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NEUROBUSINESS
A FISIOLOGIA DO
GERENCIAMENTO
Reportagem HSM Management
62
SE O CREBRO
FALASSE
Entrevista com David Rock
CASOS REAIS
Foto: Divulgao
68
72
O BRASIL
E A ERA DO
CREBRO
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76
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NEUROBUSINESS
FISIOLOGIA
DO
GERENCIAMENTO
as descobertas da
neurocincia esto, cada
vez mais, chegando s
empresas. Reportagem HSM
Management mostra como
esse novo conhecimento
tende a modificar, e a
humanizar, a gesto,
que por muitos anos
pautou-se pela viso
mecanicista desenvolvida
na era industrial
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Estudos do crebro
tm demonstrado que a
crtica melhora o fluxo
de ideias
CREBRO
SOCIAL
Em menos de uma
dcada, avanos tec
nolgicos como a
ressonncia magnJonah Lehrer
tica tiraram a neurocincia dos limites
do laboratrio. As recentes descobertas sobre
a flexibilidade do crebro,
sua capacidade de criar novas conexes neurais em
qualquer idade, sua receptividade ao treinamento cognitivo e a confirmao de que a
conduta humana tem origem
fisiolgica so revelaes formidveis para o mundo dos
negcios e, sobretudo, para a
rea de gesto.
Sabemos que o trabalho
uma transao econmica
horas de dedicao em
troca de salrio, mas para
o crebro o ambiente profis-
sional um sistema social. Da mesma forma que os predadores esto programados para reagir diante da caa, o
crebro humano est conectado de modo a responder s
ameaas sociais como se sua existncia dependesse disso.
Basicamente, para o crebro no h diferena entre ser
condenado ao ostracismo e ter fome.
As pessoas no podem ser criativas, trabalhar em harmonia com sua equipe ou tomar decises acertadas quando seu
sistema de defesa est em alerta. Consideremos o seguinte
exemplo: para lidar com o estresse, o crebro consome oxignio e glicose destinados funo da memria recente, que
processa novas informaes e ideias. Tal procedimento resulta em deteriorao do pensamento analtico, diminuio
da capacidade de resolver problemas e queda de criatividade.
Qualquer mudana, por menor que seja, em como percebemos uma situao ou realizamos uma tarefa tem efeitos
drsticos em nosso desempenho e bem-estar pessoal, afirma Susan Greenfield, especialista em fisiologia do crebro e
professora de farmacologia sinptica da Oxford University
[veja quadro na pgina 65].
David Rock, cofundador e CEO do NeuroLeadership Institute, iniciativa global que busca criar uma cincia para o
desenvolvimento de novos lderes, vai alm: No futuro, a
capacidade de colocar o crebro social a servio do desempenho ser um diferencial dos gestores. [Veja entrevista com
David Rock na pgina 68.]
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GLOSSRIO
Interdisciplinar, a neurocincia engloba, alm da biologia, qumica, cincia da computao, engenharia, lingustica, matemtica,
medicina, filosofia, fsica e psicologia. Muitas vezes, o termo usado no plural, porque h as neurocincias molecular, celular,
sistmica, comportamental e cognitiva.
Neurocoaching
Sua proposta melhorar e
ampliar as estratgias de
desenvolvimento. Indica
quais as ferramentas e
tcnicas necessrias para
dominar e equilibrar as
emoes e estabelecer
novas conexes neurais que
impulsionam pensamentos,
crenas e sentimentos.
Neuroeconomia
Combina economia, biologia
e psicologia, entre outras
disciplinas. Est centrada
no estudo do comportamento, na confiana nas relaes, na tomada de riscos
irracionais, na avaliao relativa de custos e benefcios
de curto e longo prazos e na
conduta altrusta.
Neuroliderana
um campo interdisciplinar
da cincia que estuda a
base neural da liderana e
das prticas de gerenciamento. Explora os processos do crebro por trs das
decises, os comportamentos e as interaes sociais
no trabalho e fora dele.
Seu objetivo melhorar a
eficincia dos lderes.
