Manual de Formação Docente

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Manual

de formação
docente
Introdução à neuroeducação
Trabalho por projetos
Aprendizagem cooperativa
Avaliação formativa
Manual
de formação
docente
CONTEÚDOS

I Introdução à neuroeducação  5

II Trabalho por projetos  43

III Aprendizagem cooperativa  113

IV Avaliação formativa  157


Introdução à
neuroeducação
MARIO SERRANO E ANNA JUBETE
ÍNDICE
INTRODUÇÃO À NEUROEDUCAÇÃO

1 Pensando através dos sentidos 5 Neuroalimentação


A realidade entra nas salas de aula 9 A alimentação e o cérebro 32
Uma educação baseada no cérebro: a neuroeducação 11 Que nutrientes ajudam a desenvolver o cérebro? 32
O funcionamento do cérebro 13 Que alimentos se devem evitar? 34
Aplicação na sala de aula 35
2 A importância das emoções na aprendizagem
O que é a emoção? 15 6 Papel do sono no desenvolvimento do cérebro
Aplicação na sala de aula 18 É tão importante dormir? 36
Dormir melhora a aprendizagem 36
3 A atenção
Aplicação na sala de aula 37
Porque é que custa às crianças manter a atenção? 21
Aplicação na sala de aula 23 7 O trabalho integral das áreas cerebrais
O melhor modo de aprender 38
4 A aprendizagem e a memória
Aplicação na sala de aula 40
O que é que entendemos por aprendizagem? 26
Como é que as crianças aprendem nos primeiros ciclos do REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 41
Ensino Básico? 27
 Fomentando a memória a longo prazo 29
Aplicação na sala de aula nos primeiros ciclos do
Ensino Básico 30
1.  Pensando através dos sentidos
A REALIDADE ENTRA NAS SALAS DE AULA
Em 2011, a sala 26-100 do MIT (Instituto Tecnológico de Massachu-
setts), com capacidade para mais de 500 pessoas, encheu-se de
alunos, que se amontoavam inclusivamente pelos corredores, para
assistir à última aula do mítico professor de Física Walter Lewin,
conhecido no mundo inteiro graças à difusão das suas espetaculares
encenações através da Internet. Aos seus 75 anos, colocou-se sobre
um pêndulo de 5 metros, situado sobre o estrado, e balançou-se nele
à frente de todos os alunos. Ao cabo de 10 balanceamentos, o pro-
fessor desceu do pêndulo. Esta demonstração, realizada durante 11
anos nessa mesma sala de aula, evidenciava uma verdade física ine-
gável: as oscilações do pêndulo demoravam o mesmo tempo com ou
sem Lewin em cima, porque a oscilação é independente da massa
(Ron, 2011).
Durante os últimos 30 anos, o professor Lewin transmitiu aos seus
alunos que a Física podia ser uma matéria apaixonante e experi-
mentável.As suas aulas eram uma mistura de experimentos práticos
com a correspondente explicação do que foi demonstrado através
de fórmulas matemáticas. Assim, por exemplo, além da sua famosa
demonstração do pêndulo, para explicar o momento angular e a
inércia, pendurava uma roda de bicicleta numa corda e punha-a a
rodar.
O exemplo do professor Lewin não é único no mundo. Outros pro-
fessores de diferentes etapas educativas e de diferentes países do
mundo, compreenderam que o método dedutivo-transmissivo não
chega a integrar a aprendizagem corretamente na memória a longo
prazo. Mas, então, porque é que muitos dos alunos deste físico se
recordarão das suas aulas durante toda a vida? Sem dúvida, como
aponta Francisco Mora (2013):

«[...] porque isso significa ativar os códigos cerebrais


profundos herdados ao longo dos tempos em que
aprender e memorizar eram consequência da ativação
dos processos emocionais que criam a curiosidade
e, como consequência, abrir a janela da atenção
a espaços abertos a tudo aquilo que é útil e serve
à sobrevivência biológica».
ÇÕES MO
O que é importante para a aprendizagem? CE V

IM
PE

ENTO
Desde o início que as aprendizagens a nível cerebral, devem ini-
ciar-se através da observação, da manipulação e da experimen-
tação, em pleno contacto com a natureza e com os seus
elementos. Assim o determinam os códigos do cérebro, integra-
dos neste ao longo de todo o processo evolutivo. É imprescindí-
vel que a realidade entre nas salas de aula para ativar os códigos
que ativaram a curiosidade, a atenção e a aprendizagem dos
alunos e das alunas.

Graças ao contacto com o mundo real, as crianças começam a


12 13
aprender a partir da informação que os seus sentidos, as suas emo-
ções e as suas ações lhes proporcionam. A informação, que desde
pequenos captem e assimilem através dos seus sentidos e das expe-
riências que vivam, vão posteriormente formar os alicerces do pen-

EMOÇ
samento abstrato.

ES
ES

Õ
Õ
SENSAÇ
Sendo assim, a nossa tarefa como docentes, será preparar os nos-
sos alunos e as nossas alunas, paulatinamente, para que sejam

MU
capazes de dar resposta aos problemas que lhes surgem, tendo em N
DO L
REA
conta a realidade em que vivem, tanto a nível pessoal como social,
FIGURA 1.  A REALIDADE E A APRENDIZAGEM
académico e, posteriormente, profissional.
Mais concretamente, nos primeiros ciclos do Ensino Básico, o nosso
trabalho como profissionais da educação vai consistir em proporcio-  MA EDUCAÇÃO BASEADA NO CÉREBRO:
U
nar aos nossos alunos e alunas ambientes, contextos ou situações A NEUROEDUCAÇÃO
da realidade, através das quais possa «absorver» e recolher, como se Nós, os docentes, da mesma forma que sucede noutras profissões,
fosse uma esponja, todas as perceções e sensações que o rodeie. precisamos de uma base científica que sustente as decisões corres-
Será através dessa aprendizagem implícita, através do contacto pondentes à nossa prática educativa. Desta forma, uma educação
com a realidade, que se facilitará um constante processo de estabe- baseada no cérebro, a chamada neuroeducação, toma como base
lecer e reforçar as conexões neuronais para aprender e memorizar os conhecimentos que já se possuem sobre os processos cerebrais
aquilo que, posteriormente, servirá de substrato ao pensamento da emoção, da curiosidade, da atenção e da memória.
abstrato. Como docentes, conhecer estes processos cerebrais vai ajudar-nos
a potencializar e a melhorar as capacidades e os talentos das crian-
ças, a detetar défices nas capacidades de leitura, escrita, cálculo
«Uma criança não começa a aprender com ideias e com concei-
mental, etc. Mas também nos ajudará a compreender melhor certos
tos abstratos, mas sim com perceções, emoções, sensações e
aspetos, como o porquê de a emoção ser primordial na aprendiza-
movimento, obtidos do mundo sensorial e como reação ao
gem ou o porquê de não se poder chegar à abstração sem passar
mundo real» (Francisco Mora, 2013).
primeiro pela manipulação de objetos ou de materiais.
Assim, o objetivo da neuroeducação é estabelecer-se como uma
CURIOSIDADE
referência científica da educação que apoie a nossa prática
MEMÓRIA docente e que nos ajude, como professores, a que os nossos
alunos e alunas aprendam de uma forma mais eficiente,
agradável e duradoura.
EMOÇÃO
ATENÇÃO

O FUNCIONAMENTO DO CÉREBRO
O cérebro humano consta de três sistemas interconectados (Casa-
font, 2014):
14 O primeiro sistema cerebral, conhecido como «cérebro reptiliano», é 15
FIGURA 2.  NEUROEDUCAÇÃO aquele que permite manter as funções vitais básicas, como respi-
rar, dormir ou comer. O seu objetivo é garantir a sobrevivência do
Descobrir, entre outras questões, que a aprendizagem surge da indivíduo.
atenção sobre aquilo que estimula e gera prazer cerebral, pode aju- O segundo sistema cerebral é o chamado cérebro «mamífero»,
dar-nos a criar métodos didáticos e recursos que tenham como «emocional» ou «límbico», por se situar na zona límbica do cérebro.
objetivo despertar as emoções que, por sua vez, vão estimular a Dispõe de duas estruturas muito importantes para a aprendiza-
curiosidade e a atenção nos alunos. Hoje sabemos que obrigar a gem, o hipocampo e a amígdala cerebelosa. Enquanto a amígdala
memorizar não funciona, apesar de, noutras épocas, o castigo ter cerebelosa é responsável pelas emoções, o hipocampo encarrega-
sido utilizado como estímulo para aprender. -se de guardar na memória aquilo que possa ser relevante.
O terceiro e último sistema cerebral é o neocórtex, que é a parte do
Uma didática baseada nas neurociências vai implicar uma forma
cérebro que nos diferencia, a nós humanos, do resto das espécies.
de ensinar que está mais de acordo com a maneira como o
Dentro desta zona, o córtex pré-frontal, situado atrás do frontal,
cérebro humano aprende e também uma mudança na nossa
é o encarregado de levar a cabo as chamadas funções executivas,
tarefa como educadores.
que analisaremos mais adiante.
Assim, o cérebro humano dispõe de três sistemas que se encarregam
Devemos ter consciência da responsabilidade que temos como
de gerir a nossa sobrevivência e nos permitem planificar e tomar deci-
docentes relativamente ao que ensinamos e à forma como o
sões (fig. 3 da página seguinte).
fazemos, porque o que se ensina e como se ensina tem «a capacidade
de mudar os cérebros das crianças a nível físico e a nível químico, De que é que precisam estas estruturas cerebrais para se desenvolve-
anatomicamente e fisiologicamente, fazendo crescer umas sinapses rem corretamente?
ou eliminando outras e conformando circuitos neuronais cuja função a) De um ambiente psicológico rico em afetos e estímulos sensoriais.
se expressa na conduta» (Francisco Mora, 2013).
b) De uma alimentação equilibrada, com variedade de alimentos
Isto significa que as mudanças sinápticas do cérebro são fruto do ricos em ómega-3, ferro, zinco e magnésio.
ensino e a nossa obrigação, como docentes, é saber que a forma
como ensinamos tem tanta ou mais importância que aquilo que c) De um sono reparador.
ensinamos.
2. A importância das emoções
NEOCÓRTEX na aprendizagem
O QUE É A EMOÇÃO?
Alguma vez se questionou sobre o que é a emoção? Questionou-se se
existe alguma diferença entre emoção e sentimento? Uma possível
resposta a esta pergunta é-nos dada pela Dra. Rosa Casafont,
SISTEMA LÍMBICO
citando António Damásio (2006), diretor do Brain and Creativity Ins-
CÉREBRO REPTILIANO titute, quando nos refere que «a emoção se produz no cenário do
corpo e o sentimento no cenário da mente» (Casafont, 2014).
Segundo esta afirmação, podemos dizer que a emoção e o senti-
16 17
FIGURA 3.  SISTEMAS CEREBRAIS mento não são sinónimos, apesar de, algumas vezes, os utilizarmos
como tal.
É ao longo do primeiro ano de vida que o cérebro se vai desenvolver
de forma regulada. Os neurónios crescem e ramificam-se no córtex O que é que entendemos por emoção?
cerebral, estabelecendo-se uma grande quantidade de sinapses ou
A emoção é a resposta automática que o nosso corpo tem
conexões, até alcançar o seu ponto máximo à volta dos oito anos de
diante de um estímulo. Contudo, o sentimento surge quando se
vida (Casafont, 2014).
tem consciência dessa emoção ou estímulo.
A partir daí inicia-se uma fase de eliminação sináptica das uniões
não utilizadas e um reforço das conexões mais utilizadas. Nesta
especialização sináptica da cablagem cerebral vão influir as nossas
vivências afetivas, a alimentação, o sono, etc., assim como todos os
estímulos que recebemos do meio ambiente.
Desenvolveremos estes aspetos nos capítulos posteriores dado que,
nos primeiros ciclos do Ensino Básico, tem grande importância a
atenção às necessidades psíquicas, emocionais e físicas das crianças.

Reação a Consciência
um estímulo da emoção

EMOÇÃO SENTIMENTO

FIGURA 4. EMOÇÃO E SENTIMENTO


Como educadores é importante conhecer este processamento emo- 2. Desenvolver as competências emocionais dos alunos (consciência
cional que se dá no cérebro para ter consciência de que o ato de emocional, regulação emocional, autonomia emocional, compe-
aprender está muito vinculado a estas respostas automáticas cha- tência social e competências para a vida e o bem-estar) para os
madas emoções. Como indica o Dr. Mora, sem emoção não haverá ajudar a gerir os seus sentimentos.
razão, já que o binómio cognição-emoção é indissociável. Assim,
Uma vez analisada a importância das emoções na aprendizagem,
é fundamental entender que ambos devem atuar juntos para que o
vamos conhecer o papel que desempenham a nível neuronal. Desta
processo ensino-aprendizagem seja efetivo.
forma, é necessário ter presente que o cérebro funciona de forma
Qualquer estímulo que o nosso corpo percebe através dos sentidos é interconectada, apesar de o processamento emocional se realizar
processado, inicialmente, pelo «cérebro emocional» ou «sistema lím- principalmente no sistema límbico. Para conhecer pormenorizada-
bico» que, como vimos, é um dos três sistemas que compõem o cérebro. mente como é que o cérebro processa as emoções, deveremos conhe-
cer algumas das estruturas implicadas (Casafont, 2014; Romo, 2014):
Qualquer ação que peçamos aos alunos para realizarem na sala de
18 aula estará condicionada por esta resposta emocional automática. A mígdala cerebelosa: estrutura situada no sistema límbico,
 19
Pedidos para estarem atentos na aula, recuperarem na memória a encarregada de realizar uma avaliação emocional daquilo que
informação trabalhada, serem curiosos diante das novas aprendiza- percebemos, que intervém em processos de memória, atenção e
gens, etc, isto é, para aprenderem, estarão condicionadas por este tomada de decisões ao manter interações sociais.
componente emocional.
Hipotálamo: estrutura situada no sistema límbico com a função

de mostrar a expressão corporal do estado emocional.
UTILIZAR A
CURIOSIDADE INFORMAÇÃO Tálamo: também está situado no sistema límbico e a sua função

principal é possibilitar que a nossa mente tenha consciência da
MEMORIZAR
informação sensorial e emocional, já que mantém um diálogo
APRENDER bidirecional com o córtex cerebral.
EMOÇÕES
PRESTAR Hipocampo: esta estrutura do sistema límbico conecta a amígdala

ATENÇÃO
cerebelosa com o hipotálamo e, além disso, é a chave para a experi-
mentação de emoções quando recuperamos as recordações da
memória.
Tronco encefálico: esta estrutura está no «sistema cerebral rep-

tiliano» e permite a comunicação entre o cérebro e o corpo.

FIGURA 5.  O FILTRO EMOCIONAL

Assim, conhecer a vinculação das emoções com a aprendizagem aju- HIPOCAMPO


TÁLAMO
dar-nos-á, como docentes, a tomar consciência de como estamos a AMÍGDALA CEREBELOSA

levar a cabo a nossa prática educativa dentro da sala de aula, para: HIPOTÁLAMO

1. Introduzir, se necessário, mudanças que favoreçam a aprendiza- TRONCO ENCEFÁLICO

gem dos alunos e das alunas com práticas que sejam benéficas
ao nível cerebral.
FIGURA 6.  ESTRUTURAS DO CÉREBRO
Das estruturas mencionadas, centrar-nos-emos na amígdala cere- Conhecer bem os alunos e as alunas
belosa, encarregada de determinar se o que percebemos põe em Estabelecer uma relação de proximidade com os alunos per-
causa a nossa sobrevivência. A sua resposta reativa é muito rápida, mitirá que estes se sintam confortáveis e que, além disso,
pois esta estrutura é fundamental para garantir a sobrevivência do tenham a confiança suficiente para nos contar as dificuldades
indivíduo. Em milissegundos deve decidir se o que os sistemas sen- e os problemas que enfrentam, quer sejam relacionados com
soriais percebem é benéfico. No caso de não ser proveitoso, deve as aprendizagens quer com a sua vida em geral.
proporcionar ao corpo a capacidade de responder rapidamente.
Promover a coesão social da sala de aula
Uma vez ativada a amígdala cerebelosa, a informação é enviada ao
Os alunos passam muito tempo com os seus colegas e com
hipotálamo, que se encarregará de proporcionar a resposta auto-
os docentes. Por esta razão, deve promover-se um ambiente
mática do nosso corpo (palpitações, transpiração excessiva, contra-
de aprendizagem em que se estabeleçam vínculos afetivos,
ção das pupilas, etc.) para que, finalmente, o córtex tenha
para que se crie uma rede de amizades fortes que os pos-
consciência.
20 sam acompanhar no seu dia a dia. 21
Esta forma de funcionar do nosso cérebro é a que nos faz afirmar
Educar as emoções
que as decisões que tomamos são sempre emocionais e não racio-
nais, como se pensa com frequência. O primeiro a reagir aos estímu- Aplicar programas de educação emocional ajudará, quer os
los externos é o cérebro mamífero, chegando depois ao uso da docentes quer os alunos, a desenvolver as suas competên-
razão, localizada no neocórtex. cias emocionais. Um trabalho sistemático e integrado das
competências emocionais melhorará a aprendizagem e
também promoverá a autogestão emocional.
Falar das emoções e dos sentimentos
Deve proporcionar-se um ambiente que permita que os alu-
APLICAÇÃO NA SALA DE AULA
nos expressem as suas emoções, sejam elas positivas ou
negativas. Falar de uma forma aberta sobre as mesmas
Criar um clima afetivo ajudá-los-á a aprender a geri-las e a resolver possíveis con-
Como educadores, a nossa missão é conseguir que a amíg- flitos derivados de uma má gestão emocional. Para alcan-
dala cerebelosa esteja relaxada para que os alunos sintam çar este objetivo podem facilitar-se espaços de reflexão (a
que o centro escolar é um lugar seguro e confortável. Antes partir da visualização de filmes, leitura de contos, jogos de
de mais, devemos preocupar-nos com o bem-estar de cada role play, etc.) ou aproveitando situações reais da sala de
um dos alunos e das alunas para evitar «sinais de alarme» aula (mal-entendidos, brigas, etc). Isto servirá para evitar
da amígdala cerebelosa. que sejam as emoções a dominar o corpo.
Este nível de segurança será necessário para que estejam Proporcionar feedback positivo
predispostos a aprender. Uma maneira para o conseguir é Os feedbacks que proporcionamos aos alunos, quando reve-
criar um clima afetivo positivo dentro da sala de aula, para mos as suas intervenções ou trabalhos durante a aula,
que o cérebro produza um neurotransmissor chamado devem servir não só para proporcionar as ajudas necessá-
serotonina, que se encarrega de transmitir informação ao rias, mas também para evidenciar aquilo que se está a fazer
nosso organismo sobre as nossas emoções. Isto provocará bem e proporcionando um reforço positivo. Os feedbacks
também um aumento da autoestima, pois as crianças vão positivos, na sua justa medida, ajudam a que as crianças se
sentir-se aceites por todos os membros da aula. sintam recompensadas pelo seu trabalho diário.
3.  A atenção
PROMOVER A COESÃO
SOCIAL
PORQUE É QUE CUSTA, ÀS CRIANÇAS, MANTER A ATENÇÃO?
Como foi exposto, na infância o cérebro concede respostas
PROPORCIONAR emocionais a estímulos externos, mostrando algumas dificuldades
FEEDBACK
POSITIVO CRIAR UM CLIMA na sua gestão. Por sorte, o cérebro dispõe de um terceiro sistema, o
AFETIVO NA SALA DE AULA
neocórtex, mais precisamente o cortéx pré-frontal, que se encarrega
de realizar o intercâmbio de informação com outros sistemas
sensoriais e motores.

22 23
CONHECER MELHOR CÓRTEX
OS ALUNOS PRÉ-FRONTAL

EDUCAR
AS EMOÇÕES

DAR NOME ÀS
EMOÇÕES E AOS SENTIMENTOS
DOS ALUNOS
FIGURA 8.  O CÓRTEX PRÉ-FRONTAL

Entre os processos cognitivos relacionados com o córtex pré-frontal


estão as chamadas funções executivas. Estas, nas palavras de
Casafont (2014), supõem:
FIGURA 7.  COMO FAVORECER A APRENDIZAGEM
«[...] o conjunto de habilidades necessário para adaptar a
conduta para alcançar metas complexas que requerem uma
solução criativa, através de um plano de ação. Portanto,
estas funções executivas são as que estão encarregadas de
regular a conduta, os pensamentos, as recordações e os
afetos para conseguir um resultado adaptativo».

