos. Busca-se apresentar um caminho para o entendimento do potencial
dessas causas na proliferação do crime organizado.
Soares (2006d) destaca que:
29

As explicações para a violência e o crime não são fáceis. Sobretudo, é


necessário evitar a armadilha da generalização. Não existe o crime, no
singular. Há uma diversidade imensa de práticas criminosas, associadas a
dinâmicas sociais muito diferentes. Por isso, não faz sentido imaginar que
seria possível identificar apenas uma causa para o universo heterogêneo da
criminalidade.

2.2.1 Da Pobreza, Exclusão e Desigualdade Social

Feitos esses brevíssimos apontamentos, volta-se agora, ainda que de forma


sucinta, para alguns fenômenos de nossa realidade e eventuais influências no
crescimento da criminalidade e da violência.
Para Soares (2006b), a pobreza e desigualdade são e não são
condicionantes da criminalidade, dependendo do tipo de crime, do contexto
intersubjetivo e do horizonte cultural a que nos referimos.
Kahn (2002), após longas pesquisas sobre o tema, conclui que o Brasil vive
um cenário de profunda desigualdade social e econômica, onde grande parte da
população é excluída dos direitos que lhe são garantidos constitucionalmente.
Essa desigualdade é também racial conforme Adorno (2003b):

Há uma idéia de que o crime está necessariamente ligado à pobreza e que


a pobreza está necessariamente ligada à cor. Nesse caso, a pobreza tem
cor: a cor negra. O racismo, nas instituições de controle social,
particularmente na Polícia e nas instituições de justiça, é uma expressão
daquilo que acontece na sociedade.

O referido autor (1995) ressalta que na sociedade brasileira convivem amplas


parcelas da população excluídas a despeito da reconstrução da normalidade
democrática, após 21 anos de regime autoritário. Diferentes clivagens contribuem
para esse cenário social: situação ocupacional, carência de profissionalização, baixa
escolaridade, origem regional, idade, cor e sexo. A exclusão social é reforçada pelo
preconceito e pela estigmatização, bem como pela extrema tolerância que temos
para com essa forma de discriminação.
Azevedo salienta que:

O estado de natureza pós-moderno é caracterizado pela ansiedade


permanente do trabalhador assalariado, do desempregado em busca de
trabalho, dos trabalhadores autônomos e dos trabalhadores clandestinos.
30

Ocorre o surgimento de uma subclasse de excluídos, constituída por grupos


sociais em mobilidade descendente estrutural e por grupos sociais para
quem o trabalho deixou de ser uma expectativa realista. É a chamada
Underclass, cujas características principais são: residência, em espaços
socialmente isolados das outras classes; ausência de emprego de longa
duração; famílias monoparentais chefiadas por mulheres; ausência de
qualificação ou de formação profissional; longos períodos de pobreza e de
dependência da assistência social; busca de alternativas de sobrevivência
em atividades ilícitas, do tipo Street Crime; altas taxas de vitimização letal e
encarceramento (2005b, p. 120-121).

Wieviorka (1997) sugere que a ausência ou escassez de mediadores sociais


e a diabolização do outro tornam difícil a formação de sistemas sociais, criando o
espaço da violência. O enfraquecimento do Estado como aquele que possui o
monopólio da coação física legítima passa a encobrir uma violência ilegítima
(exercida por seus agentes – policiais, através de torturas, abuso de autoridade,
etc.), bem como passa a delegar o uso de força a setores privados (segurança
privada – condomínios fechados: criando verdadeiros apartheids).
Vários são os pesquisadores como Sapori, Wanderley, Beato, Zaluar, Cano,
Santos e Soares que buscaram identificar a influência da renda sobre a
criminalidade. Cárdia et al. (2003, p. 184) [...] constataram que a concentração de
carências e de desigualdades sociais não parece suficiente para explicar a
criminalidade, sobretudo porque a evolução da criminalidade está profundamente
influenciada pelo crime contra o patrimônio, modalidade mais associada à circulação
da riqueza do que à sua carência.
Soares (2003a) exemplifica o cotidiano da tragédia através das bases sociais
do recrutamento dos jovens16. Para ele (2000a) a mais grave miséria é a exclusão
social.
Zaluar (2004) chama a atenção no sentido de que a correlação entre pobreza
e criminalidade ou pobreza e violência deve ser problematizada. Atribuir apenas à
pobreza – que sempre existiu no Brasil - o incrível aumento da criminalidade é

16
Soares (2003a) ilustra essa realidade referindo-se a um menino pobre caminhando invisível pelas
ruas das grandes cidades brasileiras. Quase sempre negro e sujo. Geralmente, abriga-se nas
calçadas das metrópoles, expulso de casa pela violência doméstica, esquecido pelo poder público,
ignorado pela comunidade e excluído da cidadania. Sem perspectivas e esperança, sem vínculos
afetivos e simbólicos com a ordem visual, sem conexão identitária com a cultura dominante, o menino
permanece invisível, enquanto perambula pelas esquinas. A invisibilidade pode ser produzida pela
indiferença pública à sua presença – que nunca é somente física, é sempre também social – ou pela
projeção sobre ele de estigmas, anulando sua individualidade. Quando um traficante lhe dá uma
arma, ele recebe muito mais do que um instrumento que lhe proporcionará vantagens materiais,
ganhos econômicos e acesso ao consumo; o menino recebe um passaporte para a existência social,
31

alimentar preconceitos e discriminações contra os pobres, além de constituir um erro


de diagnóstico que pode tornar ineficazes as políticas públicas, adotadas a partir
desse raciocínio.
Para a referida autora (2005), o Estado nunca foi suficientemente forte para
impedir o uso da violência e nunca cumpriu, nem medianamente, sua principal
função: dar segurança a seus cidadãos. Hoje, tem-se a perda do monopólio estatal
de violência legítima, fundamento da soberania, em proveito de empresas privadas
de segurança, grupos e indivíduos fortemente armados, em mãos de membros de
organizações ou redes transacionais do crime. A escalada da violência dá-se pela
inércia institucional e pela cegueira dos que elaboram políticas de segurança e que
não resolvem os problemas estruturais das principais instituições que as levam a
efeito.
Misse (2006) refere que as relações entre pobreza e miséria com certos tipos
de criminalidade é antiga no imaginário social, mas adquire status moderno com as
tentativas científicas dos socialistas, no final do século, de demonstrar sua
efetividade social.
As abordagens sociológicas clássicas alertam para as dificuldades da
correlação, mas não a negam, procurando incluí-la numa formulação sistêmica mais
abrangente.
Para Merton (1970):

[...] a pobreza em si é a conseqüente limitação de oportunidades. Quando a


pobreza e as desvantagens a ela associadas, em competição com os
valores aprovados para todos os membros da sociedade estão articuladas
com uma ênfase cultural do êxito pecuniário como objetivo dominante, as
17
altas proporções de comportamento criminoso são o resultado normal .

Não basta reduzir a miséria, como concluem os que prezam a tese


economicista. Seria ilusão acreditar que se a renda chegar aos mais necessitados, a
violência dará lugar à harmonia, à cooperação, à sociabilidade, conforme Soares
(2004b). O autor acrescenta (2006b) que ser pobre não torna ninguém criminoso.

porque a arma será capaz de produzir em cada um de nós um sentimento: o medo, provocando no
menino um sentimento de reconquista, presença, visibilidade e existência social.
17
Sabadell (2005) acredita que Merton descobriu a cilada em que se encontram as sociedades
modernas: elas prescrevem aos indivíduos determinado projeto de vida e ao mesmo tempo
impossibilitam a concretização desses projetos. Em tal situação, as violações de regras são
inevitáveis. Essa teoria explica porque grande parte de membros das classes desfavorecidas
32

Adorno (1991) insiste ser a assimetria nas relações de poder e na distribuição


da Justiça Criminal que torna possível a reprodução da delinqüência18. Para o autor
(1994), o problema da Justiça Penal reside no fato de que ela é incapaz de traduzir
diferenças e desigualdades em direitos, incapaz de fazer da norma uma medida
comum, isto é, incapaz de fundar o consenso em meio às diferenças e
desigualdades e, por essa via, construir uma sociabilidade baseada na
solidariedade.
Enfim, alegar-se que “enquanto não se eliminarem as grandes iniqüidades.
estruturais da sociedade brasileira, nada se pode fazer para conter a insegurança”, é
negar a possibilidade de soluções a curto prazo, e isso induz ao imobilismo e leva a
população à descrença, conforme salienta Soares (2006d).

2.2.2 Da Violência como Meio de Solução de Conflito

Propõe-se agora uma breve referência acerca do uso da violência como


forma de solucionar conflitos e eventuais reflexos nos fenômenos ora examinados.
Todas as vezes que é rompido o monopólio estatal do uso legítimo da
violência (isto é, ocorreu um afrouxamento dos mecanismos de controle social), a
sobrevivência pode depender da habilidade de um indivíduo em manter sua
reputação. A parte ofendida pode sentir necessidade de usar a violência e nesse
sentido ela é, em grande medida, uma performance. Assim, a violência passa a ser
considerada um meio de legítima defesa, isto é, como facilitadora da resolução de
conflito (PINHEIRO, 1997).
No momento em que a justiça não é vista pelos cidadãos como instrumento
adequado de superação da conflitualidade social, o resultado é o uso do recurso da

cometem a maior parte das infrações penais: sendo excluídos dos meios institucionalizados, para
atingir riqueza, recorrem à delinqüência.
18
Nesse contexto, torna-se essencial que a Justiça envide esforços para o combate e punição da
macrocriminalidade, não se limitando à repressão do crime comum. Mendroni refere que uma das
características bastante evidente no Brasil é a participação ou envolvimento de agentes públicos na
prática do crime organizado. Geralmente eles são colocados em pontos estratégicos para auxiliar na
execução das ações (como fraudes em licitações, permissões e concessões públicas,
superfaturamentos de obras e serviços, alvarás, falsificações, etc.). Como dizia Paul Castelano –
antigo ‘Capo’ da família mafiosa Gambino de Nova York: ‘Eu já não preciso mais de pistoleiros, agora
quero deputados e senadores’ (apud MENDRONI, 2002, p. 17).
33

violência como forma imperativa e moralmente válida para solucionar pendências


das mais diversas (PINHEIRO, 1999).
A história do Brasil, passado e presente, é uma história social e política da
violência e de suas formas explícitas nos espaços civis, públicos e políticos. Uma
das causas principais para que essa realidade se torne uma constante é o
sentimento de descrédito nas instituições. A maioria dos brasileiros prefere não
recorrer à justiça para resolver seus conflitos. Grande parte recorre à justiça privada.
No Brasil essas formas costumeiras de violência são amplamente toleradas. A
violência aparece no Brasil como uma verdadeira linguagem social, uma linguagem
do cotidiano (ADORNO, 1992 e 1999).
A macrocriminalidade muito se utiliza desse mecanismo e, nesse contexto,
Mendroni ressalta que:

O uso de violência é aceitável e utilizado sempre e quando seja necessário


para que o objetivo seja alcançado [...]. Há algumas organizações que se
dedicam precipuamente à prática de crimes violentos como sua atividade
principal. São exemplos, o PCC - Primeiro Comando da Capital – cujo
objetivo principal é o resgate de presos e a Máfia Chinesa (atuando em São
Paulo/SP) que obtém seus lucros através da chamada ‘venda de proteção’
– intimidando os comerciantes compatriotas a pagar-lhes quantias mensais
sob ameaça de prática de crimes violentos - agressões, homicídios, etc.
(2002, p. 20).

2.2.3 Da Transição Democrática

Questiona-se, nesse subitem, se, com a transição democrática, as Instituições


que compõem o Estado passaram a operar democraticamente e eventuais
influências no crescimento da criminalidade e da violência.
O’Donnel (1988) destaca que, em muitos países, a instalação de um governo
eleito democraticamente não abre necessariamente as vias para formas
institucionalizadas de democracia - especialmente nas áreas de proteção dos
direitos das maiorias excluídas.
Soares (2006a) lembra que o Brasil atravessou a estrada sinuosa que nos
conduziu da ditadura à democracia, transição essa consagrada na Constituição
Federal de 1988. Quase todas as instituições se adaptaram a essa nova realidade,
exceto as polícias e as prisões, que ficaram esquecidas, à margem de todo esse
34

processo (ADORNO, 2002c). Com efeito, a cidadania democrática não emerge


automaticamente com a transição (CARDIA, 1999).
Um dos principais paradoxos nas transições, decisivo para a consolidação da
democracia, é a sobrevivência de práticas autoritárias, conforme ressalta Cardia
(1999). Pressupõe-se que transição signifique mudanças, inovações, porém a
persistência do autoritarismo, impede a mudança nos processos de decisão (por
exemplo, a continuidade na estrutura organizacional das instituições como o
Judiciário e a Polícia. Mudam as leis, mas não os grupos encarregados de colocá-
las em prática).
Pinheiro (1997) ressalta que as práticas autoritárias estão enraizadas nas
novas democracias, acreditando ser difícil modificá-las nas instituições encarregadas
de controlar a violência.
Efetivamente, em que pese a promulgação da Constituição Federal de 1988
com amplas garantias democráticas, persiste a violência, combinando o arbítrio das
instituições do Estado com índices altos de criminalidade violenta, como o crime
organizado.
Soares (2003a) acrescenta que omissão histórica, qual seja, o esquecimento
da instituição policial quando da transição democrática, condenou a Polícia à
reprodução inercial de seus hábitos atávicos: violência arbitrária contra pobres e
negros, tortura, chantagem, extorsão, humilhação cotidiana, ineficiência no combate
ao crime, sobretudo o do “colarinho branco”. Como conseqüência temos a
degradação institucional da Polícia, corrosão de sua credibilidade, ineficiência
investigativa e preventiva, ligações perigosas com o crime organizado e sistemático
desrespeito aos direitos humanos. Seu modelo gerencial permaneceu arcaico,
reativo e fragmentário, refratário a procedimentos racionais, como a análise
qualificada de dados consistentes, configurando diagnósticos, com base nos quais
uma política seria planejada e, em seguida, avaliada, para que todo o processo
pudesse ser monitorado, o que converteria o erro em instrumento de autocorreção
sistêmico.
Para Peralva (2000) o caso brasileiro é revelador da importância que pode
adquirir a violência, quando o ingresso na democracia se efetua no quadro de uma
sociedade formatada pelo individualismo de massa. A generalização da violência
ocorre quando valores mínimos da sociedade como cooperação, reconhecimento do
outro e direito à vida, não são compartilhados.
35

Soares (2006b) conclui que a esquerda lavou as mãos, à espera da redenção


sócio-econômica e a direita sujou as mãos com sangue e lama, em nome da lei e da
ordem, manifestadas sob a forma de discriminação, violência com “os de baixo” e
tolerância indulgente com “os de cima”. Ambas as visões e os protagonistas que as
representam renunciaram à discussão sobre a política de Segurança Pública, em
toda sua complexidade.
Quando alguma tragédia “pula o muro do silêncio” e “borra a assepsia
política” que banira a violência da pauta, vozes ligeiras do Planalto apressam-se a
despachar uma Força-Tarefa para tomar de assalto a cena midiática e neutralizar a
ansiedade popular. E a vida segue até o próximo sobressalto. Na segurança pública,
voluntarismo e paralisia decisória são duas faces da mesma moeda (SOARES,
2004b).
Azevedo (2005a) lembra que a desorganização das instituições responsáveis
pela ordem pública no momento do retorno à democracia deveu-se à continuidade
entre o antigo e o novo regime democrático nascente no plano da segurança
pública.
Esse descompasso entre as garantias constitucionais formais e a persistência
de violações decorre do descompasso entre a Constituição e o funcionamento das
instituições encarregadas de sua proteção e implementação como a Polícia e o
Judiciário (PINHEIRO, 1999).

2.2.4 Da Impunidade

Uma questão que merece ser destacada é a da impunidade como forma de


chancela à prática de condutas criminosas, pois causa a erosão da lei e da ordem,
isto é, a desistência de punições que ligam o crime ao exercício da autoridade,
tornando o Estado conivente e propagador da atividade criminosa.
Impunidade significa falta de castigo19. Do ponto de vista jurídico, a
impunidade é a não aplicação de pena, mas também é o não cumprimento, seja qual

19
Segundo o Novo Dicionário Aurélio, impunidade é “estado de (ser) impune”, ou seja, que escapa ou
escapou à punição; que é ou não foi castigado. Já o Dicionário Michaelis, conceitua impunidade como
a não aplicação de determinada pena capital a determinado caso concreto. Quando a punição não é
36

for o motivo (por fuga do condenado, por deficiência da investigação, por posterior
tolerância da lei), de pena imposta a alguém que praticou algum delito.
No Brasil, ela é muito elevada. O Núcleo de Estudos da Violência da USP
constatou que do total de casos que chegam até a Polícia, que já é uma parcela
pequena, só se consegue instaurar inquérito policial em 10%. Isso em relação ao
homicídio, considerando um dos crimes mais grave (são geralmente aqueles que
acontecem na periferia, envolvendo pessoas de classe baixa, onde a Polícia não
investiga) (AZEVEDO, 2006c).
Essa impunidade deixa perplexo e indignado o cidadão honesto, diante da
omissão, inércia e indiferença do Estado, incapaz de punir, de forma eficaz, os que
transgridem as leis. Quando o risco de ser preso, processado e condenado é baixo,
a audácia e a violência aumentam.
Toda ordem social convive com algum grau de impunidade. Em grau elevado,
a impunidade leva à decomposição da ordem social, deixando as leis de cumprir
duas funções básicas: punição e prevenção (DAHRENDORF, 1985). É o que
Durkheim (2000) entende por violação à consciência coletiva, desacreditando o
poder diretivo da sociedade (poder simbólico do Estado). No momento em que a
consciência coletiva se enfraquece, os laços sociais tornam-se mais fragilizados, e,
da mesma forma, quando enfraquece o poder simbólico das leis, os
comportamentos anti-sociais passam a ser incentivados.
A crise do Sistema de Justiça Criminal resulta na impunidade penal. A
conseqüência mais grave é a descrença nas instituições promotoras de justiça.
Cada vez mais descrentes na intervenção saneadora do poder público, os cidadãos
buscam saídas. Os que dispõem de recursos apelam para a segurança privada. A
grande maioria da população, ao contrário, apóia-se perversamente na proteção
oferecida pelos traficantes locais ou procura resolver suas pendências e conflitos por
conta própria. Essas situações contribuem para enfraquecer a busca de soluções
proporcionadas pelas leis e pelo funcionamento do Sistema de Justiça Criminal. A
Justiça não é vista, pelos cidadãos, como instrumento adequado de superação da
conflitualidade social (ADORNO, 2002c).
Por um lado, tem-se o Estado como necessário e indispensável para o
controle social. De outro, a complexidade do contexto social reduz a possibilidade do

alcançada seja pela fuga, seja pela deficiência da investigação, seja por ato posterior de tolerância e
o crime permanece impune.
37

monopólio dos meios de violência legítima, reforçando características de


seletividade e de impunidade para a maioria dos delitos (AZEVEDO, 2004).
O poder de descriminalização primária, referido por Dias (1997), igualmente,
trata-se de uma forma de gerar a impunidade, pois é ela uma das principais
responsáveis pela escassa presença de delinqüentes de White Collar nas
estatísticas da criminalidade.
Percebe-se que, em geral, as principais causas da criminalidade e da
violência (pobreza, desigualdade social, exclusão e o uso da violência como solução
de conflito), aliadas à impunidade e à transição democrática (onde as instituições de
controle social não acompanharam o desenvolvimento dos crimes), geraram terreno
fértil para a proliferação do crime organizado.
Conforme salienta Dias Filho:

A camada social menos favorecida não obteve acesso a uma qualificação


adequada que lhe possibilite ocupar um espaço no mundo globalizado
extremamente competitivo. Esta situação, aliada a má distribuição de renda,
à ausência ou mesmo ineficiência do Estado em determinadas áreas
sociais, a exemplo da educação, da saúde, da assistência social e, com
peculiar propriedade, da Segurança Pública, esta somada à falta de pessoal
qualificado para o acompanhamento, a prevenção e a repressão dessa
nova modalidade delitiva – crime organizado – torna o ambiente
extremamente fértil à sua proliferação (2002, p. 106).

Já Mendroni (2002) alerta:

A sociedade transformou-se sobremaneira nas últimas décadas e a


legislação criminal também se vê diante da emergencial necessidade de
adaptação. Já não são suficientes somente os métodos de investigação
previstos no Código de Processo Penal de 1942, e, até que não seja revisto,
é mister a edição de Leis especiais que possam suplementar as suas
lacunas.

Dessa forma, a impunidade é um fenômeno complexo. Não se resume tão-


somente à legislação, mas também à falta de estrutura e modernização do Sistema
de Segurança Pública e Justiça Criminal.
Cano (2002) caracteriza a impunidade no Brasil como “uma hidra de múltiplos
tentáculos”. Destaca que ela se apresenta através da polícia sobrecarregada e
deficientemente treinada e remunerada, da Justiça morosa e atrelada a
procedimentos lentos e burocráticos, da incapacidade do Estado em proteger o alto
número de testemunhas ameaçadas, da morosidade da Justiça que redunda em
38

penas prescritas e da incerteza da punição. Enfim, o autor destaca que a descrença


no Sistema de Justiça Criminal desmobiliza a sociedade, estimula o medo e o
silêncio. É um câncer que se instala no corpo social e vai avançando pouco a pouco.
Cano conclui que:

Para curar esse câncer é preciso se submeter a uma quimioterapia que


consiga entre outras coisas, fortalecer o Ministério Público e o seu trabalho
conjunto com a polícia, proteger as testemunhas numa escala muito
superior à atual e investir na polícia técnica para poder conseguir novas
provas (2002, s/p).

A Revista Época (2007)20, em reportagem intitulada “Ainda falta muito”,


escrita pelos Jornalistas Fernandes e Clemente, ressalta que as leis diminuem a
sensação de impunidade, mas o problema não está restrito à legislação. Na ocasião,
entrevistaram Luiz Eduardo Soares, José Vicente da Silva Filho, Julita Lemgruber,
Michel Misse, Ignacio Cano e Gilson Caroni Filho que sugeriram algumas propostas
para o tema:

LEIS:
Acabar com a figura do crime continuado. Hoje, se um assassino participar
de uma chacina e matar 21 pessoas no mesmo lugar e horário, será julgado
como se tivesse matado apenas um.
Colocar na lei a exigência do exame criminológico para autores de crimes
hediondos que pedem o benefício da progressão de regime. "Hoje, ao
avaliar um pedido, os juízes têm em mãos apenas números, como o tempo
de pena cumprido. Com isso, criminosos perigosos acabam ganhando o
benefício", diz o coronel José Vicente.
Diminuir a margem de manobra dos advogados e a quantidade de recursos
possíveis. Hoje, todo criminoso condenado a mais de 20 anos pode recorrer
automaticamente, pedindo um novo julgamento. A simples ausência do
advogado durante uma audiência adia o andamento.
Uma lei permitindo interrogatórios e audiências judiciais por
videoconferência será um avanço e uma economia de tempo e dinheiro.
São Paulo faz, hoje, 10 mil escoltas semanais de presos que precisam ir
aos tribunais. Além de economizar tempo, a videoconferência permitiria que
os policiais fossem realocados para patrulhar a cidade.
Uma lei que permita que os juízes possam ouvir todas as testemunhas num
único dia. Hoje, os depoimentos são obrigatoriamente em dias diferentes, o
que arrasta os processos. O juiz poderia ainda ser dispensado de ouvir
novamente testemunhas já interrogadas na fase de investigação.

POLÍCIA:
Integrar o trabalho das polícias Civil e Militar. Informatizar e conectar os
bancos de dados de toda a rede de Segurança. É o que os especialistas
chamam de arroz com feijão da inteligência. Grandes cidades como o Rio
trabalham sem isso. "Sem o entrosamento, quem ganha é o crime", afirma o
coronel José Vicente. Uma vez conhecidas, as informações poderiam
compor um mapa de crimes mais completo, o que permitiria também um

20
Revista Época, edição 457, 5 mar. 2007, p. 1-3.
39

aumento da eficiência do patrulhamento das ruas. "No bairro de Pinheiros,


em São Paulo, 44% dos crimes se concentram em 1% da ruas", afirma José
Vicente "Isso significa que você não precisa patrular o bairro todo". Dar
autonomia, treinamento específico e estabilidade aos corregedores. É uma
iniciativa essencial para tirar da corporação os maus policiais.

PRISÕES:
Caso aumente a eficiência da polícia, os presídios não têm condição de
acomodar mais presos. Estão superlotados. Além disso, engendram novos
crimes. Um detento é assassinado por dia no Brasil, em média. Mais rápido
e barato do que construir novas unidades é libertar os detentos que já
deveriam estar soltos. Segundo a socióloga Julita Lemgruber, entre 30% e
40% dos presos já deveriam estar beneficiados pela liberdade condicional.
"A grande maioria dos presos no Brasil não é violenta", diz. Para
implementar isso, bastaria informatizar as Varas de Execução. Isso
permitiria um melhor acompanhamento da situação dos detentos. Desafogar
as celas traria a oportunidade de separar os criminosos violentos dos
menos perigosos. É muito difícil transformar as cadeias em lugar de
recuperação de criminosos. Mas pelo menos dá para fazer com que elas
deixem de ser universidades do crime. A ressocialização de infratores é um
tema tão complexo que os estudiosos são unânimes: mais fácil é impedir
que o jovem entre para o crime. "Precisamos fazer um projeto para a
juventude, disputar os meninos com o tráfico e respeitar as leis que já
existem", diz Luiz Eduardo Soares.

Feitas essas observações, passa-se, agora, a tratar dos principais entraves


para um investigação eficaz da macrocriminalidade.

2.3 DILEMAS DE GESTÃO

Nesse capítulo, examinaremos algumas das principais dificuldades no tocante


à gestão que afetam, negativamente, a eficácia da Segurança Pública e do Sistema
de Justiça Criminal. Busca-se analisar a atual gestão pública, em especial quanto à
investigação dos crimes, numa realidade onde há a proliferação do crime organizado
e a crescente criminalidade e a violência.

2.3.1 Da Escassez de Informações e das Estatísticas

Adentrando ao tema da gestão pública, propõe-se agora uma breve reflexão


sobre os problemas enfrentados em razão da falta de diagnósticos precisos, pois
40

com a complexidade das funções assumidas pelo Estado, há, paralelamente, a


necessidade de aperfeiçoar o fluxo de informações necessárias para a tomada de
decisões práticas.
Um dos principais entraves para uma investigação eficiente é a falta de um
sistema confiável de dados, o que impede comparações e conhecimento das
particularidades da criminalidade.
A explicação para o problema da criminalidade e da violência na sociologia
contemporânea não é mais buscada através de uma visão seqüencial de causa e de
efeito, ao contrário, procura-se um modelo multidimensional em que um conjunto de
ações desencadeia efeitos que se cruzam entre si.
Para que um programa ou uma política se realize é necessário que haja um
diagnóstico das dinâmicas criminais e dos fatores de risco para a elaboração de um
plano de ação, capaz de formular uma agenda, identificar prioridades, recursos e
estipular metas, seguidas de monitoramento (SOARES e GUINDANI, 2005).
Na década de 60, nos Estados Unidos, surgiram os “indicadores sociais” que,
na realidade, são incapazes de representar, de forma absoluta, a verdade sobre o
fenômeno da criminalidade. Podem, sim, caracterizar tendências do fenômeno, pois
são informações quantificáveis que traduzem conceitos sociais abstratos. Kahn
(1997) avalia os indicadores sociais como "medidas de uma característica
observável de um fenômeno social e que estabelecem o valor de uma característica
diferente, mas não observável do fenômeno". Busca-se, através dos índices
(medidas estatísticas), reduzir a margem da incerteza, prevendo a evolução futura
dos fatos e avaliando a eficácia das medidas postas em prática.
Zaluar (2004) salienta que não dispomos de um sistema nacional de
estatísticas oficiais de criminalidade e, portanto, não podemos responder
empiricamente às indagações mais simples e elementares sobre o impacto real
(distinto do socialmente percebido) do crime na vida cotidiana.
A autora (2004) ainda alerta que um espectro ronda a pesquisa sociológica no
Brasil: a reificação ingênua dos dados, principalmente os oficiais. Cada uma das
fontes de registro de dados, oficial ou não, é resultado de diversas relações sociais
que devem ser cuidadosamente consideradas para se avaliar e assegurar sua
credibilidade. Não existem pesquisas puramente quantitativas ou qualitativas, pois
elas decorrem de operações mentais de quem as registra, portanto, são construídas.
Daí decorrem os problemas principais nos dados sobre violência e criminalidade.
41

Eles dependem dos encarregados dos registros que se utilizam de categorias


preestabelecidas, interpretando o que presenciam e valendo-se do senso comum
(Policial Militar, na rua, Escrivão de Polícia, na Delegacia, Médico, no Instituto
Médico Legal, Escrivão de Justiça, no Foro, etc.). A posição institucional de quem
registra os dados, o fato de pertencer aos quadros da Polícia ou aos quadros do
Sistema de Saúde, implica uma “rationale” para um registro bastante diferenciado.
Essa é a base sobre a qual se monta todo o aparato de dados estatísticos oficiais.
Soares (2006b) ainda esclarece que no Brasil não há treinamento especial
para preenchimento dos documentos referentes à ocorrência de crimes, nem se
desenvolveu uma cultura institucional que valorize referidas declarações. Além
disso, esses registros são diferentes, nos diversos Estados, geralmente feitos à mão
ou datilografados. Os papéis gerados pelos registros têm destinos distintos, há
perda de registros, documentos com letras ilegíveis e baixa qualidade das
informações consignadas.
Nessas perspectivas, um dos principais problemas enfrentado pela gestão no
processo de integração das organizações é a falta de diagnóstico preciso,
decorrente da escassez de informações, da ausência de uma efetiva pesquisa de
vitimização, da elevada cifra obscura, bem como do efeito funil da justiça.
As estatísticas criminais são importantes mecanismos de estudos e estão
associadas ao debate democrático, em especial, na reformulação das políticas
públicas de segurança e justiça. Se antes, elas estavam no campo da reprodução
burocrática de procedimentos e inquéritos, elas, agora, compõem a preocupação
sobre o uso de dados oficiais na descrição de situações sociais e sobre as formas
da sociedade se apropriar dos discursos normativos que regem o funcionamento das
instituições de justiça criminal e, por conseguinte, contestá-los, conforme ressalta
Lima (2005).
Para melhor compreensão do tema, importante destacar os conceitos de dark
rate (cifra obscura) e de taxa de atrito.
Lemgruber questiona:

Como avaliar o tamanho de nosso problema, quando se discute a violência


e a criminalidade no Brasil, e ter clareza, por exemplo, sobre a quantidade
de crimes cometidos? Na verdade, pela falta de pesquisas regulares de
vitimização e pela insuficiente informatização do Sistema de Justiça
Criminal como um todo, é praticamente impossível determinar a real
dimensão da criminalidade em nosso país. Não existem dados confiáveis
42

para se determinar a "cifra negra" ou "taxa negra", isto é, a diferença entre o


número de crimes cometidos e aqueles que chegam ao conhecimento da
polícia (LEMGRUBER, 2002, p.157).

Tampouco se pode conhecer a taxa de atrito, ou a proporção das perdas que


ocorrem em cada instância do Sistema de Justiça Criminal, a partir do número de
crimes cometidos, culminando com o número de infratores que recebem uma pena
de prisão (LEMGRUBER, 2002, p. 157).
É caótica, no dizer de Rolim (2006), a situação enfrentada pelo Brasil em
relação aos dados para o estudo do crime e da violência. Não existem informações
elementares que permitam um diagnóstico sequer sobre as tendências criminais em
curso e, muito menos, dados que nos permitam aferir a eficácia de iniciativas
tomadas pela Polícia.
Conforme Kahn (1997), impõe-se que a Administração Pública e a Sociedade
tenham instrumentos eficazes para mensurar o desempenho das políticas colocadas
em prática no âmbito da Segurança Pública e que afetam diretamente o nível de
violência da sociedade21.
Soares (2006b) conclui que não havendo gestão, não há condições de
realizar investigações eficientes. Deve haver um sistema organizado de informações
automatizadas, capacitando policiais e gestores da segurança a se anteciparem ao
crime e preveni-lo. O autor (2000a) ressalta a necessidade do referido sistema se
articular a um processo de diagnose-planejamento-monitoramento, com profissionais
qualificados e equipamentos satisfatórios, tecnologia moderna e estrutura
organizacional adequada.

21
Soares (2002c) ressalta que no campo da Segurança Pública tudo é mais complicado do que
parece. Por exemplo, a quantidade de crimes pode diminuir por condições externas às dinâmicas
criminais que condicionam sua existência e são substituídas por outros, desfavoráveis à sua prática
(como a taxa de desemprego, o padrão de vida dos segmentos pobres, o grau de exclusão da
cidadania, etc.), sem que a política de segurança ou o comportamento policial contribuam de
qualquer modo para essa alteração das condições. A quantidade de crimes também pode decrescer
em razão de algumas condições internas às dinâmicas criminais. Por exemplo, um determinado
território pode beneficiar-se da piora relativa do desempenho policial, o que funcionaria como atrativo
para criminosos, provocando êxodo: sua conseqüência imediata seria a diminuição da criminalidade
no território abandonado pelos bandidos. O aumento de certos tipos de crimes pode ser
conseqüência do aumento, por exemplo, da disponibilidade de armas no mercado ilegal. Certas
variações nos crimes podem ser resultados das mudanças introduzidas na vida de uma sociedade
pelo ciclo sazonal. Enfim, o universo da Segurança Pública e da criminalidade é tão complexo que a
melhora aparente, inclusive redução de crimes e mortes, pode ser subproduto perverso do aumento
do perigo representado pelos criminosos, do fortalecimento de seu poder de corromper, destruir
instituições e desorganizar a sociedade.
43

É de se salientar que grande parte das delegacias não conta com os recursos
da informática. As informações coletadas não são padronizadas. Dados,
eventualmente padronizados, na maioria das vezes, não são organizados em
programas compatíveis, inviabilizando o cruzamento dessas informações entre as
várias agências. Essa ausência de integração dos sistemas informatizados não
permite se ter uma idéia precisa sobre a “taxa de atrito” no Brasil, qual seja, a
diferença entre os crimes registrados e o número de pessoas que foram
responsabilizadas por eles. Não há um acompanhamento desde a ocorrência
criminosa até a responsabilização judicial (ROLIM, 2006).

2.3.2 Ausência de Pesquisa de Vitimização

O presente subitem analisa outro grave problema de gestão, qual seja, a


ausência de pesquisa de vitimização, o que limita o diagnóstico dos índices criminais
aos dados colhidos a partir dos registros de ocorrência.
As pesquisas de vitimização coletam informações sobre os riscos de cada
setor da população, suas experiências enquanto vítimas de crime, suposições para
registrar a queixa no órgão competente, imagens da Polícia, dos criminosos, das
punições, bem como avaliação da política pública do setor. Seus dados são
importantes para entender o medo da população (ZALUAR, 2004).
Rolim (2006) acentua que no Brasil a prática de pesquisas de vitimização
ainda não se firmou. A maior parte dos Estados brasileiros jamais teve uma delas.
Na prática, prossegue-se com o trabalho de dados compilados a partir dos registros
de ocorrência, o que indica uma forma ultrapassada de se lidar com indicadores da
criminalidade e da violência.
Foram poucas as pesquisas realizadas, conforme Lima (2005) demonstrou,
em 1988. Ele refere que as “cifras negras” podem ser explicadas pelo fato de
somente uma parcela das vítimas denunciar à Polícia as ofensas criminais sofridas,
pela intervenção de critérios burocráticos de avaliação e desempenho administrativo,
pelas “negociações” que ocorrem entre vítimas, agressores e autoridades, bem
como pelo provável impacto da implementação de políticas determinadas de
Segurança Pública.
44

A diferença entre o crime ocorrido e o notificado é chamada de


“subnotificação”. São vários os fatores que podem motivar a inércia das vítimas.
Kahn (1998) citou como exemplos a percepção social quanto ao sistema policial, o
montante envolvido no crime, o fato de implicar ou não numa situação vexatória para
a vítima, o grau de relacionamento da vítima com o agressor e a existência de
formas alternativas para a resolução do problema.
Já Mingardi (1991) refere que são comuns as críticas contra as estatísticas
oficiais no Brasil. Quanto às “cifras obscuras”, aponta diversas intercorrências como
o fato de que as pessoas envolvidas, muitas vezes, não percebem que houve a
infração (como briga entre crianças), em outros casos, as vítimas são os próprios
infratores (aborto), não percebem o crime (furto de loja) ou não existe vítima
imediata (declaração incorreta de imposto de renda). Há, igualmente, situações em
que a vítima não quer dar queixa por medo de represália ou por não confiar na
Polícia (BEATO, 2001).

2.3.3 Do “Efeito Funil” no Sistema de Justiça Criminal

O que se pretende, no prosseguimento deste estudo, é analisar o chamado


“efeito funil da Justiça”, isto é, entre o número de crimes praticados, os registrados
na Polícia e, por fim, os oficialmente denunciados, há uma perda enorme. Dessa
forma, ocorre uma redução das taxas desde os crimes ocorridos, crimes registrados,
investigações realizadas, denúncias subscritas, até às sentenças proferidas.
Kahn (1998) destaca que o “efeito funil” do Sistema de Justiça Criminal
caracteriza-se pelos crimes cometidos que vão sendo filtrados até chegar à punição
de um número reduzido de infratores.
O efeito funil, também conhecido como “taxa de atrito”, para Rolim (2006), é
um indicador importante sobre o funcionamento do Sistema de Justiça Criminal, pois
demonstra que são poucos os delitos cometidos que se transformam em
condenações judiciais, tornando evidente que a maioria dos crimes cometidos resta
impune.
Sapori (2002), ao se referir sobre o problema da frouxa articulação e
efetividade da Justiça Criminal, salienta que não há consenso sobre os critérios para
45

medir eficácia e eficiência do Sistema de Segurança Pública. Referir-se ao tempo e


à fluidez do referido sistema significa explicitar o tempo gasto entre o registro formal
de um crime e o desfecho do caso, mediante sentença judicial. É a questão da
morosidade do fluxo processual. Mas isso envolve comparar a relação dos números
de crimes oficialmente registrados e os números de sentenças proferidas num
mesmo período, captando o perfil do “efeito funil do sistema”. É a capacidade de
detectar os eventos criminosos efetivamente ocorridos, reduzindo o sub-registro
criminal (cifra obscura).
A lacuna provocada pela “cifra obscura” seria medida em parte pelos estudos
de afunilamento no Sistema de Justiça do Brasil, em parte pelas pesquisas de
vitimização. Elas são ministradas precisamente para estimar qual o diferencial
existente entre as estatísticas oficiais e a criminalidade existente (KAHN, 1998).
Lemgruber (2001) ressalta a ausência de dados confiáveis para se determinar
a “cifra obscura”, tampouco se pode conhecer a “taxa de atrito”. Estudando as taxas
de atrito é que se torna possível dimensionar e localizar as perdas nas várias etapas
do Sistema de Justiça Criminal. Quanto mais elevadas as perdas em cada instância
do Sistema, mais altos os níveis de impunidade. Outra incógnita é a taxa de
esclarecimentos de crimes, isto é, a quantidade de crimes em relação aos quais a
Polícia é capaz de indicar ao Judiciário um provável culpado, tomando-se como
ponto de partida o número de crimes registrados. Em suma, não há indicadores
sérios do funcionamento e da eficácia do Sistema de Justiça Criminal.

2.3.4 Falta de Gestão e de Prioridade Política

Feitos esses brevíssimos apontamentos, volta-se agora, ainda que também


de forma sucinta, para as políticas públicas de segurança.
Criminalidade e violência historicamente não eram tidos como problemas
públicos importantes, considerando as demais carências do Estado. Sapori (2006)
ressalta que há uma ausência de racionalidade gerencial mais sistêmica no âmbito
das políticas públicas (de planejamento, monitoramento e avaliação de resultados).
Enquanto persistirem, sem controle por parte do poder público, as históricas
disputas e confrontos de forças entre grupos situados no interior do aparelho do
46

Sistema de Justiça Criminal e enquanto não se definirem limites de atuação,


firmando-lhes responsabilidade e competência, no contexto do exercício
democrático do poder, nenhuma política será eficaz, conforme sustenta Adorno
(1993a).
A crise fiscal do Estado, por outro lado, promove a redução de investimentos
na área da Segurança Pública, com sérias repercussões nas condições e na divisão
de trabalho entre agências que compõem o Sistema de Justiça Criminal, acirrando
os conflitos intra e entre as instituições (ADORNO, 1998b).
Mingardi (1991) ilustra que o Governo tem duas formas de influir na Polícia: a
primeira é alterando a estrutura organizacional, o que pode ou não resultar em
mudanças na forma das Polícias agirem; a segunda é quando da escolha do
Secretário da Segurança, que, na maioria dos casos, tem muito pouca vivência do
trabalho policial. Geralmente é um político ou advogado criminalista e, mesmo vindo
do Ministério Público ou Judiciário, seus contatos com criminosos, vítimas e policiais
se dá em outro nível. Outro risco que corre o Secretário mal informado é o de não
perceber se as informações que recebe, sobre a parte escusa do trabalho policial,
são fidedignas. Não tendo experiências para julgá-las, fica dependente dos Policiais
que coloca nos cargos de comando ou que lá são colocados (seja por indicação,
pedido ou por previsão da legislação interna).
Kahn (2006) salienta que o envolvimento federal no tocante à criminalidade
foi-se dando de modo errático. Ao sabor das crises e tragédias nacionais, houve um
verdadeiro “gerenciamento de pânico”, isto é, um processo improvisado no qual falta
uma visão de conjunto e o encaixe com os demais elementos do sistema.
Observa-se que a maioria dos governos não têm um projeto verdadeiramente
sério para a área da Segurança Pública, nem tampouco querem fazer ou executar
um. Luiz Eduardo Soares e Luis Flávio Sapori são indicativos dessa constatação.
Entre novembro de 1998 e março de 2000, o antropólogo Luiz Eduardo
Soares esteve à frente da Segurança Pública do Estado do Rio de Janeiro, onde
procurou demonstrar que a violência carioca – logo, a (in) Segurança Pública de
qualquer cidade brasileira – tem remédio. Ele acabou sendo surpreendido, durante a
gestão para implementação dos projetos que configuravam uma política de
segurança, com sua demissão. Na ocasião, o Governador deu três versões distintas
para o afastamento de Luiz Eduardo, inclusive, referindo-se a ele como “um auxiliar
do Governo”. Por ingerências políticas e em razão das críticas que fez à corrupção,
47

à brutalidade de policiais e à tibieza do Governo em apoiar o projeto de reforma da


Polícia e da Segurança Pública, Soares foi demitido e seus projetos prejudicados
(SOARES, 2000a).
Em momento posterior, quando deixou o comando da Secretaria Nacional de
Segurança Pública, cargo que ocupou entre janeiro e outubro de 2003, Soares
defendeu a necessidade de um novo formato legal para a Segurança Pública,
explicando que a falta de determinação política do Governo Federal representou o
principal entrave à consecução do Sistema Único de Segurança Pública, alertando
que o Presidente da República não quis chamar para si a responsabilidade de ser
o protagonista, na área da Segurança Pública, conforme observa Teixeira (2005).
Na ocasião, Soares destacou que o então Ministro da Justiça justificou que:

o Presidente Lula não operaria as mudanças previstas no Plano porque não


queria despejar os cadáveres na sua ante-sala do palácio e fazer com que
as tragédias cotidianas da Segurança Pública se convertessem em
desgaste político e o vulnerabilizassem (TEIXEIRA, 2005, p. 105).

O sociólogo Luis Flávio Sapori assumiu, em 2003, junto ao Governo de Minas


Gerais, o cargo de Secretário-adjunto da Defesa Social. Ele foi um dos responsáveis
pela elaboração do Plano Estadual de Segurança Pública para Minas Gerais. Como
Secretário-adjunto ajudou a implementar a nova política de Segurança Pública do
Estado, por meio da qual foi instituído o Sistema Integrado de Defesa Social. O novo
modelo de gestão em Segurança Pública promoveu a integração dos procedimentos
das forças de Segurança Estadual – Polícia Militar, Polícia Civil, Corpo de
Bombeiros e Guarda Penitenciária.
Já por ocasião do segundo mandato do Governador de Minas Gerais, em 30
de maio de 2007, Sapori foi empossado no cargo de consultor do Estado para
assuntos de Segurança Pública. Sua função era formular políticas para o combate
à criminalidade em Minas Gerais. Na oportunidade, Sapori ressaltou: “Pela primeira
vez na história do Brasil um governante acreditou que é possível fazer um plano de
ação com metas, gerenciamento, investimentos e decisão política. Investimentos em
Segurança Pública envolvem ações na área prisional, policial e prevenção social”.
Em 19 de setembro de 2007, menos de 4 meses depois, Sapori solicitou seu
desligamento, por falta de qualquer apoio político ao seu trabalho, comunicando,
48

oficialmente, que não ocupava mais o cargo de assessor do Governador para


assuntos de Segurança Pública22.
As ingerências políticas atrapalham sobremaneira a efetiva atuação estatal.
Por outro lado, cabe destacar que, no plano federal, apesar de todos os
problemas, desde a criação da SENASP, ainda no Governo de Fernando Henrique
Cardoso, começaram a ser formuladas políticas nacionais, articuladas com os
Estados, que vêm tendo continuidade e produzindo algumas mudanças importantes
em áreas como a formação policial e o condicionamento do repasse de recursos
federais a projetos consistentes, e que culminaram com a elaboração e
apresentação do PRONASCI, em 20 de agosto de 2007.
A Secretaria Nacional de Segurança Pública – SENASP foi criada pelo
Decreto n. 2.315, de 4 de setembro de 1997 e decorreu da transformação da antiga
Secretaria de Planejamento de Ações Nacionais de Segurança Pública –
SEPLANSEG. A SEPLANSEG foi criada no governo de Fernando Henrique Cardoso
através da MP 813, de 1º de janeiro de 1995 - mais tarde Lei n. 9.649, de 27 de maio
de 1998.
O Programa Nacional de Segurança Pública com Cidadania (PRONASCI) foi
instituído pela Lei 11.530 de 24.10.07 e destina-se à prevenção, controle e
repressão da criminalidade, atuando em suas raízes sócio-culturais, além de
articular ações de Segurança Pública com políticas sociais, por meio da integração
entre União, Estados e Municípios. O projeto prioriza a prevenção, buscando atingir

22
“Gostaria de comunicar a todos os amigos da imprensa mineira, e à população de maneira geral,
que não ocupo mais a posição de Assessor do Governador de Minas Gerais para assuntos de
Segurança Pública. Enviei ao governador Aécio Neves uma carta contendo minha decisão nesse
sentido na última quarta-feira, dia 19 de setembro. A partir de agora passo a me dedicar às atividades
docentes no curso de Ciências Sociais da PUC/Minas. Aproveito a oportunidade para agradecer a
todos aqueles que, direta ou indiretamente me apoiaram durante minha participação na gestão da
Segurança Pública de Minas Gerais. Menciono, em especial, os jornalistas dos diversos meios de
comunicação que têm realizado trabalho de qualidade admirável no que tange à cobertura do tema
da Segurança Pública em nosso Estado. Não poderia deixar de lembrar a competência e a amizade
do corpo técnico da Secretaria de Estado de Defesa Social, que, nos últimos quatro anos,
demonstrou um espírito republicano exemplar. Guardo lembranças saudosas dos inúmeros Prefeitos,
Vereadores e Deputados que conheci ao longo deste período, e que reforçaram em mim a convicção
de que temos políticos sérios e conscientes da gravidade do problema da violência na sociedade
mineira. Destaco também meus agradecimentos à Polícia Civil e à Polícia Militar de Minas Gerais
pelo respeito e confiança que depositaram em minha pessoa. E, por fim, menciono o Governador
Aécio Neves, manifestando publicamente minha admiração pelo Governador que teve a audácia de
construir e executar uma política de Segurança Pública, que se tornou referência nacional, em seu
primeiro mandato. Sinto-me orgulhoso de ter participado desse projeto”. Disponível em:
<http://www.radio98to.com.br> e <www.mg.gov.br/portalmg/do/noticias>.
49

as causas que levam à violência, sem abrir mão das estratégias de ordenamento
social e repressão qualificadas23.
No entanto, Soares sustenta que:

[...] Com o SUSP anêmico e sem o seu complemento institucional – a


desconstitucionalização ou alguma fórmula reformista, ao nível das
estruturas organizacionais –, o status quo policial e, mais amplamente, o
quadro fragmentário das instituições da Segurança Pública acabam sendo
assimilados. Desse modo, naturaliza-se o legado da ditadura, chancelando-
se a transição incompleta como a transição possível. O PRONASCI resigna-
se a ser apenas um bom Plano destinado a prover contribuições tópicas. [...]
Os méritos do PRONASCI são suficientes para justificar a esperança de que
haverá avanços na Segurança Pública brasileira. Mas não parecem
suficientes para justificar a esperança de que o país começará, finalmente,
a revolver o entulho autoritário que atravanca o progresso na área, com sua
carga de irracionalidade e desordem organizacional, incompatíveis com
funções tão importantes, exigentes e sofisticadas, em uma sociedade cada
vez mais complexa, na qual o crime cada vez mais se organiza, se
nacionaliza e se transnacionaliza [...] (2007, p. 11-13).

A Segurança Pública é, antes de tudo, um direito de todo cidadão, que, no


dizer de Marshall, citado por Santos (2006), compõem um dos elementos da
cidadania que deve ser garantido institucionalmente. Trata-se do “direito social à
segurança”, onde está igualmente embutido um dever. Porém, “as políticas sociais
do governo parecem estar em um labirinto também quando se trata de colocá-las em

23 o
Art. 3 : São diretrizes do PRONASCI: I - promoção dos direitos humanos, considerando as
questões de gênero, étnicas, raciais, geracionais, de orientação sexual e de diversidade cultural; II -
criação e fortalecimento de redes sociais e comunitárias; III - promoção da segurança e da
convivência pacífica; IV - modernização das instituições de Segurança Pública e do sistema prisional;
V - valorização dos profissionais de Segurança Pública e dos agentes penitenciários; VI - participação
do jovem e do adolescente em situação de risco social ou em conflito com a lei, do egresso do
sistema prisional e famílias; VII - promoção e intensificação de uma cultura de paz, de apoio ao
desarmamento e de combate sistemático aos preconceitos; VIII - ressocialização dos indivíduos que
cumprem penas privativas de liberdade e egressos do sistema pris0ional, mediante a implementação
de projetos educativos e profissionalizantes; IX - intensificação e ampliação das medidas de
enfrentamento do crime organizado e da corrupção policial; X - garantia do acesso à justiça,
especialmente nos territórios vulneráveis; XI - garantia, por meio de medidas de urbanização, da
recuperação dos espaços públicos; e XII - observância dos princípios e diretrizes dos sistemas de
gestão descentralizados e participativos das políticas sociais e resoluções dos conselhos de políticas
sociais e de defesa de direitos afetos ao PRONASCI. Investimento: R$ 483 milhões do orçamento
do MJ/2007 (descontigenciados), R$ 806 milhões/ano, de 2008 a 2011, R$ 600 milhões/ano para o
Bolsa-Formação, de 2008 a 2012. Total: R$ 6,707 bilhões. Ações policiais: Bolsa-Formação: 225
mil Policiais Civis, Militares, Bombeiros, Peritos e Agentes penitenciários de baixa renda. Habitação:
17 mil policiais civis, Militares, bombeiros, peritos e agentes Penitenciários de baixa renda via Caixa
Econômica Federal (CEF); 13 mil via imóveis a serem retomados pela CEF; cerca de 20 mil através
de cartas de crédito de R$ 30 a R$ 50 mil para policiais de renda média. Jovens: 425 mil jovens
entre 15 e 29 anos serão atingidos pelas diversas ações do PRONASCI, incluindo 63 mil reservistas.
Sistema prisional: 33.040 vagas novas para homens e 4.400 para mulheres (com atendimento
educacional, profissionalizante e de cidadania). Metas: Beneficiar, direta ou indiretamente, 3,5
milhões de pessoas entre profissionais de Segurança Pública, jovens e suas famílias. Buscar a
50

vigor” (SANTOS, 2006, p. 100). Afinal, os desacertos decisórios e operacionais na


execução das políticas sociais prejudicam resultados práticos.
A efetividade de políticas de Segurança Pública só será alcançada se mantida
e perseguida a longo prazo, independentemente dos partidos e dos governos, e
como uma das prioridades do Estado.

2.3.5 Ineficiência do Sistema de Inteligência

Por fim, nesse contexto em que analisa os “dilemas de gestão”, busca-se


avaliar, no presente subitem, os problemas relativos à atividade de inteligência,
considerando-se a necessidade de um órgão integrado de informações capaz de
analisar e elaborar diagnósticos voltados para o combate à macrocriminalidade.
Compreender as noções de Inteligência é essencial para aumentar a
capacidade de propor mudanças, tendo por base um modelo de coleta,
processamento e disseminação de informações.
A atividade de Inteligência é elemento indispensável ao Estado, ela
geralmente atua no universo antagônico e seu segmento é voltado para a produção
de conhecimentos, utilizando-se de todas as fontes disponíveis24.
Os Serviços de Inteligência são Organizações Governamentais
especializadas na coleta, análise e disseminação de informações sobre problemas e
alvos relevantes para a política externa, para a política de defesa nacional e para a
Segurança Pública de um país, formando, juntamente com as Forças Armadas e as
Polícias, o núcleo coercitivo do Estado contemporâneo (CEPIK, 2003).
A contra-inteligência é o segmento da atividade de Inteligência que engloba
um conjunto de medidas destinadas a coibir a atuação das organizações de
inteligência adversas, inclusive as agressões de caráter psicológico à população,
bem como as medidas para salvaguardar os segredos de interesse nacional. Ela é

redução do número de homicídios, dos atuais 29 por 100 mil habitantes para 12 homicídios por 100
mil habitantes, nos próximos quatro anos. Disponível em: <http://www.mj.gov.br/pronasci>.
24
Fonte de dados: Fontes humanas (oficiais de inteligência, informantes, delatores, etc.), de sinais
(interceptação e monitoração das emissões do espectro eletromagnético) e de imagens (obtidas a
partir de imagens de equipamentos fotográficos, radares, sensores montados em plataformas aéreas,
espaciais ou terrestres).
51

implementada pela adoção de medidas voltadas para a prevenção, obstrução,


identificação e neutralização de ações adversas de qualquer natureza.
No ramo policial, a atividade de Inteligência da Segurança Pública se
apresenta como instrumento de resposta e combate à violência em geral e,
principalmente, aos crimes de alta complexidade, procurando identificar, entender e
revelar os aspectos ocultos da atuação criminosa que seriam de difícil detecção
pelos meios tradicionais de investigação policial (MIRANDA, 2007).
Conforme ensina Woloszyn (2004) a metodologia para a produção do
conhecimento de inteligência é considerada universal, tendo como premissas
básicas: a) Definir o assunto, respondendo aos quesitos: o quê, quem, como,
quando, onde, por quê, para que e para quem; b) Estudar o histórico e a estratégia
dos atores envolvidos, avaliar e identificar o comportamento dos atores e das forças
políticas e sociais envolvidas; c) Identificar os principais elementos: econômicos,
políticos, sociais, culturais, bem como do contexto (locais, regionais, nacional ou
internacional); d) Caracterizar o fenômeno, o ponto central da questão, o que se fala
a respeito, causas e motivações, localização e origem do fenômeno; e) Caracterizar
os atores (quem são, quais suas representatividades, o que os distinguem em
função de seus objetivos, vulnerabilidade e possibilidades); f) Analisar a correlação
de forças que deverá ser realizada a partir da avaliação dos recursos políticos,
financeiros, humanos e tecnológicos e, por fim, g) Interpretar o quadro ou cenário,
buscando a ótica em que se deve abordar o estudo e os fatores de influência ligados
aos fenômenos do objeto da análise.
No Brasil, de modo geral, as informações coletadas pelas diversas instâncias
do Sistema de Segurança Pública e Justiça Criminal não são computadorizadas,
padronizadas e organizadas em programas compatíveis que permitam o cruzamento
das mesmas entre as várias agências.
Mingardi (2007), ao tratar sobre o trabalho de inteligência no controle do
crime organizado, ressalta a importância de desconfiar das certezas; de esquecer a
ideologia e o discurso; de identificar o alvo; de obter informações em tempo real e de
construir conhecimento e agir baseado nesse conhecimento. Porém, o grau de
informação sobre o sistema geralmente é falho e insuficiente para produzir
conhecimento utilizável. Ressalta, ainda, que somente por volta de 2006, os órgãos
de inteligência deram resposta mais efetiva, com trabalho conjunto, identificando
52

redes, rastreando o dinheiro das organizações, enfim, juntando esforços entre


Polícia, Ministério Público Estadual e Federal.
Woloszyn (2004) observa que a eficácia da atividade de inteligência permite,
tratando-se especificadamente da área da Segurança Pública, a compreensão exata
dos fenômenos da violência e da criminalidade, dentre outros, em caráter científico,
instrumentalizando com eficiência o planejamento dos órgãos que integram a
segurança pública, subsidiando gestores públicos na tomada de decisões nos mais
diversos campos, quer estratégicos, setoriais ou operacionais.
Feitas essas observações acerca dos fenômenos da criminalidade e da
violência no contexto do Sistema de Segurança Pública e Justiça Criminal, passa-se
agora a tratar de um dos pontos centrais da presente dissertação, qual seja, o
estudo da Sociologia das Organizações objetivando uma melhor compreensão
desses acontecimentos sob a ótica das Ciências Sociais.
53

3 SOCIOLOGIA DAS ORGANIZAÇÕES

A nossa sociedade é uma sociedade de organizações. Nascemos em organizações,


somos educados por organizações, e quase todos nós passamos a vida a trabalhar para
organizações. Passamos muitas de nossas horas de lazer a pagar, a jogar e a rezar em
organizações. Quase todos nós morremos numa organização, e quando chega o momento do
funeral, a maior de todas as organizações – o Estado – precisa dar um licença especial”.
Amitai Etzioni

O presente capítulo pretende abordar algumas correntes teóricas, acerca da


Sociologia das Organizações25, que melhor se conectam ao tema proposto neste
trabalho. A Sociologia das Organizações busca compreender as estratégias dos
atores, isto é, é o estudo das organizações como jogos de poder, onde os
comportamentos sociais são um fenômeno de atores que agem intencionalmente
tendo em vista fins escolhidos por eles, conforme Bernoux (s/d).
Foi preciso fazer escolhas porque todas, de alguma forma, são importantes
para o estudo da Força-Tarefa e do Sistema de Justiça Criminal. Os órgãos que
compõem e operacionalizam o Sistema de Segurança Pública e Justiça Criminal
(Polícia Militar, Polícia Civil, Poder Judiciário, Ministério Público, Sistema
Penitenciário, etc.) são refratários a mudanças e apresentam frouxa articulação
(SAPORI, 1995). Trata-se de um fenômeno complexo que se manifesta de diversas
formas e em função de múltiplos fatores, que merece ser analisado para melhor
compreender essa realidade e suas nefastas conseqüências para a investigação
criminal e para o combate ao crime organizado. Nesse contexto, oportunos os
conceitos de Friedberg, Crozier, não sem antes referir Weber, com seu modelo ideal-
típico de organização, e Merton com a sua análise das disfunções. Essa abordagem
destaca as questões que dizem respeito às relações de poder, ao funcionamento

25
Delorenzo (1975, p. 25) salienta que alguns autores também a denominam como “Sociologia
aplicada à Administração” e “Sociologia Industrial” – especialmente os anglo-saxônicos - e os
franceses empregam a denominação de “Sociologia do Trabalho”.
54

das organizações e às suas disfunções, buscando uma análise do conflito, enfim, da


cultura organizacional e interação social como categorias centrais de análise.
Igualmente, buscou-se em Schein, Freyre, Motta, Freitas, Lapassade,
Sainsaulieu e Muniz, elementos para avaliar eventuais resistências a mudanças, por
parte das organizações, principalmente porque a pesquisa tem como objeto de
análise as Forças-Tarefa (que pressupõem a integração entre diversas instituições).
Afinal, o conhecimento da diversidade organizacional é essencial para uma
integração eficaz.
Por óbvio que o presente estudo não exclui as demais teorias ou as condena,
apenas escolheu-se referido recorte porque seus valores são mais afinados com o
que se busca analisar. Parte-se do pressuposto, já referido por Adorno (1995,
2002b) e Kant de Lima (2002, 2003b), de que as organizações que operacionalizam
o Sistema de Segurança Pública e Justiça CriminaI (limitados, nesse estudo, à
Polícia Civil, Polícia Militar e ao Ministério Público) são compostas por grupos de
indivíduos que aprendem em conjunto e interagem uns com outros, construindo a
cultura organizacional.

3.1 CONCEITO DE ORGANIZAÇÕES

Trazer à luz um conceito de organização não é fácil, principalmente na


atualidade, quando tal fenômeno é abordado de diversas formas e com diferentes
significados.
Lapassade refere que:

O termo organização tem, pelo menos, duas significações: por um lado, ele
designa um ato organizador que é exercido nas instituições; por outro lado,
ele se refere a realidades sociais: uma fábrica, um banco, um sindicato, são
organizações (a sociologia, por volta de 1900, dizia: instituições) (1989, p.
101).

O autor acrescenta que se trata de uma:

a) [...] coletividade instituída com vistas a objetivos definidos, tais como a


educação, a formação dos homens, a produção e a distribuição dos bens,
etc. Nesse sentido, dir-se-á: organizações sociais. Algumas vezes,
55

estabelecem-se equivalências com estabelecimento e instituição. A


organização é aqui um ‘conjunto formado por partes que cooperam [...];
b) [...] ação de organizar [...] (LAPASSADE, 1989, p. 296).

