Antonio Luigi Negro-Imperfeita Ou Refeita
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CONFRONTOS E PERSPECTIVAS
CÓNTExrO ANPUH
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Semestral.
Indexada em: Sumários Correntes Brasileirosl Ciências Sociais e Hu-
manas, Bibliographie Latino-americaine D' articles, Historical
Abstracts, America: History and Life.
Copyright by ANPUH
Correspondência ANPUH Av. Prof. Lineu Prestes, 338 - Cidade Universitária - USP -
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Conselho Editorial
Circe Maria Fernandes Bittencourt (USP) Apresentação. 7
Eliana Regina de Freitas Outra (UFMG)
Horacio Gutiérrez (CEOHAL/ USP)
Joana Maria Pedro (UFSC) "DOSSIER": HISTORIOGRAFIA
Luís Carlos Soares (UFF)
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Notas para uma Nova Historiografia. 9
Marc Jay Hoffnagel (UFPE) Adelaida Sagarra Gamazo
Marcos Antonio da Silva (USP)
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Imperfeita ou Refeita? O Debate sobre o Fazer-se da Classe Trabalhado-
Modesto Florenzano (USP) ra Inglesa. 40
Nasr Fayad Chaul (UFGO) Antonio Luigi Negro
Suely Robles Reis de Queiroz (USP)
Tânia Regina de Luca (UNESP-Assis) "Essa Não É a República dos Meus Sonhos". Obstáculos Históricos à
Vera Hercília Pacheco Borges (UNICAMP) Democracia Política e Social no Brasil. 62
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Antonio Celso Ferreira (UNESP-Assis) Notícias do Brasilianismo. Saudades da Historiografia Brasileira. 76
Antonio Fernando de Araújo Sã (UFSE)
Antonio Jorge Siqueira (UFPE)
Marcos Antônio da Silva
César Augusto Benevides (Uf'Mâ-Aquidauana) História, Narrativa e Interpretação: Aproximações ao Pensamento de
Evandro Lopes (UFRO)
Gisafran Nazareno Mota Jucá (UFCE)
Fredric Jameson. 89
Hélio Flores (UFGO) Maria Célia Marcondes de Moraes
Jaime de Almeida (UnB)
José Carlos Reis (UFOP) Com os Olhos de Clio ou a Literatura sob o Olhar da História a Partir do
José Miguel Arias Neto (UEL-PR) Conto O Alienista, de Machado de Assis. 108
Lana Lage da Gama Lima (UFF) Sandra J atahy Pesavento
Maria Amélia Alencar (PUC-GO)
Maria Bernadete Ramos Flores (UFSC) A Perspectiva Americana nas Revistas Históricas Argentinas da Segun-
Raimundo Alencar Arraes (UFRN) da Metade do Século XIX. 119
Teresinha de Jesus Mesquita Queiroz (UFPI)
Ubiratan de Araújo Castro (UFBA)
Hebe Carmen Pelosi
Bolsistas do CNPq
Gabriela Aidar ARTIGOS
Marilena Vizentin
Piedade Lusitana. Sobre a Imprensa e o Poder. 143
Esta publicação foi financiada pelo Jaelson Bitran Trindade
Antropofagia e Cultura: a Construção de uma Identidade. O mundo In-
r Programa de Apoio a Publicações Científicas" e vertido dos Escravos. 165
I
José Carlos Barreiro
MCT ~CNPq ~ FINEP ItJAPESP Vivendo a Liberdade: Fugas e Estratégias de Sobrevivência no Cotidia-
no Escravista Mineiro. 179
..)
Liana Maria Reis
'111,. ,11111111111111111111111111111111111111111111111111111111111111111111111111111111111
Ii 111 li
Memória e Identidade entre Sapateiros e Curtumeiros. 193
Teresa Maria Malatian APRESENTAÇÃO
Imagem e Pedagogia, da cruz de Cedro Renasce uma Cidade Santa ... 207
Maria Bernadete R. Flores, Élio Cantalício Serpa, José Adilson
Campigoto, Marcos A. de Souza
Três Mulheres da Elite Maranhense. 225 Este é um número duplo, que engloba o 31 e o 32. O grande afluxo
Maria de Lourdes Monaco Janotti de bons artigos recebidos somados às dificuldades financeiras por que
passa a ANPHU assim o determinaram.
No Cotidiano da Boemia. O Feminino, o Masculino e suas Relações em
A Revista traz um "dossier" sobre Historiografia e Teoria, mais
Lupicínio Rodrigues. 249 .
Maria Izilda Santos de Matos e Fernando A. Faria uma vez evidenciando a tendência recente de grande preocupação quan-
to à reflexão teórica e metodológica sobre o saber e fazer históricos.
Poder Político e Educação em Moçambique: entre a Tradição e a
Além dos artigos de autores nacionais temos um panorama da Teoria da
Modernidade. 274
História na Espanha, o problema do nacionalismo nas revistas argenti-
José de Sousa Miguel Lopes
nas do século XIX, o pessimismo da produção recente dos brasilianistas
Anos 60/70: a Violência e o Medo na Construção da Experiência do Exí- americanos quanto ao potencial da evolução democrática do Brasil - ar-
lio e da Clandestinidade. 303 tigo que mereceu uma réplica de autor paulista, além de outros tópicos
Luci Gati Pietrocolla
interessantes.
Propaganda Política e Construção da Identidade Nacional Coletiva. 328 Outros temas que despertam interesse especial podem ser encon-
Maria Helena Rolim Capelato trados em artigos sobre as estratégias da participação feminina na vida
pública no Maranhão do século XIX; a questão das lutas dos escravos,
DOCUMENTO operários e trabalhadores sem-terra procurando formular seu imaginário
A Viagem Insólita de um Cristão em Minas Gerais: um Documento e um e sua memória.
Mergulho no Imaginário Colonial. 353 A diversidade dos temas evidencia com clareza a riqueza da atual
Eduardo França Paiva pesquisa histórica brasileira, que, pela primeira vez, tem praticamente
em todos os estados programas de formação acadêmica instalados e
RESENHAS produzindo. .
LESSER, Jeffrey. O Brasil e a Questão Judaica - Imigração, Diploma- Jamais se pesquisou tanto e com tanta inovação mas, ao mesmo
cia e Preconceito. 364 tempo, nunca a investigação histórica correu tanto perigo como neste
Zilda Márcia Gricoli Iokoi momento em que as transformações do capitalismo do fim do século
BANN, Stephen. As Invenções da História. Ensaios sobre a Representa- tendem a menosprezar qualquer atividade que vise analisar a sociedade
ção do Passado. 367 e o seu passado. Cabe aos pesquisadores e professores resistir à tentação
Nelson Schapochnik do desânimo e continuar a produzir e divulgar suas descobertas lutando
GARCIA MARQUEZ, Gabriel. Do Amor e Outros Demõnios. 370 para manter a regularidade da publicação de sua revista, o principal meio
Marcos Francisco Napolitano de Eugênio de divulgação possível no momento para suas idéias.
VILLA, Marco Antônio. Canudos - O Povo da Terra. 375 Temos o prazer de agradecer a colaboração da FAPESP, do CNPq,
José Maria de Oliveira Silva dos Núcleos Regionais da ANPUH e dos Programas de Pós-Graduação
MANIQUE, Antônio Pedro e PROENÇA, Maria Cândida. Didáctica da para a publicação deste número e do próximo.
