Mentes Perigosas: A Psicopata Mora Ao Lado, de Ana Beatriz Barbosa - Uma Reflexão Sobre Psicopatia, Direito Penal E Direito Fundamental
Mentes Perigosas: A Psicopata Mora Ao Lado, de Ana Beatriz Barbosa - Uma Reflexão Sobre Psicopatia, Direito Penal E Direito Fundamental
Mentes Perigosas: A Psicopata Mora Ao Lado, de Ana Beatriz Barbosa - Uma Reflexão Sobre Psicopatia, Direito Penal E Direito Fundamental
RESUMO
O presente artigo tem como objetivo abordar o conceito de psicopatia analisado a partir
da abordagem feita no livro Mentes Perigosas (2014) de Ana Beatriz Silva. Além disso,
discutir a relação entre psicopatia e Direito Penal e a problemática de se diagnosticar e de 189
se estabelecer uma punição mais adequada para as pessoas que apresentam este transtorno
psicológico. No livro, à luz da medicina, a autora nos mostra como os psicopatas têm o
poder de convencer e agir na vida de suas vítimas, causando muito sofrimento às pessoas
com as quais eles convivem e, às vezes, cometendo assassinatos. Na conclusão,
arriscamos a hipótese de penas diferenciadas, pois, como defendido no livro, não há cura
para um psicopata e quando ele cumpre pena com presos “normais”, pode contaminá-los
com a sua maldade. O método de abordagem utilizado, neste artigo, foi do tipo
documental, analisando a questão a partir do livro mencionado, da legislação e da
jurisprudência.
PALAVRAS-CHAVE: Psicopata; Direito Penal; Direito Fundamental.
ABSTRACT
Abstract: This article aims to address the concept of psychopathy analyzed from the
approach made in the book Mentes Perigosas (2014) by Ana Beatriz Silva. In addition,
discuss the relationship between psychopathy and criminal law and the problem of
diagnosing and establishing a more appropriate punishment for people who have this
psychological disorder. In the book, in the light of medicine, the author shows us how
psychopaths have the power to convince and act in the lives of their victims, causing
much suffering to the people with whom they coexist and sometimes committing
murders. In conclusion, we risk the hypothesis of differential punishment, for, as argued
in the book, there is no cure for a psychopath, and when he pities "normal" prisoners, he
can contaminate them with his evil. The method used in this article was documentary,
analyzing the question from the book mentioned, from the legislation and the
jurisprudence.
KEY WORDS: Psychopath; Criminal Law; Fundamental Right.
INTRODUÇÃO
Com base no livro Mentes perigosas: o psicopata mora ao lado (2014) da autora
Ana Beatriz Barbosa Silva, é possível verificar como age um psicopata na vida das
1
Graduanda em Direito no Centro Universitário Eurípides de Marília - UNIVEM.
MENTES PERIGOSAS: A PSICOPATA MORA AO LADO, DE ANA BEATRIZ
BARBOSA - UMA REFLEXÃO SOBRE PSICOPATIA, DIREITO PENAL E
DIREITO FUNDAMENTAL
REGRAD, UNIVEM/Marília-SP, v. 12, n. 1, p. 189 – 206, novembro de 2019.
pessoas, seu poder de convencimento, sua influência e o quanto pode prejudicar o meio
social em que vive.
De acordo com a autora, Dra. Ana Beatriz Barbosa Silva, os psicopatas são
pessoas com perturbação da personalidade que não possuem empatia pelo outro. Eles não
se tornam pessoas ruins ao longo de suas vidas, eles já nascem assim. São 100 % razão e
0 emoção. Essas pessoas só querem status, poder e sentir prazer no sofrimento e na tristeza
de seu próximo.
O objetivo deste texto é trazer à luz, novamente, a questão da psicopatia, o quão 190
perniciosa ela é para a boa convivência entre as pessoas, para a sociedade de uma maneira
geral, e refletir sobre as dificuldades enfrentadas no universo jurídico em relação à
psicopatia, ou melhor dizendo, ao tratamento punitivo que se dá aos psicopatas.
O presente trabalho pretende destacar alguns casos mencionados no livro Mentes
perigosas: o psicopata mora ao lado para discutir questões como a representação de perigo
para a sociedade, a dificuldade de um diagnóstico, a inexistência de um tratamento
assertivo e uma punição mais adequada.
O livro Mentes perigosas: o psicopata mora ao lado (2014), como o próprio título
sugere, trata de pessoas que possuem um transtorno de personalidade - pessoas
insensíveis, perversas, manipuladoras, desprovidas do sentimento de compaixão, não
sentem culpa ou remorso - que podem estar em qualquer lugar e desempenhar qualquer
profissão. Talvez, muitos de nós já tenhamos convivido com pessoas que possuem esse
transtorno e nunca nos demos conta disso, por causa da maestria com que fingem ser o
que não são e sentir o que não sentem.
