IED - FDL Resolução Casos Praticos Validade e Vigência Lei

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Faculdade de Direito de Lisboa

SLL - INTRODUÇÃO AO ESTUDO DO DIREITO II/ NOITE 2ª ÉPOCA/ 2011

SUB-TURMA 5

Casos práticos resolvidos sobre Validade e


Vigência da lei

Caso Prático n.º 1

Imagine que é aprovada a lei 21399/2010 que tem por objecto a


aprovação do Estatuto dos Emigrantes. Esta lei foi publicada no
Diário da República de 13 de Setembro de 2010 e disponibilizada
online no mesmo dia no sítio da Internet gerido pela INCM.
Considere as seguintes hipóteses:
a. No seu art. 2.º dispõe-se: “ Esta lei entra imediatamente em
vigor”.
b. A lei 21399/2010 nada determina acerca da sua entrada em
vigor.
c. No seu art. 2.º dispõe-se: “ A presente lei entra em vigor no
prazo de 60 dias a contar da sua publicação”.
d. No seu art. 2.º dispõe-se: “ A presente lei entra em vigor 2
meses após a sua publicação”.

Quid juris?

Resolução:

a. O art. 2 nº1 da lei 74/98 de 11 de Novembro dispõe que “ em


caso algum, o inicio da vigência da lei se verificará no próprio
dia da publicação”, todavia parte da doutrina, nomeadamente
Oliveira Ascensão entende que sendo a lei 74/98 uma lei
ordinária pode ser derrogada por uma outra lei de nível
equivalente, o que pode ocorrer em dois tipos de
circunstâncias: situações de inadiável urgência (medidas em
casos de calamidade pública); evitar a frustração dos
objectivos da própria lei (se a lei determina a suspensão da
compra de divisa estrangeira, o período de vacatio permitiria a
procura intensa de divisas, possivelmente com fins
especulativos). Nesta situação, não tendo dados mais concretos
acerca do conteúdo da lei 21399/2010 que contém o Estatuto
dos Emigrantes, parece que se deve aplicar o art. 2 nº1 da lei
74/98, e como tal não poderia entrar imediatamente em vigor.
b. Não determinando nada acerca da sua entrada em vigor, de
acordo com o art. 5 nº2 do CC, aplica-se o prazo supletivo de 5
dias que está previsto no art. 2 nº2 da Lei 74/98. Como tal esta
lei entra em vigor no dia 18 de Setembro de 2010.
c. Neste caso nos termos do art. 5 nº2 do CC, fixando a própria
lei um prazo de vacatio legis, e contando os 60 dias sem que o
dia da publicação seja considerado (art. 279 alínea b) do CC), a
lei 21399/2010 entrará em vigor no dia 12 de Novembro de
2010.
d. Este prazo, ao contrário do anterior é fixado em meses, como
tal a sua contagem deve ser feita nos termos do art. 279 alínea
c) CC, deste modo terminando o prazo de 2 meses às 24 horas
do dia 13 de Novembro (13 dia a que corresponda porque a lei
foi publicada a 13 de Setembro), a lei entra em vigor às 00
horas do dia 14 de Novembro. Também se deve referir o art. 5
nº2 a respeito do prazo fixado pela própria lei.

Caso Prático n.º 2


O Presidente da República promulgou um Decreto-lei que foi
referendado pelo Primeiro-ministro e enviado à INCM para
publicação. Passaram largos meses, mas este Decreto-lei nunca saiu
no jornal Oficial nem nunca foi disponibilizada online no sítio da
Internet gerido pela INCM, por incompetência dos serviços da
INCM.
Qual o seu valor jurídico?

Resolução:

Não tendo sido o Decreto-lei publicado, a lei não o considera


inválido, mas ineficaz, impedindo que produza os efeitos que se
destinava a produzir. As consequências da falta de publicidade
resultam do art. 119 nº2 da CRP onde se prevê a sua ineficácia ou
seja a não produção de efeitos jurídicos. Também o art. 5 nº1 do CC
dispõe que a lei só se torna obrigatória depois de publicada no jornal
oficial.

Caso Prático n.º 3

O Decreto-lei 20787 foi publicado no dia 26 de Dezembro de 2010


para entrar em vigor no dia 26 de Janeiro de 2011. O Decreto-lei
18685 foi publicado a 10 de Janeiro de 2011, para entrar em vigor no
dia 20 de Janeiro de 2011.