Neuromarketing
Estuda como o crebro responde aos anncios publicitrios e comunicao de
marcas por intermdio da
pesquisa da atividade cerebral e corporal. Visa descobrir os desejos secretos do
consumidor para antecipar
seu comportamento.
NEUROMANAGEMENT
OUTRO OLHAR
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O PRXIMO PASSO
Sabemos que o crebro humano vai
mudar, a pergunta se para o bem ou
para o mal, diz a reconhecida cientista
britnica Susan Greenfield, especializada em fisiologia do crebro e professora
de farmacologia sinptica da Oxford University, do Reino Unido. As novas geraes esto se afastando da interao humana, dos abraos, dos cheiros, e isso
um exemplo do que ser a vida no sculo
21. A cultura da tela de computador est
gerando uma mudana mental equiparvel mudana climtica.
A pesquisadora acha que as conse
quncias da cultura da tela sero sentidas em trs aspectos principais:
1. Informao versus conhecimento. As
pessoas detectaro padres e processaro informao com rapidez. No entanto,
informao no conhecimento. Entender conceitos e estabelecer relaes,
Os melhores
programas
organizacionais podem
ser uma ameaa se no
considerarem as
reaes do crebro
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DOR DE CABEA
O crebro humano complexo.
A linha entre o que o estimula e
o que o maltrata muito tnue.
Gregory Berns, professor de
psiquiatria, economia e negcios e diretor do departamento
de neuroeconomia da Emory
University, explica que at os
melhores programas organizacionais podem se tornar uma
ameaa se no levarem em conta as reaes do crebro diante
de determinadas situaes.
As anlises de desempenho
so um exemplo. As pessoas que
esto sendo examinadas costumam sentir que s por participar dessa atividade seu status
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es ou sentimentos, nossa mente chega a concluses rpidas. O hemisfrio esquerdo do crebro tenta dar sentido
ao mundo e, em busca de significado, atribui um enorme
peso s evidncias que apoiam nossas teses e ignora as
que no interessam. O renomado psiclogo experimental
e linguista Steven Pinker diz que h um mundo de diferena entre crer que se sabe a verdade e saber de fato que
algo verdade.
Um estudo realizado no California Institute of Technology analisou de que modo os preos de um produto influenciam as preferncias de gosto. Os participantes provaram
dois vinhos: um de US$ 10 e outro de US$ 90. Na verdade,
os vinhos eram o mesmo, mas as pessoas no sabiam disso. A bebida mais cara foi qualificada como a mais saborosa. Contudo, segundo o estudo das imagens, as regies
do crebro associadas ao gosto
no sofreram alterao,
enquanto as relacionadas com o prazer da
experincia foram
H um mundo de
modificadas.
diferena entre crer
Pesquisadores
em
neuroeconoque se sabe a verdade
mia da Univere saber de fato a
sity of Pennsylverdade
vania, liderados
Steven Pinker
pelo professor de
psicologia Joseph
Kable, identificaram
uma parte especfica
do crebro o crtex
frontal ventromedial como a responsvel por tomar
decises sobre o valor. Esse
estudo procura determinar
as configuraes de produtos
e preos que os consumidores percebem como justas.
De acordo com o neuromarketing, a maioria das decises de consumo responde
s emoes e no razo.
Martin Lindstrom, um dos
especialistas mais reconhecidos na rea, diz que no futuro
prximo o papel do especialista em marketing ficar obsoleto para dar lugar prtica
de psiclogos e cientistas.
Dan Ariely, professor de psi
cologia e economia do comporversity,
tamento da Duke Uni
acha que o uso da ressonncia
magntica em marketing ser
TREINAMENTO PARA A
POSITIVIDADE
O neurocoaching oferece ferramentas para intervir de maneira consciente em processos
cerebrais automticos. A adoo e prtica de novas condutas criam circuitos neurais e
os reforam.
Uma pesquisa de 2009 denominada Neuroleadership
and the Productive Brain
concluiu que quatro horas
de treinamento cerebral online durante 30 dias melhoram de modo significativo a
produtividade e a capacidade dos funcionrios de autorregularem suas emoes,
um fator-chave no controle cognitivo, uma vez que as
emoes negativas absorvem a energia neural e dispersam a ateno.
