INTER-LEGERE | Vol. 3, n. 28/2020: c21581 | ISSN 1982-1662
“FIQUE EM CASA”: violência e terrorismo íntimo contra as
mulheres em tempos de covid-191
“STAY AT HOME”: violence and intimate terrorism against
women in times of covid-19
Adriane Roso2
UFSM: http://orcid.org/0000-0001-7471-133X
Janine Gudolle de Souza3
UFSM: https://orcid.org/0000-0002-6477-4190
Caroline Matos Romio4
UFSM: https://orcid.org/0000-0002-5759-2831
Ana Flavia de Souza5
UFSM: https://orcid.org/0000-0002-0242-0119
DOI: https://doi.org/10.21680/1982-1662.2020v3n28ID21436
Resumo
A pandemia da COVID-19 tem causado muitas mortes no mundo todo. Medidas de
saúde pública foram tomadas para controlar a propagação do vírus causador da
doença, dentre elas o distanciamento social. Observa-se que esta medida pode
impactar na violência contra as mulheres e, igualmente, favorecer o terrorismo
íntimo, acirrando medos já existentes e coibindo os direitos sexuais e reprodutivos
das mulheres. Considerando este contexto, o objetivo deste artigo é tecer reflexões
acerca das intersecções entre violência contra as mulheres, as relações de gênero e
a ferramenta de distanciamento social em tempos de pandemia da COVID-19,
tratando particularmente do terrorismo íntimo. Foi realizado um estudo exploratório
e descritivo por meio de um levantamento de documentos de domínio público. O
feminismo relacional crítico, particularmente as ideias de Carole Pateman no que se
Este artigo deriva das reflexões desenvolvidas em conjunto com o projeto de pesquisa “Politics of
Reproduction in the Cyberworld: Studies on Contraceptive Technologies, (In)fertility, and Social
Representations of Masculinities/ Femininities” que conta com o apoio do CNPq (Chamada CNPq
06/2019 - Bolsas de Produtividade em Pesquisa) e da FAPERGS (Edital 05/2019 – Programa Pesquisador
Gaúcho – PqG). O Projeto tem como foco as políticas de reprodução e seus entrelaçamentos com
representações sociais, identidades sociais, relações de gênero e políticas de saúde.
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refere à dicotomia público/privado, e a Teoria das Representações Sociais serviram
de base para as reflexões desenvolvidas. Conclui-se que para prevenir e coibir a
violência, é necessário que se articule com a população modos de descontruir as
representações sobre masculinidades, sobre o que é tornar-se mulher, sobre o que é
violência e terrorismo e, acima de tudo, romper com a dicotomia entre a esfera
pública e a esfera privada.
Palavras-chave: Mulheres. Violência contra as mulheres. COVID-19. Pandemia.
Abstract
The COVID-19 pandemic has caused many deaths worldwide. Public health measures
have been taken to control the spread of the virus that causes the disease, including
social distance. It is observed that this measure can impact on violence against
women and, equally, favor intimate terrorism, heightening existing fears and curbing
women’s sexual and reproductive rights. Considering this context, the aim of this
article is to reflect on the intersections between violence against women, gender
relations and the tool of social distance in times of COVID-19 pandemic, dealing
particularly with intimate terrorism. An exploratory and descriptive study was
carried out through a survey of documents in the public domain. Critical relational
feminism, particularly Carole Pateman's ideas regarding the public\private
dichotomy, and the theory of social representations served as the basis for the
reflections developed. It was concluded that in order to prevent and curb violence,
it is necessary to articulate with the population ways of deconstructing
representations about masculinities, about what it is to become a woman, about
what is violence and terrorism and, above all, to rupture with the dichotomy
between the public and private spheres.
Keywords: Women. Violence against women. COVID-19. Pandemic.
