Negociação e Gestão de Conflitos Uni2

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Negociação e Gestão de Conflitos

UNIDADE 2
O negociador, a ética e o planejamento da negociação

Introdução da unidade

Objetivos da unidade

Ao longo desta unidade, você irá:

 identificar as habilidades essenciais dos negociadores;


 compreender os conceitos de ética, moral, capital social e valores;
 identificar os itens fundamentais no planejamento de uma negociação

Nós estamos avançando na disciplina e, provavelmente, neste momento você já percebeu a


importância de saber negociar e fazer a gestão de conflitos, no ambiente corporativo, na
vida pessoal, social ou profissional.

Nesta unidade, aprenderemos mais sobre as habilidades que um bom negociador deve
desenvolver para alcançar bons resultados ou acordos. Aliás, você descobrirá que é
completamente possível desenvolver e aprimorar tais habilidades.

Você também vai conhecer um pouco mais sobre a importância da ética na negociação e
compreenderá que, a médio e longo prazos, a ética forma a reputação. Esta é a maneira que
você será reconhecido no mercado: um profissional de boa ou má reputação. Há
profissionais e acadêmicos que afirmam que a nossa reputação é o maior “ativo” que
podemos ter, razão pela qual é tão importante preservá-la.

Como mencionado na unidade anterior, o planejamento das negociações é o momento mais


importante de todo o processo de negociação. Por esse motivo, retomaremos o tema com
mais detalhes para que você entenda que, quanto melhor for o planejamento de suas ações
no momento da negociação, maiores serão as chances de êxito.

Para praticarmos o conteúdo, acompanharemos o caso do gerente de projetos Demétrio, que


implementa o sistema ERP Integra em empresas de diferentes segmentos e portes. Suas
atribuições e responsabilidades serão úteis para solucionarmos os problemas apresentados.

Você sabe quais habilidades são necessárias a bons negociadores? O que é e como funciona
a ética nas negociações? Como planejar uma negociação? Pois bem, ao final desta unidade
você estará mais preparado para enfrentar negociações mais complexas e alcançar
excelentes resultados.

Pronto para o desafio? Então, mãos à obra.


Aula 1 - Unidade 2

Habilidades dos negociadores


Introdução da aula
Qual é o foco da aula?
Nesta aula, veremos que o desenvolvimento das habilidades necessárias aos negociadores
faz parte de um aprendizado, que melhora à medida que cada negociador aplica seus
conhecimentos e adquire experiências sobre o que se deve ou fazer.
______
Objetivos gerais de aprendizagem
Ao longo desta aula, você irá:
 identificar as habilidades essenciais dos negociadores;
 compreender o comportamento das realidades internas dos negociadores;
 aplicar os conceitos de habilidades de negociador.
______
Situação-problema
Demétrio trabalha há cinco anos na empresa Integra e é responsável pela implementação
de um sistema ERP do mesmo nome. ERP (Enterprise Resource Planning) é um sistema que
integra todas as áreas ou todos os departamentos de uma organização, desde
planejamento de materiais, compras, finanças, vendas, até planejamento de produção,
logística, expedição e controladoria.
Exatamente por envolver tantas áreas e pessoas, o trabalho da Demétrio é desafiador: ele
precisa mapear as pessoas que influenciam e as que são influenciadas pelas alterações que
o ERP traz. Isso tudo antes, durante e depois de sua implantação. Após o mapeamento, ele
precisa negociar com os gestores sobre a equipe que será formada e depois negociar as
atribuições e o tempo necessário de empenho de cada membro.
Demétrio iniciará um projeto na prestadora de serviços de embalagens All Pack. Nesse
projeto, ele precisa entender as necessidades das pessoas das diferentes áreas, negociar a
formação da equipe que irá atuar, além do tempo de dedicação. Para alcançar um bom
resultado, ele terá de usar suas habilidades de negociador.
Você acha que é importante que o gerente do projeto conheça o perfil das pessoas
envolvidas no projeto e suas características de negociação? Seus estados mentais,
conhecimentos e habilidades, além de suas expectativas, crenças e valores e
necessidades? Ou você acredita que o gerente tem que ser duro e não precisa negociar
muito com os membros da equipe?
O conteúdo a seguir lhe trará os diferentes pontos de vista sobre as habilidades dos
negociadores, podendo auxiliá-lo nessas respostas e colaborar com o Demétrio em sua
tarefa.
As habilidades essenciais dos negociadores

Knust et al. (2012) ressaltam que, para que uma negociação seja bem-sucedida, é
necessário que o negociador tenha capacidade de influenciar pessoas ou situações.
Já Wanderley (1998) afirma que o poder de convencimento é fundamental para chegar a
bons acordos e destaca dois tipos de poder:
 poder decorrente de fatores externos, por exemplo: um cargo na empresa, bons
relacionamentos, bens materiais ou recursos financeiros
 poder pessoal ou poder interno, ou seja, algo mais inerente aos negociados, como
educação, desenvolvimento próprio e características pessoais. Geralmente, o poder
interno ou pessoal leva as pessoas a conquistar e usarem corretamente o poder
externo.
Segundo Wanderley (1998), o poder não deve ser considerado um fim em si mesmo, mas
algo que, uma vez que tenhamos definido com propriedade nossos objetivos, nos permite
alcançar estes objetivos e obter sinergia nas negociações.
A sinergia ocorre cada vez que as partes que estão negociando interagem de tal forma que
provocam a soma ou mesmo a multiplicação de seus talentos e recursos. Por isso, cada vez
mais é valorizada a negociação ganha-ganha, com base na qual as partes envolvidas
multiplicam seus ganhos e geram sinergia.
______

Atenção
O contrário também pode ocorrer quando o relacionamento entre as partes subtrai ou
divide seus talentos ou recurso, gerando a antissinergia, desgastando o relacionamento e
tornando-o mais curto.
______
Knust et al. (2012) apresentam um modelo de aplicação para identificar estilos de
negociadores que se baseia nas energias usadas nas relações interpessoais. Esse modelo
focaliza os estilos e comportamentos de influência utilizados pelos negociadores em
contextos práticos, considerando os impactos diretos dessa influência sobre a outra parte.
Veja, a seguir, a ilustração do modelo de práticas situacionais de negociação proposto por
Knust et al.:

Fonte: Knust et al. (2012).


Note que o quadrante “aproximar” está em destaque, porque é o que gera sinergia entre
as partes. A sinergia pode ser apenas um dos desfechos possíveis, mas sempre deve ser
considerada como o melhor deles.
No passado, em que vivíamos um tempo de produção e comunicação em massa, com
regimes militares conduzindo muitos países, os níveis hierárquicos verticais eram muito
importantes. Nesse ambiente, o poder externo se fazia prevalecer. Havia um dito popular
que dizia “manda quem pode e obedece quem tem juízo”.
Atualmente, os relacionamentos horizontais prevalecem, ou seja, os países são mais
democráticos, há liberdade de imprensa, diálogos entre pais e filhos, e os clientes são mais
ouvidos pela empresa. Mesmo entre as organizações o que importa é que as informações
e os materiais tenham um bom fluxo entre os diferentes departamentos,
independentemente dos níveis hierárquicos.
Nesse novo ambiente, o poder externo se torna menos importante, e o poder interno ou
pessoal pode ser um fator decisivo para conseguir boas negociações e,
consequentemente, bons acordos.
Wanderley (1998) destaca os seguintes elementos formadores do poder pessoal:

Fonte: Wanderley (1998).


O estado mental positivo potencializa conhecimentos e habilidades. Com muita frequência
nos deparamos com pessoas sem muitos conhecimentos ou habilidades que alcançam
grandes resultados na vida pessoal, profissional e esportes, porque são capazes de manter
estados mentais altamente positivos.
É considerado elemento do poder pessoal, porque é a chave para entender desempenhos
espetaculares ou medíocres.
______
� Exemplificando
A pesquisadora Judith Turner, da Universidade de Washington, estudou o efeito placebo
durante quinze anos. Placebo é qualquer efeito positivo atribuído a uma pílula ou
procedimento que não deriva diretamente da sua ação farmacológica ou das suas
propriedades específicas.
A pesquisadora concluiu que ele funcionou de forma positiva EM uma grande parcela de
pacientes com dores de cabeça, de coluna, dores pós-operatórias etc.
______
O conhecimento envolve não apenas o que se conhece, mas também a profundidade, a
organização e a priorização do que se conhece. Ele deve associar-se à prática. Ou seja, é
essencial que o negociador consiga aplicar o conhecimento adquirido.
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� Reflita
Você acha que conhecimento sem prática é inútil? Prática sem conhecimento é cega?
Nada é tão prático quanto uma boa teoria?
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Habilidade significa saber fazer e implica comportamento, ação. É por meio da ação que
alcançamos os resultados almejados.
As habilidades a serem desenvolvidas são aquelas que os negociadores bem-sucedidos
possuem. Podem ser conseguidas por observação direta ou por intermédio de teoria
(livros, treinamentos técnicos, graduação etc.).
Wanderley (1998) destaca três etapas para adquirir habilidades de negociação:
1. consciência da necessidade: quando percebemos a necessidade de mudança e
desejamos que realmente aconteça. Sem a consciência de que precisamos
desenvolver constantemente novas habilidades, não há possibilidade de mudança.
2. etapa da mudança: identificação e prática dos comportamentos envolvidos na nova
habilidade, bem como o recebimento de informações sobre a maneira como este
comportamento está se desenvolvendo e as correções necessárias para que se
atinja o padrão desejado.
3. etapa da sedimentação: a transformação do novo comportamento em uma
segunda natureza, ou seja, a incorporação das novas habilidades ao repertório
comportamental.
______
� Reflita
Você acredita que as etapas apresentadas funcionam para as mais diversas situações?
Veja o caso de Ivan, que passou dos 40 anos e percebeu que estava com grande
dificuldade para subir os lances de escada até o estacionamento de seu trabalho. Além
disso, sua barriga estava cada vez maior, com risco de desenvolver doenças
cardiovasculares.
Ele então percebeu que devia mudar seus hábitos alimentares e de sedentarismo (Etapa
1). Procurou uma nutricionista e um personal trainer para ajudá-lo na mudança (Etapa 2).
Depois de oito meses, correu sua primeira meia maratona (21 km), pratica exercícios
regularmente e não sente mais falta das frituras e junk food (Etapa 3).