História - Patrimõnio e História Local. 377
Selva Guimarães Fonseca Conselho Editorial
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Imperfeita ou Refeita? O Debate sobre o Fazer-se da dos como pertencentes à mesma tradição marxista.' O artigo de Hobsbawm
Classe Trabalhadora Inglesa levará, portanto, a uma discussão, de um lado, do conceito de classe traba-
lhadora, de cultura operária, e do seu fazer-se, e, de outro, à discussão de
Antonio Luigi Negro* conceitos como pré-industrial e transição.
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Apesar da "continuidade surpreendente" do movimento sindical in- mado em seu conjunto, esse processo representa um momento importante
glês com seu "passado artesanal pré-industrial" (simultaneamente tempe- no fazer-se da classe operária inglesa pois sem ele
rada pela "falta de continuidade entre os movimentos operários pré e pós-
cartismo" e pelo "abismo entre as gerações do socialismo de Owen e do "é difícil entender como aquele agregado de microcosmos
renascimento socialista da década de 1880"), Thompson teria errado ao que formava o mundo do trabalho britânico, aquela coleção
"sugerir", "pois ele não vai além disso", "que as classes trabalhadoras do de pequenos mundos, com freqüência estritamente autõno-
período anterior ao cartismo, ou mesmo durante este movimento, eram a mos, pôde se transformar num fenômeno nacional"?
classe trabalhadora como ela iria se desenvolver mais tarde" (grifo do
autor), sendo muito "perigoso" projetar o proletariado, os movimentos Essa passagem, apesar de todas as distâncias tomadas, deixa claro
operários e as ideologias da era moderna de volta para as décadas pós- como Hobsbawm encara o momento da formação da classe de modo aná-
napoleônicas. logo ao de Thompson. No caso, a diferença recai - por ora - sobre o mo-
É também relativizado o fato de muitas das organizações dos traba- mento da maturidade. Assim, ele escreve em "O Fazer-se ... " que
lhadores ingleses serem antigas. Mesmo que "um eventual bocado de fol-
clore" possa ter "sobrevivido", "a verdade" - diz Hobsbawm - "é que a "a chamada classe operária 'tradicional', com seus padrões
história contínua dos movimentos operários britânicos, incluindo sua me- de vida e visões de mundo específicos, não chegou a emer-
mória histórica, só se inicia muito depois do cartismo" (grifo meu). O gir muito antes da década de J 880, e adquiriu suas feições
cartismo e o owenismo, traços "daquele período remoto", são "sem dúvi- no par de décadas seguintes" (p. 280).
da" os "ancestrais" da classe operária britânica "mais recente", mas são
"fenômenos diferentes". Nesse sentido, "a classe trabalhadora não estará "A soma de tudo isso", calcula,
'feita' até muito depois do final do livro de Thompson".
"Na verdade", segundo Hobsbawm, "a questão está mais em como "é uma percepção crescente de uma classe operária única,
o desenvolvimento e a expansão da nova economia industrial afetou a classe aglutinada através de um destino comum sem levar em con-
operária", apontando para o peso das mudanças que tornaram a classe sideração suas diferenças internas. Uma classe no sentido
operária do pós-cartismo um proletariado cada vez mais fabril ou, em ou- social e não meramente no sentido classificatário" (p. 287).
tras palavras, que a fizeram "tradicional".'
Por esse processo, a classe operária crescia em tamanho e se con- Para concluir, um mineiro é chamado à cena e sua biografia de no-
centrava em áreas densamente industrializadas, seu perfil artesanal ou de tório sindicalista inglês é descrita para sustentar sua concepção radical-
ofício dava lugar a profissões fabris (desqualificadas ou não). E os inte- mente histórica do conceito de classe. "Tudo o que desejo transmitir", sin-
resses aí envolvidos direcionavam as preocupações do Estado e dos pa- tetiza "O Fazer-se ... "
trões para a questão social. Enquanto isso, a greve se nacionalizava e con-
quistava seu lugar no cenário nacional. "é que Herbert Smith, como líder operário e sua carreira
Paralelamente, a luta pelo sufrágio universal (masculino) fez da teriam sido impensáveis em qualquer outro período anterior
política uma prerrogativa das massas, favorecendo a constituição de um da história do movimento operário - e talvez também em
partido operário. Assim, a política, e sua institucionalidade, passaram a qualquer período posterior. Ele se fer juntamente com a nova
interessar à classe trabalhadora e, aí, "o principal problema era impedir classe operária que ele ajudou a formar" (p. 295).
que a política partidária se transformasse em política de classes"; uma
equação cujo resultado foi uma nova aparição do caráter nacional da elas- • Se nos dirigirmos para outro artigo que precede a discussão presen-
se operária inglesa, perfazendo um verdadeiro salto na política, pois os te em "O Fazer-se ... ", encontraremos mais elementos para reflexão. "A
trabalhadores deveriam votar apenas em representantes de sua classe. To- Formação da Cultura da Classe Operária Britânica"? faz uma breve - e
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relevante - menção a Thompson, retoma a relação entre expansão econô- Em 1965, dois anos após a primeira edição inglesa de A Forma-
mica e classe operária e ilumina os termos com que se trava a polêmica ção ... , Thompson em um polêmico ensaio," publica com todas as letras que
sobre a periodização da história da classe trabalhadora inglesa. as classes trabalhadoras dos períodos 1790-1848 e 1870-1950 são fenô-
Ao rastear as origens do termo classes trabalhadoras e classe ope- menos diferentes. Entremeados pela derrota do cartismo em 1848 e pelas
rária, Hobsbawm localiza-as em seguida às guerras napoleônicas. Essa é "gelatinosas" décadas de 50 e 60, tais momentos se diferenciam, princi-
a época tanto dos "primeiros grandes movimentos ( ... ) adequadamente palmente, não só pela diversidade da estrutura industrial, mas também
descritos como ( ... ) operários" quanto do cartismo (1838-1848). Assim, pela inflexão nos rumos da agitação operária. Esta última jamais seria a
Thompson - "embora ( ... ) termine em 1830" - teria acertado "ao intitular mesma, deixando de recusar o capitalismo com base na evocação
seu grande livro A Formação da Classe Operária Inglesa". O grande reelaborativa do passado (a "economia moral")", deixando de vê-lo como
detalhe é, nesse instante, a explicitação do que Hobsbawm enxerga como catástrofe passageira ou regional, para lutar, para o bem ou para o mal, em
contraposição da classe trabalhadora "tradicional" (p. 254). seu interior. Não há a menor possibilidade, portanto, de se pensar a classe
Esse primeiro momento de emergência da classe operária constitui- trabalhadora (supondo ser possível aplicar-lhe este nome) do período 1790-
ria uma "aparição singularmente precoce" e não refletiria "uma sociedade I 848 como a classe trabalhadora que iria se desenvolver mais tarde.
industrializada, mas uma sociedade na primeira fase da primeira de todas Vimos que Hobsbawm opõe, face a face, cartismo e trabalhismo,
as 'revoluções industriais"'. (Não obstante, "foi essa experiência ( ... ) de associando o primeiro a uma derrota (que, a bem da verdade, aconteceu),
organização pré-industrial que forneceu grande parte da estrutura para a um ocaso, um fim de linha, e, outrossim, a associar o segundo com história
organização do novo proletariado".) Os "padrões característicos" da cul- contínua, desenvolvimento contínuo, com traços exteriores vigorosos, re-
tura da classe operária "tradicional" não podem ser localizados no período sistentes à ação do tempo e demarcadores de identidades de classe. Assim,
anterior a 1848 porque seus eixos de constituição foram (1) a definição do a classe operária só estará feita ao atingir esses padrões "característicos",
capitalismo como uma realidade duradoura e (2) o processo pelo qual, "tradicionais", isto é, a partir de 1870.
