AGUIAR Leitura Literária e Escola

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LEITURA LITERÁRIA E ESCOLA

Vera Teixeira de Aguia


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Nossa proposta de trabalho é a de enfocar o tema em pau­
ta a partir de cinco questões, cujas respostas trazem em seu
bojo concepções de leitura e escola:
• Como delimitar o papel do livro e da escrita numa so­
ciedade plural como a nossa?
• Quais as relações que podemos estabelecer entre a es-
cola que aí temos e a leitura da literatura infantil?
• Como deve ser o livro infantil para atingir o leitor?
• Como se dá a formação desse leitor?
• Que indicativos podemos adotar para formar o leitor,
no âmbito da escola?

Desmitificando o livro e a escrita

Ao nos propormos uma reflexão sobre leitura e escola,


queremos delimitar o objeto de nossa intervenção à literatu­
ra infantil como uma prática cultural inserida na diversidade
da dinâmica social que a criança vive. O conceito de leitura
literária que propomos, portanto, não é excludente e auráti­
co (para lembrar a terminologia de Walter Benjamim), isto é,
não concebe as relações do leitor com o texto artístico como
um momento único, desvinculado da realidade circundante,
mas, ao contrário, salienta a multiplicidade de fatores aí pre­
sentes. O livro não se coloca num templo, acima e além do
leitor, como objeto intocável, sagrado e detentor de uma verda­
de acabada e inquestionável, que se constrói por si mesma.
L30TAescolarização da leitura literária- o jogo do livro infantil e juvenil QUINTA PARTE:
Formação de leitores-professores 23/

Em oposição, é entendido como produto aprendemos a ler, passamos, entào,


cultural ativo, diferente sobre a fala.
a
pensar de modo
integrado ao sistema de trocas da comunidade, desde sua
criação até seu consumo, passando pelas ingerências de edi- A escrita é
superior a fala, esta última entendida como
ção e circulação. Nesse sentido, levamos em conta a interfe pouco convencional, desleixada. Na verdade, o que
ocor
rência dos diferentes mediadores de leitura, que atuam no re é a subordinação da escrita à linguagem oral, muito mais
circuito literário e agem sobre a quantidade, o gosto, o inte- rica e criativa. A espontaneidade da fala dá margem a cria-
resse, o comportamento do leitor. Assinm dessacralizado, o ções lingüísticas que vem atender a novas situações de co-
livro tem as funçòes alargadas, uma vez que sua leitura é municação. Resta à escrita codificar esses dados, em sinais
considerada como fato presente no cotidiano, prática social normatizados que não reproduzem todas as dimensðes dos
vivenciada entre as demais e relativizada segundo as regras atos ilocucionários.
dos jogos sociais de que participa. de escrita privilegiado em rela-
O alfabeto é um sistema
A concepção de livro e de literatura que temos em mente formação dos leitores. A simpli-
ção aos demais, o que facilita
fica reforçada quando levamos em conta o papel da escrita nas cidade do alfabeto, no entanto, muito útil para línguas silábicas
sociedades modernas (a partir do século XV, com o surgimeen como a nossa, não se adapta, por exemplo, ao idioma chinês.
to da classe comercial que vai dar espaço à burguesia, o cresci- Além disso, muitas vezes, em países de cultura não-alfabética,
mento das cidades, a organização dos estados nacionais e a como o Japão, o número de crianças competentes em leitura é
invenção da inmprensa) e percebemos que sua importäncia não muito superior às taxas obtidas no mundo ocidental.
é universal, mas deve ser historicizada. Com isso, queremos
A escrita é responsável pelo progresso social, sendo
dizer que a escrita também precisa ser desmitificada e, nesse evidente a relação entre o grau de alfabetização e o cresci-
sentido, ter seu valor relativizado segundo seu uso ou não
mento econômico e democrático das nações modernas. En-
pelas diferentes culturas. da escrita, em
tretanto, contraditoriamente, o aprendizado
Para isso, apoiamo-nos em David R. Olson, que, discutin- escravidão. E o
muitas situações, pode ser o caminho para a
lo as funções da leitura e da escrita nas sociedades letradas, caso dos momentos em que ela serve de controle social para
conclui sobre as condições necessárias à aprenlizagem, con-
formar trabalhadores produtivos e soldados obeclientes. Nesse
siderando a diversidade de fatores que nela interferem, como do
Sentido, os programas de alfabetização estão a serviço
o tipo de escritos, as formas de lerea aplicação dos princípi preparo cde mão-de-obra qualificada e disciplinada para aten
os da leitura dos textos à "leitura" do mundo natural.
der aos interesses de lucro e às vantagens das classes diri-
Partindo da constatação do lugar de destaque que a escri- de
gentes. Não há, nessa perspectiva, nenhum vislumbre
ta ocupa na atualidade, o autor enumera seis crenças a res-
bem-estar social generalizado.
peito de seu domínio, para destruí-las uma a uma: vez
A escrita é a responsável pelo avanço cultural, uma
Escrever é transcrever a fala. Tal afirnmação leva em conta que contribui, em grande parte, para o surgimento do pensa
apenas a transcrição do que é dito, deixando de lado o mento filosófico e científico. Inversamente, sua ausência
nas

como foi dito e com que intenção. Variando a entonação Sociedades ágrafas dá margem ao aparecimento da superst
e a ênfase, podemos dar inúmeras interpretaçòes a um tex- tëm observa-
to, chegando a escrita a ser vista como um modelo para a çao, do mito e da magia. O que os antropólogos
do, contudo, é a enorme sofisticação da cultura oral, que
fala, o que limita a espontaneidade e a criatividade. Quando
capacidade raciona, de
moao
permite o desenvolvimento da
238TA escolartzaçko da leitura literária- o jogo do livro Infantil e juveni QUINTA
PARTEFormaçlo de leltor sores 239
que povos que não dominam a escrita são capazes de resol- dos textos em direçao a seus
receptores, com base nas marcas
ver intrincados problemas sem o uso de bússolas, mapas, gráficas disponíveis.Por essas vias, não
seremos
gráficose outros indicadores escritos. Mas talvez o melhor funcionais, que apenas soletram ordens a serem alfabetizados
exemplo seja o dos gregos da era clássica, para os quais a informações aserem digeridas, mas leitores
obedecidas e

