Dissertação - Elidiane Araújo de Sousa - 2019 - Completa

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Universidade do Estado do Rio de Janeiro

Centro de Ciências Sociais


Faculdade de Serviço Social

Elidiane Araújo de Sousa

Violência contra a mulher e acesso à justiça: um estudo das Medidas


Protetivas de Urgência no Projeto Violeta, no Fórum Regional de
Bangu/RJ

Rio de Janeiro
2019
Elidiane Araújo de Sousa

Violência contra a mulher e acesso à justiça: um estudo das Medidas


Protetivas de Urgência no Projeto Violeta, no Fórum Regional de Bangu/RJ.

Dissertação apresentada, como requisito


parcial para obtenção do título de Mestre,
ao Programa de Pós-Graduação em
Serviço Social, da Universidade do
Estado do Rio de Janeiro. Área de
concentração: Ciências Sociais Aplicadas.

Orientadora: Prof.ª Dra. Andrea de Sousa Gama

Rio de Janeiro
2019
CATALOGAÇÃO NA FONTE
UERJ/REDE SIRIUS/CCS/A

S725 Sousa, Elidiane Araújo de.


Violência contra a mulher e acesso à justiça: um estudo das Medidas
Protetivas de Urgência no Projeto Violeta, no Fórum Regional de Bangu /
RJ / Elidiane Araújo de Sousa Furquim. – 2019.
128 f.

Orientadora: Andréa de Sousa Gama.


Dissertação (Mestrado) – Universidade do Estado do Rio de Janeiro,
Faculdade de Serviço Social.

1. Violência contra as mulheres – Teses. 2. Mulheres – Condições


sociais – Teses. 3. Mulheres – Medidas de segurança – Teses. I. Gama,
Andréa de Sousa. II. Universidade do Estado do Rio de Janeiro.
Faculdade de Serviço Social. III. Título.

CDU 396

Autorizo, apenas para fins acadêmicos e científicos, a reprodução total ou parcial


desta dissertação desde que citada a fonte.

___________________ __________________
Assinatura Data
Elidiane Araújo de Sousa

Violência contra a mulher e acesso à justiça: um estudo das Medidas


Protetivas de Urgência no Projeto Violeta, no Fórum Regional de Bangu/RJ.

Dissertação apresentada, como requisito


parcial para obtenção do título de Mestre, ao
Programa de Pós-Graduação em Serviço
Social, da Universidade do Estado do Rio de
Janeiro. Área de concentração: Ciências
Sociais Aplicadas.

Aprovada em 06 de agosto de 2019.

Banca Examinadora:

__________________________________________
Prof.ª Dra. Andrea de Sousa Gama
Faculdade de Serviço Social – UERJ

__________________________________________
Prof.ª Dra. Carla Cristina Lima de Almeida
Faculdade de Serviço Social – UERJ

__________________________________________
Prof.ª Dra. Nívia Valença Barros
Universidade Federal Fluminense

Rio de Janeiro
2019
DEDICATÓRIA

A Deus razão de tudo que sou e fonte suprema de todo saber.


Aos meus pais Espírito Santo e Osmar Sousa, pelo apoio incondicional e
incentivo a busca pelo conhecimento.
Ao meu esposo Gerson Furquim, companheiro de todas as horas e meu porto
seguro.
AGRADECIMENTOS

A Profª. Dra. Andrea Gama, minha orientadora, por sua confiança, pelas
valiosas sugestões, pelo tempo que dedicou à leitura do trabalho e, sobretudo pelo
afeto e exemplo de trabalho intelectual que significa para mim.
As colegas da turma de pós-graduação da UERJ Misslene, Maria, Adriana e
Mayana pelo apoio e reflexões críticas sobre a temática da violência contra a
mulher.
Meus sinceros agradecimentos à Juíza Yedda Assunção, a equipe de
profissionais do Fórum de Bangu e a todos aqueles que de alguma forma
contribuíram para o desenvolvimento deste trabalho.
Violência não é um sinal de força, a violência é um sinal de desespero e
fraqueza.
Dalai Lama
RESUMO

Sousa, Elidiane Araújo de. Violência contra a mulher e acesso à justiça: um


estudo das Medidas Protetivas de Urgência no Projeto Violeta, no Fórum Regional
de Bangu/RJ. 2019. 128f. Dissertação (Mestrado em Serviço Social) – Faculdade de
Serviço Social, Universidade do Estado do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2019.

A pesquisa pretende realizar um estudo a respeito das Medidas de Protetivas


de Urgência no Projeto Violeta no bairro de Bangu - RJ. Buscamos analisar a
implementação das Medidas Protetivas de Urgência no Projeto Violeta como um
mecanismo para o enfrentamento da violência contra a mulher. Caracterizamos o
Projeto Violeta como uma experiência de implementação das Medidas Protetivas de
Urgência, identificamos o perfil das usuárias atendidas e dos agressores,
classificamos os tipos de violência mais recorrente se as principais medidas de
proteção. Como metodologia utilizamos a pesquisa quali-quantitativa, pesquisa
bibliográfica, análise documental sobre o Projeto Violeta do Tribunal de Justiça do
Rio de Janeiro e Formulários de Requerimento de Medidas Protetiva. A pesquisa
revela o perfil das usuárias atendidas, e a incidência encontra-se nas faixas etárias
de 20 a 29 anos, apresentando 38% de registro, 77% dessas trabalham; 33% dos
seus agressores têm entre 20 e 29 anos de idade; as requisições de MPU’s
realizaram-se 28% por lesão corporal; e o que mais nos chamou atenção foi o fato
de que o Judiciário para combater a violência contra a mulher apresentam dois tipos
de Medidas Protetivas: as Medidas Protetivas de Urgência que obrigam o agressor
(art. 22 da LMP) e as Medidas Protetivas de Urgência à ofendida (art. 23 e 24 da
LMP), e que esses não dispõem de um quantitativo de pessoal que possa dar
resposta a essa demanda. Portanto, esse trabalho mostra a importância das MPU’s
na defesa da mulher vítima de violência, e que as ações do Estado, especialmente
do judiciário com relação às medidas auferidas devem ser mais severas para coibir a
reincidência de ações de violência contra a mulher.

Palavras-chave: Violência. Medidas de Proteção de Urgência. Projeto Violeta.


ABSTRACT

Sousa, Elidiane Araújo de. Violence against women and access to justice: a
study of Protective Emergency Measures in the Violeta Project, at the
Bangu/RJ Regional Forum. 128f. Dissertação (Mestrado em Serviço Social) –
Faculdade de Serviço Social, Universidade do Estado do Rio de Janeiro, Rio de
Janeiro, 2019.

The research intends to carry out a study about the Measures of Urgent
Protection in the Violet Project in the neighborhood of Bangu - RJ. We sought to
analyze the implementation of the Emergency Protective Measures in the Violet
Project as a mechanism for coping with violence against women. We characterize the
Violet Project as an experience of implementation of the Emergency Protective
Measures, identify the profile of the users served and the aggressors, we classify the
types of violence more recurrent if the main measures of protection. As a
methodology we use qualitative-quantitative research, bibliography research,
documentary analysis on the violet project of the Court of Justice of Rio de Janeiro
and forms of Emergency Protection Measures. The research reveals the profile of the
users served, and the incidence is found in the age groups of 20 to 29 years,
presenting 38% of the registry, 77% of these work; 33% of their aggressors are
between 20 and 29 years of age; the requisites of MPUs were 28% for personal
injury; and what struck us most was the fact that the Judiciary to combat violence
against women presents two types of protective measures: the urgent protective
measures that oblige the aggressor (article 22 of the PML) and the urgent protective
measures (Article 23 and 24 of the LMP), and that they do not have a staff that can
respond to this demand. Therefore, this work shows the importance of MPUs in the
defense of women victims of violence, and that the actions of the State, especially
the judiciary in relation to the measures taken, must be more severe in order to
prevent recidivism of violence against women.

Keywords: Violence. Urgent Protection Measures. Violet Project.


LISTA DE QUADROS

Quadro 1 - Conferências Realizadas para Combater a Violência Contra a


Mulher ........................................................................................ 46

Quadro 2 - Evolução Legislativa dos Direitos das Mulheres ........................ 48

Quadro 3 - Quadro comparativo da Lei Maria da Penha .............................. 61

Quadro 4 - Procedimentos de acessibilidade ao Projeto Violeta ................. 83

Quadro 5 - JVDFM no estado do Rio de Janeiro ......................................... 84


LISTA DE TABELAS

Tabela 1 - Países com maiores taxas de homicídios de mulheres...................... 69

Tabela 2 - Ligue 180............................................................................................ 72

Tabela 3 - Cronômetro da Violência contra a mulher no RJ................................ 79

Tabela 4 - Processos de Violência Doméstica e Feminicídio Pendentes no


TJRJ.................................................................................................... 80

Tabela 5 - Medidas Protetivas de Urgência deferidas no TJRJ........................... 81

Tabela 6 - Atendimentos nos JVDFM no estado do Rio de Janeiro.................... 85

Tabela 7 - Tipos de Medidas Requeridas Pela Equipe Técnica.......................... 108


LISTA DE GRÁFICOS

Gráfico 1 - Faixa Etária das Vítimas............................................................... 88

Gráfico 2 - Renda das mulheres atendidas no Projeto................................... 89

Gráfico 3 - Tipos de emprego das mulheres atendidas no Projeto................. 91

Gráfico 4 - Relação de parentesco................................................................. 92

Gráfico 5 - Possuem filhos em comum........................................................... 92

Gráfico 6 - Pessoas que convivem na mesma residência.............................. 93

Gráfico 7 - Faixa Etária do Agressor............................................................... 94

Gráfico 8 - Renda dos agressores.................................................................. 95

Gráfico 9 - Tipos de empregos dos agressores.............................................. 96

Gráfico 10 - Local de ocorrência da violência................................................... 97

Gráfico 11 - Violência ocorreu na presença de menores.................................. 98

Gráfico 12 - Número de vezes que foram agredidas........................................ 99

Gráfico 13 - Vítima já fez outros registros de ocorrência.................................. 99

Gráfico 14 - O autor do fato responde a processo criminal.............................. 101

Gráfico 15 - Tem Medida Protetiva de Urgência por violência anterior............ 102

Gráfico 16 - Violência sofrida no último, segundo as vítimas........................... 103

Gráfico 17 - Motivos da Medida Protetiva, segundo a equipe técnica.............. 104

Gráfico 18 - Deseja que o ator do fato seja afastado do lar para garantir sua 105
segurança.......................................................................................

Gráfico 19 - Deseja proibir a aproximação do autor.......................................... 105

Gráfico 20 - Deseja proibir que o autor mantenha contato com você................ 106

Gráfico 21 - Deseja proibir que o autor mantenha contato com os filhos.......... 106
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

CEDAW - Convenção para a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação


contra a Mulher

CRMP - Centro de Referência de Atendimento à Mulher em Situação de


Violência Maria do Pará

CNDM - Conselho Nacional da Condição da Mulher

DEAM - Delegacia Especializada de Atendimento à Mulher

DPRJ - Defensoria Pública do Estado do Rio de Janeiro

Flacso - Faculdade Latino-Americana de Ciências Sociais

IML - Instituto Médico Legal

IPEA - Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada

JECrim - Juizados Especiais Criminais

JVDFM - Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher

LMP - Lei Maria da Penha

MPU - Medidas Protetivas de Urgência

MP - Ministério Público

OEA - Organização dos Estados Americanos

ONGs - Organizações não governamentais

ONU - Organização das Nações Unidas

SEJUDH - Secretaria de Justiça e Direitos Humanos do Estado do Pará

TJAC - Tribunal de Justiça do Acre

TJRJ - Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro

TJRN - Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte

TJRR - Tribunal de Justiça de Roraima

UFPA - Universidade Federal do Pará


SUMÁRIO

INTRODUÇÃO......................................................................................... 13
1 VIOLÊNCIA CONTRA A MULHER: APORTES TEÓRICOS.................. 21
1.1 Breve contexto histórico e teórico sobre violência de gênero.......... 21
1.2 Violência contra a mulher – mapeando o fenômeno........................... 29
1.3 Histórico das políticas públicas no combate à violência contra as
mulheres no Brasil................................................................................. 39
1.4 Breve discussão sobre as Medidas de Proteção de Urgência no
combate à violência contra as mulheres.............................................. 62
2 ANÁLISE DAS MEDIDAS PROTETIVAS DE URGÊNCIA NO
COMBATE A VIOLÊNCIA CONTRA AS MULHERES............................ 69
2.1 Violência contra as mulheres no Brasil................................................ 69
2.2 Violência contra as mulheres no estado do Rio de Janeiro e o
Projeto Violeta......................................................................................... 75
2.3 Análise das Medidas Protetivas de Urgência na Comarca de
Bangu - RJ............................................................................................... 86
2.3.1 Caracterização socioeconômica das vítimas e seus agressores............. 87
2.3.2 Contexto da violência sofrida.................................................................... 97
2.3.3 A solicitação das Medidas Protetivas de Urgência................................... 103
2.3.4 Parecer da equipe técnica e medidas judiciais tomadas.......................... 107
CONSIDERAÇÕES FINAIS..................................................................... 115
REFERÊNCIAS........................................................................................ 122
ANEXO..................................................................................................... 128
13

INTRODUÇÃO

A realização deste trabalho partiu do interesse em pesquisar temas


relacionados à violência contra a mulher, desejo que emergiu, em princípio, de
minha isenção no Centro de Referência de Atendimento à Mulher em Situação de
Violência “Maria do Pará” (CRMP), da Secretaria de Justiça e Direitos Humanos do
Estado do Pará (SEJUDH), espaço onde realizei estágio curricular do curso de
Serviço Social da Universidade Federal do Pará (UFPA). Essa experiência culminou
no Trabalho de Conclusão de Curso intitulado “Gênero, violência doméstica e
interfaces com a Lei Maria da Penha: a experiência do Centro Maria do Pará, em
Belém”, com o qual obtive meu título de formação superior.
Durante o processo de graduação em Serviço Social, minhas ideias sobre a
temática da violência contra a mulher foram amadurecendo, pois percebi que esse
tipo de violência tornava-se cada vez mais banal em nossa comunidade, algo visto
como comum e corriqueiro.
Diante desse quadro, algumas questões foram nos instigando em relação
aos diferentes tipos de violências que as mulheres sofrem, e algumas indagações
foram surgindo: “por que as medidas protetivas, muitas vezes, não funcionam de
forma eficaz, pois permitem ao agressor a “liberdade” para se aproximar da vítima
agredi-la novamente?” Essas e outras perguntas foram determinantes para acentuar
meu interesse de pesquisa.
Outro fator decisivo para a consolidação deste estudo foi a mudança para o
estado do Rio de Janeiro e o conhecimento de que nessa região, mais
especificamente em Bangu, dados do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJRJ)
apontaram o Fórum Regional desse município como a área que mais apresentou
Medidas Protetivas de Urgência deferidas em todo o estado do Rio de Janeiro no
ano de 2017, com 2.017 concessões, enquanto que na capital foram 1.672
deferimentos de medidas concedidas. Esse quantitativo não inclui os bairros de
Bangu, Barra da Tijuca, Campo Grande, Jacarepaguá, Leopoldina que têm fóruns
regionais próprios.
Ainda sobre os dados do Tribunal de Justiça do Rio (TJRJ), foi constatado
que o número de processos de Feminicídio sofreu um aumento de 63% entre os
anos 2016 e 2017, isto é, o quantitativo de casos de mulheres mortas em função do
14

gênero na Justiça Fluminense subiu de 54 para 88 em comparação do mesmo


período. Em seis anos, a prisão de agressores passou de 550 para 1.504 — nesse
período foram 531 histórias de abuso, segundo o Observatório da Violência contra a
Mulher (Jornal O Globo, 2018).
Dados do Mapa da Violência 2015, elaborado pela Faculdade Latino-
Americana de Ciências Sociais (Flacso), apontam um aumento de 54% nos últimos
dez anos do número de homicídios de mulheres negras, passando de 1.864, em
2003, para 2.875, em 2013. Com a taxa de 4,8 assassinatos para 100 mil mulheres,
o Brasil está entre os países com maior índice de homicídios femininos, ocupando a
quinta posição em um ranking de 83 nações. De acordo com os dados de 2013 do
Ministério da Saúde e do Mapa da Violência de 2015, 55,3% desses crimes
aconteceram no ambiente doméstico e 33,2% dos homicídios foram cometidos por
parceiros ou ex parceiros das vítimas.
Em decorrência do aumento desse índice, de mulheres vítimas de violência,
o Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro - RJ criou o Observatório Judicial da
Violência Contra a Mulher para reunir dados estatísticos, ver legislação, emitir
relatórios e prestar orientação ao público sobre órgãos de proteção e delegacias
especializadas para ocorrências e ameaças desse tipo.
Ressalta-se que, em razão dos dados alarmantes de violência contra a
mulher no Brasil, conforme destaque do Jornal O Globo (2018), no dia 9 de março
de 2015 foi sancionada, pelo Governo Federal, a Lei nº. 13.104 que, em linhas
gerais, prevê o Feminicídio como circunstância qualificadora do crime de homicídio.
De autoria da Comissão Parlamentar Mista de Inquérito da Violência contra Mulher,
com a sanção presidencial, o assassinato de mulher por razões de gênero (quando
envolver violência doméstica e familiar ou menosprezo e discriminação à condição
de mulher) passa a ser incluído entre os tipos de homicídio qualificado, cuja pena
prevista é de reclusão de 12 a 30 anos.
"Feminicídio" é o termo que designa - e enquadra - os crimes com motivação
ligada ao gênero. A palavra surgiu no século XIX, e seu significado atual ganhou
força nos anos 1970, impulsionado por ativistas como a sul-africana Diana Russel. A
Defensora Pública Arlanza Rebello, Coordenadora de Defesa dos Direitos da Mulher
da Defensoria Pública do Estado do Rio de Janeiro (DPRJ), ressalta que a finalidade
do termo é se distinguir das ocorrências de homicídios dolosos gerais e cobrar
políticas públicas focadas no problema. Assim, Feminicídio é o assassinato de uma
15

mulher pelo fato de ser mulher. Os motivos mais comuns são o ódio, o desprezo ou
o sentimento de perda do controle e da propriedade sobre as mulheres, situações
comuns em sociedades marcadas pela incidência de papéis discriminatórios ao
feminino, como é o caso da sociedade brasileira.
Nesse sentido, Feminicídio não é um acontecimento isolado, mas é o ponto
culminante de uma violência contínua, arraigada no cotidiano de muitas mulheres.
Por isso, ao procurar coibir penalmente essa violência de gênero, não se deve omitir
sua denominação mais radical, o que acontecia com a Lei Maria da Penha, pois os
crimes qualificados como homicídios escapavam ao seu escopo, (MELLO, 2017).
Segundo Mello (2017), o machismo e o patriarcalismo arraigados em nossa
sociedade configuram motivo mais que suficientes para justificar tal tratamento
diferenciado. Logo, é importante destacarmos as penas que são imputadas aos
agressores de violência de gênero conforme a nova Lei: I - prevê o Feminicídio
como qualificador do crime de homicídio quando é praticado contra a mulher por
razões da condição do sexo feminino; II - considera-se que há razões de condição
de sexo feminino quando o crime envolver: a) violência doméstica e familiar contra a
mulher; b) ou menosprezo e discriminação contra a mulher; III - prevê causas de
aumento da pena de 1/3 até a metade se o crime for praticado: a) durante a
gestação ou nos três meses posteriores ao parto; b) contra menor de 14 anos, maior
de 60 ou pessoa com deficiência; c) na presença de descendente ou ascendente da
vítima; IV - considera-se crime hediondo, conforme a Lei nº 13.104, de 09/03/2015
do art. 121 do Código Penal, para prever o Feminicídio como circunstância
qualificadora do crime de homicídio.
O Mapa da Violência Contra a Mulher (2015) estima que, no Brasil, 13
mulheres são mortas por dia. Dos 4.762 assassinatos de mulheres em 2013, mais
de 50% foram cometidos por familiares. Em outubro de 2017, o 11º Anuário
Brasileiro de Segurança Pública revelou que o Rio de Janeiro era o estado brasileiro
com a menor quantidade de mortes de mulheres registradas como Feminicídio. De
acordo com os responsáveis pelo levantamento, o baixo índice era indício de uma
subnotificação, revelando que a polícia não está preparada para lidar com a
violência contra a mulher.
Conforme registros do Ministério da Saúde, mais de 47 mil mulheres foram
mortas no Brasil nos últimos 10 anos. No estado do Rio de janeiro a taxa de
homicídios de mulheres subiu de 3,6 por 100 mil mulheres em 2010 para 4,2 em
16

2015, chegando a 4,6 em 2016. A média foi de 365 mulheres assassinadas por ano.
(Esquerda Diário, 2018).
No Dossiê Mulher (2017), que tem como autoria o Instituto de Segurança
Pública que analisa a situação de violência às mulheres no estado do Rio de Janeiro
no ano de 2016, indicativos evidenciam que após 11 anos de vigência da Lei Maria
da Penha os assassinatos só aumentaram nos últimos 5 anos. Considerando-se que
os dados relativos ao detalhamento de Feminicídio foram inseridos no banco de
dados somente os relacionados aos meses de Outubro, Novembro e Dezembro de
2016, os quais somaram 42 vítimas (27,3%) das 154 mulheres vítimas de tentativa
de homicídio registradas no período, estima-se que o número de Feminicídio no ano
de 2016 seja superior a esses números apontados (Esquerda Diário, 2018).
Em 2015, o registro de 360 homicídios de mulheres representa entre 7 e 8 %
do total de homicídios dolosos registrados ao ano no estado do Rio de Janeiro, cuja
média é de 380 mortes/ano entre (2002-2016). Do total de vítimas de violência física
registradas em 2016, as mulheres são 63,8% (Dossiê Mulher, 2017). Ainda
Conforme esse documento, a cada 100 crimes de violência sexual no estado do Rio
de Janeiro, 85 são cometidos contra mulheres.
Em 2017, um total de 4.612 mulheres foram vítimas de crimes dessa
natureza: 4.128 vítimas de estupro e 484 vítimas de tentativa de estupro. De acordo
com os estudos do Dossiê Mulher (2017), uma mulher é vítima de estupro, ou
tentativa de estupro, a cada 2 horas, em 2015. Mesmo que esse percentual tenha
diminuído 2,8% em 2016, ainda assim o número de vítimas de estupro é assustador,
visto que somam 4.013 casos. A situação é pior quando se trata de mulheres
negras, pois essas representam 63,7% das vítimas da violência seguida de morte, e
mais da metade das que são agredidas fisicamente, representando, dessa forma,
54,5% do total das mulheres. (Dossiê Mulher, 2017).
Assim, em cinco anos, 225.869 mulheres vítimas de violência doméstica e
familiar fizeram pedidos de Medidas Protetivas de Urgência à Polícia Civil do Rio de
Janeiro. O levantamento feito entre 2013 e 2017 revela que os números divulgados
pelo Dossiê Mulher (2017) representam uma média diária de 123 solicitações nesse
período. O Dossiê também levantou outros números que chamam atenção: mais de
4 mil mulheres foram vítimas de violência sexual no estado do Rio de Janeiro, e
desse quantitativo mais da metade, 68%, foi vítima dentro da própria casa.
17

Em relação à Lei Maria da Penha, os casos de lesão corporal dolosa


(65,5%) e ameaça (60,7%) foram classificados como violência doméstica e familiar.
O estudo revela também que as mulheres continuam sendo as principais vítimas de
estupro (84,7%) e assédio sexual (97,7%). De acordo com o Dossiê, os autores de
parte dos crimes cometidos contra as mulheres são pessoas com algum grau de
intimidade ou proximidade com a vítima, como maridos, ex-maridos, namorados,
familiares, amigos, conhecidos ou vizinhos.
No âmbito deste trabalho, a violência contra a mulher no estado do Rio de
Janeiro tem nos chamando atenção, especialmente em Bangu. Segundo o Censo
2010, o bairro contém uma população de 243.125 habitantes, sendo a população
constituída de 52,72% por mulheres (114.952) e 47.28% por homens (128.173).
Nesse bairro encontra-se o nosso lócus de pesquisa que é o “Projeto Violeta”, o qual
foi criado a partir do histórico relacionado à Lei Maria da Penha. Desenvolve suas
ações com a concepção ampla de acesso à justiça, contemplando medidas judiciais
e extrajudiciais. Também apresenta como eixo motivador o fato de que, na
ocorrência de algum tipo de violência contra mulher, as Medidas Protetivas de
Urgência (MPU) não funcionam a contento, pois, conforme Mello et al. (2017):

Sabe-se que as medidas judiciais muitas vezes funcionam como uma


resposta pontual a uma situação de violência sendo ineficazes para sanar o
problema social. Por esse motivo, o legislador ofereceu à matéria um
tratamento especial, integrando os poderes Executivo, Legislativo e
Judiciário nas esferas municipais, estaduais e federal com o objetivo de
articular políticas públicas que fossem eficazes para combater a violência
baseada no gênero, (MELLO et al. 2017, p.212).

O “Projeto Violeta” foi idealizado pela Juíza Adriana Mello, em conjunto com
outras autoridades envolvidas na defesa da mulher em situação de violência -
Polícia Civil, Defensoria Pública e Ministério Público -, e inicialmente implementado
em junho de 2013, no I Juizado de Violência Doméstica, localizado na Av. Erasmo
Braga 115, 12º Andar - Sala 1204 - Palácio da Justiça.
O Projeto Violeta tem como objetivo garantir a segurança e a proteção
máxima das mulheres vítimas de violência doméstica e familiar, acelerando o acesso
à Justiça daquelas que estão com sua integridade física e até mesmo com a vida em
risco. Vencedor do Prêmio Innovare de 2014, o Projeto consiste em um núcleo de
atendimento às vítimas de violência doméstica, numa ação que conta com a
participação de Defensores Públicos, Promotores e Assistentes Sociais dentro da
18

comarca. Depois de registrar ocorrência na delegacia e solicitar as Medidas


Protetivas de Urgência, a vítima é encaminhada para o espaço do Projeto Violeta,
que agiliza a concessão do direito. Segundo Mello et al. (2017, p. 213), o projeto tem
o intuito de:

[...] garantir segurança e proteção imediatas às mulheres em situação de


violência doméstica e melhorar a qualidade do atendimento dispensado a
elas no Poder Judiciário, levando em conta que a assistência jurídica
gratuita se configura como instrumento fundamental para a efetividade do
princípio do acesso à justiça e do processo justo. O diferencial do Projeto é
o método para identificar os casos mais graves, aqueles que oferecem risco
iminente à vida da mulher, conferindo-lhes o caráter de urgência por meio
de uma tarja violeta. Conforme prevê a Lei Maria da Penha, todo processo
de Medidas protetivas de Urgência tem que ser concluído em até 48 horas.
Porém, o Projeto levando em conta o risco a que estão submetidas às
mulheres, objetiva a conclusão do processo em cerca de quatro horas,
contando do momento em que ela ingressa no Poder Judiciário.

Atualmente, o “Projeto Violeta” abrange seis Juizados de Violência


Doméstica e Familiar contra a Mulher (JVDFM): o I e V JVDFM, ambos localizados
no centro da cidade do Rio de Janeiro; o JVDFM da Comarca de Nova Iguaçu; o III
JVDFM - Fórum Regional de Jacarepaguá; o II JVDFM – Regional de Campo
Grande e o IV JVDFM – Fórum Regional de Bangu. De acordo com Mello et al.
(2017), foi traçado, no ano de 2015, no Projeto Violeta, um perfil das mulheres
vítimas de violência e de seus agressores. Detectou-se, então, que as mulheres
vítimas de violência encontram-se na faixa etária entre 31 e 40 anos (29%), seguido
pelo grupo de mulheres entre 41-50 anos (26%); a mais jovem com 18 anos de
idade e a mais velha com 79 anos. Essas vítimas são, em princípio, mulheres
solteiras (52%); possuem filhos (76%); e residem com os filhos (52%). Importante
ressaltar que 88% das vítimas exercem trabalho remunerado, seja no mercado
formal ou informal.
Sobre o perfil do agressor, a maior incidência é de homens entre 31 e 40
anos (34%), seguido pelo grupo de homens entre 41-50 anos (23%); o mais jovem
com a idade de 20 anos e o mais velho com 73 anos. Um dado relevante a ser
apresentado é a utilização da arma de fogo na prática de violência. Conforme foi
observado, esse é o meio mais recorrente nos homicídios e, de acordo com o MAPA
DA VIOLÊNCIA (2015), incide em 48% dos casos nas mortes de mulheres.
Em uma análise mais específica sobre o Estado do Rio de Janeiro, os dados
indicam que o estado ocupou a quarta posição dentre as unidades federativas com
19

maior número de morte de mulheres (6,8 mulheres mortas a cada 100 mil
habitantes), ficando atrás de Espírito Santo (8,6), Rondônia (7,2) e Mato Grosso
(7,0). As agressões são provenientes, em sua maioria, dos ex-companheiros (36%)
e companheiros (19%); seguida por ex-namorado (13%); marido (11%); ex-marido
(6%); filho (4%); irmão (4%) e outros familiares (4%). Com relação à recorrência da
agressão, a pesquisa mostra que as vítimas somente buscam proteção judicial após
sofrerem inúmeros atos de violência (47%), em menor número após a primeira
agressão (23%) e 11% após a segunda. No que diz respeito ao local onde as
agressões são cometidas, a predominância está no ambiente doméstico (57%),
seguido pela via pública (23%) e no trabalho da vítima (16%). A pesquisa aponta
também que os tipos de violência mais ocorrentes são a violência psicológica,
representando 46,8% do total, seguida pela violência física, 33,5% e, por último, a
violência moral, com 16,6% do total.
Assim sendo, os estudos realizados nesta Dissertação foram sistematizados
em 2 capítulos, respectivamente: no 1º capítulo, realizamos estudos a respeito do
histórico da violência contra a mulher; descrevemos como se realizou o processo de
desenvolvimento de políticas públicas no combate à violência contra a mulher no
Brasil; e fazemos uma breve discussão a respeito da MPU’s em efetivação. No 2º
capítulo, expomos um breve panorama sobre a violência contra as mulheres no
Brasil; e sobre a violência contra as mulheres no estado do Rio de Janeiro; além de
analisarmos os Formulários de Requerimento de Medidas Protetivas do Projeto
Violeta na Comarca de Bangu.
Para atender aos objetivos desta pesquisa, caracterizamos o Projeto Violeta
como uma experiência de implementação das Medidas Protetivas de Urgência;
identificamos o perfil das usuárias atendidas, e dos agressores; classificamos os
tipos de violência mais recorrente; e as principais medidas de proteção.
O lócus de investigação da pesquisa foi o “Projeto Violeta”. Colocamos em
destaque as características do projeto e a experiência da implantação das Medidas
Protetivas de Urgência, em Bangu, no estado do Rio de Janeiro. Esse projeto tem
por objetivo garantir a segurança e proteção imediatas às mulheres em situação de
violência doméstica e melhorar a qualidade do atendimento dispensado a elas no
Poder Judiciário. O “projeto Violeta” considera que a assistência jurídica gratuita se
configura um instrumento fundamental para a efetividade do princípio do acesso à
justiça e do processo justo.
20

Como metodologia para elaboração da Dissertação, utilizamos o método do


materialismo histórico-dialético, pois consideramos o mais apropriado para essa
incursão, uma vez que passamos inicialmente a identificar o fenômeno da violência
contra as mulheres, nas várias formas em que se apresenta, para em seguida
desnudá-lo a partir de suas partes e determinações econômicas, sociais e culturais,
o que nos possibilitou compreender a importância das MPU’s para vítimas de
violência.
O pioneirismo da Lei Maria da Penha foi determinantes para o avanço das
Medidas Protetivas de Urgência às mulheres vítimas de violência de gênero.
Observamos que o “Projeto Violeta”, como instituição de enfrentamento e combate à
violência de gênero, dispõe de ações diversas, em especial o apoio do Judiciário à
demanda em questão, o que proporciona, de certa forma, uma segurança à vítima,
tanto que os dados da pesquisa mostram um aumento no número de denúncias, e
que tais denúncias, em tese, inibem novas possíveis agressões a essa mulher.
Portanto, enfatizando os principais resultados alcançados, em consonância
ao objetivo geral proposto para esta pesquisa, constatamos que as Medidas
Protetivas de Urgência no “Projeto Violeta” se constituem como um grande
mecanismo para o enfrentamento da violência contra a mulher; observamos,
também, a relevância das MPU’s para aquelas que buscam justiça e proteção na
situação de violência em que se encontram; e de como essas medidas, apesar de
suas limitações, conseguem proteger tais vítimas de possíveis feminicídios.
21

1. VIOLÊNCIA CONTRA A MULHER: APORTES TEÓRICOS

1.1. Breve contexto histórico e teórico sobre violência de gênero

Para mergulharmos nessa discussão a respeito da violência contra a mulher


é importante trazermos um arcabouço teórico que seja possível dialogar e mostrar o
porquê atualmente à mulher ainda é vítima de violência.
Guimarães e Pedroza (2015, p. 259) ressaltam que a temática da violência
sempre tem recebido uma forte atenção em diversos campos, entre esses: na
política, filosofia, psicologia, antropologia, justiça e até mesmo no senso comum,
entretanto, as definições sobre tal são sempre as mais diversas, porém, sempre
estão relacionadas ao conceito de poder, força, dominação. E de acordo com as
autoras:

[...] há uma tendência universal e histórica de se considerar a violência


como inerente à natureza humana. Entretanto, limitar o debate acerca de
violência a esse ponto reflete uma posição simplificadora e defensiva para
lidar com a questão. Os autores enfatizam a necessidade de reflexões
conceituais mais profundas no sentido de compreender o quanto a violência
é marcada na intersubjetividade e no encontro com a alteridade.