A autora nos traz uma riqueza de detalhes de como identificar criminosos
psicopatas. Eles, primeiro, conhecem as suas vítimas, o que elas têm de carência, quais
seus sonhos e logo depois começam a agir. A autora relata que os psicopatas nunca sabem
a fundo sobre um assunto; eles flutuam sobre cada coisa que chama a atenção do outro,
mas nunca sabem a fundo o que realmente é aquilo que estão falando, mas, mesmo assim,
convencem quem os ouvem de que eles são doutores naquilo.
Os psicopatas são normais nas aparências e perigosos nas atitudes. Eles são
normais, agem naturalmente, se tornam amigos, amantes, mas na realidade não passam
de atores interpretando o gostar, o amar e o cuidar para logo em seguida conseguir o que
eles querem e diversas vezes da forma mais cruel e brutal possível.
O livro traz exemplos de alguns dos psicopatas mais famosos, que já geraram
muitas matérias nos meios de comunicação, seja no jornal, na revista, nos noticiários ou
até mesmo na escola e em uma roda de amigos. Dos casos mais famosos eis que surgem
Guilherme de Pádua, Suzane Von Richthofen, Chico Picadinho e Maníaco do Parque, que
agiram com emprego dos mais cruéis meios que se possa imaginar. Exporemos, então três
destes casos citados acima para exemplificar o comportamento de um psicopata. 191
com a sentença, iniciou um movimento para mudar o Código Penal Brasileiro e colheu
mais de um milhão de assinaturas que fez assim incluir o homicídio qualificado na lista
de crimes hediondos.
2- O CURRICULUM DE UM PSICOPATA
machuca os colegas em brincadeiras mais agressivas e não têm respeito pela vida nem
limites (SILVA, 2012).
Para esses casos, ela explica que é possível amenizar os efeitos com psicoterapia
e acompanhamento pedagógico.
A autora defende a separação de presos “comuns” de presos com os diagnósticos
de psicopatia. Para ela, os psicopatas têm o poder de convencimento aflorado: convencem
de seu arrependimento, convencem de que nunca mais irão cometer tal crime (exemplo
de Chico Picadinho, que tinha bom comportamento e logo que saiu da cadeia vitimou 197
outra mulher com o mesmo requinte de crueldade).
O psicopata vê o mundo sem emoção, sem sentimento, sem nenhum tipo
de consideração pelo outro. Só visa ao seu prazer e à sua diversão. Não existe, hoje,
nenhum método terapêutico que tenha mostrado sucesso. Todos os seres humanos têm o
sistema límbico do cérebro, que é a área responsável pelas emoções e pelos sentimentos.
Os psicopatas nascem com esse sistema límbico funcionando muito mal. Pode ser que no
futuro se consiga corrigir esse problema. Hoje, há sensores que dão sobrevida e qualidade
de vida aos pacientes com Parkinson. No futuro, as pesquisas podem indicar que um
sensor possa vir a fazer esse sistema límbico reagir. Até o momento, nenhuma medicação
ou psicoterapia surtiu efeito.
O próprio Hare chegou a fazer grupos no sistema penitenciário e o que ele viu é
que os psicopatas rapidamente dominam as técnicas e passam a se valer delas com
discurso psicológico para justificar suas atitudes. É como se esse tipo de trabalho os
armasse com conteúdo psicológico, o que facilita a defesa em um possível júri. Não se
sustenta, aqui, a pena de morte, que ela não é razoável nem eficaz. A ciência caminha, e
um problema insolúvel pode ter uma cura no futuro. Mas enquanto não há alternativa
científica para resolver a psicopatia, deveria haver prisão perpétua com isolamento para
que os psicopatas não contaminassem os outros presos que não são psicopatas. (SILVA,
2012)
aplicado para crimes de grande relevância ou crimes marcados pela reincidência dentro
de um determinado ordenamento jurídico. (LIGNE, 2015)
Esta punição é considerada um meio de segurança dentro da sociedade porque
afasta de forma definitiva o criminoso que comete crimes mais graves. De uma maneira
geral, a prisão perpétua torna impossível a reinserção social do indivíduo, considerando
que o cárcere permanecerá até quando o indivíduo existir. (LUISI, 2000)
A sentença da prisão perpétua deve estar de acordo com o ordenamento jurídico
de cada região ou país. Em alguns lugares pode haver a concessão da liberdade 198
condicional após o condenado ter cumprido um determinado período de sanção. Exemplo
dessa situação é o que ocorre em algumas regiões dos Estados Unidos, onde o indivíduo
é condenado nestes moldes e depois de um tempo são libertados condicionalmente com
vigilância eletrônica. Esta liberdade condicional só é permitida com observância no
comportamento do preso, sempre havendo restrições e obrigações. (LIGNE, 2015)
De acordo com o que foi abordado acima, podemos concluir que um psicopata é 199
uma pessoa perversa, persuasiva, fria e sem qualquer tipo de sentimento, logo não poderia
estar numa cela comum com presos, porque, sem dúvida alguma, o psicopata influencia,
com muita perspicácia, quase todos que estão a sua volta. Mesmo que os presos comuns
cometam crimes cruéis, se não tiverem a mente de um psicopata, podem ter no futuro um
arrependimento verdadeiro e voltar à convivência normal na sociedade; um psicopata não.