As funções executivas
São as que nos permitem ter o controlo sobre nós próprios para
podermos dirigir o que fazemos, sentimos e pensamos. Por isso,
é necessário ativar estas funções dentro do ambiente escolar
para poder recordar, de forma voluntária e consciente, aquilo
que se aprendeu.
Este córtex pré-frontal será a última área do cérebro a amadurecer. O descanso: para poderem processar a informação externa, os
De facto, a sua maturação não termina antes dos 24-27 anos. Isto alunos devem dormir as horas necessárias.
implica que as crianças tenham dificuldades para gerir as suas
A motivação: para podermos orientar a atenção dos alunos para
funções executivas, o que se traduz em dificuldades para controlar
o elemento de aprendizagem, precisamos de provocar a sua curio-
voluntariamente três aspetos fundamentais:
sidade. Por isso, é muito interessante apresentarmos os conteú-
A atenção. dos de um modo estimulante, o que ativa as recompensas
O controlo de impulsos. positivas do cérebro que tornam a aprendizagem mais agradável.
A memória de curto prazo. Ambos os elementos são essenciais para poder conduzir correta-
mente a atenção, sendo que um depende do outro, pois, sem um
Estas funções executivas dependem, em grande parte, das emoções
correto nível de descanso por parte dos alunos será muito difícil
e mais concretamente, da amígdala cerebelosa. Assim, será mais
poderem prestar atenção ao que se realiza na sala de aula.
fácil, para um aluno ou uma aluna, gerir as suas funções executivas,
24 25
isto é, a sua atenção e os seus impulsos, se aquilo que se lhe apre-
senta for acompanhado de uma emoção positiva. Por isso, quando
gostam de alguma coisa, ou se algo as emociona, as crianças conse-
APLICAÇÃO NA SALA DE AULA
guem manter mais a atenção e aprendem melhor.
Centrar-nos-emos particularmente numa dessas funções executi- Propor tarefas de curta duração para manter uma
vas, a atenção, definida por Tomás Ortiz como «a capacidade de atenção contínua
selecionar a informação sensorial em cada momento e de dirigir os
O tempo de atenção de uma criança de 6 a 12 anos é curto
processos mentais» (2009).
— estima-se entre 8-12 minutos —, já que ainda não dispõe
Estar atento na aula para integrar os novos conhecimentos com os de um controlo correto das suas funções executivas (lem-
anteriores não é uma tarefa fácil. bremo-nos que o córtex pré-frontal, base das funções execu-
tivas, não acaba de se desenvolver até aos 24-27 anos). Isto
Estar atentos implica a ativação de processos mentais para implica, por parte do docente, controlar o tempo de duração
recuperar e/ou armazenar na memória as aprendizagens reali- das atividades para manter a atenção dos alunos.
zadas. Para conseguir isto, o aluno deve focalizar a sua atenção, Propor desafios
deixando de lado outros estímulos externos. Desta forma, Mora A proposta de superar desafios, vinculados à aprendiza-
(2013) evidencia que, para podermos estar atentos de forma gem, que despertem a curiosidade, permitirá motivar os
temporária, precisamos bloquear 99% de tudo o que nos passa alunos. Está claro que, se o objeto de estudo não cria curio-
pela cabeça para podermos prestar atenção ao 1% restante. sidade e, portanto, não capta a atenção, a aprendizagem
vai ser menor. Porquê? Porque quando se suscita a curiosi-
Aprender é um ato muito complexo ao nível cerebral. Por isso, o dade, o cérebro ativa o chamado sistema de recompensa
cérebro precisa de um nível de atenção suficientemente alto para se cerebral, associado a outro neurotransmissor, a dopamina.
concentrar num aspeto específico da realidade e obviar tudo o resto. Por esta razão devemos propor atividades que ativem a
Dentro desta atenção temos de ter em conta dois elementos cru- curiosidade e elevem, assim, os níveis de dopamina. Isto
ciais que ajudarão os nossos alunos a estar mais predispostos a consegue-se favorecendo ambientes de aprendizagem
estar atentos na aula. Estes elementos são, tal como nos indica novos e significativos, onde os alunos possam ver a funcio-
Ortiz (2009): nalidade daquilo que aprendem.
Ter em conta as emoções e o estado anímico – Usar diferentes tons de voz em função da mensagem ou
Como vimos, são as emoções que estão encarregadas da utilizar tons musicais para determinar as atividades do
predisposição positiva para a aprendizagem, aspeto que dia.
será necessário controlar e favorecer. A um aluno que emo- – Introduzir atividades que os alunos devam realizar junta-
cionalmente se sinta bem na aula, ser-lhe-á mais fácil gerir mente com os seus colegas, criando uma aprendizagem
a atenção, aspeto chave para a aprendizagem. Assim social, a partir da participação em tarefas conjuntas com
afirma Francisco Mora (2013): outras crianças (aprendizagem cooperativa).
 Propor momentos de calma
«As emoções acendem e mantêm a curiosidade e a Juntamente com estes momentos de atividade, também
atenção e, com isto, o interesse pela descoberta de será necessário criar espaços de calma. Estes momentos de
tudo o que é novo, desde um alimento a um inimigo, ou calma terão duas finalidades:
26 a qualquer aprendizagem na sala de aula. As emoções, – Que os alunos saibam controlar o seu nível de excitação 27
em resumo, são a base mais importante sobre as quais (controlo de impulsos). Isto pode conseguir-se, por exem-
se apoiam todos os processos de aprendizagem e plo, a partir de exercícios de relaxamento ou reservando
memória». um espaço na sala de aula onde o aluno possa ir quando
estiver muito excitado. Neste espaço podem existir puffs
ou almofadas que o convidem a relaxar, a ler um livro, etc.
Favorecer um ambiente seguro
– Que os alunos possam dedicar um tempo a realizar certas
Além da necessidade de captar a atenção dos alunos para
atividades que precisam de longos períodos para serem
que possam ativar o seu córtex pré-frontal, não nos deve-
executadas, como pode ser a consolidação verbal ou
mos esquecer que o cérebro funciona de forma integrada,
escrita daquilo que aprendeu a partir da observação e
motivo pelo qual a atenção também estará condicionada
experimentação no meio ambiente. Esta consolidação
pela sensação de segurança. Se o cérebro mamífero se
pode levar-se a cabo num ambiente tranquilo, podendo
encontra em estado de alerta, porque a criança não se
ser acompanhada de música relaxante.
sente bem dentro do ambiente da sala de aula (por se sen-
tir pouco valorizada, por ter um conflito com outro aluno,
por se sentir assediada, etc), será muito difícil que possa
pôr o foco de atenção naquilo que lhe propomos aprender.
 Afastar a monotonia e a previsão
Nos primeiros ciclos do Ensino Básico será necessário cap-
tar a atenção dos alunos e das alunas pondo em jogo vários
recursos para que isto suceda:
– Utilizar jogos para facilitar a aprendizagem.
– Incorporar o movimento ao longo da jornada, para que
possam estar ativos. O movimento, além disso, mobiliza
o fluxo sanguíneo, o qual vai transportar a glicose e o
oxigénio que o cérebro precisa para funcionar.
4.  A aprendizagem e a memória Esta visão da aprendizagem proporciona uma visão dinâmica do
cérebro, que está em constante funcionamento, percebendo, com-
O QUE É QUE ENTENDEMOS POR APRENDIZAGEM? preendendo, analisando, associando, elaborando novas conexões
cerebrais e consolidando as que já possui.
Do ponto de vista cerebral, entende-se a aprendizagem como «um
processo mediante o qual diferentes grupos neuronais, de diferentes
áreas cerebrais, se conectam em uníssono para criar uma rede tem- COMO É QUE AS CRIANÇAS APRENDEM NOS PRIMEIROS
porariamente estável até que o exercício e a repetição convertam CICLOS DO ENSINO BÁSICO?
esta rede em permanentemente estável» (Ortiz, 2009). Segundo Nos primeiros anos, as crianças começam a aprender através do
esta definição, para realizar uma nova aprendizagem, o cérebro vai jogo. O jogo produz-se quando se reúnem a curiosidade, a emoção,
precisar, por um lado, de criar novos neurónios cerebrais — processo a recompensa e o prazer. «É o processo pelo qual, nos primeiros anos
conhecido como neurogénese — e, por outro, de estabelecer novas de vida, se realizam quase todas as aprendizagens positivas possí-
28 conexões entre eles, para criar redes neuronais cada vez mais com- veis» (Mora, 2013). 29
plexas que, por sua vez, interconectem diferentes áreas cerebrais.
Através do jogo, a criança ativa esses códigos integrados desde há
séculos no seu cérebro, que o levam a experimentar tudo aquilo que
Uma boa aprendizagem será aquela que permita criar novas lhe dá curiosidade e lhe produz prazer. Mediante o jogo, aprende a
redes neuronais no cérebro ou fortalecer as conexões entre as orientar-se no espaço, a identificar-se como um ser diferenciado, a
redes já existentes. Estes novos neurónios e as suas conexões classificar, a associar, etc.. E será através deste jogo que vai expan-
vão formar-se a partir dos estímulos que se recebem, sobretudo dir o seu conhecimento consciente, construindo novas redes neuro-
durante a infância, complementando-se ao longo das etapas de nais e novas conexões dentro do seu cérebro.
desenvolvimento posteriores. Existem diferentes formas de aprendizagem (Tomás Ortiz, 2009):
Por esta razão, os primeiros ciclos do Ensino Básico são funda- Aprendizagem por repetição. Uma das formas mais comuns de
mentais para consolidar as redes neuronais estabelecidas nos aprender é mediante a repetição de certas condutas ou habilida-
anos anteriores. Esta consolidação criará conhecimentos que des, até conseguir que estas estejam estruturadas e bem conecta-
vão ser guardados na memória a longo prazo, evitando ser des- das cerebralmente. Um exemplo claro é o processo de aquisição da
conectados durante o corte sináptico que se vai produzir depois. linguagem, que se aprende à base de repetir, até desenvolver uma
estrutura que nos permita comunicar. Este sistema não é o mais
adequado para a introdução de novas aprendizagens, para as
Esta capacidade neuroplástica do nosso cérebro vai diminuindo com a
quais são mais eficazes os modelos abertos, baseados em desa-
idade, apesar de não se perder totalmente. Uma pessoa saudável
fios e na procura de soluções mais do que na memorização.
pode aprender durante toda a sua vida, desde que não sofra de doen-
ças cerebrais degenerativas. E isto é assim porque o substrato da Aprendizagem por visualização. É muito utilizada nos primeiros
memória não é a quantidade de neurónios que temos, mas a quanti- ciclos do Ensino Básico e baseia-se na premissa de que se cons-
dade de conexões ou sinapses que se estabeleceram (Romo, 2014). troem melhor os conceitos associados a objetos, lugares ou ima-
gens, do que a palavras abstratas. Neste tipo de aprendizagem,
Assim, poderíamos entender a aprendizagem como o resultado da
o cérebro reforça o sistema de análise e de associação da infor-
interação entre as novas informações recebidas do meio ambiente
mação já aprendida. Por isso, é interessante aplicá-lo sobretudo
e as já aprendidas. Desta forma, os novos estímulos beneficiariam
naquelas áreas em que os alunos se sentem mais inseguros.
daquelas redes neuronais já estabelecidas, evitando que o cérebro
criasse novas redes desnecessárias.
Aprendizagem por imitação. Até há uns anos, pensava-se que era FOMENTANDO A MEMÓRIA A LONGO PRAZO
uma forma de aprendizagem principalmente social, e que não
A memória permite «evocar o aprendido, cada vez que queiramos, e
tinha relação com o cérebro. Atualmente, esta conceção mudou
fazer uso disso, quer no contexto de uma conversa, quer num ato de
devido à descoberta dos denominados «neurónios espelho»
conduta ou simplesmente num processo mental consciente determi-
(Fabbri-Destro e Rizzolatti, 2008), chamados assim por refleti-
nado» (Mora, 2013).
rem, como se se tratasse de um espelho, as condutas observa-
das. No campo educativo, esta aprendizagem é muito importante Memorizar significa consolidar as conexões neuronais estabelecidas
que seja tida em conta, já que os docentes atuam diante dos seus numa rede sináptica. Em termos neurobiológicos significa que uma
alunos como modelos a seguir. determinada sinapse ou conexão se usa repetidamente, isto é,
repete o aprendido, de maneira que o umbral de estimulação para
Aprendizagem por ação. Este tipo de aprendizagem percetivo-mo-
que o sinal elétrico se transmita de um neurónio para outro torna-se
tora, muito presente em todo o tipo de atividades lúdicas e des-
cada vez menor, precisando cada vez de menos estímulos para
portivas, constitui um bom método na etapa escolar, pois permite
30 alcançar uma resposta. 31
que o cérebro adquira novos esquemas muito sólidos. Uma forma
para o fortalecer poderia ser recordar verbalmente, ou assinalar
no papel, os conhecimentos adquiridos durante a aula no fim Se o relacionamos com os tipos de aprendizagem, à medida que
desta, o que facilitará a permanência da informação no cérebro. alguma coisa se repete vai-se reafirmando na memória, de
Aprendizagem implícita e explícita. A aprendizagem implícita é maneira que se vão fortalecendo as conexões e vai melhorando
aquela que se leva a cabo de forma não voluntária ou inconsci- a velocidade a que se pode recuperar uma conduta, habilidade
ente. Associa-se às habilidades percetivo-motoras e de procedi- ou conhecimento aprendido de forma voluntária e consciente
mentos, e organiza-se nas áreas mais profundas do córtex quando se produz um determinado estímulo.
cerebral. A aprendizagem implícita favorece enormemente a
explícita. Isto quer dizer que a exposição contínua a determina-
Da mesma forma que acontece com a aprendizagem, também exis-
dos estímulos favorece a posterior aprendizagem consciente ou
tem diferentes tipos de memória. Por um lado, temos uma memória
explícita. Por esta razão, é importante conceber ambientes com
consciente, que nos permite evocar e relatar factos ou acontecimen-
muitas novidades, para que o cérebro atue de forma positiva.
tos que sucederam. Dentro desta memória consciente está a memó-
ria a longo prazo, que é aquela que nos permite reter as recordações
ao longo da nossa vida; a memória icónica, aquela que nos permite
recordar as coisas durante um breve espaço de tempo; a memória
IMITAÇÃO
de trabalho, etc.
REPETIÇÃO
Por outro lado, dispomos da memória inconsciente, mais relacio-
VISUALIZAÇÃO
nada com atos motores, como andar de bicicleta, conduzir ou escre-
ver no computador. Essas aprendizagens estão guardadas no nosso
IMPLÍCITA OU EXPLÍCITA cérebro e só são evocados quando executamos essa determinada
conduta ou ato motor. Na memória implícita, reside a capacidade de
AÇÃO
executarmos as nossas tarefas diárias ou quotidianas.
Existe também um tipo de memória relacionada com os aconteci-
mentos emocionais.
FIGURA 9. FORMAS DE APRENDIZAGEM
Não nos podemos esquecer que qualquer nova aprendi-
APLICAÇÃO NA SALA DE AULA
zagem precisa de um tempo de consolidação, porque a
NOS PRIMEIROS CICLOS DO ENSINO BÁSICO
repetição do mesmo ajudará a uma boa consolidação.
Criar ambientes de aprendizagem estimulantes Como professores, deveríamos ter consciência deste
processo para podermos introduzir novos procedimen-
As crianças associam as aprendizagens não só com ima-
tos no início de cada semana — e de cada aula —, e
gens, mas também com lugares e situações. Por isso, con-
repeti-los, ao longo da mesma para favorecer a sua
vém ter em conta os seguintes aspetos:
consolidação.
– Fomentar tanto as aprendizagens implícitas como as
aprendizagens explícitas.
– Fazer com que a sala de aula fomente a tranquilidade, A prática diária destes novos procedimentos, que se podem
32 que seja pouco stressante, que promova a estimulação, executar em poucos minutos, será fundamental na 33
a novidade e a linguagem. aprendizagem escolar progressiva, porque, para poder
– Colocar as mesas e formar equipas, fomenta a aprendi- processar e assimilar um novo conteúdo escolar, o aluno
zagem cooperativa. precisa de muito tempo (várias horas), mas uma vez adquirido,
precisa de muito pouco tempo para o poder recordar
– Mudar algum aspeto da decoração da sala em cada tri-
novamente (vários minutos). Por este motivo, os docentes
mestre, ajuda a provocar a curiosidade dos alunos.
devem conhecer este sistema de processamento e aquisição
– Fazer com que a decoração seja alegre e divertida, utili- da informação, para não se esquecerem de, cada dia, fazerem
zando alguns espaços para expor trabalhos dos alunos. uma revisão dos conteúdos ensinados.
Isto favorecerá a sua atenção, melhorará a sua motivação
 Aproveitar os neurónios espelho
e criará uma boa atitude face à aprendizagem.
Não há melhor forma de aprender novas habilidades e
– Utilizar todos os sentidos (aprendizagem tátil, visual e
condutas que por imitação. As crianças são esponjas e
auditiva) para que os alunos aprendam, sobretudo nos
imitarão tudo o que os seus docentes fizerem. Desta forma,
primeiros ciclos do Ensino Básico. A nível manipulativo, o
se se pretende que aprendam a ser assertivos, colaborativos,
uso ativo do tato para classificar, analisar, estabelecer
tolerantes, etc., os docentes também têm de o ser.
padrões e até mesmo resolver algoritmos matemáticos,
ajudará a melhorar as suas capacidades cognitivas. Ao  Deixar uns minutos, ao fim do dia, para refletir sobre o que
nível da perceção visual, deverão utilizar-se estratégias se aprendeu
que convidem a manter a atenção focal, a discriminar Se se quer melhorar, de forma substancial, a aprendizagem
rapidamente símbolos ou volumes, a realizar descrições, dos alunos, é importante deixar uns minutos de reflexão
etc. Ao nível auditivo, deveriam propor-se exercícios de final sobre o que se aprendeu. Este método, além de melho-
discriminação de sons, tons, ritmos e palavras complexas rar a aprendizagem na etapa escolar, será muito operativo
da vida quotidiana. para a sua vida futura. Não esquecer que a melhor aprendi-
Fomentar a repetição para consolidar a memória zagem se leva a cabo em situação de atividade cerebral
lenta, mais do que de atividade cerebral rápida. Por este
Isto faz com que o corpo docente explique, utilizando, na
motivo, uma boa forma de fomentar a memória e conso-
medida do possível, objetos, lugares, circunstâncias, emo-
lidá-la, é mediante a escrita e a memória verbal, que são
ções, movimento, exemplos da vida real, etc.
processos cerebrais lentos e de grande capacidade de con-
solidação da informação recebida.
5. Neuroalimentação reto desenvolvimento e funcionamento cerebral e, portanto, para
uma boa aprendizagem.
A ALIMENTAÇÃO E O CÉREBRO Vejamos como é que influem no cérebro alguns dos nutrientes cita-
Jogar, manipular, pensar, associar, memorizar ou recordar ideias requer dos. O primeiro deles é o conhecido ómega-3. Os ácidos gordos
muita energia. Para a realização destas atividades, as crianças preci- poliinsaturados ómega-3 foram promovidos nos meios de comuni-
sam de ingerir determinados nutrientes que os ajudarão a estar men- cação social pelos seus benefícios para o coração e para a preven-
talmente ágeis para aprender melhor. Cabe recordar que o nosso ção de doenças cardiovasculares. Ora bem, estes ácidos também
cérebro representa apenas 2% do nosso peso corporal, mas consome influem a nível cerebral, contribuindo para modelar o efeito de
aproximadamente 20% de toda a energia que ingerimos (Romo, 2014). alguns neurotransmissores, como a dopamina, a noradrenalina e a
serotonina. O ómega-3 melhora a plasticidade cerebral — base da
aprendizagem e da memória — e ajuda a que as membranas das
Ter uma alimentação equilibrada, como preconiza a dieta medi- células nervosas sejam mais elásticas, favorecendo e tornando mais
34 35
terrânica, ajudará à construção e à reconstrução do cérebro, eficiente a transmissão de sinais nervosos. A ingestão de ácidos
contribuindo, em grande parte, para a manutenção de uma boa ómega-3 para um correto desenvolvimento do cérebro estima-se
plasticidade neuronal e, consequentemente, para uma melhor em duas vezes por semana e encontra-se, em maior proporção, nos
forma de aprendizagem. peixes e nos mariscos.
Por outro lado, se a dieta das crianças não incluir vitaminas dos gru-
Hoje em dia sabemos que certos nutrientes intervêm diretamente pos B e D, incrementa-se o risco de sofrerem de determinadas doen-
na concentração, na memória, no rendimento intelectual e até ças cerebrais, como a esquizofrenia e a depressão, quando
mesmo no estado anímico. Isto significa que a sua ausência pode alcançarem a idade adulta, devido a uma má conectividade entre
provocar que os neurotransmissores se tornem lentos e não cum- determinadas áreas do cérebro. Desta forma, dentro das vitaminas
pram bem a sua missão. do grupo B existe uma, a vitamina B6, que juntamente com o triptó-
fano e o magnésio, vai contribuir bastante para a produção de sero-
tonina. A serotonina é a encarregada de transmitir ao nosso
QUE NUTRIENTES AJUDAM A DESENVOLVER O CÉREBRO? organismo informação referente às nossas emoções, ao controlo da
Para conseguir um funcionamento ótimo do cérebro é preciso uma temperatura, da fome e do sono, assim como à moderação da
ingestão adequada de certos nutrientes chave, como os ácidos gor- agressividade. Um défice na sua produção pode provocar depressão,
dos poliinsaturados ómega-3, triptófano, vitaminas dos grupos B e problemas de sono, transtornos obsessivo-compulsivos ou transtor-
D e minerais, como o zinco, o magnésio e o ferro, sem esquecer as nos alimentícios, entre outros.
proteínas e os hidratos de carbono (Bueno, 2016). Outros nutrientes essenciais para um desenvolvimento cerebral
A dieta mediterrânica, que inclui cereais, legumes, peixe, porções correto são os minerais, como o zinco, o magnésio e o ferro. O zinco
moderadas de carne, fruta fresca e frutos secos, produtos lácteos, contribui para a neurogénese — formação de novos neurónios —
leguminosas e pouca quantidade de alimentos doces, já proporciona, especialmente no hipocampo — centro gestor da memória — e o seu
por si só, todos os nutrientes essenciais necessários. De qualquer défice pode favorecer estados de depressão, sobretudo em situações
forma, um ritmo de vida frenético, e as situações de risco socioeco- de stress.
nómico em que se encontram algumas crianças, podem fazer com O magnésio merece um capítulo à parte, pois é essencial para a cria-
que as suas dietas não sejam suficientemente ricas nestes nutrien- ção de neurotransmissores e para o normal funcionamento dos sis-
tes. Por isso, a necessidade de consciencializar as famílias destas temas muscular e nervoso. Este aumenta a plasticidade cerebral e
crianças sobre a importância de uma boa alimentação para um cor- otimiza a densidade das conexões neuronais no hipocampo, que é
onde se processa a gestão da aprendizagem e memória. O magné-
sio, juntamente com o triptofano e a vitamina B6, são os elementos
essenciais para a produção de serotonina. APLICAÇÃO NA SALA DE AULA
Quais os alimentos que nos proporcionam magnésio? O chocolate
preto; os peixes como o salmão, o bacalhau ou as sardinhas; os flo- Tomar um bom pequeno-almoço em casa!
cos de aveia integrais; frutas como as framboesas, os kiwis ou as Temos repetido esta frase até à exaustão e não é em vão.
bananas; hortaliças como os brócolos, o feijão verde ou a beterraba; Se os alunos tomam um fraco pequeno-almoço, diminuirá a
frutos secos, como as amêndoas, as nozes ou as avelãs; e as legumi- glicose no sangue, o que afetará o rendimento escolar, já
nosas. que estaremos a privar o cérebro do seu combustível e, pro-
vavelmente, sentir-se-ão apáticos e cansados.
Finalmente, o terceiro mineral essencial é o ferro. Este é importante
para o crescimento e o desenvolvimento dos seres humanos, motivo Seguir uma dieta mediterrânica
36 pelo qual é essencial nas crianças. Tal como nos adultos, a falta de Uma dieta rica em peixe, legumes, cereais, porções modera- 37
ferro pode produzir anemia, cansaço e dificuldade para realizar o das de carne e poucos doces, vai proporcionar ao organismo
nosso trabalho. Nas crianças podem produzir-se alterações no os nutrientes essenciais para o seu desenvolvimento cerebral.
desenvolvimento do sistema nervoso e motor, que podem acarretar
Beber água com frequência
dificuldades de aprendizagem. Como é que o défice de ferro afeta o
desenvolvimento cerebral? O ferro é essencial na produção de mie- O cérebro precisa de muita hidratação. Por esta razão, nos
lina, encarregada de acelerar a comunicação do cérebro. primeiros ciclos do Ensino Básico, que é quando o cérebro
consolida uma maior quantidade de conexões neuronais, é
importante que os alunos bebam água regularmente. Pode
QUE ALIMENTOS SE DEVEM EVITAR? ser adequado programar momentos na aula para beber
Não só devemos ter em conta que alimentos devemos ingerir, como água, sobretudo em épocas de calor. A água, a nível neuro-
também que alimentos é que devemos evitar. A chamada «comida nal, facilita a transmissão dos impulsos nervosos. «Manter-
de plástico» é o conjunto de alimentos que contêm, em geral, altos -se hidratado é decisivo para memorizar, já que basta
níveis de gorduras saturadas, sal, condimentos, açúcares ou aditivos perder mais de 2% de água corporal para diminuir a capa-
alimentares. Apesar de não se falar muito, indiretamente estes ali- cidade de memória a curto prazo» (Romo, 2014).
mentos têm muitos efeitos sobre o cérebro. Vigiar o consumo de açúcares
Em geral, refrescos, sumos, pastéis industriais e guloseimas, contêm O consumo excessivo de açúcares provoca a desidratação
enormes quantidades de açúcar e de gorduras saturadas, que dos neurónios, tendo impacto sobre a concentração dos alu-
podem provocar problemas de atenção e altos índices de nervo- nos. É necessário consciencializá-los, a eles e às suas famí-
sismo e hiperatividade (Egger, Carter, Soothil & Wilson, 1992). lias, de que é mais saudável consumir hidratos de carbono a
Resumindo, um excesso de açúcares e de gorduras de origem animal partir da glicose presente nos chamados «açúcares de
na dieta, pode ter um efeito adverso sobre a atividade e a atenção absorção lenta», como o pão, as batatas, as leguminosas ou
das crianças, diminuindo a sua plasticidade neural e desidratando os a massa, ou através da frutose presente na fruta e no mel.
neurónios, tal como expõem diversos trabalhos publicados entre os Consumir gorduras insaturadas
anos de 2002 e de 2015. Estas gorduras fazem com que os recetores Comer mais peixe, legumes, frutos secos e azeite, ricos em
de alguns neurotransmissores percam sensibilidade, pelo que a sua ómega-3, para proteger e contribuir para a formação de
plasticidade sináptica diminui. novas células cerebrais.
6. Papel do sono no desenvolvimento que tinham de memorizar, para depois realizar um teste no qual se
contablilizavam quantas é que se recordavam. Doze horas depois do
do cérebro teste inicial, dividiram-se os voluntários em dois grupos de forma a
que um grupo passasse as 12 horas seguintes em estado de vigília
É TÃO IMPORTANTE DORMIR? enquanto o outro grupo podia descansar. Ao repetir novamente o
Como já se mencionou, ao falar da atenção, para que o cérebro teste deram-se conta que o grupo ao qual foi permitido dormir, ao
possa ativar os circuitos atencionais, é necessário que o corpo esteja contrário do grupo que não tinha dormido, conseguiu recordar um
descansado e tenha tido horas de sono suficientes. Caso contrário, maior número de palavras comparadamente às que se tinha lem-
será complicado que possa dirigir a atenção para a aprendizagem. brado no primeiro teste, isto é, conseguiu até mesmo reproduzir
novas palavras.
Por esta razão, é importante consciencializar as famílias de que os
seus filhos e filhas devem dormir o número de horas necessário para Isto demonstra-nos que o sono é muito benéfico para a aprendiza-
o bom funcionamento cerebral. gem, já que, além de consolidar aprendizagens realizadas, ajuda a
38 39
O verdadeiro benefício de dormir é a limpeza que o cérebro realiza reproduzir conceitos novos trabalhados durante o dia.
enquanto se dorme. Assim afirma Marta Romo (2014) quando diz Por isso, dormir as horas necessárias ajuda a que, durante o dia, o
que «a natureza reparadora do sono parece ser o resultado da elimi- cérebro se encontre num estado ótimo para a aprendizagem, já que
nação dos tóxicos da atividade neuronal que se acumulam durante contribui para que os circuitos neuronais utilizados durante o dia
a vigília». Desta forma, durante o sono, e com o objetivo de que o possam ser fortalecidos e regenerados.
líquido cefalorraquidiano limpe estes resíduos tóxicos, os neurónios
reduzem o seu tamanho até 60%, deixando lugar ao líquido que lim-
pará os espaços existentes entre eles, que é onde, segundo alguns
estudos, se acumulam as moléculas tóxicas.
APLICAÇÃO NA SALA DE AULA
Por outro lado, como explica a mesma autora, quando dormimos
cria-se um neurotransmissor inibitório da excitação, chamado ade-
Promover hábitos de sono saudáveis
nosina, que é encarregado de limpar o cérebro e de o deixar livre e
preparado para aprender coisas novas no dia seguinte. Assim, o café Será necessário recordar às crianças a importância de dor-
e o chá, atuam como bloqueadores da adenosina, diminuindo o sono mir as horas suficientes para chegarem descansadas à
nas pessoas. escola. Por isso, convém insistir nas horas de sono recomen-
dadas de forma sistemática ao longo dos primeiros ciclos.

DORMIR MELHORA A APRENDIZAGEM Informar as famílias

O Dr. Nicolas Dumay1 e a sua equipa perguntaram-se se o sono não É interessante informar as famílias da importância do sono
servia só para fixar os conceitos, e propuseram-se investigar para a aprendizagem dos seus filhos, quer durante as con-
se também servia para recordar conceitos que a pessoa previa- versas informais quer durante as reuniões que se possam
mente não conhecia. Foi por esta razão que realizou um estudo com fazer ao longo do percurso escolar. Ressaltar a importância
72 voluntários a quem apresentou uma lista de palavras inventadas do sono no processo de atenção e aprendizagem é impor-
tante para que as famílias tomem consciência e façam com
que os seus filhos durmam o número de horas recomendado.
1
 Dumay, N. (2016). Sleep not just protects memories against forgetting, it also makes
them more accessible. Recuperado de https://www.journals.elsevier.com/cortex/
featured-articles/sleep-not-just-protects-memories-against-forgetting-it-also
7. O trabalho integral que se habituem rapidamente a estas duas vias sensoriais e, por-
tanto, não decaia o seu nível de atenção.
das áreas cerebrais Além dos contrastes sensoriais, outra questão que normalmente é
esquecida nas salas de aula é o movimento. Se, além de ouvir e
O MELHOR MODO DE APRENDER
escrever, os alunos passarem a maior parte do dia sentados numa
Em capítulos anteriores indicávamos a necessidade de subordinar a cadeira, estaremos a desaproveitar muitas oportunidades para que
abstração à aprendizagem realizada a partir dos sentidos. Os sen- mantenham o cérebro ativo.
tidos conectam o ser humano com a realidade e permitem-nos, por
Demonstrou-se que a prática regular de exercício «cria uma série de
exemplo, aprender a origem dos vegetais que comemos cada dia, a
neurotransmissores como a serotonina, noradrenalina e a dopa-
partir da observação e do cultivo destes numa horta. Tocar, cheirar,
mina, que melhoram o estado de alerta, atenção e motivação, fato-
ver, saborear um tomate depois de o ter cultivado é o que permitirá
res imprescindíveis para a aprendizagem» (Forés et al., 2015). Como
entender como crescem as plantas e, por sua vez, conseguir apren-
40 se fosse pouco, «ao fazer exercício físico liberam-se moléculas e neu- 41
dizagens significativas. Esta mesma aprendizagem não será fixada
rotransmissores que modulam processos cognitivos envolvidos em
da mesma forma na estrutura cognoscitiva de uma criança se ape-
melhorias cognitivas, emocionais e de comportamento» (Casafont,
nas lhe apresentamos uma série de desenhos que mostrem o cres-
2014). Isto implica que o exercício cria substâncias químicas que
cimento de um tomateiro. Este tipo de atividade será útil para fixar
favorecem a aprendizagem. Por isso, devemos considerar o movi-
o conteúdo, mas apenas depois de se ter «apreendido» a partir dos
mento e, especificamente, o exercício físico, como elemento essen-
sentidos.
cial do processo educativo.
Como docentes, o que é que podemos fazer a este respeito?
O essencial é utilizar diferentes metodologias para conseguir que os
neurónios continuem a criar conexões, tal como se detalha neste Segundo o exposto, a aprendizagem não é só uma questão de
fragmento de entrevista do Dr. Bueno (2016): processos mentais, isto é, não se concentra apenas no pensar,
mas no corpo inteiro, que é o que faz com que o cérebro esteja
preparado para a aprendizagem. Conceber a aprendizagem
«Do mesmo modo que, para manter o corpo em forma, é preciso como o resultado da implicação do corpo inteiro tem de servir,
treinar, ainda que seja de vez em quando, e praticar algum des- aos educadores, para planificarem e apresentarem os conteú-
porto, para que a plasticidade neuronal se mantenha da melhor dos usando diferentes estratégias didáticas, que permitam cap-
forma possível é preciso utilizar o cérebro: ler, resolver enigmas, tar a atenção dos alunos e aprender com o corpo todo.
pensar, brincar a jogos que requeiram esforço mental, aprender
idiomas, etc. Tudo isso cria aquilo que se denomina por reserva
cognitiva, que é a capacidade de nos adaptarmos à medida que,
com a idade, inevitavelmente vamos perdendo algumas das nos-
sas conexões neuronais».

Como já indicámos, uma forma de captar a atenção dos alunos é


mediante a novidade, para o que é conveniente utilizar o máximo de
sentidos possíveis durante as horas de aula. Se, de forma regular,
lhes pedirmos que utilizem as vias sensoriais do mesmo modo (por
exemplo, ouvir os conteúdos e realizar um esquema), isto fará com
Referências bibliográficas
APLICAÇÃO NA SALA DE AULA
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Realizar atividades que integrem o maior número de senti-
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Não é necessário pensar atividades para cada um dos sen-
treatment on enurese in children with migraine or hyperkinetic behavior.
tidos, mas conceber tarefas que permitam trabalhar o
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maior número de sentidos possível.
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Promover hábitos saudáveis relativamente ao exercício systems in monkeys and humans. Curr Opin Neurobiol, 18 (2), 179-184.
Promover hábitos saudáveis nos nossos alunos, a partir da
Forés, A., Gamo, J.R., Guillén, J.C., Hernández, T., Ligioiz, M., Pardo, F.,
42 prática regular de exercício físico, não só os favorecerá a 43
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nível corporal, mas também intervirá positivamente na ati- neurociencia. Barcelona: Plataforma Editorial.
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É conveniente incorporar estes hábitos dentro da escola.
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Como nos indica Ortiz (2009), «realizar uns exercícios antes de http://www.redalyc.org/pdf/1812/181220525103.pdf
de começar uma aula permite à criança melhorar o seu ren- Lozoff, B., Wolf, A.W., Jiménez, E. (1996). Iron deficiency anemic and
dimento e otimizar a disposição psíquica ao esforço cogni- infant development: Effects of espalhem oral iron therapy.
tivo que fará posteriormente». O movimento, ao contrário The Journal of Pediatrics, 129 (3), 382-389.
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é um grande aliado para a aprendizagem. que se ama. Madrid: Alianza Editorial.
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Trabalho por projetos
MAR MARTÍN MURGA
MUGA
ÍNDICE
TRABALHO POR PROJETOS
3 Orientações para a prática de projetos
3.1. O que quero que os meus alunos aprendam? 83
 O currículo no trabalho por projetos. O prescritivo 83
 Para lá do currículo. O metacurrículo 85

INTRODUÇÃO 47 3.2. Aprendendo a gerir projetos 86


 O processo de planificação. Fases de desenvolvimento
1 O trabalho por projetos: bases e fundamentos teóricos do projeto 86
1.1. O que é um projeto? 50  A gestão do tempo 94
 Características do trabalho por projetos 52  A gestão dos materiais e dos recursos 95
1.2. Antecedentes do trabalho por projetos 54  Os participantes no projeto 95

1.3. Contribuições dos principais autores para o trabalho  A avaliação do projeto 97
por projetos 55
4 Como favorecer o trabalho por projetos
A Escola Progressista norte-americana 56
4.1. Estratégias para decidir o tema do projeto 99
A Escola Nova e a pedagogia científica 59
4.2. Estratégias para motivar os alunos 99
A pedagogia social em França 62
4.3. Estratégias para trabalhar em equipas cooperativas 100
O construtivismo 63
4.4. Estratégias para distribuir o espaço na sala de aula 100
O behaviorismo 69
4.5. Estratégias para o processamento da informação 102
1.4. Chaves pedagógicas no trabalho por projetos 70
4.6. Estratégias para que a aprendizagem seja
1.5. Tipos de projetos 73 «inesquecível» 103
4.7. Estratégias de avaliação imediata 104
2 O trabalho por projetos, algo mais do que um método
4.8. Estratégias para a personalização do projeto 105
2.1. O cérebro e o trabalho por projetos 77
4.9. Estratégias para que ninguém fique para trás 106
 O que sabemos do cérebro 78
4.10. Estratégias para usar a tecnologia 106
2.2. Quais são os resultados da aprendizagem ao trabalhar
por projetos? 79 A TÍTULO DE CONCLUSÃO 107
2.3. Inquietudes sobre o trabalho por projetos 80
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 109
Introdução
Eu não te posso ensinar nada, só te posso ajudar a encontrar
o conhecimento dentro de ti próprio, o que é muito melhor
do que transmitir-te a minha pouca sabedoria.
Sócrates

De certeza que, se abriu este manual, é porque é desses docentes


que alguma vez se perguntou: o que é aprender? Como é que se
aprende? Como é que tenho de ensinar? Conseguirei que todos os
meus alunos aprendam? Conseguirei que os meus alunos adquiram
os conhecimentos necessários para os poderem usar quando preci-
sarem?
Este artigo pode ajudá-lo a responder a estas perguntas e a encon-
trar sugestões que o ajudarão na sua atividade docente. A forma
como intervimos quando trabalhamos os projetos vai constituir o 47
motivo para repensar a educação, o nosso papel docente, o papel da
escola, etc.
Neste artigo recolho parte da minha experiência como docente, mas
também leituras, investigações e inspirações de muitos especialistas
e docentes que escreveram sobre o tema. A partir daqui, quero agra-
decer a todos eles pela sua contribuição. Nos pés de página e nas
referências bibliográficas referem-se todas as fontes.

O QUE É QUE VAI ENCONTRAR NESTE ARTIGO?


Fundamentos e teoria sobre o trabalho por projetos.
Um quadro conceptual onde se expõem as ideias essenciais implí-
citas no trabalho por projetos.
Exemplos, ideias e estratégias para o trabalho por projetos.
Critérios, estratégias, instrumentos, etc., para a avaliação de
projetos e com projetos.
Perguntas e atividades cujo propósito é orientar a reflexão pes-
soal e a da equipa docente.
Desafios para a sua ação dentro da sala de aula.
Este artigo não é uma compilação de receitas e não pretende ser
sequer uma guia. O processo de ensino-aprendizagem é algo com-
plexo, impossível de abordar com fórmulas simples. No entanto, este COMO É QUE PODE TIRAR MAIOR PROVEITO DESTA LEITURA?
artigo pode ajudar a sua prática docente, conforme as suas metas, o
1. Folheie o artigo e comece a lê-lo pela parte que mais lhe interessar.
seu estilo particular de ensino e a maneira específica como cada um
Não é necessário ler numa ordem prescrita ou de forma linear. Se
aprende. O nosso principal objetivo é proporcionar um apoio útil e
prefere começar por uma visão panorâmica, então comece pelo
eficaz aos docentes que querem introduzir na sua prática o trabalho
capítulo 1, mas, se prefere começar por uma parte um pouco mais
por projetos.
prática, comece pelo capítulo 3 ou 4. Se quer saber qual vai ser o
O ensino por projetos é uma estratégia imprescindível para conse- desenlace do trabalho por projetos, comece pelo fim.
guir uma aprendizagem escolar significativa, sólida e permanente
2. Leia os quadrados. Ficará com as ideias-chave para o seu traba-
em todos e em cada um dos nossos alunos. Mas, além disso, o tra-
lho na sala de aula.
balho por projetos proporciona aprendizagens relevantes e funcio-
nais, não só nos alunos, mas também na equipa docente e nos 3. Leia o livro com papel e lápis. Recupere essa ideia, frase ou pala-
agentes externos que protagonizam a experiência. vra que lhe tenha chamado a atenção, analise-a e tente aplicá-la
no seu dia a dia. Pergunte-se: Como posso usá-la e introduzi-la
No capítulo 1, recolhem-se as bases teórico-práticas apoiadas em
na minha programação a partir deste novo enfoque?
investigações científicas. Procuramos fugir de modas passageiras
ou de ações descontextualizadas que percam de vista o objetivo 4. Trata-se de um livro para a ação. Os exemplos mais úteis serão os
48 desta prática. Trata-se de dar coerência ao uso dos projetos dentro que desenvolva por si próprio. Lance-se e compartilhe o seu pro- 49
da sequência didática dos processos de ensino-aprendizagem. Pre- jeto na rede. Carregue-o no Twitter, no Facebook, no site da sua
tende-se apoiar, com rigor, o profissionalismo de tantos docentes escola ou no seu blog, mas compartilhe-o. Pode usar o hashtag:
que impulsionam a mudança das suas salas de aula, adaptando-se #eutrabalhoxprojetos.
aos tempos atuais e preparando os seus alunos com as melhores 5. Melhor em companhia. Procure colegas para trabalhar em equipa.
ferramentas. A leitura será mais proveitosa se se compartilha, se debate, se
Nas seguintes páginas encontrará uma série de chamadas com reflete, etc. Se criarmos equipas mais ou menos permanentes
notas que lhe facilitarão a leitura. com quem pensar, programar, compartilhar ideias, etc., a tarefa
de trabalhar por projetos não só será mais gratificante, como, de
certeza, será mais rica, proporcionará mais segurança ao aplicá-la
Reflexão pessoal e contribuirá para um projeto da escola, não sendo uma situação
Esta secção contém sugestões que lhe podem ser úteis para isolada que seja uma anedota na vida académica dos nossos
aplicar as ideias expostas à sua própria prática. O seu obje- alunos.
tivo é guiar a reflexão e a metacognição, assim como a
futura ação.