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Introdução
Três acontecimentos de violência contra mulheres, escolhidos a partir de
tantos outros narrados nas mídias online, para iniciar esse artigo. O primeiro
acontecimento se refere a uma idosa que foi mantida em cárcere privado, em 2011,
no porão de sua casa, por vários anos pelo ex-marido e por sua companheira em
Sorocaba, São Paulo. A senhora vivia em condições sub-humanas, segundo os policiais
que a encontraram, e estava sobre uma cama de concreto, praticamente despida e
enrolada em um cobertor. O segundo acontecimento, em 2016, trata de uma jovem
mantida em cativeiro por dois anos pelo próprio marido em Cuiabá, Mato Grosso. Ela
era espancada, torturada, dopada por remédios, ameaçada pelo marido e impedida
de se comunicar com a família. O terceiro acontecimento, em 2017, envolve um
empresário que manteve em cárcere privado, em um apartamento sem mobílias, em
Fortaleza no Ceará, por 19 anos, a esposa e os seis filhos. Os filhos não frequentavam
escola, nem tinham atendimento médico ou amigos.
Terrorismo íntimo, juntamente com a violência situacional de casal ou
também denominada violência doméstica, é uma forma de violência íntima mais
devastadora em termos de saúde física e mental (JOHNSON, 1995; JOHNSON;
FERRARO, 2000; LIRA; MÉNDEZ, 2008; TIWARI et al., 2015). O terror é o fundamento
desta prática usualmente realizada por homens, mas também perpetrada por
mulheres, contra mulheres, principalmente, e contra homens. A expressão vem
“misturada a um padrão geral de comportamentos controladores que indica que o
agressor está tentando exercer controle geral sobre sua(seu) parceira(o)” (LIRA;
MÉNDEZ, 2008, p. 476). Envolve intimidações corporais, ameaças verbais (inclusive
de morte), ridicularização, desprezo, insultos, críticas, minimização dos sentimentos
e das habilidades intelectuais e características físicas, a negação da identidade,
necessidades e desejos das mulheres (IBIDEM).
Os três acontecimentos que abriram esse artigo, ocorreram dentro de lugares
que deveriam ser seguros, sagrados. As violências contra as mulheres são uma
realidade
histórica
no
nosso
país.
Elas
são
estruturais,
sistemáticas
e
interdependentes de diferentes marcadores sociais interconectados, tais como
gênero, raça/etnia, religiosidade. Estas práticas de terror antecedem o surgimento
e propagação do novo coronavírus (SARS-CoV-2), no final de 2019, na cidade de
Wuhan, na China, e à declaração de uma pandemia no dia 11 de março de 2020 pela
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Organização Mundial de Saúde (OMS) (HALLAL et al., 2020). No entanto, a violência
contra as mulheres passou a ter destaque nas mídias, cuja pauta girava em torno da
correlação
entre
o
aumento
da
violência
doméstica
e
as
medidas
de
isolamento/distanciamento social durante a pandemia.
O destaque nas mídias da violência doméstica em tempos de COVID-19,
aparentemente, decorre da recomendação pela Organização Mundial da Saúde (OMS)
do distanciamento social. Embora a medida de distanciamento social seja necessária
e tenha provado sua eficácia em países que a adotaram, ainda que tardiamente, a
medida provocou não apenas pautas midiáticas, mas também inquietações e
questionamentos no campo das ciências sociais e humanas e para os Estudos
Feministas. Para alguns/mas cientistas e profissionais da saúde que pesquisam a
violência contra as mulheres, a medida poderá não fazer sentido e causar um efeito
aterrorizador, à medida que aumenta o risco da exposição à violência doméstica e
também ao terrorismo íntimo, principalmente para aquelas mulheres que já têm
histórico de violência dentro de seus domicílios. Para outras/os, a medida não altera
essa característica social e cultural instituída historicamente.
