45-Texto Do Artigo-96-89-10-20131024
45-Texto Do Artigo-96-89-10-20131024
45-Texto Do Artigo-96-89-10-20131024
ANÁLISE DO DISCURSO DA
CRÍTICA LITERÁRIA UNIVERSITÁRIA
Grenissa STAFUZZA1
RESUMO: No presente artigo, tecemos alguns apontamentos sobre uma análise do discurso
da crítica literária universitária mostrando uma trajetória de construção do discurso crítico
acadêmico especializado na literatura. Para tanto, consideramos a transformação do gênero
artigo crítico literário, de autoria de professores universitários, publicados em uma revista
especializada, assim como a recepção crítica do escritor James Joyce e de sua obra, ressaltando
a sua legitimação na universidade.
Introdução
“Quem estudar no futuro a evolução da crítica literária entre nós, neste
século, não poderá deixar de observar a diferença na conceituação e no seu
exercício entre os anos anteriores à década de 50 e os que lhe sucederam”.
É com essa orientação que Afrânio Coutinho inicia o tema “Crítica Velha
e Nova” em seu artigo Crítica de mim mesmo,2 de 1984, com referência ao
filósofo Benedetto Croce (1866-1952), que escreveu Contributo alla critica
di me stesso, em 1918. É a partir do lugar de professor, crítico literário e
ensaísta que buscou acima de tudo a renovação da crítica literária brasileira
que, na década de 50, encontrava-se, segundo ele próprio, “dominada pelo
impressionismo, velho e sovado, e, pior ainda, transformado ou degenerado
1
Departamento de Letras, UFG, Catalão, GO, Brasil, [email protected]
2
Artigo de livre acesso na web no endereço http://www.pacc.ufrj.br/literaria/mimmesmo.html. Acesso
em: 22 fev. 2011.
3
“O misticismo que agradava Joyce – nota sobre a origem primeira de Ulysses” (nossa tradução do
original).
4
Jacques Derrida também participa enquanto autor de La Revue des Lettres Modernes, com uma publicação
de um artigo na edição de 1988, “Scribble” 1: Genèse des Textes. Seu artigo intitula-se “Scribble pouvoir/
écrire” (p. 13-24) e tem como matéria de estudo a obra Finnegans Wake, de James Joyce.
5
Devemos entender por positivismo em história literária não aquele de Augusto Comte, mas todo o
conjunto de técnicas de estabelecimento “positivo” dos fatos literários, segundo as normas oriundas
do século XIX e baseadas no pressuposto de que explicar a literatura significava falar de sua origem a
partir dos fatos “positivos”, facilmente identificáveis, de autoria, gênese nos fatores exteriores do meio
social, histórico, geográfico, biológico. Sílvio Romero é um exemplo de crítico brasileiro que pensava
a crítica e a história literária desse modo.
6
Nossa edição: Histoire de la littérature française. Paris: Hachette, 1938.
7
Podemos citar vários literatos que quando eram universitários iniciantes, e mesmo depois de consagrados
no mundo da literatura – o que era comum no século XIX e até meados do século XX –, fizeram disso um
exercício de escrita, como o próprio Joyce, Victor Hugo, Émile Zola, Machado de Assis, entre muitos outros.
8
É pertinente mencionarmos que essa distinção designativa entre “crítica universitária” e “crítica de
interpretação” foi convencionada. Não significa que a crítica de interpretação esteve ou esteja fora da
universidade. Ambas encontram-se na universidade, sendo que a diferença fundamental é que a crítica
universitária designa-se dessa forma por ter uma tradição de crítica literária, já a crítica de interpretação possui
um vasto repertório pensado no século XX, sendo que sua prática universitária é posterior aos anos 50.
9
Necessariamente devemos especificar que as teses defendidas nas universidades da França (em especial
nos anos 60 e 70, do século XX) que tiveram como fundamento de análise ou de referência teórica a crítica
da interpretação eram mais liberalmente aceitas por uma banca de professores examinadores da área da
filosofia do que das letras (BARTHES, 2007). Isso significa dizer o quanto a tradição da história literária
e da biografia orientava e dominava as leituras dos professores universitários das letras.
[...] e Antoine Casanova dirige toda uma reflexão coletiva na revista. Publica
numerosas intervenções sobre esse tema que serão reimpressas numa coletânea
publicada em 1974, Aujourd´hui l´histoire, onde ao lado dos historiados comunistas,
pode-se ler André Leroi-Gourhan, Jacques Le Goff, Jacques Berque, Georges Duby
e Pierre Francastel. (DOSSE, 2007, p. 366-367)
11
No original: “J´avais douze ans quand j´étudiai la Guerre de Troie, mais seule l´histoire d´Ulysse resta
dans mon souvenir. C´était le mysticisme qui me plaisait.”