Para Friedberg (1993), organizações são definidas a partir de: conjuntos


humanos formalizados e hierarquizados com vistas a assegurar a cooperação e a
coordenação de seus membros no cumprimento de determinados fins.
Quanto à classificação das organizações, Champion (1979, p. 3) refere que
“a organização formal é um arranjo predeterminado de indivíduos cujas tarefas
inter-relacionadas e especializações permitem que o agregado total atinja metas”,
destacando que “A interação social é o alvo principal da indagação sociológica”.
As organizações informais, por sua vez, são uma resposta dos indivíduos e
dos grupos à pressão do ambiente. A recusa em deixar que as minorias possam se
expressar, acarreta a formação de relações semiclandestinas (oposicionistas),
conforme esclarece Lapassade (1989, p. 296).

3.2 A DINÂMICA DAS ORGANIZAÇÕES

Quando as organizações passaram a ser objeto de pesquisas autônomas, isto


é, um ramo específico do saber e da prática, nasceu a Sociologia das Organizações.

Descobre-se que existe uma dinâmica das organizações, assim como existe
uma dinâmica dos grupos. O que implica, por hipótese, que existem traços
comuns, ao nível das estruturas e do funcionamento, entre conjuntos
aparentemente tão diferentes (LAPASSADE, 1989, p. 101-102).

Para Azevedo e Rojo (2005), Max Weber foi, dentre os fundadores da


Sociologia, quem mais prestou atenção ao Direito. A ele devemos os primeiros
elementos de uma teoria da Sociologia Jurídica.
Lapassade (1989) e Bernoux (s/d) destacam que Crozier e Friedberg foram os
primeiros a propor o estudo da organização como fenômeno autônomo, isto é, que
obedece às suas próprias regras de funcionamento e não determinado por
constrangimentos externos. Para Friedberg e Crozier o conjunto das teorias que
atribui demasiada racionalidade aos membros da organização é refutado, sendo
56

incorreto afirmar que os detentores de um papel se conformam a um modelo perfeito


de racionalidade.
Etzioni salienta que:

[...] O problema das organizações modernas é a maneira de reunir


agrupamentos humanos que sejam tão racionais quanto possível e, ao
mesmo tempo, produzir um mínimo de conseqüências secundárias
indesejáveis e um máximo de satisfação (1972, p. 9).

A partir de então, discute-se uma nova lógica nas organizações em que a


capacidade de inovar torna-se mais importante do que a capacidade de racionalizar.
Essa qualidade não depende somente de inovações tecnológicas, mas, também, e
principalmente, da capacidade de mobilização dos atores das organizações, no
sentido de cooperar de forma eficaz.
Entre as diversas formas de análise para a compreensão do fenômeno
organizacional, Bernoux (s/d, p. 117) refere que a opção da análise estratégica
aparece como a mais pertinente, salientando que o trabalho a ser desenvolvido pode
ser formalizado ou não, mas alerta que: “[...] deve ser repartido entre os indivíduos
duma maneira suficientemente clara para que um não tropece no outro [...]”.
A divisão de tarefas pressupõe precisão e duração; enquanto que a
distribuição de papéis caracteriza a autonomia dos membros da organização, que
podem “[...] comportar-se interpretando de maneira forçosamente diferente uma
função idêntica [...]” (BERNOUX, s/d, p. 118).
Max Weber “é considerado pela crítica como o fundador da Sociologia das
Organizações. Atualmente, a análise da organização se inspira nos conceitos
weberianos de burocracia e de formas de dominação” (DELORENZO NETO, 1975,
p. 42).
A Sociedade moderna, para Weber, caracterizava-se, cada vez mais, pela
racionalização. Nesse contexto, a burocracia era o meio de organizar eficientemente
um grande número de pessoas. Porém, na vida real, o modelo ideal-típico não
existe, apenas algumas de suas características (LAPASSADE, 1989).
As principais características do modelo ideal-típico de organização de Weber
foram destacadas por Delorenzo Neto (1975), nos seguintes termos:
57

26
O tipo mais puro de exercício da autoridade legal é aquele que emprega
um quadro administrativo burocrático com funcionários nomeados e atuando
conforme os seguintes critérios: a) São individualmente livres e sujeitos à
autoridade apenas no que diz respeito a suas obrigações oficiais; b) Estão
organizados numa hierarquia de cargos previamente definidos; c) Cada
cargo possui uma esfera de competência, claramente determinada; d) O
cargo é preenchido mediante uma livre relação contratual, o que possibilita
a seleção; e) Os candidatos são selecionados com base em qualificações
técnicas; f) São remunerados com salários fixos em dinheiro; g) O cargo é
considerado como a única ou, pelo menos, principal ocupação do
funcionário; h) O cargo estabelece os fundamentos de uma carreira. Existe
um sistema de “promoção” baseado na antiguidade, merecimento ou em
ambos; i) O funcionário trabalha inteiramente desligado da propriedade dos
meios da administração e não se apropria do cargo e, j) Está sujeito a uma
rigorosa disciplina e controle no desempenho do cargo.

As conseqüências principais da dominação burocrática são: a) Tendência ao


nivelamento, isto é, base de recrutamento ampla em termos de qualificação pessoal;
b) Tendência à plutocratização no interesse de uma formação profissional, a mais
longa possível e, c) A predominância de um espírito impessoal e formalista.
A efetividade da autoridade legal descansa na aceitação da validez das
seguintes idéias interdependentes: a) Que toda norma legal dada possa ser
estabelecida por acordo ou imposição, visando fins utilitários ou valores racionais –
ou ambos; b) Que todo direito consiste, essencialmente, num sistema integrado de
normas abstratas. A administração da lei consiste na aplicação dessas normas aos
casos particulares; c) A pessoa que representa a autoridade ocupa um “cargo” e
está subordinada a uma ordem impessoal que orienta suas ações nas atividades
específicas e, d) A pessoa que obedece a autoridade o faz apenas na qualidade de
“membro da associação”. O que é obedecido é a “lei”.
Como categorias fundamentais da autoridade legal, têm-se: a) Uma
organização contínua de cargos, delimitados por normas; b) Uma área específica de
competência; c) Uma organização dos cargos que obedece o princípio da hierarquia;
d) No tipo racional, os membros do quadro administrativo devem estar
completamente separados da propriedade, dos meios de produção e da
administração; e) Uma completa ausência de apreciação do cargo pelo ocupante e,
f) Atos administrativos, decisões e normas formulados e registrados em documentos,
mesmo nos casos em que a discussão oral é a regra.
Já Merton (1970) buscando demonstrar que o “tipo ideal” de Weber incluía
parte considerável de ineficácia, destacou a “disfunção” no nível dos aprendizados

26
Autoridade significa a probabilidade de que um comando ou ordem específica seja obedecido
58

entre os membros da organização burocrática. Longe de serem eficazes, as


organizações burocráticas tinham um funcionamento pesado e rígido. As
especializações das funções criadas com o propósito de aumentar a eficácia traziam
conseqüências disfuncionais, constituindo círculos viciosos de burocracia e
ineficácia conforme Friedberg (1993).
Etzioni destaca que para Merton:

O conhecimento especializado do burocrata representa, na verdade,


‘incapacidade treinada’, quando se processa modificação na situação: a
disciplina conduz ao devotamento aos meios e não aos fins; o tratamento
impessoal dos clientes e dos casos cabe a pessoas que interatuam e que,
assim, desenvolvem relações ou vínculos primários. Estas relações, por sua
vez, poderão ter efeitos disfuncionais. Segue-se, portanto, que a análise
das organizações resultará muito deficiente se não abranger o estudo dos
participantes como pessoas, limitando-se a tratá-los como elementos que
desempenham papéis dentro da organização (1972, p. 16).

Refere Lapassade (1989, p. 144): “[...] Pode-se pensar, com M. Crozier que,
em Merton, a disfunção aparece como resistência do fator humano a um
comportamento que se procura obter de forma mecânica [...]”.
Assim, para Merton, a rigidez transforma a adaptação da pessoa. Seu
pensamento é explicado por Crozier:

[...] a disciplina necessária para obter, dentro do conjunto burocrático, o


comportamento estandardizado que se deseja, supõe o desenvolvimento de
uma atitude ritualista dos funcionários [...] cuja rigidez resultante lhe torna
difícil responder às exigências particulares da sua tarefa e que,
paralelamente, essa rigidez desenvolve o espírito de casta, abrindo assim
um fosso entre o funcionário e seu público (1981, p. 262-263).

Quanto à burocracia, Crozier27 (apud LAPASSADE, 1989) observa que:

a) As regras impessoais, ao mesmo tempo em que protegem contra o


arbítrio e o favoritismo, também isolam, pois tendem a eliminar o caráter
pessoal das relações profissionais; b) A centralização das decisões evita os
riscos da iniciativa pessoal (participação sem responsabilidade), porém,
causam rigidez nas instituições. Dessa forma, os que decidem estão longe
dos problemas cotidianos e concretos da organização e, c) O isolamento de
cada categoria hierárquica impede o desenvolvimento de redes informais e
de um espírito de clã.

No dizer de Crozier:

(ETZIONI, 1972, p. 17).


59

[...] Uma organização desse tipo acaba sendo composta de uma série de
estratos sobrepostos, comunicando-se muito pouco entre si, e as barreiras
entre eles serão tais que deixarão muito pouco espaço para o possível
desenvolvimento de grupos ou de clãs que possam reunir membros de
vários estratos (1981, p. 278).

Dá-se o surgimento da pressão do grupo, constituído pelo conjunto dos


membros do estrato, sobre o indivíduo que a ele pertence para conformá-lo à moral
do grupo e provocar sua adesão a seus próprios objetivos. Dessa forma, ocorre um
deslocamento de objetivos, pois, no modelo burocrático, o objetivo original da
organização não é a própria sobrevivência, mas a tarefa para cujo cumprimento ela
foi criada.
Sainsaulieu (2006, p. 141) destaca que Crozier diagnostica a realidade das
disfunções denominando-a de “círculos viciosos burocráticos, que acabam se
reforçando mutuamente e impondo uma segunda natureza às relações humanas” e,
d) Desenvolvem-se relações de poder paralelas (informais), em razão da
permanência de zonas de incerteza: “[...] o peso da ordem oficial faz aparecer a
ordem informal como ordem de oposição e de defesa” (LAPASSADE, 1989, p. 153).
Sainsaulieu ressalta:

A hipótese geral dos sociólogos da organização é que a disfunção


burocrática é o resultado de uma libertação relativa dos atores afrontados a
um conjunto de coações de que se servem para realizar um certo número e
ajustamentos (2006, p. 142).

Complementa:

Esta análise das disfunções enriquece a compreensão do conjunto humano


de trabalho revelando circuitos de relações e de reações previsíveis. Então
a intervenção do sociólogo consistirá em tornar os membros do sistema
social mais conscientes da realidade humana e de suas relações
(SAINSAULIEU, 2006, p. 144-145).

Conforme refere Sainsaulieu (2006) Friedberg e Crozier propuseram analisar


a organização como uma rede de relações de poder, onde os indivíduos e os grupos
negociam a permuta de comportamentos conforme seus objetivos. Dessa forma
todos os participantes dispõem de uma certa capacidade de negociação, mas

27
Lapassade (1989, p. 151) ilustra que essas regras burocráticas são particularmente visíveis na
função pública e nas empresas do Estado, que constituem, aliás, o tema de pesquisa de Crozier.
60

alguns, porque capazes de controlar incertezas, são capazes de estruturar as


negociações a seu favor.
Sob esse viés, impõe-se aceitar uma visão menos intencional da ação
humana (racionalidade limitada), pois Friedberg explica que:

[...] a abordagem organizacional da ação social aposta no conhecimento, ao


mesmo tempo que induz uma relação muito diferente entre este e a prática.
Não procura desenvolver enunciados teóricos gerais e transferíveis de um
contexto a outro, para seguidamente os impor a uma prática. Serve-se dos
conhecimentos que produz num contexto de ação determinado para induzir
a aprendizagem de um raciocínio junto dos atores respectivos, de modo a
modificar a prazo os seus comportamentos. Em troca, ela serve-se da
observação dos efeitos dessas práticas modificadas para endurecer e
aprofundar os conhecimentos que produz nesse contexto e para avançar
deste modo na compreensão das características estruturais do mesmo
(1993, p. 23).

[...] esta não se resume aos objetivos que um indivíduo adota ou julga
perseguir. Deixa também espaço a coincidências, ao acaso e à descoberta.
Sem esquecer que outros mecanismos podem igualmente explicar as
escolhas humanas: estas podem ser também fruto da tradição (“faço isso
porque isso sempre foi feito assim!”), da fé ou da norma (“faço isso porque
isso se faz assim, e ponto final!”), ou da intuição (“faço isso porque sinto que
deve ser feito assim!”) (1993, p. 51).

Um dos problemas comuns das organizações, enquanto estrutura de ação


coletiva, é a organização dos comportamentos de um certo número de atores cuja
cooperação é indispensável. Atores, esses, que mantêm graus de autonomia e que
nem sempre perseguem os mesmos interesses. Assim, partindo do pressuposto
diferenciado de Weber (quanto à racionalidade como modelo ideal), Friedberg (1993
apud BERNOUX, s/d) destaca ser ilusório considerar o comportamento humano
sempre refletido. Nesse contexto, as organizações não são um todo unificado e
coerente. Trata-se de um conjunto onde se confrontam diversas racionalidades,
assim, nada mais é do que uma arena de conflitos, onde se canalizam diferentes
interesses.
A integração desse conjunto é precária. Precária porque ameaçada pelas
estratégias de poder dos participantes, na medida em que as capacidades de
negociação com os outros está ligada à incerteza de seu comportamento. Nessa
realidade, Friedberg (1993) propõe que as organizações sejam vistas como uma
rede de relações de poder e dependência, através das quais os indivíduos
negociam, permutam comportamentos para levar a cabo suas tarefas, defendendo
61

seus interesses. O poder de cada um se dá em função da incerteza que é capaz de


controlar e dominar seus parceiros.
Friedberg (1993) ressalta que o estudo da organização também pode ser
voltado para um sistema mais vasto, abrindo-se um novo campo à reflexão
organizacional: o campo das dinâmicas e redes organizacionais:
A partir das perspectivas de Friedberg e Crozier, têm-se vários postulados:

a) Os homens nunca aceitam ser tratados como meios a serviço de fins que
as organizadores fixam para a organização. Cada um tem seus objetivos
próprios (que não precisam ser, necessariamente, opostos aos da
organização). Os organizadores não são dotados de uma racionalidade sem
falhas, e a organização vive com esta multiplicidade mais ou menos
antagônica; b) Por menores que sejam, sempre há uma relativa liberdade e
autonomia dos atores.

Conforme Friedberg, os atores:

São dotados daquilo a que Michel Crozier (1990) chamou de ‘instinto


estratégico’, o que significa que as suas condutas não têm que ver
exclusivamente com a sua socialização passada, mas também com a
percepção que têm das oportunidades e dos constrangimentos do seu
contexto de ação. [...]. Nesta perspectiva, os comportamentos dos atores
fazem sempre referência a duas dimensões, a dois planos. Por um lado,
remetem para a história pessoal da pessoa, para os processos de
aprendizagem que ela atravessou na sua família, na escola ou ao longo da
sua vida profissional e nos quais pôde adquirir capacidades cognitivas [...].
Por outro lado, têm a ver com os constrangimentos e oportunidades da
situação presente que provêm da participação da pessoa em jogos
estruturados e na estrutura da interdependência subjacente. Esta obriga os
atores, se querem ganhar, a cortarem eventualmente com os seus
princípios, a infringir tal ou tal regra, em resumo, a diversificar, redefinir,
enriquecer e modificar os critérios de satisfação, ou seja de racionalidade,
que o seu passado lhes legou (1993, p. 217).

c) Os atores comprometem suas autonomias em zonas mal regulamentadas


da organização, combinando-as com jogos de poder. O poder central tenta controlar
a autonomia dos atores que procuram escapar do controle e, d) Nesses jogos de
poder, a estratégia é sempre racional, mas de uma racionalidade limitada (em razão
das estratégias dos outros e dos múltiplos constrangimentos do meio). O ator,
geralmente, utiliza-se da solução menos insatisfatória naquele momento. Assim,
face à situação diversa, há muitas soluções possíveis. Nas negociações, é
importante explorar todas as soluções e sopesar suas conseqüências. Nesse
contexto, valoriza-se a figura do decisor.
62

A análise da estratégia de poder, a partir das teorias de Crozier e Friedberg, é


composta por três elementos: Sistema concreto de ação, Zona de incerteza e Poder.

A) SISTEMA CONCRETO DE AÇÃO


Define-se a organização como “um conjunto humano estruturado”. Nele, cada
membro desenvolve suas estratégias particulares, que são estruturadas num
conjunto de relações submetidas a constrangimentos do meio. Os membros estão
sempre em constante movimento (mudança de pessoal, objetivos, etc.). Há,
portanto, a necessidade de ajustes permanentes, que são realizados pelos membros
que procuram reconstruir o conjunto posto em movimento, e esses “ajustes” são
construídos. O sistema concreto de ação refere-se ao conjunto desses ajustamentos
permanentes (BERNOUX, s/d).
Observa-se, assim, que o sistema das alianças é necessário porque a
empresa confronta-se com um número muito grande de incertezas e as soluções
nunca são evidentes (BERNOUX, s/d, p. 144).
Ressalte-se que não são jogos gratuitos: são constrangimentos impostos pela
organização e que constituem passagem obrigatória das relações de poder, logo, do
sistema concreto de ação.

B) ZONA DE INCERTEZA
Conforme Bernoux (s/d, p. 145), a zona de incerteza é um dos elementos que
deve se integrado pelos atores nas estratégicas da organização. Afinal, qualquer
organização está sujeita a múltiplas incertezas (exs. pela mudança das técnicas de
produção ou de comunicação, evolução dos mercados, etc.). A partir desses
constrangimentos, os atores reforçam ou diminuem suas autonomias, e daí o poder.
O peso da incerteza recai sobre a autonomia do ator e a possibilidade deste fazer
escolhas. Qualquer organização, mesmo aquelas com funções definidas
precisamente, tem conhecimento que todo o esquema funciona em razão desses
ajustamentos.
O recurso do poder é essa margem de liberdade dos indivíduos ou dos
grupos, uns face aos outros (negociar, recusar, procurar obter algo, etc.). Essa
possibilidade existe na medida em que o indivíduo consegue preservar uma zona
em que o outro não domine, onde o primeiro pode tornar seu comportamento
imprevisível (elemento indispensável).
63

C) O PODER
Enfim, Friedberg destaca:
Se quisermos compreender o funcionamento e uma organização a partir
não de um modelo funcionalista a priori, mas dos comportamentos
efetivamente observados dos seus membros, somos levados a alterar as
prioridades. Em vez de partir de um conjunto de papéis definidos a priori
como necessários ao bom funcionamento do conjunto e interiorizados pelos
atores, tentaremos reconstruir as relações de poder e de negociação entre
os indivíduos e os grupos através das quais esses papéis são ou não
traduzidos em comportamentos efetivos, e a articulação dessas relações
umas com as outras em jogos regulados (1993, p. 230-231).

Friedberg (1993, p. 119-120) define o poder: “[...] como a capacidade de um


ator estruturar processos de troca mais ou menos duráveis a seu favor, explorando
os constrangimentos e oportunidades da situação para impor os termos da troca
favoráveis aos seus interesses”.
Por certo que dentro das organizações indivíduos e grupos, diferentes pela
suas formações e funções, têm objetivos que nem sempre coincidem. As diferentes
visões sobre os meios necessários para assegurar o funcionamento do conjunto
vêm acompanhadas de estratégias nem sempre concordantes. Há um conflito de
poder que necessita de um poder regulador para o referido conflito.
Nesse domínio, o poder é “a capacidade de certos indivíduos ou grupos de
agir sobre outros indivíduos ou grupos” (BERNOUX, s/d, p. 152).
Portanto, o poder apresenta-se como uma relação e não como um atributo.
Essa noção traz a característica de reciprocidade que “inclui a idéia duma pressão
possível daquele que recebe uma ordem sobre aquele que a dá” (BERNOUX, s/d, p.
153).
Observa-se que, quanto maior for a importância da execução da ordem para o
superior, maior é a possibilidade do inferior em obter vantagens. Porém, só pode
fazê-lo até certa medida, já que a relação de poder continua uma relação
desequilibrada. E, nesse contexto, o superior, antes de dar a ordem, assegura-se de
que ela será cumprida, sob pena de arriscar uma má execução da mesma. Assim, a
posição hierárquica não basta, deve o superior utilizar-se de estratégias suficientes
para conseguir o que quer (BERNOUX, s/d, p. 155).
O poder possui dois recursos essenciais: constrangimento e legitimidade.
Estrategicamente, aquele que dá a ordem e usa a força para obter a obediência, fá-
lo-á mediante constrangimento físico, material, administrativo, etc., passando por
64

toda gama de sanções previstas ou imagináveis. Falar em “relação de forças”


caracteriza uma situação de antagonismo.
Friedberg e Crozier (1977) enumeraram quatro fontes do Poder (apud
BERNOUX, s/d, p. 157-160): a) Oriundo da especialização funcional. Nesse caso, a
posição do especialista na negociação é melhor, pois o bom andamento da atividade
depende de sua intervenção28 ; b) Domínio das relações com o meio: utilização de
seus conhecimentos nos dois lados, “um ator utiliza, numa organização, as relações
que tem com outra organização para fins perfeitamente estratégicos” (BERNOUX,
s/d, p. 159); c) A comunicação: uma boa rede de comunicação. Uma decisão pode
falhar somente em razão de informações insuficientes ou mal transmitidas. A
comunicação de informações possui um grande valor estratégico e, d) Utilização das
regras organizacionais: domínio das regras e conhecimento sobre a forma de utilizá-
las.
Todas as quatro fontes de poder remetem para o domínio de uma zona de
incerteza. Para analisar estrategicamente uma organização e verificar o seu real
funcionamento, deve-se apoiar na análise do poder e das zonas de incerteza,
construindo os sistemas e subsistemas concretos de ações.
A partir dessa abordagem, a organização, que inicialmente era encarada
como um todo unificado e coerente, estruturada para fins preestabelecidos,
integrada e racional, no final:

[...] não é mais do que uma arena política ou um mercado no qual se trocam
comportamentos e se perseguem estratégias de poder específicas e cujas
características (fins, estruturas, regras de jogo, “cultura”) são, por sua vez, o
mero produto dessas permutas e desses confrontos (FRIEDBERG, 1995, p.
58).

No dizer de Berger e Luckmann:

A realidade da vida cotidiana é partilhada com outros (p. 46). [...] A


realidade da vida cotidiana é, portanto apreendida num contínuo de
tipificações, que se vão tornando progressivamente anônimas à medida que
se distanciam do ‘aqui e agora’ da situação face a face (2005, p. 52).

28
Especialistas, muitas vezes, são competentes nos seus domínios particulares, mas incapazes de
compreender as repercussões da sua especialidade sobre o conjunto. A especialidade confere poder
se estiver ligada a uma situação de reconhecimento na organização e se houver adesão do grupo às
conclusões do especialista.
65

No mesmo sentido:

O universo complexo das relações humanas e da interação social é sempre


potencialmente instável e conflitual. A dimensão organizacional desse
universo não é mais que o conjunto dos mecanismos empíricos pelos
quais ele é estabilizado e que permitem construir a cooperação e a
coordenação indispensáveis entre as iniciativas, as ações e as condutas
dos diferentes participantes. A maneira como se opera e se obtém esta
cooperação não é idêntica de uma organização para outra, de um contexto
de acção para outro. Mas a construção dessa cooperação constitui o
problema central e fundamental a resolver por toda a organização [...]
(FRIEDBERG, 1993, p. 10).

Importante não esquecer o alerta de Etzioni:

Encontrar equilíbrio entre os elementos racionais e não racionais do


comportamento humano constitui um ponto principal da vida, da sociedade
e do pensamento modernos. Constitui também o problema central da teoria
organizacional [...]. A questão básica é saber a melhor forma de coordenar
as atividades humanas, a fim de compor uma unidade altamente racional e,
ao mesmo tempo, manter a integração social, as responsabilidades
normativas dos participantes e sua motivação para participação (1972, p.
15).

A imprescindibilidade da adaptação e da mudança das organizações é


destacada por Crozier ao referir que:

[...] nenhuma organização moderna pode escapar à necessidade da


mudança; todas elas são constantemente obrigadas a adaptar-se, tanto às
transformações do seu ambiente quanto às transformações, menos
evidentes, porém igualmente profundas do seu pessoal, e não poderão
sobreviver se não forem suficientemente flexíveis e capazes de adaptação
(1981, p. 271).

Porém, Sainsaulieu (2006, p. 169) alerta que introduzir mudanças


organizacionais sem prever os efeitos sobre a estrutura das relações de poder,
conduz a resistências e reações inesperadas do sistema.
Crozier e Friedberg (apud BERNOUX, s/d) reconhecem que a mudança –
base da inovação – não é um processo natural. Na verdade, a mudança constitui-se
um problema para as organizações, exatamente por seu caráter coletivo. Para eles,
a aprendizagem só pode ser compreendida como um processo de criação coletiva,
por meio do qual os membros de uma dada coletividade – mediante ensaio e erro –
inventam e fixam novas formas de jogar o jogo social da cooperação e do conflito.
66

Trata-se, pois, de um processo de aprendizagem que não pode ser individual, e é


esse o ponto que leva à sua dificuldade.
Segundo Crozier (1981) a mudança nas organizações é uma questão
sociológica, pois, são as pessoas que mudam dentro e com uma coletividade. Ele
ressalta que:
O estudo das formas de distribuição do poder e a análise da estratégia
utilizada pelos indivíduos e os grupos em suas negociações, constituem um
ponto de partida completamente fora do habitual, para compreender o
funcionamento de uma organização. Nós os temos utilizado por causa de
sua virtude de contestação e de renovação, em uma área freqüentemente
paralisada pelo formalismo, e a distinção a que temos chegado entre as
organizações caracterizadas por um sistema de relações de poder quase
estacionário, e as características por um sistema de relações de poder
dinâmico, nos oferece, do ponto de vista da teoria das organizações, uma
perspectiva extraordinariamente útil (CROZIER, 1981, p. 257).

Lapassade acrescenta que para Crozier:

[...] toda ação cooperativa coordenada exige que cada participante possa
contar com um grau suficiente de regularidade de parte dos outros
participantes [...] toda organização, qualquer que seja a sua estrutura,
quaisquer que sejam os seus objetivos e a sua importância, requer de seus
membros uma quantidade variável mas sempre importante de conformidade
(1989, p. 149).

Finaliza Crozier (1989, p. 124): “Toda a transformação importante das práticas


muda o sistema de prestígio e de poder no seio de uma organização. Cria então
tensões que podem ser consideráveis e tendem a paralisar a ação”.
Como enfrentar essa situação?

[...] mobilizar as capacidades individuais e coletivas existentes para atingir


alvos e desenvolver essas capacidades para propor outros fins. Para gerir
redes cada vez mais complexas, para assegurar a precisão dos
ajustamentos entre profissionais e técnicos [...] para manter uma
capacidade de inovação suficiente é necessário criar novas formas de
organização (CROZIER, 1989, p. 35).

A viabilidade da aceitação mais acessível de mudanças dar-se-á quanto mais


se puder provar a eficácia das mesmas para a organização29.

29
Mahoney e Weitzel (1969, p. 358) citados por Champion (1979, p. 89-90) salientam a importância
da eficiência das organizações. Suas dimensões são: flexibilidade: disposição em experimentar
novas idéias e sugestões e presteza para enfrentar problemas não habituais; desenvolvimento:
pessoas participam de treinamentos; coesão: falta de queixas e agravos; supervisão democrática:
participação subordinada em decisões de trabalho; confiabilidade: alcança o objetivo sem a
necessidade de verificação; seletividade: não aceita empregados rejeitados por outras organizações;
diversidade: ampla faixa de responsabilidade do cargo e capacidade do pessoal na organização;
67

Sainsaulieu (2006) buscou ampliar a concepção de Crozier acerca da


Sociologia das Organizações (que via seus atores apenas compondo estratégias e
relações de poder) e introduziu a subjetividade, a cultura e a identidade.
“O imperativo cultural primordial de uma cultura do desenvolvimento é,
portanto, a criatividade institucional, a capacidade de imaginar verdadeiramente
outras regras, outras estruturas, outras funções” (SAINSAULIEU, 2006, p. 432).

Todas as forças de mudanças – forças sindicais, grupos-projetos, oficinas,


comissões de estudos, grupos de pilotagem de uma experimentação –
demonstraram que a mudança em profundidade de um sistema social não
pode realizar-se sem uma estrutura particular cujo objetivo é precisamente
por em movimento o sistema social em torno de uma mobilização
excepcional de atores reunidos pela intervenção, pela conduta e pela
avaliação das mudanças de relações sociais que acompanham, ou
justificam, uma mudança de organização e de política gestionária
(SAINSAULIEU, 2006, p. 433-434).

Conclui:

[...] É constituindo grupos, escolhidos ou voluntários, mas dando uma


representação sociológica de diversas categorias profissionais e
hierárquicas ou culturais do pessoal concernido pela mudança e que terão
papel de guias e de testemunhas de um processo transformador sobre as
estruturas, interações e cultura, que se pode impulsionar e fazer viver um
verdadeiro sistema de ação. Compostos de diversos testemunhos da
situação concreta, estas Task Forces podem também compreender
especialistas de ciência social, formadores e conselhos externos,
sindicalistas. Animadas segundo os casos por um operacional da empresa,
um funcional, um experto externo ou por uma comissão dos três, essas
forças distinguem-se de um grupo-projeto centrado numa tarefa e na
resolução de problema, no sentido de que constituem sobretudo estruturas
de sensibilização prévia, de facilitação para diversos dispositivos de ação,
de negociação e de avaliação e de ter seguido o programa de
desenvolvimento social (SAINSAULIEU, 2006, p. 434).

Em que pese a necessidade e a importância de mudanças na organização,


para seu aperfeiçoamento, a tendência para o surgimento de resistência a elas e
conseqüente conflito é enorme. Impõe-se analisar o conflito e a resistência a

barganha: raramente barganha por favores; ênfase nos resultados: produção e desempenho
enfatizados e não os procedimentos; preenchimento de quadros: flexibilidade do pessoal entre as
missões; coordenação: coordena e faz o roteiro das atividades; descentralização: trabalho e
decisões quanto a procedimentos delegados a níveis mais baixos; entendimento: política entendida
pela organização e aceita por todos; conflito: pouco com outras unidades sobre autoridade;
planejamento de pessoal: desempenho não é perturbado por ausência de pessoal; suporte
supervisor: supervisor dá o suporte ao subordinado; planejamento: operações planejadas para
evitar perda de tempo; cooperação: operações escaladas e coordenadas com outras;
produtividade-suporte-utilização: desempenho, eficiência, suporte mútuo, respeito de seu
68

mudanças para melhor compreensão das dificuldades para a formação da Força-


Tarefa.
Champion (1979, p. 93) refere-se à tensão dentro do sistema organizacional.
Pode-se observar tal tensão, prestando-se atenção às possíveis incompatibilidades
entre departamentos, entre os membros da assessoria ou dos empregados, às
complexidades na rede de comunicação e até mesmo na própria estrutura
organizacional.
O autor (1979) cita dois tipos de conflitos: interorganizacional e intra-
organizacional. O primeiro é entre organizações e o segundo entre departamentos
do sistema. As organizações que se acham amarradas em departamentalizações e
rotinas são candidatas difíceis à mudança (p. 94). Referindo-se a Deutscher, o autor
esclarece que, após uma investigação sobre o modo como alcançaram o consenso
em algumas questões, Deutscher concluiu que o pequeno tamanho de grupo, as
reuniões freqüentes e as metas claramente definidas eram instrumentais na
formação de coesão de grupo. Importante, também, a especificidade no
desempenho do papel; quanto mais claramente for definido o papel, tanto menor o
desvio que se espera de seu desempenho (p. 111).
Ressalta ainda que:

[...] sem comunicação não pode haver organização e daí nenhuma atividade
de grupo, porque a comunicação é o único processo pelo qual as pessoas
se vinculam em conjunto em um grupo de trabalho, se não houver
comunicação não haverá grupo. Comunicação é a ponte sobre a qual todo o
conhecimento técnico e relacionamentos humanos tem de viajar
(CHAMPION, 1979, p. 163-164).

Santana e Teixeira (1994, p. 40) destacam que o grande desafio é administrar


relações interorganizacionais, tornando-se uma questão de grande significado
teórico e administrativo e citam Benson (1973) ao referir estruturas básicas para o
equilíbrio de uma rede:

[...] as mudanças são obtidas através de acordos e planejamento conjuntos


nos quais cada unidade social afetada participa e exercita opções.
Alterações na rede oriundas deste processo são tipicamente compromissos
firmados pela organizações afetadas. Tais compromissos geralmente
envolvem um processo de negociação e intercâmbio, através dos quais
cada parte, voluntariamente, desiste de algumas condições, em troca de

supervisor e subordinado, utilização de perícias e capacidade do pessoal; comunicação: fluxo livre


de informação e controle supervisor.
69

concessões similares feitas pelos demais (SANTANA e TEXEIRA, 1994, p.


47).

Assim, a rede estará equilibrada no momento em que todas as organizações


estejam desenvolvendo interações altamente coordenadas e cooperativas, baseada
em consenso normativo e respeito mútuo.
Schein acredita que:

[...] somente se as organizações, os profissionais e outras instituições


conjugarem esforços para melhorar o processo de integração ao longo das
carreiras, é que haverá uma chance de maximizar o desempenho
organizacional e a satisfação individual. Esse é o desafio para o futuro
(1996a, p. 67).

A visão da mudança deve incluir perspectivas pessoais, como planos de


melhorias, antecipação de benefícios e novas responsabilidades, bem como mostrar
os benefícios da nova forma de trabalho para a empresa. Essa abordagem deve ser
realizada com firmeza e planejamento, demonstrando conhecimento no assunto, o
que aumenta o comprometimento e reduz a resistência. O plano de comunicação é
imprescindível nessa ação. Explicar com clareza e riqueza de detalhes facilita o
entendimento, assim como mostrar os cenários previstos para a mudança e para a
não mudança.
Schein sustenta que:

[...] devemos ser eternos aprendizes [...]. Se não conseguirmos lidar com o
elemento ‘surpresa’ e desenvolver novas maneiras de abordar problemas e
novas respostas, fracassaremos. Por fim, maior ênfase é dada a processos
dinâmicos, ao fato de aprender a conviver com mudanças contínuas e a
desenvolver a habilidade de diagnosticar, que nos permita ver o que é
necessário (1996b, p. 79).

Nessa realidade, a “cultura organizacional” torna-se referência indispensável.


A importância da cultura no contexto das organizações fez com cientistas
sociais voltassem suas atenções para a influência da cultura no comportamento dos
indivíduos30 e nas relações de poder nas organizações.
Laraia (2004, p. 25) lembra que Tylor foi um dos primeiros a conceituar cultura
como “todo este complexo que inclui conhecimentos, crenças, arte, moral, leis,

30
Nesse sentido: Schein, Motta, Freyre e Freitas.
70

costumes ou qualquer outra capacidade ou hábitos adquiridos pelo homem como


membro de uma sociedade”.
A ampliação desse conceito deu-se com a contribuição de Kroeber que
sustentava ser a cultura que determina o comportamento do homem, pois ele age
conforme seus padrões culturais. É o meio de adaptação aos diferentes ambientes
ecológicos. Aquirindo cultura, o homem passa a depender mais do aprendizado
(socialização) que determina seu comportamento, sendo que se trata de um
processo acumulativo, resultante de experiências históricas das gerações anteriores
(LARAIA, 2004).
Quanto à cultura organizacional, Freitas conceitua:

[...] primeiro como instrumento de poder; segundo, como conjunto de


representações imaginárias sociais que se constroem e reconstroem nas
relações cotidianas dentro da organização e que se expressam em termos
de valores, normas, significados e interpretações, visando um sentido de
direção e unidade, tornando a organização fonte de identidade e de
reconhecimento para seus membros (2000, p. 97).

Licks et al. (2001, p. 78) resume a importância do estudo da cultura


organizacional ao ressaltar que: “A compreensão da cultura organizacional passa
pelo conhecimento do processo de socialização dos indivíduos, que é uma das
estratégias de transmissão e fortalecimento dos aspectos simbólicos que estruturam
a dinâmica organizacional”.
Conforme Consul:

Como um fenômeno social, a cultura tem despertado o interesse de


pesquisadores, antropólogos, psicólogos, sociólogos, assistentes sociais e,
em específico, alguns teóricos que estão envolvidos com reflexões da
chamada teoria das organizações. As literaturas especializadas apontam as
mais diferentes perspectivas de análise desta questão, até porque os
diferentes enfoques são próprios do exercício da construção do
conhecimento, o que pressupõe a relativização de conceitos e até mesmo
de posturas teórico-metodológicas bastante distintas e muitas vezes
antagônicas (2005, p. 149).

Um dos conceitos mais difundidos na literatura é de Schein (1995) que, de


maneira simples, conceitua a cultura organizacional como o conjunto dos
pressupostos básicos que o grupo desenvolveu, ao lidar com os problemas de
adaptação e integração, e que funcionaram.
71

Por certo que a cultura de uma organização não muda de forma abrupta, pois
é produto de várias gerações que sedimentam valores, sentimentos e emoções,
conforme destaca Licks et al. (2001, p. 850).
Reportando-se à Berger e Berger (1977), Licks et al. (2001) destacam que a
socialização primária é a fase do processo na qual o indivíduo aprende a ser
membro de uma sociedade; a secundária compreende os processos posteriores, por
meio dos quais o indivíduo é introduzido num mundo social específico.
A noção de socialização secundária é fundamental para a análise do
processo de integração dos indivíduos e organizações (FLEURY, 2002).
Conforme Motta:

Uma cultura organizacional forte pode ser uma excelente ‘faca de dois
gumes’, não apenas para a organização em si, mas também para os
indivíduos que nela estão. Quanto mais sedimentada, mais freio ela é para
incorporar processos de mudança. Quanto mais ela marca o orgulho de ser
‘este time’, menor é a possibilidade de se aprender com o exterior; quanto
mais fama ela acrescenta, maior a probabilidade de proporcionar um
narcisismo de tribo, excluindo o outro. Podemos dizer, então, que a cultura
organizacional é um instrumento de controle não só para os indivíduos, mas
para a própria organização, que pode fechar-se em seu próprio ‘umbigo’ e
viver de sua glória passada, reduzindo o mundo ao que é produzido entre
suas paredes (1997, p. 302).

Como salienta Licks:

A interação entre o indivíduo e uma organização é um processo dinâmico e


bidirecional, que depende de diversos fatores, incluindo, aí, a forma como
os indivíduos são aculturados ou socializados nos valores e normas da
organização, as relações de poder e as disposições institucionais
empregadas pela organização (2001, p. 85-86).

Além disso, dentro da própria cultura organizacional podem haver subculturas


onde as pessoas se organizam para refletir sobre problemas e experiências comuns.
A cultura, portanto, é importante porque define as características e funções de uma
organização e a diferencia de outras, além, de proporcionar um senso de identidade
aos seus membros.
A abordagem da Sociologia das Organizações demonstra, em especial, a
importância e a necessidade de se reunir indivíduos com objetivos, interesses e
cultura nem sempre convergentes, tornando-os capazes de suportar
constrangimentos em nome de um objetivo comum.
72

Afinal, “o coletivo não é em primeiro lugar uma relação de forças ou de


negociação [...] (SAINSAULIEU, 2006, p. 446 ).
Essa análise se torna fundamental quando se procura examinar os órgãos
que integram e operacionalizam o Sistema de Segurança Pública e Justiça Criminal,
pois compostos por pessoas que trabalham em conjunto, interagindo uns com os
outros.
73

4 DOS ÓRGÃOS QUE INTEGRAM O SISTEMA DE SEGURANÇA PÚBLICA E


JUSTIÇA CRIMINAL

Entre nós, a problemática das redes de relações interorganizacionais impõem-se como um dos
aspectos prioritários em qualquer esforço de racionalização administrativa. Há um emaranhado de
órgãos governamentais insuficientemente articulados entre si e nos processos em que intervêm, o
que gera um sub-aproveitamento de recursos e redução da eficácia global. Vários órgãos agem
sobre os mesmos problemas mas de maneira conflitante e desarticulada, facilitando sobreposições
ou lacunas de atuação. O próprio Estado não conhece bem a sua máquina, a ponto de ter dúvidas se
ela está inchada, atrofiada ou apenas esquizofrênica.
Santana e Teixeira

Busca-se, no presente capítulo, analisar os principais órgãos que integram o


Sistema de Segurança Pública e Justiça Criminal, considerando a abordagem da
Sociologia das Organizações. No exame das Polícias Civil e Militar e do Ministério
Público, levar-se-á em conta as diferentes culturas, características, bem como a
dificuldade de integração, o que explica, em parte, a frouxa articulação institucional.

4.1 DA SEGURAÇA PÚBLICA

Pesquisar sobre as Organizações Policiais e sobre o Ministério Público é


entrar no universo do que se convencionou denominar “Segurança Pública”. O
presente capítulo procura fazer uma análise do seu termo, buscando demonstrar
que seu conceito ultrapassa, em muito, o objetivo desta investigação. Porém, é
importante a referência sobre o tema para a melhor compreensão dos motivos da
crise dos órgãos da Segurança Pública e do Sistema de Justiça Criminal31.

31
Sapori (2006) considera “Sistema de Justiça Criminal” e “Segurança Pública” sinônimos e qualifica
o arranjo institucional da Segurança Pública através de um completo sistema organizacional e legal,
que se divide em subsistemas com características próprias, articulados, a princípio, por uma decisão
de trabalho e complementaridade de funções. Estão inseridos neste processo sistêmico o subsistema
Policial, Judicial e o Prisional.
74

O termo segurança é conceituado por Soares (2006b, p. 460) como a


“estabilização de expectativas positivas quanto à ordem pública e à vigência da
sociabilidade cooperativa”. Tal estabilização se dá em duas esferas: a primeira, na
esfera dos fenômenos (fatos que ocorrem e são diretamente vividos e que se
contam por números), na qual se impõe a redução de práticas violentas; a segunda,
na esfera dos sentimentos e das percepções (retratam experiências sofridas e
aquelas divulgadas pelos meios de comunicação), nos quais é importante reduzir o
medo, a sensação de insegurança e a instabilidade das expectativas32.
Há muito tempo que a Segurança Pública tem sido tratada como problema de
Governo, quando, na realidade, trata-se de uma séria questão de Estado, que vem
sendo negligenciada pelas elites, acostumadas a achar que crime é “caso” de
Polícia, restando inertes e reproduzindo velhos padrões, de forma reativa33. Nessa
realidade, nota-se como a oposição ao Governo aproveita as tragédias que ocorrem
para extrair delas benefícios políticos, acusando os gestores e desgastando seu
capital político, numa perspectiva imediata de soma zero34.

32
A chamada criminalidade urbana violenta vem aumentando no Brasil de forma ininterrupta desde o
final da década de 70, crescimento este bem superior ao padrão de crescimento populacional no
mesmo período, conforme destaca Azevedo (2006a). Portanto, o sentimento de insegurança não é de
todo infundado, pois o aumento da criminalidade muda os hábitos e conduta dos indivíduos, e eles
passam a viver com medo, uma vez que maior é o risco de vitimização. Lemgruber (2006)
questionada se vem ocorrendo, efetivamente, aumento da violência, ou, tão-somente, a sensação de
insegurança no Brasil, respondeu: “[...] a sensação de insegurança aumentou muito, o que é
plenamente justificado. Entre 1980 e 2003, por exemplo, o Brasil passou de 11,7 homicídios por
100.000 habitantes para 28,8 pelos mesmos 100.000. Isso traduzido em números significa: 13.910
homicídios, em 1980 e 51.531, em 2003: uma curva que não pára de crescer”. O mesmo alerta foi
dado por Soares (2006d, p. 2): “Assinale-se também que a (in) Segurança Pública é, hoje, uma
tragédia nacional, que atinge o conjunto da sociedade, e tem provocado um verdadeiro genocídio de
jovens, sobretudo pobres e negros, do sexo masculino. A criminalidade letal atingiu patamares
dantescos. Além disso, tornou-se problema político, sufocando a liberdade e os direitos fundamentais
de centenas de comunidades pobres”.
33
“Por isso, uma vez no Governo, os políticos acabam esquecendo o que prometeram e arquivando
os compromissos de mudança. Eles pensam o seguinte: de que adianta investir tanto, enfrentar
tantas resistências e dificuldades, inclusive a incompreensão da opinião pública, turbinada pelo
oportunismo predatório das oposições, se os frutos só serão colhidos pelos sucessores?[...]”. “[...]
Segurança é ótimo tema para campanha e péssimo para governos, porque, nessa área, é fácil culpar
os outros, acusar a incompetência dos adversários, lançando-se como abutres, sobre as tragédias,
mas é muito difícil construir alternativas viáveis e eficientes” (SOARES, 2002a).
34
Outro problema é o ciclo eleitoral: os cargos executivos estaduais e federais são preenchidos por
eleições diretas a cada quatro anos. O mesmo com os cargos executivos municipais (onde as
eleições intercalam-se ao ciclo estadual e federal). Um novo Governo implica na organização de uma
nova equipe de administração da máquina pública, principalmente nos escalões superiores. Por óbvio
que essa instabilidade retarda a produção de resultados. Políticas Públicas que necessitam tempo de
maturação mais longo sofrem desgastes, riscos de esvaziamento e pressões desestabilizadoras.
Além disso, os Governadores tendem a preferir os benefícios de ações espetaculares e superficiais,
de natureza emergencial, ainda que inconsistentes. Portanto, o que ocorre é um entusiasmo inicial
seguido por hesitação e, finalmente, pelo recuo. Nada se sustenta. Não se consolidam novas
estruturas institucionais e novos mecanismos (SOARES, 2004a).
75

O que o Brasil costuma chamar de “política de segurança”, com freqüência,


não passam de movimentos reativos e fragmentários das máquinas institucionais
treinadas e estruturadas para apagar incêndios, correr atrás do “leite derramado” e
responder, mal e lentamente, às demandas socialmente mais visíveis e às tragédias
que mais mobilizam a opinião pública (SOARES, 2001h).
Kahn (2002), após análise das políticas de segurança adotadas nos últimos
anos pelos Estados, refere que investimentos clássicos em segurança (aumento
salarial, aumento do orçamento, contratação de mais policias, etc.), embora
importantes, não são suficientes. Impõe-se um projeto baseado em diagnóstico
preciso, que determine fatores de risco, um plano de ação que estabeleça
prioridades e identifique programas que possam ser úteis para modelos a curto e
longo prazo, um processo de implementação que inclua treinamento e coordenação
dos parceiros envolvidos, avaliações que forneçam retornos, coalizações de atores-
chaves, com lideranças fortes e staff de apoio administrativo e estratégias de
comunicação que possam mobilizar profissionais e cidadãos.
Adorno (2002a) defende que as políticas penais devem ser orientadas por
uma coleção de dados estatísticos confiáveis e por informações qualitativas,
extraídas de pesquisas realizadas no domínio das Ciências Sociais, visando à
construção de modelos de Justiça e de Controle Social eficientes, eficazes e
adequados ao Estado Democrático de Direito.
Consul retrata a realidade atual:

Aliás, como se sabe, decisões de caráter paliativo têm sido próprias do


cenário da Área de Segurança Pública Brasileira quando na estrutura
política, caberia à União a coordenação nacional dos organismos policiais e
o estabelecimento macro da política de Segurança Pública e aos Estados, a
responsabilidade pelas duas principais organizações que realizam a
atividade de Polícia, a Civil e a Militar. [...] Por conta disso, a interação e a
efetiva comunicação entre os organismos policiais, federais e estaduais,
praticamente inexistem, e quando se arremeda algo nesse sentido, o fazem
com extrema formalidade, burocracia e morosidade, tornando a iniciativa
ineficiente ao tratamento do crime e da violência, que operam em
velocidades diferentes [...]. Os Estados, por sua vez, adotam uma postura
secundária em relação ao tratamento da Segurança Pública. Os organismos
policiais estaduais operam como se não existissem os federais e, vice-versa
[...]. Por sua vez, os Municípios não se sentem responsáveis, legal e
diretamente pelo tema, comportando-se como destinatários da Segurança
Pública. Como conseqüência, as lacunas na Segurança Pública
permanecem, bem como o vácuo existente pela ausência de algumas áreas
de justapostas responsabilidades, nas quais a falta de atuação da
pluralidade de Instituições, não raras vezes, proporciona a omissão ou a
sublevação do conflito, em detrimento da necessidade (2005, p. 242-244).
76

Dias Neto (2005) ressalta que, a partir da década de oitenta, surge um debate
internacional sobre a interpretação e tratamento dos conflitos subjacentes à
demanda pública por segurança contra o crime. Contrapondo-se ao modelo
tradicional de “Segurança Pública”, centrado no controle penal da criminalidade,
novos argumentos enfatizam o caráter interdisciplinar e multifatorial do tema. A
questão criminal passa a ser vista como uma das vertentes do fenômeno da
insegurança do espaço urbano deixando de ser objeto exclusivo das instituições do
Sistema de Justiça Criminal para converter-se em tema transversal do conjunto das
políticas públicas.
Sapori (2002) ilustra a realidade da Segurança Pública, como se fosse uma
organização, apresentando vários aspectos de seu desenho institucional: a) caráter
municipalizado/estadualizado do sistema, afetando seu nível de fragmentação; b)
tipos de tarefas desempenhadas por cada uma das organizações do sistema,
afetando as características da divisão do trabalho; c) tipos de vinculações com o
sistema político, que explicita o nível de autonomia das organizações; d) estrutura
burocrática das organizações, que define seus padrões de profissionalização; e)
níveis de accountability do sistema, que determinam as características da relação
com o ambiente externo e, f) níveis de articulação/desarticulação entre as
organizações do sistema, que definem os padrões de eficácia e eficiência de sua
dinâmica.
Soares (2000a) constata que um tratamento transformador e radicalmente
democrático da Segurança Pública é decisivo para a democratização efetiva e
completa da sociedade brasileira. O tratamento que vem sendo conferido à
Segurança Pública traduz alienação, incapacidade, insensibilidade e, principalmente,
distância cultural e de classe, o que a afastou dos grupos sociais que,
supostamente, estaria a representar.
Verifica-se que o tema “Segurança Pública” é amplo, não se limitando à
política do combate à criminalidade e nem se restringindo à atividade policial.
77

4.2 DA JUSTIÇA CRIMINAL

A partir da abordagem acerca da Segurança Pública, o presente capítulo


busca definir o conceito de Sistema de Justiça Criminal, procurando demonstrar que
as Instituições do Estado, encarregadas de garantir a lei e a ordem, apresentam-se
desarticuladas, lentas e debilitadas, gerando um vácuo estatal (pela inércia e falta de
efetividade dos diversos órgãos) e um campo fértil para a proliferação de
organizações criminosas. Como refere Lima (2002), o Sistema de Justiça Criminal
não tem sido explicitado da maneira como está configurado na realidade. Tal quadro
fere princípios de ética social e prejudica a relação da sociedade com o Sistema
Jurídico e seu combate à violência.
A análise do Sistema de Justiça Criminal, sob a perspectiva do enfoque
sistêmico, é indispensável.
Churchman ressalta sua importância:

Ora, é pura insensatez esperar que algum ser humano tenha sido até agora
capaz de chegar a uma compreensão tal dos problemas da sociedade que
possa realmente identificar os problemas centrais e determinar o modo
como deveriam ser resolvidos. Os sistemas em que vivemos são, até agora,
demasiado complicados para que nossos poderes intelectuais e nossa
tecnologia possam compreendê-los [...]. O enfoque sistêmico realmente
consiste em um debate contínuo entre várias atitudes de espírito com
relação à sociedade (1972, p. 11-12).

Ainda alerta:

É ingênuo pensar que alguém possa realmente abrir à plena discussão os


vários enfoques do sistema, as pessoas não desejam explorar problemas
em profundidade com os seus antagonistas, acima de tudo, não são
capazes de tomar sobre si a carga de acreditar realmente que o antagonista
possa ter razão, isto simplesmente não está na natureza do ser humano
(1972, p. 294).

No mesmo sentido, Beato ressalta:

Não dispomos de análises mais detalhadas a respeito da integração


funcional das diversas organizações do Sistema de Justiça Criminal. O que
parece ser uma constante é uma certa “desconfiança” em relação à
integração das várias organizações do Sistema de Justiça Criminal, sem
que saibamos exatamente a causa desses conflitos de jurisdições (2001, p.
30).
78

[...] Existe uma grande ignorância no Brasil em relação ao Sistema de


Justiça Criminal, em geral, e sobre as organizações policiais em particular.
Este desconhecimento não é um problema decorrente apenas do
desprestígio que o tema da Justiça Criminal tem nos meios acadêmicos,
mas também de um certo insulamento das próprias organizações do
sistema. Nem todas estão dispostas a serem estudadas e avaliadas, por
razões as mais diversas [...] (2001, p. 31).

O Sistema de Justiça Criminal merece estudos mais aprofundados, baseados


em análises de casos, em exames rigorosos das estatísticas policiais e judiciais
(ADORNO, 1998b). O crime está cada vez mais especializado, atravessando
fronteiras, aumentando em quantidade e em qualidade35. Porém, o Sistema de
Justiça Criminal permanece operando como fazia há mais de quatro décadas
(ADORNO, 1996a, 2002b, 2006).
Azevedo alerta que:

Juntamente com o crescimento nas taxas da criminalidade violenta, um


outro componente contribui de forma decisiva para o descrédito nas
instituições e a busca de alternativas privadas para a garantia da
segurança. Trata-se do baixo padrão de funcionamento do Sistema de
Justiça Criminal (2006a).

Santos (2002) destaca que a crise do Sistema é evidente: o acesso à Justiça


é precário36, a seletividade orienta os processos penais e a normatividade da lei não
se efetiva, bem como é flagrante a crise das prisões.

35
Dias (1997) questiona se tal crescimento do crime deve-se imputar, na sua maior parte, ao
aumento efetivo da criminalidade ou, diversamente, ao aumento da criminalização (seleção
penalizante, resultado da ação das agências que formam o Sistema de Justiça Criminal), tanto
primária como secundária. A criminalização primária resulta do ato e efeito de sancionar uma lei
penal material que incrimina ou permite a punição de determinadas pessoas. A criminalização
secundária caracteriza-se pela ação punitiva exercida sobre determinados indivíduos quando as
agências policiais supõem que eles praticaram um ato criminalizado primariamente, os investigam,
privando-os da liberdade de ir e vir, submetendo-os às agências judiciais, até a chegada à instância
penitenciária. Nesse contexto, o autor destaca ser notória a diferença do papel e atitude de “quem
sofre e de quem faz justiça”. O argüido passa por uma experiência que pode ser uma das mais
angustiantes de sua vida, dotado de reduzida competência de ação; o agente da instância formal de
controle apenas cumpre uma tarefa da rotina profissional, dotado de alto poder de definir uma
situação em termos vinculativos para o outro. Dessa forma, a seleção criminalizante secundária
condiciona o funcionamento das Agências do Sistema Penal, tornando-o inoperante para outra
clientela.
36
Sabadell (2005) refere que o acesso à justiça é um dos maiores problemas do Sistema de Justiça
Criminal que deve, necessariamente, ser objeto de estudo da sociologia da aplicação do direito. Ele
compõe-se pelo acesso formal à justiça (acionar o judiciário); acesso efetivo à justiça (possibilidade
real de pedir proteção judiciária) e encontra como barreiras as econômicas (altos custos do
processo), sociais (desconfiança no Sistema de Justiça que implica desistência dos processos),
pessoais (falta de informações sobre direitos de proteção judiciária e possibilidades de assistência
gratuita) e jurídicas (morosidade, incerteza quanto ao resultado, número limitado de Juízes e
Promotores, etc.).
79

O crescimento da criminalidade urbana violenta na década de 80 provocou


impacto nas agências de contenção da criminalidade. Passou a haver uma pressão
sobre as Agências Policiais, Judiciárias e Penitenciárias, sob a forma de aumento
das prisões e de processos instaurados. Elas entraram em crise institucional, pois
não conseguiram atuar por motivos de ordem estrutural, contaminando o Sistema de
Justiça Criminal. Por mais paradoxal que possa parecer, justamente em uma era de
crescente democratização política da sociedade, as agências encarregadas de
preservação da ordem pública tendem a estabelecer estratégias de sobrevivência
institucional que apelam para o autoritarismo, cada uma com lógicas próprias de
funcionamento, procurando assegurar, cada uma, sua própria autonomia. Junto à
Polícia, é crescente o arbítrio policial e a seletividade na produção dos inquéritos,
expandindo seus mecanismos de controle informal. O Judiciário tende a igual
esgotamento. Abranda cominações em casos que considera pouco graves (evitando
pressionar o Sistema Penitenciário), mas, ao mesmo tempo, apresenta-se
indulgente. O Sistema Prisional, último caminho, acaba sendo responsabilizado pelo
fracasso no controle e contenção criminal (ADORNO, 1993a).
Tem-se uma “lógica empresarial”, onde, no dizer de Dias e Andrade (1997),
as rotinas organizacionais destinam-se a potencializar a capacidade de resposta,
predominando a profissionalização e a burocratização. As necessidades das
organizações acabam se tornando fins em si mesmas, atuando sem integração e
comunicação, tendentes a desenvolver lógicas próprias.
Pinheiro (1997) alerta que as Instituições do Estado encarregadas de garantir
a lei e a ordem são disfuncionais, sendo as garantias formais, asseguradas pela
Constituição Federal e pelo Código Penal, violadas sistematicamente. A abundância
de linchamentos e de justiceiros indica a ineficiência das instituições do Estado,
encarregadas do controle da violência e do crime, e demonstra como o Estado
abdicou de seu papel de provedor da ordem e da segurança.
A pobreza de equipamentos e recursos humanos, a carência de
profissionalização, a ênfase em atitudes reativas, a má qualidade das investigações,
a impunidade, aliadas à repressão e à arbitrariedade são características visíveis no
Sistema de Justiça Criminal conforme Adorno (1998c e 2002a).

O Sistema de Justiça Criminal encontra-se engessado pela burocracia. Os


sintomas mais ostensivos da patologia burocrática são os seguintes: apego
à rotina, a cega obediência a normas e procedimentos padronizados, a
80

formalidade e não a essencialidade, a eficiência e não a eficácia, o


processo e não o resultado, a fabricação e não o produto, a aparência e não
o conteúdo, o relatório e não o plano de ação, o passado, o presente, mas
quase nunca o futuro (MATOS, 1980).

Adorno (1996b) há muito vem insistindo que o Aparelho Judiciário continua


operando como fazia há décadas, mostrando-se pouco permeável ao impacto das
mudanças sociais que alteraram as formas e os padrões de conflitualidade social. E,
dessa forma, o Sistema de Justiça Criminal é visto como pouco articulado, carente
de eficácia e incapaz de realizar as finalidades para as quais foi criado. Há uma
desproporção entre as linhas de articulação e a rigidez interna que dificultam o
andamento dos processos penais, causando séria morosidade. Dessa forma, a
distribuição da Justiça acaba alcançando alguns cidadãos em detrimento de outros e
o acesso à Justiça é dificultado por diversas ordens e dificilmente as decisões
judiciárias deixam de ser discriminatórias.
O desenho institucional da Justiça Criminal no Brasil persiste marcado por
uma notória singularidade. As atividades de policiamento ostensivo e o policiamento
investigativo estão divididas entre duas organizações, a saber: a Polícia Militar e a
Polícia Civil, sendo institucionalizadas no final da década de 60. Ambas pertencem
ao Executivo Estadual, de modo que cada Federação tem suas respectivas Polícias.
No Executivo Federal ainda existe a Polícia Federal, responsável pelos crimes
específicos contra a União e a Polícia Rodoviária Federal, responsável pelo
patrulhamento e fiscalização das rodovias federais. Compõem, ainda, o Sistema de
Segurança Pública e Justiça Criminal, o Ministério Público, Defensoria Pública e o
Judiciário. O Primeiro, com estruturas em níveis estaduais e federais, tem
vinculações com o Executivo (nomeação do Procurador-Geral de Justiça), mas não
pode ser concebido como parte deste, pois é dotado de autonomia administrativa e
financeira. À Defensoria cabe representar os interesses dos acusados sem
condições econômicas. Ao Judiciário, representado por Juízes e Desembargadores,
cabe zelar pelo cumprimento do ritualismo legal e tomar as decisões no fluxo
processual criminal. A engrenagem final do Sistema é composta pelas unidades
prisionais (SAPORI, 2006).
Bisol (2002) chamou de “fenômeno da foraclusão” as instituições policiais,
cuja característica consiste em situarem-se fora do conjunto das demais instituições.
Operam como se fossem instituições à parte ou como se fossem de outro Estado.
81

Ou, mais precisamente, assumem-se como exceção institucional em relação à


institucionalidade como conjunto ou universo. Protegidas pela própria natureza de
exceção institucional, as Polícias são induzidas a desprezar as outras instituições. O
Executivo porque se interpõe entre elas e a sociedade. O Judiciário porque é a
última palavra e, geralmente, desconstitui o que a Polícia faz. As resistências do
Judiciário e do Ministério Público acabam gerando aprofundamento do
corporativismo policial. As Polícias conseguem excluir o Judiciário e o Ministério
Público, portanto o Estado, do controle da criminalidade. O Executivo, Legislativo,
Judiciário e Ministério Público praticamente nada sabem do que se passa sob o
nome de combate ao crime entre as Polícias e a sociedade. Tal domínio do crime
começa com as estatísticas criminais, que são policialmente produzidas sem
qualquer vigilância das outras instituições. O Judiciário e o Ministério Público se
inclinam a serem mais rigorosos, recusando inquéritos mal elaborados. Em outras
situações, Juízes acabam sendo seletivos, abrandando penas de crimes
considerados pouco graves ou irrelevantes, preocupados com a superlotação
carcerária. O Poder Judiciário apresenta-se com defasagem entre números de
Juízes e processos a serem julgados37. Surgem conflitos de interpretações de
preceitos legais, demandando desnecessários recursos às instâncias superiores. O
caos final é o sistema prisional, onde a superlotação carcerária atinge sobremaneira
a dignidade humana38.