Diferentes visões teóricas sobre as habilidades dos negociadores

Diferentes áreas da ciência, como psicologia, antropologia e etnologia, estudam os


comportamentos das pessoas por diferentes meios, para diferentes fins. As ciências
aplicadas, como a Administração, Marketing, Engenharias, Direito etc., usam tais estudos e
pesquisas especificamente em suas disciplinas.
O Marketing, por exemplo, se interessa pelo comportamento dos consumidores e pelo
modo como eles reagem a uma comunicação ou uma ação de marketing; os advogados
criminalistas precisam conhecer os diferentes comportamentos das pessoas que cometem
crimes; na Administração é preciso conhecer o comportamento das pessoas diante de um
determinado ambiente de trabalho e selecioná-las de acordo com as afinidades entre a
cultura da empresa e seus objetivos.
Para qualquer que seja a finalidade, é certo que as pessoas moldam seus comportamentos
a partir de influências externas (família e parentes, amigos, cultura, região, comunidades
etc.), que são absorvidas e interpretadas de acordo com a personalidade de cada um.
Burbridge e Burbridge (2012) descrevem a complexidade do sistema nervoso e o cérebro,
bem como o estudo da neurociência. Para os autores o pensamento e o sentimento do
negociador estão inter-relacionados e acontecem simultaneamente. São processados
respectivamente pelo neocórtex (pensamento) e o sistema límbico (sentimentos) do
cérebro.
Acontece que, antes que esses dois elementos entrem em ação, há uma parte de nosso
sistema que é mais rápido e efetivo: o tronco cerebral. Essa parte é responsável pelo
controle daquelas partes de nosso corpo que não dependem nem do neocórtex nem do
sistema límbico, sendo o que controla a respiração, os batimentos cardíacos, nossas
reações automáticas e ameaças.
Algumas de nossas reações mais agressivas e imediatas vêm de lá e não chegam a ser
processadas pela parte pensante de nossa mente.
Quando uma reação dessas acontece, só nos resta avaliar se foi uma atitude adequada ou
não. Caso não seja, podemos pedir desculpas ou conviver com as consequências.
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� Exemplificando
Com o advento das redes sociais, é cada vez mais comum as pessoas famosas ou
governantes responderem tempestivamente a um comentário e terem que vir a público
pedir desculpas logo depois. Eles agiram de acordo com seu tronco cerebral.
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O negociador precisa aprender a moldar suas respostas a certas emoções e gerenciar essas
emoções por meio de um profundo e longo aprendizado.
Quando dizem que um negociador é frio, totalmente impessoal e racional, pode ser apenas
uma percepção de quem está de fora. Não significa que essa pessoa está isenta de
emoções e sim que aprendeu a gerenciá-las ou, pelo menos, não deixa que elas
transpareçam ao longo da negociação.
Há negociadores capazes de permanecer em negociação durante mais de 12 horas,
controlando o cansaço físico e o estresse mental, com o objetivo de alcançar o melhor
acordo. Negociações em tribunais e votações dos poderes legislativos e judiciários, que
duram mais de 16 horas, são bons exemplos.
Wanderlei (1998) separa o comportamento das realidades internas dos negociadores e
compara essas duas realidades a um iceberg, do qual a parte visível é o comportamento e
a realidade interna e as emoções são as partes invisíveis, como mostra a figura:
Fonte: o autor.
A seguir, falaremos um pouco mais da percepção.

Percepção
As pessoas e os negociadores não se comportam de acordo com a realidade objetiva ou
externa, mas sim de acordo com a realidade percebida.
É certo que somos influenciados pelas variáveis externas, mas cada um de nós recebe
essas influências de formas diferentes, maneiras de como interpretamos nossas
realidades. Todos construímos um mapa mental a partir dessas interpretações e cada
pessoa cria seu próprio mapa a partir de uma mesma realidade.
______
� Pesquise mais
Para refletir um pouco mais sobre o tema da percepção, acesse este link e assista ao trailer
do filme Ponto de vista, que mostra os diferentes pontos de vista sobre um mesmo
atentado. É muito interessante observar como um mesmo evento visto de diferentes locais
pode levar a diferentes interpretações!
______
Em uma negociação, a percepção é um dos pontos mais relevantes, pois, mesmo que duas
pessoas concordem a respeito de uma mesma realidade, elas poderão dar pesos e valores
diferentes sobre essa realidade. Assim, em um acidente de automóvel, elas podem
concordar com os fatos ocorridos, mas discordar sobre quem deve pagar pelos prejuízos.
Alguns negociadores perdem boas oportunidades porque formam impressões negativas
sobre a outra parte decorrentes de estereótipos e preconceitos. Por isso, os primeiros
momentos da negociação devem ser tratados cuidadosamente.
Wanderley (1998) ressalta que a percepção das pessoas é influenciada pelos seguintes
elementos:
 expectativas;
 emoções, sentimentos e desejos;
 crenças e valores; e
 necessidades
Vamos conhecer cada um deles?
Expectativas – Nós costumamos ver aquilo que esperamos ver e não vemos aquilo que não
esperamos ver.
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� Exemplificando
Foi realizado um teste na Universidade de Harvard com estudantes de uma escola
primária, em que foram selecionados aleatoriamente e agrupados na turma A e turma B.
A professora das duas turmas, que não sabia do experimento, foi informada que a turma A
era formada por estudantes excelentes, e a turma B, medianos. Após algum tempo, os
estudantes se submeteram a um teste e a turma A foi significantemente melhor.
Ou seja, a partir das expectativas da professora, a turma A foi mais incentivada do que a
turma B.
______
Emoções, sentimentos e desejos – O ser humano é cheio de sentimentos, desejos e
emoções que compõem as relações humanas, e os sentimentos que temos pelas pessoas
determinam a nossa compreensão de seus atos. Se gostamos de alguém, nossa propensão
é só de ver os pontos positivos e negar ou justificar seus pontos negativos.
______
� Reflita
Já aconteceu de, apesar de todas as evidências, você não reconhecer o erro de uma outra
pessoa? Por exemplo, aquele político de quem você gosta foi acusado de corrupção
algumas vezes e, apesar das provas, você acredita que é uma conspiração? Ou alguma
ação de um amigo próximo ou namorado?
_____
Crenças e valores – Crenças são generalizações que fazemos a respeito do mundo, de nós
mesmos e das pessoas, do que é certo ou errado e de como as coisas devem funcionar.
Nossas crenças são muito fortes e nem sempre temos consciência delas.
Valores são as prioridades que damos às crenças e estão relacionados ao tempo que
dedicamos efetivamente a eles e ao peso que assumem quando temos que decidir algo.
Por exemplo, se uma pessoa diz que valoriza ajudar as pessoas e na realidade não o faz,
isso significa que esse valor não é verdadeiro.
Necessidades – O ser humano é impulsionado ou motivado a agir para satisfazer suas
necessidades. De acordo com Kotler e Keller (2006), tudo que fazemos ou dizemos é para
satisfazer ou evitar privação de alguma de nossas necessidades.
Os autores também apresentam a hierarquia das necessidades humanas proposta por
Maslow, que mostra de que forma as necessidades são priorizadas. À medida que
atendemos uma necessidade básica, subimos a pirâmide em direção ao topo.
Veja a figura a seguir:
Fonte: o autor.

Aplicando os conceitos das habilidades dos negociadores


Os negociadores devem aprimorar suas habilidades de estudar e antever o ambiente de
negociação, bem como controlar seu comportamento e emoções, com o objetivo de
alcançar o melhor acordo possível.
Knust et al. (2012) apresentam um modelo chamado Janela de Johari – acrônimo de seus
criadores Joseph Luft e Harrington Ingham –, que pode ser útil nesse sentido, conforme
mostra a figura a seguir:

Fonte: Knust et al. (2012).