No caso do Brasil, entendemos que esta pauta tomou contornos bastante
peculiares e preocupantes, transformando-se em “batalha política” (JORNAL DO
BRASIL, 2020), dividindo a população em dois grupos bem polarizados: os favoráveis
e os contrários. Os primeiros sustentam seus argumentos e práticas nas
recomendações da OMS e outras instâncias de saúde, como a Sociedade Brasileira de
Infectologia e Sociedade Brasileira de Hipertensão. O distanciamento social é
compreendido como medida protetiva à saúde da população em geral no que tange
à disseminação da doença. Os segundos apoiam-se no discurso e comportamento do
Presidente Jair Bolsonaro que minimiza a gravidade da pandemia ao afirmar que a
mídia está “superdimensionando o poder desse vírus, não é isso tudo que a grande
mídia propaga pelo mundo todo, está havendo uma histeria, não vai ser uma
gripezinha que vai me derrubar [...]” (O GLOBO, 2020, on-line). Para este grupo, a
defesa pelo fim do distanciamento sustenta-se no prejuízo que tal medida causa na
economia.
Todavia, ainda que a preocupação em relação à economia mereça atenção,
não podemos desconsiderar que, no momento em que escrevemos este artigo, ainda
há uma imensa subnotificação de casos e mortes, devido à baixa testagem realizada,
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não sendo possível identificar com exatidão o número de casos no país, diferente de
países que tiveram sucesso no controle devido à testagem em massa. A taxa de
contágio ainda é considerada alta, a população tem resistência a aderir as medidas
de isolamento social voluntário, além de que há dificuldades de gestores públicos
em reconhecer a situação grave existente (BARRUCHO, 2020).
Com relação à possível intensificação das violências contra as mulheres e do
terrorismo íntimo, problemáticas centrais deste artigo, como salientado no
documento produzido pela Organização das Nações Unidas (ONU Mulheres, 2020b),
situações de emergência aumentam os riscos a violências para meninas e mulheres,
especialmente à violência doméstica. As mulheres em situação de violência acabam
por “enfrentar obstáculos adicionais para fugir de situações violentas ou acessar
ordens de proteção que salvam vidas e/ou serviços essenciais devido a fatores como
restrições ao movimento em quarentena” (ONU Mulheres, 2020b, p. 2). De fato,
como alertam Bradbury-Jones e Isham (2020), vivemos em nível global um paradoxo
pandêmico, já que para se proteger do adoecimento causado pela COVID-19 as
mulheres acabam mais expostas à violência doméstica. Isso ocorre porque o lar pode
ser um lugar onde a dinâmica do poder pode ser distorcida e subvertida por aqueles
que abusam.
Assim, a medida de distanciamento social “fique em casa” torna-se um
paradoxo per se que merece ser estudado. Permanecer em casa pode impactar na
prática de violência contra as mulheres e, igualmente, favorecer terrorismo íntimo,
acirrando medos já existentes, agravando ansiedades e inseguranças, afetando a
saúde mental das mulheres e coibindo seus direitos sexuais e reprodutivos. Ao mesmo
tempo em que devemos lidar com a pandemia do novo coronavírus e realizar todos
os cuidados necessários para frear a disseminação, precisamos também lidar com
outra pandemia mais antiga, que pode ser considerada mais “silenciosa”, que é a
violência doméstica e suas diferentes formas, dentre elas o terrorismo íntimo contra
as mulheres.
Silenciosa não apenas no sentido do abafamento das vozes das mulheres que
sofrem diretamente as violências, mas relativo, principalmente, ao silêncio que as
pessoas, os familiares, os amigos, o Estado e a sociedade em geral adotam frente às
situações de violência dentro de espaços privados. “Todo mundo que mora aqui ou
trabalha próximo suspeitava que acontecia algo de estranho naquele apartamento.
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Na verdade, tinha pessoas que sabiam, mas todo mundo tinha medo de se meter,
né?” (TRIBUNA DO NORTE, APUD JOSÉ, 2017, on-line), argumenta um dos vizinhos do
empresário que encarcerou sua família (Acontecimento 3).
Os acontecimentos narrados no início desse artigo nos provocam muitas
perguntas: Por que não se “suspeita” de que pode haver pessoas aprisionadas em
seus próprios espaços privados? Por que não se resolve, ou se age tardiamente,
(n)esses acontecimentos? Por que uma relação chega a este ponto? O que os casos
de violência doméstica e terrorismo íntimo nos dizem sobre as relações de gênero e
sobre o mundo em que vivemos? Como medidas específicas de proteção à saúde das
populações em tempos de pandemia incidem sobre as mulheres que já sofriam
violência antes mesmo do coronavírus fazer parte de nossa realidade?