Santos e Izumino (2005) definem violência como uma ação que transforma
diferenças em desigualdades hierárquicas com o fim de dominar, explorar e oprimir.
A ação violenta trata o ser dominado como “objeto” e não como “sujeito”, o qual é
silenciado e se torna dependente e passivo. Nesse sentido, o ser dominado perde
sua autonomia, ou seja, sua liberdade, entendida como “capacidade de
autodeterminação para pensar, querer, sentir e agir”.
Saffioti (2015) ressalta que qualquer comportamento que tenha a intenção
da ruptura de qualquer forma de integridade da vítima, sendo essa: física, psíquica,
sexual ou moral, através ou pelo uso da força, é considerada como violência, logo,
compreende-se que qualquer tipo de violência é uma violação dos direitos inerentes
do ser humano.
22

Para Barata (2008), a violência é classificada enquanto violência objetiva, a


qual se refere às agressões permanentes contra a natureza, e violência subjetiva,
que é retratada pelas agressões, determinadas ou não pelo indivíduo.
Damasceno (2018) enfatiza que a violência deve ser compreendida não
apenas como aquela que podemos materializá-la, ou aquela que deixam marcas,
mas essa deve ser entendida, também, como uma “violência invisível” aquela na
qual somos lesados por não termos nossos direitos garantidos, e mesmo sabendo
que estamos sendo vitimados não temos consciência a respeito de nossos direitos
que não estão sendo garantidos, achando natural tal descaso.
Concordamos com os autores acima, pois acreditamos que atualmente
estamos vulneráveis a todo tipo de violência, e ao trazermos a categoria mulher para
essa discussão é importante enfatizarmos que essa ao fazer parte de uma
sociedade que se diz integradora, a qual considera todos iguais perante sua Carta
Maior, deve reaver seus preceitos, pois atualmente o que observamos em nível
nacional constantemente são registros de violência contra a mulher, e o que
observamos são as fragilidades nas leis de proteção a essa.
A discussão sobre violência contra mulher, Santos e Izumino (2005, p. 3)
destacam que:

[...] violência contra as mulheres resulta [...] de uma ideologia que define a
condição “feminina” como inferior à condição “masculina”. As diferenças
entre o feminino e o masculino são transformadas em desigualdades
hierárquicas através de discursos masculinos sobre a mulher, os quais
incidem especificamente sobre o corpo da mulher. Explica a autora que,
“[a]o considerá-los discursos masculinos, o que queremos simplesmente
notar é que se trata de um discurso que não só fala de “fora” sobre as
mulheres, mas sobretudo que se trata de uma fala cuja condição de
possibilidade é o silêncio das mulheres”. Tais discursos masculinos não se
contrapõem a discursos “femininos”, já que são produzidos e proferidos
tanto por homens quanto por mulheres.

Essy. (2017, p 5, 6) enfatiza:

Sobressai-se, portanto, a teoria de que, até os dias atuais, a mulher é vista


como sujeito social autônomo, porém historicamente vitimada pelo controle
social masculino. É justamente pela possibilidade do conceito patriarcado
ser utilizado de forma abrangente, abarcando todos os níveis da
organização social, que seu sentido substantivo é tão frutífero para analisar
as diversas situações de dominação e exploração das mulheres. O uso de
patriarcado enquanto um sistema de dominação dos homens sobre as
mulheres permite visualizar que a dominação não está presente somente na
esfera familiar, tampouco apenas no âmbito trabalhista, na mídia ou na
política. Portanto, o patriarcado é utilizado como forma de naturalizar um
sistema que legitima e naturaliza o exercício da dominação e exploração
das mulheres por um indivíduo, na maioria das vezes, do sexo masculino, e
23

que apesar de já ser superado como organização social que tem o patriarca
como figura central de uma comunidade familiar ou econômica, ainda
possui grandes reflexos na estrutura social do século XXI.

Compreendemos que as ações de violência contra a mulher têm histórico


que está ligada a dominação entre os gêneros, o masculino sobre o feminino, ou
seja, a sociedade brasileira tem o histórico e sua própria constituição machista, seu
viés é construído com práticas de violência cometida contra muheres. Conforme
Severi (2017, p. 28):
[...] buscou compreender o sistema de exploração-dominação ou
dominação-exploração baseado no sexo/gênero como algo que permeia
todos os níveis institucionais, seja na esfera privada ou na pública, de modo
imbricado com outros sistemas, como o capitalismo e o racismo, fundindo-
se em um único sistema de dominação- exploração (nó de opressões).É
impossível isolar a responsabilidade de cada um desses três sistemas
(patriarcado-racismo-capitalismo) pelas discriminações e violências
praticadas contra mulheres. Isso não significa que a simbiose entre eles
seja harmônica ou pacífica, mas sim uma unidade contraditória. A depender
das circunstâncias históricas, cada uma das contradições que integram o
“nó” frouxo e móvel formado entre as estruturas de gênero, de raça/etnia e
de classe social adquirem relevos distintos e resultarão em formas
específicas de opressão vividas por cada mulher ou grupos relativamente
homogêneos de mulheres.

Nesse momento é importante ressaltarmos a ideia de Severi (2017, p. 37),


com relação a uma nova categoria que surge:

Outra categoria utilizada por muitas vertentes do feminismo, não sem


controvérsias sobre o seu significado, é Patriarcado, em geral para nomear
os sistemas ou relações de subordinação das mulheres e, por meio dele,
elaborar críticas severas, sobretudo, aos principais fundamentos
organizadores da concepção liberal e contratualista de Estado Moderno. Na
sociologia clássica, o termo foi frequentemente usado para se referir a uma
estrutura pré-moderna ou a uma força tradicional do passado de
organização da opressão das mulheres (e seus descendentes e escravos)
pelos homens. Todavia, teóricas como Carole Pateman (1996) têm buscado
compreendê-lo como sistema constitutivo da modernidade e da forma como,
ainda hoje, os Estados estão estruturados.

Então, o patriarcalismo, conforme Severi (2017, p. 35), é uma doutrina que


dá suporte e sustentação as relações hierarqicas de subordinação entre homens e
mulheres, ou seja, pautadas nas diferenças naturais entre os sexos. Todavia, as
ações de violência contra a mulher, remetem a uma lógica de poder político, na qual
convém a resultante de uma vontade livre e racional, pois tal poder só poder ser
exercido por indivíduos adultos, livres e iguais, no entanto, o poder político é
relacionado ao poder dos indivíduos livres e iguais que o exercem na esfera pública,
logo, é considerado em contraposição ao poder paternal, do chefe da família, mais
24

especificamente, o poder dos homens, maridos e pais, sobre as mulheres, esposas,


e filhos ou filhas, exercido na esfera privada ou doméstica, tendo seu fundamento
não em uma convenção social, mas na própria lei da natureza, o mais forte deve
governar o mais fraco.
A respeito da violência de gênero que ocorre devido a ação e o envolvimento
do patriarcado, Severi (2017, p. 38) ressalta:

[...] o uso do termo gênero provocou nos estudos feministas foi o crescente
questionamento sobre o caráter reducionista e excludente da identidade
mulher, ainda que no plural (mulheres) [...] Apesar de gênero e de
patriarcado não se situarem em um mesmo campo de referências, o uso de
um conceito não tem resultado, necessariamente, na exclusão de outro.
Muitas análises têm feito o uso simultâneo dos termos “patriarcado” e
“gênero”. No entanto, a categoria gênero abriu a possibilidade de realização
de novos questionamentos, uma vez que a categoria patriarcado parecia
dar conta de explicar todo um conjunto de relações sociais produtoras de
desigualdade entre os gêneros. Por outro lado, os estudos de gênero não
garantem respostas completas sobre uma forma histórica de dominação ou
de exploração (MACHADO, 2000). As abordagens de Saffioti e de Werneck
& Iraci acima apontadas são exemplos de propostas analíticas que
associam gênero e patriarcado, de modo articulado também com outras
categorias como raça e classe social.

É imprescindível ressaltar que no século XXI, a sociedade vem reproduzindo


a subordinação da mulher perante o sexo masculino através da tradição e costumes
machistas, patriarcais, de forma mais intensa e mais banal, naturalizando a
opressão sofrida por séculos, pois, atualmente essa se reflete em diversos
ambientes sociais nos quais o sexo feminino se faz presente. Entretanto, devemos
discutir que o patriarcalismo compõe a dinâmica social como um todo até mesmo
nos dias atuais, estando inclusive, arraigado no inconsciente de homens e mulheres
individualmente e no coletivo enquanto categorias sociais, (ESSY, 2017).
O debate se faz imprescindível, pois a mulher sofreu todas as limitações
possíveis, sendo destinadas apenas a desempenharem as tarefas domésticas, no
entanto, ao entrarem no mercado de trabalho na busca pela liberdade e
independência financeira, passaram a desempenhar dupla jornada, além de auxiliar
no sustento da casa, ou seja, houve uma mudança na dinâmica em nossa
sociedade, sendo desenvolvidas ações nos vieses dos direitos das mulheres os
quais findaram na determinação dos papeis de cada gênero. Logo, esses que são
impostos socialmente desde os primórdios acabaram gerando um meio propício
para conflitos no qual a mulher é integrada no mercado de trabalho e tem que se
25

impor, redefinindo todo o modelo ideal de família estabelecido, colocando em xeque


a ideologia patriarcal.
A partir das lacunas deixadas nas ações preestabelecidas para cada gênero
surge a violência como meio de reprimir a mulher, com o intuito de designar essa a
ocupar o lugar que lhes é determinado historicamente: o lar, desempenhando seu
papel de mãe e esposa.
Sendo assim, conforme Santos e Medeiros (2017) as mulheres vítimas de
violência passaram a se posicionar paralelamente ao movimento feminista na
década de 1970, no contexto de redemocratização do país, concomitante as ações
feministas no âmbito nacional brasileiro, internacionalmente havia vários tratados
decorrentes de Convenções e ações da Organização das Nações Unidas (ONU), e
das Organizações dos Estados Americanos (OEA) tratando a respeito da temática
da violência contra a mulher.
Importante considerarmos algumas categorias como violência de gênero na
qual Guimarães e Pedroza (2015, p. 257):

O conceito de gênero foi proposto por estudiosas feministas americanas


(como Stoller e Gayle Rubin) na década de 70 como o objeto de estudo dos
feminismos (Saffioti, 1999b). Tal conceituação é proposta para superar o
determinismo biológico relacionado ao uso do termo sexo ou diferenciação
sexual e destacar a construção social das identidades de homens e
mulheres. Esse novo conceito propicia uma desnaturalização e
desconstrução de definições e papéis referentes ao masculino e ao feminino
e possibilita a introdução de compreensões das dinâmicas relacionais entre
eles (Conceição, 2009; Scott, 1990 ;Torrão, 2005).Machado (1998) ressalta
que a análise de gênero instaurou um novo paradigma metodológico a partir
de três pilares fundamentais: a ruptura com o essencialismo biológico; o
privilégio metodológico às relações de gênero em contraposição às
categorias substancializadas de homem e mulher; e a afirmação da
transversalidade de gênero nas demais áreas do social. Gênero passa,
assim, a ser compreendido como uma categoria de análise com estatuto
teórico e epistêmico e caráter estruturante da sociedade (Saffioti, 1999a;
Scott, 1990; Segato, 2011).

Ademais Balestero e Gomes (2015) corroboram que a violência de gênero


não está restrita a uma cultura, ou seja, essa encontra-se presente em todas as
camadas da sociedade, independente de localidade, no entanto, a violência de
gênero consiste na maneira em que as diferenças entre homens e mulheres são
inseridas nas mais diversas sociedades levando em consideração o processo
histórico evolutivo, no qual não estão relacionadas as distinções biológicas que
existem entre macho e fêmea.
26

A respeito da violência contra mulherChauí (1985) ressalta que reconhece


tal como sendo:

[...] resultado de uma ideologia de dominação masculina que é produzida e


reproduzida tanto por homens como por mulheres. A autora define violência
como uma ação que transforma diferenças em desigualdades hierárquicas
com o fim de dominar, explorar e oprimir. A ação violenta trata o ser
dominado como “objeto” e não como “sujeito”, o qual é silenciado e se torna
dependente e passivo. Nesse sentido, o ser dominado perde sua
autonomia, ou seja, sua liberdade, entendida como “capacidade de
autodeterminação para pensar, querer, sentir e agir”.

Concordamos com Chauí (1985) em sua colocação, pois a violência contra a


mulher resulta de uma socialização machista, pois nesse contexto de construção e
desenvolvimento da cultura patriarcal a mulher o homem compreende que é correto,
espancar a mulher e que essa deve se submeter aos seus desejos e caprichos.
Sendo assim, todo esse contexto que é propagado em nossa sociedade
abre margem para aviolência intrafamiliarque de acordo com Ministério da Saúde
(2001, p. 7) é um problema social de grande dimensão, que afeta toda a sociedade
atingindo especialmente os mais frágeis, mulheres, crianças, idosos e portadores de
deficiência. No entanto, nesse contexto, a mulher o Ministério da Saúde (2001),
ressalta que nas cidades brasileiras a agressão a mulher acontece a cada 4
minutos; 63% das vítimas de violência intrafamiliar são cometidas contra mulheres; e
em 70% dos casos os agressores são os próprios maridos ou companheiros. Logo,
a violência intrafamiliar toma a forma de maus-tratos físicos, psicológicos, sexuais,
econômicos ou patrimoniais, causando perdas de saúde ainda pouco
dimensionadas.
A partir das violências que as mulheres eram vítimas, muitas protestavam, e
eram através das lutas feministas que essas se sobressaiam nas discussões
políticas, todavia, passaram a se organizar por meio de convenções, encontros para
debaterem meios e formas jurídicas e sociais para serem reconhecidas na
sociedade e se protegerem de seus agressores.
Essa violência contra a mulher tem toda uma construção cultural, na qual
Oliveira, lima e Arana (2017) corroboram, e concordamos com os autores, pois essa
violência não é apenas um ato destrutivo praticado entre os sujeitos, na forma de
agressões, sejam físicas ou verbais. Compreendemos que vem sendo criada e
instruída pela própria sociedade, na qual pode ser considerada no caso de uma
cultura da violência. Essa violência, diz respeito à violência promovida e perpetuada,
27

ao longo do tempo e, por este motivo, nem sempre é fácil de ser observada ou
modificada, levando e consideração que esta é inscrita nos ditados populares, nas
“piadas” preconceituosas, mas que insistem em arrancar sorrisos de quem as
proferem e de quem concorda com tais discursos, nos olhares, nos gestos etc.
Santos e Medeiros (2017, p. 2) enfatizam:

[...] a Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação


contra a Mulher (CEDAW/ONU,1979) e a Convenção Interamericana para
Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher (Convenção de
Belém do Pará, OEA, 1994). A CEDAW, adotada pela Resolução 34180 da
Assembleia Geral das Nações Unidas, em 18 de dezembro de 1979, entrou
em vigor em 03 de setembro de 1981, “define em que consiste a
discriminação contra as mulheres, estabelece uma agenda para ações
nacionais com o fim de eliminá-la e prevê uma série de direitos a serem
respeitados, protegidos e implementados (arts. 1.º ao 16.º)”
(PANDJIARJIAN, 2006:80). [...]portanto, que a discriminação e a
desigualdade favorecem a violência contra as mulheres o que limita os
outros direitos, porque é uma forma de discriminação e deve ser
considerada como todos os atos que trazem dano ou sofrimento físico,
psicológico ou sexual. [...]o governo brasileiro, em 1984, inseriu no seu
ordenamento jurídico interno a definição legal de “discriminação contra a
mulher”. No entanto, o Brasil não fugiu à regra, pois a ratificação ocorreu
com reservas no artigo 15, § 4º. “Os Estados-partes concederão ao homem
e a mulher os mesmos direitos no que respeita à legislação relativa ao
direito das pessoas, à liberdade de movimento e à liberdade de escolha de
residência e domicílio” e, no artigo 16, § 1º (a), (c), (g) e (h). Esses artigos,
em última instância, tratam sobre a temática da violência doméstica contra a
mulher perpetrada pelo parceiro íntimo, visto que abordam a igualdade no
casamento e na família. Somente, em 1994, portanto dez anos após sua
ratificação, o Brasil comunicou a ONU a retirada dessas reservas. Essa
deliberação só foi possível, porque a Constituição Federal de 1988
consagrou, a igualdade entre mulheres e homens como um direito
fundamental.

A partir das convenções que houveram internacional e nacionalmente, no


Brasil houve uma relevância na Convenção de Belém do Pará, essa adotada pela
(OEA) em 09 de junho de 1994 seu intuito foi para Prevenir, Punir e Erradicar a
Violência contra a Mulher, entretanto, essa ratificada pelo Estado brasileiro em 27 de
novembro de 1995, conforme Santos e Medeiros (2017) Apud Libardoni e Massula
(2005):

A partir da ratificação da Convenção de Belém do Pará pelo Estado


brasileiro passamos a contar com dispositivo legal internacional que diz o
que é e como se manifesta esta forma específica de violência que atinge as
mulheres pelo simples fato de serem mulheres e de estarem inseridas em
um contexto histórico e cultural permissivo que propicia relações desiguais
entre mulheres e homens (LIBARDONI & MASSULA, 2005:13).
28

A Convenção de Belém do Pará, conforme Santos e Medeiros (2017) é


considerado marco histórico na luta das mulheres por uma vida sem discriminação e
violência, isso posto é importante ratificar que gênero é uma categoria de análise
que explica como se estabelece as relações sociais entre o masculino e o feminino.
Com a evolução das conquistas femininas obtidas historicamente, tais direito
como votar, como os direitos femininos foram garantidos com intuito de integrar a
mulher ao mercado de trabalho e tratá-la como autônoma, e não como propriedade
masculina ou como indivíduo não considerado como sujeito, logo, Essy (2017, p. 7,
8) enfatiza:

No entanto, a violência doméstica, que antes era vista como natural e


legitimada pelos padrões sociais da época, atualmente se arrasta com o
passar dos anos e ganhou evidência apenas com a imposição da vontade
feminina diante da opressão sofrida dentro do ambiente doméstico.
Ademais, a violência doméstica ainda é naturalizada socialmente, de
diversas formas e em diversos ambientes, através da sujeição da mulher à
inferioridade dentro do próprio ambiente doméstico ou de trabalho e ao
tratar o corpo feminino como objeto sexual, como acontece diariamente
quando a grande maioria das mulheres sofre assédio, tanto na rua como no
ambiente de trabalho. Tais situações se estabelecem como agravantes no
atual contexto histórico em que vivemos, visto que as alterações nos papéis
preestabelecidos para os gêneros não garantiram a adequação e aceitação
social diante dessas mudanças ocorridas, motivo que colabora para a
legitimação da violência sofrida pelas mulheres com o intuito de devolvê-las
ao lugar e aos papeis que desempenhavam no século passado.

Consideramos como relevante a breve discussão para entrarmos no debate


a respeito da violência contra a mulher na sociedade brasileira, pois devemos
considerar o fato da mulher ainda ser vista como submissa está entranhada com o
processo histórico a qual passamos e ainda vivemos, logo, o patriarcalismo
conservador não consegue ver de bom modo essa transformação que está
ocorrendo.
A partir da referência do texto “Participando do Debate sobre Mulher e
Violência”, Santos e Izumino (2005, p. 4), enfatizam que a violência contra as
mulheres é resultado de uma ideologia a qual tem a intenção, mesmo sem querer,
de colocar em prática a dominação masculina, essa dominação que é produzida e
reproduzida pelos homens, como também pelas próprias mulheres, acreditamos que
muitas vezes, essas últimas, reproduzem até mesmo de forma inconsciente, ainda
assim, ainda ressaltam que “A violência contra as mulheres resulta da socialização
machista. “dada sua formação de macho, o homem julga-se no direito de espancar
29

sua mulher. Esta, educada que foi para submeter-se aos desejos masculinos, toma
este “destino” como natural”.
A partir da breve discussão acreditamos que o debate a respeito da violência
contra a mulher no Brasil deve ser considerada e levada em questão, pois
observamos muitas situações de violência que são cometidas contra as mulheres,
porém, em certos casos o agressor sai impune, todavia, em nossa concepção,
apesar das muitas conquistas que as mulheres conseguiram, em certos ramos da
sociedade, ainda não são reconhecidas e respeitadas como deveriam, não há uma
valorização pela própria mulher.
Ademais, para darmos continuidade a esse debate é importante
ressaltarmos que no próximo tópico nossa ênfase será violência de gênero contra as
mulheres, a mulher era vista como aquela quem deveria obedecer, ser passiva em
suas ações, deveria somente acatar, e não agir, e caso contrariasse o homem, seu
companheiro/esposo, poderia ser punida, como se fosse algo natura. Tais situações
encontramos atualmente, pois isso destacarem a violência de gênero contra a
mulher no tópico seguinte.

1.2. Violência contra a mulher – mapeando o fenômeno

O interesse teórico no debate é realizar uma articulação entre gênero,


classe, e raça/etnia, pois atualmente temos a concepção de que estão claras as
diferenças entre homens e mulheres, no entanto, para as diferenças entre homens
brancos e negros e mulheres brancas e negras, o que acaba mobilizando raça e
gênero para explicar desigualdades salariais ou diferenças quanto ao desemprego.
A discussão sobre gênero, classe, raça/etnia Hirata (2014) leva-nos a
discussão sobre interseccionalidade, pois traz para o debate o fato de mulheres
brancas e negras terem trajetórias duradouras nas ocupações de menor prestígio e
de más condições de trabalho, a exemplo do emprego doméstico, atividade em que
as mulheres negras são mais numerosas, ambas estão também representadas no
que diz respeito ao desemprego.
Compreendemos a necessidade e a importância do debate sobre
interseccionalidade nesse trabalho, pois a temática exige uma visão crítica na
30

discussão de gênero, haja vista que se não houvesse uma discussão mais ampla a
respeito, a mulher estaria e seria submissa ao homem, não teria vez no cenário
político, econômico, etc., ou seja, são questões que devem ser tratadas através de
políticas públicas que os deem auxílio.
A interseccionalidade é um debate no qual é considerado duas ramificações
nas quais a sociedade não consegue enxergar e é considerado natural à mulher, ser
submissa, pelo fato de haver aspetos de superioridade entre os indivíduos, no caso
da mulher, além disso, não teria seus direitos garantidos, e conforme (HIRATA,
2014, p. 61-62):

[...] a ideia de um ponto de vista próprio à experiência e ao lugar que as


mulheres ocupam cede lugar à ideia de um ponto de vista próprio à
experiência da conjunção das relações de poder de sexo, de raça, de
classe, o que torna ainda mais complexa a noção mesma de “conhecimento
situado”, pois a posição de poder nas relações de classe e de sexo, ou nas
relações de raça e de sexo, por exemplo, podem ser dissimétricas. Assim,
um primeiro ponto para aprofundamento é a análise do conceito de
“conhecimento situado” ou de “perspectiva parcial” da epistemologia
feminista a partir dos conceitos de interseccionalidade ou de
consubstancialidade. Ambas as conceitualizações partilham, a meu ver, do
pressuposto central da epistemologia feminista, segundo o qual “as
definições vigentes de neutralidade, objetividade, racionalidade e
universalidade da ciência, na verdade, frequentemente incorporam a visão
do mundo das pessoas que criaram essa ciência: homens – os machos –
ocidentais, membros das classes dominantes” (Lowy, 2009, p. 40) e,
podemos acrescentar, brancos.

Entretanto, Hirata (2014) enfatiza que a temática da interseccionalidade foi


pontuada o uso do termo para designar interdependência das relações de poder de
raça, sexo, e classe, sendo desenvolvida nos países anglo-saxônicos a partir da
herança do “blackfeminism” (p. 62), nos anos de 1970, cuja crítica coletiva se voltou
de maneira radical contra o feminismo branco, de classe média, heteronormativo.
A interseccionalidade tem seu foco nas intersecções da raça e do gênero,
abordando parcial ou perifericamente classe ou sexualidade com intuito de contribuir
para estruturação de suas experiências, especialmente as mulheres de cor, logo, a
proposta da temática é levar em conta as múltiplas fontes de identidades, e como
ressalta Hirata (2014, p. 62):

[...] Crenshaw propõe a subdivisão em duas categorias: a “intersecciona-


lidade estrutural” (a posição das mulheres de cor na intersecção da raça e
do gênero e as consequências sobre a experiência da violência conjugal e
do estu-pro, e as formas de resposta a tais violências) e a
“interseccionalidade política” (as políticas feministas e as políticas
31

antirracistas que têm como consequência a marginalização da questão da


violência em relação às mulheres de cor) (cf. Idem, ibidem).

Ademais, Hirata (2014) Apud Bilge (2009) ressalta:

A interseccionalidade remete a uma teoria transdisciplinar que visa


apreender a complexidade das identidades e das desigualdades sociais por
intermédio de um enfoque integrado. Ela refuta o enclausuramento e a
hierarquização dos grandes eixos da diferenciação social que são as
categorias de sexo/gênero, classe, raça, etni-cidade, idade, deficiência e
orientação sexual. O enfoque interseccional vai além do simples
reconhecimento da multiplicidade dos sistemas de opressão que opera a
partir dessas categorias e postula sua interação na produção e na
reprodução das desigualdades sociais (Bilge, 2009, p. 70).

Sendo assim, devido complexidade da categoria interseccionalidade


consideramos que essa tem fortes rebatimentos em outras categorias que são
transversais a que propormos em nossa pesquisa, e essa passa a ser relevante,
pois nosso intuito é realizar um debate aprofundado a respeito das categorias
imersas na temática apresentada, entre essas, gênero.
Nesse momento realizaremos uma discussão sobre a constituição da
categoria gênero, fazendo um breve contexto histórico Piscitelli (2008) ressalta que
foi a partir da segunda metade da década de 1970 que o conceito gênero foi
pensado, e esse era compreendido como uma construção cultural e arbitrária,
variável, de aspectos vinculados ao sexo biológico, tido como natural e imutável,
tinha se difundido de maneira extraordinária. Esse conceito, pensado no marco da
distinção entre sexo e gênero, era considerado como um avanço em relação à
categoria mulher.
No final da década de 1980 começou a serem questionados os pressupostos
na discussão que existe entre a distinção sexo/gênero, e um dos motivos fora a
fixidez e unidade que essa distinção conferia às identidades de gênero, ao formular
a existência de uma base biológica imutável que dividia a humanidade em dois
sexos, em dois gêneros, Piscitelli (2008).
Conforme Piscitelli (2008) fora colocado um debate pelas feministas que
tratavam sobre a situação de subordinação das mulheres usando tal conceito, pois
esse era taxado, pensado como alternativa possível ao trabalho com conceito de
Patriarcado, logo, tais discussões chama atenção pra o fato de que a compreensão
do gênero no ocidente está relacionada não apenas na relação entre os sexos, mas,
32

sobretudo numa ideia mais geral relacionada ao fato de como a cultura é diferente e
superior a natureza.
Destarte, compreendemos que a constituição e debate sobre a categoria
gênero recaem não somente para distinguir o que é masculino e feminino, ou seja,
vai para uma discussão na qual tentam enquadrar de forma natural e obrigatória a
cultura masculina, todavia, percebemos que essa discussão deve ser realizada de
forma minuciosa, pois se formos nos deixar levar pelos ideais tradicionais os
costumes do patriarcado sempre prevaleceram em todos os espaços.
Piscitelli (2008) enfatiza que as diversas formas de combater a dominância
masculina nos espaços de debate é importante pois, houve uma universalidade da
hierarquia e da subordinação feminina em sistemas nativos de moralidade e de
concepções nativas de poder e político.
Entretanto, percebemos a importância em pensar gênero, pois esse não
deve ser compreendido como mecanismo segundo o qual se produzem e
naturalizam noções do masculino e feminino, mas também como o mecanismo
mediante o qual esses termos são desconstruídos e desnaturalizados.
Sendo assim, é importante a radicalidade de sua formulação, pois, consiste
em pensar gênero como um fazer, como uma atividade que é performada para
alguém, mesmo que esse alguém seja inteiramente imaginário.
A discussão propõe afastar o gênero de ideias como a relação entre
masculinidade e feminilidade, pois o binário masculino/feminino não esgotaria o
campo semântico do gênero, vale a pena considerar em um diálogo múltiplo com
aspectos do pensamento feminista, do pensamento queer e com os movimentos da
Nova Política do Gênero que reivindicam direitos sexuais, incluindo os direitos de
pessoas intersex e trans.
O debate de gênero é forte e tem sua complexidade na qual envolve
diversas gamas da sociedade nas quais merecem destaque, porém, como não
conseguiremos abordar todas, focaremos brevemente no debate sobre
interseccionalidade na qual segundo Hirata (2014, p. 62) “aponta o uso desse termo,
pela primeira vez, para designar a interdependência das relações de poder de raça,
sexo e classe.”
De acordo com Hirata (2014, p. 62) a categoria da interseccionalidade, tende
fazer uma discussão com intuito de enfatizar:
33

[...] sobretudo as intersecções da raça e do gênero, abordando parcial ou


perifericamente classe ou sexualidade, que “podem contribuir para
estruturar suas experiências (as das mulheres de cor)” (Idem, p. 54). A
interseccionalidade é uma proposta para “levar em conta as múltiplas fontes
da identidade”, embora não tenha a pretensão de “propor uma nova teoria
globalizante da identidade” (Idem, ibidem). Crenshaw propõe a subdivisão
em duas categorias: a “interseccionalidade estrutural” (a posição das
mulheres de cor na intersecção da raça e do gênero e as consequências
sobre a experiência da violência conjugal e do estupro, e as formas de
resposta a tais violências) e a “interseccionalidade política” (as políticas
feministas e as políticas antirracistas que têm como consequência a
marginalização da questão da violência em relação às mulheres de cor) (cf.
Idem, ibidem).