Nessa matriz são combinados aspectos conhecidos e desconhecidos do eu e dos outros. Ali
são destacadas quatro áreas que favorecem e dificultam o fluxo de informações:
 área pública: relação de confiança (informação aberta);
 área cega: os outros não fornecem informações para mim;
 área de fachada: área oculta da qual eu não forneço informações para os outros;
 área desconhecida: nem eu tenho a informação nem os outros a têm.
Nas relações recém-iniciadas, quando dois negociadores mantêm o primeiro contato, as
áreas cegas e de fachada são relativamente grandes, o que leva as partes a fazerem
suposições ou inferências. É preciso ter cuidado, pois as inferências podem distorcer os
fatos e influir negativamente nos juízos de valor e, por conseguinte, nas decisões.
A área cega diminui com o aumento do feedback, e a área fechada diminui com o aumento
da comunicação, por meio de revelações mútuas.
Para que a área pública seja ampliada, há que se construir confiança. Assim, à medida que
as partes ampliam a comunicação e favorecem o feedback, a área pública é aumentada.
Ela é fundamental para a condução de negociações positivas, nas quais o posicionamento
estratégico de integração é requerido.
De acordo com Knust et al. (2012), a capacidade de estimular o outro a sentir que há uma
sintonia entre ambos é chamada de rapport.
Ao espelhar a comunicação verbal e não verbal, assemelhando sua postura, velocidade dos
gestos, tom, volume e velocidade da voz, quantidade de contato visual, o negociador
aumenta as chances de se estabelecer o rapport. Ele ajusta a sintonia emocional,
harmoniza, facilita o diálogo, a cooperação e aproxima as partes.
Outra habilidade que deve ser desenvolvida é a empatia – a capacidade de perceber o
sentimento e a disposição emocional do outro –, que evidencia a tendência de se sentirem
como se estivessem
no lugar da outra parte. Essa é uma característica importante quando o produto da
negociação depende tanto do nível de entendimento mútuo quanto da eficiência do
processo cooperativo.
Exemplo 1 – Mariana Tuti foi contratada como representante comercial de uma indústria
de produtos de limpeza e precisava mostrar serviço logo de início. Em sua região de
atuação, havia um hipermercado que não comprava os produtos de sua empresa, e ela
decidiu visitá-los.
Seus colegas e seu superior imediato disseram a Marina que não valia a pena a
abordagem. O comprador daquele tipo de produto era intransigente e avesso a mudanças,
razão pela qual comprava sempre os produtos da mesma marca (concorrente).
Mariana estava no quadrante “área cega”, mas decidiu tentar.
Após algumas tentativas, em seu primeiro contato com o comprador, ela buscou
o rapport e a empatia. Procurou não falar muito de seus produtos, mas entender mais
sobre a outra parte. Buscou conhecer o ambiente, o tipo de sala, se comunicar em tom de
voz semelhante e se colocar à disposição para solucionar algum eventual problema que o
comprador pudesse ter em relação àquela linha de produtos.
Passados dois meses, para surpresa de Mariana Tuti, esse comprador a procurou
informando que ele tinha constantes problemas de entrega com um tipo de produto e que
gostaria de comprar uma pequena parcela desses produtos da sua empresa para teste.
Assim começou a parceria que já dura 15 anos e que equivale ao faturamento de 25% da
organização em que Mariana atua: com empatia e rapport.
Exemplo 2 – Marcelo Arão é dono de uma startup que criou um app que ele considera
revolucionário. No entanto, para conseguir desenvolver e decolar com o negócio, ele
precisa de investimento. Um de seus contatos lhe falou sobre um investidor que poderia
ajudar, mas que era muito ocupado e tinha um estilo mais conservador.
A partir dessas informações, Marcelo preparou uma apresentação muito rápida e prática
de seu produto e até comprou uma camisa – o que não fazia há anos!
No dia da apresentação/negociação, tudo correu muito bem. Em poucos minutos, ele pôde
mostrar os benefícios de seu produto e o retorno que o investidor poderia ter,
conseguindo o aporte inicial.
Ele considera que as informações prévias foram essenciais para o sucesso, porque sua
roupa estava adequada para o evento e a rapidez da apresentação permitiu que o
investidor fizesse muitas perguntas pertinentes, que foram respondidas com atenção e
sinceridade.

Conclusão
Demétrio, que trabalha na empresa Integra, implementa o sistema ERP de mesmo nome e
começará um projeto desde seu início na prestadora de serviços de embalagens All Pack.
Nesse projeto, ele precisa entender as necessidades das pessoas das diferentes áreas,
negociar a formação da equipe e o tempo de dedicação necessário. Para alcançar um bom
resultado, ele terá de usar suas habilidades de negociador.
Como ele é experiente na gestão de projetos, especialmente os de implementação de ERP,
Demétrio procurou não ouvir muito a opinião de outras pessoas sobre os gestores e as
pessoas que fariam parte das equipes.
Ele agendou reuniões com os membros dos diferentes departamentos e procurou
entender suas necessidades e aflições em relação ao novo sistema. Assim, reduziu a
possibilidade de criar estereótipos antecipados e preconceituosos sobre as outras partes.
Durante as reuniões, procurou usar o tom de voz dos participantes e até empregou alguns
jargões inerentes às áreas. Dessa maneira, proporcionou empatia e tornou o início do
projeto menos complicado.
Os gestores ficaram satisfeitos com as explicações de Demétrio, mas gostaram,
principalmente, de ele ter anotado todas as necessidades e dificuldades enfrentadas
atualmente. Os gestores cederam seus subordinados e foram generosos com o tempo
durante o qual eles poderão se dedicar ao projeto.
Um bom exemplo de habilidade de negociação.
______
� Reflita
Nesta aula, conhecemos algumas habilidades que são necessárias para que os
negociadores consigam bons acordos.
Lembre-se de que as habilidades podem e devem ser desenvolvidas, não fazendo parte da
genética das pessoas, que as tem ou não!
Aula 2 - Unidade 2
Ética nas negociações

Introdução da aula
Qual é o foco da aula?
Nesta aula, conheceremos mais sobre ética, valores e princípios, estudos que irão auxiliá-lo
nas decisões que devem ser tomadas.
Este conteúdo é muito importante e atual, porque está na pauta de assuntos relacionados
aos negócios e aos relacionamentos sociais e pessoais. É claro que focaremos no mundo
organizacional e empresarial, mas cabe uma reflexão sobre nossas atitudes e
comportamentos em busca de um país melhor.
Bons estudos!
______
Objetivos gerais de aprendizagem
Ao longo desta aula, você irá:
 compreender os conceitos de ética, moral, capital social e valores;
 analisar o método da negociação baseada em princípios;
 debater a importância da ética nas negociações;
______
Situação-problema
Vamos continuar acompanhando a jornada do nosso personagem Demétrio? Ele é gerente
de projetos na empresa Integra, que implementa atualmente o sistema ERP Integra.
Desta vez, ele se deparou com um problema de ética e precisou contar o que viu aos
gestores da empresa All Pack. Vamos contar a história do começo...
A empresa All Pack sempre trabalhou com planilhas eletrônicas que não “conversavam”
entre si. Ou seja, cada departamento tinha suas próprias informações, que eram levadas à
diretoria. Acontece que, durante o processo de implantação do sistema ERP, Demétrio
descobriu que algumas informações eram deliberadamente alteradas visando mostrar um
resultado melhor do que o real.
A acuracidade dos estoques, apresentada nas reuniões mensais, também era falsa. Isso
poderia, inclusive, causar problemas entre a empresa e a Receita Federal.
Demétrio contou o que encontrou aos gestores da empresa, pois tratava-se da sua visão
pessoal sobre ética, bem como a reputação de empresa onde atua, a Integra, e da
organização que contratou seus serviços, a All Pack.
Após ter conhecimento sobre os fatos, o que você faria? Quais seriam suas ações
imediatas e quais seriam suas ações para evitar que tais fatos acontecessem novamente?
Preparado? Vamos lá?

Preocupações éticas
Em seu livro “Incansáveis”, Mauricio Benvenutti (2016) afirma que estamos vivendo um
momento de mudanças profundas, passando de um comportamento e atitudes de
ganância para o de generosidade e de competição para o de cooperação.
No final da década de 1970 e início dos anos 1980, havia um comercial de televisão que
dizia que o brasileiro “gosta de levar vantagem em tudo”. E essa era realmente a postura
de muitos brasileiros, desde a simulação para conseguir um pênalti inexistente no futebol,
até esconder informações sobre defeitos em um automóvel ou casa à venda.
O comportamento dos executivos das empresas não era diferente. As negociações eram
uma relação de ganha/perde e, se fosse possível ganhar enquanto o outro perdesse muito,
melhor ainda.
______
� Pesquise mais
Quer saber mais sobre o assunto? Acesse este link e ouça a reportagem da rádio CBN
sobre pesquisa realizada pela Instituto Datafolha, que mostra que 90% dos jovens
brasileiros acham a sociedade brasileira pouco ou nada ética.
______
Com o passar do tempo, as novas gerações assumem uma postura diferente do passado. A
preocupação com a sustentabilidade (economia dos recursos naturais) e a possibilidade de
emitir a opinião – seja porque muitos países se tornaram mais democráticos, seja porque
as tecnologias de comunicação, principalmente a Internet, possibilitam que tais opiniões,
apelos, reclamações ganhem audiência e força –, têm mudado comportamentos, éticas e
valores.
Políticos e dirigentes no mundo todo são descobertos em suas falcatruas, julgados e
punidos. No Brasil, a Lava-Jato ganhou uma força nunca antes alcançada, prendendo,
inclusive, senadores e políticos influentes. A Federação Internacional de Futebol e
entidades olímpicas denunciam subornos e corrupção em todo o mundo, destituindo e
prendendo figuras importantes no cenário mundial.
______
� Reflita
Você ou algum amigo seu já comprou um CD ou DVD pirata, mesmo sabendo que era
antiético? Muitas pessoas investiram tempo e dinheiro criando o material original e
alguém copiou para vender por um preço muito menor, correto?
_____
Há uma nova ética emergindo, que torna o acesso aos produtos e serviços mais importante
do que sua posse ou seu poder. O controle, exercido pelo Estado ou chefes hierárquicos
nas organizações, passa a ser menos importante, e a participação do povo e colaboradores
nas empresas ganha espaço.
Mas o que é mesmo ética?
______
� Assimile
De acordo com o dicionário Aurélio, ética é o estudo dos juízos de apreciação que se
referem à conduta humana suscetível de qualificação do ponto de vista do bem e do mal,
seja relativamente a determinada sociedade, seja de modo absoluto.
______
Para Knust et al. (2012), por definição, ética é um sistema de comportamentos em que as
pessoas devem tratar as outras com justiça, agindo de uma forma que as pessoas
considerem justas.
O problema da ética é que as pessoas se tornam emotivas quando acham que os outros
estão sendo injustos. Alguns estudiosos afirmam que a ética influencia e é influenciada
por: moral, capital social e valores.
Por isso, a seguir, vamos conhecer um pouco mais sobre cada um desses termos.

