O dia em que o presidente desapareceu
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O dia em que o presidente desapareceu - Bill Clinton
Clóvis Marques
1ª edição
2018
CIP-BRASIL. CATALOGAÇÃO NA PUBLICAÇÃO
SINDICATO NACIONAL DOS EDITORES DE LIVROS, RJ
Clinton, Bill, 1946-
C572d
O dia em que o presidente desapareceu [recurso eletrônico] / Bill Clinton, James Patterson ; tradução Clóvis Marques. - 1. ed. - Rio de Janeiro : Record, 2018.
recurso digital
Tradução de: The president is missing
Formato: epub
Requisitos do sistema: adobe digital editions
Modo de acesso: world wide web
ISBN 978-85-01-10102-0 (recurso eletrônico)
1. Romance americano. 2. Livros eletrônicos. I. Patterson, James. II. Marques, Clóvis. III. Tzítulo.
18-49548
CDD: 813
CDU: 82-31(73)
Meri Gleice Rodrigues de Souza - Bibliotecária CRB-7/6439
Título original:
The President is Missing
Copyright © 2018 by James Patterson and William Jefferson Clinton
Este livro foi publicado mediante acordo com The Knopf Doubleday Group, uma divisão da Penguin Random House LLC e Little, Brown and Company, uma divisão da Hachette Book Group, Inc.
Texto revisado segundo o novo Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa.
Todos os direitos reservados. Proibida a reprodução, no todo ou em parte, através de quaisquer meios. Os direitos morais dos autores foram assegurados.
Direitos exclusivos de publicação em língua portuguesa somente para o Brasil adquiridos pela
EDITORA RECORD LTDA.
Rua Argentina, 171 – Rio de Janeiro, RJ – 20921-380 – Tel.: (21) 2585-2000, que se reserva a propriedade literária desta tradução.
Produzido no Brasil
ISBN 978-85-01-10102-0
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Atendimento e venda direta ao leitor:
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Um agradecimento especial a Robert Barnett, nosso advogado e amigo, que nos reuniu para a realização deste livro, aconselhou, persuadiu e eventualmente falou grosso.
Obrigado também a David Ellis, sempre paciente, sempre sábio, que ficou ao nosso lado durante a pesquisa, no primeiro e no segundo esboços e nas muitas e muitas fases de redação. Esta não seria a mesma história sem a ajuda e a inspiração de David.
A Hillary Clinton, que conviveu com essa ameaça e a ela resistiu, assim como às consequências de ter tido suas advertências ignoradas, pelo seu constante estímulo e pelo lembrete de manter a história realista.
A Sue Solie Patterson, que aprendeu a arte de criticar e estimular, não raro ao mesmo tempo.
A Mary Jordan, que mantém a cabeça no lugar mesmo quando todos ao redor a estão perdendo.
A Deneen Howell e Michael O’Connor, que fazem com que todos nós respeitemos o contrato, os prazos e as metas.
A Tina Flournoy e Steve Rinehart, por ajudarem o parceiro novato a cumprir sua parte do trato.
E aos homens e mulheres do Serviço Secreto dos Estados Unidos e a todos os outros encarregados da ordem pública, das Forças Armadas, dos serviços de informações e da diplomacia que dedicam suas vidas a nos manter em segurança.
Sumário
Quinta-feira, 10 de Maio
Capítulo 1
Capítulo 2
Capítulo 3
Sexta-feira, 11 de Maio
Capítulo 4
Capítulo 5
Capítulo 6
Capítulo 7
Capítulo 8
Capítulo 9
Capítulo 10
Capítulo 11
Capítulo 12
Capítulo 13
Capítulo 14
Capítulo 15
Capítulo 16
Capítulo 17
Capítulo 18
Capítulo 19
Capítulo 20
Capítulo 21
Capítulo 22
Capítulo 23
Capítulo 24
Capítulo 25
Capítulo 26
Capítulo 27
Capítulo 28
Capítulo 29
Capítulo 30
Capítulo 31
Capítulo 32
Capítulo 33
Capítulo 34
Capítulo 35
Capítulo 36
Capítulo 37
Capítulo 38
Capítulo 39
Capítulo 40
Capítulo 41
Capítulo 42
Sábado nos Estados Unidos
Capítulo 43
Capítulo 44
Capítulo 45
Capítulo 46
Capítulo 47
Capítulo 48
Capítulo 49
Capítulo 50
Capítulo 51
Capítulo 52
Capítulo 53
Capítulo 54
Capítulo 55
Capítulo 56
Capítulo 57
Capítulo 58
Capítulo 59
Capítulo 60
Capítulo 61
Capítulo 62
Capítulo 63
Capítulo 64
Capítulo 65
Capítulo 66
Capítulo 67
Capítulo 68
Capítulo 69
Capítulo 70
Capítulo 71
Capítulo 72
Capítulo 73
