Matéria de 11º Ano
Matéria de 11º Ano
Matéria de 11º Ano
1
MÓDULO 3
Filosofia e racionalidade argumentativa
UNIDADE 1
Argumentação e lógica formal
CAPÍTULO 1
Noções elementares de lógica
1. O que é a lógica?
A lógica é o estudo da validade dos argumentos.
2. Que tipos de validade existem?
Há, em termos gerais, dois grandes tipos de validade: a validade dedutiva e
a validade não dedutiva.
3. O que as distingue?
A validade dedutiva de um argumento depende exclusivamente da sua forma
lógica. A validade não dedutiva não depende unicamente da forma lógica, mas
também do conteúdo e do contexto da argumentação.
4. A que tipo de argumentos estão associados estes tipos de validade?
A validade dedutiva está associada aos argumentos dedutivos. A validade
não dedutiva está associada aos argumentos não dedutivos, como é o caso
dos argumentos indutivos, por analogia, e de outros que iremos estudar.
5. O que é um argumento dedutivamente válido?
É um argumento em que a verdade das premissas – suposta, imaginada ou de facto
– implica a verdade da conclusão. Esta é uma consequência lógica daquelas.
6. Em que condições podemos considerar que um argumento não dedutivo
é válido?
Um argumento não dedutivo é válido quando: 1. A verdade das premissas
torna mais provável do que improvável a verdade da conclusão e 2. A
verdade das premissas é relevante para que aceitemos a conclusão.
7. O que são argumentos?
Os argumentos são inferências em que certas proposições denominadas
premissas visam defender, apoiar ou sustentar a verdade de uma outra – a
conclusão.
8. Como são constituídos os argumentos?
Os argumentos são constituídos por uma determinada ligação entre proposições.
9. O que são proposições?
As proposições são ideias ou pensamentos expressos através de frases
declarativas (atribuem, declaram ou constatam) com sentido que podem ser
verdadeiras ou falsas, isto é, que têm valor de verdade.
10. O que distingue os argumentos das proposições?
Apenas as proposições podem ser verdadeiras (ou falsas); apenas os
argumentos podem ser válidos (ou inválidos). Em lógica, é incorreto dizer que
um argumento é verdadeiro ou que uma proposição é válida.
EXERCÍCIOS
4. Deus me livre!
P2 – Os insetos voam.
1.2. As mulheres grávidas não deviam fumar, dado que o tabaco pode
prejudicar o desenvolvimento do feto.
Não temos neste argumento indicador de conclusão, mas indicador de premissa
(«dado que»). O que está depois deste indicador é a premissa, e o que está
antes é a conclusão.
Esquematizando:
Premissa: O tabaco pode prejudicar o desenvolvimento do
feto. Conclusão: Logo, as mulheres grávidas não deviam
fumar.
1.3. Trezentas mil pessoas foram ao Rock in Rio, e isso leva-me a pensar
que não há crise económica em Portugal.
b)Apresente o argumento.
Portugal.
1.4. Portugal está em crise económica porque não soube aproveitar o dinheiro
que veio da Europa.
1.5. Tendo sido tão desorganizados, não admira que tenhamos perdido o jogo.
b) Apresente o argumento.
IV
dedutiva 1
Há, em termos gerais, dois tipos de validade: a validade própria dos argumentos
dedutivos e a validade caraterística dos argumentos não dedutivos.
2.4. O que são argumentos dedutivos?
São argumentos cuja validade não depende unicamente da sua forma lógica.
Por outras palavras, se, por exemplo, for verdade que todos os portugueses
gostam de cerveja e se for verdade que Miguel é português, então segue-se
necessariamente das premissas apresentadas que é verdade que Miguel gosta
de cerveja.
3.2. As estatísticas revelam que 86% das pessoas que se vacinam contra a
gripe não a contraem. João vacinou-se contra a gripe há dois meses. Logo, João
ficará imune à gripe que agora atinge tanta gente.
É provável que as moedas tenham datas anteriores a 1945, mas pode também
haver nessa caixa moedas posteriores a 1945. O que é verdade no que
respeita a dez moedas não é necessariamente verdadeiro para as restantes. O
raciocínio generaliza
uma observação que nada garante não poder ser desmentida por
observações posteriores. Não há qualquer necessidade lógica na passagem das
premissas à conclusão. As premissas não obrigam a aceitar a conclusão. Por
isso, não é um raciocínio dedutivamente válido.
1 2
José Saramago e António Lobo José Saramago e António Lobo
Antunes são escritores famosos. Antunes são arquitetos famosos.
Logo, José Saramago é um Logo, José Saramago é um arquiteto
escritor famoso.
famoso.
Os dois argumentos são válidos. A validade do segundo não é afetada pelo facto
de, ao contrário do primeiro, ser constituído por proposições falsas. Imaginando
um mundo em que Saramago e Lobo Antunes fossem arquitetos, a premissa
seria verdadeira e daí seguir-se-ia que a conclusão teria de ser verdadeira.
Tendo a mesma forma dedutivamente válida, os dois argumentos são válidos
ou as duas formas argumentativas são válidas.
MÓDULO 3
Filosofia e racionalidade argumentativa
UNIDADE 1
Argumentação e lógica formal
CAPÍTULO 2
Percurso A – A lógica aristotélica
O termo médio só pode ocorrer nas premissas, ao passo que o termo maior
aparece numa das premissas e é predicado na conclusão.
O termo médio só pode ocorrer nas premissas, ao passo que o termo menor
aparece numa das premissas e é sujeito na conclusão.
6.O que significa dizer que um termo está distribuído? O que significa dizer
que não está distribuído?
Quando um termo está tomado em toda a sua extensão, dizemos que está
distribuído ou que tem extensão universal. Quando um termo está tomado em
parte da sua extensão, dizemos que não está distribuído ou que tem extensão
particular.
PM – Todos os portugueses
são europeus.
Tipo A – Universal afirmativa.
Pm – Todos os alentejanos
Todos os portugueses são
são portugueses.
europeus.
C – Logo, todos os alentejanos
Tipo E – Universal negativa.
são europeus.
Nenhum alemão é
Termo médio – portugueses
(termo das duas premissas). português. Tipo I –
EIO EIO
OAO
fracosModos
AAI EAO
3.Os termos maior e menor não podem ter, na conclusão, maior extensão do que
nas premissas. Devem estar distribuídos nas premissas se estiverem
distribuídos na conclusão, ou seja, não podem ser universais na conclusão e
particulares nas premissas (a infração da regra origina a falácia da ilícita maior ou
a falácia da ilícita menor).
4. O termo médio deve ter extensão universal – estar distribuído – pelo menos
em uma premissa (a infração da regra origina a falácia do termo médio não
distribuído).
8. A conclusão segue sempre a parte mais fraca: será negativa se houver uma
premissa negativa e particular se houver uma premissa particular.
DEVE DAR ESPECIAL ATENÇÃO ÀS SEGUINTES FALÁCIAS FORMAIS ASSOCIADAS
AO SILOGISMO CATEGÓRICO.
2 – O termo médio pode ser universal nas duas premissas. O que não pode é ser
particular nas duas. Tem de ser universal – estar distribuído – pelo menos numa
delas.
3– O termo maior pode ser universal na premissa e na conclusão. Pode ser também
particular na premissa e particular na conclusão. Pode ser igualmente universal na
premissa e particular na conclusão. O que não pode é ser particular na premissa e
universal na conclusão.
cientistas.
Como se perguntou que falácia comete este silogismo, antevê-se que é a falácia
do termo médio não distribuído. É verdade, mas temos de justificar essa
afirmação.
cientistas.
Logo, alguns cientistas são filósofos.
O termo médio pode ser universal nas duas premissas. O que não pode é
ser particular nas duas. Tem de ser universal – estar distribuído – pelo menos
em uma delas
EXERCÍCIOS
ATIVIDADE
poemas.