Entendemos que existe uma relação entre a violência contra as mulheres e as
representações de masculinidades, ao ponto de dificultar a quebra de mitos
populares que conduzem a práticas do tipo “em briga de marido e mulher ninguém
mete a colher” e a instauração do slogan feminista “O pessoal é político”. Sabemos
que a “associação entre homens e violência está bem estabelecida na literatura
acadêmica” (EDLEY, 2017, p. 12). Vivemos em um mundo manifestamente
generificado, no qual testemunhamos uma “normalização da masculinidade” onde as
mulheres têm sido vistas como exóticas e os homens como normais, pessoas comuns,
que não precisam ser estudados (EDLEY, 2017). Essa visão é sustentada pelo
patriarcado e pelo sistema liberal, que fabricam e insistem na ideia de que ao homem
a esfera pública é um direito, às mulheres os espaços privados são o único domínio
possível.
Mais do que nunca, em tempos de pandemia, quando medidas de
distanciamento possuem significados e efeitos diversos, precisamos indagar também
sobre “as ambiguidades do público e do privado no patriarcalismo-liberal”
(PATEMAN, 1983, p. 295). Junto a isso, devemos considerar gênero sob a perspectiva
relacional, não apenas atentando para esta problemática, como muitas feministas
têm feito, com foco exclusivo nos sentimentos e experiências das mulheres. A
violência doméstica e o terrorismo íntimo acarretam sofrimento tanto para homens
quanto para mulheres, ainda que sejam experiências diferenciadas.
Neste artigo, temos como objetivo tecer reflexões acerca das possíveis
intersecções entre violência contra as mulheres, as relações de gênero e a medida
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de distanciamento social em tempos de pandemia da COVID-19, tratando
particularmente do terrorismo íntimo. Especificamente, pretendemos (a) levantar
informações sobre a violência doméstica contra as mulheres durante a pandemia no
contexto global e nacional, (b) identificar as ações estratégicas adotadas frente a
tal contexto e (c) especular sobre o terrorismo íntimo enquanto uma insurgência
radical por parte do/a perpetrador/a que denuncia ao Estado as inequidades de
gênero em sociedades patriarcais e neoliberais. A pergunta que orienta nossas
reflexões é: como são os efeitos da pandemia da COVID-19 na produção da violência
doméstica e do terrorismo íntimo contra mulheres?
Para responder aos objetivos, realizamos um estudo exploratório e descritivo
através de um levantamento de documentos de domínio público. Considerando que
a pandemia da COVID-19 é recente e ainda não conhecemos suficientemente seus
desdobramentos no que tange à saúde das mulheres e às relações de gênero, esta
escrita, de cunho reflexivo, torna-se relevante e fundamental. Descrever e pensar
sobre tais experiências não só serve para entendermos o que tem sido proposto no
período de distanciamento social, mas também pode contribuir para criarmos ações
permanentes tanto no combate à violência quanto na promoção à equidade de
gênero.
Os documentos foram escolhidos a partir de amostragem proposital ou por
oportunidade, cuja facilidade de acesso é o que prevalece no processo de pesquisa
(LEWIN, 2015). Escolhemos documentos derivados de grupos midiáticos com ampla
circulação, documentos de pequena mídia (jornais locais), dados e informações
divulgados pelos órgãos públicos em suas mídias digitais, artigos científicos,
orientações advindas de órgãos internacionais de promoção de saúde (ONU) e vídeos
que remetessem à problemática estudada. A busca pelos materiais que embasaram
esta pesquisa ocorreu em diferentes mecanismos de busca (Google Acadêmico®,
YouTube®, Twitter®, Facebook®, Scielo) durante os meses de março, abril e maio
de 2020, por meio de palavras-chave “violência contra as mulheres” OR “violência
doméstica” AND “pandemia”, “coronavírus”, “COVID-19”. A partir dos resultados
desta procura fomos selecionando matérias que se mostravam pertinentes para nossa
problematização e que atendessem nossos objetivos. Não tivemos pretensão de
levantar todos os materiais publicados em relação à temática, mas, sim, encontrar
fontes que auxiliassem na problematização do assunto, contribuindo para o
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entendimento da violência doméstica e do terrorismo íntimo em tempos de pandemia
e seu caráter generificado. Este último aspecto merece muita atenção haja vista que
os “impactos de gênero das epidemias de doenças infecciosas são menos
compreendidos e reconhecidos” (ROESCH et al., 2020, p. 1).
