Cartas A Um Jovem Terapeuta

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Livros

Cartas a um jovem terapeuta: reflexes para psicoterapeutas, aspirantes e curiosos


Contardo Calligaris. Rio de Janeiro: Campus; 2004. ISBN 85-352-1493-3

Vrios autores recorrem ao formato cartas ao escrever um livro. Lembrem de Cartas a um jovem poeta, de Rainer Maria Rilke, ou de As ligaes perigosas, de Choderlos de Laclos, que o prprio Calligaris cita numa anedota ao final do livro. uma forma segura de manter a ateno do leitor, no s pelo interesse voyeurista que desperta, como pela simplicidade da linguagem que o estilo pede. Nas cartas, Calligaris se dirige a dois jovens em incio de carreira e procura dar-lhes uma noo do que e do que no ser terapeuta. Aborda temas polmicos (como de seu estilo) e trata tambm de questes clssicas tais como o que deve ser o setting, o que seria cura em psicoterapia, o que fazer com o amor transferencial, etc. Dentre os temas polmicos, trata da eterna questo psicoterapia versus neurocincias, sendo que fala da psicoterapia na sua vertente analtica, assim como da prpria psicanlise. interessante que aqui se possa falar um pouco dessa abordagem, j que a maioria das publicaes recentes na literatura psiquitrica se refere psicoterapia de orientao cognitiva e/ou comportamental. O autor diz abertamente que, na prtica, se muitas vezes cognitivista ou behaviorista, ou seja, no se analista 100% do tempo. E no descarta, portanto, a necessidade de se informar de tcnicas outras ainda que se queira utilizar a psicanlise como mtodo ou teoria explicativa do funcionamento psquico. Pensamos que essa postura uma faca de dois gumes. Por um lado, um alvio algum falar s claras daquilo que muitos profissionais pensam e fazem, mas no dizem abertamente, talvez por medo das suas instituies de origem ou pela adeso excessivamente rgida aos cnones do referencial terico de predileo. Por outro, a um profissional em incio de carreira pode dar a noo equivocada de que as coisas so mais simples do que na realidade podem ser. Uma das utilidades da leitura para os jovens terapeutas, sejam das reas psiquitrica ou psicolgica, que o livro tenta dar uma noo da importncia de cada uma delas, sem discriminao e sem conflitos. Calligaris nos d como exemplo um paciente deprimido que, uma vez medicado, pode voltar a ter condies de participar ativamente de sua psicoterapia, ao contrrio do que pensam alguns profissionais biolgicos (que atribuem a melhora exclusivamente medicao) e dos seus correspondentes psicanalticos na ortodoxia, que muitas vezes so contra a medicao por pensar que esta no cura, apenas anestesia o sintoma. Talvez a parte mais interessante do livro seja a crtica que faz do distanciamento apresentado pelo discurso psicanaltico em algumas instituies em relao ao que deveria ser o seu objeto: o trabalho com o paciente. justamente a que est o seu maior mrito: situa a terapia no consultrio, ocorrendo entre duas pessoas, uma querendo se livrar de alguma forma de sofrimento e outra procurando viver do trabalho de cuidar
Rev Bras Psiquiatr. 2005;27(2):168-9

dessa pessoa. Pode parecer bvio, mas no freqente que textos tcnicos tratem de assuntos como O que fazer para ter mais pacientes?, O que dizer ao paciente sobre a terapia no incio do tratamento? ou E se o paciente me d sono?, mesmo que essas perguntas sejam assduas entre as preocupaes no s dos iniciantes. Nesse particular, o livro de Calligaris ganha por no ser tcnico. Assim, cremos que o livro, de fcil e rpida leitura, poderia at ser indicado, no como obra bsica, evidentemente, mas como leitura auxiliar pelos cursos, nem que seja para desencadear e ampliar um debate que saudvel, necessrio e que remeta s obras de referncia, num tempo em que frmulas mgicas so procuradas. Uma coisa continua certa: quer para o terapeuta mdico, quer para o terapeuta psiclogo, o caminho no fcil e o entendimento dessas pequenas coisas, se no consegue torn-lo menos rduo, pelo menos alerta para que certas dificuldades requerem, alm da tcnica, sensibilidade e intuio. Ana Gabriela Hounie Projeto Transtornos do Espectro Obsessivo -Compulsivo (PROTOC) do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clnicas da Faculdade de Medicina da Universidade de So Paulo (FMUSP) Cludio Augusto Duque Sociedade Psicanaltica de Pernambuco

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