7. Dê um exemplo.
Ex.: A – Proposição que não se encontra na forma-padrão:
Não há português que não seja patriota.
B – Proposição colocada na forma-padrão:
Todos os portugueses são patriotas.
Todos é o quantificador. Portugueses é o sujeito. São é a cópula. Patriotas é
o predicado.
ATIVIDADE 2
III
ATIVIDADES DE AVALIAÇÃO DE SILOGISMOS CATEGÓRICOS
ATIVIDADE 1
Corrija os silogismos seguintes.
Silogismo inválido – falácia dos quatro termos – porque touro é um conceito com
dois significados distintos: animal e signo.
Correção possível:
Todo o touro é animal que tem chifres.
Lampeiro é um touro.
Logo, Lampeiro é animal que tem chifres.
Correção possível:
Todos os humanos são
mortais. Todos os psicólogos
são humanos.
Logo, todos os psicólogos são mortais.
ATIVIDADE 2
Todos os virtuosos são justos. Todos os virtuosos são altruístas. Logo, alguns
altruístas são justos.
virtuosos.
Silogismo inválido porque não segue a parte mais fraca. A conclusão tem de
ser negativa. A correção dá origem a um silogismo de 1.ª figura, modo EAE.
3. O justo é virtuoso.
Forma-padrão: Todo o justo é virtuoso. Alguns homens são virtuosos. Logo, todo
o homem é justo.
Silogismo inválido porque, mais uma vez, não segue a parte mais fraca (falácia
da ilícita menor). A correção fornece-nos um silogismo de 2.ª figura, modo
AOO:
Todo o justo é virtuoso. Alguns homens não são virtuosos. Logo, alguns homens
não são justos.
Forma-padrão:
Nenhum cético moderado é dogmático. Alguns dogmáticos são filósofos. Logo,
alguns filósofos são céticos moderados.
Silogismo inválido porque não segue a parte mais fraca. Corrigido, dá origem a
um silogismo de 4.ª figura, modo EIO:
ATIVIDADE 3
crítico.
LÓGICA PROPOSICIONAL
EXERCÍCIOS
Operadores verofuncionais
empirista.
Conjunção PQ P e Q. Descartes é racionalista
e
Hume é empirista.
Disjunção PQ P ou Q. Descartes é racionalista ou
Hume é empirista.
Uma proposição simples é aquela que não possui conetiva ou operador lógico,
ou seja, é a proposição que não é abrangida pela negação, conjunção,
disjunção, pelo condicional ou pelo bicondicional.
4. O que é uma proposição composta?
Uma proposição composta é a proposição que possui pelo menos uma conetiva
ou operador lógico.
P Q
Proposição simples: P
Proposição simples: Q
proposição: (P Q) P
1. (P Q) (P Q)
Para a proposição ser verdadeira, é suficiente que P seja verdadeiro (outra
hipótese ainda era Q ser verdadeira).
3. P [(P Q) Q)]
Para a proposição ser verdadeira, é suficiente que a proposição P seja
verdadeira (outro caso possível era o de a proposição Q ser verdadeira).
A A
V F
F V
falso que P»). P será verdadeira se P for falsa e P será falsa se P for
uma proposição.
como P.
Por sua vez, uma dupla negação de P, P, equivale a P ‘P’, porque, se a
da negação.
P Q P Q
V V V
V F F
F V F
F F F
P Q P Q
V V V
V F V
F V V
F F F
A disjunção inclusiva de duas proposições, P e Q, expressa-
inclusiva, P Q, é verdadeira quando pelo menos uma das frases disjuntas for
e B.
falsas. Ou então:
É suficiente uma disjunta ser verdadeira para que a disjunção inclusiva seja
verdadeira.
O que verificamos a partir desta afirmação? Que a afirmação apenas será falsa
não podem ser ambas verdadeiras. Por exemplo, atenta na seguinte proposição
disjunta exclusiva:
verdadeira ou Q é verdadeira.
P Q P Q
V V V
V F F
F V V
F F V
então B»).
Assim:
Mas já não é a mesma coisa que afirmar «Se é peixe, então é sardinha», porque,
ser falso.
Fico, na condição de
Todas estas afirmações simbolizam-se da mesma forma, P Q, sendo «P: ficas» e «Q:
fico», traduzindo-se assim por «Se ficas, então fico». Se reparar, o consequente surge
sempre do antecedente para o consequente. Para não se enganar, uma boa maneira
dependente do antecedente.
P Q P ↔ Q
V V V
V F F
F V F
F F V
se Q».
Pela análise da tabela, podemos constatar que o bicondicional apenas é verdadeiro
então A)», a qual se usa para as situações em que «A» e «B» são simultaneamente
permutar-se sem que haja alteração do valor de verdade da proposição. Neste aspeto,
II
3. É falso que, se a que a Mona Lisa não é bela, então a arte não precisa da beleza.
É falso que (se não P, então não Q).
¬ (¬P ¬Q)
Sem igualdade económica, não há paz social, e, não havendo esta, o Estado periga.
Q: «Há segurança.»
R: «O Estado periga.»
P: Os touros sofrem.
Esta mesma proposição pode ainda ser simplificada para o seguinte modo:
P V Q
P Q
P: A alma é material.
corpo.
P (Q R)
III
Tabelas de verdade
1.1. P (Q P)
P Q P (Q P)
V V V F V F F
V F V F F F F
F V F F V V V
F F F F F F V
1.2.P (Q Q)
P Q P (Q Q)
V V F F V F F
V F F F F F V
F V V V V F F
F F V V F F V
1.3. P (Q Q)
P Q P (Q Q)
V V F F V V F
V F F F F V V
F V V V V V F
F F V V F V V
V V V V F F F
V F V V V F F
F V F F F F V
F F F V V V V
1.5. (P Q) P
P Q (P Q) P
V V V V V V V
V F V F F V V
F V F F V V F
F F F F F V F
1.6. (P Q) (P Q)
P Q (P Q) (P Q)
V V F F V V V V F F
V F V F F F V V V V
F V F V V V V F F F
F F F V V F V F F V
V V V V V V F V V V F
V F V V F V F V F V V
F V F V V V V V V V F
F F F F F V V V F V V
IV
P Q P ¬Q ¬Q |= P
V V F F F V
V F V V V V
F V V F F F
F F V V V F
EXERCÍCIOS
1.3. A lógica forma é inútil por ser abstrata, não se ocupa de contextos práticos.
Todos os corvos observados até hoje são pretos. Logo, todos os corvos são pretos.
Todos os corvos até agora observados são negros. Logo, o próximo corvo
observado será negro.
Lorenzo Valla, On Pleasure, Nova Iorque, Abaris Books, 1977, pp. 219-
exemplifica.
Trata-se de uma generalização por indução. Para que estes argumentos sejam
bons, a amostra expressa pela premissa deve ser ampla e representativa.
4. «Podemos verificar que existe uma grande semelhança entre a Terra que
habitamos, e os outros planetas, Saturno, Júpiter, Marte, Vénus e Mercúrio.
Como a Terra, todos giram em torno do Sol, embora a distâncias e períodos
diferentes. Como a Terra, recebem toda a sua luz do Sol. Como a Terra,
vários rodam em torno do seu eixo e, desse modo, têm também a sucessão
dos dias e das noites. Alguns têm luas, que servem para lhes dar luz na
ausência do Sol, como a nossa Lua faz para nós. Como a Terra, estão todos,
nos seus movimentos, sujeitos à mesma lei
da gravitação universal. Com base nestas semelhanças não é irracional pensar
que esses planetas, como a nossa Terra, sejam habitados por vários tipos de
criaturas vivas.»
Thomas Reid, Essays on the Intellectual Powers of Man, Cambridge, John Bartlett, 1850, p. 16.
6. A esmagadora maioria das nozes deste saco que parti até agora estava
estragada. Portanto, a próxima noz que tirar do saco também estará estragada.