"nas palavras de Maurice Dobb, 'a classe operária começou a assumir o A "história contínua" parece, então, ser um critério decisivo para a
caráter homogêneo de um proletariado fabril'" (p. 257). história operária, pois, sem ela, a classe não estará feita. Se pudesse ser
O modo como a passagem do singularmente precoce para o carac- diferente, Thompson teria acertado. Não se pode pensar a formação da
teristicamente tradicional é vista propõe a dicotomia cartismo-derrota (avi- classe trabalhadora em 1832 pois seria necessário legar ao futuro os pa-
zinhando-se da idéia de provisoriedade, ocaso e descontinuidade) versus drões pelos quais se fez.
trabalhismo-estabilização ("história contínua"). Assim, enquanto que a Uma confirmação adicional desse raciocínio reside no modo como
"grande fermentação política de 1815-1848" e "as amplas mobilizações o passado se reflete no presente através da tradição. A argumentação é
de massa do período cartista ( ... ) desapareceram", "o desenvolvimento internamente tensa, mas, ao cabo, resta que a herança do primeiro período
contínuo do movimento operário moderno e o Partido Trabalhista somente não se faz legar pela força do costume. Algumas organizações podem ser
surgiram ( ... ) com a redescoberta do socialismo e o chamado 'novo' muito antigas mas isso não é preponderante, algum bocado de folclore,
sindicalismo da década de 1880" (p. 257). aqui e ali, pode ter também sobrevivido, mas isso também parece não pe-
sar muito. Mesmo a "tradição viva", aquela que remonta a antes de 1870,
Talvez seja possível, após a investi da da crítica, também nos vol- só o seria porque "os historiadores do trabalho desenterraram o passado
tarmos criticamente em sua direção. O fulcro das reservas de Eric mais remoto e introduziram-no no movimento, onde ele veio a tornar-se
Hobsbawm a Edward Thompson já foi exposto e, de fato, pode ser sinteti- parte da bagagem intelectual dos ativistas". Nesse sentido, o "fio da he-
zado (visto a ênfase dada à história contínua do movimento operário) no rança" do "período inicial da industrialização" terá se rompido em algum
suposto equívoco do segundo ao sugerir que a classe trabalhadora não • lugar e momento entre a derrota do cartismo, os anos 1850 e 1860 e o
tradicional teria sido a classe trabalhadora como ela iria se desenvolver esboço dos padrões ditos característicos (décadas de 1870 e 1880).'11
mais tarde. Não seria plausível, ao contrário, sugerir a possibilidade de mo-
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mentos diferentes de emergência da classe operária ao longo da história, por sua impressionante uniformidade nacional e longa duração, confor-
acompanhando a própria concepção histórica de Hobsbawm? mam o perfil (e a mais comum imagem) de um proletariado fabril "tradi-
cional".
Tão importante quanto a história contínua é o rumo tomado pela As transformações dramáticas dos anos 50 e 60 desse século, con-
Revolução Industrial e (nesse caso, não tão explicitado) o modo como a solidadas pela consolidação de novos padrões produtivos e pelo avanço da
cultura operária é conceitualmente abordada. Se o "O Fazer-se ... " alerta hegemonia neoliberal, no entanto puseram-na a pique. Fragmentada, de-
para a maneira como a expansão industrial afetou a classe trabalhadora, composta, atacada e confrontada por um complexo processo de mudanças
"A Formação da Cultura... " descreve o cartismo como um movimento pre- muitas vezes fora de seu poder, a classe trabalhadora inglesa tradicional
coce que não refletia uma sociedade industrializada, mas, tão-somente, entrou em decadência.
seu estágio inicial. Como decorrência, um movimento operário no tempo Não seria o caso - agora provavelmente mais do que nunca - de
justo seria aquele que aconteceria durante a fase verdadeiramente indus- atentarmos então, não só para as mani festações materiais, mas também
trial, distante, portanto, de seu passado artesanal (transitório e efêmero para as práticas simbólicas que as sustentam? De fato, ganharíamos muito
porque declinante). Por isso, seriam seus padrões os característicos e sua se, junto com o entendimento da cultura como um todo material, a vísse-
cultura, tradicional. mos também como um código de regras (conscientes e inconscientes) que
Quando Hobsbawm assevera que "o proletariado britânico tornou- asseguram - não sem diferenciações internas - a vida social de um grupo;
se identificável não só pelo que usava na cabeça", 11 devemos ter cuidado "um conjunto de regras de interpretação da realidade, que permitem a atri-
para não ler a cultura da classe trabalhadora mais pelos sinais exteriores huição de sentido ao mundo natural e social"." Ou, para não sairmos do
que endossa e menos pelo que a faz produzir ou portar tais sinais. Valori- debate inglês, diante, de um lado, de um "processo em que os padrões
za-se - não sem razão - um boné que dá um toque de classe a um indivíduo, industriais e tecnológicos mudam" e, de outro, de seus impactos sobre a
a demonstração explícita de um sentimento de pertencimento a uma classe manifestação da identidade da cultura operária tradicional, não é caso de
social, mas que valores e crenças professa o mesmo indivíduo? Sabemos, huscar auscultar "os valores e as crenças [que] permanecem e até se de-
em primeiro lugar, que tende a acreditar no sindicalismo e no "seu" parti- scnvolvem em virtude da continuidade de práticas culturais e formas
do, o Trabalhista (e, em menor escala, no socialismo). Ambiente físico, institucionais adaptadas às novas condições"?"
estilo de vida e lazer completam o agregado de traços exteriores, costumes Em resumo, os trabalhadores não são, como é sabido, o primeiro
e hábitos adquiridos enquanto membro desse grupo. Em segundo lugar, grupo social a expressar sua cultura através de sinais, práticas, ritos e
somos assim levados a uma cultura operária sistêmica, integrada, comple- produtos. E, como a cultura é um sistema dinâmico, aqueles mudarão sem-
xa e coerente, 12 e nisso os dois artigos citados trazem a erudição do autor pre. Desse modo, temos à disposição dois aspectos da cultura operária no
de Mundos do Trabalho, satisfazendo, em certa medida, a pergunta levan- interior do mesmo entendimento da classe trabalhadora como formação
tada uma vez que ficamos, enfim, sabendo muito do que a classe trabalha- histórica e cultural.
dora pensava ou acreditava em função do que fazia. É claro que a impressionante longevidade e unidade de uma classe
Entretanto, se enfatizarmos nossa visão da cultura como um con- G um tópico que demanda o interesse da pesquisa. Mas cabe, igualmente,
junto de práticas e produtos materiais, restringimos o espaço de atuação indagar seu fundamento não material, simbólico. Se este último pode ser
dos esquemas mentais de interpretação da realidade. Adicionalmente, a rcclaborado ou mantido silencioso numa situação onde a perda de muitas
importância que é dada à imutabilidade dessa cultura, que extrai sua resis- posições conquistadas parece ser regra longa e geral, é porque já era rele-
tente longevidade não só da coesão grupal, mas também de uma certa au- vante desde antes da classe constituir um fenômeno estável. Assim, a cul-
tonomia cultural advinda de um isolamento residencial quase absoluto," tura operária se definirá tanto pela sua manifestação material quanto pelo
termina por fechar ainda mais aquele espaço e atuação. Em outras pala- • conjunto de princípios que embasam, estruturam e conferem inteligibilidade
vras, a cultura da classe operária é representada com a eleição de um período a essa manifestação. Ir,
expressivo de sua história (1870-1950) cujos traços exteriores, garantidos Qual conclusão tiramos? Que é preciso relativizar a afirmação de
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que a classe trabalhadora existiu plenamente no período que vai de 1870 a "o livro deveria começar com os homens antes de serem.