Moral, capital social e valores


Segundo o dicionário Aurélio, moral é o conjunto de regras de conduta consideradas
válidas, quer de modo absoluto para qualquer tempo e lugar, quer para grupo ou pessoa
determinada.
De acordo com Fukuyama (2000), já se tornou comum referir-se à ética e à moral
indiscriminadamente. No entanto, as pessoas preferem o termo ética, porque representa
melhor os valores universais e reduz a conotação religiosa. Assim, costuma-se falar sobre
ética empresarial ou organizacional, ética na política, ética no trabalho, sociedade etc.,
referindo-se ao comportamento esperado das pessoas e instituições com base em valores
universais.
______
� Pesquise mais
As tecnologias de comunicação, principalmente a Internet e as redes sociais, possibilitam
que as pessoas tenham muito mais acesso às informações do que em um passado recente.
No entanto, essa democratização da informação também traz malefícios, como as fake
news (notícias falsas).
Essas notícias são divulgadas – por maldade ou não –, sem nenhum critério ou pesquisa
sobre a veracidade. Elas são “consumidas” e divulgadas por pessoas que acreditam ou
querem acreditar que são verdadeiras, porque lhes interessa.
______
Os seres humanos são, por natureza, criaturas sociais. Seus impulsos e instintos mais
básicos os levam a criar regras morais que os unem em comunidades.
Por sua vez, o capital social pode ser definido como um conjunto de valores ou normas
informais, comuns aos membros de um grupo, que permitem a cooperação entre eles. Se
os membros do grupo passarem a esperar que os outros vão se comportar de forma
confiável e honesta, eles vão confiar uns nos outros.
A confiança é como um lubrificante que torna mais eficiente o funcionamento de qualquer
grupo organização.
______
� Exemplificando
A máfia caracteriza-se por um código interno de comportamento extremamente forte, e os
mafiosos se consideram “homens de honra”, como ocorre com traficantes. No entanto,
essas normas não se aplicam fora de um pequeno círculo de mafiosos.
______
Em contraste, as normas que produzem capital social precisam incluir virtudes como
honestidade, cumprimento das obrigações e reciprocidade. As diferenças reais entre elas
dizem respeito àquilo que pode ser chamado de “raio de confiança”. Ou seja, as normas
cooperativas como honestidade e reciprocidade podem ser comuns a um número limitado
de pessoas e não serem a outras na mesma sociedade.
Todas as sociedades possuem algum capital social. As famílias são fontes importantes de
capital social em toda parte.
Fukuyama (2000) afirma que a força dos laços familiares difere de uma sociedade para
outra e também varia em relação a outros tipos de obrigações sociais. Em alguns casos,
parece haver uma espécie de relação inversa entre os laços de confiança e reciprocidade
dentro e fora da família: quando um é muito fraco o outro lado tende a ser fraco.
Na China e na América Latina, as famílias são fortes e coesas, mas dificilmente confiam em
estranhos, e os níveis de honestidade e cooperação na vida pública são muito mais baixos.
Entre as consequências estão o nepotismo e a corrupção pública generalizada.
Ainda segundo o autor, o que tornou a Reforma Protestante importante não foi tanto o
fato de encorajar a honestidade, a reciprocidade e frugalidade entre os indivíduos, mas sim
o fato de essas virtudes serem, pela primeira vez, praticadas amplamente fora da família.
De acordo com o autor, é perfeitamente possível formar grupos bem-sucedidos na
ausência de capital social, usando-se uma variedade de mecanismos de coordenação
formal como contratos, hierarquias, constituições, sistemas legais etc. Mas as normas
informais reduzem grandemente o que os economistas chamam de custos de transação –
os custos de monitorar, contratar, julgar e forçar o cumprimento dos acordos formais.
O capital social tem benefícios que vão além da esfera econômica: ele é importante para a
criação de uma sociedade civil saudável e para o domínio dos grupos e associações que
estão entre a família e o Estado.
Por fim, o estudo dos valores humanos tem interessado as mais diversas áreas do
conhecimento. Na Antropologia, os valores são fundamentais na compreensão da cultura.
Na Sociologia, os valores que fundamentam a sociedade e justificam as suas ações é tema
recorrente.
Os mais diversos estudiosos sobre o tema veem os valores como os critérios utilizados
pelas pessoas para avaliar ações, indivíduos e eventos.
De acordo com Schwartz (1992), os valores podem ser caracterizados da seguinte forma:
 são crenças associadas ao afeto – quando os valores são ativados, eles se tornam
inerentes aos sentimentos positivos e negativos. Para pessoas independentes, o
valor “independência” aflora quando ele é ameaçado;
 se referem a objetivos desejados e motivam ações – pessoas que valorizam ordem
social, justiça e benevolência são motivadas a buscarem esses objetivos;
 transcendem ações e situações específicas – pessoas que valorizam obediência e
honestidade, por exemplo, usarão esses valores como base para suas ações e
atitudes no trabalho, na escola, nos negócios, na política, com a família, amigos e
mesmo com pessoas desconhecidas;
 servem como padrões ou critérios – eles guiam, selecionam e avaliam as ações das
pessoas. As pessoas decidem o que é bom ou mau, justo e legítimo com base em
seus valores, sem mesmo se darem conta disso, porque esses valores estão no
subconsciente.
 são priorizados por ordem de importância – os valores das pessoas formam um
sistema de prioridades. Há pessoas que têm como valores prioritários status e
poder; outras, tradição e conformidade, e suas ações e atitudes se basearão,
primeiramente, nesses valores, depois nos demais.
A ética nas negociações
Na perspectiva de Knust et al. (2012), a maioria dos gerentes experientes valoriza mais o
comportamento ético, a integridade e as expectativas compartilhadas nas relações de
longo prazo do que contratos altamente elaborados.
O comportamento ético nas organizações é um tema carregado de emoções. A percepção
de falta de ética mexe e causa indignação.
De acordo com Tamayo e Porto (2005), ao se considerar a origem dos valores
organizacionais, pode-se supor que a sua estrutura seja semelhante à dos valores pessoais,
porque ambos os valores são introduzidos por pessoas: o fundador ou dono da empresa,
membros influentes ou o grupo dos trabalhadores, por exemplo. Essas pessoas possuem
um sistema de valores pessoais que expressam as suas metas e definem o que é bom para
si, para os outros grupos e para a sociedade.
Portanto, é lógico pensar que, quando os indivíduos tentam estabelecer o que é bom para
a organização, utilizem os mesmos princípios e as mesmas metas que orientam os valores
das organizações e das pessoas.
Os valores da organização devem ser comunicados e conhecidos por clientes, fornecedores
e colaboradores, visando aproximar ou afugentar quem pretende, de alguma maneira,
fazer negócios com a tal organização. Esses valores devem ser praticados a partir das
pessoas de maior poder na empresa, para que os demais colaboradores entendam,
incorporem e também pratiquem tais valores.
De acordo com Burbridge e Burbridge (2012), esses valores, essas condutas, esses
comportamentos e essas atitudes formam a ética da empresa. No entanto, não é tão
simples a avaliação do ponto de vista ético. Segundo os autores, a própria ética se divide
em:
 ética de convicção, baseadas em valores e
 ética de responsabilidade, baseada em análise de risco e no atingir determinados
objetivos.
Para quem segue a ética de convicção, são seus valores e princípios que determinam a
atitude a tomar. No entanto, como estes nem sempre são universais, isso poderá ser
interpretado de maneiras diferentes, de acordo com os valores de cada um. Quem segue a
ética de reponsabilidade abre um leque de opções, uma vez que cada decisão depende da
avaliação do melhor resultado possível a se obter.
A ética de responsabilidade costuma ser adotada por muitos políticos e muitos
profissionais na área empresarial. Leva-se a decisão a ser tomada, após análise de qual
alternativa trará os melhores resultados para a maioria dos atingidos ou para a pessoa ou
grupo que tem esse poder de decidir.
Já para Knust et al. (2012), o comportamento ético se destaca em duas dimensões:
 o que é intrinsicamente certo ou errado – como a mentira, a chantagem e uso da
coerção; e
 a instrumental, de uso de diferentes táticas ou não durante o processo – como usar
informações exclusivas do outro em seu próprio benefício.
Diferentes visões sobre a conduta ética nas negociações
Muitas questões éticas nas negociações são sobre revelar a verdade, o grau de
honestidade, sinceridade e abertura que o negociador deve ter. A atenção é mais voltada
ao que os negociadores dizem (e como dizem) do que ao que fazem, embora algumas
vezes os negociadores possam agir de forma antiética.
Para Knust et al. (2012), alguns executivos se acham compelidos a praticar alguma forma
de embuste em seus procedimentos com clientes, fornecedores, sindicatos, funcionários
do governo ou até mesmo com seus pares. Eles realizam isso por meio de declarações
incorretas, encobrimento de fatos pertinentes ou exagero, com o objetivo de persuadir os
outros a concordar com eles.
O negociador pode querer maximizar seus interesses escondendo preferências e
mostrando o mínimo de suas posições, manipulando dados e informações. Por isso, nem
sempre são sinceros.
É importante ressaltar que o negociador está sujeito a permanente observação. Nos
primeiros contatos, o que promove uma aceitação maior é o currículo, a experiência e as
referências. Durante a execução da negociação e nas diversas rodadas em que se
defrontam, os negociadores são medidos pela consistência e coerência de seus
argumentos. Depois do acordo selado, também se espera que os compromissos
combinados sejam cumpridos sem desgastes decorrentes de interpretações equivocadas
ou pressões externas, o que fortalece a credibilidade e boa reputação.
Ainda de acordo com Knust et al. (2012), a confiança se desenvolve lentamente ao longo
do tempo e se caracteriza como um compromisso emocional, baseado no respeito mútuo
e no comportamento ético.
No entanto, a confiança acaba quando o outro se sente enganado ou percebe que fatos
foram deliberadamente manipulados, fraudados, ocultos ou que se utilizaram mentiras,
blefes ou promessa que não poderão se cumprir.
Em médio e longo prazos, os manipuladores e os manipulados conscientes tendem a
comprometer sua integridade e boa reputação. Por isso, é importante que qualquer
negociador considere que a manipulação tem efeitos devastadores, podendo desgastar as
relações entre os indivíduos, grupos e organizações.
______
� Exemplificando
A indústria de brinquedos Brincar é Bom terceirizou as atividades de embalagens de seus
produtos. O contrato com a empresa ganhadora da concorrência, a empresa Embala Tudo,
era de cinco anos, e as duas partes ficaram satisfeitas com o acordo.
Os problemas começaram quando a empresa contratada percebeu que os volumes
prometidos de produção mensal não eram cumpridos sistematicamente, causando
prejuízos nas receitas e nos retornos sobre os investimentos.
O pessoal da empresa Embala Tudo procurou por diversas vezes os responsáveis pelo
acordo da contratante, que se negavam a atendê-los. Com o passar do tempo, eles
perceberam que os volumes informados e combinados de produção nunca tinham
acontecido anteriormente e haviam sidos manipulados em uma planilha eletrônica.
O contrato foi desfeito após muita briga, contando inclusive com a presença de advogados.
A reputação da empresa contratante ficou marcada para próximos negócios.
Aplicabilidade da ética nas negociações empresariais
Knust et al. (2012) afirmam que a integridade é um atributo do negociador que tem
caráter e é honesto com seus valores e princípios. Seus atos e comportamentos são
capazes de projetar a ideia de que cumpre seus acordos, é coerente e valoriza suas
credenciais. Nesse sentido, a integridade diz respeito à capacidade de ganhar a confiança
da outra parte.
Segundo os autores, há uma tendência entre especialistas de que o modelo de
Harvard deve ser importante nos ambientes de negociação.
Esse modelo compreende que as negociações sejam baseadas em princípios e favoreçam
um maior equilíbrio entre as partes negociadoras, especialmente em contextos de boa-fé.
Assim, outros fundamentos devem ser considerados, a saber:
 pessoas – separar o problema das pessoas;
 interesses – concentrar-se nos interesses;
 opções – inventar opções de ganhos mútuos;
 critérios – utilizar critérios objetivos.
Os negociadores que utilizam essa abordagem devem se preparar para discutir e negociar
os princípios antes da discussão do objeto de negociação. Sete elementos do modelo
devem compor o planejamento dessa negociação: relacionamento, comunicação,
compromisso, alternativas e Macna, interesses e legitimidade, pela ótica de cada parte.
______
� Assimile
Macna: para desenvolver alternativas aos impasses ou defender posições dentro dos
limites aceitáveis para um acordo (máximo ou mínimo), é preciso pensar em formas de
proteção.
Como planejar, a fim de evitar pagar mais por aquilo que se deseja, ou receber menos pelo
que está oferecendo à outra parte, se comparado com outras alternativas? O negociador
precisa pensar em um “plano B”.
______
Cabe ressaltar que, entre as críticas que se fazem ao método da negociação baseada em
princípios está a fragilidade com que trata o processo quando o negociador é altruísta, que
deseja e pratica a cooperação e interage com outros que não levam em conta princípios.
O primeiro estaria imbuído de comportamentos ingênuos frente a interlocutores
predadores, podendo ser facilmente manipulado pela dissimulação de intenções positivas.
______
� Pesquise mais
Esperamos que tenha gostado do tema e ficado curioso para obter mais informações! Se
quiser saber mais, acesse este link e assista à opinião de Leandro Karnal, um professor e
historiador brasileiro sobre as questões éticas. Vale a pena!

