Cap HISTORIOGRAFIA LINGUÍSTICA para Sussu 2009

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HISTORIOGRAFIA LINGUÍSTICA: PRINCÍPIOS E PROCEDIMENTOS

Neusa Barbosa Bastos – IP-PUC/SP – NEL-UPM

Reflexões sobre estudos históricos/historiográficos são extremamente relevantes para


as áreas do conhecimento em geral e em particular para a área de Letras e Lingüística,
uma vez que acreditamos ser o homem um ser histórico por excelência. Assim é que,
através dos tempos, os indivíduos procuram modos de descrição e explicação dos
fatos humanos em momentos e lugares diversos.

Concordamos com Koerner (1996:61) no que tange à necessidade do estabelecimento


de uma lista de princípios práticos e teóricos que sejam amplos o suficiente para
encontrar aceitação entre historiógrafos da lingüística, porque podem ser adaptados a
períodos diferentes da história das ciências da linguagem e a aspectos particulares
sob investigação, linhas guias que possam fazer nossa interpretação do passado mais
transparente para colegas que não necessariamente compartilhem da mesma
formação, perícia e interesse.

Neste trabalho, tecemos considerações acerca do fazer histórico/historiográfico que


busca metodologias em ciências sociais, filosofia, linguística e demais saberes já
constituídos, que possam contribuir com os princípios norteadores do processo em
questão. De início, seguimos os procedimentos metodológicos da Historiografia
Linguística, de acordo com Koerner e Altman, trazendo como concepção de
Historiografia Lingüística (HL) o modo de escrever a história do saber lingüístico,
tendo como objetivo descrever/explicar como se desenvolveu tal saber em um
determinado contexto. Vista assim, tal concepção leva-nos não só à análise de um
produto acabado dentro de um recorte no tempo, mas também à consideração de seus
mecanismos geradores, conduzindo-nos a uma visão pancrônica da realidade em que
etapas de conhecimento a engendraram.

Nosso foco estará voltado para o conceito de historiografia, seus princípios e


procedimentos, mencionando anteriormente que o fazer história tem sido, ao longo
dos séculos, uma preocupação dos homens nas diferentes sociedades e épocas, por
uma necessidade, intrínseca ao ser humano, de questionar-se sobre o seu passado para
nele se apoiar, viver o presente e fazer prospecções para um futuro assentado nas
experiências vividas, conhecendo assim maneiras de organizar as próximas etapas a
serem realizadas. (BASTOS, 2004)

Com esse objetivo, na França, passa a vigorar uma tendência historiográfica que se
volta para a recuperação da historicidade sem deixar de lado a dinâmica social que
impulsiona os movimentos humanos com as seguintes inovações que se manifestaram
por meio da intelectualidade do início do século XX: 1) a substituição da tradicional
narrativa de acontecimentos por uma história-problema; 2) a história de todas as
atividades humanas e não apenas a história política; 3) a colaboração de outras
disciplinas tais como: geografia, sociologia, psicologia, economia, lingüística,
antropologia social e outras.

Retomando Bastos (2004), afirmamos que, na década de 20, surge o movimento dos
Annales em que a forma de se fazer história, por meio da junção harmônica de
organizações cronológica e temática, leva a descrições de lutas entre grupos
conflitantes em relação a idéias ou a quaisquer outras manifestações: econômicas,
sociais, geográficas etc. Quanto à questão de tema, escolhe-se um período para
localizar um problema o que significa que se deveria escrever uma história de longa
duração e, por meio da busca de solução do problema, enfoca-se o fenômeno
histórico, explicado em termos de seu tempo e não em função de tempos anteriores.

