A Transposição Da Literatura para o Cinema

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A transposio da Literatura para o Cinema: reflexes preliminares.

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rica Eloize Peroni Ferreira 2
Centro de Ensino Superior Promove

Resumo:
Trata-se da investigao da intersemiose existente entre texto literrio e cinematogrfico.
A multiplicidade de obras literrias presentes no cinema, desde a sua constituio at os dias
atuais, nos faz questionar sobre a similaridade existente entre ambas as linguagens, ressaltando as
etapas pertinentes ao processo de transposio, tais como a intertextualidade, adaptao e
traduo intersemitica.
Palavras-chave: cinema; literatura; semitica; transtexualidade.

Introduo
Considerando a importncia dada ao estudo das similaridades do texto literrio e
cinematogrfico, este artigo configura-se como recorte de uma pesquisa, ainda em
desenvolvimento, que tem como objetivo investigar os processos de transposio existentes entre
literatura e cinema considerando suas inter-relaes. A emitente presena da literatura no cinema
nos dias atuais nos desperta para a verificao das potencialidades que fazem com que essas
linguagens to distintas se aproximem.
A forte presena narrativa, os elementos textuais, ficcionais, entre outros aspectos presentes
marcam a notoriedade da literatura na construo da linguagem cinematogrfica. A pesquisa
requer a contemplao dos estudos pertinentes transtextualidade, traduo intersemitica e
adaptao, visando obter a possvel compreenso das etapas da transposio entre diferentes
linguagens.

Trabalho apresentado ao Intercom Jnior Jornada de Iniciao Cientfica em Comunicao na seo correspondente
Comunicao audiovisual.
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aluna do stimo perodo de graduao em Comunicao Social com habilitao em Produo Editorial, orientada pelas
professoras mestres em Comunicao Social pela UFMG, Renata Alencar e Joana Meniconi. Desenvolveu atividades acadmicas
reconhecidos pela instituio como exposio fotogrfica na Semana de Comunicao 2004 e 2005 e co-direo do curtametragem Chuva, exibido publicamente pela Associao Curta Minas, Cine Esquema Novo em Porto Alegre e Festival de
Audiovisual na UFPE.

A origem dos processos narrativos


Atualmente, encontramos vrios exemplos de obras literrias que serviram de inspirao para
diretores cinematogrficos. Os best-sellers tm sido alvo para roteiros de filmes, por exemplo, o
famoso O cdigo da Vinci, recentemente lanado em diversas salas de cinema brasileiras.
Grandes obras literrias, tradicionalmente conhecidas como Romeu e Julieta de Shakespeare,
marcam temporalmente a existncia da literatura presente no cinema. A filmografia brasileira
tambm est repleta de filmes que tm seu contexto vinculado literatura nacional. Guimares
Rosa, Machado de Assis, Jorge Amado, entre outros, so exemplo de escritores que tiveram suas
obras recriadas no cinema. Isto, na verdade, no uma virtude da atualidade, pois encontramos
este paralelo presente desde a constituio do cinema, quando o ilusionista francs George Mlis
foi pioneiro em utilizar as tcnicas de transposio.
Mas o que faz linguagens to distintas encontrarem pontos de convergncia? Esta virtude pode
ser atribuda possibilidade do cinema contar suas histrias atravs da projeo de fotogramas
que proporciona a iluso tica do movimento. Porm, tudo se inicia na narratividade. Muito
antes de os livros existirem como objetos fsicos, os contadores de histrias transmitiam dados
essenciais s sucessivas geraes em forma de narrativa (EPSTEIN, 2002:11). Com base neste
dado, possvel afirmar que o processo narrativo j existia desde os primrdios da vida humana,
mesmo antes do surgimento da escrita. O homem em sua necessidade de exteriorizar e aludir
histrias de seu universo, fictcio ou no, fazia desta prtica ancestral em forma de oralidade que
mais tarde contribuiu na construo do universo literrio presente na histria da humanidade.
Os caminhos para Transposio
sabido que o cinema alicerou a sua linguagem a partir da constituio literria, tendo como
base construo narrativa na qual permeia a estrutura lingstica cinematogrfica. A
intertextualidade, definida por Genette (apud AMARAL, 2005:2)3 tudo que o coloca em
relao, manifesta ou secreta, com outros textos. Cada texto uma voz, uma expresso. Cada
linguagem designa suas especificidades e remete uma rede semntica ao seu interlocutor. esta a
forma de dialogar na intertextualidade. Na relao transtextual entre cinema e literatura,
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GENETTE, Grard. Palimpsestes. Paris: Seuil, 1982, p.35.

encontramos a intertextualidade presente por intermdio da hipertextualidade. Segundo Cecy


