Atualização Dos Critérios Da OMS

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Motriz, Rio Claro, v.16 n.4 p.811-819, out./dez. 2010 doi: http://dx.doi.org/10.5016/1980-6574.

2010v16n4p811

Artigo Original

A utilização do critério da Organização Mundial de Saúde para


classificação do estado nutricional em crianças
Valter Cordeiro Barbosa Filho 1,3
Teresa Maria Bianchini de Quadros 2
Evanice Avelino de Souza 1
Alex Pinheiro Gordia 2
Wagner de Campos 3
1
Grupo de pesquisa em Tratamento e Prevenção da Obesidade em Adolescentes,
Universidade Federal do Ceará, Fortaleza, CE, Brasil
2
Universidade Federal do Recôncavo da Bahia, Cruz das Almas, BA, Brasil
3
Programa de Pós-graduação em Educação Física da Universidade Federal do Paraná,
Curitiba, PR, Brasil

Resumo: Este estudo analisou a concordância do critério da Organização Mundial de Saúde (OMS, 2007)
com os critérios de Kuczmarski et al. (2002), Cole et al. (2000, 2007) e Conde e Monteiro (2006) para
classificação do estado nutricional em crianças. Estudo transversal realizado com 619 escolares (331
meninas) de 6 e 7 anos de idade, da cidade de Fortaleza, Ceará. Aferiu-se estatura e massa corporal para
cálculo do índice de massa corporal. O índice Kappa (k) foi utilizado para analisar a concordância entre os
critérios, considerando p<0,05. As concordâncias do critério da OMS (2007) foram significativas (p<0,001),
sendo muito boas (k=0,82) com Kuczmarski et al. (2002) e Cole et al. (2000, 2007), e boa (k=0,68) para
Conde e Monteiro (2006). Em conclusão, sugere-se cautela na utilização do critério da OMS, assim como
dos demais, para avaliação do estado nutricional em crianças brasileiras devido às diferenças étnicas e
metodológicas.
Palavras-chave: Estado nutricional. Crianças. Diagnóstico. Desnutrição. Excesso de peso.

Use of World Health Organization criteria for nutritional status classification in children
Abstract: This study analyzed the concordance of the World Health Organization criteria (WHO, 2007) with
Kuczmarski et al. (2002), Cole et al. (2000, 2007) and Conde and Monteiro (2006) criteria used for nutritional
status classification in children. This is a cross-sectional study, with 619 students (331 girls) from 6 and 7
years old, from the city of Fortaleza, Ceará, Brazil. Body mass and stature were measured to calculate the
body mass index. The Kappa index (k) was used to analyze the concordance between the criteria,
considering p<0.05. The concordances of the WHO (2007) criteria with the other three criteria were all
significant (p <0.001): very good (k = 0.82) with Kuczmarski et al. (2002) and Cole et al. (2000, 2007); good
(k = 0.68) with Conde and Monteiro (2006). In conclusion, the World Health Organization criteria should be
use with caution, as well as the others, to assess the nutritional status of Brazilian children due to ethnic and
methodological differences.
Key Words: Nutritional status. Children. Diagnosis. Malnutrition. Overweight.

Introdução (JANSSEN et al., 2005; KATZMARZYK et al.,


A população brasileira passa por uma 2003).
transição nutricional caracterizada pela diminuição A Organização Mundial de Saúde (OMS, 1995)
da desnutrição (MONTEIRO et al., 2009), recomenda a utilização do Índice de Massa
principalmente nos grandes centros urbanos, e Corporal (IMC) para o diagnóstico do estado
pelo aumento da obesidade (MONTEIRO; nutricional de grupos populacionais por ser um
CONDE; POPKIN, 2004; BATISTA FILHO; método não-invasivo, válido e de baixo custo
RISSIN, 2003). Desta forma, a obesidade se (NIHISER et al., 2007). Em adultos, a OMS
tornou um dos principais problemas de saúde propôs os pontos de corte do IMC de 25 kg.m e
-2

pública (WANG; MONTEIRO; POPKIN, 2002), -2


30 kg.m para o diagnóstico de sobrepeso e
visto que se inicia cada vez mais cedo e está obesidade, respectivamente (OMS, 1998). No
relacionada com fatores de risco para doenças entanto, como o IMC muda substancialmente com
cardiovasculares e síndrome metabólica o avanço da idade, estes pontos de corte não são
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adequados para classificação do estado nutricional de crianças de seis e sete anos de