Capítulo 74
Capítulo 75
Capítulo 76
Capítulo 77
Capítulo 78
Capítulo 79
Capítulo 80
Capítulo 81
Capítulo 82
Capítulo 83
Capítulo 84
Capítulo 85
Capítulo 86
Capítulo 87
Capítulo 88
Capítulo 89
Capítulo 90
Capítulo 91
Capítulo 92
Capítulo 93
Capítulo 94
Capítulo 95
Capítulo 96
Capítulo 97
Capítulo 98
Capítulo 99
Capítulo 100
Capítulo 101
Capítulo 102
Capítulo 103
Capítulo 104
Capítulo 105
Capítulo 106
Capítulo 107
Capítulo 108
Capítulo 109
Capítulo 110
Capítulo 111
Capítulo 112
Capítulo 113
Capítulo 114
Capítulo 115
Capítulo 116
Capítulo 117
Capítulo 118
Capítulo 119
Capítulo 120
Capítulo 121
Capítulo 122
Capítulo 123
Domingo
Capítulo 124
Capítulo 125
Capítulo 126
Segunda-feira
Capítulo 127
Capítulo 128
Epílogo
Agradecimentos
QUINTA-FEIRA,
10 DE MAIO
CAPÍTULO
1
— Ordem na Comissão...
Os tubarões espreitam, as narinas farejam o odor de sangue. Treze tubarões para ser exato, oito do partido da oposição e cinco do meu, tubarões contra os quais venho preparando defesas com a ajuda de advogados e assessores. Aprendi a um custo bem alto que, por mais que se esteja preparado, poucas defesas são eficientes contra predadores. Em certo momento, não resta nada a fazer a não ser entrar na briga e revidar.
Não faça isso, voltou a pedir na noite passada minha chefe de Gabinete, Carolyn Brock, como já havia pedido tantas vezes. O senhor não deve chegar nem perto de uma sessão dessa comissão. O senhor tem tudo a perder e nada a ganhar.
O senhor não pode responder as perguntas deles.
Isso vai acabar com a sua presidência.
Examino os treze rostos diante de mim, sentados em uma longa fileira, uma Inquisição espanhola moderna. O sujeito de cabelo grisalho no meio, atrás da placa SR. RHODES, pigarreia.
Lester Rhodes, o presidente da Câmara, em geral não participa desse tipo de sessão, mas abriu uma exceção para esta Comissão Especial, que encheu de congressistas alinhados com ele, cujo principal objetivo na
vida aparentemente é impedir que eu realize meu programa de governo e me destruir, política e pessoalmente. A brutalidade na luta pelo poder é mais antiga que a Bíblia, mas alguns dos meus adversários de fato me odeiam com todas as forças. Eles não querem só me tirar do cargo. Não vão ficar satisfeitos se eu não for condenado e arrastado para a prisão, esquartejado e apagado dos livros de história. Se pudessem, queimariam minha casa na Carolina do Norte e cuspiriam no túmulo da minha esposa.
Estico a haste do microfone para que ele fique firme e estendido, bem próximo de mim. Não quero me inclinar para a frente ao falar enquanto os membros da comissão ficam sentados bem empertigados em suas cadeiras de encosto alto de couro, como reis e rainhas no trono. Eu pareceria fraco se me inclinasse, subserviente, uma mensagem subliminar de que estou à mercê deles.
Estou isolado na minha cadeira. Nenhum assessor, nenhum advogado, nenhuma anotação. O povo americano não vai me ver trocando sussurros com um advogado, tapando o microfone com a mão para em seguida declarar que Não me recordo disso, senhor congressista. Não tenho nada a esconder. Eu nem devia estar aqui, e podem ter certeza de que não queria estar aqui, mas aqui estou. Sozinho. O presidente dos Estados Unidos diante de uma turba de acusadores.
No canto do salão, o triunvirato dos meus principais assessores observa, todos sentados: a chefe de Gabinete, Carolyn Brock; Danny Akers, meu amigo mais antigo e consultor jurídico da Casa Branca; e Jenny Brickman, vice-chefe de Gabinete e assessora política sênior. Os três em uma atitude estoica, rostos impassíveis, preocupados. Nenhum deles queria que eu fizesse isso. Concluíram de forma unânime que eu estava cometendo o maior erro da minha presidência.
Mas aqui estou. Chegou a hora. Vamos ver se eles tinham razão.
— Senhor presidente.
— Senhor presidente da Câmara. — Tecnicamente, neste contexto, provavelmente eu deveria chamá-lo de senhor presidente da Comissão, mas eu poderia chamá-lo de muitas coisas e não vou fazê-lo.