Sob o ponto de vista da autora de Mentes perigosas, a melhor forma de punir um
doente mental, no caso da psicopatia, seria a prisão perpétua, pois a maior reincidência
criminal advém desses criminosos. Além disso, a mente de um psicopata é tão doentia
que além de eles voltarem a praticar os crimes com requinte de crueldade, seu poder de
convencimento é tão grande que eles conseguem induzir outras pessoas que não têm esse
transtorno a agirem com a mesma crueldade que a deles.
A Constituição Federal de 1988 nos traz o seguinte texto, no qual podemos
identificar a vedação de pena em caráter perpétuo:
Inciso XLVII do Artigo 5 da Constituição Federal de 1988
Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza,
garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do
direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
XLVII - não haverá penas:
a) de morte, salvo em caso de guerra declarada, nos termos do art. 84, XIX;
b) de caráter perpétuo;
c) de trabalhos forçados;
d) de banimento;
e) cruéis;
(REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL. Constituição (1988). Brasília:
Planalto do Governo.)
Vale destacar que a Constituição Federal traz como fundamento em artigo 1°,
inciso III, o princípio da dignidade da pessoa humana, que garante o respeito à identidade
e integridade de qualquer ser humano. Carvalho discute que, caso não seja colocado em
prática, este princípio afeta o caráter do indivíduo, trazendo consequências negativas
individuais e coletivas.
O princípio abrange não só os direitos individuais, mas também os de natureza
econômica, social e cultural, pois, no Estado Democrático de Direito a liberdade não é 200
apenas negativa, entendida como ausência de constrangimento, mas liberdade positiva,
que consiste na remoção de impedimentos (econômicos, sociais e políticos) que possam
embaraçar a plena realização da personalidade humana. (CARVALHO, 2009, p. 673)
Desta forma, é importante destacar também que direitos fundamentais são
entendidos como os direitos mais básicos de todos os cidadãos. Existe uma confusão
terminológica quanto ao termo, já que é muito usado como sinônimo de "direitos
humanos" ou "direitos do Homem", entretanto é importante isolá-lo como uma categoria
própria. Na doutrina jurídica brasileira, os direitos fundamentais são descritos pela
Constituição de 1988 e se aplicam somente aos indivíduos e casos por ela regidos, o que
os difere de "direitos humanos" por estes se aplicarem a todo o mundo, independente de
soberania nacional. No seu Título segundo, a Constituição classifica os direitos e
garantias fundamentais dos brasileiros entre direitos e deveres individuais e coletivos
(igualdade perante a lei, inviolabilidade do direito à vida, etc.), direitos sociais (saúde,
educação, trabalho, lazer) e direitos políticos. (FALCÃO, 2013).
Portanto, de acordo com a nossa Constituição, os direitos fundamentais do ser
humano seriam atingidos, caso houvesse a possibilidade de sancionar a prisão perpétua.
Entretanto, há casos específicos que devem ser analisados com mais atenção,
principalmente quando se trata de um psicopata que é um dos assassinos mais cruéis que
poderíamos conhecer. Percebemos, neste ponto, que há um conflito entre direitos e
condutas. O que fazer com um criminoso psicopata? Se este criminoso estiver solto, com
certeza continuará cometendo os mesmos crimes que já cometeu com o mesmo grau de
violência, e isto é um fato.
Outro fato é que a nossa doutrina ainda não tem um entendimento homogêneo a
respeito da culpabilidade do psicopata. Umas das grandes dificuldades do Direito Penal
Mundial é classificar os psicopatas como imputáveis, não entendendo que tais indivíduos
Apesar de a doutrina não tratar de maneira uniforme o tema, vale discutir neste
artigo as causas excludentes de culpabilidade denominadas inimputabilidade (em razão
de doença mental) e culpabilidade diminuída (em razão de perturbação mental), pois há 201
a possibilidade de o indivíduo receber um outro tratamento que não a prisão, um
tratamento psicológico e/ou psiquiátrico em um manicômio judiciário.