nutricional em crianças e adolescentes idade e verificar a concordância do critério da
(MAYNARD et al., 2001; COLE; FREEMAN; OMS (2007) com os critérios propostos por
PREECE, 1995). A partir disso, diversos critérios Kuczmarski et al. (2002), Cole et al. (2000, 2007)
de classificação do IMC, de acordo com o sexo e e Conde e Monteiro (2006).
idade, foram propostos para crianças e
adolescentes (MUST et al., 1991; COLE et al., Materiais e Métodos
2000; KUCZMARSKI et al., 2002; CONDE; Este estudo apresentou delineamento
MONTEIRO, 2006). No entanto, ainda não há um transversal e foi realizado no mês de maio de
critério de classificação do estado nutricional em 2007, com uma amostra representativa dos
crianças e adolescentes universalmente aceito escolares de seis e sete anos de idade
(NEOVIUS et al., 2004). regularmente matriculados nas escolas públicas e
particulares da cidade de Fortaleza, Ceará. O
Em 2007, a OMS propôs um critério de
Termo de Consentimento Livre e Esclarecido
classificação do estado nutricional para crianças e
(TCLE) foi assinado pelos pais ou responsáveis
adolescentes entre 5 e 19 anos de idade, com a
de cada escolar incluído na investigação,
finalidade de monitorar e acompanhar infanto-
assegurando-se o anonimato das informações. O
juvenis de vários países (BUTTE; GARZA; ONIS,
estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em
2007). Esse recente critério foi desenvolvido a
Pesquisa da Universidade Federal do Ceará
partir dos dados americanos do National Center
(protocolo nº 075/07).
for Health Statistics (1977), com um
reprocessamento dos dados para se adequar ao A população do estudo foi composta por
padrão de crescimento das crianças menores de 70.000 crianças de seis e sete anos de idade que
cinco anos de idade, identificado em estudo frequentavam as escolas públicas e particulares
multicêntrico realizado pela OMS em 2006, e aos nas seis regiões do município de Fortaleza, de
pontos de corte definidos para a classificação do acordo com o levantamento do Instituto Brasileiro
estado nutricional em adultos (ONIS et al., 2007). de Geografia e Estatística (IBGE, 2005). Calculou-
se uma amostra aleatória simples, considerando a
Devido à sua recente publicação, o critério da
maior prevalência de excesso de peso (15,0%)
OMS (2007) ainda é pouco utilizado para
observada em crianças do município (PEREIRA;
diagnósticos nutricionais em crianças e pouco se
LIMA; MARTINS, 2004), com nível de confiança
sabe sobre a concordância desse critério com
de 95% e erro amostral de três pontos
outros critérios de classificação do estado
percentuais. Após o acréscimo de uma margem
nutricional utilizados na literatura brasileira. Não
de segurança de 10% para eventuais perdas
obstante, a utilização de diferentes critérios pode
amostrais, foi obtido o tamanho final da amostra
gerar divergências no diagnóstico do estado
para o estudo (n=618).
nutricional em crianças, dificultando a
comparação entre estudos. Neste sentido, o
objetivo deste estudo foi analisar o estado

Tabela 1. Distribuição dos escolares de acordo com o sexo e idade.


Idade Masculino Feminino Total
n % n % n %
6 anos 149 51,7 159 48,0 308 49,8
7 anos 139 48,3 172 52,0 311 50,2
6-7 anos 288 46,5 331 53,5 619 100,0

Quatro escolas em cada uma das seis regiões (14,2%) crianças foram excluídas da amostra por
do município de Fortaleza foram selecionadas por não entregar o TCLE ou faltar o dia da coleta de
conveniência para participar deste estudo, sendo dados. Portanto, a amostra deste estudo foi
duas escolas públicas e duas particulares, por composta por 619 crianças, sendo 364 (59,9%)
região. Com a autorização da direção escolar, de escolas públicas e 254 (41,1%) de escolas
trinta alunos de cada escola foram selecionados particulares.
aleatoriamente e convidados a participar da coleta O critério utilizado para se determinar o
dos dados. Dos 720 escolares convidados, 101 intervalo entre as idades foi de 6,00–6,99 = 6