37
Dados de 2005: considerando a Magistratura nacional, tem-se, em média (não há dados referentes
a todos os Estados): junto ao 1º grau: há 2.88,00 processos por juiz; no 2º grau: 1.221,41, a carga de
trabalho nas turmas recursais é de 2.587,21 e junto aos juizados especiais, 8.686,83, por Juiz. A taxa
de congestionamento junto ao 1º grau é em média 75,49%, no 2º grau 42,23%, junto às turmas
recursais: 40,54% e nos juizados especiais é de 42,12%. No Rio Grande do Sul, a taxa de
congestionamento no 1º grau é de 74,52%; no 2º grau 34,96%; nas turmas recursais, 45,97% e junto
aos juizados especiais 36,75%. Fonte: Conselho Nacional de Justiça. Justiça em números.
Indicadores estatísticos do Poder Judiciário. Justiça Estadual – 2005. Disponível em:
<http://www.cnj.gov.br>.
38
Em dezembro de 2005, havia 361.402 presos no sistema penitenciário brasileiro. Na última década,
esse número cresceu de 148.760 para 361.402 detentos. O número de presos por 100 mil habitantes
também saltou de 93 para 195. Em 1995, havia 68.597 vagas no sistema, e um déficit de 80 mil
vagas. Em 2005, eram 215.910 vagas e um déficit de 145 mil. Fonte: Julita Lemgruber, do Centro de
Estudos de Segurança e Cidadania (CESEC), da Universidade Candido Mendes, no Rio de Janeiro.
Atualmente, a população carcerária nacional é de 419.551 (presos no sistema e na Polícia), sendo
que o número de vagas é de 333.907, com um déficit de 85.644 vagas. Só no Rio Grande do Sul, há
25.317 presos para 16.186 de capacidade, com uma diferença de 9131 do total geral/capacidade.
Fonte: SUSEPE/RS: Demonstrativo do quadro de cargos da SUSEPE e Mapa da População
Carcerária Semanal – 301007 – O número do quadro de agentes na SUSEPE, em 8.11.07, era de
3.033, sendo que somente 2.441 trabalham na segurança dos presos (agentes penitenciários). Os
demais são auxiliares administrativos e monitores.
82

Nessa realidade, cresce a perda da confiança nessas instituições de justiça e


nos agentes responsáveis por sua distribuição e execução.

4.3 DAS POLÍCIAS

Fixadas as premissas acerca do Sistema de Segurança Pública e Justiça


Criminal, cumpre agora analisar duas das principais instituições que operacionalizam
a Segurança Pública, qual sejam, a Polícia Civil e a Polícia Militar.
A Polícia é uma organização hierárquica e burocrática, com cultura
organizacional e identidade que a especificam, podendo ser analisada nesse
contexto sociológico39.
Torres (1977) salienta que, embora a Polícia exista desde a antigüidade,
empregou-se a palavra para indicar a segurança do Estado. Somente no séc. XV
começou-se a falar da Polícia como instituição destinada a zelar pela ordem e
segurança pública.
Em Estados democráticos, a Polícia é uma resposta civilizada às
insatisfações públicas em relação à disseminação da violência.
Donnici:

E o que se sabe sobre a Polícia brasileira é que ela, como campo


privilegiado para o estudo das Ciências Sociais, administração pública e
direitos humanos, nunca foi uma prioridade dos governantes. A Polícia
sempre esteve num plano inferior no pensamento e na cabeça dos donos
do poder, se é que eles, os donos, têm cabeça (1990, p. 67).

A lei n. 2161, regulamentada pelo decreto 120, de 1842, consagrou a divisão


clássica das funções policiais em Polícia Administrativa e Polícia Judiciária,
estabelecendo um sistema centralizado e hierarquizado.

39
O sistema burocratizado já se inicia quando da prática de crime: a Polícia Militar aciona a Polícia
Civil que passa a investigá-lo através de um inquérito policial. Eventuais medidas, de forma
burocrática e formal são encaminhas ao IGP - Instituto Geral de Perícia ( exames ou inspeção do
local do crime) ao Judiciário (para obter intercepção telefônica) ou ao Ministério Público (para
manifestar parecer favorável em prisão provisória). De posse do inquérito, o Ministério Público pode
devolvê-lo (pois insuficiente), arquivá-lo ou denunciar com base no expediente. A partir de então,
começa o calvário da instrução, quando as testemunhas passam pelos mesmos expedientes que
enfrentaram na Polícia: oitivas são novamente repetidas, até que haja eventual condenação,
transação ou julgamento (conforme rito).
83

Competências distintas solidificaram corporações com modelos culturais


distintos40.
Em 1988, a Constituição Federal manteve a duplicidade de Polícias.
Guimarães (2002), ao tratar das Organizações Policiais e de suas
transformações, refere que o grande desafio da Polícia é o seu modelo
organizacional e as relações internas decorrentes. O dilema está na migração de
uma organização burocrática, centralizadora e autoritária para uma organização
mais flexível e descentralizada.
Azevedo (2000) lembra que “é preciso compreender essa especificidade do
Estado brasileiro, em que se delegou à polícia o relacionamento com a maioria da
população, para a intermediação de seus conflitos [...]” ( p. 200).
Soares (2006d) caracteriza as Polícias, de um modo geral, como ineficientes
na prevenção e na repressão qualificada, na investigação e na conquista da
indispensável confiança da população. São refratários à gestão racional, não
avaliam sua própria performance, nem se abrem a controle e monitoramento
externos. Não se organizam com base em diagnósticos sobre os problemas a
enfrentar, o modo de fazê-lo, as prioridades a definir e as metas a identificar. Não
planejam sua prática, a partir de diagnósticos fundados em dados consistentes, nem
corrigem seus erros, analisando os resultados de suas iniciativas, os quais,
simplesmente ignoram. São máquinas reativas, inerciais e fragmentárias, inscritas
num ambiente institucional desarticulado e inorgânico, regidos por marcos legais
rígidos e inadequados.
As deficiências mais comuns a ambas as Polícias se refletem na coleta,
registro, produção, distribuição e processamento precário das informações, gerando
dados inconsistentes e pouco confiáveis e inviabilizando diagnósticos, análises
prospectivas e definição de orientações estratégicas. O atendimento, serviços e
produtos são de má qualidade. A correição, por sua vez, é quase inexistente, em
decorrência da inércia burocrática, das restrições normativas, da inoperância
administrativa e, em alguns casos, comprometimento corporativista (SOARES,
2003b).
Beato (2001) ressalta que as funções policiais são, pois, separadas e
redundam em culturas intra-organizacionais distintas o que se traduz em um

40
Historicamente, as forças brasileiras foram criadas para manter as condições de produção e
reprodução das desigualdades, dos privilégios e de dominação econômica e política (MINAYO, 2002).
84

elemento de tensão interorganizacional. Há igualmente o problema do ponto de


conflito entre as forças policiais, que decorre dos atritos e tensões a respeito de
onde começa e termina o policiamento ostensivo e a atividade investigatória, o que
redunda em ações desarticuladas de informações e estratégias entre essas
organizações.
Tanto a Brigada Militar como a Polícia Civil se enquadram no modelo
burocrático de Weber, pois predominam o formalismo, a existência de normas
escritas e estrutura hierárquica forte, mas não no seu modelo puro (CONSUL, 2005).

4.3.1 Da Polícia Civil

Uma vez mantida a duplicidade das Polícia na Carta Magna, tem-se a Polícia
Civil, aquela também conhecida como Polícia Judiciária que será neste subitem
brevemente analisada.
As Polícias civis são subordinadas aos Governadores dos Estados, do Distrito
Federal e dos Territórios (§ 6º do art. 144 da CF). O Delegado de Polícia é escolhido
pelo Secretário da Segurança Pública.
Filho refere que:

[...] a instituição carece de uma estrutura de procedimentos que tenham o


condão de dar um norte a seus integrantes sobre a maneira como devem
ser conduzidos os trabalhos destinados a dar fiel cumprimento às
atribuições que lhe foram destinadas. Tudo é feito de improviso [...]. É
comum na Polícia Civil, mesmo em departamentos ditos especializados,
acontecer, quando da mudança das chefias, uma debandada geral, isto é, o
chefe transferido para outra unidade policial, leva consigo grande
quantidade de policiais amigos, causando prejuízo na qualidade do trabalho
da unidade, pois os policiais que os irão substituir, levam tempo para se
adaptarem (2002, p. 25).

[...] Outra constatação: número considerável de Delegados de Polícia não


exercem nenhum tipo de controle sobre as atividades desenvolvidas pelos
investigadores no dia a dia. Normalmente estes saem pela manhã, em
duplas ou trios, com uma viatura e não informam à autoridade policial da
unidade sobre o destino e a diligência que irão realizar (2002, p. 25).
85

Outros problemas detectados pelo autor são a interrupção de investigações


em finais de semana e feriados, os bicos, e a “Polícia elitizada”, isto é, aquela que se
preocupa em esclarecer muito mais a autoria quando a vítima é abastada.
Ao descrever o local de trabalho, o autor destaca que os plantões de Polícias
caracterizam-se por algumas salas com móveis velhos, mal iluminadas, mal
cheirosas, mal arejadas, situadas no interior de um prédio sinistro e mal conservado
(FERNANDES FILHO, 2002).
Na Polícia Civil, os Delegados têm seu embasamento profissional na Lei
Processual Penal, publicada há mais de 50 anos, e que há muito já se encontra
defasada em relação à sociedade que se torna cada vez mais complexa.
Beato (2001) salienta que na Polícia Civil ocorre a “advogadização”: ela
executa o Inquérito Policial. Com esse poder é ele que oferece elementos ao
Ministério Público e decide quem será julgado ou não. Acabam passando por
atividades típicas da instrução criminal e não mais da investigação.
Soares (2000b) ressalta a burocracia policial, onde a delegacia é o melhor
exemplo dessa herança paralisante: endossos, revalidações cartoriais, tudo em um
ambiente fisicamente degradado, insalubre e hostil. Policiais e público sentem-se
desrespeitados pelo cenário decadente. O formalismo processual, com um inquérito
policial inquisitivo e depois a repetição dos atos investigativos na fase judicial, só
prejudica uma instrução célere à busca da verdade, bem como gera a tendência das
organizações criticarem-se mutuamente. Judiciário e Ministério Público criticando o
inquérito policial, não satisfeitos com o trabalho investigativo e a qualidade do
inquérito; a Polícia alegando falta de apoio institucional e condescendência com os
criminosos, discursando o velho jargão “a Polícia prende e a Justiça solta”, bem
como criticando o formalismo judicial. Além disso, há o poder discricionário da
Polícia Civil, investigando e indiciando somente aqueles que considera suspeitos,
acabando o Ministério Público por denunciar somente os que são “previamente
escolhidos pela Polícia”.
86

4.3.2 Da Polícia Militar

A Polícia Militar conhecida em nosso Estado como Brigada Militar, exerce


precipuamente a atividade de policiamento ostensivo e também merece algumas
breves referências para melhor entendimento do contexto da Segurança Pública, em
especial quanto à rivalidade existente entre as duas Polícias que prejudica a idéia de
uma Força-Tarefa.
Licks refere:

O processo de socialização na cultura policial Militar tem um caráter


bastante distinto e peculiar, que se propõe a transformar um Civil em um
Militar. É através das disciplinas e dos rituais socializadores que os
voluntários aprendem as normas e os valores apropriados à cultura Militar,
baseados em dois princípios básicos: hierarquia e disciplina (2001, p. 87).

Knoll, Juiz-Auditor da Justiça Militar Estadual, durante entrevista realizada


pelo Projeto Memória da Justiça Militar Estadual41, destacou:

Outro aspecto que eu gostaria de destacar, fora o aspecto ideológico, é a


formação Policial Militar que transmite ao Policial Militar um caráter. Caráter,
vocês sabem, é um sinal, é uma marca, é um estigma, é uma postura. E eu
sempre cuidei para que a minha posição fosse vertical como traço do meu
caráter. Quem não cuida da posição vertical anda na horizontal como réptil,
bajulando, rastejando para conseguir as coisas. Quem está na
perpendicular forma seu caráter, a sua idoneidade, e forma a sua ideologia,
porque cada um de nós tem uma ideologia para viver. E isso é muito
importante. O Militar tem como diretrizes ou avenidas do seu trânsito a
obediência, a ordem, a disciplina e a hierarquia, e cada uma dessas coisas
tem um sentido (AXT, 2006, p. 81).

41
Para Günter Axt (2006, p. 13), a história oral tem se revelado um instrumento importante na
alavancagem de projetos de memória institucionais. É a possibilidade de contar histórias não escritas
em local algum. É a história das representações do real formuladas por cada indivíduo, história de
opiniões, vivências, experiências, uma história afetiva das instituições estudadas. Não se trata,
conforme refere Axt, de ganho de somenos importância à cultura, pois permite contar a história
política e institucional por perspectivas outras. Não a história que bebe nas fontes das atas oficiais,
nas fontes do jornalismo, mas sim histórias mais afetivas das instituições estudadas onde os
elementos do cotidiano acham-se freqüentemente retratados.
87

Ressalte-se que a hierarquia é, inclusive, retratada por sinais (estrelas e


divisas), reforçando a identidade, em especial no uso da farda42.
Para Knoll:

[...] misturar a Polícia Civil e a Polícia Militar é uma posição tomada por
ignorantes que não sabem distinguir a competência do serviço cabível a um
e a outro, nem a formação funcional, quer do Militar, quer do policial civil. A
Polícia Civil não é má. Não é desajustada. É necessária. Tão necessária
quanto a Polícia Militar. Todavia, a formação profissional e a função de uma
e outra são profundas e diferentes (2006, p. 84).

Consul destaca que:

[...] a identidade organizacional da Brigada Militar, por ser uma construção


social com múltiplos significados e manifestações, só se torna realidade por
meio das interações feitas pelos policiais Militares, num diálogo contínuo
com os demais mundos culturais, consolidando o sentimento de
semelhança e diferença conferido pela consciência histórica organizacional
(2005, p. 261).

A Polícia Militar conforme Soares (2000a) caracteriza-se pelo “engessamento


vertical”, que inviabiliza a distribuição de responsabilidade, e a Polícia Civil carece
de hierarquia e disciplina. A integração entre elas é exceção. Há dificuldade de se
trabalhar de forma integrada, isso diante dos conflitos de competências, além da
duplicidade de sistemas de comunicação e informatização de dados, sem sistema
integrado de Segurança Pública. Há corporativismo inevitável entre as organizações,
bem como desintegração dentro de cada estrutura. Na Polícia Militar tem-se o
distanciamento entre o Comandante do Batalhão e seus inferiores (soldados que
efetuam o policiamento ostensivo e que não têm contato direto com a cúpula Militar).
Destaca Freitas que o indivíduo e as Instituições são duas realidades
concomitantes e estreitamente ligadas:

Pode-se afirmar que a Polícia Civil ocupa uma posição na periferia do


campo jurídico, assim como a Polícia Militar. Embora seja um órgão do
Estado e sua atuação envolva o conhecimento jurídico (atributo mais
fortemente associado aos Delegados), seu poder de nomeação é baixo, não
produzindo efeitos importantes no campo jurídico, pois o indiciamento não
leva necessariamente a uma condenação. O resultado do trabalho policial,

42
”[...] a farda é o primeiro sinal da ordem, da lei e da disciplina” (KNOLL, 2006, p. 80). “A farda não é
uma veste que se despe com facilidade e até com indiferença, mas uma outra pele, que adere à
própria alma, irreversivelmente para sempre” – (Inscrição na parede do Batalhão de Polícia de
Eventos). In: A major da PM que tirou a farda: Mírian Assumpção e Lima (2002).
88

materializado no inquérito policial, precisa ser validado pelo promotor para


43
que seja constituída uma questão jurídica (2000, p. 73).

Essas culturas organizacionais distintas por certo resistem a mudanças, em


especial quando se busca integração, compartilhamento e cessão de espaço, com
prejuízo de eventual poder.
É sabido que novas leis e regras não são suficientes para mudar uma cultura.
Mas elas têm papel fundamental no estabelecimento do perfil da Polícia e na
consolidação da instituição policial, e podem ser um dos fatores de mudança de
mentalidade, se forem implementadas e executadas com tenacidade, porque
passam a representar um novo termômetro institucional (MARIANO, 2004, p. 67-68).
Mingardi (1991) lembra que a dificuldade na mudança da mentalidade policial
é o fato de ser a própria instituição que habilita o candidato ao ingresso na carreira.
Portanto, quem estabelece as metas da formação dos Polícias é a Academia de
Polícia, ou seja, a própria instituição. Trocando em miúdos, policiais antigos instruem
novos policiais sempre dentro da norma vigente44.
No caso da Polícia Militar, Soares (2003b) afirma que os maiores problemas
seriam os regulamentos disciplinares arcaicos que se preocupam mais com o
comportamento dos policiais dentro dos quartéis do que nas ruas. A presença de
muitos graus hierárquicos dificulta a relação entre policiais operacionais e o
comando. Há excessiva presença de policias em funções burocrático-
administrativas.
Todas essas Instituições Policiais são interdependentes e influenciadas umas
pelas outras. Por mais eficiente que uma instituição seja e por mais eficazes que
sejam suas ações, ela está comprometida se não ajustadas às ações das demais.

43
Para Kant de Lima (1983a) essa característica do Sistema Jurídico Brasileiro, com a utilização de
diversas formas de produção da verdade, produz a desqualificação de uma sobre a outra. Kant vai
ainda mais longe quando afirma que a verdade da Polícia é a que menos vale, em especial, quando
sua prova é baseada na confissão do indiciado.
44
Jornal Zero Hora, 26.11.06 páginas 46-47: Pontos de Discórdia entre Brigada Militar/Polícia
Civil: PC reclama: Possibilidade da BM realizar Termos Circunstanciados (TCs), tendo autonomia
para atender sozinha algumas ocorrências. BM reclama: O fato da PC desencadear ações de
policiamento ostensivo e preventivo, deixando de investigar crimes e de prender bandidos. PC
reclama: Ao fazer os TCs, a BM deixa de estar nas ruas realizando o policiamento, o que resulta na
ocorrência de mais crimes. BM reclama: PC tenta interferir no comando de ocorrências de alto risco,
nas quais é preciso negociação. PC reclama: PMs atuam de forma discreta e fazem investigações de
crime. BM reclama: PC atua seletivamente só investigando grandes crimes. PC reclama: O controle
do Guardião, alegando que deveria estar sob sua responsabilidade porque se trata de instrumento de
investigação. BM reclama: A PC trabalha ostensivamente nas ruas, usando viaturas e coletes com
identificação, quando seu trabalho deveria ser discreto, qualificando a investigação e prendendo
mais.
89

Não se pode evitar a mudança, como já destacado por Crozier (1981)45.


Castells (1999b) relata que as Instituições Policiais devem estar preparadas
para a contemporaneidade da criminalidade, representada, atualmente, pelo crime
organizado, crime do “colarinho branco”, tráfico de armas, crimes eletrônicos, etc.
Conforme Fleury (2002), as instituições devem atuar em redes. Redes seriam
mais do que simples relação de interdependência entre as organizações. Seriam
relações entre indivíduos que atuam dentro daquelas organizações e que criam
vínculos entre si: cooperação/competição, solidariedade/conflito,
igualdade/diversidade.
A Polícia Militar peca pelo centralismo, enquanto que a Civil comete o pecado
inverso, ao dissolver-se na atomização das agências locais. Pela fratura do ciclo do
trabalho policial (determinada pela Constituição Federal) resistem à cooperação. Na
formação, capacitação e gestão do conhecimento falta uma plataforma
compartilhada a nível nacional. Na esfera da gestão e da estrutura organizacional
faltam dados com diagnósticos confiáveis, prévio planejamento, avaliação e
monitoramento. Na esfera da perícia faltam condições, que garantam a qualidade do
trabalho e a cooperação interinstitucional.
Soares (2000a) lembra que a Polícia Militar, sobretudo seus quadros
superiores, não vêem com bons olhos mudanças que a aproximem da Polícia Civil,
porque acha que o futuro imporá a desmilitarização e que, o convívio acabaria
revertendo, a médio prazo, em absorção da Polícia Militar pela Polícia Civil. Os
Policiais Civis, por sua vez, resistem ao controle porque temem o fim da autonomia
de seus Delegados (cada um tem suas regras, seu regime de trabalho, seus

45
Em novembro de 2000, no Estado do Rio Grande do Sul, o Secretário de Justiça editou a Portaria
172 permitindo que a Brigada Militar lavrasse TC (Termo Circunstanciado). Trata-se de um
procedimento utilizado pra encaminhar, diretamente, aos Juizados Especiais, ocorrências de delitos
de pequeno poder ofensivo. Até então, os TCs só eram realizados pela Polícia Civil. Na ocasião, o
representante da ASDEP (Associação dos Delegados de Polícia) sustentou que o Secretário de
Justiça e Segurança estava “povoando uma desintegração das Polícias, instalando uma anarquia,
que iria gerar mal-estar entre as duas corporações” (Zero Hora, de 18 nov. 2000, p. 32) . Até hoje, a
BM vem atuando junto aos TCs.
A falta de sincronia entre o trabalho da Brigada Militar e da Polícia Civil no atendimento a crimes
dolosos contra a vida motivou que, em julho de 2003, a 1ª Vara do Tribunal do Júri de Porto Alegre
convidasse profissionais da Polícia Militar, Polícia Civil e Instituto Geral de Perícias, juntamente com o
Poder Judiciário e Defensoria Pública do Estado para discutir problemas relacionados com o “local
de crime de homicídio”. Na ocasião, a PC sustentava que as ações incorretas de PMs (mexer no
cadáver e no local do crime, por exemplo) estavam prejudicando as investigações dos homicídios,
pois sua função era isolar e preservar o local do fato, até a chegada dos Peritos e Policiais Civis.
Foram encaminhadas ao Secretário de Justiça e Segurança sugestões resultantes do consenso entre
as organizações Policiais. Entre o elenco de sugestões estava a normatização dos procedimentos
adotados pela Polícias e a criação padronizada de uma ficha de levantamento do local do fato.
90

jeitinhos, suas informações, seus informantes, suas práticas informais, etc.). É sob
esse manto protetor da invisibilidade – isolamento de cada unidade – que se
escondem ilícitos de todo o tipo, como corrupção, chantagem e tortura.
Pinheiro (1999), após pesquisar acerca das violações de direitos no Sistema
de Segurança Pública e Justiça Criminal, apontou diversas manifestações das
instituições quanto ao relacionamento entre os Operadores de Direito. Delegados
percebem que são alvos de desconfiança por parte do Ministério Público e do
Judiciário. Ao mesmo tempo, sentem falta de cooperação por parte desses órgãos.
Alguns entrevistados chegam a sugerir que esse descompasso e a falta de
cooperação entre as instituições favorecem o crescimento da criminalidade,
alimentando a impunidade. Parte da Polícia acredita que Ministério Público e
Judiciário possuem um posto privilegiado dos críticos. Delegados manifestaram que
a maior causa da criminalidade hoje em dia é a falta de sintonia entre os órgãos
encarregados de combater o crime. Sustentam que os Juízes ficam grudados nas
cadeiras e não sabem o que está acontecendo no ambiente social. O Promotor, por
sua vez, só aparece em casos de repercussão.
Nesse domínio, é pertinente lembrar Douglas (2007), ao alertar que falar
sobre cooperação e solidariedade significa escrever, ao mesmo tempo, sobre
rejeição e desconfiança. Algumas vezes a confiança tem breve duração e é frágil,
dissolvendo-se rapidamente. Algumas vezes a suspeita é tão profunda que a
cooperação torna-se impossível.
Quanto à comunicação entre as partes, Pinheiro (1999) claramente diz: “As
regras que norteiam as comunicações entre esses profissionais parecem
construídas para favorecerem desentendimentos. Não há canais ágeis e
desburocratizantes de comunicação”46.
Os Delegados se percebem vítimas de uma série de situações, frente às
quais são impotentes para mudar, o que os impede de cumprirem seus papéis. Por
outro lado, recebem os Promotores como parte do problema e como uma ameaça
para o futuro. A Polícia desfruta de uma imagem de instituição heterogênea: existem
os maus e bons; honestos e corruptos, que respeitam a lei ou não, e para distingui-

46
Pinheiro (1997) exemplifica essa realidade: A conduta do Juiz quando expede um ofício para a
Delegacia, parecendo inimigo do Delegado: ”Determino sob pena de obediência”. Em primeiro lugar
ele não é chefe do Delegado. Ele é do Poder Judiciário. E o Delegado, por sua vez, integra o Poder
Executivo.
91

los é preciso conhecê-los. Pelas características de suas carreiras eles permanecem


nos lugares por pouco tempo o que dificulta familiaridade e confiança47.
Kant de Lima (1997) bem ressalta que o papel institucional da Polícia é
influenciado pela posição particular que a Instituição Policial ocupa, formal e
informalmente, no Sistema Judiciário, não havendo autonomia frente à Promotoria e
ao Judiciário.
Com afirma Filho:

Os obstáculos institucionais ao controle da violência em São Paulo estão


entranhados na cultura e nas operações de duas forças policiais separadas
e em rivalidade, no Judiciário, nos sistemas penal e legal e na política local.
A Polícia Militar conduz o patrulhamento uniformizado para manter a ordem
pública e prender os infratores durante o cometimento do crime. A Polícia
Civil, com instalações separadas e responsabilidades territoriais, em
superposição com as da Polícia Militar, investiga crimes de autoria
desconhecida e processa as prisões feitas pela Polícia Militar. As forças
policiais em paralelo são previstas pela Constituição Federal (1999, p. 5).

A Polícia, pressionada pela escassez de recursos, acaba se tornando seletiva


na produção dos inquéritos (reservando-os aos delitos mais graves ou mais
importantes), expandindo os mecanismos informais de atuação policial48.
Naím (2006), após detalhado estudo sobre organizações criminosas,
constatou que a rixa interna entre as instituições tornava a vida dos criminosos mais
fácil, alertando que:

Problemas de articulação entre as agências encarregadas do combate aos


contrabandistas globais não são uma exclusividade norte-americana.
Praticamente em toda parte esses organismos são presas de forças
poderosas e deformadoras: interesses dissimulados, corrupção, inércia
burocrática, politização ou absoluta incompetência.

Observa-se a necessidade da Polícia mudar sua estratégia, acompanhar as


mudanças provocadas pelo tempo, entender a criminalidade mutante, planejar ações

47
Nesse contexto, os Delegados de Polícia lembraram de suas atuações junto às comarcas do
interior, quando as dificuldades de relacionamento entre os operadores de direito eram reduzidas,
pois existia maior proximidade física e informalidade na comunicação, o que trazia maior confiança e
colaboração.
48
Investimento das Organizações de Segurança Pública (Bombeiros, Polícia Civil, Militar e Guarda
Municipal): no ano de 2004 teve valor aproximado de R$ 20 bilhões. Efetivo das Polícias:
aproximadamente 600 mil policiais. A relação entre habitante/efetivo era de 355 em 2003, só no Rio
Grande do Sul. Informações atualizadas até 17.8.2004 (é uma média, pois os dados analisados foram
encaminhados pelas Secretarias Estaduais de Segurança Pública que encontraram dificuldades para
informar os dados corretamente). Fonte: Relatório baseado no Perfil Organizacional do Sistema
92

compatíveis com as necessidades do momento e trabalhar com a realidade. O


quebra-cabeça do crime, muito mais organizado que se pensa e muito mais
desconhecido do que se imagina (SOUZA, 2006)49.
Azevedo (2006) destaca que no âmbito da Segurança Pública impõe-se
melhor preparação das polícias, investimento em inteligência para atuar contra o
crime organizado, lavagem de dinheiro e combate à corrupção policial. No âmbito do
Sistema de Justiça Criminal, deve haver um enfrentamento mais eficaz contras as
altas taxas de impunidade, morosidade e seletividade da Justiça, bem como da
precariedade do Sistema Prisional.
Para Soares, conforme refere Adorno (2000a), a melhoria dos serviços
policiais bem como o controle da impunidade quer nos casos de envolvimento de
policiais com o crime, quer com a corrupção ou com o uso abusivo da força física,
contribuem para reduzir as taxas de sub-notificação dos registros de crime, para
aproximar o cidadão das agências policiais e para agilizar as investigações. A partir
daí, deve haver um aumento da confiança dos cidadãos na polícia, conferindo-se
legitimidade às instituições de controle da ordem pública. Para tanto, Soares indica
três fórmulas: moralização institucional, tecnologia e modernização do aparelho
policial e agilização das investigações.
Adorno (2000a) destaca:

Nacional de Estatísticas de Segurança Pública e Justiça Criminal (SINESPJC). Disponível em:


<www.mj.gov.br./segurançapublica/estatística/recursos organizacionais/efetivo das Polícias>.
49
Souza (2006) descreve como o PCC (Primeiro Comando da Capital) bradou, no dia 31 de agosto,
comemorando a data de seu aniversário em várias prisões: “Tem que matar Juiz! Tem que matar
Promotor! Tem que matar Polícia!”. Interpretando essas manifestações, ele entende que: “A
seqüência hierárquica dos representantes dos órgãos de persecução penal foi rigorosamente
obedecida. E decretando simbolicamente a morte de Magistrados, membros do Ministério Público e
da Polícia, o PCC preocupava-se em vender a imagem da constituição de uma ordem paralela, sem
precedentes, capaz de perturbar agentes do Estado dia e noite. E o Estado, lento, pesado,
burocrático, demorou para ensaiar uma reação. Gastou muito tempo brigando entre si, disputando
isonomia salarial, engalfinhando-se para definir quem manda no inquérito policial e determina ou
preside investigações, e reclamando de uma posição considerada olímpica demais entre os
Magistrados – os quais, por sua vez, argumentavam que a distribuição da justiça passa por
exigências nem sempre compatíveis com certas maneiras de ser das outras instituições. Em vários
momentos, a sociedade assistiu com perplexidade essa queda de braço, que arrancou aplausos do
crime organizado a ponto de semear a discórdia entre os que têm a obrigação, por dever de ofício,
de combatê-lo. Mas os briguentos institucionais não se importam muito. Afinal, dizem, o povo é leigo,
e como tal deve engolir, sem maiores reclamações, as pílulas amargas das doutrinas e dos dogmas.
A teoria tripartite da repartição dos Poderes faria Montesquieu remexer ossos na tumba, num País
onde o Executivo legisla abundantemente, por força de decretos e o Legislativo investiga, através de
Comissões de Inquérito, cujo único destinatário só pode ser, de início, o Ministério Público. Ao
Judiciário, naturalmente, cabe executar. O que o Estado não faz, na maioria das vezes, o crime já
está fazendo”.
93

Aparentemente simples, o programa envolve, em verdade, o enfrentamento


de fortes obstáculos políticos e administrativos. Em primeiro lugar, a
moralização institucional envolver uma política agressiva de combate e de
controle da corrupção que contempla múltiplas medidas, desde a punição
rigorosa dos agentes envolvidos até o recrutamento de novos quadros de
policiais cuja formação ética os torne quase imunes aos apelos financeiros
oferecidos pelo mercado ilegal de drogas, de armas e do crime em geral [...]
o próprio quadro político com suas redes e alianças parece poderoso
dissuasor da moralização institucional. Do mesmo modo, o processo de
modernização e de aplicação de tecnologia aos serviços e às rotinas
policiais enseja intervenção governamental na área referente à produção de
informações. Sabe-se o quanto policiais, quer civis quer militares, são
ciosos desse monopólio. Argumentam, com freqüência, o caráter sigiloso
das investigações para evitar transparência e acesso público. Em verdade,
sabem também o quanto o controle público das informações retira-lhes
autonomia e se presta a uma sorte de accountability da atividade policial,
desestabilizando as práticas convencionais de policiamento repressivo e faz
funções judiciais da atividade policial. No limite, esse afeta os interesses
locais, em particular os negócios ente policiais e bandidos. A melhoria das
investigações esbarra no terreno da autonomia dos agentes policiais.
Policiais civis se recusam consensualmente ao controle externo de suas
atividades. Essa recusa tem sido fundada no peso histórico de nossa cultura
jurídica, notadamente a influência das tradições inquisitoriais que marcam o
direito penal brasileiro. Estudos demonstram o quanto o inquérito policial é
lugar de arbítrio e de abuso de poder. A ausência de controle faculta às
autoridades policiais ampla discricionariedade na seleção das ocorrências
que podem ser objeto dos mais distintos interesses.

4.4 DO MINISTÉRIO PÚBLICO

Com a pretensão de ter conseguido aclarar os papéis das Polícias em nosso


Estado, passa-se, agora, a tratar, ainda que de forma resumida, a instituição do
Ministério Público.
A Constituição Federal estabelece em seu artigo 127: “O Ministério Público é
instituição permanentemente essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-
lhe a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e
individuais indisponíveis”. É um órgão do Estado e não de Governo e muito menos
atrelado ao Judiciário ou Executivo.
Soares (2006d) ressalta que se o Executivo abdica de assumir a
responsabilidade na área da Segurança Pública, dificilmente o Legislativo encontrará
ambiente para negociação adequada de matérias tão sensíveis. O Judiciário só age
no Brasil por provocação. Sobra, além da Sociedade Civil, o Ministério Público como
94

fonte alternativa de iniciativa, visando alterações legais e adoção de projetos


positivos na direção adequada50.
A análise de sua cultura organizacional, do Ministério Público, é
imprescindível no contexto do tema investigado.
Machado (2007) alerta que as pesquisas sobre o Ministério Público, sob o
enfoque das Ciências Sociais, foram iniciadas no Brasil somente a partir de meados
da década passada, na esteira das primeiras investigações sócio-jurídicas sobre o

50
Carneiro (2006), ao contrário, reportando-se a denúncias noticiadas pela mídia contra Promotores
de Justiça, acredita que a instituição vem perdendo sua credibilidade perante a sociedade brasileira.
Cita que, em 2000, o Procurador-Geral do Ministério Público de Minas Gerais, Márcio Decat Moura,
estaria envolvido com a “máfia do jogo”. Numa gravação interceptada, o intermediário oferecia
propina mensal de R$ 100 mil ao ex-superintendente administrativo do Ministério Público que
recusou, sob alegação de que “o chefe exigiu mais”. Decat foi apontado como amigo pessoal do
então ex-governador de Minas, Newton Cardoso, motivo pelo qual teria sido nomeado pelo
Governador Itamar Franco, mesmo sendo o menos votado em listra tríplice apresentada pela
instituição (Bragon, R. Denúncia contra Procurador-Geral abre crise no MP. In: Jornal Folha de São
Paulo, p. A14, 29 set. 2002). Em 2002, o Procurador-chefe do Tocantins, Mário Lúcio Avelar, foi
exonerado vez que participou ativamente da Operação Diamante da Polícia Federal que comprovou
desvios de vultosos numerários da Superintendência de Desenvolvimento da Amazônia (SUDAM),
sendo R$ 1,3 milhão encontrado no cofre de Jorge Murad, genro do ex-presidente José Sarney
(Krunk, G. Procurador-Chefe do Tocantins é exonerado. In: Jornal O Estado de São Paulo, p. A12, 21
nov. 2002). O Procurador-Geral da República, Geraldo Brindeiro, afastou aquele Procurador da
República. Na conhecida “Operação Anaconda” da Polícia Federal, as investigações, que eram
sigilosas, foram divulgadas ao público. Sua estrutura operacional era composta por Juízes,
Promotores, Advogados, Empresários, Políticos, Policiais, etc. O “modus operandi” consistia em
orientar os criminosos para que produzissem brechas nos inquéritos policiais, que poderiam ser
utilizadas pelos Advogados e pelos Juízes Federais para beneficiá-los. A sua base operacional era
em São Paulo com ramificações no Pará, Alagoas e Rio Grande do Sul. A investigação apontou que
o Subprocurador Geral da República, Antonio Augusto César, teria recebido UU$ 15 mil, sendo
investigado como integrante da quadrilha (Macedo e Diamante. Anaconda chega a Subprocurador da
República. In: Jornal O Estado de São Paulo, p. A4, 6 nov. 2003; Macedo e Corsalette. Livro Caixa de
‘Quadrilha’ Cita Subprocurador. In: Jornal O Estado de São Paulo, p. A9, 20 nov. 2003; Vasconcelos
e Valente. Subprocurador aconselhou a forjar prova. In: Jornal Folha de São Paulo, p. A 11, 25 jan.
2004; Diamante e Macedo. PF quer que procuradores sejam investigados. In: Jornal O Estado de São
Paulo, p. A9, 3 dez. 2003). Para referido autor, as relações entre crime organizado com Autoridades
Judiciárias e integrantes do Ministério Público fez com que surgissem litígios entre instituições
pertencentes a distintos entes federados. O Procurador de Justiça Antonio Carlos Amâncio Pereira
denunciou ao Ministério Público Federal que a Administração do Ministério Público Estadual tudo
manipulava para burlar as leis, tendo sua Corregedoria arquivado diversos processos instaurados
para apurar atos ilícitos praticados por seus membros. Naquela oportunidade, também foi feita
denúncia de ato de corrupção envolvendo Oliveira Filho, Procurador-Geral, no sentido de que não
havia realizada qualquer medida para apurar os fatos relatados pelo Grupo de Repressão ao Crime
Organizado que denunciou atos do presidente da Assembléia Legislativa (Carvalho, LM Procurador
denuncia chefe do MP Capixaba. In: Jornal Folha de São Paulo, p. A10, 11 abr. 2003). O autor vai
além, destacando que os crimes de homicídio e sexuais, praticados por Promotores, passaram a
integrar o cotidiano brasileiro (Godoy, M. Promotor é acusado de abuso sexual de menina. In: Jornal
O Estado de São Paulo, p. C6, 7 fev. 2004). Abusos funcionais, que teriam sido cometidos durante
investigações, levaram ao afastamento de José Carlos Blat, Promotor de Justiça do Grupo de
Atuação Especial e Repressão ao Crime Organizado (GODOY, M. Denúncia afasta Blat de Grupo
Anticorrupção. In: Jornal O Estado de São Paulo, p. C1, 18 fev. 2004). Por fim, conclui que o
Ministério Público possui um passado suspeito, somados aos atuais abusos e desmandos de alguns
de seus integrantes, não justificando o discurso de que seus integrantes são os únicos “paladinos da
lei” e capazes de combater o crime. Nessas alegações, percebe-se um exagero, pois a corrupção e a
criminalidade são males que decorrem da própria natureza dos homens.
95

Sistema de Justiça. Poder Judiciário e Polícias foram as primeiras a serem objeto de


análise51.
No mesmo sentido, Dias (1997) refere que o Ministério Público foi a última
instância de controle a suscitar o interesse sistemático da Criminologia e da
Sociologia.
Para garantir a fiel execução dos mandamentos constitucionais (defesa da
ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais
indisponíveis), a Carta Magna conferiu aos membros do Ministério Público
determinados direitos e garantias. Suas principais prerrogativas são:
a) Inamovibilidade: é a impossibilidade de remover compulsoriamente o titular
de seu cargo, salvo por motivo de interesse público (na defesa da sociedade e da
própria Instituição), quando deverá ocorrer mediante decisão tomada por dois terços
do órgão colegiado competente, fundamentada por razões que autorizem o sacrifício
da garantia constitucional, assegurada ampla defesa (art. 128, I, b/CF);
b) Vitaliciedade: para os vitalícios, a perda do cargo só pode decorrer de
sentença judicial transitada em julgado, tanto cível como penal; não mais se admite
a perda do cargo por mera decisão administrativa. A LONMP previu a perda do
cargo do membro vitalício do Ministério Público, nos seguintes casos: a) prática de
crime incompatível com o exercício do cargo, após decisão transitada em julgado; b)
exercício da advocacia; c) abandono do cargo por prazo superior a 30 dias corridos;
c) Irredutibilidade e isonomia de vencimentos;
d) Independência funcional: constitui-se na ausência de subordinação
intelectual de cada agente, havendo substituição, o novo titular poderá agir e opinar
diferentemente do antecessor, no mesmo grau ou em recurso. A opinião pessoal de
cada um tem que ser respeitada, sem que o membro seja obrigado a contrariar sua
convicção quando atue. Cada agente (desde o Promotor substituto até o Procurador-
Geral) só está vinculado ao imperativo da lei e de sua consciência, esteios que dão
sustentação à independência funcional, não podendo receber ordens ou
recomendações de caráter normativo, quando de suas manifestações, para agir

51
Pesquisa realizada em 2006 (SCHNORRENBERGER et al., 2006) permitiu identificar valores que
compõem a ideologia central do Ministério Público, a qual representa a base para o fortalecimento de
sua cultura organizacional: Independência, Compromisso Social, Iniciativa, Integridade,
Competência, Coragem, Democracia e Unidade. Identificou-se, igualmente, os valores a serem
reforçados ou internalizados para que o Ministério Público se mantenha atualizado às novas
demandas que se apresentam: Unidade, Efetividade e Transparência. Conforme Schnorrenberger
96

deste ou daquele modo. Os membros do Ministério Público só se sujeitam ao


controle de órgãos superiores e diretivos da Instituição (Procuradoria-Geral da
Justiça, Colégio de Procuradores, Conselho Superior do Ministério Público e
Corregedoria-Geral do Ministério Público), na sua conduta administrativa ou nos
seus atos pessoais que afrontem a probidade e o decoro que se exigem de todo
agente público.
e) Foro por prerrogativa de função.
Assim como as prerrogativas, advieram vedações constitucionais com o
escopo de garantir aos agentes ministeriais a indispensável isenção e conseqüente
credibilidade. São elas a proibição de exercer, ainda que em disponibilidade,
qualquer outra função, salvo uma de magistério; de receber, a qualquer título,
honorários, percentagens ou custas processuais; de exercer a advocacia; de
participar de sociedade comercial, exceto na condição de acionista ou quotista; de
exercer atividade político-partidária, salvo exceções previstas em lei.
Os integrantes e as atividades do Ministério Público estão sujeitos a controle
interno e externo. O controle interno é exercido por órgãos colegiados com
atribuições legais. Os inquéritos no campo criminal, se arquivados contrariamente à
posição do Juiz, são submetidos ao controle do Procurador-Geral de Justiça. Se
houver desídia, o controle do cidadão é legitimado. Os inquéritos no campo civil, se
arquivados, são reexaminados pelo Conselho Superior. Os relatórios de suas
atividades devem ser encaminhados trimestralmente à Corregedoria-Geral para
análise. Suas contas são submetidas ao Tribunal de Contas. O concurso para o
ingresso na carreira tem o controle da OAB, que indica um de seus componentes
para a banca examinadora. O chefe da instituição se sujeita ao um processo de
destituição. Como órgão público está sujeito ao controle popular.
Em 2003, através de uma pesquisa sobre plano estratégico do MP/RS,
constatou-se a importância do Ministério Público, como catalisador de demandas
sociais e indutor de políticas públicas, em diálogos com os poderes e entidades
municipais e estaduais52. Dentro da área de ações institucionais abordou a
necessidade de aperfeiçoamento e fortalecimento das premissas orientativas para

et al., (2006) os valores representam a base da cultura de uma organização, conferindo sentido de
identidade e significado às pessoas que nela trabalham.
52
No primeiro semestre de 2003, buscou-se um diagnóstico organizacional e, posteriormente, uma
visão de futuro, com o objetivo de orientar o biênio 2003/2005. A metodologia deu-se através de
pesquisa-consulta junto à intranet, bem como realização de seminário de planejamento estratégico.
97

atuação dos Promotores e Procuradores de Justiça com ênfase na adoção de nova


postura de gestão.
Em 2005, é feita uma nova pesquisa intitulada ”Ministério Público Gaúcho:
quem são e o que pensam os Promotores e Procuradores de Justiça sobre os
desafios da política criminal”53. Na ocasião, houve várias manifestações nas
entrevistas, reconhecendo problemas no trato com Promotores e Polícias Civis e a
necessidade de maior aproximação entre eles.
Em 2006, o Ministério da Justiça elaborou um diagnóstico do Ministério
Público em cada unidade da Federação54. Na ocasião, foi solicitado que os
entrevistados qualificassem seu relacionamento com uma série de instituições,
conferindo nota de 0 a 10, sendo 0 ruim e 10 excelente. Na região Sul, o resultado
foi: com Poder Executivo local: 6,5; Poder Legislativo: 6,3; Políticos da oposição ao
governo local: 6,0; MPF/MP Trabalho: 6,6; Procuradoria-Geral de Justiça: 8,7; Poder
Judiciário: 8,3; Polícia Civil: 6,6; Polícia Militar: 7,4; Polícia Federal : 6,8; Defensoria
Pública: 6,4; Imprensa: 6,9; Igrejas: 6,4 e ONGs/Associações: 6,555.
Alguns comentários dos entrevistados foram selecionados:

“O Ministério Público precisa urgentemente capacitar seus Promotores e


Procuradores em gestão. Afinal, como agentes políticos, nosso papel não se resume
a atuar apenas nos processos, mas sim e, principalmente, na efetivação dos direitos
sociais e individuais garantidos na Constituição, prevenindo a ocorrência de suas
violações. O Promotor tem que saber diagnosticar, planejar, escolher estratégias,
estipular metas e, então, agir para o controle e a avaliação dos resultados
alcançados”.

53
Fruto de convênio celebrado entre o MP/RS, Grupo de Pesquisa em Violência e Cidadania e da
Fundação de Apoio à Pesquisa da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, com apoio do CNPq,
sob a coordenação de Rodrigo Ghiringhelli de Azevedo. Foram aplicados questionários a todos os
integrantes do MP/RS, com retorno de 48,5%. Foram realizadas 17 entrevistas em profundidade com
Promotores e Procuradores com atuação na área criminal.
54
Dados retratam a estrutura do Ministério Público em 2003 e 2004. Foi realizada uma pesquisa
qualitativa dos membros do Ministério Público dos Estados. Foram remetidos 11.860 questionários.
Obteve-se um total de 3.260 respostas, correspondendo a 27,5%. No Sul, de 2.2.80 associados da
Associação Nacional dos Membros do Ministério Público, houve retorno de 31,1, 83,1 que
encontravam-se em atividade e 16,9 eram aposentados, 81,1 eram Promotores e 18,9 Procuradores,
sendo 36,8 Promotores da capital e 63,2 do interior.
55
Fonte: SRJ (Secretaria da Reforma do Judiciário), 2006.
98

“Na década em que nos encontramos, é imprescindível à atuação dos


Ministério Públicos, a integração informatizada entre si, e com demais órgãos
públicos nas três esferas de Governo, para aperfeiçoamento e agilização das
funções. O acesso às informações é de fundamental importância à atuação
ministerial, sendo, atualmente grande óbice a uma atuação rápida, a sua falta”.

Num trabalho de conclusão, do curso de MBA em Formação de Gestores do


Ministério Público da FGV (2006)56, buscou-se a “Identificação dos valores da
ideologia central do Ministério Público do Rio Grande do Sul”. A partir do estudo
identificaram-se como valores marcantes do Ministério Público do Rio Grande do
Sul: Compromisso Social, Independência, Unidade, Democracia, Integridade,
Coragem, Iniciativa e Competência.
Em 2007 o Ministério Público do Rio Grande do Sul realizou um evento
chamado “Gestão Estratégica do Ministério Público até 2022”, tendo por objetivo
fundamentar o Projeto de Gestão Estratégica do Ministério Público (GEMP 2022)57.
Preliminarmente, houve pesquisa de marketing realizada pela Segmento,
entre os dias 29 de junho e 23 julho de 2007, que objetivou pesquisar a imagem
percebida e as estratégias que as lideranças (Governo e Sociedade) esperam para o
Ministério Público/RS58.
Quanto à imagem do Ministério Público os pontos positivos diagnosticados
foram parceria, idoneidade, seriedade, independência, força, eficiência,
imparcialidade e suporte didático e pedagógico. Enfim, uma imagem legitimada59.

56
Autores: André Jacó Schnorrenberger, Carmem Célia Vieira dos Santos, Eliane de Mello Miranda,
Juliana Rodrigues Marques, Luciana Baggio Bortolotto e Sérgio Vasconcelos Guedes. A metodologia
utilizada foi a pesquisa bibliográfica e documental, por meio da análise de diversas publicações e
documentos referentes ao Ministério Público, bem como a realização de entrevistas com lideranças
que participaram ativamente de sua construção histórica.
57
A base metodológica do trabalho foi a Future Search, uma metodologia participativa de
planejamento e alinhamento estratégico usada em organizações, com a particularidade de permitir a
reunião de grandes grupos e deles obter consenso para a construção de um futuro comum. Para
tanto, havia 4 fases distintas: a descoberta de bases comuns do passado; o compartilhamento das
complexidades externas que impactam o nosso presente; a criação de um futuro inspirado por todos
e a ação necessária à implementação desse futuro.
58
Método adotado: qualitativo-técnico da entrevista com profundidade. Público: Formadores de
Opiniões/Líderes de diversas Instituições do Governo e da Sociedade. Amostra: 21 entrevistas: 11
(onze) representantes da Sociedade e 10 (dez) representantes do Governo. Instrumento de pesquisa:
roteiro semi-estruturado.
59
Como pontos negativos, destacaram o conservadorismo, corporativismo, divulgação de denúncias
sem comprovações, pouco contato com entidades (para buscar opinião de especialistas e da
sociedade), falta de unidade dos Promotores e o fato de deter muito poder sem controle.
99

Na ocasião, igualmente, através de questionamentos sobre as manchetes


que gostariam de encontrar sobre o Ministério Público Gaúcho em 2022, um dos
pontos foi “Poderes Integrados trabalham em prol do Rio Grande”.
Enfim, concluíram que: “A marca Ministério Público tem vitalidade para a
sociedade e para o público Governo”. A imagem do Ministério Público é muito
positiva e se caracteriza pela diferenciação de outros órgãos. Considerado como
defensor da sociedade, que está ao lado do povo, competente, eficiente, qualificado,
atuantes, idôneo, possuindo lisura nas suas ações. Antes, era visto como órgão de
punição, autoritário. Hoje, um órgão de instrução, ajuda e parceiro.
Valendo-se das palavras de Medeiros, quando analisa o combate à corrupção
e Ministério Público, é oportuno o destaque:

Muitas vezes escapa à avaliação do Ministério Público que ele não é o


único responsável, levando os seus agentes a, não raro, dispensarem
aliados com quem poderiam repartir tarefas e responsabilidades, bem como
ganhar eficiência e eficácia. Não se perceber sozinho e, então, transformar
os co-responsáveis em parceiros e aliados [...] construir parcerias e alianças
é uma imposição constitucional de compatibilização de atribuições para o
sucesso de uma empreitada desafiadora (2006, p. 69-70).

Assevera, ainda, Medeiros:

É premente que o Ministério Público, por sua envergadura constitucional,


aproxime todos os atores [...] convoque-os à ação, motive-os, impulsione os
renitentes, dê trânsito às conclusões das operações, distribua tarefas,
valorize os desacreditados, dê suporte aos fragilizados [...]. Coordenar os
diversos atores não significa, por óbvio, comando ou regência. Deve o
Ministério Público fazer com que todos, mesmo ele próprio, ajam como
integrantes de uma mesma equipe [...] com todas as engrenagens
funcionando articuladas e eficientemente. Cabe ao Ministério Público
catalisar os processos de articulação entre as diversas instâncias. Deve
congregá-las para que arestas e diferenças sejam aparadas, de modo a
haver fluxo ágil de informações e conhecimento das iniciativas, projetos e
metas uns dos outros. É imperioso que as linhas de atuação de cada um
dos atores sejam de conhecimento recíproco, e preferencialmente
justapostas, evitando-se superposições, repetições, conflitos ou vão
dispêndio de energia (2006, p. 72).

Brindeiro (2004) salienta a relevância de atuar em conjunto com outras


instituições do Poder Público e da Sociedade Civil organizada, como a Receita
Federal, Polícia Federal, Banco Central, Controladoria-Geral da União, Conselho de
Controle de Atividades Financeiras, etc.
100

Novas idéias, novas demandas, requerem novas estratégias que necessitam


de organizações compatíveis para que sejam implementadas com sucesso.
Pois, como refere Brindeiro (2004), a macrocriminalidade é a criminalidade do
futuro, mas que hoje já é tão presente.
Dessa forma, torna-se imprescindível o estudo sobre a macrocriminalidade
para a compreensão da necessidade da criação da Força-Tarefa.
101

5 DA MACROCRIMINALIDADE

A prática do crime é tão antiga quanto a própria humanidade. Mas o crime global, a formação de
redes entre poderosas organizações criminosas e seus associados, com atividades compartilhadas
em todo o planeta, constitui um novo fenômeno que afeta profundamente a economia no âmbito
internacional e nacional, a política, a segurança e, em última análise, as sociedades em geral.
Manuel Castells

O presente capítulo busca conceituar o crime organizado, e demonstrar


como, efetivamente, ele vem numa crescente, com a participação de criminosos
cada vez mais fortalecidos e, a contra-senso, com as instituições encarregadas de
combatê-los, enfraquecidas, a partir do conhecimento acerca da realidade do
Sistema de Segurança Pública, que se apresenta débil, e do Sistema de Justiça
Criminal, que se apresenta ineficiente, desaparelhado e voltado apenas para o
combate aos crimes individuais.
O Sistema de Segurança Pública e Justiça Criminal apresenta-se
reproduzindo modalidades de ação herdadas da tradição, que não dão conta das
exigências de controle social, próprias da sociedade caracterizada por formas
coletivas de organizações criminosas. Para tanto, faz-se referência à Comissão
Parlamentar de Inquérito (CPI) do Narcotráfico, instalada no Estado, em 2002, que
concluiu pela existência de diversos focos de crimes organizados no Rio Grande do
Sul. Procura-se demonstrar a dificuldade na investigação do crime organizado e a
necessidade de se ter, nos processos penais, que têm como alvo a
macrocriminalidade, um procedimento diferenciado, a começar pelas investigações.
Nesse domínio o crime organizado afeta a economia, a política e a sociedade
em geral.
“[...] ‘Crime Organizado’ é uma palavra-performance que habita nosso
imaginário como uma espécie de entidade mitológica, uma esfinge que demanda
‘decifra-me ou te devoro” (MUNIZ, 2007, p. 2).
102

Bezerra Santos (2007) defende que o Brasil deve acatar as recomendações


da Convenção de Palermo, da qual é signatário, para melhor tipificar o conceito:

Convenção das Nações Unidas Contra o Crime Organizado Transnacional:


Artigo 1: Objetivo: O objetivo da presente Convenção consiste em promover
a cooperação para prevenir e combater mais eficazmente a criminalidade
60
organizada transnacional. Artigo 2: Terminologia : Para efeitos da presente
Convenção, entende-se por: a) “Grupo criminoso organizado” – grupo
estruturado de três ou mais pessoas, existente há algum tempo e atuando
concertadamente com o propósito de cometer uma ou mais infrações
graves ou enunciadas na presente Convenção, com a intenção de obter,
direta ou indiretamente, um benefício econômico ou outro benefício
material.

Já há algum tempo, tem-se constatada a transformação do perfil dos


criminosos: revelam-se mais ousados e especializados, utilizando-se de recursos
sofisticados, como armas pesadas, redes de informações, centrais telefônicas e
informantes infiltrados nos mais diversos setores da vida social.
Em 1975, durante a “V Semana Internacional de Criminologia”, em São Paulo,
surgiu a referência sobre “crime organizado”. Parecia um assunto do outro mundo,
uma etapa a qual nunca chegaríamos, porque jamais se permitiria aos criminosos
essa possibilidade de evolução no crime. Subestimou-se o adversário e o tempo
demonstrou que o erro de avaliação na projeção do futuro seria fatal conforme
lembra Souza (2002).

5.1 DO DESENVOLVIMENTO DA CRIMINALIDADE ORGANIZADA NO BRASIL

Como ressalta Zaluar:

ainda não se fez, no Brasil, uma história do crime organizado, desde aquele
que sempre presidiu a legalização da propriedade fundiária até o mais
recente, do tráfico de drogas, que tornou as redes mais extensas, mais
globais e muito mais difíceis de serem controladas (2004, p. 346).

[...] Apenas nos últimos anos as investigações policiais e dos promotores e


procuradores do Estado permitiram começar a levantar o véu que encobria
a crucial participação de políticos, empresários e negociantes em diversos

60
Convenção das Nações Unidas Contra o Crime Organizado. Disponível em:
<http://bvc.cgu.gov.br>.
103

esquemas de lavagem do dinheiro fruto da corrupção ou de negócios


escusos, o véu que afirmava a correlação entre pobreza e criminalidade,
sem entender a complexidade dos processos de interconexão das várias
atividades ilegais de personagens com diferentes origens sociais (ZALUAR,
2004, p. 346-347).

A violência urbana sempre foi apresentada como ação de pequenos e médios


habitantes, geralmente pobres e moradores de favelas. Zaluar (2004) procurou
desconstituir esse estereótipo cristalizado nos discursos da direita e da esquerda.
Na direita, os criminosos eram os verdadeiros culpados por estarem encarcerados,
Na esquerda, eram vítimas de um sistema ineficaz que fazia deles homens
violentos. Não se relacionava violência entre os jovens pobres e a transformações
nas formas de criminalidade que se organizavam em torno do tráfico de drogas e do
contrabando de armas. Essa atitude deixou o caminho livre para o crime organizado
e acabou por abalar a noção de civilidade. Um dos grandes problemas no Brasil se
deu na recusa dos brasileiros em aceitar que as novas formas de associação entre
criminosos que estavam mudando o cenário da criminalidade, economia e política do
país. Além disso, o regime militar no Brasil contribuiu para que o crime organizado
se espalhasse com rapidez pelo Brasil nos anos e 1970.
Comparando a Máfia Italiana com o crime organizado no Brasil, Zaluar (2004,
p. 347) destaca: “Portanto, lá como cá, também foram os bandidos pobres e pouco
importantes que sempre pagaram na prisão os crimes dos ricos ainda tão impunes”.
Ao utilizar a comparação histórica, com base na obra de Salvadore Lupo, a
autora procurou ressaltar que a máfia nunca foi fenômeno rural, tradicional e de
ordem pública na Sicília, mas sempre esteve conectada com o controle ilegal ou
ilegítimo de mercados, contratos e negócios, tendendo ao monopólio econômico e à
vitória eleitoral garantida.
No final dos anos 70, chefes sicilianos como Buscetta e Badalamenti
adquiriram poder internacional, transferindo dinheiro do Novo para o Velho Mundo
pelos canais bancários, principal pista seguida pelo Juiz Falcone. Em 1984,
Badalamenti encontrava-se no Rio de Janeiro e telefonou para os Estados Unidos
afirmando que “a eles cabia o tráfico de heroína”. Também no Brasil, Buscetta foi
preso e interrogado, justo no momento em que se registrava a ascensão das taxas
de homicídio no Brasil e se iniciava as gangues armadas nas favelas do Rio de
Janeiro e de outras cidades brasileiras.
104

No Brasil, o Comando Vermelho, também conhecido como “Falange


Vermelha”, foi criado em 1979, no Rio de Janeiro, a partir do convívio dos presos
políticos, que combatiam a ditadura militar implantada no país, com os presos
comuns. Foi a partir do CV que o Brasil entrou definitivamente na rota das drogas,
trazendo também armamentos pesados e sofisticados. Os presos políticos
aprenderam sobre assaltos a bancos, violência sexual, assassinados, tóxicos e
jogos. Os presos comuns receberam aula de política, comportamento grupal e
organização coletiva. O Primeiro Comando da Capital (PCC) começou a funcionar
por volta de 2002 e, atualmente, controla cerca de 30 mil detentos. O maior rival do
PCC é o Comando Democrático pela Liberdade (CDL), facção que surgiu em 1996,
em São Paulo. O Terceiro Comando (TC) nasceu nos anos 80, como dissidente do
CV, e atua no Rio de Janeiro. A Facção Amigos dos Amigos (ADA) foi fundada em
1998. As facções CV e TC já chegaram à internet. Há um link encontrado numa
página do CV para um site em português e com endereço brasileiro da FARC
(Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia), grupo guerrilheiro aliado de
algumas facções brasileiras. As facções criaram sites, contas de e-mail e fizeram
registro no ICQ (programa de bate-papo em tempo real), para envio e recebimento
de mensagens. Não há dúvidas de que a proliferação das facções criminosas é
resultado da má administração e da precariedade do sistema prisional. É como se
fosse um acordo informal entre Governo e presos: o Estado permite regalias e faz
vistas grossas, isso em troca de paz. É um modelo que permite a criação das
facções (RUWEL, 2001).
Referindo-se ao PCC, Souza (2002) salienta que:

[...] eles montam uma central telefônica. Estruturam uma equipe de


advogados. Fazem negócios com empresários, traficantes que costumam
apresentar-se como respeitáveis senhores. Corrompem funcionários e tudo
o que é proibido entra na prisão. E, cumprindo pena, comandam seus
negócios criminosos normalmente, agenciam assassinatos e planejam
vinganças. A organização foi estruturada com a criação de um estatuto,
pactos firmados, catequização de adeptos e compromissos irreversíveis de
união. A organização decidiu financiar cursos de direito para jovens
adeptos, sob juramento de que, no futuro, eles seriam os sempre
disponíveis advogados do grupo.

Tem-se, como afirma Zaluar (2004), que desde 1980, quando começou a se
expandir e a se consolidar o negócio do tráfico, ele sempre foi comandado por
homens jovens que jogavam nos dois tabuleiros: o do poder e o do negócio. O que
105

mudou, no final de 1980, é que o negócio passou a ser comandado por designação
dos conselhos, que se encontravam dentro e fora das prisões, portanto, fora da
favela.
Nesse contexto de corrupção, as Instituições do Sistema de Justiça acabaram
contaminadas. Passa-se a notar a forma diferenciada no agir da Polícia Militar e da
Polícia Civil no tocante às suas relações com os “pobres e ricos”. No dizer de Zaluar
(2004, p. 359 ): “Há, sem dúvida, uma polícia para os pobres e uma polícia para os
ricos, o que foi reforçado durante o regime militar”.
Já existem registros pelo país afora de conexões entre traficante e políticos
via financiamento de campanhas eleitorais, além do tráfico de influências,
comprovando como os traficantes conseguiram penetrar nas várias organizações
governamentais e voluntárias.
Considerando-se as abordagens da Sociologia das Organizações, nesse
contexto, pode-se verificar como a teoria de Weber acerca do “monopólio legítimo da
violência pelo Estado” faz parte dessa realidade. No momento em que esse
monopólio mostrou-se falível, os traficantes (mafiosos) passaram a exercer o lugar
do Estado, enfraquecendo, sobremaneira o Sistema de Segurança Pública e Justiça
Criminal.