Conclusão
Voltemos agora ao nosso desafio. Vamos recordá-lo?
O gerente de projetos Demétrio precisou comunicar aos gestores da empresa All Pack que
alguns colaboradores da empresa deliberadamente alteravam informações, com o objetivo
de tornar os resultados melhores do que aconteciam na realidade.
Após ter conhecimento sobre os fatos, o que você faria? Quais seriam suas ações
imediatas e quais seriam suas ações para evitar que tais fatos acontecessem novamente?
Para revolver essas questões, é preciso realizar as seguintes ações:
 Desligar (despedir) os colaboradores que trabalhavam “maquiando” os números,
para que os resultados parecessem melhores do que a realidade. Essa ação é
necessária porque os profissionais são antiéticos e podem cometer outros
deslizes/falcatruas em diversas situações. Também é necessário realizar isso,
porque tais atitudes não estão alinhadas com os valores e princípios da empresa.
 Deixar bem claro aos colaboradores internos, fornecedores e clientes quais são os
valores da empresa. Dessa maneira, ninguém pode dizer que não conhecia os
valores e princípios que regem a organização, e que atuaram por ignorância.
 Implementar o sistema integrado, que evita que os dados sejam imputados e
alterados com facilidade. Em um sistema integrado (ERP), as informações inseridas
ou alteradas no sistema são visualizadas por diversas áreas e ficam registradas, ou
seja, é mais difícil manipular dados.
______
� Reflita
E assim terminamos mais uma aula! Esperamos que você tenha gostado do tema e que
também tenha entendido que valores, princípios e ética são os “ativos” mais importantes
que temos no mundo dos negócios. Eles podem abrir ou fechar portas permanentemente.
Lembre-se: pessoas com boa reputação sempre serão pelo menos ouvidas, porque
merecem ser ouvidas. Pessoas de má reputação não conseguem acesso a outras pessoas
de boa reputação. Só conseguem aproximação de outras pessoas de má reputação,
iniciando um ciclo vicioso difícil de ser “quebrado”.

Aula 3 - Unidade 2
Planejando a negociação

Introdução da aula
Qual é o foco da aula?
Nesta aula, iremos conhecer um pouco mais sobre essa etapa tão importante no
processo de negociação, que é o planejamento.
Como já mencionado anteriormente, quanto mais tempo puder ser dedicado às
atividades relacionadas a preparação e planejamento, maiores serão as
possibilidades de sucesso da negociação.
______
Objetivos gerais de aprendizagem
Ao longo desta aula, você irá:
 empregar a ferramenta de planejamento Ciclo PDCA;
 compreender diferentes visões sobre planejamento de negociações;
 identificar os itens fundamentais no planejamento de uma negociação.
______
Situação-problema
Você já está familiarizado com o nosso personagem Demétrio, mas não custa nada
relembrarmos alguns detalhes, não é mesmo?
Demétrio é responsável pela implantação de um sistema ERP na empresa All Pack,
um projeto no qual ele precisa entender as necessidades das pessoas das diferentes
áreas, negociando a formação da equipe que irá atuar e o tempo de dedicação.
Para alcançar um bom resultado, ele terá de usar suas habilidades de negociador.
Demétrio está acostumado a trabalhar em ambientes complexos e caóticos e, por
isso mesmo, sabe que é necessário planejar a negociação. Além disso, ele entende
que precisa ter diferentes abordagens e pontos de vista sobre o planejamento.
De acordo com o presidente e fundador da empresa All Pack, o pessoal da logística
e operação é muito solícito, porém estão sempre “apagando incêndio”. Já a equipe
do comercial é divertida, embora desorganizada. E os colaboradores da
contabilidade fiscal são metódicos e organizados, mas contra a implantação do
sistema.
Pronto, esse é o contexto em que nosso gerente de projetos terá de planejar suas
negociações, além de negociar com seus pares em sua própria empresa.
Por onde você acredita que ele deve começar? Quais etapas ele deve seguir
durante o planejamento? Quais informações são relevantes para que as
negociações e objetivos do projeto sejam alcançados?
Preparado para o desafio? Não se preocupe. Após ler e discutir o conteúdo desta
aula você estará pronto para planejar um processo de negociação e, melhor ainda,
obter sucesso em suas negociações.