Preparados para começar


Ideias-chave
Ressaltaremos alguns conceitos e ideias que consideramos Ao folhear este livro, o que é que lhe chamou a atenção?
especialmente importantes para o trabalho por projetos.
Ao ler este livro, o que despertou a sua curiosidade?
O que é a primeira coisa que lhe vem à cabeça quando ouve
a palavra «projeto»?
1. O trabalho por projetos: bases e no estudante que ocorre em pequenos grupos, com o professor como
guia, e que está organizada com base em situações problemáticas».2
fundamentos teóricos Podemos dizer que a aprendizagem e o ensino por projetos fazem
Os que se apaixonam pela prática sem a teoria são como os pilotos
parte das chamadas metodologias «ativas», já que o seu objetivo
sem leme nem bússola, que nunca poderão saber para onde vão. não é tanto a transmissão de conhecimentos, mas sim a colocação
em prática desses conhecimentos com um determinado objetivo.
Leonardo da Vinci
Dentro deste âmbito, encontramos outras práticas tais como a
aprendizagem baseada em tarefas, a aprendizagem baseada em
problemas, a aprendizagem pela descoberta, a aprendizagem
baseada em perguntas, em desafios, etc. Podemos dizer que todas
Algumas ideias prévias estas práticas partem da ideia da aplicação do conhecimento e
põem ênfase em «o que sei fazer com aquilo que sei». Para tal, é
O que é que sabe sobre o trabalho por projetos? O que é necessário refletir sobre aquilo que sei, aquilo que não sei, aquilo que
que gostaria de saber? preciso de saber, para que é que preciso daquilo que sei, onde é que
o posso aplicar, etc.
Antes de começar a trabalhar por projetos, proponho-lhe que
50 51
faça uma lista das razões que o impulsionam a usar esta
metodologia na sala de aula. Neste capítulo vai encontrar a
teoria necessária para fundamentar o seu discurso. A denominação trabalho por projetos aplica-se a
uma diversidade de propostas educativas que com-
partilha os mesmos fundamentos teóricos da psicologia da
1.1.  O QUE É UM PROJETO? aprendizagem, mas que surgiu em contextos diferentes e
que seguiu também a sua própria evolução.
Não é fácil definir este termo. A palavra «projeto» provém do latim
projectu, pró ('para a frente') e iacere ('lançar'). Projeto é literal- Podemos dizer que um projeto é um conjunto de atividades
mente ('lançar para a frente'). organizadas e sequenciais para a obtenção de um determi-
nado resultado ou produto. As bases comuns às diferentes
No campo educativo, trata-se de um termo ambíguo muito afetado propostas relacionam-se com os seguintes aspetos: a
pela polissemia, já que é um vocábulo que conta com diversas defi- aprendizagem participativa, ativa e em cooperação; a moti-
nições. Esta ambiguidade é ainda maior se observarmos a variedade vação e a implicação dos aprendizes; a globalidade da
de significados que se atribui ao termo nos centros educativos. aprendizagem e a transversalidade dos conteúdos; o desen-
Podemos dizer que neste momento é um dos vocábulos mais utiliza- volvimento de conhecimentos declarativos e instrumentais;
dos na linguagem pedagógica, mas em determinadas ocasiões iden- a relação com o contexto social onde tem lugar a aprendi-
tifica práticas que respondem muito pouco à ideia original e aos zagem, etc.3
princípios científicos que o apoiam.
Podemos encontrar diferentes definições. Howard Barrows, o funda-
dor dos modelos PBL (Problem Based Learning1) na Universidade de 2
 Barrows, H. S. (1986). A taxonomy of problem-based learning methods. Em Medical
McMaster, no Canadá, define-o como «uma aprendizagem centrada Education, 20/6, 481-486.
3
 Centro Virtual Cervantes. Diccionario de términos clave de ELE. http://cvc.cervantes.
es/ensenanza/biblioteca_ele/diccio_ele/diccionario/trabajoproyectos.htm
  Aprendizagem baseada em problemas.
1
A proposta que aqui se recolhe responde a uma aprendizagem glo- os alunos aprendam de maneira autónoma, alcancem objetivos,
bal dentro da sequência didática do processo de ensino-aprendiza- autorregulem a sua aprendizagem, aprendam a aprender, etc.
gem. Esta perspetiva implica introduzir mudanças, não só na
Trata-se de uma metodologia de trabalho que pode ser mais ou
metodologia, mas também na seleção dos conteúdos, na avaliação,
menos prolongada no tempo.
na organização dos tempos, dos espaços, nos papéis, etc. Nos capí-
tulos 3 e 4 encontrará algumas ideias para implementar estas Existe uma grande participação dos alunos na exposição, no design
mudanças. e no seguimento dos projetos. Eles são os protagonistas.
O docente converte-se num guia ou orientador da aprendizagem.
O trabalho por projetos não significa desterrar outros modelos de
ensino-aprendizagem, mas antes utilizá-los com uma nova perspe- Favorece-se a aprendizagem cooperativa. O trabalho dos alunos
tiva. Por exemplo, o modelo instrutivo será necessário na altura de realiza-se de maneira cooperativa, aprendendo uns com os
introduzir explicações; a aprendizagem cooperativa, na altura de tra- outros.
balhar em equipa; os modelos pessoais, na altura de introduzir a per- Favorece-se o compromisso do aluno com a sua aprendizagem e
sonalização; e o trabalho individual é necessário para desenvolver a com a do seu grupo de trabalho. Isto implica a autorregulação da
autonomia, a metacognição, etc. aprendizagem, o aumento da responsabilidade individual e gru-
Não há uma única maneira de ensinar, como também não há uma pal, etc.
52 única maneira de aprender. No entanto, temos de ter a noção de 53
Favorece-se a autonomia e a metacognição. A aprendizagem
que, cada forma de ensinar cria um tipo de aprendizagem diferente. produz-se em todo o processo, nos dados que se obtêm na inves-
Por isso, será necessário refletir sobre aquilo que queremos que os tigação, no conflito cognitivo que supõe a realização da tarefa,
nossos alunos aprendam, analisar as diferentes práticas de ensino e etc., mais do que na consecução final da meta ou no produto
adaptar umas às outras. final. Procuram-se aprendizagens sólidas e a longo prazo.
O trabalho por projetos favorece o desenvolvimento de habilida-
Características do trabalho por projetos des e competências nos alunos e nas alunas, como por exemplo, a
Analisando o trabalho por projetos no contexto educativo, podemos resolução de problemas, a tomada de decisões, o desenvolvimento
assinalar algumas chaves: de habilidades de comunicação, o desenvolvimento de atitudes e
valores, a consciência da própria aprendizagem, o pensamento
Trata-se de uma metodologia inserida no quadro curricular esta-
crítico, as habilidades de avaliação e autoavaliação, a aprendiza-
belecido. O corpo docente realiza a programação do projeto
gem permanente, etc.
tendo em conta o regulamento e o currículo vigente.
O trabalho por projetos costuma implicar um produto final e, em
Parte-se de uma exposição real, favorecendo a motivação dos
determinadas ocasiões, produtos intermédios.
alunos e familiarizando-os com as situações e as dificuldades que
poderão encontrar nas suas vidas. A avaliação dos alunos é contínua. Isto propicia que tenham
consciência dos passos dados e, portanto, que se autoavaliem
Não se produz uma transferência passiva da informação, mas
continuamente.
trata-se de um método de trabalho ativo.
Um projeto está construído com diferentes modalidades de ativi-
A planificação e o desenvolvimento do projeto não são algo fixo
dades. O design das atividades tem em conta, não só, o momento
nem estático, são abertos e vão mudando segundo as necessida-
da realização, mas também diferentes níveis de dificuldade ou
des, os interesses e o ritmo dos alunos. O objetivo principal é que
diferentes estilos de aprendizagem, permitindo sempre prestar
atenção à diversidade.
Esta metodologia requer materiais diversos e variados, facilmente Primeira fase (1590-1765). O trabalho por projetos é introduzido
localizáveis, que o próprio aluno pode proporcionar. em academias de arquitetura de Roma e de Paris, onde os estu-
dantes mais avançados trabalham para resolver um problema de
Os projetos enriquecem-se com a implicação e a participação de
design para a construção, por exemplo, de uma catedral ou de
outros agentes da comunidade educativa. Podem convidar-se as
uma praça.
famílias a participar durante o processo de trabalho ou na expo-
sição final. Segunda fase (1765-1880). O projeto é aceite como um método
regular de ensino em escolas de engenharia em França, na
O trabalho por projetos encerra muitas possibilidades para a ino-
Alemanha e na Suíça. Quase um século mais tarde, em 1864, este
vação educativa.
método chega aos Estados Unidos da América.
Terceira fase (1880-1918). O trabalho com projetos é incorpo-
1.2.  ANTECEDENTES DO TRABALHO POR PROJETOS
rado na educação geral pública nos Estados Unidos da América.
A história é um profeta com o olhar voltado para trás: Durante esta fase passou de ser um método de ensino regular no
por aquilo que foi e contra aquilo que foi. Anuncia aquilo que será. treino manual da educação técnica e a aplicar-se no ensino das
Eduardo Galeano ciências em geral.

54 Quarta fase (1918-1965). O método por projetos é redefinido e 55


Realizar projetos realmente não é uma novidade. No entanto, anali-
regressa agora à Europa vindo dos Estados Unidos da América.
sando a história da pedagogia pode afirmar-se que o desenvolvi-
Nesta fase, é dotado de fundamentação teórica a partir da psico-
mento do currículo a partir de um trabalho por projetos está
logia da aprendizagem de Thorndike. Enquanto o interesse pelos
relacionado com uma tradição inovadora do ensino.
projetos decaía nos Estados Unidos da América, esta metodologia
Nesta secção vamos avaliar o legado pedagógico que nos deixaram era adotada em alguns países da Europa e da América Latina.
alguns autores do século xx para a educação do século xxi, anali-
Quinta fase (1970-até aos nossos dias). Redescobrimento do
sando as suas investigações e as suas propostas didáticas sob o
método de trabalho por projetos como o mais adequado para o
prisma do trabalho por projetos.
ensino numa sociedade democrática, em particular por parte de
Muitos atribuem a W. H. Kilpatrick a novidade desta metodologia, educadores alemães, holandeses e de outros países nórdicos.
apesar de existirem testemunhos e evidências que mostram a pre-
sença do trabalho por projetos em períodos anteriores da história
1.3. CONTRIBUIÇÕES DOS PRINCIPAIS AUTORES PARA O
da educação. Alguns autores assinalam a origem deste método no
TRABALHO POR PROJETOS5
século xvi no contexto da criação das primeiras academias de arqui-
tetura na Europa. Especificamente, Knoll4 afirma que o projeto, Com um olhar global do trabalho por projetos no mundo educativo
como um método institucionalizado de ensino, teve a sua origem no e a partir do percurso histórico que aqui propomos, podemos con-
movimento da profissionalização da arquitetura e da engenharia cluir que não estamos a falar de algo novo. No entanto, devemos
que começou em Itália durante os últimos anos do século  xvi. Par- reconhecer que se inscreve numa perspetiva renovadora da educa-
tindo deste momento histórico, Knoll postula cinco fases na evolu- ção, num quadro pedagógico que deriva do movimento da Escola
ção desta metodologia de ensino. Nova europeia, com a pedagogia ativa de Decroly ou Freinet, e do
movimento progressista e pragmatista nos Estados Unidos da Amé-
4
 Em: http://scholar.lib.vt.edu/ejournals/JITE/v34n3/Knoll.html
http://seminariopedagocrita.blogspot.com.es/2008/01/sobre-el-mtodo-de-proyec- 5
 Abbagnano, N., Visalberghi, A. (1988). Historia de la pedagogía. Madrid: Fondo de
to-parte-2.html Cultura Económica.
rica, que tem em Dewey e Kilpatrick os seus expoentes máximos. É John Dewey (1859-1952)
nos trabalhos destes últimos autores que podemos encontrar expli-
Foi um dos filósofos que maior influência exerceu sobre a práxis
citamente o Project Method.
educativa do mundo ocidental. Segundo este autor, o processo edu-
Nos desenvolvimentos teóricos recentes, onde encontramos diferen- cativo tem dois aspetos: um psicológico, que consiste na exterioriza-
tes denominações, como Trabalho por projetos, Projetos de trabalho, ção e na aplicação das potencialidades do indivíduo; e outro social,
Aprendizagem por projetos ou Pedagogia por projetos, integram-se que consiste em preparar e adaptar o indivíduo às tarefas que
diferentes teorias de aprendizagem: algumas de tipo construtivista, desempenhará na sociedade.
que vão desde a perspetiva psicogenética de Piaget até à perspetiva
Algumas das suas contribuições para o trabalho por projetos são:
sociocultural de Vygotsky, desde a conceção de aprendizagem signi-
ficativa de Ausubel até à conceção de Ensino para a Compreensão O seu pragmatismo, chamado instrumentalismo, pelo ênfase que
de Harvard, entre outros; e teorias de tipo behaviorista, recolhendo põe no valor instrumental do conhecimento e do pensamento em
as contribuições de autores como Watson ou Skinner6. geral para resolver situações problemáticas reais da nossa exis-
tência.
Vejamos, a seguir, alguma destas contribuições.
A análise de uma ideia em termos das consequências práticas
resultantes da sua aplicação.
A Escola Progressista norte-americana
56 57
O facto de partir da experiência real de cada aluno.
O facto de defender que toda a investigação tem como ponto de
partida uma situação problemática de incerteza e dúvida.
Segundo a Escola Progressista norte-americana, a
escolarização deve servir para que a criança A escola deve representar a vida quotidiana, uma vida que seja
aprenda da vida real e não só dos livros e da tradição aca- real e vital para a criança.
démica formal. Os aspetos científicos, técnicos e artísticos estão intimamente
relacionados entre si.

Nas origens do método por projetos estão John Dewey como


inspirador e William H. Kilpatrick na posterior materialização e
concretização da proposta. Ambos os autores, o primeiro com uma Algumas contribuições de Dewey
exposição mais filosófica da educação e o segundo com uma
perspetiva metodológica, inscrevem-se numa corrente renovadora
que refuta os modelos fragmentados de transmissão do saber que
✓  Learning by doing: aprender fazendo.
reproduzem as várias disciplinas na escola, assim como a passividade ✓  A educação é um processo social. A educação é cresci-
do estudante e a memorização de conteúdos sem aplicação prática. mento.
Nas suas propostas pedagógicas, defendem um conteúdo social do ✓  A educação não é uma preparação para a vida, a educação
que se ensina e uma aprendizagem a partir e para a própria vida do é a própria vida.
estudante.
✓  A atitude mais importante que se pode educar é o desejo
de continuar a aprender.
6
 García-Vera, N. O. (2012). La pedagogía de proyectos en la escuela: una revisión de
sus fundamentos filosóficos y psicológicos. Magis, Revista Internacional de Investi-
gación en Educación, 4 (9), 685-707.
Na aplicação das suas ideias, na sua própria escola laboratório como Specific Learning. Trata-se de projetos de ensino ou aprendiza-
espaço de vida e de trabalho, Dewey rompe com o espaço e com os gem específica, destinados a melhorar uma técnica, um procedi-
horários tradicionais, com a segmentação das disciplinas e com a mento ou uma habilidade concreta. Este tipo de projeto é o que
verticalidade do professor. Na sua escola, as crianças iam «fazer». está intimamente relacionado com grande parte do trabalho
escolar.
William Heard Kilpatrick (1871-1965)
A intenção de Kilpatrick foi difundir o pensamento de Dewey, pro-
porcionando indicações metodológicas suficientemente precisas,
para não exigir demasiado da capacidade inventiva dos professores, Algumas contribuições de Kilpatrick
e o suficientemente flexíveis, para não limitar a sua capacidade de
iniciativa. Desta forma nasceu o Método dos projetos, título de uma ✓  Advoga por uma integração dos fatores educativos, inte-
obra de Kilpatrick editada no ano de 1918. lectuais e emotivos, individuais e sociais, instrumentais e
Este autor parte da conceção de que o aluno aprende aquilo que lhe finalistas.
serve para a vida. Por isso advoga por uma «filosofia experimental ✓  Classifica os projetos segundo a sua finalidade.
da educação», em que o conhecimento se adquire através da expe-
58 riência. Também critica a divisão do conhecimento em matérias, 59
disciplinas ou áreas, porque aprender isoladamente significa que «o
aluno não vê ou não sente a utilidade ou a pertinência daquilo que se A Escola Nova e a pedagogia científica
lhe ensina». No final do século xix, e início do século xx, também na Europa se
Kilpatrick propõe um novo programa escolar, concebido pelo corpo registou um vasto movimento de renovação pedagógica. A primeira
docente, no qual as áreas se reúnam e organizem em função das contribuição por ordem cronológica foi a constituída pelas chamadas
necessidades do aluno. «escolas novas», isto é, instituições escolares de vanguarda fundadas
e dirigidas por docentes inovadores.
Para Kilpatrick, um projeto é um plano de trabalho escolhido
livremente com o objetivo de realizar algo que nos interessa. Kilpa- O impulso talvez mais eficaz à renovação pedagógica europeia foi
trick propõe quatro tipos de trabalho por projetos, segundo a finali- dado pela que se costuma chamar «pedagogia científica», porque,
dade concreta que se persiga: em vez de se fundamentar em tendências filosóficas, se apoiou
essencialmente nos novos conhecimentos sobre o desenvolvimento
Producer’s Project. Projetos com elaboração de um produto final
da criança, que proporcionaram novas ciências como a psicologia.
que partem do desejo de construir alguma coisa.
Consumer’s Project. Projetos para estudar um tema e desfrutar María Montessori (1870-1952)
com o conhecimento. Foi a primeira mulher licenciada em Medicina pela Universidade de
Problem Project. Resolver um problema intelectual desafiante Roma. Permaneceu ali durante alguns anos, na qualidade de assis-
para satisfazer uma curiosidade intelectual. Estes projetos tente na clínica neuropsiquiátrica, onde se ocupou, sobretudo, da
nascem, geralmente, no decurso das atividades que se levam a educação de «crianças anormais e mentalmente fracas».
cabo em projetos do primeiro e do segundo tipo, já que «todo o O sucesso que conseguiu na recuperação de muitas destas crianças
propósito de produzir, sobretudo se se reveste de um carácter sugeriu-lhe a ideia de que os seus métodos poderiam ser igualmente
educativo, acarretará certas dificuldades que, por sua vez, eficazes com as crianças consideradas «normais».
estimularão o pensamento».
Do seu trabalho podemos destacar o seguinte: São os critérios psicológicos que diferenciam o método de Decroly
do de Montessori, pois, à perspetiva analítica de Montessori, contra-
O núcleo da sua pedagogia fundamenta-se em conceber a educa-
põe-se a exposição global que, juntamente com a teoria dos interes-
ção como autoeducação, isto é, como um processo espontâneo.
ses, constitui a principal característica do método Decroly.
O seu método baseia-se na necessidade da criança aprender ao
Decroly sublinha a estreita relação que existe entre a globalização e
fazer.
o interesse. A psicologia globalista Decroly, que após um século de
O objetivo principal do método Montessori é que a criança desen- investigações se confirmou, pressupõe partir de temas propostos
volva ao máximo as suas possibilidades de aprendizagem dentro pelas próprias crianças, com a condição de que o docente controle
de um ambiente estruturado, que lhe seja atraente e motivador. que técnicas, noções, procedimentos, etc., é conveniente introduzir
Nas «casas da criança» que ela concebeu, tudo está criado à medida em cada momento.
da criança: mesas, cadeiras, armários, estantes, casas de banho, etc. Entre as principais contribuições deste autor, podemos indicar:
Os docentes devem diminuir as suas intervenções ao mínimo. A escola tem como primeiro objetivo a formação de cidadãos
O método Montessori desenvolve a totalidade da personalidade, democráticos e isto só se pode conseguir mediante o exercício de
não só as faculdades intelectuais, mas também a capacidade de uma prática escolar democrática.
60 decisão, de iniciativa e de escolha independente, além de ter em A escola deve educar para a vida preparando os homens e as 61
conta o desenvolvimento emocional. mulheres para se integrarem na sociedade, comprometendo-os a
construirem uma sociedade melhor.
A escola deve colocar em prática uma verdadeira pedagogia do
interesse, com métodos ativos e sem se submeter a uma hierar-
Algumas contribuições de Montessori quização de temas, partindo do mais simples para avançar para
o mais complexo.
✓  Ambiente de aprendizagem seguro, estruturado e ordenado.
✓  Profundo respeito pelas crianças.
✓  Independência e espontaneidade. Algumas contribuições de Decroly
✓  Método empírico e experimental.
✓  Novo enfoque dos conteúdos escolares.
✓  A globalização, base da aprendizagem escolar, e a vida,
Ovide Decroly (1871-1932) como objeto da educação.
Médico e psicólogo belga, fundou, em 1907, L'École de I'Ermitage , 7
✓   Organizar todas as atividades escolares em torno de
centro experimental de reconhecido prestígio internacional que núcleos temáticos ou centros de interesse significativos
nasce sob o lema: École pour la vie et par la vie8. Nesta instituição, adequados a cada idade.
Decroly introduz os centros de interesse e vai perfilando a sua teoria
sobre a globalização no ensino. ✓  Organização de atividades de observação, associação e
expressão.

7
  A École de I'Ermitage.
8
  Escola para a vida e pela vida.
A pedagogia social em França O conceito de funcionalismo adquire em Freinet uma dimensão cen-
tral. Partir da criança supõe criar instituições onde o trabalho escolar
Célestin Freinet (1896-1966)
tenha um sentido, uma utilidade, uma função. Todas as suas técnicas
Freinet é o precursor da Escola Moderna, uma escola que parte da estão ao serviço da capacidade de experimentação e de expressão
criança, respeitando a sua evolução natural e todas as suas poten- das crianças para dar solução às suas necessidades imediatas.
cialidades e que tenta educá-la para a vida. As propostas de Freinet
nascem da realidade escolar quotidiana, já que ele era um professor O construtivismo
de aldeia.
Neste enfoque, encontramos um grande número de teorias, entre as
Os seus princípios educativos são: quais podemos mencionar a epistemologia genética de Jean Piaget,
A educação deve promover o desenvolvimento total da pessoa e a teoria sociogenética ou sociocultural de Lev Vygotsky, a teoria da
não ser uma acumulação de conhecimentos nem um ensino. aprendizagem significativa de David Ausubel e a teoria das inteli-
gências múltiplas de Howard Gardner.
A escola deve estar centrada na criança. Parte-se da ideia de que
é a criança quem aprende e, portanto, a organização curricular
deve estar subordinada à sua capacidade de aprendizagem, o que
leva a organizar a sala de aula a partir dos interesses dos alunos. Características da visão construtivista da
62 63
aprendizagem:
A investigação experimental é a base e a primeira condição do
esforço de modernização escolar para a cooperação. ✓  A aprendizagem é um processo de reorganização cognitiva.
✓  A aprendizagem depende do nível de desenvolvimento do
aprendiz.
Algumas contribuições de Freinet ✓  A aprendizagem é favorecida pela interação social.
✓  A aprendizagem parte da tomada de consciência da realidade.
As técnicas de Freinet constituem um leque rico e coerente
de atividades que propõem:
Jean Piaget (1896-1980)
✓  A tentativa experimental.
A psicologia genética, fundada por Jean Piaget durante a primeira
✓  A livre expressão infantil. metade do século xx, teve um enorme impacto sobre a educação,
✓  A educação pelo e para o trabalho. tanto no que se refere à teoria como na própria prática pedagógica.
✓  A cooperação. Na sua obra, Piaget tenta explicar como é que se constrói o conhe-
cimento. Oferece-nos uma visão do ser humano como um organismo
✓  A investigação do ambiente.
que, ao atuar sobre o meio modifica-o e modifica-se também a si
✓  A importância do bom ambiente escolar e social. próprio. Considera o desenvolvimento da inteligência e a aquisição
✓  A necessidade de criar material para potencializar essas do conhecimento como processos indissociáveis. Para ele, os conhe-
ideias na prática educativa. cimentos derivam da ação, não como simples respostas associativas
mas num sentido mais profundo, que implica um desenvolvimento
✓   O plano de trabalho, as assembleias, as bibliotecas, a intelectual, um exercício da inteligência onde estão presentes quer
revista escolar, etc. os processos de assimilação quer os de acomodação.
Algumas contribuições de Piaget Algumas contribuições de Vygotsky

✓  O conhecimento não pode ser implementado desde fora, ✓  O cérebro não é um mero suporte das funções psicológicas
mas tem de ser construído ou reconstruído pelo aprendiz. superiores, mas parte da sua constituição.
✓  O desenvolvimento intelectual e a aquisição do conheci- ✓  O surgimento das funções superiores não elimina as ele-
mento são dois processos intimamente relacionados. mentares, o que acontece é a superação das funções ele-
mentares pelas superiores.
✓  O professor não tem que ensinar, mas favorecer as condi-
ções para que o aluno aprenda. ✓  O funcionamento do cérebro molda-se ao longo da história
da espécie (base filogénica) e do desenvolvimento indivi-
dual (base ontogénica), como produto da interação com o
Lev S. Vygotsky (1896-1934)9 meio físico e social (base sociogénica).
A teoria do desenvolvimento vygotskiana parte da conceção de
64 que todo o organismo é ativo e estabelece uma contínua interação 65
entre as condições sociais e a base biológica do comportamento David Ausubel (1918-2008)
humano. O ponto de partida são as estruturas orgânicas elemen- David Ausubel define a aprendizagem significativa como «a nova
tares, determinantes para a maturação, a partir das quais se informação que se incorpora de forma substantiva, não arbitrária,
desenvolvem as funções mentais, que dependem em grande parte à estrutura cognitiva do aluno. Por isso existe uma intencionalidade
das experiências sociais da criança. Nesta perspetiva, o processo para relacionar os novos conhecimentos adquiridos com os do nível
de desenvolvimento segue duas linhas diferentes: um processo ele- superior, que são mais inclusivos e que já existiam na estrutura
mentar, de base biológica, e um processo superior, de carácter cognitiva.»
sociocultural.
Ausubel acreditava que a compreensão de conceitos, princípios e
Vygotsky considerava que a aquisição da linguagem constitui o ideias consegue-se através do raciocínio dedutivo. Portanto, as teo-
momento mais significativo do desenvolvimento cognitivo das crian- rias e os métodos de ensino devem estar relacionados com a ativi-
ças. A linguagem representa um importante salto nas funções supe- dade que se realiza na sala de aula e com os fatores cognoscitivos,
riores, já que constitui um complexo sistema simbólico que funciona, afetivos e sociais que nela influem.
não só, como instrumento de comunicação, mas também como ins-
Segundo este autor, a construção do conhecimento começa com a
trumento de planificação e autorregulação.
observação e o registo de acontecimentos e objetos através dos
Este autor ressalta que as possibilidades de aprendizagem de uma conceitos que já temos. Aprendemos mediante a construção de uma
criança estão intimamente relacionadas com o nível de desenvolvi- rede, acrescentando conceitos novos aos existentes.
mento alcançado num determinado momento. Existe, portanto,
A aquisição e a retenção de conhecimentos não se limita aos contex-
uma zona de desenvolvimento potencial.
tos formais de instrução, onde professores e alunos interatuam, já
que se trata de um processo presente durante toda a nossa vida,
que se torna essencial para a atuação competente, a gestão eficaz
9
 Lucci, M. (2006). A proposta de Vygotsky: a psicologia sócio-histórica. Revista de e a melhoria do trabalho quotidiano.
currículum y formación del profesorado, 10, 2.
Bruner expõe que «a um aluno não se lhe deve falar de física, histó-
ria, ciências ou matemática, mas deve fazer física, história, ciências
Algumas contribuições de Ausubel ou matemática. O conhecimento verdadeiramente adquirido é
aquele que se redescobre.
✓  É um firme defensor da aprendizagem significativa em vez Por outro lado, ao falar do currículo, este autor defende aquilo que
da memorização. se chamou currículo em espiral, que «se baseia em passos sucessivos
✓  Conhecer a organização da estrutura cognitiva dos alunos de um mesmo domínio de conhecimento e tem o objetivo de promo-
permitirá uma melhor orientação do trabalho educativo, já ver a aprendizagem da estrutura subjacente de forma cada vez
que não se trata de um trabalho que se desenvolva sobre mais poderosa e argumentada».
«mentes em branco». A aprendizagem é um processo ativo, de associação, de construção
✓  Os alunos e as alunas têm uma série de experiências e de e de representação mental. A estrutura cognitiva prévia que possui
conhecimentos que afetam a sua aprendizagem e que um aluno ou uma aluna abastece de significado as aprendizagens e
devem ser aproveitados em seu benefício. Em palavras do permite organizar as novas experiências e ir mais além da informa-
próprio David Ausubel: ção dada.

66 «Se tivesse de reduzir toda a psicologia educativa a um 67


só princípio, enunciaria este: "O fator mais importante
que influi na aprendizagem é o que o aluno já sabe. Ave- Algumas contribuições de Bruner
rigue isto e ensine consequentemente”».

✓  Aprendizagem por descoberta.


✓  O corpo docente deve motivar os estudantes para que
Jerome Bruner (1915-2016)10 sejam eles próprios a descobrir relações entre conceitos e
Precursor da aprendizagem pela descoberta, Bruner considera que construam o seu conhecimento.
os estudantes devem aprender através da descoberta guiada, que ✓  A informação ou conteúdos de aprendizagem devem apre-
ocorre durante uma exploração motivada pela curiosidade. Por- sentar-se de uma forma adequada à estrutura cognitiva
tanto, o trabalho do corpo docente não é explicar uns conteúdos, do aluno.
mas proporcionar o material adequado para estimular os seus alu-
nos mediante estratégias de observação, comparação, análise de ✓   O currículo deve organizar-se de forma espiral, o que
semelhanças e diferenças, etc. pressupõe trabalhar os mesmos conteúdos, ideias ou
conceitos cada vez com mais profundidade.
Este autor desenvolveu uma teoria da aprendizagem em que des-
creveu o processo de aprender e os diferentes modos de representa- ✓  As crianças vão modificando as suas representações men-
ção. O aprendiz codifica e classifica os dados que lhe chegam do tais à medida que se desenvolve a sua cognição ou capaci-
meio ambiente através das categorias que já dispõe. Estes proces- dade de categorizar, conceptualizar e representar o mundo
sos intermédios entre os estímulos e as condutas dependem das que os rodeia.
necessidades, das experiências, das expectativas e dos valores.

 Esteban, M. (2008). As ideias de Bruner: da «revolução cognitiva» à «revolução cul-


10

tural».
Howard Gardner (1943-)11
Gardner questiona a maneira tradicional de compreender a inteli-
gência e pretende ampliar o alcance do potencial humano além do Algumas contribuições de Gardner
número do quociente intelectual. Começa a estudar a inteligência
desde outro ponto de vista, através de diferentes disciplinas e do ✓  Gardner, da mesma forma que Dewey e Kilpatrick, entende
trabalho de campo com pacientes com lesões cerebrais. A partir que os projetos de trabalho são uma estratégia educativa
destas investigações chega à conclusão de que a inteligência é a que deve partir de propostas dos próprios alunos.
capacidade de resolver problemas e criar produtos. ✓  Os projetos fazem com que o processo de ensino-aprendi-
Apresenta o seu primeiro modelo teórico sobre a inteligência: zagem seja mais ativo.
a teoria das Inteligências Múltiplas. Segundo esta proposta, a mente ✓  Os projetos implicam um ensino globalizado e requerem
humana é como um computador que processa a informação. A mente trabalho cooperativo e construtivo; não é a tarefa de um
está organizada em oito inteligências ou habilidades cognoscitivas de um só aluno, mas sim de toda a turma.
diferentes: musical, físico-cinestésica, lógico-matemática, linguís-
✓  O objetivo dos projetos é estimular as crianças para cria-
tica, reflexo-espacial, interpessoal, intrapessoal e naturalista (esta
rem significados mediante interações com o mundo físico e
última foi incluída uns anos mais tarde).
68 social. 69
Com o objetivo de proporcionar uma base teórica às suas afirma-
✓  Os projetos implicam planificação, colocação em prática e
ções, Gardner estabeleceu uns testes básicos que cada inteligência avaliação.
deveria superar para ser considerada como tal e não ficar simples-
mente num talento, numa habilidade ou numa aptidão.
Os pontos-chave da teoria das inteligências múltiplas são:
O behaviorismo
Todos possuímos as oito inteligências.
A maior parte das pessoas pode desenvolver cada inteligência No enfoque behaviorista encontramos o conjunto de teorias
até alcançar um nível de competência adequado. conhecidas com a denominação de teorias do condicionamento
estímulo-resposta. O behaviorismo parte de uma conceção empírica
Em geral, todas as inteligências funcionam juntas de modo
do conhecimento, que se baseia nos estudos da aprendizagem
complexo.
realizada mediante condicionamento, e considera desnecessário
Existem muitas maneiras de ser inteligente em cada categoria. conhecer os processos mentais superiores para a compreensão da
A capacidade cognitiva é específica de um campo ou domínio e conduta humana.
para poder avaliar, num grau suficiente, as capacidades e os Dentro deste enfoque, as teorias mais conhecidas são a teoria cone-
potenciais cognitivos de uma pessoa, é preciso que entre em xionista de Thorndike e a teoria do condicionamento por reforço de
contacto com os materiais e a informação de vários domínios. B. F. Skinner.
Neste sentido, concebe o Projeto Spectrum12.
O ondutismo de Skinner considera três elementos fundamentais: o
estímulo discriminativo, a resposta operante e o estímulo que
11
 Prieto, M. D., Ballester, P. (2003). As inteligências múltiplas. Diferentes formas de reforça. Esta teoria exerceu grande influência no campo educativo
enseñar y aprender. Madrid: Pirámide. Gardner, H. (2005). Inteligencias múltiples. La
teoría en la práctica. Barcelona: Paidós.
ao propor o modelo de ensino programado e, com o auge dos com-
12
  http://www.pz.harvard.edu/projects/project-spectrum putadores, está a adquirir novas perspetivas.
Os irmãos Johnson (1999) definem os componentes essenciais que
determinam que o trabalho cooperativo seja mais produtivo que o
Algumas contribuições do behaviorismo trabalho competitivo ou individualista:
Interdependência positiva bem definida.
✓  O ensino programado. Interação cara a cara.
✓  A subdivisão das tarefas. Responsabilidade individual e responsabilidade grupal bem defi-
✓  A motivação intrínseca (reforçadores sociais). nidas para conseguir atingir as metas.
Desenvolvimento das habilidades interpessoais.
✓  Cada aluno tem o seu próprio ritmo de aprendizagem.
Por parte do grupo, análise frequente e periódica do seu funcio-
namento atual com o objetivo de melhorar a sua eficácia futura.