Campos (2000), a hipertextualidade toda relao que une um texto a outro, realizada por meio
de aluses textuais ou paratextuais. O texto A (hipotexto) o texto base que serve como ponto de
partida e d origem a um texto B (hipertexto). Assim, a obra literria passa a ser o hipotexto,
dando origem ao hipertexto, que o roteiro. A narrativa cinematogrfica um texto composto
por sons, imagens e discursos verbais necessrios para a compreenso do espectador, presente nas
entrelinhas da projeo visual. Qua ndo um roteiro adaptado de um livro ou conto literrio, ele
passa a ser um outro texto, visto que as tcnicas de linguagem, embora consistam em algumas
similaridades, so representadas por elementos que as distinguem.
Alm das abordagens da intertextua lidade evidenciadas acima, o segundo passo o qual julgamos
indispensvel para compreender o processo de transposio a anlise sobre a perspectiva da
traduo intersemitica. De acordo com Jlio Plaza (2003), a traduo intersemiotica a traduo
que consiste em interpretao de signos entre sistemas semiticos, ou ainda, de um sistema de
signos para outro, e est pautada na utilizao de suportes, os quais apresentam estruturas
tcnicas e expressivas necessrias para que as linguagens se materializem em signos que, por sua
vez, servem tambm como interfaces, ou seja, mediaes. A interpretao de signos lingsticos
por outros no lingsticos significa uma transmutao de signos lingsticos para no
lingsticos paralelisando uma posio verbal x no- verbal. A traduo nos diversos meios se d
a partir de uma estratificao ou demarcao de fronteiras ntidas entre diversos e diferentes
sistemas de signos, dividindo-os em cdigos separados, tais como: verbal, pictrio, fotogrfico,
flmico, televisivo, grfico, musical, etc. (PLAZA, 2003:67).
No o rtulo do meio ou do cdigo que ir nos fornecer habilidade tcnica para detectar as
operaes sgnicas que esto inseridas nas mensagens e se processam no seu interior. Para se
inteligir essas informaes no trnsito semitico, deve -se obter a capacidade de leitura
diretamente na raiz. A diversidade das linguagens e suportes nos quais os movimentos de
passagem de caracteres icnicos, indiciais e simblicos 4 se efetivam, no se sobrepe somente
nos intercdigos mas tambm nos intracdigos, entendendo os processos de leis e articulaes de
linguagem que se efetuam no seu interior.
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Na perspectiva semitica de Peirce, cones, ndices e smbolos so tipos de signos que se remetem ao objeto da representao de
um modo especfico. cone um signo que sugere o objeto por similaridade, ndice indica um outro existente para fora dele
mesmo e smbolo a representao em forma de lei, fundamentados pelos legi-signos.

A traduo intersemitica da literatura para o cinema implica na produo de signos


interpretantes gerados numa mente tradutora ou intrprete, durante o processo de traduo. Esses
signos interpretantes esto relacionados a uma diversidade de referncias que o tradutor adquire
ao longo de suas experincias pessoais e intelectuais. Trata-se da experincia real com o
original a ser traduzido, o efeito que aquele produz na relao de leitura. Este interpretante
realmente o significado singular do signo original, a maneira pela qual cada mente o recebe e a
ele reage (PLAZA, 2003:35). O novo texto contm elementos sgnicos inserido s em seu interior
que referenciam a obra original, mas a traduo intersemitica consiste no surgimento de uma
outra obra, ou seja, numa transcriao.
Para compreender a definio de transposio de maneira singular necessrio ressaltar as
diferenas culturais e lingsticas que interferem no processo de traduo. Adaptar requer a forma
inteligvel e coerente de relacionar o contexto verbal s formas mais adequadas para a nova
linguagem que ser transposta. necessrio tambm avaliar o tempo, espao, meio e pblico
receptor do contexto traduzido. A cultura como um todo nunca deixa de transparecer nos textos
traduzidos, mesmo na traduo interlingual, conclui-se que toda traduo cultural. (DINIZ,
1996:50). Adaptar, portanto, um elemento complementar e fundamental que trabalha de forma
conjunta e atuante no processo de transposio.
A transcriao do texto literrio para o cinematogrfico resulta em transformaes devido s
diferenas de linguagens utilizadas, alm do prprio gesto de leitura do tradutor/adaptador,
mesmo quando se trata de uma traduo com o objetivo de ser literal. A transposio inclui
uma srie de transformaes de linguagens que se constituem por sua neutralidade e abrangncia
e que estabelecem rupturas na forma estrutural do texto, modificando sua forma. Por isso, a
transposio passa a ser o termo mais adequado para explicar o processo no qual uma obra
literria submetida linguagem cinematogrfica.

Consideraes Finais
A necessidade humana em desejar a constante presena da narrativa nos meios miditicos pode
explicar a grande incidncia da literatura presente na arte cinematogrfica. Mas atribuir toda
responsabilidade do eixo existente entre literatura e cinema ao processo narrativo seria uma viso
muito simplista, resultando em desconsiderao de todas as etapas pertinentes ao processo de
transposio. A extrema necessidade relacionada narrativa talvez seja explicada pelo desejo
insacivel do homem com o imaginrio e o seu universo onrico. Estaria o homem moderno
contguo s novas tendncias contemporneas, necessitando reafirma r suas relaes literrias
atravs do cinema? Ou estaria ele exaurido de novas experincias, propiciando um processo de
retroalimentao ostentado em outra obra de arte? No decorrer da pesquisa poder emergir outras
reflexes motivadas por esse questionamento. Mas o que se pode afirmar, sem receios, que o
cinema continua, nos dias atuais, a se utilizar da literatura como forma de reafirmar a constante
relao existente entre as duas linguagens.

Referncias Bibliogrficas
AMARAL, Adriana. Cidado Slade: a vida de um homem seu intertexto (2003). Disponvel em:
<http://www.bocc.ubi.pt/pag/amaral-adriana -velvet-goldmine.pdf>. Consultado em: 16 nov. 2005 7 p.
CAMPOS, Cecy Barbosa. Hitchcock x Brian de Palma: A intertextualidade flmica (2000). Disponvel
em: <http://www.letras.ufmg.br/abrapui/senapulli2000/Cinema%20Brian%20001.pdf>,
consultado em 20 mai. 2006. 13 p.

DINIZ, Thais F.N. Os Enleios de Lear: da semitica a traduo cultural (1996). Disponvel em: <
http://www.thais-flores.pro.br>. Consultado em 16 fev. 2006
EPSTEIN, Jason. O Negcio do Livro: passado, presente e futuro do mercado editorial. Rio de Janeiro:
Ed. Record, 2002. 170 p.

PLAZA, Jlio. Traduo Intersemitica. So Paulo: Editora Perspectiva, 2003. 210 p.

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