Era uma vez um Rico e um Pobre. Face aos mesmos comportamentos, perante as mesmas atitudes, o Rico e o Pobre eram vistos, pelos outros, como estando a fazer coisas diferentes:
Quando o Rico roubava, era cleptomaníaco, "coitado, era doente... pegam-se-lhe as mãos. É um dom que ele tem!" (expressão celebrizada pela minha avó paterna). Quando o Pobre roubava, era um ladrão, andava no gamanço, era escumalha da sociedade.
Quando o Rico andava triste, tinha problemas, estava deprimido. É uma doença, um estado psicológico. Quando o Pobre estava triste, sem emprego, sem dinheiro, com 3 filhos para sustentar, a passar fome, era um preguiçoso ("Vai mas é trabalhar!") e estava simplesmente triste. Depressão é coisa de rico, o pobre não tem hipótese de meter baixa devido a depressão. Aliás, ter hipótese ele até tem, mas não se pode dar a esse luxo, porque tem três bocas para alimentar, fora a sua.
Quando o Rico se fazia acompanhar da sua esposa, igualmente Rica, envergando um vestido de pele de chita às pintinhas, era chique, fashion, glamouroso, whatever. Quando o Pobre se fazia acompanhar da sua esposa, igualmente Pobre, envergando um vestido de pele de chita às pintinhas, era parolo, a roçar o avec style, ridículo portanto.
Quando o Rico veste uma t-shirt branca com um estampado enorme todo brilhante a dizer EMPORIO ARMANI, aquilo é giríssimo. Quando o Pobre veste a mesma t-shirt, é da feira. Não pode realmente ser original, não... é da feira!
Quando o Rico organiza um jantar de Verão na sua casa, serve em pratos chiquérrimos da Vista Alegre, com fio de ouro e brasão: nesses mesmos pratos serve um espargo, uma cenoura anã, um mini bife delicioso e uma batata laminada. Acompanha com o vinho da terra, vertido em copos de cristal. E os convidados passam fome. Quando o Pobre organiza um jantar de Verão na sua casa, convida a família toda, os amigos e os vizinhos que não conhece. Monta a mesa lá fora no quintal, serve em pratos coloridos um de cada nação, não importa os copos em que serve a pinga, só importa que sejam cheios. Faz alta churrascada e os convidados saem de lá a rebentar de tanta comida.
Há coisas curiosas, não há? As pessoas encarregam-se de cavar cada vez mais o fosso da diferença.