Não se pode deixar de mencionar os representantes iniciadores desse movimento da


Escola dos Annales: Lucien Febvre, Marc Bloch e, ainda, Braudel, historiador
inquieto que debateu entre os limites da liberdade individual e o determinismo, tendo
como meta articular o social, o político, o econômico e o cultural na maneira de ver os
fenômenos e escrever a história. Essa movimentação entre tendências leva-nos, depois
de 1968, a três correntes, a saber: 1) a redescoberta da história das mentalidades; 2) a
tentativa de empregar métodos quantitativos na história cultural; 3) a reação contrária
a tais métodos que tende para um ressurgimento da narrativa, um retorno à política e
uma antropologia histórica. Assim, o grupo contribuiu com diversas possibilidades de
se fazer história: história problema, história comparativa, história psicológica, geo-
história de longa duração, história serial e antropologia histórica.
Paralelamente à tradição francesa com sua abrangência interdisciplinar, voltada para a
conjuntura e para as mentalidades coletivas, está a tradição inglesa empirista voltada
para o seu individualismo metodológico em que, segundo Moura (1995:14), a
historiografia norte-americana é parte da história intelectual e
procura utilizar uma abordagem ao mesmo tempo “internalista” e
“externalista”; em outras palavras, procura ver o movimento das idéias
como desenvolvimento e transformação de correntes de pensamento
pretéritas e, ao mesmo tempo, procura verificar de que modo os contextos
(social, nacional, internacional) condicionam (ou se relacionam) aquelas

idéias e sua transformação.

Convém mencionar que os seguidores de ambas as tendências (historiografia


americana e Escola dos Annales) propiciaram a abertura da história ao diálogo com
outras ciências humanas e sociais, num processo de mútuo enriquecimento e, também,
uma abertura maior para as correntes historiográficas estrangeiras: a social britânica,
voltada para o renovado interesse pelo marxismo, e a Nouvelle Histoire francesa, com
uma grande preocupação com tendências de longa duração e uma relativa
despreocupação com pensadores individualizados. (Burke, 1997:118).

Nesse momento do estado da arte, passamos a enfocar a Historiografia que tem sido
entendida como uma disciplina que contém como principais objetivos: descrever e
explicar como se produziu e desenvolveu o conhecimento de qualquer natureza em
um determinado contexto social e cultural, através do tempo, como já mencionamos
anteriormente. (Altman, 1998:25). Assim, temos o discurso sobre o passado tal como
produzido pelo historiógrafo, não mais a história como relato de fatos passados vistos
na sua sucessividade.

Portanto a abordagem da Historiografia Linguística considera que o historiógrafo da


Linguística deve ter tido treino em Linguística, a fim de ter uma compreensão
adequada de quais são as questões particulares ao campo, para que esteja
familiarizado com mais de um tipo de transmissão da teoria e da prática Lingüística e
de suas mudanças através do tempo.

Quanto ao fazer historiográfico, segundo Koerner (1996:47), o historiógrafo explica,


como já expusemos antes, tanto quanto possível, as razões da mudança de orientação
e de ênfase e a possível descontinuidade que delas se pode observar. Sua prática
requer, ainda, capacidade de síntese para poder retirar dos fatos empíricos coligidos a
partir de fontes primárias o que for essencial, trazendo essas descobertas empíricas
para a perspectiva correta para interpretá-las e oferecer uma explicação adequada dos
fatos. Quanto ao estabelecimento de base fundamental de uma historiografia
lingüística, afirma que
Indubitavelmente, o estabelecimento da base fundamental de uma
historiografia lingüística, um campo de averiguação, cujas tendências
devem estar exclusivamente em prol do restabelecimento dos fatos mais
importantes do nosso “sine ira et studio”1 passado lingüístico e
explicando, tanto quanto possível, as razões para as mudanças de direção
e ênfase, e para possível descontinuidade que pode ser observada, coloca
altas exigências em termos de escolaridade, amplitude de abrangência e
profundidade de aprendizado, exigindo um conhecimento quase
enciclopédico, por parte do pesquisador, dada a natureza quase
interdisciplinar dessa atividade. Além disso, ela exige uma capacidade de
síntese, uma aptidão para destilar a essência, da quantidade de fatos
empíricos que pode ser juntada aos poucos, das fontes originais. Em
outras palavras, para utilizar uma diferenciação contemporânea, a
historiografia lingüística tem de ser ‘orientada para a teoria’ e não
‘orientada para dados’, embora, sem dúvida, muita leitura das fontes
originais precise ainda ser feita, a fim de se estabelecer adequadamente os
fatos básicos no desenvolvimento da disciplina.

Sendo assim, o historiógrafo deve procurar, além de seu próprio campo, diretrizes e
modelos que o embasem na busca de seu quadro de trabalho, sua própria metodologia
e epistemologia, tendo como condição sine qua non uma dupla perícia: o
conhecimento específico sobre um domínio científico e o bom conhecimento da
história intelectual (incluída no domínio matriz da história geral).