escrita era muito limitada. Ali, dentro de uma cultura essen- críticos, capazes
de interagir com textos das mais
diversas naturezas
cialmente oral, e por isso mesmo, exercitou-se a dialética, institucionais jornalisticos, políticos, religiosos, sociais e
fundada no debate e na argumentação para a
construção do científicos, jurídics, etc.) e estender essa capacidadeliterários,
leitora a
conhecimento. Portanto, de pouco valeu a escrita para as rea- todas as situações orais da vida cotidiana.
lizações intelectuais daquele povo.
Dessa perspectiva, o livro de Olson converte-se em
A escrita
docu-
constitui-se
instrumento do desenvolvi-
um mento valioso para a reflexão sobre o estatuto da escrita e o
da
mento cognitivo, uma vez que o conhecimento se identifica
leitura nas sociedades modernas e papel da escola
Com o que aprendemos na escola e nos livros.
neste
Logo, a alfabe- contexto. Em um país comoo nosso, em que diferentes cultu-
tização abre as portas para esse conhecimento abstrato, atra- ras convivem simultaneamente, precisamos revisar parâmetros,
vés da aquisição das "habilidades básicas"
para a leitura e a evitando classificar os alunos segundo seu lugar social, mais
escrita. Tais assertivas estão
equivocadas por identificar os ou menos privilegiado. Essa atitude determina a discrimina-
meios de comunicação (no caso, os escritos) com o conheci-
ção de valores, em favor de um sociedade letrada e em detri
mento por eles comunicado, que pode se valer de outros
mento de todas as contribuições dos grupos divergentes.
meios, como as falas, as gravuras, os vídeos, as gravações,
Não podemos, da mesma forma, deixar de estender a ca-
etc. A escola deve, então, somar a escrita aos outros r cursos
pacidade de escrita e leitura a todos os segmentos, de modoo
expressivos com os quais a criança já convive, em vez de
que as trocas sociais sejam cada vez mais participativas. O
renegá-los em favor dos livros. Valorizando mais os conteú
que vale, neste caso, é aproveitar a lição de Olson e, no pro-
dos dados, em vez das letras, é possível formar um sujeito
cesso de alfabetização, levar em conta as peculiaridades cul-
crítico e não apenas um leitor funcional, que segue ordens
turais que as crianças trazem para, a partir delas, criar
sem posicionar-se diante delas
possibilidades de intercâmbio. Importa considerarmos que
Para o autor, todavia, relativizar o valor da escrita não muitos estudantes trazem para a escola o mundo da vida e,
significa deixar de admitir sua influência na construção das
Se Ihes oferecemos o mundo da escrita, estamos querendo
ativicdades culturais e cognitivas do homem ociclental. É certo
1aze-los Exercitar novas articulações mentais. Alfabetizar, por-
que, para decifrar a escrita, desenvolvemos estruturas men viver
decodificar sinais, mas ensinar a
tais especificas, que passam a nos dar as chaves para com- tanto, não é ensinar a

preendermos tud o que nos rodeia, isto é, todo o mundo neste mundo de papel.
para nós passa a ser uma escrita. Isso acontece porque os
sistemas gráficos não só preservam as informações, como escola
pro- Situando a literatura infantil na
porcionam modelos de funcionamento que nos levam a
ver a linguagem, o mundo e nossa mente sob nova luz.
a
Trata-se de estabelecer relações complementares entre
as
abemos que, historicamente, a leitura está vinculada
a leitura e a escrita, percebendo que podemos ler todos os escola, instituição responsável pela educação dos individuos
alabetiza-
sinais, dos livros e do mundo, buscando recuperar a
intenção nas sociedades modernas e, especificamente, pela
ao. Contudo, talvez pelas condições de seu aparecimento
QUINTAPARTE: Fornmação de leltores-professores 24
240TAescolarlza;ão da leitura literária- ojogo do livro infantil e juvenil

Uma proposta pedagógica nessa direção apóia-se na socio


cultural destinada formar informar os filhos teórico que
como agência a e
logia da leitura, enquanto
recorte se debruça sobre
da classe, a burguesia emergente, a escola traçou para si livro e seus mediadores sociais, na estéica da
as questöes do
nova e

objetivos bem definidos quanto ao modelo de homem que ti- atenta às relaçoes entre o leitor e o texto como cruza-
recepção,
nha em vista, capaz de competir e ser um adulto de sucesso. mentos de horizontes de expectativas. Partincdco de princípios
Para chegar a esse fim, homogeneizou sua clientela, expurgan- as duas teorias são complementares.
do todos aqueles que, por suas divergèncias, não correspon-
epistemológicos opostos,
e a análise das
lessem ao formato de aluno apto a atingir as metas propostas. A preocupa-se com a descrição
primeira
com os condicionamentos que
questões exteriores da leitura,
Na verdade, curículos, desde então, se organizaram de
os
determinam a permanëncia ou não de um livro no seio da

modo a atender somente aos alunos que correspondessem aos intervenientes na valoração dos tex-
sociedade, c o m os fatores
estreitos limites de uma normalidade interessante aos parâme-
tos, com o s
modos de aproximação dos leitores aos livros,
tros sociais vigentes. Por e s s a razão, as experiências
escolares, a s histórias indivicluais e coleti
acabam por afastar o s alunos das
com os juízos que fazem, c o m
e m maior o u m e n o r tempo, Nesse enfoque, a atenção dirige-se não
ao con-
vas de leitura.
camadas populares que, por não trazerem de casa as condi
teúdo m e s m o dos textos, mas às agências
sociais que propiciam
não conse-
ções materiais e comportamentais da classe média, e trânsito entre os leitores: gráicas, casas