Qual deles está hoje em vigor?

Resolução:

Temos uma situação em que pode suscitar a questão do momento da


posteridade na revogação, isto é saber qual é a lei que efectivamente
revogou a outra lei. Isto porque pode haver situações dúbias em que
não se sabe qual a lei que surgiu depois e veio traduzir a ultima
vontade do legislador (exemplos: duas leis publicadas na mesma
data/ duas leis em que uma é publicada depois da outra mas a sua
entrada em vigor é no mesmo dia/ ou duas leis publicadas em datas
diferentes, mas em que a segunda lei entra em vigor antes da
primeira). A questão tem de ser resolvida por um critério de
posteridade da lei, que em termos académicos poderá ser: o
momento da aprovação da lei, publicidade (ou mesmo a ordem de
publicação e numeração no Diário da República – DR), entrada em
vigor. Grande parte de doutrina, nomeadamente Oliveira Ascensão e
Galvão Telles, têm acolhido o critério da publicidade, outros
autores dependendo da situação que esteja em causa, falam numa
impossibilidade de determinar a ultima vontade do legislador e pela
via da interpretação abrogante, descobrem uma lacuna de colisão.

Neste caso em particular, temos uma lei publicada posteriormente (o


Decreto-lei 18685), que entra em vigor antes da lei publicada
inicialmente (Decreto-lei 20787). Deste modo, para Oliveira
Ascensão e atendendo ao critério da publicidade, não restariam
duvidas de que o Decreto-lei 18685 revoga o Decreto-lei 20787, e
como tal e seria este que estaria em vigor. Teixeira de Sousa, embora
chegue à mesma conclusão, entende que temos um impedimento de
vigência do Decreto-lei 20787.

Caso Prático n.º 4

O Decreto-lei 51/81 regula a concessão de crédito para habitação por


bancos e entidades afins. O Decreto-lei 511/81 regula sobre higiene e
segurança em mercearias e supermercados. No dia 1 de Fevereiro de
2000 foi publicado o Decreto-lei 99/2000, que regula sobre higiene e
segurança em estabelecimento de venda ao público de quaisquer
bens, fazendo-o em moldes bastante diferentes do Decreto-lei
511/81. A última disposição do Decreto-lei 99/2000 dispõe o
seguinte: “fica revogado o Decreto-lei 51/81”. No dia 1 de Março,
saiu no Diário da República uma declaração de rectificação,
determinando que, onde no Decreto-lei 99/2000 se lê “o Decreto-lei
51/81” deve ler-se “o Decreto-lei 511/81”.

Os diplomas de 1981 estão revogados? Desde quando?

Resolução:

O Decreto-lei 99/2000 revoga o Decreto-lei 51/81. Temos uma


revogação expressa nos termos do art. 7 nº2 do CC, pois esta está
prevista na sua última disposição: “fica revogado o Decreto-lei
51/81”, também é uma revogação substitutiva, visto haver uma nova
regulação da matéria e uma revogação total visto subentendermos
que o Decreto-lei 51/81 fica completamente suprimido.1

Em 1 de Março surge uma declaração de rectificação, determinando


que, onde no Decreto-lei 99/2000 se lê “o Decreto-lei 51/81” deve ler-
se “o Decreto-lei 511/81”. A lei 74/98 permite no seu art. 5 a
rectificação de leis publicadas porque a publicação deve reflectir
integralmente o texto original. Todavia fixa-lhe alguns requisitos:

a. Âmbito da rectificação: art. 5 n.º1, que aqui está preenchido


(erro material queria dizer 511 e disse 51)
b. Prazo de 60 dias: 5 n.º2, que aqui também está preenchido (1
de Fevereiro publicação do Decreto-lei 99/2000/ 1 de Março a
publicação da declaração de rectificação)
c. Órgão com competência para a rectificação, o que aqui
também está preenchido: art. 5 nº1 (subentende-se que é o
mesmo)

Assim, deve entender-se que é o Decreto-lei 511/81 que se


encontra revogado, reportando-se de acordo com o art. 5 n.º4 os
efeitos da rectificação à data da entrada em vigor do texto

1
Pode-se questionar a possibilidade de uma revogação global tácita, se
entendermos que existe uma intenção de a nova lei regular toda a matéria relativa
ao regime sobre higiene e segurança em estabelecimento de venda ao público
rectificado (Decreto-lei 99/2000). O que significa que o Decreto-lei
511/81 se considera revogado desde 6 de Fevereiro (o Decreto-lei
99/2000 foi publicado a 1 de Fevereiro e como tal de acordo com o
art. 5 nº2 do CC e art. 2 nº2 da lei 74/98 entrou em vigor no dia 6 de
Fevereiro).