Mudar um desafio. Dos 60 mil pensamentos dirios de
uma pessoa, 80% so negativos. Segundo os especialistas,
para manter o estado de bem-estar, so necessrios trs
pensamentos positivos para cada pensamento negativo.
possvel reverter a inclinao natural do ser humano ao pessimismo? Sim; tornando-se consciente da tendncia mental para libertar a negatividade. Se algum
se apega aos pensamentos e sentimentos negativos, continua revisando-os e persistindo em compreend-los e
termina conseguindo o que deveria evitar: refora o pessimismo. Ao desviar a energia e a ateno das conexes
neurais negativas, estas se debilitam e desaparecem.
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David Rock
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Se o crebro
falasse
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O modelo Scarf
Em sua edio n 79 (pgina 60), HSM Management pu
blicou um artigo de David Rock sobre neuroliderana em
que ele descrevia o modelo Scarf como eventual substitu
to da pirmide de necessidades de Abraham Maslow para
os gestores que querem aumentar a motivao da equipe.
Durante esta entrevista, ele voltou a explicar a ideia:
As ameaas e recompensas sociais so to importantes
quanto as ameaas e recompensas primrias, porque ati
vam o mesmo centro cerebral: a rea dos impulsos prim
rios. Essas so as motivaes intrnsecas e as resumi na
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Casos reais
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texto empresarial, a frase muito mais do que uma explicao. Em geral, incorpora crenas que se fortaleceram ao
longo dos anos pela repetio de rotinas e de centenas de
conversas sobre o que (no) deve ser feito.
Essas crenas constituem prticas complexas e sutis to
enraizadas na cultura corporativa que acabam moldando
sua identidade. De fato, no so ruins em si; constituem
muitas vezes a razo pela qual a empresa vai bem. Porm,
quando as circunstncias se transformam ou a companhia
se torna disfuncional, o que fazemos aqui precisa mudar.
Modificar um hbito difcil; nas empresas, a complexidade da conduta coletiva faz com que o desafio seja
ainda maior. Nos ltimos anos, as pesquisas no campo
da neurocincia abriram espao para trilhar caminhos
radicais. A chave implementar novos comportamentos que substituam essas atitudes fixas, quase gravadas
nos circuitos neurais.
Princpios da mudana
Os focos da mudana organizacional so baseados nas descobertas que a neurocincia considera em diversos fatores
relacionados ao funcionamento do crebro, tais como:
Hbitos so difceis de mudar. Muitos padres convencionais de pensamento nunca chegam ateno consciente. Isso acontece com a informao processada por
rgos como os gnglios basais tambm chamados de
centro dos hbitos, que normalmente controlam atividades semiautomticas (dirigir e andar, por exemplo),
a amgdala, que d origem s emoes fortes (medo, irritao etc.), e o hipotlamo, que lida com instintos (fome,
sede e desejo sexual, entre outros).
Toda vez que os padres neurais dos gnglios basais
so convocados, criam mais razes. Quando uma prtica
organizacional ativa um rgo, torna-se extremamente difcil remov-la. Por isso, necessrio desenvolver
novas condutas, que devem ser geradas nos gnglios
basais. Aprender novos comportamentos costuma ser
difcil e doloroso porque implica superar de maneira
consciente um circuito neural profundamente cmodo.
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O crculo virtuoso
dos valores focados
Esse crculo mostra seis passos para produzir uma mudana profunda
(crculo externo) e os novos valores organizacionais que produzem (crculo interno). O crculo virtuoso comea quando o primeiro passo ativa
o foco deliberado na maneira como fazemos as coisas aqui. Conforme
as etapas progridem, os participantes ganham um senso mais forte de
significado compartilhado, levando a prticas especficas e, por fim, a
contribuies mais tangveis e a um desempenho melhor.