1.4. CHAVES PEDAGÓGICAS NO TRABALHO POR PROJETOS Aprendizagem por competências


Como vimos, os princípios do trabalho por projetos procedem de De acordo com a definição da Comissão Europeia, uma competên-
várias fontes e, apesar de guardarem uma notável coerência entre cia é a capacidade demonstrada para utilizar conhecimentos e habi-
70 eles, derivam em perspetivas diferentes. lidades. O conhecimento é o resultado da assimilação de informação 71

Assinalamos a seguir algumas chaves pedagógicas a ter em conta que tem lugar no processo de aprendizagem. A habilidade é a capa-
no trabalho por projetos: cidade para aplicar conhecimentos e utilizar técnicas com o objetivo
de completar tarefas e de resolver problemas.
Aprendizagem significativa As competências manifestam-se na realização de ações num con-
Um dos objetivos que pretendemos com o trabalho por projetos é texto particular e desenvolvem-se através da ação e da interação.
que os alunos e as alunas aprendam de um modo significativo. Um dos desafios que temos como docentes é desenvolver as habili-
A teoria da aprendizagem significativa, proposta originariamente dades e as competências dos nossos alunos, entre as quais se des-
por Ausubel, defende que o processo de construção de significados tacam as chamadas competências do século xxi : colaboração,
é o elemento central do processo de ensino-aprendizagem. O aluno comunicação, pensamento crítico e uso das novas tecnologias. Estas
aprende um conteúdo quando é capaz de lhe atribuir um significado. competências devem ensinar-se explicitamente e, além disso, con-
vém oferecer oportunidades para que os alunos as ponham em prá-
Aprendizagem cooperativa
tica, através das tarefas e atividades propostas no projeto.
A aprendizagem por projetos não se pode separar do trabalho coope-
rativo. Como dizia Pere Pujolàs (2001), «aprender, numa perspetiva Aprender a aprender
curricular, é um processo complexo em que intervêm de forma intera- A Comissão de Cultura e Educação da União Europeia considera
tiva os alunos, o professor e os conteúdos, num determinado contexto «aprender a aprender» como uma competência básica que tem
definido pelas atividades de aprendizagem. Na construção de conhe- grande influência em todas as outras. A definição que realiza é a
cimentos e na realização de aprendizagens significativas, são deter- seguinte: «Aprender a aprender é a capacidade para prosseguir,
minantes as interações sociais que se estabelecem, não só entre o persistir e organizar a própria aprendizagem, o que implica realizar
professor e os alunos, mas também entre os próprios alunos e entre um controlo eficaz do tempo e da informação, individualmente
eles e os conteúdos objeto de aprendizagem». e em grupo.» Esta competência tem grande importância na apren-
dizagem permanente, não só durante a infância e a juventude, mas e a motivação dos alunos, produzem satisfação e criam uma apren-
também na idade adulta. dizagem mais funcional, dado que se dão respostas fundamentadas
Aprender a aprender supõe dispor de habilidades para se iniciar na em evidências.
aprendizagem e ser capaz de continuar a aprender de maneira cada
Desenvolvimento do pensamento crítico e criativo14
vez mais eficaz e autónoma durante toda a vida. Isto é necessário
ser ensinado e treinado. O pensamento crítico é o processo de analisar e avaliar o próprio
pensamento com o propósito de melhorá-lo, e pressupõe o conheci-
O currículo integrado mento das estruturas básicas do pensamento. Quando falamos de
Nos projetos, o currículo deve integrar-se e organizar-se à volta de pensamento crítico e criativo, referimo-nos a um pensamento que
temas, desafios, tópicos geradores, etc., que superem os limites das questiona, que indaga, que faz perguntas e procura respostas.
disciplinas. O objetivo é que o aluno ou a aluna manejem quadros
teóricos, conceitos, procedimentos e habilidades de diferentes disci-
plinas para compreenderem ou solucionarem as questões e os pro-
blemas que lhes são colocados. Chaves pedagógicas no trabalho por projetos
Um projeto não pode abranger a mesma amplitude de conteúdos
72 que outro tipo de metodologias, mas permite trabalhá-los com No trabalho por projetos teremos em conta: 73
maior profundidade. Por isso, é necessário selecionar os conteúdos ✓  Que a aprendizagem seja significativa.
mais importantes e significativos e assegurar que os que podem ser ✓  Que exista trabalho cooperativo.
mais úteis aos alunos sejam de uma ou várias áreas, para serem
✓  Que se favoreça a aprendizagem competencial.
desenvolvidos no projeto.
✓  Que se ensine a aprender a aprender.
A investigação13 ✓  Que se integrem as diferentes áreas do currículo.
Introduzir a investigação na prática educativa supôs um esforço ✓  Que se favoreça a investigação.
importante para romper o estreito espaço formativo que é a trans- ✓  Que se desenvolva o pensamento crítico e criativo.
missão dos conhecimentos para alunos que precisam de compreen-
der e dar respostas às incógnitas que lhes vão sendo colocadas no
dia a dia.
1.5.  TIPOS DE PROJETOS
Aprender através da investigação implica participar em experiências
Os diferentes tipos de projetos facilitam que os alunos e as alunas
que despertam o interesse e questionam o conhecimento que se
desenvolvam diferentes classes de conhecimentos e habilidades,
possui sobre um determinado tema, o qual nos leva à forma natural
ainda que entre estas existam importantes aspetos em comum,
que tem o género humano para se aproximar àquilo que desconhece:
como por exemplo, a investigação.
perguntar, procurar informação, comprovar e tirar conclusões. As
interações pessoais e materiais que se põem em funcionamento, A tipologia que aqui se propõe é de carácter indicativo e não deve
quando se explora uma situação controversa, promovem o interesse ser assumida de uma forma estrita. Muitos dos projetos que se rea-

 Pozuelos, F. J., Travé, G. (2005). Aprender investigando, investigar para aprender:


13

el  punto de vista de los futuros docentes. Investigación en la Escuela n.º 54,  Paul, R., Elder, L. (2005). Una guía para los educadores en los estándares de compe-
14

págs. 2-25. tencia para el pensamiento crítico. Fundación para el Pensamiento Crítico.


lizam na escola não são projetos puros e partilham traços de várias – Elaboração do guião.
das tipologias enunciadas. – Planificação e organização do trabalho.
– Produto final.
– Difusão.
Tipos de projetos Projetos científicos
Nestes projetos os alunos e as alunas realizam, em função das suas
✓  Projetos de investigação.
possibilidades, investigações semelhantes às dos cientistas. Em
✓  Projetos científicos. geral, parte-se de uma hipótese que é preciso comprovar, para o que
✓  Projetos tecnológicos. é necessário tomar decisões sobre o procedimento a seguir para
✓  Projetos de serviço de cidadão. realizar a experiência. Para fechar o projeto, elabora-se um relatório
✓  Projetos de compreensão. que recolha os resultados da investigação, as evidências e as conclu-
sões.
As principais fases de um projeto científico são:
Projetos de investigação
74 – Identificação e seleção do problema. 75
Em sentido estrito, os projetos de investigação implicam a desco-
– Formulação da hipótese.
berta de algum aspeto da realidade e a produção de um novo conhe-
cimento, que pode estar dirigido a incrementar os postulados – Planificação do projeto.
teóricos de uma determinada ciência (investigação pura ou básica), – Pesquisa e registo da informação.
ou pode ter uma aplicação imediata na solução de problemas práti- – Execução da experiência.
cos (investigação aplicada).
– Recolha e análise dos dados.
Relativamente ao tipo de design, a investigação classifica-se em: – Elaboração e apresentação do relatório final.
Investigação documental: é aquela que se baseia na obtenção e
na análise de dados provenientes de materiais impressos ou de Projetos tecnológicos
outros tipos de documentos. Nos projetos tecnológicos, os alunos desenvolvem ou avaliam um
Investigação de campo: consiste na recolha de dados direta- processo ou um produto de utilidade prática, imitando assim o tra-
mente da realidade onde ocorrem os acontecimentos, sem mani- balho dos técnicos. O desenvolvimento destes projetos consiste
pular ou controlar qualquer variável. principalmente, na criação e na construção de um artefacto através
Investigação experimental: consiste em submeter um objeto ou de uma metodologia de design.
um grupo de indivíduos a determinadas condições ou estímulos As fases dos projetos tecnológicos são:
(variável independente), para observar os efeitos que se produ-
– Compreender.
zem (variável dependente). Esta difere da investigação de campo
através da manipulação e do controlo de variáveis. – Definir.

As principais fases de um projeto de investigação são: – Idealizar.


– Prototipar.
– Seleção do tema.
– Avaliar.
– Pesquisa e seleção da informação.
Projetos de serviço de cidadão
2. O trabalho por projetos, algo mais
Neste tipo de projetos, os alunos atuam como cidadãos inquietos e
críticos, que solidariamente consideram os problemas que os afe-
do que um método
tam, informam-se, propõem soluções e, inclusive, colocam-nas em Nenhum conhecimento humano poderá ir mais longe do que a sua
prática e difundem-nas. Dentro deste tipo de projetos, estão os cha- experiência.
mados projetos de aprendizagem e serviço, em que se desenvolvem
John Locke
tarefas sociais relevantes.
As fases dos projetos sociais são:
– Motivação.
– Diagnóstico. Antes de começar este capítulo, sugerimos-lhe que
se faça a si próprio estas perguntas:
– 
Design e planificação.
– Execução. ✓  Quais os benefícios de trabalhar por projetos?
– Reflexão e avaliação. ✓  Quais os riscos?
76 – Reconhecimento e celebração. Neste capítulo vai encontrar investigações que lhe propor- 77
cionarão argumentos sobre os motivos para trabalhar com
Projetos de compreensão projetos.
Estes projetos surgem na Universidade de Harvard através do Pro-
jeto Zero, fundamentado no trabalho das Inteligências Múltiplas de
Howard Gardner. A sua finalidade é desenvolver a compreensão nos
alunos levando a cabo uma diversidade de ações ou tarefas (desem-
penhos) que demonstrem que o aluno ou a aluna entende o tema 2.1.  O CÉREBRO E O TRABALHO POR PROJETOS
proposto (estereótipo generativo) e, ao mesmo tempo, é capaz de Ouço e esqueço.
assimilar esse conhecimento com a profundidade suficiente para Vejo e recordo.
poder utilizá-lo em outras situações. Faço e compreendo.

O quadro conceptual dos projetos de compreensão inclui quatro Confúcio


ideias chave:
Estes três simples enunciados de Confúcio, de há cerca de 2400
– Os tópicos geradores. anos, indicam-nos, de forma simples, algumas chaves do modo
– As metas de compreensão. como aprendemos. Parece claro que a nossa mente não funciona
– Os desempenhos de compreensão. como um gravador, e que no trabalho por projetos se parte, preci-
samente, do fazer. O cérebro, não só recebe informação, como
– A avaliação diagnóstica contínua.
também a processa. O propósito deste capítulo é listar as princi-
pais investigações sobre o cérebro e sobre o trabalho por projetos
para, assim, unindo ambas, poder conhecer a maneira mais eficaz
de aprender.
O que sabemos sobre o cérebro o mesmo, já que não têm os mesmos conhecimentos prévios nem
o mesmo modo de aprender. O trabalho por projetos oferece
Só compreendendo como é que o cérebro adquire e conserva a
alternativas a esta variedade de estilos de aprendizagem e tem
informação é que seremos capazes de conhecer os limites da sua
em conta, além disso, as experiências prévias.
capacidade para aprender. Listamos, de seguida, alguns pontos
sobre o que se sabe do cérebro e da sua relação com a aprendizagem
mais concretamente, com a aprendizagem através de projetos de 2.2. QUAIS SÃO OS RESULTADOS DA APRENDIZAGEM AO
trabalho: TRABALHAR POR PROJETOS?
A plasticidade cerebral. O grau de modificação que se produz no Parece ser aceite que o trabalho por projetos tem efeitos positivos
cérebro depende do tipo de aprendizagem. A aprendizagem a sobre a aprendizagem. Os estudos científicos realizados apoiam
longo prazo implica uma modificação mais profunda. Os projetos esta hipótese. Os principais benefícios para os alunos deste modelo
implicam a aquisição de aprendizagens mais duradouras no didático, destacados por alguns autores e encontrados por Lourdes
tempo. Galeana15, são os seguintes:
A importância do ambiente. A qualidade do ambiente social e das Desenvolvem-se habilidades e competências. Os projetos favore-
interações que se produzem influem na aprendizagem. O traba- cem a colaboração, a planificação, a comunicação, a tomada de
78 lho por projetos favorece um bom ambiente. decisões e a administração do tempo. 79
O cérebro emocional. O manuseio e a autorregulação das pró- Segundo Martínez, Herrero, González e Domínguez (2007), os
prias emoções é uma das habilidades chave de um aprendiz efi- alunos que trabalham por projetos melhoram a sua capacidade
caz. O trabalho por projetos melhora a autorregulação da para trabalhar em equipa; põem em jogo maior esforço, motiva-
aprendizagem e costuma criar emoções positivas nos alunos e ção e interesse; aprendem a fazer exposições e apresentações;
nas alunas. melhoram o aprofundamento dos conceitos; têm menos stress
em época de exames; o trabalho com os conteúdos é-lhes mais
A motivação. Está muito ligada às emoções e é crucial para a
fácil, ameno e interessante; detetam os erros com maior facili-
aprendizagem. Os alunos aprendem com maior facilidade se o
dade; têm uma melhor relação com o corpo docente e melhoram
fizerem por si próprios, com o desejo de compreenderem.
também a relação com os colegas.
A educação tradicional focou-se na motivação extrínseca, vincu-
lada a fatores externos. O trabalho por projetos pretende fomen- Aumenta a motivação. Regista-se um aumento da assiduidade,
tar a motivação intrínseca, vinculada a fatores internos. maior participação na aula e melhor disposição para a realização
A combinação de motivação e autoestima é essencial para uma das tarefas.
aprendizagem bem-sucedida. Integra-se a aprendizagem na escola com a realidade. Os alunos
As interações sociais. São importantes catalizadoras da aprendi- retêm maior quantidade de informação quando estão compro-
zagem. Sem elas, um indivíduo não pode aprender nem desenvol- metidos com projetos estimulantes em que se faz uso de habili-
ver-se adequadamente. O trabalho partilhado com outro colega, dades mentais de ordem superior em vez de memorizar dados
que é favorecido pela metodologia de projetos, capacita os alu- em contextos isolados, sem conexão. Também se estabelecem
nos para desenvolver melhores estratégias e refinar o seu racio- relações entre diferentes disciplinas e dá-se ênfase à utilização
cínio. do conhecimento no mundo real.

As diferenças individuais. As experiências prévias jogam um papel


fundamental na aprendizagem. Os alunos e as alunas da mesma
sala de aula, perante os mesmos estímulos, não aprenderão   Informação extraída de http://ceupromed.ucol.mx/revista/PdfArt/1/27.pdf
15
Segundo Willard e Duffrin (2003), o trabalho por projetos que, no caso de conhecerem esta metodologia, cada novo projeto
melhora a satisfação com a aprendizagem e prepara melhor os será único.
estudantes para enfrentar situações reais que vão encontrar no
seu futuro laboral. Inquietudes nos professores

Desenvolvem-se habilidades de colaboração. A aprendizagem Quanto às dificuldades expressas pelos professores, alguns dos
colaborativa permite aos alunos compartilhar ideias, expressar principais obstáculos encontrados são a elevada carga de trabalho
as suas próprias opiniões e propor soluções, habilidades necessá- e a dificuldade para avaliar.
rias posteriormente nos postos de trabalho. Um estudo realizado por Marx, Blumenfeld, Krajcik e Soloway (1997)
Aumentam as habilidades para a solução de problemas. mostrava que os professores que aplicam o trabalho por projetos
encontram dificuldades nos seguintes aspetos: tempo, administra-
Aumentam as forças individuais. Entre elas é essencial a melhoria ção da aula, controlo, apoio à aprendizagem dos alunos, uso da
dos estilos de aprendizagem individuais. tecnologia e avaliação. Quanto ao tempo, expunha-se que os proje-
Aprende-se a usar a tecnologia de maneira prática. tos costumam levar, em geral, mais tempo do que inicialmente se
programa. A administração da aula é um problema comum que
requer encontrar o equilíbrio entre permitir aos alunos que traba-
2.3.  INQUIETUDES SOBRE O TRABALHO POR PROJETOS16
80 lhem por sua conta e manter uma certa ordem. Algo parecido acon- 81
Quando enfrentamos, pela primeira vez, uma mudança, é frequente tece com o apoio à aprendizagem, já que os professores,
que surjam dúvidas e inquietudes. O trabalho por projetos supõe um frequentemente, têm dúvidas sobre se lhes dão demasiada ou pouca
reajuste relativamente complexo do processo de ensino-aprendiza- liberdade. O uso das TIC como ferramentas que fomentam o desen-
gem e, como todas as mudanças metodológicas, apresenta as suas volvimento de competências no aluno, e não só como ferramentas
dificuldades, especialmente no início da sua aplicação. de apoio à instrução do professor, supõe também alguma dificul-
dade. Por último, a avaliação dos projetos é um dos aspetos mais
Podemos mencionar quatro tipos de inquietudes:
complexos, já que deve evidenciar a aquisição de habilidades e des-
Inquietudes nos alunos trezas e não só a aprendizagem de conceitos.
Um estudo realizado por Krajcik, Blumenfeld, Marz, Bass, Fredericks
Inquietudes nas famílias
e Soloway (1998) descreve que os alunos e as alunas que enfrenta-
vam pela primeira vez um trabalho por projetos, tinham dificuldades Relativamente às famílias, a minha experiência diz-me que não pode-
no momento de levar a cabo as tarefas relacionadas com a criação mos pressupor que todos aceitem este tipo de mudança. Para mui-
de perguntas científicas significativas, administração do tempo, tos, esta metodologia é desconhecida, e surgem-lhes alguns medos e
transformação da informação em conhecimento e desenvolvimento inseguranças. Por isso, uma boa comunicação será fundamental para
de argumentos lógicos para apoiar as suas teses. que compreendam o que é que fazemos e porque é que o fazemos.
A minha experiência pessoal diz-me que os alunos, no início, não Algumas inquietudes que recolhi junto das famílias são:
sabem o que se espera deles. Por esta razão, é conveniente dedicar Que as crianças possam perder o tempo e não aprendam o suficiente.
tempo suficiente a explicar-lhes o processo, as tarefas que devem
Que não se consigam atingir os objetivos de aprendizagem
realizar, para onde é que a ação se dirige, etc. Não podemos esque-
propostos.
cer-nos que, para eles, também é uma nova maneira de trabalhar e
Que não exista esforço.
Que em casa não saibam ajudá-los, já que eles normalmente apren-
 Informação extraída de http://actualidadpedagogica.com/estudios_abp/
16
deram com um modelo instrutivo e é o que sabem reproduzir.
Que a aprendizagem dos alunos que costumam obter melhores
resultados, ao trabalhar com outros, se torne mais lenta.
3. Orientações para a prática
de projetos
Inquietudes na Administração educativa
Relativamente à Administração educativa, às vezes surgem dificul- O que temos de aprender
dades com o cumprimento do regulamento e com a falta de flexibi- a fazer, aprendêmo-lo fazendo.
lidade deste. Desta forma, podemos destacar a rutura com os Aristóteles
tempos estabelecidos para as diferentes áreas ou matérias (para
fazer um bom projeto não bastam sessões de 45 ou 55 minutos), o
cumprimento do currículo oficial, a diferente organização da sala de
aula, etc. Antes de começar este capítulo, sugerimos que
Nos seguintes capítulos, encontrará o modo de abordar estas reflita sobre estas questões:
inquietudes. Tê-las presentes desde o momento inicial, ajudar-lhe-á O que quer que os seus alunos aprendam?
a traçar um plano e a adiantar-se às dificuldades.
O que é que eles vão precisar de saber ao longo da vida?

82 Neste capítulo vai encontrar reflexões sobre o que há para 83


aprender, o que precisam de aprender e como relacionar
Depois de ler este capítulo estes dois pontos através do trabalho por projetos.

Faça um decálogo com as principais razões para trabalhar


por projetos e não o esqueça se surgirem dificuldades. 3.1.  O QUE QUERO QUE OS MEUS ALUNOS APRENDAM?
Antes de começar, faça um quadro com três colunas: na
O currículo no trabalho por projetos. O prescritivo
primeira faça uma lista do que pode resultar mal; depois
pense naquilo que pode fazer para que tal não aconteça e Partimos da ideia de que uma das principais tarefas do corpo
escreva-o na segunda coluna e, se ainda assim sucedesse, docente é construir propostas curriculares o mais coerentes possível
pergunte-se: o que é que poderia fazer para o solucionar? para facilitar a aprendizagem dos alunos. Assim, todas as decisões
Escreva as suas respostas na terceira coluna. Acabou de que se tomem devem contribuir para facilitar as condições para o
realizar o seu plano de contingência para o trabalho por desenvolvimento das aprendizagens previstas. A pergunta-chave
projetos. seria como integrar o currículo oficial no projeto.
A seguir recolhem-se algumas ideias:

Seleção do tema do projeto


É preciso saber a etapa, o nível, a área ou as áreas, etc., assim
como o tempo que se dispõe para a sua realização.
Que blocos de conteúdo e critérios de avaliação do currículo ofi-
cial é que devo cobrir? Relacione todos os elementos do currículo
e organize pequenos blocos, tantos como os temas e os projetos
que vá realizar ao longo do ano.
Pergunte-se: que características é que tem o seu grupo de alu- O quadro curricular tem de ter em conta todos os elementos do currí-
nos? O que lhes interessa? culo: os objetivos, os conteúdos, as competências-chave, os padrões de
aprendizagem avaliáveis, etc. Se estabelecêssemos um mapa de rela-
Relacione os dois passos anteriores. Relacione o que têm de
ções entre objetivos, conteúdos e critérios de avaliação com as compe-
aprender segundo o currículo oficial com os interesses dos seus
tências-chave, estaríamos a configurar uma rede sólida que nos
alunos e das suas alunas.
facilitaria muito o trabalho de programação do nosso projeto.
Decida se vai realizar o projeto sozinho ou com outros docentes.
A avaliação da aprendizagem
Dê um nome ao projeto, que seja atraente e fácil de comunicar e
que evidencie o tema que se vai trabalhar. Trata-se, não só, de avaliar o rendimento, mas também, de avaliar a
evolução e potencializar a consciência do aluno sobre a sua aprendi-
Cumprindo a lei zagem. Um dos elementos-chave nos projetos é a orientação e o
acompanhamento contínuo no processo. Integrar o desempenho
A lei estabelece-nos uns conteúdos oficiais de aprendizagem. Estes
e a retroalimentação é precisamente aquilo que os nossos alunos
conteúdos organizam-se em função do que os alunos têm de apren-
precisam para evoluir.
der num ano escolar (a longo prazo, programação didática) e num
tema (a curto prazo, unidade de programação ou projeto). No processo de programação definiremos os instrumentos que vamos
84 utilizar para realizar a avaliação: a observação sistemática do traba- 85
lho dos alunos, as provas orais e escritas, o portfólio, as rubricas e a
OBJETIVOS
COMPETÊNCIAS avaliação dos trabalhos da aula realizados ao longo do projeto, etc.
CHAVE O uso de instrumentos variados permitirá a integração de todas as
aprendizagens alcançadas num quadro de avaliação coerente.

Determinam se Se a cada instrumento e atividade de avaliação que se programe


Por meio de
foram alcançados acrescentar o critério e o padrão de aprendizagem que está a ava-
liar, poderá identificar e comunicar facilmente o que está a aprender
o aluno ou a aluna e que conteúdos do currículo oficial é que está a
alcançar.
CRITÉRIOS DE
AVALIAÇÃO
CONTEÚDOS
PADRÕES DE
APRENDIZAGEM
Para lá do currículo. O metacurrículo
Currículo, palavra proveniente do latim curriculum, significa «car-
Sequenciado em reira» e faz referência aos conteúdos das disciplinas e ao plano de
atividades/tarefas estudos de um determinado país.
Dão pistas segundo
Com o trabalho por projetos, queremos ir mais além do currículo,
para trabalhar e desenvolver nos nossos alunos habilidades, capaci-
dades e competências derivadas dos conteúdos que o
MÉTODO PEDAGÓGICO
TRABALHO POR PROJETOS currículo oficial assinala. Trata-se não só de saber, mas que cada
aluno seja capaz de responder à pergunta «o que é que posso fazer
FIGURA 1.  RELAÇÃO DOS ELEMENTOS DO CURRÍCULO17 com aquilo que sei?».
Com o trabalho por projetos podemos falar de metacurrículo, pois
 Baseado em Moya, J. e Luengo, F. (2011). Teoría y práctica de las competencias
17
expomos não só o que os alunos têm de aprender segundo a lei, mas
básicas. Barcelona: Editora Graó.
também aquilo que precisam e precisarão de saber fora do ambiente FASES DE DESENVOLVIMENTO DO TRABALHO POR PROJETO
escolar. Estamos a falar do currículo para o seu futuro, de um currí-
culo evoluído.
PREPARAÇÃO
David Perkins, após analisar as mudanças que se estão a dar no 1
mundo e na sociedade, assinala as habilidades imprescindíveis que 1.1. Definir o 1.2. Motivação. 1.3. Ponto de partida.
atualmente é preciso adquirir: trabalhar os meios de comunicação; tema chave. · Desafio. · Diagnóstico.
trabalhar com informação complexa (criar, processar, classificar, · Necessidades.
· Oportunidades.
etc.); trabalhar em equipa e desenvolver capacidades sociais e de
comunicação; saber pensar de maneira sistemática, crítica e cria- DESENVOLVIMENTO E EXECUÇÃO
tiva; saber adaptar-se às mudanças e ser flexível; saber enfrentar 2
problemas do mundo real e tomar decisões considerando diferentes 2.1. Compilação da informação. 1.4. Desenho e planificação.
elementos, e saber formular perguntas relevantes. Todos estes · Caderno de equipa. · Para quê: objetivos, intencionalidade.
· Caderno pessoal. · Porquê: fundamentação teórica.
aspetos deveriam recolher-se nesse metacurrículo. · O quê: produto final a desenvolver.
2.2. Investigação. · Para quem: destinatários.
· Com quem: equipas de trabalho, papel
3.2.  APRENDENDO A GERIR PROJETOS do professor.
86 87
2.3. Processamento de dados. · Quando: cronograma, fases de
O processo de planificação. Fases de desenvolvimento execução.

do projeto
2.4. Análise e síntese.
Se dispusesse de oito horas para derrubar uma árvore,
empregaria seis a afiar o machado. COMUNICAÇÃO E APRESENTAÇÃO
Abraham Lincoln 3
2.5. Produção e execução. 3.1. Compilação de
Apesar de cada tipo de projeto necessitar de umas etapas específi- · Exercícios. evidências de aprendizagem.
· Atividades. · Portfólio.
cas para o seu desenvolvimento, podemos assinalar algumas fases
· Tarefa ou produto final. · Blog.
genéricas que são comuns a todos: · ...
Preparação. CONCLUSÃO
Desenvolvimento e execução. 4

Comunicação e apresentação. 4.1. Metacognição. 3.2. Apresentação e comunicação


do produto final.
Conclusão.
4.2. Celebração e
De forma transversal, convém incorporar também estes aspetos: reconhecimento.

Reflexão. Cultura de pensamento.


4.3. Classificação.
Registo. Gestão do conhecimento.
Avaliação.
No quadro seguinte, recolhe-se, de maneira resumida, o processo de
execução do trabalho por projetos seguindo as fases anteriormente
mencionadas.
PROCESSOS TRANSVERSAIS Ponto de partida. Podemos planear o seguinte:
– Diagnóstico. Averiguar os conhecimentos prévios.
REFLEXÃO/CULTURA DE PENSAMENTO
– Necessidades. Averiguar as necessidades que os alunos terão
para o bom desenvolvimento do projeto.
REGISTO/GESTÃO DO CONHECIMENTO – Oportunidades. Assinalar as oportunidades que a realização
do projeto proporciona.
AVALIAÇÃO Desenho e planificação. Para a planificação, a resposta às seguin-

tes perguntas dá-nos uma ajuda:
Avaliação inicial. Avaliação contínua. – Para quê? Objetivos, intencionalidade do projeto, etc.
· Determinar · Feedback.
conhecimentos · Autoavaliação:
– Porquê? Fundamentação teórica.
prévios. rúbricas. – O quê? Produto final que se vai desenvolver.
· Coavaliação.
· Avaliação da equipa. – Para quem? Destinatários a quem se apresentará o projeto.
– Com quem? Composição das equipas de trabalho, papel
88 89
do corpo docente, ajudas externas (famílias, voluntários).
Avaliação final e global. Avaliação do produto.
– Quando? Cronograma e fases de execução.
· Classificação segundo critérios · Cumprimento dos
e padrões de aprendizagem. objetivos.
· Avaliação do programa ·Avaliação da qualidade 2.  Fase de desenvolvimento e execução
e da qualidade da aprendizagem. do produto.
Implica o início do desenvolvimento do projeto. As várias equipas pre-
· Avaliação de capacidades e atitudes.
· Avaliação do projeto. cisarão de espaços e de tempo para realizar o seu trabalho. As ativi-
dades variarão de acordo com o perfil dos alunos, o tipo de projeto e o
FIGURA 2.  ESQUEMA DAS FASES DE DESENVOLVIMENTO DE UM PROJETO tema escolhido. O corpo docente decidirá que conteúdos é que se vão
explicar e quais vão ser objeto de investigação por parte dos alunos.
Vejamos a seguir cada uma delas:
Compilação da informação. A consulta de fontes de informação

1.  Fase de preparação deve estar sempre presente, em maior ou menor grau, ao longo
Nesta fase realizam-se as primeiras conversas, expõe-se o tema de do processo. Como é que se obtêm os dados? Devemos planificar
trabalho, o propósito, o que se sabe do tema, as possíveis atividades como e onde obter os dados e a informação que os alunos vão
a desenvolver, os recursos necessários, etc. precisar para a execução do projeto.
Algumas ferramentas que podem ser úteis são fichas, questioná-
Definir o tema. O projeto deve ser consistente e apoiar as metas

rios, guias de entrevistas, gravações, etc. Tudo isto pode ser reco-
do plano de estudos. Deverá incluir experiências e problemas do
lhido no caderno individual e/ou de equipa.
mundo real. O título deverá ser motivador e atrativo.
I nvestigação. A investigação implica a descoberta de algum

Motivação. Devemos procurar a melhor maneira de «cativar» os

aspeto da realidade. Podemos utilizar o método científico ou
alunos para que se impliquem ativamente no desenvolvimento do
experimental, a aprendizagem por descoberta, a investigação
projeto. Não pode surgir de uma imposição. Não pode ser visto
guiada, a investigação de problemas sociais de interesse, a inves-
como uma obrigação, mas também não se trata de investigar
tigação de campo, etc. É preciso proporcionar aos alunos instru-
sobre o que cada um deseja.
mentos que favoreçam a boa realização desta investigação.
Processamento da informação. Análise e síntese. As atividades
  
Apresentação do produto final. O trabalho escolar é mais signifi-
que fecham a sequência de um trabalho prático têm a função de cativo quando existe um objetivo que vai além de um exame.
favorecer a elaboração de conclusões e a análise e avaliação por Quando os alunos têm de apresentar o seu trabalho a um
parte dos alunos do processo de trabalho seguido. Que tipo de público real, preocupam-se muito mais com a qualidade deste.
análise se pede? Como orientar os alunos sobre a forma mais Alguns autores diferenciam entre o debate, uma simples comu-
idónea de expressar, apresentar e comunicar os dados? Nesta nicação aos colegas e a apresentação pública, que implica uma
fase convém descrever as diferentes operações a que os dados comunicação a um público mais amplo utilizando diferentes
que obtemos serão submetidos: classificação, registo, tabulação, meios.
etc., assim como as técnicas de análise.
4.  Fase de conclusão do projeto
Algumas ferramentas que podem ser úteis são os esquemas, os
mapas mentais, os resumos, as comparações, etc. É importante ter definida a conclusão do projeto desde o início. Isto
ajudará à execução e planificação das tarefas a desenvolver.
Produção e execução. No início de cada projeto empreendemos
 
uma viagem intelectual com os nossos alunos com o objetivo de Metacognição. Nesta fase trata-se de pensar sobre o pensa-

conseguir alcançar uma aprendizagem significativa. Apoiar-nos- mento. Algumas ideias sobre a metacognição foram recolhidas
-emos em tarefas, atividades e exercícios que nos levarão ao por David Perkins e Robert Swartz num organizador gráfico, com
90 desenvolvimento de um produto final, em que se ponham em jogo forma de escada, que nos pode ajudar a refletir sobre o trabalho 91
capacidades e competências que coloquem em evidência as realizado.
novas aprendizagens. A variedade de produtos que definamos
enriquecerá os nossos projetos.
4. Planificar a execução do
Alguns tipos de produtos: processo de pensamento
na próxima vez que
– Produtos escritos: guiões, poemas, manifestos, folhetos, etc. tenhamos de o fazer.
– Produtos de apoio a uma apresentação: palestras, debates,
canções, obras de teatro, bailes, exposições, etc. 3. Avaliar se o levamos a cabo
de forma eficaz.
– Produtos noutros suportes: escultura, display, portfólios, etc.
– Produtos tecnológicos: blog, site, aplicações para desenvolvi-
mento de bandas desenhadas, cartazes, vídeos, ficheiros de
voz, etc. 2. Descrever como nos
envolvemos no processo de
pensamento.
3.  Fase de comunicação e apresentação
Trata-se de uma fase de grande relevância no trabalho por projetos.
1. Tomar consciência do tipo de
C ompilação das evidências de aprendizagem. Comunicar os
 processo de pensamento que
resultados da investigação e apresentar o trabalho final, não é só está a ser levado a cabo.
uma ação para fora, mas também para dentro, porque é o resul-
tado final do processo seguido e evidencia os trabalhos realiza-
dos ao longo do projeto. Uma ferramenta que pode ser de grande FIGURA 3. ESCADA DE METACOGNIÇÃO18

utilidade para isso é o portfólio.


 Swartz, R. J., Costa, A., Beyer, B., Reagan, R., Kallick, B. (2013). El aprendizaje basado
18

en el pensamiento. Cómo desarrollar en los alumnos las competencias del siglo  XXI.
Madrid: SM. Biblioteca de Innovación Educativa.
Celebração e reconhecimento. É o momento de reconhecer o tra-
 7.  Fase transversal. Avaliação
balho bem feito, avaliar o esforço e compartilhar as conquistas.
As quatro primeiras fases propostas no esquema da figura 2 têm o
Classificação. No sistema escolar devemos classificar a aprendi- seu momento de avaliação previsto, que é composto por determina-
zagem, que estará baseada nos critérios de avaliação e nos padrões dos objetivos relacionados com a aprendizagem. Pretende-se que a
de aprendizagem avaliáveis, e dependerá, além disso, dos acordos avaliação esteja constantemente presente na sala de aula. O que é
adotados. É importante que estes critérios estejam muito bem defi- que aprendemos com esta nova experiência? Que evidências de
nidos desde o início para evitar a arbitrariedade. Os alunos e as alu- aprendizagem vou recolher? Que instrumentos vou utilizar?
nas devem conhecer esta informação ao começar o projeto, pois vai
A seguir, apresentam-se algumas ideias para cada uma das fases da
ajudá-los a saber o que se espera deles e do seu trabalho. Algumas
avaliação.
ferramentas que podem ser úteis para a avaliação são as rubricas, as
escalas de observação, etc. Avaliação inicial. Pergunte-se: O que é que sabem os meus alu-

nos? Que conhecimentos são necessários para poder realizar
5.  Fase transversal. Reflexão. Cultura de pensamento adequadamente o trabalho prático? Possuem as capacidades
Esta fase, muito relacionada com a avaliação, implica o uso de fer- técnicas que a sua realização requer? As respostas que obtenha
ramentas que favoreçam a reflexão e a compreensão profunda dos a estas perguntas permitir-lhe-ão adequar a planificação às
92 diferentes conteúdos que se trabalharam, fomentando a autorregu- necessidades do grupo e de cada um dos seus alunos e das suas 93
lação e o aprender a aprender. alunas.