2. Há vários anos que tenho lucro com ações da empresa X. Vou continuar a
comprar ações da empresa X e o meu lucro aumentará.
Trata-se de um argumento indutivo com uma amostra pouco lata, mas relevante
pela relação entre o conteúdo das premissas e o da conclusão. No entanto,
omite conhecimentos significativos para avaliar a conclusão, nomeadamente a
evolução da empresa X e as tendências gerais da economia e da bolsa. Essa
omissão torna o argumento difícil de aceitar.
Que haja uma correlação entre fumar e ter cancro é, hoje em dia, consensual.
Mas isto não pode levar-nos a concluir que todos os que fumam têm ou terão
cancro do pulmão. A correlação não é necessária. O argumento comete a
falácia da generalização apressada ou inadequada.
MÓDULO 3
1. Petição de princípio.
2. Falso dilema.
6. Boneco de palha.
II
III
1.Sou contra a pena de morte, porque a pena de morte tira a vida a uma pessoa.
a)Petição de princípio.
b)Ad hominem.
c)Apelo à ignorância.
d)Boneco de palha.
a)Derrapagem.
b)Falso dilema.
c)Apelo à ignorância.
d)Petição de princípio.
a)Ad hominem, porque ataca-se a oposição em vez da tese que esta defende.
d) Falso dilema, porque se assume que a oposição só tem duas opções, dizer
que o governo é propaganda ou nada dizer, quando há outras opções.
a)Falso dilema.
b)Boneco de palha.
c)Ad hominem.
d)Derrapagem.
a)Ad hominem, porque apresentam uma objeção irrelevante para atacar o que
os defensores da eutanásia dizem.
b)Falso dilema, porque sugere que tem de se optar entre ser a favor ou
contra a eutanásia.
B: – O quê, não me digas que cumpres sempre a lei? És daqueles que nunca
anda a mais de 120 na autoestrada? Não me digas que nunca andaste a
mais de 120 na autoestrada!
b)Ad hominem.
c)Boneco de palha.
d)Apelo à ignorância.
9. Não há uma ligação clara entre fumar e cancro de pulmão, apesar do que
os médicos dizem e de anos de estudos científicos. Portanto, fumar não faz mal
aos teus pulmões.
a)Ad hominem.
b)Petição de princípio.
c)Apelo à ignorância.
d)Falso dilema.
b) Bola de neve, porque se tenta refutar que se deva aprovar leis contra as
armas automáticas derivando daí consequências cada vez mais
inaceitáveis.
1. Não está provado que o Pai 2. Não está provado que o réu não é
Natal não existe; logo, o Pai Natal culpado; logo, o réu é culpado.
existe.
1.2. Considere a forma dos dois argumentos. Que ilação devemos tirar acerca
da diferença entre lógica formal ou dedutiva e lógica informal?
Os argumentos têm a mesma forma lógica. Contudo, isso não impede que um
dos argumentos seja válido – o argumento 2 – e o outro inválido ou
falacioso. Um argumento de tipo informal e válido pode ter a mesma forma
lógica que um argumento informal inválido. Ora, um argumento dedutivo
inválido não pode ter a mesma forma lógica que um argumento dedutivo válido.
Neste último caso, se a forma do argumento é válida, então premissas
verdadeiras justificam e garantem conclusões verdadeiras. Daqui se retira uma
importante ilação sobre a diferença entre argumentos dedutivos e não
dedutivos: a validade dedutiva depende inteiramente da forma lógica dos
argumentos; mas a validade indutiva não depende inteiramente da forma
lógica dos argumentos.
Não acredito que tenha ouro no meu terreno. Nunca tive notícia de haver ouro
por estas bandas e em terrenos deste tipo não é hábito encontrar ouro. Além disso,
já abri poços e caboucos e nunca vi ouro nenhum.
Não. As premissas não garantem a conclusão de que não há ouro nos terrenos
em questão.
V
Identifique as falácias informais cometidas.
1.Não podes ver esse filme. Ainda não tens idade para isso.
2. Luís: Penso que as pessoas não devem usar perfumes nem sprays. São
péssimos para o ambiente.
Maria: Então queres que as pessoas andem a cheirar mal e com cabelos que
parecem mato?
Boneco de palha. Deturpa-se a posição de Luís para mais facilmente a tentar atacar.
4.O meu pai diz-me que não devo mentir. Ele diz que mentir é errado
porque leva a que as pessoas deixem de confiar umas nas outras. Mas eu já
ouvi o meu pai
mentir. Às vezes ele telefona para o trabalho a dizer que está doente, quando
não está, de facto, doente. Portanto, mentir não é errado – o meu pai apenas não
gosta que eu minta.
5.Advogado – João afirma que o meu cliente cometeu o crime. Contudo, João
é um bêbado inveterado, portanto, o seu testemunho de João não tem valor
algum.
7.A razão pela qual este produto tem muita procura é porque muita e muita
gente o quer ter.
10. Não existem presos políticos neste país, mas somente cidadãos que
foram condenados por atividades políticas não permitidas pela lei.
Petição de princípio. Não existem presos políticos porque não existem presos
políticos.
11. Os céticos tentaram sem sucesso durante séculos provar que a
reencarnação é um mito. Portanto, devemos concluir que a
reencarnação é um facto.
Apelo falacioso à ignorância. Não é pelo facto de não ter prova de que a luz
se apaga que se pode concluir que não se apaga.
1. O que é a retórica?
A retórica é habitualmente definida como a arte da persuasão.
2. O que entende Aristóteles por retórica?
Aristóteles entende-a sobretudo como estudo do método da persuasão. Ela
é a faculdade de descobrir e considerar o que, para cada questão, pode ser
adequado para persuadir.
3. Porque se justifica o estudo da retórica?
O estudo da retórica justifica-se porque argumentar é tentar persuadir e
convencer, encontrar formas de obter a adesão a certas ideias e opiniões.
Tentamos persuadir os outros, e outros procuram fazer o mesmo. Na vida
prática, em processos comunicativos concretos, a argumentação destina-se a
convencer e a ganhar a adesão do interlocutor.
4. Qual é o domínio de atuação da retórica?
O campo da argumentação retórica é o verosímil, o provável, o controverso
e o discutível, e não o necessariamente verdadeiro. A retórica pretende
descobrir os meios que, relativamente a qualquer argumento, podem
persuadir um dado auditório. Procura fazer aceitar teses prováveis, que
podem ser controversas, verosímeis ou convincentes. É, por isso, «a técnica
ou a arte do verosímil».
5. O que entende Aristóteles por ethos?
O ethos é uma «prova» ou dispositivo retórico baseada no caráter do orador.
O orador tenta persuadir o auditório proferindo o discurso de maneira a
criar nele a impressão de que tem um caráter que o torna digno de crédito,
valendo-se da sua experiência no assunto, da sua reputação e da qualidade das
fontes e informações em que se apoia. É um apelo à credibilidade.
6. O que é o pathos?
É uma «prova» ou dispositivo retórico centrado no auditório. O orador tenta
persuadir despertando pelo discurso no auditório sentimentos e emoções que o
tornam recetivo ao que está a ser dito.
7. O que carateriza o logos?
É uma «prova» ou dispositivo retórico baseado no discurso. Apela à
racionalidade e capacidade lógica do auditório. Se o orador tenta persuadir
procurando apresentar razões em defesa de um determinado ponto de vista
(e não tentando despertar certas emoções ou transmitir a imagem de
credibilidade pessoal), então estamos no plano do logos.
MÓDULO 3
Filosofia e racionalidade argumentativa
UNIDADE 2
Argumentação e retórica
CAPÍTULO 4
Argumentação e filosofia
EXERCÍCIOS
I
1. Analise as afirmações seguintes sobre a diferença entre persuasão
e manipulação. Selecione, de seguida, a alternativa correta.
A – 1 e 2 falsas; 3 e 4 verdadeiras.