elas o significado seu aparecimento


as tarefas propostas nem dar a comerciais, livrarias, biblio-
guem cumprir editoras, firmas de representações
atribuído. Há, como salienta Michael Apple, um
que lhes é e escolares, salas de leitura, cujos
tecas públicas, particulares
mais forte diretivo do que o discurso explí- encontro dos
curriculo oculto, e
mecanisnmos de facilitam ou prejudicam o
ensino. Isso tam- atuação
cito, que embasa os objetivos traçados para o
livros. Por seu turno, o e x a m e das trajetórias
divergentes, sujeitos com os
bém acontece com a clientela oriunda das culturas a leitura,
dominante e, por esses meios, dos leitores diagnostica interesses, motivaçòes para
que não corresponde
ao padrão sociais e culturais que ocu-
quadro de exclusão encon reações diante dos textos, lugares
voz silenciada. No
mesmo
ve sua todos os meandros se-
coeficiente intelectual médio, pam, influências que exercem, enfim,
tram-se o s alunos que fogem ao

o planejamento didático. Em guidos em seu processo de formação.


de respostas previsíveis para lidar
A Segunda compete examinar a obra à
luz do horizonte de
aí t e m o s não está aparelhada para
suma, a escola que
c o m o inusitado.
Como é repeti- morais, econõmicas,
com a diferença, c o m o novo, questoes (estéticas, sociais, religiosas,
necessidades que mesmo tempo que
transformar e criar segundo as etc.) para as quais ela é a resposta, ao
tiva, não sabe en-
essas vias, um
surgem, não s e projeta para
o futuro.
propoe novas perguntas. A leitura é, por
da obra e o do leitor,
descrita, opôe-se a escola s e n - contro de horizonte de expectativas, o
A escola tradicional, assim leitura. A história
trabalhar com realidades va- cada
sível à diversicdacde, pronta para que se dá sempre de modo n o v o a
lá fora. Soma de individualidades dos textos, por sua vez, concretiza-se na
história das leituras,
riadas, tal qual o mundo de novos horizontes.
e m grupo, m a s
afirmanm s u a s particularidades Sempre diferentes, porque c r u z a m e n t o s
que interagem n o v o s alu- ativodo
um consenso, os conmo movimento
sem,
necessariamente, chegar a
contato com objetos culturais múl O ato de ler, nessa medida, ocorre como estrutura esque
nos leitores vão entrar em
caminhos, eltor sobre o texto, que se apresenta
incleterminaç o e vazios
2
livro de literatura. Por esses
matica, com indicações, pontos cle
e, entre eles,
o
tiplos e
da escola, uma vez que a sala de Serem preenchidos. De posse clas pistas
fornecidas pela obra
aumenta a complexidade
variedade de sujeitos, de obje- os cdados, co
a s e r o espaço da
aula passa apolado em sua experiência, o sujeito arranja le sentido. Nao
tos de leitura e de práticas culturais. PIEta espaços em branco e constrói totalidades
QUINTAPARTE: Formação de
2421A escolarização daleitura literária- o jogo do livro infantil e juvenil leitores-professores 243

Em se tratando da leitura da literatura infantil,


há, portanto, literaturaleitor e o texto nunca é
sem o mesmo, respeitando
os pressupostos que traçamos até agora, precisamos concei-
porque provoca de modo diferente cada leitor.
tuar o gênero, segundo sua especificidade, ao mesmo tempo
Falamos especificamente em literatura e explicamos por que. que inseri-lo no contexto maior da literatura em geral. Talvez a
O processo de leitura que descrevemos como preenchimento nenhuma outra produção as teorias em pauta tão bem se ajus-
de sentidos vale para todas as obras. Como produções ver tem, uma vez que a literatura infantil se define a partir de seu
bais, elas compõem-se de ditos, não ditos e subentendidos. destinatário. Modalicdade literária tardia, aparece só no mo-
No entanto, os textos informativos, apelativos, argumentativos mento em que a infäncia passa a ser tratada de modo especial,
e tantos outros estão muito mais comprometidos com o
refe-
como idade de formação do homem. Tem, então, desde o co-
rente externo do que o literário. Neles, os espaços em
branco
é a criança, colocada no
dar vazão à meço, u m receptor específico, que
são mínimos, porque não pretendem sugerir e
família da comunidade.
centro das atenções da e
dar ordens, influenciar com-
imaginação, m a s garantir certezas, Até a ldade Média, os pequenos exercitavanm-se para a vida
portamentos.
adulta participando de todas as atividades do grupo; apren-
Umberto Eco diz, muito apropriadamente, que o texto li- diam a viver vivendo, dentro de uma cultura predominante-
terário é um organismo preguiçoso, isto é, trabalha pouco
mente oral. Com o advento dos tempos modernos, surgiu a
econômico na ação, delega a o leitor a
para se constituir, é necessidade de investimento na educação infantil, de modo
tarefa de completá-lo. Se levamos em conta que ele é impre-
a preparar as n o v a s gerações para a sociedade
letradae com-
visível, porque traz para o universo do leitor possibilidades materiais pedagógicos
n o v a s dle senticdo, que colocam
e m questão s u a s verdades, petitiva que se instalava. Dentre os
literário, que se con-
desestabilizando-o e levando-o a reestruturar-se, concluímos
necessários para a empreitada estava o

verteu em livro de leitura de uso escolar.