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Classificação do estado nutricional em crianças

anos e 7,00–7,99 = 7 anos. A distribuição das do IMC menores que o percentil 5, entre 85 e 95,
crianças por idade e o sexo pode ser verificada na e acima de 95 como desnutrição, sobrepeso e
Tabela 1. obesidade, respectivamente. Nos critérios de Cole
et al. (2000) e Conde e Monteiro (2006) o
Visando melhorar a confiabilidade das
sobrepeso e a obesidade foram identificados a
medidas, previamente à coleta de dados efetuou- -2
partir das curvas equivalentes ao IMC 25 kg.m e
se um treinamento dos avaliadores. Os materiais -2
30,0 kg.m para adultos, respectivamente. A
utilizados para avaliação antropométrica foram: (i)
desnutrição foi identificada à partir das curvas
fita métrica da marca Easyread e modelo Cateb, -2 -2
equivalentes ao IMC 18,5 kg.m e 17,5 kg.m
com resolução de 0,1 cm; e (ii) balança digital da
para adultos de acordo com os critérios de et al.
marca Plenna e modelo Wind, com resolução de
(2007) e Conde e Monteiro (2006),
0,1 kg e capacidade de 150 kg.
respectivamente. Os pontos de corte
As padronizações propostas por Gordon, selecionados para a desnutrição, sobrepeso e
Chumlea e Roche (1988) foram seguidas para obesidade corresponderam ao valor anual médio
determinação da estatura (m) e da massa da idade dos escolares (ex. 6,5 anos).
corporal (kg). A estatura foi aferida com a criança
A estatística descritiva foi utilizada para
sem sapatos, os calcanhares unidos e a cabeça
caracterização dos resultados, baseada em
orientada com o plano de Frankfurt. Para
média, desvio padrão e porcentagem. Para
determinação da massa corporal, a criança foi
verificar as diferenças entre os sexos utilizou-se o
avaliada na posição ortostática, sem sapatos e
teste t de Student para dados contínuos e o teste
usando o uniforme de educação física. As 2
qui-quadrado (X ) para proporções. O índice
medidas da massa corporal e estatura foram
-2 Kappa (k) foi utilizado para avaliar a concordância
utilizadas para cálculo do IMC (kg.m ).
do critério da OMS (2007) com os demais critérios
O IMC foi classificado de acordo com os de classificação do estado nutricional. Utilizou-se
critérios propostos pela OMS (2007), Kuczmarski o método proposto por Svanholm et al. (1989)
et al. (2002), Cole et al. (2000, 2007) e Conde e para classificação da concordância em: pobre
Monteiro (2006), a partir dos pontos de corte (≤0,20), regular (0,20 a 0,40), moderada (0,41 a
determinados para sexo e idade. O critério da 0,60), boa (0,61 a 0,80) e muito boa (>0,80). O
OMS (2007) classificou os valores do IMC nível de significância foi estabelecido em p<0,05,
menores que o percentil 3 como desnutrição, utilizando-se o pacote estatístico SPSS 15.0.
entre os percentis 85 e 97 como sobrepeso e
acima do percentil 97 como obesidade. O critério
de Kuczmarski et al. (2002) classificou os valores

Resultados
As características gerais da amostra de acordo com a idade e o sexo são apresentadas na Tabela 2.
Observou-se diferença significativa entre os sexos para as variáveis massa corporal (p=0,041) e estatura
(p=0,030) das crianças de seis anos de idade, sendo que os meninos apresentaram valores médios
superiores.

Tabela 2. Média e desvio padrão das variáveis analisadas de acordo com a idade e sexo.
6 anos 7 anos
Variáveis Masculino Feminino Masculino Feminino
Idade (anos) 6,41 (0,2) 6,45 (0,3) 7,41 (0,3) 7,38 (0,3)
Massa Corporal (kg) 23,6 (5,0) 22,5 (4,5)* 25,0 (5,3) 24,4 (5,1)
Estatura (cm) 120,9 (6,6) 119,4 (4,9)* 124,5 (6,1) 123,6 (6,2)
-2
IMC (kg.m ) 16,01 (2,3) 15,66 (2,3) 16,02 (2,6) 15,85 (2,4)
* Diferença significativa, com p<0,05.

Na Tabela 3, pode ser verificada a entre os sexos nas classificações nutricionais


classificação do estado nutricional das crianças (p=0,308). Verificou-se também que o critério da
de acordo com os diferentes critérios de OMS (2007) apresentou a maior prevalência de
referência. Ao utilizar o critério da OMS (2007), desnutrição (16,0%) na amostra total e, ao utilizar
não foram verificadas diferenças significativas o critério de Conde e Monteiro (2006), identificou-

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se prevalência de desnutrição de apenas 4,4%. Os critérios da OMS (2007) e de Cole et al. (2000,
Entretanto, no que se refere ao sobrepeso, 2007) apresentaram a maior (9,4%) e menor
percebeu-se que o critério brasileiro apresentou a (6,3%) prevalência de obesidade,
maior prevalência (15,3%), enquanto o critério de respectivamente. De maneira geral, estes
Kuczmarki et al. (2002) diagnosticou a menor resultados também se repetiram ao utilizar os
proporção de crianças com sobrepeso (10,5%). diferentes critérios de classificação em cada sexo.