A importância de planejar uma negociação


Primeiramente, vamos ver o que o dicionário nos diz sobre planejamento?
De acordo com o dicionário Aurélio, planejamento significa o ato ou efeito de
planejar, criar um plano para otimizar o alcance de um determinado objetivo. Essa
palavra pode abranger diferentes áreas de nossa vida profissional e pessoal.
Por exemplo, se pretendemos viajar para outro país por turismo, devemos planejar
nossas férias, a agência de viagem que vai nos auxiliar, o roteiro que pretendemos
seguir, os valores que iremos gastar na viagem etc.
Na vida profissional, o planejamento está relacionado com a preparação,
organização e estruturação de um determinado objetivo. Se você é gestor de uma
empresa e pretende reduzir os custos operacionais em 25% nos próximos 12 meses,
por exemplo, precisa planejar e estruturar quais ações serão necessárias para se
atingir tal objetivo.
Uma ferramenta muito utilizada no planejamento e acompanhamento das ações
que visam atingir um objetivo específico é o Ciclo PDCA, apresentado a seguir.

Fonte: Falconi (2012).


O Ciclo PDCA é iniciado com o planejamento das atividades/ações (plan), definindo
metas, após se ter conhecimento sobre o problema e suas principais causas. Em
seguida, tem-se a fase de execução (do), ou seja, coloca-se em prática o que foi
planejado. No momento seguinte, você irá analisar os resultados da execução
(check) para tornar padrões e rotineiros os bons resultados. Ou seja, vai repetir o
que deu certo e entender os maus resultados, considerando como um aprendizado
(act).
Como mostra a imagem, esse ciclo não tem fim e pode servir para tanto para
processos de produção, inovação, administrativos e de negociação das empresas,
como para o nosso dia a dia – no planejamento de uma dieta de emagrecimento ou
de um plano de estudos, por exemplo.
______
Atenção
Nesta aula, iremos nos deter um pouco mais na fase de planejamento e
programação, ok? Mas, antes, vamos retomar alguns assuntos que já tratamos
anteriormente.
______
Quando a negociação é necessária?
As pessoas discutem negócios diariamente e chegam a acordos sem negociar. Ou
seja, há uma discussão ou uma reunião em que as pessoas chegam a um acordo
sem que qualquer uma das partes tenha precisado se mover. Elas chegaram a um
acordo igualmente satisfatório e não negociaram.
A negociação ocorre quando uma ou mais partes têm pontos de vista ou objetivos
diferentes sobre relacionamentos de questões políticas, comerciais ou pessoais, por
exemplo. Em decorrência dessas diferenças, há um movimento para buscar acordos,
e sem esse movimento de pelo menos uma das partes, não há negociação.
Por que estamos falando disso neste momento, ou seja, nesse momento da
disciplina?
Porque o planejamento da negociação deve ter como objetivo induzir a outra parte
(ou partes) a se deslocarem de suas posições iniciais e se direcionarem à nossa.
Nessa fase, deve-se pensar, inclusive, o que pode acontecer se existe a
possibilidade de um acordo proveitoso, proveniente do processo, o quanto você
está disposto a ceder e o quanto você precisa que a outra parte ceda. Cada
indivíduo tende a reconhecer que suas prioridades podem ser muito diferentes
daquelas da outra parte.
Como já mencionado anteriormente, quanto melhor for o planejamento da
negociação, maiores serão as chances de êxito.
De acordo com Steele, Murphy e Russil (1991), há pesquisas nas quais se mostra
que o fator-chave que distingue os negociadores habilidosos dos apáticos consiste
no modo pelo qual eles planejaram suas negociações.
Para os autores, na primeira fase do processo de negociação é preciso distinguir os
termos preparação e planejamento.
A preparação está relacionada à pesquisa de problemas a serem negociados e
pode incluir:
 verificar a situação atual do mercado, por meio da pesquisa de relatórios,
interação com especialistas internos e externos à empresa;
 compreender de forma precisa quais são suas próprias exigências e de sua
empresa ou da parte que está representando;
 examinar a outra parte, que pode ser um fornecedor ou cliente, com o
objetivo de descobrir quais são seus pontos altos e baixos, ou fortes e fracos;
 decidir quais são seus objetivos e até que ponto você está disposto a ceder.
O planejamento constitui a etapa em que você desenvolve a negociação e reflete a
forma pela qual a reunião procederá. Você deve planejar a sua estratégia, quase do
mesmo modo como um atleta planeja sua estratégia de corrida.
Nesse momento algumas questões podem ser formuladas, tais como:
 De que forma iniciarei a negociação?
 Como a outra parte reagirá?
 De que modo vou estabelecer meu programa de trabalho?
 De que maneira posso impor condições, sem esfriar os ânimos durante a
negociação?
 Se eu estiver negociando com uma equipe, que função cada membro da
equipe desempenhará?
 De que forma responderei às questões difíceis e aos problemas que,
provavelmente, a outra parte irá levantar?
______
� Reflita
Se na fase de preparação e planejamento você descobre que a outra empresa
costuma levar especialistas para a reunião de negociação, o que você faz? Estuda
ainda mais sobre o tema da negociação ou também convida especialistas para estar
de “igual para igual” com a outra parte?

As diferentes visões de planejamento de negociação


Acadêmicos e praticantes divergem sobre as etapas ou fases de um processo de
negociação, mas são quase unânimes em dizer que, quanto mais tempo o
negociador investe na fase de planejamento, maiores serão suas chances de êxito.
Para Martinelli (2002), o planejamento da negociação é uma das questões mais
importantes para uma visão sistêmica e, por isso, tem sido bastante estudado ao
longo dos anos.
Segundo o autor, Fisher e Ury lembram alguns elementos, que consideram
essenciais para o planejamento de negociações, a saber:
 separar as pessoas do problema – não envolvendo questões pessoais, que
devem ser separadas da negociação;
 concentrar-se nos interesses a serem buscados e não nas posições pessoais;
 buscar encontrar o maior número de alternativas de solução;
 encontrar critérios objetivos para a solução do problema.
Ainda segundo o autor, Acuff considera que o planejamento da negociação é
composto de quatro passos básicos. Caso não sejam executados, os negociadores
estarão impedidos de terem uma preparação fundamental, o que os levará a
abrirem mão do poder de tomar decisões com boas informações.
Esses quatro passos básicos são:
 identificar todas as questões envolvidas que possam surgir durante a
negociação – de todos os envolvidos, inclusive você;
 priorizar as questões que possam surgir;
 estabelecer o alcance do acordo – algo entre a posição ideal de negociação e
a posição de recuo;
 desenvolver estratégias e táticas que auxiliem a alcançar os objetivos e que
satisfaçam todas as partes envolvidas.
No planejamento é importante que o negociador adote uma postura de negociação
“ganha-ganha”, mantenha altas a expectativas, use linguagem compatível com a
linguagem da outra parte.
É também preciso que escute com atenção e faça quantas perguntas forem
necessárias, construa sólidas relações interpessoais e tome cuidado com concessões
desnecessárias. Ainda, que esteja alinhado com a cultura e ambiente de negociação
do país anfitrião.
Martinelli (2002) cita os seis passos básicos a serem seguidos em processo de
negociação, propostos por Matos. São eles:
 abordagem;
 argumentação;
 superação de objeções;
 acordo;
 reforço;
 reabordagem.
Segundo Martinelli (2002), Mills mostra a grande importância da fase de
planejamento, assim como da preparação para a negociação. Ele diz que um acordo
deve ser composto de sete etapas, chamadas RESPECT:
 preparar-se;
 explorar as necessidades;
 sinalizar a movimentação;
 testar com propostas;
 trocar concessões;
 fechar o acordo;
 amarrar as pontas soltas.
Ainda segundo o autor, Hodgson enfoca as restrições e influências de um processo
de negociação, destacando cinco etapas fundamentais:
 preparação;
 discussão;
 propostas;
 barganha;
 acordo.
A ideia não é detalharmos cada uma das observações dos autores, mas sim
conhecermos a importância que todos ressaltam sobre a fase de planejamento.