a função da arte é amplamente educativa.
que
e a literatura será Assim concebida, a obra teve desviada sua função estética
Nesse processo, ler é ampliar horizontes
e passou a servir a propósitos educacionais restritos. E aqui
s e u leitor. Estendendo
tanto melhor quanto mais provocaro
da leitu- se localiza o
pecado original da literatura infantil: ter nascido
o conceito deprovocação aos ingredientes externos Nesse
dizer ela é eficien comprometida coma educação, em detrimento da arte.
ra, a que antes nos referimos, podemos
que
com
de práticas desafiantes e tem por Sentido, todo o percurso dos estudos da área defronta-se
te quando se faz através
o estatu-
foco textos que negam, em instância
cada vez maior, o hori- tal impaSse e procura respostas que redimensionem
zonte de expectativas do sujeito. to literário do livro infantil.
leitura e estética da recepção medida, a
Aproximamos sociologia da dos textos está condicionado, nessa
O feitio
porque ambas as
teorias deslocam a questão literária para o
Concepçao de criança
que os m e s m o s têm em
vista e que de
n o e x a m e do estatuto da
litera- repassados. Conser
leitor, pólo aqui privilegiado Ermina a natureza dos valores
a serem
relativi- a serem
tura. Detendo-nos nas contingncias
exteriores, que Vadora ou emancipadora, isto é, conjunto de lições
dos textos no conjunto o leitor, a
zam o valor intrínseco de permanëncia obedecidas ou proposta instigante a questionar
analisando o interior dos discursos artísticos iteratura infantil é, contudo, sempre escrita por um aauito
da sociedade, e
dos leitores implícitos
segundo representações que
as
trazem
para uma criança. Tal fato acarreta um prejuízo, do ponto de
e unilateral,
as possibilidades de leitura que promovem, procuramos
texto se torna cliretivo
e
mais abrangente, do complexo vIsla literário, porque o protetora
dar conta, de modo um pouco dominadora ou
literária. metizando a postura autoritária,
fenômeno que é a leitura dos mais velhos em relação aos jovens.
QUINTAPARTE: Formação de
244TA escolarização da leitura literária- ojogo do lIlvro infantil e juvenil leitores-professoress245

um conto primitivo, de estrutura


simples (situação inicial
Descrevendo o livro infantil
conflito-processo de
solução- sucesso final), em que
interage um grupo (ouhumano
antropomorfizado), no qual
cada elemento tem um papel bem definido. Sua leitura pro
Para atenuar a assimetria entre o emissor e o receptor, o

livro infantil precisa abrir mão de seu caráter pedagógico, em picia a vivência de sentimentos e reações em que o leitor
mergulha ao aceitar o pacto de faz-de-conta com o narrador.
favor da representação de novas possibilidades de vida, atra-
vés de jogos criativos de linguagem. A adequação do texto ao No poema, situação é mais densa porque, de modo
essa