As relações de gênero estão relacionadas a todo tipo de violência que é


praticada contra as mulheres, pois compreendemos que na estrutura patriarcal
veiculam-se normas e padrões sociais queinferiorizam e naturalizam práticas
violentas contra as mulheres.Logo, sobre o processo histórico de gênero Borges
(2009, p.18) ressalta:

O gênero foi originalmente usado em termos linguísticos, para descrever as


regras formais que dizem respeito ao feminino e ao masculino, podendo ser
analisado como um fenómeno cultural, social e linguístico. Na sequência
domovimento feminista (que vinha emergindodesde a altura da Revolução
Francesa) nos anos 70, as feministas, começaram a usar o conceito de
género,para se referirem à organização social do relacionamento entre
sexos. Os movimentos organizados de mulheres, remontam ao séc. XVIII e
a preocupação vigente, na altura, entre as feministas prendia-se com a sua
emancipação relativamente a um estatuto civil subordinado. As mulheres
começam a entrar no domínio político, não pela sua representação efectiva
na tomada de decisão, mas pela pressão que conseguiram desenvolver
nacamada política. A primeira vaga de feminismos preocupou-se com a
regularização jurídica da posição das mulheres na conquista de direitos
iguaise com a defesa/valorização das diferenças.

Vale ressaltar que Scott (1989), uma das primeiras feministas a se


debruçarsobre o debate e formuladora de gênero como categoria de análise, traz
uma contundente definição subdividindo-a em duas partes: sendo cada uma
constituída devárias outras subpartes interdependentes entre si, embora
comanálises separadas.
Scott (1989) enfatiza que o gênero enquanto categoria é resultado da ligação
entre duas afirmações: a primeirarefere-se ao gênero como elemento norteador das
relações sociais com base nasdistinções entre os sexos. Sobre esta primeira
constatação, a autora discorre acerca dealguns elementos-chave: simbologias
culturais que culminam em representações míticas contraditórias.
A segunda é a normatização de conceitos que mostram interpretações de
símbolos. A escola, igreja, família e Estado são as principais propagadoras das
34

normas que ditam comportamentos de homens e mulheres. Nesta segunda


afirmação insere-se aconcepção de gênero como constituidor primário das relações
de poder, (SCOTT,1989).
É explicável, portanto, à distribuição assimétrica de funções e atribuições
entre homens e mulheres, pois de acordo com as relações que o feminismo propõe
compreendemos que para além de direitos iguais, suas pretensões tangenciam o
fato da mulher deixar de ser vista apenas como aquela que vai cuidar da casa e dos
filhos, ou seja, buscam seus espaços em outras áreas da sociedade. Como ressalta
Borges (2009):

A segunda vaga de feminismos, por volta dos anos 60 (e que se prolonga


mais ou menos até meados dos anos 80) inicia o percurso da entrada
dasmulheres no mercado de trabalho, a luta pela regulamentação do
divórcio epela utilização de métodos contraceptivos. Segundo Neves
(2008:38), “a segunda vaga do feminismo diz respeito à fase do
ressurgimento da expressão feminista em 1960 e 1970, muito marcada pelo
protesto em tornodas desigualdades sofridas pelas mulheres, com especial
predominância nas áreas da família, da sexualidade e do trabalho.” Nesta
altura, as feministas criaram o conceito de género para insistir na existência
de uma distinção social, baseada no sexo e para se posicionarem pela
rejeição do determinismo biológico (Anselmi& Law, 1998: 18). Mulheres e
homens foram diferenciados/as tendo por base as suas características
físicas, o que começoua partir dos anos a ser insuficiente para caracterizar
as relaçõessociais.
(BORGES, 2009, p. 18).

Borges (2009, Apud WINSTEAD et al., 1997, p. 5) argumenta que há vários


modos de analisar a categoria gênero. De acordo com o mesmo:

Existem várias formas de analisar, observar, estruturar, construir e


reconstruiro gênero, contudo, é preponderante refleti-lo como um conceito
dinâmico namedida em que, atravessa e é atravessado, por outras
categorias tradicionalmente discriminadas, como são a classe social, a
etnia, a pertença a dada comunidade religiosa, etc. Assim, o género encerra
em si dimensões subjetivas, apesar de estruturantes, podendo analisar-se
duas dimensões nasquais são observadas as diferenças de género nos
relacionamentos; a primeira dimensão reporta-se à explicação estrutural vs.
explicação individual e asegunda dimensão inclui a explicação socialização
vs. explicação biológica. No que concerne à explicação estrutural, esta diz
respeito à ideia de que onosso comportamento é determinado por forças
exteriores, constrangimentos, ou seja, as exigências situacionais e
expectativas ocasionam as diferenças de género. Por isso, o facto de as
mulheres serem vistas primariamente em certos países, nos papéis de mãe,
professora, e os homens noutros, como presidente e técnico afeta as
expectativas em relação a homens e mulheres eàs suas características. A
explicação individual ignora o meio em que cada pessoa está inserida,
apontando para que o nosso comportamento é influenciado pelostraços e
características pessoais, assumindo que, porque mulherese
Homenssãobiologicamente diferentes terão que, consequentemente, ter
35

comportamentos diferentes (WINSTEAD et al., 1997, p. 5, Apud, BORGES,


2009).

No Brasil, a maior preocupação em desvendar a construção de papéis


masculinos e femininos e como eles proporcionaram uma distribuição desigual de
poderes, teve início na década de 70. Esse período é importante, pois, foram os
movimentos feministas que reivindicavam maior atenção por parte do poder público
em relação às agressões físicas e psicológicas contra as mulheres. O méritotambém
se deveà receptividade dessa temática pelaacademia, porém, foi a partir da década
de 80 que a temática de gênero ganha visibilidade em estudos nas universidades.
Desse modo, faz sentido o argumento de Campos (2010, p. 3) quando
afirma que:

A discussão do conceito de gênero tem contribuído para um melhor


entendimento da opressão específica da mulher e do conjunto das pessoas
que vivem em sociedade. Tendo como compreensão a superação da fase
de simples constatação da opressão da mulher para a tomada de
consciência daexistência de relações opressoras de sexo/gênero,
permitindo evidenciar que,além de exploração entre as classes sociais,
existe uma divisão sexual, também desigual.

Esta superação representou um salto qualitativo no que concerne ao


entendimento de que existe outra face de exploração presente no capitalismo: a
desigualdade sexual, que está em todos os setores da sociedade e esta tende a
naturalizá-la. Os seres humanos sempre condicionaram socialmente os fenômenos
naturais, sendo difícil separar o que é natural do que foisocialmente construído.
Entretanto, não basta conhecer somente este processo, deve-se conhecer o
contrário que é a socioculturação dos fenômenos naturais. Portanto, quando se
afirma que é comum a mulher ocupar o espaço doméstico, deixando livre o espaço
público ao homem, está se naturalizando um resultado histórico. (SAFFIOTI, 1987).
Mesmo que a categoria gênero seja utilizada para estudos referentes às
mulheres entende-se que há interdependência entre as duas questões, Osterine
(2001, p. 18) acredita que “gênero sublinha o aspecto relacional entre homens e
mulheres, ou seja, só poderá adquirir real sentido se recuperar aexperiência
conjunta de homens e mulheres em toda sua complexidade”. Por meio desta
afirmativa, é notável a preocupação da autora em não apenas mostrar o caráter
histórico do processo de submissão e dominação da mulher pelohomem. É preciso
36

investigar com o mesmo afinco, a construção da identidade de gênero dos homens e


como surgiu amentalidade de dominador, o que nos parece bastante plausível.
Este termo, nada mais é do que uma modalidade das relações sociais,
tendocomo núcleo principal a subordinação do gênero feminino pelo masculino,que
por sua vez sempre esteve presente no decorrer da história da humanidade e
permeando diferentes culturas. Para Osterine (2001, p. 119) implica em:

(...) captar a trama das relações sociais, assim como as históricas


transformações por ela experimentadaatravés dos diferentes sociais
nosquais, as relações de gênero têm lugar. As relações de gênero, portanto,
não sãoconsequênciasda existência de dois sexos, macho e fêmea, o vetor
caminhaem sentido contrário, ou seja, do social para o indivíduo. Os
indivíduostransformam-se em homens e mulheres por intermédio
dasrelações de gênero.

Embora ainda esteja presente a educação diferenciada entre os sexos em


algumas culturas, por exemplo, observa-se atualmente mudanças significativas na
estrutura familiar que consequentemente afetaram os papéis femininos sobretudo no
Ocidente. Parte destas mudanças deve-se ao ingresso da mulher no mercado de
trabalho e o aumento de sua escolaridade.
Com isso, as mulheres de hoje diferenciam-se da geração de suas mães e
de suas avós pelo fato de abdicar do seu papel social de cuidar dos afazeres
domésticos.
Muitas almejam um emprego que lhes garantam não só a possibilidade de
prover as suas necessidades como também a forma de se livrar do julgo e
dependência financeirade um homem. No campo das relações amorosas, a provisão
afetiva ainda é vista como uma obrigação feminina, além da provisãodas
necessidades ligadas à reprodução diária como a alimentação, o vestuário etc.
Trata-se:

[...] de tarefas muitas vezes penosas que a mulher desenvolve para


agradar, uma vez que lhe ensinaram a tentar agradar sempre. O cuidar
feminino, isto é, realizar com carinho uma série de funções que beneficiem
o companheiro eos filhos, parece complementar o papel de provedor das
necessidades efetivamente materiais da família desempenhado pelo
homem. (SAFFIOTI, 1995, p. 86).

Assim como a família adquire “ares de santidade” não podendo ser


“maculada” por contextos ou situações que comprometam a sacralidade da
instituição, tais comodivórcios, alcoolismoeviolência doméstica etc., afigura da
37

mulher também passa a sermitificada. É comum no imaginário sexista o mito de uma


“supermulher” que como senão bastasse o papel doméstico, isto é, de cuidar da
casa e dos mais frágeis (crianças e idosos), ainda é estimulada a exercitar toda a
sua paciência, seu carinho e amor paracom o esposo e filhos, atributos
considerados como “naturais” ao sexo feminino, (SAFFIOTI, 1995).
Talvez seja por isso que a autora enfatize o caráter hercúleo detais tarefas,
porque foram designadas somente às mulheres e elas pagam um preço bastante
alto por isso. Mesmo com o ingresso da mulher no mercado de trabalho, essa
realidade nãomudou, haja vista que as atribuições são agora multiplicadas por três:
ater-se aos afazeres domésticos, cuidar do marido e dosfilhos (muitas vezes
somente dos últimos) e serem exímias profissionais. Conforme Alves (2004) a
seguir:

Os valores da sociedade machista condicionam que a mulher de sucesso


público seja também mãe e esposa de sucesso no lar. Nota-se que a
segunda condição é mais importante do que a primeira. A mulher que quer
valorizar sua carreira profissional, sem abandonar seu espaço de mãe e
esposa, vive emconstante conflito para conciliar a dupla tarefa. Esse conflito
não existe para os homens, pelo menos para aqueles que vencem a “guerra
dasobrevivência”. Muitas mulheres abrem mão do sucesso profissional
emnome do casamento, algumas escolhem, no mercado de trabalho,
carreiras tipicamente femininas, outras disputam espaço nas carreiras
masculinas, mas abdicam da progressão funcional para não comprometer
sua vida privada e sua feminilidade. Elas aceitam perder no mundo público
ou se dispõem a se limitar profissionalmente, em busca de ganhos no
mundo privado para não romper a hierarquia dopredomínio masculino que,
em geral, estabelece: Homem mais alto com mulher mais baixa/Homem
mais velho com mulher mais nova/Homem mais rico com mulher mais
pobre. (ALVES, 2004, p.19).

No tocante à sexualidade, nota-se a existência de uma censura de seu


exercício pelas mulheres, como se fosse determinado um tempo de vida para
vivenciá-laplenamente. Além disso, elas foram educadas:

[...] num código de sexualidade ainda muito rígido –o que é próprio ou impróprio;
o que é natural, agradável, normal, ou ao contrário: danoso, excessivo,
insultuoso; aquilo que é passível de admiração, aceitação ou, inversamente, de
repulsa, negação. Submeteram-se a padrões de sexualidade claros ou implícitos
quanto à regulamentação das relações sexuais indesejáveis –entre camadas
sociais, raças ou faixas etárias diferentes.
Nestas últimas, só era admitido o contato do homem mais velho com mulher
mais jovem –esta era a “teúda e manteúda” e muitas vezes tolerada pelaesposa
que já havia perdido o interesse sexual (ou nuncao tivera, seja pela estimulação
inadequada do marido, seja por sua própria repressão sexual), além de
pressentir que a outra, embora bela e atraente, seria um objeto facilmente
descartável quando a paixão do marido declinasse [...] (NEGREIROS, 2004,
p.81).
38

No tocante a socialização masculina, enfatiza-se a conquista do espaço


público por meio da obtenção de sucesso nos estudos, nacarreira profissional, em
áreas destinadas à produção. Os sentimentos são tolhidos, como prerrogativa para
ser “macho” de verdade, por isso, frases como: “homem não chora” são ditas desde
criança. A masculinidade é costumeiramente testada em todos os grupos sociais e
em todas as fases da vida dos homens. Para não perder a reputação no grupo e não
ser chamado de “fraco” ou “afeminado”, na adolescência, é comum a cobrança de
uma iniciação sexual precoce apartada da afetividade como requisito para o
ingresso na vida adulta, não importando com quem seja e quantas parceiras o
garoto tenha. Enquanto nas mulheres, a feminilidade não é colocada em xeque pela
sociedade, sendo coroada pelo início do período menstrual (SANTOS, 2010).
Na vida adulta, a virilidade masculina ainda é colocada à prova por meio da
conquista de inúmeras parceiras e da não rejeição a uma investida feminina. Neste
ponto, a infidelidade masculina, muitas vezes, é consentida, como se o
inconformismo com um relacionamento monogâmico fosse “natural porque é coisa
de homem”. Agindo deste modo, torna-se distante da “imagem de homem
comunicador de seus sentimentos e emoções, pensando estar se livrando do
estigma de homem efeminado’ ou ‘homemmole’” (SANTOS, 2010, p. 63).
A agressividade também faz parte desse processo a fim de demonstrar
autoridade tanto na esfera pública como na privada. Na visão de Osterine (2001,
p.127), este atributo é esperado dos meninos, além da tomada de iniciativa “para
enfrentar os fatos corriqueiros, o constante acerto nas investidas sexuais, a escolha
de caminhos característicos de pessoas fortes e vencedorasos provedores”.
No âmbito privado, a conduta agressiva é bastante cobrada no que tange
aos relacionamentos afetivos, ochamado “papel de homem” se traduz em atitudes
violentas para com as suas mulheres e filhos sob o pretexto de “discipliná-las” e
demonstrar autoridade sobre seus corpos esuas vidas.
Mas os homens pagam um ônus pelos privilégios legitimados na construção
de sua identidade de gênero. Embora não seja tãoalto se comparado à socialização
repressiva que as mulherespassam. O fato é que de uma forma ou de outra, os
homens também sofrem as consequências desta cultura sexista. O direito de errar e
muitomenos o de perder é pouco tolerado para o homem, pois seriam indícios de
39

fraqueza,assim ele está acostumado mais com a potência do poder, enquanto a


mulher convive com a impotência deste. (SAFFIOTI, 2004).
Assim sendo, em situações de desemprego, é bastante comum o sentimento
de derrota por parte do homem, uma vez que o fato de não obter êxito na conquista
de um emprego significa um fracasso perante a sociedade, o que acaba atingindo
fulminantemente sua virilidade, na medida em que é socializado para prover
financeiramente o sustento da casa e da família. Umadas consequências desta
situação é o vício do alcoolismo, um dos principais estopins para a violência
doméstica. Sobre esta última, entende-se que a agressão de um homem contra a
mulher revela contraditoriamente a impotência do poder masculino (SAFFIOTI, 2004,
p. 51), uma vez que além de não conseguirestabelecer uma maneira dialógica de
resolver possíveis desentendimentos no relacionamento afetivo, representa também
certa perda de poder em relação à função de provedor e aocontrole da vida de sua
parceira, principalmente quando ocorre o rompimento da relação.

1.3. Histórico das políticas públicas no combate à violência contra as


mulheres no Brasil

Nossa discussão nesse tópico se realizará a partir da contextualização


histórica das políticas públicas para proteção e defesa dos direitos das mulheres.
Sendo assim, a normatização dos direitos humanos da mulher no mundo
contemporâneo é caracterizado pela ocorrência de diversos acontecimentos, como a
internacionalização da economia, a governança global e o reconhecimento dos
direitos humanos, que ganham destaque em resposta às atrocidades cometidas na
Segunda Guerra Mundial pelo nazismo.
A ocorrência de conflitos internacionais traz a necessidade de se estabelecer
instrumentos reguladores pelo Direito Internacional, o qual possa reconstruir os
direitos humanos rompidos com a Segunda Guerra, objetivando a manutenção da
paz e a prevenção da recorrência de tamanhas barbaridades. Portanto, essa fase
marcou a evolução histórica dos direitos humanos como paradigma e referencial
ético para orientar a ordem internacional contemporânea, por extrair da teoria a sua
40

concepção e levá-la efetivamente à esfera da luta política pela proteção desses


direitos em âmbito internacional.
A respeito desse ponto concorda Piovesan (2009, p. 120-121) quando expõe
que:

[…] a internacionalização dos direitos humanos constitui, assim, um


movimento extremamente recente na história, que surgiu a partir do pós-
guerra, como resposta às atrocidades e aos horrores cometidos durante o
nazismo. Nesse contexto, desenha-se o esforço de reconstrução dos
direitos humanos, como paradigma e referencial ético a orientar a ordem
internacional contemporânea. Se a Segunda Guerra significou a ruptura
com os direitos humanos, o pós-guerra deveria significar sua reconstrução.
[…] O processo de internacionalização dos direitos humanos – que, por sua
vez pressupõe a delimitação da soberania estatal – passa, assim, a ser uma
importante resposta na busca da reconstrução de um novo paradigma,
diante do repúdio internacional às atrocidades cometidas no holocausto.

Inquietações e percepções de ordem pública levaram os governos a


proposição de alternativas para estas demandas. Dessa forma, o século XX foi
definitivo para o reconhecimento de um amplo leque de direitos humanos,
responsável por profundas modificações na conduta dos diversos segmentos sociais
em diferentes regiões do planeta. Nesse panorama é que se desenvolveram os
primeiros organismos de proteção internacional dos direitos Humanos.
De acordo com Pereira e Quadros (1993) a internacionalização dos direitos
humanos significou uma evolução do clássico para o moderno, possibilitando a
formação de um aparelho de proteção destes direitos em nível internacional.
Sob o prisma da reconstrução dos direitos humanos, no pós-guerra, fatores
de absoluta relevância contribuíram para o fortalecimento da internacionalização dos
direitos humanos, sendo um dos mais importantes a promulgação da Carta da
Organização das Nações Unidas (ONU) assinada por 51 países em 26 de junho de
1945, mudando completamente a perspectiva dos direitos fundamentais no cenário
global, tornando visíveis as instituições internacionais.
Neste panorama dos direitos humanos e sua internacionalização, a ONU
tem a função fundamental de lutar pela efetividade dos direitos do homem. Sobre a
ONU, Buergenthal, citado por Piovesan (2009, p.135), argumenta que:

A Organização tem, ao longo dos anos, conseguido tornar claro o escopo


da obrigação dos Estados-membros em promover os direitos humanos,
expandindo estes e criando instituições, com base na carta da ONU,
destinadas a assegurar o cumprimento dessas obrigações mediante
resoluções que exigem dos estados que cessem com as violações com
esses direitos, especialmente, quando configurar 'um consistente padrão de
41

grandes violações, fortalecendo a Comissão de Direitos Humanos da ONU


e seus órgãos subsidiários para que estabeleçam procedimentos para
apreciar as denúncias de violações.

Posteriormente, a Assembleia Geral da ONU em 10 de dezembro de 1948,


aprovou a Declaração Universal dos Direitos Humanos, objetivando formar uma
ordem pública mundial, sob uma nova interpretação em relação aos direitos
humanos edificada no respeito à dignidade da pessoa humana, com a adoção de
princípios fundamentais para garantir a vida, a liberdade e a igualdade entre os
seres humanos. O preâmbulo dessa Declaração assinala que:

[…] os povos reafirmaram, na Carta, sua fé nos direitos humanos


fundamentais do homem, na dignidade e no valor da pessoa humana, e na
igualdade de direitos do homem e da mulher, e decidiram promover o
progresso social e melhores condições de vida em uma liberdade mais
ampla.

Apesar da Declaração dos Direitos Humanos pautar-se na igualdade de


direitos entre homens e mulheres, por um longo tempo o seu tratado não foi voltado
para equiparar direitos entre os sexos, acarretando inúmeras violações dos direitos
humanos das mulheres.
Vale ressaltar um ponto muito importante o qual nos referimos as
contribuições dos movimentos feministasfrente ao quadro de violações dos direitos
fundamentais e de omissões da justiça. Ativistas dos movimentos feministas
demonstram uma diversidade de pautas discutidas e de lutas empreendidas por
elas, sobretudo a partir do século XVIII e deram grande visibilidade em nível mundial
a temática da violência contra mulher. Já século XX, desde a década de 60 essas
mobilizações enfocaram principalmente as denúncias das violências cometidas
contra mulheres no âmbito doméstico, enfatizando sua preocupação com a
ampliação dos direitos humanos das mulheres, bem como o exercício de sua
cidadania, mostrando que o privado era público e assim deveria ser também objeto
de políticas públicas assegurando o respeito à dignidade humana e a uma vida sem
violência (Costa, 2007, p. 52).
Por um longo período os limites do privado legitimaram a gravidade das
violências sofridas por mulheres, ilustradas por ditados populares como o “em briga
de marido e mulher, ninguém mete a colher” (Saffioti, 1999). A década de 70 se
configura também como o momento de muitas mulheres ocuparem as cadeiras das
universidades de forma expressiva. A saída das mulheres para o mercado de
42

trabalho e a entrada para o meio universitário ocasionaram mudanças na sociedade


e nos assuntos abordados no meio acadêmico, possibilitando a elaboração de
pesquisas que forneceram mais subsídios para as discussões acerca das
desigualdades e violências entre homens e mulheres (Narvaz; Koller, 2006). Sobre a
entrada no meio acadêmico Rago (1998) comenta:

Progressivamente, a cultura feminina ganhou visibilidade, tanto pela simples


presença das mulheres nos corredores e nas salas de aula, como pela
produção acadêmica que vinha à tona. Histórias da vida privada, da
maternidade, do aborto, do amor, da prostituição, da infância e da família,
das bruxas e das loucas, das fazendeiras, empresárias, enfermeiras ou
empregadas domésticas, fogões e panelas invadiram a sala e o campo de
observação intelectual ampliou-se consideravelmente. O mundo acadêmico
ganhava, assim, novos contornos e novas cores.

No tocante as obras brasileiras produzidas no campo jurídico nos anos 70 a


80 com o viés de uma perspectiva feminista, Severi (2017) destaca:

Nesse sentido, destacamos as obras de Silvia Pimentel, Evolução dos


direitos da mulher: norma, fato, valor;publicada em 1978, e a de Branca
Moreira Alves, Ideologia e feminismo: a luta da mulher pelo voto no Brasil,
publicada em 1980.

Nesse contexto de produções, a Fundação Perseu Abramo em 2001,


publicou uma das primeiras pesquisas que denunciaram a gravidade das violências
sofridas pelas mulheres. Revelou que a cada 15 segundos uma mulher é espancada
no Brasil, sendo em 70% dos casos perpetradas por parceiros ou ex-parceiros
conjugais. Na segunda pesquisa da Fundação realizada 10 anos após a primeira,
tiveram dados muito semelhantes ao anterior.
A semelhança de características dos movimentos feministas que emergiram
na Europa e nos Estados Unidos nos anos 60, os movimentos feministas surgiram
no Brasil nos anos 70, paralelamente à crise econômica e a ditadura militar no país.
Nesse cenário de instabilidade econômica e política do país os movimentos
feministas reivindicavam por políticas públicas que deveriam coibir tanto a violência
do Estado quanto a violência de outros poderes sociais, como demonstra Silva
(1992, p.91):

No cenário atual de lutas feministas, têm-se constituído iniciativas


importantes para alteração da condição feminina na sociedade brasileira.
Dentre elas destaca-se a criação de organismos governamentais com o
objetivo de promover políticas públicas positivamente discriminatórias em
relação à mulher.
43

As transformações que o movimento feminista brasileiro sofreu nas décadas


de 1970 a 1980 foram bastante significativas, com a Lei da Anistia, em 1979 que
marcou o retorno dos exilados políticos, dentre estas muitas feministas, ensejaram
diretamente no processo de redemocratização da política. Para Goldberg (1987),
voltaram com ideias e experiências bastantes diferenciadas das que viveram no
Brasil, trazendo diversos elementos para os debates sobre a relação entre
feminismo e luta de classes, a autonomia, o separatismo e o pluralismo.
Uma das mais significativas vitórias do feminismo brasileiro foi a criação do
Conselho Nacional da Condição da Mulher (CNDM), em 1984, onde foi lançada uma
campanha nacional para a inclusão dos direitos das mulheres na nova carta
constitucional. Segue-se posteriormente em 1985, a criação da primeira Delegacia
Especializada no Atendimento à Mulher, a cidade de São Paulo. Além da criação
pelo movimento feminista de organizações independentes como as ONGs na
década 1990 em prol dos direitos das mulheres e a rede de atendimento à mulher
fornecida por essas ONGs até os dias atuais.
Esse esforço conjunto culminou na Constituição de 1988, caracterizando um
marco fundamental para a institucionalização dos direitos das mulheres no Brasil,
pois foi somente através dela que se reconheceu a igualdade de direitos de homens
e mulheres, seja na vida pública e na vida privada, bem como incorporou em seu
texto, inúmeros outros direitos individuais e sociais das mulheres.
Assim como estabelece o inciso I, do art. 5, da CF/88:

Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza,


garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a
inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à
propriedade, nos seguintes termos:
I – homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações, nos termos
desta Constituição;

Importante ressaltarmos a respeito da criação das Delegacias


Especializadas de Atendimento à Mulher, Mello (2017) ressalta:

A criação das delegacias Especiais de Atendimento à Mulher, que também


podem ser chamadas de Delegacias de Defesa da Mulher, é fruto de
demandas feministas que atuaram ativamente na Assembleia Constituinte
de 1987 (MELLO, 2016). Destaca-se o pioneirismo do Brasil com este
modelo de delegacia que, posteriormente, serviu de modelo para vários
países da América Latina. A necessidade desse tratamento diferenciado
está fundamentada em um tratamento das vítimas pelos agentes de polícia
que muitas vezes constrangiam, humilhavam e revitimizavam a mulher que
escolhia fazer uma denúncia (Bandeira, 2014). O resultado dessa conduta
44

institucional era o descrédito da mulher nas autoridades policiais e a


subnotificação das denúncias de violência de gênero [...] as Delegacias da
Mulher são “instituições governamentais, resultantes da constituição de um
espaço público onde se articulou o discurso relativo aos direitos das
mulheres de receberem um tratamento equitativo quando encontram-se em
situações de violências denunciadas”. Pretende-se, através da
especialização, criar um ambiente acolhedor e favorável à mulher que retire
a violência sofrida das cifras negras, tão comuns quando se trata da
criminalidade contra a mulher. (MELLO, 2017, p. 223 e 224).

Ao lado dos avanços internos, a ação do movimento internacional de


mulheres impactou nas Nações Unidas e em outras instituições internacionais, como
a Organização dos Estados Americanos (OEA), produzindo importantes tratados,
convenções, declarações, recomendações e conferências que, além de
denunciarem as violações dos direitos humanos das mulheres, especialmente as
violências de toda espécie, resultaram em impactos positivos nas legislações de
inúmeros países, incluindo o Brasil.
No bojo dos debates de direitos humanos, foram efetivadas inúmeras outras
normas que visavam erradicar as discriminações contra mulheres.A partir da
primeira Conferência Mundial das Mulheres, realizada no México em 1975, foram
formuladas propostas e recomendações para melhorar a condição de vida das
mulheres no quadro mundial e de acesso as mesmas oportunidades que os homens.
Por conseguinte, em 1979, concretizando um compromisso assumido na I
Conferência Mundial e aprovado pela Assembleia Geral das Nações Unidas, foi
realizada a Convenção para a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação
contra a Mulher (CEDAW), constituindo um importante momento para o feminismo
mundial, onde se definiu o que constitui-se a discriminação contra a mulher,
estabelecendo uma ampla agenda de ações a fim de eliminá-la. Esta Convenção da
ONU definiu que:

[...] a discriminação contra a mulher viola os princípios da igualdade de


direitos e do respeito da dignidade humana, dificulta a participação da
mulher, nas mesmas condições que o homem, na vida política, social,
econômica e cultural de seu país, constitui um obstáculo ao aumento do
bem-estar da sociedade e da família e dificulta o pleno desenvolvimento das
potencialidades da mulher para prestar serviço a seu país e à humanidade.