O
UI
B
I
FO
C
2
Renomear
as reaes
IC
PR
T
5
ICA
Responder
com
repetio
AD
6
Revalorizar
as escolhas
em tempo
real
CON
TR
1
Reconhecer a
necessidade de
mudana
F
3
NI
S I G Refletir sobre
4
Reorientar
a conduta
expectativas e
valores
Fontes: Gaito (crculo
interno); Schwartz e
Lennick (passos).
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sa em uma rotina. Para evitar tal imerso, fundamental ficos sugerem que dizer, por exemplo, As coisas sero
aumentar a conscincia sobre os pensamentos, emoes melhores se mudarmos acalma as reaes como um
e aes e sua conexo com os resultados na vida real. De- placebo alivia a dor.
pois de um episdio difcil, por exemplo, voc pode se dis Passo 4: Reorientar a conduta. Aqui necessrio alitanciar e perguntar: Em que eu estava pensando?
nhar hbitos e metas. As prticas a adotar
Como me sinto agora? Meu comportaso identificadas e colocadas em prtica.
mento estava alinhado com meu
Nas empresas que navegam por guas
objetivo e com o quadro mais
A etapa do
turbulentas (como em uma crise
amplo que tenho?.
econmica), reorientar-se talvez
Coletivamente, a etareconhecimento
signifique perseguir prticas depa do reconhecimento
significa falar sobre
liberadas para ativar o espectasignifica falar sobre
dor imparcial. Um lder pode
as possibilidades de
as possibilidades de
comear falando abertamente
mudana com a premudana com a premissa
sobre como se sente, pedir a
missa de que a made que a maneira como
sua equipe que faa o mesmo
neira como fazemos
e ento ajud-la a encontrar
as coisas no pode
fazemos as coisas no
uma perspectiva mais ampla.
continuar. A prtica despode continuar
Ainda esto bem, tm trabasa etapa pode trazer grande
lho, suas famlias no sofrecarga emocional, porque significa
ram. Logo trata de gerar um esrecusar ou abandonar aes cmotado emocional mais calmo, levando
das, porm contraproducentes.
as pessoas a um pensamento premeJim Cracchiolo, presidente-executivo da
ditado. Essa a etapa crucial da sequnAmeriprise, por exemplo, reconheceu a necessicia, por causa de seu poder de impacto no
dade de transformao no setor de assessoria financrtex pr-frontal, onde se processam novas condutas
ceira e isso influenciou sua rejeio ao programa de
que, ao se repetirem, constroem circuitos nos gnglios
apoio do governo dos Estados Unidos, aps a crise de
basais e se convertem em um conjunto de novos hbitos.
2008. Segundo ele, o financiamento do governo impediria
a empresa de atingir todo o seu potencial. Essa explicao
Passo 5: Responder com repetio. Significa ser responsressoou fortemente nos funcionrios.
vel e tornar os demais responsveis pondo em prtica con Passo 2: Renomear as reaes. Essa etapa foi inspirada dutas apropriadas para a mudana de modo constante. A
na terapia de transtorno obsessivo-compulsivo, o conhe- disciplina necessria para criar novos hbitos. A Cargill,
cido TOC. Se uma pessoa com TOC d um novo nome a por exemplo, usa indicadores para estabelecer prioridades
um comportamento inadaptado, ela pode superar pen- de liderana e avaliar o comportamento dos gestores.
samentos disfuncionais (Tenho de lavar as mos para
me assegurar de que esto limpas) e aprender que so Passo 6: Revalorizar as escolhas em tempo real. Essa
simplesmente pensamentos (Sinto que a urgncia volta, etapa a da ateno plena. possvel reconhecer os
mas somente um pensamento que me produzido pela prprios pensamentos no momento em que acontecem,
sndrome do TOC). O ato mental de renomear melhora resistir ao sequestro da amgdala e controlar a crise.
a capacidade de distinguir e, portanto, diminui o apego Nas empresas, em vez de reverter automaticamente a
ideia da maneira como fazemos as coisas aqui, as
pessoal ao que se est pensando.
pessoas pensam na maneira como fazamos as coisas,
Passo 3: Refletir sobre expectativas e valores. Nessa pois agora fazemos melhor. Quando as respostas autoetapa, as expectativas antigas so suplantadas por uma mticas mudam em um grande grupo de pessoas, surge
nova imagem do estado que se deseja alcanar. Tanto a uma nova tica organizacional. A transformao deixa
Cargill como a Ameriprise mantm sees internas de de ser imposta e passa a ser escolhida, instalando-se
treinamento para fomentar a capacidade de reflexo co- como um novo hbito.
letiva. Os participantes falam sobre o tipo de empresa
que esto tentando criar, sobre a liderana que ser geHSM Management
rada e sobre as necessidades e valores de seus clientes.