Ao longo do projeto podemos disponibilizar aos alunos ferramentas Avaliação contínua. É importante que os alunos vão realizando o

que os ajudem a processar a informação, a resolver problemas, seguimento do seu trabalho, reservando para isso tempo de aula
a tomar decisões, a aclarar ideias, a argumentar, etc. Para atingir e contando com o apoio docente. Este tempo é necessário por-
este objetivo as propostas de David Perkins e Robert Swartz sobre que ajuda a não perder de vista a finalidade do projeto e a corri-
as rotinas e as destrezas de pensamento podem ajudar-nos. gir erros. Pensar sobre o que aprenderam e o que ainda lhes falta
aprender, induz a fazer correções no caminho e a determinar os
6.  Fase transversal. Registo. Gestão do conhecimento esforços que devem ser aplicados para ajudar a que todos alcan-
cem a meta proposta.
Nesta fase transversal pretendemos que os alunos e as alunas, em
cada uma das tarefas que se levam a cabo ao longo da execução do Avaliação do produto. Permite, tanto ao docente como ao aluno,

projeto, obtenham a informação necessária e que possam recolher avaliarem o resultado do trabalho. Como ficou o nosso trabalho?
o conhecimento gerado bem como as correspondentes evidências. Está parecido com a ideia original? Para isso será muito útil o uso
de uma rubrica.
Algumas ideias para documentar um projeto nas diferentes etapas
da sua execução: Avaliação final e global. Os projetos são como icebergues, o que

se vê à primeira vista é apenas uma pequena parte de tudo o que
– F ase de preparação: plano estruturado do projeto, plano de
foi conseguido. Num projeto aprende-se muito mais do que ape-
equipa, manuais do projeto, etc.
nas conteúdos, o que converte os projetos em tarefas complexas
– Fase de desenvolvimento e execução: caderno de equipa, caderno e prolongadas. Determinar, de antemão, todas as capacidades e
pessoal de trabalho, relatório técnico do projeto, etc. as competências que se vão trabalhar e a maneira de recolher
– Fase de comunicação, apresentação e conclusão: portfólio, rela- esta informação, favorecerá a avaliação final. No quadro
tório final, comunicação, etc. seguinte propõe-se o percurso do que poderia ser o processo de
avaliação num projeto.
AVALIAÇÃO INICIAL A gestão dos materiais e dos recursos
Materiais. Convém fazer uma lista do material que vai precisar

para o correto desenvolvimento do projeto: equipas, dispositivos,
PROJETO
salas, material consumível, etc. Partilhe esta lista com os alunos.
Alguns dos materiais podem ser proporcionados por eles próprios
MEMÓRIA DE ou pelas suas famílias.
AVALIAÇÃO Recolher o Atividades, Desempenho
prescritivo técnicas e Recursos humanos. Propomos-llhe que, para o trabalho por pro-

instrumentos jetos, na medida do possível, se apoie em mais alguém. Algumas
ideias para isso:
JUÍZO DE VALOR
– Dois professores.
– Um professor e uma mãe ou um pai.
TOMADA – Um professor e um voluntário de apoio.
DE DECISÕES SELEÇÃO DE INFORMAÇÃO
– Aprendizagem entre pares.
FIGURA 4. DA AVALIAÇÃO À QUALIFICAÇÃO E AO PLANO DE MELHORIA
94 95
Os participantes no projeto
O papel dos alunos
A gestão do tempo O aluno é o protagonista ativo. A partir dos objetivos definidos, e
No trabalho por projetos, a pressa é o maior inimigo. Esta metodo- respeitando as suas qualidades pessoais e o seu estilo de aprendiza-
logia requer tempo suficiente para se poder desenvolver de uma gem, promovem-se a autoaprendizagem e o desenvolvimento das
forma autêntica. É necessário tempo para perfilar o problema ou o competências mediante diferentes recursos. O trabalho por proje-
desafio; tempo para definir o plano de trabalho; tempo para desen- tos supõe um maior compromisso e responsabilidade na própria
volver o que foi planificado; tempo para a comunicação de resulta- aprendizagem. O aluno deverá partilhar informação, assim como
dos, etc. As aulas de 45 ou de 50 minutos não favorecem o trabalho aprender a trabalhar com outros, gerindo os possíveis conflitos que
por projetos, por isso, convém dedicar períodos temporais mais possam surgir. Além disso, terá de dispor de estratégias para plani-
amplos, como uma manhã ou uma tarde completas. Assim, uma das ficar, controlar e avaliar os passos que vai dando.
tarefas mais importantes do docente será organizar os períodos de O papel do professor19
aula da maneira mais ampla possível, e controlar o tempo da reali-
Defendemos um papel protagonista dos alunos, mas esta metodo-
zação do projeto.
logia implica um papel muito ativo por parte do corpo docente.
Algumas ideias para ganhar tempo na sala de aula: Baseando-nos na obra de Perrenoud20 recolhemos as competências
– Leve tudo planificado e medido temporalmente. mais importantes para desenvolver a função docente:
– Comece pontualmente. – Organizar e animar situações de aprendizagem.
– Dê instruções claras. – Gerir a progressão das aprendizagens.
– Prepare a informação e o material necessários com antecipação.
– Impeça que as discussões se prolonguem demasiado tempo.
19
 Morales, P. (2005). Implicaciones para el profesor de una enseñanza centrada en el
alumno. Universidad Pontificia Comillas.
– Proporcione um cronograma do projeto. 20
 Perrenoud, P. (2004). Diez nuevas competencias para enseñar. Barcelona: Graó.
– Criar oportunidades para todos os alunos. O papel das famílias
– Implicar os alunos na sua aprendizagem e no seu trabalho. Convém planificar qual vai ser o papel das famílias no projeto.
– Trabalhar em equipa. O objetivo é fazer com que as famílias sejam nossas aliadas.
– Participar na gestão da escola. Papel passivo. É importante dar-lhes a conhecer, previamente, o

– Informar e implicar os pais. projeto que vamos realizar, em que consiste esta metodologia,
para resolver de antemão todas as dúvidas que possam surgir.
– Utilizar as novas tecnologias.
Ao longo do processo pode manter as famílias informadas sobre
– Enfrentar os deveres e os dilemas éticos da profissão.
o desenvolvimento do projeto e sobre as aprendizagens realiza-
– Organizar a própria formação contínua. das, através de um site, blog, das redes sociais, etc.
Alguma das tarefas concretas do corpo docente no trabalho por Papel ativo. Pode pedir a colaboração das famílias, quer para

projetos são: proporcionar materiais, participar no projeto dentro da sala de
Conhecer em profundidade as metodologias ativas. aula, facilitar dados, assistir à exposição final ou até para avaliar
o projeto, etc.

Enriquecer o desenho curricular.
Ajudar a perfilar os temas dos projetos.
96 A avaliação do projeto 97
Adotar o papel de facilitador da aprendizagem. Para isso é neces-
sário fomentar o trabalho autónomo dos alunos, assim como Para saber se realizámos um bom projeto, é preciso ter em conta
conceber atividades e estratégias de aprendizagem em diversos seis princípios21.
cenários, possibilitando que os alunos adquiram um papel ativo e
se interessem por aprender.
Conceber evidências que proporcionem valor, que por si próprias Os seis princípios de um bom projeto
permitam demonstrar as competências e aprendizagens adquiri-
das pelos alunos.
1. Rigor académico.

Ajudar a ampliar o campo de interesses dos alunos, propondo-
-lhes novas vivências e incentivando-os ao uso de novos recursos. 2. Autenticidade.
Ajudar os alunos a aprofundarem as suas reflexões. 3. Aprendizagem aplicada.
Proporcionar explicações. 4. Exploração ativa.

Criar o clima de trabalho adequado. 5. Conexão com o mundo adulto.
Dar um correto feedback. 6. Práticas de avaliação cumulativa.
Fazer do erro um motivo de aprendizagem.
Ajudar no controlo do tempo. Rigor académico. Os projetos devem ter em conta objetivos cur-

riculares específicos e competências das várias disciplinas.
Autenticidade. Os projetos utilizam um contexto do mundo real

e desenvolvem temas significativos para os alunos.

  Steinberg, A.: Real Learning, Real Work: School-to-Work as High School Reform.
21
Aprendizagem aplicada. Os projetos envolvem os alunos em pro-

blemas semiestruturados que exigem competências de trabalho
4. Como favorecer o trabalho por
em equipa, resolução de problemas, comunicação, etc. projetos
Exploração ativa. Os projetos vão além da sala de aula e impli-

O valor de uma ideia resideno
cam trabalhos de campo e explorações na comunidade.
uso da mesma.
Conexão com o mundo adulto. Os projetos conectam os alunos

Thomas A. Edison
com mentores adultos e com pessoas da comunidade.
Práticas de avaliação cumulativa. Os projetos implicam apresen-

tações por parte dos alunos e/ou avaliação do seu trabalho tendo
em conta critérios pessoais, curriculares e do mundo real.
Antes de começar propomos-lhe refletir

Que projeto vai realizar?


Depois de ler este capítulo
Como é que o vai fazer?
98 Neste capítulo apresentam-se diferentes estratégias que 99
Que elementos é que destacaria no trabalho por projetos?
podem servir para começar a trabalhar com esta metodologia.
Que conteúdo do currículo é que vai ser o primeiro em ser
transformado num projeto?
Explique-o nas redes: #eutrabalhoxprojetos. 4.1. ESTRATÉGIAS PARA DECIDIR O TEMA DO PROJETO
Mantenha-se atento quando estiver com crianças da idade dos
seus alunos, sobretudo no seu tempo de ócio. O que ouvir e o que
vir hoje pode ser-lhe útil amanhã.
Estude aquilo que eles gostam: esse grupo de música, essa série,
esse livro, etc. Analise um dos temas que tratam e comprove se
existe ligação a algum bloco de conteúdos do currículo. Use-o
para cativá-los. Acertará no alvo!
Leia jornais, revistas, livros, vá ao cinema, ao teatro, à última
exposição que chegou à cidade, etc. Na cultura pode encontrar
importantes elementos de inspiração.
Realize um inquérito aos seus alunos sobre os seus gostos e hobbies.

4.2. ESTRATÉGIAS PARA MOTIVAR OS ALUNOS


Para criar interesse, lance-lhes um desafio, um dilema, conte uma
história, um relato, etc. Apresente um material audiovisual que
centre a atenção dos alunos sobre o conteúdo do projeto que se
vai desenvolver.
O que é que o motiva? A paixão e a curiosidade do docente são o Sala de aula tradicional
melhor modelo para os alunos. Esta distribuição não
Faça perguntas durante as aulas para estimular a curiosidade: O possibilita o trabalho por
que é que aconteceria se...? Como é que é possível que...? O que projetos nem a aprendi-
é que tu farias nesse caso...? O que é que vocês sabem sobre...? zagem cooperativa. Fa-
Conceba perguntas que guiem e ajudem a refletir e a esclarecer vorece o trabalho indivi-
os conceitos mais importantes. dual.

Exponha diferentes pontos de vista sobre um mesmo tema. Por


exemplo, um conflito bélico contado desde a visão de cada um
dos grupos implicados.
Fale menos para provocar que os alunos pensem mais. Faça pau- FIGURA 5.  DISTRIBUIÇÃO DA SALA DE AULA TRADICIONAL
sas na aula para que trabalhem e reflitam sobre os temas que se
trataram. Assembleia em círculo
Sentar os alunos em cír-
Utilize o método socrático para fazer perguntas e organizar
100 culo promove a interação 101
debates entre os alunos sobre temas que criam controvérsia.
frente a frente. O profes-
Fomente o trabalho colaborativo através de pequenos grupos sor é mais um. É muito
nos quais, além de completar a tarefa solicitada, tenham de defi- útil para o debate, a ex-
nir os objetivos, expor estratégias utilizadas e modo como resol- posição pessoal, etc.
veram os seus problemas.
Utilize a técnica da aula invertida, onde os trabalhos de leitura,
documentação e procura da informação se realizam em casa, e
se utiliza o tempo na sala de aula para organizar a informação,
FIGURA 6.  DISTRIBUIÇÃO EM CÍRCULO
aprofundar, praticar, resolver dúvidas e debater sobre o tema
tratado.
Distribuição em U
Favorece o deslocamen-
4.3. ESTRATÉGIAS PARA TRABALHAR EM EQUIPAS to do professor entre os
COOPERATIVAS alunos pela zona central
Queremos estimular o trabalho entre pares, a interdependência que se cria, assim como
positiva, a responsabilidade individual e o conhecimento mútuo. a visão por parte de to-
Para isso, teremos em conta os princípios da aprendizagem coope- dos dos meios audiovi-
rativa que se desenvolvem noutro artigo deste manual. suais. É muito adequada
para exposições grupais.

4.4. ESTRATÉGIAS PARA DISTRIBUIR O ESPAÇO NA SALA DE AULA


Não existe um único modo de distribuir a aula. A escolha dependerá FIGURA 7.  DISTRIBUIÇÃO EM U

de como se pretende trabalhar com a turma.


Mesas por equipas Estratégias cognitivas
Consiste em distribuir a Estratégias de repetição. Consistem na repetição ativa do material

aula em grupos de traba- que se deve aprender. Trata-se de um mecanismo da memória que
lho segundo o número ativa os materiais de informação para mantê-los na memória a curto
que tenhamos decidido. prazo e, ao mesmo tempo, transferi-los à memória a longo prazo.
Este tipo de distribuição
Estratégias de organização. Consistem em dar estrutura ao

também permite dividir
material que se deve aprender: resumi-lo, dividi-lo, elaborar
em pares ou grupos de
mapas conceptuais, etc. Permitem fazer do material um todo
três.
coerente e organizado.
Estratégias de elaboração. Consiste em estabelecer conexões ou

FIGURAS 8 E 9.  DISTRIBUIÇÃO EM EQUIPAS integrar os novos conteúdos que se aprendem com a informação
que já temos na memória: parafrasear, idealizar analogias ou uti-
Mesa de conferências lizar algum método mnemotécnico.
O ideal são as mesas re-
dondas, mas se não se Estratégias metacognitivas
102 103
têm pode configurar-se Estratégias de controlo da compreensão. Têm o objetivo de fazer

de maneira retangular ou com que o aluno tenha consciência da sua aprendizagem para
quadrada. que, assim, avalie a eficácia das estratégias usadas, corrija o que
for necessário e consiga alcançar as metas desejadas. Requerem
planificação, estabelecimento de metas, formulação de
perguntas,etc. Estas estratégias incluem procedimentos de
autorregulação.

FIGURA 10.  FIGURA 11.  Estratégias de apoio


DISTRIBUIÇÃO EM MESA DISTRIBUIÇÃO EM MESA DE
DE CONFERÊNCIAS CONFERÊNCIAS Estratégias afetivas. Têm como objetivo estabelecer e manter a

RETANGULAR QUADRADA motivação, concentrar e manter a atenção, reduzir a ansiedade e
controlar o tempo de maneira efetiva. Incluem diferentes tipos de
4.5. ESTRATÉGIAS PARA O PROCESSAMENTO DA INFORMAÇÃO recursos que contribuem para que a resolução da tarefa se leve a
bom termo. Este tipo de estratégias, em vez de se focar diretamente
Com o trabalho por projetos pretende-se percorrer o caminho que
sobre a aprendizagem, tem como finalidade melhorar as condições
vai da informação ao conhecimento. Trata-se de conceber a apren-
materiais e psicológicas em que se produz essa aprendizagem.
dizagem como um processo de construção. Para isso podem seguir-
-se diferentes estratégias.
4.6. ESTRATÉGIAS PARA QUE A APRENDIZAGEM SEJA
Algumas estratégias de aprendizagem segundo a classificação de
«INESQUECÍVEL»
Weinstein e Mayer são22:
Estas são algumas ideias para que os alunos retenham o que traba-
lharam nos projetos:
 Valle, A. e outros (1998). Las estrategias de aprendizaje: características básicas y su
22

relevancia en el contexto escolar. Revista de psicodidáctica, n.º 6, págs. 53-68.


Partir dos conhecimentos prévios.
– Que os conteúdos se relacionem com o que o aluno já sabe.
– Estabelecer conexões com os novos conteúdos. experiências, as suas aprendizagens e as suas dificuldades, para
– O que sei sobre o tema? O que preciso saber? reconduzi-los antes de chegarem ao fim.

Partir de algo que os motive. Revisão por pares. Uma das estratégias é promover a «revisão

por pares», de maneira que possam receber retroalimentação
– É necessário que o material seja potencialmente significativo,
não só do professor, mas também dos seus colegas e, assim,
que a aprendizagem tenha sentido para o aluno.
aproveitar os benefícios da escrita e da leitura ativas. Algumas
– É preciso manter certa tensão ao longo do projeto, para que a
ideias podem ser: avaliação entre pares, entrevista, crítica e
motivação inicial não decaia.
feedback, interrogatório, examinar-se um ao outro, comparar
– É importante trabalhar a motivação intrínseca dos alunos. apontamentos, exercícios, etc.
Dotar o projeto de estrutura. O poder de um bom feedback. Estas são algumas recomendações

– Que a informação apresentada esteja estruturada com certa para dar um bom feedback23:
coerência interna (significatividade lógica). – Procure o melhor momento.
– Que os alunos saibam o que têm de fazer. – Vá pouco a pouco.
–  Os alunos têm de conhecer para que serve o que se trabalha. – Comece com um aspeto positivo.
104 – Esclarecer com perguntas: O que tenho de saber? O que tenho – Emita uma opinião neutra, sem emitir juízos de valor. 105
de fazer? Quando tenho de o fazer?
– Exponha as consequências.
Autorregulação da aprendizagem. – Fale das causas.
– Procurar a aceitação da meta da atividade por parte do aluno.
– Que o aluno saiba o fundamental que é preciso trabalhar no 4.8. ESTRATÉGIAS PARA A PERSONALIZAÇÃO DO PROJETO
projeto. Pode ajudar a elaboração de um programa de ação
para a consecução da meta. Uma das tarefas do docente na fase de planificação do projeto é
oferecer a cada um dos seus alunos a oportunidade de realizar ati-
Avaliação dos resultados. vidades e tarefas que se ajustem às suas necessidades e aos seus
– Conhecer de antemão os critérios de sucesso. estilos de aprendizagem. Para isso:
– Dispor de informação sobre os resultados reais que se estão a Investigue sobre os estilos de aprendizagem dos seus alunos.
obter. Exponha tarefas em que intervenham os diferentes estilos de
– Analisar a correção da atividade (correspondência entre os aprendizagem. Conceba atividades tendo em conta a teoria das
seus resultados e a meta). Inteligências Múltiplas, por exemplo.
Trabalhar a metacognição. Tire os seus alunos da zona de conforto, mas parta do que sabem,
pois é necessário que tenham uma certa segurança enquanto
– O que é que aconteceu antes, durante, depois?
aprendem.
Exponha atividades de diferentes graus de dificuldade cognitiva,
4.7. ESTRATÉGIAS DE AVALIAÇÃO IMEDIATA seguindo, por exemplo, a taxonomia de Bloom.
Uma das chaves do trabalho por projetos é a avaliação contínua e
processual. Através de diferentes estratégias, podemos conhecer as
expetativas dos alunos, os seus conhecimentos prévios, as suas
 Romo, M (2016): ¿Sabes cómo dar un buen feedback? (Disponível em https://mar
23

taromo.wordpress.com/2016/11/28/sabes-como-dar-un-buen-feedback/)
4.9. ESTRATÉGIAS PARA QUE NINGUÉM FIQUE PARA TRÁS
A título de conclusão
No momento de programar as atividades, tenha em conta a diversi- Aquele que aprende e aprende mas não pratica o que sabe,
dade da sala de aula. As atividades devem ser: é como aquele que lavra e lavra mas não semeia.
Variadas, isto é, devem trabalhar os diferentes estilos de apren-
 Platão
dizagem, contemplar as diferentes inteligências, capacidades
Partindo de conhecimentos, experiências, teorias e investigações,
cognitivas e modelos de pensamento.
proporcionaram-se ideias de como incorporar o trabalho por proje-
Inclusivas, para as quais haverá diferentes níveis de dificuldade.
 tos no dia-a-dia da sala de aula, tendo em conta o currículo e o
Completas e o mais reais possível.
 metacurrículo. É a altura de passar à ação.
No momento de realizar um projeto é preciso considerar os diferen-
tes ritmos de aprendizagem, e ter em conta se na sala de aula há
algum aluno com necessidades educativas especiais.
FAZER
Juntamente com a programação das atividades, a avaliação contí-
nua e o feedback terão muita importância para enfrentar as dificul- Agora
dades que se estejam a apresentar e poder reconduzi-las para ter é consigo.
106 107
sucesso na tarefa atribuída.
PARTIR DA
EXPERIÊNCIA
4.10. ESTRATÉGIAS PARA USAR A TECNOLOGIA
Mostraram-se várias
A incorporação da tecnologia no trabalho por projetos é muito ade- estratégias para ter êxito
no trabalho por projetos,
quada, já que facilita muitas das fases da sua realização. Para isso
quer para escolher um tema,
tenha em conta: como para motivar os alunos,
para usar as TIC, para organizar a
sala, etc.

SABER COMO

Introduzir o currículo prescritivo no projeto ,


definir como planificar, avaliar e gerir o projeto,
OS DISPOSITIVOS OS SERVIÇOS DIGITAIS saber como ir mais além e criar um
metacurrículo.
– Projetores para a visualização em – Blogs e microblogs.
SABER
grande grupo, como os quadros – Recursos educativos abertos, livros de
digitais. texto digitais, etc. O que é trabalho por projetos, de onde vem, que contribuições
–  Tablets e telefones inteligentes, para – Sistemas colaborativos: redes sociais, deram alguns dos principais autores do século xx, como aprende o
a pesquisa e a compilação de dados. cérebro e que repercussão pode ter o trabalho por projetos, que tipos
wikis, etc.
de projetos existem...
– Wi-Fi na sala de aula, que facilite a – Plataformas: ambientes digitais,
conexão à Internet. plataformas de jogos, etc.
– Sistemas de produção audiovisual. – Ferramentas de aprendizagem:
– Impressora: convencional, 3D, etc. geolocalização, realidade aumentada. FIGURA 12.  ESQUEMA DO PERCURSO DA APRENDIZAGEM PROPOSTA
E DO SEU PROJETO DE FAZER PROJETOS
– Robótica. – Incorporação de diferentes apps.
É o fim do seu «projeto de fazer projetos», ou talvez seja melhor
dizer que é o início. Se leu este artigo, só lhe resta a última fase:
Referências bibliográficas
pô-lo em prática! À medida que comece a sua própria viagem, irá
pondo em prática o aprendido. Permita-se cometer erros e faça de
cada projeto uma alavanca de mudança pedagógica. E não se
esqueça de desfrutar aprendendo juntamente com os seus alunos! Referências bibliográficas

Obrigado a todos os autores e textos que inspiraram e


documentaram este trabalho.
De certeza que conhecerá muitos mais, aumente a lista.

Abbagnano, N., Visalberghi, A. (1988). Historia de la pedagogía. Madrid:


Fondo de Cultura Económica.
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Aprendizagem cooperativa
M.ª JOSÉ DÍAZ AGUADO
ÍNDICE
A APRENDIZAGEM COOPERATIVA

1 O que é a aprendizagem cooperativa? 5.2. Cooperação e solidariedade 137

1.1. Tipos de aprendizagem cooperativa 117 5.3. O sucesso e o reconhecimento 137

1.2. Requisitos para a eficácia da aprendizagem


6 Orientações para a aprendizagem cooperativa em
cooperativa 119
grupos formais

2 Por que é conveniente incorporar a aprendizagem cooperativa 6.1. O papel do corpo docente 138
nos primeiros ciclos do Ensino Básico? 122 6.2. A formação das equipas cooperativas 139
6.3. A atribuição de papéis específicos 141
3 Os grupos informais e algumas técnicas cooperativas
6.4. As tarefas em puzzle 142
3.1. Processamento interindividual da informação
através dos grupos informais 126 6.5. As tarefas completas 143

3.2. Técnicas cooperativas fáceis de colocar em prática 128


7 Ensinar capacidades para a cooperação 145

4 Sem interdependência positiva e responsabilidade individual


8 Avaliação e seguimento da aprendizagem cooperativa
não existe aprendizagem cooperativa
8.1. Autoavaliação do funcionamento individual
4.1. A interdependência positiva relativamente às metas
e grupal 148
através da avaliação 131
8.2. Observação da aprendizagem cooperativa
4.2. A interdependência positiva através dos papéis,
por parte do corpo docente 149
dos materiais e das atividades 134
8.3. Como garantir a igualdade de oportunidades
4.3. A interdependência entre todas as equipas
através da avaliação 150
da aula 134

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 153


5 O trabalho cooperativo permite adaptar a sala de aula
à diversidade
5.1. Condições para o contacto intergrupal: integração
e tolerância 135
1.  O que é a aprendizagem cooperativa?
Cooperar é trabalhar juntamente com outras pessoas para conse-
guir objetivos partilhados. Com o termo «aprendizagem coopera-
tiva» faz-se referência à utilização sistemática de situações
cooperativas como processo de ensino-aprendizagem, através de
pequenos grupos que trabalham juntos para otimizar quer a própria
aprendizagem quer a dos outros.

