segunda-feira, 27 de fevereiro de 2017

Segunda feira de Carnaval

                                                    Segunda feira de Carnaval
Acordei pela manhã bem cedo, quando o sol enviou pela janela seus primeiros raios fazendo refletir o brilho das lantejoulas da minha fantasia que descansava sobre a cadeira.
Aos meus pés ronronando refestelado, Otávio soprava uns confetes sobreviventes da folia que teimavam e pairar sobre o seu nariz.
Arrastei meus chinelos de tigresa que combinam perfeitamente com o Baby doll da mesma estampa e me dirigi para ligar a cafeteira que me aguardava pronta desde a noite passada. Voltei para o quarto e Otávio continuava ronronando só que agora se espreguiçava inteiro como os gatos fazem gostosamente.
Entrei no Chuveiro e ia cantarolar "o teu cabelo não nega" mas me lembrei que agora é ofensivo cantar certas modinhas, me lembrei da "cabeleira do Zezé" e também desisti por que vai que o vizinho ouve e pensa que é provocação com ele, que é careca de pai e mãe!?
Dai entre uma ensaboada e outra me lembrei de cantar "Maria sapatão", ai mesmo foi que enchi a boca de água do chuveiro pensando; "deusmelivre" mexer em abelheiro logo cedo.
Resolvi então cantar Roberto Carlos e a música do Chuveiro, aquela que "o sabonete rola por teu corpo inteiro", dai acabei o banho que a água anda cara e rara para usar com tanta "Performance".
Vesti um abadá de outros carnavais botei um short esfiapado e um chapéu de palha e voltei à cozinha. Depois de um café, um suco, um pãozinho, meio papaia, granola, tapiocas doce e salgadas, um pedaço de pão de ló, uma fatia de queijo minas e "mais umas coisinhas" sai para a minha caminhada. 
Fui sozinha; o Otávio se negou a sair dos lençóis, pois havia pulado carnaval a noite toda e até me avisou que hoje não estaria para ninguém,  nem pro prefeito, nem para o governador e muito menos para a Faye Dunaway que nem sabe ler mais o que está escrito no papel e "causou" no Oscar. Aff...
Sai caminhando para voltar logo, antes que o sol descolasse a minha pele toda, e ainda lá na orla dei de cara com ninguém menos que Casey Affleck!!! 
Sim eu também fiquei pasma, mas ele nem parou só abanou a mão e continuou a corrida. 
Eu ainda dei parabéns pelo Oscar de melhor ator e ele abanou de volta, provavelmente para não ter de explicar mais uma vez o contratempo na entrega dos prêmios. Mas foi melhor assim a fama dele é de abusador...
Claro que voltei para casa em seguida, pois o sol já estava me fazendo mal pra cabeça.
Cheguei exausta, mas encontrei sobre a mesa um suco de laranja, acerola e gengibre com folhinhas de hortelã que em boa hora veio me refrescar e descansar.
Otávio já havia levantado e bordava lantejoulas com ar entediado... mas é sempre um cavalheiro...
Boa semana de Carnaval e modorra...