Nessa reflexo, a companhia emprega as expectativas
strategy+business
de condies melhores como ferramenta para reforar
Reproduzido com autorizao.
padres neurais produtivos. Experimentos neurocientTodos os direitos reservados.
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O Brasil e a
era do crebro
Um assunto de suma importncia quando um novo
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Queremos ampliar o instituto transformando-o no Campus do Crebro. Seria um parque neurotecnolgico, que instalaria no Brasil uma cadeia produtiva de neurotecnologia, e
futuramente isso se converteria na Cidade do Crebro um
modelo a replicar em outras regies do Pas.
Uma parte do empresariado brasileiro parece que j se conformou com o gap que o Brasil tem em relao aos pases
O que vocs esto fazendo para que isso acontea?
Para dar visibilidade a nosso objetivo, estamos buscando mais inovadores em termos de cincia e tecnologia e desistiu
patrocnio para fazer uma demonstrao do nosso projeto de tentar diminu-lo. Outra parte, menor, quer avidamente
Walk Again na abertura da Copa do Mundo de Futebol ser tech. Se isso fosse um jogo, que time venceria?
que ser sediada pelo Brasil em 2014. Nosso sonho que A diferena entre o Brasil e os Estados Unidos nas condies para fazer cincia realmente grande,
uma criana tetraplgica volte a andar utilizana comear pelo fato de que l a cincia
do um terno robtico comandado por
faz parte do dia a dia das pessoas e
seu crebro e d o chute inicial no
aqui no. Mas preciso entender
jogo inaugural.
que essa situao produto de
Isso, alis, teria um efeito exDe acordo com essa lgica
um pensamento conformista
tremamente benfico para a
atrasada [de parte do
como o desses empresrios
marca Brasil, ao tirar o esdo time nmero um, que
tigma de que aqui s tem
empresariado], devemos
dominou nossa vida dufutebol e msica, conferincontinuar sendo uma
rante 400 anos. De acordo
do-nos uma imagem ciencom essa lgica atrasada,
tfica que ajuda a construir
colnia, no de Portugal,
devemos continuar sendo
a cultura de cincia e inovamas dos pases que
uma colnia no mais
o de que tanto precisamos.
desenvolvem cincia
de Portugal, mas de outros
pases que desenvolvem
O projeto Walk Again continuaria l fora
cincia e tecnologia.
ou seria transferido para c?
Esse conformismo quase
Ele financiado por um consrcio internaatico, porque nos condena a ser
cional e continuaria entre Estados Unidos, Sua
subservientes, seguidores eternos,
e Alemanha, mas a gente quer trazer toda essa tecnologia
obedecendo s normas cientficas
para Natal e eventualmente para So Paulo para servir
ditadas por outra sociedade. Cincia, neste
tambm como alavanca do parque neurotecnolgico.
sculo, uma questo de soberania nacional.
E como anda o processo de viabilizao, tanto do pontap iniPor qu?
cial como desse cluster de neurotecnologia no Brasil?
O patrocnio ao chute inicial temos dois meses para viabili- Se um pas no investir em reas estratgicas, cientficas e
zar e estamos conversando com muitas empresas o apoio tecnolgicas, ele fica completamente merc de quem dedo governo j possumos, mas preciso mais do que isso. tm o conhecimento. Hoje, se os fornecedores de microproPor exemplo, em So Paulo, procuramos um hospital par- cessadores decidirem boicotar o Brasil, o Pas para. Se os
satlites internacionais no aceitarem fazer o servio de que
ceiro, para fazer toda a parte clnica, algo bem difcil.