Nas II e III Conferências Mundiais das Mulheres, celebradas


respectivamente, em Copenhague em 1980, e em Nairobi no ano de 1985, é que se
começa a tratar da igualdade de gênero no campo jurídico e na igualdade de
oportunidades na educação e no trabalho, definindo-se medidas a serem tomadas
45

para tal resolução. Posteriormente, no ano de 1993, em Viena ocorreu a Conferência


Mundial dos Direitos Humanos, que define os direitos humanos das mulheres e
meninas como inalienáveis e constituem parte integrante e indivisível dos direitos
humanos universais.
Desta Conferência, a resposta às denúncias dos movimentos de mulheres
em todo o mundo, culminou na elaboração da Declaração sobre a Eliminação da
Violência Contra Mulher, onde a OEA, em 1994 deu força de lei a essa Declaração,
por meio da Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência
contra a Mulher(Convenção Belém do Pará) que estabelece a violência contra as
mulheres como uma violação dos direitos humanos e liberdades fundamentais das
mulheres. Dessa forma a Convenção da OEA reconhece que:

[…] a violência contra as mulheres incluiu as violências física, sexual e


psicológica: a) que tenha ocorrido dentro da família ou unidade doméstica
ou em qualquer outra relação interpessoal em que o agressor conviva ou
haja convivido no mesmo domicílio que a mulher e que compreende, entre
outros, estupro, violação, maus-tratos e abuso sexual; b) que tenha ocorrido
na comunidade e seja perpetrada por qualquer pessoa e que compreende,
entre outros, violação, abuso sexual, tortura, maus-tratos de pessoas, tráfico
de mulheres, prostituição forçada, sequestro e assédio sexual no lugar de
trabalho, bem como em instituições educacionais, estabelecimento de
saúde ou qualquer outro lugar e que seja perpetrada ou tolerada pelo
Estado ou seus agentes, onde quer que ocorra.

Neste mesmo ano, acontece ainda a IV Conferência Mundial sobre


População e Desenvolvimento, celebrada no Cairo, que inseriu a discussão sobre os
direitos sexuais e reprodutivos. Já na IV Conferência Mundial da Mulher, realizada
pelas Nações Unidas, em Beijing em 1995, foram aprovadas uma Declaração e uma
Plataforma de Ação com a finalidade de fazer avançar os objetivos de igualdade,
desenvolvimento e paz para todas as mulheres, além de inseri-las neste debate.
Dentro desta discussão Ventura (2009, p. 39) destaca:

A importância dos documentos resultantes das Conferências Internacionais


realizadas no Cairo e em Pequim, para a agenda dos direitos humanos, foi
o reconhecimento da sexualidade e da reprodução como bens jurídicos
merecedores de proteção e promoção específicas, em prol da dignidade e
do livre desenvolvimento humano. Os documentos do Cairo e de Pequim,
ao reafirmarem o dever dos Estados na promoção, inclusive, da saúde
sexual, independentemente da saúde reprodutiva, como integrante não só
do direito à saúde, mas de outros direitos individuais e sociais fundamentais
para o exercício da sexualidade e reprodução, vêm favorecendo à
ampliação gradativa do conteúdo desses direitos, inclusive, dos direitos
sexuais.
46

Tanto as Convenções da ONU quanto da OEA definem violência e


discriminação, além de firmarem compromisso com os Estados-Membros, a
desenvolver políticas públicas capazes de erradicar essas violações de direitos
humanos nos espaços públicos e privados.
Dessa forma, leis municipais, estaduais e nacionais foram propostas, e
algumas até aprovadas, coibindo a violência contra a mulher e cobrando dos órgãos
públicos assistência adequada às mulheres vítimas de violência, mudando o quadro
desses graves indicadores sociais.
Contudo, vale ressaltar que o processo de desenvolvimento e criação de leis
que protegessem essas mulheres ocorreram ainda no século XX a partir de
definições dos direitos humanos que tiveram impacto na detecção e investigação da
violência de gênero contra a mulher. O Quadro 1 elaborado abaixo sintetizamos, de
modo breve, todas as convenções que se desenvolveram para combater a violência
contra a mulher:

Quadro 1 - Conferências Realizadas para Combater a Violência Contra a Mulher

1945 Carta das Nações Unidas.

1948 Convenção contra o genocídio.

1966 Pacto internacional dos direitos civis e políticos.

1966 Pacto internacional dos direitos econômicos, sociais e culturais.

1965 Convenção sobre a eliminação de todas as formas de discriminação


racial.
1979 Convenção para a eliminação de todas as formas de discriminação
contra a mulher.
1984 Convenção contra a tortura e outros tratamentos ou penas cruéis,
desumanas ou degradantes.
1989 Convenção sobre os direitos da criança.

1994 Convenção interamericana para prevenir, punir e erradicar a violência


contra a mulher - Convenção de Belém do Pará.

Fonte: Damasceno e Sousa (2017).

Inegavelmente, a Constituição Federal Brasileira de 1988 em conjunto com


Tratados e Convenções internacionais ratificados pelo Estado Brasileiro, realizou
47

inúmeras mudanças no quadro legislativo a partir da década de 90, no tocante à


violência cometida contra mulher e igualando homens e mulheres em direitos e
obrigações na vida pública e na vida privada.
Com a Lei 8.930/94, foi incluído em seu texto que o estupro passava a ser
considerado como um crime hediondo e inafiançável. Seguido pela Lei 9.099/95, que
instituiu os Juizados Especiais Criminais (JECrim) como responsáveis pelo
julgamento e execução de infrações penais de menor potencial ofensivo, tendo
como critério para tal definição a pena máxima não superior a dois anos.
Foi revogado com a Lei 9.520/97, o impedimento da mulher casada de
prestar queixa criminal sem o consentimento do marido. Também em 1997, por meio
da Lei 9.455 tipifica entre outras, em seu parágrafo primeiro, a violência psicológica
dentre os crimes de tortura. Segundo o seu Art. 1º, inciso II constitui crime de tortura:

Submeter alguém, sob sua guarda, poder ou autoridade, com emprego de


violência ou grave ameaça, a intenso sofrimento físico ou mental, como
forma de aplicar castigo pessoal ou medida de caráter preventivo;

Em 2004 a violência doméstica foi reconhecida trazendo a tona esta


modalidade de violência nunca antes tipificada. Com a Lei 10.886 é alterada a
redação do artigo 129 do Código Penal, como destaca o parágrafo 9º:

Violência doméstica – Se a lesão for praticada contra ascendente,


descendente, irmão, cônjuge ou companheiro, ou com quem conviva ou
tenha convivido, ou ainda prevalecendo-se o agente das relações
domésticas, de coabitação ou de hospitalidade: pena: detenção de seis
meses a um ano.

Ao longo dos anos as lutas intensas traçadas pelos movimentos feministas


em aliança a outros movimentos sociais nas décadas de 70, 80 e 90, foram
significativas no que diz respeito ao combate a violência contra as mulheres e a
busca da garantia de seus direitos. As reivindicações propostas por estes
movimentos originaram vários projetos de Lei. Todos foram significativos à
construção de regras para qualificar a violência contra a mulher no sentido de
erradicá-la.
Um deles foi o Projeto de Lei 4.559/04 de autoria do Poder Executivo, sendo
sua proposta transformada pela relatora, a deputada Jandira Feghali. O projeto
buscava gerar mecanismos de prevenção, assistência e proteção às mulheres em
situação de violência, através de alterações no procedimento das ocorrências
quando do atendimento da autoridade policial e no estabelecimento de amparo à
48

vítima, por meio do atendimento de uma equipe multidisciplinar. Finalmente, após


tramitar pela Câmara dos Deputados e pelo Senado Federal, foi aprovada em
Plenário e sancionada pelo Presidente da República, em agosto de 2006, nascendo
assim, a Lei 11.340, mais conhecida como Lei Maria da Penha.
Sendo assim, nesse momento do trabalho apresentaremos o Quadro 2, na
qual sintetizamos todas as leis e seus conteúdos até a criação da LMP:

Quadro 2 - Evolução Legislativa dos Direitos das Mulheres


Reconheceu a igualdade de direitos de homens e mulheres, seja
CF 1988 na vida pública e na vida privada, bem como incorporou em seu
texto, inúmeros outros direitos individuais e sociais das mulheres.
O estupro passava a ser considerado como um crime hediondo e
Lei 8.930/94
inafiançável.
Instituiu os Juizados Especiais Criminais, como responsáveis
Lei 9.099/95 pelo julgamento e execução de infrações penais de menor
potencial ofensivo.
Tipifica entre outras em seu parágrafo primeiro a violência
Lei 9.455/97
psicológica dentre os crimes de tortura.
Foi revogado o impedimento da mulher casada de prestar queixa
Lei 9.520/97
criminal sem o consentimento do marido.
É alterada a redação do artigo 129 do Código Penal, de forma
que a violência doméstica for praticada contra ascendente,
Lei 10.886/04 descendente, irmão, cônjuge ou companheiro, ou com quem
conviva ou tenha convivido, ou ainda prevalecendo-se o agente
das relações domésticas poderá ser aumentada até a metade.

Fonte: O autor, 2019.[M1]

Fazendo um breve histórico da lei 11.340: vida e luta de Maria da Penha, um


fator que em conjunto aos movimentos feministas contribuiu para sansão da Lei
11.340 foi a incansável luta de uma mulher chamada Maria da Penha Maia
Fernandes, que assim como muitas mulheres sofreu violência, mas que teve
coragem de romper o silêncio e denunciar seu agressor.
49

Maria da Penha Maia Fernandes, nascida no estado do Ceará, Bioquímica,


mãe de três filhas, à época com 38 de idade, vivenciou um caso emblemático de
violência doméstica e familiar contra mulher. Em 1983, sofreu duas tentativas de
homicídio praticadas por seu marido, o colombiano nacionalizado brasileiro, Marco
Antônio Heredia Viveiros, professor universitário de Economia. Na primeira tentativa,
em 29 de maio de 1983, ela recebeu um tiro enquanto estava dormindo que a deixou
paraplégica. A versão narrada por seu marido à polícia foi que ambos tinham sofrido
uma tentativa de assalto sem sucesso, mas que houve disparo de arma de fogo.
Maria da Penha foi hospitalizada e ficou internada durante quatro meses.
A segunda tentativa ocorreu, em outubro do mesmo ano, após seu retorno
do hospital. Maria da Penha foi aprisionada em sua própria casa e voltou a sofrer
novas agressões por parte do marido que tentou eletrocutá-la enquanto tomava
banho. Diante destes fatos, ela optou pela separação com o apoio da família e com
autorização judicial deixou o lar em companhia das filhas.
Em janeiro de 1984, ela denunciou seu agressor dando seu primeiro
depoimento à polícia. Em setembro do mesmo ano, o Ministério Público apresentou
ação penal contra Heredia. Porém só em outubro de 1986 que Juíza da 1ª Vara
aceitou a denúncia formalizada pela mesma.
Heredia foi a Júri duas vezes. A primeira em 4 de maio de 1991, quando foi
condenado a uma pena de 15 anos de prisão, mas teve sua sentença anulada um
ano depois por meio de um recurso de apelação. Na segunda, em 15 de março de
1996, Heredia recebeu uma condenação de 10 anos e 6 meses de prisão,
novamente a defesa entrou com um novo pedido de recurso e continuou a
responder ao processo em liberdade.
Pela demora injustificada das autoridades brasileiras em não tomar medidas
necessárias para processar e punir o agressor, que ficou impune por mais de 15
anos, o caso de Maria da Penha ganhou visibilidade. Ela recebera apoio de
organizações de defesa dos direitos humanos que levaram sua causa à Comissão
Interamericana de Direitos Humanos da OEA, em setembro de 1997. Um ano
depois, a denúncia foi recebida pela referida Comissão sob o número de processo
12.051.
Essa Comissão considerou que houve negligência e omissão por parte do
Estado brasileiro em relação ao caso, condenando-o ao pagamento de indenização
a Maria da Penha e exigindo providências do governo brasileiro quanto à
50

condenação do agressor e recomendando para a adoção de várias medidas, entre


elas à elaboração de Lei de enfrentamento a violência contra mulher, conforme
Relatório Nº 54/2001.

No caso em apreço, os tribunais brasileiros não chegaram a proferir uma


sentença definitiva depois de 17 anos, e esse atraso vem se aproximando
da possível impunidade definitiva por prescrição, com a consequente
impossibilidade de ressarcimento que, de qualquer maneira, seria tardia. A
Comissão considera que as decisões judiciais internas neste caso
apresentam uma ineficácia, negligência ou omissão por parte das
autoridades judiciais brasileira e uma demora injustificada no julgamento de
um acusado, bem como põem em risco definitivo a possibilidade de punir o
acusado e indenizar a vítima, pela possível prescrição do delito.
Demonstram que o Estado não foi capaz de organizar sua estrutura para
garantir esses direitos.

O referido relatório foi um instrumento decisivo para o desfecho do caso de


Maria da Penha, com a condenação de Heredia, em 28 de outubro de 2002, após 19
anos de impunidade, poucos meses antes da prescrição da pena, fato que contribuiu
de forma direta na elaboração da Lei 11.340. Porém, o réu cumpriu apenas 2 anos
de prisão em regime fechado correspondente a 1/6 da pena. Hoje encontra- se em
liberdade.
Após as tentativas de homicídios, Maria da Penha passou a atuar em
movimentos sociais contra a violência e a impunidade. Atualmente, coordena
estudos, pesquisas e publicações da Associação de Parentes a Amigos de Vítimas
de Violência (APAVV), além de realizar trabalhos de divulgação da Lei 11.340. Sua
história pode ser conhecida na biografia que escreveu em 1994, no livro intitulado
“Sobrevivi... posso contar”.
No tocante a Lei 11.340/2006 predominantemente chamada de Lei Maria da
Penha, cuja finalidade é coibir e prevenir a violência doméstica e familiar praticada
contra mulher, aprovada graças a uma intervenção da OEA, como fora assinalado
anteriormente, foi elaborada com uma ampla participação da sociedade civil, de
Organizações não governamentais (ONGs) atuantes nas causas jurídicas e
feministas, bem como do poder executivo federal. Esta Lei ampara toda mulher,
independente de classe social, raça, etnia, orientação sexual, renda, cultura, nível
educacional, idade e religião, constituindo-se assim, em um instrumento legal de
extrema importância para o enfrentamento da violência contra mulher. Sobre o tema,
destacam (Parodi e Gama, 2010, p. 64):
51

Em linhas gerais, a Lei 11.340/2006 apresenta-se como robusta para vencer


todos os desafios que lhes foram propostas desde o momento de sua
confecção como projeto de Lei. Por ser fruto da experiência vivida pelos
envolvidos com essa forma de violência, tende a ter vida longa e deixar de
sofrer com a revogação de Leis que só causam mais instabilidades.

A referida Lei em seu texto estabelece medidas de assistência e proteção às


mulheres em situação de violência doméstica e familiar, por meio das políticas de
prevenção e proteção, além da criação dos Juizados de Violência Doméstica e
Familiar contra a Mulher e os procedimentos judiciais a serem adotados.
O conceito de violência adotado na Lei Maria da Penha é referido em seu
art. 5º “como qualquer ação ou omissão baseada no gênero que lhe cause morte,
lesão, sofrimento físico, sexual ou psicológico e dano moral ou patrimonial”. Nos
incisos I a III do mesmo artigo é estabelecido o campo de ocorrência, quais sejam, o
âmbito da unidade doméstica, o âmbito da família ou qualquer relação íntima de
afeto, independente da orientação sexual.
No diploma legal, o âmbito doméstico é definido como “o espaço de convívio
permanente de pessoas, com ou sem vínculo familiar, inclusive as esporadicamente
agregadas”, ou seja, refere-se ao compartilhamento do mesmo domicílio e todos os
núcleos de convivência comum, independente de elo afetivo direto. O âmbito familiar
é compreendido como “a comunidade formada por indivíduos que são ou se
consideram aparentados, unidos por laços naturais, por afinidade ou por vontade
expressa” (art. 5º inciso II). Nesta hipótese, entendem-se os lares formados por
pessoas com ou sem laço de consangüinidade. Quanto às relações afetivas
descritas no artigo 5º inciso III, se configuram “em qualquer relação íntima de afeto,
na qual o agressor conviva ou tenha convivido com a ofendida, independente de
coabitação”. Portanto, refere-se a todos os tipos de relações afetivas, abrangendo os
casados, os companheiros em união estável, noivos, namorados, inclusive as “ex-
relações”, independente de morar na mesma residência ou não.
No artigo 7º, o legislador tipifica os crimes de violência contra mulher,
abrangendo todos os tipos de lesões percebidas no âmbito doméstico e familiar,
classificando-as em física, psicológica, sexual, patrimonial e moral. Como segue
abaixo:

Art. 7º. São formas de violência doméstica e familiar contra a mulher, entre
outras:
I - a violência física, entendida como qualquer conduta que ofenda sua
integridade ou saúde corporal;
52

II - a violência psicológica, entendida como qualquer conduta que lhe cause


dano emocional e diminuição da auto-estima ou que lhe prejudique e
perturbe o pleno desenvolvimento ou que vise degradar ou controlar suas
ações, comportamentos, crenças e decisões, mediante ameaça,
constrangimento, humilhação, manipulação, isolamento, vigilância
constante, perseguição contumaz, insulto, chantagem, ridicularização,
exploração e limitação do direito de ir e vir ou qualquer outro meio que lhe
cause prejuízo à saúde psicológica e à autodeterminação;
III - a violência sexual, entendida como qualquer conduta que a constranja a
presenciar, a manter ou a participar de relação sexual não desejada,
mediante intimidação, ameaça, coação ou uso da força; que a induza a
comercializar ou a utilizar, de qualquer modo, a sua sexualidade, que a
impeça de usar qualquer método contraceptivo ou que a force ao
matrimônio, à gravidez, ao aborto ou à prostituição, mediante coação,
chantagem, suborno ou manipulação; ou que limite ou anule o exercício de
seus direitos sexuais e reprodutivos;
IV - a violência patrimonial, entendida como qualquer conduta que configure
retenção, subtração, destruição parcial ou total de seus objetos,
instrumentos de trabalho, documentos pessoais, bens, valores e direitos ou
recursos econômicos, incluindo os destinados a satisfazer suas
necessidades;
V - a violência moral, entendida como qualquer conduta que configure
calúnia, difamação ou injúria.

As diretrizes para as políticas públicas a serem adotadas para prevenção e


erradicação desses tipos de violência, são apresentadas no artigo 8º, como um
conjunto de ações integradas entre os diferentes setores governamentais da União,
dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios e de ações não-governamentais,
por meio da integração operacional do Poder Judiciário, Ministério Público e
Defensoria Pública com as áreas da segurança pública, assistência social, saúde,
educação, trabalho e habitação. As medidas integradas de prevenção são
apresentadas na seguinte ordem:
a) a realização de estudos e pesquisas que visem apontar as causas,
consequências e a frequência da violência doméstica e familiar contra mulher, a fim
de se criar um sistema de dados nacional para que se possam avaliar os resultados
das medidas adotadas;
b) a proibição de papéis estereotipados, nos meios de comunicação social, que
legitimem ou exacerbem a violência doméstica e familiar;
c) a implantação de policiais especializados no atendimento às mulheres vítimas de
violência nas Delegacias referenciadas em atendimento à mulher;
d) a realização de campanhas educativas abordando a temática da prevenção da
violência doméstica e familiar contra mulher, voltadas a sociedade de uma forma
geral;
53

e) a parceria entre órgãos governamentais e entidades não-governamentais, com o


objetivo de implementar programas de erradicação da violência doméstica e familiar
contra mulher;
f) a qualificação contínua dos profissionais envolvidos no atendimento direto e
indireto à mulher vítima de violência;
g) a criação de programas educacionais pautados no respeito aos valores éticos e a
dignidade da pessoa humana;
h) a inclusão nos currículos escolares do ensino de conteúdos relativos aos direitos
humanos, bem como a temática da violência doméstica e familiar contra mulher.

A Lei prevê também, que a mulher em situação de violência doméstica e


familiar deverá ser assistida por uma equipe multidisciplinar composta, a fim de
receber orientações e encaminhamentos, conforme os princípios e as diretrizes
previstos na Lei Orgânica da Assistência Social, no Sistema Único de Saúde, no
Sistema Único de Segurança Pública, dentre outras normas e políticas públicas de
proteção. Nesse sentido, o município de Belém conta com o Centro de Referência
Maria do Pará, lócus deste estudo, caracterizado como um espaço de referência
para o atendimento interdisciplinar voltado à promoção, prevenção, defesa,
reparação e assistência às mulheres em situação de violência doméstica e familiar.
A Lei define ainda que diante da possibilidade de ocorrer violência ou não, a
autoridade policial deverá tomar as providências determinadas em seus artigos 11 e
12, a saber: garantir proteção à vítima encaminhá-la ao atendimento médico,
fornecer transporte à vítima e seus dependentes para abrigo ou local seguro ou
acompanhá-la para retirar seus pertences. Deverá também, lavrar o registro de
ocorrência, tomar por termo a representação e remeter o expediente à juízo no
prazo de 48 horas, quando a vítima solicitar alguma medida protetiva.
Além de definir os procedimentos a serem adotados pela autoridade policial,
a Lei Maria da Penha determina ao Juiz adotar não só as medidas requeridas pela
vítima ou pelo Ministério Público, como também de seu próprio juízo, afim de
assegurar a integridade física e psicológica da mulher.
Assim cabe ao Juiz, conceder em até 48 horas as Medidas Protetivas de
Urgênciasolicitadas pela ofendida no auto da denúncia, “independente de realização
de audiência das partes e de manifestação do Ministério Público”, podendo ser
54

substituídas por outras de maior eficácia, quando os direitos da ofendida forem


violados, bem como aplicar concomitantemente
Entre as “Medidas Protetivas de Urgência que obrigam o agressor” expostas
no art. 22, são estipuladas várias medidas essencialmente cautelares. Elencamos a
suspensão ou restrição da posse de armas, afastamento do lar, proibição de
determinadas condutas, não aproximação, nem contato com ofendida, proibição de
frequentar determinados lugares, restrição ou suspensão de visitas aos dependentes
menores, prestação de alimentos provisórios ou provisionais; suspensão de
procuração concedida ao agressor e proibição temporária de compra, venda ou
locação de bens comuns. Também há possibilidade de aplicação das medidas a
vítima descrito nos art. 23 e 24 da referida Lei, de forma que o magistrado poderá
determinar a inclusão da vítima em programas assistenciais e assegurar à vítima,
quando servidora pública, remoção prioritária, bem como a manutenção de vínculo
empregatício por até seis meses à trabalhadora de iniciativa privada, entre outros.
Sendo, assim, conforme Carvalho (s/d), a Lei Maria da Penha como um
marco que é relevante no contexto de violência contra a mulher, pois essa não prevê
somente as Medidas Protetivas de Urgência, mas também um sistema de políticas
públicas direcionado às mulheres, criando mecanismos de proteção à mulher que
perpassam apenas medidas cautelares, mas preveem, também, encaminhamento
para serviços de acolhimento, atendimento, acompanhamento e, se necessário,
abrigamento.
De acordo com a LMP em seu artigo 20, altera o código penal ao criar mais
uma hipótese de prisão preventiva, ao permitirque o agressor tenha sua
prisãodecretada pelo Juiz, em qualquer fase do inquérito policial ou instrução
criminal. A esse respeito Parodi e Gama (2010, p. 185-186) afirmam:

Estamos aqui diante de uma nova hipótese de prisão preventiva e isso fica
patenteado com a alteração promovida pelo art. 42 da Lei 11.340/2006,
acrescentando o inciso IV no art. 313, do Código de Processo Penal. De
forma bastante específica, a prisão preventiva vai ser ordenada quando se
tratar de crime envolvendo violência doméstica e familiar contra mulher e
estiver prejudicada a execução de medidas protetivas de urgência prevista
na Lei 11.340/2006. Dessa forma, vale reforçar que a prisão é decretada
para garantir a execução de medidas de proteção. Com a nova
determinação a prisão não vai mais depender dos casos específicos
arrolados pelo art. 313 do Código de Processo Penal.

Logo, sobre as ações realizadas a partir das medidas de proteções que são
impostas aos agressores das mulheres vítimas de violência é importante
55

percebermos e darmos importância a Lei 11.340/2006 que tem se constituído um


mecanismo de extrema importância no combate à violência contra mulher, ao prever
mecanismos de prevenção, políticas públicas, punição mais rigorosas aos
agressores e criação de espaços de atendimento à vítima, possibilitando
umaassistência mais eficiente e assegurando os direitos humanos das vítimas.
Então, compreendemos que essas leis devem ser concretizadas e colocadas em
práticas para que haja punição dos agressores e mostrarmos que de fato funcionam
e tem seu caráter punitivo na qual quem descumprir não ficar sem a devida sanção.
A respeito dos estudos que avaliam a Lei Maria da Penha, de acordo com o
Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA –2015) teve impacto positivo na
redução de assassinatos de mulheres, emdecorrência de violência doméstica, de
acordo com o estudo “Avaliando a Efetividade da Lei Maria da Penha”.
Para mostrar a importância da LMP o Instituto IPEA (2015), argumenta que a
Lei fez diminuir em cerca de 10% a projeção anterior de aumento da taxa de
homicídios domésticos, desde 2006, quando entrou em vigor e foi responsável por
evitar milhares de casos de violência doméstica no país. Argumenta o IPEA (2015):

Aparentemente, a Lei Maria da Penha teve papel importante para coibir a


violência de gênero, uma vez que a violência generalizada na sociedade
estava aumentando. Ou seja, num cenário em que não existisse a Lei Maria
da Penha, possivelmente as taxas de homicídios de mulheres nas
residências aumentariam.

Conforme os dados do IPEA (2015) no Brasil, a taxa de homicídios de


mulheres dentro de casa era de 1,1 para cada 100 mil habitantes, em 2006, e de 1,2
para cada 100 mil habitantes, em 2011. Já as mortes violentas de homens dentro de
casa passaram de 4,5 por 100 mil habitantes, em 2006, para 4,8, em 2011. Nesse
caso, estão incluídos vários fatores, além de violência doméstica. O diretor de
Estudos e Políticas do Estado, das Instituições e da Democracia do IPEA, Daniel
Cerqueira, argumenta:
Se não tivesse havido a Lei Maria da Penha, a trajetória de homicídios de
mulheres no Brasil teria crescido muito mais. Homicídios como um todo
aumentaram [no país], mas, na contramão dessa direção, a Lei Maria da
Penha conseguiu conter os homicídios de mulheres dentro de casa. (IPEA,
2015).

Esses resultados sobre a redução de homicídios sobre mulheres são


atribuídos ao “aumento da pena para o agressor, ao maior empoderamento da
mulher e às condições de segurança para que a vítima denuncie e ao
56

aperfeiçoamento do sistema de Justiça Criminal para atender de forma mais efetiva


os casos de violência doméstica”, IPEA, (2015).
A partir dos dados do IPEA (2015) consideramos que os estudos que
avaliamos impactos da Lei Maria da Penha em nossa sociedade são positivos, pois
notamos que as mulheres passaram a denunciar mais todos os tipos de violência
que sofrem. No entanto, ainda há muitas mulheres que sofrem violência de seus
companheiros, que até recebem sanções judiciais, mas seus agressores retornam
às agressões contra suas ex-companheiras, sendo mesmo reincidentes quando
denunciados. Logo, compreendemos que tais acontecimentos caracterizam um ciclo
ou espiral crescente de violência que ganha relevo em momentos do término da
relação ou formalização da denúncia. Nesse sentido, as Medidas Protetivas de
Urgência vêm para enfrentar esse momento crítico onde as mulheres ficam mais
expostas ao aumento da violência por parte dos agressores.
Então, consideramos que a Lei Maria da Penha foi um importante passo na
proteção dos direitos da mulher e possibilitou o aumento das denúncias. Além disso,
o próprio escopo legal, caracterizado pela imposição de medidas severas, atua no
sentido de desestimular a ação criminosa. Sendo assim, conforme Carneiro (s/d):

As Medidas Protetivas de Urgência são meios destinados de proteção à


vítima de violência doméstica e com a criação da LMP a mulher tem
buscado auxílio jurídico solicitando essas medidas cautelares como forma
de proteção. Pretende se que através da efetivação dessas medidas seja
controlada a violência contra a mulher, pois em caso de descumprimentos
destas pelo agressor há penalidades que enseja até em prisão preventiva.

Entre as Medidas Protetivas de Urgência que obrigam o agressor expostas


no art. 22, foram estipuladas várias medidas essencialmente cautelares, como:
suspensão ou restrição da posse de armas, afastamento do lar, proibição de
determinadas condutas, não aproximação, nem contato com ofendida, proibição de
frequentar determinados lugares, restrição ou suspensão de visitas aos dependentes
menores, prestação de alimentos provisórios ou provisionais; suspensão de
procuração concedida ao agressor e proibição temporária de compra, venda ou
locação de bens comuns. Também o magistrado poderá determinar a inclusão da
vítima em programas assistenciais e assegurar à vítima, quando servidora pública,
remoção prioritária, bem como a manutenção de vínculo empregatício por até seis
meses à trabalhadora de iniciativa privada.
57

Vale corroborar, conforme Santos e Medeiros (2017) que a Lei Maria da


Penha quando entrou em vigor avançou para punir de forma efetiva os agressores,
pois antes da lei, os condenados respondiam o Termo Circunstancial de Ocorrência
– TCO -, pagavam cestas básicas às instituições de caridade ou multas, o que
reforçava a ideia da impunidade dos agressores. Ademais, vale acrescentar que
devido a não existência de uma lei mais severa as mulheres não registravam nas
delegacias as violências que sofriam, pois além de considerarem uma ação
vexatória, havia enorme preconceito. Além disso, essas são consideradas mais
vítimas, pelo fato de não haver somente a violência como companheira constante,
mas também porque ainda não conseguiram romper com o status quo social que as
mantêm presas nessas relações familiares violentas.
A Lei Maria da Penha tem seus aspectos que visam colaborar para a
modificação social, no que se refere à diminuição, e a erradicação, da violência
contra a mulher, logo, Santos e Medeiros (2017):

“A promoção e a realização de campanhas educativas de prevenção da


violência doméstica e familiar contra a mulher, voltadas ao público escolar e
à sociedade em geral, e a difusão desta Lei e dos instrumentos de proteção
aos direitos humanos das mulheres”.