1950, e em nenhum outro mais. Se fixamos e frisamos sua cultura através metalúrgicos e estudar como eles se tornaram metalúrgicos.
de sinais exteriores, que só puderam existir com o advento de urna certa (... ) Obviamente, é essa a estrutura inovadora e ousada de
sociedade de indústria e consumo de massa (sendo portanto historicamen- A Formação da Classe Operária Inglesa".
te determinados), se tais sinais são os critérios de análise, qualquer outra
experiência - anterior ou posterior - se chocará com o modelo. O que vem
antes ou depois estará incompleto - seja por sua precocidade ou por sua Quando lemos que "a cultura operária saiu de uma tradição cultural
desfiguração - em relação à fase eleita. A classe certa no lugar certo no mais vasta, a das classes subalternas pré-industriais" e que "operário do
momento certo só acontece urna vez. Ali onde urna certa experiência, ten- século 20 será sindicado e trabalhista, em política, como o seu avô era
samente transformada em modelo, recai. cartista", vemos o quanto é difícil conter os primeiros movimentos operá-
Um certo período, dotado de forte visibilidade, homogeneidade e ex- rios num estado de isolamento histórico quando se fala da "reconstrução
tensão, certamente induz a urna identificação entre pesquisa e pesquisador, do movimento operário a partir de 1880".1~
mas devemos ter em mente que um período de relativa estabilidade do capi- De fato, não é fácil refutar uma existência como classe para os
talismo não deve se sobrepor àquele outro onde os extraordinários eventos trabalhadores da primeira fase da Revolução Industrial, aceitando sua cul-
da primeira fase da Revolução Industrial ainda podiam ser confrontados com tura em seu próprio tempo e lugar. Se as décadas entre inícios de 1850 e
a evocação reelaborativa de urna visão de mundo tradicional. fins de I 860 representam uma "fase de transição de uma forma de cultura
Por ter sido vivenciado como era trágica, dado o ataque a um modo operária para outra", é possível supor então que o período estudado por
de vida considerado consuetudinário, Thompson pôde afirmar a maturidade Thompson teve o seu próprio perfil e, enfim, seu momento de formação?
da classe trabalhadora inglesa que, pela intensidade de sua trajetória, teria Ao que parece, a resposta seria, no frigir dos ovos, não. O ''jovem'' prole-
dividido a Inglaterra, de ponta a ponta, entre nós trabalhadores e eles proprie- tariado inglês pode ter criado "uma consciência de classe ( ... ), um movi-
tários e burgueses. Por outro lado, se só se ativesse a traços exteriores homo- mento operário de massa e uma ideologia operária antes de 1840", pode
gêneos e duradouros, A Formação... perderia a outra face do "subpolítico", ter demonstrado uma "maturidade extraordinária", mas, ao cabo, não os
as tradições da maioria de linguagem não articulada, que quase não deixa- apresentou de modo a não ser "aparente"."
ram registros mas que tomaram parte no processo do fazer-se da classe ope- A maior fraqueza da cultura e do movimento operários desse perío-
rária e de onde surgiram as minorias de linguagem articulada. 17 do residiria na fonte de seu próprio vigor: a luta contra o capitalismo nas-
Esse é um debate que encontra na polêmica entre Herbert Gutman e cente em nome de um modo de vida tradicional. Na fase pioneira, "são as
Eugene Genovese um interessantíssimo paralelo, que chama a atenção do camadas trabalhadoras em declínio que fazem a sua força e que lhe forne-
historiador, não só para o período de estabilidade do fato já consolidado, cem os seus quadros"." Elas teriam lutado em nome de uma época relati-
mas também para suas origens, sua etapa formativa. "Urna questão central vamente não muito distante; um passado que era, todavia, acenado contra
em Rol!, Jordan, Rol!: The World the Slaves Made é o efeito que os escra- um presente grávido de futuro. Uma luta de resistência que enfrentou enor-
vos imprimiram sobre seus proprietários", afirma Gutman." "Uma esplên- mes dificuldades para disputar os rumos da Revolução Industrial."
dida questão", avalia. Sua resposta, adiciona, nos leva a querer "saber Se A Formação ... foi escrito para "derrubar as muralhas chinesas
quem eram os escravos desde as origens e corno se formou e desenvolveu a que separam o século 18 do 19",23 a leitura dos artigos de Hobsbawm
relação senhor-escravo". "Suponha que alguém esteja escrevendo um li- deixa a impressão que foram repostas mais adiante, em algum instante
vro sobre os trabalhadores da indústria do ferro e do aço em Pittsburgh entre a derrota do cartismo e a "grande indústria moderna"." É como se a
chamado Roll, Monongabela, Rol!: The World the Steelworkers Made", pesquisa de Thompson tivesse se proposto a desconstruir uma muralha
propõe para depois perguntar: "Corno seria o começo de um tal livro?". preto-industrial e o debate aqui travado se deparasse com uma outra, erguida
"Se alguém estuda o mundo que os trabalhadores da indústria do aço cria- com ferro fundido. Não se trata, porém, de ver uma predominante conti-
ram", responde nuidade entre os dois períodos em questão, mas o novo marco plantado na
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11111111 IIIIIUJIIUlJUIllLU lU nlllu mlUllflltll UlIlImnulUrunnUI ••••••••
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história, tampouco, pode ser visto como a instauração de uma época indus- precoce da classe trabalhadora que muito distou de seu período de matu-
trial onde, enfim, a classe trabalhadora podia fazer-se plenamente. ridade embora tenham lutado com bravura e determinação em nome da
Assim talvez se possa entender como "O Fazer-se ... " seja, ao mes- situação imediatamente anterior ao ponto de partida de uma triunfante tran-
mo tempo, concebido como "tributo" e "crítica" a Thompson. Algo feito sição capitalista-industrial. Seu apego àquilo que, supostamente, a corren-
possível por um certo sentido teleológico da história. Ao comentar o im- te da história havia decretado ser extinto não consegue fazer chegar às
pulso, então ascendente na historiografia inglesa, de investigação do "mundo gerações futuras uma história contínua. Derrotado, o cartismo marcou o
mental do operário", Hobsbawm achou "curioso" o fenômeno do interesse fim da linha do carretel do alfaiate. As linhas ferroviárias desfiariam ago-
primordial de pesquisadores pela "pré-história da classe operária, e não o ra a história dos trabalhadores das fundições, onde o metal era transforma-
seu período de maturidade". "A obra fundamental dessa tendência" - do em trilhos. A classe não estava feita porque se aferrara ao passado, e o
explicitou - "é o livro The Making of the Englisb Working Class", Loca- futuro ainda estava por vir. As gelatinosas décadas de 1850 e 60 sepulta-
lizado entre tais pólos (pré-história e maturidade), é natural queA Forma- riam o que de velho tivesse resistido. A tradição dos pioneiros estava mor-
ção ... seja, de certo modo, "um elogio fúnebre", já que seus personagens ta, e tudo o que, daquele tempo, foi incorporado à memória histórica do
principais, trabalhadores rurais sem terra, imigrantes irlandeses, diaristas, movimento operário se deve ao trabalho de arqueologia de historiadores
aprendizes, oficiais, mestres, fazem parte de "todo um complexo de gru- que desenterraram o passado de uma certa pré-história. Thompson teria
pos a meio caminho entre a sociedade pré-industrial e o proletariado"." feito uma última homenagem, póstuma. Por isso, seu elogio seriafúnebre.