5.2 DA MACROCRIMINALIDADE ATUAL

Adorno (2002d) esclarece que as mudanças na sociedade e nos padrões


convencionais de delinqüência e de violência foram acompanhadas com uma
aceleração de mudanças jamais conhecidas e experimentadas, com novas formas
de acumulação de capital e de concentração industrial e tecnológica, modificações
nos processos de produção e nos processos de trabalho, promovendo deslocamento
nas relações dos indivíduos entre si, dos indivíduos com o Estado e entre diferentes
Estados.
Naím (2006) lembra que a globalização também teve seu lado negro: redes
mundiais de comércio ilegal de armas, drogas, órgãos humanos, bens falsificados,
terrorismo, lavagem de dinheiro, etc. São contrabandistas e traficantes com
capacidade de operar no plano global. O crime organizado é o outro lado da moeda
106

da globalização. Isso deixa de ser simples questão criminal, diz respeito a uma nova
forma de política no século XXI. Os criminosos estão cada vez mais fortalecidos e as
instituições encarregadas de combatê-los, enfraquecidas.
A CPI do Narcotráfico de 2002 constatou a existência de vários focos de
crime organizado no Rio Grande do Sul61:

Crime Organizado e Narcotráfico: o delito organizado de maior destaque,


quer nas denúncias do “disque-denúncia”, quer nos depoimentos das
testemunhas é o do narcotráfico. Ele se organiza em todo o Estado,
provindo, fundamentalmente, a maconha do Paraguai e a cocaína da Bolívia
e da Colômbia. Na grande Porto Alegre destacam-se três nomes apontados
como traficantes, sendo que um deles predomina o tráfico dentro do
presídio. Vários nomes são apontados nas cidades do interior, sendo que
na cidade de Passo Fundo houve a ação da Força-Tarefa e CPI, obtendo-se
resultados animadores. Crime Organizado e Tráfico de Armas: há
indicativos que Aceguá, no RS, é conhecido como local de ingresso de
armas, como AR-15, Uzi, AK-44. Após, seriam negociadas por tóxicos.
Crime Organizado e Roubo de Cargas: o roubo de cargas é sério
porquanto implica, em numerosos casos, no crime de latrocínio. Em maio
ocorreu um assalto a um caminhão em Montenegro, da Transportadora
Benfica, transportando aparelhos de ar-condicionado da empresa Sulvan. O
fato foi investigado pela Força-Tarefa. Os policiais conseguiram o mandado
judicial naquela comarca e fizeram a operação. Foi deslocada uma equipe
por três Estados, fazendo 4.700 Km, conseguindo identificar uma quadrilha
de 20 elementos que foram responsáveis pelo assalto ao caminhoneiro,
pela receptação e pela venda dessa carga, que acabou sendo recuperada.
Crime Organizado e Roubo de Caminhões e Outros Veículos: o furto ou
o roubo de veículos está estreitamente relacionado com o tóxico. Dessa
forma, assume forte relevo o esquema da transformação do veículo furtado
em moeda para que esta possa comprar tóxico. São vários os desmanches
existentes no Estado, segundo informações, e o controle sobre eles é
praticamente inexistente. O Crime Organizado e a Polícia: o número de
policiais envolvidos em corrupção é uma preocupação do Estado. Os fatos
ocorridos e os resultados obtidos em Passo Fundo, em Canoas, na Defrec
e, recentemente, em Bagé, na exitosa operação da Polícia Federal, onde
havia conivência e envolvimento de agentes públicos, são indicativos da
existência de crime organizado dentro das instituições do Estado, com
infiltração e conivência com a máfia. Crime Organizado e Lavagem de
Dinheiro: estabelecimentos comerciais são fachadas para a lavagem do
dinheiro, cuja finalidade principal é lavar o dinheiro oriundo do crime
organizado. Há denúncia de envolvimento de bingos na lavagem de dinheiro
no Vale dos Sinos e de revendas de automóveis e caminhões. Do Crime
Organizado e o Jogo do Bicho: o jogo do bicho, embora constitua
contravenção penal, motivo pelo qual estaria afastado do crime organizado,
enquanto fato isolado, é instrumento para a corrupção quer de Policiais
Civis, quer de Brigadianos. O Crime Organizado e os Camelôs: pelos
elementos trazidos pelo Secretário Municipal de Porto Alegre, existe, por
trás, uma organização dedicada ao comércio ilegal de bens oriundos do
crime.

61
Fonte: Relatório da CPI. Disponível em: <http://www.al.gov.br>.
107

A criminalidade cresceu e mudou de padrão. Conforme ressalta Adorno


(1998a, 1998b), em lugar do assaltante soturno e solitário, maneiroso, hábil no
manejo das mãos e das palavras, que pulava de telhado em telhado e que, quando
surpreendido pela Polícia, negociava sua prisão, surge o “bandidão”. Nascido na
periferia das grandes cidades, envolve-se cedo com a delinqüência, aprende com
destreza o manejo com armas, impõe, pela força, seus caprichos, estabelece seu
negócio, geralmente o tráfico de drogas, arregimentando outros pares, geralmente
mulheres e crianças. Compra proteção policial e cumplicidade, mediante o silêncio
imposto daqueles que tudo sabem mas não vêem e não falam. Não economiza
metralhadoras quando se trata de defender seus negócios e é intolerante com a
quebra da lealdade ou com a concorrência.
Bem salienta Zaluar (2004) que negar o caráter organizado da criminalidade
contemporânea é negar a história.
Não há dúvidas de que o crime se alimenta das debilidades da sociedade e
do Estado e se afirma na indiferença coletiva. Nesse contexto, quanto maior a
ineficácia do Sistema Criminal, a banalização das penas e a desmoralização das
normas jurídicas, maior acaba sendo a necessidade de atuação permanente e firme
da Justiça62 (RUWEL, 2001).
Para Castells (2003), há uma “economia do crime em rede”. A estratégia
utilizada consiste em instalar as suas funções de gestão e produção em zonas de
baixo risco, nas quais detêm um relativo controle do meio institucional, e voltar a
atenção, como mercados preferenciais, para as zonas com uma procura de elevado
nível sócio-econômico, que possam pagar mais caro. As novas organizações
criminosas internacionalizam-se, estabelecem alianças estratégicas, em vez de
competirem, numa prática muito idêntica a das multinacionais. Servem-se de
instituições financeiras legítimas de vários países para lavagem de dinheiro. O
funcionamento do sistema é assegurado pelo uso da violência num nível
extraordinário, sendo que a indústria precisa corromper Policiais, Magistrados,
Jornalistas, para poder funcionar. Assim, a formação de redes é o seu modus
operandi.

62
O crime sempre existiu e sempre existirá. Não há como acabar com ele, pois inerente a toda
sociedade, inclusive a organizada. Uma vez praticado um crime, deve-se buscar meios mais eficazes
para sua efetiva punição (RUWEL, 2001).
108

Mendroni (2002), por sua vez, salienta que as organizações criminosas


tipicamente brasileiras são aquelas especializadas em crimes contra a administração
pública, tráfico de drogas, quadrilhas de roubo de carros e de cargas, seqüestro,
lavagem de dinheiro e jogo do bicho (não considerada somente como contravenção,
pois são os banqueiros do jogo do bicho que agem empresariando cassinos
clandestinos, comprando máquinas de caça-níqueis, praticando corrupção e outros
crimes mais violentos, como ameaças, extorsões e até homicídio). Além disso, ao
contrário das nossas instituições, que apresentam graves deficiências na estrutura
(equipamentos, efetivo, salário, etc.), a organização criminosa geralmente possui
considerável quantidade de armas e equipamentos. Parte do dinheiro obtido no
crime é investido na própria empresa criminosa, na compra de aparelhos eletrônicos,
automóveis, dinheiro para a corrupção, contratação de advogados, aluguéis de
imóveis, compra de passagens, etc. – com a particularidade de, ao contrário do
poder público – não ter necessidade de obedecer aos trâmites legais.
Castells (1999c) bem analisa o processamento da macrocriminalidade,
ressaltando que o crime organizado propõe problemas novos e insolúveis a curto
prazo para a Justiça Penal. As leis penais não podem ser aplicadas do mesmo modo
que são aplicadas às modalidades delituosas cometidas pelo delinqüente comum.
Os processos penais que têm como alvo a macrocriminalidade ensejam
procedimentos diferenciados, a começar pela investigação. Em primeiro lugar,
porque a natureza das operações é pouco conhecida, envolve uma rede de atores,
situados em múltiplos pontos da estrutura social, com funções extremamente
diferenciadas. Ademais, tudo funciona à base do segredo, da conhecida “lei do
silêncio”, cuja transgressão é severamente punida63. Com isso, dilui-se a

63
Delegados, Juízes e Promotores, em pesquisa realizada por Pinheiro (1999), de forma unânime,
confirmaram a dificuldade de encontrar pessoas dispostas a testemunhar em investigações e
processos criminais não só na Polícia, como em Juízo. O principal motivo seria o descrédito nas
instituições do Sistema de Justiça Criminal e o medo de retaliação dos acusados, de seus familiares
ou amigos e associados, em que pese a existência do PROTEGE. O Estado do Rio Grande do Sul foi
pioneiro em legislação de proteção a vítimas e testemunhas ao promulgar, em 20 de janeiro de 1999,
a Lei Estadual n. 11314 que dispõe sobre proteção, auxílio e assistência a vítimas de violência. O
Programa Estadual de Proteção, Auxílio e Assistência a Testemunhas Ameaçadas - PROTEGE - foi
instituído em maio de 2000, pelo Decreto n. 40027/2000, tendo como suporte a Lei Federal
9807/1999. O objetivo é assegurar a integridade física e psicológica e a segurança de testemunhas,
bem como de seus familiares que estejam sendo coagidos ou expostos à grave ameaça em razão de
terem presenciado ou indiretamente tomado conhecimento de atos criminosos e detenham
informações necessárias à investigação, desejando colaborar com as autoridades competentes ou
com o processo judicial. O programa auxilia no combate à criminalidade, incentivando a realização de
denúncias e derrubando a "lei do silêncio" - quando não há informação por medo de represálias -
mentora da impunidade. Em 2003, o programa Polêmica da Rádio Gaúcha de Porto Alegre-RS
109

materialidade da infração – a qual somente pode ser objeto de intervenção judicial


caso perfeitamente caracterizada sob o ponto de vista das exigências legais –, bem
como se dilui a precisa identificação da responsabilidade penal. Difícil também é
estabelecer uma relação de causalidade, um nexo entre a materialidade da infração
e seus possíveis autores. Na maior parte das vezes em que se consegue apurar
autoria e materialidade, geralmente trata-se dos agentes “operacionais”, não
resultando na desmontagem de toda organização, que se recompõe em outros
lugares e com novos recursos.
A capacidade de modernizar suas ações, diversificar suas atividades, sem
deixar rastros, resulta em uma ampla gama de operações. Além disso, muitos
desses criminosos possuem respeitada imagem frente à sociedade, utilizando-se de
“empresas de fachada”, de “empresas fictícias”, através de “laranjas” e de “testas-
de-ferro”, restando intocáveis caso descoberta a trama. De tempos em tempos essa
estrutura é modificada, mudando as empresas e removendo pessoas para outros
postos, enfim, modificando seu modus operandi e dificultando a descoberta da
autoria. Na maioria das vezes, esses criminosos possuem condições financeiras
para ter a sua disposição empregados especializados, equipamentos de última
geração, moderna tecnologia, gama enorme de conexões com outros grupos
criminosos e rede de ligações com quadros oficiais da vida social, política e
econômica da comunidade. Seu alto poder de corrupção faz com que funcionários
do Estado participem da organização. A estrutura que possui facilita sua atuação em
diversos locais do mundo, dificultando seu rastreamento. Geralmente, a investigação
leva meses e implica alto custo o que, efetivamente, prejudica a atuação do
Estado64.

realizou um debate sobre “Você denunciaria um traficante?”, com a participação dos Promotores das
Varas do Júri de Porto Alegre. Na ocasião, de 157 participantes, 2/3 (67,67%) responderam
negativamente (o motivo não foi questionado).
64
Castells (1999c) exemplifica: Comércio de drogas: opera de forma mais ágil e menos rastreável.
Cita o Brasil como integrante de novas rotas do comércio das drogas de festa (como o ecstasy)
apresentando índices de dependência sem precedentes (conforme o Escritório de Crime e de Drogas
das Nações Unidas – UNDCP – 2004); Contrabando de órgãos: rins humanos de doadores vivos
transportados do BRASIL para a África do Sul. No Brasil, a venda de um rim tornou-se forma comum
de ganhar dinheiro, principalmente para jovens. A taxa no mercado raramente ultrapassa 10 mil
dólares; Contrabando de armas: há mercado de armas ilegais bem como a transferência de
tecnologia. Uma batida policial em 2002, em São Paulo, fechou uma oficina tecnicamente avançada
que produzia cerca de 50 submetralhadoras falsificadas por mês; Pirataria: Inovações e ferramentas
oriundas da globalização transformaram-se em indústria global; Tráfico humano: os recrutadores
ganham cerca de 500 dólares “por cabeça”. Mulheres passam anos como escravas sexuais, sujeitas
a tratamento desumano, até seu corpo exaurir. No Japão, geralmente as meninas são oriundas do
Brasil; Falsificação de medicamentos: por empresas brasileiras que quebraram as patentes das
110

Hassemer (1993) caracteriza o crime organizado como um fenômeno


cambiante, que compreende uma gama de infrações penais, sem vítimas imediatas
ou com vítimas difusas, dispondo de múltiplos meios de disfarce e simulação. É, em
última análise, a corrupção da Legislatura, da Magistratura, do Ministério Público e
da Política.
Souza (2006) destaca que o crime organizado avançou sobre funcionários de
Presídios, Juízes, Policiais, Promotores, Advogados e Jornalistas. Conseguiu
atemorizar a todos, paralisar as cidades, causar a expectativa dos dias seguintes.
Mostrou audácia e vigor, e, em vários momentos, as autoridades foram apanhadas
de surpresa, tendo de mudar abruptamente métodos viciados de trabalho.
Por outro lado, as instituições de controle e combate às ações criminosas
permanecem alheias à nova realidade que se apresenta. O Sistema de Justiça
Brasileiro ainda está voltado para os crimes individuais e desaparelhado para
investigar o crime organizado (ZALUAR, 2002). No mesmo sentido, refere Mendroni
(2002), ao destacar a insuficiência dos métodos de investigação previstos no Código
Penal.
Ziegler (2003) alerta que o capitalismo encontra sua essência no crime
organizado, que funciona à margem de toda transparência e numa clandestinidade
quase perfeita. Geralmente escapam do controle do poder público, de seu Estado, e
de suas leis.
Mingardi alerta que:

[...] não adianta tentar resolver o problema do Crime Organizado através do


uso puro e simples da força. O combate passa necessariamente pela ação
de corpos especializados. O promotor não acusa, o juiz não sentencia e o
sistema penitenciário não pune se não houver prova de crime, e as provas
só podem ser obtidas através de investigações. Ninguém aparece com elas
numa bandeja oferecendo ao Estado. Mesmo quando aparece um caso
destes, em que um informante dá tudo de bandeja, existe ainda a
necessidade de, como dizem nos meios policiais “fazer a prova”, ou seja,
transformá-la em algo utilizável pelo Ministério Público, para dar
consistência a uma acusação. Existem falhas gritantes na forma como são
conduzidas as investigações sobre o Crime Organizado no Brasil. Da

originais, a fim de descobrir os componentes das fórmulas e Lavagem de dinheiro: além dos
paraísos fiscais como as ilhas exóticas, há outros lugares para se levar dinheiro. Uma delas é a
Ciudad del Este, cidade paraguaia, na fronteira entre Brasil e Argentina (encruzilhada para todo
comércio ilícito). Nenhum segmento do sistema bancário mundial é completamente imune à prática
de lavagem de dinheiro. Graças à tecnologia, qualquer pequena instituição financeira pode ser a
origem ou o destino de fundos para qualquer lugar. Foram criados inúmeros bancos virtuais:
entidades que existem exclusivamente na internet e que nunca se encontram cara a cara com o
cliente. As redes mais sofisticadas empregam seus próprios hackers especializados para proteger
suas comunicações e invadir as máquinas das agências de repressão.
111

mesma forma que os legisladores, e amplos setores da Polícia ainda não


perceberam que não se pode tratar de forma igual coisas diferentes. Não
existe um conceito de Crime Organizado uniforme entre as Polícias, muito
menos um pensamento articulado de como tratá-lo (1998, p. 204-205).

Mingardi (1991) ainda salienta que a corrupção é um dos grandes problemas


envolvendo os crimes de “colarinho branco”. Nesses casos, o acerto na Delegacia
de Polícia é rápido, pois se lida com criminosos endinheirados. Para enfrentar essa
situação, esses criminosos habituais mantêm um fundo de contingência, guardado
por alguém de confiança. Quando chega a hora da necessidade, recorrem a seu
“banqueiro”, que saca do fundo e entrega o dinheiro ao Advogado (truta) que paga à
Polícia, que, por sua vez, distribui um pouco aos “gansos” (policiais corruptos),
envolvidos na captura. Por certo que, no futuro, quando do julgamento, a defesa se
torna mais fácil pois o inquérito não retratou fielmente os fatos. Essa realidade
demonstra que a corrupção policial é importante fator criminógeno, pois além de
permitir ao criminoso agir impunemente, obriga-o a delinqüir mais para manter-se.
Filho (2002) descreve o funcionamento de uma organização criminosa
através do centro de comando, inteligência, coordenação e controle, unidades
operacionais e periféricas. O comando, geralmente, compõe-se de um único
membro ou de um número reduzidíssimo de pessoas. O centro de inteligência
constitui-se de um número limitado de integrantes, dificultando o acesso à zona de
tomada de decisões. A unidade de coordenação e controle executa a função de
manter interligada a estrutura da organização. Nas unidades operacionais são
desenvolvidos os planejamentos estratégicos (onde se encontram os “testas-de-
ferro”) e, após, na periferia, busca-se a mão-de-obra.
Duarte (2001) lembra que o crime organizado nasce através de uma
instituição sólida, eficiente e, sobretudo, moldada em padrões de permanência
organizacional e de longevidade estrutural.
Não há dúvidas que a identificação dos criminosos que atuam de forma
organizada é cada vez mais difícil para os órgãos públicos competentes, porque,
muitas vezes, agem sob a proteção de cargos, posição social ou posição econômica
que não levantam suspeitas, não raras vezes, utilizando-se de atividades legais
(ALVES, 2007).
Adverte Becerra (1998):
112

É indubitável que as novas formas de criminalidade puseram em maior


evidência a incapacidade do sistema de investigação dos delitos, fato que
confirma a profecia da criminologia crítica, feita há mais de vinte anos. O
sistema é seletivo não só por razões ideológicas, mas por razões
inteiramente práticas. Os crimes de ‘colarinho branco’ são bem mais difíceis
de investigar. A complexidade da atividade financeira, as facilidades nas
comunicações, o aparecimento de organizações criminosas, apoiadas em
alta tecnologia, cujo modo de atuação constitui sempre um grande
obstáculo à fixação da responsabilidade pessoal, etc., já não permitem que
a investigação dos fatos ilícitos seja encarada como uma atividade pessoal
isolada, muitas vezes burocratizada e carente de meios técnicos. Além do
esforço pessoal e das habilidades profissionais, estes desafios exigem um
trabalho em equipe e a coordenação não só interna do Ministério Público,
como também dos distintos setores estatais e sociais comprometidos com a
investigação de atividades ilícitas deste tipo.

Alerta ainda para:

[...] a necessidade de se desenhar um sistema de investigação de delitos


federais próprio dos membros do Ministério Público e que permita otimizar,
interna e externamente, os recursos estatais destinados à investigação
deste tipo de delinqüência, sem que a busca da eficiência implique a lesão
das garantias individuais (BECERRA, 1998, p. 38).

No mesmo sentido Lucas refere que:

Considerando que a organização criminosa possui tentáculos no interior dos


órgãos estatais voltados justamente à apuração dos crimes por ela
praticados e, além disso, que esses não possuem vítimas individuais e são
realizados de forma a não deixar vestígios que permitam ligá-los aos seus
verdadeiros autores, é natural que se compreenda a dificuldade enorme que
se tem, máxime nos órgãos policiais, de enfrentar as organizações
criminosas (2007, p. 5).

Por certo que medidas preventivas para a contenção da criminalidade e do


crime organizado são importantíssimas, mas, como lembra Filho (2002), o Brasil, em
matéria de segurança, vive hoje um grave dilema: “urgente x essencial, prevenção x
repressão”. Temos que a repressão é medida imediata, sendo o essencial, o
primordial. Isso representa a necessidade urgente de aplicação de mecanismos de
repressão. Não como uma política pública excludente à prevenção, mas como
direito-dever do Estado.
Mendroni (2002) ainda alerta que, em alguns casos, a organização criminosa
acaba por substituir a atuação que seria da Justiça e da Polícia, atuando como
verdadeira defensora dos pobres e oprimidos.
113

Mas ainda acredita que o Estado tenha forças suficientes para combater
qualquer tipo de estrutura organizada para a prática de crimes. Daí decorre o seu
raciocínio do combate no esquema de Força-Tarefa.
Uma gestão que promova um verdadeiro programa de combate à
macrocriminalidade, com um núcleo de inteligência devidamente estruturado,
conjugação de esforços e compartilhamento de informações, talvez fosse capaz de
combater as organizações criminosas de uma forma que as Polícias, tais como hoje
se encontram, jamais conseguirão.
A Força-Tarefa representa a integração entre as diversas organizações que
compõem o Sistema de Segurança Pública e Justiça Criminal no combate à
macrocriminalidade.
114

6 DA ORDENAÇÃO METODOLÓGICA

O presente capítulo busca situar o leitor acerca da metodologia adotada para


a realização da dissertação, em especial, as técnicas, instrumentos e tipos de
pesquisa, procurando demonstrar sua importância e necessidade para uma melhor
compreensão do tema.
Dentre as mais diversas maneiras de se fazer pesquisa, neste trabalho,
optou-se pelo método de estudo de casos, com observação participante, coleta,
análise de documentos e entrevistas semi-estruturadas.
Para tanto, a mestranda, além das entrevistas realizadas em Porto Alegre,
dirigiu-se à Minas Gerais para conhecer o GISP (Grupo Integrado de Segurança
Pública), conhecido como a Força-Tarefa Institucionalizada, o CAOCRIMO (Centro
de Apoio Operacional do Combate ao Crime Organizado e de Investigação Criminal)
e o GCOC/MG (Grupo de Combate às Organizações Criminosas), entrevistar seus
principais atores e participar de uma Operação da Força-Tarefa de Combate ao
Crime Organizado, no interior do Estado (Passos, Piumhi, Capitólio, Itaú de Minas e
São José da Barra).
Minayo (2007) refere que o trabalho de campo permite a aproximação do
pesquisador com a realidade sobre a qual formulou uma pergunta e estabelece uma
interação com os atores que conformam essa realidade (participando, ativamente
dos fatos investigados). O principal instrumento utilizado foi o Diário de Campo, onde
eram escritas todas as informações colhidas durante a operação realizada.
Partiu-se do estudo de caso, através da pesquisa empírica. No dizer de Yin
(2005), ela só avança quando vem acompanhada pelo pensamento lógico, e não
quando é tratada como propósito mecanicista ou de coleta de dados.
Ressalte-se que a combinação das observações participantes com as
entrevistas é amplamente admitida na literatura conforme destacou Fleury (2002).
115

6.1 ESTUDO DE CASOS

O presente subitem busca esclarecer o conceito de “Estudo de Caso” e a


forma como esse método foi utilizado na presente dissertação.
Na definição de Yin (2005), o “Estudo de Casos” representa uma maneira de
investigar um tópico empírico, seguindo-se um conjunto de procedimentos pré-
especificados. Manifesta-se como uma forma de se fazer pesquisa empírica para
investigar fenômenos contemporâneos, dentro do seu contexto de vida, e em
situações em que se utilizam múltiplas fontes de evidências.
Para tanto, buscou-se, inicialmente, definir o caso que está sendo estudado,
determinar os dados relevantes a serem coletados e definir o que deveria ser feito
após a coleta dos dados.
Houve o cuidado no sentido de utilizar as Instituições da Polícia Militar e Civil
e a Instituição do Ministério Público Estadual e Federal como unidades de análise e
os Policiais Civis e Militares, Promotores e Procuradores como informantes. Esse
alerta é dado por Yin:

A confusão comum começa porque as fontes de coleta de dados podem ser


pessoas individuais (p. ex. entrevistas com indivíduos), ao passo que a
unidade de análise de seu estudo de caso pode ser organizacional (p. ex. a
organização à qual pertence o indivíduo) – um problema freqüente quando o
estudo de caso versa sobre uma organização (2005, p. 101).

Operacionalmente, trabalhou-se com teorias interdisciplinares. Pois, como


refere Minayo (2003, p. 20): “qualquer investigação utiliza conceito e noções de
várias áreas do conhecimento, [...] disciplinas e métodos isolados costumam ser
insuficientes para tratar de questões tão complexas”.
Para a pesquisa empírica, foi concentrada a atenção na questão da Força-
Tarefa como mecanismo de investigação para o combate ao crime organizado,
levando-se em consideração a necessidade de integração entre as diversas
instituições que atuam no Sistema de Segurança Pública e Justiça Criminal.
116

6.2 DAS ENTREVISTAS SEMI-ESTRUTURADAS

Procura-se no presente subitem comprovar a necessidade da realização de


entrevistas semi-estruturadas e a forma como foi realizada, buscando demonstrar a
importância dos depoimentos (informações e opiniões) dos entrevistados para a
análise do referencial teórico e para a conclusão alcançada.
No presente trabalho foram realizadas entrevistas semi-estruturadas que
combinam perguntas fechadas com abertas, tendo o entrevistado a possibilidade de
discorrer sobre o tema em questão sem se prender à indagação formulada. Como
destaca Yin:

Dessa forma, você pode tanto indagar dos respondentes-chave tanto os


fatos relacionados a um assunto quanto pedir opinião deles sobre
determinados eventos. Em algumas situações, você pode até mesmo pedir
que o respondente apresente suas próprias interpretações de certos
acontecimentos e pode usar essas proposições como base para uma nova
pesquisa (2005, p. 117).

As entrevistas foram realizadas em diferentes dias e locais (Porto Alegre e


Minas Gerais). Nem todas foram gravadas. Os Policiais Civis e Militares de Minas
Gerais solicitaram que não houvesse gravação e identificação de seus nomes,
buscando o anonimato. Na ocasião, alegaram que se tratava de um tema polêmico,
que envolvia outras Instituições da Polícia e da Justiça, o que, eventualmente,
poderia comprometer a ética profissional. Sendo assim, procurou-se conservar o
estilo informal da linguagem falada, retirando-se apenas expressões que pudessem
adquirir conotações pejorativas ou ofensivas. A mestranda procurou anotar tudo com
suas próprias palavras, tentando manter a fidedignidade ao sentido conferido pelo
entrevistado. Não foram exigidas assinaturas em “Termos de Autorização e
Consentimento”, visto que a maioria dos entrevistados alegou sua desnecessidade
em razão do anonimato.
Durante as entrevistas informou-se o caráter confidencial das mesmas e a
preocupação com o ponto de vista de cada um. Cientes do caráter reservado de
suas manifestações, observou-se que os entrevistados falaram de forma mais
espontânea sobre suas relações profissionais (problemas, angústias, temores,
sucessos e dificuldades). A garantia do anonimato, nesse ponto, foi essencial.
117

A mestranda preocupou-se em informar que não se buscava criar


constrangimentos entre os atores que compõem e operacionalizam as diversas
instituições do Sistema de Segurança Pública e Justiça Criminal (objetos de
pesquisa), e sim, apresentar suas diferentes percepções sobre o tema. Por certo
que, nas perguntas feitas, buscou-se verificar a visão dos integrantes sobre as
instituições às quais pertencem, bem como sobre as demais que com eles interagem
(eventuais ingerências políticas, nas atribuições; compartilhamento de espaço,
conflitos, vaidades institucionais, temor pela eventual perda do poder, cultura
organizacional, desconfianças, identidade organizacional, etc.).
Houve, igualmente, a preocupação da mestranda em fazer uma explanação
dos objetivos da pesquisa, da necessidade de depoimentos sinceros e dos motivos
da escolha dos entrevistados (seja por indicação, pela experiência, pelo
conhecimento prático, etc.).
Um dos motivos para que a escolha da pesquisa de campo recaísse sobre o
Estado de Minas Gerais foi em função de um novo plano de ação implementado
junto à Segurança Pública. Ela se deu num momento ímpar, quando as Instituições
que integram a Força-Tarefa de Minas Gerais apresentavam-se desgostosas e
desgastadas. O mesmo sentimento nutria o Assessor do Governador de Minas
Gerais que, inclusive, no dia seguinte à entrevista, pediu demissão do cargo,
alegando falta de apoio ao seu trabalho, que, diga-se de passagem, era essencial ao
planejamento previamente realizado pelo Governo. Portanto, não só através das
informações fornecidas, mas também de seus gestos, expressões e atos, os
entrevistados exteriorizaram a realidade que estavam vivenciando, sem
preocupação com futuras justificativas funcionais à Instituição de origem. Referida
situação facilitou, sobremaneira, a percepção da realidade institucional e social dos
envolvidos, o que muito ajudou para a compreensão do tema objeto da pesquisa.
Outro aspecto oportuno e favorável à mestranda, foi a intermediação havida
entre o Procurador-Geral do Ministério Público do Estado do Rio Grande do Sul com
o Ministério Público do Estado de Minas Gerais, bem como a mediação havida entre
seu Orientador e o então Assessor do Governo. Tais situações facilitaram
sobremaneira o trabalho, pois os entrevistados já a aguardavam, em Minas Gerais, e
tinham conhecimento de seus interesses e objetivos naquele Estado.
118

Em Porto Alegre, não houve a necessidade dessa intermediação, pois os


entrevistados eram amigos e colegas da mestranda, todos com alto nível intelectual
e vasta experiência profissional.
No tocante à Força-Tarefa de Minas Gerais, a mestranda entrevistou um
representante do Governo que participou, de forma efetiva, da implantação do GISP
(Grupo Integrado de Segurança Pública), bem como alguns de seus atuais
membros: um Delegado de Polícia e um Oficial da Polícia Militar. Junto ao
CAOCRIMO e GCOC, foi entrevistado um Procurador de Justiça do Ministério
Público Estadual que, igualmente, participou da criação do GISP, do CAOCRIMO e
do GCOC/MG. Junto ao GISP, em Minas Gerais, a entrevista com o Policial Civil foi
realizada quando o mesmo se encontrava sozinho em seu gabinete. A entrevista
com o Policial Militar deu-se no dia seguinte e com a presença do Policial Civil (que
trabalha na mesma sala). No final, quando à sós com o Policial Civil, o mesmo
referiu à mestranda que nem todas as respostas dadas pelo Policial Militar
correspondiam à verdade dos fatos. Além disso, destacou que, em que pese ser
necessária a integração das Polícias, para um trabalho eficaz de investigação
conjunta, era do seu conhecimento que o Policial Militar lhe ocultava provas e
realizava uma investigação isolada.
Quanto à Força-Tarefa que atua junto ao Ministério Público Federal foi
entrevistado um Procurador da República atuante nessa área.
Fez-se, igualmente, uma análise da Task Force, Força-Tarefa Americana,
utilizando-se, em especial, materiais trazidos pelos membros do Ministério Público
do Rio Grande do Sul que, no ano de 2006, participaram de uma visita aos Estados
Unidos, buscando, entre outros objetivos, conhecer o trabalho da Força-Tarefa de
Combate ao Crime Organizado. Aproveitou-se, igualmente, do referencial teórico
existente sobre o tema.
Quanto ao Rio Grande do Sul, foram examinados diversos documentos, em
especial os acordos celebrados e os motivos da formação do mecanismo
denominado pelos Promotores como “Força-Tarefa” e entrevistado o então
Coordenador da Promotoria Especializada Criminal do Rio Grande do Sul, um dos
primeiros Promotores de Justiça a participar de sua criação. Também foram
realizadas entrevistas com um Oficial da Brigada Militar (que é Policial Militar há
cerca de 20 anos e que se encontra, atualmente, lotado na cúpula da Instituição) e
119

um Delegado da Polícia Civil (hoje Coordenador de um dos mais importantes


Departamentos da Polícia Civil, que atua no combate ao Crime Organizado).
Por mais que se buscasse um recorte pequeno, visando uma comparação
mais precisa e detalhada (como por exemplo, utilizando-se apenas como objetos de
comparação e análise a Força-Tarefa do Rio Grande do Sul e de Minas Gerais), a
mestranda acabou por alargar o objeto de pesquisa utilizando a Força Tarefa
americana mais como uma referência ilustrativa (vez que lá surgiram as primeiras
formações e notícias de Força-Tarefa). Quanto ao Ministério Público Federal, a
pretensão, que igualmente deveria ter sido ilustrativa (em notas de roda pé ou
apenas breves referências no contexto das demais), deu-se de forma mais ampla,
pois a mestranda preocupou-se em informar a existência de um trabalho mais
atuante do Ministério Público Federal junto às Forças-Tarefas como importante
mecanismo de combate à macrocriminalidade (principais objetos de investigação do
Ministério Público Federal). Enfim, o recorte escolhido pode não ter sido o ideal,
mas a intenção era repassar o maior número de informações possíveis (em especial
aquelas colhidas recentemente como a entrevista com o Ministério Público Federal e
a viagem realizada pelo Ministério Público aos Estados Unidos). Na realidade, a
comparação efetivamente pretendida desde o início do trabalho limitava-se às
Forças-Tarefas do Rio Grande do Sul (assim conhecidas como aquelas que atuam
junto à Promotoria Especializada Criminal) e as Forças-Tarefas de Minas Gerais
(seja a Institucionalizada - GISP, como a do CGCOC, do Ministério Público
Estadual).

6.3 PESQUISA DE CAMPO COM OBSERVAÇÃO PARTICIPANTE

A técnica utilizada através do estudo de casos com observação participante é


o que se pretende caracterizar e descrever no presente capítulo. Essa técnica
possibilita uma leitura de parte da realidade sobre a teoria, até então estudada.
Realidade essa que podemos ver, ouvir, tocar, dimensionar e interagir.
120

6.3.1 “Operação Caminhada” 65

No dia 17 de setembro de 2007, em Minas Gerais, a mestranda participou de


uma reunião que objetivava revisar estratégias que seriam executadas durante uma
operação, no dia seguinte. No dia 18 de setembro (com início durante a madrugada)
de 2007, o Ministério Público Estadual, a Polícia Civil, cerca de oitenta Policiais
Militares, Auditores da Receita Federal, Fiscais da Superintendência da Fazenda,
quinze Oficiais de Diligências do Ministério Público e vinte e oito Promotores de
Justiça do Estado de Minas Gerais, sob a coordenação de dois Procuradores de
Justiça do Ministério Público do Estado de Minas Gerais, partiram para realizar a
“Operação Caminhada”, em Passos, Piumhi Capitólio, Itaú de Minas e São José da
Barra (cerca de 356 Km de Belo Horizonte).
A operação foi coordenada pela Procuradoria de Combate aos Crimes
praticados por Agentes Políticos Municipais, com a colaboração do Centro de Apoio
Operacional das Promotorias de Defesa da Ordem Econômica e Tributária (CAOET)
e do Centro de Apoio Operacional de Combate ao Crime Organizado (CAOCRIMO).
Toda a documentação apreendida foi enviada para Procuradoria de Crimes
praticados por Agentes Políticos Municipais, em Belo Horizonte, para estudo técnico
e jurídico.
Suspeitava-se que Órgãos Públicos estivessem ligados a crimes contra a
Administração, como licitações fraudulentas e desvio de recursos. A investigação
tramitava em sigilo de Justiça. O objetivo era reunir provas relacionadas a
procedimentos judiciais em andamento no Tribunal de Justiça de Minas Gerais.
Por ocasião da ação, a mestranda procurou participar ativamente, atuando
junto com os demais integrantes da Força-Tarefa, em especial com os Procuradores
de Justiça, verificando os principais problemas, dificuldades e entraves enfrentados
e observando as diversas atuações dos diferentes atores de cada instituição,
integrantes da operação66. Durante a operação, foram cumpridos 42 mandados de
busca e apreensão, deferidos pelo Tribunal de Justiça de Minas Gerais, junto à
Prefeitura de Passos, Câmara Municipal, diversas empresas, escritórios e casas do

65
Reportagens dos Jornais de Minas Gerais sobre a Operação realizada. Anexo I.
66
A mestranda, inclusive, foi fotografada por um Jornal local segurando as provas apreendidas.
Anexo II.
121

Prefeito e de Vereadores. Foram apreendidos centenas de documentos, CPUs de


diversos computadores e CDs que se encontravam nos locais já referidos, além dos
que se encontravam na Câmara da Cidade de Passos, em 28 residências de
Secretários Municipais, funcionários de carreira e estabelecimentos (como
escritórios de advocacia e de contabilidade). Os Promotores de Justiça ainda
apreenderam documentos e computadores na casa do responsável pelo Jornal
Correio dos Lagos e na casa do Secretário da Administração de Passos, onde
também foi apreendido um revólver 38, momento em que foi dada voz de prisão em
flagrante ao Secretário (solto, após o pagamento de fiança). Na casa de um
Vereador, Promotores de Justiça encontraram uma arma calibre 765, com 13 balas,
além de munições calibres 32, 22, 44 e 762, este último de um fuzil de uso exclusivo
das Forças Armadas.
A mestranda tomou conhecimento de que, anteriormente, houve vários
encontros, entre todos os integrantes da operação, para tratar sobre as estratégias
de atuação. Embora não tenha participado desses encontros, questionou diversos
integrantes da operação sobre como eles ocorreram. Vários integrantes da operação
informaram que, a partir do caso concreto, estabeleceram estratégias de atuação,
dividiram os grupos – para atuação simultânea – e solicitaram, judicialmente, as
autorizações pertinentes (mandados de buscas e apreensões, quebras de sigilos,
entre outras). Além disso, escolheram os parceiros necessários para bem
desempenhar os objetivos da operação, como, por exemplo, Secretário do Estado
da Fazenda, Polícia Militar, Polícia Civil, Auditores Fiscais, etc. Houve, efetivamente,
uma divisão de tarefas coerente e eficaz e tudo foi previamente planejado com
divisão de tarefas e coordenação.
Momentos antes do início da operação, ainda de madrugada (antes do início
do horário normal de abertura do expediente dos Órgãos Públicos), os Promotores
de Justiça se reuniram com os Procuradores, Policiais, Oficiais de Diligências,
Secretários da Receita Federal e demais integrantes da operação e retomaram as
estratégias previamente estabelecidas. Cada grupo era composto de, no mínimo, um
representante de cada instituição e suas tarefas deveriam ser realizadas em locais
pré-determinados, de forma simultânea, objetivando evitar vazamentos de
informações.
Em que pese a demora para finalizar a operação (em razão de algumas
resistências dos suspeitos, pela dificuldade de localização de outros, em razão da
122

distância dos locais que deveriam ser objetos de investigação e, principalmente, pela
dificuldade de coleta e organização de todos os documentos apreendidos), os
Procuradores e Promotores de Justiça manifestaram satisfação quanto aos
resultados obtidos. Todas as documentações, CPUs, armas, etc. foram separadas,
rubricadas, envelopadas, seladas e encaminhadas à Belo Horizonte, dentro de um
caminhão, devidamente escoltado pela Polícia Militar, para que fossem procedidas
as respectivas análises. Houve, igualmente, o acompanhamento de alguns
Advogados, sendo, inclusive, solicitada, pelo Ministério Público, a presença do
Presidente da OAB local.
O Procurador de Justiça que atua diretamente junto ao Centro de Apoio
Operacional às Promotorias de Justiça de Defesa da Ordem Econômica e Tributária
(CAOET), ao falar sobre as operações que vêm sendo realizadas em todo o Estado,
visando, especialmente, ao combate à sonegação fiscal, referiu:

A sociedade vem demandando a formação de promotores de Justiça


“operacionais”, que alarguem a sua atuação para além do gabinete, mas
sempre com o objetivo de realizar suas funções. E as operações
deflagradas a partir do CAOET nada mais são do que a aglutinação de
diversas instituições para a obtenção de um objetivo, sem descurar das
características próprias de cada participante, mas integrando-os para se
alcançar o objetivo comum. Trata-se de uma organização de forças, numa
articulação política, que se dá na melhor acepção da palavra.

Ações de outras Forças-Tarefa do Ministério Público Estadual de Minas


Gerais vêm obtendo sucesso nas mais diversas esferas de atuações67.

67
Junto ao Centro de Apoio Operacional às Promotorias de Justiça de Defesa da Ordem
Econômica e Tributária (CAOET) somente em uma operação junto ao setor siderúrgico, a Receita
obteve um incremento de R$ 240 milhões, oriundos de devedores que se apresentaram para
regularizar débitos. Essa atuação conjunta, além de qualificar o servidor fazendário no trato das
questões tributárias, tem garantido o resgate das receitas indispensáveis ao atendimento das
diversas e crescentes necessidades da sociedade. Outras operações foram realizadas como a
Operação Mata Atlântica (quadrilha especializada em sonegação de tributos, com recuperação da
receita de cerca de 90 milhões. Presos: 11 fiscais, 2 Policiais Militares, 1 Advogada e 1 Contador),
Operação Fronteira (combate ao contrabando, apreendidos 22 ônibus com mercadorias
contrabandeadas, sendo 34 mil veículos fiscalizados), Operação Grãos de Minas (sonegação de
impostos estaduais, montante autuado: 37 milhões. Bloqueio judicial de bens, valores e dinheiro que
totalizaram mais de 20 milhões), Operação Divino (desmantelamento de quadrilha com atuação no
setor de siderurgia, valor aproximado de 108 milhões de autuações. Bens apreendidos e já
penhorados no valor estimado de 43 milhões. Desvendamento de um homicídio e prisão de todos os
envolvidos (9), inclusive empresários). Operação Pequizeiro (tráfico ilícito de carvão. Autuações:
cerca de 1 milhão de reais, correspondente ao recolhimento da taxa ambiental), Operação Dionísio
(bebidas sem pagamento de ICMS, sonegados 49 milhões em impostos. Cinco pessoas presas.
Apreendida grande quantidade de bebida, documentação fiscal paralela, dois veículos e moto),
Operação Diamante Negro (desmantelou organização criminosa responsável pela fabricação,
consumo e comércio de carvão, retirados de matas nativas. Prejuízo por sonegação de ICMs e de
123

6.3.2 Do GISP68

Não há como negar que a mestranda possuía uma idéia pré-concebida de


que o GISP, conhecido como a Força-Tarefa institucionalizada em Minas Gerais, era
exemplo da atuação e integração institucional no combate à macrocriminalidade (em
especial pelo retorno positivo ocorrido nos primeiros anos do chamado “Choque de
Gestão” do Governo mineiro, com relevante diminuição da criminalidade). Mas essa
idéia pré-concebida (que se sabe prejudicial a qualquer pesquisa social) não
influenciou a mestranda quando se deparou com a realidade do GISP em Minas
Gerais.
A Coordenação do GISP coube à SEDS (Secretaria do Estado de Defesa
Social), a quem compete a articulação de seus membros e a organização de suas
atividades. A despesa decorreu de um convênio firmado com a União, bem como de
recursos de dotações orçamentárias da Secretaria do Estado de Defesa Social (há,
inclusive, previsão de investimentos até 2015). As ações elaboradas estão
interligadas ao Plano Nacional de Segurança Pública, da SENASP, o que facilita a
captação de recursos do Governo Federal.
Em que pese o decreto da criação do GISP ser datado de 2003, sua
regulamentação se deu somente dois anos depois, através da Resolução Conjunta
datada de 2005, acordada pelo Procurador-Geral de Justiça, Chefe da Polícia Civil
do Estado e Comandante-Geral da Polícia Militar, dispondo sobre a estrutura e
funcionamento do GISP.
Na ocasião, organizaram sua estruturação considerando o novo paradigma
de “Gestão Integrada e Sistêmica da Segurança Pública”. Suas diretrizes eram
basicamente, o incremento da integração entre os órgãos do Sistema de Justiça
Criminal e a implantação do “Planejamento Estratégico” como ferramenta gerencial
das ações empreendidas pelo Sistema de Justiça Criminal.
O GISP prevê um Conselho Gestor, competindo-lhe definir os crimes em que
irá atuar, bem como propor medidas e decidir sobre os órgãos convidados. Deve
reunir-se uma vez por mês e suas deliberações são colegiadas. Em caso de

taxa ambiental, além de prejuízo ao meio-ambiente: correspondente a 45 mil campos de futebol).


Fonte: Revista do Ministério Público de Minas: MPMG Institucional. Ano III, Edição 11, julho de 2007.
68
Anexo III.
124

dissenso, prevalece a maioria de votos. O Secretário Executivo possui voto de


qualidade. Para se integrar ao GISP, o efetivo passa por um processo seletivo
(verificação de antecedentes e habilidades). Os casos omissos são resolvidos pelo
Secretário de Estado de Defesa Social mediante parecer do Conselho Gestor.
O GISP restou estruturado da seguinte forma:
SEDS: Secretaria Executiva dividida em:
A) Coordenadoria do Crime Organizado;
B) Coordenadoria de Inteligência de Segurança Pública e
C) Coordenadoria de Proteção e Autoridades.
Impõe-se ressaltar que, quando da criação do GISP, a GCOC já existia e
vinha atuando exitosamente. Trabalhavam, inclusive, com um “guardião” (Central de
Comutação Digital, utilizado para interceptar ligações) cedido pela Secretaria da
Fazenda. O Ministério Público aderiu ao GISP, mas não abriu mão do GCOC.
O GISP demorou a funcionar. Foi assinado um convênio entre todas as
Instituições, em 2002, mas restou implementado somente em 2005. Porém, o
Conselho Gestor apresentou-se inoperante, não realizava reuniões, não indicava
demandas, etc. A idéia do Colegiado não rendeu. O decreto do GISP sequer
indicava quais crimes seriam objetos de investigação, criando melindres entre as
próprias instituições69.
Enquanto isso, o Ministério Público continuava atuando e ampliando seu
leque de convênios com outras Instituições, como a Receita Estadual.
No prédio onde está situado o GISP, há poucos funcionários, muitos andares
livres e pouquíssimas demandas. Em que pese toda essa estrutura, o GISP está
sendo esquecido. O edifício encontra-se praticamente vazio, com vários locais
ociosos. Sua localização, além de ser longe das demais instituições ou de
policiamento efetivo, é perto de uma vila perigosa de traficantes, onde recentemente
ocorreu uma grande chacina.

69
Algumas atividades foram desenvolvidas com êxito: Operação Recarga, Operação “ET”; Operação
Ouro Negro; Operação Vertentes; Operação Câncer; Operação Loja de Doces, Operação Carga
Explosiva; Operação Varella; Operação Casa de Oração; Operação Café; Operação Bocaiúva;
Monitoramento das atividades do PCC no Estado; Busca de informações sobre roubo de cargas no
Triângulo Mineiro; Informações sobre desvios de produtos químicos controlados/perigosos no norte
de Minas, Mapeamento das atividades no interior dos shoppings populares, Auxílio ao Exército e
ABIN; apoio à rede RENISP – Rede Integrada de Inteligência do Ministério da Justiça e Cumprimento
de Pedidos de Busca da Coordenação-Geral de Segurança - COSEG, etc. Fonte: Gabinete de Ação
Integrada do Sudoeste e Apoio à Assessoria de Consolidação de Informações de Inteligência do
Sistema de Defesa Social de Minas Gerais.
125

Na mesa do Policial Militar havia apenas alguns envelopes pardos (dito pelo
Policial Civil que se tratava de provas para corrigir). Na mesa do Policial Civil havia
somente alguns documentos. O Aparelho de Interceptação telefônica encontrava-se
estragado.
Os atores demonstraram desinteresse em compartilhar informações e
suscitaram dúvidas quanto à confiabilidade dos parceiros oriundos das outras
instituições. Em setembro de 2007, o Chefe de Polícia Marco Monteiro, determinou a
criação de uma nova delegacia, subordinada ao DEOESP – Departamento de
Operações Especiais - para intensificar ações de Inteligência e aumentar a
integração com o Ministério Público e Polícias de outros Estados (o que já era objeto
do GISP).
Pode-se constatar que há ainda vários aspectos e barreiras a serem
superados, em especial, quanto à cultura organizacional, relação de poder,
dificuldade de aceitação do próximo, problemas quanto à alegação de ingerência
nas atribuições e falta de confiança.
Na maior parte das situações, observou-se que a Polícia Civil foi a Instituição
que mais resistiu à integração de todos os órgãos. A Polícia Militar tem receio de
que a Polícia Civil se torne mais forte e que seja anexada à ela (e, nesse caso, os
bacharéis em direito teriam primazia, beneficiando os Delegados de Polícia). Por
outro lado, há a eterna irresignação no sentido de que “a Polícia prende e o
Judiciário solta, sem que o Ministério Público tome partido”. Já o Ministério Público
entende que há casos em que a Polícia Civil não pode atuar sozinha, principalmente
quando deve investigar pessoas poderosas, o próprio corpo policial e quando se
trata de crime organizado, ante total falta de estrutura. Dessa forma, não há
comunicação entre as Instituições, as informações não são compartilhadas, o Setor
de Inteligência é privatizado, não há efetivo planejamento ou ação conjunta, enfim
há relação totalmente desorganizada. Enquanto isso, o crime organizado vai se
tornando cada vez mais poderoso.
Observou-se a carência de um efetivo controle, de uma conscientização no
sentido da necessidade de união para combater o crime organizado de forma
eficiente, compartilhando conhecimentos e informações. Não há o entendimento
entre os Policiais no sentido de que a eventual coordenação do Ministério Público
nas operações não caracterize superioridade ou necessidade de submissão, e sim,
apenas otimização e racionalidade na gestão. Verificou-se, igualmente, carência de
126

tecnologia de cursos e formação conjuntas e convivência em espaços funcionais e


sociais. Observou-se que um dos problemas essenciais, que dificultou a integração
entre os Órgãos do Sistema de Segurança Pública e Justiça Criminal, foi a falta de
prévia definição quanto aos limites de atuação de cada instituição. e, principalmente,
desinteresse de mudança ou, ao menos, flexibilidade da cultura organizacional de
cada Instituição, objetivando integrar-se com as demais.
Percebe-se que muitas das barreiras são antigas, construídas ao longo dos
anos, num processo histórico, sem apoio governamental ou da sociedade civil para
derrubá-las ou evitá-las. São elas que abalam, sobremaneira, a confiança entre as
diversas instituições. Todos resistem a mudanças, em especial por medo da perda
de poder e status .

6.3.3 Do CAOCRIMO e GCOC – MPE- MG70

O presente subitem procura explicar o trabalho que tem sido realizado pelo
CAOCRIMO e pelo GCOC de Minas Gerais, em especial diferenciando-os do GISP,
objetivando demonstrar que, na realidade, duas Forças-Tarefa distintas atuam
concomitantemente (a Instituicionalizada pelo Governo Estadual e a do Ministério
Público Estadual).
Durante os dias em que a mestranda esteve em Minas Gerais, acompanhou
os trabalhos realizados pelo CAOCRIMO e pelo GCOC, onde pôde constatar a
forma organizada como o Procurador de Justiça articulava, juntamente com Policiais
(em especial os Militares) e funcionários de outros órgãos, estratégias de atuação
conjunta nas diversas demandas que se apresentavam.
No local, existe um “guardião” cedido pela Receita Estadual que é utilizado
pelo Ministério Público sem ingerências de outras instituições.
São vários os oficiais de diligências, secretários, estagiários e funcionários,
cada um com tarefas bem definidas. Pôde-se observar suas atividades, bem como
conversar com vários Policiais, funcionários e outros Promotores acerca do trabalho

70
Ver Anexo IV.
127

do GCOC e do GISP, o que permitiu à mestranda a aproximação com a realidade


sobre a qual havia formulado a pergunta, quando do início da pesquisa.
A observação deu-se não somente por ocasião das entrevistas mas,
principalmente, sobre tudo aquilo que não é dito, mas, de alguma forma, é
demonstrado por atos, condutas, reações e que pode ser devidamente captado. O
contato com os diversos atores, objetos da pesquisa, permitiu à mestranda uma
importante interação, possibilitando construir um conhecimento empírico para a
pesquisa social, conforme ensina Minayo (2007).
Constatou-se a preocupação dos Promotores em demonstrar para a
Sociedade que está havendo uma “democratização da lei penal” isto é, que os
criminosos do “colarinho branco” também estão sendo punidos. Na ocasião,
manifestaram satisfação quanto aos trabalhos que vêm sendo realizados, inclusive,
referindo que as operações das Forças-Tarefas têm mudado a mentalidade dos
empresários mineiros e diminuído a sonegação fiscal, pois setores empresariais
cada vez mais se preocupam em quitar seus débitos, para evitar procedimentos
sonegatórios.
Feitas as observações quanto aos métodos adotados para elaborar a
presente pesquisa, passa-se, agora, a tratar do ponto central dessa dissertação,
qual seja a Força-Tarefa.
128

7 DA FORÇA-TAREFA

O ‘reunir o exército’ envolve não somente a própria mobilização, mas também a organização,
equipamento e adestramento para a eficaz participação no combate e, finalmente, o
‘concentrar as forças’ trata daquela concentração estratégica que visa a atender ao início das
operações, ainda fora do teatro.
Alberto Cardoso

Nos capítulos anteriores, apresentou-se uma ampla reflexão acerca dos


fenômenos da criminalidade e da violência, bem como se demonstrou a ascensão
da macrocriminalidade, especialmente pela falta de uma investigação eficaz. Essa
realidade evidencia a fragilidade das agências de controle e repressão do crime.
Procura-se no presente capítulo analisar parte do escasso material teórico existente
no Brasil com relação à Força-Tarefa e a doutrina sobre a Task Force americana,
em especial, quanto aos seus resultados nas investigações e combate ao crime
organizado, procurando caminhos para responder às questões suscitadas nesse
estudo.
O Estado reivindicou o monopólio do uso legítimo da violência física. Porém,
como já se viu, na prática, a situação é bem diferente. O Estado não consegue se
estabelecer como detentor do monopólio legítimo da violência, seja por excesso na
sua utilização, ou pela fragilidade dessa capacidade para conter determinados
crimes, em especial os chamados “organizados”, e que muitas vezes alcançam
inclusive certa legitimidade social nas áreas em que atuam (ADORNO, 2002a)71.

71
Adorno (2002a) destaca que recente literatura tem questionado a pertinência de pensar o
monopólio estatal da violência em nossa contemporaneidade nos termos propostos por Weber.
Referindo-se à Wieviorka (1997), o autor salienta que o Estado se revela cada vez mais incapaz de
controlar a economia, sendo forçado, por exemplo, a recuar diante de determinadas circunstâncias,
como as atividades informais (mercado negro, trabalho clandestino, etc.). Citando Herbert (1999), que
avaliou o controle do crime nos Estados Unidos, Adorno (2002a) destacou alguns argumentos que
poderiam comprometer a legitimidade do Estado-nação contemporâneo: Externamente, os processos
de globalização econômica e social (consumo e produção que reforçam o poder das grandes
corporações e enfraquecem a capacidade do Estado de regulamentar o mercado de modo a evitar a
potência abusiva dos mais fortes sobre os mais fracos) e também a rapidez das mudanças
tecnológicas (que alteram no tempo e no espaço os fluxos das pessoas, mercadorias e capitais).
Internamente, a legitimidade do Estado-nação estaria perdendo força em razão das políticas neo-
liberais e das severas restrições ao Welfare State. Nesse contexto, essas restrições comprometeriam
129

Nesse sentido, pretende-se, em seguida, verificar a necessidade e eficácia da


conjugação de esforços entre as diversas agências de controle e repressão do crime
para a investigação e combate da macrocriminalidade, através do mecanismo que
se convencionou denominar Força-Tarefa.
Analisando as organizações, Schein acredita que o clima organizacional vem
se tornando cada vez mais cooperativo. Os indivíduos estão se dando conta de que
a competição é virtualmente destrutiva. O Autor refere que:

Se essa tendência for universal, começaremos, também, a ter maior


demonstração de colaboração interorganizacional, não por razões políticas,
mas por razões de ordem prática face à necessidade tecnológica. Maiores
níveis de coordenação só poderão ser alcançados por uma divulgação e
descentralização mais ampla de informações, que permitirão um
entrosamento entre as várias unidades, e não por um planejamento
centralizado [...]. Todavia, para que essa coordenação auto-administrada
ocorra, não apenas as informações devem estar amplamente disponíveis,
mas todos os protagonistas do sistema devem ser capazes de saber qual é
o seu papel (1996b, p. 70).

No Estado do Rio Grande do Sul, em 2002, foi instaurada uma Comissão


Parlamentar de Inquérito do Narcotráfico, na Câmara dos Deputados, objetivando
investigar a possibilidade de envolvimento de algum parlamentar com o esquema do
narcotráfico no País. Por fim, acabou-se identificando uma megaquadrilha, com
ramificações em, pelo menos, quatorze Estados da Federação, dentre eles o Estado
do Rio Grande do Sul. Verificou-se uma conexão com um conjunto de outros crimes
que passam pela questão do roubo de cargas, da lavagem de dinheiro, com

a eficiência das agências encarregadas do controle repressivo da Ordem Pública, abrindo espaço
para que o crime organizado passasse a competir com o Estado (no controle do território como
espaço físico e social de realização da dominação). E, mais, ao se reportar à Garland (1996, 2001),
Adorno (2002a) indica que está ocorrendo uma transferência de responsabilidades públicas e estatais
de controle do crime, seja através da polícia comunitária (que, na realidade, enfraquece as
tradicionais funções do poder público de executar policiamento preventivo e repressivo, bem como de
investigar crimes), seja através da segurança privada (tendendo à erosão da autoridade estatal de
controle do crime e da violência, pois igualmente transfere responsabilidade e garante a crença junto
aos cidadãos de que o mercado é mais eficiente do que o Estado na prestação de serviços) e, por
fim, através da internacionalização das atividades policiais (em razão da internacionalização do crime,
com extensas e complexas operações bancárias, multiplicando em curto espaço de tempo atividades
como fraudes, espionagem, tráfico de armas e drogas, terrorismos, etc.). Com isso, a repressão ao
crime organizado acaba submetida à autoridade extrajudicial, o que se traduz em perda significativa
do papel do Estado-Nação (como, por exemplo, tornando-se signatário de convenções internacionais,
e de acordos bilaterais entre Estados-Nações). Por fim, Adorno (2000a) ressalta que Herbert muito
bem contesta essas tendências, pois a segurança privada não compromete o monopólio estatal,
muito menos a internacionalização das atividades policiais a enfraquece. Na realidade, trata-se
apenas de uma cooperação que envolve trocas de informações, tornando as agências nacionais de
controle do crime mais eficientes e operativas. Ao final, Adorno (2000a) conclui que as tarefas
130

incidência grande da presença e da ligação de agentes públicos das mais diferentes


esferas com a atividade criminosa e delituosa no país.
Na ocasião, ressaltaram a importância do trabalho conjunto do Ministério
Público Estadual, do Ministério Público Federal, da Polícia Federal, da Secretaria de
Estado da Justiça e da Segurança e de um conjunto de outras Instituições que
atuariam de forma integrada, multiplicando e amplificando a capacidade de, ao final
dos trabalhos, identificar essas conexões.
A CPI sugeriu, como um dos mecanismos de combate ao crime organizado, a
criação de uma Força-Tarefa:

O maior mérito da CPI talvez tenha sido a criação da Força-Tarefa, onde se


reuniram as várias Instituições, congregando-se forças e capacidades. O
Estado, infelizmente, costuma atuar de forma estanque. As Instituições
agem isoladamente, quando existem para uma finalidade comum: o bem da
sociedade. Impõe-se, pois, modernizar a atuação do Estado, atuando os
órgãos em sintonia, no objetivo maior, compartilhando informações,
reunindo atividades, etc. Sugere-se, pois, a criação de uma força-tarefa
(Interrompe a leitura) permanente (Retoma a leitura), mediante convênio ou
outro instrumento legal, de abrangência multiinstitucional, com a
participação de outros Estados da Federação, compartilhando-se banco de
dados e informações, de forma a obter maior êxito no combate às
organizações criminosas, preservando-se suas independências, mas
congregando forças, como uma alavanca, no combate ao crime organizado.
Deverá o Estado e a União, por si ou através da cooperação das Nações
Unidas, aparelharem a Força-Tarefa, com a moderna tecnologia, de forma a
72
torná-la organizada e preparada ao combate do crime organizado.

7.1 CONCEITO DE FORÇA-TAREFA

Busca-se no presente capítulo conceituar “Força-Tarefa”. Na realidade, não


há um conceito específico para o termo. Ao contrário, há uma idéia no sentido de
que “Força-Tarefa” se trata de algo provisório, criado para uma determinada
demanda. Não é o que se busca na presente dissertação, através da qual se
sustenta a criação de uma “Força-Tarefa permanente” para a investigação e
combate à macrocriminalidade (que, como já visto, não se trata de algo provisório).

apontadas por Weber já se encontram esgotadas, ensejando novos arranjos institucionais e políticos
que proporcionem o controle dos crimes nesta “era da globalização”.
72
Manifestação do Deputado Francisco Áppio. Disponível em: <www.al.rs.gov.br>.
131

Como já referido anteriormente, a dificuldade de sua conceituação encontra-


se no fato do termo ser utilizado de forma abusiva no cotidiano brasileiro, não sendo
definida e compreendida entre os operadores do direito73.
A idéia de Força-Tarefa, dentro da teoria organizacional, nos remete aos
conceitos de redes advindos das áreas da Sociologia e da Antropologia.
Santos, Hermílio (2007) refere:

Uma das principais características das sociedades complexas é a


relevância das instituições no contexto de diferenciação social, marcada por
uma especialização dos diferentes tipos de organizações da sociedade.
Essa diferenciação tem sido acompanhada pelo surgimento de um tipo de
arranjo institucional em rede, que implica uma maior cooperação e
intercâmbio entre diversas instituições. A construção equilibrada dessa
interação prospera em um ambiente institucional diversificado e plural, em
que os recursos necessários (capital, conhecimento, capilaridade,
capacidade de formação, etc.) para o desenvolvimento estejam
desconcentrados.