Esse é um fato que vem encontrando grande resistência social, porque ao


se tratar de violência contra a mulher, necessário se faz cuidar de outros temas
como sexualidades, machismo, aborto e gênero, por exemplo, que vem sendo alvo
de intensa campanha conservadora para impedir sua discussão, notadamente em
ambiente escolar.
É importante considerarmos os 11 anos dos avanços na Lei Maria da Penha,
pois, tem sua relevância por tornar a violência contra a mulher um assunto público,
de interesse social, retirando da privacidade e exclusividade dos interesses de uma
família.
Conforme Santos e Medeiros (2017, p. 8):

[...] a Lei Maria da Penha, também, nessa perspectiva, tornou-se marco


histórico, pois foi fruto do processo democrático e que deve ser
compreendida como um caso exemplar bem-sucedido de articulação
política entre a sociedade civil, representada pelos movimentos de mulheres
e feministas brasileiro e os Poderes Executivo e Legislativo.

Sendo assim, a Lei Maria da Penha representa um importante avanço em


relação à proteção aos direitos da mulher e na coibição das situações de violência
58

doméstica, pois ela penaliza o agressor, o que até então não ocorria, nos casos de
violência contra a mulher, e era considerado crime de menor potencial ofensivo, sem
que nenhuma medida protetiva fosse oferecida à vítima e a pena principal impetrada
ao agressor se reduzia ao pagamento de cestas básicas, (SANTOS e MEDEIROS,
2017, p. 9).
Santos e Medeiros, (2017, p. 9):

[...] dentro da inovação da Lei Maria da Penha ressaltarmos que a


conceituação da violência doméstica e familiar contra a mulher no seu Art.
5.º: Para os efeitos desta Lei, configura violência doméstica e familiar contra
a mulher qualquer ação ou omissão baseada no gênero que lhe cause
morte, lesão, sofrimento físico, sexual ou psicológico e dano moral ou
patrimonial:
I – no âmbito da unidade doméstica, compreendida como o espaço de
convívio permanente de pessoas, com ou sem vínculo familiar, inclusive as
esporadicamente agregadas;
II – no âmbito da família, compreendida como a comunidade formada por
indivíduos que são ou se consideram aparentados, unidos por laços
naturais, por afinidade ou por vontade expressa;
III – em qualquer relação íntima de afeto, na qual o agressor conviva ou
tenha convivido com a ofendida, independentemente de coabitação.
Parágrafo único. As relações pessoais enunciadas neste artigo independem
de orientação sexual (BRASIL, 2006). Além disto, em seu Artigo 7.ºdefine as
formas de violência doméstica e familiar contra a mulher, quais sejam: a
violência física; a violência psicológica; a violência sexual; a violência
patrimonial; e, a violência moral.

Vale ressaltar que os avanços nas Leis são significativos, devemos


considerar como avanços, pois há de fato ações que efetivas e podem proteger
mulheres vítimas de violência. Entretanto, consideramos que há desafios que
devemos superar, pois ainda existem inúmeras lacunas na Lei, no combate a
violência contra as mulheres.
Logo, enfatizando dentre os desafios da LMP, Santos e Medeiros,(2017, p.
10 e 11), ressaltam:

[...] destacamos a necessidade de informação, para além dos dados oficiais


produzidos sobre o índice da violência contra a mulher. Existe ainda uma
carência de dados que permitam ter uma dimensão mais aproximada da
realidade vivenciada pelas mulheres quando procuram os aparatos legais
para sua proteção em suas cidades: a aplicação das medidas protetivas de
urgência, a responsabilização dos agressores e a efetiva garantia dos
direitos destas mulheres e seus filhos. Existe neste sentido uma lacuna em
relação a avaliação dos resultados obtidos na aplicação da Lei Maria da
Penha na coibição da violência contra a mulher no país. A realização de
pesquisas nesta área aparece como fundamental para se pensar em
estratégias de enfrentamento deste tipo de violência, e promover analises
dos índices de violência contra a mulher no país, bem como, avaliar e
monitorar os resultados efetivos relacionados a aplicabilidade da lei nas
diversas instâncias (delegacias, judiciários, defensoria pública, Ministério
59

Público e instituições de atendimento nas diversas áreas da política


social).Mesmo a produção de dados oficiais sobre o homicídio de mulheres
esbarra-se na ausência de certas informações importantes que dificultam
identificar o número exato destas ocorrências:

Santos e Medeiros, (2017, p. 11), reiteram:

A partir da promulgação da Lei Maria da Penha, foram criados os Juizados


de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher, aperfeiçoando os
mecanismos jurisdicionais, possibilitando que o sistema de justiça
atendesse de forma mais efetiva os casos envolvendo violência doméstica
contra a mulher. Além disto a rede de atendimento à mulher em situação de
violência foi ampliada, através dos investimentos da Secretaria de Políticas
para Mulheres (SPM) por meio do Pacto Nacional de Enfrentamento à
Violência Contra as Mulheres e do Programa Mulher, Viver sem Violência.
Entretanto a existência destes equipamentos em si não são garantias
efetivas do cumprimento da Lei, pois fatores culturais, políticos, de recursos
econômicos e humanos, vão influenciar no desenvolvimento das ações de
proteção e repressão à violência contra a mulher.

A mulher vítima de violência nem sempre procura imediatamente a


delegacia, muitas passam anos para realizarem a denúncia, por vínculo afetivo,
dependência econômica de seu parceiro, vergonha, medo, ausência de apoio por
parte de familiares e as incertezas diante de seu destino. Ademais, na delegacia ao
formalizarem a denúncia se deparam com uma série de dificuldades, entre essas,
comprovação da violência, violência física fica mais evidente, mas quando diz
respeito a violência psicológica, acaba sendo negligenciada, apesar de sabermos
que a violência física geralmente é acompanhada de violência psicológica ou na
maioria dos casos, esta cria as condições para que a outra aconteça.
Corroboram Santos e Medeiros,(2017, p.12):

[...] Além disso a falta de profissionais capacitados tanto nas delegacias


especializadas, quanto nas distritais, acabam tornando-se entraves no
acesso da mulher à justiça. Outro aspecto em relação aos mecanismos de
coibição da violência contra a mulher diz respeito às medidas protetivas de
urgência, pois a aplicação destas pelo Juizado de Violência Doméstica e
Familiar, não é a garantia cessação das agressões e ameaças, se não
forem implementadas ações de fiscalização e repressão quando do seu
descumprimento.

Pasionato (2015) nos leva a refletir, pois, há demora em notificar mulheres e


seus agressores sobre a decisão judicial. Logo, importante enfatizarmos que não
existem mecanismos para fazer o seguimento das medidas e saber se efetivamente
as mulheres estão protegidas, de foto, ou seja, essa demora acaba gerando nas
mulheres um descrédito em relação à proteção dada pelo Estado, ocasionando na
maioria das vezes a desistência na continuidade do processo.
60

Santos e Medeiros, (2017, p.12):

Ademais a morosidade dos processos na justiça, pelo acúmulo de funções


de alguns juízes com o trabalho em outras varas, vem colocando tais
medidas como a principal intervenção realizada por estes. Ainda no que se
refere a atuação destes juízes, conforme preconizado na Lei Maria da
Penha, não há consenso sobre o desempenho da dupla competência, que
passa não só pela questão criminal, mas pelas decisões quanto a guarda
dos filhos e a pensão alimentícia. Desta forma, muitos juízes se restringem
nas medidas protetivas à aplicação daquelas que dizem respeito à
integridade física desta mulher, cabendo a mesma buscar as varas cíveis e
de famílias para resolver sobre as situações relacionadas à situação familiar
e patrimonial.

Entre os desafios que há na Lei Maria da Penha, Santos e Medeiros, (2017,


p 12), ressaltam que ainda são desafios a implantação e funcionamento da rede de
enfrentamento à violência contra a mulher, que é composta, por delegacia
especializada de atendimento à mulher, juizados de violência doméstica e familiar,
promotorias e defensorias especializadas, além, de Centros de Referências, Casas
Abrigo e serviços de saúde, além de espaços de controle social, como os Conselhos
dos Direitos da Mulher. Ademais, deve haver o fortalecimento da rede de
enfrentamento à mulher em situação de violência doméstica, pois o se observa
atualmente é o sucateamento e precarização dessa política.
O contexto de avanço da LMP devemos enfatizar a criação das DEAMS
Delegacia de Atendimento às Mulheres, criada em 1985. A primeira delegacia em
defesa da mulher, na cidade de São Paulo, contudo, vale ressaltar, que mesmo com
a criação da DEAM os dados estatísticos mostravam números alarmantes de
violência cometida contra a mulher. (Oliveira, Lima, Arana, 2017).
Oliveira, Lima, Arana (2017) ressaltam que a criação da LMP foi o sustento
primordial que as DEAM’s precisavam, pois as denúncias deixaram de ficar impunes,
e no âmbito das políticas públicas, as atuações das DEAM ś e a Lei Maria da Penha
são fundamentais, pois constata-se que por ser um elemento construído (também)
culturalmente e naturalizado na sociedade brasileira, a violência contra mulher,
assim como outros temas chamados “transversais”, deva ser incluída e participar
dos currículos escolares. Consideram que para haver uma mudança na sociedade e
combater de fato a violência contra a mulher, a temática deve ser incorporada nas
discussões nos espaços educacionais, em todos os níveis, como todos os outros
lugares de sociabilidade institucionalizados, ou não, pois é considerada uma
problematização constante desta temática na qual pode gerar na sociedade
61

elementos que configurem mudança social e, portanto, ajudar na eficácia das


iniciativas por parte do Estado para com a sociedade.
Para ilustrar as mudanças que ocorreram com a promulgação da Lei 11.340,
iremos demonstrar no Quadro 3 um antes e depois da Lei Maria da Penha,
destacando suas principais inovações no enfrentamento a violência contra a mulher.

Quadro 3 - Quadro comparativo da Lei Maria da Penha

Antes Lei Maria da Penha


Não existiam leis específicas sobre Tipifica e define a violência doméstica e
violência doméstica contra a mulher. familiar contra a mulher.
Aplicava a lei dos juizados especiais
criminais (lei 9.099/95) para os casos de Retira dos juizados especiais criminais a
violência doméstica. Estes juizados competência para julgar os crimes de
julgam os crimes com pena de até dois violência doméstica contra a mulher.
anos (menor potencial ofensivo).
Permitia a aplicação de penas
pecuniárias como as de cestas básicas e Proíbe a aplicação destas penas.
multa.
Os juizados especiais criminais tratavam Foram criados juizados especiais de
somente do crime, mas para a mulher violência doméstica e familiar contra a
vítima de violência doméstica resolver as mulher com competência cível e criminal
questões de família tinha que ingressar para abranger todas as questões de
com outro processo na vara de família. família.
A mulher podia desistir da denúncia na A mulher somente poderá renunciar
delegacia. perante o juiz.
Era a mulher que muitas vezes
É vedada a entrega da intimação pela
entregava a intimação para o agressor
mulher ao agressor.
comparecer às audiências.
A lei não utilizava a prisão em flagrante
Possibilita a prisão em flagrante.
do agressor.
Possibilitar ao juiz a decretação da prisão
Não era prevista a prisão preventiva para preventiva quando houver riscos à
crimes de violência doméstica. integridade física ou psicológica da
mulher.
A mulher vítima de violência doméstica, A mulher será notificada dos atos
em geral não era informada quanto ao processuais, especialmente quanto ao
andamento dos atos processuais. ingresso e saída da prisão do agressor.
A mulher vítima de violência doméstica, A mulher deverá estar acompanhada de
em geral, ia desacompanhada de advogado ou defensor em todos os atos
62

advogado ou defensor público nas processuais.


audiências.
Altera o artigo 61 do código penal para
A violência doméstica contra a mulher
considerar este tipo de violência como
não era considerada agravante de pena.
agravante da pena.
A pena para o crime de violência A pena do crime de violência doméstica
doméstica era de 6 meses a 1 ano. passa a ser de 3 meses a 3 anos.
A violência doméstica contra mulher Se a violência doméstica for cometida
portadora de deficiência não aumentava contra mulher portadora de deficiência, a
a pena. pena será aumentada em 1/3.
Permitir que o Juiz determine o
Não previa o comparecimento do
comparecimento obrigatório do agressor
agressor a programas de recuperação e
a programas de recuperação e
reeducação.
reeducação.
Conforme o art. 22 que trata das MPU, o
O agressor podia continuar freqüentando Juiz pode fixar o limite mínimo de
os mesmos lugares que a vítima distância entre o agressor e a vítima,
freqüentava, nem era proibido de manter seus familiares e testemunhas. Bem
qualquer forma de contato com a como o contato através de qualquer
agredida. forma de comunicação e a frequentação
a lugares.
A Lei 13.641/2018 art. 24-A altera a LMP
Não era previsto a prisão do agressor por introduzindo uma pena de detenção de 3
descumprimento das MPU. meses a 2 anos por descumprimento das
MPU.

Fonte: Pesquisa Documental com base na Lei 11.340/06.

1.4. Breve discussão sobre as Medidas de Proteção de Urgência no combate a


violência contra as mulheres

Na construção das garantias inerentes à defesa da mulher vítima de


violência de gênero, a partir da criação da Constituição Federal de 1988 e sobre as
ações que tratam da família, o Estado brasileiro passou a assumir a
responsabilidade assistencial de seus integrantes com o compromisso de criar
mecanismos para coibir a violência no âmbito de suas relações. Como
anteriormente, a criação da LMP foi, sem dúvidas, um marco histórico para o Brasil.
63

A violência contra a mulher passou a ser crime, sendo tratada com maior atenção e
respeito.
Para que haja essa ação,deve haver por parte do Judiciário uma decisão
que garanta uma proteção mais eficaz contra a ação deagressores. Isso significa
que, independentemente da existência de qualquer feito penal,deve-segarantiro
direito a um atendimento especializado e a proteçãopolicial ininterruptapara proteger
as mulheres do “Ciclo Espiral Ascendente de Violência” teoria definida pela
psicóloga americana Lenore Walker. Ela identificou que as agressões cometidas em
um contexto conjugal ocorrem dentro de um ciclo que é constantemente repetido.O
ciclo se inicia com a fase da tensão, que é anterior a agressão. Pode manifestar-se
no tom de voz, em insinuações e manifestações verbais grosseiras. A segunda fase
é a da explosão, onde o agressor demonstra toda a sua ira, reage a determinadas
situações de forma desproporcional, até chegar às agressões físicas. Já a fase da
lua de mel é o momento que se segue à fase da explosão, quando o agressor pede
desculpas e a manipula afetivamente de várias formas, uma delas é prometendo que
a situação não vai mais se repetir.Com o tempo, os intervalos entre uma fase e outra
ficam menores, assim como as agressões passam a acontecer sem obedecer à
ordem das fases.
Ressalta-se também a importância da proteção a essas mulheres, já que
ocorre a ruptura quando estas estão mais vulneráveis. De acordo com o ciclo de
violência, muita das vezes, a mulher rompe com o ciclo após a segunda fase quando
ocorre a explosão da violência, estando mais fragilizada, emocionalmente e
fisicamente.
As mulheres que decidem romper um relacionamento violento também
estão rompendo com uma série de sonhos e expectativas em relação ao
casamento e à família. Há perdas e ganhos frente a esta decisão, que não
devem ser ignorados pelos profissionais de saúde. Reconhecê-las, implica
poder trabalhá-las e, assim, fortalecer a mulher no redirecionamento e
estabelecimento de novos projetos de vida. (PASSOS, 2006, p.21).

No entanto, essa vulnerabilidade perpassa um outro campo, além do


supracitado. Ele está presente principalmente no momento em que a mulher
encontra-se em risco eminente de perder sua vida. Dessa forma, as Medidas
Protetivas de Urgência têm suma importância na vida da mulher, onde ela necessita
veementemente do aparato estatal para garantir sua segurança patrimonial, sua
saúde mental, física, bem como sua sobrevivência.
64

Dado seu uso em situações de urgência, as Medidas Protetivas de Urgência


devem ter caráter autônomo, ou seja, é a razão de não ser necessário o
ajuizamento, ou mesmo a existência de qualquer feito, penal/cível, capaz de conferir
pressuposto para análise de uma “orderofprotection”,já que a rapidez na sua
expedição é essencial para sua efetividade.Vez que o pedido analisado em tais
ações é único e não reclama qualquer outra intervenção do Estado, que não seja
conhecer e julgar a necessidade de se limitar a liberdade de alguém em razão de
uma conduta que tenha esbarrado na violência de gênero, não necessitando ouvir
de forma liminar a outra parte.
É o próprio pedido de proteção a razão da demanda, cuja solução a vítima
reclama ao Poder Judiciário, e sendo comprovado o comportamento agressivo, seja
delitivo ao não, e sua caracterização pela violência de gênero, é necessário o
deferimento da proteção a fim de se garantir a segurança à ofendida. E somente
após as Medidas Protetivas serem deferidas é que o agressor é comunicado,
passando a estar obrigado desde sua intimação.
Importante salientarmos que essa mesma análise fora ofertada à versão
nacional da “order of protection”, que recebeu o nome de “Medida Protetiva”. Este
nome se deu não apenas pela sua origem,mas porque preexiste no conjunto legal
semelhante instituto, qual sejam as medidas específicas de proteção previstas pelo
Estatuto da Criança e do Adolescente, que existem por si só e não carecem de mais
nenhum acontecimento jurídico para lhes dar sustento. (MACHADO, s/d).
Sendo assim, foram realizadas e concretizadas tais ações com a edição da
Lei 11.340/2006, que tratou de conferir com maior severidade os crimes praticados
contra a mulher, cujo contexto são as relações de gênero. Consequentemente,
houve a criação dos juizados especializados em Violência Doméstica e Familiar
contra a Mulher, alterações de rito e a criação das “medidas protetivas de urgência”
para inibir a prática de crimes contra mulheres.
O maior de todos os avanços da Lei 11.340 refere-se à criação dos Juizados
de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher, com competência cível e
criminal, pois durante muito tempo considerou-se na Lei 9.099/95 a violência
doméstica e familiar contra à mulher como crime de menor potencial ofensivo e/ou
delito de lesão leve ou culposa.
Com o advento da Lei 11.340 retirou-se a competência dos Juizados
Especiais Criminais (JECrim), alterando-se o artigo 61 do Código Penal para
65

considerar a violência doméstica e familiar contra a mulher como agravante de pena,


vedandoa aplicação de penas pecuniárias como as de cestas básicas e multa.
Para evitar que a vítima desista de sua denúncia contra o agressor ainda na
delegacia como ocorria anteriormente, a Lei 11.340 prevê que a vítima só poderá
desistir da representação da ação penal em audiência designada pelo(a) Juiz(a).
É relevante propor especialmente por Medidas Protetivas de Urgência, com
o fim de proteger imediatamente a ofendida, logo, essas medidas têm caráter
preventivo de delitos mais graves e reparador ainda que apenas parcial e
provisoriamente, de danos materiais.
Essa ferramenta se tornou importante não só pelos efeitos materiais que
visa coibir, mas também porque a violência doméstica passou a apresentar
características específicas, como a rotinização. Ainda assim, há grande debate na
área jurídica em relação ao rito processual das medidas assecuratórias, uma vez
que alguns magistrados aplicam o rito cautelar do Código de Processo Civil e outros
adotam o rito simplificado, visando atender ao caráter de urgência característico da
formulação do pedido pela ofendida.(CARVALHO,s/d).
O art. 5º da Lei 11.340 prevê que o tipo de violência tutelada por essa
legislação especial pode ocorrer no âmbito da unidade doméstica, no âmbito da
família e em qualquer relação íntima deafeto, e ainda que esses termos
permaneçam em aberto e não tenham sido pacificados pela doutrina, considera-se
que o referido texto legal abarca violências baseadas no gênero (caput do mesmo
artigo) em qualquer desses âmbitos. Logo, é importante salientarque para configurar
violência perpetrada na unidade familiar, não são necessárias ligações genéticas
entre a vítima e o autor do fato, mas tão somente a configuração de uma relação
passível de ser considerada como família, (CARVALHO,s/d).
É importante ressaltarmos que as Medidas Protetivas de Urgência, conforme
Carneiro (s/d) são concedidas sempre que a mulher encontra-se em situação de
risco resultante de violência doméstica, pois sua finalidade é protegê-la de novas
agressões, podendo ainda ser adotada medidas como: afastar o agressor do âmbito
familiar, proibir determinadas condutas, prestar alimentos quando necessário à
ofendida, acompanhamento psicológico e inserção em Casa abrigo, tudo no intuito
de preservar a integridade da vítima e familiares.
As Medidas Protetivas de Urgência sãoespécies de medidas cautelares, pois
conforme Sousa (2009) essas objetivam a garantia daintegridade psicológica, física,
66

moral e material (patrimonial) das vítimas, com a finalidade de garantir que ela possa
agir livremente ao optar por buscar o amparo estatal e em especial a jurisdicional
contra seu suposto agressor.
Conforme Carneiro (s/d)as medidas protetivas de urgência foram
instrumentos criados pela lei 11.340/2006 com o intuito de assegurar proteção
estatal em favor da mulher. Logo, a concessão dessas medidas protetivas é deferida
pelo juiz, a requerimento do Ministério Público ou a pedido da ofendida, quando a
vítimasolicita amparo na Delegacia. Opedido de medidas protetivas deve ser
encaminhado pelo delegado em 48 horas (art. 12, III), e o juizdeve decidir em 48
horas (art. 18, I), sendo assim, após o deferimento, o agressor deve ser intimado da
decisão, o que nem sempre é possível, devido o agressor dificultar o recebimento da
intimação ou até mesmo evadir-se para local incerto, o que prejudica a
concretização da medida protetiva contra o agressor. Importante ressaltar que são
altos os números de casos de violência doméstica e que por vezes não são
apreciados em tempo hábil, assim ensejando o perigo de demora.
Mello (2009, p.11) salienta que a lei prevê as Medidas Protetivas de
Urgência nos artigos 22, 23 e 24 que:

São verdadeiras medidas cautelares e de bastante utilidade nos casos de


violência doméstica e, como tal devem preencher os dois pressupostos
tradicionalmente consistentes no periculum in mora (perigo de demora) e
fumus bonis iuris(aparência do bom direito). Dessa forma, deve o Juiz agir
com bastante cautela ao conceder tais medidas, visto que sabemos que os
pedidos muitas vezes são feitos diretamente na Delegacia de Polícia, sem
que a vítima tenha sido orientada por um advogado ou defensor público e
chegam ao Juiz sem qualquer suporte probatório mínimo que lhe permita
definir o pleito cautelar imediatamente.

Concordamos com Mello (2009), pois acreditamos que o Estado é ineficaz


na fiscalização do cumprimento das Medidas Protetivas, uma vez que a legislação é
muito bem formulada e o que falta é uma estrutura estatal para que a lei seja
exercida, ou seja, não há uma equipe de pessoal quetenha a capacitação para
trabalharcom a demanda que está sendo apresentada, sendo visível o descaso
quando nos referimos à medida protetiva. Além da escassez de policiais para o
atendimento das vítimas, através de patrulhas e delegacias especializadas, o que
contribui para o aumento dos casos de violência no lar e familiar, aliado ao fato que
existe a falta de promotores e juízes para que os inúmeros processos referentes à
Lei Maria da Penha tenham prosseguimento.
67

Ademais, o Estado deixa a desejar na fiscalização do cumprimento das


Medidas Protetivas de Urgência e nem tudo que está positivado no artigo 22 da Lei
11340/06 e seus incisos e que seja realmente cumprido:

A proibição de frequentar determinados lugares a fim de preservar a


integridade física e psicológica da ofendida. No caso o agressor mesmo
sabendo da medida protetiva não teve nenhum receio de se aproximar
dessas vítimas, no entanto o Estado não tem como fazer esse
monitoramento 24 horas e essas vítimas acabam ficando vulneráveis ao
agressor, sendo que podem ser buscadas melhorias nas medidas
protetivas, algo como a implantação do botão do pânico, o qual de grande
importância sua expansãopara todo o país, uma vez que a violência contra
a mulher existe no Brasil inteiro.

Sendo assim, é importante destacarmos sobre o aumento das


recomendações de Políticas Públicas para enfrentamento da violência contra
mulher que se configuram através dapromoção de campanhas de combate à
violência contra a mulher visando a conscientização da população para
denúncias e registros de ocorrência contra abusos e violação de direitos; maior
integração dos dados do Disque-Denúncia com as instituições policiais (Polícia
Civil e Polícia Militar) para o acompanhamento dodirecionamento das denúncias;
maior integração entre o poder público estadual e o municipal a fim de promover
políticas públicas voltadas para a melhoriada equidade entre os gêneros;
aumento do número deDelegacias Especializadas de Atendimento à Mulher e de
Centros de Referência de Atendimento às mulheres; capacitação dos agentes de
segurança para melhor atendimento à vítima; fortalecimento de canais
especializados no Judiciário para atendimento de casosde violência contra a
mulher; entre outros.
Então, frisamos Parizotto (2016, p. 30) na qual enfatiza que a
operacionalização da LMP no judiciário é considerada uma grande inovação
trazida pela própria Lei, na qual retrata as medidas protetivas de urgência
(MPUs), e conforme a autora:

Este dispositivo legal permite que, em caráter preventivo, as mulheres


recebam proteção judicial e policial para romper com a violência, assim
como sejam arbitradas rapidamente questões cíveis de extrema relevância.

Parizotto (2016, p; 30) corrobora exemplos de Medida Protetiva de


Urgência, entre essas, ressalta:o afastamentodo autor de violência, do lar;
proibição de aproximação e contato; restrição ou suspensão de visitas aos filhos;
68

prestação de alimentos provisionais ou provisórios; separação de corpos;


restituição de bens indevidamente subtraídos da vítima e proibição temporária
para a celebração de atos e contratos de compra, venda e locação de
propriedade em comum.
Mais importante informação está no fato que Parizotto (2016, p 30) diz:

Para ter acesso às MPUs, as mulheres podem solicitá-las diretamente na


delegacia, sem o auxílio de um advogado. Há também a possibilidade de
solicitá-las através do Ministério Público ou por um advogado particular.
Segundo a LMP, o pedido de MPUs emitido na delegacia deve ser remetido
ao juiz em quarenta e oito horas. O juiz, por sua vez, deverá responder a
esta solicitação em até outras quarenta e oito horas. Um elemento
importante a se observar nas MPUs reside no fato de que as mesmas são
concedidas diante de indícios de materialidade de um delito e não são
definitivas. Dessa forma, prescindem de julgamento e condenação,
primando por uma atuação judiciária célere e não punitiva, mas protetiva.

Portanto, o combate à violência contra as mulheres constitui-seem ações


que visam reduzir as relações de poder entre homens e mulheres que
historicamente são desiguais.
Contudo, temos a compreensão que as Medidas Protetivas de Urgência
são inseridas em nossa sociedade para que haja a minimização da violência
contra as mulheres, pois a banalização desse tipo de crime se tornou algo
comum, que fere e reprime de forma grave essa parte da sociedade que, sim,
têm os mesmos direitos dos homens.
69

2 ANÁLISE DAS MEDIDAS PROTETIVAS DE URGÊNCIA NO COMBATE A


VIOLÊNCIA CONTRA AS MULHERES

2.1. Violência contra as mulheres no Brasil

A violência contra a mulher é um evento alarmante em todo o mundo, que


independe de suas culturas, etnias e costumes e tem sido um problema cada vez
mais em pauta nas discussões e preocupações da sociedade brasileira. Diariamente
um número expressivo de mulheres são expostas a violência no Brasil sob diversas
formas e intensidades, seja em espaço público, privado ou até mesmo culminando
na expressão mais grave da violência, que é o assassinato.
Embora não seja um fenômeno exclusivamente contemporâneo, o que se
percebe é que a visibilidade política e social desta problemática tem um caráter
recente, dado que a evolução da condição jurídica da mulher no Brasil foi bastante
lenta e apenas nas últimas décadas é que tem se destacado a gravidade e
seriedade das situações de violências sofridas pelas mulheres.
Na pesquisa intitulada Mapa da Violência 2015, elaborada pela Faculdade
Latino-Americana de Ciências Sociais (Flacso), com dados fornecidos pela
Organização Mundial da Saúde (OMS), o nosso país ostenta a 5ª posição em
um ranking de 83 países com a maior taxa de homicídios de mulheres no mundo,
passando da 7ª posição, no levantamento anterior, realizado em 2010 com uma taxa
de 4,4 homicídios a cada 100 mil habitantes, para o 5º lugar no levantamento de
2015 com 4,8 homicídios. Destaco abaixo, o ranking dos 10 países com as maiores
taxas de homicídios de mulheres do mundo.

Tabela 1- Países com maiores taxas de homicídios de mulheres

POSIÇÃO PAÍS HOMICÍDIO DE MULHERES /


100 MIL HABITANTES
1 El Salvador 8,9
2 Colômbia 6,3
3 Guatemala 6,2
70

4 Rússia 5,3
5 Brasil 4,8
6 México 4,4
7 Moldávia 3,3
8 Suriname 3,2
9 Letônia 3,1
10 Porto Rico 2,9

Fonte: Mapa da Violência 2015.