1.1.  TIPOS DE APRENDIZAGEM COOPERATIVA


A aprendizagem cooperativa informal consiste na colaboração
dos alunos em equipas de dois ou de três membros, com a dura-
ção de menos de uma sessão, e que são estabelecidas no próprio
momento, pontualmente, para trabalhar numa determinada
altura da aula desenvolvida pelo professor, com o objetivo de
favorecer uma participação mais ativa e, com isto, uma maior
eficácia. Trata-se dos procedimentos ou técnicas cooperativas
mais fáceis de aplicar, mas também de efeitos mais limitados. Ao
longo deste artigo mencionam-se numerosos exemplos deste 117
tipo de técnicas. As técnicas cooperativas simples, propostas por
Kagan, que se descrevem no ponto 3.2, costumam ser fáceis de
aplicar ao especificar de forma muito concreta que papel é que
desempenha cada membro do grupo em cada momento.
A aprendizagem cooperativa formal consiste em estabelecer equi-
pas de alunos que trabalham desde uma aula até várias semanas
ou até mesmo meses, para conseguirem atingir metas de apren-
dizagem partilhadas e completarem conjuntamente uma tarefa.
Convém que estas equipas sejam formadas pelo corpo docente, e
que combinem a diversidade existente na sala de aula, tanto
quanto ao rendimento, género e origem cultural , como quanto ao
nível de integração social. A maior parte das investigações publi-
cadas sobre a eficácia da aprendizagem cooperativa estudam o
funcionamento das equipas formais e consideram que, quando se
cumprem as condições adequadas, contribuem para melhorar o
rendimento e as relações interpessoais.
As equipas de base são grupos cooperativos heterogéneos, for-
mados pelo corpo docente, que trabalham periodicamente — no
mínimo duas vezes por semana — durante um período extenso de
tempo — um trimestre, todo o curso ou até mesmo vários cursos 1.2. REQUISITOS PARA A EFICÁCIA DA APRENDIZAGEM
— com a responsabilidade de ajudar cada um dos seus membros COOPERATIVA
no seu desenvolvimento académico e pessoal. São os grupos mais Para que a aprendizagem cooperativa formal melhore o rendimento,
eficazes para melhorar a qualidade de vida na escola e prevenir são necessárias as seguintes condições:
problemas de exclusão e assédio.
a) Interdependência positiva. Os alunos devem compreender que a
única maneira de alcançar com sucesso as metas individuais é
Para organizar o começo do seu funcionamento, é preciso ter através da consecução das metas grupais, segundo o princípio
em conta que a aprendizagem cooperativa não substitui outras «um por todos e todos por um». Esta interdependência pode
formas de ensino-aprendizagem, como o trabalho individual ou estabelecer-se de várias formas: através das recompensas gru-
a aula, mas complementa-as e enriquece-as. Além disso, pode pais, da interdependência nos recursos proporcionados para a
ser aplicada sobre qualquer área ou matéria, em todos os níveis tarefa ou nos papéis atribuídos. Os membros de um grupo devem
educativos e ao longo de todo o percurso escolar, sendo esta ter a certeza de que os esforços de cada integrante não só o
última a melhor distribuição temporária. beneficiarão a ele, mas também aos seus companheiros de
grupo. Esta interdependência leva a comprometer-se não só com
As investigações realizadas pela Unidade de Psicologia Preventiva o sucesso individual, mas também com o dos outros.
da Universidade Complutense de Madrid, permitiram desenvolver b) Responsabilidade individual. Cada aluno ou aluna deve tornar-se
um modelo de aprendizagem cooperativa formal, baseado na reali- responsável pela realização do seu trabalho dentro do grupo. E,
zação partilhada de tarefas completas ou projetos, muito eficazes para favorecê-lo, é preciso avaliar a aprendizagem de cada um,
118
para adaptar a aprendizagem aos desafios da sociedade atual. não só como membro do grupo mas também de forma individual. 119
Nestes projetos, os alunos desempenham papéis de especialista em Convém não esquecer nunca que a função do grupo de aprendiza-
diversas áreas, como se fossem políticos que querem melhorar o gem cooperativa é fortalecer cada um dos seus membros na sua
bairro, especialistas em meio ambiente sobre a qualidade da água capacidade para trabalhar, quer individualmente, quer em grupo.
ou navegadores que exploram espaços desconhecidos até à data. c) Grupos heterogéneos. Com carácter geral, o critério de composição
Este tipo de ficção estratégica favorece a cooperação por ser muito das equipas formais deve defender a máxima heterogeneidade
motivadora e significativa. Para melhorar a eficácia deste tipo de em rendimento, origem cultural, género e nível de integração na
tarefas, convém que o produto final, elaborado por cada equipa, sala de aula.
seja recolhido numa obra com a qual se identifique. Por exemplo,
uma campanha para melhorar o bairro, a gravação de uma jornada d) Igualdade de oportunidades para o sucesso. Os alunos devem
sobre a qualidade da água ou um livro com o que foi aprendido nas entender que a pertença ao seu grupo não supõe nenhuma des-
viagens realizadas a partir da ficção da tarefa programada. vantagem académica relativamente à de outros grupos, pelo que
é preciso garantir esta condição ao formar as equipas e ao expli-
O facto de dispor de um material didático específico para a realiza- car as condições da avaliação. A adaptação dos critérios de ava-
ção destes projetos de trabalho facilita consideravelmente a tarefa liação para proporcionar experiências de igualdade de status a
do corpo docente. todos os alunos (ao compará-los consigo próprios ou com outros
com o mesmo nível) ajuda a construir a igualdade, inclusivamente
em contextos muito heterogéneos.
e) Interação social estimulante, cara a cara, na qual os membros da
equipa se ajudem, se animem e cada um favoreça a aprendizagem
do outro, através das oportunidades para perguntar, explicar,
analisar, conectar os conteúdos atuais com outros e tornar a grupo para avaliar o progresso, assim como os esforços indivi-
aprendizagem mais significativa. Para favorecê-la é preciso distri- duais, relativamente ao seu sucesso.
buir a sala de aula de maneira a que exista uma interação visual e
j) Apropriação dos objetivos da tarefa pelos alunos e pelas alunas.
verbal entre os membros do grupo facilitando a comunicação.
A eficácia da equipa depende de que todos os seus membros tra-
f) Aprendizagem de capacidades, atitudes e interações sociais posi- balhem para conseguirem atingir os objetivos. Para isso é preciso
tivas. Convém recordar que estas capacidades não se desenvol- que os entendam como objetivos próprios e que sintam que os
vem automaticamente, só porque o corpo docente pede que podem alcançar. Convém ter em conta que os projetos de traba-
trabalhem em equipa. Para consegui-lo, precisam de aprender a lho os favorecem consideravelmente, sendo quase sempre mais
trabalhar à volta de objetivos partilhados, criar um clima positivo, significativos e motivadores.
resolver conflitos, expressar críticas e discrepâncias construtiva-
k) O corpo docente deve dar instruções ou pautas para a realização
mente, animar-se e motivar-se, comprometer-se, negociar, etc.
da tarefa: o que é que devem fazer, qual a ordem a seguir, com
O corpo docente deve descrever e ensinar as condutas e atitudes
que materiais, etc. As indicações devem ser suficientes para que
esperadas, e atribuir determinados papéis a cada membro do
todos os grupos as possam completar.
grupo para favorecer o facto de todas as equipas trabalharem
para o desenvolvimento destas capacidades. l) Acesso à informação que devem aprender. Os alunos devem
poder aceder, com facilidade, aos conteúdos necessários para
g) Reconhecimento público para o sucesso académico da equipa. É
resolver a tarefa e cumprir os objetivos propostos.
preciso proporcionar um reconhecimento formal do rendimento
do grupo, que pode resultar total ou parcialmente, da soma do m) Oportunidades para completar as tarefas requeridas de proces-
rendimento de cada aluno. Este reconhecimento deve ser propor- samento da informação. Cada aluno deve completar um deter-
120 minado número de tarefas de processamento da informação 121
cional aos avanços e esforços levados a cabo.
diretamente relacionado com os objetivos propostos (compreen-
h) Reflexão e avaliação sobre o funcionamento individual e grupal.
der, aplicar, relacionar, organizar dados, interpretar, etc.). A
Uma vez realizada a tarefa, cada equipa e cada aluno deve dedi-
tarefa atribuída à equipa deve definir-se de tal forma que con-
car um determinado tempo a refletir sistematicamente sobre
duza cada aluno a completar as atividades necessárias para o
como foi o trabalho de cada um e do seu grupo nos seguintes
cumprimento dos objetivos.
aspetos:
n) Dar o tempo necessário para a aprendizagem. Cada aluno e cada
– Até que ponto é que conseguiram atingir as metas do grupo.
equipa devem contar com tempo suficiente para desenvolverem
– Como se ajudaram a compreender o conteúdo, os recursos e os o seu trabalho. Sem isso, as vantagens cognitivas da aprendiza-
procedimentos das diferentes tarefas. gem cooperativa são muito limitadas. Convém ter em conta,
– Como é que utilizaram atitudes e condutas positivas para favo- assim, que muitas das vantagens da aprendizagem cooperativa,
recerem o rendimento do grupo e de todos os seus membros. quer académicas quer de desenvolvimento de capacidades, ati-
– O que é que precisam de fazer para a próxima vez conseguirem tudes e melhoria de relações sociais, só surgem, e só se mantêm,
que o grupo funcione ainda melhor. se, os mesmos grupos heterógeneos trabalharem cooperativa-
mente mais de quatro semanas seguidas.
i) Definição de objetivos específicos. É preciso que o corpo docente
defina, com claridade e precisão, quais os resultados que espera
que os alunos obtenham com a tarefa de aprendizagem coope-
rativa. Da claridade dos objetivos depende a capacidade do
2. Por que é conveniente incorporar a – Prestar atenção a cada equipa para resolver os problemas que
possam surgir.
aprendizagem cooperativa nos – Proporcionar reconhecimento e oportunidade de mostrar o seu
primeiros ciclos do Ensino Básico? próprio progresso a todos os alunos.
Para responder a esta pergunta, convém ter em conta os resultados As investigações realizadas refletem que estas ações fazem com
obtidos nas investigações sobre a eficácia da aprendizagem coope- que melhore a interação do corpo docente com o aluno, mesmo
rativa relativamente a seis objetivos básicos nos primeiros ciclos do a que se produz durante as explicações docentes ou durante o
Ensino Básico: trabalho individual. Assim, pode explicar-se que a aprendizagem
cooperativa contribui para melhorar a autoridade de referência
Incrementar o rendimento e a motivação pela aprendizagem em
do corpo docente para ensinar e educar ao mesmo tempo.
todos os alunos. Para explicar esta vantagem, é preciso ter em
conta que a estrutura individualista e competitiva, habitual na Adaptar a sala de aula à diversidade, desenvolver a tolerância e o
escola, se caracteriza por uma interdependência negativa entre o respeito intergrupal. Os procedimentos educativos tradicionais,
sucesso dos colegas e o próprio sucesso, segundo o qual o aluno concebidos para um aluno médio e um contexto homogéneo, não
pode sentir que, quanto piores sejam as qualificações dos outros, são favoráveis a adaptar o ensino às características dos alunos
melhor é a própria. Como consequência, o esforço para aprender em contextos heterogéneos. Por isso, as oportunidades educati-
costuma ser desincentivado entre pares, contribuindo para criar vas distribuem-se de forma muito desigual, incrementando com
mesmo normas de relação que vão contra este esforço e a concep- isto o risco de exclusão por parte da escola. Convém ter em conta
tualizá-lo de maneira negativa como algo próprio de «marrões». que os contextos heterogéneos em que convivem diversos grupos
122 (género, origem cultural, nível de capacidade, etc.), apenas con- 123
Pelo contrário, a aprendizagem cooperativa permite criar uma
tribuem para desenvolver a tolerância quando se dão oportuni-
situação em que a única forma de alcançar as metas pessoais é
dades para estabelecer relações de amizade entre membros de
através das metas da equipa, o que faz com que a aprendizagem
vários grupos com igualdade de estatuto. As oportunidades que,
e o esforço para aprender sejam muito mais valorizados no grupo
desta forma, proporciona a aprendizagem cooperativa, conver-
de pares, aumentando com isto a motivação geral pela
tem-na num procedimento idóneo para fazer da diversidade uma
aprendizagem e a ajuda mútua que se proporcionam, assim como
vantagem, ajudando a alcançar objetivos complexos como a coe-
o rendimento.
ducação, o respeito intercultural e a integração dos alunos com
Melhorar as relações entre professores e alunos, desenvolvendo necessidades educativas especiais.
uma autoridade que permite, ao mesmo tempo, ensinar e educar.
Ensinar a cooperar, a resolver conflitos e a prevenir o assédio e
A aprendizagem cooperativa supõe uma mudança importante no
outras formas de violência. A aprendizagem cooperativa repre-
papel do docente. O controlo das atividades deixa de estar cen-
senta um contexto privilegiado para ensinar as competências
trado no corpo docente e passa a ser partilhado com toda a aula.
socioemocionais que figuram entre os objetivos básicos dos pri-
Esta mudança faz com que os docentes possam realizar outras
meiros ciclos do Ensino Básico. Além disso, ao incorporar este
atividades que contribuem para melhorar a qualidade educativa,
procedimento, aumentam consideravelmente as possibilidades
além das que habitualmente levam a cabo (explicar, perguntar e
de o corpo docente poder detetar e intervir diante dos problemas
avaliar). Por exemplo:
que surgem nas relações entre pares, convertendo a sala de aula
– Ensinar a cooperar de forma positiva. num contexto onde é possível aprender a resolver pacificamente
– Observar o que sucede em cada equipa e com cada um dos os conflitos. Para compreender o papel da aprendizagem coope-
alunos e das alunas. rativa na prevenção do assédio escolar, é preciso ter em conta,
além disso, a sua eficácia para reduzir a principal condição de
risco de vitimização, o isolamento, assim como para incrementar «Cada vez com mais frequência, os empregadores já não exigem
a principal condição da prevenção: a presença de companheiros e uma determinada qualificação [...] e pedem, pelo contrário, um
colegas dispostos a deter o assédio desde o seu começo. conjunto de competências específicas a cada pessoa, que com-
bina a qualificação propriamente dita [...], o comportamento
Prevenir a disrupção, ao incrementar o protagonismo social e a social, a aptidão para trabalhar em equipa, a capacidade de ini-
aprendizagem da autorregulação nos nativos digitais. O corpo ciativa e de assumir riscos. [...] Entre estas qualidades, ganha
docente costuma descrever o aluno atual como menos capacitado cada vez maior importância a capacidade de comunicar e de
para o trabalho académico e para o esforço e com pouca tole- trabalhar com os outros, de enfrentar e de solucionar conflitos.»
rância à frustração, características intrinsecamente relacionadas
com a forma de processar a informação dos nativos digitais. As
crianças estão habituadas à recompensa imediata e a serem os Como expressão do reconhecimento existente hoje em vários siste-
protagonistas das tarefas que realizam, o que dificulta a sua mas de ensino europeu sobre a necessidade de incorporar a apren-
capacidade de atenção em atividades monótonas, individuais e dizagem cooperativa às salas de aula, podemos destacar a seguinte
com efeitos a médio ou longo prazo, tal como são as tarefas aca- recomendação feita pelo Estudio Estatal de la Convivencia Escolar
démicas tradicionais. Isto ajuda a explicar o incremento do com- en la Educación Secundaria, orientado pelo Ministério da Educação
portamento disruptivo que se produziu nos últimos anos. Espanhola, e no qual participaram as 17 comunidades autónomas:
A aprendizagem cooperativa ajuda a superar este problema, ao
proporcionar protagonismo a todo o aluno, até mesmo a quem o «Convém promover estruturas cooperativas e relações basea-
procura de forma negativa, com outros procedimentos. Além das no respeito mútuo, para erradicar o assédio».
124 125
disso, ajuda a adaptar as tarefas escolares às características dos
nativos digitais, permitindo-lhes mostrarem as suas competên-
cias, sentirem-se eficazes e, desde essa perceção, avançarem
para outras competências mais complexas, como a autorregula-
ção, para alcançarem objetivos complexos, e o esforço, para
superarem os obstáculos.
Adaptar a forma de aprender às exigências do mundo laboral do
século xxi. O trabalho na Revolução Industrial era fragmentado,
despersonalizado, bastante hierarquizado, e realizava-se quase
sempre de forma individual. Em coerência com isto, o ensino
preparava para a integração numa cadeia, para o trabalho em
tarefas despersonalizadas, para mandar ou obedecer, sendo
um peão facilmente intercambiável. Pelo contrário, a revolução
tecnológica e a sociedade do conhecimento, exigem ensinar a
aprender através de tarefas mais completas e significativas,
desenvolvendo projetos próprios, em cooperação com pares,
como se reconhece a partir do documento da UNESCO (1996)
sobre a educação para o século xxi:
3. Os grupos informais e algumas contrário, têm de entrar em acordo sobre a forma correta de
resolver o exercício. Quando chegarem a um acordo sobre todas
técnicas cooperativas as atividades, partilham o seu trabalho com o outro par.
Leitura partilhada. Os pares trabalham sobre um texto exposi-
Seguidamente apresentam-se os procedimentos cooperativos mais
tivo breve: o aluno A lê o primeiro parágrafo e o aluno B resume-o.
fáceis de colcocar em prática, conhecidos como técnicas simples,
A seguir, identificam o tema tratado no parágrafo, isto é, a que
que se podem aplicar no próprio momento na sala de aula sem
pergunta é que esse parágrafo responde, e acordam uma res-
necessidade de decisões prévias. A facilidade de aplicação
posta à referida pergunta. Ao passar ao parágrafo seguinte,
converte-os num excelente recurso para a iniciação à aprendizagem
repetem o processo, invertendo os papéis.
cooperativa, quer para o corpo docente quer para os alunos e alunas.
Escrita cooperativa. O professor propõe a escrita de um texto e
cada par pensa, individualmente, durante uns três minutos, sobre
3.1. PROCESSAMENTO INTERINDIVIDUAL DA INFORMAÇÃO
o que quer escrever. O aluno A apresenta as suas ideias ao estu-
ATRAVÉS DOS GRUPOS INFORMAIS
dante B enquanto o estudante B toma apontamentos, faz per-
As maiores vantagens cognitivas da cooperação exigem que o tra- guntas e dá sugestões; depois trocam-se os papéis. De seguida, o
balho não se limite a juntos encontrarem a resposta correta ou a par redige, em conjunto, o primeiro parágrafo e, individualmente,
memorizarem simples informação, mas deve ajudar ao intercâmbio o resto. Depois leem os textos completos ao outro par que expõe
interindividual que favoreça um processamento mais elaborado. perguntas e sugestões. Posteriormente, trocam de papéis e
Para isso, é necessário que se produza diálogo, debate, resolução de ouvem as redações do outro par, expondo sugestões. Por último,
dúvidas, pesquisa de explicações e exemplos ou interpretações que os quatro membros do grupo corrigem as suas redações e escre-
126 127
permitam relacionar a nova informação com esquemas prévios. vem a versão final.
Para favorecer este processamento grupal mais elaborado, Johnson Recapitular o aprendido. Para fechar uma aula, os dois membros
e Johnson (2008) propõem as seguintes técnicas de aprendizagem do par podem pôr em comum o que aprenderam e escrever os
cooperativa informal para pares heterogéneos, sentados lado a dois ou três aspetos que lhes pareceram mais importantes e as
lado, que podem integrar o seu trabalho num grupo de quatro com perguntas que eles gostariam de formular numa próxima sessão.
o outro par sentado em frente. É importante que o professor recolha este trabalho, para devol-
Responder a uma pergunta concreta. Primeiro, cada aluno ela- vê-lo com as suas observações.
bora uma resposta individual, depois explica a sua resposta ao Expor e debater sobre dúvidas. Depois de uma explicação, cada
outro membro do par e, por último, elaboram uma resposta membro do par ou equipa vai expor possíveis dúvidas e, juntos,
comum, tentando que seja melhor do que as individuais. vão tentar resolvê-las. Após uns minutos, o grupo completo ana-
Comparar os apontamentos. Ao acabar uma exposição, cada lisar as dúvidas expostas pelos pares ou equipas.
membro do par revê os seus apontamentos para completar e Realização conjunta de esquemas. Primeiro cada membro do par
corrigir o que for necessário a partir da comparação com os do realiza o seu esquema, individualmente, depois explica o seu
colega. esquema ao colega e ouve o dele e, por último, elaboram um
Corrigir os trabalhos. Em primeiro lugar, cada aluno apresenta ao esquema conjunto que inclua o melhor dos esquemas individuais.
seu colega o processo e os resultados do primeiro exercício Debater sobre conteúdos tentando responder às perguntas
realizado individualmente, e ouve a apresentação do seu colega; expostas e registando os aspetos em que estão de acordo e
se estiverem de acordo, passam ao exercício seguinte, caso aqueles em que discordam.
3.2. TÉCNICAS COOPERATIVAS FÁCEIS DE COLOCAR EM para que todos os membros da equipa escrevam a sua contribui-
PRÁTICA ção e participem na resolução da atividade exposta. Pode ser
Kagan (2013) elaborou e divulgou mais de 200 técnicas cooperativas interessante que cada aluno ou aluna utilize um lápis ou caneta
entre as quais se encontram algumas que são muito simples e fáceis de cor diferente.
de praticar. Estas técnicas diferenciam-se dos procedimentos infor- O jogo das palavras. Nesta técnica, atribuem-se, a cada equipa,
mais descritos anteriormente dado que especificam, de forma muito várias palavras-chave sobre o tema que se está a trabalhar, com
mais concreta, o que é que cada membro do grupo deve fazer em o objetivo de elaborarem um resumo ou um mapa conceptual.
cada momento. O autor incentiva a utilizá-las com o lema: Cada membro da equipa trabalhará sobre uma das palavras e
explicará o seu significado, escrevendo uma frase ou realizando
um desenho. Por ordem, vão mostrando o seu trabalho ao resto
«Aprenda-a hoje, aplique-a amanhã e utilize-a durante toda a
do grupo, para comentá-lo, corrigi-lo e completá-lo, de forma que
vida».
possa passar a ser um trabalho de equipa. Repete-se o mesmo
procedimento com todas as palavras.
Incluem-se, a seguir, algumas das técnicas aplicáveis nos primeiros
O passo seguinte consiste em ordenar, sobre a mesa, todas as
ciclos do Ensino Básico em equipas de dois ou quatro membros:
contribuições, seguindo um critério lógico que permita fazer o
Pares que partilham. A partir de uma pergunta proporciona-se esquema, o resumo ou o mapa conceptual em questão. O profes-
um tempo para pensar respostas de forma individual. Cada sor supervisionará o trabalho antes que a equipa o passe a limpo
membro da equipa partilha a sua resposta com o colega que está e obtenha a forma final: um mural, folhas agrafadas e numera-
sentado ao lado, alternadamente. Depois, cada par partilha as das, etc.
128 suas respostas com o resto do grupo, elaborando, em conjunto, a 129
Números iguais juntos. Atribui-se um número de 1 a 4 a cada um
melhor forma de responder à pergunta exposta.
dos componentes de cada equipa. A seguir atribui-se uma tarefa
Lápis ao centro. Distribui-se uma tarefa ou trabalho em partes às equipas e reserva-se um tempo para que cada grupo decida
iguais ao número de membros da equipa, e estabelece-se a como levá-la a cabo. Reserva-se um momento para a sua realiza-
ordem da sua realização. Cada membro da equipa será respon- ção e certifique-se que todos sabem fazer o que lhes é pedido.
sável por ler a sua parte da tarefa e propor uma resolução, que Decorrido este tempo, o professor escolhe aleatoriamente um
vai acordar com os colegas. Durante este tempo, os lápis de número de 1 a 4. Os alunos e as alunas que têm esse número
todos permanecem no centro da mesa para indicar que é o devem resolver a tarefa diante do resto da aula. Aqueles que o
momento de falar e ouvir, não de escrever. façam bem vão receber algum tipo de reconhecimento: um elo-
Uma vez acordada a estratégia a seguir, os membros da equipa gio, um aplauso, um ponto positivo para a sua equipa, etc.
pegam nos seus lápis e resolvem a parte que lhes toca, nos seus
cadernos.
Folha giratória. Atribui-se uma tarefa à equipa, como por exem-
plo, elaborar uma lista de palavras, redigir um texto, etc. Depois
de um momento de reflexão, um dos membros da equipa vai
escrever a sua contribuição numa folha de papel dividida em qua-
tro partes (a folha giratória); o resto dos colegas vai observar o
que o colega fez e ajudam, animam ou corrigem caso seja neces-
sário. A folha vai avançando no sentido dos pronteiros do relógio
4. Sem interdependência positiva 4.1. A INTERDEPENDÊNCIA POSITIVA RELATIVAMENTE ÀS
METAS ATRAVÉS DA AVALIAÇÃO
e responsabilidade individual não Para que exista aprendizagem cooperativa, é imprescindível que o
existe aprendizagem cooperativa aluno compreenda que a única maneira de avançar no sucesso das
metas individuais é através das metas grupais. Todos os membros
Com alguma frequência, podem ouvir-se comentários de docentes: de uma equipa devem ter a certeza que os esforços de cada um não
«Já tentei a aprendizagem cooperativa e não funcionou». Ao per- só os vão beneficiar como também vão beneficiar o resto do grupo.
guntar-lhes como é que a levaram a cabo, e por quanto tempo é que A interdependência positiva leva a que cada um se comprometa,
a colocaram em prátrica, costuma acontecer que não chegaram a não só com o próprio sucesso, mas também com o dos outros. Esta
superar os obstáculos iniciais para que se dessem as duas condições é a base da aprendizagem cooperativa.
básicas: a interdependência positiva, sem a qual não há cooperação;
Para valorizar a interdependência positiva relativamente às metas,
e a responsabilidade individual, sem a qual não pode haver aprendi-
é preciso proporcionar um reconhecimento explícito do rendimento
zagem, como sucede com qualquer outra metodologia.
da equipa, de acordo com os avanços e os esforços levados a cabo.
A aprendizagem cooperativa permite criar uma situação em que as É necessário ter em conta que, quando os alunos e as alunas não
metas pessoais se alcançam através das metas da equipa, o que faz podem identificar os resultados do seu esforço pessoal, porque este
com que a aprendizagem e o esforço para aprender sejam mais va- se dilui no produto grupal, pode produzir-se uma difusão de
lorizados no grupo de pares, aumentando com isto a motivação pela responsabilidade, que reduz a motivação, o esforço e, portanto, o
aprendizagem, assim como o reforço e a ajuda que se proporcionam rendimento.
mutuamente os alunos e as alunas.
130 Para evitar o problema da difusão de responsabilidade, mantendo 131
as vantagens da estrutura cooperativa, Slavin (2012) propõe avaliar
a equipa de modo que pelo menos uma parte desta avaliação pro-
Diálogo com Joana, aluna portuguesa de 11 anos, que está no
ceda da soma das avaliações do rendimento individual de todos os
sexto ano:
seus membros.
– Tu gostaste de trabalhar em equipa? Os estudos realizados refletem que a aprendizagem cooperativa
– Sim. Se há uma coisa que eu não sei, os meus colegas podem contribui para melhorar o rendimento, sobretudo quando se realiza
ensinar-ma e se eles não sabem alguma coisa eu posso ensiná- uma avaliação do grupo que integra a avaliação individual. O proce-
-los. Se estamos sozinhos não nos podemos ajudar. dimento que se descreve a seguir, inspirado nas propostas de Slavin,
cumpre esta condição.
– Como é que aprendes mais, sozinha ou em equipa?
– Em equipa aprendo muito mais. Porque podes contar aos
outros aquilo que aprendeste. Se trabalharmos sozinhos, como
há alguns que são uns «marrões» e que guardam tudo para eles   MODELO DE APRENDIZAGEM COOPERATIVA
para que os outros não o saibam. Em equipa isto não acontece. COM EQUIPAS HETEROGÉNEAS

Formação de equipas de aprendizagem cooperativa hetero-


Convém ter em conta que esta interdependência positiva não se génea (por grupo étnico, género, nível de rendimento, nível
costuma produzir automaticamente, só pelo facto de formar equi- de integração, etc.) com o objetivo de preparar cada um dos
pas de alunos e pedir-lhes que cooperem, mas é necessário favo- seus membros estimulando a interdependência positiva.
recê-la pró-ativamente.
Desenvolvimento da capacidade de colaboração, para o que Tarefas muito estruturadas realizadas por pares sobre aspetos
convém criar um esquema de trabalho prévio; definir a de pouca complexidade, como memorizar nomes, aprender ope-
colaboração através de condutas específicas; proporcionar rações aritméticas ou realizar uma leitura partilhada.
modelos para favorecer a aprendizagem por observação;
Grupos de debate e controvérsia em que o objetivo da tarefa é a
proporcionar oportunidades de praticar; observar a prática
expressão de diferentes pontos de vista, o que pode ser com
diária e comprovar que os alunos cooperam adequada-
frequência suficientemente motivador por si próprio. A sua
mente.
eficácia exige capacidades necessárias para debater sobre o
Realização, no mínimo, de duas sessões de aprendizagem tema proposto.
cooperativa por semana.
Para favorecer, desde o começo, a interdependência positiva nas
Avaliação através de: metas, antes de apresentar a composição das equipas, o corpo
– Torneios grupais (comparação entre alunos do mesmo docente deve explicar em que é que consiste a tarefa e como é que
nível de rendimento). Distribui-se ao máximo a oportuni- vai ser avaliada, dizendo, por exemplo:
dade de sucesso entre todos os alunos da aula. Educa-se
a comparação social. A aplicação deste procedimento Nesta tarefa vocês vão trabalhar em equipas. O objetivo da
depende de se poderem formar grupos de nível de rendi- equipa é que cada membro aprenda a realizar a tarefa. Faremos
mento semelhante. avaliações para ver se conseguiram realizar a tarefa. Todas as
– Torneios individuais (comparação com a sua própria pres- crianças que tenham aprendido e tenham melhorado relativa-
tação na aula anterior). Maximizam-se as oportunidades mente à avaliação anterior conseguirão tirar 10 para a sua
132 de sucesso para todos os alunos. Estimula-se o desenvol- equipa. Esta pontuação anotar-se-á na ficha da equipa. 133
vimento da ideia de progresso pessoal.
É muito importante que vocês se animem a trabalhar, que todos
participem e que a equipa se dê bem. Não vale que alguém faça
o trabalho de outro. Todos e todas têm de trabalhar para que a
As investigações que realizámos nas salas de aula heterogéneas dos equipa realize a tarefa.
primeiros ciclos do Ensino Básico demonstram a eficácia desta
forma de avaliação através de torneios, que favorecem um grande
aumento da motivação pela aprendizagem em todos os alunos, Para favorecer a interdependência positiva relativamente aos obje-
assim como o sucesso académico de todos, incluindo os que não tivos, convém que escolham um nome para a equipa e que todos os
tinham sucesso com outros procedimentos. membros assinem estar de acordo com este nome. Assinatura que
também vão incluir antes de entregar cada trabalho para constar
Por outro lado, em determinadas condições e tarefas, pode dar-se que estão de acordo com o que o grupo apresentou, que aprende-
interdependência positiva nas metas e responsabilidade individual ram as tarefas que lhes foram entregues e que todos os membros
sem necessidade de aplicar o modelo de avaliação anteriormente do grupo trabalharam.
exposto:
Grupos de estudo voluntário que tenham um bom nível de moti-
vação para a tarefa e para o trabalho em comum e possuam
capacidades suficientes para a levar a cabo, como se observa
com frequência nos grupos cooperativos que se estabelecem
espontaneamente.
4.2. A INTERDEPENDÊNCIA POSITIVA ATRAVÉS DOS PAPÉIS,
DOS MATERIAIS E DAS ATIVIDADES
5. O trabalho cooperativo permite
Convém também reforçar a interdependência positiva através des-
adaptar a sala de aula à diversidade
tes outros aspetos:
A aprendizagem cooperativa representa a principal inovação de efi-
Interdependência através dos papéis adotados por cada membro cácia comprovada para adaptar a sala de aula à diversidade, e, con-
do grupo. Para isso, é preciso definir diferentes papéis, comple- verter esta numa vantagem, contribui para a atenuação de alguns
mentares e interligados. A sua eficácia depende de que sejam dos problemas que mais nos preocupam hoje em dia, tal como a
motivadores, de que se possam levar a cabo as funções subjacen- exclusão e o assédio escolar.
tes a cada papel e de que o seu desempenho seja autoavaliado
sistematicamente, quer pela equipa quer por cada aluno. Mais à
5.1. CONDIÇÕES PARA O CONTACTO INTERGRUPAL:
frente incluem-se exemplos de como definir estes papéis.
INTEGRAÇÃO E TOLERÂNCIA
Interdependência relativamente aos materiais. Para estabelecer
Nas salas de aula em que há diversos grupos étnicos, observa-se,
esta interdependência pode dar-se a cada membro do grupo só
com frequência, uma segregação que impede o estabelecimento de
uma parte da informação ou dos recursos necessários para levar
relações interétnicas de amizade. Este problema também se produz
a cabo a tarefa. Isto faz com que seja imprescindível a coopera-
quando se leva à prática a coeducação entre alunos e alunas e tam-
ção para poder realizá-la. As tarefas em puzzle são um bom
bém na integração do aluno com necessidades educativas especiais.
exemplo deste tipo de interdependência.
A aprendizagem cooperativa pode garantir, melhor que qualquer
Interdependência positiva relativamente à tarefa e à apresentação outro procedimento, a integração e o respeito mútuo entre indiví-
134 final. As tarefas completas, em que o aluno desempenha papéis de 135
duos pertencentes a diferentes grupos.
especialista em diversos temas, costumam favorecer a interdepen-
Para isto, devem verificar-se três condições:
dência positiva ao serem mais motivadoras e significativas. Para
melhorar ainda mais a eficácia deste tipo de tarefas, convém que o  ue se produza um contacto estreito entre alunos que perten-
Q
produto final, elaborado por cada equipa, seja recolhido numa obra cem a diferentes grupos étnicos, de género ou de rendimento,
com a qual se identifiquem. O facto de apresentar publicamente com a duração, qualidade e intensidade suficientes, para que se
estes produtos em cenários motivadores (a sala de aula, o salão de possam estabeler relações próximas.
atos, o site do centro, etc.) ainda favorece mais a interdependência 
Que se proporcionem experiências em que os membros dos dife-
positiva e, com isto, a eficácia da aprendizagem cooperativa. rentes grupos tenham um estatuto semelhante, para o qual será
necessário compensar as diferenças iniciais. Esta igualdade de
4.3. A INTERDEPENDÊNCIA ENTRE TODAS AS EQUIPAS DA AULA oportunidades pode conseguir-se avaliando cada estudante em
função do seu próprio progresso, ao compará-lo consigo próprio
Convém promover a interdependência positiva e a responsabilidade no passado ou com estudantes do seu mesmo nível de rendimento.
individual do conjunto das equipas existentes na sala, estabelecendo

Que os membros da equipa cooperem na consecução dos mes-
objetivos para toda a aula. Para consegui-lo, podem conceder-se pon-
mos objetivos, para o que costuma ser preciso ajudar cada equipa
tos adicionais quando todos alcançarem um determinado objetivo.
a superar os obstáculos que surjam.
Também se pode sugerir que, quando um grupo termine a tarefa atri-
buída, os seus membros a comparem com outros grupos que também É muito importante que os alunos e as alunas percebam que existe
a tenham terminado, para comparar as suas respostas e estratégias, igualdade de oportunidades para o sucesso e que pertencer à sua
ou que ajudem grupos que ainda não a tenham terminado. equipa não supõe nenhuma desvantagem académica relativamente
a outras equipas, o que faz com que seja preciso garantir esta con- 5.2.  COOPERAÇÃO E SOLIDARIEDADE
dição ao formar as equipas e explicar como é que se vai levar a cabo
Ao incorporar a aprendizagem cooperativa na sala de aula, promove-se
a avaliação. A adaptação dos critérios de avaliação, para proporcio-
o pedir e o proporcionar ajuda, melhorando com isto quer as capacida-
nar experiências de igualdade a cada aluno (ao compará-lo consigo
des sociais do aluno quer as suas oportunidades de aprendizagem. Isto
próprio ou com pares do seu mesmo nível de rendimento) é funda- é especialmente importante para os alunos que apresentam alguma
mental para o desenvolvimento da tolerância e do respeito mútuo, dificuldade, já que se lhes proporciona uma atenção individualizada da
assim como para conseguir a integração do aluno com necessidades sua zona de desenvolvimento próximo (Vygostky, 1978).
especiais.
Importância parecida para os colegas tem o facto de poderem ajudar.
As investigações que realizámos demonstram que, quando se dão as Convém recordar que, ensinar a assumir responsabilidades, parece
três condições descritas na teoria do contacto de Allport, a aprendi- ser uma disciplina pendente da sociedade atual, devido, em parte, ao
zagem cooperativa contribui para promover a coeducação, a tole- facto de que, durante a infância e a adolescência, as crianças costu-
rância intercultural e a integração do aluno, até mesmo com alunos mam ser quase sempre recetores de ajuda. Poucas vezes têm a opor-
que inicialmente apresentavam problemas de integração no seu tunidade de comprovar a sua capacidade para ajudar outra pessoa e
grupo-classe. de melhorar com isto a sua própria autoestima e responsabilidade.
Este extrato de uma entrevista com uma aluna cigana, reflete a A aprendizagem cooperativa apresenta vantagens, independente-
mudança que a aprendizagem cooperativa originou na aceitação da mente do nível de rendimento inicial do aluno, seja este baixo, médio
diversidade cultural dentro da sala de aula e na melhoria das rela- ou alto, já que todos beneficiam, de forma significativa e, especial-
ções interétnicas: mente, os de rendimento superior. Resultados que refletem o que o
136 corpo docente conhece pela sua própria experiência: uma das for- 137
mas mais eficazes de aprender é ensinar.
Helena, uma aluna cigana de 8 anos, que está no terceiro ano de
escolaridade: Quando se pergunta aos docentes qual o tipo de alunos que a
aprendizagem cooperativa beneficia mais, a resposta frequente
– O que é que tu gostas mais, de trabalhar sozinha ou em grupo? costuma ser todos, quer no que se refere à aprendizagem de
– Em grupo, porque sinto-me acompanhada e divirto-me muito conteúdos quer relativamente à educação em valores. Além disso,
com eles. Por exemplo, se temos de fazer um exercício, fazêmo-lo frequentemente referem as mudanças que se produzem naqueles
entre todos, [...] aprendes mais porque te dizem coisas. que inicialmente tinham dificuldades de aprendizagem ou de
integração, assim como nos imigrantes que ainda têm de aprender
– Tu gostarias de mudar de grupo?
uma língua que não dominam.
– Eu gostaria de continuar com estes colegas, dou-me melhor
com eles porque antes me diziam coisas feias e agora, pelo con-
trário, ajudam-me e brincam comigo no pátio. Antes diziam-me 5.3.  O SUCESSO E O RECONHECIMENTO
«cigana rabuda», porque, como sou cigana, dizem-me isto e eles, Os alunos, com frequência, comparam o seu rendimento com o dos
como não são, diferenciam-se assim de mim. Agora já não me seus colegas, e aqueles que obtêm sistematicamente resultados,
dizem isto porque são bons colegas comigo. negativos, diminuem a sua motivação pela aprendizagem. Face ao
exposto, uma importante vantagem da aprendizagem cooperativa
– Porque é que não te dizem já estas coisas?
é que permite igualar as oportunidades de obter sucesso e reconhe-
– Porque eu lhes digo: «Temos de dar-nos bem». E eles dizem: cimento por parte de todos os alunos. Ao ensinar os alunos a com-
«Temos de ser amáveis e dar-nos bem, estar juntos e ajudar-nos». pararem-se consigo próprios, assim como com colegas de
rendimento semelhante, evitam-se os riscos de desmotivação.
6. Orientações para a aprendizagem A mudança de uma estrutura tradicional para uma estrutura coope-
rativa, vai significar um certo esforço de adaptação. Para começar
cooperativa em grupos formais a trabalhar com equipas formais, costuma ser conveniente aplicar a
aprendizagem cooperativa numa área ou matéria com 2 ou 3 aulas
6.1.  O PAPEL DO CORPO DOCENTE semanais, e incluir uma aula de avaliação semanal ou levar a cabo
Na aprendizagem cooperativa formal, estabelecem-se equipas que esta avaliação no fim de cada aula.
trabalham durante uma aula, várias semanas ou até mesmo meses, As equipas formais, baseadas na heterogeneidade, que permanecem
para conseguirem atingir metas de aprendizagem partilhadas e estáveis durante pelo menos dois meses, são de grande eficácia
completar conjuntamente uma tarefa. As equipas formais podem para o sucesso de objetivos educativos complexos, como o
variar em função da tarefa ou até mesmo dentro de uma mesma desenvolvimento da tolerância e da integração. É importante que as
tarefa. equipas formais permaneçam um determinado tempo, o qual seja
A eficácia deste tipo de trabalho requer que o corpo docente: suficiente para a adaptação de alunos e professores à nova
estrutura cooperativa.
Tome algumas decisões prévias. Formule os objetivos e compe-
tências; decida o tamanho e a composição das equipas; defina os
papéis atribuídos a cada membro da equipa; organize a distribui- 6.2.  A FORMAÇÃO DAS EQUIPAS COOPERATIVAS
ção da sala de aula e defina as tarefas que os alunos devem rea- Quem é que forma as equipas. A pior opção relativamente à for-
lizar. Deve organizar-se a sala de aula de forma a que se favoreça mação de equipas formais é que sejam estabelecidas pelos alu-
a interação positiva, cara a cara, e para que seja possível obser- nos segundo as suas preferências, pois, nestes casos, costumam
var facilmente o que sucede em cada grupo, o que estimula a
138 reproduzir-se as segregações que existem na nossa sociedade. 139
responsabilidade individual e o processamento grupal da infor-
Desta forma, a partir dos primeiros anos do Primeiro Ciclo,
mação sobre a qual trabalham.
observa-se a influência do género, do rendimento, do grupo
Explique a tarefa e a estrutura cooperativa. É necessário explicar étnico ou das necessidades especiais. Nos últimos anos também
aos alunos os critérios para o sucesso na tarefa, os conceitos e as começa a ser significativa a segregação em função de atitudes e
estratégias para a completar, assim como as condutas e as habi- valores. Estas tendências, cuja origem se situa fora da escola, são
lidades sociais que devem desenvolver. Além disso, é preciso pro- o antecedente das exclusões que continuarão, de forma ainda
mover a interdependência positiva, a responsabilidade individual mais grave, em idades posteriores. Quando não se corrigem,
e a necessidade de cooperação entre equipas, estendendo a representam um dos principais obstáculos para a eficácia da
interdependência positiva a toda a aula. aprendizagem cooperativa. Por isso, costuma ser imprescindível
Supervisione a aprendizagem dos alunos, ajudando-os a comple- que a formação das equipas não se realize de acordo com os gru-
tar a tarefa com sucesso e a praticar as capacidades sociais. pos ou amizades previamente existentes, mas através de um pro-
Esta supervisão permite recolher informação de grande utilidade cedimento que garanta a heterogeneidade. Assim, é essencial
para o seguimento da aprendizagem, e favorece a implicação e a que as equipas sejam formadas pelo corpo docente, explicando
responsabilidade individual e grupal. as suas razões. Desta forma, também se transmite uma atitude
contrária às segregações, a favor da tolerância e em prol da
Avalie a aprendizagem e o funcionamento das equipas, qualita-
igualdade. Como consequência de integrar uma equipa de traba-
tiva e quantitativamente. Promova o diálogo sobre o funciona-
lho cooperativo, os alunos estabelecem uma identidade comum e
mento do grupo e peça-lhes que elaborem um plano de melhoria.
descobrem que, apesar das suas diferenças, partilham coisas em
Reconheça o trabalho das equipas, para recompensar a interde-
comum.
pendência positiva e a responsabilidade individual.
Outra das vantagens das equipas formais heterogéneas estabele- – Nível de integração no coletivo da aula, critério que se pode apli-
cidas pelo corpo docente, é que os alunos e as alunas trabalham car através da observação do corpo docente ou avaliar-se atra-
mais do que se estivessem com os seus amigos, já que, com estes, vés de procedimentos sociométricos, que consistem em
lhes seria mais difícil concentrar-se na tarefa e eliminar distrações. perguntar a todos os alunos sobre a sua disposição em relacio-
Convém ter em conta que, o facto de modificar a composição nar-se com o resto dos membros da turma. Existem programas
daqueles grupos que têm dificuldades para cooperar, pode impe- informáticos através dos quais o aluno responde, por meio do
dir que os alunos desenvolvam as capacidades sociais necessá- computador, e o corpo docente pode dispor dos resultados sem
rias. Além disso, se a modificação está relacionada com a rejeição ter de dedicar tempo a processar a informação. Alguns destes
a interatuar com colegas de coletivos para com os quais existem programas incluem indicadores para a formação dos grupos
preconceitos (racistas, xenófobos, sexistas, etc), pode contribuir heterogéneos de aprendizagem cooperativa.
para reforçar estes problemas. – quando, entre os objetivos, se procura uma mudança de atitudes
e a educação em valores (tolerância, não violência, diminuição de
O tamanho das equipas. Para decidir quantos membros é que
condutas de risco), também é preciso ter em conta a diversidade
terá cada grupo, convém ter em conta que, quanto maior for a
que existe na sala de aula para formar as equipas.
equipa, mais capacidades de comunicação e de resolução de con-
flitos costumam ser requeridas, e cada membro vai ter menos – Para distribuir os alunos com mais dificuldades de inclusão,
tempo para comunicar com os outros. Desta forma, explica-se convém ter em conta que é importante incorporar na sua
que se obtenham melhores resultados com grupos pequenos. equipa colegas com empatia e boa situação no grupo global
que possam facilitar a integração.