Tabela 3. Classificação do estado nutricional dos escolares de Fortaleza, CE, a partir dos diferentes critérios
de referência de acordo com o sexo.
Estado Nutricional (%)
Critérios
Desnutrição Peso normal Sobrepeso Obesidade
Amostra total (n=619)
OMS (2007) 16,0 62,4 12,3 9,4
Cole et al. (2000, 2007) 15,3 67,2 11,1 6,3
Kuczmarski et al. (2002) 10,0 70,3 10,5 9,2
Conde e Monteiro (2006) 4,4 73,8 15,3 6,5
Masculino (n=288)*
OMS (2007) 16,7 58,7 13,9 10,8
Cole et al. (2000, 2007) 15,3 66,7 10,8 7,3
Kuczmarski et al. (2002) 9,7 67,7 11,8 10,8
Conde e Monteiro (2006) 3,1 74,0 17,4 5,5
Feminino (n=331)
OMS (2007) 15,4 65,6 10,9 8,2
Cole et al. (2000, 2007) 15,4 67,7 11,5 5,4
Kuczmarski et al. (2002) 10,3 72,5 9,4 7,9
Conde e Monteiro (2006) 5,4 73,7 13,6 7,3
*Não houve diferenças significativas entre os sexos, com p<0,05.

Os índices de concordância Kappa (k) do critério da OMS (2007) com os demais critérios de classificação
do estado nutricional estão apresentados na Tabela 4. As concordâncias observadas foram significativas
(p<0,001), independente do sexo e idade. O critério de Kuczmarski et al. (2002) apresentou concordâncias
muito boas em relação ao critério da OMS (2007), em ambos os sexos e idades e, enquanto que o critério
de Cole et al. (2000, 2007) apresentou concordância muito boa para o sexo feminino e boa para o sexo
masculino. Em relação à concordância do critério da OMS (2007) e de Conde e Monteiro (2006), observou-
se concordância moderada e boa, respectivamente, para as crianças do sexo masculino e feminino. Quando
analisada a amostra total, a menor concordância do critério da OMS (2007) foi verificada com o critério de
Conde e Monteiro (2006) para o sexo masculino e a maior com o critério de Cole et al. (2000, 2007) para o
sexo feminino.

Tabela 4. Índice de concordância Kappa (k) do critério da OMS (2007) com o critério de Kuczmarski et al.
(2002), Cole et al. (2000, 2007) e Conde e Monteiro (2006), para os escolares de Fortaleza, CE, de acordo
com a idade e sexo.
Critério OMS (2007)*
Kuczmarski et al. Cole et al. Conde e Monteiro
(2002) (2000, 2007) (2006)
6 anos
Masculino (n=149) 0,80 0,76 0,58
Feminino (n=159) 0,85 0,92 0,78
Ambos (n=308) 0,83 0,84 0,68
7 anos
Masculino (n=139) 0,80 0,76 0,65
Feminino (n=172) 0,81 0,85 0,70
Ambos (n=311) 0,80 0,81 0,68
6-7 Anos
Masculino (n=288) 0,80 0,76 0,61
Feminino (n=331) 0,83 0,88 0,74
Ambos (619) 0,82 0,82 0,68
*Todas as concordâncias foram significativas, com p<0,05.

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Classificação do estado nutricional em crianças