Caso Prático n.º 5

Considerando que:

a. De acordo com o código da estrada “É proibida a circulação de


veículos ligeiros a uma velocidade superior a 120 km/h em
auto-estradas”.
b. Ninguém cumpre com tal disposição.

Pode-se dizer que o Decreto-lei que rege o Código da Estrada


está parcialmente revogado?

Resolução:

Não podemos dizer que exista uma revogação parcial ou derrogação


do código da estrada pois a revogação implica que haja uma nova lei
que faça cessar a vigência de uma lei anterior. Neste caso temos
um mero desuso, ou seja uma pratica social sem convicção de
obrigatoriedade, porque embora as pessoas não cumpram com tal
disposição e as autoridades tolerem o comportamento, a verdade é
que dos dados da hipótese parece resultar a convicção de que não é
lícito proceder assim. (caso a hipótese referisse que as pessoas
tinham uma convicção de que efectivamente era licito andar a uma
velocidade superior a a 120 km/h em auto-estradas, aí teríamos um
costume contra-legem e de acordo com a posição de Oliveira
Ascensão a lei cessaria a sua vigência).
Caso Prático n.º 6

Considere que:

a. A 12 de Fevereiro de 2010, entrou em vigor a lei 20693/10, a


qual aprovou o Código de boa conduta administrativa.
b. Em 6 de Maio de 2010 entrou em vigor a lei 20874/10 que
revogou a lei 20693/10, a qual por seu turno, tinha revogado a
lei 19502/08, a qual continha todo o regime relativo à boa
conduta administrativa.

Qual o regime que regula a boa conduta administrativa?

Resolução:

Temos três leis:

1. Lei nº 19502/08: continha todo o regime relativo à boa conduta


administrativa
2. Lei nº 20693/10: entrou em vigor 12 Fevereiro de 2010 e
aprovou o Código de boa conduta administrativa
3. Lei nº 20874/10: entrou em vigor a 6 de Maio de 2010 e limitou
se a revogar a Lei nº 20693/10

Temos duas revogações:

1. A Lei nº 20693/10 revogou a Lei nº 19502/08. Temos uma


revogação tácita que pois não existe uma declaração expressa
do legislador em revogar, mas tal facto decorre da
incompatibilidade de disposições das duas leis (art. 7 nº2 do
CC). Temos uma revogação substitutiva, visto que a Lei nº
20693/10 apresentou uma nova regulação da matéria: a
aprovou o Código de boa conduta administrativa. E temos uma
revogação global tácita (art.7 nº2 do CC parte final), visto que
resulta uma intenção do legislador de regular novamente todo
um instituto jurídico: a boa conduta administrativa.
2. A Lei nº 20874/10 revogou a Lei nº 20693/10.
Subentendemos uma revogação expressa (art. 7 nº2 do CC)
pois a hipótese apenas refere que “a lei 20874/10 revogou a lei
20693/10”, o que nos leva a considerar que a sua finalidade foi
somente essa e que por isso o disse expressamente, não
visando legislar novamente sobre a matéria. E por estes
motivos também é uma revogação simples. Podemos entender
também que é uma revogação total, visto suprimir
completamente a Lei nº 20693/10. 2

Porque a ultima lei revogatória, a Lei nº 20874/10, tem uma eficácia


meramente revogatória, e não também dispositiva, para
determinarmos um regime para esta matéria coloca-se a questão de
saber se pode haver repristinação da primeira lei a ser revogada, ou
seja da Lei nº 19502/08. O art. 7 nº4 do CC, vem dar a resposta à
questão, ao considerar que “ a revogação da lei revogatória não
importa o renascimento da lei que esta revogara” ou seja não é
permitida a repristinação.