A coisa poderia começar de muitas maneiras. Um discurso de congratulação pessoal do presidente da Câmara disfarçado de pergunta. Algumas perguntas introdutórias sem maiores impactos. Mas vi vários vídeos de Lester Rhodes interrogando testemunhas antes de presidir a Câmara, quando ele não passava de um congressista medíocre da Comissão de Supervisão da Câmara, e sei que ele gosta de começar falando grosso, indo direto na jugular, confundindo a testemunha. Ele sabe — na verdade, desde 1988, quando Michael Dukakis enfiou os pés pelas mãos na primeira pergunta do debate presidencial sobre pena de morte, todo mundo sabe — que, se você erra logo na largada, ninguém vai se lembrar de mais nada.
Será que o presidente da Câmara vai seguir o mesmo plano de ataque com um presidente em exercício?
Claro que vai.
— Presidente Duncan — começa ele —, desde quando oferecemos proteção a terroristas?
— Não oferecemos — respondo, tão rápido que quase atropelo a fala dele, pois não se pode dar trela a uma pergunta dessas. — E jamais ofereceremos. Não enquanto eu for presidente.
— O senhor tem certeza?
Foi isso mesmo o que ele acabou de dizer?! Senti o sangue subir à cabeça. Não se passou nem um minuto e Lester já me deixou neste estado.
— Senhor presidente da Câmara, se eu disse é porque tenho certeza. Vamos deixar as coisas bem claras desde o início. Ninguém aqui está protegendo terroristas.
Depois dessa chamada, ele faz uma pausa.
— Bem, senhor presidente, não vamos discutir por escolhas de palavras. O senhor considera que os Filhos da Jihad são uma organização terrorista?
— É claro. — Meus assessores me aconselharam a não falar é claro; pode soar pretensioso e condescendente, a menos que seja dito no tom certo.
— E esse grupo tem recebido apoio da Rússia, não é verdade?
Eu faço que sim com a cabeça.
— Sim, a Rússia tem dado apoio ao grupo terrorista FdJ de tempos em tempos. E nós condenamos o fato de apoiarem esse grupo e outras organizações terroristas.
— Os Filhos da Jihad cometeram atos de terrorismo em três continentes, correto?
— Sim, é o que se sabe.
— Eles são responsáveis pela morte de milhares de pessoas?
— Sim.
— Inclusive americanos?
— Sim.
— As explosões que mataram cinquenta e sete pessoas no hotel Bellwood Arms, em Bruxelas, inclusive uma delegação de deputados estaduais da Califórnia? A invasão do sistema de controle aéreo da república da Geórgia, que provocou a queda de três aviões, sendo que um deles transportava o embaixador georgiano nos Estados Unidos?
— Sim. Ambos os atentados ocorreram antes de eu assumir a presidência, mas, sim, os Filhos da Jihad assumiram a responsabilidade por esses incidentes...
— OK, vamos então falar do que aconteceu desde que o senhor assumiu a presidência. Não é verdade que, meses atrás, os Filhos da Jihad invadiram os sistemas militares israelenses e tornaram públicas informações confidenciais sobre agentes secretos e movimentos de tropas israelenses?
— Sim, é verdade.
— E, muito mais perto de nós, aqui na América do Norte. Na semana passada mesmo. Sexta-feira, dia 4 de maio. Não é verdade que os Filhos da Jihad cometeram mais um atentado terrorista ao invadir os computadores que controlam o sistema de metrô de Toronto para desligá-lo, provocando um descarrilamento com dezessete mortos e dezenas de feridos, além de ter deixado milhares de pessoas presas no escuro durante horas?
Ele está certo ao dizer que o FdJ também foi responsável nesse caso. E o número de vítimas está certo. Para o FdJ, contudo, não foi um atentado terrorista.
Foi apenas um ensaio.
— Quatro das vítimas que morreram em Toronto eram americanas, correto?
— Correto. Os Filhos da Jihad não assumiram a responsabilidade neste caso, mas acreditamos que tenham sido eles.
O presidente da Câmara assente com a cabeça e examina as anotações.
— O líder dos Filhos da Jihad, senhor presidente... É um indivíduo chamado Suliman Cindoruk, correto?
Lá vamos nós.
— Sim, Suliman Cindoruk é o líder do FdJ.
— O mais perigoso e atuante ciberterrorista do mundo, correto?
— Pode-se dizer que sim.
— Um muçulmano nascido na Turquia, não é?
— Ele é turco, mas não é muçulmano — corrijo. — É um nacionalista radical secular contrário à influência do Ocidente na Europa Central e no sudeste europeu. Sua jihad
não tem nada a ver com religião.
— É o que o senhor diz.