Desenvolvimento entre o silêncio público e o sofrimento privado
A leitura do material foi conduzida em três níveis de reflexão e análise. O
primeiro consiste em um levantamento sobre a violência doméstica contra as
mulheres durante a pandemia causada pela COVID-19 no contexto global e nacional.
O segundo nível envolveu identificar as ações estratégicas adotadas frente a tal
situação. No terceiro nível, conceituamos terrorismo íntimo e realizamos alguns
apontamentos referentes ao dualismo público/privado na interface com a violência.
Partimos de uma visão crítica de ciências sociais e humanas a qual visa a
ruptura com o dualismo cartesiano, o positivismo cientificista, a tendência à
universalização dos fenômenos sociais, o ideal de neutralidade e a objetividade na
produção do conhecimento. O feminismo relacional crítico, particularmente as ideias
defendidas por Pateman (1983), serviu de base para desenvolvermos nossas
reflexões, colocando em evidência as críticas feministas sobre a dicotomia entre o
público e o privado. Defendemos que o horizonte de equidade de gênero e o foco
relacional ao invés de dual/biologicista, no que se refere aos direitos sexuais e
reprodutivos e ao acesso democrático às instâncias de controle social, pode auxiliar
na construção de estratégias de enfrentamento às violências contra mulheres e
homens.
Violência contra as mulheres em tempos de pandemia: quando a diminuição no
registro de violência não significa diminuição da violência
Dados recentes mostram que, desde o início da COVID-19, a violência contra
as mulheres, e particularmente a violência doméstica, aumentou em vários países à
medida que preocupações com segurança, saúde e dinheiro criam tensões
acentuadas pelas condições de vida apertadas do confinamento. Cabe sinalizar que
mais da metade da população mundial estava em condições de distanciamento social
ou confinamento no início de abril (ONU Mulheres, 2020a). Entender a própria casa
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como um lugar de aconchego, proteção e descanso deveria ser um direito básico, no
entanto, acaba se tornando um privilégio de classe, gênero (VIEIRA; GARCIA; MACIEL,
2020) e igualmente geracional, já que as mulheres com idade superior a 60 anos têm
sido consideradas mais vulneráveis à COVID-19.
No que se refere aos dados mundiais, percebe-se que as violências já
existentes se agravam e concomitante a isso novos casos surgem. Desde a adoção das
medidas de distanciamento social, em países como a França, a República do Chipre
e Singapura, houve um aumento de aproximadamente 30% nas denúncias, na China,
os números de violência doméstica triplicaram (MELO et al., 2020) com muitos
relatos de mulheres em uma rede social chinesa utilizando a
hashtag
#AntiDomesticViolenceDuringEpidemic (REVISTA GALILEU, 2020). Conforme matéria
da ONU Brasil (2020), constata-se que o Líbano e a Malásia também apresentaram
um aumento no número de ligações para as linhas telefônicas de ajuda, em
comparação com 2019.