Todavia entende a doutrina que nada impede que o legislador aprove


uma lei repristinatória, ou que essa repristinação resulte da própria
interpretação da lei. Ou seja pode haver uma declaração expressa do
legislador no sentido de repristinar a primeira lei revogada, ou esta
mesma vontade resultar dos próprios elementos da interpretação,
havendo assim uma declaração tácita do legislador no sentido da
repristinação (note-se que a este respeito a lei brasileira refere que
“não é permitida a repristinação, salvo se outra for a intenção
inequívoca do legislador”, o que existe quando há uma declaração
expressa ou tácita nesse sentido nos termos agora referidos. Esta
solução é defendida também na lei portuguesa por parte da doutrina,
tendo sido também já acolhida em alguns acórdãos dos tribunais).

2
Modalidades de revogação: expressa e tácita; simples e substitutiva; global e
individualizada (esta não é muito relevante); total (abrogação) e parcial
(derrogação).
No caso em análise não temos dados suficientes que nos permitam
afirmar que existe uma intenção de a Lei nº 20874/10 repristinar a
Lei nº 19502/08, por isso não temos actualmente um regime
relativamente à boa conduta administrativa. Existe uma lacuna que
deve ser preenchida com recurso aos meios normais permitidos de
integração (art. 10 do CC).

Caso Prático n.º 7

A Lei nº 18167/89 regula o estatuto das gaivotas em estado selvagem


das Ilhas Berlengas, visando controlar a população dessas aves
nessas ilhas. Atendendo a que devido a alterações no ecossistema, as
gaivotas abandonaram em massa as Ilhas Berlengas, será que a Lei
nº 18167/89 ainda se encontra em vigor?

Caso as gaivotas voltem a habitar as Ilhas Berlengas, qual será o


regime aplicável ao controlo populacional das gaivotas?

Resolução:

Está em causa uma outra modalidade de cessação da vigência da lei,


a caducidade. A caducidade verifica-se quando a cessação de
vigência de uma lei ocorre por ocorrência de um facto jurídico futuro
e está prevista no art. 7 nº1, 1ª parte do CC “ quando não se destine
a ter vigência temporária”. Este artigo refere-se apenas às leis
temporárias, ou seja as leis cuja cessação decorre de um facto
previsto na própria lei. Tais factos podem ser meramente
cronológicos (exemplo “ lei cessa a sua vigência no dia 31 de
Dezembro”) ou de outra ordem (exemplo: “a lei cessa a sua vigência
uma vez resolvida a situação de crise”). Todavia entende a doutrina
que a caducidade também se verifica quando se extingam os
pressupostos de aplicação da lei (exemplo: morte do ultimo
sobrevivente de guerra aos quais a lei atribuía um subsidio)

No caso em análise temos uma suposta situação em que


desaparecem os pressupostos de aplicação da Lei nº 18167/89 que
regula o estatuto das gaivotas em estado selvagem das Ilhas
Berlengas. Todavia para podermos afirmar que existe caducidade,
temos de perceber se existe um desaparecimento dos pressupostos
de aplicação de modo irreversível. Da análise da hipótese, resulta
que tal facto não acontece, até porque mais tarde as gaivotas
voltaram a habitar as Ilhas das Berlengas. Assim não existe uma
cessação da vigência da lei, e como tal regime aplicável ao controlo
populacional das gaivotas será o previsto na Lei nº 18167/89.

Caso Prático n.º 8

Em 18 de Abril de 2010 é aprovada a lei nº 21083 disponibilizada


online a 20 de Maio no sítio da Internet gerido pela INCM. Em 16 de
Maio de 2010 é aprovada a lei nº 21065, disponibilizada online
também a 20 de Maio no sítio da Internet gerido pela INCM. A lei n.º
21065 é absolutamente incompatível com a lei n.º 21083.
a. Qual dos diplomas se encontra actualmente me vigor?
b. E se a lei nº21083 tivesse sido disponibilizada online no sítio da
Internet gerido pela INCM no dia 18 de Maio de 2010?

Resolução:

Temos duas leis:

1. Lei nº 21083 aprovada a 18 de Abril de 2010 e disponibilizada


online a 20 de Maio no sítio da Internet gerido pela INCM.
2. Lei n.º 21065 aprovada a 16 de Maio de 2010 e disponibilizada
online a 20 de Maio no sítio da Internet gerido pela INCM.

