Cientistas dizem que fazer malabarismo com e-mail, celular e outras fontes de informação muda a maneira como as pessoas pensam. Nossa concentração está sendo prejudicada pelo fluxo intenso de informação.
Esse fluxo causa um impulso primitivo de resposta a oportunidades ou ameaças imediatas. O estímulo provoca excitação - liberação de dopamina- que vicia. Na sua ausência, vem o tédio. Enquanto muita gente diz que fazer várias coisas ao mesmo tempo aumenta a produtividade, pesquisas mostram o contrário: As multitarefas dificultam a concentração e a seleção necessárias para ignorar informações irrelevantes. E mesmo depois que a pessoa se desliga, o pensamento fragmentado continua.
Para estudiosos de Stanford, a dificuldade de se concentrar só no que interessa mostra um conflito cerebral, que vem da nossa evolução. Parte do cérebro age como uma torre de controle, ajudando a pessoa a se concentrar nas prioridades. Partes primitivas, como as que processam a visão e o som, querem que ela preste atenção às novas informações, bombardeando a torre de controle.
Funções baixas do cérebro passam por cima de objetivos maiores, como montar uma cabana, para alertar sobre o perigo de um leão por perto. No mundo moderno, o barulho do e-mail chegando passa por cima do objetivo de escrever um plano de negócios ou jogar bola com o filho.
Mas outras pesquisas mostram que o cérebro também se adapta. Usuários de internet têm mais atividade cerebral do que não usuários. Eles estão ganhando novos circuitos de neurônios.
LER NA INTERNET
Em seu novo livro "The Shallows: What the Internet is Doing to Our Brains" o escritor norte-americano Nicholas Carr examina a história da leitura e a ciência de como o uso de diferentes mídias afeta nossa mente. Explorando como a sociedade passou da tradição oral para a palavra escrita e depois para a internet, ele detalha como nosso cérebro se reprograma para se ajustar às novas fontes de informação. Ler na internet mudou fundamentalmente a forma como usamos nosso cérebro.
A quantidade de textos, fotos, vídeos, músicas e links para outras páginas combinada com incessantes interrupções na forma de mensagens de texto, e-mails, atualizações do Facebook, tweets, etc fez com que nossas mentes se acostumassem a catalogar, arquivar e pesquisar informações. Desta forma, desenvolvemos habilidades para tomar decisões rapidamente, especialmente visuais. Por outro lado, cada vez lemos menos livros, ensaios e textos longos – que nos ajudariam a ter foco, concentração, introspecção e contemplação. Ele diz que estamos nos tornando mais bibliotecários – aptos a encontrar informações de forma rápida e escolher as melhores partes – do que acadêmicos que podem analisar e interpretar dados.
A ausência de foco obstrui nossa memória de longo prazo e nos torna mais distraídos. "Nós não nos envolvemos com as funções de interpretação de nossos cérebros", diz. Ele ainda afirma que, por séculos, os livros protegeram nossos cérebros de distrações, ao fazer nossas mentes focalizarem um tema por vez.
Com aparelhos como o Kindle e o iPad, que incorporam dispositivos digitais de leitura, tornando-se comuns, Carr prevê que os livros também mudarão. "Novas formas de leitura requerem novas formas de escrita". Se escritores suprem a necessidade crônica de uma sociedade distraída, eles inevitavelmente evitarão argumentos complexos que requerem atenção prolongada e escreverão de forma concisa e aos pedaços, Carr prevê.
Ele inclusive sugere um exercício para aqueles que sentem que a internet os tornou incapazes de se concentrarem: diminuam o ritmo, desliguem a web e pratiquem habilidades de contemplação, introspecção e reflexão. "É bem claro pelo que já sabemos sobre a ciência do cérebro que, se você não exercita habilidades cognitivas específicas, você acaba as perdendo. Se você se distrai facilmente, não pensará da mesma forma que pensa se você presta atenção".
Ou seja, estamos desenvolvendo uma nova raça humana, diferente na forma de pensar e interagir entre si e com as coisas ao nosso redor. O Homem desenvolve as ferramentas e acaba sendo moldado por elas, e tem sido assim desde a pré-história. Sem habilidade pra INTERPRETAR, ficaremos mais burros. Aliás, já estamos! Basta ver como nossa sociedade está alheia ao mensalão e como isso mal influenciou o resultado das eleições. Num tempo onde só recebemos as informações e estamos muito distraídos pra processá-las, para o Homer Simpson brasileiro o NÚCLEO PRINCIPAL de um partido ser condenado à prisão por fazer uma quadrilha pra desviar dinheiro público e comprar apoio político não significa que o mesmo partido (que inclusive apóia os membros da quadrilha) vá fazer isso uma vez eleito à prefeitura de sua cidade. Esse tipo de raciocínio realmente me impressiona, e me lembra do comercial da Apple em 1984, com a massa dominada de boca aberta em frente a um telão. Hoje não temos mais o domínio da TV, mas as massas continuam passivas, atadas a certas mídias seja por paixão ou manipulação.
Outra coisa que notei é a proliferação dos jogos casuais. Antigamente você tinha de levar seu videogame pra TV da sala (a única na casa), montar a caixinha RF atrás dela e jogar um jogo até o fim sem poder salvá-lo. Exigia tempo, esforço, treino, aperfeiçoamento. Vivíamos sem ver o final de muitos jogos, e sobrevivemos a essa frustração. Hoje podemos pegar o celular na fila do consultório e jogar pelo tempo exato até ser chamado. Com possibilidade de salvar o progresso, com continues infinitos, com uma curva de aprendizado fácil e o próprio jogo dá dicas de como superar as dificuldades. Não há comprometimento do jogador com o jogo, e o jogo é que implora por sua atenção, lhe dando itens, ouro, badges e outras bugingangas pra que você se sinta feliz "ganhando". Joguei Draw Somethingcom algumas pessoas no exterior e enquanto estávamos acertando um o desenho do outro tudo ia bem. 10, 20 rounds se passavam com trocas diárias de desenho. Mas bastava perder uma vez e o placar voltar pra zero pra nunca mais ver essa pessoa de novo. Pessoas criadas a leite com pêra, que nunca jogaramRiver Raid e não suportam o mínimo de frustração.
Essa é a geração - ou melhor, sociedade - "Colheita feliz", cada vez mais reagindo somente a estímulos, com o cão de Pavlov.
E a espiritualidade, como fica? Todos sabemos que o contato interno com o Divino depende da meditação, da introspecção. Será que a verdadeira espiritualidade vai se perder, desta vez não por proibições, mas sim por pura falta de capacidade das pessoas? Ou ficará esquecida num mar de informações irrelevantes?