B – 1 verdadeira; 2, 3 e 4 falsas.
C – 1 e 3 verdadeiras; 2 e 4 falsas.
D – 4 verdadeira; 1, 2 e 3 falsas.
2. A manipulação é
A – A consequência necessária da
da persuasão.
C – Uma forma de argumentação que nada tem a ver com as estratégias persuasivas.
D – Uma forma de argumentação que se centra exclusivamente nas
caraterísticas do auditório.
3. A transformação da persuasão em manipulação é facilitada por
A – Fatores estritamente
emocionais. B – Fatores
estritamente cognitivos.
A – 1 e 2 falsas; 3 e 4 verdadeiras.
B – 1 verdadeira; 2, 3 e 4 falsas.
C – 3 verdadeira; 1, 2 e 4 falsas.
D – 4 verdadeira; 1, 2 e 3 falsas.
5. A manipulação
do orador.
verdadeiras. F – Só a alínea B é
verdadeira.
6.Temos capacidade de raciocinar, mas há raciocínios que temos dificuldade
em acompanhar e compreender porque não dominamos o assunto em causa.
Esta caraterística
A – Impede a persuasão
racional. B – Facilita a
manipulação.
A – 1 e 2 falsas; 3 e 4 verdadeiras.
B – 1 verdadeira; 2, 3 e 4 falsas.
C – 3 verdadeira; 1, 2 e 4 falsas.
D – 1 e 4 verdadeiras; 2 e 3 falsas.
1. Para Platão, a retórica não é uma arte nem uma forma de persuasão.
B – 1, 2, 3 e 4 verdadeiras;
C – 3 verdadeira; 1, 2 e 4 falsas.
D – 1, 2 e 3 verdadeiras; 4 falsa.
11. Platão não considera que a retórica dos sofistas seja uma arte, entre
outras razões, porque
auditório.
C – Faz com que o auditório acredite saber o que ignora.
D – As alíneas anteriores são todas falsas.
verdadeiras.
1. Não é uma arte porque o seu uso nos afasta da verdade e do bem.
3. Não é uma arte porque o desprezo pela verdade é um mal que nos
afasta do bem.
A – 1 e 2 falsas; 3 e 4 verdadeiras.
B – 1, 2, 3 e 4 verdadeiras;
C – 3 verdadeira; 1, 2 e 4 falsas.
D – 1, 2 e 3 verdadeiras; 4 falsa.
limitações cognitivas.
indubitáveis.
E – As alíneas A e B são
verdadeiras. F – As alíneas A e C
são verdadeiras.
2. O que é o conhecimento?
O conhecimento é uma relação entre o sujeito, quem conhece, e um objeto,
aquilo que é conhecido.
EXERCÍCIOS
4.Defende que basta que uma crença seja verdadeira para haver
conhecimento.
A – 1 e 2 falsas; 3 e 4 verdadeiras.
B – 3 verdadeira; 1, 2 e 4 falsas.
C – 1 e 3 verdadeiras; 2 e 4 falsas.
D – 2 verdadeira; 1, 3 e 4 falsas.
3. Analise as afirmações seguintes sobre definição tradicional de
conhecimento. Selecione, de seguida, a alternativa correta.
A – 1 e 2 falsas; 3 e 4 verdadeiras.
B – 3 verdadeira; 1, 2 e 4 falsas.
C – 1 e 3 verdadeiras; 2 e 4 falsas.
D – 2 verdadeira; 1, 3 e 4 falsas.
1. João sabe que chove se está a nevar. De acordo com a noção tradicional
de conhecimento, esta proposição
incrível.
5.Para saber que P, é necessário ter boas razões para crer que P. Esta
afirmação significa que
A – É um conhecimento.
conhecemos.
A – 1 e 2 falsas; 3 e 4 verdadeiras.
B – 3 verdadeira; 1, 2 e 4 falsas.
C – 2 e 3 verdadeiras; 1 e 4 falsas.
D – 2 verdadeira; 1, 3 e 4 falsas.
C – Muitas vezes tomamos como suficiente uma condição que é apenas necessária.
D – As nossas crenças, por mais fortes e convictas que sejam, não fazem de
certas proposições um conhecimento.
E – As alíneas A, B e C são
verdadeiras. F – As alíneas C e D
são verdadeiras.
11. Analise as afirmações seguintes sobre as condições necessárias e
suficientes do conhecimento proposicional. Selecione, de seguida, a
alternativa correta.
2. Supor que uma proposição é verdadeira não chega para saber que é
verdadeira.
3. Não pode haver crença sem haver conhecimento porque para saber
primeiro há que acreditar.
A – 1 e 2 falsas; 3 e 4 verdadeiras.
B – 3 verdadeira; 1, 2 e 4 falsas.
C – 2 e 3 verdadeiras; 1 e 4 falsas.
D – 1, 2 e 4 verdadeiras; 3 falsa.
factivas. E – Só alínea A é
verdadeira.
Este exemplo
A – Mostra que podemos saber que algo é falso, mas não podemos
conhecer falsidades.
B – Mostra que a crença é apenas uma condição necessária para o
conhecimento. C – Mostra que podemos ter crenças verdadeiras justificadas
por mero acaso.
D – Uma crença verdadeira não é sinónimo de conhecimento.
3. É possível que um sujeito tenha uma crença verdadeira e essa crença não
seja um conhecimento.
A – 1 e 2 falsas; 3 e 4 verdadeiras.
B – 3 verdadeira; 1, 2 e 4 falsas.
C – 1, 2 e 3 verdadeiras; 4 falsa.
D – 1, 2 e 4 verdadeiras; 3 falsa.
16. Acredito que é verdade que amanhã o Sol vai nascer. Logo, é verdade que
o Sol vai nascer.
conhecimento.
C – Verdadeira, porque exige que o sujeito tenha razões para acreditar que a
crença é verdadeira.
D – Falsa porque, segundo Gettier, é possível que seja apenas por sorte que
uma crença seja verdadeira e esteja justificada.
3. É possível que um sujeito tenha uma crença verdadeira e essa crença não
seja um conhecimento.
A – 1 e 2 verdadeiras; 3 e 4 falsas.
B – 3 verdadeira; 1, 2 e 4 falsas.
C – 1, 2 e 3 verdadeiras; 4 falsa.
D – 1, 2 e 4 verdadeiras; 3 falsa.
verdadeiras. B – Uma dada crença pode ser justificada mediante uma cadeia
infinita de crenças.
Rute vê Hélia com a mãe numa loja de roupa. Vê também que Hélia compra um
fato de banho cor-de-rosa. Infere daí que Hélia vai aparecer na praia no fim de
semana com esse fato. Acredita com boas razões que Hélia vai aparecer
com esse fato, porque gosta de factos de banho dessa cor. A proposição
formulada por Rute é a seguinte:
Hélia vai aparecer no fim de semana na praia com um fato de banho cor-de-rosa.
Rute tem uma crença verdadeira. Essa crença é justificada porque basta ver que
Hélia traz esse fato vestido e que o comprou para ir à praia. Mas suponhamos
agora que Hélia não gosta de factos daquela cor e que foi a mãe que a obrigou a
comprá-lo sob pena de não ir à praia no fim de semana. A crença de Rute
continua a ser uma crença verdadeira justificada – verdadeira, porque era sua
crença que Hélia iria à praia e, na verdade, de facto, foi; justificada porque
comprou o fato para poder ir à praia. Mas podemos dizer que Rute sabia que
Hélia iria à praia com o referido fato de banho? Não. A verdade da crença é o
resultado de uma coincidência. A razão que a leva a pensar que Hélia
aparecerá na praia com um fato de banho cor-de-rosa é diferente da razão
pela qual Hélia foi à praia com um fato de banho cor-de-rosa. Rute poderia
ter pensado que Hélia queria aparecer com um novo fato de banho, mas na
verdade foi a mãe que quis, provavelmente farta de ver a filha a usar sempre o
mesmo fato de banho.