Alínea A):
Temos duas leis aprovadas em datas diferentes, mas disponibilizadas
online na mesma data. Tais leis são incompatíveis, por isso coloca-se
a questão de saber como se afere o momento da posteridade (qual é
o critério que nos permite saber que uma lei é posterior à outra?),
para determinar qual é a lei revogatória.

Resulta do art. 1 nº2 da lei 74/98 que se entende como data da


publicação, a data do dia em que a mesma é disponibilizada online
no sítio da Internet gerido pela INCM, por isso as duas leis foram
publicadas na mesma data. Esta situação, em que duas leis são
publicadas na mesma data, é a que maior problema tem gerado na
doutrina, nomeadamente para quem entende que o critério decisivo
para se aferir o momento da posteridade é o da publicação da lei
(Oliveira Ascensão e Galvão Telles). Assim a resolução da questão
para os autores com esta posição passa por uma interpretação
abrogante e reconhecimento de uma lacuna de colisão. No mesmo
sentido Menezes Cordeiro, embora entenda que o critério decisivo
não seja o da publicação.

Não pode deixar de se referir também que, quando temos diplomas


publicados na mesma data, existem vozes no sentido de considerar
que o critério determinante para aferir a posteridade tem de ser o da
aprovação da lei.

Assim acolhendo o critério da publicidade temos uma lacuna de


colisão e como tal nenhum dos diplomas se encontra em vigor.

Defendendo o critério da aprovação, é a lei aprovada a 16 de Maio de


2010, ou seja a Lei n.º 21065 que se encontra em vigor.

Alínea B):

No caso de a lei nº21083 ter sido disponibilizada online no sítio da


Internet gerido pela INCM no dia 18 de Maio de 2010, entende-se de
acordo com o já referido art. 1 nº2 da lei 74/98 que é publicada a 18
de Maio. Ora se a lei nº 21083 é publicada a 18 de Maio e se a 20 de
Maio é publicada a lei nº 21065, (e subentendendo que se aplica o
prazo supletivo de vacatio legis do art. 2 nº2 da lei /4/98 a cada uma
das leis entrando em vigor também em datas diferentes pela ordem
cronológica da publicação) temos uma situação em que não se
suscita qualquer dúvida acerca do momento da posteridade e como
tal a lei 21065 que foi publicada e entrou em vigor depois da lei nº
21083, revogou esta última lei.

Assim sendo é a lei 21065 que está em vigor.

Quanto às modalidades de revogação, temos uma revogação tácita


nos termos do art. 7 nº2 do CC, substitutiva e subentendemos que
seja total.

Caso Prático n.º 9

Em 13 de Novembro de 2010 é publicada a lei nº21446, a qual


aprova o regime dos terrenos agrícolas destinados à cultura de
oliveiras, tendo sido disponibilizada online no sítio da Internet gerido
pela INCM a 15 de Novembro de 2010.

Em 8 de Dezembro de 2010 é publicada e disponibilizada online no


sítio da Internet gerido pela INCM a lei nº 18337 que aprova o
regime legal dos terrenos agrícolas e prevê a sua entrada em vigor
para 4 de Janeiro de 2011. Esta lei é incompatível com a lei nº21446
de 13 de Novembro.

Emmanuel, jovem olivicultor, interroga-se sobre qual o regime


aplicável hoje ao seu terreno?

Resolução:

Temos duas leis:


1. Lei nº21446: publicada a 13 Novembro 2010; disponibilizada
online no sítio da Internet gerido pela INCM a 15 de Novembro
de 2010; aprova o regime dos terrenos agrícolas
destinados à cultura de oliveiras.
2. Lei nº 18337: publicada a 8 de Dezembro 2010; disponibilizada
online no sítio da Internet gerido pela INCM a 8 de Dezembro
de 2010; aprova o regime legal dos terrenos agrícolas;
prevê a sua entrada em vigor para 4 de Janeiro de 2011.

Quanto à lei nº 21446

Embora o art. 2 nº1 da lei 74/98 preveja que a data da publicação da


lei se considera o da sua disponibilização online sítio da Internet
gerido pela INCM, a verdade é que na prática pode suceder que a
data do Diário da República não corresponda ao da sua efectiva
disponibilização online. Por isso devemos aplicar o art. 2 nº 4 da lei
74/98 e entender que o prazo de vacatio legis se deve contar a partir
da data da sua disponibilização online (segue a doutrina acolhida
pela versão originária da lei 74/98 quando se discutia o problema de
saber se o prazo da vacatio legis se deveria contar a partir da data
da publicação ou da efectiva distribuição do Diário da República,
tendo a lei 74/98 optado pela data da distribuição).