leitor não significa a minorização do gênero, mas dá-se por extremamente sintético, condensam-se as emoções e as idéi
as, projetadas em imagens associativas.
um processo de inclusão: a literatura infantil é aquela que a
criança também lê. Os conteúdos dos textos, entretanto, só adquirem senti-
Para que esse movimento se efetue, é necessário o exercí- do, como expusemos teoricamente, quando expostos à in
cio de adequação do texto às condições cognitivas, sociaise vestigação de quem lë, isto é, eles vivem através da regência
afetivas dos leitores, tanto em relação a seu conteúdo quanto do leitor. O que importa, então, não é o texto em si, mas o
aos aspectos compositivos e à apresentaç o material. A rigor, uso que a ele se dá. Por tais vias, queremos salientar o cará-
não estamos propondo censura ou limites preconceituosos, ter socializador da literatura, já que ela só se faz no diálogo
mas aproximação ao universo daqueles a que se destina. Só com seu receptor. Por isso, ela pode atenuar o egocentrismo
Assim texto e leitor podero diálogo. Se, c o m o
manter um acentuado, próprio desta fase de desenvolvimento, dando
dissemos anteriormente, afastar-se do leitor e provocá-lo é margem a novas formas de interação com o mundo. Por essas
saudável, a distância que se estabelece não pode s e r tanta a vias, descobrindo o outro, o sujeito se encontra enquanto ser
ponto de interromper a comunicação. humano; a consciência do outro leva-o à de si mesmo e das
possibilidades de comunicação com seus pares.
A rigor, todos os temas e formas podem ser objeto de um
livro para iniciantes, desde que enfocados a partir das capa-
comportamento infantil é bastante imitativo,
o
Como o
cidades compreensivas dos leitores. Em se tratando de sujei- mundo delineado na literatura é exemplar para criança. a
Se
tos oriundos de uma cultura fortemente oral, importa
não arealidade ali esquematizada quer apontar para um mundo
fazer diferenças a priori, mas respeitar seu ritmo de desenvol- aberto ao desafio e à compreensão do afeto, importa apre
vimento próprio, como, de resto, o de todas as crianças. Igual- Elas são tanto melhor elabora-
sentar situações repetitivas.
socioculturais
mente, aquelas que vivem em outras condições Clas pelo leitor quanto mais vezes a ele se apresentarem.
divergentes não devem ser excluídas, mas integradas ao pro- desses modelos narrati-
Acrescentamos, ainda, a importância
cesso, na medida em que encontram no text referenciais com vos para o desenvolvimento da memória e da atenção. Quanto
Os quais possam dialogar. assim estrutura-
os textos
a esse aspecto, é bom lembrar que
Desse modo, as histórias e os poemas poderào versar so- como A galinba ruiva, que
bre os mais variados conflitos, personagens, estados de espí- aos (em lengalenga, por exemplo, os contos orais,
o d o s nós conhecemos), fazem uma ponte com
rito, sentimentos. Como o leitor desta faixa tem dificuldacle a z e n d o para o papel as formas de narrar primitivas,
que
de perceber a globalidade das situações, atendo-se à parte enfáticos e pela
8arantianm sua continuidade pelos recursos
em detrimento do todo, a história contribui para o
desenvol- repetição. Como, antes de se tornar leitora, a criança è ouvin-
vimento da capacidade de percepção gestáltica e de estabele e das histórias e das cantigas, ela tem nesses textos reiterad
cimento de relaçòes entre as partes. Ela organiza-se como
vos o primeiro degrau para o mundo letrado.
QUINTAPARTE: Formação de leitoresprofes 247
246TA escolarização da leitura literária-o jogo
do livro infantil
e juvenil
e, mais genericamente, da edição. O livro é o texto e também
calcados na oralidade, o sua formação material, com uma face fisica que se apresenta
Além dos modelos compositivos
formas alternativas, que acompanham,
ao leitor e lhe aponta sentidos. Por isso, cada vez mais, numa
gênero vale-se de literatura e m sociedade sedutora como a nossa, a confecção do livro infantil
m e s m o que às v e z e s
de longe, as conquistas da
as voltadas para o tem merecido cuidados visuais: capa, diagramação, ilustração.
geral. As histórias policiais, a s intimistas,
os
os poemas concretos, No entanto, esses elementos, mais do que um caráter ape
cotidiano, os poemas e m prosa,
modalidades de cria-
poemas bem
humorados são várias das lativo de conquista do consumidor, são signos construtores
oferecidas ao público. Em todos os casos, importa asse- de significações. Importa, então, que eles não sejam apenas
ção
da linguagem, a captação da energia redundâncias do texto escrito, repetindo as informações ali
gurar a coloquialiclade
e versatilidade.
viva da fala, c o m sua espontaneidade contidas (quando não contrariadas), mas também índices
nào é e s c r e v e r pobre, somam à constituição do sentido global do
Escrever para a infância, portanto, novos, que se
de cores, de luze
livro: ilustrações criativas, em que jogos
no
fluente, expressões
as novas explicando-se
mas escrever
novas inter-
c o n t e x t o da frase e
do texto, n a situação de comunicação. sombra, de detalhes e superposições permitanm
fazem concessões empobrecedoras, cuidadosa e original, que oriente o
Acentuamos que não se
A
pretações; diagramação
se risca a linguagem pernóstica. leitor em direço de novos sentidos; capas sugestivas que
da mesnma maneira que
a o mundo e convive com os falantes ao
provoquem curiosidade,
etc.). Nossa proposta é a de que a
criança está exposta eles dialoga se faz o objeto livro per
seu redor. Com eles aprende
a s e expressar,
com
multiplicidade de linguagens de que
assim, ditos e subentendidos, ver-
de u m dialeto especial. A literatura, mita a emergência de ditos, não
s e m necessitar
valer-se de u m jargão
rebaixado.
bais e visuais, c o m o possibilidades de
sentidos que se colocam
também não precisa liberdade de esco
outro lado, é a "limpeza estrutu ao leitor. Dentre elas, ele
vai e x e r c e r sua
O que é procedente, por sua percepçào e dando um
Referimo-nos a
religiosas
digressões morais, Iha, combinando dados segundo
ral" dos textos.

informativas, que são


dispensáveis, e longas descrições nexo para sua leitura.
ou
história enxuta, com
questões da
Importa
descartadas. a
como de resto em todas as
Nesse processo,
que podem s e r direta das personagens e Daí a necessi-
predomínio da ação,
apresentação
de ima- Vida, experiência vai ter um peso importante.
a
resulta-
c o m dosagem equilibrada dade do exercício continuado da
leitura para alcançar
diálogos ágeis, o poema em os sentidos que outras palavras, quanto
mais
ritmos e sonoridades dos cacla vez mais eficientes. Em
gens encadeadas, a lógica in- da cultura livresca,
desdobram. Encaixes
desnecessários quebram O individuo estiver expostoaos estímulos
se
não propiciam a humano unm ser
ao m e s m o tempo que ele será e, consequentemente,
terna da composição, cami- melhor leitor
n o quer se perder por traz da experien
conhecimentos que
comunicação c o m o leitor, que mais rico, por s o m a r os
à imaginação Ihe oferecer.
nhos desviantes. O
estímulo à inteligência e
Cia oral àqueles que a escrita pode
empírica
dessa economia estrutural. Queremos di
nasce, justamente, não po-
zer que os
indicadores lingüísticos da obra literária
leitor
dem ser tão poucos
a ponto de que
os sentidos não se
Acompanhando a formação do
e nem congestionem a comunicação.
tantos que
produzam,
considerando a obra literária enquanto
fe-
Como estamos nos permiem
internas de funcionamento e objeto à mercê Levando em conta os dados históricos, que contin-
nômeno com leis letradas e as
devemos nos ater a seu invólucro e localizar a leitura nas sociedades moderna escolia,
das regras sociais de uso, diretamente à ação da
leitores. Aqui, avulta a questão cla ilustração 8 h c i a s sociais, que a
subordinam
trânsito entre os
QUINTAPARTE: Formaçãoede
leltores-professores249
49
248 escolarização daleitura literára-ojogo do livro infantil e juvenil

regem as épocas de produçao e recepção clas obras e sän

buscamos compreencder o processo de formação


clo leitor a par- introjetados, de modo particular, pelo autor e pelo leitor. Como
a crianças e
adolescentes. a diálogo desseultimo eCcom a obra em si (e
nào com seu
tir de experiências realizadas junto
leitura avança, alargam-se
os nrodutor), cruzamento
o de horizontes que se
produz está no
A medida que a pesquisa enm Ambito do leitor e do texto, cada um colocando questões e
necessidade dle dar conta da
campos interdisciplinares, pela dando as respostas possíveis, segundo seu momento históri
O estudo
cultural do mundo contemporâneo.
complexidade somente a
Co. Como a obra literåria é simbólica, ela permite leituras
não pode se ater tão
da literatura, por exemplo, já
deve voltar-se para o papel do leitor, plurais, dando--se à interpretação sempre de um modo novo,
autores e obras, mas
pelas possibilidades de combinações dos signos. Por essas
textos adquirem sentidos. Por seu
pois é através dele que os