2.João não sabe nada de futebol, mas gosta de falar sobre tudo e mais
alguma coisa. Certo dia, na véspera de um jogo entre o Benfica e o
Sporting, afirma que o Benfica vai ganhar. Quando lhe perguntam por que
razão acredita nisso, responde: Porque sim! Acontece que o Benfica ganha ao
Sporting. João teve por conseguinte uma crença verdadeira. Será que
podemos dizer que possuía um conhecimento desse facto, que sabia que
o Benfica ia ganhar?
Uma crença verdadeira não é sinónimo de conhecimento. Com efeito, haveria
conhecimento ou crença verdadeira justificada se argumentasse dizendo que
em 20 jogos do campeonato o Benfica empatou 4 e não perdeu nenhum, que o
Sporting vai jogar sem alguns titulares importantes, que uma vitória dá um
avanço importante na disputa do título, etc. O caso de João ilustra que o
conhecimento não se pode confundir com a simples opinião ou com
palpites, mesmo que corretos.
Tenho uma crença. Esta crença é verdadeira e está justificada. Contudo, revela-
se verdadeira por acaso porque a razão para a julgar verdadeira deve-se a uma
feliz coincidência. Julgo que sei, mas estou enganado. Assim, como diz
Gettier uma crença verdadeira pode estar justificada e não constituir contudo
conhecimento.
2.Por que razão é importante que a base do sistema seja uma verdade
absolutamente indiscutível?
95
devidamente fundamentadas, devemos considerar (provisoriamente) como falso o
que, por pouco que seja, for duvidoso. Só será verdadeiro o que for impossível
ser falso.
Consiste em provar que só um ser perfeito pode ser causa da ideia que o representa.
Provando que Deus não pode enganar, apercebe-se de que podemos confiar nas
operações da razão. O critério da evidência é fundamentado de modo que aquilo
que considero claro e distinto – evidente – é e continuará a ser claro e distinto. Por
outro lado, supera o solipsismo, dado que descobre uma existência que não
depende de si.
Descartes apercebe-se de que há ideias das coisas que não são produzidas pelo
sujeito pensante. Existindo, devem ter uma causa: as próprias coisas sensíveis. Esta
propensão ou crença natural é legítima e fundada, dado que Deus, a quem a
devo, não me engana.
O que não passa no 1. Os sentidos não são dignos de confiança quanto às informações
exame da dúvida quer sobre as qualidades das coisas sensíveis quer sobre a
metódica/hiperbólica existência dessas mesmas coisas.
2. Deus existe.
Mas sou a causa desta ideia? Sou o seu autor? Não, porque ela
representa mais perfeição do que a que possuo e poderia
causar. Logo, só um ser perfeito é causa da ideia de perfeito.
Quem é esse ser? É Deus. Logo, Deus existe.
A importância da 1. Afasta-se a desconfiança no funcionamento correto do
existência de nosso entendimento.
Deus como ser
Provado que Deus não pode enganar, podemos confiar nas
perfeito
operações do nosso entendimento/razão. O critério da
evidência é fundamentado de modo que aquilo que considero
claro e distinto – evidente – é claro e distinto, absolutamente
indubitável.
I
1. Qual é o objetivo do pensamento de Descartes?
4.Que resultados atinge Descartes com os argumentos das ilusões dos sentidos e dos
sonhos?
Com estes argumentos, Descartes mostra que os sentidos não são fontes fidedignas
de conhecimento e que é possível duvidar da existência das coisas sensíveis. Em
suma, que nem a crença na fiabilidade dos sentidos nem a crença na existência do
mundo exterior são indubitáveis.
Descartes mostra que nem as verdades de razão nem as verdades sensoriais, isto é,
que nem as proposições a priori nem as proposições a posteriori são indubitáveis e,
portanto, que aparentemente nem umas nem outras constituem o ponto de
partida do conhecimento.
Não. A dúvida cética tem por objetivo mostrar que o conhecimento não é
possível. A dúvida cartesiana tem o objetivo oposto, mostrar que há conhecimento,
isto é, verdades indubitáveis.
Porque há pelo menos uma verdade, «penso, logo, existo», que resiste a todas as
dúvidas, mesmo as mais radicais. Essa verdade é justificada pela própria dúvida.
Quando duvidamos, estamos a pensar e, se pensamos, somos necessariamente alguma
coisa. Este é um conhecimento que nenhum cético consegue abalar.
Deus tem duas funções principais: garantir a fiabilidade das nossas faculdades (razão
e sentidos) e a existência do mundo físico, isto é, recuperar o que tinha sido posto
em causa pela dúvida metódica.
13. Tente criticar o argumento que Descartes usa para provar a existência de
Deus como causa da ideia de perfeito (também conhecido como argumento
da marca).
O princípio no qual se baseia o argumento – tem de haver pelo menos tanta realidade
na causa de algo como no efeito – é contestável. Nesta ordem de ideias, a vida só
poderia ser causada por coisas vivas. Ora, os cientistas afirmam hoje em dia que a
vida evoluiu a partir de matéria inanimada. E não se vê como pode a existência de
Deus ser uma evidência tão
clara e distinta como a do sujeito pensante.
14. Só Deus garante que as minhas ideias claras e distintas são objetivas e
verdadeiras. Ora, foi partindo de ideias claras e distintas – Existo como
substância pensante, sou imperfeito – que Descartes provou a existência de um
Deus em que podia confiar, de um Deus que é o garante de que, quando penso clara e
distintamente algum objeto, não me engano. Não há algo de falacioso no
raciocínio de Descartes?
II
1
«Ora, depois de o conhecimento de Deus e da alma ter garantido a certeza dessa
regra, é fácil compreender que os sonhos que imaginamos não devem de modo
algum fazer-
nos duvidar da verdade dos pensamentos que temos quando acordados. [...] Todas as
nossas ideias ou noções devem ter algum fundamento verdadeiro; porque não
seria possível que Deus, que é inteiramente perfeito e verídico, as tivesse posto em
nós sem isso.»
René Descartes, Discurso do Método, Parte IV, Lisboa, Ed. Sá da Costa, 1981, p. 33
Orientações:
Mas como posso estar certo de que o mundo existe? Como recupera Descartes a
crença na existência do mundo exterior? Concebo clara e distintamente que sou uma
substância pensante, que Deus existe e não me engana e que posso confiar no meu
entendimento quando concebe que as coisas sensíveis são extensas. A minha razão,
por si só (a priori), permitiu-me conhecer tudo isso de modo indubitável a partir
do Cogito.
O problema da existência do mundo, no entanto, não pode ser resolvido dessa forma
pelo nosso entendimento. O máximo que a razão nos pode assegurar é da
existência e veracidade divina. O que nos leva a crer na existência do mundo é
um sentimento obscuro, embora seja, segundo Descartes, uma certeza intensa na
qual devemos confiar. Certas sensações que eu experimento acontecem contra a
minha vontade. Não sou o seu autor, pois então acontecem quando eu quiser e como
eu quiser. Essas sensações exigem a existência de algo de exterior a mim que seja a
sua causa. A crença de que são as coisas corpóreas ou sensíveis a causa das
sensações é uma crença irresistível, ou seja, uma espécie de ensinamento da
natureza e um instinto. De tal modo assim é que, para a considerar falsa,
teríamos de supor um Deus enganador, o que sabemos agora ser impossível.
Logo, é preciso «confessar» que as coisas corpóreas existem.
1 – Ser constituído por bases ou princípios que resistam a qualquer dúvida, isto
é, que sejam absolutamente evidentes (como diz a regra da evidência, não podem
suscitar a mínima suspeita de que sejam falsos).