— É o que dizem todos os relatórios dos serviços de informações que recebi — rebato. — O senhor também leu todos eles, senhor presidente da Câmara. Se o senhor quer transformar isto aqui num discurso raivoso islamofóbico, vá em frente, mas essa atitude não vai contribuir em nada para a segurança do nosso país.
Ele consegue abrir um sorriso irônico.
— De qualquer maneira, ele é o terrorista mais procurado do mundo, não é?
— Nós queremos capturá-lo — respondo. — Queremos capturar qualquer terrorista que tente atacar o nosso país.
Lester faz uma pausa. Está decidindo se volta a me perguntar: O senhor tem certeza? Se ele fizer isso, vou precisar reunir toda a minha força de vontade para não virar esta mesa e esganá-lo.
— Só para deixar claro, então — retoma ele. — Os Estados Unidos querem capturar Suliman Cindoruk.
— Esta não é uma questão que precisa ser esclarecida — retruco. — Jamais houve a menor dúvida. Jamais. Há uma década estamos à procura de Suliman Cindoruk. E não vamos desistir até capturá-lo. Está bem claro agora?
— Bem, senhor presidente, com o devido respeito...
— Não — interrompo. — Quando o senhor começa uma pergunta dizendo com o devido respeito
, significa que vai dizer algo que não demonstra o menor respeito. Não importa o que pense, senhor presidente da Câmara, mas o senhor precisa demonstrar respeito, se não por mim, pelo menos por todas as pessoas que se dedicam a combater o terrorismo e preservar a segurança do nosso país. Não somos perfeitos nem nunca seremos. Mas nunca vamos deixar de fazer o nosso melhor.
Então faço um gesto de desdém para ele.
— Vá em frente, faça a sua pergunta.
Com o pulso acelerado, respiro fundo e olho para meu trio de assessores. Jenny, minha conselheira política, está assentindo com a cabeça; ela sempre quis que eu fosse mais agressivo com o novo presidente da Câmara. Danny não deixa transparecer nada. Carolyn, minha equilibrada chefe de Gabinete, está inclinada para a frente, os cotovelos apoiados nos joelhos, as mãos juntas sob o queixo. Se fossem juízas nos Jogos Olímpicos, Jenny me daria um 9 pela explosão de raiva, mas Carolyn não passaria do 5.
— O senhor não pode questionar meu patriotismo, senhor presidente — diz meu adversário grisalho. — O povo americano está bastante preocupado com o que aconteceu na Argélia na semana passada, e ainda nem começamos a falar do assunto. O povo americano tem todo o direito de saber de que lado o senhor está.
— De que lado eu estou? — intervenho num impulso, quase derrubando o microfone da mesa. — Eu estou do lado do povo americano, é do lado dele que eu estou.
— Senhor pres...
— Eu estou do lado desse povo que trabalha dia e noite para garantir a segurança do nosso país. Das pessoas que não estão preocupadas com visões de mundo nem com os caminhos da política. Das pessoas que não esperam elogios quando acertam nem têm como se defender quando são criticadas. É do lado dessas pessoas que eu estou.
— Presidente Duncan, eu dou todo o apoio aos homens e às mulheres que lutam diariamente para garantir a segurança desta nação. Não estamos falando dessas pessoas. O foco aqui é o senhor. Isto aqui não é uma brincadeira. Eu não sinto prazer nisso.
Em outras circunstâncias, eu acharia graça. Lester Rhodes ansiava mais pela sessão da Comissão Especial do que um universitário pelo aniversário de 21 anos.
Toda essa encenação é para aparecer. O presidente da Câmara Rhodes montou a comissão de tal forma que o resultado não pode ser diferente: uma constatação de má conduta por parte do presidente dos Estados Unidos, suficiente para remeter a questão à comissão julgadora da Câmara e dar início ao processo de impeachment. Os oito congressistas alinhados a Lester estão seguros em seus distritos eleitorais, territórios tão bem controlados, que eles poderiam até baixar as calças no meio da sessão e começar a chupar o dedo que não só seriam reeleitos dentro de dois anos como não teriam adversários.
Meus assessores estavam certos. Não faz a menor diferença se as provas contra mim são fortes, inconsistentes ou se não existem. A sorte foi lançada.
— Faça suas perguntas — peço. — Vamos acabar logo com esta farsa.
Lá no canto, Danny Akers se inquieta e sussurra alguma coisa para Carolyn, que acena positivamente com a cabeça, mantendo a expressão impassível. Sem dúvida Danny não aprova meu comentário sobre a farsa, meu ataque à sessão. Mais de uma vez ele me disse que o que eu tinha feito era ruim, muito ruim
e dava ao Congresso uma justificativa plausível para a investigação.