Variáveis de um processo de negociação


De acordo com Wanderley (1998), o resultado de uma negociação não decorre
apenas da atuação isolada dos negociadores: todos eles estão submetidos a uma
rede de tensões e influências. Os negociadores trabalham em um contexto de inter-
relacionamentos e de forças das mais variadas espécies que constituem os cenários
de uma negociação.
Segundo o autor, três cenários devem ser considerados:
1. onde ocorre a negociação;
2. aquele constituído por todos os personagens e fatores organizacionais que
de alguma forma influenciam os atores do primeiro cenário;
3. aquele constituído pelos fatores externos à organização, que podem ser de
natureza econômica, financeira, jurídica, social e ecológicas. Em caso de
negociações internacionais, a cultura do país ou região também deve ser
considerada.
Steele, Murphy e Russil (1991) citam algumas variáveis mais subjetivas que podem
influenciar um processo de negociação. Eles afirmam que, se uma negociação for
realizada muito rapidamente, pelo menos uma parte estará propensa a se sentir
insatisfeita.
Se você comprar ou vender alguma coisa e não seguir algumas das etapas de uma
negociação, você provavelmente se sentirá inseguro quanto a ter conseguido o
melhor negócio possível. Ou terá dúvidas se se participou de uma negociação real.
______
� Reflita
Suponha que você esteja procurando um carro para comprar e encontra o modelo
que deseja anunciado por R$ 25.000,00. Você examina o carro, do qual
prontamente gosta, oferece R$ 20.000,00 ao vendedor, que aceita de imediato, sem
contestar. Como você se sente diante disso?
Você naturalmente sentirá que realmente poderia ter comprado o carro por muito
menos se sua oferta inicial fosse inferior.
Suponha que o mesmo carro fosse anunciado e que você tenha feito a mesma
oferta, porém desta vez o vendedor não a aceitou. Após uma prolongada
negociação, vocês fecham um acordo ao preço de R$ 23.000,00.
Como você se sente? Nessa nova circunstância, você percebe que se esforçou em
favor de suas concessões e obteve o melhor preço do vendedor, ainda que
pagando por preço maior comparado ao primeiro exemplo.
_____
Segundo os autores, outra variável importante na negociação ocorre quando a
outra parte não pretende ceder ou negociar. Ao se deparar com uma parte que se
recusa a mudar de posição, a tendência é ceder, fazer diversas concessões, na
convicção de que, se você se mantiver em movimento, fará com que outra parte se
movimente também.
Se você não tomar cuidado, pode prosseguir na movimentação da sua posição até
que não tenha mais nada a ceder, para concretizar a negociação. Você pode estar
diante de um negociador experiente que o está manipulando, ou, simplesmente,
alguém que não quer fazer negócio com você.
Steele, Murphy e Russil (1991) recomendam que, quando fizer a primeira concessão
para a outra parte, insista em obter um retorno. Se nada acontecer, você não deve
ceder novamente. Em vez disso, tente adiar a reunião ou mesmo desistir da
negociação.

Como planejar uma negociação


A seguir apresentaremos alguns tópicos que podem ser importantes na fase de
planejamento de uma negociação.
É claro que, dependendo da negociação, alguns itens podem ser excluídos e outros
podem ser incluídos. Mas, de acordo com Steele, Murphy e Russil (1991), seguindo
essa receita há boas chances de êxito e de ocorrer um bom acordo no final da
reunião.
1. Como determinar seus objetivos – Quando se fala em objetivos há uma frase
conhecida que diz: “Se você não sabe para onde vai, você saberá se chegou?”. Isso
significa que os objetivos devem ser mensuráveis.
Se o objetivo da negociação é redução de preço, deve-se fixar um percentual de 8%
de redução, por exemplo, pois assim você sabe que precisa alcançar pelo menos os
8%. Mais que isso pode ser considerado uma excelente negociação; e, menos que
esse percentual, uma negociação ruim.
Os objetivos devem ser:
 quantificáveis;
 elevados, porém atingíveis (factíveis);
 apoiados por dados e pesquisas;
 delimitados segundo uma amplitude, ou seja, não necessariamente um valor
único, abrangendo as posições: ideal, realística e de recuo.
______
� Exemplificando
Alguns processos de terceirização de operação, transporte e TI, por exemplo,
incluem um termo SLA (Service Level Agreement) ou acordo de nível de serviço.
O supermercado Azul decidiu terceirizar sua área de TI, e os SLAs de performance
da Internet (medida em megabits) e a capacidade de armazenamento (medida em
bytes) estavam em ordem. No entanto, o tempo de resposta e conserto para um
problema, que era de 24 horas, estava atrapalhando a negociação.
Carlos Augusto, o comprador da empresa, preparou uma apresentação sobre a
dinâmica da organização para mostrar que a solução do problema deveria ser de
no máximo duas horas. O negociador da empresa de TI entendeu a situação e
fechou o negócio.
______
2. Atribuição de um custo às concessões – É preciso estar preparado para
concessões e, na fase de planejamento, é importante que você avalie quanto lhe
custarão essas concessões. Dessa forma, você irá conhecer bem o espaço
intermediário entre a posição ideal de negociação e a posição de recuo.
Além das avaliações sobre custo, é também necessário que o negociador conheça
outros parâmetros, como valores, questões legais ou emocionais, por exemplo.
______
� Exemplificando
O vendedor do sabão em pó Tudo Branco tinha um preço objetivo a negociar com
um grande varejista.
Entretanto, com a promessa de um grande lote de compra, o vendedor concedeu
um grande desconto e ficou feliz. Quando retornou à empresa e mostrou a
negociação à sua área de custo, descobriu que sua negociação tinha gerado
prejuízo.
______
3. Percepções e pressupostos referentes às forças e deficiências – Na fase de
planejamento de uma negociação, é possível descobrir quais seriam os pontos
fracos e fortes de sua empresa em relação à outra parte. Com essas evidências,
pode-se desenvolver estratégias para se buscar sucesso na negociação.
______
� Exemplificando
Uma grande indústria de Minas Gerais abriu uma licitação para que fornecedores
entregassem produtos em sua fábrica, contudo um dos requisitos era que a
empresa estivesse a 200km de distância.
Uma empresa do Paraná sabia que esse era seu ponto fraco e propôs montar um
armazém a 100m da empresa. Tal esforço e conhecimento da deficiência gerou a
possibilidade de acordo.
______
4. Planejamento de cada fase da negociação – Na fase do planejamento, é
importante pensar detalhadamente em cada etapa do processo de negociação.
Quanto mais tempo for investido no planejamento, maiores serão as possibilidades
de excelentes acordos, como mostra a figura a seguir:

Fonte: adaptado de Burbridge e Burbridge (2012).


5. Como os negociadores hábeis se preparam e planejam – Negociadores
eficientes consideram uma amplitude maior de variáveis potenciais, introduções e
conclusões do que negociadores médios. Além disso, os negociadores eficientes
consomem tempo adicional estudando áreas de interesse comum entre eles
próprios e a outra parte, sobre as quais ocorra a possibilidade de se construir
pontes, a fim de alcançar um acordo.
6. Pesquisa: fontes de informação – Negociadores eficientes buscam informações
de fontes diferentes. Há muitas possibilidades de se conseguir informações na
internet, mas também é possível buscar informações com parceiros de negócios
que já negociaram com a outra parte (colegas da própria empresa, sindicato,
associações, revistas e jornais etc.).
Quanto mais informações o negociador conseguir sobre a outra parte, mais
preparado ele estará para criar sinergia com seu interlocutor e para responder
possíveis questionamentos.
Matinelli (2002) destaca uma lista de conferência que pode ser utilizada no
planejamento ou na preparação de uma negociação empresarial. Vejamos:
Sobre a outra parte:
 o estado civil;
 o que gosta de fazer fora do trabalho;
 a jornada de trabalho;
 a personalidade (extrovertido/introvertido, meticuloso, toma decisões
rapidamente, etc.);
 o tempo que trabalha na empresa;
 a reputação como negociado etc.
Sobre cultura:
 o cumprimento dos horários;
 o ritmo das negociações;
 a importância da ética, dos valores e da reputação;
 o tamanho da equipe da outra parte;
 a necessidade de formalizar agenda e pauta.
Sobre a organização:
 os principais produtos ou serviços;
 a situação financeira (atual e passada);
 o tipo de estrutura (mais vertical ou horizontal);
 o estilo dos gestores;
 os problemas pontuais e crônicos;
 os principais concorrentes e fornecedores.
Quando já ocorreram negociações anteriores, pode-se conseguir essas informações
em banco de dados ou com os que fizeram parte da negociação. Ao tratar-se de
uma primeira negociação com a outra parte, é possível buscar informações por
outros meios (inclusive redes sociais) ou com colegas de outras empresas.
______
� Pesquise mais
Ficou curioso e quer saber mais sobre planejamento de negociações? Acesse
este link e assista a um vídeo, no qual o autor mostra de forma clara e simples a
importância do planejamento.