Para destacar esse perverso cenário mundial nos índices brasileiros de


homicídios de mulheres, podemos comparar com os dados desta mesma pesquisa
feita com países desenvolvidos, onde o Brasil comete 48 vezes mais homicídios que
o Reino Unido, 24 vezes mais que a Irlanda e a Dinamarca e 16 vezes mais que
Japão ou Escócia.
Estes dados evidenciam que o Brasil é um dos países mais inseguros para se
nascer mulher. Conforme o Atlas da Violência (2019), produzido pelo produzido pelo
Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA) e pelo Fórum Brasileiro de
Segurança Pública (FBSP), os dados dos homicídios no país, chegaram ao
quantitativo de 4.936 mulheres assassinadas em 2017 no país com uma taxa de 4,7
homicídios para cada 100 mil brasileiras e a pesquisa observa um aumento de
20,7% na taxa nacional de assassinatos de mulheres entre 2007 e 2017. As taxas
de homicídios são ainda maiores quando se incorpora a dimensão racial, pois, em
2017, a taxa para cada 100 mil mulheres negras totalizava 5,6% e a cada 100 mil
mulheres não negras 3,2%. Já no período de dez anos da pesquisa (2007 a 2017),
taxa de homicídios para cada 100 mil mulheres negras aumentou 29,9%, enquanto
entre as não negras houve um aumento de 4,5%. As mulheres negras também são
recordes nas taxas de violência letal. Em 2017, elas totalizaram 66% de todas as
mulheres assassinadas no país. Essas taxas vêm ratificar uma fórmula já conhecida
por nós, que em nossa sociedade a combinação do machismo e racismo agrava o
risco de lesão e morte para mulheres negras no Brasil.
Outro dado mais recente lançado em 2019, de caráter nacional é a pesquisa
“Visível e invisível: a vitimização de mulheres no Brasil”, elaborada pelo Instituto
Datafolha e pelo FBSP, que sinaliza dados alarmantes de 16 milhões de mulheres
71

com 16 anos ou mais que sofreram algum tipo de violência durante o ano de 2018,
isso significa 1.830 mulheres por hora. Segundo a pesquisa foram 4,7 milhões de
mulheres vítimas de agressão física (soco, chutes e empurrões), 536 mulheres por
hora e1,7 milhão foram ameaçadas com facas ou armas de fogo. Essa relação entre
a posse de armas de fogo e o agravamento da violência contra as mulheres é tão
intensa, que a própria Lei Maria da Penha, prevê em seu art. 22 como uma de suas
Medidas Protetivas de Urgência a suspensão da posse ou porte de armas do
agressor. Nesse sentido, é pertinente salientar a importância da política de controle
de armas de fogo na segurança de todos. No entanto, com a assinatura do atual
presidente do decreto que altera o Estatuto do Desarmamento de 2003 facilitando a
posse de armas de fogo no país, esse cenário pode agravar ainda mais a situação
das mulheres que convivem cotidianamente com a violência.
Outro dado desta pesquisa que nos chama atenção é que 1,6 milhões de
mulheres sofreram espancamento ou tentativa de estrangulamento, três mulheres
por minuto. E 76,4% desses casos de agressão foram cometidos por um homem
conhecido, sendo que 23,8% deles eram namorado/ cônjuge/ companheiro, 15,2%
ex-namorados e ex-companheiros e 21,1% vizinhos. No que se refere ao âmbito da
violência, 40% dessas agressões aconteceram dentro de casa, caracterizando o
ambiente doméstico como local preferido pelo agressor, por ser resguardado da
opinião e interferência de terceiros.
Quanto aos dados da percepção da violência com predominância das ofensas
verbais e sexuais, baseadas na escolaridade, as mulheres com ensino médio e
superior, respectivamente 46,3% e 45,2% prevalecem com a maior taxa de
percepção de vitimização, enquanto as com nível fundamental reportam 17,3%.

Embora a violência aconteça em todas as classes sociais, quanto mais


educação formal, menos violência. Um reflexo disso é o reconhecimento
das violências tidas por “invisíveis”. (BUENO, Samira, et al, 2019).

Ao mesmo tempo em que as mulheres demonstram ter cada vez mais


consciência da violência sofrida, uma parcela menor de 23,8% das vítimas procurou
órgãos especializados (DEAM, Disque 180), 8% disseram ter procurado delegacia
comum, 15% compartilharam a situação com alguém da família ou pessoas
próximas e a assustadora taxa de 52% de vítimas que não fizeram absolutamente
nada após a violência sofrida.
72

[...] fatores que mantêm as mulheres em silêncio como temor, vergonha,


crença na mudança do parceiro e revitimização por parte de autoridades e
da sociedade. (BUENO, Samira, et al, 2019)

Segundo o Anuário Brasileiro de Segurança Pública divulgado em 2018, que


consolida os dados do setor de segurança pública no Brasil, o número de homicídios
praticados contra mulheres teve um aumento de 6,1% entre 2016 e 2017. Em
números absolutos representam respectivamente 4.245 casos contra 4.539. A
pesquisa também registra, dentro desta estatística, um aumento no número de
feminicídios, que subiram de 929 em 2016 para 1.133 em 2017 em todo o país.
Quando nos reportamos às regiões, a pesquisa aponta que as regiões nordeste e
norte lideram o ranking dos estados mais letais para as mulheres no Brasil. A
unidade da federação mais perigosa ano de 2017 foi o Rio Grande do Norte, com
uma taxa de 8,4 homicídios a cada 100 mil mulheres, em seguida vem o Acre 8,3%
e o Ceará 7,6%. Na contramão desses dados, as unidades da federação com as
menores taxas de homicídios de mulheres em 2017 estão Tocantins 1,8%, São
Paulo com 2,2% e o Distrito Federal com 2,6%.
A Central de Atendimento à Mulher - Ligue 180é um serviço gratuito do
governo federal que atende ininterruptamente os pedidos de orientações sobre leis e
direitos das mulheres, informações sobre serviços especializados da rede de
atendimento à mulher e registro de denúncias de violência cometidas contra elas. De
acordo com os dados divulgados pelo Ministério dos Direitos Humanos (MDH)no
relatório do primeiro semestre de 2018 de janeiro a junho, revela que a Central
realizou 523.339 atendimentos. Desse balanço total 72.839 casos são denúncias e
relatos de violência contra a mulher que englobam violência psicológica, cárcere
privado, homicídio e outros crimes. Quanto aos tipos de violações a violência física
foi o crime mais registrado no primeiro semestre de 2018, com 34 mil casos, seguida
da violência psicológica, com 24.378, e da violência sexual, correspondendo a 5.978
casos. Destaco na tabela abaixo os dados das demais violações:

Tabela 2 - Ligue 180


Tipo de Violência Janeiro a junho de 2018
Violência física 34.000
Violência psicológica 24.378
Violência sexual 5.978
73

Violência patrimonial 1.447


Violência moral 3.381
Cárcere Privado 2.611
Tráfico de pessoas 102
Homicídio 899
Total 72.839

Fonte: Ligue 180: Balanço Semestral – janeiro a junho de 2018 (SPM/MDH, 2018).

Em comparação com 2017, a Central de Atendimento à Mulher realizou nos


cinco meses do ano,592.217 atendimentos. Porém constatou que, no tocante aos
relatos de violência sexual, em 2018, houve aumento de 16,9% e 37,3% nos casos
de homicídios denunciados. Os temas mais disseminados em 2018 nos
atendimentos são Violência Doméstica contra a Mulher com 36.778 atendimentos,
seguido pela Lei Maria da Penha com 35.665 atendimentos. Os estados de São
Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais e Bahia no ano de 2018 tiveram o maior número
de registros de atendimento somando a taxa de 52,52% mais que a metade da taxa
nacional.
Todos os dados apresentados nas pesquisas sobre a violência contra
mulheres no Brasil reportam ao período de vigência das Leis Maria da Penha (2006)
e do Feminicídio (2015). Os dados têm demonstrando que a violência continua
fazendo parte da vida das mulheres e são cada vez mais alarmantes. Das ações a
serem realizadas no âmbito nacional do judiciário para combater esta violência, o
relatório “Poder Judiciário na Aplicação da Lei Maria da Penha”, de 2018 do
Conselho Nacional de Justiça (CNJ), com baseem dados fornecidos pelos Tribunais
de Justiçados Estados e do Distrito Federal, que avalia a implementação das
políticasdo Poder Judiciário no enfrentamento à violênciadoméstica e familiar contra
a mulher, destaca que no Brasil a quantidade de varas exclusivas de Violência
Doméstica e Familiar contra a Mulher era de 109 em 2016, passando para 122 em
2017, um aumento percentual de 12%. Quanto ao acolhimento das vítimas de
forma privativa e individualizada, os Tribunais declararam possuir, em 2017, em
suas varas, 226 gabinetes privativos, enquanto no ano anterior existiam 168.
Apenas o Tribunal de Justiça do Acre (TJAC) sinalizou não possuir gabinete
privativo para atendimento à mulher.
74

No tocante aos setores de serviços psicossociais especializados em


atendimento à vítima nos tribunais de justiça, em um universo de 259 setores não
exclusivos, ou seja, setores que acumulam atendimento em outros tipos de
processos, apenas 72 setores prestam atendimento exclusivamente nos casos de
violência doméstica contra a mulher, um número maior que o ano de 2016 que
possuía 54 setores exclusivos. Os Tribunais de Justiça do Ceará (TJCE), Rio
Grande do Norte (TJRN) e Roraima (TJRR), declaram não possuir setor
psicossocial especializado no atendimento à vítima, seja exclusivo ou não
exclusivo. Em relação a estrutura de recursos humanos no judiciário, o “Manual de
Rotinas e Estruturação dos Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a
Mulher” (CNJ, 2018), define que varas e juizados que possuem em trâmite até 5
mil processos, devem conter em seu quadro multidisciplinar no mínimo um(a)
psicólogo(a) e um(a) Assistente Social. Em todo Brasil, apenas 15 tribunais
estavam adequadamente estruturados adequadamente.
Ainda sobre o Relatório, em 2017, no Brasil ingressaram nos Tribunais de
Justiça estaduais de todo o país 452.988 casos novos de violência doméstica
contra a mulher, um aumento de 12% em relação a 2016, com 402.695 casos
novos registrados. No que concerne a resposta do judiciário aos casos de
violência doméstica contra mulheres, o judiciário conta os “indicadores de
performances” um deles chamado de “Índice de Atendimento à Demanda (IAD)”,
utilizado para avaliar se o poder judiciário foi capaz de baixar processos pelo menos
em número equivalente ao quantitativo de casos novos. A pesquisa contatou que a
Justiça Estadual foi capaz de decidir um número de processos superior à
demanda de casos novos, foram baixados uma taxa de 119% no País, em
números representam 540.156 processos de conhecimento criminais em violência
doméstica contra a mulher em 2017, número 18% superior ao baixado em 2016,
quando foram decididos 456.858 processos.
Outro “indicador de performance” representado pela “taxa de
congestionamento (TC)” que indica o percentual de processos não decididos em
relação ao total de processos que tramitaram durante o ano. Em 2017, a taxa geral
de congestionamento nesse assunto ficou em 63%, pouco menor que a observada
em 2016, que foi de 66%.Ou seja, o número de processos não julgados em 2017,
atingiram o montante de 908.560 casos, percentual 2% maior que o ano de 2016
onde restaram pendentes de julgamento 891.818 casos pelo Brasil.
75

Em 2017 os Tribunais de Justiça estaduais registraram 2.643 casos novos


de feminicídio. O relatório esclarece que, por se tratar de previsão em lei recente
(a Lei nº 13.104, ou Lei do Feminicídio, promulgada em 2015), alguns Tribunais,
como o do Amapá (TJAP) e Alagoas (TJAL), não dispõem dessa informação. Os
Tribunais também movimentaram 13.825 casos de feminicídio em 2017, com
3.039 processos foram baixados, restando pendentes ao final do ano 10.786
processos. Foram contabilizadas 4.829 sentenças proferidas em casos de
feminicídio.
No tocante a promoção do Judiciário frente às providências urgentes, seja
para impor restrições ao agressor (arts. 22 da LMP) ou para resguardar a mulher em
situação de violência e seus dependentes (arts 23 e 24 da LMP), em 2017, totalizam
236.641 Medidas Protetivas de Urgência expedidas, houve um aumento de 21% se
comparado ao ano anterior que expediu 194.812 Medidas.
No próximo tópico iremos abordar sobre a violência contra a mulher no estado
do Rio de Janeiro, bem como suas medidas frente a esse fenômeno.

2.2. Violência contra as Mulheres no estado do Rio de Janeiro e o Projeto


Violeta

Nos últimos anos o Rio de Janeiro foi palco de diversos atos violentos contra
a mulher que envergonharam a população do estado. Um deles foi o assassinato da
Vereadora Marielle Franco, que morreu em um atentado com treze tiros que
atingiram o carro em que estava. Outro cruel acontecimento foi o da Paisagista
Elaine Caparroz que foi brutalmente espancada em seu apartamento por cerca de
um período de quatro horas, por um rapaz que estava se relacionando. Mais um
terrível caso, foi o da proprietária de uma lanchonete que foi arrastada pelos
cabelos, recebeu chutes pelo corpo e coronhadas na cabeça, por ter enviado um
pedido errado ao cliente. E o caso mais atual no estado foi o da idosa de 65 anos
Maria da Penha, morta pelo seu ex-companheiro a golpes de facão, por estar
inconformado com o término do relacionamento. Esses casos são apenas alguns
que repercutiram na mídia e não representam nem a metade dos casos computados
no estado.
76

O 12º Anuário Brasileiro de Segurança Pública divulgado em 2018 destaca


que no estado do Rio de Janeiro em 2017, 381 mulheres foram assassinadas, 68
casos foram registrados pela polícia como feminicídio. Quando comparado ao ano
anterior, percebemos que o número de homicídios foi maior totalizando 396 casos,
porém apenas 16 casos foram registrados como feminicídio.Em 2017,houve um
aumento de 17,8% na taxa de casos registrados como feminicídio referente ao ano
de 2016. Outro dado desta pesquisa, é a lesão corporal dolosa praticada contra a
mulher, em números reais totalizaram 24.206 casos de violência doméstica
registrados no estado.
Segundo a Central de Atendimento à Mulher - Ligue 180, em seu relatório do
primeiro semestre de 2018 de janeiro a junho, o Rio de Janeiro lidera o ranking de
relatos de violência e denúncias registradas nos estados brasileiros, com uma taxa
de 54,29% por 100 mil habitantes, que em números reais caracterizam 9.317
atendimentos. Desse total, 6.347 foram encaminhadas aos órgãos de defesa da
mulher e 4.446 foram respondidas, representando uma taxa de 70,6% de denúncias
respondidas.
De acordo com os dados do Dossiê Mulher 2019, elaborado pelo Instituto de
Segurança Pública (ISP/RJ), em 2018 no estado do Rio de Janeiro das 729
tentativas de homicídios registradas, apenas 275 foram qualificadas como tentativa
de feminicídio, desse total 63,5% dos autores eram companheiros ou ex-
companheiros das vítimas e 52% do total ocorreram dentro da residência.
Nos casos de homicídios dolosos foram 350 casos e registradas como
Feminicídio 71 casos. Esses dadosainda são mais alarmantes quando classificados
por cor. Em 2018, no estado do Rio de Janeiro para cada 100 mil mulheres negras
6,8% são vítimas de homicídios dolosos, mais que o dobro do índice de 100 mil
mulheres brancas que é de 2,7%. Quando comparado ao ano anterior, visualizamos
um aumento de 17,6% de homicídios de mulheres negras e uma redução nos
homicídios de mulheres pardas de 29,6% e 6,8% de brancas.

[...] o fator raça tem um peso bastante significativo nas análises dos
homicídios,merecendo, portanto, foco especial para políticas preventivas
que levem em contafatores atrelados de vulnerabilidade em relação ao
direito à vida.(Dossiê mulher, 2019)
77

Segundo a relação do autor com a vítima, os companheiros e ex


companheiros ainda são apontados como os maiores acusados de homicídios
dolosos de mulheres correspondendo a 12,3% dos casos. Quanto ao local de
ocorrência do fato a via pública com 41,4% e as residências com 34,3% são os
locais incidentes na pesquisa.
No que diz respeito a lesão dolosa, este tipo de delito não se destaca apenas
nos crimes de violência física. Ele compreende o maior
número absoluto de mulheres vítimas dentre todos analisados neste Dossiê,
somando terríveis 41.344 casos em 2018. A pesquisa também contatou uma
diminuição deste tipo de violência nos anos de 2013 a 2018, com uma maior
variaçãono ano de 2014 para 2015, com uma redução de 3.871 vítimas.
Em 2018, a violência psicológica somou 37.827 casos, caracteriza o segundo
tipo de violência que mais incide no estado, violência esta que ocorre de forma
silenciosa e progressiva, com danos intensos e devastadores. E por não deixar
marcas visíveis como a violência física, acaba sendo mais difícil de ser denunciada,
analisada e julgada (Oliveira, 2008). Em números reais do Dossiê Mulher 2019, a
ameaça é um tipo de crime que ainda prevalece as mulheres como principais vítimas
com 66,8% totalizando 37.423 dos casos, seguido pelos casos de vítimas
deconstrangimento ilegal que somam 404 mulheres vítimas. A faixa etária mais
expressiva das vítimas é a de 30 a 59 anos, com uma taxa de 59,6%.
Ainda neste ano, 4.543 mulheres foram vítimas de estupro em todo o estado,
correspondendo a 71,6% dos casos de crime de natureza sexual, um aumento de
6,8% se comparado ao ano de 2017 que teve 4.173 casos. Quanto a faixa etária
desse crime e o de tentativa de estupro, contabilizam 69,7% e 37,0% a prevalência
de vítimas jovens de até 17 anos, ou seja, 3.165 crianças e adolescentes foram
abusadas em 2018. Já as mulheres de 18 a 29 anos representam 14% das vítimas
de estupro.

É importante destacar que os crimes de natureza sexual ainda possuem


uma enorme subnotificação, principalmente quando a vítima é criança ou
adolescente. Por conta da pouca idade e dependendo das circunstâncias
em que o crime ocorreu, a vítima sequer tem consciência de que está
sofrendo violência sexual e, em alguns casos, nem sequer alcançou a
habilidade de fala para poder verbalizar o que passou. (Dossiê mulher,
2019).
78

As mulheres negras ainda são as maiores vítimas de estupro no estado,


foram 55,8% para a taxa de 37,7% de mulheres brancas. A residência continua
sendo o principal local de ocorrência desse tipo de crime, representando 71,9% dos
casos (3.265), reforçando com o fato da mulher estar mais propícia a uma violência
sexual no âmbito privado do que nos espaços públicos. O Dossiê também aponta
que 9,7% dos autores deste delito são companheiros e ex-companheiros. E 28,3%
foram vítimas de pessoas muito próximas de seu convívio familiar, ou seja, os pais,
padrastos, parentes e conhecidos.
As mulheres ainda são as principais vítimas do crime de violência patrimonial
no estado do Rio de Janeiro em 2018. O principal tipo de violência foi o de dano com
2.743 casos, seguido por violação de domicílio com 2.223 casos e supressão de
documentos com 364 casos. A faixa etária das mulheres mais recorrente para esse
tipo de violência é 30 a 59 anos, com uma taxa de 60,6%. Assim como os outros
tipos de violência, a patrimonial é marcada por 59,1% dos autores próximos à vítima.
Sobre os crimes de violência moral no estado do Rio de Janeiro, 29.665
mulheres fizeram registro de violência moral, a mais incidente é o delito demulheres
vítimas de injúria 24.583, seguido por 3.357 vítimas de difamação e 1.725 vítimas de
calúnia. Afaixa etária das mulheresque mais se destaca quanto a este tipo de
violação é a de 30 a 59 anos, com uma taxa de 60,6%, igualando a taxa da violência
patrimonial. O local com mais ocorrência é a residência com 15.738 casos. Para
Barreto (2005) definiu a violência moralcomo:

[...] um processo, mediado por palavras, símbolos e sinais, que,


estabelecidos, impõem ao outro a obediência cega sem questionamentos
ou explicações.
79

Destaco abaixo os dados da violência contra a mulher no Rio de Janeiro:

Tabela 3 - Cronômetro da Violência contra a mulher no RJ

A cada 3 dias. É vítima dehomicídio doloso em sua residência.

1 a cada 5 dias. É vítima de Feminicídio.

1 a cada 9 dias. É vítima de Feminicídio íntimo, ou seja, é cometido por


parceiros ou ex.

116 por dia. São vítimas deviolência física.

3 por hora. Registram queixa de Lesão Corporaldolosa praticada por


companheiro ou ex.

A cada 2 horas. É vítima de Estupro.

2 por hora. Registram queixa de Ameaça praticada por companheiro ou ex.

81 por dia. Registram queixa de Violência Moral (injúria, calúnia ou


difamação).

6 por dia. Têm o seu domicílio violado.

Fonte: Dossiê Mulher 2019 (ISP/RJ).

Apesar da promulgação de leis que tem o intuito de coibir a violência tanto no


ambiente doméstico como em espaços públicos, muitas agressões, seguidas de
assassinato são cometidos por companheiros e ex-companheiros. Isso nos leva a
inferir que o medo da punição não exerce eficácia, pois ainda sobressai a cultura
enraizada em nossa sociedade da dominação masculina sobre a mulher, inibindo de
certa forma a ação eficaz das esferas políticas e jurídicas.
No tocante ao judiciário, segundo dados do relatório “O Poder Judiciário na
aplicação da Lei Maria da Penha” do CNJ (2018), atualmente o Rio de Janeiro
80

possui 11 juizados especiais de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher. No


que se refere ao quantitativo do quadro multidisciplinar de atendimento às mulheres,
em 2017, ressalta-se que do total de 267 profissionais que atuam no Tribunal de
Justiça do Rio de Janeiro, 77% não atuam exclusivamente em varas e juizados
especializados em violência doméstica e apenas 23% desenvolvem atividades
exclusivas a violência doméstica. Ou seja, o TJRJ conta com uma equipe de 30
Assistente Sociais e 35 Psicólogos(as) no atendimento direto as mulheres e 205
profissionais em atividades de compartilhamento entre diversas unidades. Um
quantitativo de recurso humano julgado adequado ao número de processos,
segundo regras do CNJ, dispostas no “Manual de Rotinas e Estruturação dos
Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher” (CNJ, 2018).
Essa pesquisa mostra que o Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJRJ)
ficou em 4º lugar no ranking brasileiro com o maior número de casos novos que
ingressaram na justiça sobre violência doméstica contra a mulher, com 46.340
processos. No tocante a capacidade de resposta do judiciário frente à demanda de
processos de violência doméstica contra a mulher, o Tribunal de Justiça do Rio de
Janeiro foi o 2º do Brasil com número de processos baixados, um total de 69.675
processos de conhecimento criminais em violência doméstica contra a mulher em
2017. A pesquisa aponta que o Tribunal do Rio de Janeiro foi capaz de decidir um
número de processos superior à demanda de casos novos nesse assunto, porém o
estado leva o título de 2º no ranking nacional de casos pendentes de violência
doméstica contra a mulher, com 98.354 casos de processos acumulados. Destaco
abaixo na tabela 3, dados do Departamento de Pesquisas Judiciárias do CNJ
(DPJ/CNJ), sobre os processos de violência doméstica e feminicídio pendentes no
país nos anos de 2016 a 2018.

Tabela 4 - Processos de Violência Doméstica e Feminicídio Pendentes no TJRJ


Ano Casos Pendentes de Violência Casos Pendentes de
Doméstica Feminicídio
2016 101.839 63
2017 98.354 128
2018 100.312 82

Fonte: Departamento de Pesquisas Judiciárias do CNJ (DPJ/CNJ).


81

A pesquisa também aponta que o Tribunal de Justiça do Rio é o 3º do Brasil a


expedir Medidas Protetivas de Urgência, seja voltada a ofendida ou ao agressor,
com o quantitativo de 25.358 Medidas deferidas., batendo um recorde se comparado
ao ano de 2016, conforme tabela abaixo:

Tabela 5 - Medidas Protetivas de Urgência deferidas no TJRJ


MPU MPU MPU Comparativo Comparativo
2016 2017 2018 2017 x 2018 2016 x 2018

16.865 25.358 26.767 6% 59%

Fonte: Departamento de Pesquisas Judiciárias do CNJ (DPJ/CNJ).

Neste cenário de violência no Rio de Janeiro, esses dados chamaram


atenção especialmente em Bangu, que segundo o Censo 2010 tem uma população
de 243.125 habitantes, sendo a população de 52,72% de mulheres (114.952) e
47.28% de homens (128.173). Quanto aos dados de violência contra mulher por
circunscrição de Delegacia de Polícia Civil,o Dossiê Mulher 2019, apontou que a
delegacia de Banguficou em 2º lugar no ranking no número dedenúncias de
violência contra mulher, já os dados da Central de Atendimento a Mulher - Ligue 180
(Relatório de janeiro a junho de 2018) aponta Bangu no 8º lugar no número de
registros de ocorrência de ameaça e lesãocorporal dolosa contra a mulher.
Neste bairro localizado na zona oeste da cidadedo Rio de Janeiro, encontra-
se o nosso lócus de pesquisa que é o Projeto Violeta do Fórum Regional de Bangu.
Projeto o qual foi criado a partir do histórico relacionado à Lei Maria da Penha. Esse
projeto se desenvolve a partir da concepção ampla de acesso à justiça
contemplando medidas judiciais e extrajudiciais. Ademais, tem ainda como
motivador o fato de quando ocorre algum tipo de violência contra mulher as Medidas
Protetivas de Urgência não funcionam como realmente deveriam. Conforme Mello et
al. (2017):

Sabe-se que as medidas judiciais muitas vezes funcionam como uma


resposta pontual a uma situação de violência sendo ineficazes para sanar o
problema social. Por esse motivo, o legislador ofereceu à matéria um
tratamento especial, integrando os poderes Executivo, Legislativo e
82

Judiciário nas esferas municipais, estaduais e federal com o objetivo de


articular políticas públicas que fossem eficazes para combater a violência
baseada no gênero, (MELLO et al. 2017, p.212).

Fazendo um resgate histórico sobre o Projeto Violeta, este foi idealizado


pela Juíza Adriana Mello, em conjunto com outras autoridades envolvidas na defesa
da mulher em situação de violência - Polícia Civil, Defensoria Pública e Ministério
Público. Inicialmente foi implementado em junho de 2013 no I Juizado de Violência
Doméstica e Familiar (JVDF), localizado na Av. Erasmo Braga 115 12 Andar - Sala
1204 - Palácio da Justiça.
O Projeto Violeta tem como objetivo garantir a segurança e a proteção
máxima das mulheres vítimas de violência doméstica e familiar, por meio da
celeridade na tramitação das Medidas Protetivas de Urgência, garantindo a
segurança da mulher, vítima de violência doméstica, que por vezes estão com sua
integridade física e até mesmo com a vida em risco. Conforme prevê a Lei Maria da
Penha em seu art. 18, todo processo de Medidas Protetivas de Urgência tem que
ser concluído em até 48 horas. Porém, o Projeto levando em conta o risco a que
estão submetidas às mulheres, objetiva a conclusão do processo em cerca de 4
horas, contando do momento em que a mulher ingressa no Poder Judiciário.
A grande relevância do Projeto Violeta é justamente facilitar o acesso das
mulheres à Justiça, dando cumprimento aos tratados de Direitos Humanos das
mulheres que o Brasil ratificou e afirmando o papel do Poder Judiciário na conquista
da igualdade. Dessa forma, na prática o Projeto torna mais rápido e mais eficaz o
acesso das mulheres ao judiciário.
Vencedor do Prêmio Innovare de 2014, o mais importante da justiça
brasileira, o Projeto consiste em um núcleo de atendimento às vítimas de violência
doméstica, numa ação que conta com a participação de Defensores Públicos,
Promotores e Assistentes Sociais dentro da comarca. Conforme Mello et al. (2017, p.
213) o projeto tem o intuito de:

[...] garantir segurança e proteção imediatas às mulheres em situação de


violência doméstica e melhorar a qualidade do atendimento dispensado a
elas no Poder Judiciário, levando em conta que a assistência jurídica
gratuita se configura como instrumento fundamental para a efetividade do
princípio do acesso à justiça e do processo justo.
83

Atualmente ele é um Projeto estratégico do TJRJ, portanto faz parte de todo


o planejamento do Tribunal para um atendimento humanizado às mulheres que
sofrem com a violência doméstica e familiar. E a expansão do Projeto em novas
Comarcas ou Fóruns faz parte da programação da “Semana da Justiça pela Paz em
Casa”, campanha que acontece em todo o Brasil de 30 de novembro a 4 de
dezembro. Destaco na Quadro 5, abaixo, os procedimentos que devem ser tomados
pela mulher para ter acesso ao Projeto Violeta:

Quadro 4 - Procedimentos de acessibilidade ao Projeto Violeta


A vítima se dirige à Delegacia, preferencialmente à Delegacia
1º Passo Especializada de Atendimento à Mulher (DEAM), onde registra a
ocorrência e solicita ao Delegado(a) a cópia do Registro de
Ocorrência com o Requerimento de Medidas Protetivas. Os
pedidos urgentes saem das delegacias com uma tarja roxa que
indica a urgência no trâmite.
De posse do Registro de Ocorrência com oRequerimento de
2º Passo Medidas Protetivas, ela sedirige aos Juizados de Violência
Doméstica e Familiar Contra a Mulher, onde a Medida é autuadae
viraum processo.
A vítima é acolhida pela equipe técnica composta por Psicólogos(as)
3º Passo e Assistentes Sociais, onde é preenchido o Formulário de
Requerimento de Medidas Protetivas e em seguida avaliam o caso,
apresentando relatório ao(à) Juiz(a).
4º Passo Ela é encaminhada para entrevistacom a Defensoria Pública.
O pedido de Medida Protetiva é encaminhado para o(à) Juiz(a), que
decide em média, em quatro horas sobre o deferimento da Medida
5º Passo Protetiva. Caso deferida, as providências para garantir a segurança
da vítima são tomadas imediatamente por Oficial de Justiça, se
necessário com o apoio de Policiais.

Fonte: Observatório Judicial da Violência contra a Mulher - TJRJ.

Com intuito de acolher a mulher vítima de violência no momento que se


encontra fragilizada e proporcionar um ambiente humanizado e respeitoso para as
84

mulheres vítimas de violência, o Projeto conta com um espaço denominado Sala


Lilás, onde a mulher é atendida por uma equipe multidisciplinar contendo Policiais,
Assistentes Sociais, Psicólogos(as) e enfermeiras, onde é realizado exames periciais
e a coleta do relato da violência sofrida. Além desta sala, o Projeto conta com uma
brinquedoteca para atividades lúdicas com as crianças, enquanto as mães estão
sendo atendidas pela equipe profissional. Atualmente, o “Projeto Violeta” abrange
dez Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher (JVDFM),
distribuídos pelos municípios do Rio de Janeiro e na área metropolitana, conforme o
quadro abaixo:

Quadro 5 - JVDFM no estado do Rio de Janeiro


JUIZADOS LOCALIZAÇÃO

I E V JVDFM Centro da cidade do RJ

II JVDFM Regional de Campo Grande

III JVDFM Fórum Regional de Jacarepaguá

IV JVDFM Fórum Regional de Bangu

JVDFM Comarca Nova Iguaçu – Mesquita

JVDFM Comarca de São João de Meriti

JVDFM Comarca de Saquarema

JVDFM Comarca de Belford Roxo

JVDFM Comarca de Petrópolis

Fonte: Observatório Judicial da Violência contra a Mulher - TJRJ

Segundo os dados do Observatório Judicial da Violência contra a Mulher, do


Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro (TJRJ), desde a criação do Projeto
em 2013, deferiu as vítimas de violência doméstica, cerca de 2.697 Medidas
Protetivas de Urgência.Já no período de janeiro a junho de 2018, o Projeto atendeu
420 mulheres. Em uma linha do tempo a Comarca de Bangu desde a sua criação
liderou em atendimentos às mulheres em situação de violência. A tabela abaixo
85

contém a série histórica de atendimentos de sua criação até o primeiro semestre de


2018 dos Juizados de Violência doméstica e Familiar contra a Mulher, porém não
apresenta os dados dos JVDFM de Belford Roxo por ter sido inaugurado no
segundo semestre de 2018 no dia 19 de dezembro e Petrópolis que foi inaugurado
em 26 de março de 219.