Ele não está errado. Só não sabe a história toda. Danny não tem acesso suficiente às informações de segurança para saber o que eu sei, o que Carolyn sabe. Se soubesse, pensaria de outra forma. Teria conhecimento da ameaça ao país, uma ameaça com um alcance jamais visto antes.
Uma ameaça que me levou a fazer coisas que jamais imaginei que faria.
— Senhor presidente, o senhor ligou para Suliman Cindoruk no domingo, 29 de abril deste ano? Há pouco mais de uma semana. O senhor fez ou não contato telefônico com o terrorista mais procurado do mundo?
— Senhor presidente da Câmara, como eu já disse muitas vezes, e como o senhor deveria saber, nem tudo o que fazemos para garantir a segurança do país pode ser revelado ao público. O povo americano sabe que para manter a segurança dos Estados Unidos e cuidar das relações exteriores é preciso mover muitas peças, realizar muitos acordos complexos, e que certas providências tomadas no meu governo precisam ser mantidas em sigilo. Não porque queremos manter as coisas em segredo, mas porque precisamos. Por isso existe o privilégio executivo.
Lester provavelmente contestaria a aplicabilidade do privilégio executivo a assuntos confidenciais. Mas Danny Akers, meu conselheiro na Casa Branca, considera que eu vou vencer esta briga, pois está em questão minha autoridade constitucional nas relações exteriores.
Seja como for, senti o estômago embrulhar ao dizer essas palavras. Mas Danny falou que, se eu não invocar o privilégio, posso estar abrindo mão dele. E, se abrir mão, vou ter de responder se liguei para Suliman Cindoruk, o terrorista mais procurado do mundo, dois domingos atrás.
E essa é uma pergunta que não vou responder.
— Bem, senhor presidente, não tenho certeza se o povo americano consideraria essa uma resposta satisfatória.
Bem, senhor presidente da Câmara, tampouco creio que o povo americano o consideraria um presidente da Câmara satisfatório, mas, de qualquer forma, o povo americano não o elegeu para o cargo, não é? O senhor recebeu inexpressivos oitenta mil votos no terceiro distrito em Indiana. Eu tive sessenta e quatro milhões de votos. Mas os seus parceiros de partido o elegeram líder porque o senhor conseguiu arrecadar muito dinheiro para eles e lhes prometeu minha cabeça numa bandeja.
Provavelmente essa réplica não ficaria bem na televisão.
— Então o senhor não nega que ligou para Suliman Cindoruk no dia 29 de abril. É isso mesmo?
— Eu já respondi a sua pergunta.
— Não, senhor presidente, o senhor não respondeu. Como sabe, o jornal francês Le Monde publicou gravações telefônicas que vazaram, além da declaração de uma fonte anônima, que indicam que o senhor ligou e falou com Suliman Cindoruk no dia 29 de abril deste ano. O senhor tem conhecimento disso?
— Eu li o artigo.
— E o senhor nega?
— A resposta é a mesma de antes. Eu não vou discutir a questão. Eu não vou entrar no jogo do fiz ou não fiz a ligação
. Não confirmo nem nego, eu sequer discuto ações tomadas para garantir a segurança do país. Não quando tenho de mantê-las em segredo pelo bem da segurança nacional.
— Bem, senhor presidente, se um dos maiores jornais da Europa publica uma matéria sobre o assunto, eu não tenho certeza se a ação continua sendo um segredo.
— Minha resposta é a mesma — insisto. Meu Deus, eu estou parecendo um idiota! Pior, um advogado.
— O jornal Le Monde informa que... — e ele segura o jornal. — O presidente dos Estados Unidos, Jonathan Duncan, tomou a iniciativa e participou de uma ligação com Suliman Cindoruk, líder dos Filhos da Jihad e um dos terroristas mais procurados do mundo, na tentativa de encontrar um meio-termo entre a organização terrorista e o Ocidente.
O senhor nega, senhor presidente?
Não posso responder, e ele sabe disso. Lester está me jogando de um lado para o outro, como um gato brincando com um novelo de lã.
— Eu já dei a minha resposta. Não vou repetir.
— A Casa Branca não fez nenhum comentário sobre essa notícia do Le Monde.
— Exato.
— Mas Suliman Cindoruk fez, não é? Ele divulgou um vídeo dizendo: O presidente pode implorar por misericórdia quanto quiser. Os americanos não vão ter misericórdia nenhuma da minha parte.
Não foi isso o que ele disse?
— Foi isso o que ele disse.
— A Casa Branca então divulgou uma declaração oficial que dizia: Os Estados Unidos não responderão aos absurdos ditos por um terrorista.
— Exatamente. Não responderemos.
— O senhor implorou misericórdia a ele, senhor presidente?