A primeira hipótese de causa excludente de culpabilidade tratada no Código
Penal brasileiro, no caput do seu art. 26, é a inimputabilidade em razão de doença mental,
pois abrange todas as psicoses, sejam elas orgânicas, tóxicas ou funcionais, crônicas ou
transitórias.
Deste modo, tem-se a inimputabilidade em razão de doença mental como todas
as alterações psíquicas ou mentais que anulem, à época da conduta (a ação ou omissão),
a capacidade do sujeito de compreender a natureza da ilicitude do fato ou de
autodeterminar-se com essa compreensão. Desta forma, doentes mentais podem ser
penalmente imputáveis se realizarem o injusto penal durante intervalos de lucidez.
7. CULPABILIDADE
Todavia, a culpabilidade, ainda não possui um julgamento único, ela passa por
transformações dia a dia. Além desse fator, o pensamento majoritário adotado é a teoria
tripartida, que conceitua crime como fato típico, antijurídico e culpável. Capez traz um
conceito sobre esses três fatores:
A Teoria Naturalista ou Causal, o fato típico resultava de mera comparação entre
a conduta objetivamente realizada e a descrição legal do crime, sem analisar qualquer
aspecto de ordem interna, subjetiva. Sustentava que o dolo e a culpa sediavam-se na
culpabilidade e não pertenciam ao tipo. Para os seus defensores, crime só pode ser fato 202
típico, ilícito (antijurídico) e culpável, uma vez que, sendo o dolo e a culpa
imprescindíveis para a sua existência e estando ambos na culpabilidade, por óbvio esta
última se tornava necessária para integrar o conceito de infração penal. Todo penalista
clássico, portanto, forçosamente precisa adotar a concepção tripartida, pois do contrário
teria de admitir que o dolo e a culpa não pertenciam ao crime, o que seria juridicamente
impossível de sustentar. (CAPEZ, 2011).
A infração penal (fato típico e ilícito), somente quando presente a culpabilidade
poder-se-á impor pena ao sujeito. Note que o Código Penal, diante de situações em que
não exista culpabilidade, declara ser o réu ”isento de pena”. Não se refere a crime. Não
diz “não há crime”, como acontece em face de excludentes da antijuridicidade (legítima
defesa etc.).
Na inimputabilidade, o sujeito não pode ser responsável por seus atos, não tendo
eficácia, sendo a culpabilidade excluída ou diminuída, como é disciplinado no código
penal, o art. 26, no seu caput, que não será punido aquele que possuir doença mental ou
desenvolvimento mental incompleto, quando ocorrer a ação ou omissão do fato e não é
inteiramente capaz de compreender a ilicitude do episódio.
Devido a isso, pode-se falar também da capacidade de compreensão diminuída,
ou seja, a semi-iniputabilidade. A qual traz alternativa que é a redução da pena imposta
ao acusado, podendo ser de 1/3 a 2/3 ou aplicação de medida de segurança, que poderá
ser estabelecida pelo juiz a decorrer do caso concreto e do estudo que deve ser realizado.
(JusBrasil, online).
Deste modo, nota-se que para que o indivíduo seja submetido a medida de
segurança, ou seja, se ele for considerado um psicopata, que no caso os juristas entendem
que eles têm conhecimento dos atos que estão cometendo, porém não conseguem
controlar seus impulsos, esses serão submetidos as medidas de segurança, com a qual o
psiquiatra passará a ser seu tutor e ele cumprirá pena em manicômio judiciário até que o
médico ateste que possa voltar em convívio da sociedade. Na maioria das vezes isso não
ocorre, pois como já mencionado nos tópicos acima, um psicopata não tem cura, eles
nascem com déficit de caráter.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Todo o campo das noções da perversidade “funciona tanto melhor quanto mais
fraco for epistemologicamente” (Foucault, 2002. p. 42). Parece ser esse o caso da
invenção desse monstro moral que é o psicopata. A tese de Silva, não por acaso, se torna
um best seller popular. O discurso da “perversão e do perigo” justifica medidas que
violam os direitos humanos e satisfazem o desejo de vingança da população. Mas, Direito
não é vingança, assim como o campo da psicologia e psiquiatria não é catecismo moral.
Um dos papéis da psicologia e do direito é criticar de forma consistente o aparecimento
desses casos brutais como é a invenção midiática do personagem psicopata. Do ponto de
REFERÊNCIAS
BOBBIO, Norberto. A Era dos Direitos. 15 ed. Rio de Janeiro: Campus, 1992.
CAPEZ, Fernando. Curso de direito penal, volume 1, parte geral: (arts. 1º a 120)
Fernando Capez. 15 ed. São Paulo: Saraiva, 2011.
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