Dessa maneira, com um conhecimento quase enciclopédico, por conta da natureza


interdisciplinar de tal atividade, é necessário restabelecer os fatos mais importantes do
passado, explicando, dentro das possibilidades razões das mudanças de orientação e
de ênfase e, ainda, continuidade e descontinuidade passíveis de observação, com
capacidade de síntese para porejar o essencial da massa dos fatos empíricos reunidos a
1
sine ira et studio, lema da História, segundo Tácito: escrever sem cólera e raiva e sem favorecimento - escrita
imparcial).
partir das fontes primárias que constam de um dos pontos importantes a ser seguido
de acordo com os integrantes do GPeHLP2. Deve, então o historiógrafo, descrever o
processo e a atmosfera de uma “revolução em curso” e essas descobertas empíricas
para a perspectiva correta, interpretá-las e oferecer uma explicação adequada dos fatos
a partir de sua “não-história”, isto é a busca por meio do registro da história da língua
ou da lingüística que não está escrita, não constando nos documentos oficiais.

Desencadeiam os estudos de HL, cinco tipos de motivação: o primeiro diz respeito a


uma motivação como sujeito enciclopédico, como “ramo” de uma enciclopédia do
saber; o segundo refere-se a uma motivação como ilustração do progresso do
conhecimento; o terceiro relaciona-se a uma motivação como objetivo de defender,
difundir ou promover um modelo linguístico particular em detrimento de outro; o
quarto volta-se a uma motivação como descrição e explicação de conteúdos de
doutrina, inserida em um contexto histórico científico e o quinto e último, a uma
motivação como testemunha exterior sobre uma realidade social, “colorida” pelas
concepções e práticas linguísticas. Quaisquer desses tipos preencherão as
possibilidades de se desenvolverem estudos na tendência da HL.

Por exemplo, a reconstrução histórica, que seria grosso modo a constituição do quadro
de definição, implica expor questões acerca das teorias lingüísticas que não se
desenvolveram em total isolamento, mantidas pela sociedade que promoveu a
atividade científica. Devemos considerar aqui a idéia da influência, o debate da
continuidade e descontinuidade e a questão da metalinguagem só para citar alguns
exemplos.

Assim uma questão a ser considerada, de acordo com Koerner (1996:63) é a do


argumento da influência ou suposta influência que ajuda a construir o quadro teórico a
ser considerado. Tais influências vêm das muitas idéias que nos tenham sido passadas
pelos nossos antepassados e, mesmo existindo mudança e inovação de fato, ela
usualmente toma forma de variação de temas, de seleção sobre o conhecimento
acumulado e de desvios do clima intelectual que induziram a ver de diferentes
maneiras as coisas. Neste caso, compete ao historiógrafo detectar, analisar e explicar
2
GPeHLP – Grupo de Pesquisa em Historiografia da Língua Portuguesa do Instituto de Pesquisas
Linguísticas Sedes Sapientiae para Estudos de Português da PUCSP.
estas mudanças, tendo a preocupação de não ser iludido por aclamações de novidade,
originalidade e criatividade, usualmente feitas pela geração imediatamente
subseqüente.

Os historiógrafos estão cientes das continuidades (acumulação) e descontinuidades


(ruptura) por intermédio do que percebemos que certa tendência cessa e outra aparece
por uma mudança geral de perspectiva. Quanto ao fator de subjetividade da HL,
podemos afirmar que o sujeito da historiografia, motivado, com formação profissional
compatível para a pesquisa, utilizando a metodologia adequada e mantendo seu estilo,
deve ter convicções científicas e ideológicas, conhecimento sobre as correntes
intelectuais do período que possam ter causado impacto sobre o pensamento
linguístico, sabendo assim sobre o contexto científico e cultural.