Fleury (2002) destaca que as redes apresentam várias vantagens como a


pluralidade de atores, possibilidade de maior mobilidade de recursos, presença
pública sem aumento da estrutura burocrática, maior versatilidade e adaptabilidade
ao ambiente e objetivos e estratégias oriundos de consenso obtido por meio de
negociação entre seus participantes.
Matos (1980) alerta:

Em nossa época, marcada pela transitoriedade, em que se exige de


homens e organizações capacidade adaptativa e inovadora, novos sistemas
e novas técnicas estão sendo, sucessivamente, introduzidos. Formas
Matriciais, Forças-Tarefa, Gerência de Projetos procuram dar
flexibilidade desejável às estruturas para as adaptações e ajustamentos a
uma eficaz organização administrativa para resultados (Grifo do Autor).

Naím bem ilustra essa realidade:

Reunir policiais, advogados, contadores, economistas, cientistas da


computação e, até mesmo, cientistas sociais em equipes integradas e
funcionais com um amplo raio de ação é, de fato, difícil. Mas não é
impossível. Forças-Tarefa envolvendo diferentes agências – até mesmo de
países distintos – foram bem sucedidas no desmantelamento de operações
de tráfico e na captura de importantes protagonistas desse comércio. O
problema é que Forças-Tarefa finalmente se dissolvem, com cada membro
voltando para sua repartição original, enquanto os traficantes se reagrupam

73
A própria Instituição do MPRS denomina Força-Tarefa como a atuação dos Promotores em “salões
de bailes”, para evitar venda de bebidas alcoólicas, em criatório de galos de rinha,em desmanches de
carros, etc. Ver Anexo V.
132

e se adaptam. Manutenção de uma mentalidade de ‘Força-Tarefa’


envolvendo múltiplas agências em um futuro indefinido, bate de frente
com tudo o que sabemos sobre o modo como as administrações
públicas preferem agir (Grifo nosso) (2006, p. 235).

Brindeiro entende que:

O novo Ministério Público deve ter uma ênfase sobretudo no trabalhado das
Forças-Tarefa. Criando-se a Força-Tarefa mantém-se a observância do
princípio do Promotor Natural, cabendo aos promotores ali designados a
atribuição exclusiva para atuação. Trata-se de uma nova forma de
abordagem, sublinhando a integração entre os protagonistas,
potencializadora, de forma participativa e transparente (2004, p. 39).

Mendroni (2002), após estudar as Forças-Tarefas americanas, refere que


existem duas classificações possíveis: as Forças-Tarefa formal e informal.
A primeira seria aquele grupo que se forma:

[...] através de um contrato escrito entre os chefes dos órgãos, com duração
de tempo limitado mas prorrogável, devendo perdurar até que a situação de
crise seja considerada superada ou amenizada o suficiente, a ponto de
poder ser combatida através dos meios normais de persecução criminal
(MENDRONI, 2002, p. 31).

Os chefes ou responsáveis por cada órgão público assumem perante os


demais o compromisso de co-participar com seus esforços, - de pessoal,
materiais e equipamentos disponíveis e principalmente partilhando das
informações, que já por acaso detenham a respeito de pessoas, situações,
circunstâncias, locais, etc. Formulam um contrato no qual esse
compromisso e os seus tópicos tornam-se documentados, permitindo a
estabilidade do Grupo (MENDRONI, 2002, p. 32).

Já a Força-Tarefa informal prescinde de contrato escrito:

Basta que as Forças Estatais se reunam e planejem diretrizes a serem


seguidas em cooperação mútua intensificada contra um determinado
problema relacionado à criminalidade em determinada região. Não havendo
compromisso documentado o desfazimento torna-se mais fácil e a Força-
Tarefa mais instável, o que contudo não impede que sejam alcançados
resultados satisfatórios (MENDRONI, 2002, p. 32).

Unem-se em verdadeiro esforço coletivo os órgãos dos representantes dos


Ministérios Públicos, das Polícias, da Secretaria da Fazenda, da Receita
Federal, do INSS, da Procuradoria do Município. Eles se reúnem de forma a
traçar diretrizes, estratégias, trabalhando em conjunto contra determinada
situação de criminalidade organizada (MENDRONI, 2002, p. 32).
133

Quanto ao material, equipamentos e integrantes, o autor destaca (2000, p.


32): “Cada órgão que vier integrar a Força-Tarefa deve participar com a estrutura
que puder dispor, não só entregando agentes à participação, mas também veículos,
equipamentos de investigação, armas, etc.”74. Os Chefes dos órgãos devem realizar
uma triagem e separar aqueles interessados em participar, seja para trabalhar de
forma integral na Força-Tarefa seja a título de horas extras.

Nessa realidade, Mendroni alerta:

Torna-se então intolerável a ocorrência de situações de “ciúmes”, entre


integrantes das mesmas instituições e de instituições distintas. Torna-se
inaceitável realizações de operações ou providências adversas e
prejudiciais, umas as outras. Todos os integrantes devem ter em mente, de
forma inequívoca, que trabalham para a perseguição do mesmo objetivo, e
para isso, nada mais prejudicial que o trabalho desencontrado, adverso.
Não se admitem disputas entre os integrantes do mesmo time, situação em
que os criminosos evidentemente extraem vantagens (2002, p. 34-35).

Como no âmbito da investigação criminal, costumeiramente depara-se com a


prática de diversos delitos, mister se faz utilizar os mecanismos processuais
disponíveis para o caso concreto75, procurando sempre atingir os bens e o dinheiro
dos chefes das organizações.
Mendroni (2002) observa que a estrutura material é essencial, em especial
quanto à instalação de computadores interligados em rede com os mais diversos
órgãos públicos e um local de preferência neutro, proporcionando a atuação de
todos os seus integrantes, nos “moldes do sistema Norte Americano” (p. 36).
Salienta a importância de um local onde a “identidade seja do próprio grupo” (p.
37)76.

74
No entendimento do autor (2002, p. 33), é preciso formar uma estrutura material compatível com o
combate à organização criminosa, como, por exemplo, softwares para a execução de interceptações
telefônicas e acesso aos bancos de dados, micro câmeras, escutas ambientais,etc.
75
Geralmente, os mecanismos legais mais utilizados são os previstos na Lei n. 9.034/95 e Lei
10.217/01 que dispõem sobre a utilização de meios operacionais para a prevenção e repressão de
ações praticadas por organizações criminosas (exemplos: ação controlada, infiltração de agentes,
acesso a dados, delação premiada e outros); na Lei n. 9.613/98 que dispõe sobre os crimes de
lavagem ou ocultação de bens, direitos e valores; na Lei n. 9.807/99 que estabelece normas para
organização e manutenção de programas especiais de proteção a vítimas e a testemunhas
ameaçadas; na Lei n.7.492/96 que se refere aos crimes contra o Sistema Financeiro Nacional, etc.
76
Mendroni (2002) recomenda a participação de Ministérios Públicos Estadual e Federal
(coordenação das investigações e providências jurídicas), das Polícias Federal, Estadual e Militar
(atuação no campo operacional), do Setor de Inteligência (com pessoal especializado em perícias
diversas, computação, contadoria, telefonia, etc.), da Secretaria da Fazenda, da Receita Federal, do
INSS e dos Procuradores e Agentes do Banco Central.
134

O autor sugere, quanto aos pressupostos para o combate, que haja uma
estratégia de atuação definida (panorama geral da organização criminosa), uma
investigação de campo (identificando-se todos os participantes, em especial os
“testas-de-ferro”) e a obtenção de informações e documentos referentes aos dados
pessoais de todos integrantes. Após, mister se faz o processamento e conferência
das informações (ex. cruzamento de dados a partir de informações da declaração de
imposto de renda, dados da Secretaria da Fazenda, contas de luz, água, cadastro
na Junta Comercial, contas bancárias, etc.).
Para a realização dessas tarefas, Mendroni (2002) e Brindeiro (2004)
sustentam a atuação exclusiva dos Agentes Policiais, especialmente treinados para
tanto.
Após a coleta e exame dos dados, os Promotores de Justiça devem definir os
principais pontos de ataque jurídico, para, em seguida, movimentar a máquina do
Estado. É o início da atividade jurídica e normalmente da atividade jurisdicional, na
medida em que se requer quebra do sigilo telefônico, sigilo bancário, fiscal, escutas
telefônicas, etc. Por certo que as boas estratégias são sempre bem-vindas77 como,
por exemplo, o lançamento de contra-informações para dentro da organização
criminosa desde que bem executada e sem provocar suspeitas (2002, p. 39).
O objetivo da Força-Tarefa deverá ser sempre destruir a organização
criminosa. Importante concentrar esforços para destruir a organização criminosa,
remetendo os demais crimes para as formas de investigação e persecução comuns.
Nos últimos anos, como bem ressalta Machado (2007), as Forças-Tarefa
tornaram-se importante estratégia política78.
Silva assinala:

Assim, na atual conjuntura de violência e corrupção que assola o país,


deveríamos nos empenhar numa “Força-Tarefa” para combater esses
males, sem vaidades, corporativismos ou exclusividades, posto que isto não
traz qualquer benefício, mormente diante da árdua luta que temos pela
frente, para, acima de tudo, buscar uma melhora para a sociedade,
destinatária final de nosso trabalho (2004, s/p).

77
A propósito do tema, confira-se A Arte da Guerra, os 13 capítulos. Edição Especial. São Paulo:
DPL, 2007.
78
Em 2002, São Paulo criou a Força-Tarefa permanente para combater o comércio de mercadorias
ilegais que entravam no país e acabar com a corrupção do setor de fiscalização da Prefeitura. Em
2003, foi criada a Força-Tarefa contra o crime organizado no Espírito Santo. No mesmo ano, foi
criada a Força-Tarefa que comandou a “Operação Anaconda” envolvendo esquema de vendas de
sentenças por Juízes Federais. Disponíveis em: <http://portal.prefeitura.sp.gov.br> e
<http://notícias.correioweb.com.br>.
135

Medeiros bem salientou que:

As incipientes experiências de Forças-Tarefa ou grupos de atuação,


surgidas no seio do Ministério Público Federal, ou nos centros de apoio
operacional, que se firmam nos Ministérios Públicos estaduais, são
indicadores de que novos modos de organização das engrenagens do
Ministério Público estão sendo exigidos em face da dinâmica de sua
atuação e dos níveis de cobrança por que passa a instituição (2006, p. 77).

Questionada sobre a importância da integração entre as organizações, em


“Histórias de Vida do Ministério Público do Rio Grande do Sul”, Ruwel destacou:

[...] sempre entendi ser importante a integração entre as instituições. O


Ministério Público depende da Polícia Civil, pois é ela quem faz os
inquéritos, quem investiga, e, da mesma forma, da Brigada Militar, pois são
os Policiais Militares os que realizam o policiamento ostensivo, bem como,
na maioria das vezes, os que chegam em primeiro lugar na cena do crime.
Por tudo isso, é importante essa integração, essa troca de informações e
experiências (2005, p. 266).

Salienta Lemos Junior (2002, p. 446-447) que diante da forma com que atuam
as organizações criminosas (a diversidade de atividades e a presença indispensável
de funcionários públicos), a criação de Força-Tarefa é a única forma real de
enfrentar a atuação do criminoso organizado.
Pode-se observar que são vários e diversificados os conceitos atribuídos à
figura da Força-Tarefa, bem como o entendimento de sua importância e
necessidade. Portanto, inviável a utilização de um conceito-padrão de Força-Tarefa
para que seja utilizado como modelo ideal na presente dissertação. Exeqüível, sim,
é a utilização das principais características de todos esses conceitos daquilo que
autodenominam “Forças-Tarefa”, objetivando a construção de um mecanismo ideal
e viável para o combate à macrocriminalidade.
Já, nos Estados Unidos, as Forças-Tarefa Task-Force (Força-Tarefa) são
amplamente conhecidas e definidas.
136

7.2 FORÇA-TAREFA AMERICANA: TASK FORCE - USA

Objetiva-se com o presente subitem trazer informações de como as Forças-


Tarefa (Task-Force) atuam nos Estados Unidos. Primeiro por ser um dos primeiros e
poucos locais onde uma Força-Tarefa permanente atua de forma constante e
estável, ao contrário do que ocorre no nosso Estado, segundo por ser um dos
modelos que mais se aproxima do que se busca aperfeiçoar no Rio Grande do Sul e
objeto da presente pesquisa.
Mendroni destaca que os Grupos denominados Task-Force – Força-Tarefa
são considerados pelos Agentes Norte-Americanos o melhor sistema para o efetivo
combate às Organizações Criminosas:

Concebidos sob a ideologia da mútua cooperação entre os diversos órgãos


de persecução detentores de atribuições variadas para atuar em conjunto,
com unidade de atuação e de esforços, com o direcionamento para a
investigação, análise e iniciativa de medidas coercitivas voltadas para o
desmantelamento das estruturas criminosas, utilizando-se dos mais
variados instrumentos de investigação e mecanismos legais (2002, p. 30).

O relatório The Organized Crime Drug Enforcemenrt Task Force Program –


Briefing for the Delegation from Brazil (2006), escrito pelo The Department of the
Treasury, Department of Justice e U.S. Department of Homeland Security assim
descreveu The Organized Crime Drug Enforcement Task Force Program (o
Programa Força-Tarefa de Combate ao Crime Organizado e Drogas) 79:

PAPEL:
O Programa Força-Tarefa de Combate ao Crime Organizado e Drogas
combina a perícia e recursos de suas sete agências federais afiliadas (membros),
junto com Promotores de Justiça e com autoridades policiais estaduais e municipais,
para desestruturar e desmantelar sofisticadas organizações de tráfico de drogas que
operam regionalmente, nacionalmente e internacionalmente, assim como os
sistemas financeiros que as suportam.

79
Dados coletados através do material entregue ao Ministério Público do Rio Grande do Sul, em
2006, durante visita aos Estados Unidos. Ver Anexo VI.
137

Ela se esforça para reduzir o abastecimento de drogas diretamente amparado


pela Estratégia Nacional de Controle de Entorpecentes e pelo Plano Estratégico do
Departamento de Justiça.

HISTÓRIA:
A Força-Tarefa foi criada pelo Presidente Reagan, em 1982, como uma
resposta para a epidemia das drogas que envolvia uma rede de grupos criminosos,
cujos principais líderes eram freqüentemente isolados das atividades diárias de suas
organizações.
A missão do programa era se concentrar “naqueles que dirigem,
supervisionam e financiam o comércio de drogas ilícitas”, separar, e finalmente
destruir a bem costurada rede de criminosos que vivem do tráfico de drogas e de
crimes a ele relacionados.
O então Presidente dos EUA, baseado na noção de que um único órgão não
possui a perícia, recursos e competência (autoridade legal) para realizar a missão
sozinho, criou esse mecanismo de investigação.
Originalmente estabeleceu Forças-Tarefa paralelas (coligadas), porém, refere
que, com o passar do tempo o Programa perdeu seu foco.
A partir daí, houve o reestruturamento do PFTCCOD (Programa Força-Tarefa
de Combate ao Crime Organizado e Drogas).

REESTRUTURAMENTO DO PFTCCOD:
Em março de 2002, o Procurador-Geral dos Estados Unidos (Ministro da
Justiça) anunciou uma estratégia abrangente de coação para reduzir o
abastecimento de drogas ilícitas, identificando, desestruturando e desmantelando
grandes organizações de abastecimento de drogas e lavagem de dinheiro, por meio
de investigações nacionalmente coordenadas tendo como alvo toda a infra-estrutura
dessas organizações.
O PFTCCOD era a peça central dessas estratégias. Dentre elas
apresentaram:
1) Diretrizes aperfeiçoadas para se concentrar nas mais significantes;
2) Para cada investigação criminal conduzida pela Força-Tarefa, há a
exigência de uma investigação financeira;
138

3) Exigência do desenvolvimento anual de Planos de Estratégia Regional


para incluir a identificação das Organizações Alvo das Prioridades Regionais;
4) Estabelecimento de medidas de desempenho e implementação de
relatórios para todas as investigações da Força-Tarefa;
5) Criação de uma central de informação, contendo agentes e analistas
dos diversos órgãos desenvolvidos, com a função de cruzar os dados das
investigações, identificando a conexão entre as organizações-alvo, concentrando os
esforços nos componentes financeiros dessas organizações;
6) Estabelecimento de definições padrão de desestruturamento/
desmantelamento;
7) Exame dos acordos reembolsáveis do órgão e;
8) Revisão das exigências extraordinárias, estaduais e locais, para
acordos e reembolso, objetivando melhor supervisão e controle.

MEMBROS:
AFT: Álcool, fumo, armas de fogo e explosivos;
DEA: Administração de combate às drogas;
FBI : Departamento Federal de Investigação;
ICE: Serviço Nacional de Imigração e Vistoria Aduaneira, Serviço Interno de
Receita/Fisco;
USCG: Serviço Nacional de Guarda Costeira; Os 94 Gabinetes dos
Promotores de Justiça dos Estados Unidos e;
USMS: Serviço de Delegados dos Estados Unidos; Departamento de Justiça
Criminal e Divisão de Taxas e Autoridades Policiais Estaduais e Municipais.

REALIZAÇÕES DO PFTCCOD:
Os resultados dessa nova política indicaram alto grau de eficiência: os
membros da Força-Tarefa:
1) Os membros do PFTCCOD desmantelaram 20 organizações-alvo
consolidadas como prioridade e desestruturaram a operação de outras nove, entre
os anos de 2003 e 2005. Além disso, desestruturaram e desmantelaram 238
organizações relacionadas aos alvos estabelecidos como prioridades em 2005;
2) Ao final de 2005, 402 investigações foram relacionadas aos alvos da lista
de prioridades, e 420 foram relacionadas aos alvos das prioridades regionais;
139

3) Aproximadamente 95% das investigações do PFTCCOD iniciadas em 2004


e 2005 envolveram investigações financeiras. Isto é mais de 14% das investigações
iniciadas em 2002;
4) Em 2005, o PFTCCOD confiscou pouco menos de US$ 322 milhões ou
123% do que foi confiscado em 2004 e 184% do confiscado em 2003 e;
5) Igualmente em 2005, 90% de todas as investigações ativas do PFTCCOD
eram multijurisdicionais, isto é, um acréscimo de 19% das investigações dessa
categoria em meados de 2003 e 50% dessa categoria ao final de 2003. Além do
mais, 40% de novas investigações são de escopo internacional.

O CENTRO DE FUSÃO DO PFTCCOD: Objetivos:


1) Combinar os dados das investigações financeiras e de entorpecentes em
uma central;
2) Time de agentes e analistas de órgãos diversos para desenvolver
diretrizes;
3) Identificar conexões entre alvos e organizações por meio das linhas
regionais e estaduais;
4) Melhorar esforços para se concentrar nos componentes financeiros das
organizações e;
5) Criar uma imagem completa e inteligente para o campo.

A partir da implementação das Forças-Tarefa, 95% de suas investigações,


iniciadas em 2004/2005, envolveram investigações financeiras, o que corresponde a
mais de 14% das investigações iniciadas em 2002. Tão-somente no ano de 2005,
foram confiscados aproximadamente US$ 322 milhões de dólares, o que representa
123% a maior do que foi confiscado em 2004 e 184% do que fora em 2003.
Nos Estados Unidos, conforme Mendroni (2000), normalmente integram os
grupos de Força-Tarefa todas as polícias com atribuições locais e as agências
federais:

1) Polícias municipais;
2) Polícia dos condados;
3) Polícias estaduais e;
140

4) Agências Federais como FBI, DEA, US-Customs, US-Marchals, IRS,


etc.

Sendo essas últimas que mantém a gerência dos grupos integrantes.

O Departamento de Justiça dos Estados Unidos da América e HIDTA – HIGH


Intensity Drug Trafic Area – North Texas apresentaram diversas recomendações
para a organização de um grupo de Força-Tarefa, que restaram identificadas por
Mendroni (2000, p. 43-46):

FUNÇÕES DE PLANEJAMENTO:

1) Desenvolver a estrutura;
2) Decidir a composição;
3) Estabelecer Comissões de Trabalho e;
4) Decidir sobre as obrigações dos membros da Força-Tarefa (nível de
autoridade, quem vai fazer, o que, quando, etc.).

PAPEL DO LÍDER:
1) Providenciar treinamento para os membros quanto às suas funções
(cursos, treinamentos no local de trabalho, visitas a outras Forças-Tarefa, etc.);
2) Desenvolver estratégias;
3) Estabelecer avaliação do risco;
4) Trabalhar de acordo com as orientações dos órgãos;
5) Reconhecer as limitações do orçamento;
6) Planejar a estrutura financeira da Força-Tarefa;
7) Indicar Órgão Fiscal;
8) Desenvolver procedimentos financeiros;
9) Aperfeiçoar políticas de pessoal e controle de pessoal;
10) Recrutar a participação de pessoal da área judicial e de policiamento no
Grupo;
11) Definir quem patrocinará a Força-Tarefa;
12) Decidir sobre o tipo de apoio financeiro para a Força-Tarefa
(requerimentos, salários, veículos, horas extras, equipamentos, relatórios);
141

13) Examinar os papéis gerais de cada órgão (memorandos, contratos de


trabalho) e;
14) Estabelecer a sede-escritório, móveis e bens e equipamentos técnicos.

RECOMENDAÇÕES DE ORGANIZAÇÃO DE 0 A 60 DIAS:


1) Desenvolver estratégias e planejar como a Força-Tarefa irá funcionar;
2) Estabelecer relacionamentos com os órgãos participantes;
3) Desenvolver contatos com outras Forças-Tarefa;
4) Obter treinamento e gerenciamento financeiro;
5) Desenvolver memorandos de entendimento (compartilhar bens, etc.) e;
6) Desenvolver contratos de trabalho.

DE 60 A 120 DIAS:
1) Aperfeiçoar a avaliação de risco, estratégia e grupos individuais;
2) Desenvolver um orçamento geral e prioridades de recursos financeiros;
3) Decidir sobre políticas de compras;
4) Controlar o inventário;
5) Buscar recursos para pessoal e equipamento;
6) Desenvolver a planta do espaço da sede para a Força-Tarefa;
7) Definir a necessidade da Força-Tarefa;
8) Estabelecer o orçamento e;
9) Fazer considerações a respeito da locação e construção.

DE 120 A 180 DIAS:


1) Estabelecer relacionamentos com a comunidade e os líderes políticos;
2) Iniciar, efetivamente, as atividades da Força-Tarefa;
3) Desenvolver objetivos gerais da Força-Tarefa;
4) Começar a fazer acompanhamento das realizações do primeiro ano até
o momento (mantendo estatísticas de tudo) e;
5) Desenvolver um diretório de políticas e procedimentos.

DE 180 A 360 DIAS:


1) Mudar para a Sede;
2) Começar a preparar a Avaliação de risco, estratégia, iniciativas;
142

3) Iniciar a revisão e avaliação dos membros da Força-Tarefa e;


4) Desenvolver programas de treinamento avançado.

OUTRAS RECOMENDAÇÕES:
1) Buscar fontes adicionais de financiamento e recursos financeiros (doações,
contribuições, etc.);
2) Não se comprometer muito financeiramente com base somente na
possibilidade de obter recursos financeiros futuros;
3) Estabelecer prioridades financeiras gerais para a Força-Tarefa e;
4) Realocar recursos financeiros conforme o necessário para sustentar
necessidades gerais.

O Relatório80 apresentado pelos membros do Ministério Público do Rio


Grande do Sul confirma o destacado por Mendroni (2002), no sentido de que as
Forças-Tarefa continuam sendo utilizadas nos Estados Unidos como forma de
desmantelar as organizações criminosas.

7.3 FORÇA-TAREFA NO RIO GRANDE DO SUL

O presente subitem tem a pretensão de demonstrar parte do trabalho que


vem sendo realizado junto às Promotorias Especializadas Criminais de Porto Alegre,
conhecidas como “Forças-Tarefa do Ministério Público Estadual”.
No Rio Grande do Sul, o que o Ministério Público autodenomina como “Força-
Tarefa” surgiu no final do ano 2000, quando foi instituída a Comissão Parlamentar de
Inquérito (CPI) do Crime Organizado pela Assembléia Legislativa, criando uma força
de apoio composta pelo Ministério Público Estadual, Ministério Público Federal,
Polícia Federal, Polícia Civil, Brigada Militar e Secretaria da Fazenda, para apoiar as
ações daquela CPI. Desenvolveu-se no curso do ano de 2001.
Em setembro de 2001, no relatório final, o relator da CPI, Deputado Francisco
Ápio, sugeriu que aquela Força-Tarefa fosse tornada definitiva. Essa sugestão foi

80
Dados coletados através do material entregue ao Ministério Público do Rio Grande do Sul, em
2006, durante visita aos Estados Unidos. Ver Anexo VII.
143

acolhida pelo Governador do Estado, pelo Secretário de Justiça e da Segurança


Pública e pelo Procurador-Geral de Justiça. Estabeleceu-se então, em setembro de
2001, um convênio entre o Ministério Público Estadual e o Governo do Estado. O
termo previu um subconvênio entre a Secretaria de Justiça e da Segurança Pública
e o Ministério Público, disponibilizando Policiais Militares e Policiais Civis para
comporem uma força de apoio à Promotoria Especializada Criminal. Assim, nasceu,
inicialmente, para auxiliar na CPI, e, depois, tornou-se perene no apoio às ações da
Promotoria Especializada Criminal.
Em 2002, o Estado do Rio Grande do Sul, por intermédio da Secretaria de
Justiça e da Segurança e do Ministério Público Estadual, visando ao
desenvolvimento de ações de combate ao crime organizado, à macrocriminalidade
econômica e à criminalidade envolvendo agentes públicos, celebraram um
subconvênio. Seu objetivo era viabilizar ações conjuntas, levadas a efeito pelo
Ministério Público, com a cooperação investigatória e operacional da Secretaria de
Justiça e da Segurança, por intermédio da Brigada Militar, da Polícia Civil e do
Instituto-Geral de Perícias. Ao Poder Executivo competia disponibilizar os recursos
humanos, materiais e técnicos e ao Ministério Público Estadual disponibilizar a
estrutura operacional das Promotorias. Na época, o prazo de vigência era de 2
anos. Após, realizaram um termo aditivo, onde coube ao Poder Executivo
disponibilizar recursos humanos e materiais às atividades de apoio. O prazo foi
prorrogado para 4 anos. Findo esse prazo, novo termo previu a disponibilização, por
parte da Secretaria de Justiça e da Segurança, de veículos, efetivo, equipamentos e
o acesso ao Sistema de interceptações telefônicas ao Ministério Público Estadual.
Em 2006, houve um novo convênio entre o Estado do Rio Grande do Sul, por
intermédio da Secretaria de Justiça e da Segurança e do Ministério Público
Estadual, que restou assinado em 20.12.2006, DOE 09 de janeiro de 2007, com
vigência de um ano, mantendo-se os mesmos termos81.
Atualmente, o Ministério Público Estadual tem denominado “Força-Tarefa”
esse grupo de Policiais e Promotores que atuam junto à Promotoria Especializada
Criminal.
Conforme explicado por um dos entrevistados, Promotor de Justiça,
integrante dessa Força-Tarefa:

81
Ver Anexo VIII.
144

Hoje nós podemos dizer que a FT está junto com a Promotoria Especializada
Criminal. Não é. Está junto com. Podemos dizer que a Promotoria sem a FT seria
hoje uma ONG, porque eles são os nossos braços da rua, são assessores que
podem buscar os fatos na rua. São Policiais treinados e experimentados para buscar
os fatos na rua e nos trazer para que nós possamos exercer a atividade
investigatória do MP, suportado por aqueles elementos de provas que eles colhem
(MPRS).

A Força-Tarefa representa a abertura de caminhos, inovação no combate à


criminalidade porque combate espécies de crimes que não são combatidas e de
forma diferente com a visão do Promotor. Visão de quem trabalha a prova depois do
processo. Já faz a fase pré-processual pensando não no término daquilo (relatório
policial) e sim no processo, na prova, na sentença condenatória. Esse é o grande
problema. Cada Instituição (Polícia Civil, Polícia Militar, Ministério Público, Poder
Judiciário) faz o seu trabalho e na verdade todo mundo fez seu trabalho e o réu está
solto e continua cometendo o crime [...]. A Força-Tarefa atua em ações distintas.
Geralmente o Promotor atua nas ações finais, operações finais, busca e apreensão,
etc. Outras não. O normal é que se recebe uma “notitia criminis”, se verifica a
questão da atribuição, se é atribuição da Promotoria, e sendo da Promotoria e
existindo diligências externas elas são feitas. Policial vai, filma, faz relatório. Peço
preventiva. Se um Promotor normal recebe esta notícia manda para a Polícia, leva
10, 15 dias se não houver nenhum obstáculo inesperado no caminho. Ou quando se
estabelecem operações maiores que envolvem escutas telefônicas, movimentações
bancárias e aí então temos operações com 100, 120 mil ligações telefônicas. Esse
trabalho de campo é feito pelos policiais e nós entramos com o suporte jurídico.
Discutimos a estratégia eu com minha equipe, ações táticas, mas a forma de como a
coisas devem acontecer é com eles. Eu digo o que preciso (filmagens, oitivas) e eles
decidem como atuar. A estratégia é do Promotor e a tática é dos Policiais. Cada um
dos cinco Promotores possui uma equipe de Policias. São cinco Promotores com
2,3, policiais e ao total 15. Em determinadas vezes se reúnem. São cinco
Promotores da Coordenadoria Criminal que são a Força-Tarefa. Temos assessores,
assistentes, técnicos de áudio, agentes financeiros, técnicos, suporte administrativo
que compõe a Especializada e a sua Força-Tarefa (MPRS).
145

Pelos documentos analisados e pela entrevista realizada com o então


Coordenador da Promotoria Especializada Criminal, infere-se que, geralmente, são
investigados delitos de tráfico de drogas e crimes contra a Administração Pública,
em especial, concussão, corrupção e peculato, envolvendo Agentes Públicos, com
formação de quadrilhas. A Força-Tarefa possui um “link” do “guardião”, pertencente
à Secretaria de Justiça e da Segurança, o que não garante completa segurança
quanto ao sigilo do apurado nas escutas. Não existem cargos próprios, efetivados
por concurso. Ao contrário, os Policiais são cedidos pela Secretaria de Justiça e da
Segurança, mediante prévio convênio, ficando o Ministério Público vinculado ao
interesse e à disponibilidade do Governo. O fato desses Agentes não serem
concursados, vincula-os às Instituições de origem, o que, eventualmente, pode
comprometer o sigilo das operações. Não existem funcionários qualificados, experts
em análise de dados bancários, técnicos em operações com softwares e outros
programas de computadores. Esse grupo não se localiza em um prédio próprio,
onde todas as Instituições encontram-se juntas, de forma integrada (Polícia Civil,
Militar, etc.). Ao contrário, está sediado em um dos andares de um prédio do
Ministério Público. Além disso, a coordenação fica a cargo de um Promotor de
Justiça (com atribuição apenas no âmbito do 1º grau). As investigações são
realizadas sob a presidência do Promotor de Justiça através de um Procedimento
Investigatório Criminal, com o auxílio de Policiais.
Em que pese as deficiências estruturais, materiais e humanas, a Força-Tarefa
vem obtendo êxitos em suas operações, através de diversas denúncias e
condenações de pessoas com alto nível econômico. Há vários casos que teriam
seus resultados reduzidos em mais de 50% (cinqüenta por cento) se um Promotor
de Justiça, de forma isolada, fosse investigar.
Na opinião do entrevistado, integrante dessa Força-Tarefa:

Acreditamos que fazemos um bom trabalho em razão das várias reações de


desagrado com o nosso trabalho, vindo de setores bem específicos da sociedade,
tais como advogados de bandidos, acadêmicos de boa e má índole, que procuram
com seu conhecimento deturpar a intenção do trabalho. Setores corruptos da
administração pública que se impõem fortemente contra a existência da Força-
Tarefa. Por quê? Porque eles querem que o Promotor volte a se encastelar dentro
de sua Promotoria e receba única e exclusivamente papéis que são manipulados,
146

porque os papéis aceitam tudo. São setores retrógrados e corrompidos que querem
o Promotor como um “bobo na corte” [...]. Começamos, embora aquilo não seja
também importante, a denunciar médico, assessor de político, político, vereador,
vice-prefeito, secretário, dono de empresa, temos denúncias contra empresa de leite
[...] (MPRS).

Há opiniões favoráveis à criação de uma Força-Tarefa permanente, em


especial pela dificuldade de um Distrito Policial, de forma isolada, investigar
determinados crimes. Um dos entrevistados, integrante da Polícia Civil, observou:

Tem uma questão crucial e muitos não se deram conta: As ferramentas


postas à disposição da investigação policial. Hoje, na maioria das vezes, a
descoberta vem através de interceptação telefônica [...]. Temos o software, o
guardião [...]. Mas tal mecanismo encontra-se na Secretaria de Justiça e da
Segurança: órgão político! A Polícia Federal tem o guardião dentro de sua casa. A
ingerência é menor. Outra questão crucial que mostra que essa parceria é salutar é
a garantia para o investigador, que estará atuando junto com o MP. Sozinho, fica ao
sabor do momento político. Um distrito isolado não tem condições de investigar
sozinho determinados crimes. Por exemplo, nessa nossa investigação há a
participação de muitos agentes públicos (cooptação de agentes públicos) CRVA,
despachantes, Polícia Civil (PCRS).

Questionados sobre a necessidade de integração entre as diversas


instituições para o combate ao crime organizado, os entrevistados responderam:

O motivo dessa união é porque as coisas não funcionavam e não funcionam.


Por quê? Porque as policias são notoriamente despreparadas, quer em termos de
recursos humanos, quer em termos de recursos naturais. Têm focos muito grandes
de corrupção (principalmente a Polícia Civil). A Polícia Militar, embora seja uma
Polícia organizada, é truculenta e sem um viés investigativo. O Ministério Público,
por seu turno, ficava e fica muitas vezes encastelado nas suas Promotorias e não vê
o que acontece. A qualidade do trabalho do Ministério Público depende da qualidade
do trabalho que ele recebe. Se ele recebe um trabalho mal feito, quer por
impossibilidade, incompetência, quer por falta de vontade, corrupção, interesses
147

corporativos, interesses políticos [...]. Então hoje são das coisas boas que as
Instituições têm, ou seja, o treinamento de investigação da Polícia, a disciplina da
Brigada Militar, os recursos do Ministério Público, a capacidade jurídica dos
Promotores, estrutura que nos permitem ultrapassar, embora com alguma
dificuldade, essas barreiras e fazer com que o material que chega ao Promotor seja
um material de boa qualidade e aí então o trabalho fica um trabalho de boa
qualidade. Permite desbaratar quadrilhas, processar grandes empresários, enfrentar
setores que ordinariamente não seriam enfrentados. Por quê? Porque poderiam se
contrapor, quer financeiramente, quer politicamente pressionando as instâncias
administrativas da Polícia, para retirada das investigações. Por isso ela se fez
necessária. Para que se superassem os óbices, as dificuldades decorrentes de toda
uma estrutura e se juntasse, se catalisasse as coisas boas no combate à
criminalidade organizada. Para isso que se criou, para isso que ela existe. Desde o
início do trabalho, prendemos cerca de 500 pessoas, muito poucos processos nós
perdemos, estabelecemos algumas parcerias com setores de ponta, cerca de 1000
processados, isso em razão do nosso trabalho. Cada denúncia tem cerca de 10, 15
denunciados. Se um Promotor isolado fosse investigar ou denunciar esses fatos,
seria cerca de mais de 50% reduzida a sua produção. Aqui, muito mais do que
quantidade, existe qualidade. Existe “quem são os nossos réus”. Aqui temos o
prazer, se é que prazer é a expressão correta, orgulho de não prender o pobre. Aqui
nós temos bandidos de ponta, de bom nível econômico, com status, donos de
restaurante, esse são os nossos clientes preferenciais que não são alcançados pelo
trabalho ordinário (MPRS).

[...] Mas é possível que utilizando da Força-Tarefa se catalise ações. Por


exemplo, combate ao tráfico em parceria com o DENARC. Não acabamos com o
tráfico, mas aumentamos seu preço da droga na rua. Assim, quanto mais agências
existirem para combater o crime melhor: Policia Militar, Civil, Ministério Público,
Agência de Águas, quem quiser combater o crime será bem vindo. Eventuais
superposições são resolvidas na base do entendimento [...]. Buscamos “a melhora
institucional”, institucionalmente falando: a capacidade de adaptação e investigação
da Polícia Civil, a disciplina e concentração da Polícia Militar, a estrutura e
conhecimento jurídico do Ministério Público, pretendemos juntar e criar um novo
148

caminho. Os Policiais são escolhidos por indicação, afinidade, conhecimento prévio


[...], indicação do comando (MPRS).

Não há políticas de Segurança Pública. Tudo é feito de forma reativa.


Enquanto não houver um ataque sério e fulminante contra a corrupção de
funcionário público, não se pode falar em política de segurança. Esse é o primeiro
passo: limpar a casa. No momento em que se limpa a casa é possível fazer alguma
coisa. Mas hoje se sabe que boa parte da Polícia Civil e Militar está se corrompendo,
tem um grande nicho de ‘ovos pobres’ que precisam ser extirpados. Por quê?
Porque esses tipos de conduta perpassam à sociedade uma permissividade e uma
autorização coletiva. Primeira coisa: tolerância zero contra a corrupção e truculência
policial e depois vamos conversar. A Força-Tarefa nesse contexto, pouco ajuda. São
15 policiais num universo de mais de 25 mil Policiais Militares, 6, 7 mil policiais civis.
Não há como termos uma ingerência na política pública (MPRS).

Ao contrário do entendimento do membro do Ministério Público, o Delegado


da Polícia Civil sustenta que a investigação deve ser feita pela sua Instituição:

[...] as instituições são órgãos estanques por incrível que pareça, embora a
gente faça o IP, para o MP, somos estanques. E tem a questão corporativista e
institucional. E eu entendo que dentro da atribuição de cada instituição se pode
trabalhar junto, dá para integrar, cada um fazendo seu mister. Uma investigação, por
exemplo, a que está aqui: furto, roubo, receptação, adulteração de veículos:
organização criminosa que age no Rio Grande o Sul, Santa Catarina, Paraná, Mato
Grosso, São Paulo, são 9 meses de investigação, com interceptação, filmagem,
enfim as técnicas mais novas de investigação foram usadas. Durante todo esse
período se repassou para Polícia Rodoviária Federal, Polícia Rodoviária Estadual,
Polícia Civil, Paraná, claro que eram avisados e ai a investigação se alastra. Está
fazendo 30 dias que a representação com IP, que são 2500 laudas e pedido de
representação de prisão preventiva, ambas estão em poder da Juíza [...] e ela não
decide. Ou seja, se esse trabalho fosse feito de forma integrada, e o MP trabalhando
junto com o Poder Judiciário também, o Poder Judiciário não iria se imiscuir nas
provas. Sem dúvida que esse é o exemplo que cai como uma luva. Talvez o
tratamento fosse diferenciado. Agora estamos de novo pedindo as prisões
149

preventivas, nesse período de espera já mais de dezenas de veículos foram


clonados. A BM poderia entrar na questão da inteligência, trazendo informações
para a Polícia Civil e num segundo momento para deflagração da operação:
cumprimento do mandado de busca e apreensão, acompanhamento da Polícia
Militar como polícia ostensiva, preventiva. Há a necessidade de melhorar a questão
da integração (PCRS).

[...] Por outro lado, quando se fala em integração e talvez seja o receio dos
homens da instituição é a questão de um querer se arvorar na atribuição da outra. A
Brigada Militar nas investigações, canalizando provas para sua corporação, atraindo
um atrito desnecessário. Claro que outra questão fundamental é o Poder Judiciário.
Por exemplo, Rio Grande do Sul não tem vara especializada para o crime
organizado. Pior é quando toda a investigação está pronta, com pedidos de Prisão
Preventiva e mandado de busca e apreensão, ai os Juízes começam a se dizer
incompetentes e vai passando de um para outro até o Tribunal de Justiça resolver
depois de muito tempo e a prova sumiu. Perdeu-se toda investigação nesse tempo,
meses, argüição de incompetência. Poder Judiciário é fundamental nesta questão.
Não o Judiciário sendo parte e sim o Judiciário-Poder-Estado, tendo condições de
processar dezenas de réus na mesma comarca. É uma questão estrutural (PCRS).

[...] então a questão do Termo Circunstanciado [...]. Acho até que num
primeiro momento sou favorável, desde que essa outra instituição esteja fazendo
seu serviço. Essa a Brigada não tem gente para fazer o policiamento preventivo. E
outra coisa eu sou grande defensor do policiamento preventivo ostensivo. Eu tenho
inúmeros exemplos de ações do Corpo Regional do Vale dos Sinos depois que nós
botávamos a Policia na rua, eles, os ladrões, não agiam. Então é assim ó [...] se o
Policial não tem condição de fazer a atribuição precípua dele como é que ele vai se
arvorar numa outra que não é dele, né? Então não tem. Bom o Estado tem que cair
na real tem que contratar mais, tem que [...]. Enfim a questão é com o administrador
e não com nós, né? [...] Eu sou professor de administração policial, organização,
sistema e método [...] tu te apavora quando tu começa a ver o organograma de cada
instituição. Isso é o fim da picada. Tá? Agora têm mais os azulzinhos e tem mais a
Guarda Municipal, entendeu? Aí tu pega, vamos pegar o exemplo de Canoas. Em
Canoas tu tens distritos policiais especializados, a delegacia da mulher, a delegacia
150

de trânsito, e uma delegacia regional que comanda a região [...] aí tu vai pra Brigada
Militar, aí tem 15º BPM com 4 companhias. Aí tu tens o Comando de Policiamento
Metropolitano que a sede é em Canoas. Até tu vais para os Bombeiros, aí tu tens o
Comando Regional dos Bombeiros com sede em Canoas, ou seja, aí tu tens a
Guarda Municipal e ainda tem o Secretário Municipal de Segurança Pública com a
Guarda Municipal com cento e poucos agentes. Cada um desses tem uma estrutura
administrativa, tem uma secretaria, mulher da limpeza, tem o prédio, tem a luz, tem a
viatura. Isso não pode estar certo. Tem que faltar gente. É muita gente. tá? Eu sou
adepto de uma polícia única. Um comando só. Quem vai comandar? Não sei! Isso é
pra um segundo momento. Mas tinha que ser polícia única. A nova polícia. Claro é
difícil, ainda mais aqui no RS que as duas instituições. A Brigada tem histórias e não
sei que tal. Mas tinha que ser polícia única, comando único, tu és fardado pra fazer
isso aqui, tu és da polícia judiciária tu vai fazer trabalho de cartório e tal, entendeu?
Não dá certo, não dá certo, não dá certo. Aí quando tu vês essa estrutura
organizacional aí tu te apavoras, né? (PCRS).

Já quanto à preocupação com atuação da Polícia Federal, assim se


manifestou o entrevistado, integrante da Brigada Militar:

[...] Criminalidade: Devemos diferenciar crime de ocasião e crime organizado.


Pelas questões sociais até pode-se dizer que há muitos crimes de ocasião. A
Brigada Militar pega só a ponta, o Crime Organizado demanda mais inteligência
porque eles se reúnem para grandes tarefas. Ex. venda de veículos, planejamento,
pirataria têm organização por trás. A Brigada Militar ataca o crime de ocasião,
aquele que aparece, mas é o menor. Temos a Polícia Civil que tem grandes
dificuldades, porque há muita demanda de crimes de ocasião, gerados inclusive pela
atuação da Brigada Militar, eles não têm tempo de se dedicar para os crimes
importantes, investir nos crimes organizados. Aí surge a Polícia Federal pegando o
nicho do crime organizado, aquele crime que não aparece. A Brigada Militar vai à
feira e pega qualquer tomate que tem ali. A Polícia Federal escolhe os tomates que
quer. É o trabalho de inteligência (BMRS).
151

Resta visível a inconformidade dos entrevistados quanto à falta de articulação


e controle entre as instituições, bem como no tocante à ingerência de uma na
atribuição da outra.

7.4 FORÇA-TAREFA DO MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL82

Nesse momento, procura-se, em especial, ilustrar o tema ao demonstrar


como é realizado o trabalho das Forças-Tarefas junto ao Ministério Público Federal,
em especial, quanto ao resultado dos seus trabalhos.
A Força-Tarefa do Ministério Público Federal surgiu no ano de 2003, quando
foi detectada a necessidade de sua criação para fazer frente a uma demanda
específica no Estado do Paraná. Tratava-se de uma gigantesca evasão de divisas
por meio das denominadas CC-5. Não havia Procuradores, Delegados, pessoal da
Receita Federal e Banco Central suficientes para fazerem frente a mais de 2 mil
inquéritos que estavam represados e cujos crimes corriam o risco de prescrição. Na
ocasião, os Procuradores que atuavam na área criminal entenderam que não havia
como suprir a demanda, e que se nada fosse feito, a imagem da Instituição, do
Judiciário e do Estado, como um todo, seria gravemente afetada.83
O objetivo inicial da Força-Tarefa era organizar os inquéritos e oferecer
denúncia no prazo de sessenta dias. Isso foi concluído e toda a máquina
(Instituições Financeiras, interpostas pessoas e doleiros) foi denunciada.
Da análise do que havia, descobriu-se que a rede não era somente local, mas
nacional e internacional. Foz do Iguaçu havia se transformado numa grande
“lavanderia” (lavagem de dinheiro).

82
Material colhido através de entrevista com o Ministério Público Federal e análise de documentos –
2007.
83
A região de Foz do Iguaçu/PR sempre foi uma área de grande demanda. As fronteiras com a
Argentina e Paraguai têm seu ponto de encontro na cidade. A existência de um mercado livre no lado
Paraguaio e Argentino, com a ocorrência de milhares de compradores “muambeiros”, tem
possibilitado a prática de contrabando e descaminho de toda sorte de produtos. Paralelamente, o
mercado financeiro se mobilizou para fazer frente a essa demanda, pois o mercado paraguaio
aceitava reais brasileiros – com a finalidade de criar mecanismos de retorno desses reais. Criados os
mecanismos, eles foram facilmente burlados por pelo menos cinco instituições financeiras, que
lucraram imensamente com a remessa ao exterior de bilhões de dólares.
152

Passou-se, então, a trabalhar conjuntamente com a Promotoria e


Procuradoria americanas e com o seu Departamento de Segurança interna. Foram
utilizados diversos canais de comunicação e pactos, como o de Assistência Mútua
(MLAT), que foram sistematicamente realizados. O Departamento de Recuperação
de Ativos do Ministério da Justiça atuou como órgão intermediário, atendendo
demandas do Ministério Público Federal e do Judiciário.
Novos canais foram abertos com o Uruguai, Argentina, Paraguai, Suíça, Itália,
entre outros, buscando-se, principalmente, o contato direto entre Ministério Público
Federal e Estadual ou outro órgão encarregado da repressão à lavagem de dinheiro
desses países, possibilitando que medidas fossem requeridas no Brasil e
imediatamente cumpridas no exterior.
Na ocasião, a operação obteve grande repercussão:

Brasil traz de volta dólar desviado para EUA: Um acordo inédito permitirá ao
Brasil trazer de volta parte dos recursos remetidos por doleiros, ilegalmente, para os
EUA. Graças a um trabalho conjunto de procuradores brasileiros e promotores norte-
americanos, bloquearam-se US$ 20,5 milhões em 35 contas abertas no Merchants
Bank, de Nova York. Parte desse dinheiro, algo como US$ 5,766 milhões (ou R$
13,7 milhões) virá para os cofres do Tesouro do Brasil. Não se trata de uma
repatriação clássica, mas de uma repartição de verbas ilícitas entre os governos
norte-americano e brasileiro. Algo que jamais havia ocorrido antes (Blog do Josias,
em 04/08/07) (MPF).

Atualmente, a Força-Tarefa é estruturada institucionalmente, de acordo com


a previsão do Ministério Público Federal, em cada Estado. Interinstitucionalmente, é
estruturada por acordo entre os órgãos, constantes no Convênio de Cooperação.
A coordenação geral é do Ministério Público Federal, destinatário final da
prova. Se a prova não for produzida corretamente ou for insuficiente, será o
Ministério Público Federal quem arcará com as conseqüências, mas a Coordenação
Operacional fica a cargo da Polícia (que possui conhecimento e treino para tanto).
O foco principal das Forças-Tarefa são os crimes de lavagem de dinheiro,
praticados por organizações criminosas e contra o sistema financeiro. Isso não
impediu a apuração de outros delitos conexos ou praticados contra a própria Força-
Tarefa, como escutas telefônicas e violação de sigilo (MPF).
153

O resultado mais significativo foi o preventivo e educativo. Aquele que


demonstra que o Estado não é apático, mas que pode agir contra o crime
organizado. Dentro da Força-Tarefa se criou conhecimento. Lá foram feitos os
primeiros acordos de colaboração com criminosos (delação premiada). Hoje, todo
país utiliza o formulário do acordo de colaboração (assim como os formulários de
colaboração internacional que foram criados na Força-Tarefa do Ministério Público
Federal – MLALT e San Luis) (MPF).
Questionado sobre os principais entraves para a formação da Força-Tarefa,
respondeu:

Há resistências. A Polícia Federal sempre foi resistente. A instituição não quer


trabalhar coordenadamente, mas de forma independente. Porém, numa Força-
Tarefa não pode haver independência (funcional) ou vaidade pessoal. A Receita
Federal também se vê como órgão independente que não aceita críticas e
sugestões. Eles acham que não entendemos nada de tributos (talvez até com razão)
e que não podemos nos meter nessas atividades (MPF).

Há ainda o temor de retaliações quando do retorno do servidor ao órgão de


origem. Tivemos casos em que necessitamos ingressar no judiciário para afastar
punições de servidores quando estes regressaram à origem. Tais punições tinham
como fundamento “deslealdade à instituição”. Nítida retaliação, que nos levou a
propor ações de improbidade. Depois desse episódio, passamos a contar com
poucos servidores de outros órgãos interessados em auxiliar o MP. Sim, pois é
preciso boa-vontade do servidor. Não basta utilizar o poder de requisição, é
necessária colaboração (MPF).

Como refere Machado:

O ciúmes recíproco pelo receio de invasão de “reservas de mercado”


acabam, em alguns casos, gerando disputas. A necessidade de apoio
institucional pode, também, trazer à tona tensões intraorganizacionais e
interorganizacionais. A definição de prioridades pelo procurador-geral,
redirecionando frentes de atuação e grupos de trabalho, evidencia apenas
parte dos conflitos (2007, p. 24).

A coordenação, igualmente, deve ser feita pelo Procurador da República, no


entendimento do entrevistado:
154

[...] Não vejo a Polícia Militar como unicamente preventiva. Ela é


essencialmente preventiva. Isso não quer dizer que ela não possa auxiliar o
Ministério Público. Neste caso, será auxiliar “ad hoc” do MP, que pode requisitar
seus serviços. Se instituições atuarem em Força-Tarefa. Não existe subordinação.
Já frisei que vaidades pessoais e gritos de independência funcional não são
compatíveis para quem se dispõe a atuar em Força-Tarefa. Respeito ao
conhecimento, preparo, inteligência, etc. de cada membro é fundamental. Não é por
que eu sou Procurador da República que sou mais inteligente ou melhor, ou
qualquer coisa, que outro membro da Força-Tarefa, seja Promotor, seja Polícia, etc.
O que vai ditar a coordenação da Força-Tarefa é quem vai para a linha de frente
após o oferecimento de denúncia (MPF)

A Força-Tarefa do Ministério Público Federal é coordenada por Procurador da


República que é auxiliado pelas Polícias.
Ilustrando a atuação dessa Força-Tarefa, Machado resume a relação do
Ministério Público Federal com o Ministério Público do Distrito Federal e Territórios:

As ações conjuntas entre integrantes do MPDFT e do MPF consolidam


novas dinâmicas de atuação. A coordenação entre atores que integram
distintos níveis da organização e a interação interorganizacional mostram o
processo por meio do qual a organização-resposta é modificada diante de
situações para as quais o modelo formal não está programado para atuar
(2007, p. 326).

7.5 FORÇA-TAREFA DE MINAS GERAIS84

O presente subitem procura trazer o resultado do material colhido, em Minas


Gerais, por ocasião da pesquisa de campo, onde, acreditava-se que estaria a Força-
Tarefa legalmente institucionalizada, que atuava de forma permanente contra à
macrocriminalidade e que, portanto, seria nosso modelo de pesquisa.
Em janeiro de 2002, o Promotor de Justiça Francisco José Lins do Rego
Santos foi assassinado a tiros quando estava em seu carro, em Belo Horizonte. Ele
investigava a existência de uma máfia de adulteração de combustíveis em Minas

84
Trabalho realizado pela Polícia Civil sobre GISP. Anexo IX.
155

Gerais e já havia participado do fechamento de vários postos. A solução do caso


deu-se em função de uma Força-Tarefa formada, espontaneamente, por diversas
Instituições, ainda sob o impacto do bárbaro crime. Foi uma mobilização voluntária e
cidadã que resultou exitosa, mas ali acabou.
A criminalidade vinha numa crescente. Nesse sentido a observação de um
dos entrevistados:

A trajetória de Minas Gerais na área de Segurança Pública não é muito


diferente da trajetória dos demais estados brasileiros. Uma trajetória recente de
crescimento dos índices de criminalidade, principalmente violenta, de consolidação
do crime organizado, do tráfico de drogas [...] roubo de cargas, contrabando de
mercadorias, ou seja, essas manifestações mais comuns de crime organizado [...]
inclusive, tanto a pirataria consolidou-se principalmente no que diz respeito à
adulteração de combustível (Gov. Est. MG).

Assumindo o governo em 1º de janeiro de 2003, o Governador buscou


priorizar uma política de segurança que tinha como característica a articulação de
estratégias repressivas e preventivas contra a criminalidade. Para tanto, foi
elaborado um documento intitulado “Plano de Ação: Não ao Gerenciamento de
Crise, Sim ao Gerenciamento de Resultado”, colocado em prática como parte do
chamado “Choque de Gestão”85.
A Secretaria de Estado de Defesa Social de Minas Gerais – SEDS -
materializou uma nova concepção organizacional de controle da criminalidade e da
violência. Mais que uma simples estrutura, a SEDS representou a convicção do
Governo no sentido de que a sociedade mineira carecia de uma política de
Segurança Pública que promovesse tanto a redução das taxas de criminalidade
como o incremento da segurança subjetiva da população.
Conforme destacado pelo entrevistado:

[...] Uma ação governamental que superasse o gerenciamento de crises. Que


é a racionalidade mais convencional na área de Segurança Pública? Geralmente, os
Governadores colocam lá um profissional da área do Direito ou um Policial. Esses
profissionais montam umas equipes, geralmente de seus pares, e trabalham
156

basicamente à medida com que os casos e os problemas vão se apresentando a


eles, não é? Eles lidam de forma reativa, ao sabor dos acontecimentos. É o que se
denomina na literatura de gerenciamento de crise. Pois bem, nós entendíamos que
um governo tinha que ser diferente. O governo Aécio tinha que ser diferente! Minas
Gerais podia demarcar uma nova posição, um novo modelo de gestão, não mais
pelo gerenciamento de crise, mas por uma nova racionalidade, que era um
gerenciamento de resultados.

Primeiro, criou-se a Secretaria, definimos com clareza os papéis. Segundo


aspecto: foi elaborado esse plano de ação, esse projeto de 04 anos, com diretrizes,
com ações, metas, objetivos, coordenações específicas. Terceiro, foi colocado
dinheiro no projeto. Investimento. Foi tomada uma decisão política de investimento
como nunca antes na história do Estado, em termos de Segurança Pública. A média
de investimento na área de Segurança Pública em Minas Gerais na década anterior
foi em torno de 20 milhões de reais/ano. A partir de 2003 e 2006 a média passou de
100 milhões de reais/ano, um crescimento de mais de 400% [...].

Os projetos foram gerenciados de forma intensiva, ou seja, foi se


preocupando em definir uma metodologia de gerenciamento. Isso prá mim foi um
ganho fundamental, e essa gerência coube a profissionais não às Polícias.

E assim foi feito. Com resultados muito expressivos, principalmente a


reversão da “cor da criminalidade”, depois de 10 anos, Minas começou a ter quedas
dos índices, começou em 2004, 2005 e 2006 os índices permaneceram em queda,
sendo que em 2006 a queda dos índices de criminalidade violenta em Minas foi em
torno de 10,5%. No triênio 2004/2006, essa queda chegou a 17%, o que é um dado
expressivo (Gov. Est. MG).

A fim de privilegiar o caráter estratégico dessa nova Pasta, foi centralizada


sob a responsabilidade do governo a coordenação das atividades operacionais dos
órgãos que integram o Sistema de Defesa Social do Estado de Minas Gerais, quais
sejam: Polícias Militar e Civil, Corpo de Bombeiros Militar, Defensoria Pública e

85
Disponível em: <http://www.segurancacidade.org.br/susp/textos/pesp/pesp_mg.pdf>.
157

Subsecretaria de Administração Penitenciária, visando a efetividade no controle e na


prevenção social, bem como a integração entre esses órgãos.
A integração das instituições responsáveis pela defesa social decorre da
construção de novas bases paradigmáticas do ponto de vista doutrinário e técnico-
científico, formando uma nova plataforma de ação interinstitucional, capaz de
racionalizar sistematicamente os itens operacionais da ação ostensiva e da ação
investigativa.
Para tanto, forma observados os princípios constitucionais e as respectivas
competências, como também os pertinentes aos demais órgãos do sistema,
inclusive os situados fora da esfera do Poder Executivo Estadual, tais como:
Ministério Público, Poder Judiciário, Polícia Federal, Polícia Rodoviária Federal,
incluindo, ainda, setores organizados da Sociedade Civil.
Nesse contexto, criou-se o GISP – Grupo Integrado de Segurança Pública -
que seria a “Força-Tarefa Institucionalizada” de Minas Gerais, em 2004.
O referido Grupo prevê a promoção de ações que visam integrar a avaliação,
planejamento, organização, elaboração e a execução de operações de prevenção,
repressão e investigação de infrações penais a especificar, respeitadas as
atribuições constitucionais de cada instituição policial.
É composto por representantes da SEDS, da Polícia Civil, Polícia Militar, da
Polícia Rodoviária Federal, da Superintendência da Polícia Federal, do Tribunal de
Justiça, do Ministério Público Estadual, do Conselho de Defesa Especial, da
Assembléia Legislativa, com eventual participação do Corpo de Bombeiros, Justiça
Federal, Ministério Público Federal, Superintendência da Receita Federal e
Superintendência do Instituto Nacional do Seguro Social.
Buscou-se, através de uma Força-Tarefa, a combinação de esforços de todas
as Instituições voltadas às atividades de Segurança Pública e Justiça Criminal, com
autonomia administrativa e sem coordenação, em tempo integral.
Há um comando rotativo e um Conselho de Representação (Colegiado), que
deve se reunir para dar diretrizes ao órgão composto por todas as instituições. As
deliberações são colegiadas. Em caso de dissenso, prevalece a maioria de votos. O
Secretário Executivo possui voto de qualidade. Para integrar o GISP, o efetivo passa
por processo seletivo (verificação de antecedentes e habilidades). Os casos omissos
serão resolvidos pelo Secretário de Estado de Defesa Social, mediante parecer do
Conselho Gestor.
158

A regulamentação do GISP surgiu somente dois anos depois, através da


Resolução Conjunta n. de 31.8.2005, acordada pelo Procurador-Geral de Justiça,
Chefe de Polícia Civil do Estado e Comandante-Geral da Polícia Militar, dispondo
sobre estrutura e funcionamento do GISP.
O Grupo começou a funcionar bem somente no segundo semestre de 2005,
com bons resultados, através de uma operação que envolveu roubo de café no Sul
de Minas Gerais, ocasião em que se desbaratou uma grande quadrilha de
criminosos, envolvendo grandes empresários. Porém, o Ministério Público entendeu
que houve vazamento de informações, acabando por desarticular o GISP.
O otimismo do representante do Governo, ao implantar o GISP era grande:

O que há de melhor numa Força-Tarefa? A combinação de esforços de


órgãos distintos, que têm autonomia, são órgãos que compõem uma rede, mas não
compõem propriamente um sistema previamente coordenado. Eles estão vinculados
a um sistema, mas cada um com suas respectivas autonomias administrativas,
orçamentárias, onde não existe propriamente uma coordenação única. Essa é a
realidade da Justiça Criminal. No Brasil e em nível internacional. A Força-Tarefa é
uma possibilidade concreta de focar as ações de todos esses órgãos num mesmo
problema. As energias são direcionadas para um mesmo problema, um mesmo
grupo de pessoas fica full time, por conta da solução desse problema [...].

[...] Agora, uma questão que realmente ainda não foi devidamente resolvida
por essa política, que foi a integração do Executivo, dos órgãos das Polícias, do
Sistema Prisional, do Sistema Estadual de Segurança Pública com o Ministério
Público, Judiciário, Polícia Federal, Polícia Rodoviária Federal, principalmente,
Ministério Público e Judiciário. Isso devemos reconhecer, o Governo, a política de
Minas, tentou atuar sobre essa questão, através de um projeto, chamado Gabinete
Integrado de Segurança Pública, ou GISP. O que seria o GISP? O GISP seria a
Força-Tarefa institucionalizada e formalizada, seria isso (Gov. Est. MG).