Sobre a viabilizao do cluster, creio que temos uma jane- o Brasil precisa, j era. No tenho muita dvida de que, se
la de oportunidade de dois anos, no mais; outros pases tm quiserem desligar a internet do Brasil fora daqui, desligam.
Por exemplo, eu me orgulho muitssimo da Embraer, mas
se dedicado ao assunto tambm.
ela no faz turbina nem avionics no Brasil; compra fora e, se
O governo faz a figura de um planejador central na iniciativa? o fornecimento parar, no ter a quem pedir socorro.
No no projeto do chute inicial, mas o governo o planejador de um modelo de cincia para o Brasil. No sei se os lei- Em cenrios de guerra ou catstrofes, o fornecimento pode
tores da sua revista conhecem a Comisso do Futuro. uma cessar, de fato. Mas parece impossvel reduzir a diferena...
comisso de cientistas voluntrios e independentes, da qual Outros pases a esto reduzindo, por que no o Brasil? Hoje
fao parte, que foi convidada pelo Ministrio da Cincia e os Estados Unidos enfrentam uma crise tremenda em seu
Tecnologia para criar esse modelo. Nos prximos dois a trs financiamento cientfico e no grau de educao cientfica, e
meses devemos terminar um primeiro relatrio que trar outras naes, que h dcadas ningum imaginaria competona, creio eu, a gravidade da situao do Pas em relao a titivas na rea, aparecem com fora, como a Coreia do Sul
ou a Finlndia, com o melhor ensino de cincia do mundo.
seus competidores.
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Universidade Federal do Rio Grande do Norte; o governo estadual cuidou de gua, luz e estrada; o governo federal contribuiu com os recursos para a construo; e a sra. Lily Safra
nos ajudou a equip-lo e sustent-lo, fazendo, creio, a maior
doao privada para a cincia em toda a histria do Brasil.
O que precisaria mudar na universidade brasileira?
Criar a carreira de pesquisador e trein-lo para estruturar
um negcio so bons comeos. Outro ponto de virada seria no ter tanto receio de reconhecer e privilegiar o que
tem mrito. Como h muita dificuldade em dizer no no
Brasil, quando surge um pool de recursos, eles so pulverizados para contentar todo mundo, em vez de concentrados
em uma pesquisa que tenha mrito e possa realmente fazer
diferena, que como se faz mundo afora.
Alm disso, em cincia existe uma premncia de apoiar
os jovens, que esto iniciando a carreira a cincia vive dessa renovao contnua. S que, no Brasil, acontece o oposto:
a gente concentra todo nosso apoio financeiro, estratgico
e poltico em quem est no final da carreira. Essa casta do
CNPq [Centro Nacional de Desenvolvimento Cientfico e
Tecnolgico] no existe em nenhum lugar do mundo.
E foi assim que o Brasil exportou Miguel Nicolelis?
No, quando fui embora fazer meu doutorado, no comeo de
1989, eu era muito jovem, nem sabia dessas coisas. Por outro lado, quando terminei o doutorado, logo vi que no teria
a menor chance de fazer aqui o que eu queria. S comecei a
voltar, ainda parcialmente, em 2003.
Houve um esforo do governo para repatriar cientistas, no
foi? Bem, um modelo de cincia que atraia as empresas deve
conter uma promessa de lucro. Como garantir isso?
No parque neurotecnolgico, por exemplo, h essa promessa. Uma frao dessa atividade econmica tem de gerar os
recursos para manter e ampliar as aes sociais que iniciamos e o restante fica para o investidor. Se nosso empreendedorismo no fosse to primitivo em geral, essa promessa
de lucro seria enxergada. No d para querer ter o mximo
possvel de lucro daqui a 10 milissegundos.
hora de as empresas brasileiras verem que o resto do
mundo est fazendo coisas inovadoras e de longo prazo,
aceitando o desafio do complexo, e ns no. Eu acredito no
futuro do capitalismo brasileiro como ganha-ganha.
S que o sr. fala em no registrar patente e doar tudo para
a humanidade, la Santos Dumont... Isso provoca arrepios.