Minha assessora política, Jenny Brickman, está quase arrancando os cabelos. Ela também não tem acesso a certas informações, por isso não conhece a história toda, mas sua maior preocupação é que nessa sessão eu seja visto como um presidente combativo. Se não tiver como dar o troco, disse, então não vá. O senhor vai servir apenas de saco de pancadas político para eles.
E ela estava certa. Nesse exato momento, é a vez de Lester Rhodes colocar as luvas e bater em mim na esperança de extrair informações confidenciais e deslizes políticos.
— O senhor está balançando a cabeça negativamente, senhor presidente. Só para ficar claro: o senhor nega que implorou a Suliman Cindoruk que tivesse mis...
— Os Estados Unidos nunca vão implorar nada a ninguém — intervenho.
— OK, o senhor então nega a afirmação de Suliman Cindoruk de que o senhor implorou...
— Os Estados Unidos nunca vão implorar nada a ninguém — repito. — Está claro, senhor presidente da Câmara? O senhor quer que eu diga de novo?
— Bem, se o senhor não implorou...
— Próxima pergunta.
— Então o senhor pediu educadamente que ele não nos atacasse?
— Próxima pergunta — repito.
Lester faz uma pausa e consulta as anotações.
— Meu tempo está acabando — diz então. — Tenho só mais algumas perguntas.
Um a zero — ou quase —, mas ainda faltam doze, cada um com suas frasezinhas matadoras, suas alfinetadas e suas perguntas capciosas.
As últimas perguntas do presidente da Câmara são tão lendárias quanto as primeiras. Mas, de qualquer maneira, eu já sei o que ele vai dizer. E ele já sabe que eu não vou ter como responder.
— Senhor presidente — começa ele —, vamos falar de terça-feira, 1º de maio. Na Argélia.
Pouco mais de uma semana atrás.
— Na terça-feira, 1º de maio, um grupo de separatistas ucranianos anti-Rússia atacou uma fazenda no norte da Argélia onde se acreditava que Suliman Cindoruk estivesse escondido. E de fato ele estava lá. O grupo tinha localizado o terrorista e se deslocou para a região com a intenção de matá-lo.
Mas o grupo foi impedido, senhor presidente, por uma equipe das Forças Especiais americanas e agentes da CIA. E assim Suliman Cindoruk conseguiu escapar.
Eu me mantenho completamente imóvel.
— O senhor ordenou esse contra-ataque? — questiona ele. — E, se ordenou, por quê? Por que um presidente dos Estados Unidos mandaria forças americanas para salvar a vida de um terrorista?
CAPÍTULO
2
— A presidência da Comissão convoca o cavalheiro de Ohio, sr. Kearns.
Aperto a ponte do nariz, lutando contra o cansaço. Dormi pouquíssimas horas no último fim de semana, e o exercício mental de me defender com as mãos atadas está acabando comigo. Mais que tudo, no entanto, estou irritado. Tenho muitas coisas a fazer. Não tenho tempo para isso.
Olho para a esquerda — o mostrador está correto. Mike Kearns é o presidente da comissão julgadora, um protegido de Lester Rhodes. Ele gosta de usar gravata-borboleta para que todo mundo saiba quanto é inteligente. Sinceramente, já vi recados em Post-its mais profundos.
Mas o sujeito sabe fazer uma pergunta. Ele foi promotor federal durante anos, antes de entrar na arena política. Entre as cabeças empalhadas na parede do seu gabinete estão dois CEOs de laboratórios farmacêuticos e um ex-governador.
— Combater o terrorismo é uma questão de segurança nacional muito séria, senhor presidente. O senhor concorda?
— Com certeza.
— Então o senhor concordaria também que qualquer cidadão americano que interferisse na nossa capacidade de conter terroristas poderia ser acusado de traição?
— Eu condenaria um ato dessa natureza.
— Isso seria um ato de traição?
— Isso cabe aos advogados e aos tribunais decidir.
Somos ambos advogados, mas ele entendeu.
— Seria um delito passível de impeachment se o próprio presidente interferisse no combate ao terrorismo?
Gerald Ford disse certa vez que um delito passível de impeachment é qualquer coisa que a maioria do Congresso decida que é.
— Não cabe a mim dizer.
Ele assente.
— Não, não cabe. Mais cedo, o senhor se recusou a responder se deu ordens para que Forças Especiais americanas e agentes da CIA contivessem uma investida contra Suliman Cindoruk na Argélia.
— O que eu disse, sr. Kearns, foi que certas questões de segurança nacional não podem ser discutidas em público.
— Segundo o New York Times, o senhor agiu com base em informações confidenciais que indicavam que essa milícia anti-Rússia tinha localizado Suliman Cindoruk e iria matá-lo.