O significado desse meio caminho é o de intermédio, onde uma de-
terminada época histórica prepara (e é avaliada de acordo com) o que vem Se a derrota do cartismo leva a uma inflexão na trajetória da classe
depois. Seu caráter é, pois, "transitório" já que a primeira fase da Revolu- trabalhadora, ela faz ressaltar a importância das organizações políticas na
ção Industrial veio a "realizar a adaptação das instituições pré-industriais sua história. O fino trato da questão da consciência de classe de Eric
e serni-industriais, com a criação de uma economia verdadeiramente in- Hobsbawm mostra o apego do operariado inglês pelo Partido Trabalhista
dustrializada" para abrir as estradas por onde passará a "era do caminho e por seus sindicatos. Chega-se ao final com ar nos pulmões. A classe
de ferro"." trabalhadora, se não havia se batido pelo socialismo, lograra democratizar
Tal sentido encontra seu pano de fundo numa leitura marxista cor- a sociedade. Suas sólidas bases organizacionais traziam através da con-
rente sobre a história operária. Um modo de ler os acontecimentos cultiva- quista do Estado de bem estar social, retornos evidentes. Os trabalhadores
do, entre outros, pelo velho Engels. Ao narrar a conquista da Inglaterra do ingleses podem não ter erguido barricadas conselhistas, mas "nenhuma
primeiro mercado mundial, feito pelo qual se transformaria na "oficina do outra classe operária atingiu o grau de 'controle por parte dos trabalhado-
mundo", seu prefácio, de 1892, à edição alemã de seu livroA Situação da res' do recinto da fábrica"." E o voto trabalhista indicava claramente o
Classe Operária Inglesa associa o legado do sindicalismo de ofício (con- desejo, nada minoritário, de representação direta na institucionalidade.
temporâneo do "estado juvenil da exploração capitalista") a um velho e Jogada pelo separatismo cultural e pela segregação residencial num
desgastado sindicalismo de aristocratas do trabalho, depositando suas es- espaço isolado do resto da sociedade, a classe operária povoou-o à sua
peranças de revolucionário na "organização da grande massa de 'traba- imagem e semelhança, erguendo verdadeiras comunidades "fechadas". É
lhadores não qualificados'" e nos resultados eleitorais positivos dos can- claro que isso tanto facilitou seu hermetismo cultural aparente, manten-
didatos operários, que teriam mostrado aos trabalhadores sua capacidade do-a, por assim dizer, conservadora, isto é, resistente às investidas das
de se constituir como "força decisiva"." Essa seria uma nova fase da his- "classes altas", quanto razoavelmente imune à mudança. A história contí-
tória O "novo sindicalismo" e o ressurgimento do socialismo ganham va- nua desse período (1870-1950) é, afinal, bastante consistente. Porém, como
lor como momentos de evolução - no sentido de progresso positivo que o, adverte o próprio Hobsbawm, as classes subalternas não são, de modo
termo comporta - da história, superando velhas fases. absoluto, culturalmente autônomas. Os trabalhadores não são um grupo
Eis então uma época velha e remota onde se reuniam os ancestrais social arredio, isolado do contato e da fricção cultural com a sociedade
do movimento operário responsáveis por uma aparição singularmente envolvente. Assim, ao mesmo tempo que incorporam valores e práticas
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11111111111111111111111111111111111111111111111111111111111111111111111
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que vêm de cima, os transformam segundo seu modo de encarar o mundo, 1911-14 foi sufocada na I Grande Guerra enquanto que as potencialidades
além, claro, de produzir seus próprios valores e práticas. Isso não significa de 1945-47 foram abolidas pela Guerra Fria". Foram "momentos políticos
dizer que sejam donas onipotentes de sua história, ou que sejam imunes às fugazes" - quando, "em termos políticos reais, uma estratégia socialista
relações contraídas com seus opositores. era viável" - em que a classe operária virou-se para a direita, apegando-se
Talvez o quadro pintado por Hobsbawm agrade aos olhos de quem ao patriotismo da coroa real imperialista."
professa valores como solidariedade, igualdade e democracia, mas a pai- Atualmente, quando já se verifica a intensidade dos sinais surgidos
sagem evoca, ao cabo, uma certa homogeneidade, pois a classe trabalha- nos anos 50 - apontados com pioneira sensibilidade por Hobsbawm" a clas-
dora parece estar sempre à esquerda. Resulta incômodo, entretanto, um se trabalhadora, espremida entre vigorosas transformações tecnológicas e
certo crescendo na sua descrição. "Esta cultura", a tradicional, os impactos do desmantelamento do socialismo real, sente a crise de suas
instituições clássicas e, neste momento, apesar de todas as críticas que pos-
"provavelmente não sofreu alteração substancial até a trans- samos (e devamos) fazer, sobressai a importância de sindicatos e partidos.
formação da vida material das classes trabalhadoras (. . .) Uma migração para a intolerância, o racismo e a violência, especialmente
na década de 1950. Pode-se argumentar que a velha cultura entre os jovens, são fatos hoje mais que preocupantes. Ontem eles não fa-
provavelmente atingiu seu ápice entre 1945 e 1951, poisfoi ziam a revolução na saída dos estádios de futebol, iam para ospubs se diver-
este o período em que alcançaram seu apogeu a sindi- tir. Hoje oshooligans distribuem atos de barbárie, e os partidos neofascistas
calização (. .. ), a força eleitoral do Partido Trabalhista, a ou neonazistas reciclados exibem índices eleitorais crescentes.
freqüência a jogos de futebol". 29
"O uso marxista apropriado e majoritário de classe é o de categoria
Os indicadores eleitorais são muito claros nesse sentido e não há histórica. Creio poder demonstrar que é esse o uso do próprio Marx em
como deixar de concordar com o que está dito acima. Todavia, um even- seus escritos mais históricos", escreveu Thornpson" para, em seguida, pos-
tual conforto como esse choca-se com alguns fatos importantes. Assim, tar-se ao lado de Cristopher Hill, Rodney Hilton e Eric Hobsbawm, neles
um pouco de descontinuidade deve ser adicionado à sua história contínua. identificando o mesmo manejo no emprego do conceito. Não por acaso,
"Nem um daqueles que viu as massas na noite de Mafeking", ano- Thompson cita "Notas sobre Consciência de Classe", artigo assinado pelo
tou Stedman Jones, "jamais as esqueceu". "Foi a noite de Mafeking'', ob- autor de Mundos do Trabalho.
servou Thompson, "quando as mais sagradas distinções de classe dissol- Esse uso inglês do conceito de classe encontra sua possível inspira-
veram-se em uma histeria nacionalista," ção num famoso trecho de O Dezoito Brumário de Luís Bonaparte:
"que assinalou o mergulho nessa época terrível. Na ação "na medida em que milhões de famílias camponesas vivem
dos portuários das docas Victoria e Albert, que se recusa- em condições econõmicas de existência que isolam seu modo
ram a trabalhar qualquer navio não decorado em honra à de vida, seus interesses e sua cultura dos de outras classes, e
rendição de Mafeking - aqueles mesmos portuários sobre que as colocam em contraste hostil contra estas últimas, elas
cujo suporte Tom Mann havia buscado fundar o interna- constituem uma classe. Na medida em que existe apenas uma
cionalismo proletário -, já podemos ver as derrotas esma- inter-relação local entre os pequenos camponeses, e que a
gadoras que estavam por vir".30 identidade de seus interesses não origina nenhuma unidade,
nenhuma união nacional e nenhuma organização política,
Uma onda imperialista varreu o país, abalando esforços, perspecti- eles não constituem uma classe=r'
vas e desejos de organização política e democrática da classe trabalhado-
ra. Outros inconvenientes históricos podem ser registrados: "o movimento Embora esta citação seja apenas um minúsculo trecho na heterogê-
da década de 1890 ruiu frente à guerra dos Boers, a vaga sindicalista de nea e ampla obra de Marx, vale apontar o fato de não se referir à industria-
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lização corno elemento. causal ou definidor para o. acontecimento de uma Merecendo. um outro olhar, a plebe pode mesmo. iluminar, em sua
classe social, Esse é provavelmente o. sentido. marxist.a clássico referido. singularidade histórica, o. uso. inglês do. conceito de classe e o. debate travado.