Partindo-se desses entendimentos, questionou-se sobre a viabilidade de se


criar um mecanismo de investigação que integrasse os diversos órgãos da
Segurança Pública para o combate da macrocriminalidade. Todos concordaram que
a idéia da criação de uma Força-Tarefa, através de um trabalho conjunto e integrado
159

entre os diversos Órgãos do Sistema de Segurança Pública e Justiça Criminal era


boa e poderia render resultados exitosos. Porém, desde seu início, os entrevistados
manifestaram os principais entraves que justificaram, posteriormente, a inoperância
de sua atuação:
Mas ao final de 2003/2004, conseguimos avançar na estruturação de um
modelo, chamado Gabinete. Qual foi o acordo que, nós, pelo menos, teórico, ao qual
nós chegamos? Nós tínhamos que criar uma estrutura organizacional própria,
superando a grande limitação que nós entendíamos ser a Força-Tarefa. Qual era a
grande limitação da Força-Tarefa? O fato dela ser voluntária, dela não ter garantia
de continuidade, e ela é provisória, necessariamente, provisória. E transitória. Prá
gente garantir que todos esses órgãos sentem à mesma mesa e estejam focados
em problemas comuns, eles precisam assinar um convênio entre si, assumir,
compromissando-se com essa tarefa. Nesse convênio, nós vamos criar uma
estrutura comum, um órgão específico. Esse órgão, ele deverá ficar vinculado
orçamentariamente à própria Secretaria de Estado de Defesa, ao Governo Estadual.
Mas, não significa que a Secretaria ou a Polícia Militar ou Civil, seja o comandante
do órgão. Você teria um problema ali de quem vai mandar, efetivamente. Quem vai
exercer a autoridade? Então, a nossa idéia era de que existisse uma autoridade, um
comando rotativo entre os órgãos. Para isso nós criamos um conselho, um
colegiado. Um conselho de coordenação, com representação formalizada indicada
dos órgãos, esse colegiado iria se reunir, periodicamente, e dar as principais
diretrizes para o órgão. Então você teria quase que, uma coordenação colegiada.
Com todas essas instituições presentes. E no plano operacional, você tinha lá,
Delegados, Oficiais da PM, Promotores, eventualmente uma representação de um
Juiz, um representante da Polícia Rodoviária Federal, que podiam estar compondo
um grupo fixo, você tinha que ter membros fixos que podiam dedicar-se quase que,
full time, ao órgão. E esse colegiado de coordenação daria as prioridades, definiria o
que fazer. Esse convênio, efetivamente, foi assinado em 2004. Naquele momento,
nós entendíamos que havia muita confiança, muita expectativa, que você tava
criando algo novo. Foi assinado convênio pelos vários órgãos. E o Governo Estadual
elaborou um decreto, publicou um decreto, criando o GISP. O decreto veio primeiro,
aí através do convênio cristalizou-se.
160

Criou-se, então, o GISP. Foram feitas as tratativas destinadas a sua criação,


o Ministério Público, evidentemente, se animou [...] já no processo de criação do
GISP, nós tínhamos conhecimento da reduzida qualidade técnica e moral de alguns
daqueles que foram escolhidos pra funcionar ali. Num primeiro instante, o Ministério
Público apostou, sim, na idéia, porque a idéia era uma idéia correta, era uma idéia
boa. A idéia era de fazer aquilo que o Ministério Público não conseguia fazer, isto é,
aglutinar os esforços, não só de Ministério Público e Polícia Militar, mas de Ministério
Público, Polícia Militar, Polícia Civil, Polícia Federal, Receita, etc., etc. Ou seja, o
Governo conseguiria por um ato de Governo agregar tudo aquilo que nós não
tínhamos conseguido fazer. Então, nós apostamos que aquilo daria certo. Num
primeiro instante. O instante seguinte, enquanto nós escolhíamos, não
necessariamente os melhores de nós [...], mas entre nós os mais experientes, ao
menos isso, ao nosso lado o que acontecia? Débeis mentais, alguns. Criminosos,
outros eram indicados para a tarefa de campo (grupos operacionais, inteligência,
proteção de autoridades) [...]. Indivíduos que não apostavam no GISP. Indivíduos
que viram no GISP a oportunidade para validar a sua tese, para alcançar dois
resultados de uma vez, matar dois coelhos com uma cajadada só, desfazer-se de
alguns dos piores elementos da sua Instituição, que ficariam, assim, entregues à
Secretaria de Defesa Social e não mais à sua Instituição de origem [...]. Vamos
assinar o convênio, pensaram as Instituições, porque aí nós temos algum aporte de
recurso, e porque nós estamos obrigados a assinar [...]. Agora, vamos fazer com
que isso não dê certo [...]. O que não deu certo de fato, foi que o Governo, desde a
sua origem, não teve autoridade sobre seus comandados. E por não tê-la, não
conseguiu alocar no GISP quem de fato poderia ter, eventualmente, qualidade para
isso. Mas o momento da criação do GISP, a apressada criação do GISP, se deu,
exatamente, prá que não houvesse a perda dos recursos. Essa é que é a realidade.
O GISP deveria ter sido uma medida estudada, criada a partir de um processo,
inclusive, de seleção cuidadosa de seus representantes, e o Governo, todavia, prá
atender ao calendário de aporte de recursos, precipitou sua criação [...]. Nós fomos
atropelados pela apresentação de uma lista de servidores, alguns de moralidade, no
mínimo, discutível, outros de sanidade mental, no mínimo, discutível, e não é à toa,
que o GISP não tem um histórico de ações prá demonstrar o que fez. Não as têm
(MPMG).
161

[...] O GISP era uma coisa nova e as Instituições não a aceitavam; era vista
como uma “super Swat”. Eram quatro Delegados, hoje são dois. Eram vinte e um
Policiais Civis, hoje são dez [...]. Hoje, cada Instituição tem seu órgão de inteligência
e não repassa informações para as outras. Inclusive, dentro da própria Instituição,
não passam informações. Ex.: Delegado do setor da Inteligência, que fica no andar
acima do seu, não lhe informa sobre eventuais demandas ou dados, em que pese
que apenas os dois representem a Polícia Civil. Participou somente uma vez do
Conselho Gestor criado. Nunca mais foi chamado [...]. Não foi feito perfil para
verificar o servidor ideal para vir para o GISP. Também não há dúvida de que foi
criado para receber dinheiro da União com o PRONASCI. Sequer tem guardião.
Possuem um outro aparelho pior que está estragado (Manifestação da Polícia
Civil).

[...] o grupo começou a funcionar bem no 2º semestre de 2005, já com uma


tarefa e já mostrando resultados nos primeiros meses [...] foi uma investigação de
roubo de café no sul de Minas, onde se desbaratou um grupo sofisticado de
criminosos, envolvidos em roubos desse tipo de produto no sul, onde essa
mercadoria era repassada para o mercado legal, havia grandes empresários
envolvidos com esse tipo de crime no sul do Estado. Essa operação recebeu uma
denominação, teve uma grande visibilidade pública na Mídia Estadual e Nacional.
Então, chega-se ao 2º semestre de 2005 com grandes resultados – de repente a
gente tem uma nova esperança, o projeto vai vingar. E os Policiais animados, os
Órgãos, o Conselho Gestor do GISP se sente legitimado, reunidos periodicamente.
Então, havia uma coordenação por parte da Secretaria, alguma Superintendência
cuidava disso diretamente, que era o Gerente, o superintendente Genilson Zeferino,
que era uma pessoa chave nisso tudo, foi uma liderança importante. Naquele
momento ele conseguiu preencher um vácuo de autoridade, um vácuo de
coordenação. Ele passava a ser o interlocutor, um intermediário entre o conselho
gestor e os operadores que estavam na ponta [...] era alguém do Governo (Gov.
Est. MG).

Não houve nada antes, não houve nada depois. E nessa Operação Ouro
Negro [...] houve um vazamento de informação. Ou seja, um grupo supostamente
elitizado, grupo supostamente de elite, um grupo supostamente dos melhores,
162

permitiu o vazamento da informação. Ao ponto tal que um dos investigados se


apresentou, espontaneamente, prá dizer: olha, tão me investigando, aí, mas eu não
tô envolvido, não (MPMG). Questionado sobre o fracasso do GISP, o representante
do Governo de Minas Gerais destacou:

Funcionou bem assim até meados de 2006, quando aí tem uma nova gestão
na Secretaria, um novo grupo entra, um novo Secretário, reformulação geral [...]. O
Governador não tinha a mínima noção, nunca teve a mínima noção do que era o
GISP. Nunca teve. Isso nunca foi dito que era uma prioridade do governo. Talvez
tenha sido aí outro erro. Nós não transformamos isso numa, numa política do
governador. O Secretário que veio a seguir, inclusive, deixou claro que não
acreditava nisso, que não gostava do órgão, que não queria o órgão. E o órgão
entrou num processo de esvaziamento político, administrativo, grave.
1º aspecto: Falta de uma decisão política do Governador e do Secretário,
primeiro. Porque a falta de comprometimento do Secretário foi decisiva. 2º aspecto
de falha, talvez: a disseminação de informações, foi falha. Criou-se um estereótipo,
estigma em relação ao órgão, não se tinha clareza do que ele era. Acabou criando
resistência em relação a ele, principalmente no seio da Polícia Civil. Desnecessário.
Isso poderia ter sido melhor manejado. 3º aspecto: ausência de um comando único,
a coordenação colegiada não funcionou [...]. Faltava uma coordenação, o perfil que
era difícil decidir. Essa ausência dessa coordenação monocrática, isso significou que
não tinha alguém que falasse pelo órgão, não tinha alguém que resolvesse os
problemas pelo órgão, não tinha alguém que falasse e pleiteasse pelo órgão,
principalmente nesses momentos de esvaziamento político institucional que ele
sofreu. Isso, acho que foi o 3º aspecto decisivo do fiasco [...]. Criou uma competição
(Gov. Est. MG).

Na opinião do Policial Militar ouvido, faltou a especificação de diretrizes:

Foi criado um instrumento e não foi devidamente regulamentado. Quando


reiterada a pergunta quanto à sua função, respondeu que lhe foi vendido um
163

trabalho conjunto! Acrescenta que enquanto não houver regulamentação, nada


funcionará (PMMG86).

Em que pese a boa vontade do Governo de Minas Gerais, desde o início,


verificaram-se falhas graves na criação do GISP, observadas pelos entrevistados e,
inclusive, reiterados pela representante do Governo. Questionados, por exemplo,
sobre a previsão dos crimes que deveriam ser objetos de investigação da Força-
Tarefa institucionalizada, responderam:

Não, não foi dado, não se definiu esse leque de [...]. Se definiu o seguinte,
que este atuaria a partir de demandas. Então, este foi outro aspecto. Tem um
aspecto interessante, ele só atuaria operacionalmente, a partir de demandas
definidas pelo Colegiado de coordenação dele. Então, não seria todo tráfico de
drogas, seria, por exemplo, se o Colegiado entendesse que havia um problema de
tráfico de drogas na região do triângulo mineiro, ele seria encarregado de atuar
(Gov. Est. MG).

Tanto assim, que no regimento interno do GISP, ou ato constitutivo ou o que


seja, ficou definido que o Grupo Gestor é quem diria onde é que iriam atuar. Era o
Grupo Gestor que deveria dizer [...]. Não houve previsão de crimes, porque ninguém
sabia ainda o que é crime organizado. A própria lei não o diz (MPMG).

O reconhecimento de que a integração entre os diversos Órgãos que


compõem o Sistema de Segurança Pública e Justiça Criminal seria, no mínimo,
naquele momento, inviável, começa a aparecer nos discursos dos entrevistados
quando fazem referências às resistências que começaram a surgir e o desinteresse
quanto à necessidade de ceder espaços, dividir poder, enfim flexibilizar seus
comportamentos já tão arraigados nas respectivas culturas organizacionais de cada
instituição:

É interessante que em 2004 foi identificada uma resistência de uma


organização, que era a Polícia Civil. A Polícia Civil no momento da assinatura do

86
Depoimento não gravado a pedido do Policial.
164

convênio já demonstrava muita resistência em relação ao GISP. Principalmente, no


que diz respeito à divisão de atribuições entre os Delegados e os Promotores no
órgão. Polícia Civil e Delegados diziam que queriam resguardar as suas atribuições
investigativas, não queriam compartilhar isso com os Promotores, não achavam que
isso devia estar vinculado a eles. E isso foi um problema que ficou nítido em 2004. E
quando o gabinete estava prestes a começar a funcionar, isso veio mais a público,
essa resistência tornou-se mais nítida, o que envolveu uma serie de negociações
com o órgão, com a Polícia Civil, com o Ministério Público, para encontrar um meio
termo, principalmente porque naquele momento nos estávamos elaborando um
regimento interno do gabinete. Ele já tava começando a funcionar e o Conselho
Gestor do órgão tava já discutindo o regimento interno. Nesse momento a Polícia
Civil bateu pé. Começou a criar muito problema, a ponto do Secretário ter que dizer,
não, vai ter que fazer. Não vou aceitar esse tipo de resistência corporativa. A Polícia
assinou, ela praticamente, ela legitimou o regimento interno no Conselho Gestor.

Porque nesse regimento interno estava sendo definida a estrutura do órgão, o


detalhamento da estrutura do órgão e as atribuições de cada um dos setores do
órgão. O setor de Inteligência, o setor de investigações, o setor de atividades táticas
temiam que o GISP pudesse sobrepor a elas, por isso que, inclusive, resistiam muito
a indicar nomes, para compor o gabinete. A Polícia Civil demorou muito para compor
esses nomes. E os Policiais que, efetivamente, eram indicados, muitas vezes eram
retalhados, sofriam de alguma maneira, dizia-se para eles, se vocês forem para esse
gabinete vocês estão profissionalmente acabados na Polícia Civil, vocês vão ficar
marcados, estigmatizados. Então, isso provocou muito problema, muito problema.

[...] É um problema do ser humano, obviamente. São seres humanos que


comandam as organizações, da vaidade. É um problema das disputas internas entre
as organizações por espaço-poder. Sua literatura organizacional e sociológica
mostra muito claramente que isso é um fenômeno de cunho internacional, isso não é
um fenômeno propriamente brasileiro. A desarticulação dos órgãos policiais nos
Estados Unidos, ficou claro, teve papel decisivo no atentado de 11 de setembro.
Ficou visível (Gov. Est. MG).
165

O trabalho da Polícia Militar seria de Inteligência pelo conhecimento que


adquire no dia-a-dia, no policiamento ostensivo, onde vê e ouve muita coisa. Dispõe
de muitas informações. Estabelecer fluxo de informações sadia e permanente com
os seus homens que se encontram em patrulhamento para facilitar as investigações.
Teríamos uma espantosa melhoria de combate contra o crime. Não podemos
prescindir desse conhecimento. Num negócio onde vaidade é acentuada. Já temos
muita divergência. Temos que buscar consenso. Porque outra instituição já e vista
como adversária. Relação ruim. Obriga a que se estabeleça convivência entre
indivíduos que não confiam entre eles, o fracasso está aberto. A Polícia Civil é
necessária [...]. Investigação exige criatividade que não existe no Militar, até pelo
seu enquadramento institucional [...]. Milico cheira a milico em razão de sua
formação, disciplina, cultura da hierarquia e disciplina. Na situação que acontece no
fenômeno que existe na rua e exige pronta, imediata resposta, o Milico fracassa e o
Civil não. Civil sabe fazer: é empregar a criatividade para enfrentar a dificuldade, é
questão de cultura, isso o PM não tem. Nós verificamos isso quando comparamos
serviços entre eles.

Continuamos a assediar a Polícia Civil, pedindo-lhe que designasse prá cá


alguns de seus servidores, prá que pudéssemos fazer aquele trabalho que
queríamos fazer. A Polícia Civil, olimpicamente, ignorava nosso pleito, embora ele
tenha sido reiteradamente a ela dirigido. Ou seja, pensávamos em integração,
trabalhávamos por ela [...]. Nós trabalhávamos prá essa integração e encontrávamos
a resistência da Polícia Civil, que nunca quis se integrar, nem à época nem depois,
porque sabia que, integrar-se ao Ministério Público seria de certo modo reconhecer
que o Ministério Público tem poder prá investigar. E esse é o grande dogma contra o
qual eles se batem até o dia de hoje. [...] Polícia Civil é muito diferente da Polícia
Militar, a Polícia Militar não quer se envolver com a Polícia Civil e chega ao ponto de
abrir essas crises. [...] mas é preciso que vocês saibam de uma coisa, a nossa
relação com a Polícia Federal está muito longe de ser aquilo que se desejaria. E por
quê? Porque a relação se estabelece em mão única. A Polícia Federal quer tudo que
nós temos, mas nada nos quer dar em troca. A Polícia Federal não nos quer
investigando, nem tampouco, nos quer fornecendo informações. A sua atitude é
muito diferente do seu discurso. Ela nos quer no papel de subalternos. Ela quer
agigantar-se, fazendo com que nós nos tornemos, quem, sabe, um mero
166

departamento do Estado, e não mais uma função institucional, uma função essencial
à justiça (MPMG).

Foi discriminado pela Instituição por se encontrar lá.Tem conhecimento que o


próprio capitão que trabalha a sua frente, na mesma sala, possuía informações
privilegiadas sobre determinada demanda e investigou, junto com a PM sem lhe
contar! O MP, por sua vez, em determinada situação, lhe pediu que a PM passasse
a pedir as interceptações também!, por ”deferência”. Não admitiu! Não admite que
PM investigue! (PCMG87).

O Oficial ouvido junto ao GISP referiu ser a idéia de integração válida. Porém,
há aqueles que acreditam que não teria êxito, pois seria apenas uma maneira
institucional e política para parecer que algo está sendo feito. Questionado se o
Major do andar de cima (Inteligência) poderia não lhe repassar informações acerca
de determinada demanda, respondeu que sim. Seria a teoria da Compartimentação,
isto é, Necessidade de Conhecer (PMMG)88.

Já o Delegado de Polícia referiu que há tempo vem questionando qual a


atribuição do Capitão junto ao GISP, eis que somente a Polícia Civil vem
investigando e a Polícia Militar deveria se limitar ao policiamento ostensivo89
(PCMG).

A realidade dessas informações puderam ser confirmadas quando da


observação participante junto ao GISP: havia uma total desintegração entre os
Órgãos que lá se encontravam. Em que pese trabalharem na mesma sala, não se
observou uma relação de confiança e união entre a Polícia Civil e a Polícia Militar.
Ao contrário, ambos demonstravam desconfiança e descrédito no trabalho conjunto.

A partir desses depoimentos foram questionados quais foram os principais


equívocos que impediram o sucesso da Força-Tarefa, que havia sido implantada

87
Depoimento não gravado a pedido do Policial.
88
Depoimento não gravado a pedido do Oficial.
89
Depoimento não gravado a pedido do Policial.
167

pelo Governo com a esperança de efetiva integração entre as Instituições, de forma


permanente, para o combate da criminalidade:

[...] Essa falta de chefia, essa falta de uma cabeça pensante e coordenadora
foi uma das razões do GISP não vingar. O Modelo de gestão colegiada foi um fiasco.
Não funcionou e eu estou convencido de que não vai funcionar nunca. Se esse
caminho, talvez, tem que analisar as especificidades do processo mineiro,
obviamente, singularidades, nessa trajetória de experiências de Minas Gerais. Nada
impede que outro Estado possa pensar em reconstituir essa experiência em outros
moldes, não repetir os erros que foram cometidos aqui. Mas que me confesso
céptico, eu cada vez menos acredito que a gente possa fazer da Força-Tarefa algo
mais permanente. Ou seja, cada vez mais eu me convenço que os governos
estaduais vão ter que criar Forças-Tarefas específicas prá resolver problemas
específicos de criminalidade organizada. E delegar atribuições, tarefas, metas,
depois que isso for cumprido, se desfaz (Gov. Est. MG).

[...] Para o nível operacional deve haver pessoas reconhecidamente capazes.


Processo lento de negociação para se chegar a um denominador comum. Com
quem podemos estabelecer uma relação confiável para gestar uma equipe mista?
Mas deve haver Voz de Comando. Deve haver consenso lá em cima para tomar
decisões. Demanda tempo, convivência. Decisão amadurecida com quadros
compostos de tal forma até o dia em que tivéssemos certeza. Unidade do Conselho
Gestor. No nível da execução deve ser escolhido o melhor de cada instituição.
Confiança na base e no topo.

Como conseguir permanência num órgão instável politicamente? Solução:


Efetividade, mostrar trabalho e nenhum Governo tocaria nele. É a única coisa que
daria garantia para que um programa pudesse se sustentar. Estabelecer nível de
eficiência tal que nenhum Governo possa prescindir disso. Não se mexe em time
que está vencendo. Vai ter que te engolir (MPMG).

O GISP, atualmente, está praticamente esquecido. Em setembro de 2007, o


Chefe de Polícia Marco Antônio Monteiro, determinou a criação de uma nova
delegacia subordinada ao DEOESP – Departamento de Operações Especiais com
168

objetivo de investigar quadrilhas e para intensificar ações de inteligência e aumentar


a integração com o Ministério Público e Polícias de outros Estados. Finalidade que,
a priori, estava prevista para o GISP90.

7.6 DA FORÇA-TAREFA PARALELA AO GISP, SOB O COMANDO DO


MINISTÉRIO PÚBLICO MINEIRO91

Aliado ao GISP, havia uma outra “Força-Tarefa” no âmbito do Ministério com


toda uma estrutura organizada: Procurador de Justiça coordenador, guardião à
disposição das investigações, bem como Policiais Civis e Militares atuando em
conjunto.
Em 12 de junho de 2002, através da Resolução PGJ n. 52/02, o Ministério
Público Mineiro criou o Centro de Apoio Operacional de Combate ao Crime
Organizado e de Investigação Criminal – CAOCRIMO, alguns meses após o
resultado eficaz da investigação do homicídio do Promotor de Justiça Lins do Rego,
realizada de forma integrada entre vários órgãos da Segurança Pública.
O CAOCRIMO é considerado órgão auxiliar da atividade funcional do
Ministério Público na área da prevenção e repressão às organizações criminosas,
com atribuição estadual. Entre várias atribuições, promove a articulação, integração
e intercâmbio entre órgãos de execução, inclusive para efeito de atuação conjunta.
Os policiais continuam vinculados administrativamente à unidade apoiadora, estando
submetidos a regime jurídico próprio da Instituição de origem. Era dirigido por
Procurador de Justiça, designado pelo Procurador-Geral, onde também atuam
Promotores de Justiça. Em cada comarca do Estado há, pelo menos, um Promotor
incumbido da prevenção e repressão às atividades das organizações criminosas.
No mesmo dia, em 12 de junho de 2002, através da Resolução Conjunta n.
02 de junho de 2002, o Comandante-Geral da Polícia Militar do Estado de Minas e o
Procurador-Geral de Justiça do Estado de Minas Gerais criaram o Grupo de
Combate às Organizações Criminosas em Minas Gerais-GCOC/MG, composto por

90
Anexo X.
91
Quando da criação do GISP, o Grupo de Combate ao Crime Organizado já existia e vinha atuando
exitosamente. Trabalhavam, inclusive, com um Guardião (Central de Comutação Digital, utilizado
para interceptar ligações) cedido pela Secretaria da Fazenda. O Ministério Público aderiu ao GISP,
mas não abriu mão do GCOC.
169

integrantes da Polícia Militar e Ministério Público. Na ocasião, ficou estabelecida a


inexistência de subordinação direta de um conveniente em relação a outro, e que a
coordenação administrativa seria do Ministério Público. Estabeleceu-se também que
seriam consideradas, preferencialmente, infrações penais praticadas por
organizações criminosas. Exs.:
Lavagem de dinheiro, ocultação de bens, direitos e valores;
Contra-ordem tributária, economia, relação de consumo – em especial
adulteração de combustível e cartelização de combustível;
Tráfico de drogas;
Roubo e receptação de carros;
Extorsão mediante seqüestro;
Contra instituições financeiras, empresas de transportes de valores/cargas,
receptação de bens auferidos por prática criminosa;
Furto e roubo de veículos;
Homicídio praticado em atividade de grupo de extermínio e;
Demais infrações praticadas por organizações criminosas.

A Força-Tarefa do Ministério Público continua a atuar com eficiência, através


de seu GCOC/MG92.

92
Exemplo de experiência realizada em Minas Gerais, através da Força-Tarefa: A “Força-Tarefa do
Gusa”, como ficou conhecida, originou-se após a morte de um assessor da Assembléia Legislativa
que revelou a existência da “máfia das notas fiscais frias” agindo no setor siderúrgico do Estado de
Minas Gerais. Composição: Ministério Público de Minas Gerais; Secretaria de Estado de Fazenda de
Minas Gerais; Polícia Militar e Polícia Civil. Importância: A criação dessa Força-Tarefa era necessária,
pois levantamentos iniciais evidenciaram fraudes que geravam prejuízos vultosos para o Estado,
sendo que em apenas um caso envolvendo uma das empresas, foi detectado um prejuízo no valor
de mais de R$ 70.000.000 (setenta milhões de reais). Metodologia: Diante da complexidade do caso
e da diversidade de agentes, foram instaurados três inquéritos policiais, havendo a indicação de um
membro de cada instituição para a condução dos trabalhos. Foram realizadas várias diligências:
localização e identificação de pessoas e lugares; obtenção de documentos; monitoramentos
telefônicos; quebra de sigilo bancário, dentre outros. Operação - 13/12/2005: Seleção das empresas
para busca e apreensão dentre as envolvidas, dada a limitação da capacidade de operacionalização
dos trabalhos: 22 empresas selecionadas; Planejamento da operação: Ministério Público,
SUFIS/DGP, Núcleo Fiscal junto ao Ministério Público, Polícia Militar e Polícia Civil, 22 buscas
administrativas; Participação de:160 fiscais da SEF;120 policiais Militares; 70 policiais civis; Ministério
Público de Minas Gerais (CAO- CRIMO), Rio de Janeiro e São Paulo; Cumprimento de 23 mandados
de busca e apreensão; Expedidos 26 mandados de prisão e cumpridos 23 nos Estados de Minas
Gerais, Rio de Janeiro e São Paulo sendo:13 policiais Militares; 01 contabilista; 09 civis.
Concomitantemente foram oferecidas 02 denúncias contra as duas organizações criminosas, sendo
53 denunciados, dentre eles: 10 empresários; 01 contabilista; 13 policiais Militares; 03 representantes
comerciais. Resultados: Emissão de: 27 TAD; 13 BO. Apreensão de: 36 CPU; 340 caixas de
documentos; 65 agendas pessoais; 11 aparelhos de telefonia móvel; 01 máquina datilográfica.
Resultados levantamento das provas para embasamento do processo criminal junto à documentação
apreendida; autenticação dos arquivos magnéticos apreendidos; auditoria nas empresas objeto de
170

Questionado porque não abriu mão do GCOC ao integrar-se ao GISP, O


Procurador-Coordenador do GCOC respondeu:
O GISP, que ele tem? Nada [...]. Eu digo até que nós estivemos entre os
parceiros mais honrados do GISP [...]. Nós estávamos inspirados pela honesta e fina
intenção de cooperar, mas não ao ponto de abrir mão de imediato daquilo que
havíamos conquistado, ao contrário de outras instituições, que se apresentaram
publicamente [...] enquanto trabalhavam contra ele. E essa é a diferença entre nós e
alguns dirigentes de outras instituições. Deu no que deu! Não podia ser diferente.
Não havia chance de ser diferente. E durante as reuniões do GISP, das quais eu
participei, alguns bem intencionados, mas, lamentavelmente, muito imaturos,
falaram: “nós queremos o guardião [...]. Então, não podia ceder os nossos recursos
prá alguém que não só não demonstrara capacidade técnica, como já se revelava,
com posto de gente que não tinha qualidade moral [...] (MPMG).

A Sociedade passa a nutrir um sentimento de punibilidade fazendo com que


haja uma democratização da lei penal. Isto é, a comprovação de que as classes
mais nobres da Sociedade também respondem crimes. É a demonstração de que
também se atua contra a criminalidade da “cifra dourada”, do “colarinho branco”.
Em entrevista concedida à Revista do MPMG Institucional, o Subsecretário da
Receita Estadual de Minas Gerais, Pedro Meneguetti (p. 16 ) destacou:

Para combater a sonegação fiscal e as outras formas de crime contra o erário,


o Centro de Apoio das Promotorias de Justiça de Defesa da Ordem Econômica e
Tributária (CAOET) vem realizando, em parceria com outras instituições, como a
Secretaria do Estado da Fazenda (SEF) e as Polícias Civil e Militar, operações de
sucesso em todo Estado.

Para o Subsecretário, o enfrentamento do crime organizado contra a ordem


tributária depende de uma comunhão de esforços das instituições (MPE, SEF,
Receita Federal e Polícias). Nesse contexto, ele ressalta:

busca administrativa; confecção de relatório do envolvimento das empresas siderúrgicas no esquema


de sonegação fiscal. Fonte: Ministério Público de Minas Gerais – GCOC - Grupo de Combate às
Organizações Criminosas. Ver Anexo XI.
171

A alocação de um número maior de Auditores Fiscais junto ao CAOET e a


adoção de novas estratégias conjuntas no estudo e combate das diferentes
modalidades de fraudes ao erário, além da qualificação do servidor fazendário no
trato das questões de natureza tributário-penal, têm garantido o resgate de receitas
indispensáveis ao atendimento das diversas e crescentes necessidades da
sociedade.

7.6.1 Prováveis causas do descrédito e da inoperância do GISP

Partindo-se da idéia inicial de que o GISP era o modelo de Força-Tarefa para


o Rio Grande do Sul e, após, a pesquisa demonstrando contrário, o objetivo desse
subitem é o exame das prováveis causas do descrédito e inoperância do GISP na
opinião de seus integrantes. Ressalte-se a importância de tais avaliações para que
esses erros não sejam repetidos no nosso Estado quando de eventual criação de
uma Força-Tarefa permanente:

[...] Não houve troca de informações, os setores de inteligência não


conversavam. Então, esse já é o problema crônico. Volto ao argumento, a frouxa
articulação, a metáfora da frouxa, me descreve bem o desafio que é gerir esse
sistema. Isso significa que nós temos que experimentar. Temos que inovar, não há
modelos a serem seguidos. Volto a dizer em Minas Gerais, eu não voltaria a
defender o GISP. Ou pelo menos nos moldes que ele foi executado. Agora, a
pergunta deve ser colocada por que não reconstruir essa experiência de outras
maneiras, né? Quais foram os principais erros que Minas Gerais cometeu? E que
definiram o fracasso do modelo [...].
Essa era a pretensão. Obviamente, a gente pode analisar, mas o que que
aconteceu até agora? O GISP não decolou, não conseguiu vingar. Então, é o
momento da gente refletir por quê? O que explica possivelmente que esse modelo
institucional não tenha conseguido [...] porque ele conceitualmente, era uma boa
idéia, era repetir o que há de melhor numa Força-Tarefa.
172

Talvez aí esteja um dos problemas, né. Talvez a própria viabilização, talvez a


idéia não tenha mobilizado devidamente as devidas Instituições. Isso talvez tenha
ficado restrito pela liderança de alguns poucos indivíduos no âmbito das respectivas
organizações.

Agora, não tenha dúvida, que o Ministério Público não ter desmontado o
GCOC foi decisivo. Foi decisivo.

Pensando aqui, talvez, seja um dos elementos pra gente considerar. Porque
foram os mesmos, os que estavam no inicio, que permaneceram e que perduraram,
foram os mesmos. A questão e que, durante 2004, esse órgão praticamente não
funcionou, porque não teve sede. A Secretaria demorou quase um ano para
encontrar um espaço, um imóvel, pra comprar os equipamentos e prá por tudo para
funcionar. Só em 2005, primeiro semestre de 2005 conseguiu fazer isso. Houve uma
inoperância administrativa séria, mas do meu ponto de vista, é resultado de uma
falta de compromisso do Secretario de Defesa, ele não, ele, efetivamente, era um
dos que não estava convencido desse modelo.

Talvez, houve problema de disseminação da informação, a ponto dessas


resistências consolidarem-se no seio da Polícia Civil. Esses receios corporativos
internos, talvez, esses segmentos não tivessem a devida noção do que é o GISP,
talvez é um outro erro que a gente deve considerar. Ou seja, talvez a gente não
tenha conseguido mostrar de maneira clara para todo mundo, que o GISP era Força-
Tarefa institucionalizada. A gente não queria criar ali um outro grupo de
especialistas, de super polícias ou de super investigadores, separado do restante
das instituições. Eu acho, que, esse talvez tenha sido outro erro, nós não
conseguíamos disseminar essa identidade do órgão. Efetivamente, para o público
interno, pareceu a idéia de que a Secretaria, o Governo, estava criando um super
órgão, uma Swatt mineira. E aí, obviamente, era compreensível as resistências. E
nós não conseguimos evitar isso, talvez, aí, um erro de comunicação. Outro erro.

Foi uma batalha interna intensa em 2006 para garantir a sobrevivência


financeira do órgão. Foi uma grande batalha. Foi um período em que começaram a
perder alguns policiais, começaram a se desiludir, houve um esvaziamento de
173

atribuições, não tinham mais tarefas, o Conselho Gestor começou a se reunir


esporadicamente, começou a ser desmobilizado. Não havia mais a pessoa da
Secretaria, que podia fazer esse papel, essa mediação, não tinha mais. E o
Secretário não queria colocar ninguém. Isso acabou esvaziando o órgão.
Desmotivação, falta de recursos básicos. Em 2006, vem um outro Secretário, que
também não comprou a idéia [...]. O novo Secretário que assumiu em 2007, também
não vê no órgão uma política adequada. Não vê com prioridade, não entende e não
compreendeu o GISP como uma Força-Tarefa institucionalizada. Ao contrário, vê
como um estorvo, um problema, só gasta, e ele resolve que a prioridade dele é
montar um setor de Inteligência própria da Secretaria, coordenado pela Polícia
Federal. Foi a decisão política que ele tomou. Então, ele esvaziou o GISP. No
momento, o GISP está praticamente esvaziado, está prestes a acabar. Uma
experiência que nasceu muito bem, e, então, morreu!.

Interessante que nesse processo de deterioração, quem está mais sentindo é


a Polícia Militar e o Ministério Público. São os órgãos que estão mais sentindo. A
Polícia Civil, parece, dá a impressão, na sua cúpula, que está satisfeita com a
derrocada do GISP.

A partir de 2006 começou a acontecer. Com o esvaziamento da Instituição, os


bons Policiais já não queriam, quem estava lá queria sair, e havia uma rotina de
indicar nomes para compor o órgão, prá cumprir lacunas e começamos a identificar
que os que estavam sendo indicados não eram profissionais motivados, muitas
vezes competentes para aquelas atividades. E isso, veja, foi uma bola de neve,
principalmente em 2006. O GISP nunca conseguiu formar um grupo coeso, de
policiais, de profissionais. nunca conseguiu.

A única alternativa que eu vejo para que a gente reverta a situação é os


Governadores assumirem posições mais firmes no comando do problema da
Segurança Pública. A única maneira de você lidar com o corporativismo das
instituições, é uma liderança política forte, carismática. Representação democrática.
e afirmar categoricamente, assumir essa missão, como diretriz basilar de seu
governo. Para mandar em quem tem que ser mandado e negociar com quem tem
que ser negociado. Prá chamar na mesma mesa o Presidente do Tribunal de Justiça
174

e o Procurador-Geral de Justiça e definir com clareza metas e tarefas para os


órgãos policiais e prisionais. Eu não vejo outra alternativa. O problema é que os
políticos brasileiros até agora não acordaram para isso. Eles ainda temem a
Segurança Pública, não conhecem bem o tema Segurança Pública e continuam
acreditando que a melhor maneira de lidar com o tema é empurrar com a barriga,
como é uma expressão popular. É continuar pagando crise. Não querem, acham que
é de custo político envolver-se no embate direto com as organizações, no exercício
da autoridade. Governadores temem, muitos deles fogem dessa atribuição. Quando
fazem, fazem de uma forma muito personalista como o Governador do Paraná, que
também não é um bom modelo sob esse ponto de vista, mas eu não vejo outra
alternativa. Enquanto os Políticos, Agentes Políticos e os Governadores não
assumirem esse compromisso, essa atitude, nós vamos ter que continuar
convivendo com essa briga corporativa interminável entre as organizações, e nós
vamos continuar perdendo [...]. Eu não vejo como a sociedade Civil possa lidar, não
há como, a Sociedade Civil não tem capital político para lidar com esse problema.
Essas são corporações muito fortes, muito autônomas, muito pouco transparentes.
não há, a curto prazo, qualquer chance da Sociedade Civil por si, lidar com o
problema. Não vejo outra solução. Tem que vir da Autoridade Política a solução do
problema. O dia em que nós tivermos um Governador que assuma isso e mostre
bons resultados, se destaque nacionalmente, ou outros vão copiar. É isso que
precisa. Precisamos um com coragem prá fazer isso. Porque à medida que os outros
perceberem que dá resultado, que o custo político é menor que eles imaginam, que
eles podem se beneficiar muito eleitoralmente com os bons resultados, aí os outros
vão imitar. Nós temos um modelo de sucesso, que poderia ter sido Aécio Neves,
mas tá deixando de ser Aécio Neves. o Aécio Neves teve essa chance na mão, tá
perdendo essa chance. Porque acho que não visualizou isso, não conseguiu
visualizar. A minha tristeza e a minha frustração pessoal (Gov. Est. MG).

Atualmente, em Minas Gerais, dois órgãos distintos têm atuado no combate à


macrocriminalidade: GISP (instituída por decreto estadual) e o CAOCRIMO
(pertencente ao Ministério Público Estadual).
Portanto, a idéia inicial que surgiu, com a criação de uma Força-Tarefa
Institucionalizada (GISP), visando à integração dos diversos órgãos da Segurança
175

Pública e do Sistema de Justiça Criminal para o combate à macrocriminalidade, não


obteve êxito.
Impõe-se destacar, a partir da pesquisa de campo realizada e das opiniões
dos entrevistados, os principais motivos que redundaram no fracasso dessa Força-
Tarefa:
- O fato de ter sido um “projeto relâmpago” que precisava ser apresentado a
tempo para obter recursos de federais. Não houve um prévio planejamento, com o
consenso das instituições interessadas, que, inclusive, demonstraram resistências
para integrar o Grupo;
- A existência de fortes resistências de todas as instituições: A Polícia Militar
não pretendia trabalhar junto com a Polícia Civil. A Polícia Civil, por sua vez, não
tinha interesse que a Polícia Militar se tornasse Polícia Judiciária e que passasse a
investigar, assim como o Ministério Público. Havia total desconfiança entre as
instituições, faltando articulação interinstitucional;
- A falta de um pulso firme da cúpula da SEDS e de controle rigoroso por
parte do Governo que, ao contrário, demonstrou falta de vontade política para
efetivar atribuições;
- O convênio e regulamento estavam mal elaborados, pois sequer
regulamentaram as atribuições das diferentes instituições, não resguardando a
competência das mesmas;
- A falta de definição quanto aos crimes que seriam objeto de investigação,
criando conflitos internos nas próprias instituições (em especial junto à Polícia Civil,
pois as Delegacias Especializadas temiam que o GISP pudesse acabar com as
especializações. Assim, os Policiais que atuavam no GISP começaram a sofrer
retaliações, por parte dos demais colegas);
- Falta de especificação sobre como deveria ser feito o inquérito policial e a
quem seria dirigido. Criou-se, assim, uma dualidade de atribuição;
- Falta de prévia reunião entre as instituições para debate sobre a criação do
GISP. Após sua criação, houve falhas na disseminação das informações sobre do
que ele se tratava. Parecia que era do conhecimento apenas dos líderes das
instituições, os demais acreditavam que estava sendo criada uma verdadeira Swat,
gerando estigmas desnecessários;
- Inoperância administrativa: demora na agilização da máquina estatal para
regulamentar e tornar físico o GISP;
176

- Demora na apresentação de sua regulamentação;


- Não se trabalhou previamente com o problema da “cultura das instituições”,
onde prevaleceu, por parte dos diversos órgãos, a resistência a mudanças e à
integração. Havia forte sentimento de temor ao novo e medo de perder poder e
espaço;
- Conselho Gestor totalmente inoperante: houve “vácuo de coordenação por
parte do Governo Estadual”, faltando a mediação de algum órgão;
- Forte ingerência política e falta de consenso quanto à importância do GISP a
cada mudança de Secretário que atuava junto ao Grupo;
- O GISP não se tornou uma Política de Governo, entrando em processo de
deterioração;
- É muito alto o custo político de combater e enfrentar a cultura das
instituições. Os políticos limitam-se a apagar incêndios e;
- Houve excesso de interesses corporativos. Por exemplo, a insistência do
Ministério Público Estadual em manter o GCOC, permanecendo como instância
paralela e assumindo posição ambígua.

A experiência do GISP, me leva a pensar se, se é possível realmente


viabilizar um modelo como esse. Depois de 4 anos desse insucesso, eu me
confesso céptico da viabilidade de um modelo mais formalizado. Prá mim foi uma
experiência muito traumática, angustiante, perceber que ela não vingou pelas
diversas nuances políticas envolvidas. Ou seja, percebi que o problema era muito
mais difícil do que eu imaginava [...]. Articulação interinstitucional das organizações.
Existe em boa medida a qualquer processo de formalização aos interesses
corporativos em jogo. Significa, então, me perguntam, então, será que nós vamos
estar fadados ao modelo da Força-Tarefa convencional? Talvez sim (Gov. Est. MG).

7.7 DO PODER DE INVESTIGAÇÃO POR PARTE DO MINISTÉRIO PÚBLICO

Busca-se, neste momento, fazer uma breve referência sobre uma questão
que tem sido objeto de várias controvérsias e recursos à Instância Superior: o
eventual poder de investigação por parte do Ministério Público.
177

As entrevistas realizadas em Minas Gerais e no Rio Grande do Sul, em


especial quando ouvidos os Policiais, demonstraram discordância com o poder que
vem sendo dado ao Ministério Público para investigar, seja coordenando as demais
instituições ou participando dos atos investigatórios.
Pela pesquisa, até então realizada, pôde-se verificar que não há
regulamentação legal sobre o tema quando se aborda o trabalho realizado por uma
Força-Tarefa.
Nos documentos juntados e, principalmente, nas manifestações dos atores
envolvidos, ora verifica-se que as operações da Força-Tarefa são presididas pelas
Autoridades Policias e formalizadas através de um Inquérito Policial encaminhado ao
Ministério Público (que acompanhou, muitas vezes as investigações e,
eventualmente, solicitou determinadas diligências), ora foi coordenada pelo
Ministério Público (Federal ou Estadual), que se utilizava das Polícias como
auxiliares para operacionalização de suas investigações. O trabalho era formalizado
através de um Processo Investigatório Criminal onde o próprio Ministério Público
denunciava e instruía o feito.
O que se pôde constatar foi a possibilidade da ocorrência de duas
investigações, realizadas sobre o mesmo fato, e sob a presidência e coordenação
de órgãos distintos, ao mesmo tempo (sem que uma saiba da outra)93.
Conforme esclarece Andrade (2006, p. 139-140), há quatro espécies de
investigação criminal, sendo elas as realizadas pelo Poder Judiciário (Investigações
criminais contra magistrados – 1º art. 33, caput, Loman – e os crimes praticados nas
dependências do Supremo Tribunal Federal – Regimento Interno do STF, art. 43 §§
1º e 2º); pelo Ministério Público (Procurador-Geral investiga crimes praticados por
membros do Ministério Público, no exercício de suas funções, conforme Lei
Orgânica do Ministério Público Estadual e Federal); pelo Poder Legislativo (conforme
art. 58, § 3º da Constituição Federal, que outorga poderes investigatórios aos
membros da Câmara dos Deputados e do Senado Federal, através das Comissões
Parlamentares de Inquérito) e pela Polícia Judiciária (Polícia Civil e Polícia Federal).

93
A prevalecer os termos da referida resolução pode ocorrer de fatos delitivos idênticos serem
apurados por meio de procedimentos distintos e por agentes públicos diversos, gerando insegurança
jurídica e competição entre a Polícia Judiciária e o Ministério Público, provocando ainda mais
descrédito nas instituições do Sistema de Segurança Pública e Justiça Criminal, em especial à
instituição eventualmente preterida. Tal constatação pôde ser verificada no depoimento prestado pelo
Policial Militar do GISP, por ocasião das entrevistas realizadas.
178

Há muitos argumentos contrários à investigação por parte do Ministério


Público94.
O que se nota, no entanto, é que por trás desse debate está o fato de que:

[...] começa a tomar corpo certa consciência mundial da necessidade de


maior participação do Ministério Público, já na primeira fase da persecução
penal, seja atuando lado a lado com a polícia, seja realizando sua própria
investigação criminal, pois somente desta maneira poderá tornar o combate
à criminalidade mais efetivo e célere, em razão de uma melhor seleção dos
elementos que realmente lhe interessam para formalizar sua atuação em
âmbito processual (ANDRADE, 2006, p. 95).

A Constituição Federal, em seu artigo 129, estabeleceu as funções do


Ministério Público, sendo que seu inciso I previu que lhe compete “promover,
privativamente, a ação penal pública, na forma da lei”. Andrade (2006, p. 177-178)
invoca a Teoria dos Poderes Implícitos, ou seja, “quem pode o mais, pode o menos”.
Dessa forma, “se o Ministério Público é o titular da ação penal (o que seria o mais),
também poderá ele fazer suas próprias investigações (o que seria o menos), a fim
de que possa melhor exercer sua titularidade e se convencer sobre o oferecimento
ou não, da acusação”. Além disso, segundo ele, a Polícia Judiciária não possui
qualquer exclusividade na condução das investigações criminais.
A Lei 8.625, de 12.02.1993 (Lei Orgânica do Ministério Público) prevê a
possibilidade de três tipos de investigações criminais serem realizadas pelo
Ministério Público:
Conforme Andrade:

A primeira, diz respeito à investigação criminal dentro de um procedimento,


cujo objetivo seja o resguardo imediato dos direitos assegurados na
Constituição frente à inércia dos Poderes Públicos e serviços de relevância
pública, como a Polícia Judiciária. A segunda refere-se aos inquéritos
policiais ou termos circunstanciados presididos pelo Procurador-Geral
sempre que haja indícios da prática de infração penal, por parte de membro
do Ministério Público, quando cometida no exercício de suas funções. E a
última, diz respeito às investigações iniciadas pelo Procurador-Geral,
antecipando-se à instauração de inquérito policial, sempre que tiver notícia
de que um dos membros de sua instituição praticou algum ilícito penal.
Igualmente no exercício de suas funções (2006, p. 197).

94
Andrade (2006) refere diversos argumentos contrários ao poder investigatório do Ministério Público,
rebatendo-os um a um, quais sejam: o art. 144, § 4º da Constituição Federal, o perigo de voltar ao
sistema inquisitivo, fere o princípio da igualdade de armas, fere o princípio da imparcialidade,
desrespeita o princípio da legalidade, trata-se de conduta exibicionista, há uma atuação parcial, temor
da volta à ditadura do Ministério Público, condenado com base nas investigações, esvazia trabalho
das Delegacias de Polícia e a ausência de controle externo. Para melhor exame: ver Ministério
Público e sua investigação criminal.
179

O Código de Processo Penal no seu parágrafo único, artigo 4º, não derrogada
pela Constituição Federal (ANDRADE, 2006, p. 203), e o seu artigo 47 prevêem a
investigação, quando o inquérito for deficitário. Como bem salienta Andrade (2006,
p. 206): ”[...] de há muito estaria implantada a cultura da investigação ministerial, se
o dispositivo em comento não fosse substituído pelos requerimentos endereçados à
Autoridade Judicial, que os repassa à Autoridade que presidiu o inquérito policial”.
A participação do Ministério Público durante a investigação criminal destina-
se a permitir que ele possa solicitar providências, desde o simples registro de uma
ocorrência policial até a conclusão do inquérito policial, respeitando a ampla defesa
(ANDRADE, 2006, p. 223).
Na realidade, conforme ressaltam Streck e Feldens (2003), a investigação
criminal exercida pelo Ministério Público não se consubstancia como uma regra
geral, e, sim, no plano da necessidade circunstancial.
Lemos Junior (2002, p.425) destaca que essa coordenação não pode ser
traduzida como enfraquecimento do órgão policial, mas ao contrário, “deve a Polícia
Judiciária descobrir que, apoiando-se nas mãos orientadoras do Ministério Público, o
trabalho policial fica mais prestigiado, mais forte, e distante de possíveis pressões
políticas ou gestões de advogados, o que é muito comum no Brasil”.
Ainda acrescenta:

Independentemente da posição legislativa atribuída à Polícia Judiciária,


cabe ao Ministério Público priorizar, em todo país, sua atuação na área
criminal e combater efetivamente a criminalidade organizada que tanto tem
abalado a ordem pública. E, para tanto, é imprescindível que, assim como
ocorre nas Promotorias de Justiça voltadas à defesa dos interesses difusos
e coletivos, haja pleno acompanhamento da investigação criminal por parte
do promotor de justiça. De fato, na área criminal, deve o Ministério Público
estabelecer em seu Plano de Atuação o combate às organizações
criminosas e, para tanto, a fim de que a previsão torne-se real, defendemos
que o promotor de justiça deveria assumir a coordenação da investigação
criminal (LEMOS JUNIOR, 2002, p. 425).

O Superior Tribunal de Justiça já se posicionou quanto à viabilidade de


investigação por parte do Ministério Público.
Atualmente, a definição sobre o poder investigatório do Ministério Público em
matéria criminal encontra-se sub judice. A questão está sendo debatida por meio do
julgamento de um pedido de habeas corpus (HC 84548) do empresário Sérgio
Gomes da Silva, o Sombra, acusado de ser o mandante do assassinato do ex-
180

prefeito de Santo André (SP), Celso Daniel, ocorrido em janeiro de 2002. Os


advogados sustentam a insubsistência da ação penal por ter sido embasada em
investigação promovida pelo Ministério Público.
Em junho de 2007, o relator do habeas corpus, ministro Marco Aurélio,
acolheu o pedido para trancar a ação penal que corre na Justiça de Itapecerica da
Serra. Segundo o ministro, o artigo 144 da Constituição Federal estabelece que
cumpre à Polícia Federal exercer com exclusividade as funções de Polícia Judiciária
da União e que às Polícias Civis a apuração de infrações penais, exceto as militares.
O ministro Sepúlveda Pertence, que proferiu o segundo voto no julgamento, afirmou
que não havia inconstitucionalidade na investigação pelo Ministério Público. O
pedido de vista do ministro Cezar Peluso suspendeu a discussão pelo Plenário do
Supremo Tribunal Federal (STF). Desde 21 de junho de 2007 até o presente
momento, os autos continuam em poder do ministro Peluso para voto95.
Esse foi um problema enfrentado pelo Governo de Minas Gerais quando da
criação do GISP:

Então, era o momento de definir com clareza quem faria a investigação. Se,
por exemplo, os inquéritos que pudessem ser instaurados no âmbito do gabinete
teriam que ser remetidos para uma unidade especializada da Polícia Civil, ou não.
Ao que nós não queríamos, nós queríamos que o gabinete, que o Delegado ali
tivesse autonomia para instaurar os inquéritos, sem ter que prestar contas à
Delegacia de Roubos de Carga, de tráfico de drogas, nessas divisões mais
especializadas. Aí começou a surgir, constatamos, as divisões especializadas da
Polícia Civil resistiam, ou temiam o GISP.

Porque eu fico pensando o seguinte: qualquer nível de formalização, vai ter


um problema básico de definir com clareza, quem manda, quem exerce
coordenação, isso não tem como ser resolvido, isso não tem uma solução simples

95
Disponível no site do STF: informação processual: <www.stf.gov.br/processos.HC 84548>. A
Justiça brasileira ainda não sedimentou uma solução para o assunto. Junto ao STJ, o Ministro Rel.
Paulo Medina observa que o texto da Lei Orgânica Nacional do Ministério Público não autoriza esse
órgão a instaurar inquérito policial, mas somente a requisitar diligências investigatórias e instauração
de inquéritos à autoridade policial. Contrariamente a esse entendimento, o ministro Nilson Naves
argumentou que as Polícias não têm direito exclusivo à investigação criminal. Além disso, para ele, se
por um lado não há texto normativo que mencione expressamente a possibilidade de o Ministério
181

ou envolve um grau de consenso difícil, e principalmente no momento atual


brasileiro a relação entre Ministério Público e Polícia Civil é uma relação muito tensa.
O modelo de gestão colegiado não funcionou porque faltavam cabeças, faltava
liderança, gestor operacional. Começaram a surgir problemas internos no órgão,
disputas de setores, o setor de inteligência com o setor operacional. Faltava alguém.
Uma chefia para dizer e para mediar as soluções dos conflitos. Um órgão como esse
não pode ter coordenação colegiada, isso ficou claro para todos nós [...]. Não tem
como resolver esse problema. É insolúvel esse problema (Gov. Est. MG).

Oportunas as manifestação dos demais entrevistados sobre o tema:

Não vejo problemas desses órgãos serem primordialmente executivos e


acessoriamente auxiliares do Ministério Público Federal. No dia que Delegado de
Polícia puder oferecer denúncia e apanhar de advogado de defesa, não falo mais
em investigação pelo Ministério Público. Enquanto o Ministério Público tiver que
fazer a defesa da acusação, não vejo como se possa subtrair a função de procurar e
buscar as provas que melhor satisfaçam sua atividade (MPF).

Da mesma forma Ministério Público, a Força-Tarefa do Ministério Público


podia ser algo conjunto com os departamentos policiais: DEIC DENARC e o
Promotor junto acompanhando a investigação e fazendo o meio de campo como
Poder Judiciário e não investigando. Eu vejo Promotor pedalando portas. isso não é
conduta, ela se expõe demais. não é atividade de Promotor. isso depõe contra a
instituição. Esse trabalho conjunto, cada um fazendo seu trabalho no mesmo local,
no mesmo prédio os resultados seriam bem melhores que esses que estamos
alcançando nos dias de hoje (PCRS).

Nunca fizemos um trabalho conjunto com a especializada criminal. A PF tem


crescido muito e as instituições não estão se dando conta. Nós somos técnicos e
notamos isso. A atribuição da federal eles não fazem. ex. muitas armas proibidas
que entram nas fronteiras que á atribuição da PF. Ela acaba fazendo excelentes
trabalhos nas outras áreas, mas não o faz na esfera de sua atribuição primária.

Público conduzir investigações criminais, por outro, não há dispositivo legal em sentido oposto. O
entendimento de Naves foi seguido pelos demais Juízes do Tribunal.
182

Trabalhamos com a PF e o trabalho foi tranqüilo. A PF não tem compromisso com a


investigação. Esse é o problema da FT: ela não tem compromisso com a
investigação, com a vítima batendo a sua porta a todo o momento. Ela pode
escolher o que vai fazer. E não é pressionada politicamente, nem pela mídia ou
vítimas. É diferente. Não tem cultura de investigação, o dia-a-dia da investigação. A
eleição da investigação já se dá pela dimensão de marketing, isso eu vejo no MP. A
FT não tem compromisso com a investigação no dia a dia, porque, muitas coisas,
ela manda para nos investigarmos. A Promotoria Especializada sempre manda
pedidos de IPs, mas o que é bom não vem. Essas instituições que não têm a
essência da investigação do dia a dia que nem a Polícia Civil são diferentes. Na
questão do crime organizado, verificou-se uma pulverização: o crime comum com
característica de crime organizado, de organização criminosa (PCRS).
Andrade sobre o tema refere:

Por fim, no que diz respeito às investigações policiais, há quem entenda


que, ao invés de promover investigações paralelas, o Ministério Público
deveria buscar uma maior participação junto às Delegacias de Polícia,
trabalhando lado a lado com a autoridade policial. No entanto, não vemos
como possa vir a prosperar tal proposição (2006, p. 275).

Explica que, para muitos, a simples indicação de um Promotor para


acompanhar a tramitação de um inquérito já é vista como grave violação ao princípio
da igualdade entre as partes, além disso a “velha guarda” da Polícia Judiciária se
mostra arredia a toda e qualquer aproximação do Ministério Público e, em terceiro
lugar, a maioria das Delegacias sequer possui estrutura para comportar a presença
de um Promotor de Justiça.
Objetivando regulamentar os limites de atuação do Ministério Público no que
diz respeito ao poder investigatório, a Resolução n.13 de 2 de outubro de 2006, do
Conselho Nacional do Ministério Público, disciplinou, no âmbito do Ministério
Público, a instauração e tramitação de Procedimento Investigatório Criminal96.