turno, analisar o processo


de leitura significa investigar
as
vias,o leitor pode
ter suas expectativas atendidas ou contra-
riadas, em maior ou menor grau. Mas o certo é que ele não
extrínsecas de seu desenvolvimento, ten-
condições intrínsecas e dla leitura, uma vez que seu horizon
sujeito enquanto persona
foco o
inliviclual e social, continuará igual depois
do como
te estará modificado pela interação com o texto. Daí decorre,
e da sociolo-
imbricando-se fommulações teóricas da psicologia
denominamos psicossociologia. por conseguinte, que uma segunda leitura do mesmo mate-
gia. A e s s e "construto" necessariamente diferente.
investigação leva- rial será
Os resultados alcançados até aqui pela
Cultura da Vila Nossa Senho- Por ser o texto uma estrutura esquemática, concebidaa
da aefeito n o Centro de Lazer e
da PUCRS, durante de indeterminaço e vazios, o
ra de Fátima, junto ao Campus
Aproximado partir de indicações, pontos
detectarmos a s condições necessá- um elemento ativo no processo de leitu-
o a n o de 1996, permitem receptor precisa ser
a abordagem psicossocioló- fazer escolhas, preencher lacunas.
rias à formação do leitor. Assim, ra, para decodificar sinais,
da leitura que
é conseqüência de n o s s o s
aqui propomos Por essa razão, podemos dizer que a literatura vive no imagi-
gica vivi- isto é, se solidari-
debates n a de compreendermos a experiência
tentativa nário social: pela ação daqueles que lêem,
Marília
da enquanto pesquisadoras.
Durante dois semestres, z a m conm o autore completam seu trabalho de criação.
minha orientação, oficinas
de
sob atividade do leitor,
Papaléo Fichtner realizou, atendidas pelo grupo
Uma teoria assim formulada aposta na
leituracom crianças da comunidade,
mes-
atribuindo-lhe um criativo no trânsito literário, ao
papel
até então n a s áreas de saúde,
da arte, por
de trabalho do referido Centro, mo tempo que garante a função emancipadora
serviço social psicologia. à medida que provo-
capacidade de expandir horizontes
e
Sua
de literatura, adotamos os pressu- sentido,
desestabilizando-os. Nesse
Enquanto estudiosas liderada por Hans-
ca seus consumidores,
Escola de Constança, funcionaram como pråti-
postos teóricos da isto é, a as oficinas de leitura desenvolvidas
dos
a estética recepcional, inicial e continuada
Robert Jauss, que formula cas que tinham em vista a formação
na atuação do leitor, a
concepção da arte literária centrada vista de s e u
desenvolvimento in
dos enfoques Sujeitos, tanto do ponto de
referimos anteriormente. Diverginclo
que já nos
dividual quanto social.
obra e seu produtor, esta teoria a
tradicionais, voltados para a de laboratório permite-nos
atividade que dá existência e Paralelamente, este trabalho
atenta para a leitura enquanto de leitura e as cond
em jogo, então, as relações entre reflexão sobre a qualidade do processo
legitima a literatura. Entram Partindo sem-
e permanência.
através da din mica de pergunta e resposta foes necessárias a sua aquisição o livro
o texto e seu leito, interativa, em que
le lado lado. Tal processo só é
a percebido à luz da noção de pre de uma situação grupal, lúdica e e damatizado
conjuntos de códigos éti- manuseado, lido
os apresentado às crianças,
horizontes de expectativas era
como
caixas,
recursos de sucata disponíveis
(potes, garrafas,
cos, estéticos, religiosos, sociais, morais, filosQficos, etc., que Os
250TAescolarizaçlo da leitura literária-o Jogo do livro infantil e juvenil QUINTAPARTE: Formação de leltoresprofessores 251

papéis, jornais velhos, tampinhas, etc.), as atividades evoluíam, livro nas diferentes agencias sociais, mediadoras do ato
de
ler). o processo de particularização é similar,
graclativamente, para o ato individual de leitura. Talvez tenha exigindo possi-
sicdo para nós o momento mais significativo, nesse sentido, aquele bilidades de discriminação do sujeito de seu papel no grupo.
em que cluas meninas tomaram o livro e se afastaram do grupo Para isso, condições externas de leitura, como ter o livro
para
para, em um canto da sala, fazerem sua leitura particular. si, estar sozinho, dispor de um espaço em que possa intera-
gir só com o livro, são necessárias. No entanto, o ambiente
A experiência deu-nos a chave para entenlermos a leitura
propício não é imposto, mas buscado, como pudemos pre-
como uma atividade condicionada ao domínio da capacidade
senciar num lance de oficina. A internalização psicológica,
de singularização. Em outras palavras, para que o indivíduo se
torne um leitor, é necessário que esteja apto a fazer a discrimi- corresponde a privatização social.
nação eu X mundo, pela estruturação de sua personalidade e Como vimos, historicamente, a expansão da leitura está
conscientização do processo de internalização por que passa. associada à sociedade moderna, uma vez que os grupos pri
A essa particularização individual corresponcle, no âmbito so mitivos se organizavam em uma vida tribal e transmitiam suas
cial, uma outra particularização, pela possilbililade de distin- experiências através cda fala. Estruturadas dos mi- enm torno

humanos
ção entre o públicoe o privado. Por outros caminhos, tem-se tos, como respostas aos questionamentos para a
rela-
aqui também um movimento que levao sujeito ao singular persona social, as culturas orais identificavam-se com os