Conclusão
Agora vamos ajudar o Demétrio na sua tarefa de planejar o projeto e as
negociações inerentes ao projeto?
Só para você perceber o tamanho do desafio, veja o comentário do presidente da
empresa sobre algumas das áreas em questão:
“O pessoal da Logística e operação é muito solícito, porém estão sempre 'apagando
incêndio'. A equipe do comercial é divertida, embora desorganizada. Já os
colaboradores da contabilidade fiscal são metódicos e organizados, entretanto são
contra a implantação do sistema.”
Esse é o ambiente em que o planejamento da negociação deve ser realizado por
nosso gerente de projetos. Vamos ajudá-lo?
Demétrio já é experiente e segue sempre os mesmos passos para planejar a
negociações com os membros de um projeto. Vejamos:
1. Cria objetivos claros e ousados para todos os membros do grupo de trabalho
e para cada área. Por exemplo: o projeto deve ser concluído em quatro
meses. Para se alcançar esse objetivo, é preciso a dedicação de cada membro
do grupo de, pelo menos, 20 horas semanais.
2. Atribui custos às concessões. Ele sempre tem uma margem para negociar. Por
exemplo: se não puder cumprir 20 horas em uma semana, pode-se fazer
menos, contanto que o déficit seja compensado na próxima semana ou que
se trabalhe em regime de hora extra.
3. Com base no que o presidente da empresa comentou e com outras
informações conseguidas antes do início do projeto, Demétrio organizou o
grupo para que equilibrem suas forças e deficiências. Por exemplo: uma
pessoa do comercial, que é desorganizada, trabalha com funcionários da
contabilidade fiscal, que são mais metódicos. Dessa forma, a pessoa do
comercial motiva e inspira a pessoa da contabilidade a continuar com o
projeto e esta ajuda a organizar as atividades e cumprir as metas.
4. Demétrio planejou cada fase do projeto e da negociação com os membros
do grupo, de forma que todos saibam o que fazer para obter um bom
resultado final.
5. Como se trata de um projeto de quatro meses e Demétrio sabe que irá
conviver com os membros do grupo durante esse período, ele buscou
informações sobre cada um dos membros para descobrir afinidades ou
assuntos polêmicos que não devem ser tratados. Suas experiências anteriores
mostram que, a partir desse conhecimento, muitos conflitos podem ser
evitados e os resultados alcançados.
6. Desde que ficou sabendo que iria trabalhar na All Pack, Demétrio buscou
informações sobre a empresa, seus fornecedores, clientes e colaboradores
internos. Falou com colegas, com consultores e especialistas, pesquisou sobre
os donos, a origem da empresa, os prêmios conquistados, as reclamações de
clientes etc. Ele sabia que essas informações seriam preciosas ao longo de
todo o projeto.
______
� Reflita
Nesta aula, em razão de sua importância, voltamos a explorar o tema de
planejamento de negociações!
Lembre-se de que o bom negociador reconhece essa necessidade e se esmera para
cumprir essa etapa do processo de negociação da melhor maneira possível.

Aula 4 - Unidade 2
Na prática

Introdução da aula
Qual é o foco da aula?
Nesta aula, você irá aplicar os conhecimentos adquiridos nas aulas anteriores para
solucionar as situações-problema apresentadas.
______
Objetivos gerais de aprendizagem
Ao longo desta aula, você irá:
 analisar as situações-problema apresentadas;
 formular possíveis soluções levando em conta as aulas previamente
estudadas;
 comparar suas respostas com as soluções apresentadas.

Caso indústria Bom Ar


Ernesto, que é gestor de RH da indústria de ventiladores Bom Ar, tem enfrentado
problemas em conseguir que a maioria dos 452 trabalhadores da empresa aceitem
a alteração do plano de saúde. O estatuto da empresa rege que a maioria dos
colaboradores deve aceitar a mudança de plano.
Ernesto tem explicado que os benefícios são os mesmos, porém a negociação com
a nova organização trará uma grande econômica para a empresa Bom Ar.
O tempo está se esgotando e não houve acordo. O Sr. Medeiros, assistente de
Ernesto, pediu para tomar a frente da negociação, porque está na empresa há mais
de 15 anos e conhece muitos funcionários formadores de opinião.
Será que dessa vez dá certo? Será importante o conhecimento do Sr. Medeiros
sobre como os colaboradores negociam? Será que vão pressionar para buscar seus
pontos de vista ou buscarão sinergia no acordo? Conhecer suas crenças, seus
valores e suas necessidades?
Pois bem, acompanhe a resolução da situação-problema e pense se poderia haver
outras alternativas.

Caso indústria Bom Ar – Resolução


Sr. Medeiros conversou pessoalmente com alguns representantes para entender o
porquê da recusa em aceitar a proposta. A resposta que ouviu foi que o gerente
tinha um linguajar muito difícil e, pela dificuldade de entendimento, eles preferiam
não aceitar.
Perguntou então a esses trabalhadores se ele podia entender o novo plano e
explicá-lo pessoalmente. Com a resposta afirmativa, voltou ao seu chefe e pediu
que ele lhe explicasse com detalhes o novo plano.
Medeiros preparou uma nova apresentação, muito mais simples que a anterior,
destacando os pontos mais importantes, explicados com a linguagem dos
funcionários. Após a explicação de forma simples, apresentada por alguém que
parecia um legítimo representante dos trabalhadores, a maioria levantou a mão em
concordância.
A atuação do Sr. Medeiros foi importante pois, ao entender as necessidades das
outras partes e se dedicar a atendê-las, gerou empatia e tornou a negociação mais
fácil.

Caso Atacarejo
A empresa Atacarejo atua em todo o Brasil desde 1987. Nos últimos anos, vem
passando por profundas reformulações com o objetivo de se expandir para fora do
Brasil. Para atingir esse objetivo, o conselho administrativo da empresa foi renovado
com a chegada de novos conselheiros, e a diretoria foi trocada por profissionais
com currículo internacional.
Acontece que, no final do ano de 2016, um comprador quase foi despedido porque
recebeu um kit para churrasco de um fornecedor, e a diretoria teve conhecimento.
O comprador permaneceu no emprego após intervenção de seu gestor, que
explicou que aquela era uma prática na empresa e que eles não sabiam que a partir
daquele ano era considerado um ato antiético.
O problema foi contornado, mas todos ficaram receosos sobre quais
procedimentos e atitudes tomarem sobre as diferentes situações que ocorrem
rotineiramente.
O que você faria para ajudar a eliminar esse dilema ético?

Caso Atacarejo – Resolução


A nova diretoria deveria se reunir com o conselho, com o objetivo de definir quais
são os valores e princípios que regem a empresa.
Além disso, deveria apresentar esses valores e princípios aos colaboradores
internos, fornecedores e clientes. Assim todos terão conhecimento do que que é
ético ou não, de acordo com os valores apresentados.

Caso Manuel Carlos


Manuel Carlos é um vendedor experiente, mas está um pouco apreensivo sobre a
venda de dez caminhões para uma empresa de transportes, por ser um grande
negócio.
O gerente de vendas da concessionária onde trabalha o indicou para essa
negociação por conhecer suas habilidades. Mané, como é conhecido, não conhece
a empresa de transportes Entrega Rápida e precisa ser bastante convincente em sua
negociação.
Seu desafio é planejar a negociação para o experiente vendedor. O objetivo é fazer
com que ele feche o acordo.

Caso Manuel Carlos – Resolução


O melhor é que Mané se oriente por uma sequência de planejamento para que
alcance o bom resultado, por exemplo:
1. Ele deve determinar objetivos ousados, pois recebe um percentual sobre a
venda de cada caminhão. O preço do modelo pretendido pela empresa
Entrega Rápida é de R$ 110.000,00 a unidade. Mané deve colocar como
objetivo vender a esse preço, deixando para negociar o prazo de pagamento.
2. Ao longo da negociação, pode ser que o cliente queira reduzir o preço, e é
preciso que Mané saiba qual é o valor mínimo que pode ser praticado, para
não prejudicar sua empresa e sua comissão. O preço mínimo estipulado será
de R$ 105.000, sendo possível negociar o serviço pós-venda.
3. A qualidade da marca do caminhão que Mané representa é
reconhecidamente a melhor do mercado, e esse é o ponto forte para sua
negociação. Contudo, o preço é maior do que o dos concorrentes, se
tornando um ponto fraco para sua empresa.
4. É necessário que o vendedor planeje cada etapa da negociação, desde o
planejamento, passando pela execução e controle do pós-venda (prazos de
entrega, revisões etc.). É importante que cada detalhe seja detalhadamente
pensado.
5. Mané deve estar bem preparado para a negociação. Portanto, deve conhecer
muito bem a empresa Entrega Rápida: seus donos, fundadores, empregados,
fornecedores, clientes, saúde financeira e, principalmente, os negociadores da
empresa. Quanto mais afinidades ele conseguir encontrar em relação aos
negociadores, maior a empatia gerada e oportunidade de fechar o negócio.
6. Para conseguir as informações sobre a empresa e seus colaboradores, Mané
pode utilizar de diversos meios: revistas, jornais, mídia on-line, redes sociais,
bancos, colegas de trabalho, outras empresas de transporte, sindicato dos
transportes etc. Nessa hora, não se pode ter preguiça, pois quanto mais
informações, melhor.

Referências
BENVENUTTI, M. Incansáveis. 3. ed. São Paulo: Gente, 2016.
BURBRIDGE, A.; BURBRIDGE, M. Gestão de conflitos. São Paulo: Saraiva, 2012.
Falconi, V. O verdadeiro poder. Nova Lima: INDG Tecnologia e Serviços, 2012.
FUKUYAMA, F. A grande ruptura. Rio de Janeiro: Rocco, 2000.
KNUST, M. et al. Negociação e gestão de conflitos. São Paulo: FGV, 2012.
KOTLER, P.; KELLER, L. K. Administração de marketing. 12. ed. São Paulo:
Pearson/Prentice Hall, 2006.
MARTINELLI, D. P. Negociação empresarial: enfoque sistêmico e visão
estratégica. São Paulo: Manole, 2002.
SCHWARTZ, S.H. Universals in the content and structure of values: theoretical
advances and empirical tests in 20 countries. In: ZANNA, M. (ed.).
Advances in experimental social psychology. New York: Academic Press, 1992.
STEELE, P.; MURPHY, J.; RUSSIL, R. Negócio fechado! A arte da negociação. São
Paulo: McGraw-Hill, 1991.
Tamayo, A.; Porto, J. B. Valores e comportamento nas organizações. Petrópolis:
Ed. Vozes, 2005.
WANDERLEY, J. A. Negociação total. São Paulo: Gente, 1998.

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