Mencionemos, ainda, a questão da metalinguagem, recurso que utiliza a linguagem


empregada para descrever idéias do passado sobre linguagem e linguística que exige
criatividade indivíduo na descrição e explicação do fatos linguísticos, idéias sobre
língua e linguagem a serem analisados nos documentos selecionados de períodos
passados com o objetivo de trazer a conhecimento do público presente constructos
antigos. A tarefa do historiógrafo, atendo-se às orientações teóricas da época em foco,
seu quadro de referência, tem como meta explicar, tanto quanto possível, as razões da
mudança de orientação e de ênfase e a possível descontinuidade que delas se pode
observar, descrevendo o processo e a atmosfera de uma “revolução em curso” e
trazendo essas descobertas empíricas para a perspectiva correta, interpretando-as e
oferecendo uma explicação adequada dos fatos

A aplicação de teorias modernas para a interpretação do passado pode produzir um efeito


distorcido na informação, ao mesmo tempo em que pode gerar interferências e inferências
não autorizadas pelas pistas presentes no texto e no contexto em que o documento foi
produzido. Ocorrem, ainda, possíveis interferências, quando o leitor moderno altera o
significado de enunciados da história por associação, por exemplo, em um mesmo texto
de elementos do passado e da atualidade. O recurso da metalinguagem pode ser um
refreador dessa atitude.
E quanto à periodização podemos afirmar que se baseia nas grandes revoluções
sociais ocorridas no mundo. Por exemplo: historiógrafos consideram o fim do mundo
romano como o limite entre a Antigüidade e a Idade Média, pois a decadência do
povo romano caracteriza um momento de revolução em que o movimento popular
reivindica seus direitos, opondo-se à escravatura, assim como se consideram as
primeiras revoluções burguesas na Europa caracterizadoras do início dos tempos
modernos.

Convém lembrar que nossa preocupação volta-se sempre à aquisição de uma


princípios teórico-metodológicos que permitam a realização de um trabalho
historiográfico com peso científico, seguindo o estabelecimento do clima de opinião
do período e avaliação do objeto de estudo e, ainda, a ampliação de estudos por meio
do conhecimento amplo sobre o campo de investigação específico e sobre a história
geral para se estabelecer o quadro de definição do período em que se apoiarão as
análises das fontes primárias escolhidas como corpus . As fontes coligidas formam
esse corpus que deve ter de valor historiográfico como a correspondência, as notas ou
até mesmo a documentação reunida por estudiosos (que dificilmente divulgam como
ou em que circunstâncias chegam a determinados resultados de pesquisa)

Passamos, então, a expor os princípios koernianos e os passos investigativos


fundamentais para a elaboração de um trabalho historiográfico. Primeiramente,
quanto aos princípios básicos, temos a convicção de que historiógrafo, como qualquer
outro cientista, não trabalha sem princípios que o norteiem, visando à credibilidade de
sua pesquisa, neste caso são três: a) a contextualização; b) a imanência e c) a
adequação.

A contextualização visa à busca das correntes intelectuais do período e da situação


sócio-econômica, política e cultural e, principalmente do pensamento lingüístico
marcado de forma indelével por todo um determinado período histórico com a
presença das mais variadas correntes filosóficas, políticas, econômicas, cientificas e
artísticas que se interinfluenciam. Isso nos impele a recorrer ao “clima de opinião”
cultural da época, o espírito de época, em que determinado pensamento se
desenvolveu; clima formado pelo endosso e pelo abandono de valores, a partir da
revisão de paradigmas.

A imanência refere-se ao esforço do historiógrafo de entender o texto lingüístico


produzido nos séculos enfocados de forma completa, histórica e criticamente, e
filologicamente se possível. Entretanto, tal atitude não poderá desviá-lo da fidelidade
ao que foi dito, ou seja, cabe-lhe respeitar não só o quadro geral da teoria em questão,
como também as acepções terminológicas definidas internamente, e não em referência
à doutrina lingüística moderna, qualquer que seja a linha teórica que o embase.

A adequação relaciona-se com a obediência aos dois primeiros. Diz respeito ao


momento de o historiógrafo, de forma explícita, aventurar-se a introduzir
aproximações modernas do vocabulário técnico e a construir um quadro conceitual de
trabalho que permita a apreciação dos textos analisados, seus conceitos e teorias, com
a constatação das afinidades de significado que subjazem a ambas as definições.

Reafirmados os princípios koernianos, voltamo-nos para os procedimentos a serem


seguidos, os passos investigativos que abrangem quatro momentos: seleção,
ordenação, reconstrução e interpretação.

O primeiro deles diz respeito à seleção de documentos a serem estudados dentre todos
os que houver disponíveis, para que entre eles se elejam os mais representativos para
o tema da investigação em tela. O segundo deles refere-se à ordenação dos
documentos selecionados, pois, em havendo mais de um documento a ser analisado,
deverá ser utilizado um critério para a ordenação dos mesmos: cronológica, temática
etc Em seguida, buscamos reconstruir o conhecimento lingüístico dos vários recortes
considerados, baseando-nos, por fim, na interpretação crítica do processo dessa
produção contextualizada a partir do clima de opinião delineado.