por Thornpson ao. afirmar que, em 1832, havia se formado a classe traba- em torno da formação da classe trabalhadora no. século. 19. "É fácil caracte-
lhadora inglesa. Se a industrialização ainda não. tinha se objetivado em sua rizar esse comportamento corno infantil", admitiu Thornpson. "Sem dúvida
plenitude, a classe trabalhadora já estava "madura", isto. é, já havia se é assim", especialmente se um conhecido procedimento for mantido:
expressado. de modo "decisivo." pois era consciente e historicamente de-
senvolvida, manifestando-se institucional e ideologicamente." "se insistirmos em olhar o século 18 apenas através da lente
De uma parte, foi assim operando, que Thompson pôde afirmar que do movimento operário do século 19, veremos somente ima-
a industrialização. não. produziu a classe trabalhadora, resgatando. a im- turidade, o pré-politico, a infância da classe't'"
portância dos artesãos para a história operária "moderna", superando. as
Isso. clama por retirar do. exemplar mais desenvolvido de uma
fronteiras entre os séculos 18 e 19 e demonstrando como a agitação. jacobina
pretensa linha evolutiva a chave da explicação. do. "primitivo." para encontrá-
no. final do. século. 18 "iniciou tradições que se prolongam até o. século.
la neste último. mesmo. No. que to.ca ao. fenômeno. da industrialização, é
atual"." De outra parte, foi apoiado em tal noção que se voltou para a
problemático negar a formação da classe operária do. período 1790-1848
multidão, a cultura plebéia e a economia moral. Ao. deixar o. futuro para
porque ela não. constituiu a classe como ela iria se desenvolver mais tarde.
trás, Thompson encontrou tanto. uma plebe organizada e racionalmente
Isolados por duas décadas, onde se verificou tanto. o. declínio do. cartisrno e
orientada quanto. uma realidade muito. diferente da do. século. 19.
do. socialismo owenista quanto. uma radical redefinição no. perfil social do.
"Com ênfase sobre normas, sistemas de valores e rituais, dedican- operariado, os períodos 1790-1848 e 1870-1950 são. dois momentos dife-
do. atenção. às funções expressivas das formas de distúrbio. e amotinamento rentes, e nos termos propostos pelo. uso. histórico. do. conceito de classe, a
e às expressões simbólicas de autoridade, controle e hegemonia", Thompson classe jamais está pronta e acabada. Diante do. vigor de uma classe opera-
assim comentou seu novo interesse: ria numerosa e concentrada em grandes fábricas, a classe do. cartisrno é
certamente menos tradicional, mas este fato, é provável que isso. já esteja
"fui levado a esses problemas, no meu próprio trabalho, no claro, não. representa dernérito para ninguém."
momento em que terminei A Formação da Classe Operária Segundo. uma certa leitura da história, o. contrário, aliás, seria ple-
Inglesa (1963) e decidi dirigir minhas pesquisas para uma namente possível. Thompson discorre sobre os dois períodos discutidos
época cada vez mais passada, à consciência plebéia e às aqui. De um lado, ao. opor-se frontalmente contra a tese do. caráter "pre-
formas de protesto (. .. ) do século 18".37 maturo." do. cartisrno, e, de outro, ao. fazer ardente defesa da história da
classe trabalhadora do. período predileto de Hobsbawrn (definida por Tom
É precisamente nessa fase de seu trabalho, ao. discutir po.rque a ple- Nairn como "um dos enigmas da história contemporânea")," Thornpson
be não. era uma classe, que fica um tanto. mais claro. po.rque o. operariado de endossa a "profunda cesura", afirmada por Perry Anderson, seguida à
1832 o. era. A plebe, de fato, não. era uma classe pois não. apresentava o. "exaustão" provocada pelo. declfnio do. cartisrno,
momento da autodefinição consciente, um programa e uma estrutura de Teria sido. fácil concordar co.m Anderson e Nairn e afirmar então.
organização de classe, porque o. ofício ainda inibia uma solidariedade eco- que o. "máximo. de ardo.r e insurgência" típico. do. cartisrno correspondia a
nômica entre as diferentes maestrias em oposição aos empregadores e por- uma fase de ouro da história operária e associar o. período posterior a uma
que, afinal, ela não. seria notável por uma consciência de classe "impecá- inflexão pérfida: "reformista", "corporativa", "traidora". As Peculiarida-
vel". Contudo, tendo. oferecido inúmeras evidências de solidariedade e des ... , contudo, é escrito. para refutar um argumento. que hierarquiza expe-
consciência horizontais, a multidão. passou a ser olhada corno "era, sái riências históricas diferentes. Mesmo. sabendo. do. câmbio. radical na orien-
generis, com seus próprios objetivos, atuando dentro de uma polaridade tação. política da classe trabalhadora (mesmo, de certa forma, lamentan-
de forças delicada e complexa, peculiar ao. seu próprio. contexto" .3X do-o), não. é dito. que em uma época mora a classe trabalhadora e na outra,
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não. Tendo sido derrotada em sua vontade de derrubar o capitalismo, não - ante a um "processo permanente de fazer-se e refazer-se" _46 talvez seja
se seguiu uma classe trabalhadora "dócil", "entorpeci da", "apática"." cedo enviar-lhe acenos de adeus.
É exatamente na crítica feita ao "uso esquemático do conceito de Herbert Smith pode, uma outra vez, pontuar o fim do texto. Esse
classe" onde iremos encontrar o fio da meada empregado nessas conside- líder operário, impensável em qualquer fase anterior - ou mesmo posterior
rações: - da história do movimento operário, que se fezjuntamente com a classe
operária que ajudou a formar, muito nos tem a falar se o ouvirmos em sua
"de 1790 a 1960, somos carregados de ponta a ponta pelo historicidade. Aprenderemos uma vez mais se estendermos, outrossim, esse
pronome impessoal, supondo-se uma classe com uma com- cuidado à "velha" classe operária. Ela não pode ser analisada por aquilo
posição sociológica mais ou menos imutável e (depois de que não estava disponível. A Inglaterra não era a "oficina do mundo" àquela
1832) com a mesma cultura coletiva hermeticamente fecha- época. Tal classe é impensável fora de seu tempo, e a ausência de uma
da".43 sociedade industrial não nos deve fazer concluir que ela não estava plena-
mente formada.