Tabela 6 - Atendimentos nos JVDFM no estado do Rio de Janeiro

Juizados Inícios das 2013 2014 2015 2016 2017 2018


atividades
I JVDFM – capital 01/06/2013 256 197 306 230 126 48

II JVDFM - Campo 16/11/2016 - - - 12 153 118


Grande
III JVDFM – 01/12/2015 - - 3 33 56 11
Jacarepaguá

IV JVDFM – Bangu 16/11/2016 - - - 0 251 123

V JVDFM – capital 17/03/2014 - 90 216 120 133 44

JVDFM - Nova Iguaçu 30/11/2015 - - 6 67 21 23

JVDFM - São João de 06/11/2017 - - - - 1 4


Meriti
JVDFM- Saquarema 10/01/2018 - - - - - 49

Fonte: Observatório Judicial da Violência contra a Mulher – TJRJ

Quanto ao acolhimento das mulheres de forma privativa e individualizada,


previsto no Manual de Rotinas e Estruturação dos Juizados de Violência
Doméstica e Familiar contra a Mulher” (CNJ, 2018). A Comarca de Bangu, possui
gabinete privativo para atendimento à mulher vítima de violência e uma
brinquedoteca para atendimentos as crianças. No tocante a equipe multidisciplinar
em seu atendimento, a Comarca conta com apenas 2 profissionais exclusivos do
Projeto, sendo 1 Assistente Social e 1 Psicóloga.
Todavia, além dos dados estatísticos de violência que são cometidos contra
mulher no Estado do Rio de Janeiro o que nos chama atenção para realização de
86

nossa pesquisa é compreender como se desenvolve o Projeto Violeta na Comarca


de Bangu. No tópico seguinte, iremos analisar as Medidas Protetivas nesta comarca
dentro do Projeto Violeta.

2.3. Análise das Medidas Protetiva de Urgência na Comarca de Bangu - RJ

Nesse momento do trabalho apresentaremos os dados da pesquisa


realizada na Comarca de Bangú - RJ, a respeito das mulheres vítimas de violência
que procuraram apoio jurídico e assistencial no Projeto Violeta, com intuito de
buscarem apoio e solução para os diversos tipos de violência que sofreram.
Para nortear a pesquisa tivemos como objetivo geral a realização da análise
da implementação das Medidas Protetivas de Urgência no Projeto Violeta como um
mecanismo para o enfrentamento da violência contra a mulher e como objetivos
específicos, caracterizar o Projeto Violeta como uma experiência de implementação
das Medidas Protetivas de Urgência; identificar o perfil das usuárias atendidas e dos
agressores no ano de 2018; classificar os tipos de violência mais recorrentes e as
principais medidas de proteção deferidas.
Importante ressaltar que analisamos 60 Formulários de Requerimento de
Medida Protetiva que estavam disponíveisno cartório do Juizado, que equivale à
metade dos atendimentos do primeiro semestre de 2018, o qual totalizaram 123
mulheres atendidas na comarca de Bangu. Este Formulário (em anexo) é uma
síntese do formulário utilizado pela equipe do Projeto durante os atendimentos as
mulheres, selecionamos as perguntas mais relevantes ao nosso objeto de pesquisa.
A escolha para análise dos Formulários se deu de forma aleatória e não utilizamos
critérios específicos para utilização desses.
É importante enfatizarmos que os Formulários que utilizamos como
instrumental de estudo é composto por perguntas abertas e fechadas, que dividindo
em eixos de análise enfatizam:

1) a caracterização socioeconômica das vítimas e seus agressores;


2) o contexto da violência sofrida;
3) a solicitação das Medidas Protetivas de Urgência;
4) a manifestação da equipe técnica e medidas judiciais tomadas.
87

Iniciaremos a análise dos resultados com a caracterização socioeconômica


das vítimas e seus agressores, seguiremos por eixo conforme a sequência
especificada e acima.

2.3.1. Caracterização socioeconômica das vítimas e seus agressores

Vários autores de diversas áreas de estudo como a Psicologia, Assistência


Social, Sociologia, Antropologia e mais recente o direito, tentaram traçar um perfil
das vítimas de violência, bem como de seus agressores. Na tentativa de se traçar
um perfil da vítima, Noémia Carvalho (2010, p. 26) assim constatou:

De acordo com a bibliografia revista, é consensual concluir que as


diferentes investigações são controversas e apontam para a não existência
de um perfil psicológico ou sócio-cultural pré-existente nas mulheres
agredidas (Sprenkle, 1992).

Um dos pontos mais importantes para compreender a violência doméstica e


familiar contra a mulher é reconhecer que não existem perfis de vítimas e
agressores e nem padrões absolutos de comportamento. Mas temos que
entender o contexto de cada relação onde ocorre a violência contra as mulheres,
portanto, é essencial para identificar as discriminações de gênero que estão nas
raízes destas agressões.
Inicialmente apresentaremos o perfil etário das mulheres vítimas de violência
atendidas pelo Projeto Violeta da Comarca de Bangu que está visibilizado no Gráfico
1 abaixo.
88

Gráfico 1 -Faixa Etária das Vítimas

Fonte: O autor, 2019.[M2]

Porém mesmo possuindo a menor taxa do universo de mulheres atendidas


no Projeto, não podemos deixar de observar que 5% são mulheres muito jovens
sofrendo violência. Um estudo realizado pela Fundação Oswaldo Cruz, em escolas
públicas e privadas em dez capitais brasileiras, no período de 2007 a 2010,
investigou a violência nos relacionamentos afetivo-sexuais em adolescentes de 15-
19 anos. Os dados de prevalências de vitimização quantificam 86,9% e de
perpetração de algum tipo de agressão 86,8% e 76,6% dos adolescentes ambos os
sexos atuando, simultaneamente, como vítimas e autores de diversas formas de
violência. Porém a atuação da mulher está mais frequente em situação de
autodefesa. Ou seja, a violência entre a população jovem em relações íntimas é um
tema com grande relevância que merece ser investigado, bem como nas relações
entre pessoas do mesmo sexo.
Em relação a renda, os formulários, demonstram que as mulheres em sua
maioria possuem trabalho remunerado caracterizando 77% do total. Nessa
proporção estão incluídas as empregadas no mercado formal, as trabalhadoras
informais e as autônomas. E a parcela de3% das mulheresapesar de não estarem
89

ativamente no mercado de trabalho, detém renda salarial por serem aposentadas.


Em contraponto, uma percentagem de 20% das mulheres não trabalha, dessas
vítimas que não possuem renda 3% são estudantes, 5% declararam se do lar e 12%
encontram-se desempregadas. A renda familiar dessas mulheres tem sua maior
taxa na faixa de 1 saláriomínimo, com 51%, porém um quantitativo expressivo
declarou uma faixa de renda de 1 salário e meio, com 24%, seguido de 2 salários
mínimos, com 12%.

Gráfico 2 - Renda das mulheres atendidas no Projeto

Fonte: O autor, 2019.[M3]

É importante no tocante do trabalho destas mulheres, a Lei Maria da Penha,


ela trouxe consigo a providência cautelar que repercute diretamente nas relações de
trabalho e seguridade social da mulher vítima de violência doméstica e familiar,
conforme disposto em seu art. 9º no parágrafo 2º, inciso II:

A assistência à mulher em situação de violência doméstica e familiar será


prestada de forma articulada e conforme os princípios e as diretrizes
previstos na Lei Orgânica da Assistência Social, no Sistema Único de
Saúde, no Sistema Único de Segurança Pública, entre outras normas e
políticas públicas de proteção, e emergencialmente quando for o caso. §
2oo O juiz assegurará à mulher em situação de violência doméstica e
familiar, para preservar sua integridade física e psicológica:
90

(...) II - manutenção do vínculo trabalhista, quando necessário o


afastamento do local de trabalho, por até seis meses.

Com a prerrogativa da preservação da integridade física e psicológica da


mulher violada, de forma simplificada, este artigotrata da manutenção do
vínculotrabalhista da mulher vítima de violência, quando necessário o seu
afastamento do local de trabalho pelo período de até seis meses.Seja pela agressão
propriamente dita, por medo de sair de casa, por um dia inteiro prestando queixas na
delegacia ou fazendo exames de corpo de delito, entre outros.
Em que pese se tratar de uma importante prerrogativa trabalhista
concedida as mulheres, segundo a pesquisa feita em 2017, pela Universidade
Federal do Ceará, que tem como título“Relatório da Violência Doméstica e seu
impacto no Mercado de Trabalho e na Produtividade das Mulheres”, destaca que por
vergonha em assumir que sofre violência, uma grande parcela dessas mulheres não
assumem para seus empregadores que sofrem violência e por vezes, não justificam
suas faltas, afetando diretamente em 50% em sua produtividade laboral, levando
muitas vezes ao quadro de demissão seja por vontade própria ou por iniciativa do
empregador.
Dentre os tipos de emprego que as mulheres estão inseridas, destaca-se
com 12% do total o emprego doméstico, sendo seguido com taxas semelhantes os
empregos de serviços gerais e manicure com 10% cada um. É importante
ressaltarmos que em sua maioria os tipos de empregos que essas mulheres
exercem são atividades tradicionalmente femininas, precarizados e de baixa
remuneração, podendo estar ligados ao baixo grau de escolaridade, com a inserção
tardia da mulher no mercado de trabalho ou até mesmo com a baixa oferta de
emprego no país. Apesar de terem conquistado mais espaço no mercado de
trabalho, dados de 2018 da Relação Anual de Informações Sociais (Rais) do
Ministério do Trabalho, mostram que as mulheres ainda possuem uma participação
maior no serviço familiar não remunerado na comparação com os homens. O Gráfico
3 abaixo, ilustra os tipos de trabalho remunerado das mulheres:
91

Gráfico 3 -Tipos de emprego das mulheres atendidas no Projeto

Fonte: O autor, 2019.[M4]

Sobre a análise da relação de parentesco entre agressor e vítima, no Gráfico


4 abaixo informa que em 47% do total são os ex-companheiros os maiores
agressores dessa vítima, 32% são maridos e 12% companheiro. Dado afirmado em
todas as pesquisas que apresentamos ao longo deste trabalho, uma delas é a
pesquisa “Visível e invisível: a vitimização de mulheres no Brasil” de 2019 do
Instituto Datafolha e FBSP, aponta que 76,4% das mulheres que sofreram violência
afirmaram que agressor era alguém conhecido da vítima.
Apesar que as agressões de maridos, namorados e ex-companheiros serem
mais conhecidas nos casos enquadrados na Lei Maria da Penha, podemos
contemplar no Gráfico 4 outros graus de parentescos, como o irmão que possui uma
taxa de 5% do total e de filhos com 1%. São situações de dominação e
superioridade cultural que muitos homens ainda admitem possuir sobre a mulher.
92

Gráfico 4 -Relação de parentesco

Fonte: O autor, 2019.[M5]

A análise da situação familiar das vítimas que podemos visualizar no Gráfico


5 e 6, demonstram que amaior parte das mulheres não possuem filhos com o
agressor com uma taxa de 53%. No entanto, constatou-se que 89% das mulheres
convivem na mesma residência com seus filhos e algumas dessas pessoas
contribuem com a renda mensal da família.

Gráfico 5 - Possuem filhos em comum

Fonte: O autor, 2019.[M6]


93

Gráfico 6 -Pessoas que convivem na mesma residência

Fonte: O autor, 2019.[M7]

Os dados analisados nos mostram, que o perfil das mulheres vítimas de


violência atendidas no Projeto Violeta são brasileiras, em sua maioria são jovens,
em sua maioria não possuem filhos em comum com o agressor, que exercem
atividade remunerada em empregos de baixa qualificação, recebem uma média
salarial de até 2 salários mínimos e estão buscando o poder judiciário para cessar
com a violência sofrida por inúmeras vezes como veremos adiante.
A partir do levantamento dos dados dos Formulários, identificamos a
ausência da questão sobre o perfil étnico ou racial da vítima, dados já contabilizados
em muitas pesquisas nacionais e internacionais que constatam a maior incidência da
violência nesse recorte de mulheres. Como apontado no Atlas da Violência de 2018,
as mulheres negras apresentam proporções mais elevadas do que as brancas nos
indicadores de violência de gênero. É de suma importância contar com esses dados
para melhor classificar as vítimas de violência que buscam o serviço do Projeto
Violeta.
Sobre a caracterização do agressor, podemos inferir que sua análise será de
forma unilateral, uma vez que o preenchimento dos Formulários de Requerimento de
Medida Protetiva é obtido através do relato das vítimas no momento de seu
acolhimento pela equipe do Projeto. Isso significa que só teremos a informação a luz
da vítima e não do agressor, por ser um projeto que atende apenas as mulheres
vítima de violência e seus filhos(as).
Iniciaremos a descrição do perfil do agressor, demostrando no Gráfico 7 sua
faixa etária.
94

Gráfico 7 -Faixa Etária do Agressor

Fonte: O autor, 2019.[M8]

Quanto a faixa etária podemos extrair que o grupo que mostrou maior
incidência são jovens entre 20 e 29 anos de idade, com 33%, seguido por homens
de 30 e 39 anos de idade, com 25% e 20% compõe a faixa etária de 40 e 49 anos.
No tocante trabalho e renda do agressor, percebemosuma taxa expressiva de
97% dos homens que possuem trabalho remunerado, enquanto uma pequena
parcela de 3% é de desempregados e estudantes.
Sobre a renda são as mais variadas, porém se destaca a taxa de 67% de
homens que tem como renda a faixa de 1 salário mínimo e meio, seguido por a
salário mínimo com 14%, 2 salários mínimos com 11% e a faixa de 3 a 5 salários
mínimos com 8% do total. Ou seja, são homens que em sua maioria com baixos
salários, porém com salários maiores que os das mulheres. Como mostram os
dados de 2018 da Relação Anual de Informações Sociais (Rais) do Ministério do
Trabalho, a diferença salarial entre homens e mulheres vem diminuindo aos poucos
nos últimos anos, no entanto a remuneração média feminina em 2017 correspondia
a 85,1% do salário dos homens.
95

Gráfico 8 - Renda dos agressores

[M9]

Fonte: O autor, 2019.[M10]

No Gráfico 9, apresentamos os tipos de atividades remuneradas que eles


exercem. Os grupos ocupacionais que prevalecem são os Autônomo com 19% do
total, seguido por 15% do Vendedor, 10% do Biscateiro, com uma taxa de 8% cada
um estão o Auxiliar de serviços de Gerais e o Pedreiro. Por fim com as menores
taxas de 1% cada um estão o Professor, o Engenheiro e o Empresário. Podemos
inferir que em sua maioria são atividades com menor exigência de escolaridade e de
baixa remuneração.
96

Gráfico 9 - Tipos de empregos dos agressores

[M11]Fonte: O autor, 2019.[M12]

Verificamos que 72% do total de agressores não possuem armas de fogo. A


relação entre a posse/porte de armas de fogo e o agravamento da violência contra
as mulheres é de fato reconhecida pela Lei Maria da Penha, uma vez que prevê em
seu no artigo 22 a Medida Protetiva de suspensão da posse ou do porte de armas
do agressor.
Naturalmente, outros fatores têm que ser analisados para garantir um país
com menos violência, porém, o controle da arma de fogo é central. Se analisarmos a
conjuntura atual, observamos que há um retrocesso e que essa ação, do presidente
Jair Bolsonaro em aprovar o Projeto de Lei 3723/19 para permitir a concessão de
porte de arma de fogo a novas categorias, além das previstas no estatuto do
desarmamento pode gerar aumento significativo nos registros de assassinato de
mulheres.
97

2.3.2. O contexto da violência

Ainda segundo os Formulários de Requerimento de Medida Protetiva, neste


segundo eixo daremos destaque para a descrição dos episódios de violência.
Iniciaremos destacando no Gráfico 10, olocal de ocorrência da violência,
constatamos que o espaço privado, as residências ainda são os ambientes propícios
para que ocorra a violência contra a mulher. Entretanto, é interessante ressaltar e
distinguir a violência doméstica e familiar, pois conforme Paes (2017), e gráfico
abaixo, a violência que atinge as mulheres está muito próximo delas, logo, é dentro
de suas casas o ambiente da violência e são seus familiares os agressores:

Gráfico 10 - Local de ocorrência da violência

Fonte: O autor, 2019.[M13]

A respeito dos nossos dados e fazendo uma comparação com a pesquisa


Visível e invisível: a vitimização de mulheres no Brasil(2019), respectivamente, a
violência têm ocorrido nas residências com 42%, e nas vias públicas com 29% são
os locais com maior incidência.
Sendo assim, percebemos que o lar ao contrário da ideia de que é um local
seguro para mulheres e o ambiente urbano é perigoso, é justamente dentro de casa
que registramos os maiores índices de violência contra a mulher.
98

Gráfico11 -Violência ocorreu na presença de menores

[M14]Fonte: O autor, 2019.[M15]

Em análise ao Gráfico 11, podemos contatar que uma grande parcela de 57%
das violências são vivenciadas pelos filhos(as). Devemos levar em consideração que
o ambiente famíliar é um espaço importante para o desenvimento do ser humano,
uma vez que é neste ambiente que tem inicio o processo de construção da
socialização de cada indivíduo. Nesse sentido Romanelli (1998) destaca que o
processo de socialização é transmitido as crianças, durante o cotidiano dos adultos
por meio de valores, normas e modelos culturais já consolidados e pré
estabelecidos. Portanto, os adultos são modelos para as crianças, que por sua vez
tomam como exemplo a forma como os pais agem em seu dia a dia, assimilando
assim posturas e valores que serão desenvolvidos ao longo de sua vida. Nesse
sentido Saffioti (1997, p.51) ratifica:

[...] a violência é um comportamento aprendido, crianças vítimas de violência


apresentam maior probabilidade de se tornarem adultos violentosdo que as
não-vítima.

Vale enfatizar que estas crianças que testemunham atos de violência, são tão
vítimas quanto suas mães e podem carregar para toda a vida grandes traumas,
necessitando também de atendimento psicosocial e proteção do Estado.
99

Gráfico 12 – Número de vezes que foram agredidas

Fonte: O autor, 2019.[M16]

Gráfico 13 -Vítima já fez outros registros de ocorrência

Fonte: O autor, 2019.[M17]

Os Gráficos 12 e 13 acima, nos mostram uma série de números


impressionantes. Uma proporção de 25% das vítimas foram agredidas entre 11 e 15
vezes; 17 % foram agredidas acima de 15 vezes. Associado a isso, verifica-se 53%
das mulheres não havia denunciado as violências pretéritas. No tocante à
quantidade de vezes que a violência ocorreu,verificamos que a grande maioria das
100

vítimas somente procurou umamedida judicial após a ocorrência de inúmeras


agressões.
A pesquisa do Fórum Brasileiro de Segurança Pública e Instituto Datafolha
(2019), destaca que a mulher após sofrer uma violência, uma expressiva taxa de
52% de mulheres agredidas não denuncia seu agressor, taxa que se repetiu no ano
anterior a pesquisa.
A realidade é que orientação jurídica e o acesso à informação são uma
grande barreira no acesso à justiça, principalmente quando se trata de violência
doméstica contra a mulher, pois essa violência é tratada culturalmente como um
assunto privado, onde, na maioria das vezes, as mulheres são culpabilizadas pela
violência sofrida e pelas consequências de tal denúncia. Um fator preponderante
para essa enorme demanda de mulheres não denunciarem, está na descrença no
poder judiciário, em decorrência a diversos fatores, que segundo Ferraz (1992) o de
maior preponderância é a demora na prestação dos serviços do judiciário.
Outra pesquisa que corrobora com esses dados é a do Ministério da Saúde,
através do cruzamento entre registros de óbitos e atendimentos de entrada em
hospitais, unidades de pronto atendimento (Upas) ou ambulatórios públicos no
período de 2011 a 2016. Constatou-se que 3 entre cada 10 mulheres que morreram
no Brasil por causas ligadas à violência já eram agredidas frequentemente, e já
haviam dado entrada na rede hospitalar pública em busca de tratamento para
hematomas, fraturas e outros tipos de lesões associados à violência. Outro dado
que reforça este fenômeno é o estudo do Fórum Brasileiro de Segurança Pública e
Instituto Datafolha (2019), onde 27,4% das mulheres relataram que tinham sofrido
algum tipo de violência nos 12 meses anteriores.
Em consonância a esses dados, contatamos no Gráfico 14 que somente 37%
das a esses dados informaram que seus agressores respondem a processo criminal
pelas agressões anteriores, enquanto uma grande taxa de 60% do total informa que
esses agressores não respondem a processo algum. Entretanto, como mostra o
Gráfico 15, 50% das mulheres afirmam que tiveram suas Medidas Protetivas de
Urgência deferidas e 37% destas mulheres ainda estão sem as Medidas de
Proteção da LMP. Ou seja, o fato do homem já responder processo criminal de
violência contra a mulher não é um fator que inibe a ocorrência de novos casos de
violência, ao passo que esta mulher já está no mínimo soclicitando mais uma vez a
proteção do Estado para o quadro de violência que está vivendo. Outro agravante, é
101

que esses homens são reincidentes no mesmo crime e ainda estão descumprindo
medidas judiciais impostas a ele (Lei 13.641/2018, que introduziu o artigo 24-A na
Lei 11.340/2006), ato ao qual é passivel de prisão em flagrante quando houver
descumprimento à ordem judicial de MPU. Ou seja, o juiz(a) irá avaliar se a ordem
judicial estava ou não em vigor e quais eram as medidas concedidas a esta mulher
para saber se haverá ou não a responsabilização criminal deste homem. Outro
ponto de avaliação do judiciário é se houve descumprimento insignificante, que não
teve intenção de violar a ordem judicial, logo não será caracterizado como crime,
como no caso de envio de mensagem pontual para ter notícia dos filhos; encontro
não intencional ou agressivo durante busca dos filhos; compatibilizações
decorrentes de ambos trabalharem no mesmo local, estudarem na mesma
faculdade, frequentarem a mesma igreja, até adequado esclarecimento da
abrangência da decisão da MPU. Todo esse processo demanda um longo tempo de
análise, o ideal seria que houvesse compartilhamento de informações entre sistema
de Justiça e segurança pública, de forma que as autoridades policiais pudessem
verificar imediatamente o conteúdo processual da MPU e as mulheres pudessem ser
informadas em tempo real quanto a aproximação ou liberdade de seu agressor.

Gráfico 14 - O autor do fato responde a processo criminal

Fonte: O autor, 2019.[M18]

Gráfico 15 - Tem Medida Protetiva de Urgência por violência anterior


102

Fonte: O autor, 2019.

A respeito do descumprimento de MPU, um projeto inédito no estado do Rio


de Janeiro em vigor este ano ainda em fase de teste, fruto de uma parceria do
Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJRJ) e da Secretaria de Administração
Penitenciária (Seap), visa a segurança da mulher vítima de violência através de um
dispositivo eletrônico disponibilizado a mulher pela Seap que recebe um sinal
emitido pelas tornozeleiras eletrônicas utilizadas pelos acusados de violência
doméstica. Quando este estiver próximo a sua vítima, o aparelho vibra e emite um
som de aleta. O segundo aviso é por meio de contato telefônico da Central de
monitoramento que avisa a mulher sobre a localização do agressor e dá orientações
quanto as atitudes que ela deve tomar para manter-se segura.
A utilização de dispositivo eletrônico para avisar sobre a aproximação de
acusados de agredir mulheres segue uma determinação judicial da Vara de
Violência Doméstica do TJRJ. A primeira a receber o aparelho foi a atriz Cristiane
Machado, que foi agredida por seu esposo no ano passado, agressões que foram
flagradas por câmeras de segurança da residência do casal, onde demonstra o
empresário e ex-diplomata Sérgio Schiller Thompson Flores, agredindo e
ameaçando a atriz com quem foi casado por quase dois anos. Cristiane foi avisada
no mesmo dia em que recebeu o equipamento eletrônico, que seu ex-marido havia
desobedecido a uma Medida Protetiva de proibição de aproximação e estaria a
menos de 200 metros de distância. Porém em análise ao descumprimento, não foi
constatado uma aproximação, o que houve foi uma um cruzamento acidental entre
os dois, já que Sérgio estava passando de carro no local em que Cristiane estaria.
103

Os dados dos Gráficos 13 e 14 nos fazem deduzir que essa mulher


possivelmente realizou e solicitou pela segunda vez as MPU. Entretanto, caímos nos
seguintes questionamentos: aonde o judiciário está falhando? Pois, quase metade
das mulheres informam terem realizado a primeira denúcia de agressão, e outro
questionamento: o que falha no sistema jurídico que não resolveu o caso na primeira
solictação de MPU?

2.3.3. A solicitação das Medidas Protetivas de Urgência

Nossa discussão neste eixo irá percorrer o contexto da solicitação das


Medidas Protetivas de Urgência no Projeto. Verificamos que 60% das mulheres
informaram que sofreram agressão antes de registrarem a denúncia atual. Em
relação ao último ato de requerimento que levou a vítima a solicitar as MPU, os tipos
de violência sofridas foram com 28% a lesão corporal a mais recorrente, seguida de
23% de ameaça e 17% de ameaça de morte. Destacamos que 13% já reportam a
tentativa de feminicídio, lei mais recente (2015) e que já surge com força na
tipificação das situações de violência. (Gráfico 16)

Gráfico 16 - Violência sofrida no último, segundo as vítimas

Fonte: O autor, 2019.[M19]


104

Logo, compreendemos que a violência contra a mulher está baseada no


vínculo entre a dominação masculina, e conforme as autoras Oliveira, Lima e Arana
(2017, p. 203):

[...] a dominação masculina é resultante, também, da socialização machista,


pois “dada sua formação de macho, o homem julga-se no direito de
espancar sua mulher. Esta, educada que foi para submeter-se aos desejos
masculinos, toma este destino como natural”.

Enfatizamos a respeito da violência contra a mulher, especialmente os


assassinatos. Os dados do Dossiê Mulher 2019, ressaltam que em 2018 no estado
do Rio de Janeiro, 41.344 mulheres foram vítimas de lesão corporal, 37.423
sofreram ameaça e 729 sofreram tentativas de homicídios.
O Gráfico 17abaixo, trata dos motivos que levaram a vítima a solicitar a
MPU, porém eles enfocam a visão da equipe técnica durante o preenchimento do
Formulário de Requerimento. Foi relatado pelas profissionais como motivo da
solicitação das MPU, 29% como agressão, 26% lesão corporal, 20% ameaça, 15%
proteção a vítima e 10% como tentativa de feminicídio. Percebemos uma certa
semelhança e sintonia na identificação quanto a visão das vítimas e da equipe
técnica.

Gráfico17 -Motivos da Medida Protetiva, segundo a equipe técnica

Fonte: O autor, 2019.[M20]


105

Nos Gráficos 18 e 19 contatamos que existe muito medo ente as mulheres


para com seus agressores, mas esse medo não as paralisa, porque estão cientes de
seus direitos e estão requerendo a proteção judicial. A fim de garantir a sua própria
segurança, os dados nos mostram que 60% das mulheres vítimas de violência
desejam o afastamento do agressor de sua residência. Além disso, 85% dessas
deseja proibir aproximação do agressor.

Gráfico 18 - Deseja que o ator do fato seja afastado do lar para garantir sua
segurança

Fonte: O autor, 2019.[M21]

Gráfico 19 - Deseja proibir a aproximação do autor

Fonte: O autor, 2019.[M22]


106

Os dados a partir do Gráfico 18, mostram que de fato essas mulheres


querem e afastar de seu agressor. E que após vários episódios sofridos, desejam e
requerem a proteção do Estado para romper esse ciclo de violência.