Ora, se é assim nos termos do art. 5 nº2 do CC, art. 2 nº2 e 4 da lei
74/98 aplica-se o prazo supletivo de vacatio legis de 5 dias, e como
tal a lei 21446 entra em vigor no dia 20 de Novembro de 2010.

Quanto à lei nº 18337

É publicada a 8 de Dezembro de acordo com o art. 1 nº2 da lei 74/98


e entra em vigor a 4 de Janeiro de acordo com o art. 5 nº2 do CC.
Temos assim uma situação em que uma lei posterior, a lei 18337 é
incompatível com uma lei anterior, a lei 21446. Teríamos neste caso
uma situação de revogação tácita (art. 7 nº2 do CC) e substitutiva.
Mas a questão que se coloca é a de saber se tal revogação é
permitida?

Traçando a lei nº 18337 o regime legal dos terrenos agrícolas, a lei


21446 afigura-se especial em relação a ela, visto se referir à situação
particular do regime dos terrenos destinados à cultura de
oliveiras. Ora, de acordo com o art. 7 nº3 do CC “ lei geral não
revoga lei especial, salvo se outra for a intenção inequívoca do
legislador”. Resta-nos saber se da hipótese decorre uma intenção
inequívoca de o legislador revogar o regime especial. A doutrina tem
entendido que esta intenção inequívoca pode resultar, por um lado
de uma declaração expressa (o legislador diz expressamente que
com a lei geral também se pretendem afastar os regimes especiais)
ou por outro de uma declaração tácita (da interpretação resulta que
o legislador quis regular exaustivamente um sector não deixando
subsistir fontes especiais). 3
Os dados da hipótese não nos permitem
aferir tal intenção, por isso aplicando o art. 7 nº3 do CC,
consideramos que a lei nº 18337 não revoga a lei nº 21446 e deste
modo o regime aplicável ao terreno de Emmanuel é o previsto na lei
nº 21446.

Caso Prático n.º 10

Suponha a seguinte situação:

3
Neste sentido Oliveira Ascensão
A lei n.º 9/2009 revogou a lei n.º4/2004 que estabelece o regime
legal sobre a boa conduta dos alunos do 1º ano da FDL, a qual havia
por sua vez revogado a lei nº 2/2002.

a. Sabendo que a lei n.º 9/2009, não regulou a matéria em causa,


tendo-se limitado a revogar a lei 4/2004, qual o regime
aplicável à boa conduta dos alunos do 1º ano da FDL?
b. Imagine agora que a lei n.º 4/2004 foi declarada
inconstitucional com força obrigatória geral pelo Tribunal
constitucional?
c. E se a lei n.º 9/2009 estabelecesse no seu artigo 19 que “ o
regime legal sobre a boa conduta dos alunos do 1º ano da FDL
é o previsto na lei nº 2/2002”?

Resolução:

Temos três leis

1. Lei nº2/2002
2. Lei nº4/2004
3. Lei nº9/2009

Alínea A)

A lei 9/2009 não tem eficácia dispositiva, por isso temos uma
revogação simples, expressa e supomos que seja total. Por sua vez a
lei nº4/2004 que revogou a lei 2/2002 tinha eficácia dispositiva e
revogatória por isso temos, neste caso, uma revogação substitutiva,
não se sabe se expressa ou tácita e em principio total.

Ora, não tendo a ultima lei eficácia meramente revogatória, e não


também dispositiva, para determinarmos um regime para esta
matéria coloca-se a questão de saber se pode haver repristinação da
primeira lei a ser revogada, ou seja da Lei nº 2/2002. O art. 7 nº4 do
CC, vem dar a resposta à questão, ao considerar que “ a revogação
da lei revogatória não importa o renascimento da lei que esta
revogara” ou seja não é permitida a repristinação.
Todavia entende a doutrina que nada impede que o legislador aprove
uma lei repristinatória, ou que essa repristinação resulte da própria
interpretação da lei. Ou seja pode haver uma declaração expressa do
legislador no sentido de repristinar a primeira lei revogada, ou esta
mesma vontade resultar dos próprios elementos da interpretação,
havendo assim uma declaração tácita do legislador no sentido da
repristinação (note-se que a este respeito a lei brasileira refere que
“não é permitida a repristinação, salvo se outra for a intenção
inequívoca do legislador”, o que existe quando há uma declaração
expressa ou tácita nesse sentido nos termos agora referidos. Esta
solução é defendida também na lei portuguesa por parte da doutrina,
tendo sido também já acolhida em alguns acórdãos dos tribunais).