Para que a dúvida metódica esteja intimamente ligada à primeira regra do método
que identifica o verdadeiro com o absolutamente verdadeiro, evidente ou
completamente claro e distinto (não há meio termo entre o verdadeiro e o falso),
ela terá de ser estrategicamente hiperbólica. Isto quer dizer o seguinte: qualquer
crença será considerada falsa se nela detetarmos a mínima fragilidade e qualquer
faculdade que usamos para conhecer será rejeitada como sempre enganadora se
alguma vez nos tiver enganado.
Mediante este princípio hiperbólico de aplicação da dúvida, Descartes pretende
separar radicalmente o verdadeiro do falso para encontrar conhecimentos que
sejam:
Descartes começa por examinar criticamente a ideia de que os sentidos são o ponto
de partida do conhecimento. Rejeita, contudo, que o conhecimento derive da
experiência sensível porque, aplicando a regra hiperbólica associada à dúvida, se
apercebe facilmente de que, enganando-nos algumas vezes, os sentidos não são
de confiar quanto às informações que nos dão sobre as propriedades das coisas
sensíveis. A rejeição do empirismo está desde já claramente estabelecida: o
conhecimento não começa com a experiência porquê não pode começar com o que
várias vezes nos ilude. O que me engana algumas vezes não merece o mínimo
crédito.
Parece absurdo pôr em causa a existência real de coisas físicas, mas lembremos que,
de acordo com a regra hiperbólica de aplicação da dúvida metódica, basta uma leve
e frágil suspeita – que não deixa por isso de ser suspeita e motivo de
desconfiança – para que uma crença seja declarada falsa. Baseado na dificuldade
em encontrar um critério que distinga de forma absolutamente clara o sonho da
realidade, o que vivemos acordados e o que vivemos a dormir, Descartes argumenta
que, por mais frágil que seja o argumento, temos razão para duvidar de que as coisas
físicas existam realmente. Não é verdade que vivemos tão intensamente o que nos
acontece durante os sonhos e o que nos acontece no
estado de vigília? O mundo físico pode ser um sonho, uma ilusão e não uma
realidade. A crença na sua real existência é colocada sob suspeita e
hiperbolicamente considerada falsa.
Deixemos o plano dos sentidos e das coisas sensíveis – o mundo físico ou sensível.
Parece que agora a dúvida encontrará algo que lhe resista completamente. Não é
verdade que objetos inteligíveis como os conhecimentos matemáticos gozam de uma
credibilidade a toda a prova. Parece insensato pôr em causa que 2 + 2 = 4. Mas
lembremos: basta uma frágil suspeita, uma razão minimamente perturbadora,
para pôr em causa certos conhecimentos. Debrucemo-nos sobre os mais simples.
Se puderem ser objeto de dúvida, mais facilmente o serão os mais complexos.
Acreditamos que 2 + 2 = 4. Parece inconcebível duvidar disto. Mas…. mas ouvi
dizer que Deus me criou e que, criando-me, criou o meu entendimento depositando
nele algumas verdades elementares como 2 + 2 =
4. Ora, também se diz do meu suposto criador que é omnipotente. Omnipotente?
Quer dizer que… é capaz de tudo. HUM… Se é capaz de tudo, o que me garante que
não tenha criado o meu entendimento destinando-o ao erro sem disso me
informar? O que me garante que Deus não seja um ser maligno que se diverte a
enganar-me e a baralhar o meu entendimento, levando-o a considerar verdadeiro o
que pode ser falso e falso o que pode ser verdadeiro. Esta hipótese parece
demasiado «metafísica», o cúmulo do absurdo, mas a verdade é que a suspeita se
instala. E, como basta suspeitar por pouco que seja de uma crença para a considerar
falsa, então devemos reconhecer que as supostas verdades matemáticas podem ser
falsidades.
«Penso, logo, existo» – cogito ergo sum – é a primeira e absoluta verdade que
encontramos. Dela, por mais que nos esforcemos não podemos duvidar. Será por isso
o primeiro princípio do sistema dos conhecimentos que dele iremos deduzir de
forma puramente racional. Temos lançada a primeira pedra do «edifício» dos
conhecimentos. O termo cogito costuma usar-se como abreviatura desta primeira
verdade.
MÓDULO 4
O conhecimento e a racionalidade científico-
tecnológica UNIDADE 1
Descrição e interpretação da atividade cognoscitiva
CAPÍTULO 3
Análise comparativa de duas teorias do conhecimento: o empirismo de David
Hume
Primeira conclusão cética: Não podemos provar que acontecimentos que supomos
Não é possível provar que causalmente relacionados estejam conetados necessariamente.
a ideia de conexão Como conhecer é explicar os factos estabelecendo uma
necessária é verdadeira. conexão necessária entre eles, o conhecimento objetivo do
mundo não é possível.
EXERCÍCIOS
Para Hume, a nossa ideia de inferência causal não tem uma origem objetiva, isto
é, na própria realidade, mas é o resultado de um mecanismo psicológico subjetivo a
que dá o nome de hábito. Não existe qualquer justificação, racional ou empírica,
para a nossa crença na existência de relações causais. É o hábito baseado em
repetições passadas, em que sempre que um fenómeno ocorria um outro se lhe
seguia, que nos leva a crer, isto é, ter a expetativa de que um é causa e o outro
efeito e que estão necessariamente conetados. Com base no hábito e não na razão
ou nos próprios objetos, acreditamos na repetição futura dos acontecimentos.
II
Parece uma proposição, não suscetível de muita discussão, que todas as ideias
são apenas cópias das nossas impressões ou, por outras palavras, que nos é
impossível pensar qualquer coisa que previamente não tenhamos sentido, quer
pelos nossos sentidos externos ou internos. Esforcei-me por explicar e demonstrar
esta proposição e expressei a esperança de que, mediante uma conveniente
aplicação dela, os homens possam alcançar uma maior claridade e precisão nos
raciocínios filosóficos do que a que, até agora, conseguiram obter.»
2. «Suponhamos que uma pessoa, embora dotada das mais fortes faculdades da
razão e reflexão, é trazida subitamente a este mundo; de facto, observaria de
imediato uma contínua sucessão de objetos e um acontecimento seguindo-se a
outro, mas nada mais seria capaz de descobrir. Não conseguiria, de início, através
de qualquer raciocínio, alcançar a ideia de causa e efeito, dado os poderes
particulares pelos quais as operações naturais são executadas nunca aparecerem
aos sentidos; nem é justo concluir, só porque um acontecimento precede outro, que
o primeiro é a causa e o segundo o efeito.
A sua conjunção pode ser arbitrária e casual. Pode não haver outro motivo para
inferir a existência de um a partir da ocorrência do outro.»
3. «Há alguns filósofos que imaginam que a todo o momento temos consciência
íntima daquilo a que chamamos eu; que sentimos a sua existência e a sua
continuidade na existência; e que estamos certos, para além da evidencia de uma
demonstração, da sua identidade e simplicidade perfeitas. A sensação mais forte
e a paixão mais violenta, dizem eles, em vez de nos distraírem dessa visão
apenas a fixam mais intensamente e fazem-nos considerar a sua influência sobre o
eu pela sua dor ou pelo seu prazer. Tentar fornecer uma prova mais completa disto
seria enfraquecer-lhe a evidência, uma vez que nenhuma prova pode ser derivada
de um facto do qual estejamos tão intimamente cônscios; e não há nada de que
possamos estar certos se duvidarmos deste facto.
Infelizmente todas estas afirmações positivas são contrárias a essa mesma
experiência que se invoca em seu favor; e não temos nenhuma ideia do eu da
maneira que está aqui explicada. Com efeito, de que impressão poderia
derivar esta ideia?»
