(Fichamento) ARAÚJO, Antonio. A Encenação Performativa

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ARAJO, Antonio. A encenao performativa.

A encenao contempornea vem estabelecendo uma forte relao com a


performance,
sendo contaminada e reconfigurada por ela. (p.253)

Nesse sentido, o carter autobiogrfico, no-representacional e no-narrativo,


de contraponto iluso, e baseado na intensificao da presena e do
momento da ao, num acontecimento compartilhado entre artistas e
espectadores traos caractersticos da arte performtica vo orientar as
sugeridas aproximaes com o campo teatral. (p.253)

O corpo em risco, colocado em situao-limite, que no representa mais


personagens, mas utiliza sua autobiografia como material cnico, outro ponto
em comum desse dilogo. (p.253)

(...) Ou seja, essa instaurao da presena do corpo e da pessoa do prprio


performer, no mediada por instncias ficcionais, que marcou a ciso entre
representao associada ao teatro e apresentao elemento-base da
performance ser revista e rearticulada pela encenao contempornea.
(p.253/254)

Entre outros elementos, ela vai lanar mo da exposio nua e crua do corpo
do ator-performer e de sua ampliao imagtica ou de partes dele por meio
de recursos tecnolgicos, acentuando o elemento presencial ou pondo em
xeque a sua ausncia ou virtualidade , alm de colocar em risco ou em perigo
a integridade fsica dos prprios atuadores. (p.254)

(...) Nesse sentido, o ator se transforma, ele tambm, no encenador da obra, ou


seja, um performer-encenador. (p.254)

Na medida em que a funo precpua do diretor no mais a passagem do


texto cena, o campo de experincia do prprio encenador se abre tambm
como material cnico. Suas memrias, histrias pregressas e busca de
autodesenvolvimento so convocadas para a construo do espetculo. Na
verdade, a vida pessoal do encenador j se encontra, desde o momento da
escolha dos projetos, determinando os critrios de seleo. Portanto, a
encenao passa a ser, em certa medida, a encarnao, a mise en chair do
diretor. E ele, por sua vez, torna-se, ento, um encenador-performer que
trabalhar na elaborao do acontecimento cnico com um grupo de
performers-encenadores. (p.254)

A questo da especificidade do espao para a performance outro ponto de


contato com a encenao site specific contempornea, na medida em que
toda performance s feita (e s pode ser feita) em e para um dado espao
ao qual ela est indissoluvelmente ligada (Fral, 1985, p. 129). Esse local
especfico e nico, muitas vezes aberto prpria cidade, e s eventuais
interferncias dos espectadores-atuadores, vai trazer ainda a questo do
inesperado, do dilogo e da incorporao do acaso dentro da obra. Como
Glusberg aponta, deve-se ter em mente que o elemento inesperado na
performance inesperado no s para o espectador, [...] mas tambm e
primeiramente ao artista de performance, cujo trabalho sempre tem um aspecto
de inesperado (Glusberg, 1987, p. 83). (p.254)

Outro dado de aproximao importante refere-se minimizao ou ausncia


de hierarquia entre os elementos constitutivos da cena, no mbito da
performance. (...) gerando uma obra em que nem o texto, nem o ator ou a
encenao tm carter epicntrico. Ou seja, a resultante do espetculo como
no caso da performance reflete uma alternncia de dominncias textuais,
cnicas, interpretativas, etc. ao longo de sua apresentao. (p.254/255)

(...) O posicionamento performativo do encenador, nessa medida, o condiciona


menos para a realizao da obra perfeita, deixando que o espetculo
apresente em cena e em ato o seu prprio processo de feitura. Tal perspectiva
se materializa tanto pela explicitao de rastros do processo, pela no-
maquiagem dos seus buracos, fissuras e fracassos, quanto pela apresentao
da obra como um constante e contnuo work in progress. (p.255)
Tal tipo de encenao, inclusive, na sua busca de negao da representao,
chega a se apresentar como uma no-encenao. (...) colocando em crise a
capacidade todo-poderosa que ela teria de unificar, simbolizar ou interpretar
um texto ou a prpria realidade. (p.255)

Tanto como na performance, a encenao performativa pretende provocar a


instaurao de um acontecimento. Segundo Fral, no contando nada nem
imitando ningum, a performance [...] sem passado, nem futuro, acontece,
transforma a cena em acontecimento, acontecimento do qual o sujeito sair
transformado, esperando uma outra performance para seguir o seu percurso
(Fral, 1985, p. 135). (p.256)

Portanto, o objetivo principal deste tipo de encenao menos a amarrao


esttica do todo, mas, sobretudo, a produo de experincia. Busca-se uma
interferncia no espectador a fim de que ele seja capaz de mobilizar sua
prpria capacidade de reao e vivncia a fim de realizar a participao no
processo que lhe oferecida (Lehmann, 2007, p. 224). (p.256)

(...) Ao contrrio da perfomance, que no visa ao estabelecimento de um


sentido geral ao discurso cnico ou materializao de um ponto de vista
sobre um determinado assunto ou texto, a encenao parece, por natureza,
convocada a essa composio ou articulao do sentido. (p.256)

A encenao performativa, nesse sentido, vai buscar justamente se libertar da


construo da unidade, do discurso homogneo e do sentido articulador. Ela
procurar se deixar atravessar por sentidos, por linhas de fora, por
heterogeneidades materiais, discursivas e de linguagens. Ao invs da
produo de sentido, busca-se, como na performance, a produo de
presena, ao invs da organizao simblica, da homogeneizao dos
materiais ou da amarrao de um sentido, emergem pedaos de sentido,
possibilidades tateantes de significao, postas em movimento e em contato,
por ao do diretor. (p.257)
(...) a encenao performativa vai colocar os diferentes fluxos de desejo e de
sentido em conexo, deixando emergir as diversidades, habitando em
heterotopias e, por fim, desestabilizar as cristalizaes de unidade. (...) E,
nesse sentido, a associao ainda que instvel entre performance e
encenao um dado ao qual a cena contempornea no consegue mais
escapar, pois uma no vai sem a outra, somente a dosagem que varia.
(p.257)

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