deste critério para a classificação do estado


nutricional tem sido investigada recentemente,
Discussão principalmente por ser o único critério com dados
Apesar da importância do diagnóstico do de crianças e adolescentes brasileiros (FARIAS
estado nutricional de crianças e adolescentes de JÚNIOR et al., 2009; QUADROS, 2009; VITOLO
diferentes regiões do Brasil, há poucos estudos a et al., 2007; FERNANDES et al., 2007).
respeito do estado nutricional em crianças Ao analisar a concordância destes critérios de
escolares do município de Fortaleza. No presente classificação do estado nutricional com o da OMS
estudo, verificou-se que a desnutrição esteve (2007) em crianças, verificou-se que o recente
mais presente do que o sobrepeso nas crianças critério da OMS apresentou concordâncias entre
deste município, entretanto, quando observadas moderada e muito boa com os demais critérios
as prevalências de sobrepeso e obesidade investigados. Estes resultados corroboram outros
(excesso de peso), foi verificada uma maior estudos realizados com crianças brasileiras
prevalência em relação à desnutrição. Este perfil (LEAL, 2008; SILVA et al., 2008).
nutricional das crianças do município de Fortaleza
Os achados do presente estudo indicaram que
ainda é observado em alguns municípios do
o critério de Conde e Monteiro (2006) apresentou
Nordeste brasileiro, onde são identificadas
as menores concordâncias com o critério da OMS
elevadas prevalências de desnutrição, sobrepeso
(2007), enquanto que o critério de Kuczmarski et
e obesidade no mesmo espaço sociodemográfico
al. (2002) foi o único que apresentou
(IBGE, 2006).
concordâncias muito boas em ambos os sexos e
Vale ressaltar que estes resultados não se idades. Em contrapartida, Leal (2008) verificou
justificam pela homogeneidade da amostra deste que o critério de Conde e Monteiro (2006)
estudo, visto que foram avaliadas crianças tanto apresentou maior concordância com o critério da
de escolas públicas quanto de particulares. OMS (2007) do que o critério de Cole et al. (2000,
Tampouco pelo critério de classificação do estado 2007) para ambos os sexos, ao estudar 2.795
nutricional, uma vez que dos quatro critérios de crianças de 7 a 10 anos de idade do município de
classificação utilizados no presente estudo, três Florianópolis, SC. Vale ressaltar que Leal (2008)
apresentaram prevalências semelhantes de utilizou uma faixa etária diferente do presente
desnutrição. Portanto, observa-se a necessidade estudo e analisou a concordância entre critérios
de políticas públicas para combater tanto a somente para identificação do excesso de peso, o
condição de sobrepeso e obesidade quanto da que pode justificar as discordâncias entre os
desnutrição nas crianças do município de resultados dos estudos.
Fortaleza, CE.
As diferenças entre os critérios na
Em relação aos critérios utilizados no presente concordância com o critério da OMS (2007)
estudo para comparação com o da OMS (2007), podem ser justificadas pelos pontos de corte do
percebe-se que o critério proposto por Cole et al. IMC de cada critério de classificação do estado
(2000, 2007) é bastante utilizado no diagnóstico nutricional. Alguns estudos já verificaram que o
nutricional de crianças e adolescentes brasileiros critério de Conde e Monteiro (2006) classifica
(PELEGRINI et al., 2008; VIEIRA, et al., 2008), mais casos de excesso de peso do que os
provavelmente por ter sido desenvolvido com critérios de Cole et al. (2000, 2007) e Kuczmarski
base em dados de seis diferentes países, et al. (2002), indicando que o critério brasileiro
incluindo o Brasil. O critério de Kuczmarski et al. tende a superestimar a prevalência de excesso de
(2002) foi desenvolvido pelo Centers for Disease peso quando comparado aos critérios norte-
Control and Prevention dos Estados Unidos e americano e internacional (FARIAS JÚNIOR et al.,
também é bem aceito na classificação do estado 2009; QUADROS, 2009; FERNANDES et al.,
nutricional de jovens brasileiros (BARRETO, 2007).
2007; PEREIRA; LIMA; MARTINS, 2004). No
Estudo realizado com adolescentes de idades
entanto, o critério de Conde e Monteiro (2006)
entre 10 e 19 anos indicou que a mudança do
ainda é pouco utilizado para classificação do
critério antigo da OMS (1995) para o atual (OMS,
estado nutricional em jovens, provavelmente
2007) resultou em aumentos significativos nas
devido à sua recentemente publicação. A acurácia

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V. C. Barbosa Filho, T. M. B. Quadros, E. A. Souza, A. P. Gordia & W.Campos