Hume pensa que não temos conhecimento do eu, porque não temos qualquer
impressão que lhe corresponda. Temos consciência das nossas perceções, sensações
e sentimentos, pensamentos e emoções. Mas, por mais que procuremos, não
encontramos uma impressão que possa estar na origem da ideia de Eu. Sempre
que inspecionamos os conteúdos da nossa própria mente, descobrimos impressões
e ideias, de calor ou de frio, de claro ou escuro, de amor ou ódio, de prazer ou dor,
mas nunca encontramos nada que corresponda ao eu, que supostamente constitui a
sede dessas perceções. A mente, diz Hume, é uma espécie de teatro em que
várias perceções ocorrem sucessivamente. Contudo, a comparação com o teatro
não nos deve enganar, uma vez que são unicamente estas perceções que constituem
a mente e não temos a mais remota noção do lugar em que estas cenas são
representadas ou dos materiais de que são compostas.
Por outro lado, também não podemos estar certos da existência do mundo
exterior. Pensamos que existem objetos externos, que têm uma existência
contínua e independente de nós, porque temos certas perceções cuja origem
atribuímos a esses objetos. Mas será que podemos provar que esses objetos são
efetivamente a origem das nossas perceções? Hume pensava que não, porque a
nossa mente conhece unicamente as suas próprias perceções, isto é, as impressões e
ideias, e tanto umas como outras são estados internos, subjetivos, e não podem
constituir prova de que algo tem uma existência contínua e independente fora
de nós. É perfeitamente possível que essas perceções existam sem que lhes
corresponda qualquer objeto (prova-o as alucinações e os
sonhos). A aparente constância das coisas, o facto de que o que vemos hoje é
mais ou menos igual ao que vimos ontem, leva-nos a acreditar que têm uma
existência independente das nossas perceções. Esta crença não tem, no entanto,
justificação porque não temos experiência da conjunção constante entre os objetos e
as nossas impressões. O facto de não se poder justificar racionalmente a existência
do mundo exterior, no entanto, não implica que este não exista. Não podemos
conhecer a existência do mundo exterior, mas podemos acreditar que existe.
Trata-se de uma crença que, embora não seja racionalmente justificável, é tão
natural que devemos perguntar que razões nos levam a acreditar que o mundo
externo existe e não propriamente se ele existe.
III
A origem do conhecimento.
A possibilidade do conhecimento.
Os limites do conhecimento.
Ciência e metafísica
Descartes considera que a experiência, dados os erros dos sentidos, não pode ser
fonte credível de conhecimentos, melhor dizendo, as suas informações não podem
constituir (dado que muitas vezes são enganadoras) crenças básicas que possam
conduzir a outros conhecimentos. O saber constrói-se com base em ideias inatas
e, desde que siga um método correto e Deus garanta o normal funcionamento
da nossa razão, podemos alcançar verdades objetivas sobre o mundo. Esta rejeição
dos sentidos é uma convicção fundamental de Descartes e marca a sua orientação
claramente racionalista inspirada no modelo dedutivo das matemáticas.
Para Hume, todas as ideias têm uma origem empírica. Todos os nossos conteúdos
mentais são perceções. Estas são de dois tipos: impressões e ideias. As nossas ideias
são cópias das nossas impressões e por isso não há ideias inatas.
Quanto à objetividade das leis naturais defendida por pensadores não racionalistas
como Locke e Newton, o filósofo escocês argumenta que qualquer generalização,
baseando-se em factos passados e pretendendo valer para o que ainda não foi objeto
de experiência, é incerta. Nada podemos saber acerca do futuro porque nada nos
garante que o futuro seja semelhante ao passado. Não há conhecimento,
propriamente falando, do que ultrapassa a nossa experiência atual ou passada: o
que aconteceu não serve como fundamento seguro da previsão do que ainda
não aconteceu.
Ceticismo? Sim, no sentido em que o nosso conhecimento não é certo e seguro. Mas
uma coisa é o valor científico dos nossos conhecimentos e outra a sua utilidade
prática e vital: sabemos que os nossos «conhecimentos científicos» são mais
pretensão e desejo de segurança do que saber, mas não podemos viver sem
essas sábias ilusões.
3. Os limites do conhecimento.
Descartes afirma que a razão apoiada na veracidade divina e nas ideias inatas
pode conhecer a realidade na sua totalidade ou, melhor dizendo, os princípios gerais
de toda a realidade: Deus, alma e mundo são realidades que podem ser
conhecidas.
4. Ciência e metafísica
A análise dos conteúdos da mente realizada por Hume condu-lo a uma posição
oposta à de Descartes. A sua teoria das ideias afirma que estas são cópias das
impressões e delas derivam. Não há ideias inatas. Com efeito, diz Hume, aqueles a
quem, por alguma razão, falta a impressão também nunca têm a respetiva ideia. Um
cego de nascença, que não tem, por exemplo, a sensação de vermelho, também
nunca tem a respetiva ideia.
Do mesmo modo, quando alguém nunca teve uma dada sensação, não tentamos
fazer com que a tenha a partir de uma ideia, mas pondo a pessoa numa situação em
que possa adquirir essa sensação. Tudo isto prova, pensa Hume, que não existem
ideias inatas e que todo o conhecimento tem origem, não na razão, mas na
experiência.
Há, no entanto, um ponto em que Hume e Descartes estão de acordo. Ambos pensam
que a experiência não pode ser a origem do conhecimento, se entendermos que só
as ideias de cuja verdade temos absoluta certeza são conhecimento. Esta
constatação leva Descartes a encontrar na razão a origem e o critério do
conhecimento. Para Hume, esta via está vedada pela recusa do inatismo e, portanto,
ao contrário de Descartes, pensa que só a experiência legitima as nossas ideias, sem,
no entanto, lhes conferir absoluta certeza, isto é, o estatuto de conhecimento, à
exceção dos domínios da matemática e da lógica.
Ceticismo? Sim, no sentido em que o nosso conhecimento não é certo e seguro. Mas
uma coisa é o valor científico dos nossos conhecimentos e outra a sua utilidade
prática e vital: sabemos que os nossos «conhecimentos científicos» são mais
pretensão e desejo de segurança do que saber, mas não podemos viver sem
essas sábias ilusões.
Descartes afirma que a razão, apoiada na veracidade divina e nas ideias inatas,
pode conhecer a realidade na sua totalidade ou, melhor dizendo, os princípios gerais
de toda a realidade: Deus, alma e mundo são realidades que podem ser
conhecidas.
MÓDULO 4
O conhecimento e a racionalidade científico-
tecnológica UNIDADE 2
O conhecimento
científico CAPÍTULO 2
Ciência e construção: validade e verificabilidade das hipóteses
3. O que é o indutivismo?
É a conceção segundo a qual o método indutivo é o método típico da ciência ou
o caminho que os cientistas seguem para explicar e prever os acontecimentos do
mundo.
10. Podemos dizer que para Popper uma teoria científica ou é verdadeira ou
falsa?
Não. Quando Popper diz que uma teoria é científica, não está dizer que é verdadeira
ou falsa, mas que podemos testar se é falsa ou não. Se provarmos que não é
falsa, nunca podemos dizer que o assunto está encerrado (que é verdadeira). Pode
vir a revelar-se falsa mediante outros testes. Assim, o termo falsificável aplicado a
uma teoria significa que a possibilidade de ser falsa está sempre em aberto.
EXERCÍCIOS
A ciência, para Popper, não precisa da indução nem para encontrar hipóteses e
teorias (bastam as conjeturas criativas do investigador) nem para as avaliar (tentar
falsificá-las é a forma de as testar).
Uma teoria corroborada é uma teoria que até agora resistiu às tentativas de
refutação, mas que apesar disso não pode ser declarada verdadeira. Por mais
provas que tenhamos, nunca podemos dizer que uma teoria é verdadeira. A
possibilidade de ser falsificada está sempre em aberto. Só as teorias que resistem
aos testes de falsificação sobrevivem, mas sempre ameaçadas pela possibilidade de
falsificação e, por isso, novas e melhores teorias ameaçam as teorias ainda
vigentes.
3
Esclareça em que consiste o critério de cientificidade de uma teoria para Popper.