No caso em análise não temos dados suficientes que nos permitam


afirmar que existe uma intenção de a Lei nº 9/2009 repristinar a Lei
nº 2/2002, por isso, não temos actualmente um regime relativamente
à boa conduta dos alunos do 1º ano da FDL. Existe uma lacuna que
deve ser preenchida com recurso aos meios normais permitidos de
integração (art. 10 do CC).

Alínea B)

Se a lei 4/2004 foi declarada inconstitucional com força obrigatória


pelo Tribunal Constitucional, prevê o art. 282 nº1 da CRP a
repristinação das normas que a lei declarada inconstitucional
revogou. Assim a lei 2/2002 é repristinada ou seja volta a produzir
efeitos, sendo ela que contém o regime aplicável à boa conduta dos
alunos do 1º ano da FDL.

Alínea C)

Neste caso, existe uma declaração expressa do legislador no sentido


de repristinar a primeira lei revogada. Tal facto é permitido pelo art.
7 nº4, visto estar em causa um critério supletivo previsto em lei
ordinária. E assim sendo também aqui a lei 2/2002 é repristinada
sendo ela que contém o regime aplicável à boa conduta dos alunos
do 1º ano da FDL.

Caso Prático n.º 11

A lei nº 100/2000 que estabelece o regime legal sobre a poluição


sonora, veio substituir a lei n.º80/1980 (regulamento geral do ruído).
O seu artigo 30 dispõe que “ fica revogada a lei n.º80/1980”.

a. Sabendo que na lei n.º 80/1980 se encontra todo o regime legal


relativo à matéria da poluição sonora, classifique o tipo de
revogação em causa
b. Imagine agora que o artigo 30 da lei nº 100/2000 dispunha que
“fica revogado o regulamento geral do ruído”. Qual o tipo de
revogação que está em causa?
c. Sabendo que a lei nº100/2000 nada dispõe sobre o ruído de
vizinhança. Quais as regras que regulam actualmente a
questão?
d. Caso o artigo 30 da lei nº 100/2000 dispusesse que “ Ficam
revogadas todas as disposições em contrário”, como se
classificaria a revogação?

Resolução:

Temos duas leis:

1. Lei nº80/1980
2. Lei nº100/2000

Alínea A)

Temos uma revogação expressa (art. 7 nº2 do CC), substitutiva, total


porque o conteúdo da lei 80/1980 fica completamente revogado e
podemos conceber uma revogação global tacita nos termos da parte
final do art. 7 nº2 do CC, se entendermos que a lei nº100/2000
pretendeu regular toda a matéria relativamente à poluição sonora
(note-se que se diz expressamente na alínea a) que a lei 80/1980
regulava todo o regime legal da poluição sonora).

Alínea B)

Temos uma revogação expressa (art. 7 nº2 do CC), substitutiva, e


global, neste caso uma revogação global expressa porque se diz
expressamente a matéria que é revogada.

Alínea C)

Entendendo que temos uma revogação global da matéria


relativamente à poluição sonora, e não dispondo a lei 100/2000 sobre
o ruído de vizinhança, de acordo com a posição do Professor Oliveira
Ascensão temos de admitir uma lacuna que deve ser integrada. Note-
se que Freitas do Amaral nestes casos parece entender que o que
parecia uma revogação global, afinal não o é, visto que esta nos
termos do art. 7 nº2 parte final deve resultar “ da circunstância de a
nova lei regular toda a matéria da lei anterior”. Se a matéria da lei
anterior não é toda revogada, então ainda se encontra em vigor a
parte relativamente à qual a nova lei nada dispôs.