Na Austrália, houve um aumento no número de buscas no Google com o termo
“violência doméstica” em comparação com dados dos últimos cinco anos. No Canadá,
Alemanha, Espanha, Reino Unido e EUA, autoridades governamentais, mulheres
ativistas de direitos humanos e parceiros da sociedade civil indicaram relatórios
crescentes de violência doméstica durante a crise e aumento da demanda por abrigos
de emergência (ONU Mulheres, 2020a). Ainda, deve-se considerar que 70% das
pessoas que trabalham no setor social e de saúde, globalmente, são mulheres. Elas
estão na linha de frente na resposta à pandemia, sendo profissionais de saúde,
cientistas, médicas, dentre outras. Além disso, elas têm três vezes mais cuidados
não remunerados em casa do que os homens (ONU Mulheres, 2020b). Nesse caso,
podemos destacar os paradoxos em relação ao “lugar das mulheres” na nossa
sociedade, que oscilam entre o velho e o novo, como salientam Santos, Duarte e
Trindade (2020). As autoras ressaltam que ao mesmo tempo em que as mulheres
correm riscos estando à frente dos cuidados em saúde na pandemia, uma
considerável parcela da população também se encontra em risco por estar em casa
devido à violência.
Por sua vez, ainda que a América Latina e o Caribe tenham se convertido em
regiões com legislação e políticas públicas bastante avançadas no que concerne à
violência contra mulheres, essas regiões apresentam as maiores taxas de violência
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sexual do mundo e a segunda taxa de maior violência por parte de ex-parceiro (ONU
Mujeres, 2017). Na Argentina, o caso divulgado pelo jornal El País sinalizou a
preocupação com a violência doméstica, já que uma mulher e sua filha foram
assassinadas durante a quarentena. O movimento “Nem uma a menos” convocou
protestos para alertar o aumento da violência e exigir medidas de proteção
(CENTENERA, 2020).
A República Dominicana está entre os países da América Latina com maiores
índices de violência contra as mulheres. De acordo com o documento Feminicidios
en la República Dominicana, de 2016 até 2018, registrou-se a morte violenta de 320
mulheres por questões de gênero (POLO, 2019). Com a entrada da COVID-19,
observou-se uma diminuição nas denúncias contra violência doméstica. A ministra da
Mulher, Janet Camilo, em entrevista, afirma que, nos primeiros dez dias de
confinamento, os telefones de atendimento às vítimas receberam 238 ligações,
número inferior ao normal, algo que a ministra atribui ao medo do vírus (EFE, 2020).
O estudo realizado pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP) (BUENO
et al., 2020) mostra que houve redução nos registros de ocorrências de violência
doméstica durante a pandemia em alguns estados. No estado do Pará, houve uma
redução de 49,1% no total de ocorrências registradas entre os dias 19 de março e 02
de abril, ao comparar com o mesmo período do ano de 2019. No caso das lesões
corporais dolosas no estado do Mato Grosso os registros apresentaram queda de
21,9%, comparando março de 2019 com março de 2020. Já no Rio Grande do Sul, os
registros de agressão em decorrência da violência doméstica apresentaram uma
queda de 9,4% em março deste ano em comparação com março de 2019, no Acre a
queda foi de 28,6%, no Ceará de 29,1% e no Pará de 13,2%. Apenas no Rio Grande do
Norte se verificou crescimento dos registros desse tipo de violência, o aumento foi
de 34% em relação ao mesmo mês de 2019, deve-se considerar que o isolamento no
Estado começou mais tarde que nos outros estados mencionados.
Os registros de ameaça às mulheres apresentaram redução, sendo que o
estado do Pará foi o que apresentou maior redução, 27,9%. No Mato Grosso 21,3% e
no Rio Grande do Sul 22,5%. No Rio Grande do Norte os registros de ameaça
aumentaram 54,3%. Em relação às denúncias, no Brasil o número total caiu de 8.440
em março de 2019 para 7.714 em março de 2020, redução de 8,6%. Todavia, embora
tenha ocorrido uma diminuição dos registros de lesão corporal e de solicitações de
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medida protetiva, isso não reflete a realidade da violência doméstica no Brasil, pode
representar apenas que as mulheres estão tendo dificuldades para realizarem
denúncias (BUENO et al., 2020). O Instituto Maria da Penha (2020) também alerta
para o fato de que a redução do número de denúncias não significa que os casos de
violência diminuíram.