12
No original: “où Joyce put-il donc trouver ce mysticisme qui lui plaisait?”
13
No original: “Comment les Aventures d´Ulysse (grifo do autor) de Lamb purent-elles communiquer
au jeune Joyce um sens mystique qui est tout à fait étranger à la manière de Lamb?”
14
François de Salignac de la Mothe-Fénelon, conhecido como François Fénelon (1651-1715), foi
poeta e escritor francês e também teólogo romano católico. Autor de Télémaque (escrito no período de
1693-1694), o autor utiliza-se do mito grego de Telêmaco, filho de Ulysses, para atacar a monarquia
absolutista, assim como a dominação ideológica na França de Louis XIV.
15
No original “une certaine version démodée”.
16
George Chapman (1559-1634), tradutor, dramaticista e poeta inglês. Traduziu as obras de Homero,
Ilíada (tradução publicada em 1598) e Odisseia (tradução publicada em 1616).
17
Alexander Pope (1688-1744), poeta e crítico inglês, tradutor de Homero. Pope traduziu a Ilíada no período de
1715 a 1720. Encorajado pela favorável recepção crítica de sua tradução de Ilíada, traduz a Odisseia (publicada em
1725-1726), mas por esta segunda tradução recebeu duras críticas.
Esta poesia universal não é somente fantástica e fictícia; ela contém também
verdades das mais materiais e mais doutrinais; nas quais, se é verdade que o corpo
– a saber os fatos literários ou históricos – aparenta-se fictício e incapaz de existir
autenticamente, é preciso buscar a significação e a alegoria que estão em sua alma.
(1959, p. 140)18 (nossa tradução do original)
18
No original: “Cette poésie universalle n´est pás seulement fantastique et fictive; elle contient aussi
les vérités les plus matérielles et les plus doctrinales; dans lesquelles, s´il est vrai que le corps – à
savoir les faits littéraux ou histoire – semble fictif et incapable d´exister réellement, il faul chercher la
signification et l´allégorie qui en sont l´âme.”
19
“The Mysticism that Pleased Him: A Note on the Primary Source of Joyce´s Ulysses”. In: Envoy: A
Review of Literature and Art. Dublin, v. 5, n. 17, p. 62-69, maio de 1951. Tradução e publicação na La
Revue des Lettres Modernes com a autorização do autor. É pertinente mencionar que essa informação
encontra-se subsequente ao editorial da revista: juntamente com o nome das universidades em que os
autores atuam como professores, aparece se o artigo é um artigo que já foi publicado em outra fonte,
sua data de publicação inicial e sua língua de origem.
Considerações finais
A tarefa de analisar o discurso da crítica literária universitária via corpus,
formado por artigos crítico-literários de autoria de professores universitários,
publicados na La Revue des Lettres Modernes – Histoire des Idées et des
Littératures, com um recorte pelas décadas de 1956-1965 e 1988-1994, deu-nos
24
No original: “[...] les augmentations successives qui ont frappé l´industrie du livre et du papier,
l´élevation générale sensible des divers services et façons, les honoraires et les droits, la documentation
et les royalties fon que le prix de revient est désormais tel qu´il exclut de sortir sans aucune aide
extérieure quelle qu´elle soit un volume d´érudition ou de critique de plus de 300 pages à um prix qui
ne soit pas exorbitant. Nos amis nous comprendront et nous pardonneront cette dichotomie”.
ABSTRACT: In this article, we offer some notes about an analysis of the discourse of
universitarian literary criticism showing a trend of construction of the academic critical
discourse specialized in the literature. For this purpose, we consider the transformation of
the genre literary critical article, written by academics, published in a specialized journal,
as well as the critical reception of James Joyce and his work, emphasizing its legitimation
in the university.
Referências
BARTHES, R. Crítica e verdade. Tradução de Leyla Perrone-Moisés. 3. ed. São Paulo:
Perspectiva, 2007.
GORMAN, H. James Joyce: his first forty years. Nova York: Geoffrey Bles, 1941.
Obras consultadas
FOUCAULT, M. O que é a crítica? Crítica e Aufklãrung. Tradução de Antônio C. Galdino.
In: BIROLI, Flávia; ALVAREZ, Marcos César (Orgs.). Cadernos da Faculdade de Ciências
e Filosofia de Marília - Michel Foucault: histórias e destinos de um pensamento. Marília:
UNESP, v. 9, n. 1, p. 169-189, 2000.