quando ele deixa de ser um elemento do grupo primitivo para tos em formas fixas e simples, transmitidos pelos contadores,
se tornar um membro atuante da sociedade. contendo as vivências comuns ao grupo, em produções reite
No ambito individual, o movimento de particularização rativas. Todas as questões da existência, enraizadas
grandes
no inconsciente coletivo, eram tematizadas e resolvidas por
só se gradativamente,
realiza à medida que a
passa criança
do pensamento mágico, colado ao mítico, para a descoberta Conta de sua elaboração oral em forma de mito. Essas narra-
de sua interioridade. Sem estabelecer u m a separação nítida tivas passavam de geração em geraço por força da memória,
as vivências leito- baseados numa econo-
entre o eu e o mundo que a cerca, ela tem o que garantia exercícios perceptivos
ras externalizadas pelo jogo simbólico. Nessa situação, pre- mia cognitiva temporal e auditiva.
dominam os elementos lúdicos e concretos e talvez daí o Com o advento da burguesia, surgiu um novo modelo so
ela manuseia,
prazer da leitura: o livro é o brinquedo que
restritoa
Cial, centrado na cidade, e um novo formato familiar,
tem cheiro, formae cor. Mas é atra- cor-
que os adultos leem, que célula pai-mäe-filhos. À difusão da leitura pela imprensa,
vés do contato repetido (como o jogo simbQlico que imita a Por sua vezZ, O
respondeu a popularização crescente do livro.
vida adulta) que se dá a internalização do processo, ou seja, movimento de paticularização social decorrente da ordem ca
fornecem os elementos necessários e o
as ações experimentadas pitalista estabelecida facilitou a distinção entre o público
à construção da personalidade. Fecha-se, assim, o círculo: a incentivaram
privado, e as novas posturas do homem burguês
leitura propicia a formação do indivíduo que, por sua vez, escolha do
livre iniciativa de
para ler necessita de condições que possibilitem
a internali- Sentimentos de propriedade e
só desenvoive
e
vro. Diante do texto escrito, o leitor vê-se
zação. Suas primeiras tentativas precisam ser, portanto, nmui- uma consciência muito mais
do que temporal.
espacial
to lúdicas e coletivas, mas sempre apoiadas no livro, para agora
ind-
da questão-o
que possa fazer a travessia. LEvando-se em conta os dois pólos o
Do ponto de vista social (e aqui nos apoiamos na sociolo- que leitor precisa sair
vIaual e o social podemos afirmarindividual/privado, quc
do do pensamento mítico/público para o o
gia da leitura, que dá conta, como já salientamos, lugar do a escrita. iNe>
COresponde à passagem cla cultura oral para
QUINTA PARTE: Formação de leitoresprofessores 253
252IA scolarização da leitura literiria- o jogo do livro Infantil e juvenil

antes salientar que elàs também se incluem


caminho, contudo, os componentes primitivos não se per- casa, nao sem
no espaço maior
da comunidade.
dem, porque a arte se apropria dos arquétipos, dando uma Pela via da escola, o aluno pode contactar com outros seg-
dimensão espacial, no texto escrito, ao que era temporal na
fala do contador. Ler, assim, quer dizer recuperar, simbolica- mentos sociais que oaproximam dos livros e, para isso, pro-
todo o pessoal que
mente vivências arcaicas, sem perder o sentido da realidade, fessores, supervisores, orientadores, enfim,
deve estar aberto ao convívio para além
ressignificando-as em nível indiviclual para melhor se inte- se ocupa da educação
aula. Nessas ocasiðes, a cada um é
grar no social. Compreender esse processo é a tarefa que das paredes da sala de
dado o direito de escolha daquilo que quer ler, segundo
atribuímos à psicossociologia da leitura. seus

A partir daí, podem-


Odiagnóstico das
condições necessárias à formação do interesses, curiosidades e possibilidades.
em que o estudante tenha que justificar
leitor, na perspectiva apontada, pretende contribuir para a se propor atividades

melhoria desse processo, na certeza de que a prática da leitu- suas decisões, falar
dos assuntos preferidos, contar como se
livro a s e r lido. Também é esse o
ra, alargando horizontes, permite ao indivícduo a descoberta deu s e u encontro c o m o
a compreensão das
de novas formas de ser e de viver, interna e externamente. momento de todas as ações que permitam
editora, partes da obra, ca-
noções de autor, ilustrador, título,
s e r e m exploradas pelo
animador de leitura.
pas, assunto, a
Propondo ações Uma vez dissecado o objeto
livro a partir de clados exter-
indi-
nos, à hora da leitura, ela m e s m a que é sempre
chega-se
silenciosa. Mesmo quando introduzida por algum
Por essa linha de pensamento, consideramos a necessida- vidual,
da história,
de de que a escola abrigue múltiplas formas de aproximação estímulo externo do professor (como narrar parte
um fundo musical, levar ao
tea-
entre sujeitos e livros, c o m oferta livre de tipos
de textos de apresentar personagens, fazer
contato direto com o tex-
diferentes linguagens, de atividades de leitura individual e tro), a ação de ler supõe isolamento,
à internalização
coletiva. Aos discriminação, serão oferecidas
alunos, sem to, capacidade de gerir a solicdão para chegar
sociais mais amplas (como clos significados descobertos e a um posicionamento diante de
ocasiðes de freqüentar agências cola-
bibliotecas públicas, livrarias, feiras,
encontros c o m escrito- les. Para que isso aconteça, as atividades grupais podem
no
borar, pois vão chamar a atenção para narrativas poemas,
c o m o jornais, revis-
e
res) e interagir c o m modalidades várias,
textos,
funcionem c o m o mediadores inicio transmitidos oralmente e depois iclentificaclos nos
LAs, catálogos, almanaques, que facilitando a relação entre senticlos e sinais gráficos.
escolar desempenha
de leitura. Nesse contexto, a biblioteca
catalisadora dos bens culturais
à metas
seguintes organizam-se segundo
as
irradiadora e As atividades
o papel de
disposição do aluno. educacionais que as embasam. Elas devem, como já enfati-
mais importantes na zamos, respeitar a diversidade de ritmos, de capacidades de
E claro que, entre as instituições
c o m o livro,
está a família. E im- compreensão, de abstração, de concentração dos alunos.
intermediação da criança
as dificuldadles
socioeconômi- Não importa até onde a criança vai, mas a qualidade d per
porta, e muito, enfatizar que curso de leitura que consegue realizar: levamos em conta,
brasileira e os privilégios culturais (que
cas da população
uma culturadominante, desrespeitando
como
as de aqui, a caminhada que oleitor está fazendo, no senti-
novo
elegem domésti- do de interiorizar e refazer, para si, os conteúdos da obra,
ler no âmbito da vida
mais), interferem no ato de
foco é escola, no processo de singularização que descrevemos. Lidar
Ca. Por esse motivo, e ainda porque
nosso a
da
com
de leitura n o interior a variedade, numa mesma turma, não é fácil, mas tambem
abstemo-nos de discutir as práticas
5 4 A escolarização da leitura literária- o jogo do lvro infantil e juvenil
QUINTAPARTE: Fomação de leitoresprofessores 25