domingo, 12 de fevereiro de 2017

Saudade de Sentir Saudade


                                               Saudade de Sentir Saudade...
Hoje acordei com vontade de falar de saudade, não aquela dolorida, mas aquela de todos os tempos, aquela que nos remete à casa da nossa avó, ao cheiro de pão ou bolo saindo do forno, do picolé comprado na venda lá na esquina com a moedinha que ganhamos, do vestido novo, do sapato de verniz, com meia branca, que escorregava e acabou causando um tombo e o joelho ralado, de cantar na escola o Hino Nacional com a mão no peito, da prova em papel almaço e caneta (?), do lanche com doce (Mussi de banana ou goiaba), da volta para casa com os pés mergulhados na enxurrada do fim de tarde, do cheiro de sabão da gaveta da cozinha... Nossa!!!  Quantas lembranças de infância...
Mais à frente  a saudade das crianças voltando da escola feito andorinhas inquietas querendo todas contar as novidades ao mesmo tempo.
Saudade do cheiro de neném em casa, de ouvir o piano da vizinha tocando, da chuva no telhado e da gritaria feliz dos filhos jogando futebol na rua com os vizinhos embaixo do aguaceiro de verão.
Saudade do entra e sai de amigos e dos amigos dos filhos. Das risadas e das reclamações reivindicatórias de saídas e ou chegadas fora do combinado.
Saudades das  conversas que tínhamos durante as refeições e que geravam muitas polêmicas que eram resolvidas e comprovadas nos livros que viviam espalhados pela casa. Todos liam de tudo. Um dicionário fazia parte dos apetrechos de cozinha para tirar dúvidas. Muita saudade desse tempo.
Saudades dos muitos cachorros e tantos bichinhos que passaram pela nossa vida. Cada um com sua história assim como temos as nossas.
Saudades dos vizinhos amigos e dos amigos vizinhos. Lembranças boas de momentos únicos onde dividimos  algumas lágrimas e  muitas alegrias.
Saudade do tempo em que eu arrumava tempo para ajudar quem precisasse independente de tudo o que havia por fazer. Fazia de coração e ainda faço quando a oportunidade aparece só para ver novamente o sorriso voltar ao rosto triste e aflito. É uma sensação única.
Sinto saudade do tempo em que problema não era problema porque com fé em Deus sempre dei jeito e encontrei solução.
Saudade de ter saudade, pois o trem já vai perdendo a velocidade, chegando no fim da linha e a paisagem vai ficando escassa e nebulosa, os sons vão diminuindo aos nossos ouvidos e não demora o apito vai soar avisando a chegada da estação final. Vamos dar uma última olhada para o caminho percorrido e com um último suspiro chegaremos à conclusão que valeu a pena, valeu muito à pena toda a estrada e estações percorridas.


Bom domingo!