Alínea D)

Estaria em causa uma revogação tácita que resultaria do art. 7 nº2


do CC “ incompatibilidade entre as novas disposições e as regras
precedentes”, mesmo que o art. 30 da lei 100/2000 nada dissesse a
este respeito.
Caso Prático n.º 12

A Lei n.º 1 que regula alguns aspectos do direito de propriedade


sobre terrenos agrícolas, entrou em vigor há 40 anos. A Lei n.º 2,
que inclui um artigo no sentido de fazer cessar a vigência de Lei n.º
1, regula também a propriedade daqueles terrenos, e foi publicada
no dia 1 de Novembro de 2006, para entrar em vigor um mês após a
sua publicação. A Lei n.º 3, que é logicamente incompatível com a
Lei n.º 2, foi publicada no Diário da República com data de 5 de
Novembro e disponibilizada online a 10 de Novembro de 2006. O
Decreto - regulamentar nº 4 do Governo que tem um artigo no
sentido de fazer cessar a vigência das leis anteriores, foi publicado
no dia 10 de Dezembro de 2006, não dispondo nada acerca da sua
entrada em vigor.

Qual destes diplomas está hoje em vigor?

Resolução:

Temos 4 leis (sentido amplo):

1. Lei nº1: entrou em vigor há 40 anos


2. Lei nº2: publicada a 1 de Novembro de 2006; entrada em vigor
um mês após a sua publicação; contém artigo que revoga a Lei
nº1
3. Lei nº3: publicada a 5 de Novembro de 2006 e disponibilizada
online a 10 de Novembro; é logicamente incompatível com a
Lei nº2
4. Decreto - regulamentar nº4: publicado a 10 de Dezembro de
2006

Lei nº2

É publicada a 1 de Novembro e entra em vigor a 2 de


Dezembro de 2006 de acordo com o art. 5 nº2 do CC e 279 alínea c)
do CC.
A lei nº2 revoga a Lei nº1. Temos uma revogação expressa (art. 7 nº2
do CC), substitutiva, e subentende-se total.

Lei nº3

É publicada a 5 de Novembro de 2006 e disponibilizada online a


10 de Novembro. Embora o art. 2 nº1 da lei 74/98 preveja que a data
da publicação da lei se considera o da sua disponibilização online
sítio da Internet gerido pela INCM, a verdade é que na prática pode
suceder que a data do Diário da República não corresponda ao da
sua efectiva disponibilização online. Por isso devemos aplicar o art. 2
nº 4 da lei 74/98 e entender que o prazo de vacatio legis se deve
contar a partir da data da sua disponibilização online (segue a
doutrina acolhida pela versão originária da lei 74/98 quando se
discutia o problema de saber se o prazo da vacatio legis se deveria
contar a partir da data da publicação ou da efectiva distribuição do
Diário da República, tendo a lei 74/98 optado pela data da
distribuição). Ora, se é assim nos termos do art. 5 nº2 do CC, art. 2
nº2 e 4 da lei 74/98 aplica-se o prazo supletivo de vacatio legis de 5
dias, e como tal a Lei nº 3 entra em vigor no dia 15 de Novembro
de 2006.

Temos uma revogação tácita (art. 7 nº2 do CC), substitutiva, e


subentende-se total.

Decreto - regulamentar nº4

É publicado a 10 de Dezembro, como tal nos termos do art. 5 nº2 do


CC e art.2 nº2 da lei 74/98 entra em vigor no dia 15 de Dezembro.

Atendendo ao principio da hierarquia das leis (que prevalece sobre o


critério da posteridade) previsto no art. 112 nº5 da CRP, uma norma
de valor inferior, no caso um regulamento, não pode revogar uma
norma de valor superior, no caso uma lei. Por isso resta averiguar se
é a Lei nº1, a Lei nº2 ou a Lei nº 3 que está em vigor.
A dúvida surge relativamente ao momento da posteridade das Leis
nºs 2 e 3. Temos um caso em que uma lei publicada antes (a lei nº 2),
entra em vigor depois de uma lei publicada depois (a lei nº3). Nestas
situações para Oliveira Ascensão e atendendo ao critério da
publicidade, não restariam duvidas de que a Lei nº3 publicada depois
revoga a Lei nº2, e como tal, seria esta que estaria em vigor. Teixeira
de Sousa, embora chegue à mesma conclusão, entende que temos
um impedimento de vigência da lei nº2.

Assim é a lei nº3 que está em vigor hoje.

Sandra Lopes Luís

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