140 Nos primeiros ciclos do Ensino Básico é conveniente estabelecer 141


equipas formais de quatro membros, combinando ao máximo a A razão principal para adotar os critérios de formação de gru-
diversidade existente na sala de aula. Por sua vez, cada equipa pos heterogéneos é que ajudam a evitar a segregação de deter-
dividir-se-á em dois pares, sentados um em frente ao outro. minados alunos, que se produz de forma espontânea e, portanto,
favorecem a inclusão.
Numa primeira fase, o trabalho iniciar-se-á a pares para passar,
numa segunda fase, ao debate no grupo.
6.3.  A ATRIBUIÇÃO DE PAPÉIS ESPECÍFICOS
A heterogeneidade dos grupos. Na composição das equipas for- Alguns dos problemas mais frequentes, como a falta de participa-
mais de aprendizagem cooperativa deve existir a diversidade que ção de determinados alunos ou alunas, a tendência para assumirem
existe na turma relativamente às seguintes características: um papel dominante ou a falta de capacidades para cooperarem,
– Género, incluindo em cada equipa rapazes e raparigas. podem resolver-se atribuindo um determinado papel a cada um dos
– Grupo étnico ou cultural, misturando ao máximo a diversidade membros do grupo e definindo com precisão quais são as suas fun-
que exista. ções. É preciso definir os papéis de forma a que todos tenham um
estatuto semelhante.
– Rendimento na área em que se leva a cabo a tarefa coopera-
tiva ou rendimento de um modo geral. Para isto, pode ser útil A divisão de papéis favorece a aquisição de capacidades sociais e
avaliar o rendimento de toda a turma e distribuir os alunos em académicas e contribui, além disso, para esclarecer o que deve fazer
quatro níveis. Cada equipa estará integrada por um aluno de cada aluno na equipa. É conveniente dar, a cada membro da equipa,
cada nível. um cartão com o papel que tem de desempenhar, onde também se
inclua uma descrição das suas funções.
preparam o mesmo tema, explicá-lo aos seus colegas de equipa e
aprender com a explicação dos seus colegas especialistas peritos
DISTRIBUIÇÃO DE PAPÉIS NA EQUIPA noutros temas.

Numa equipa de quatro membros podem distribuir-se os


6.5.  AS TAREFAS COMPLETAS
seguintes papéis:
De acordo com os princípios da psicologia da atividade (Vygostky,
Moderador/a: supervisiona que o tom de voz e o ruído se
1978), para adequar as tarefas de aprendizagem cooperativa ao
mantenham dentro de limites adequados e distribui os tur-
nível de desenvolvimento do aluno é preciso que estas se encontrem
nos de participação entre os membros do grupo para que
dentro da zona de desenvolvimento atual de algum ou alguns dos
estes se adaptem aos critérios previstos.
integrantes de cada grupo (que deveriam ser capazes de realizá-las
Porta-voz: escreve e comunica as respostas de acordo com com as instruções do corpo docente), assim como dentro da zona de
as pautas estabelecidas (pergunta quando falta alguma desenvolvimento próximo do resto dos membros de cada grupo (que
coisa, pede esclarecimentos, comunica à turma os resulta- as deveriam poder realizar com ajuda), o que favorece que todos os
dos do trabalho da equipa). membros do grupo participem ativamente na realização partilhada
da atividade.
Observador/a: observa o comportamento de todos os mem-
bros do grupo relativamente aos objetivos propostos e às Dentro da análise mencionada no parágrafo anterior, cabe conside-
normas de convivência, pergunta ao grupo sobre o seu cum- rar, tanto as atividades mais simples, como a realização partilhada
primento e preenche as fichas de autoavaliação. de tarefas completas, muito mais eficaz e significativa, e para a
142 qual a aprendizagem cooperativa proporciona um contexto muito 143
Coordenador/a: controla o cumprimento dos passos defini-
favorável. Para compreender a relevância que têm as tarefas com-
dos para a realização da tarefa, faz perguntas para com-
pletas, convém ter em conta que permitem interiorizar simultanea-
provar que se entendeu o mais importante, revê e controla
mente, quer o objetivo quer o procedimento para alcançá-lo.
o tempo.
Ao perguntar ao corpo docente do primeiro ciclo sobre a eficácia da
aprendizagem cooperativa para conseguir alcançar objetivos rela-
cionados com conteúdos, procedimentos e atitudes, este costuma
6.4.  AS TAREFAS EM PUZZLE
aludir à maior facilidade dos colegas para explicarem as coisas ao
No modelo de aprendizagem cooperativa, conhecida como puzzle ou seu nível, assim como à possibilidade de aprenderem através de
jigsaw, a tarefa divide-se em partes, como se fossem as peças de um uma atividade em que se ponham em jogo simultaneamente os
puzzle, que cada membro do grupo prepara, primeiro individual- objetivos e as ferramentas necessárias para aprender.
mente e depois explica ao outros membros do grupo. Em muitas
equipas de trabalho formadas por adultos, esta é a forma de coo-
peração mais habitual. A tarefa decompõe-se em tantas partes Ana, professora do quarto ano:
como membros tenham as equipas, de forma a que cada aluno ou «A aprendizagem cooperativa é um método que serve um pouco
aluna se especialize num destes temas e trabalhe juntamente com para tudo, mas sobretudo para os procedimentos. Há muitos
colegas de outros grupos a quem também correspondeu esse casos em que, o mais importante, não é a compreensão do con-
mesmo tema, para depois explicá-lo aos seus coolegas de equipa. ceito, mas o procedimento, a atividade. Apesar de começar por
Assim, cada aluno beneficia do desempenho de três papéis em coo- explicá-lo, muitas crianças compreendem-no depois, quando
peração: estudar ou investigar sobre um tema com especialistas que realizam a atividade, através do procedimento».
João, professor de Apoio no primeiro ciclo: 7. Ensinar capacidades para a
«Às vezes aconteceu-me que um aluno ensinou a outro o seu cooperação
método de fazer as coisas e este compreendeu-o melhor do que
quando eu expliquei, porque as palavras e o próprio vocabulário Entre os objetivos dos primeiros ciclos do Ensino Básico, incluem-se
é mais próximo, mais acessível. Além disso, pode acontecer tam- uma série de competências que a aprendizagem cooperativa pode pro-
bém que se sintam mais livres, menos pressionados. Refiro-me mover, como são as capacidades para trabalhar em equipa: conhecer
a que, muitas vezes, quando o professor explica uma coisa a um as normas de convivência e comportar-se de acordo com elas; esfor-
aluno, o temor ou o medo de não entender bem ou de fazer mal çar-se na consecução de um objetivo, superando os obstáculos; confiar
o que lhe é pedido, pode fazê-lo sentir-se mais pressionado e em em si próprio; desenvolver o sentido crítico, a iniciativa pessoal e a cria-
frente de um colega isto não acontece, porque se este se equi- tividade; respeitar os direitos humanos e a diversidade cultural; resolver
voca, apenas se engana. Por exemplo, perguntam os verbos uns pacificamente os conflitos e aprender a relacionar-se em grupo.
aos outros e sabem-nos e quando os chamo à minha mesa A aprendizagem cooperativa favorece o desenvolvimento destas com-
“ficam a ver navios". Pode ser medo de ficar mal em frente do petências sociais, mas também as requer como condição necessária
professor, nervos. para a sua eficácia. Convém ter em conta que estas capacidades não
Também é muito positivo perguntarem uns a outros, o facto de se desenvolvem automaticamente só porque o corpo docente pede
também poderem fazer de professores, pois motivam-se. E se aos seus alunos e às suas alunas que trabalhem em pequenos grupos,
têm dúvidas, sempre te têm a ti para ajudar. [...] A possibilidade é preciso favorecê-las pró-ativamente. Para trabalhar em equipa, os
de utilizar os próprios colegas para a aprendizagem de conteú- alunos devem aprender a mobilizar-se em torno de objetivos partilha-
144 dos é possível e, além disso, é boa, o que acontece é que nem dos, a criar um clima positivo, a expressar construtivamente as críticas 145
sempre é preciso utilizar os «mesmos», mas é preciso dar a e as discrepâncias, a resolver conflitos, a animar-se, a motivar-se, a
todos esta responsabilidade, adaptando os conceitos à sua comprometer-se, a negociar, etc. Para conseguir isto, o corpo docente
experiência ou conhecimentos. Todos devem sentir-se professo- tem de descrever e ensinar as condutas e atitudes esperadas, atribuir
res e alunos nuns ou noutros temas». determinados papéis a cada membro da equipa, ajudá-los a tomar
consciência da sua responsabilidade e dar oportunidades para prati-
car e favorecer uma adequada avaliação desta prática.

 PAUTAS PARA ENSINAR CAPACIDADES


SOCIAIS

Pode favorecer-se a aquisição ou a manutenção de novas


capacidades sociais através das seguintes pautas:

Criar um esquema prévio. Convém começar com uma expli-


cação da capacidade, como conceito ou princípio geral, e
relacioná-la com uma descrição concreta das condutas que
implica. É muito importante que nesta explicação se desta-
que a importância que a capacidade tem para os objetivos
a que o treino se dirige.
Proporcionar modelos para favorecer a aprendizagem por Em qualquer aula de aprendizagem cooperativa, o corpo docente
observação. A observação de modelos que manifestam deve observar se o aluno mostra interações e atitudes sociais posi-
um bom desempenho da capacidade pode ser de grande tivas, em que os membros da equipa se ajudam, animam e cada um
eficácia para a sua aquisição. Por isso, convém estimular o favorece a aprendizagem do outro através das oportunidades para
aluno para que encontre modelos e exemplos dentro da perguntar, explicar, analisar, conectar a aprendizagem atual com a
própria equipa ou de outras equipas da aula. Quando isto anterior ou torná-la mais significativa.
não for possível, o corpo docente pode explicar represen-
Para promover estas atitudes é preciso distribuir a sala de aula de
tando, a título de exemplo, em que consiste o que está a
forma a favorecer uma interação visual e verbal entre os membros
tentar explicar.
do grupo que facilite a comunicação. O contexto mais simples para
Dar oportunidades de praticar. A aquisição de uma nova esta interação positiva é o que se produz por pares, que se pode
capacidade é um processo lento e precisa de bastante prá- levar a cabo facilmente em equipas de quatro membros que reali-
tica até que se automatize, momento em que deixa de zam parte do trabalho de dois em dois.
requerer esforço. Por isso, convém proporcionar oportuni-
dades frequentes para que se pratiquem as capacidades
que se pretendem ensinar. As equipas cooperativas propor-
cionam um contexto de grande relevância para proporcio-
nar estas oportunidades.
Avaliar a prática. Para favorecer a aquisição das novas
capacidades, o corpo docente deve observar, ao longo de
146 147
todas as aulas, como é que se comportam os seus alunos e
as suas alunas, com o objetivo de lhes proporcionar oportu-
nidades para avaliar as suas conquistas, reforçando assim
as condutas adequadas e animando-os a modificar as ina-
dequadas, sempre com otimismo inteligente.
A eficácia desta avaliação aumenta quando se faz imedia-
tamente a seguir à conduta sobre a qual se quer influir, e
expõe-se em termos de condutas específicas, fáceis de
identificar. No caso das condutas inadequadas, é conve-
niente que a crítica se realize em termos descritivos, limi-
tando-a ao comportamento (não à pessoa), e que se ajude
o aluno a encontrar uma conduta alternativa para esta
situação, mostrando reconhecimento quando a manifestar.
É importante ter em conta que o corpo docente representa
um modelo, apesar de não o propor, e deve ter cuidado para
que a sua forma de atuar seja coerente com aquilo que
tenta ensinar.
8. Avaliação e seguimento da E relativamente aos objetivos propostos, convém mencionar:
aprendizagem cooperativa – O que é que aprendemos nesta aula?
– O que fica por aprender para a próxima aula?
8.1. AUTOAVALIAÇÃO DO FUNCIONAMENTO INDIVIDUAL
E GRUPAL
Uma vez realizada a tarefa, cada equipa e cada aluno deve dedicar As capacidades de cooperação e integração do trabalho de todos
um certo tempo a refletir sistematicamente sobre a forma como os membros do grupo. Convém dar uma importância semelhante
trabalhou. Esta autoavaliação é de grande relevância para o funcio- ao sucesso destes objetivos, incorporando na avaliação as seguin-
namento da aprendizagem cooperativa e para ajudar a superar os tes questões:
obstáculos que surgem. Além disso, constitui uma excelente oportu- – Se conseguiram criar um bom ambiente de trabalho.
nidade para desenvolver a capacidade de autorregulação dos pro- – Se trabalharam juntos, cooperando.
cessos cognitivos e sociais.
– Se integraram as contribuições de todos.
De entre os aspetos que convém incluir nesta avaliação, cabe – Se conseguiram que todos trabalhassem.
destacar os seguintes:
– Se um aprendeu ao observar os outros.
Os objetivos propostos na tarefa e o plano de trabalho. O aluno – Se expuseram perguntas que os fizeram pensar.
deve avaliar se alcançou os objetivos e até que ponto os alcançou,
destacando os avanços mais significativos para reforçar os acer- Capacidades para a discussão e resolução de conflitos. Em deter-
148 tos, e aqueles aspetos em que os avanços foram menores, para minadas atividades, baseadas em debates ou naquelas em que 149
poder identificá-los como prioritários nas próximas aulas. Desta surgem conflitos especialmente relevantes, convém avaliar os
forma, desenvolve-se a motivação de eficácia, segundo a qual as avanços. Com este objetivo, poderiam ser avaliadas as seguintes
dificuldades não se definem como fracassos, mas como proble- questões:
mas a resolver. Assim, incrementam-se o esforço e a capacidade – Se todos opinaram.
de superação de obstáculos. – Se se ouviram uns aos outros.
– Se observaram que assuntos ocasionaram conflitos.

No sexto ano, por exemplo, para esta autoavaliação poderia – Se resolveram os conflitos de forma adequada.
expor-se uma rubrica, segundo uma escala de quatro graus, com Avaliação de cada membro do grupo. Convém levá-la a cabo a
as seguintes questões: partir de uma dupla perspetiva: avaliação de cada aluno por
– Tínhamos claro como fazer a tarefa e quais eram os objetivos? parte dos outros membros do grupo e autoavaliação de cada um
– Dedicámo-nos a trabalhar na tarefa? deles relativamente à sua própria contribuição e à forma de
como melhorá-la.
– Fizemos um bom plano para realizar a tarefa e cumprimo-lo?
– Aproveitámos bem o tempo?
– Analisámos cada passo da tarefa para corrigi-lo e melhorá-lo? 8.2. OBSERVAÇÃO DA APRENDIZAGEM COOPERATIVA POR
PARTE DO CORPO DOCENTE
– Fizemos uma avaliação global da tarefa realizada?
Os critérios gerais anteriormente mencionados devem ser observados
em cada aula por parte do corpo docente. Convém anotar os resulta-
dos das observações numa ficha semelhante à que se inclui a seguir.
Em ambos os casos (torneios grupais ou individuais) a pontuação da
OBSERVAÇÃO DO FUNCIONAMENTO DE CADA EQUIPA
equipa resulta da soma das pontuações de cada um dos seus mem-
Aspetos Sim Não Observações bros. Esta condição, proporciona as vantagens da cooperação, evi-
Entendem os objetivos e a tarefa? tando o risco de difusão de responsabilidade que se deteta, por
vezes, quando o aluno não pode comprovar qual a sua contribuição
Observa-se interdependência positiva
e responsabilidade individual?
para os resultados da equipa. Como consequência da difusão de
responsabilidade, o rendimento e a motivação pela aprendizagem
Debatem e resolvem bem os conflitos?
poderiam diminuir.
Todos os membros do grupo participam?
Comparação com pares do mesmo nível. Nos torneios grupais
… formam-se grupos de três alunos, tendo em conta que o seu nível
na tarefa seja o mais homogéneo possível, e entregam-se-lhes as
provas de avaliação. Todos os grupos de torneio assim formados
8.3. COMO GARANTIR A IGUALDADE DE OPORTUNIDADES realizam as provas simultaneamente. A criança que melhor
ATRAVÉS DA AVALIAÇÃO resolve a tarefa em cada grupo de torneio consegue dez pontos
A incorporação da aprendizagem cooperativa em áreas avaliáveis, cos- para a equipa que o treinou.
tuma favorecer a sua eficácia, aumentando a relevância que lhe dá o Ao comparar o rendimento com o dos colegas de nível semelhante,
aluno e a autoridade do corpo docente para a levar a cabo. igualam-se consideravelmente as possibilidades de que todos os
Para decidir o procedimento de avaliação, é importante recordar alunos consigam os dez pontos para a equipa da qual fazem parte.
que deve ser coerente com os objetivos e os princípios da coopera- Uma forma muito ágil e simples de organizar os torneios grupais
150 151
ção. Por isso, se se quer favorecer a interdependência positiva e a com grupos do mesmo nível de rendimento pode ser a seguinte:
responsabilidade individual, parece lógico reforçá-las através do – D ar cada papel (porta-voz, coordenador/a, observador/a e
procedimento escolhido para a avaliação. Os torneios grupais e os moderador/a) a alunos/as que tenham um mesmo nível de ren-
torneios individuais ajudam a consegui-lo, contribuindo, além disso, dimento.
para distribuir o protagonismo académico.
– no fim da aula, por exemplo, pedir que saiam os/as moderado-
Uma vantagem importante da aprendizagem cooperativa é que res/as e expor-lhes algumas perguntas, concedendo os pontos
permite modificar a estrutura da avaliação e igualar as oportunida- a quem responda de acordo ao critério escolhido (90% ou a
des de obter sucesso e reconhecimento de todos os alunos e as alu- quem mais responda, por exemplo).
nas. Para isto compara-se o rendimento de cada aluno consigo – Assinalar os pontos obtidos por cada membro à sua equipa e
próprio, na aula anterior (no torneio individual), ou se possível, com apontá-los na cartolina colocada na parede.
colegas de nível de rendimento semelhante (no torneio grupal).
– Proceder da mesma forma com o resto dos papéis atribuídos a
Quando se combinarem estes dois procedimentos de avaliação, cada grupo (porta-voz, coordenador/a e observador/a).
favorece-se a consecução de dois importantes objetivos: Os torneios grupais têm uma grande força motivadora. É neces-
– Ajudar a definir metas realistas, contribuindo para o desenvolvi- sário, no entanto, dar-lhes um aspeto lúdico, enfatizando a
mento da autoestima e da motivação de eficácia. importância de colaborar e relativizando a importância de
ganhar ou perder. Em cada dia, convém atribuir alguns pontos
– Estimular a aquisição de capacidades de comparação intrapessoal
aos alunos que melhor tenham colaborado, apontando-os na
que permitam comprovar o próprio progresso, assim como capa-
equipa a que pertencem.
cidades e oportunidades de comparação interpessoal.
A comparação intrapessoal e o sentido do progresso. Nos tor-
neios individuais cada aluno realiza a prova sozinho e consegue os
Referências bibliográficas
pontos para a sua equipa sempre que o seu rendimento for igual
Allport, G. (1954). The nature of prejudice. Cambridge, Mass.:
(atribuem-se cinco pontos) ou superior (dez pontos) ao alcan-
Addison-Wesley.
çado na aula anterior.
Aronson, E. (1978). The jigsaw classroom. Beverly Hills, Calif.:
Para que a aprendizagem cooperativa produza os resultados
Sage Publications.
esperados, é muito importante que os sucessos se distribuam ao
máximo e que todo o aluno o consiga alcançar com certa periodi- Aronson, E. (2000). Nobody left to hate. Teaching compassion
cidade. Para isso, costuma ser necessário combinar os dois pro- after Columbine. New York: Freeman.
cedimentos de avaliação descritos. No entanto, em algumas
Díaz-Aguado, M.J. (dir.) (1992). Educación y desarrollo de la
ocasiões, o nível de rendimento de um aluno com necessidades
tolerancia. Cuatro volúmenes y un vídeo. Madrid: Ministerio
educativas especiais integrado em salas de aula ordinárias, pode
de Educación y Ciencia.
estar a uma distância excessiva do nível de rendimento dos seus
colegas mais próximos. Nestes casos, é conveniente utilizar só os Díaz-Aguado, M.J. (dir.) (1994). Todos iguales, todos diferentes.
torneios individuais de comparação intrapessoal. Programas para favorecer la integración de alumnos con
necesidades educativas especiales. Cinco volúmenes. Madrid:
Os dois procedimentos de avaliação anteriormente resumidos
ONCE. Disponível na Internet.
permitem educar a comparação intra e interpessoal, processos de
grande importância no desenvolvimento da personalidade, em geral, Díaz-Aguado, M.J. (2003). Educación intercultural y aprendizaje
e na aprendizagem escolar, em particular. Os torneios grupais cooperativo. Madrid: Pirámide.
152 153
ensinam os alunos a utilizar múltiplos grupos de referência, incluindo Díaz-Aguado, M.J. (2006). Del acoso escolar a la cooperación
assim a comparação com colegas de rendimento próximo ao seu e en las aulas. Madrid: Pearson Educación.
com aqueles com quem é possível obter diferente tipo de resultados.
Os torneios individuais ensinam a comparação temporária Díaz-Aguado, M.J. (2015). Da violência escolar à cooperaçao
intrapessoal em função da qual se desenvolve a motivação de na sala de aula. São Paulo: Adonis.
sucesso e a ideia de progresso. Díaz-Aguado, M.J., Andrés, T. (1999). Aprendizaje cooperativo
Para favorecer a motivação pela aprendizagem cooperativa e y educación intercultural. Investigación-acción en centros
aumentar a sua eficácia, convém elaborar uma tabela na qual se de Primaria. Psicología Educativa, 5,2. págs. 141-200.
mostrem os resultados obtidos por cada uma das equipas ao longo Díaz-Aguado, M.J., Baraja, A. (1993). Interacción educativa
do ano, onde devem figurar os seguintes dados: nome da escola e y desventaja sociocultural. Un modelo de intervención para
ano; nomes das equipas; número de torneios ou aulas de avaliação. favorecer la adaptación escolar en contextos interétnicos.
Para garantir que todo o aluno consiga um nível aceitável de reco- Madrid: Centro de Investigación y Documentación Educativa.
nhecimento, e especialmente os que mais precisam, pode ser conve- Disponível na Internet.
niente que o corpo docente vá registando os resultados obtidos por Díaz-Aguado, M.J., Martínez Arias, R., Martín Babarro, J. (2010).
cada estudante num documento à parte, não visível para o aluno, Estudio estatal sobre la convivencia escolar en la Educación
que lhe proporcione dados individuais necessários para assegurar a Secundaria Obligatoria. Madrid: Ministerio de Educación.
eficácia da aprendizagem cooperativa. Observatorio Estatal de la Convivencia. Disponível no site
do Ministério da Educação.
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Avaliação formativa
PATRICIA COMPAÑÓ
ÍNDICE
AVALIAÇÃO FORMATIVA

INTRODUÇÃO 161

1 A regulação e a autorregulação das aprendizagens


1.1. A avaliação formativa como regulação
da aprendizagem 162
1.2. A avaliação formadora como complemento
da avaliação formativa 166
1.3. Que diferenças existem entre a avaliação tradicional
e a avaliação formativa/formadora? 169

2 O processo de avaliação no trabalho por projetos


2.1. Redação de indicadores e níveis de aquisição 171
2.2. Seleção de atividades de avaliação.
Para lá do exame 173
2.3. Seleção de instrumentos de avaliação 176
2.4. Retroalimentação da avaliação do aluno 178
2.5. Avaliação dos alunos 179

CONCLUSÕES 180

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 181


Introdução
Normalmente, quando falamos de avaliação educativa, associamo-
-la, quase de forma exclusiva, à avaliação dos resultados obtidos
pelos alunos e pelas alunas. De certa maneira, é lógico que assim
seja, já que as avaliações externas (PISA, PIRLS, TIMSS, provas esta-
tais de competências, etc.) estão a fazer com que os resultados — e
as pontuações obtidas em diferentes rankings, se convertam no
ponto de mira de qualquer aproximação ao processo avaliativo.
O próprio curriculum escolar entende a avaliação da aprendizagem
como aquilo que o aluno deve alcançar, tanto no que concerne a
conhecimentos como a capacidades. Promove-se assim uma visão
finalista da avaliação, baseada fundamentalmente nos resultados.
Por outro lado, a avaliação pode perceber-se, tanto pelo aluno como
pelo corpo docente, como um instrumento qualificador, no qual o
sujeito a avaliar é só o aluno e o objeto da avaliação são as aprendi-
zagens realizadas em função de uns padrões mínimos para todos.
No entanto, o conceito de avaliação atual trata de promover uma
visão da avaliação que também tem em conta o processo de apren-
dizagem e não só os resultados finais. Neste sentido, a nova conce-
ção centra-se tanto no processo de ensino-aprendizagem como nos
resultados. Segundo esta visão, em alguns casos, o sujeito da ava- 161
liação pode ser o aluno, noutros o grupo-classe e noutros o profes-
sor ou a equipa docente. Relativamente ao objeto da avaliação, às
vezes pode avaliar-se o processo de aprendizagem do aluno, noutras
avaliar-se-ão os resultados, enquanto em algumas ocasiões, a aten-
ção pode dirigir-se para a intervenção pedagógica levada a cabo.
No entanto, a verdadeira diferença entre a avaliação de competên-
cias atual e a avaliação tradicional supõe entender que cada aluno
ou aluna tem um sistema pessoal de aprendizagem que vai cons-
truindo de uma maneira progressiva. Surge, nesta perspetiva,
uma avaliação complementar à avaliação formativa, a chamada
avaliação formadora, que implica a autorregulação da própria
aprendizagem.
1. A regulação e a autorregulação As mudanças propostas por estes autores e pelos seus sucessores,
entre os anos cinquenta e setenta do século xx, no que concerne à
das aprendizagens avaliação, foram fruto da mudança de paradigma e de teoria sobre
a aprendizagem daquela época, criando as bases para o desenvolvi-
1.1. A AVALIAÇÃO FORMATIVA COMO REGULAÇÃO mento de um novo enfoque, conhecido como modelo sistémico
DA APRENDIZAGEM (Jorba e Casellas, 1996).
O conceito de avaliação formativa foi definido a partir das contri- A partir de então, o modelo sistémico, diferente do modelo psicomé-
buições de vários autores. Alguns dos mais significativos pela trico vigente até a data, destaca-se pela sua relevância pedagógica.
sua contribuição para o termo foram R. W. Tyler, L. J. Cronbach A avaliação já não serve só para certificar uns resultados de apren-
e M. Scriven. As suas contribuições marcaram o desenvolvimento da dizagem, mas permite aos docentes, por um lado, adaptar as suas
avaliação tal como hoje a conhecemos. propostas pedagógicas às necessidades dos estudantes e, por outro,
Nos anos cinquenta do século xx, R. W. Tyler, professor da Universi- oferece a informação necessária para proporcionar aos alunos as
dade Estatal de Ohio, contribuiu para a visão atual da avaliação ajudas pertinentes para superar os obstáculos e as dificuldades que
quando, em 1950, a vislumbrou como «um processo que permite se lhes apresentam no seu processo de aprendizagem.
determinar em que grau é que se alcançaram os objetivos educativos Assim, o modelo sistémico incorpora uma visão mais pedagógica da
propostos». Neste sentido, propôs que os objetivos constituíssem a avaliação que o modelo psicométrico. Este modelo, conhecido também
base da tarefa de planificação do corpo docente, servindo como cri- como avaliação formativa, põe a avaliação ao serviço da adaptação
tério para selecionar materiais, concretizar os conteúdos e preparar da prática educativa às necessidades dos alunos, já que não se tem só
os exames. em conta o resultado final, mas todo o processo de aprendizagem.
Mais tarde, L. J. Cronbach (1963) agregou um elemento importante Assim, em que momento do processo de ensino-aprendizagem é que
para a conceção moderna de avaliação: o uso da informação obtida situaríamos a avaliação formativa? Segundo Jorba e Casellas (1996),
para tomar decisões sobre o programa educativo, acrescentando a avaliação formativa situa-se «durante» o processo, enquanto a
162 retroalimentação ao processo, não se limitando a uma avaliação. avaliação preditiva ou avaliação inicial se deveria levar a cabo no 163
Mas foi só em 1967 que M. Scriven introduziu os termos de avalia- início e a avaliação sumativa realizar-se-ia no fim do processo.
ção formativa e avaliação sumativa. Para este autor, a avaliação
pode adotar duas funções diferentes dependendo onde se centre o
foco de atenção. Assim, definiu a avaliação formativa como aquele AVALIAÇÃO
tipo de avaliação que «centra a sua intervenção nos processos, de
forma que desde o seu início pretende incidir na melhoria destes».
Contudo, a avaliação sumativa resumiu-a como aquela que se foca-
ANTES DO DURANTE O DEPOIS DO
liza sobre os resultados, perseguindo o controlo dos mesmos. O ENSINO ENSINO ENSINO
valor da contribuição de Scriven foi propor uma avaliação centrada
nos processos, num momento histórico em que a única avaliação
existente era a que se centrava nos resultados. PREDITIVA FORMATIVA SUMATIVA