quarta-feira, 1 de fevereiro de 2017

Domingo de Chuva

                                     Domingo de chuva.
E o domingo amanheceu chovendo, o que fazer no dia de hoje?
Era a dúvida de Agripino para aquele dia. Ir ao cinema? Passear no Shopping, comprar um livro novo já que o dessa semana acabou na sexta-feira, andar na chuva até molhar os ossos, sentido as bochechas geladas?
Pois é; as opções não são muito interessantes para quem trabalha como um camelo a semana toda, é solteiro e "já passou do meio dia". Fazer o quê para se distrair? Ir ao Shopping comprar outro livro e ir ao cinema era a opção do dia e de todas as semanas.
Lembrou de ligar para a amiga de trabalho, também solteira e também na mesma faixa de idade, a Adalgisa, mas lembrou que ela se comprometeu com a irmã de ficar com os sobrinhos para o casal viajar mais sossegado.
Parou na frente do espelho, molhou os dedos indicadores na língua e passou nas sobrancelhas que vivia arrumando e alisando e de um tempo para cá costumava arrancar os fios que nasciam fora do lugar. Parou para observar melhor e chegou a conclusão que de tanto arrancar estava com as sobrancelhas finas como as de boneca, apenas uns poucos fiapos.
Como não reparou que tirou fios demais, e agora?
Foi até a gaveta do banheiro e retirou um lápis preto que havia ganho de brinde quando comprou a pinça. -Acho que eles dão o lápis de brinde porque já sabem no que vai dar esse negócio de arrancar fios todos os dias.-
Voltou para o espelho mais uma vez e fez um risco perfeito, engrossando um pouco mais como convinha a um homem sério, assim ele pensava.
Dai foi fazer o outro risco mas não dava certo, saia torto, a sobrancelha da direita era torta por natureza. Então, deixou assim mesmo, uma apontava para cima e outra fazia o tipo acento circunflexo.- o que fazer ó Zeus!!!!-
Resolveu pentear uma franja aproveitando que o cabelo estava crescido no alto. No fundo andava pensando em amarrar os cabelos no alto da cabeça, num rabicho com andavam usando os modelos de revistas e os artistas da televisão, parecia os lutadores de sumô, mas o dele ainda não dava, estava curto ainda, mas dava uma boa franja.
Assim penteou tudo para frente para esconder as sobrancelhas e colocou por cima um par de óculos escuros de aros bem grandes. Como estava frio, vestiu um sobretudo e saiu para pegar um cineminha.
Quando chegou à rua uma ventania estava acontecendo e lá se foi o cabelo para cima descobrindo as sobrancelhas e os óculos ficaram respingados de garoa, assim teve que retirar e ficar segurando o cabelo com as mãos. Ainda bem que não trouxe o guarda-chuva, pensou. Não teria mãos para segurá-lo.
Entrou no metrô e percorreu os corredores de cabeça baixa e entrou na leva de passageiros e ficou de frente para a porta não querendo ser observado. Desceu na estação perto do Shopping e segurando a franja na testa se dirigiu para lá.
Subiu de elevador de costas para todos os demais que subiam com ele e virado para a parede foi até o último andar, o dos cinemas. quando a porta se abriu ele saiu feito uma flecha na direção do cinema. Comprou a entrada, ainda segurando a franja diante da bilheteira impassível, mas que ele era capaz de jurar que ela segurava o sorriso de deboche para a situação constrangedora dele.
Felizmente a sessão começou em seguida apagando todas as luzes. O filme contava a história de um cara não muito certo da cabeça, que roubava madeixas de cabelo e ele não gostou do que viu e voltou para casa muito arreliado. Pegou o Note book e escreveu para a empresa que não iria trabalhar por um motivo muito forte e especial, se quisessem descontar os dias que o fizessem, se quisessem despedi-lo que o fizessem mas o fato é que ele não iria trabalhar tão cedo. Na verdade  ele nem sabia mesmo quando poderia voltar ao trabalho, só quando as sobrancelhas crescessem e voltassem ao normal.
Abriu a pagina do tira-dúvidas e procurou tirar aquela que lhe causava aflição e leu desolado que, se a pessoa for jovem o pêlo demora uns 20 dias para aparecer, se for mais velha a pessoa, o caso dele, e se ao arrancar danificou o bulbo do pêlo, nunca mais nascerá.
Agripino se jogou desconsolado na cama e depois de alguns dias, durante a noite e de chapéu enterrado na cabeça mudou de cidade. Viveu mais de ano escondido só saindo a noite e todo disfarçado. Deixou os poucos e ralos cabelos crescerem, a barba praticamente ele não tinha mesmo e ficou um "barba-rala" que vivia infeliz no quartinho de pensão até o dia em que durante o jantar onde morava, depois de tomar um vinho barato, angustiado por demais se abriu para um outro morador da pensão. Conversa vai, conversa vem ele conseguiu contar para o homem a sua aflição, a sua vergonha; o caso das suas sobrancelhas.
O amigo então o convidou a ir até o seu quarto e sentou-o numa cadeira. Retirou do bolso uma navalha e enquanto Agripino dormitava de porre todo esparramado, o amigo lhe raspou as "maledetas" sobrancelhas com a perícia do barbeiro que era.
Quando acordou, Agripino estava com uma horrível dor de cabeça causada pela qualidade do vinho e foi direto para o chuveiro e só depois se olhou no espelho levando um grande susto.
Correu ao quarto do amigo que ainda dormia ao sabor do vinho também e sacudindo-o até acordá-lo e lhe perguntou o que ele havia feito?
- Como assim, o que eu fiz, não está vendo? Sumi com o seu problema. Ele não existe mais. Ninguém vai rir do que você não tem e agora me deixe dormir que hoje é minha folga.
Agripino voltou desolado para o seu quarto e examinado bem o que ele havia considerado um estrago completo. Penteou, puxou e amarrou o cabelo à moda Sumô e gostou do que viu no espelho. Saiu à rua todo fagueiro pensando;
Se tivesse conhecido aquela pessoa antes, não teria perdido o emprego e teria me livrado de tanto sofrimento, por que não pensei nisso antes? Agora sou um cara de estilo...
E saiu assobiando e chutando uma latinha que estava no chão...