Integre na sua resposta a referência ao verificacionismo e o conceito de graus de
cientificidade.
A refutabilidade é um critério de demarcação entre ciência e não ciência. Uma
teoria é científica se e só se for refutável ou falsificável. Uma teoria falsificável é uma
teoria que podemos descobrir que é falsa, mas não é necessariamente uma teoria
falsa. Trata-se de uma teoria de que se deduzem consequências ou predições
testáveis, isto é, passíveis de serem confrontadas com os factos. Se estas predições
se revelarem incompatíveis com os factos, a teoria diz-se falsificada, ou seja, o teste
a que foi submetida mostrou que é falsa. A perspetiva verificacionista é a doutrina
segundo a qual a verificação é um critério de demarcação entre ciência e não ciência
consiste em determinar o valor de verdade de uma teoria ou hipótese. Se não for
possível determinar de modo conclusivo que uma teoria é verdadeira ou falsa, não
estamos perante uma teoria científica. Popper opõe-se a esta doutrina.
1 – For falsificável;
2 – Correr bastantes riscos nos testes de refutação; e
3 – Superar os testes rigorosos destinados a falsificá-la.
4
Na sua primeira obra, A Lógica da Descoberta Científica, publicada em alemão em
1934, Popper defende que, apesar de as teorias científicas não poderem ser
verificadas nem mesmo tornadas prováveis, podem ser falsificadas pelos factos.
O método proposto e aconselhado por Popper pode ser entendido como uma
depuração do método hipotético-dedutivo, afastando qualquer referência à
verificação e à indução. Popper recusa a perspetiva verificacionista por
várias razões.
Karl Popper defende uma conceção de ciência que assenta na rejeição completa
da indução. O grau de confirmação de uma hipótese depende, segundo a
perspetiva indutivista, do número de casos observados que estão de acordo com ela.
Mas, segundo Popper, é impossível provar que todos os corvos são negros
(precisaríamos de observar todos os corvos em todos os lugares e em todos os
tempos), e isso deixa a proposição universal sempre por provar. Ora, segundo
Popper, isto tem consequências nefastas para a imagem da ciência. Não podendo
nenhum enunciado universal ser comprovado por qualquer número de observações
favoráveis que nos são possíveis, então a aplicação do critério da verificabilidade
acaba por transformar em não científicas – em teorias empiricamente não
verificáveis – as hipóteses que mais nos dizem em termos informativos sobre a
realidade. As leis da natureza aplicam-se a um número infinito de casos – a todos os
casos possíveis. Mas as nossas observações não são nem podem ser em número
infinito. Não devemos concluir então que, sendo científico igual a empiricamente
verificável – para o verificacionista –, os enunciados da ciência não são científicos
porque não são em rigor verificáveis? O critério da verificabilidade derrota-se a si
mesmo. Pretende verificar, mas acaba por nunca verificar.
A ciência, para Popper, não precisa da indução nem para encontrar hipóteses e
teorias (bastam as conjeturas criativas do investigador) nem para as avaliar (tentar
falsificá-las é a forma de as testar.
MÓDULO 4
2. Que critério usa Popper para justificar esse progresso ou avanço da ciência?
Usa o critério da verosimilhança. Uma teoria pode aproximar-se mais da verdade do
que outra. O progresso da ciência não é uma acumulação de teorias verdadeiras
porque nunca podemos estar certos da verdade de uma teoria. A verdade é um
ideal regulador.
17. Dado que são formas incompatíveis de ver o mundo, como carateriza Kuhn a
relação entre os paradigmas?
Os paradigmas são incomensuráveis.
A ciência evolui, mas é muito discutível dizer que essa evolução se faz de forma estritamente
racional e objetiva.
1 – Pela teoria dominante e pelas leis que estão associadas a essa teoria. O
paradigma newtoniano, dominante durante vários séculos, incluía as leis do
movimento descobertas por Newton e que explicavam o movimento de vários corpos
desde os planetas às marés.
Este paradigma fornecia regras para resolver problemas e investigar a natureza, para
usar os instrumentos científicos disponíveis (como o telescópio) e para avaliar se as
explicações ou respostas obtidas eram boas.
A constituição de um paradigma instaura a comunidade dos sábios (para Kuhn, a ciência é obra de
comunidades científicas e não de génios isolados) e define, não só o meio de solucionar
os problemas, mas também os problemas que convém resolver.
Sem um paradigma, não podemos falar de comunidade científica nem, por isso,
de ciência. Assim, o que distingue a ciência da não ciência não é, como pensam
os indutivistas, o facto de as teorias científicas poderem ser verificadas ou, como
pensa Popper, o facto de poderem ser falsificadas. O critério de demarcação reside
no facto de existir ou não num determinado campo de investigação um
paradigma aceite pela generalidade dos seus praticantes.
‒ Paradigma.
‒ Ciência normal.
– Ciência extraordinária.
‒ Progresso científico.
Então, o que decide a preferência pelo novo paradigma. Em última análise, fatores de
ordem subjetiva. Cada cientista interpreta à sua maneira os critérios objetivos
de preferência entre paradigmas e além disso não se devem esquecer fatores
sociológicos como o prestígio de um dado grupo de cientistas e interesses
económicos e sociais no advento de uma nova forma de ver o mundo.
Não podemos, segundo Kuhn, dizer que um novo paradigma nos aproxima
objetivamente mais da verdade do que o anterior. Podemos pensar que sim, mas não
prová-lo de forma objetiva. As revoluções científicas são mudanças de paradigma e
nada mais. E isto por mais que pensemos que novas teorias que conhecemos – a
teoria eletromagnética de Maxwell e a teoria química de Lavoisier, por exemplo –
explicavam melhor (e assim estavam mais próximas da verdade) a propagação
das ondas eletromagnéticas e a combustão do que as teorias anteriores.
3.Para Kuhn, a atividade científica desenvolve-se no interior de comunidades de
seres humanos que seguem uma determinada teoria, um dado modo de ver o mundo e
certas práticas de investigação. Que ligação existe entre a natureza da atividade
científica e a resistência à mudança?
4.Por que razão, para Kuhn, um novo paradigma não representa necessariamente um
avanço em relação ao paradigma anterior? Está de acordo?
Kuhn responde que não há um critério independente de cada paradigma para avaliar
se a atividade científica progride em direção à verdade ou não. Em tempos de ciência
normal, podemos definir critérios que nos permitem ver se a utilização do
paradigma nos encaminha para a verdade ou não. Por que razão é isto possível?
Porque cada paradigma é também constituído pelos critérios que avaliam a
relevância dos problemas e das soluções propostas. Cada paradigma é avaliado
pelos seus próprios critérios de avaliação.
Cada paradigma define que problemas devem ser investigados, como devem sê-lo e
como aferir os resultados. Por isso, não herda necessariamente os problemas do
paradigma anterior.
6. Por que razão é, para Kuhn, importante salientar que a atividade científica se
desenvolve no interior de comunidades de seres humanos que seguem determinadas
teorias, modos de ver o mundo e práticas de investigação?
Parece que não. O que significa esta tese de Kuhn? Que uma teoria é científica e
não pseudocientífica se for consistente com as teorias que prevalecem no
interior da comunidade dos cientistas. Contudo, podemos perguntar se não é
possível a um qualquer grupo reclamar que é uma comunidade científica. Assim, por
exemplo, a Sociedade de Investigação Internacional da Terra Plana pode reclamar ser
um grupo de cientistas que visam estabelecer como facto científico que a Terra é
plana e que a astronomia moderna não é senão uma fraude, um mito. Como
distinguir então a verdadeira ciência da pseudociência? Kuhn apresenta cinco
critérios que, independentemente das preferências pessoais dos cientistas, separam
uma boa teoria científica do que não o é. Esses critérios são:
Estes critérios são em grande parte racionais, não são estabelecidos pela
experiência, o que revela, apesar de tudo, que a ciência é uma empresa racional.