No entanto, com o passar do tempo, a conceção que esteve na ori-


gem destes dois termos — formativa e sumativa — foi derivando em Retroativa Interativa Pró-ativa
conceções que poderiam ser suscetíveis de uma interpretação de
oposição e não de complementaridade. FIGURA 1.  A AVALIAÇÃO DURANTE O PROCESSO DE ENSINO-APRENDIZAGEM
A avaliação formativa tem uma finalidade reguladora do processo alunas, e lhes ofereça as ajudas necessárias para superarem os obs-
de ensino-aprendizagem do aluno porque faz referência aos proce- táculos ou dificuldades que se produziram durante o processo de
dimentos utilizados pelo corpo docente para adequar a sua prática aprendizagem.
educativa aos progressos e também aos problemas de aprendiza-
Este modelo sistémico de avaliação formativa é onde assentam as
gem observados nos seus alunos. «A informação que se procura
bases do conceito de avaliação mais estendido a nível educativo. A
refere-se às representações mentais do aluno e às estratégias que
seguir, oferecemos duas definições que concretizam esta visão da
utiliza para chegar a um determinado resultado », expõem Jorba e
avaliação:
Casellas a este respeito.
Segundo Allal (1988) existem três tipos de regulação formativa:
«A avaliação define-se como um processo sistemático e rigoroso
A regulação retroativa: é um tipo de regulação diferida, isto é,
de recolha de dados, incorporado no processo educativo desde o
fora da situação de aprendizagem. Neste tipo de avaliação, nor-
seu começo, de forma a que seja possível dispor de informação
malmente programam-se atividades de reforço, depois de uma
contínua e significativa para conhecer a situação, formar juízos
avaliação pontual, que tem lugar no fim de uma sequência de
de valor relativamente a ela e tomar as decisões adequadas
atividades de ensino-aprendizagem. A sua finalidade é ajudar os
para prosseguir a atividade educativa, melhorando-a progressi-
alunos a superar as dificuldades ou a corrigir os erros detetados
vamente» (Casanova, 2007).
durante a avaliação.
A regulação interativa: é aquela que se leva a cabo de forma inte-
grada na situação de aprendizagem. Consiste, por um lado, em
«Na perspetiva funcional, a avaliação educativa é um processo
realizar uma adaptação, por parte do corpo docente, da ativi-
de reflexão sistemática, orientado sobretudo para a melhoria da
dade às necessidades do aluno, como consequência imediata da
qualidade da aprendizagem dos alunos, das intervenções dos
deteção de dificuldades ou obstáculos na aprendizagem. Por
profissionais, do funcionamento institucional ou das aplicações
outro lado, também se pode dar uma regulação interativa naque-
à realidade dos sistemas ligados à atividade educativa.
164 las situações em que o material pedagógico, que se coloca nas 165
mãos do aluno, permite realizar uma autoavaliação ou coavalia- Supõe um processo complexo que inclui:
ção das aprendizagens. Um dos exemplos mais claros é a apre- • Uma recolha de informação em relação a uns indicadores que
sentação de atividades autocorretivas, quer seja em formato reflitam a situação inicial.
papel, quer seja em formato digital.
• Uma coerência entre o planificado, o que se levou a cabo e os
A regulação pró-ativa: este tipo de regulação prevê atividades de resultados.
formação futuras, orientadas para a consolidação e aprofunda-
mento das competências dos alunos. • Uma elaboração de juízos de valor.
Segundo o exposto até agora, a avaliação formativa, entendida • A tomada de decisões que conduza a uma intervenção, a par-
como a regulação das aprendizagens do aluno, é interpretada como tir da informação obtida.
um processo sistémico, dividido em três momentos, que vão permitir • O seguimento e o controlo da intervenção que se leva a cabo,
analisar as representações mentais do aluno relativamente ao que assim como uma nova avaliação das consequências
está a aprender e como o está a aprender (competência de apren- resultantes da aplicação».
der a aprender). Esta análise possibilitará que o docente adapte a
(Mateo, 2000)
sua prática educativa às necessidades dos seus alunos e das suas
Como se pode observar, em ambas as definições a avaliação é Esta ideia de avaliação como estratégia de aprendizagem é reco-
entendida como um processo sistemático e rigoroso de recolha de lhida por Pellicer e Ortega Delgado (2009):
informação e interpretação dos dados para a emissão de um juízo,
com o objetivo de tomar as decisões pertinentes antes, durante e «Quando avaliamos como parte de uma estratégia para a
depois do processo de aprendizagem do aluno. aprendizagem, procuramos e interpretamos o que os alunos e as
alunas fazem para decidir em que etapa é que se encontram,
PROCESSO AVALIATIVO onde é que precisam de chegar e qual é que é o melhor modo
para o fazerem.

Estas autoras propõem uma série de elementos que são vitais para
1 2 3 avaliar baseando-se nesta visão:
RECOLHER ANALISAR OS TOMAR Observação. Sem descartar a utilidade dos exames como ativi-
DADOS DADOS E EMITIR JUÍZOS DECISÕES
dade de avaliação final, a observação vai permitir conhecer o que
FIGURA 2.  ASPETOS BÁSICOS DO PROCESSO AVALIATIVO
é que fazem os nossos alunos, que dificuldades é que estão a
encontrar, quais são as suas reações diante das aprendizagens
Nesta conceção sistémica da avaliação formativa, as práticas que propostas, qual é o seu ponto de partida na altura de abordar as
se levam a cabo dependem do quadro teórico de referência. Por isso, tarefas, qual é o seu grau de participação, etc.
é interessante consensualizar no grupo de professores o conceito de
avaliação que se tomará como referência, já que este condicionará Interpretação. Não só é importante observar o que é que fazem
o desenvolvimento da mesma. Desta forma, em função da visão que os alunos e como é que o fazem, como também entender porque
se tenha da avaliação, poderão decidir-se questões importantes, é que fazem o que fazem.
como por exemplo os objetivos que se perseguem, os agentes impli- Juízo. Uma vez recolhida e interpretada a informação, como
cados, os diferentes momentos nos quais avaliar, etc. docentes deveremos emitir um juízo em relação aos parâmetros
166 167
de avaliação propostos e consensualizados.
1.2. A AVALIAÇÃO FORMADORA COMO COMPLEMENTO Ação. A informação recolhida na avaliação deve conduzir a uma
DA AVALIAÇÃO FORMATIVA modificação da nossa intervenção educativa. Se não fosse assim,
os passos anteriores não teriam nenhuma utilidade.
Esta visão de avaliação formativa ou avaliação do processo de
aprendizagem, propõe uma recolha de informação das representa- Explicitação metacognitiva. O feedback que possamos proporcionar
ções mentais que o aluno vai criando, baseando-se nos conteúdos aos nossos alunos e alunas a respeito das suas ações, deve implicar
que deve aprender e nas estratégias utilizadas para realizar essa uma reflexão metacognitiva por parte dos alunos, que implique uma
aprendizagem. tomada de consciência do seu grau de aprendizagem.
Partindo desta conceção, a avaliação entende-se como uma estra- Na visão de avaliação formativa tradicional, a regulação da apren-
tégia de aprendizagem que ajuda, tanto docentes como alunos, a dizagem é levada a cabo, basicamente, pelo corpo docente. É este
terem consciência dos obstáculos que vão aparecendo e que dificul- que se encarrega de detetar as dificuldades de aprendizagem no
tam a aprendizagem. Esta tomada de consciência vai permitir que aluno, de analisá-las e de tomar decisões a este respeito. No
não seja só o corpo docente a detetar as dificuldades, mas também entanto, Sanmartí (2007) opina que «só o próprio aluno pode corri-
seja o próprio aluno ou aluna quem tomem consciência destas e gir os seus erros, dando-se conta do porquê de se enganar e
possam levar a cabo ações para as superar. tomando as decisões de mudança adequadas».
Neste sentido, Sanmartí propõe que o corpo docente partilhe com o 1.3. QUE DIFERENÇAS EXISTEM ENTRE A AVALIAÇÃO
aluno a responsabilidade da avaliação. TRADICIONAL E A AVALIAÇÃO FORMATIVA/FORMADORA?

Partindo do que foi exposto até agora, poderíamos dizer que a ava-
«Não é suficiente que quem ensina corrija os erros e explique a liação atual, que oferece uma visão mais formativa/formadora, é
visão correta. Deve ser o próprio aluno a avaliar-se, propondo plural: nos enfoques, nos conteúdos, nos métodos, nos instrumentos,
atividades com este objetivo específico. Esta avaliação é a que nos agentes, nas audiências, etc.
se chama avaliação formadora».
Analisando as características dos dois tipos de avaliação, podemos
concluir que a avaliação atual implica um enfoque mais construtivo
Será esta a visão formadora, onde têm lugar a autoavaliação e a e é mais personalizada, de forma que não só permite uma maior
coavaliação, já que este tipo de avaliação constitui o motor do pro- atenção à diversidade, mas também corresponsabiliza o aluno pelo
cesso de construção do conhecimento. É interessante, neste sentido, seu próprio processo de aprendizagem.
que tanto os que ensinam como os que aprendem, recolham dados
sobre a aprendizagem, os analisem e tomem decisões a este res-
peito. Desta forma, o aluno corresponsabiliza-se do seu processo de
aprendizagem a partir da tomada de consciência deste.
8
5
Os pontos-chave em que temos de incidir são:
Detetar os erros de aprendizagem quando se produzem.

Assegurar que os efeitos não sejam sancionadores, mas constru- AVALIAÇÃO AVALIAÇÃO ATUAL
tivos relativamente ao processo de aprendizagem. TRADICIONAL (FORMATIVA/ FORMADORA)

Tendo em conta a importância que a avaliação tem no processo de • Utiliza diferentes provas: provas de • Utiliza amostras variadas:
aprendizagem, é interessante concretizar os passos que qualquer escolha múltipla, de associação, etc. experiências dos alunos, projetos,
168
processo avaliador deve ter em conta: • Faz um juízo avaliativo baseado na debates, portefólios, produtos, etc. 169
recolha de informação objetiva, • Faz um juízo objetivo, tendo em
Recolha de dados com rigor e sistematização. tomando o mesmo ponto de conta o ponto de partida, assim
referência para todos ao como as particularidades de cada
Análise da informação obtida.
 interpretar os resultados sem aluno.
Formulação de conclusões. considerar o ponto de partida. • Focaliza a avaliação de forma
• Focaliza a avaliação sobre individualizada sobre os alunos, à
Estabelecimento de um juízo de valor sobre o objeto avaliado. a pontuação do aluno em luz da sua própria aprendizagem.
Adoção de medidas para continuar a atuar corretamente.
 comparação com a de outros. • Permite ao corpo docente criar
• Permite conhecer o nível do aluno uma história avaliativa relativamente
Como conclusão do até agora exposto, poderíamos dizer que: mediante uma pontuação. ao indivíduo ou ao grupo.
• Tende a ser generalizável. • Tende a ser idiossincrática.
A avaliação faz parte do processo de aprendizagem e tem sen-
• Proporciona uma informação • Provê informação avaliativa que
que inibe a ação curricular. facilita a ação curricular.
tido como ferramenta para construir o conhecimento, já que se
• Coloca a avaliação sob a decisão • Permite ao aluno participar na sua
trata de um elemento da prática educativa que nos permite refle- exclusiva do corpo docente. própria avaliação.
tir sobre o processo e, caso seja necessário, modificá-lo quando
Adaptado de Casanova (2007) e Mateo (2000)
este não se constrói como esperávamos ou como prevíamos.
2. O processo de avaliação no trabalho 2.1. REDAÇÃO DE INDICADORES E NÍVEIS DE AQUISIÇÃO

por projetos Como docentes, quando iniciamos o trabalho por projetos, planifica-
mos as tarefas que os nossos alunos e as nossas alunas desenvolve-
rão, definimos as atividades que realizarão e quando é que as
Pode ser interessante ordenar as ideias em relação à avaliação dos levarão a cabo. Paralelamente a este processo, também é muito
projetos, concretizando-as numa série de passos que vão permitir importante planificar como é que se vai levar a cabo a avaliação.
que a avaliação seja um processo contínuo, interdependente do pro- Esta avaliação iniciar-se-á com a redação de indicadores e os seus
cesso de ensino-aprendizagem, e não só um elemento final. Desta diferentes níveis de aquisição.
forma, a avaliação estará integrada nos projetos de trabalho e não
se desenvolverá só a posteriori.
«Um indicador define-se como a ação concreta que se observa
Os passos ou fases que seguiremos para avaliar os projetos são: na realização de uma tarefa» (Cortés, 2009).
1. Redação de indicadores e níveis de aquisição (O que é que quere-
mos avaliar?). Indicadores de avaliação e seus níveis de aquisição
2. Seleção de atividades de avaliação (Como é que avaliaremos?). Para concretizar os indicadores de avaliação e os correspondentes
3. Seleção dos instrumentos de avaliação (Como é que recolhere- níveis de aquisição, é necessário conhecer os critérios de avaliação e
mos os dados?). os padrões de aprendizagem avaliáveis que o curriculum proporciona.
4. Retroalimentação da avaliação do aluno (O quê e como é que Para passar dos critérios de avaliação e dos padrões (primeiro nível
devolvemos a informação aos alunos?). de concretização curricular) aos indicadores de avaliação (terceiro
5. Avaliação dos alunos (Como é que os classificaremos?). nível de concretização), é necessário contextualizar estes elementos
ao nível de centro, na forma de resultados de aprendizagem, de for-
ma a que possamos analisar como é que o aluno evolui na aquisição
170 das competências. 171

NÍVEIS DE CONCRETIZAÇÃO
1 3 5
1
Redação de Seleção dos Avaliação
indicadores e níveis instrumentos dos alunos CRITÉRIOS DE
de aquisição de avaliação AVALIAÇÃO
PADRÕES DE
APRENDIZAGEM
2
RESULTADOS
DE APRENDIZAGEM
2 4 3
Seleção de atividades Retroalimentação
de avaliação da avaliação do aluno INDICADORES
DE AVALIAÇÃO

FIGURA 3.  PASSOS DO PROCESSO DE AVALIAÇÃO FIGURA 4. CONCREÇÃO DOS CRITÉRIOS DE AVALIAÇÃO
Assim, os critérios de avaliação são o referente específico para ava- 2.2. SELEÇÃO DE ATIVIDADES DE AVALIAÇÃO. PARA LÁ
liar a aprendizagem, e descrevem aquilo que o aluno deve conseguir, DO EXAME
tanto ao nível de conhecimentos como de competências. São pres- As atividades de avaliação são os exercícios e modelos de avaliação
critivos e, portanto, procedem do curriculum oficial. vinculados ao processo de ensino-aprendizagem que se utilizam
A um nível mais específico, mas ainda prescritivo, encontramos os para avaliar o grau de consecução dos indicadores por parte do
padrões de aprendizagem avaliáveis, que são especificações dos cri- aluno.
térios de avaliação que permitem definir os resultados da aprendi- Existe uma grande variedade de atividades com as quais podemos
zagem. Concretizam o que o aluno deve saber, compreender e saber avaliar para lá das tradicionais provas escritas. Isto não significa
fazer em cada área. Devem ser observáveis, mensuráveis e devem que, na avaliação das competências, se descarte este tipo de provas,
permitir graduar o rendimento ou sucesso alcançados. mas convém incluir outras atividades e instrumentos de avaliação.
Os resultados de aprendizagem são uma declaração do que se Vejamos alguns exemplos:
espera que o estudante seja capaz de realizar com êxito em cada
área ou matéria. Um resultado de aprendizagem é uma mudança Perguntas orais a toda a turma. Apesar de ser mais eficaz que
relativamente específica e duradoura que um aluno ou uma aluna cada aluno se responsabilize pelas suas próprias respostas por
conseguem em relação a determinadas aprendizagens. Entende-se escrito, realizar perguntas orais estimula a curiosidade e a aten-
então que os resultados de aprendizagem são concretizações mais ção, levando à ativação de conhecimentos prévios e ao desenvol-
específicas que os padrões. vimento da capacidade crítica.

No entanto, os resultados de aprendizagem não só devem especifi- Para que este tipo de atividade seja um bom método de avalia-
car os critérios e os padrões correspondentes, mas também devem ção, devem cumprir-se algumas condições:
estar contextualizados no centro, em função da realidade sociocul- – É preciso realizar boas perguntas, que incidam no que real-
tural deste. Assim, se um centro decide trabalhar com os seus alu- mente queremos avaliar. É necessário, portanto, tê-las defini-
nos uma série de conteúdos específicos, deverá incluí-los como das de antemão, e não nos limitarmos a perguntas que possam
172 resultados de aprendizagem, de forma a que possam ser medidos. ser respondidas de memória pelos alunos. 173

Este trabalho de derivação dos critérios e padrões a resultados de – É preciso realizar as perguntas tendo em conta para que é que
aprendizagem, vai permitir a sua posterior concretização em indica- se fazem, já que devem estimular a reflexão e favorecer uma
dores de avaliação ou de sucesso com os seus consequentes níveis aprendizagem de qualidade. Esta consciência da finalidade das
de aquisição (terceiro nível de concretização). perguntas ajudar-nos-á a selecioná-las corretamente.

A redação dos indicadores de avaliação ajudará a evidenciar o tra- – Devemos explicar aos alunos e às alunas a finalidade destas
balho diário do aluno, a partir da recolha de amostras e de evidên- perguntas, para que sejam significativas e funcionais.
cias de aprendizagem. A soma das diferentes evidências Outro sistema pode consistir em formular perguntas oralmente,
permitir-nos-á analisar a progressiva aquisição das competências para que cada aluno responda de forma individual, quer seja por
por parte do aluno. No entanto, para uma melhor aproximação à escrito ou mediante o uso de um instrumento como, por exemplo,
aquisição das competências será necessário que, para cada um dos um dado. Assim, o docente pode formular uma pergunta e pro-
indicadores, consensualmente, se estabeleçam diferentes níveis de porcionar duas ou três possibilidades de resposta. Cada aluno
sucesso pela própria equipa docente. Podemos encontrar um bom dará a sua resposta, de forma individual, mostrando no dado o
exemplo disso nas próprias rubricas, onde claramente se podem número da resposta escolhida.
identificar os indicadores e os diferentes níveis de aquisição.
Atividades escritas. Nos projetos de trabalho podem aplicar-se – Relação de objetivos que se querem conseguir com o projeto,
diferentes atividades de avaliação por escrito. Uma delas res- tanto os propostos pelo corpo docente como os sugeridos con-
ponde à avaliação de conhecimentos prévios, onde os alunos indi- sensualmente pelos próprios alunos.
vidualmente deverão responder de forma escrita a uma série de – Uma coleção de material selecionado e ilustrativo das aprendi-
perguntas. zagens realizadas no projeto (atividades das diferentes tarefas
Outro tipo de perguntas que podemos encontrar são as chama- de investigação, mapas conceptuais, fotografias das atividades
das perguntas abertas de resposta breve. Em determinadas oca- e do produto final, etc.).
siões, trata-se de uma só pergunta, de resposta muito breve, em – Reflexões pessoais relativamente às aprendizagens realizadas,
que se pede aos alunos que resumam a ideia principal da tarefa, sobre o trabalho individual e sobre o trabalho em equipa.
que deem a sua opinião sobre o conceito trabalhado, etc.
Diário de aprendizagem. Da mesma forma que o portefólio, o diá-
Portefólio. Os portefólios são uma coleção de materiais e traba- rio de aprendizagem pode ser utilizado como atividade de auto-
lhos selecionados com a intenção de mostrar o rendimento ou a -reflexão por parte do aluno e como instrumento de recolha de
aprendizagem realizada, refletir sobre este e avaliá-lo. O porte- informação por parte do corpo docente.
fólio pode conter também as avaliações qualitativas do docente.
O seu conteúdo, portanto, pode ser qualquer produção realizada,
individualmente ou por equipas de trabalho, acompanhada de O diário reflexivo é, segundo Bordas e Cabrera (2001):
pequenas reflexões pessoais do tipo diário de classe. «Uma estratégia avaliativa para desenvolver capacidades
metacognitivas. Consiste em refletir e escrever sobre o pró-
O portefólio é, pois, um instrumento de avaliação muito completo
prio processo de aprendizagem. As representações que o
e do qual se pode obter muita informação, da mesma forma que
aluno faz da sua aprendizagem, podem centrar-se num ou
os diários de aprendizagem ou as rubricas.
em vários dos seguintes aspetos:
O uso de um portefólio ou pasta de trabalhos especiais, quando a) O desenvolvimento conceptual alcançado.
174 se trabalha por projetos, permite recolher uma grande variedade 175
b) Os processos mentais levados a cabo.
de atividades que realiza o aluno nas tarefas de investigação,
assim como as reflexões deste, e será possível observar a sua c) Os sentimentos e atitudes que se experimentaram».
aprendizagem e o seu avanço no desenvolvimento do projeto.
É importante que o docente guie os alunos no uso reflexivo do Através do diário, o aluno expressa o que julga que aprendeu,
portefólio. Por isso, é conveniente que os objetivos sejam explíci- assim como as dificuldades que encontrou ao longo das diferen-
tos e que se vá realizando um seguimento dos trabalhos que se tes tarefas de investigação do projeto.
vão arquivando. Também se podem incluir, para fomentar esse
Por outro lado, na sua vertente de instrumento de avaliação, a
pensamento reflexivo, mapas conceptuais que organizem as rela-
análise do diário de cada aluno e aluna permitirá ao docente
ções entre os principais conceitos trabalhados, assim como
identificar se os alunos tomaram consciência dos objetivos e se
autoavaliações e coavaliações que evidenciem as aprendizagens
identificaram os obstáculos e dificuldades que tiveram. Neste
realizadas.
sentido, de um ponto de vista de avaliação formadora, a recolha
A estrutura básica do portefólio, ou pasta de trabalhos especiais, de evidências de aprendizagem de um diário vai permitir regular
poderia ser a seguinte: as perceções em relação aos obstáculos identificados pelo pró-
– Índice do portefólio. prio aluno mais do que proporcionar uma avaliação da atividade
em si mesma.
2.3. SELEÇÃO DOS INSTRUMENTOS DE AVALIAÇÃO Escala de avaliação
Os instrumentos de avaliação são ferramentas que nos serão úteis 1 2 3 4
para recolher os dados que as atividades de avaliação do aluno pro-
Categorias Indicadores
porcionam. É possível que a atividade e o instrumento de avaliação
sejam o mesmo elemento, como acontece com as rubricas, os por-
tefólios, os diários reflexivos, os questionários, as provas, etc. Este (baixo) (bom) (muito bom) (exemplar)
facto, facilitará a recolha e o tratamento da informação e os dados Descritor Descritor Descritor Descritor
Aa (%)
a avaliar. Aa1 Aa2 Aa3 Aa4

Dado que já se analisaram os portefólios e os diários anteriormente, Descritor Descritor Descritor Descritor
A (%) Ab (%)
Ab1 Ab2 Ab3 Ab4
a seguir centrar-nos-emos nas rubricas, que são um dos instrumen-
Descritor Descritor Descritor Descritor
tos de avaliação mais utilizados nos últimos tempos. Ac (%)
Ac1 Ac2 Ac3 Ac4
As rubricas são matrizes que explicitam, na sua primeira coluna, os Descritor Descritor Descritor Descritor
Ba (%)
indicadores de avaliação de uma competência. No resto de colunas Ba1 Ba2 Ba3 Ba4
da matriz concretizam-se os diferentes níveis de aquisição dos refe- Descritor Descritor Descritor Descritor
B (%) Bb (%)
ridos indicadores. Bb1 Bb2 Bb3 Bb4
Descritor Descritor Descritor Descritor
Bc (%)
Bc1 Bc2 Bc3 Bc4
O uso de rubricas, não só permite a recolha de evidências de
aprendizagem de uma competência ou dos seus vários elemen- FIGURA 5.  ESTRUTURA DE UMA RUBRICA
tos, mas também favorece a escolha consensual dos critérios
entre os membros da equipa docente, assim como a comunica- Os elementos que compõem uma rubrica são:
ção destes critérios ao aluno (Alsina, 2013). I ndicadores ou critérios de realização. São os itens que nos ajuda-
176 rão a concretizar os objetos a avaliar. A primeira coluna facilita a 177
categorização de indicadores que têm em comum alguma carac-
Em relação ao corpo docente, o design conjunto e consensual de terística. Segundo a concretização que queiramos desenvolver, a
rubricas entre os vários membros da equipa docente, permite uma referida coluna de categorias será ou não necessária.
avaliação mais objetiva. Ao passo que, em relação ao aluno, o facto
de conhecer de antemão os critérios mediante os quais será ava- Escala de avaliação. Determina os diferentes níveis de aquisição

liado, vai permitir-lhe corresponsabilizar-se pelo seu próprio pro- de cada um dos indicadores. Podem indicar uma avaliação quan-
cesso de aprendizagem. titativa ou qualitativa.

O uso da rubrica, além disso, facilita proporcionar um feedback Descritores. É a informação que concretiza como desenvolver

quase imediato aos alunos e às alunas, já que permite encurtar cada um dos indicadores segundo o nível de concretização que
substancialmente o tempo de retorno da informação, ao oferecer queiramos. Os descritores devem ser muito claros e estar redigi-
uns resultados quantitativos e/ou qualitativos baseados em padrões dos com frases curtas e unívocas.
do conhecimento prévio do corpo docente e dos alunos. As rubricas podem ser utilizadas em qualquer nível educativo, adap-
tando o conteúdo ao nível de desenvolvimento dos alunos. Pode
trabalhar-se com rubricas muito desenvolvidas ao nível de conteúdo,
ou com rubricas simples, construídas com imagens, no caso dos alu-
nos e das alunas mais novos.
A rubrica é, portanto, um instrumento muito completo quando se Esta comunicação dos resultados aos alunos, na perspetiva de ava-
utiliza em consonância e de acordo com a construção cooperativa liação formativa, faz parte do processo educativo. Nela, a análise
do grupo-turma. Pode utilizar-se tanto a nível externo (heteroava- das fortalezas e debilidades dos alunos em torno dos objetivos de
liação) como a nível pessoal de autoavaliação ou a nível grupal para aprendizagem estabelecidos, jogam um papel fundamental, sobre-
fomentar a coavaliação. tudo para expor estratégias de melhoria.

2.4.  RETROALIMENTAÇÃO DA AVALIAÇÃO DO ALUNO 2.5. AVALIAÇÃO DOS ALUNOS


A informação recolhida na avaliação deve ser usada extensiva e Entendemos que avaliar consiste em atribuir uma avaliação, quan-
intensivamente, especialmente para retroalimentar os processos titativa ou qualitativa, a um projeto/exercício/tarefa/prova, em
formativos dos alunos. Uma retroalimentação adequada está na relação a um referente que nos serve de comparação. Neste sentido,
base da chamada aprendizagem autónoma; só a partir da reflexão é importante afixar, desde o início, o tipo de pontuações que utiliza-
é possível capacitar o aluno para que tome consciência da sua situa- remos e como é que as atribuiremos, para que o modo de avaliar
ção no processo de aprendizagem e possa melhorar. fique claro desde o início.
O processo de avaliação não se completa enquanto não se levar a A forma mais comum de avaliar é associar uma pontuação numé-
cabo esta retroalimentação. Neste sentido, devemos assegurar-nos rica (normalmente de 1 a 10) a cada secção/pergunta, e, mais tarde,
de que a informação que proporcionamos seja compreendida e somar e dividir o total pelo número de perguntas ou itens. Não obs-
assumida pelos alunos e as alunas, de maneira que possa servir para tante, também é possível pontuar de forma qualitativa, sem atribuir
efetuar a mudança desejada. pontuação numérica, mas sim um nível no desenvolvimento da
tarefa. Este tipo de avalição (não desenvolvido-desenvolvido-exce-
lente, por exemplo) é mais pertinente para a avaliação de compe-
tências e pode ir de insuficiente a excelente, de principiante a
CONSELHOS PARA PROPORCIONAR especialista, etc.
178 179
UM BOM FEEDBACK Se temos claro não só para que é que avaliamos, mas também o
impacto que esta avaliação terá, podemos selecionar melhor o tipo
Não se centrar só nos aspetos negativos, mas reforçar o que
de avaliação que devemos utilizar.
se faz bem.
Procurar um momento oportuno para proporcionar o
feedback a cada um dos alunos e das alunas ou à equipa de
trabalho.
Permitir uma resposta ao feedback que ajude o aluno a
entender bem o que lhe estamos a transmitir.
Dar um feedback completo e o mais específico possível.
Finalizar com um compromisso mútuo. Isto ajuda a que os
alunos entendam melhor que se trata de um trabalho con-
junto, mas que precisam de comprometer-se para mudar o
que for necessário.
Conclusões Referências bibliográficas
Allal, L. (1979). Estrategias de evaluación formativa:
«A avaliação é a peça-chave da regulação do processo de concepciones psicopedagógicas y modalidades de aplicación.
ensino-aprendizagem» (Castillo, 2002). Infancia y aprendizaje, (11), págs. 4-22.
Allal, L. (1988). Vers un élargissement de la pédagogie de
Em modo de conclusão, devemos ter em conta que a avaliação deve maîtrise: processus de régulation interactive, rétroactive
estar associada ao próprio design do projeto de trabalho e às dife- et proactive . Em M. Huberman (ed.), Assurer la réussite des
rentes tarefas de investigação. Isto significa que não podemos dei- apprentissages scolaires? Les propositions de la pédagogie
xar a avaliação para o final, mas esta deve ser contemplada ao de maîtrise (págs. 86-126). Neuchatel-Paris: Delachaux et
longo de todo o projeto. Niestlé.
Alsina, J. (2013). Rúbricas para la evaluación de competencias.
Para levar a cabo uma avaliação completa, vamos reparar nos
Barcelona: Octaedro.
momentos da avaliação, nos agentes desta e no tipo de instrumen-
tos que vamos utilizar, segundo as intenções de aprendizagem que Bordas, I., Cabrera, F. (2001). Estrategias de evaluación de los
também trabalhemos. aprendizajes centrados en el proceso. Revista Española de
Pedagogía, (218), págs. 25-48.
É por esta razão que podemos organizar a avaliação à volta de uma
série de passos que nos ajudarão a responder às seguintes pergun- Casanova, M. A. (2007). Manual de evaluación educativa.
tas: Madrid: La Muralla.
Castillo, S. (2002). Compromisos de la evaluación educativa.
O que é que queremos avaliar?
Madrid: Pearson Educación.
Como é que o avaliaremos?
Cortés, J. (2009). Cómo redactar resultados de aprendizaje
180 Como é que o recolheremos? y criterios de evaluación. 181
Como é que passaremos a informação recolhida e os seus resul- Hussey, T., Smith, P. (2008). Learning outcomes: A conceptual
tados? analysis. Teaching in higher education, 12 (1), págs. 107-115.
Como é que o pontuaremos? Jorba, J., Casellas, E., Prat, À., Quinquer, D. (1996). Avaluar
per millorar la comunicació i facilitar l’aprenentatge.
Como se pode observar, a resposta a estas perguntas ajudar-nos-á Barcelona: ICE‑UAB.
a completar o processo formativo do ponto de vista da avaliação.
Kennedy, D. (2007). Writing and using learning outcomes.
A informação recolhida mediante a avaliação ajudará tanto o corpo
Mateo, J. (2000). La evaluación educativa, su práctica y otras
docente como os alunos a avaliar todo o processo de ensino-apren-
metáforas. Barcelona: ICE-UB. Horsori.
dizagem a partir de diferentes pontos de vista (agentes, momentos,
etc.). Isto vai proporcionar-nos uma visão mais completa e autên- Mateo, J., Martínez, F. (2008). La evaluación alternativa
tica do processo. de los aprendizajes. Barcelona: Octaedro.
Morales Vallejo, P. (2009). Ser profesor: una mirada al alumno.
Guatemala: Universidade Rafael Landívar. Recuperado a partir
de http://www.upcomillas.es/personal/peter/otrosdocumentos/
Evaluacionformativa.pdf
Pellicer, C., Ortega Delgado, M. (2009). La evaluación de
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Reynolds, L. (2013). Giving students feedback: 20 tips to do it
right. Recuperado a 6 de março de 2017, a partir
de http://www.opencolleges.edu.au/informed/features/giving-
student-feedback/#ixzz2lwrzfThN
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Barcelona: Graó.
Zabala, A. (1995). La práctica educativa. Cómo enseñar.
Barcelona: Graó.

182
Manual de formação docente

TEXTO
Patricia Compañó (Avaliação formativa)

M.ª José Díaz Aguado (Aprendizagem cooperativa)

Anna Jubete (Introdução à neuroeducação)

Mar Martín Murga (Trabalho por projetos)

Mario Serrano (Introdução à neuroeducação)

TRADUÇÃO
INCYTA Linguistic Services

EDIÇÃO
Alfredo Solteiro

PAGINAÇÃO
Cláudia Gaminha

©2018
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2734-502 Barcarena, Portugal

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Internet: www.santillana.pt

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ISBN: 978-989-708-849-0

Depósito Legal: 439823/2018

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