prevalências de sobrepeso (GOMES; ANJOS; outros critérios utilizados na literatura brasileira foi
VASCONCELOS 2009). Além disso, a utilização relevante para verificar se o recente critério
do critério de Cole et al. (2000, 2007) resultou em poderia ocasionar divergências com critérios
uma redução significativa na prevalência de anteriormente utilizados. Além disso, a avaliação
desnutrição quando comparado à recomendação do estado nutricional de crianças do município de
atual da OMS (GOMES; ANJOS; Fortaleza, CE, a partir do critério da OMS (2007)
VASCONCELOS 2009). Estes resultados foi coerente, uma vez que há evidências de que
sugerem cautela na comparação de estudos com este critério segue um padrão metodológico mais
diferentes critérios de classificação do estado adequado na determinação da desnutrição,
nutricional, uma vez que cada critério possui sobrepeso ou obesidade (BORGHI et al., 2006).
particularidades, principalmente no que se refere Contudo, cabe destacar que a amostra do
á população de referência e ao método estatístico presente estudo foi representativa de escolares
utilizado para estabelecimento dos pontos de de 6 e 7 anos de idade de um município do
corte. Nordeste brasileiro, fato que impossibilita a
generalização dos resultados. Neste sentido,
A análise das concordâncias entre critérios
encoraja-se a realização de estudos que
para classificação do estado nutricional em
investiguem o estado nutricional em amostras que
crianças tem sido investigada com frequência na
sejam representativas de outras idades e regiões
literatura (KO et al., 2008; WILLONS; JOHNSON;
do Brasil.
BALL, 2007; KAIN et al., 2002; FLEGAL et al.,
2001). Entretanto, observa-se resultados
Conclusão
destoantes entre os estudos, variando de
Pode-se concluir que a desnutrição, o
concordâncias muito boas (LEITE et al. 2008) a
sobrepeso e, em menor proporção, a obesidade,
pobres (FERNANDES et al., 2007; BUENO;
foram prevalentes em crianças de seis e sete
FISBERG, 2006). Não obstante, pode-se verificar
anos de idade do município de Fortaleza, CE, de
que muitos estudos avaliaram apenas a
acordo com o recente critério de classificação do
concordância entre critérios na detecção de
estado nutricional proposto pela OMS. Este
excesso de peso em crianças e adolescentes
critério apresentou concordâncias entre boa a
(FARIAS JÚNIOR et al., 2009; FERNANDES et
muito boa com os critérios norte-americano e
al., 2007; ABRANTES; LAMOUNIER;
internacional e moderada a boa com o critério
COLOSIMO, 2003). Contudo, no presente estudo
brasileiro. Portanto, sugere-se cautela na
optou-se por analisar a concordância dos critérios
utilização do critério da OMS, assim como dos
tanto na detecção do excesso de peso quanto da
demais, para avaliação do estado nutricional em
desnutrição, visto que a desnutrição ainda é
crianças brasileiras devido às diferenças étnicas e
presente em crianças de todas as regiões do
metodológicas.
Brasil, especialmente em algumas regiões do
Nordeste brasileiro (IBGE, 2006), fato confirmado Referências
no presente estudo.
ABRANTES, M.M.; LAMOUNIER, J.A.;
Vale destacar que poucos estudos foram COLOSIMO, E.A. Comparison of body mass
encontrados na literatura analisando a index values proposed by Cole et al. (2000) and
Must et al. (1991) for identifying children with
concordância do critério da OMS (2007) com
weight-for-height index recommended by the
outros critérios de classificação do estado World Health Organization. Public Health
nutricional. A maioria dos estudos que utilizaram o Nutrition, v.6, n.3, p.307-311, 2003.
critério da OMS foi realizada para analisar o http://dx.doi.org/10.1079/PHN2002426
padrão de crescimento em crianças menores de
cinco anos de idade (ÁLVAREZ; LOPES; ÁLVAREZ, M.C.; LÓPEZ, A.; ESTRADA, A.
Estado nutricional de niños de Antioquia,
ESTRADA, 2009; LEONE; BERTOLI; SCHOEPS,
Colombia, según dos sistemas de referencia.
2009) ou para verificar a concordância deste Revista Panamericana de Salud Publica, v.25,
critério com outros critérios de classificação do n.3, p.196–203, 2009. Disponível em:
estado nutricional nesta faixa etária (MEI et al., www.scielosp.org/pdf/rpsp/v25n3/a02v25n3.pdf
2008; PADULA; SALCEDA, 2008).
BARRETO, A.C.N.G. Prevalência de excesso de
Com base neste contexto, a análise da peso em pré-escolares na cidade de Natal/RN.
concordância do critério da OMS (2007) com 65f. Dissertação (Mestrado em Ciências da

816 Motriz, Rio Claro, v.16, n.4, p.811-819, out./dez. 2010


Classificação do estado nutricional em crianças

Saúde) Universidade Federal do Rio Grande do CONDE, W.L.; MONTEIRO, C.A. Body mass
Norte, Natal, 2007. index cutoff points for evaluation of nutritional
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