Gráfico20 -Deseja proibir que o autor mantenha contato com você

Fonte: O autor, 2019.[M23]

Gráfico 21 -deseja proibir que o autor mantenha contato com os filhos

Fonte: O autor, 2019.[M24]

A respeito dos gráficos 20 e 21 é interessente analisarmos ambos em


conjunto, pois notamos que existe preocupação por parte da vítima agredida em não
manter contato com o agressor, pois 93% dos formulários analisados mostram isso,
se formos detalhar alguns aspectos, a mesma vitima que tem filho em comum com o
agressor, 43% não quer que esse mantenha contato com os filhos.
107

2.3.4. Parecer da equipe técnica e medidas judiciais tomadas

O fomulário de requerimento de MP apresenta em seus últimos quesitos os


itens “detalhes da violência sofrida”, além das “manifestações da equipe técnica” e
“medidas judiciais tomadas”. A primeira apresenta a descrição detalhada da
violência sofrida. A segunda é voltada para a manifestação da equipe técnica quanto
o que sugerem ao judiciário em relação a violência sofrida por esta mulher. A
manifestação do judiciário vem através das decisões tomada por estes, as quais em
grande maioria acatam a sugestão da equipe técnica, tais como: proibição de
contato por qualquer meio de comunicação com a vítima, seus familiares e
testemunhas; proibição de aproximação da ofendida e seus familiaresna qual é
fixado distancia entre agressor e vítima, podendo ser estipulada por 100, 200, 300,
no máximo 500 metros, entre outras.
Tais medidas acima são reforçadas ou até mesmo aumentadas, dependedo
da medida judicial. Em algumas exceções, ressalvando que o agressor possa
realizar visitas somente aos filhos, mas sem manter contato com a mulher agredida,
seus familiares, amigos e até mesmo proibido de frequentar o mesmo ambiente
dessa. Todavia, observamos que os pedidos/pareceres de ambas as equipes,
técnica e judiciais são muitas vezes semelhantes, o que nos leva a indagar que os
atendimentos são realizados num processo acelerado sem a devida importância
para os casos.
Nesse processo de constituição das MPU e manifestações das equipes
técnicas e jurídicas, elaboramos a Tabela 7, com intuito de mostrare quantificar os
tipos de medidas requeridas às vítimas de violência. É pertinente enfatizar que
quando necessário e sem prejuízo de outras medidas o(a) juiz(a) poderá aplicar as
Medidas Protetivas de Urgência em conjunto ou separadamente.
Sendo assim, a Tabela 7, abaixo tipos de medidas requeridas mostra as
quantificações dessas:
108

Tabela 7: Tipos de Medidas Requeridas Pela Equipe Técnica


Total de
Tipos de Medidas Protetivas requeridas pela equipe Formulários
técnica Analisados 60
Proibição de aproximação da ofendida e seus familiares 60
Proibição de contato com a ofendida 60
Afastamento do lar 19
Proibição de frequentar o mesmo lugar que a ofendida 14
Prestação de alimentos provisionais ou provisórios 9
Restrição ou suspensão de visitas aos dependentes 8
menores
Suspensão do porte ou restrição do porte de armas 2
Garantia de proteção policial 6

Fonte: O autor, 2019.[M25]

Nesse ponto observamos que as medidas requeridas nos itens 1 e 2 são


paralelas, pois os 60 fomulários analisados mostram as decisões de proibição de
aproximação com a ofendida e seus familiares, e consequentemente, carrega a
proibição do contato com a mesma. Ou seja, ambas decições técnicas e judiciais
andam juntas, fortalecem uma possível reincidência nas ações de violência.
Entendemos que o “afastamento do lar”, “proibição de frequentar o mesmo
lugar que a ofendida”, são respectivamente, 19 e 14 mulheres vítimas de violência,
corrobora com os itens 1 e 2 da Tabela 7acima, pois reforçam o afastamento entre
agressor e vítima.
As “prestações de alimentos provisórios” são expedidas quando a vítima é
dependente do agressor, ou quando há filhos em comum entre ambos, e a vítma
não tem condições de custear os gatos com alimentação.
A suspenção do porte arma do agressor, sendo registrasos 2 vítimas que
informaram a utilização do objeto pelo agressor, é primordial nesse campo das
medidas, pois consideramos que um sujeito armado tem maiores possibilidades de
cometer feminicídio. Ademais, observamos que muitas vezes mesmo que as
mulheres não queiram ter o contato com o seu agressor, esses acabam tentando
conseguir encontrá-la e o que se observa quando há esse encontro e o homem está
109

armado, acontece de haver o assassinato da mulher por justamente não querer


reatar o relacionamento com o agressor.
No último tópico, “garantia de proteção policial”, do total determinado
judicialmente, apenas 6 foram expedidas com essa medida, entretanto, no nosso
ponto de vista consideramos que essa medida é essencial na proteção da vítima,
pois se houvesse quantidade suficiente de policiais para o que demanda a
sociedade, as mulheres não seriam vítimas fáceis dos agressores, ou seja, estariam
protegidas, se possível, 24 horas e não se preocupariam em dar continuidade em
sua rotina diária.
Após essa demosntração das medidas de proteção em nosso lócus de
pesquisa, realizaremos uma comparação dessa, com as pesquisas realizadas por
Mello (2017) no “Projeto Violeta” no estado do Rio de Janeiro, e Parizotto (2016), na
cidade de São Paulo, especificamente no Poder Judiciário.
As três pesquisas em comum apresentam em suas análises que as
jurisdições utilizam para o combate a violência contra a mulher o Capítulo II da Lei
11.340/06 especificamente os artigos. 18 a 24, nos quais apresentam dois tipos de
medidas protetivas: as medidas protetivas de urgência que obrigam o agressor (art.
22 da LMP) e as medidas protetivas de urgência à ofendida (art. 23 e 24 da LMP).
Na pesquisa de Mello (2016, p. 222), constatou-se que a medida protetiva é
relativa, pois o encaminhamento da vítima a programas de assistência e apoio,
embora não seja solicitado formalmente pelas vítimas, é aplicada pelas(os)
magistradas(os), após conversa com a equipe técnica, quando verificada a
necessidade. Embora não conste nos autos tais medidas protetivas desempenham
importante função no auxílio às vítimas, pois muitas dessas ainda não têm suas
vidas estabilizadas, e ainda vive dependente de outrem.
Para Parizotto (2016) é importante reconhecermos a importância das MPU’s,
pois elas reforçam a ampla aplicação destas na sociedade, principalmente nos
agressores das vítimas, no entanto, é relevante reiterar que essas leis acabam
superando a dicotomização entre MPUs criminais (amplamente aplicadas) e MPUs
cíveis (esparsamente aplicadas), no entanto, essas são importantes sim, porém,
reconhecemos a existência de problemas para que sua efetivação ocorra de forma
mais eficaz.
110

Então, a respeito das MPU’s observamos que essas objetivam proteger a


mulher para que ela possa continuar com sua vida livre da violência e, em casos
extremos, consideramos que quem deve ser “enclausurado” é o homem autor da
violência, ou seja, as medidas devem avançar de forma proporcional na qual a
vítima possa dar continuidade em sua vida em sociedade sem se preocupar se as
agressões possam acontecer novamente.
Fazendo um debate a respeito da LMP é importante ressaltarmos que os
processo judiciais dessa se inicia de quatro formas possíveis, Parizotto (2016, p.
194) corrobora:

Os processos criminais judicializados sob a LMP podem ter início de quatro


formas possíveis: de ofício, pelo Delegado de Polícia; através de auto de
prisão em flagrante; mediante requerimento da vítima ou através de
requisição (ordem) do Promotor de Justiça ou do Juiz (MP/SP, 2012, p. 12).
A lavratura de Boletim de Ocorrência em Delegacia de Polícia, a terceira
forma indicada, é a mais recorrentee foi também o caso de todas as
entrevistadas para a presente dissertação.

Na continuação do processo da passagem do inquerito policial para o poder


judicial, frizamos Pizotto (2016, p. 194, 195), pois:

Nos crimes de ação penal pública, a denúncia (acusação) é oferecida pelo


Promotor de Justiça (Ministério Público). Ela pode ser condicionada ou
incondicionada. Quando ela é condicionada, o promotor somente poderá
acusar, caso a vítima tenha demonstrado interesse – também conhecido
como “solicitar a representação do Boletim de Ocorrência”. Neste caso, a
vítima tem seis meses da data de emissão do BO para requisitar a
representação na delegacia, quando então será instaurado um inquérito
policial que constituirá elementos para a judicialização do processo criminal.

Ou seja, enfatizamos que o processo é movido e que em muitos casos os


agressores e própria justiça, em algumas exceções, consideram o fato de violência
contra a mulher, como crimes de menor potencial ofensivo, conforme Pizotto (2016 p
198):

Assim sendo, a decisão do STF, compreendendo as particularidades de


violência doméstica, recusou a aplicação da Lei 9.099/95 para os crimes
considerados de “menor potencial ofensivo” nos casos de violência
doméstica e ainda estabeleceu um patamar até onde a mulher pode decidir
processar ou não o homem autor de violência. A partir das agressões leves,
o Estado passou a atuar mais enfaticamente para o fim do ciclo da
violência.
111

A assistência jurídica para mulheres violêntadas, na compreensão de Mello


(2017, p. 224) é “em todos os atos processuais, cíveis e criminais, a mulher em
situação de violência doméstica e familiar deverá estar acompanhada de advogado”,
salvo nos casos de requerimento de “Medida Protetiva de Urgência”.
Ademias é de fundamental importância a celeridade no processo, pois
muitas das vezes não sabemos como esse agressor pode reagir após ciência do
processo, consequentemente pode reincidir as ações de violência contra a mulher,
podendo levá-la a morte, em certos casos, Mello (2017, p. 225 e 229) ressalta:

A Lei Maria da Penha estabelece um prazo de 48 horas para a decisão


acerca do deferimento ou não da medida protetiva de urgência. As diretrizes
do Projeto limitam o prazo de decisão para o mesmo dia em que a vítima
distribuiu o requerimento. A necessidade desse encurtamento do prazo foi
verificada na prática pois, após distribuir o pedido de medida protetiva, a
vítima voltava para a casa e muitas vezes era novamente agredida.
A intimação do agressor deve ser realizada o mais rápido possível, para que
ele tome ciência da restrição proferida. A análise dos autos revelou que,
embora haja uma comunicação célere entre o Juízo e a Central de
Mandados e um processamento eficaz dentro da própria Central, o entrave
encontra-se na hora de intimar o acusado.

Entretanto, é importante fazermos os contrapontos a respeito da decisões


tomadas pela equipe técnica e judicial, pois ao nosso ver, consideramos a partir de
nossas observações que tais decisões não trazem medidas mais brandas, além do
afastamento do agressor por alguns metros da vítima, ou seja, não sugerem
medidas que assegurem e resguardem essa vítima de sofrerem novas agressões
futuras, e possivelmente serem vítimas de feminicídio, logo, nossa insatisfação é tida
com relação a eficiência e eficácia da medida protetiva que não é garantida como
deveria, e a pesar de todo o suporte, sócio jurídico, a vítima ainda fica em situação
de risco.
Consideramos que a respeito da relevância dessas medidas trazemos para
o debate nossas considerações, que apontam no sentido de que o afastamento até
pode trazer uma certa segurança a essa mulher agredida, porém, uma segurança
paliativa que não dá certeza que essa não sofrerá novas violências, ou seja,
compreendemos que a pesar dessa fragilidade nas medidas auferidas, temos o
reconhecimento dessas como um avanço no combate a violência contra a mulher.
Contudo, o fato de haver o afastamento do agressor da vítima, impede que
hajam outras violências há a intervenção da lei 11. 340/06 LMP, além das MP,
conforme Carneiro (s/d, p. 2 e 3):
112

[...] a agressão contra mulher que antes era considerada lesão leve, crime
de menor potencial ofensivo nos termos do art. 129, caput, do código penal
e nos termos do art. 88 da Lei 9.099/95, passou a ser analisada pela
referida legislação sendo impostas penas mais severas. As medidas
protetivas de urgência foram criadas visando à preservação da integridade
física, da liberdade de ir e vir, da guarda dos filhos e do patrimônio da
mulher ofendida, sendo que o legislador distinguiu as medidas protetivas de
urgência que obrigam o agressor (art. 22) das medidas protetivas de
urgência à ofendida (arts. 23 e 24).

Ademais, notamos a falta de ações do Estado para com as mulheres vítimas


de violência, e no mercado de trabalho, na educação/formação, em grupos de apoio
as vítimas com o intuito de romperem o ciclo da violência e possam ter apoio quando
necessitarem, conforme enfatiza Parizotto (2016, p. 137):

A falsa dicotomia entre as esferas pública e privada seria o “combustível”


para estes conflitos, uma vez que sela o “lar” como uma unidade inviolável
e, portanto, fora do alcance de atuação do Estado. Relegar à esfera privada
novamente a resolução destes conflitos significa reforçar as desigualdades
nela vigentes. Quando o Estado assume sua responsabilidade frente à
violência doméstica, propõe-se a romper com esta falsa dicotomia e atuar
nesta relação de forma a contrabalancear a desigualdade de poder entre as
partes. Ora, se a família é exatamente o ambiente propício para o
surgimento deste fenômeno, ela, sozinha, dificilmente será capaz de
superá-lo.

Conforme a LMP no art. 29 deve haver os juizados especiais de violência


doméstica e familiar deve ser composta por uma equipe multidisciplinar e
profissionais especializados nas áreas da psicologia, assistência social, jurídica e
saúde. Entretanto, apesar de haver todo o desempenho e trabalho dos órgãos
protetores é relevante reconhecermos que diversos fatores contribuem para eficácia
de LMP especialmente com intuito de prevenir, punir o fim da violência doméstica e
familiar contra a mulher. Devemos levar em consideração que sua eficácia não será
integral, pois depende de fatores sociais, econômicos, culturais que estão
entranhados em nossa sociedade, Carneiro (s/d).
No entanto, concordamos com Carneiro (s/d), pois as MPU têm a finalidade
de eliminar ou minimizar a situação de risco das vítimas e essas medidas devem ser
providenciadas o mais breve possível, ou seja, legalmente compete ao juizado
analisar e fazer cumprir as medidas protetivas, e essas podem ser concedidas pelo
juiz a requerimento do ministério Público, e a pedido da vítima devendo ser aplicado
de forma isolada ou acumulativa sempre garantindo o direito da vítima.
113

Observamos que as leis aparentam ser eficazes quando estão escritas,


porém na realidade das vítimas, constatamos que essas não são eficientes, pois o
papel do Estado é ineficaz na fiscalização dos cumprimentos das medidas
protetivas, considerando que esses não dispõem de estrutura adequada o suficiente
para tal, e também há descaso quando se trata de medida protetiva. Outro elemento
primordial é a escassez de policiais para o atendimento das vítimas, através
patrulhas e delegacias especializadas, e Carneiro (s/d, p.18 e 19) corrobora:

O Estado deixa a desejar na fiscalização do cumprimento das medidas


protetivas e nem tudo que está positivado no artigo 22da Lei 11340/06 e
seus incisos é realmente cumprido, talvez pela inoperância do Estado de
fazer cumprir o que a lei pede, o artigo menciona que: A proibição de
frequentar determinados lugares a fim de preservar a integridade física e
psicológica da ofendida. No caso o agressor mesmo sabendo da medida
protetiva não teve nenhum receio de se aproximar dessas vítimas, no
entanto o Estado não tem como fazer esse monitoramento 24 horas e essas
vítimas acabam ficando vulneráveis ao agressor, sendo que podem ser
buscadas melhorias nas medidas protetivas, algo como a implantação do
botão do pânico, o qual de grande importância sua expansão para todo o
país, uma vez que a violência contra a mulher existe no Brasil inteiro. O
Botão do Pânico foi criado pelo Instituto Nacional de Tecnologia Preventiva
em parceria com o Tribunal de Justiça do Espírito Santo e foi o ganhador do
Prêmio Innovare e após ser apresentado no Fórum Nacional de Juízes de
Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher, em Vitória, Espirito Santo
foi introduzido também no Paraná, município de Londrina e agora no Estado
do Pará, que foi o terceiro a implantar o projeto de ferramenta portátil como
proteção. O Botão do Pânico é um dispositivo que foi criado para que
mulheres em situação de risco possam acionar a polícia, além de poder ser
utilizado como meio de prova em eventual instrução criminal. O
equipamento aciona a central de controle, que imediatamente envia uma
equipe até o local, além de iniciar a gravação do áudio do ambiente,
permitindo em tempo real aos controladores saber o que se passa na
origem do chamado. Ao mesmo tempo, os policiais destacados recebem em
um dispositivo móvel o alerta para que a viatura mais próxima se dirija ao
local dos fatos.

Ademais, concordamos com o autor acima, pois a estrutura estatal é ineficaz


para a fiscalização do cumprimento da medida protetiva de proibição do agressor de
se aproximar da vítima, uma vez que carece de recursos, especialmente no que
tange a força policial, para coibir a violação das medidas protetivas, sendo que os
dispositivos eletrônicos de grande valia para minimizar essa carência.Apesar de
frequentes descumprimento das Medidas Protetivas, percebemos que estas são de
grande importância para manutenção da vida desta mulher.
Sendo assim, ao mesmo tempo que se expandem reformas legais no âmbito
jurídico em defesa da mulher visando o fim de sua discriminação, seja por meio da
criação de novas leis ou adesão a tratados internacionais, percebemos de certa
114

forma o poder judiciário em geral, ainda carrega fortes traços conservadores,


reforçado também pela mídia televisiva, pelo empresariado e pelos governos em
vigência, sobretudo, destacamos o atual panorama que estamos vivenciando na era
bolsonarista que descortinou muitos valores que estavam adormecidos.
Embora haja aparato legal para coibir e reprimir a violência doméstica contra
a mulher, verifica-se que a eficácia dessas medidas não depende apenas da
interpretação de como aplicar seus artigos. Para atingir os fins constitucionais
pretendidos pela Lei Maria da Penha, alternativas para além da punição e de
natureza complementar as medidas protetivas devem ser postas em prática, tais
como programas voltados a educação cultural do agressor. Segundo Medrado, “[...]
que a lei, de certo modo reconhece que para intervir no contexto da violência
doméstica e familiar contra as mulheres, a partir da perspectiva de gênero, é
preciso implementar ações que possam também incluir os homens” (2008, p. 83).
Durante o período em que a pesquisa foi realizada, constatamos que a
equipe técnica do Projeto se esforça em proporcionar um atendimento diferenciado e
humanizado às mulheres que chegam ao Fórum, são profissionais dispostos a
garantir às mulheres a possibilidade real de rompimento do ciclo da violência a que
estão submetidas. Todavia o quadro reduzido de profissionais ligados ao
atendimento das mulheres, não dão conta do quantitativo de processos que dão
entrada no poder judiciário, elevando assim os índices de congestionamento de
processos.
Contudo, apesar destas críticas ao Poder Judiciário, acreditamos que o
trabalho desenvolvido pelo Projeto Violetaem conjunto com o serviço de coleta
pericial, dão celeridade das medidas deferidas e corroboram para a diminuição da
violência sofrida por elas.
115

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Esta pesquisa traz à tona a importância do debate a respeito das mulheres


que diariamente são vítimas de algum tipo violência, seja ela psicológica, verbal,
física, entre outras, que são concebidas como natural ou normal, pois constatamos a
partir deste trabalho que vivemos numa sociedade com ideologias e pensamentos
anacrônicos, nos quais a mulher deve ser submissa ao homem, entretanto,
Guimarães e Pedroza (2015), enfatizam nosso posicionamento, pois a violência
contra a mulher é um problema que está cada vez mais em pauta em nossa
sociedade, porém, não é um fenômeno contemporâneo que passou a ser percebido
e ter visibilidade política e social dessa problemática recentemente devido a
gravidade das situações de violência sofridas pelas mulheres.
Utilizamos para a construção dessa discussão os autores, Saffioti (1987),
Osterine (2001), Campos (2010), Scott (1989), Borges (2009), que em comum
sustentam a ideia na qual a categoria gênero é a transversal na qual perpassa o
debate sobre violência contra a mulher, e concordamos com os autores utilizados,
pois constatamos em nossa pesquisa que a violência contra a mulher não é algo
praticado que se iniciou hoje em dia, e sim um processo que foi construído e
compreendido em uma sociedade patriarcal.
A partir das convenções que houveram, internacional e nacionalmente, em
especial a Convenção de Belém do Pará, para Prevenir, Punir e Erradicar a
Violência contra a Mulher passou a ser um marco histórico na luta das mulheres por
uma vida sem discriminação e violência, sendo relevante a discussão para a
categoria gênero.
Frisamos o histórico das políticas públicas no combate a violência contra as
mulheres, entre essas a Lei Maria da Penha, e teve o século XX como princípio para
o reconhecimento de um amplo leque de direitos humanos das mulheres. Com a
Declaração sobre a Eliminação da Violência Contra Mulher, em 1994 por meio da
Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a
Mulher que estabelece a violência contra as mulheres como uma violação dos
direitos humanos e liberdades fundamentais das mulheres.
Com relação ao judiciário “o Poder Judiciário na aplicação da Lei Maria da
Penha” do CNJ (2018), o Rio de Janeiro possui 11 juizados especiais de Violência
116

Doméstica e Familiar contra a Mulher, o TJRJ conta com uma equipe de 30


Assistentes Sociais e 35 Psicólogos (as) no atendimento direto as mulheres e 205
profissionais em atividades de compartilhamento entre diversas unidades.
O Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJRJ) ficou em 4º lugar no ranking
brasileiro com o maior número de casos novos que ingressaram na justiça sobre
violência doméstica contra a mulher, com 46.340 processos, o Tribunal de Justiça do
Rio de Janeiro foi o 2º do Brasil com número de processos baixados, um total de
69.675 processos de conhecimento criminais em violência doméstica contra a
mulher em 2017. O Tribunal de Justiça do Rio é o 3º do Brasil a expedir Medidas
Protetivas de Urgência, seja voltada a ofendida ou ao agressor, com o quantitativo
de 25.358 Medidas deferidas.
O bairro de Bangu - RJ, o Dossiê Mulher 2019, ficou em 2º lugar no ranking
no número de denúncias de violência contra mulher, os dados da Central de
Atendimento a Mulher - Ligue 180, sendo 8º lugar no número de registros de
ocorrência de ameaça e lesão corporal dolosa contra a mulher. Encontra-se nessa
região o nosso lócus de pesquisa o Projeto Violeta do Fórum Regional de Bangu, o
Projeto tem o intuito de facilitar o acesso das mulheres à Justiça, dando
cumprimento aos tratados de Direitos Humanos das mulheres tornando mais fácil o
acesso dessas ao judiciário.
Os procedimentos para ter acesso ao Projeto Violeta a vítima se dirige à
Delegacia, preferencialmente à Delegacia Especializada de Atendimento à Mulher
(DEAM), onde registra a ocorrência e solicita ao Delegado(a) a cópia do Registro de
Ocorrência com o Requerimento de Medidas Protetivas, em seguida ela se dirige
aos Juizados de ViolênciaDoméstica e Familiar Contra a Mulher, onde a Medida é
autuada e vira um processo. Posteriormente a vítima é acolhida pela equipe técnica
composta por Psicólogos(as) e Assistentes Sociais, onde é preenchido o Formulário
de Requerimento de Medidas Protetivas e em seguida avaliam o caso, apresentando
relatório ao (à) Juiz (a), sendo encaminhada para entrevista com a Defensoria
Pública, o pedido de Medida Protetiva é encaminhado para o(à) Juiz(a), que decide
em média, em quatro horas sobre o deferimento da Medida Protetiva. Caso deferido,
as providências para garantir a segurança da vítima são tomadas imediatamente por
Oficial de Justiça, se necessário com o apoio de Policiais.
O espaço do Projeto conta com um espaço denominado Sala Lilás, onde a
mulher é atendida por uma equipe multidisciplinar contendo Policiais, Assistentes
117

Sociais, Psicólogos (as) e enfermeiras, onde é realizado exames periciais e a coleta


do relato da violência sofrida. Além desta sala, o Projeto conta com uma
brinquedoteca para atividades lúdicas com as crianças, enquanto as mães estão
sendo atendidas pela equipe profissional. Atualmente, o “Projeto Violeta” abrange
dez Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher (JVDFM),
distribuídos pelos municípios do Rio de Janeiro e na área metropolitana.
Entrando na discussão da análise das medidas protetivas de urgência na
comarca de Bangu – RJ, analisamos 60 Formulários de Requerimento de Medida
Protetiva que estavam disponíveis no cartório do Juizado, que equivale à metade
dos atendimentos do primeiro semestre de 2018, o qual totalizaram 123 mulheres
atendidas nessa comarca.
Na pesquisa constatamos ainda que as maiores incidência de mulheres
vítimas encontram-se nas faixas etárias entre 20 a 29 anos e 30 a 39 anos, 77%
dessas trabalham, sendo esses trabalhos de baixa qualificação, e sua renda variada,
considerando que 20% não possuem renda, 51% com 1 salário mínimo, e 24% 1
salário mínimo e meio.
Seus agressores em sua maioria, 33% têm faixa etária entre 20 a 29 anos,
25% entre 30 a 39 anos, 20% entre 40 a 49 anos; 87% trabalham de modo informal,
97% possuem renda, e seus salários variam, 57% recebem 1 salário mínimo e meio;
14%, 1 salário mínimo; 10%, 2 salários mínimos e 7% não trabalham.
Além disso, apesar de terem sido violentadas outras vezes, 60% informam
que esses agressores não respondem processo, ao passo que47% das vítimas
registraram ocorrência contra seus agressores, e 47% dos agressores são os ex-
companheiros.
É importante que fora constatada que 53% das vítimas não possuem filhos
em comum com o agressor e os tipos de violência mais comuns, entre essas, 28%
são por lesão corporal; 23% por ameaças; 17% por ameça de morte; 13% tentativas
de feminicídio e 12% por perseguição.
Entre os formulários analisados, 60% dessas ressaltam que houve ações
violentas em momentos anteriores e que 57% ocorreram na presença de menores,
sendo que o local de ocorrência do fato 45% mostram que essa se deu em
residência e 17% nas vias públicas, e 27% em outros locais, sendo em casa de
shows.
118

A pesquisa informa que 60% das mulheres vítimas de agressão desejam


que o ator do fato seja afatado do lar para que as agressões não possa acontecer
novamente, e 85% dessas quer que seja proibida a aproximação do agressor, 93%
dos formulários analisados mostram que a vítima deseja proibir que o autor
mantenha contato consigo, 47% permitem que o agressor mantenha contato com os
filhos.
Constatamos que a discussão sobre as medidas de proteção de urgência no
combate a violência contra as mulheres tem o intuito de proteger imediatamente a
ofendida, pois compreendemos que essas medidas têm caráter preventivo de delitos
mais graves e reparador ainda que apenas parcial e provisoriamente, de danos
materiais, além de ter possibilitado o aumento das denúncias.
E de acordo com nossas constatações as Medidas Protetivas são medidas
cautelares que objetivam a garantia da integridade psicológica, física, moral e
material (patrimonial) das vítimas, com a finalidade de garantir que a vítima possa
agir livremente ao optar por buscar o amparo estatal e em especial a jurisdicional
contra seu suposto agressor.
A respeito da pesquisa é considerável sua relevância por se tratar de uma
discussão na qual foram considerados os formulários analisados, e através desses
constatamos os diversos tipos de violência que é cometida contra a mulher.
Compreendemos a partir das ideias de Almeida (1999), que a violência
doméstica é concebível como um processo de “terror doméstico” no qual se
configura como um quadro abrangido por uma série de pequenas violências na vida
diária da mulher, formada por cenas de violência cotidianas, por ameaças de morte
dirigidas à mulher ou mesmo a seus filhos e a outros familiares, por tentativas de
homicídios anteriores.
Importante reiterarmos que os motivos das medidas protetivas e o último ato
de requerimento solicitado por algum tipo de violência sofrida pela vítima, são as
mais diversificadas agressões, pedido de proteção à vítima, lesão corporal, etc.
Saffioti e Almeida (1995) reiteram, pois os caminhos da violência perpassam uma
escalada, na qual, conforme constatamos, iniciam por agressões verbais evoluindo
para físicas e ou sexuais podendo atingir ameaça de morte e até mesmo o
homicídio.
119

Em nossa pesquisa os tipos de violência mais identificados: física, moral,


psicológica, verbal, patrimonial, injúria, situação de cárcere, as violências são
cometidas dentro das residências, que configuram a violência doméstica e familiar.
Todavia, observamos que as medidas de proteção ainda não são eficazes
como esperamos, pois apesar do avanço nas leis, entre essas a LMP, não há
número de pessoas suficiente para fiscalizar as mulheres que são vítimas de
violência, para que o agressor não se aproxime dessa.
Realizamos um parâmetro entre as pesquisa realizadas por Mello (2017) no
“Projeto Violeta” no estado do Rio de Janeiro, e Parizotto (2016), na cidade de São
Paulo, especificamente no Poder Judiciário, e em comparação com a nossa
pesquisa os resultados trazem em comum a a implementação das Medidas
Protetivas de Urgência no espaço jurídico, pois observamos que ambas pesquisas
há fragilidades no aspecto pessoal destas instituições que estão a frente na defesa
dessas vítimas, acreditamos que uma equipe, com o quantitativo maior não
resolveria todos os casos, porém melhoria a fluides no atendimento e proteção
eficaz para essa mulher poderia dar mais segurança caso houvesse profissionais
para tamanha demanda.
A respeito das contribuições para o Serviço Social, notamos que a profissião
é um pilar importantíssimo a essa demanda que emerge e tem voz, necessitando de
ajuda em nossa sociedade, pois abre as portas para dar todo suporte necessário a
quem necessita, e na área sócio jurídica observamos que chega para realizar ações
mais contundentes, específicas, que os outros profissionais de determinadas áreas
não conseguem ter a percepção relacionada ao viés social.
Enfatizamos como uma crítica construtiva aos formulários de requerimento
de medida protetiva o fato desses não disponibilizarem as categorias abertas,
referentes à classe social, e cor, pois, seria mais interessante durante a tabulação
dos dados e termos o controle para sabermos esses dados dessas vítimas.
Entretanto, observamos no paralelo com as pesquisas das autoras Mello
(2017) e Parizotto (2016) e concordamos com esses, pois se houvessem
manifestações e medidas judiciais mais rigorosas talvez pudesse haver efetividade
nas determinações tomadas, pois a partir dos Formulários de Requerimento de
Medida Protetiva analisados, observamos que mesmo essa sendo imposta perante a
instituição judiciária não é levada com seriedade pelos agressores, sendo que esses
são proibidos de certas ações, porém acabam não as seguindo, entre essas, como
120

se aproximar da vítima. Ou seja, consideramos que mesmo com o avanço das


medidas judiciais que tem como diretriz a Lei 11. 340/06 LMP, ainda não
conseguimos materializar essas ações de proteção contra a mulher vítima de
violência.
O que nos remete a tal crítica, por exemplo, é saber que não há uma
fiscalização por parte do judiciário, ou até mesmo quantitativo pessoal para saber se
a mulher vítima da agressão encontra-se bem fisicamente e psicologicamente, ou
seja, devem ser realizadas algumas ações que possam servir de forma efetiva a
essa vítima.
Ademais, existe a escassez de policiais, ou até mesmo de uma equipe
técnica psicossocial, para o atendimento das vítimas, que seriam mais viáveis
através de patrulhas, e delegacias especializadas, com intuito de contribuir para a
redução dos casos de violência. Todavia, compreendemos que a escassez de
recursos, especialmente humanos, é um agravante para se garantir a integridade
das vítimas de violência doméstica.
Sendo assim, consideramos a relevância da pesquisa, porém, enfatizamos
nossas dificuldades, por conta do curto tempo para análise dos dados e pesquisa
bibliográfica.
Como forma de contribuir no funcionamento do trabalho no “Projeto Violeta”,
em especial nos Formulários de requisição de MPU’s, a partir de nossas
observações seria interessante se nesse constasse os encaminhamentos realizados
para outras instituições como, por exemplo, assistência social, se fora para
acompanhamento de uma equipe específica, caso essa vítima necessite de apoio
para se profissionalizar, ou de alguma ação mais peculiar, que possa ir para além do
fornecimento de apoio alimentar.
Outra sugestão que apresentamos seria a respeito das manifestações da
equipe técnica e medidas judiciais tomadas sejam mais severas, pois o que
observamos nessas ações de modo demasiado é apenas a solicitação do
afastamento do agressor de onde reside, ou seja, uma ação que não dispõem
segurança alguma para essa vítima. E que fosse disponibilizado uma quantidade
considerável de pessoas para trabalharem na fiscalização e apoio a essa vítima,
pois consideramos que os autores da agressão não respeitam as determinações
realizadas pelo poder judiciário muitas vezes se aproximando da mulher para dar
continuidade as agressões que se iniciaram antes da solicitação das MPU’s.
121

Sem dúvida, as Medidas Protetivas de Urgência são remédios paliativos nos


casos de violência contra a mulher por si só não bastam para extirpar esse tipo de
violência da sociedade brasileira. Logo, fortalecer a confiança da mulher no poder
público é um dos principais desafios a serem enfrentados no país, uma vez que um
dos motivos do não registro das agressões é a descrença no poder público. Para
isso os serviços devem ser melhorados e a rede de serviços fortalecida de forma
que traga o suporte necessário para as vítimas denunciarem seus agressores.Além
disso, é importantíssimo haver um investimento em campanhas voltadas a mulher
que incentivem as vítimas a denunciar seus agressores, mas também em as
campanhas de violência devem ser dirigidas também aos homens objetivando
promover a desconstrução da ideia social de subordinação cultural da mulher. É
preciso que se enverede pela via do reconhecimento transformativo a fim de
promover uma reestruturação profunda no sistema cultural, desconstruindo as
diferenciações culturais de gênero ao levar toda a sociedade à mudança da forma
de pensar, pois o foco somente na denúncia como caminho para punir o criminoso
não está sendo efetivo para salvar as vidas das mulheres.
122

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ANEXO[M27]

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