NOTAS
não é impossível. Talvez o segredo para o sucesso da mis-
Vera Teixeira Aguiar é professora da Faculdlacle dle Letras da PUC/RS.
são esteja na qualidale das tarefas planejaclas, em termos
A respeito, ver os relatórios de pexquisa que registram os dados coletados e
de ludismo e versatilicdade.
analisaclos:
A leitura é um jogo em que o autor escolhe as peças, dá as FICHTNER, Marília Papaléo. Oficina de leitura e produçáo textual em diferentes
linguagens- PROLER/PUCRS. Reatório de Pesquisa. Porto Alegre: PUCRS, 1996.
regras, monta o deixa ao leitor a possibilidade de
texto e
fazer combinaçòes. Quando ela faz senticdo, está ganha a apos- oficina de leinura e criação exiual em diferenies linguagens comoprodução
de sentido e construção de conbecimento- PROLER/PUCRS. Relatório de Pesquisa.
ta. Mas isso só acontece porque o leitor aceita as regras e se Porto Alegre: PUCRS, 1997.
transporta para o mundo imaginário criado. Se ele resiste,
fica fora da partida. Ao mergulhar na leitura, entra em outra
BIBLIOGRAFIA
esfera, mas não perde o sentido do real e aí está, a nosso ver,
APPLE, Micheal. ldeologia e curriculo. São Paulo: Brasiliense, 1982.
a função mágica da literatura: através dela vivemos uma ou-
BOURDIEU, Pierre. Les règles de l'art. Génèse et structure du champ
tra realidade, com suas emoções e perigos, sem sofrer as
con litéraire. Paris: Seuil, 1992.
seqüências daquilo que fazemos e sentimos enquanto lemos.
ECO, Umberto. Leitura do texto literário. Lector in fabula.
Essa consciência do brinquedo que a arte é leva-nos a expe- Lisboa: Pre-
rimentar o prazer de entrar em seu jogo. sença, 1979.

Assim, através do caráter lúdico da literatura, o entendi- ESCARPIT, Robert. Le littéraire et le social. Paris: Flammarion, 1970.
mento do leitor alastra-se para além dos sentidos do texto; HAUSER, Arnold. Sociologia del arte. Sociología del priblico. Barcelona:
ele pussaa dar-se conta do próprio processo de leitura e, Labor, 1977.
nessa caminhada, descobre-se enquanto sujeito capaz de tal reader Baltimore, London: The Johns
ISER, Wolfgang. The implied
empresa. Em suma, o leitor se lë. Por isso, quando propomos Hopkins University, 1978.
atividades lúdicas com as obras lidas, temos e m vista brinca- JAUSS, Hans-Robert. Pour une esthetique de la réception. Paris: Galli-
deiras que recuperem a espontaneidade e o comprometimen-
mard, 1978.
dos sentidos
to dos que provoquem desafios a partir
jogos,
dos textos e, sobretudo, que estimulem a participação do lei- OLSON, David R. O mundo no pape!: as implicaçoes conceituais e cog
nitivas da leitura da escrita. So Paulo: Ática, 1997.
tor. Cada u m vai ter em vista o conteúdo do objeto textual e,
ao mesmo tempo, vai atentar para sua própria ação, desco ONG, Walter J. Oralità e scrittura. Le tecnologie della parola. Bologna:
Mulino, 1986.
brir seu papel no jogo da leitura.
RICOEUR, Paul. O conflito das interpretações. Ensaios de hemeneunca
Para que esse procedimento tenha continuiclade, é neces
Rio de Janeiro: Imago, 1969.
e variadas.
sário, contudo, que as atividades sejam múltiplas "A obra de ate na época de
de

Oleitor iniciante, com pouco fôlego, tem capacidades de con- WALTER, Benjamin. suas técnicas
reprodução". In.: Os pensadores. São Paulo: Abril, 1980.
constante ofer
centraçaoe de atenção reduzicdas, o que exige ZILBERMAN, Regina. A lteraura infantil na escola. São Paulo: Global,
ta de novos textose experiências de leitura. Das ações quase 191
aos poucos, a outras mais dluradouras,
relämpago passamos,
em exercício crescente de amadurecimento. E, justamente por

depender das condições internas do novo leitor,


não pode
seu ritmo, ao mes-
mos impor prazos, mas devemos respeitar
ações mais refleticdas.
mo tempo que encorajá-lo a

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