Na Duke University, tambm sofro uma presso muito grande para patentear tudo o que eu fao. Em alguns casos, no
tive alternativa e patenteei de fato.
Veja: eu entendo essa discusso da propriedade intelectual, s que, como muitas coisas, ela usada de maneira
indevida. Em algumas situaes, as patentes so aceitveis;
em outras, no. Por exemplo, precisvamos desenvolver, no
Entenda o
trabalho de
Nicolelis
Miguel Nicolelis, com o cientista John Chapin, ajudou a
mudar o enfoque dos estudos da fisiologia do crebro.
Eles foram estudar como se comportava o crebro de
animais como ratos quando estes faziam atividades interessantes: Em vez de olhar uma clula de cada vez, analisamos grandes grupos que nos permitem chegar mais
perto da dinmica de funcionamento dessa estrutura em
termos operacionais, o como funciona. Em 1995, eles
comearam a medir os impulsos cerebrais (sinais eltricos) de 50 neurnios ao mesmo tempo, ouvindo o som do
crebro em tempo real. J esto conseguindo faz-lo com
mil neurnios ao mesmo tempo e, em cinco a dez anos,
pretendem faz-lo com at 100 mil. A partir desse feito,
vieram vrias descobertas, entre elas:
O crebro funciona como uma democracia neural, no como a ditadura de um
neurnio especfico. Cada funo exercida
por vrios neurnios e cada neurnio tem
potencial para exercer vrias funes.
Os sinais eltricos emitidos pelos neurnios so caticos e devem s-lo, pois,
se ficam muito sincrnicos e disciplinados,
ocorre a crise de epilepsia. Desorganizar
esses sinais somando-lhes sinais eltricos
artificiais no nervo da face faz cessar a crise.
Com o mal de Parkinson, o crebro se
comporta como numa crise epilptica de
baixa frequncia. Ento, desorganizar os
sinais com estmulos na medula espinhal,
por exemplo, melhora sensivelmente os
sintomas da doena, que, contudo, no
tem cura. Um rato com Parkinson avanado, que j no se
movia, conseguiu ir beber gua e uma macaca no mesmo
estgio da doena escalou a jaula para pegar uma banana.
E se os sinais eltricos artificiais forem
comandados pelo crebro? Talvez os tetraplgicos possam voltar a andar, com a
ajuda de uma interface crebro-mquina,
o terno robtico do projeto Walk Again. O
experimento da macaca Aurora no videogame, descrito no incio deste texto, provou isso e somouse a ele outro, igualmente bem-sucedido, em que a
macaca idoya comandou, com o pensamento, um rob no
Japo.
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om.br Magement.c
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Uma frmula
pessoal para
inovar
por Miguel Nicolelis
Brasil, vacinas para malria e dengue. Elas no teriam muita utilidade no hemisfrio norte, mas seriam cruciais aqui,
na frica e na sia, e, num caso desses, uma patente que
no mereceria existir. Assim como foi com os remdios do
coquetel da aids, cujas patentes o Brasil ignorou e assim se
transformaram num modelo mundial. Se h milhes de pessoas correndo risco de vida, patentes no se aplicam.
O modelo da indstria farmacutica atual est fadado a
desaparecer. No h como conseguir crescer 8% ao ano, que
o que se tenta fazer, para dar o retorno a seus acionistas,
quando se gastam bilhes de dlares para gerar uma nica
droga. E os pipelines no so to ricos quanto eram h al-
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o contedo de gordura de uma semente do semirido nordestino como possvel fonte de biodiesel e j est pensando
na possibilidade de abrir um negcio de certificao de leo
vegetal do semirido, algo que no existe.
Ou seja, mesmo que essas crianas no se tornem cientistas,
elas se tornam empreendedores...
Sim, medida que pegam o gosto por inovar. Esse o caminho: inovao se faz com gente que pensa diferente e que
quer mudar o mundo. E, se essas crianas, apesar de serem de lugares to perifricos que quase ningum sabe que
existem, hoje tm certeza de que podem mudar o
mundo, h futuro para o Brasil, principalmente se conseguirmos multiplicar
essa experincia.
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