— Eu li isso. Não tenho nenhum comentário a fazer.
Mais cedo ou mais tarde, todo presidente enfrenta decisões em que o melhor a fazer não é bom politicamente, pelo menos em curto prazo. Se o que está em jogo é muito importante, é necessário fazer o que se considera certo, na esperança de que os rumos da política mudem. É o trabalho que ele se comprometeu a fazer.
— Senhor presidente, o senhor conhece o título 18, seção 798, do Código dos Estados Unidos?
— Eu não guardo na memória as seções do Código dos Estados Unidos, sr. Kearns, mas creio que esteja se referindo à Lei de Espionagem.
— De fato, estou, senhor presidente. Diz respeito ao uso indevido de informações confidenciais. Um trecho relevante neste momento diz que constitui delito federal se valer deliberadamente de informações confidenciais em prejuízo da segurança ou dos interesses dos Estados Unidos. Isso parece correto?
— Tenho certeza de que sua leitura foi precisa, sr. Kearns.
— Se um presidente deliberadamente usa informações confidenciais para proteger um terrorista que quer nos atacar, isso se enquadraria nessa lei?
Não de acordo com o meu conselheiro na Casa Branca, pois, segundo ele, essa seção não se aplica ao presidente, o que seria uma leitura inédita da Lei de Espionagem, podendo um presidente então tornar pública qualquer informação que queira.
Mas isso não vem ao caso. Ainda que eu quisesse entrar num debate jurídico-semântico sobre o alcance de uma lei federal — o que eu não quero —, a verdade é que eles podem me destituir do cargo por qualquer motivo. Não precisa ser um crime.
Tudo o que fiz foi para proteger o meu país. E faria de novo. O problema é que não posso dizer nada disso.
— Tudo o que posso dizer ao senhor é que sempre agi tendo em mente a segurança do meu país. E será sempre assim.
Vejo Carolyn lá no canto, lendo algo no celular, respondendo. Mantenho contato visual com ela, caso precise largar tudo isso e agir em função do seu feedback. Algo do general Burke no Comando Central? Do vice-secretário de Defesa? Da Equipe de Emergência para Ameaças Iminentes? Estamos lidando com muitas coisas ao mesmo tempo, tentando acompanhar os acontecimentos e nos defender dessa ameaça. O próximo golpe pode vir a qualquer momento. Temos mais um dia, pelo menos — ou é o que esperamos. Mas a única certeza é que nada é certo. Precisamos estar sempre preparados para o caso de...
— Ligar para os líderes do Estado Islâmico é proteger o nosso país?
— O quê? — pergunto, voltando o foco para a sessão. — Do que o senhor está falando? Eu jamais liguei para os líderes do Estado Islâmico. O que o Estado Islâmico tem a ver com isso?
Antes de concluir minha resposta, eu me dou conta do que acabei de fazer. Gostaria de poder esticar o braço, segurar as palavras e enfiá-las de novo na boca. Mas já é tarde. Ele me pegou de jeito enquanto eu estava distraído.
— Ah, quer dizer então que, quando eu pergunto se o senhor ligou para os líderes do Estado Islâmico, o senhor responde que não, sem hesitar. Mas, quando o presidente da Comissão pergunta se o senhor ligou para Suliman Cindoruk, o senhor recorre ao privilégio executivo
. Acho que o povo americano é capaz de perceber a diferença.
Suspiro e olho para Carolyn Brock, que continua com aquela expressão implacável, embora eu imagine ter visto um sutil eu bem que avisei em seus olhos semicerrados.
— Congressista Kearns, essa é uma questão de segurança nacional. Não estamos aqui num jogo de te peguei. São assuntos sérios. Quando o senhor quiser fazer uma pergunta séria, terei prazer em responder.
— Um cidadão americano morreu nesse combate na Argélia, senhor presidente. Um cidadão americano, um agente da CIA chamado Nathan Cromartie, morreu ao impedir que essa milícia anti-Rússia matasse Suliman Cindoruk. Acho que o povo americano considera isso um assunto sério.
— Nathan Cromartie foi um herói. Lamentamos a sua perda. Eu lamento a sua perda.
— O senhor ouviu o que a mãe dele disse sobre o assunto.
Ouvi. Todo mundo ouviu. Nada do que ocorreu na Argélia foi divulgado ao público. Não podíamos fazer isso. Até que o grupo miliciano publicou o vídeo de um americano morto, e não demorou para que Clara Cromartie o identificasse como seu filho, Nathan. E também revelou que ele era agente da CIA. Ela jogou a merda no ventilador. A mídia caiu em cima da sra. Cromartie, e em questão de horas ela exigia saber por que seu filho teve de morrer para proteger um terrorista responsável pela morte de centenas de inocentes, entre eles muitos americanos. Em sua profunda dor, ela praticamente escreveu o roteiro da sessão da Comissão Especial.