Entretanto, um final como esse seria muito inglês, e a história in-
Possivelmente, foi o artigo de Gareth Stedman Jones, "Working- glesa está cheia de particularidades que tornam árida demais a discussão
Class Culture and Working-Class Politics in London, 1870-1900", o pri- de estar a classe operária formada ou não em 1832. Não se pretendeu,
meiro a propor a hipótese do refazer-se da classe. Ao perfilar "dois temas exatamente, discutir esse marco, mas sim em tomo de que girou o debate
que tradicionalmente foram mantidos aparte", a história do movimento sobre o mesmo, e isso pode fornecer elementos para reflexão do caso bra-
operário e a investigação da cultura operária, este polêmico estudioso do sileiro.
cartismo buscou traçar a "emergência de um padrão da cultura da classe Ao recuperar a história de um movimento operário que se formou
trabalhadora distintamente novo" e explicar suas opções políticas. "Se a na fase anterior à clássica - um momento quando, nas palavras de Tom
'formação da classe operária inglesa' teve lugar no período de 1790-1830", Nairn, o marxismo estava escondido no futuro - Thompson descentralizou
conjeturou, a história operária. A fábrica, o processo de trabalho, sindicatos (para não
falar de partidos), ideologias marxistas, greves por salário, etc., tiveram
"algo próximo de um refazer-se da classe operária aconte- de dividir seu espaço, ou esperar por sua vez para entrar na história (para,
ceu em algum lugar entre 1870 e 1900. (. .. ) Esse processo novamente, dividir espaços centrais). Ao resgatar linguagens e práticas
de refazer-se não obliterou o legado da primeira fase (articuladas e não articuladas) apropriadas por um movimento operário
[ormativa da história da classe trabalhadora, tão bem des- emergente, Thompson buscou contornar os obstáculos que separavam o
crita por Edward Thompson. Mas transformou seu signifi- século 18 do 19. Hobsbawm, cuja discordância quanto à efetividade da
cado. No campo da ideologia operária, uma segunda cama- formação da "velha" classe trabalhadora foi examinada aqui, teve seme-
da formativa de experiência histórica foi superimposta à lhante preocupação em seus últimos posicionamentos no debate sobre aris-
primeira, colorindo, consequentemente a primeira à luz de tocracia operária ao se perguntar como seria a sociedade inglesa sem um
seus já transformados horizontes de possibilidades" .44 grupo de trabalhadores que embasava suas vidas sobre o senso de uma
sociedade não governada pelas leis do mercado, recuperando, também ele,
Longe de válida por si mesma, a sugestão de Stedman Jones encon- os laços entre a classe operária das oficinas e manufaturas e a da grande
trou algum eco. Savage & Miles são bastante claros: para eles, "a classe indústria."
operária está constantemente sendo feita e refeita", admitindo a explica, Novamente, essa seria uma conclusão inglesa. O debate sobre a
ção sobre o câmbio da cultura operária do radicalismo à "aceitação mais periodização da história da classe trabalhadora e a discussão do peso de
pragmática do status quo" .45 De outra parte, em um balanço sobre a "des- sujeitos diferentes na sua formação pode ter repercussões no Brasil. A
truição" da classe trabalhadora inglesa, uma certa cautela é advogada pois reflexão sobre o instrumental com que certos momentos históricos são dis-
56 57
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cutidos parece ser mais profícua. Pouco se extrairia se descartássemos a classe é vista como, provavelmente, a principal expressão política e cultural da prolongada seqüên-
cia de mudança industrial do século 19".
experiência nacional por sua inadequação em relação a explicações con-
.• Cf. BRIGGS, Asa. "The language of class". In: B.R[GGS, A., SAV[LLE, J. (org.), Essays in
sagradas da história operária européia. Certo, não tivemos um forte labour history: in ntemory of G. D. H. Cole. Londres. Macmillan, j 967.
sindicalismo de ofício moldando a emergência nacional da classe traba- "Cf. HOBSBAWM, E. "O fazer-se ". Op. cit., p. 273-274.
lhadora como no caso inglês, mas já é hora de investigarmos outros mo- 'Cf.1-I0BSBAWM, E. "O fazer-se ". Op. cit., p. 275-276.
dos, historicamente particulares, pelos quais o século 19 informou o 20 no "Cf. HOBSBAWM, E. "O fazer-se ". Op. cit., p. 278.
Brasil. 7 In: Mundos do trabalho (Rio de Janeiro: paz e Terra, 1987). Doravante citado COmO "A formação
Dois grandes itens de pesquisa podem ser indicados aqui. Um, trata da cultura ... ".
da trajetória específica dos trabalhadores negros (escravos e libertos) e 'Tratando-se de um ensaio sobre um largo período de tempo da história inglesa, THOMPSON, E.,
das associações mutualistas dos trabalhadores livres (geralmente qualifi- em As peculiaridades dos ingleses (Col, Textos Didáticos, n. LO. Campinas: Unicamp-lf-Cli, 1993)
tem aí a oportunidade de cotejar a "primeira" classe trabalhadora com a "tradicional". Por Aforma-
cados) e outro, das relações estabeleci das entre elas. Este último item não
çüo... estará sendo citado, de agora em diante, Aformação da classe operária inglesa.
deve ser descuidado. Se a emergência dos trabalhadores como uma classe
""Podemos vero ludismo", anotaTHOMPSON (em Afonnaçiio ... v. Ill, p. 123), "como momento
nas duas primeiras décadas do século 20 remete ao seu passado no século de um conflito ôetransição. De um lado, olhava para trás, para costumes antigos e uma legislação
anterior (e, portanto, à formação de uma linguagem de classe) pesquisar patemalista que nunca poderiam ressuscitar; de outro lado, tentava reviver antigos direitos a fim de
só as associaões de ofícios talvez signifique, em sua maior parte, pesquisar abrir novos precedentes". Em um momento posteriorTHOMPSON, E., em "La economia 'moral'
de la multitud en la Inglaterra dei siglo XVIII" (In: Tradicián, revueltu y consciencia de clase.
a história de trabalhadores brancos. Quando há aestimulante indicação da Barcelona: Crítica, 1989, p. 89), escreve que o modelo da multidão "era uma reconstrução seletiva
pesquisa da luta de classes sem classes, temos que no século 19 brasileiro do modelo parernalista, que tomava dele todas aquelas características que mais favoreciam aos
há outros trabalhadores para se conhecer em suas peculiaridades, mesmo pobres".
que não afirmassem fazer parte de uma classe operária. Não parece mais "Cf. HOBSBAWM, E,"O fazer-se ". Op. cit., p. 275.
razoável restringir a emergência da classe trabalhadora no Brasil ao pe- "Cf. HOBSBAWM, E. "O fazer-se ". Op. cit., p. 273.
ríodo entre a abolição da escravatura e a vigência da República Velha, ""Tratá-Ia [a cultura) corno sistema ( ... ) significa admitir a racional idade intrínseca de qualquer
cultura". Cf. VELHO, G. & CASTRO, E . "O Conceito de cultura e o estudo de sociedades comple-
nem associá-la somente à imigração, ou aos centros industriais urbanos.
xas". In: Espaço-Cadernos de Cultura, n. 2, 1980, p. 17.
Antes e depois desse período da história, novos encontros entre o "novo" e
""Sobre o problema da autonomia da cultura operária, expliquei-me mal se não dei a idéia de que
o "velho" carecem de pesquisa. Assim, ao invés de grandes cortes, mo- o separatismo cultural era fenômeno dominante. Mas ele nunca é total". Cf H08SBAWM, E. "As
mentos de ruptura onde o "novo" nasce sem vínculos com o passado para classes operárias inglesas e a cultura desde os princípios da Revolução Industrial". ln: Níveis de
sepultar um "velho" supostamente anacrônico, a concepção histórica da cultura e grupos sociais. Colóquio da Escola Normal Superior de Paris. Lisboa. Cosmos, 1974,
p.262.
classe social permitirá entender transformações mas também identificar
-cr. VELHO &CASTRO. Op. cit., p. 17.
continuidades surpreendentes.
"Cf. BEYNON, Huw. "A destruição da classe operária inglesa?". In: Revista Brasileira de Ciên-
cias Sociais, n. 27, 1995, p. 6.