96
Art. 127 Constituição Federal: O Ministério Público é instituição permanente, essencial à função
jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos
interesses individuais indisponíveis. Art. 129. Da Constituição Federal: São funções institucionais do
Ministério Público: I - promover, privativamente, a ação penal pública, na forma da lei; II - zelar pelo
efetivo respeito dos Poderes Públicos e dos serviços de relevância pública aos direitos assegurados
nesta Constituição, promovendo as medidas necessárias a sua garantia; VIII - requisitar diligências
investigatórias e a instauração de inquérito policial, indicados os fundamentos jurídicos de suas
manifestações processuais; IX - exercer outras funções que lhe forem conferidas, desde que
compatíveis com sua finalidade, sendo-lhe vedada a representação judicial e a consultoria jurídica de
183

entidades públicas. LC75/93: Art. 8º Para o exercício de suas atribuições, o Ministério Público da
União poderá, nos procedimentos de sua competência: I - notificar testemunhas e requisitar sua
condução coercitiva, no caso de ausência injustificada; II - requisitar informações, exames, perícias e
documentos de autoridades da Administração Pública direta ou indireta; III - requisitar da
Administração Pública serviços temporários de seus servidores e meios materiais necessários para a
realização de atividades específicas; IV - requisitar informações e documentos a entidades privadas;
V - realizar inspeções e diligências investigatórias; VI - ter livre acesso a qualquer local público ou
privado, respeitadas as normas constitucionais pertinentes à inviolabilidade do domicílio; VII - expedir
notificações e intimações necessárias aos procedimentos e inquéritos que instaurar; VIII - ter acesso
incondicional a qualquer banco de dados de caráter público ou relativo a serviço de relevância
pública; IX - requisitar o auxílio de força policial. Lei n. 8.625, de 12 de Fevereiro de 1993. Art. 26.
No exercício de suas funções, o Ministério Público poderá: I - instaurar inquéritos civis e outras
medidas e procedimentos administrativos pertinentes e, para instruí-los: a) expedir notificações para
colher depoimento ou esclarecimentos e, em caso de não comparecimento injustificado, requisitar
condução coercitiva, inclusive pela Polícia Civil ou Militar, ressalvadas as prerrogativas previstas em
lei; b) requisitar informações, exames periciais e documentos de autoridades federais, estaduais e
municipais, bem como dos órgãos e entidades da administração direta, indireta ou fundacional, de
qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios; c) promover
inspeções e diligências investigatórias junto às autoridades, órgãos e entidades a que se refere a
alínea anterior; II - requisitar informações e documentos a entidades privadas, para instruir
procedimentos ou processo em que oficie; III - requisitar à autoridade competente a instauração de
sindicância ou procedimento administrativo cabível; IV - requisitar diligências investigatórias e a
instauração de inquérito policial e de inquérito policial militar, observado o disposto no art. 129, inciso
VIII, da Constituição Federal, podendo acompanhá-los; V - praticar atos administrativos executórios,
de caráter preparatório; VI - dar publicidade dos procedimentos administrativos não disciplinares que
instaurar e das medidas adotadas; VII - sugerir ao Poder competente a edição de normas e a
alteração da legislação em vigor, bem como a adoção de medidas propostas, destinadas à prevenção
e controle da criminalidade; VIII - manifestar-se em qualquer fase dos processos, acolhendo
solicitação do juiz, da parte ou por sua iniciativa, quando entender existente interesse em causa que
justifique a intervenção. § 1º As notificações e requisições previstas neste artigo, quando tiverem
como destinatários o Governador do Estado, os membros do Poder Legislativo e os
desembargadores, serão encaminhadas pelo Procurador-Geral de Justiça. § 2º O membro do
Ministério Público será responsável pelo uso indevido das informações e documentos que requisitar,
inclusive nas hipóteses legais de sigilo. § 3º Serão cumpridas gratuitamente as requisições feitas pelo
Ministério Público às autoridades, órgãos e entidades da Administração Pública direta, indireta ou
fundacional, de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios. §
4º A falta ao trabalho, em virtude de atendimento à notificação ou requisição, na forma do inciso I
deste artigo, não autoriza desconto de vencimentos ou salário, considerando-se de efetivo exercício,
para todos os efeitos, mediante comprovação escrita do membro do Ministério Público. § 5º Toda
representação ou petição formulada ao Ministério Público será distribuída entre os membros da
instituição que tenham atribuições para apreciá-la, observados os critérios fixados pelo Colégio de
Procuradores. Resolução n. 13, de 02 de outubro de 2006. O Conselho Nacional do Ministério
Público, no exercício das atribuições que lhe são conferidas pelo artigo 130-A, § 2º, inciso I, da
Constituição Federal e com fulcro no art. 64-A de seu Regimento Interno, Considerando o disposto no
artigo 127, caput e artigo 129, incisos I , II,VIII e IX, da Constituição Federal,Considerando o que
dispõem o art. 8° da Lei Complementar n.º 75/93, o art. 26 da Lei n.º 8.625/93 e o art. 4º, parágrafo
único, do Código de Processo Penal;Considerando a necessidade de regulamentar no âmbito do
Ministério Público, a instauração e tramitação do procedimento investigatório criminal; RESOLVE:
Capítulo I DA DEFINIÇÃO E FINALIDADE Art. 1º O procedimento investigatório criminal é
instrumento de natureza administrativa e inquisitorial, instaurado e presidido pelo membro do
Ministério Público com atribuição criminal, e terá como finalidade apurar a ocorrência de infrações
penais de natureza pública, servindo como preparação e embasamento para o juízo de propositura,
ou não, da respectiva ação penal. Parágrafo único. O procedimento investigatório criminal não é
condição de procedibilidade ou pressuposto processual para o ajuizamento de ação penal e não
exclui a possibilidade de formalização de investigação por outros órgãos legitimados da
Administração Pública. Capítulo II DA INSTAURAÇÃO Art. 2º Em poder de quaisquer peças de
informação, o membro do Ministério Público poderá: I – promover a ação penal cabível; II – instaurar
procedimento investigatório criminal; III – encaminhar as peças para o Juizado Especial Criminal,
caso a infração seja de menor potencial ofensivo; IV – promover fundamentadamente o respectivo
184

arquivamento; V – requisitar a instauração de inquérito policial. Art. 3º O procedimento investigatório


criminal poderá ser instaurado de ofício, por membro do Ministério Público, no âmbito de suas
atribuições criminais, ao tomar conhecimento de infração penal, por qualquer meio, ainda que
informal, ou mediante provocação. § 1º O procedimento deverá ser instaurado sempre que houver
determinação do Procurador-Geral da República, do Procurador-Geral de Justiça ou do Procurador-
Geral de Justiça Militar, diretamente ou por delegação, nos moldes da lei, em caso de discordância
da promoção de arquivamento de peças de informação. § 2º A designação a que se refere o § 1º
deverá recair sobre membro do Ministério Público diverso daquele que promoveu o arquivamento. §
3º A distribuição de peças de informação deverá observar as regras internas previstas no sistema de
divisão de serviços. § 4º No caso de instauração de ofício, o membro do Ministério Público poderá
prosseguir na presidência do procedimento investigatório criminal até a distribuição da denúncia ou
promoção de arquivamento em juízo. § 5º O membro do Ministério Público, no exercício de suas
atribuições criminais, deverá dar andamento, no prazo de 30 (trinta) dias a contar de seu
recebimento, às representações, requerimentos, petições e peças de informação que lhes sejam
encaminhadas. § 6º O procedimento investigatório criminal poderá ser instaurado por grupo de
atuação especial composto por membros do Ministério Público, cabendo sua presidência àquele que
o ato de instauração designar. Art. 4º O procedimento investigatório criminal será instaurado por
portaria fundamentada, devidamente registrada e autuada, com a indicação dos fatos a serem
investigados e deverá conter, sempre que possível, o nome e a qualificação do autor da
representação e a determinação das diligências iniciais. Parágrafo único. Se, durante a instrução do
procedimento investigatório criminal, for constatada a necessidade de investigação de outros fatos, o
membro do Ministério Público poderá aditar a portaria inicial ou determinar a extração de peças para
instauração de outro procedimento. Art. 5º Da instauração do procedimento investigatório criminal far-
se-á comunicação imediata e escrita ao Procurador-Geral da República, Procurador-Geral de Justiça,
Procurador-Geral de Justiça Militar ou ao órgão a quem incumbir por delegação, nos termos da
lei.Capítulo III DA INSTRUÇÃO Art. 6º Sem prejuízo de outras providências inerentes à sua atribuição
funcional e legalmente previstas, o membro do Ministério Público, na condução as investigações,
poderá:I – fazer ou determinar vistorias, inspeções e quaisquer outras diligências;II – requisitar
informações, exames, perícias e documentos de autoridades, órgãos e entidades da Administração
Pública direta e indireta, da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios;III – requisitar
informações e documentos de entidades privadas, inclusive de natureza cadastral;IV – notificar
testemunhas e vítimas e requisitar sua condução coercitiva, nos casos de ausência injustificada,
ressalvadas as prerrogativas legais;V – acompanhar buscas e apreensões deferidas pela autoridade
judiciária;VI – acompanhar cumprimento de mandados de prisão preventiva ou temporária deferidas
pela autoridade judiciária; VII – expedir notificações e intimações necessárias; VIII- realizar oitivas
para colheita de informações e esclarecimentos; IX – ter acesso incondicional a qualquer banco de
dados de caráter público ou relativo a serviço de relevância pública; X – requisitar auxílio de força
policial. § 1º Nenhuma autoridade pública ou agente de pessoa jurídica no exercício de função pública
poderá opor ao Ministério Público, sob qualquer pretexto, a exceção de sigilo, sem prejuízo da
subsistência do caráter sigiloso da informação, do registro, do dado ou do documento que lhe seja
fornecido. § 2º O prazo mínimo para resposta às requisições do Ministério Público será de 10 (dez)
dias úteis, a contar do recebimento, salvo hipótese justificada de relevância e urgência e em casos de
complementação de informações.§ 3º Ressalvadas as hipóteses de urgência, as notificações para
comparecimento devem ser efetivadas com antecedência mínima de 48 horas, respeitadas, em
qualquer caso, as prerrogativas legais pertinentes.§ 4º A notificação deverá mencionar o fato
investigado, salvo na hipótese de decretação de sigilo, e a faculdade do notificado de se fazer
acompanhar por advogado.§ 5º As correspondências, notificações, requisições e intimações do
Ministério Público quando tiverem como destinatário o Presidente da República, o Vice-Presidente da
República, membro do Congresso Nacional, Ministro do Supremo Tribunal Federal, Ministro de
Estado, Ministro de Tribunal Superior, Ministro do Tribunal de Contas da União ou chefe de missão
diplomática de caráter permanente serão encaminhadas e levadas a efeito pelo Procurador-Geral da
República ou outro órgão do Ministério Público a quem essa atribuição seja delegada. § 6º As
notificações e requisições previstas neste artigo, quando tiverem como destinatários o Governador do
Estado os membros do Poder Legislativo e os desembargadores, serão encaminhadas pelo
Procurador-Geral de Justiça. § 7º As autoridades referidas nos parágrafos 5º e 6º poderão fixar data,
hora e local em que puderem ser ouvidas, se for o caso. § 8º O membro do Ministério Público será
responsável pelo uso indevido das informações e documentos que requisitar, inclusive nas hipóteses
legais de sigilo. Art. 7º O autor do fato investigado será notificado a apresentar, querendo, as
informações que considerar adequadas, facultado o acompanhamento por advogado. Art. 8º As
185

A Resolução dá legitimidade institucional para a realização de investigação


criminal, que há anos vem sendo questionada pelo meio jurídico e, ao mesmo
tempo, delimita os poderes do Ministério Público.
Quanto à constitucionalidade do PIC, Sobrinho (2006) assim se manifesta:

Nunca é demais relembrar que o art. 144, parágrafos 1º, I e 4º da


Constituição Federal atribuiu à Polícia Federal e às Polícias Civis estaduais

diligências serão documentadas em auto circunstanciado. Art. 9º As declarações e depoimentos


serão tomados por termo, podendo ser utilizados recursos áudio-visuais. Art. 10 As diligências que
devam ser realizadas fora dos limites territoriais da unidade em que se realizar a investigação, serão
deprecadas ao respectivo órgão do Ministério Público local, podendo o membro do Ministério Público
deprecante acompanhar a(s) diligência(s), com a anuência do membro deprecado. § 1º A deprecação
poderá ser feita por qualquer meio hábil de comunicação, devendo ser formalizada nos autos. § 2º O
disposto neste artigo não obsta a requisição de informações, documentos, vistorias, perícias a órgãos
sediados em localidade diversa daquela em que lotado o membro do Ministério Público. Art. 11 A
pedido da pessoa interessada será fornecida comprovação escrita de comparecimento. Art. 12 O
procedimento investigatório criminal deverá ser concluído no prazo de 90 (noventa) dias, permitidas,
por igual período, prorrogações sucessivas, por decisão fundamentada do membro do Ministério
Público responsável pela sua condução. § 1º Cada unidade do Ministério Público, manterá, para
conhecimento dos órgãos superiores, controle atualizado, preferencialmente por meio eletrônico, do
andamento de seus procedimentos investigatórios criminais. § 2º O controle referido no parágrafo
anterior poderá ter nível de acesso restrito ao Procurador-Geral da República, Procurador-Geral de
Justiça ou Procurador-Geral de Justiça Militar, mediante justificativa lançada nos autos. Capítulo IVDA
PUBLICIDADE Art. 13 Os atos e peças do procedimento investigatório criminal são públicos, nos
termos desta Resolução, salvo disposição legal em contrário ou por razões de interesse público ou
conveniência da investigação. Parágrafo único. A publicidade consistirá: I – na expedição de certidão,
mediante requerimento do investigado, da vítima ou seu representante legal, do Poder Judiciário, do
Ministério Público ou de terceiro diretamente interessado; II – no deferimento de pedidos de vista ou
de extração de cópias, desde que realizados de forma fundamentada pelas pessoas referidas no
inciso I ou a seus advogados ou procuradores com poderes específicos, ressalvadas as hipóteses de
sigilo; III – na prestação de informações ao público em geral, a critério do presidente do procedimento
investigatório criminal, observados o princípio da presunção de inocência e as hipóteses legais de
sigilo. Art. 14 O presidente do procedimento investigatório criminal poderá decretar o sigilo das
investigações, no todo ou em parte, por decisão fundamentada, quando a elucidação do fato ou
interesse público exigir; garantida ao investigado a obtenção, por cópia autenticada, de depoimento
que tenha prestado e dos atos deque tenha, pessoalmente, participado. Capítulo V DA CONCLUSÃO
E DO ARQUIVAMENTO Art. 15 Se o membro do Ministério Público responsável pelo procedimento
investigatório criminal se convencer da inexistência de fundamento para a propositura de ação penal
pública, promoverá o arquivamento dos autos ou das peças de informação, fazendo-o
fundamentadamente. Parágrafo único. A promoção de arquivamento será apresentada ao juízo
competente, nos moldes do art.28 do CPP, ou ao órgão superior interno responsável por sua
apreciação, nos termos da legislação vigente. Art. 16 Se houver notícia de outras provas novas,
poderá o membro do Ministério Público requerer o desarquivamento dos autos, providenciando-se a
comunicação a que se refere o artigo 5º desta Resolução. Capítulo VIDAS DISPOSIÇÕES FINAIS E
TRANSITÓRIAS. Art. 17 No procedimento investigatório criminal serão observados os direitos e
garantias individuais consagrados na Constituição da República Federativa do Brasil. Aplicando-se,
no que couber, as normas do Código de Processo Penal e a legislação especial pertinente. Art. 18 Os
órgãos do Ministério Público deverão promover a adequação dos procedimentos de investigação em
curso aos termos da presente Resolução, no prazo de 90 (noventa) dias a partir de sua entrada em
vigor. Art. 19 Esta Resolução entra em vigor na data de sua publicação. Brasília, 02 de outubro de
2006. ANTONIO FERNANDO BARROS E SILVA DE SOUZA PRESIDENTE Art. 4º CPP - A polícia
judiciária será exercida pelas autoridades policiais no território de suas respectivas circunscrições e
terá por fim a apuração das infrações penais e da sua autoria. Parágrafo único - A competência
definida neste artigo não excluirá a de autoridades administrativas, a quem por lei seja cometida a
mesma função.
186

as tarefas relativas às investigações criminais, exceto as de natureza militar.


Também não se desconhece que dentre as inúmeras atribuições do
Ministério Público consagradas no artigo 129 da Carta Política não se inclui
o poder investigatório, salvo nos casos de inquérito civil.

Pela referida resolução membro do parquet poderá instaurar procedimento


investigatório criminal para apurar ocorrência de infrações penais de
natureza pública, quando se sabe que os únicos procedimentos destinados
à formalização da prova na fase extrajudicial são o inquérito policial e o
termo circunstanciado, de atribuição da Polícia Judiciária. O titular da ação
penal pode valer-se de qualquer peça informativa para formar a sua opinio
delicti e provocar a inércia jurisdicional, entretanto, não se permite a
utilização de procedimentos formais não prescritos em lei na fase
investigativa.

Não é outra a conclusão que se chega da leitura do artigo 9º do Código de


Processo Penal: "Todas as peças do inquérito policial serão, num só
processado, reduzidas a escrito ou datilografadas e, neste caso, rubricadas
pela autoridade". A formalidade do inquérito policial assegura a
transparência e a legalidade da apuração da infração penal, servindo de
subsídio confiável à propositura da ação penal. Abandonar o formalismo
tradicional do inquérito é uma temeridade e ameaça as garantias
97
constitucionais e processuais do suspeito .

Por fim, o assunto continua polêmico e sem definição jurídica.


“Sabe-se que o papel do analista não é denunciar nem justificar as
montagens particulares que se põem em evidência, na realidade é analisar sua
mecânica interna e suas conseqüências” (FRIEDBERG, 1995, p. 311).
Dessa forma, observa-se que, na atualidade, não há qualquer norma
disciplinando qual a investigação juridicamente válida: da Polícia Civil, do Ministério
Público, de uma Força-Tarefa, de todas?98
A pesquisa demonstra que referida pauta carece de regulamentação por lei
federal, não bastando regulamentações administrativas, em âmbito estadual. Uma
lei que torne a investigação contra a macrocriminalidade mais eficaz, mais célere e
dinâmica, diminuindo a burocracia e defendendo os interesses sociais, e não de
políticos ou de grupos econômicos.

97
Em 10.10.2006, A Associação dos Delegados de Polícia do Brasil ajuizou Ação Direta de
Inconstitucionalidade (Adin 3806) contra referida resolução, junto ao no Supremo Tribunal Federal
(STF). Segundo a conselheira Janice Ascari (CNMP), o STF terá que avaliar duas questões: se os
Conselhos Nacionais podem editar resoluções e se o Ministério Público tem poder de investigação.
Quanto à primeira, disse estar tranqüila, pois o Supremo já entendeu que os Conselhos têm poder
normativo, tanto o CNMP quanto o Conselho Nacional de Justiça (CNJ). Em relação à segunda, é
preciso aguardar o julgamento. Em 13.02.08: conclusos. Disponível em: <www.stf.gov.br>.
98
Os documentos juntados referentes à atuação da FTRS demonstram que ora a operação era
coordenada pela Polícia Civil, ora pelo Ministério Público, sem que houvesse qualquer referência
quanto à validade das provas apuradas - Anexo X II.
187

Essa realidade se confirma através do estudo de Sapori (2006), que conclui


pela ausência de uma racionalidade gerencial do Sistema de Segurança Pública e
Justiça Criminal, vista como uma arena de conflitos e de negociações de segmentos
organizacionais frouxamente conectados.
188

CONCLUSÃO

[...] Assim, vamos passando as páginas e a cada novo texto, um retrato quase expressionista, forte,
marcante, de um Brasil muitas vezes ameaçado fora e dentro dos próprios mecanismos de
segurança, vê sua oferta de cidadania mostrar-se frágil. É preciso ir além. É preciso reformar. É
preciso ajustar. É preciso refletir e encarar o cenário entre sombrio e contraditório de quadros, que
optam mais pelo corporativismo do que pela missão essencial que a sociedade lhe destinou.
Benedito Domingos Mariano

Como forma de finalizar o trabalho, é de se ressaltar, antes de tudo, suas


limitações. Como qualquer trabalho científico, há de se questionar sobre suas
conclusões, pois o pesquisador pode estar equivocado. Por certo que essa
realidade, aqui, é consciente e espera-se poder, cada vez mais, aperfeiçoar a
pesquisa.
Como já foi dito, o tema é amplo e suscetível das mais diversas formas de
interpretações. Evidentemente, seu recorte teórico comporta ampliações. O tema
enseja diversas outras abordagens, que não foram analisadas, como, por exemplo,
o procedimento que deveria ser adotado pela Força-Tarefa (se realizado através de
inquérito policial, com a presidência de uma Autoridade Policial ou procedimento
criminal, sob a coordenação do Ministério Público) que merecem estudos mais
aprofundados. O que se pretendeu, na pesquisa realizada, foi, preliminarmente,
verificar se uma Força-Tarefa, constituída pela integração de diferentes órgãos do
Sistema de Segurança Pública e Justiça Criminal, seria um mecanismo eficaz para
o combate à macrocriminalidade, e quais os obstáculos encontrados para a sua
implementação e manutenção.
A pesquisa utilizada permite inferir que os fenômenos da criminalidade e da
violência vêm numa crescente, sendo uma forte influência para a proliferação do
crime organizado. A transição democrática (em geral, sinônimo de inovação e
mudança) não significou que as Instituições que operacionalizam o Sistema de
Segurança Pública e Justiça Criminal acompanharam essa democratização. As
Policiais, em especial, apresentam uma continuidade organizacional, agindo como
189

há décadas atrás e condenando a Polícia à reprodução de seus hábitos atávicos,


gerando descrédito e ineficiência. Enfim, como referiu Soares (2003), o “modelo
gerencial da Polícia permaneceu arcaico”. Ademais, o problema não se resume
somente à Polícia, mas também ao Ministério Público e ao Poder Judiciário, muitas
vezes atuando de forma burocrática e desconectada da realidade social. Assim, a
Justiça não é vista como um instrumento legítimo e adequado para a superação da
conflitualidade social. As principais causas da criminalidade e da violência, aliadas à
impunidade e deficiências na gestão dos órgãos responsáveis pela aplicação da lei,
demonstraram que as Instituições de Controle Social não acompanharam o
desenvolvimento social, criando terreno fértil para a proliferação da
macrocriminalidade.
Observou-se que os métodos investigatórios previstos no Código de Processo
Penal de 1942 não são suficientes para combater o crime organizado. Os dilemas de
gestão apresentados no início do trabalho, como a falta de diagnósticos criminais, de
sistemas de dados confiáveis, etc., demonstraram que sem gestão não há como
realizar investigações eficientes. É necessária a descentralização e divulgação de
informações para uma integração entre as organizações.
A macrocriminalidade é o cerne do problema contemporâneo, em especial
quanto à dificuldade na sua investigação. A corrupção de agentes do Estado
inviabiliza uma investigação completa. A natureza das suas operações é pouco
conhecida, envolvendo redes de atores situados em diferentes pontos, com grande
capacidade de expandir-se, diversificando atividades. Todo o funcionamento se dá
na base da “Lei do Silêncio”, diluindo a materialidade e dificultando a descoberta da
autoria. Os criminosos geralmente são ricos e conhecidos, respeitados na sociedade
e se escondem atrás de “testas de ferro” e de “laranjas”, com empresas de fachada
onde a lavagem de dinheiro é uma constante. De tempo em tempo, essas
organizações mudam, dificultando suas localizações e rastreamentos. É um
fenômeno cambiante onde as vítimas são difusas. Seus membros internacionalizam-
se, estabelecem alianças estratégicas, servem-se de instituições financeiras
legítimas para lavarem dinheiro sujo.
As falhas nos sistemas de investigação provocadas, principalmente, por
métodos arcaicos, insuficientes e incapazes, são elementos essenciais para a
proliferação da macrocriminalidade. Os mecanismos normais de investigação não
têm condições de desvendar a criminalidade organizada.
190

A CPI do Narcotráfico instaurada no Rio Grande do Sul, em 2002, já havia


demonstrado a existência de organizações criminosas no Estado, vinculadas ao
narcotráfico, tráfico de armas, roubo de cargas, jogo do bicho, lavagem de dinheiro,
etc. Essa realidade põe em evidência a incapacidade do sistema de investigação
dos delitos. As entrevistas realizadas, na sua unanimidade, referem que a
criminalidade vem numa crescente, em especial, no caso do narcotráfico, roubo de
cargas, contrabando de mercadorias, adulteração de combustível e crimes contra a
Administração Pública.
Partindo do pressuposto de que as organizações que integram o Sistema de
Segurança Pública e Justiça Criminal são compostas por grupos de indivíduos que
interagem uns com outros, construindo uma cultura organizacional, ela deve ser,
necessariamente, conhecida pelos seus Gestores. Porém, constata-se, pelas
entrevistas realizadas, aliadas ao referencial teórico examinado, que os diversos
órgãos que integram o Sistema de Segurança Pública e Justiça Criminal
apresentam-se desarticulados, atuando de forma independente e prejudicando uma
investigação eficaz no combate ao crime organizado, e contribuindo para as altas
taxas de corrupção e impunidade.
A centralização e rigidez eliminam o caráter pessoal das relações. Uma grave
conseqüência dessa realidade é a verificação da distância, daqueles que decidem
os problemas que surgem nas organizações, comparados àqueles que executam as
atividades. As rotinas organizacionais destinam-se a potencializar a capacidade de
resposta, predominando a burocratização, com procedimentos padronizados e
obediência cega à lei. Cria-se, assim um círculo vicioso, conforme referido por onde
se desenvolvem relações de poder paralelas, em razão das zonas de incerteza. São
elas que reforçam ou diminuem a autonomia e daí o poder.
Nas entrevistas realizadas, em especial quando trata da ineficácia da Força-
Tarefa de Minas Gerais, um dos aspectos mais referidos foi exatamente as brigas
interinstitucionais. A Polícia Civil sustenta que a Polícia Militar vem extrapolando
suas funções (como, por exemplo, na realização dos Termos Circunstanciados, no
cumprimento dos mandados de busca e apreensão, no comando do Guardião, etc.).
Já o Ministério Público possui poder demasiadamente grande, acabando por se
imiscuir nas atribuições da Polícia Civil, sustentando o poder de investigar.
Quanto à Polícia Civil, as demais instituições vêem poder demasiado, em
especial quanto à discricionariedade na escolha dos inquéritos policiais, que acabam
191

sendo investigados e enviados ao Ministério Público. Outra resistência à criação da


Força-Tarefa é o medo da perda de espaço e poder. Os atritos entre as forças
policiais começam no momento de se definir onde acaba o policiamento ostensivo e
onde se inicia a atividade investigatória, o que redunda em estratégias
desarticuladas.
Quanto ao Ministério Público, a maior resistência das demais instituições diz
respeito ao seu comportamento, no sentido de atuar sozinho, buscando investigar de
forma autônoma. Isso gera a visão de uma instituição conservadora e corporativista.
Essa abordagem se mostrou real quando um dos fatores alegados para a
inoperância do GISP, em Minas Gerais, foi o fato do Ministério Público Estadual,
através do CAOCRIMO, não dispensar o GCOC. Para as demais instituições, essa
foi uma atitude de clara demonstração do desinteresse do Ministério Público dm
buscar a integração.
Com relação à dissertação, julga-se recomendável uma aproximação entre o
Direito e a Sociologia, em especial no âmbito da área da Segurança Pública e do
Sistema de Justiça Criminal. A importância da utilização de conceitos da Sociologia
das Organizações é enorme. Ela nos dá, através de seus conceitos e abordagens,
bases para os estudos das organizações que operacionalizam o Sistema se
Segurança Pública e de Justiça Criminal. Em especial, como interpretá-los através
da compreensão do ser humano, suas relações e reações.
No âmbito da Sociologia das Organizações, discute-se uma nova lógica
organizacional onde a capacidade de inovar é tão importante como a de racionalizar.
Essa inovação depende também da capacidade de mobilização dos diferentes
atores no sentido de cooperar de forma eficaz. A Força-Tarefa pode ser vista como
um mundo de atores que interagem entre si, entram em conflito e criam clima de
discórdia. E, para resolver estas questões, a comunicação é essencial.
Há um histórico de animosidades recíprocas. Isso abala um dos pilares de
qualquer rede interorganizacional. A mudança organizacional nesse contexto é
quase que impossível, principalmente em razão das estruturas organizacionais
centralizadas e hierarquizadas. Assim, é importante o estudo das estratégias para
compreender os fenômenos organizacionais.
Os principais entraves para a formação de uma Força-Tarefa encontram-se
nessa realidade, na dificuldade para a integração das diversas instituições. O estudo
demonstrou que somente quando as organizações conjugarem esforços para
192

melhorar o processo de integração haverá a chance de maximizar o desempenho


organizacional. Mobilizar os indivíduos é a forma mais fácil de aceitação de
mudanças, mostrando a eficácia das mudanças para as organizações. Somente
assim, instalar-se-á uma verdadeira cultura de desenvolvimento atuando com
flexibilidade, confiabilidade, seletividade, diversidade e planejamento.
A abordagem sociológica acerca da cultura organizacional nos mostra como
ela é um grande entrave à formação das Forças-Tarefas.
A cultura influencia o comportamento dos indivíduos e quanto mais
sedimentada e centralizada ela for, maior o freio a mudanças, pois a cultura define
as funções e características individuais.
As polícias com diferente competências, solidificaram-se em duas
corporações distintas com modelos culturais diferenciados, gerando uma falta de
articulação institucional, onde se faz necessário “trabalhar as diferenças culturais”
antes de criar-se a Força-Tarefa.
Deve haver uma negociação entre as instituições, onde uns desistem em
troca de concessões feitas pelos outros, sendo imprescindível a troca de
informações, planejamento entre todas as instituições envolvidas. Com efeito, essa
abordagem comprovou que, por mais importante que seja uma mudança, ela deve
ser nem elaborada, pois podem surgir resistências a ela e, a partir daí, conflitos.
A atuação de uma Força-Tarefa permanente apresenta resultados
animadores. Não se trata de “perda de autonomia, espaço ou poder” e, sim, de
reconhecer o potencial do trabalho em conjunto, diante da inegável proliferação da
criminalidade organizada.
Por certo que deve haver uma estrutura operacional completa em termos de
informação, diagnóstico e cruzamentos de dados, um ambiente diversificado e
plural, flexível às adaptações e ajustes, com prévio planejamento, cooperação
mutua, reiteradas reuniões, enfim, uma estrutura onde cada instituição participe e
tenha suas atribuições especificadas e respeitadas.
Por certo que nesse contexto não se abstrai o pano de fundo da estrutura
sócio-econômica do país, com suas desigualdades e problemas sociais. Da mesma
forma não se olvidam os dilemas de gestão que dificultam a operacionalização das
organizações que atuam junto à Polícia e à Justiça. Mas a pesquisa demonstra que,
em que pese essa realidade, viável e eficaz a criação de Forças-Tarefa para,
atuando de acordo com as previsões legais, combater de forma eficaz o crescente
193

desenvolvimento da macrocriminalidade, devendo ser prioridade de qualquer


Estado, independente do governo que esteja no poder.
Respondendo ao objetivo principal deste estudo, pode-se inferir, que, com
base no referencial teórico abordado, nas entrevistas tomadas e na observação
realizada, pode-se concluir que a criação de uma Força-Tarefa permanente pode ser
considerada como um modelo viável para melhorias na investigação da
macrocriminalidade, na integração dos diversos órgãos do Sistema Criminal e na
gestão da Segurança Pública, devendo, para tanto, serem enfrentados os
obstáculos que se interpõem. No plano organizacional, à sua constituição
consolidação, em especial quanto ao seu procedimento.
194

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Unidade. Porto Alegre: Unidade, n.57, p. 46-56, jan/dez. 2004.

___. Terrorismo Criminal - um novo fenômeno no Brasil. In: Revista da Ajuris. Porto
Alegre: AJURIS, n. 75, p.19-29, set. 1999.

YIN, ROBERT K. Estudo de Caso: Planejamento s Métodos. Porto Alegre:


Bookman, 2005.

SITES CONSULTADOS

CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA. Disponível em: <www.cnj.gov.br>.

CORREIO WEB. Disponível em: <www.noticias.correioweb.com.br>.

GOVERNO DO ESTADO DE ALAGOAS. Disponível em: <www.al.gov.br>.

GOVERNO DO ESTADO DE SÃO PAULO. Disponível em: <www.sp.gov.br>.

MINISTÉRIO DA JUSTIÇA. Disponível em: <www.mj.gov.br>.

MINISTÉRIO PÚBLICO DO RS: Disponível em: <www.mp.rs.gov.br>.

PORTAL MINAS. Disponível em: <www.mg.gov.brt>.

PREFEITURA DE SÃO PAULO. Disponível em: <www.portal.prefeitura.sp.gov.br>.

PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA. Disponível em: <www.//bvc.cgu.gov.br>.

PRONASCI. Disponível em: <www.cfappm.ma.gov.br>.

RÁDIO 98. Disponível em: <www.radio98to.com.br>.

SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. Disponível em: <www.stf.gov.br/processos>.

SECRETARIA DE REFORMA JUDICIÁRIA. Disponível em:


<http://www.mj.gov.br/reforma>.

SEGURANÇA COM CIDADANIA. Disponível em: <www.segurancacidada.org.br>.

SUSEPE. Disponível em: <www.susepe.rs.gov.br>.


209

UNODC. Disponível em: <www.unodc.org/brazilç/about_us.html>.


210

ANEXOS

ANEXO I: OPERAÇÃO FTMG

ANEXO II: OPERAÇÃO FTMG

ANEXO III: SEDS – GISP/MG

ANEXO IV: CAOCRIMO/GCOC

ANEXO V: FTRS

ANEXO VI: THE ORGANIZED CRIME DRUG ENFORCEMENT TASK FORCE


PROGRAM

ANEXO VII: RELATÓRIO MPRS

ANEXO VIII: FTRS: CONVÊNIOS E SUBCONVÊNIOS

ANEXO IX: TRABALHO DA PC SOBRE GISP/MG

ANEXO X: NOVA DELEGACIA DE POLÍCIA/MG

ANEXO XI: MÁFIA DO GUSA/MG

ANEXO XII: FTRS


Norma: DECRETO 43644 2003 Data: 03/11/2003 Origem: EXECUTIVO

Ementa: CRIA COMISSÃO NA SECRETARIA DE ESTADO DE DEFESA SOCIAL PARA PROMOVER


AÇÕES DE COMBATE À CRIMINALIDADE.
Fonte: PUBLICAÇÃO - MINAS GERAIS DIÁRIO DO EXECUTIVO - 04/11/2003 PÁG. 2 COL. 1
Indexação: CRIAÇÃO, COMPOSIÇÃO, COMISSÃO, ÂMBITO, SECRETARIA DE ESTADO DE
DEFESA SOCIAL, OBJETIVO, PROMOÇÃO, ATIVIDADES, COMBATE, CRIME.
COMPETÊNCIA, SECRETÁRIO DE ESTADO DE DEFESA SOCIAL, FIXAÇÃO, NORMAS
COMPLEMENTARES, FUNCIONAMENTO, COMISSÃO, PROMOÇÃO, ATIVIDADES,
COMBATE, CRIME.
Catálogo: EXECUTIVO, COMISSÃO.

Texto:

Cria Comissão na Secretaria de


Estado de Defesa Social para
promover ações de combate à
criminalidade.

O Governador do Estado de Minas Gerais, no uso de suas


atribuições que lhe conferem os incisos VII e XIV do art. 90, da
Constituição do Estado e tendo em vista o objeto do Convênio nº
03/2003, firmado entre o Ministério da Justiça e o Estado de Minas
Gerais,

Decreta:

Art. 1º - Fica criada no âmbito da Secretaria de Estado de


Defesa Social comissão para promover o combate à criminalidade.
Parágrafo único. Em atendimento ao disposto no Convênio nº
03/2003, firmado entre o Ministério da Justiça e o Estado de Minas
Gerais, fica a comissão criada pelo caput denominada "Gabinete de
Gestão Integrada de Segurança Pública no Combate à Criminalidade".

Art. 2º - O Gabinete de Gestão Integrada de Segurança Pública


no Combate à Criminalidade tem por finalidade promover ações que
visem a integrar a avaliação, o planejamento, a organização, a
elaboração e a execução de operações de prevenção, repressão e
investigação de infrações penais que especificar, respeitadas as
atribuições constitucionais de cada instituição policial.

Art. 3º - O Gabinete de Gestão Integrada de Segurança Pública


no Combate à Criminalidade é composto pelos seguintes membros:
I - um representante da Secretaria de Estado de Defesa
Social;
II - um representante da Polícia Civil de Minas Gerais;
III - um representante da Polícia Militar de Minas Gerais;
IV - um representante da Polícia Rodoviária Federal em Minas
Gerais;
V - um representante da Superintendência da Polícia Federal
em Minas Gerais;
VI - um representante do Tribunal de Justiça do Estado de
Minas Gerais;
VII - um representante do Ministério Público do Estado de
Minas Gerais;
VIII - um representante do Conselho de Defesa Social; e
IX - um representante da Assembléia Legislativa de Minas
Gerais.
§ 1º Para cada representante haverá um suplente, que o
substituirá em caso de ausência ou impedimento.
§ 2º Os membros do Gabinete serão indicados pelos respectivos
titulares dos órgãos e entidades e designados por Resolução do
Secretário de Estado de Defesa Social, para um período de 2 (dois)
anos, permitida uma recondução por igual período.
Art. 4º - O Secretário de Estado de Defesa Social poderá,
eventualmente, solicitar a participação de um representante nas
atividades do gabinete, aos titulares dos seguintes órgãos:
I - Corpo de Bombeiros Militar de Minas Gerais;
II - Justiça Federal;
III - Ministério Público Federal;
IV - Superintendência da Receita Federal;
V - Superintendência do Instituto Nacional do Seguro Social.

Art. 5º - O Gabinete de Gestão Integrada de Segurança Pública


no Combate à Criminalidade será coordenado pela Secretaria de
Estado de Defesa Social, através da Superintendência de Integração
do Sistema de Defesa Social, a quem compete a articulação de seus
membros e organização de suas atividades.
Parágrafo único. As demais disposições relativas ao
funcionamento do gabinete de Gestão Integrada no Combate à
Criminalidade serão fixadas por meio de Resolução do Secretário de
Estado de Defesa Social.

Art. 6º - As despesas decorrentes da execução deste Decreto


correrão por conta de convênios firmados com a União, bem como de
recursos das dotações orçamentárias da Secretaria de Estado de
Defesa Social.

Art. 7º - Este Decreto entra em vigor na data de sua


publicação.

Palácio da Liberdade, em Belo Horizonte, aos 3 de novembro de


2003; 215º da Inconfidência Mineira.

Aécio Neves - Governador do Estado


GOVERNO DE MINAS GERAIS
SECRETARIA DE ESTADO DE DEFESA SOCIAL

Resolução Conjunta nº _016/05, de 31/08/2005

Dispõe sobre a estrutura e o funcionamento do


Gabinete de Gestão Integrada de Segurança
Pública no Combate à Criminalidade – GISP –,
nos termos do Decreto Estadual nº 43.644/ 2003.

O SECRETÁRIO DE ESTADO DE DEFESA SOCIAL DE MINAS


GERAIS, no uso das atribuições que lhe conferem o inciso III, § 1º, do art. 93, da
Constituição Estadual, a Lei Delegada nº 49, de 2 de janeiro de 2003, a Lei Delegada
nº 56, de 29 de janeiro de 2003, o Decreto nº 43.295, de 29 de abril de 2003,
considerando o disposto no parágrafo único do art. 5o do Decreto Estadual nº 43.644,
de 03 de novembro de 2003, e tendo em vista o objeto do Convênio nº 03/2003,
firmado entre o Ministério da Justiça e o Estado de Minas Gerais;

O PROCURADOR-GERAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE MINAS


GERAIS, no uso das atribuições que lhe confere o art. 18 da Lei Complementar nº 34,
de 12 de setembro de 1994;

O CHEFE DA POLÍCIA CIVIL DO ESTADO DE MINAS GERAIS, no


uso das atribuições que lhe conferem a Lei nº 5.406, de 16 de dezembro de 1969, e a
Lei Delegada nº 101, de 29 de abril de 2003, e;

O COMANDANTE GERAL DA POLÍCIA MILITAR DO ESTADO DE


MINAS GERAIS, no uso das atribuições que lhe conferem a Lei nº 6.624, de 18 de
julho de 1975, e a Lei Delegada nº 49, de 2 de janeiro de 2003,

CONSIDERANDO

O novo paradigma de gestão integrada e sistêmica da segurança


pública;

As diretrizes do Governo Federal dispostas no Plano Nacional de


Segurança Pública editado pela Secretaria Nacional de Segurança Pública do
Ministério da Justiça;

Os Convênios nº 003/2003 e nº 004/2003, firmados entre a União e o


Estado de Minas Gerais, referentes ao Gabinete de Gestão Integrada de Segurança
Pública;

O Plano Emergencial de Segurança Pública de 2003 do Governo do


Estado de Minas Gerais;

1
GOVERNO DE MINAS GERAIS
SECRETARIA DE ESTADO DE DEFESA SOCIAL

O disposto no Decreto Estadual nº 43.644, de 03 de novembro de 2003;

A necessidade de redução da criminalidade, da insegurança pública e


do risco de morte a que as autoridades e policiais estão submetidos, por meio do
combate ao crime organizado, da apuração de crimes praticados contra policiais e
autoridades e da proteção de autoridades, que constituem demandas primordiais da
sociedade mineira,

RESOLVEM

CAPÍTULO I

DISPOSIÇÕES PRELIMINARES

Art. 1o – O Gabinete de Gestão Integrada de Segurança Pública no Combate à


Criminalidade – GISP – é um órgão consultivo e executivo no campo de segurança
pública e combate ao crime organizado, composto por integrantes de diversas
Instituições e estruturado conforme organograma constante do Anexo Único desta
Resolução.

§ 1° – A participação no Conselho Gestor será exerc ida como encargo


daqueles servidores que forem designados pelos seus órgãos de origem;

§ 2º – Os servidores policiais designados para atuar no GISP ficarão à


disposição da Secretaria de Estado de Defesa Social de Minas Gerais – SEDS – e
exercerão suas atividades em tempo integral.

CAPÍTULO II

DO CONSELHO GESTOR

Art. 2o – O Conselho Gestor, cuja composição está prevista no art. 3o do


Decreto Estadual nº 43.664, de 03 de novembro de 2003, é o órgão político do GISP,
competindo-lhe:

I. Definir os crimes em que o GISP irá atuar;

II. Construir, de forma compartilhada, soluções a cargo do setor de


segurança pública, propondo as medidas ao Secretário de Estado de
Defesa Social;

III. Decidir quais órgãos deverão ser convidados a participarem do referido


Conselho como parceiros na solução de problemas.

2
GOVERNO DE MINAS GERAIS
SECRETARIA DE ESTADO DE DEFESA SOCIAL

§ 1o – As funções desempenhadas nesse Conselho não serão remuneradas.

§ 2o – O Conselho Gestor reunir-se-á uma vez por mês, ordinariamente, ou,


extraordinariamente, mediante convocação do Secretário Executivo.

§ 3o – O Secretário Executivo do Conselho Gestor será designado pelo


Secretário de Defesa Social e terá como atribuições a elaboração da pauta, a
convocação e a condução das reuniões do referido Conselho.

§ 4º – Participarão das reuniões apenas os membros natos do Conselho e


seus convidados e, em caso de impedimento daqueles, os seus respectivos
suplentes.

§ 5o – As deliberações do Conselho Gestor serão colegiadas, ou, em caso de


dissenso, tomadas por maioria dos votos de seus membros natos, exercendo o
Secretário Executivo o voto de qualidade, se necessário.

CAPÍTULO III

DA SECRETARIA EXECUTIVA

Art. 3o – A Secretaria Executiva é composta por três servidores do quadro de


pessoal da SEDS e possui as seguintes atribuições:

I. Suprir as necessidades financeiras e materiais do GISP, no que tange a


diárias de pessoal e logística necessária ao funcionamento cotidiano do
órgão;

II. Elaborar toda a correspondência do Gabinete;

III. Controlar o serviço de protocolo relativo a toda documentação enviada e


recebida;

IV. Outras, conforme determinação do Secretário Executivo.

CAPÍTULO IV

DA COORDENADORIA DE INTELIGÊNCIA DE SEGURANÇA PÚBLICA

Art. 4o – A Coordenadoria de Inteligência de Segurança Pública é composta


por policiais estaduais, pela Subsecretaria de Administração Penitenciária e por

3
GOVERNO DE MINAS GERAIS
SECRETARIA DE ESTADO DE DEFESA SOCIAL

integrantes do Ministério Público Estadual, sendo garantida a presença de


representantes das Polícias Federal e Rodoviária Federal, competindo-lhe:

I. Desenvolver levantamentos sobre atividades criminais dentro do Estado,


observando-se aqueles elencados pelo Conselho Gestor, produzindo
conhecimentos que permitam àquele Conselho e às demais
Coordenadorias e Centros uma visão mais detalhada dos delitos,
priorizando a identificação de quadrilhas atuantes em Minas Gerais;

II. Inter-relacionar-se com as Agências de Inteligência dos diversos órgãos


federais, estaduais e municipais, objetivando manter um fluxo contínuo de
informações essenciais;

III. Realizar trabalhos de Inteligência Eletrônica, nesta compreendidas


atividades relacionadas a captação, gravação e reprodução de imagens e
sons.

Parágrafo único – A Coordenadoria possui em sua estrutura um Centro de


Operações de Inteligência, responsável pelas operações de campo destinadas à
busca e à coleta de informações para suprir as necessidades do GISP, mediante
avaliação da Coordenadoria de Inteligência de Segurança Pública.

CAPÍTULO V

DA COORDENADORIA DE COMBATE AO CRIME ORGANIZADO

Art. 5o – A Coordenadoria de Combate ao Crime Organizado é o órgão


responsável pela repressão das atividades desenvolvidas por organizações
criminosas dentro do Estado.

Parágrafo Único – A Coordenadoria de Combate ao Crime Organizado é


composta por oficiais da Polícia Militar, delegados da Polícia Civil e integrantes do
Ministério Público Estadual, sendo garantida a presença das Polícias Federal e
Rodoviária Federal, e atua na condução direta e como facilitadora dos trabalhos
desenvolvidos pelos seguintes Centros que lhe são vinculados: Centro de
Procedimentos Formais, Centro de Apuração de Crimes Contra Policiais e
Autoridades, Centro de Operações Técnico-científicas.

Art 6o – Ao Centro de Procedimentos Formais, integrado pelo Ministério


Público Estadual, por policiais civis e militares estaduais, compete:

I. Respeitadas as competências constitucionais, formalizar os Inquéritos


Policiais destinados a apurar crimes praticados por organizações
criminosas que tenham sido alvo de investigações por parte do GISP;

4
GOVERNO DE MINAS GERAIS
SECRETARIA DE ESTADO DE DEFESA SOCIAL

II. Representar perante o Poder Judiciário sobre a necessidade de adoção


de medidas judiciais contra pessoas investigadas nos respectivos
inquéritos;

III. Solicitar diligências aos demais Centros e à Coordenadoria de Inteligência


de Segurança Pública que visem proporcionar-lhe subsídios para a
elaboração do inquérito;

IV. Prestar informações à Coordenadoria de Combate ao Crime Organizado


sobre o andamento de apurações que estejam sendo levadas a efeito,
sempre que solicitado.

Art 7o – Compete ao Centro de Apuração de Crimes Contra Policiais e


Autoridades, composto por policiais militares e civis estaduais e sendo garantida a
presença de integrantes do Ministério Público Estadual, apurar crimes cometidos
contra policiais militares e civis e autoridades estaduais ocorridos no exercício do
desempenho de suas atribuições ou em decorrência destas.

Art 8º – O Centro de Operações Técnico-científicas, composto por policiais


militares e civis estaduais com conhecimentos nas diversas áreas periciais, destina-
se a atender as necessidades do GISP no que tange a trabalhos técnicos.

CAPÍTULO VI

DA COORDENADORIA DE PROTEÇÃO A AUTORIDADES

Art 9º – A Coordenadoria de Proteção a Autoridades, composta por policiais


militares e civis e por integrantes do Ministério Público, é o órgão do Gabinete
responsável pela proteção a autoridades vítimas de ameaças em razão do exercício
de suas funções, competindo-lhe receber as solicitações, analisá-las e, se
necessário, implementar as medidas aplicáveis a cada caso, mediante apoio das
forças policiais.

CAPÍTULO VII

DO PESSOAL EMPREGADO NO GISP

Art 10 – Os integrantes do GISP devem ser designados por seu Comando ou


Chefia, mediante proposta do próprio Gabinete.

5
GOVERNO DE MINAS GERAIS
SECRETARIA DE ESTADO DE DEFESA SOCIAL

Parágrafo único – Para atuar no GISP, seus integrantes passarão por um


processo seletivo que tenha o objetivo de verificar seus antecedentes e habilidades
específicas.

Art 11 – São motivos para o desligamento do servidor dos quadros do GISP:

I.prática de ato de indisciplina;


II.quebra da lealdade;
III.baixa produtividade;
IV. cometimento de falta que afete a honra e o decoro pessoal, mesmo que
não seja em ato de serviço;
V. falta de discrição que possa comprometer a segurança dos seus
integrantes ou os objetivos de uma operação;
VI. outras, mediante avaliação do Conselho Gestor.

Seção I

Dos Coordenadores

Art 12 – O Coordenador de cada uma das diversas Coordenadorias e Centros


será designado por ato do Secretário Executivo para o exercício da função pelo prazo
de dois anos, não se permitindo a recondução.

§ 1º – A escolha do ocupante inicial de cada função será realizada mediante


sorteio e as subseqüentes serão de forma alternada entre os representantes de maior
posto hierárquico de cada Instituição que possua representante na Coordenadoria ou
Centro.

§ 2º – As decisões no âmbito das Coordenadorias e Centros serão tomadas de


forma colegiada, cabendo ao Coordenador o voto de qualidade, se necessário.

§ 3º – As decisões de natureza administrativa serão tomadas pelo respectivo


Coordenador.

CAPÍTULO VIII

DISPOSIÇÕES FINAIS

Art 13 – Para cumprir as operações policiais relacionadas às atividades de


combate ao crime organizado e de proteção a autoridades, o GISP deverá valer-se
das forças táticas das polícias estaduais.

6
GOVERNO DE MINAS GERAIS
SECRETARIA DE ESTADO DE DEFESA SOCIAL

Art. 14 – Para realizar as operações de natureza técnico-científicas relativas às


atividades de combate ao crime organizado e de proteção às autoridades, o GISP
poderá valer-se, entre outros, do Núcleo de Apoio Pericial - NAP – da Polícia Civil.

Art 15 – As despesas de diárias e passagens com os policiais empregados no


GISP serão custeadas com recursos da SEDS.

Art 16 – Os casos omissos serão solucionados pelo Secretário de Estado de


Defesa Social, mediante parecer do Conselho Gestor.

Art. 17 – Fica a cargo da Secretaria de Estado de Defesa Social a obrigação


de publicação da presente resolução na Imprensa Oficial.

Art. 18 – Esta Resolução Conjunta entra em vigor na data de sua publicação.

Art. 19 – Fica garantida a revisão desta Resolução Conjunta no prazo de 180


dias a contar da data de sua publicação.

Belo Horizonte, 31 de agosto de 2005.

ANTÔNIO AUGUSTO JUNHO ANASTASIA JARBAS SOARES JÚNIOR


Secretário de Estado de Defesa Social de Minas Procurador-Geral de Justiça do Estado de Minas
Gerais Gerais

Delegado Geral de Polícia OTTO TEIXEIRA FILHO Cel. PM SÓCRATES EDGAR DOS ANJOS
Chefe da Polícia Civil do Estado de Minas Gerais Comandante Geral da Polícia Militar do Estado de
Minas Gerais

7
ANEXO ÚNICO À RESOLUÇÃO CONJUNTA 016/05

ORGANOGRAMA DO GABINETE DE GESTÃO INTEGRADA DE SEGURANÇA


PÚBLICA
CONSELHO
GESTOR

SECRETARIA
EXECUTIVA

COORDENADORIA COORDENADORIA COORDENADORIA


DE COMBATE AO DE INTELIGÊNCIA DE PROTEÇÃO A
CRIME DE SEGURANÇA AUTORIDADES
ORGANIZADO PÚBLICA

CENTRO DE CENTRO DE CENTRO DE CENTO DE


OPERAÇÕES PROCEDIMENTOS APURAÇÃO DE OPERAÇÕES DE
TÉCNICO- FORMAIS CRIMES CONTRA INTELIGÊNCIA 8
CIENTÍFICAS POLICIAIS E
AUTORIDADES
Estado do Rio Grande do Sul
Ministério Público

Clipping
Voltar
Segurança Pública
Força-tarefa interdita desmanches na Capital

Cinco pessoas foram presas, duas pelo furto de energia e três por receptação e adulteração de numeração

Um trecho da Avenida Sertório, entre a Assis Brasil e a Baltazar de Oliveira Garcia, na zona norte de Porto Alegre, foi fechado para o trânsito ontem à tarde.

Sem o movimento normal da via, pôde ser realizada a operação Força Total, nome dado à união entre Polícia Civil, Brigada Militar, Secretaria Estadual da Fazenda e
Secretaria Municipal da Indústria, Produção e Comércio (Smic) contra os desmanches de veículos.

Até o final da tarde, em um dos estabelecimentos visitados pela polícia, quase na Avenida Baltazar de Oliveira Garcia, ainda se contavam peças e pedaços de carros sem
numeração. Motores, portas, tetos eram juntados no pátio e recompunham o que antes havia sido um automóvel.

- A numeração identificadora do vidro traseiro foi removida propositadamente. É uma pena que essas outras partes dos carros, como as portas, não tenham número de
fábrica. Ajudaria bastante - comentava no local o titular da Delegacia de Furtos e Roubos de Veículos (DFRV), Eduardo de Oliveira Cesar.

Às 14h11min, dezenas de viaturas com sirenes e luminosos ligados avisavam que algo importante iria ocorrer. Batedores de moto da Empresa Pública de Transporte e
Circulação (EPTC) e da BM fechavam as ruas para deixar o comboio seguir.

Segundo o diretor do Departamento Estadual de Investigações Criminais (Deic), delegado Ranolfo Vieira Júnior, a ação foi concentrada em seis locais, quase na esquina
com a Baltazar. Todos foram interditados, mas cinco deles por irregularidades fiscais, o que era um dos objetivos da força-tarefa ao agregar fiscais da Receita Estadual.
Os produtos mais valiosos, como motores e caixas de câmbio, foram recolhidos.

- Trabalham sem nota fiscal, sem recolher impostos, irregulares nesse sentido. E havia furto de energia elétrica - explicou o diretor do Deic.

Polícia deve divulgar hoje números finais

Em uma das lojas, havia carros retalhados, sem sinal de acidente ou batida. Até ontem, pelo menos cinco veículos foram identificados como furtados ou roubados, entre
eles um Fox, um Honda Civic, um Gol e um Golf. Cinco pessoas foram presas, duas por furto de energia e três por receptação e adulteração de numeração
identificadora. Hoje, em entrevista, a polícia deverá divulgar os números finais da operação, que foi comemorada ontem mesmo:

- Olha, de legal aqui, só mesmo a nossa operação. Eles não têm documentação, não têm nota fiscal, não têm ligação elétrica, nem segurança contra incêndio. Estão
atuando aqui de forma clandestina - afirmou o coronel Paulo Roberto Mendes.

Fonte: Zero Hora


Ministério Público - RS

Intranet

SEGURAN ÇA PÚBLICA
Força-tarefa vai percorrer os salões
Fonte:Correio do Povo (tachado por brunaq em 15/02/2007 13:26)

Ação protegerá menores em Santa Cruz. Em Bento, jovens terão ônibus a R$ 1,00 após os
bailes.

A formação de uma força-tarefa para coibir a venda de bebidas alcoólicas a menores durante o
Carnaval em Santa Cruz do Sul foi acertada durante reunião realizada ontem na sede do
Ministério Público. A fiscalização terá a participação do Conselho Tutelar, Conselho Municipal dos
Direitos da Criança e do Adolescente, Conselho Municipal Antidrogas, Brigada Militar e
secretarias municipais de Turismo, Saúde e Fazenda.

A força-tarefa deverá ingressar nos salões durante os bailes de Carnaval, para verificar se não
há menores consumindo bebidas alcoólicas. Conforme a promotora da Infância e da Juventude,
Simone Spadari, a questão voltará a ser debatida durante uma audiência pública marcada para
as 9h desta quinta-feira. Estão convidados associações de bairros, a Polícia Civil, blocos
carnavalescos e os proprietários dos estabelecimentos.

As operações, conforme a promotora, atendem a uma reivindicação da própria comunidade. A


Brigada Militar também estará com o policiamento reforçado durante as festas. O comandante
do 23º Batalhão de Polícia Militar, tenente-coronel Edson Luiz Chaves Brendler, informou que
alunos do curso de formação de PMs de Rio Pardo, serão designados para auxiliar os futuros
colegas.

Em Bento Gonçalves, o núcleo Rafael Fracalossi, ligado ao projeto Vida Urgente, vai desenvolver
campanha de conscientização de jovens durante o Carnaval. Além de alertar sobre os perigos do
trânsito, a entidade oferecerá um ônibus para transportar os adolescentes ao final das noitadas.
A Coordenadora do núcleo, Maria Tereza Fracalossi, reconhece que o sucesso da iniciativa
depende do apoio da maior quantidade possível de jovens. 'Não estaremos suplicando para que
não bebam. Acho que devem mesmo se divertir, mas saber o que estão fazendo e que em casa
há seus pais esperando', comenta. O projeto Carona Consciente acontecerá durante o Carnaval
da Billy, que será realizado em parceria com a Fenavinho Brasil de amanhã até domingo, no
Parque de Eventos.

O núcleo terá um quiosque no local para cadastrar jovens interessados em voltar para casa de
ônibus. O veículo sairá do parque às 5h e a passagem custará apenas R$ 1,00 'Estaremos
deixando os jovens praticamente em frente à porta de suas casas', explica a coordenadora. A
organização da festa também oferecerá ônibus a R$ 1,00, com saída às 5h30min e paradas em
locais definidos.

(C)Ministério Público - RS
MEIO AMBIENTE
Força-tarefa estoura criatório de galos de rinha
Fonte:O Informativo (tachado por rmelz em 03/08/2007 17:40)

Policiais e promotores esperavam encontrar cem animais,


mas foram surpreendidos com criatório de mil aves

Taquari - Depois de seis meses de investigações uma


força-tarefa do Ministério Público (MP) gaúcho acabou com
um negócio que movimentava milhares de reais todos os
meses, considerado um dos principais do Estado no ramo.
O "Criatório de Galos Combatentes Kern" estava localizado
nos fundos de uma casa simples do Bairro Coqueiros,
distante cinco quilômetros do Centro.

Munidos de mandado de busca e apreensão expedido pelo


juiz Juliano Rossi, da Comarca de Taquari, os integrantes
da força-tarefa composta por servidores do MP, da Polícia
Civil e da Brigada Militar chegaram à residência por volta
das 14h30min. Dois fiscais do Setor de Inteligência do
Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos
Naturais Renováveis (Ibama), de Brasília, e militares do
Batalhão Ambiental da BM também acompanharam a ação,
que terminou com a apreensão de quase mil aves - 528
delas galos de rinha prontos para combate.

A denúncia de que Teobaldo Kern (47) mantinha e treinava


galos de briga chegou ao Ibama em janeiro de 2006. O
órgão passou a investigar o caso e localizou diversos
criatórios espalhados pelo país. "Consideramos a
importância desse criador, vimos que ele mantinha uma
página de propaganda na internet e fizemos contato com o
MP gaúcho. Outras ações semelhantes deverão ser
realizadas em diversas partes do Brasil a partir de agora",
explica um dos fiscais.

No início deste ano o caso foi encaminhado à Promotoria


Especializada Criminal (PEC), que passou a aprofundar as
investigações. Durante o período foram feitas fotos de
satélite do criatório, realizadas escutas telefônicas,
interceptados e-mails e adquiridos DVDs que eram
comercializados por Kern em seu site. As filmagens
mostravam galos lutando e serviam como manual para
iniciantes na criação de aves combatentes. Também
explicavam detalhadamente os equipamentos e técnicas
utilizados no aprimoramento dos bichos. "Os DVDs
mostravam os tipos de raças, alimentação, cuidados e
demonstração de agressividade. Ele comercializava esses
produtos e os galos em pelo menos 15 estados do país",
assegura o promotor Mauro Rockenbach, da PEC.

Antes do início da operação, Rockembach - acompanhado


da promotora de General Câmara, Fabiane Rios Lisardo -
disse que esperava encontrar entre 50 e cem aves no
local. Encontrou quase dez vezes mais. "Ficamos surpresos
com o tamanho do criatório. Isso nos complica até para
abrigá-los. Faltará espaço para todos." Dos 528 galos,
apenas 52 foram levados para a Escola Técnica de
Agricultura, em Viamão, que ficará como fiel depositária.
"Esses são os mais importantes, as matrizes, de linhagem
nobre", explica o comandante da 2ª Companhia do 1º
Batalhão Ambiental da BM, capitão Rodrigo Gonçalves dos
Santos. O restante das aves ficará no criatório, sob os
cuidados de Kern, que não poderá manter o comércio para
fins de rinha.
O criador, aliás, já havia tido problemas por manter o aviário. Há alguns anos ele divulgava em seu antigo site -
Galos Combatentes - a luta de aves e seu comércio. Respondeu a um Termo Circunstanciado e pagou R$ 200 de
multa a uma instituição de Taquari. Desta vez a punição será bem mais cara: R$ 132 mil. O valor foi definido
pelo número de bichos feridos ou mutilados encontrados no local.

Raça aprimorada

A origem dos galos comercializados por Kern, segundo o Ibama, é asiática. Vindos da Índia, os animais são
aprimorados no Brasil mediante cruzamento de raças. "Eles têm pouca gordura, são mais leves, têm patas mais
largas e grossas e cristas menores. Além disso, são agressivos de nascença", explicam os fiscais. "São aves
mutiladas para não ficar tão feridas em lutas, e seus tratadores costumam utilizar meios artificiais para deixá-
las mais bravas", acrescenta. Nas rinhas - eventos dos quais Kern afirma que não participa - são presas
biqueiras e esporas de metal de até 12 centímetros, para que os ferimentos nos oponentes sejam mais sérios.

Kern negocia as aves em diversos estados e até mesmo para alguns países do Mecosul. De acordo com a
Promotoria Especializada Criminal, envia ovos e pintos, além de galos adultos, de avião para seus compradores.
"Nas escutas chegamos a gravar apostas de brigas que valiam até carros", revela um dos fiscais. "Galistas
costumam viajar para a Europa e Ásia em busca de aves melhores. Kern é conhecido nacionalmente pelo
montante de sua comercialização."

De acordo com o fiscal, a criação desses animais não é crime, mas a incitação aos maus-tratos é. "O Rio Grande
do Sul tem uma cultura de galos de rinha, assim como Santa Catarina tem a farra do boi, a Amazônia tem a
matança de golfinhos e o Nordeste tem a criação de pássaros em gaiolas", completa o servidor.

Saiba mais

As rinhas de galo em geral têm regras definidas antes das lutas ou próprias de cada rinhadeiro. Há algumas
chamadas de "oficiais", porém não o são por se tratar de um crime. Conforme o capitão Rodrigo Gonçalves dos
Santos, as mais usuais são:

Os galos têm que ter o mesmo peso para se enfrentar.

Ou ambos usam biqueiras e esporões ou nenhum usa.

As lutas podem ser até a morte de um dos oponentes ou até que um deles comece a fugir dentro do ringue, ou
até que um dos criadores suspenda o combate.

Algumas outras podem ser encontradas em sites na internet:

Os galos devem ter a mesma altura.

As brigas são em quatro rounds de 15 minutos.


COORDENAÇÃO-GERAL DE
SEGURANÇA –
COSEG
EMBASAMENTO JURÍDICO

• Decreto nº 43.644, de 03 de Novembro de 2003


Legislação que foi a gênese estadual do Gabinete
Integrado de Segurança Pública – GISP, na qual o
Governo do Estado de Minas Gerais, tendo em vista
o Convênio nº. 03/2003, firmado entre o Ministério da
Justiça e o Estado de Minas Gerais, criou, no âmbito
da Secretaria de Estado de Defesa Social, uma
comissão denominada “Gabinete de Gestão
Integrada de Segurança Pública no Combate à
Criminalidade”. decreto 43644.htm
EMBASAMENTO JURÍDICO
Resolução Conjunta nº 016/05, de 31 de Agosto de 2005
- Dispõe sobre a estrutura e o funcionamento do
Gabinete de Gestão Integrada de Segurança Pública
no Combate à Criminalidade – GISP – nos termos do
Decreto Estadual nº. 43.644/2003.
- Foi assinada pelo Secretario de Estado de Defesa
Social de Minas Gerais, pelo Procurador-Geral de
Justiça do Estado de Minas Gerais, pelo Chefe da
Polícia Civil do Estado de Minas Gerais e pelo
Comandante Geral da Polícia Militar do Estado de
Minas Gerais em função dos convênios firmados
entre a União e o Estado de Minas Gerais e o Plano
Emergencial de Segurança Pública de 2003 do
Governo Mineiro.resoluc16.05.doc
Diretrizes do GISP
– O incremento da integração entre os órgãos
do sistema de justiça criminal;

– A implantação do planejamento estratégico


como ferramenta gerencial das ações
empreendidas pelo sistema de justiça
criminal; e

– A constituição da informação como principal


ferramenta de ação policial.
ORGANOGRAMA
SEDS

Secretário
Executivo

CCCO CPA CI

Centro de
Operações de
Centro Centro de Centro de Inteligência
Apuração de Procedimentos Operações
Crimes contra Formais Técnico
Policiais e Científica
Autoridades
RECURSOS HUMANOS – POLÍCIA CIVIL
Por Coordenadoria
• Coordenadoria de Combate Crime Organizado
– 1 Delegado de Polícia – Coordenador
– 1 Escrivão
– 5 Agentes
• Coordenadoria de Proteção a Autoridades
– 4 Agentes
• Coordenadoria de Inteligência
– 1 Delegado de Polícia – Coordenador
– 2 Agentes
RELACIONAMENTO COM AS DEMAIS
INSTITUIÇOES INTEGRANTES DO GABINETE
• A Polícia Civil vem se relacionando muito bem
com todas as demais instituições que compõem
o Gabinete Integrado.

• Respeitando-se as atribuições constitucionais


de cada instituição, o GISP desenvolve,
verdadeiramente, um trabalho de união de
forças para o combate ao crime no Estado de
Minas Gerais.
ATIVIDADES DESENVOLVIDAS
Coordenadoria de Combate Crime Organizado
• Operação “Recarga” – Belo Horizonte – Origem
MP – Encerrada com êxito.

• Continuação da Operação “Recarga” – Belo


Horizonte – Origem MP – Encerrada com êxito.

• Operação “ET” – Dores de Campos – Origem


PC – Encerrada com êxito.

• Operação “Ouro Negro” – Barbacena e região –


Origem PC – Encerrada com êxito.
ATIVIDADES DESENVOLVIDAS
Coordenadoria de Combate Crime Organizado

• Operação “Vertentes” (parte) – Perdões e


São João Del Rei – Origem PC –
Encerrada com êxito.

• Apoio DRPC Leopoldina decorrente


operação “Ouro Negro” – Barbacena –
Origem PC – Encerrada com êxito parcial.
ATIVIDADES DESENVOLVIDAS
Coordenadoria de Combate Crime Organizado

• Operação “Câncer” – Barbacena – Origem PC


– Encerrada com êxito.

• Operação “Vertentes” – Prados, Carandaí e São


João Del Rei– Origem PC – Encerrada com
êxito.

• Operação “Loja de doces” – Conselheiro


Lafaiete e região – Origem PC – Encerrada com
êxito.
ATIVIDADES DESENVOLVIDAS
Coordenadoria de Combate Crime Organizado

• Operação “Carga explosiva” – Norte de Minas – Origem


MP – Apoio ao Ministério Público – Aguardando.