— O senhor não acha que deve algumas respostas à família Cromartie, senhor presidente?
— Nathan Cromartie foi um herói — repito. — Ele era um patriota. E sabia tão bem quanto qualquer um que muito do que é feito no interesse da segurança nacional não pode ser discutido publicamente. Eu tive uma conversa particular com a sra. Cromartie e sinto profundamente pelo que aconteceu ao filho dela. Mas não direi nada além disso. Não posso e não vou.
— Pois bem, senhor presidente, em retrospecto — prossegue ele —, o senhor diria talvez que sua política de negociar com terroristas não funcionou tão bem assim?
— Eu não negocio com terroristas.
— Como quer que o senhor queira chamar isso: ligar para terroristas, acertar as coisas com eles, ser indulgente com eles...
— Eu não sou...
As luzes piscam duas vezes. Alguns dos presentes reagem com um suspiro, e Carolyn Brock se empertiga e faz uma anotação mental.
Kearns se aproveita da pausa para lançar outra pergunta.
— O senhor não faz nenhum segredo, senhor presidente, de que prefere o diálogo a demonstrações de força, de que preferiria resolver as coisas com os terroristas em uma conversa.
— Não — respondo, prolongando a palavra, o sangue pulsando nas têmporas, pois esse tipo de simplificação exagerada resume tudo o que há de errado na nossa política —, o que eu tenho dito muitas vezes é que, se houver uma forma pacífica de resolver uma situação, essa é a melhor forma. Dialogar não é se render. Nós estamos aqui para debater política externa, senhor congressista? Longe de mim interromper essa caça às bruxas com uma conversa realmente significativa...
Olho de relance para o canto do salão, onde Carolyn Brock se encolhe, uma rara mudança em sua expressão implacável.
— Dialogar com o inimigo é uma coisa, senhor presidente. Ser indulgente é outra.
— Eu não sou indulgente com os nossos inimigos. Nem abro mão do uso da força ao lidar com eles. A força é sempre uma alternativa, mas só a emprego quando considero necessário. Talvez isso não seja fácil de entender para um filhinho da mamãe que passou a vida se enchendo de cerveja na faculdade, fazendo juramentos para alguma fraternidade secreta e chamando os outros por apelidos, mas eu enfrentei o inimigo de frente num campo de batalha. Eu vou pensar muito bem antes de mandar nossos filhos e filhas para a guerra, porque eu fui um desses filhos e sei quais são os riscos.
Jenny está inclinada para a frente, querendo mais, sempre achando que eu preciso dar mais detalhes da minha vida no serviço militar. Fale do seu tempo no Exército. Fale do seu período como prisioneiro de guerra. Dos seus ferimentos, da tortura. Isso foi motivo para uma discussão sem fim durante a campanha presidencial, uma das coisas ao meu respeito que mais se revelaram positivas. Para os meus assessores, podia até ser o único assunto da minha campanha. Mas eu nunca cedi. De certas coisas não se fala.
— O senhor terminou, senhor pres...
— Não, eu não terminei. Eu já expliquei tudo isso à liderança da Câmara dos Deputados, ao presidente da Câmara e a outras pessoas. Eu disse que não podia comparecer a esta sessão. Os senhores poderiam ter dito: Tudo bem, senhor presidente, nós também somos patriotas e vamos respeitar o que o senhor está fazendo, mesmo que não possa nos dizer tudo o que está acontecendo.
Mas não foi isso que os senhores fizeram, foi? Os senhores não resistiram à oportunidade de me arrastar até aqui para que parecessem superiores. Então vou dizer aqui publicamente o que já disse aos senhores em particular: eu não vou responder as suas perguntas específicas sobre conversas que tive ou ações que tomei, pois são perguntas perigosas. Elas representam uma ameaça à nossa segurança nacional. Se eu tiver de perder o cargo para proteger o país, vou perdê-lo. Mas não se enganem. Eu nunca realizei uma única ação nem disse uma única palavra sem ter a segurança dos Estados Unidos como maior preocupação. Nem nunca o farei.
Meu interrogador não se intimida nem um pouco com meus insultos. Sem dúvida ele fica entusiasmado com o fato de suas perguntas estarem mexendo comigo. Kearns volta a consultar as anotações, seu fluxograma de perguntas e réplicas, enquanto tento me acalmar.
— Qual foi a decisão mais difícil que o senhor tomou esta semana, sr. Kearns? Que gravata usar na sessão? Para que lado pentear o cabelo nessa tentativa ridícula de disfarçar a calvície que não engana ninguém?
"Ultimamente, passo quase todo o meu