"Richard Hoggart, emAs utilizações da cultura (Lisboa: Editorial Presença, 1973), cuja primeira
NOTAS edição foi datada em 1957, referindo-se às modificações na cultura operária devido à influência das
publicações de massa, ocorridas nos últimos 30 ou 40 anos de então, alerta para os "perigos ( ... )
'''Formação'', ao invés de "fazer-se", foi o termo utilizado pela tradução brasileira de The I/Iakill~ [da] atitude romântica", que pode levar à exaltação das "qualidades admiráveis da antiga cultura da
ofthe english working class. Em ambos os casos, estará sendo dita a mesma coisa. O artigo de classe proletária, assumindo o ponto de vista de que esta cultura está presentemente em declínio,
HOBSBAWM, E. "0 fazer-se da classe operária, 1870-1914" foi publicado em Mundos do traba- surgindo assim uma tendência para exagerar o contraste entre o que foi essa cultura e o que ela é
lho (Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1987). Doravante citado como "O fazer-se ..". actualmente" (p. 16). Mais adiante cstá escrito que "essa tradição tende a tornar-se gradualmente
'É o que afirmam, por exemplo, Kaye em The british marxist historians (Cambridge: Polity Press, mais fraca" (p. 33). Apesar disto, a classe trabalhadora oferece uma resistência que, incorporando a
1984) e o próprio Thompson em "i.Lucha de c1ases sin clases?" (In: Tradicián, revueltay consciencia mudança. repõe a tradição: "as classes proletárias possuem um elevado grau e faculdade natural de
de clase. Barcelona: Crítica, 1989, p. 35). O polêmico livro de Patrick Joyce visions ofthe people. resistirem à mudança, adaptando ou assimilando, nas novidades, aquilo que lhes interessa, c despre-
Industrial england and the question ofclass, I R48-1914 (Cambridge: Cambridge University Press, zando todo o resto" (p. 40).
1994, p. I) também reconhecendo esse debate, aponta que "quaisquer que sejam as diferenças, "Cf. THOMPSON, E.Aj(m"açiio ... V. I, p. 57.
58 59
""111"'111 lIU mwnnru I [ lInnm nmn" .••• u' .••••• , I llUn_ ••••••••••••••• _"~n_. _
I
\
"Cf, GUTMAN, H. "Herbert Gutrnan". In: VVAA. Yisions of history. Nova lorque: Pantheon 41C" d
ua o em THOMPSON, E. As peculiaridades dos ... Op. cit., p.13. As referências feitas a Tom
Books, 1983, p. 209. Nairn e Perry Anderson se devem ao fato de este ensaio ter sido endereçado a seus trabalhos publi-
I'Cf. HOBSBAWM, E. "As classes operárias inglesas e a cultura ''. Op. cit., p. 245. cados emNew Left Review.
,ncf. HOBSBAWM, E. "As classes operárias inglesas e a cultura ''. Op. cit., p. 250. 4'N~te-se que o debate é travado em torno de estratégia política, e não gira em torno da industrial i-
zaçao.
21Cf. HOBSBAWM, E. "As classes operárias inglesas e a cultura ". Op. cit., p. 250.
4'Cf. Thompson, E. As peculiaridades ... Op. cit., p. 93, 95.
"Ao publicar, em 1952, o artigo "Os destruidores de máquinas" (In: Trabalhadores. Rio de Janei-
44Cf. STEDMAN JONES. "Working-c1ass culture and ... ''. Op., cit., p. 497, 498. A noção de refa-
ro: Paz e Terra, 1981) HOBSBAWM, E. (à página 15) demonstrou original sensibilidade ao criticar
zer-se d~ classe, que se aSSOCIa diretarnente a uma concepção histórica do conceito encontra emA
os "apologistas" de classe média que insistiam na tecla de que "se devia ensinar aos operários a não
forllla~ao . . uma fonte de mspiração: "o exame desse período [anos 30 e 40 do século 19] ultrapas-
baterem com a cabeça contra a verdade econômica, por mais intragável que fosse".
sa os limites desse estu?o, levando-nos a uma época em que a classe operária não se encontrava
"Cf. THOMPSON, E. Aforniução ... v. I, p. 111. mais em seu fazer-se.já estando feita (em suafárma cartista)" (v. Ill, p. 323).
"Cf. ENGELS, Friedrich. "Prefácio à edição Alemã de 1892". In:A situação da classe trabalha- "Cf. SAVAGE, M. & MILES, A. Tlte remaking ofthe englisli working class (1840-1940). Lon-
dora inglesa. São Paulo, Global, 1986, p. 363. dres: Routledge, 1994, p. 90. 12.
"Cf. HOBSBAWM, E. "As classes operárias inglesas e acultura ". Op. cit., p. 240, 241, 247. 4·Cf. BEYNON, H. "A destruição da classe operária inglesa?". Op. cit., p. 6.
'·Cf. HOBSBAWM, E. "As classes operárias inglesas e acultura ". Op. cit., p. 248. 4'Cf HOBSBAWM, E. "Artífices e aristocratas do trabalho". In: Mundos do trabalho. Rio de
Janeiro: Paz e Terra, 1987, p. 372.
nCf. ENGELS, F. "Prefácio à ... ''. Op. cit., p. 367, 373, 376-78.
"Cf, HOBSBAWM, E. "A formação da cultura ". Op. cit., p. 269.
"Cf. HOBSBAWM, E. "A formação dacultura ". Op. cit., p. 261.
.,nCf. STEDMAN JONES, G. "Working-class culture and working-c1ass politics in London, 1870-
1900: notes on the remaking of a working class". In: Languuges ofclass. Cambridge: Cambridge
University Press, p. 460. Cf. THOMPSON, E.As peculiaridades dos ... Op. cit., p.63.
·"Cf. THOMPSON, E. As peculiaridades dos ... Op. cit., p. 63.
·"Cf. "O avanço do trabalhismo estancado?" (In: Estratégias para uma esquerda racional. Rio de
Janeiro: Paz e Terra, 1991), originalmente publicado em 1978, trata destas mudanças, mas desde
um colóquio em 1966, publicado em "As classes operárias inglesas e a cultura ... ". Op. cit.,
HOBSBAWMjá mencionava tais transformações.
"Cf. THOMPSON, E. "iLucha de c1ases sin clases?". Op. cit., p. 35.
·"'Citado em HOBSBAWM, E. "Notas sobre consciência de classe". In: Mundos do trabalho. Rio
de Janeiro: Paz e Terra, 1987, p. 55.
"Cf. THOMPSON, E. "iLucha de clases sin clases?". Op. cit., p. 39. EscreveTHOMPSON, E. em
Aforniação ... v. 111, p. 304: "De 1830 em diante, veio a amadurecer uma consciência de classe, no
sentido marxista tradicional, mais claramente definida, com a qual os trabalhadores estavam cientes
de prosseguir por conta própria em lutas antigas e novas" .
.1·Cf. THOMPSON, E. Aformação ... Op. cit., v. I, p. 111 .
17Cf.
. THOMPSON, E. "Folklore, anthropology and social history". In: The indian historical review.
v. 111, n. 2, p. 248.
"Cf. THOMPSON, E. "Patrician society, plebeian culture". In: Journal of Social History, v. 7, n.
4, p. 396-398.
"Cf, THOMPSON, E. "Patrician society ... ". Op. cit., p. 398.
4\1"0 erro mais corrente hoje em dia é o de fazer a definição das antíteses culturais do século 18
(industrial/pré-industrial, moderno/tradicional, classe operária 'madura'l'prirnitiva') inaplicáveis
porque supõem descobrir em uma sociedade prévia categorias para as quais essa sociedade não
possuía recursos e essa cultura não possuía termos". Cf. THOMPSON, E. "iLucha de c1ases sin
clases?". Op. cit., p. 42.
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