• Operação “Varella” – Região Metropolitana de Belo


Horizonte – Origem PC – Encerrada com êxito.

• Operação “Casa de Oração” – Contagem e Região


Metropolitana de Belo Horizonte – Origem PC – Em
andamento
ATIVIDADES DESENVOLVIDAS
Coordenadoria de Combate Crime Organizado

• Operação “Café” – Vespasiano – Origem Polícia Civil –


Em andamento.

• Operação “Bocaiúva” – Norte de Minas – Origem SEDS


– Em andamento.
ATIVIDADES DESENVOLVIDAS
Coordenadoria de Combate Crime Organizado
• Demandas Encerradas – 10 (dez)
– Delitos apurados:
• Posse ilegal de arma – 02
• Adulteração de veículos – 01
• Roubo de carga – 03
• Tráfico de entorpecentes – 04
• Jogos de azar – 01
– Origem:
MP – 02 (dois)
PC – 08 (oito)
ATIVIDADES DESENVOLVIDAS
Coordenadoria de Combate Crime Organizado

• Operações em andamento – 04 (quatro)


– Delitos:
• Adulteração de combustíveis – 01
• Tráfico de entorpecentes e armas – 02
• Furto e Roubo – 01
– Origem:
MP – 01 (um)
PC – 02 (dois)
SEDS – 01 (um)
ATIVIDADES DESENVOLVIDAS
Coordenadoria de Proteção a Autoridades
• Demandas Encerradas – 54 (cinquenta e quatro)
– Levantamentos sobre ameaças a:
• Juízes de Direito – 11 casos;
• Delegados de Polícia – 17 casos;
• Agentes de Polícia – 15 casos;
• Prefeito Municipal – 01 caso;
• Agente Penitenciário – 04 casos.
– Apoio à CCCO – 05
– Apoio à SEDS - 01
ATIVIDADES DESENVOLVIDAS
Coordenadoria de Proteção a Autoridades

• Demandas encerradas – ORIGEM

– SEDS – 05 (cinco)
– PM – 01 (um)
– MP – 01 (um)
– PC – 47 (quarenta e sete)
ATIVIDADES DESENVOLVIDAS
Coordenadoria de Proteção a Autoridades

• Demandas em andamento – 12 (doze)


– Levantamento sobre ameaças a:
• Delegados de Polícia – 03 casos;
• Agentes de Polícia – 05 casos;
• Prefeito Municipal – 01 caso;
• Juiz de Direito – 03 casos.
– Origem:
PC – 12 (doze)
PRINCIPAIS ATIVIDADES DESENVOLVIDAS
Coordenadoria de Inteligência

• Monitoramento das atividades do PCC


no Estado;
• Busca de informações sobre roubo de
cargas no Triângulo Mineiro;
• Busca de informações sobre desvio de
produtos químicos controlados /
perigosos no Norte de Minas Gerais;
• Mapeamento de atividades no interior
dos Shoppings populares;
• Auxílio ao Exército Brasileiro e ABIN na
segurança durante o desfile de 07 de
setembro;
• Apoio à rede RENISP – Rede Integrada
de Inteligência do Ministério da Justiça;
• Cumprimento de Pedidos de Busca da
Coordenação-Geral de Segurança –
COSEG;
• Assessoramento ao Gabinete de
Gestão Integrada do Sudeste – GAISP;
• Apoio à Assessoria de Consolidação
de Informações de Inteligência do
Sistema de Defesa Social.
“MÁFIA DO GUSA”
FORÇA TAREFA

A “Força Tarefa do Gusa”, como ficou


conhecida, originou-se após a morte de um
assessor da Assembléia Legislativa que
revelou a existência da “máfia das notas
fiscais frias” agindo no setor siderúrgico do
Estado de Minas Gerais.
“MÁFIA DO GUSA”
COMPOSIÇÃO

• Ministério Público de Minas Gerais;


• Secretaria de Estado de Fazenda de Minas
Gerais;
• Polícia Militar e
• Polícia Civil.
“MÁFIA DO GUSA”
IMPORTÂNCIA

A criação dessa força tarefa era necessária,


pois levantamentos iniciais evidenciaram
fraudes que geravam prejuízos vultosos para
o Estado, sendo que em apenas um caso
envolvendo uma das empresas, foi detectado
um prejuízo no valor de mais de R$
70.000.000 ( setenta milhões de reais).
“MÁFIA DO GUSA”
METODOLOGIA

Diante da complexidade do caso e da


diversidade de agentes, foram instaurados três
inquéritos policiais, havendo a indicação de
um membro de cada instituição para a
condução dos trabalhos.
“MÁFIA DO GUSA”
METODOLOGIA

Foram realizadas várias diligências:


• localização e identificação de pessoas e lugares;
• obtenção de documentos;
• monitoramentos telefônicos;
• quebra de sigilo bancário, dentre outros.
“MÁFIA DO GUSA”
DA FRAUDE

Durante o desenvolvimento dos trabalhos, em


um dos inquéritos, foi detectada a existência
de duas grandes organizações criminosas que
fraudavam o Estado; uma que agia em Belo
Horizonte e região e outra que atuava em Pará
de Minas e demais cidades.
“MÁFIA DO GUSA”
MODUS OPERANDI - BH

O esquema consistia no estabelecimento fraudulento


de empresas ( na maioria das vezes utilizando-se de
“laranjas”) - “CLIENTES” e “FORNECEDORAS”
- para simular a compra e venda de produtos e a
emissão de notas fiscais visando acobertar o
transporte de cargas de ferro gusa.
“MÁFIA DO GUSA”
MODUS OPERANDI - BH

Em Paraopeba, foi constituída a empresa STREET


METAIS, com o único fim de emitir notas fiscais
para acobertar cargas de ferro-gusa de siderúrgicas
que não emitiam notas fiscais próprias.

Na referida empresa não havia movimentação de


mercadoria de fato, mas apenas de direito, ou seja
existia somente a circulação de crédito.
“MÁFIA DO GUSA”
MODUS OPERANDI - BH

Em Belo Horizonte, a empresa Santa Juliana servia


como escritório central da organização criminosa,
onde também eram emitidas as notas fiscais.

Esta, efetivamente, trabalhava com circulação de


mercadoria, porém, distinta do gusa, estando no
ramo de material de construção.
“MÁFIA DO GUSA”
MODUS OPERANDI - BH

No Estado do Rio de Janeiro, foram constituídas,


fraudulentamente, principalmente na cidade de Levy
Gasparian, empresas comerciais atacadistas de ferro-
gusa para:

• gerar créditos de ICMS;


• obter AIDF;
• simular movimentação física de produtos na STREET.
“MÁFIA DO GUSA”
MODUS OPERANDI - BH

Os motoristas carregavam os caminhões nas


siderúrgicas e recebiam instruções sobre o transporte
e a nota fiscal, geralmente emitida pela empresa
STREET METAIS.

A empresa STREET METAIS, para não recolher o


ICMS, simulava operações de aquisição de ferro-gusa
das empresas fictícias situadas no Estado do Rio de
Janeiro, adquirindo créditos de operações que não
ocorriam.
“MÁFIA DO GUSA”
MODUS OPERANDI - BH

As notas fiscais emitidas pela empresa STREET


METAIS tinham como destinatário, dentre outros, a
empresa METAL COQUE, constituída
fraudulentamente, com matriz na cidade de Levy
Gasparian/RJ e filial na cidade de Limeira/SP.

As cargas que seguiam acobertadas com documentação


fiscal para o Estado do Rio de Janeiro tinham as notas
fiscais trocadas próximo à SIDERÚRGICA BARRA
MANSA que era o seu real destinatário.
“MÁFIA DO GUSA”
MODUS OPERANDI - BH

Quando o destino era o Estado de São Paulo, as


notas fiscais eram trocadas em postos de gasolina na
cidade de Atibaia/SP e seguiam para siderúrgicas do
interior do Estado, sendo que em alguns casos, os
caminhões eram descarregados na empresa METAL
COQUE.
“MÁFIA DO GUSA”
MODUS OPERANDI - BH

Dessa forma era possível omitir os reais destinatários


desses carregamentos de produtos siderúrgicos.

Além desses destinos, as cargas também eram


vendidas para empresas do Estado de Minas Gerais.
“MÁFIA DO GUSA”
MODUS OPERANDI - BH
“MÁFIA DO GUSA”
MODUS OPERANDI - BH

Agenciadores de carga

• contratavam caminhoneiros para realizar o


transporte com e sem documento fiscal (vantagem
- frete mais valorizado);

• utilizavam de batedores;
STREET METAIS
FAVORECIDAS E CLIENTES

AS NOTAS FISCAIS FRIAS EM NOME DA STREET METAIS


EMPRESAS PRODUTORAS DE GUSA BENEFICIADAS COM

EMPRESAS DESTINATÁRIAS DO GUSA


FAVORECIDAS

CLIENTES
OBS.: CONTATO S ESTABELECIDOS CO M RILDO O U NÔ FORAM
REALCIO NADO S A NÉLSO N VICENTE, UMA VEZ Q UE SÓ PRESTAVAM
SERVIÇOS PARA O M ESM O
“MÁFIA DO GUSA”
MODUS OPERANDI - BH

À medida que tinham problemas com a fiscalização,


as empresas constituídas fraudulentamente eram
substituídas por outras empresas que utilizavam do
mesmo método para efetivar a sua constituição.

Consequentemente, ficava o débito fiscal da outra, já


que não havia intenção de regularizar a situação da
empresa.
ESQUEMA FRAUDULENTO DE COMPRA E VENDA DE PRODUTOS SUDERÚRGICOS
DÉLIO TARABAL RONNY CLYTON W. XAVIER
DONO MENTOR
AILTON JOSÉ DA SILVA
EMPRESAS CRIADAS POR RONNY
PROCURADOR PARA SUSTENTAR O ESQUEMA
COMERCIAL REMAFLEX
EMPRESAS SUPER STREET METAIS DIST. SANTA JULIANA DISTRIBUIDORA GUSAFER
OPERACIONALIZAÇÃO OPERACIONALIZAÇÃO ABRASIFER
FORNECEDORAS FACHADA LU MINAS REPRESENTAÇÕES
DISTRIBUIDORA PEQUIAÇO
CRP COMÉRCIO E REPRESENTAÇÕES
CARLOS ANTÔNIO S. AFONSO SYLVIA ROLAND
CONTADOR FUNCIONÁRIA DA SUFER FUNCIONÁRIA DA STREET
CONSTITUÍA EMPRESAS EM EMITIA NOTAS FISCAIS EMITIA NOTAS FISCAIS
LEVY GASPARIAN/RJ GERENCIAVA A EMPRESA GERENCIAVA A EMPRESA PAULO CÉSAR ANGELA MANSUR
SÓCIO DA GUSAFER, GERENTE DA
NELSON VICENTE CLÁUDIO TINOCO SANTA JULIANA E SANTA JULIANA
COORDENAVA A COMPRA, COORDENAVA A COMPRA E ABRASIFER
O CARREGAMENTO E O VENDA DE PRODUTOS
EMPRESAS CRIADAS POR DÉLIO TRANSPORTE DAS CARGAS SIDERÚRGICOS
ANA MARIA NILSON GERALDO
PARA SUSTENTAR O ESQUEMA AGUIAR CONTADOR DA
RILDO, CARLOS, ROBERTO ALEIXO CONTADORA STREET
PEREIRA E MARQUES COM E REP CELSO, NELSON COORDENAVA A COMPRA E
COMERCIAL CIFERLUX E WARNEY VENDA DE PRODUTOS
COMERCIAL AMPLAFER APOIO LOGÍSTICO SIDERÚRGICOS
DIST. FERRO E AÇO VIEIRA E FRANCELINO ALEMAR MARCELO
INTERGUSA POLÍCIA CIVIL ANTUNES
LAGOFER COMÉRCIO E REPRESENTAÇÕES FUNCIONÁRIO DA CONTADOR DA
METAL COQUE DIST. STA. JULIANA STREET
COMERCIAL AÇOLIGAS
FERRO SIDER
KALIL EMPRESAS FAVORECIDAS EMPRESAS CLIENTES SIMULADAS
GENILDA FABIANA
METAL COQUE SÓCIA DA SOCIA DA
INSIVI IND. SUDERPURGICA VIANA STREET GUSAFEL
SICAFE PRODUTOS SIDERÚRGICOS CROSSOVER COMÉRCIO DE METAS
CALSETE SIDERURGIA INTERGUSA
PAULO CÉSAR DE ARAÚJO SIDERÚRGICA NOROESTE BARRA SUL METAIS VENUSA
CONSTITUÍA EMPRESAS EM ITASADER USINA SIDERÚRGICA PENTÁGONO CLÁUDIA
TRÊS RIOS/RJ FERROCOQUE SÓCIA DA C R P FOI SÓCIA DA SANTA
MGS MINAS GERAIS SIDERÚRGICA COMÉRCIO E JULIANA, GUSAPEL
SIDERPA SIDERÚRGIA PAULINO REPRESENTAÇÕES
SIDERÚRGICA ALTEROSA E ABRASIFER
AVG SIDERURGIA
DEVAIR
EMPRESAS CRIADAS POR DÉLIO CONTRATAVA JOSÉ CARLOS
PARA SUSTENTAR O ESQUEMA CAMINHONEIROS, FUNCIONÁRIO DA
EMPRESAS REAIS DESTINATÁRIAS MOTORISTA DA GUSAFEL
CROSSOVER COMÉRCIO DE METAS SANTA JULIANA
PENTÁGONO
MINAS GERAIS RIO DE JANEIRO SÃO PAULO

SIDERÚRGICAS SIDERÚRGIC SIDERÚRGICAS


E FUNDIÇÕES BARRA MANSA E FUNDIÇÕES DO
INTERIOR DO ESTADO
“MÁFIA DO GUSA”
MODUS OPERANDI - PARÁ DE MINAS

O esquema consistia em garantir o transporte irregular


de cargas inviabilizando a fiscalização, uma vez que
possuíam informações privilegiadas dos dias, locais e
horários em que essa iria ocorrer.

O grupo se dividia em três grandes células que agiam


dentro do Estado, cada qual em sua área, sendo todo o
percurso monitorado pelo gerente de cada uma delas
que comunicavam entre si.
“MÁFIA DO GUSA”
MODUS OPERANDI - PARÁ DE MINAS

A organização criminosa utilizava-se de policiais militares


para viabilizar o transporte da carga irregular, que agiam
da seguinte forma:

• Permitiam a passagem de veículos sem a devida


fiscalização;
• Informavam a existência ou não de fiscalização;
• Dificultavam a realização de operações de fiscalização;
• Intensificavam a fiscalização quando se tratava de veículos
com carregamentos de empresas “concorrentes”.
ROTAS USADAS

Origem: Sete Lagoas


Destino: RJ e SP

OAS
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Itinerários
INHAÚMA, CACHOEIRA
DA PRATA, MARAVILHA,
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SP
ROTAS USADAS

Origem: Sete Lagoas


Destino: RJ e SP

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Itinerários

POMPÉU, MARTINHO
CAMPOS, PARÁ DE MINAS,
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SP
ROTAS USADAS

Origem: Sete Lagoas


Destino: RJ e SP

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Itinerários

ITAÚNA,
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CARMO DA MATA ,
OLIVEIRA – BR 381
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ROTAS USADAS
Origem: Sete Lagoas
Destino: RJ e SP

OAS
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Itinerários

MARTINHO CAMPOS,
MOEMA, LAGOA DA PRATA,
SANTO ANTÔNIO
DO MONTE, ARCOS ,
FORMIGA, CANDEIAS,
CAMPO BELO, PERDÕES , BR 381.
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SP
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ROTAS USADAS

Origem: Divinópolis
Destino: RJ e SP

OAS
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Itinerários

CARMO DA MATA,
OLIVEIRA – BR 381.

FORMIGA , CANDEIAS,
CAMPO BELO,PERDÕES – BR 381.
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Perdões
SP
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ROTAS USADAS

Origem: Bom Despacho


Destino: RJ e SP

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Itinerários

MOEMA, LAGOA DA
PRATA, SANTO
ANTÔNIO DO MONTE, ARCOS,
FORMIGA , CANDEIAS, CAMPO
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RJ
“MÁFIA DO GUSA”
BENEFICIÁRIAS

• siderúrgicas produtoras de ferro-gusa, pois


vendem seus produtos sem a emissão de nota
fiscal;

• aciarias e fundições, que adquirem o produto por


um preço mais barato, e

• empresas que emitem as notas fiscais cobrando


percentual para tal.
“MÁFIA DO GUSA”
OPERAÇÃO - 13/12/2005

• Seleção das empresas para busca e apreensão


dentre as envolvidas, dada a limitação da
capacidade de operacionalização dos trabalhos;

• 22 empresas selecionadas;

• Planejamento da operação: Ministério Público,


SUFIS/DGP, Núcleo Fiscal junto ao Ministério
Público, Polícia Militar e Polícia Civil.
“MÁFIA DO GUSA”
OPERAÇÃO - 13/12/2005

• 22 buscas administrativas;

• Participação de:
− 160 fiscais da SEF;
− 120 policiais militares;
− 70 policiais civis;
− Ministério Público de Minas Gerais (CAO-
CRIMO), Rio de Janeiro e São Paulo.
“MÁFIA DO GUSA”
OPERAÇÃO - 13/12/2005

• Cumprimento de 23 mandados de busca e


apreensão;

• Expedidos 26 mandados de prisão e cumpridos 23


nos Estados de Minas Gerais, Rio de Janeiro e São
Paulo sendo:
- 13 policiais militares;
- 01 contabilista;
- 09 civis.
“MÁFIA DO GUSA”
OPERAÇÃO - 13/12/2005

Concomitantemente foram oferecidas 02


denúncias contra as duas organizações criminosas,
sendo 53 denunciados, dentre eles:
• 10 empresários;
• 01 contabilista;
• 13 policiais militares;
• 03 representantes comerciais.
“MÁFIA DO GUSA”
RESULTADOS
• Emissão de:
- 27 TAD;
- 13 BO.

• Apreensão de:
- 36 CPU;
- 340 caixas de documentos;
- 65 agendas pessoais;
- 11 aparelhos de telefonia móvel;
- 01 máquina datilográfica.
“MÁFIA DO GUSA”
RESULTADOS

• levantamento das provas para embasamento do


processo criminal junto à documentação
apreendida;

• autenticação dos arquivos magnéticos


apreendidos;
“MÁFIA DO GUSA”
RESULTADOS

• auditoria nas empresas objeto de busca


administrativa;

• confecção de relatório do envolvimento das


empresas siderúrgicas no esquema de sonegação
fiscal.
“MÁFIA DO GUSA”
DIFICULDADES PROCESSUAIS

• Instrução;
• Perícias;
• Análise documental;
• Testemunho.
“MÁFIA DO GUSA”
DIFICULDADES OPERACIONAIS

• Dimensão geográfica;
• Falta de pessoal;
• Compartimentação das informações;
• Disponibilização de veículos adequados;
• Tempo entre comunicação e elaboração
das diligências.
“MÁFIA DO GUSA”
PRINCIPAIS DIFICULDADES

Lei 9.249/95

Art. 34. Extingue-se a punibilidade dos crimes


definidos na Lei nº 8.137, de 27 de dezembro de
1990, e na Lei nº 4.729, de 14 de julho de 1965,
quando o agente promover o pagamento do tributo
ou contribuição social, inclusive acessórios, antes do
recebimento da denúncia.
“MÁFIA DO GUSA”
DIFICULDADES LEGAIS

Lei 9.430/96

Art. 83. A representação fiscal para fins penais


relativa aos crimes contra a ordem tributária
definidos nos arts. 1º e 2º da Lei nº 8.137, de 27 de
novembro de 1990, será encaminhada ao Ministério
Público após proferida a decisão final, na esfera
administrativa, sobre a exigência fiscal do crédito
tributário correspondente.
“MÁFIA DO GUSA”
DIFICULDADES PROCESSUAIS

Lei 9.430/96

Parágrafo único. As disposições contidas no


caput do art. 34 da Lei nº 9.249, de 26 de dezembro
de 1995, aplicam-se aos processos administrativos e
aos inquéritos e processos em curso, desde que não
recebida a denúncia pelo juiz.
“MÁFIA DO GUSA”
PRINCIPAIS DIFICULDADES

Lei 10.684/03
Art. 9o. É suspensa a pretensão punitiva do Estado,
referente aos crimes previstos nos arts. 1º e 2º da Lei
nº 8.137, de 27 dezembro de 1990, e nos arts. 168A e
337A do Decreto-Lei no 2.848, de 7 de dezembro de
1940 – Código Penal, durante o período em que a
pessoa jurídica relacionada com o agente dos aludidos
crimes estiver incluída no regime de parcelamento.
“MÁFIA DO GUSA”
PRINCIPAIS DIFICULDADES

Lei 10.684/03
§ 1o A prescrição criminal não corre durante o
período de suspensão da pretensão punitiva.

§ 2o Extingue-se a punibilidade dos crimes


referidos neste artigo quando a pessoa jurídica
relacionada com o agente efetuar o pagamento
integral dos débitos oriundos de tributos e
contribuições sociais, inclusive acessórios.
“MÁFIA DO GUSA”
SUGESTÕES
• intensificação da fiscalização;
• criação de grupo especializado (realização de trabalho
conjunto entre os Ministérios Públicos dos Estados de Minas
Gerais, Rio de Janeiro e São Paulo, bem como com as
respectivas SEFs.)
• criação de uma central de informações;
• mobilização para alterações na legislação;
• criteriorização na concessão de parcelamento, e
• maior controle na concessão de inscrição estadual.
“MÁFIA DO GUSA”
CONTATOS

CAO-CRIMO
TEL: (31) 3250.5050
e-mail: [email protected]

CAO-ET
TEL: (31) 3337.1420
e-mail: [email protected]
Estado do Rio Grande do Sul
Ministério Público

Clipping
Voltar
Geral
Hora de cobrar a dívida

Por Affonso Ritter

Excelente a idéia do Ministério Público gaúcho, abraçada pela governadora Yeda


Crusius, de formar uma espécie de força tarefa, ou grupo de inteligência, para
acelerar os processos de cobrança da dívida ativa do Estado, uma idéia concretizada
pelo governador Aécio Neves, na forma de vara especial da justiça e defendida em
programa da TV Bandeirantes pelo presidente do TJ, Marco Antônio Barbosa Leal, em
novembro. A recuperação de 10% desta dívida de R$ 12 bilhões, somada aos esforços de
eliminação de gastos, cobriria quase o déficit. Todos os candidatos ao governo do
estado prometem isso em todas as eleições, mas ninguém leva a sério.

Fonte: Jornal do Comércio


Ministério Público - RS

Intranet

GERAL
Se a polícia não faz, o MP faz
Fonte:Clicrbs (tachado por pauladr em 07/05/2007 14:31)

Por Giovani Grizotti

Sempre que o Ministério Público realiza um trabalho de


investigação criminal, setores da Polícia Civil torcem o nariz. E
não é pra menos: os promotores penetram na lacuna deixada
por quem deveria apurar determinados delitos, mas não o faz,
seja por inoperância, falta de pessoal ou conivência. Uma
dessas três hipóteses talvez possa explicar os motivos de um
golpista estar vendendo certificados de conclusão de segundo
grau e até diplomas universitários no bairro São Geraldo, em
Porto Alegre, mesmo havendo uma ocorrência policial
denunciando o crime desde 2001. A operação que apreendeu
Promotor Flávio Duarte (esq) em ação
carimbos e históricos escolares falsos foi realizada hoje. Para
comprovar a fraude, um policial da força-tarefa comprou um
certificado por R$ 70,00.

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01/02/2007 - Crime
Caça-níqueis apreendidas em Uruguaiana
Por: Jorn. Celio Romais

Foram recolhidas 212 máquinas. A operação foi desencadeada pelo Ministério Público, Polícias Civil, Federal e Militar

O Ministério Público requereu a busca e apreensão de máquinas caça-níqueis em 11 locais na área central da cidade gaúcha de
Uruguaiana. Durante o cumprimento dos mandados judiciais foram apreendidas 212 máquinas caça-níqueis, talonários e listas do
jogo do bicho, R$ 102 mil, mil e 400 dólares, mil e 69 pesos, além de R$ 16 mil em cheques.

As buscas foram coordenadas pelas promotoras Carolina Barth Loureiro, Danieli de Cássia Coelho e Renata Pinto Lucena. Elas
contaram com o auxílio do promotor Gerson Daiello Moreira, coordenador da Força-Tarefa Operação Bingo. Também participou dos
trabalhos o procurador da República Bruno Baiocchi Vieira. A Operação conjunta contou, ainda, com a participação das Polícias Civil,
Federal e Militar, encarregadas da apreensão e do lacre dos equipamentos que serão posteriormente periciados pelo Instituto-Geral
Caça-níqueis de Perícias.

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E X E C U ÇÕ E S C R I M I N A I S
Desde abril já foram apreendidos 2.206 caça-níqueis na região
Fonte:Jornal NH (tachado por rmelz em 18/06/2007 13:59)

Ações conjuntas entre Ministério Público (MP), Brigada Militar (BM) e Polícia Civil apertaram o cerco
em torno dos jogos de azar, universo abastecido, principalmente, por máquinas caça-níqueis. As
operações começaram em 12 de abril e, até sexta-feira passada, em dois meses, 2.206 equipamentos
desse tipo foram apreendidos em nove cidades dos Vales do Sinos e Caí, além de grandes somas em
dinheiro e materiais de informática. A maior apreensão do ano aconteceu em São Leopoldo, onde
foram recolhidas, em duas operações, nos dias 10 de maio e sexta-feira passada, um total de 1.222
máquinas. Em todo o Rio Grande do Sul, o Ministério Público estima que tenham sido recolhidas
aproximadamente 5 mil máquinas, apenas entre nos meses de maio e junho deste ano. De acordo
com o promotor de Justiça do Ministério Público do Estado e integrante da Força-Tarefa Bingos Fábio
Costa Pereira, a maior parte do jogo ilegal está concentrada nos grandes conglomerados urbanos, que
representam uma quantidade maior de circulação de dinheiro. “É o aspecto mercadológico em
questão: os jogos vão para onde há mais clientes’’, explica. Apesar de diferentes legislações que ora
proíbem, ora autorizam a abertura de bingos mediante liminares da Justiça, o promotor ressalva que
em nenhum momento houve uma lei que autorizasse o funcionamento de máquinas caça-níqueis.
FLAGRA - Entretanto, atividades desse tipo continuam comuns em pequenos bares e bingos dos
centros urbanos, como o local flagrado pela reportagem do Jornal NH no bairro São José, em Novo
Hamburgo, na sexta-feira passada, onde caça-níqueis funcionavam sem nenhuma restrição. No local,
máquinas eram utilizadas para divertimento público, recolhendo dinheiro de usuários. Pereira enfatiza,
porém, que nenhum local, por menor que seja, tem autorização legal para manter esses
equipamentos. “Eles são organizados e dissimulados, por isso atuamos em todos os locais, do grande
ao pequeno explorador. É um jogo de gato e rato, eles na atividade deles e nós na nossa.’’ A Força-
Tarefa atua desde 2002 na luta contra os jogos de azar de qualquer tipo, interpretados como
contravenção penal. Este ano, a atividade ganhou maior visibilidade devido às parcerias com outros
órgãos de repressão, como o Instituto Geral de Perícia (IGP), Polícia Federal, Receita Federal, Polícia
Civil e Brigada Militar. “Esse trabalho conjunto permitiu a realização de mais ações e resultados mais
expressivos’’, avalia o promotor, que considera o jogo ilegal um problema social sério que precisa ser
combatido.

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Casa de jogos tinha 188 caça-níqueis

Apreensão foi uma das maiores já realizadas em um único local

Autoridades concretizaram ontem uma das maiores apreensões de caça-níqueis em um só estabelecimento já realizadas em Porto Alegre.Foram recolhidos 188
máquinas do Café Europa, casa de jogos no bairro Passo dAreia, zona norte da Capital. No local, também foram apreendidos R$ 117 mil que estavam dentro das
máquinas e no caixa.

O Café estava na mira da Polícia Civil desde o final do ano passado, mas o estabelecimento funcionava amparado por um mandado de segurança expedido pelo 2º
Juizado Especial Criminal. A ordem impedia que o delegado Cléber Ferreira, diretor do Departamento de Polícia Metropolitana, recolhesse equipamentos do café.
Contrariados, promotores que integram a força-tarefa contra bingos - composta pelos ministérios públicos Estadual e Federal, Advocacia-geral da União, Receita
Federal, e as polícias Federal, Civil e Militar - recorreram ao Tribunal de Justiça do Estado. Na quinta-feira passada, a liminar em favor do Café Europa foi cassada.

- Entendíamos que, apesar do impedimento ao delegado Cléber, a força-tarefa tinha poderes para fazer o recolhimento, mas, mesmo assim, preferimos aguardar a
decisão do TJ - comentou o promotor Fábio Costa Pereira.

Após a publicação do acórdão, Pereira ingressou com um pedido de busca e apreensão das máquinas, e a ordem foi concedida na sexta-feira. No dia seguinte, o local foi
lacrado por policiais. A ação ocorreu por volta das 16h30min, quando cerca de 200 pessoas ocupavam os dois salões do café. Segundo o delegado Herbert Ferreira,
diretor da Delegacia de Polícia Regional de Porto Alegre, havia filas para jogar em algumas máquinas com premiação acumulada.

- Vinha gente de outras cidades e até de outros Estados, tentando ganhar R$ 40 mil ou R$ 50 mil - comentou o policial.

Máquinas lacradas no sábado foram recolhidas ontem

Os equipamentos foram lacrados no sábado e levados ontem à tarde para um depósito da Receita Federal. Dois caminhões foram usados para o transporte. Em
operações anteriores, máquinas lacradas ficaram nos próprios bingos porque a polícia não dispunha de espaço.

Guardados em local adequado, os equipamentos serão periciados. Se ficar comprovada a presença de componentes eletrônicos estrangeiros contrabandeados, a Receita
Federal deverá decretar a perda e a destruição dos caça-níqueis. Além da medida administrativa, o Ministério Público Federal será acionado para abertura de um
inquérito por crime de contrabando. Em paralelo, a Polícia Civil instaurou um termo circunstanciado - espécie de inquérito - por exploração de jogo de azar, previsto na
Lei das Contravenções Penais.

O proprietário do Café Europa, que se identificou apenas como Leandro, evitou falar sobre o assunto. Desde o ano passado, a força-tarefa recolheu cerca de 2,5 mil
caça-níqueis na Capital e cidades vizinhas.

Fonte: Zero Hora


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17/10/2007 - Crime
Operação busca caça-níqueis na capital gaúcha
Por: Jorn. Marco Aurélio Nunes

Arquivo/MP
Ação conjunta vasculha estabelecimentos de Porto Alegre atrás de máquinas caça-níqueis

Mais de mil caça-níqueis. Esta é a previsão de apreensão de máquinas que o Ministério Público está fazendo dentro da Operação
Pé-de-Cabra, iniciada nesta manhã, em Porto Alegre. A ação conjunta da Especializada Criminal e o Comando de Policiamento da
Capital (CPC) da Brigada Militar, envolve todos os bairros da Capital. O promotor de Justiça Ricardo Herbstrith revelou que 170
mandados de busca e apreensão estão sendo cumpridos por soldados dos batalhões e, inclusive, do BOE – Batalhão de Operações
Especiais.

Ricardo Herbstrith explicou que recebeu um levantamento da Brigada Militar sobre a exploração de jogos de azar. “O objetivo é
apertar o cerco ao crime organizado”, frisou o representante do Ministério Público que, às 9h desta quarta-feira, estava dentro de
uma casa de jogos da avenida Assis Brasil 6482, na Zona Norte. No local os agentes apreenderam 155 equipamentos que
acabaram lacrados. Mais estabelecimentos espalhados por quase todos os bairros, inclusive na Restinga, seriam visitados.

A operação que está sendo desencadeada foi solicitada pelo Ministério Público e deferida pela Justiça de Porto Alegre. As máquinas localizadas em bares, restaurantes e
casas de jogos em zonas da cidade serão lacradas e os responsáveis pelos estabelecimentos identificados. Os valores em dinheiro recolhidos na ação serão depositados
em uma conta judicial. No final do dia os responsáveis pela ação conjunta terão um balanço definitivo da Operação Pé-de-Cabra.

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27/06/2007 - Crime
"Gabarito" sai e lista implicados
Por: Jorn. Marco Aurélio Nunes

Operação simultânea do Ministério Público para frear fraudadores de concursos públicos iniciou às
8h45min em várias cidades e está sendo aprovada

Um grande esquema armado para fraudar concursos públicos foi descoberto e desmontado pela
Promotoria Especializada Criminal da Capital. A operação “MP-Gabarito”, desencadeada cedo da
manhã desta quarta-feira, de forma simultânea, utilizou mais de cem homens para cumprir
Agentes vasculharam tudo...
mandados de busca e apreensão expedidos pela Justiça. As diligências foram efetuadas na
Capital e em cidades do Interior do Estado com apoio de efetivo da Brigada Militar. Há 27
pessoas envolvidas acusadas de fraude em licitações, falsidade ideológica, corrupção e formação
de quadrilha.
Fotos/Marco A. Nunes:
Foram identificados pela Força-Tarefa do Ministério Público sete prefeitos, dois vice-prefeitos e 18
Rockenbach chefiou operação
empresários. A investigação e a ação que barrou os quadrilheiros foi coordenada pelo promotor
de Justiça Mauro Rockenbach. O Ministério Público chegou a pedir as prisões temporárias dos envolvidos, mas o Tribunal de Justiça do ...em escritório de Carlos
Estado entendeu que, por enquanto, não havia necessidade da segregação. O subprocurador-geral de Justiça para Assuntos Barbosa
Institucionais, Eduardo de Lima Veiga, destacou a ação em rede que mobilizou cerca de 30 Promotores de Justiça do Interior e da
Capital “preocupados em zelar pela probidade da administração pública”.

MANIPULAÇÃO

Os agentes estiveram em 24 empresas e residências dos municípios de Sananduva, Marau, Camargo, Passo Fundo, Nonoai, Sarandi,
Carazinho, Carlos Barbosa, Garibaldi, Nova Prata, Tapejara, Trindade do Sul e Porto Alegre. Eles fizeram o chamado “congelamento”
dos locais para proceder a busca e apreensão e notificar os implicados. Treze empresas escolhidas através de licitações para organizar Promotor analisou documentos
concursos públicos municipais e que, praticamente, zonearam as regiões Norte e Central do Estado, estão envolvidas na manipulação
de resultados para favorecer apadrinhados de Administrações Municipais. Foi apurado que pelo menos 35 cidades tiveram concursos
fraudados pelas empresas que cobravam, em média, R$ 20 mil para realizarem as provas.

CARTA-CONVITE

Documentações de licitações de concursos realizados entre empresas prestadoras de serviços com Prefeituras comprovam as graves
Volantes com grades de
irregularidades cometidas. O esquema funcionava através do sistema de carta-convite: modalidade de licitação entre interessados do
respostas
ramo que acontece com participação de um número mínimo de três empresas para cotação dos valores estabelecidos para realização
do concurso.

EMPRESAS

Pelas provas colhidas estão implicadas as empresas “Marcesa” de Sananduva, “LVS” de Carlos Barbosa, “Themma Concursos” e
“Exactu” de Nonoai, “Digibem” de Camargo e Marau, “Compac” de Trindade do Sul, “Assessoria Municipalista” de Sarandi, “Vital
Concursos” de Carazinho, “Dinâmica” de Veranópolis, “Municipium” de Nova Prata e “Triade & Associados” de Porto Alegre. Os Anúncio de carta-convite
principais envolvidos são: Mário César Sauer, da Marcesa, considerado o grande articulador das fraudes junto com outras empresas;
Fernando Henrique Gabriel, policial civil em Nonoai e sócio-proprietário da Themma e que fazia contatos; e Julcemar João Bernardi,
funcionário da Digibem com sedes em Marau e Camargo. Eles eram responsáveis pelos ajustamentos de valores e manipulação do
resultado dos concursos.

INVESTIGAÇÕES

As investigações iniciaram em novembro do ano passado, quando chegaram ao Ministério Público suspeitas de irregularidades em Relação de cidades com
concursos públicos feitos em São José do Ouro e Sananduva. Logo a Promotoria Especializada teve certeza de que os fatos não eram concursos
isolados e o esquema era bem maior. No município de Paim Filho, por exemplo, uma mulher que rodou no concurso para o cargo de
Agente de Saúde foi colocada em primeiro lugar. Em Campestre da Serra, uma candidata que ficou classificada em último lugar para o
cargo de Professora de Pedagogia “Educação Infantil”, foi fixada também em primeiro lugar.

FRAUDE

A fraude era simples: a empresa contratada para fazer o concurso público corrigia as provas e, em seguida, informava à
Força-Tarefa enfrentou neblina
Administração do Município o resultado. Tendo uma lista daqueles que deveriam “passar” no certame, o interessado alterava a
da serra
classificação de seus “apadrinhados”. Após, o concurso era homologado pela Administração Municipal e o resultado “oficial” era
divulgado. Também foi apurado pelos agentes a venda de gabaritos de provas para candidatos inscritos nos concursos de Nova Prata
e Cotiporã. O promotor de Justiça Mauro Rockenbach disse que estão implicados os prefeitos e os vices dos municípios de Vanini e
Paim Filho, e os prefeitos de Herveiras, Novo Tiradentes, Pinhal da Serra, Campestre da Serra e Rio dos Índios.

TRABALHO

O trabalho do Ministério Público foi dividido em quatro fases: a primeira em Sananduva, a segunda em São José do Ouro e a terceira Um dos escritórios visitados
em Sobradinho. A última etapa se concentrou junto à 4ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça, responsável pelo julgamento de
Prefeitos. O promotor de Justiça Mauro Rockenbach comentou que "trata-se de uma organização criminosa formada por empresários e administradores municipais, que
se estruturou com propósito único de dilapidar os cofres dos conhecidamente carentes municípios gaúchos, em um perfeito consórcio de rapinagem que age há mais de
vinte anos. Uma verdadeira máfia".

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23/10/2007 - Crime
Estelionatários barrados pela Criminal
Por: Jorn. Marco Aurélio Nunes

Fotos: Marco A. Nunes


Ação da Força-Tarefa na Capital e região metropolitana, com apoio da BM, deu um pontapé inicial para
desarticular quadrilha organizada

Especialistas na aplicação de golpes contra aposentados e redes bancária e comercial, foram


surpreendidos pela Especializada Criminal da Capital. A “Operação Jubilados” – batizada em
menção ao benefício da aposentadoria – eclodiu cedo da manhã desta terça-feira para recolher e
...operação do Ministério
produzir mais provas contra acusados, principalmente, de cometer o delito de estelionato. A ação
Público...
simultânea foi deflagrada em Porto Alegre, Canoas, Esteio e Sapucaia do Sul. Foram cumpridos
19 mandados de busca e apreensão solicitados pelo Ministério Público e deferidos pela Justiça.
Além de 15 agentes da Força-Tarefa, mais de 100 soldados da Brigada Militar apoiaram a
operação coordenada pelo promotor de Justiça João Nunes.
Porta de escritório foi
LARANJAS
arrombada na...

A quadrilha dedicada a fraudar bancos, lojas e que ainda tem como vítimas pessoas aposentadas, vinha agindo na Região ...comandada pelo promotor João
Metropolitana e no Interior. O grupo é monitorado há seis meses pelos agentes da Força-Tarefa. A Promotoria de Justiça Especializada Nunes
Criminal acredita que pelo menos 40 pessoas participam, principalmente como “laranjas”, da organização que está sendo
desmantelada. As apurações do Ministério Público seguem para identificá-las. Em Porto Alegre, os mandados foram cumpridos nos
bairros Centro, Santana, Sarandi, Glória, Vila Nova, Restinga e Lami.

DOCUMENTOS

O bando conseguia dados de aposentados diretamente do INSS – como o extrato de benefício – que contém informações
privilegiadas, e com base nesse documento “montava uma nova pessoa”, explica o promotor de Justiça João Nunes. A partir desse Documentos foram vasculhados
momento vários outros documentos como carteira de identidade, recibo de IPTU, matrícula de imóveis e contracheques, eram e...
falsificados para obtenção de empréstimos bancários. Para não serem descobertos os implicados tinham o cuidado de alterar apenas o
endereço da pessoa em que se apoderaram dos dados. Após, utilizavam uma empresa radicada no mercado para fazer a
intermediação do empréstimo junto aos bancos.

VÍTIMAS

A investigação da Força-Tarefa apurou que o grupo obtinha uma média de 10 empréstimos por mês na rede bancária. “Depois de
...recolhidos para obtenção de
aberta a conta na agência, o laranja sacava todo o dinheiro depositado com o cartão bancário que recebia”, frisa João Nunes. A
provas
Especializada Criminal estima que há, pelo menos, 100 vítimas dentre pessoas físicas e jurídicas desse grupo que no período de um
ano também aplicou golpes em cidades como Santa Cruz do Sul, Caxias do Sul e Bagé. “Cada um exerce uma função dentro da
organização que possui muitos laranjas”, disse o Promotor de Justiça, adiantando que 14 membros estão identificados.

CERTIDÃO

Outro golpe característico do bando que, de acordo com João Nunes, “falsifica de maneira bem feita documentos públicos e privados”,
era praticado a partir de uma certidão de nascimento de uma pessoa que não existe. Através desse documento falso era Promotor Nunes pediu micro da
confeccionado uma avalanche de outros documentos como identidade, CPF, carteira profissional, contracheque, escrituras de imóveis BM...
e montada, inclusive, documentação de empresa fantasma para aquisição de empréstimos bancários, compra de carros financiados e
outros bens de valores no comércio.

APREENSÃO

O Promotor da Especializada Criminal que comandou a ação salienta que “a profissão dos integrantes da quadrilha é o crime e a busca
e apreensão realizada será fundamental ao desfecho da investigação que responsabilizará os envolvidos”. Na ação ocorrida em
escritórios do Centro de Porto Alegre foram apreendidos computadores, arquivos, folhetos de propaganda de empréstimos e farta ...para levar material apreendido
documentação como contratos chancelados. à Promotoria

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04/12/2007 - Crime
Operação Alvorada: presos ao amanhecer
Por: Jorn. Flávio Damiani

Flávio Damiani
Sonegação de quase R$ 50 milhões leva três empresários e contador para a cadeia

No início da manhã desta terça-feira, a Força-tarefa do Ministério Público desencadeou uma


operação para cumprir mandados de prisão, expedidos pelo juiz substituto da comarca de Flores
da Cunha, Silvio Viezzer, contra três empresários e o responsável pela contabilidade de uma
indústria de bebidas da cidade. Eles foram detidos na própria empresa logo que chegaram, às 8h,
Homens da força-tarefa que
acusados de crimes contra a ordem tributária (sonegação de ICMS) e formação de quadrilha. Os
atuaram na operação
prejuízos aos cofres públicos, com a utilização do chamado “caixa dois”, atingiram R$ 48,5
milhões. O integrante do escritório contábil, que operacionalizava a fraude, também foi preso em
sua residência em Caxias do Sul e encaminhado, junto com os empresários, à Promotoria de
Justiça de Caxias do Sul, de onde serão levados ao Presídio.
Alguns dos presos durante a
operação SONEGAÇÃO

A Promotoria de Justiça Especializada Criminal de Combate aos Crimes Contra a Ordem Tributária vinha investigando, desde o ano
passado, os delitos praticados na empresa através de um trabalho conjunto com a Receita Estadual, que detectou as irregularidades
fiscais e realizou uma detalhada auditoria na documentação contábil e fiscal. Segundo os promotores de Justiça Aureo Gil Braga e
Renato Velasques, responsáveis pela investigação, os desvios aconteceram no período de 2000 a 2005 e o montante elevado é fruto
de uma complexa e duradoura associação criminosa voltada à sonegação de tributos. Os documentos fiscais que acompanhavam as
mercadorias durante o transporte tinham valores reais, mas o informado ao fisco era falso. Segundo os Promotores, o grupo utilizava
um sistema de informática que automaticamente alterava os valores.

A Força-tarefa, coordenada pelo promotor de Justiça João Nunes Ferreira, envolveu 12 policiais civis e militares e contou ainda com o apoio de mais 12 policiais da
Brigada Militar de Caxias do Sul. A articulação contou também com o apoio da rede de informações do Grupo Nacional de Combate às Organizações Criminosas –
GNCOC.

COMBATE EFETIVO

Ao longo deste ano, a Promotoria de Justiça Especializada de Combate aos Crimes Contra a Ordem Tributária denunciou 92 sonegadores, cujos prejuízos ultrapassam R$
150 milhões. Desde 2000, a Promotoria abriu processo-crime contra 950 fraudadores que lesaram os cofres gaúchos em mais de R$ 1 bilhão. “Este é um trabalho que
envolve um combate efetivo à macrocriminalidade e o ressarcimento ao erário estadual. O Ministério Público não tem medido esforços no embate contra os criminosos
do colarinho branco”, afirma o promotor de Justiça Aureo Braga. O promotor Renato Velasques destaca ainda que "o Rio Grande do Sul necessita de recursos para
atender as necessidades da sociedade e casos como este demonstram que a lei atinge todas as camadas sociais".

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Geral
Ganha força o combate à sonegação

O governo do Estado concluiu ontem mais uma etapa no combate à sonegação fiscal no Rio Grande do Sul. Com a finalidade de intensificar a cobrança de crimes
tributários, o secretário da Fazenda, Aod Cunha de Moraes Júnior, entregou ao procurador-geral de Justiça, Mauro Renner, levantamento com as informações sobre as
últimas autuações feitas pelo órgão. A expectativa é com a análise do material recuperar parte do valor devido em prazo curto de tempo.
Ao todo, os dados referem-se a 149 ações contra empresas gaúchas. Os casos apresentam indícios de sonegação e outros crimes tributários e foram identificados pela
Receita estadual. A partir de agora, as informações deverão ser investigadas pelo Ministério Público (MP), que poderá encaminhar denúncia à Justiça. O valor total das
perdas do Estado nessas ações chegou a R$ 347,4 milhões, em dívidas de ICMS, multas e juros.

Aod lembrou que, nos últimos meses, houve aumento no número de ações desenvolvidas pela secretaria para combater a sonegação e aumentar o volume de recursos
em caixa. 'Todo o esforço direciona-se ao saneamento das contas públicas, como a redução do déficit de R$ 1,3 bilhão previsto 2008, e evitar que o Estado perca
receitas', afirmou. O secretário citou também o trabalho da força-tarefa entre Fazenda, Procuradoria-Geral e Tribunal de Justiça para agilizar a cobrança da dívida ativa.
Além disso, ressaltou que o Estado é pioneiro na utilização de notas eletrônicas que evita a fraude com recursos e possíveis erros nos cálculos dos valores cobrados de
ICMS. Atualmente, o Rio Grande do Sul envia esse tipo de recibo para sete estados brasileiros. Entre outras iniciativas que poderão ser promovidas pelo Executivo, Aod
destacou o projeto Consumidor Cidadão, que integra o Plano de Recuperação e está em análise na Assembléia Legislativa.

Renner destacou como fundamental o trabalho entre Ministério Público e Receita estadual. Além das trocas de informações, a parceria entre os órgãos agiliza a obtenção
de autorização judicial para a quebra de sigilo bancário e de mandados de busca e apreensão. As medidas proporcionam rapidez ao processo de cobrança e a
possibilidade de recuperação dos recursos devidos. O promotor Aureo Braga, da Justiça Especializada no Combate aos Crimes Contra a Ordem Tributária, lembrou que,
em 2007, houve denúncia de 85 pessoas por sonegação de ICMS, totalizando R$ 100 milhões. Disse que, com o trabalho conjunto, ocorre a condenação do infrator na
grande maioria das ações apresentadas pela Receita estadual.

Fonte: Correio do Povo


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24/07/2007 - Crime
Oferecidas primeiras denúncias da "Gabarito"
Por: Jorn. Marco Aurélio Nunes

Dez pessoas estão denunciadas. Ministério Público deverá encaminhar mais denúncias contra prefeitos à 4ª Câmara Criminal do TJE

Menos de um mês da eclosão da “Operação Gabarito”, o Ministério Público gaúcho encaminhou as duas primeiras denúncias à 4ª
Câmara Criminal do Tribunal de Justiça, resultantes da ação desencadeada para apurar fraudes em concursos públicos no Interior
do Estado. As denúncias encaminhadas através da Procuradoria de Prefeitos ao Poder Judiciário, no final da tarde desta terça-feira,
dizem respeito a fraudes em concursos nos municípios de Paim Filho e Campestre da Serra. Nos próximos dias outras denuncias
contra prefeitos implicados num esquema montado para burlar concursos deverão ser oferecidas, adiantou o coordenador da
Procuradoria de Prefeitos do Ministério Público, Gilberto Montanari. Os denunciados serão notificados para, em 15 dias,
apresentarem defesa preliminar e, após, será aprazada solenidade processual junto à 4ª Câmara Criminal que decidirá sobre o
recebimento, ou não, das denúncias oferecidas.
Montanari, da Procuradoria de
A denúncia de Paim Filho foi oferecida contra o prefeito Paulo Henrique Baggio, seu vice Elton Luiz Dal Moro e o empresário Mário
Prefeitos
César Sauer, da Marcesa, vencedora da licitação. Também está sendo oferecida denúncia contra os empresários ou colaboradores
das empresas, Emerson Luiz Bocasanta, da Compac S/S Ltda.; Cláudio Antônio Biasi, da Biasi Assessoria Ltda.; Fernando Henrique Gabril, da Themma Concursos Ltda.
e Julcimar João Bernardi, da Digiben Assessoria Empresarial Ltda.

Gilberto Montanari disse que pesa sobre o Prefeito de Paim Filho as infringências ao artigo 90 da Lei de Licitações, que diz com a “frustração e fraude do processo
licitatório”. Também pesam as infringências aos artigos 299 e 317 do Código Penal: “falsidade ideológica pela alteração do resultado do concurso e corrupção passiva
por solicitar ou receber para si ou para outrem, direta ou indiretamente, vantagem indevida resultante da alteração do resultado do concurso”.

O delito do artigo 90 da Lei de Licitações prevê pena de detenção de dois a quatro anos, mais multa de 2% a 5% do valor da licitação. Já a falsidade ideológica prevê
pena de reclusão de um a cinco anos, mais multa, e a corrupção prevê pena de dois a 12 anos de reclusão, mais multa. “Os delitos de falsidade e de corrupção, bem
como os da Lei de Licitações, têm como efeito da eventual condenação a perda do cargo, função pública ou mandato eletivo, afora a suspensão dos direitos políticos,
enquanto perdurarem os efeitos da eventual condenação, previstos no artigo 15, inciso III, da Constituição Federal”, explicou Montanari.

Sobre o empresário Mário César Sauer – da empresa Marcesa – pesam as infringências dos mesmos dispositivos. Os demais empresários infringiram os dispositivos da
Lei de Licitações (art. 90) “por participarem de licitação onde ocorreu frustração e fraude ao caráter competitivos do procedimento licitatório”, frisou o Procurador de
Justiça.

A denúncia de Campestre da Serra foi oferecia contra sua prefeita, Orenia Gomes Goeltzer, também conhecida como Martha Goeltzer; a sua secretária de Educação à
época, Irene Carneiro Mello e contra o empresário Mário Cesar Sauer, da Marcesa, realizadora do concurso naquele município.

A Prefeita, sua Secretária da Educação e o empresário estão incursos no artigo 89, caput, 2ª parte, da Lei de Licitações, pois, em co-autoria, “deixaram de observar as
formalidades pertinentes à dispensa ou inexigibilidade de licitação”, salientou Montanari. Este delito prevê pena de três a cinco anos de detenção. Ainda, pesa sobre a
Prefeita e o empresário Mário Cesar Sauer, da empresa Marcesa, realizadora do concurso naquele município, os delitos de falsidade ideológica, em virtude da
manipulação do resultado do concurso (art. 299 do CP) e a corrupção passiva (art. 317 do CP), por solicitar e receber para si ou para outrem, direta ou indiretamente,
vantagem indevida decorrente do resultado do concurso manipulado em benefício de outrem.

Gilberto Montanari esclareceu que as denúncias foram oferecidas em razão dos fortes indícios de prova surgidos “após minuciosa análise de documentação requisitada
junto às prefeituras, da documentação apreendida em virtude dos mandados judiciais de busca e apreensão nas empresas e residências, bem como das interceptações
telefônicas efetuadas com autorização judicial e nos depoimentos prestados durante a investigação criminal levada a efeito pela Procuradoria de Prefeitos e a Promotoria
de Justiça Especializada Criminal desta Capital”.

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28/02/2007 - Institucional
Caxias: Força-Tarefa e PF desarticulam quadrilha
Por: Jorn. Flávio Damiani

Pais e esposas dos traficantes auxiliavam no tráfico comandando as operações de dentro da prisão

Policiais da Força-Tarefa do Ministério Público do Rio Grande do Sul e da Polícia Federal


desarticularam na manhã desta quarta-feira em Caxias do Sul uma organização criminosa
envolvida no tráfico internacional de drogas.
...também na prisão de
Foram realizadas 12 prisões preventivas desde o início da manhã desta quarta-feira e um
mulheres...
flagrante, os pais do líder da organização estavam de posse de 2 quilos de cocaína. A operação
se estendeu por bairros e vilas da cidade. Os presos foram levados para interrogatório na
Delegacia da Polícia Federal de Caxias do Sul. Todos, inclusive os que já estão na cadeia,
[Fotos: Victor Hugo Cozzatti resultado de operações anteriores, tiveram suas prisões preventivas decretadas.
Rocha] Operação em Caxias
O trabalho iniciado em dezembro de 2006 pela Promotoria Especializada Criminal de Porto Alegre
culminou...
cruzou informações com a Polícia Federal que já vinha investigando, desde setembro, a atuação
da quadrilha. “No cruzamento de dados confirmamos a descoberta de uma rede de trafico centralizada em Caxias e passamos a ...pelos agentes da...
monitorá-los” disse o promotor de Justiça, Mauro Rockembach, que comandou as investigações pelo Ministério Público. Segundo ele,
a quadrilha comercializava mais de 50 quilos de cocaína por mês na região da serra.

Durante as investigações ocorreram prisões como a do último dia 7 de fevereiro, onde um traficante trazia da Bolívia 1 quilo de
cocaína em cápsula no estômago. No período de setembro a fevereiro foram realizadas dez prisões. Mesmo dentro da cadeia, alguns
destes presos continuavam negociando cargas de entorpecentes através de telefones celulares.

A operação denominada pela Polícia Federal de Savana e pelo Ministério Público de Guns N’oses é porque, além da cocaína, também ...Força-Tarefa e da PF
envolvia o comércio ilegal de armas e as mulheres dos presos, que atuavam no tráfico enquanto os maridos estavam na cadeia.

Os traficantes utilizavam carros ônibus e até prostitutas para transportar cocaína-base, que segundo o delegado de Polícia Federal, Noerci da Silva Melo, era beneficiada
em laboratório. “A cocaína-base tem um alto poder de concentração e com um quilo é possível conseguir até 5 quilos da droga”, destacou o delegado.

A operação envolveu 110 agentes federais e policiais que atuam na Força-Tarefa do Ministério Público, além de agentes de Inteligência da Brigada Militar.

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(51) 3224-6938
17/08/2007 - Crime
Ação retira hackers da web
Por: Jorn. Marco Aurélio Nunes

Operação "Nerd II" da Especializada Criminal de Porto Alegre eclodiu após nove meses de investigações
da Força-Tarefa

Mandados de prisão e de busca e apreensão que estão sendo cumpridos contra três pessoas no
Paraná, uma em Santa Catarina e 25 no Rio Grande do Sul, estão pondo um fim nas atividades
de uma quadrilha de hackers – indivíduos que ingressam em sistemas fechados de computadores
Rockenbach chefiou ação na
– que atuava, principalmente, no Sul do País. O grupo, que agia há mais de um ano lesando
fronteira
clientes e instituições financeiras, desviou via Internet mais de R$ 10 milhões de contas
bancárias. Mas está sendo desmantelado na manhã desta sexta-feira, através da “Operação Nerd
II”, desencadeada pela Promotoria de Justiça Especializada Criminal de Porto Alegre. A ação
Fotos/Marco A. Nunes: simultânea, que conta com o emprego de quatro equipes da Força-Tarefa do Ministério Público e
agentes da Polícia Civil, é comandada pelo promotor de Justiça Ricardo Herbstrith. Os mandados
mulheres presas em Quaraí
foram deferidos pelo Fórum Regional de Sarandi, na Capital.

BENS Acusadas foram para o presídio

Em Curitiba foram detidos dois membros da quadrilha: o que “lavava” o dinheiro arrecadado, e o líder e mentor dos golpes que eram
aplicados principalmente contra pessoas jurídicas. Sua mãe, que também tinha tarefas no grupo, foi presa em Maringá. Em
Florianópolis, um “laranja” deverá ser detido. Nove integrantes da quadrilha são procurados na fronteira-oeste: três homens em
Santana do Livramento e seis mulheres em Quaraí. Elas foram surpreendidas na cidade pela Força-Tarefa e presas. Outros 16
participantes da organização deverão ser barrados na Grande Porto Alegre. O Ministério Público pediu à Justiça o seqüestro dos bens
da quadrilha. Dentre eles estão duas coberturas, apartamentos, vários automóveis e eletrodomésticos. O líder do grupo inclusive
comprou um ponto dentro do Shopping Paladium, que está sendo construído na capital paranaense, para instalação de uma choperia. Promotores Mauro e Dinamárcia
Ricardo Herbstrith anunciou que em Curitiba foi apreendido uma ilha de computação, dois aparelhos chamados “chupa-cabras” que
servem para clonar cartões bancários em máquinas 24 horas, diversos cartões magnéticos em branco, laptops, dinheiro, uma moto e
dois carros.

REMANESCENTES

A operação “Nerd II” – batizada em menção a jovens cujos interesses recaem sobre tecnologia, RPG, ficção cientifica etc. – eclodiu
Herbstrith comandou toda
após nove meses de investigações. Agentes da Força-Tarefa monitoraram os membros da quadrilha especialmente pelas
operação
interceptações telefônicas. O promotor Herbstrith salientou que os hackers capturados são remanescentes de grupos desbaratados
nas operações “Pontocom”, da Polícia Federal, e “Nerd I”, realizada pela Especializada há dois anos. No Paraná as prisões foram efetuadas pela equipe da Força-Tarefa
coordenada por Herbstrith, que teve auxilio de agentes da Promotoria de Investigações Criminais (PIC) daquele estado. Na Grande Porto Alegre, policiais civis cumprem
os mandados chefiados pelo delegado Cléber Ferreira, diretor do Departamento de Polícia Metropolitana (DPM). Em Livramento e Quaraí, o promotor de Justiça Mauro
Rockenbach coordena as equipes.

PROGRAMAS

Os hackers serão acusados de furto mediante fraude na Internet, formação de quadrilha e lavagem de dinheiro. O Ministério Público gaúcho começou apurar as ações
do grupo depois de receber notícias dos bancos que sofreram as conseqüências pela invasão de contas. Especializados em enviar spam com links atrativos aos
internautas, que funcionavam como iscas para obtenção de dados que davam acesso a conta bancária do navegador da Web, os hackers também utilizavam programas
de mensagens instantâneas para se comunicarem porque era o meio mais fácil de não serem descobertos.

CÓDIGO

De acordo com Herbstrith, a quadrilha, que tinha uma célula no Estado, de forma on line “quebrava o código da fonte das páginas de segurança dos bancos”. Após ter
acesso a conta bancária, transferia o dinheiro para várias contas de “laranjas”. A pulverização de depósitos em contas bancárias era feito para dificultar que as
autoridades encontrassem o rastro do dinheiro. O saque também era feito por “laranjas” na boca do caixa da agência bancária e em pequenas quantias para não
chamar atenção. De posse de todo o cadastro e números de senhas da pessoa que teve seu computador invadido, os hackers ainda tinham facilidades para pedir
empréstimos através do “Crédito 1 Minuto”. O promotor Herbstrith entende que com a prisão dos investigados “retiramos de circulação uma quadrilha de grande
expressão no meio criminoso, que causava prejuízos de grande monta, gerando insegurança nas relações bancárias”.

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Estado do Rio Grande do Sul
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28/08/2007 - Crime
Hackers são denunciados à Justiça
Por: Jorn. Marco Aurélio Nunes

Promotor Ricardo Herbstrith ainda faz diligências para denunciar outros integrantes da quadrilha

O Ministério Público denunciou à Justiça 20 dos 29 integrantes do grupo de hackers desmantelado há mais de uma semana durante
a operação “Nerds II”. A ação foi efetuada por agentes da Força-Tarefa da Promotoria de Justiça Especializa Criminal da Capital e
teve apoio da Polícia Civil. Os mandados de prisão e de busca e apreensão foram cumpridos simultaneamente em cidades do Sul do
País.

O líder da quadrilha, Romany Cuttolo Bonante, de 23 anos, foi preso em Curitiba, assim como seu comparsa, que “lavava” o
dinheiro arrecadado nos golpes. A mãe de Romany, que tinha tarefas no grupo, foi detida em Maringá, e um homem que agia como
“laranja”, em Florianópolis. Em Quaraí, na Fronteira-Oeste do Estado, seis mulheres foram surpreendidas e, na Grande Porto
Herbstrith denunciou os Alegre, 15 participantes da quadrilha foram barrados.
hackers
Os hackers – indivíduos que ingressam em sistemas fechados de computadores – lesando clientes e instituições financeiras,
desviaram via Internet mais de R$ 10 milhões de contas bancárias. A operação batizada de “Nerd II” em menção a jovens cujos interesses recaem sobre tecnologia,
ficção cientifica etc., eclodiu após nove meses de investigações. Os hackers são acusados de furto mediante fraude na Internet, formação de quadrilha e lavagem de
dinheiro. O promotor de Justiça Ricardo Herbstrith, que comandou a investigação e a ação para desbaratar a quadrilha, esclareceu que “outros membros do grupo ainda
não foram denunciados, porque diligências estão sendo feitas”.

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