Um procedimento importante na condução metodológica do trabalho relaciona-se à


questão das fontes, que podem ser primárias e secundárias: considerando-se como
fontes primárias os documentos originais, dos quais serão extraídos os elementos que
nos permitem, seguindo os passos investigativos, proceder à análise dos documentos
selecionados e como fontes secundárias, aquelas que permitem verificar o que já foi
estudado sobre os documentos que temos em mãos e as que nos embasam
teoricamente.

No geral, as fontes documentais estão disponíveis à interpretação do historiógrafo da


linguística que descreve e explica os fenômenos de língua e as idéias lingüísticas que
embasam sua descrição e explicação, compondo assim a historiografia linguística. As
aproximações dos dados do contexto e os elementos da dimensão interna da língua
permitem desvendar, revelar e sistematizar as interações materializadas no documento.
Além disso, as informações passadas, impressas no documento, surgem para o
historiógrafo da língua não só como representativa de uma época, mas também como uma
possibilidade de reconstituição de uma realidade para, primeiramente, recuperá-la e
depois traduzi-la para a ciência de nosso tempo.

A se considerar, ainda, estão as dimensões cognitiva e social. Entendemos por


dimensão cognitiva, também vista como “interna”, o entendimento que os indivíduos,
como parte de uma realidade em seus recortes espaço-temporais têm; aquilo que é
apreendido nos seus ditos repletos de linhas teórico e/ou metodológicas orientadoras
da produção do documento que temos em mãos sendo, portanto, a dimensão que
organiza o conhecimento científico e sua construção como processo social e histórico.
Entendemos por dimensão social, também vista como “externa”, o entendimento dos
aspectos sociais com relação aos grupos de linguistas, filólogos e gramáticos que
exerciam papel institucional ao tecer um quadro teórico compatível com os sentidos
comuns a um grupo de pessoas da época em questão.

Levando em consideração que as etapas metodológicas aqui enumeradas, fazendo-nos


supor certa ordem, não rigidamente estanques, abordaremos os critérios de análise.
Detectam-se aqui as categorias, que, entre outros requisitos, imprimem cientificidade
a um trabalho.

De acordo com BASTOS e PALMA (2006),


categoria é um aspecto, saliente em uma obra, e revelador de um ponto de
vista que a alicerça e que pode manifestar-se nos mais diversos níveis
lingüísticos, sublinhando, assim, “uma crença em...”. A categoria, como
se vê, resumindo e salientando um intrincado de valores traduzidos em
língua, reveste-se de tal importância que, alheio a ela, o historiógrafo
poderá priorizar o episódico. Assim, tendo esse ponto de apoio,
estabelecemos, na análise da relação entre ensino de Língua Portuguesa e
gramáticas do Português dos séculos considerados, duas categorias: a)
apresentação/organização das obras e b) intenção teórico-metodológica
dos autores que, explicitamente ou não, levando em conta o item a),
desenvolveram políticas de Língua Portuguesa matizadas pelo “discurso
da lei” e do “ensino”.

Considerando as etapas arroladas acima como fios condutores de um trabalho


historiográfico, resta-nos reafirmar que o historiógrafo deve detectar, analisar e
explicar as mudanças que houve, durante o percurso a ser investigado, sem que se
deixe envolver pela novidade, pela originalidade e pela criatividade, usualmente feitas
pelas gerações que lhe são imediatamente subseqüentes.

Tendo discutido o conceito de historiografia, seus princípios e procedimentos,


podemos afirmar que nosso objetivo foi atingido e deixar consignado que aspectos da
história e da historiografia devem constar dos estudos relacionados à Língua
Portuguesa, voltamos às autoras Bastos e Palma (2006), para afirmar que ao
descreverrmos e explicarrmos como se produziu e desenvolveu o conhecimento
lingüístico em um determinado contexto social e cultural, através do tempo, estamos
implicados com questões relacionadas à nossa identidade, políticas lingüísticas e
educação do povo. Lembremos, então, as palavras de Hull (2003:5) “o povo não deve
voltar as costas ao passado para não se tornar uma nação de amnésicos.”

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