Segundo dados do FBSP (BUENO et al., 2020), houve crescimento da letalidade
derivada da violência contra as mulheres. Para averiguar mais a fundo este
crescimento, o FBSP, em parceria com a Decode6, realizou monitoramento nas
postagens no Twitter contendo relatos de brigas de casais de vizinhos. A Decode
coletou mais de 52 mil menções contendo algum indicativo de briga entre casais
vizinhos realizadas entre fevereiro e abril deste ano. Após filtrar apenas as
mensagens que indicassem a ocorrência de violência doméstica, resultaram em 5.583
menções. Quando analisados, nos dados por mês, há um aumento de 431% entre
fevereiro e abril, ou seja, os relatos de brigas de casal com indícios de violência
doméstica aumentaram quatro vezes, o que corrobora que há um incremento da
violência durante a quarentena.
Informações específicas sobre cárcere privado são limitadas, na pesquisa
bianual feita pelo Senado brasileiro, por exemplo, não encontramos dados sobre esta
tipificação de violência (BRASIL, 2017). Outras fontes indicam que a cada duas horas
e meia, em média, uma mulher reportou ao Ligue 180 ser vítima de cárcere privado
em 2015. De janeiro a outubro de 2015, houve um aumento de 300% de denúncias de
cárcere privado (DIÓGENES, 2015). Em 2018, o Sistema Integrado de Atendimento à
Mulher registrou denúncias de 3.065 situações de cárcere privado. Em 2019, no
período de janeiro a junho, o Sistema de Ouvidoria Nacional de Direitos Humanos
(SONDHA) recebeu o total de 1.243 denúncias de cárcere privado (BRASIL, 2019).
Para 2020, durante a pandemia da COVID-19 não foi possível encontrar informações
científicas precisas. Em Minas Gerais, os casos consumados de cárcere privado em
março de 2020 caíram de 18 para 16 em comparação ao ano anterior (OLIVEIRA;
FRANCO, 2020). Por outro lado, profissionais da área do direito denunciam que as
mulheres estão sendo colocadas em cárcere privado durante a pandemia (SOUZA,
2020).
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Empresa com grande experiência em mineração de dados em redes sociais. Analisou relatos de brigas
de casais e violência doméstica nas redes sociais entre fevereiro e abril de 2020 (BUENO et al. 2020).
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Por fim, queremos comentar sobre o enquadramento dos discursos das grandes
mídias e do impacto destas na construção das representações acerca da violência e
das masculinidades. Ainda que as mídias tenham a função relevante de informar e
também denunciar sobre as violências, é preciso relembrar que elas constroem
representações conforme seus interesses. Por meio do processo comunicacional, elas
irão desempenhar “um papel crítico na produção e circulação de representações
sociais, à medida que ideias sobre objetos e eventos sociais circulam em público e
são incorporadas em representações sociais” (SAMMUT et al., 2015, p. 8).
Reconhecer o lugar de fala da mídia no processo de construção das representações
nos dirige a pensar nos riscos e consequências de discursos midiáticos que
correlacionam a pandemia com o aumento da violência contra as mulheres.
Como alertam Williamson, Lombard e Brooks-Hay (2020), as narrativas
midiáticas sobre violência doméstica durante o distanciamento social, do tipo
“Assassinos do coronavírus” (Coronavirus murders), são erradas e danosas. Os
autores criticam as mídias que correlacionam a violência doméstica exclusivamente
à pandemia, argumentando que esta abordagem reduz a complexidade do fenômeno
e desresponsabiliza os seus autores e a sociedade em dar respostas mais efetivas
para a violência doméstica. Assim, a violência doméstica adquire aspectos
contextuais, dando a ilusão de que encerrada a pandemia se encerrariam os casos
de violência doméstica. Entendemos, por tanto, que é preciso uma “pedagogia para
os comunicadores” que promova a discussão sobre a “força” de seus discursos sobre
a possibilidade de transformar representações sociais no campo das violências.
Estratégias de enfrentamento durante a pandemia: do contexto internacional ao
nacional
Contexto Internacional
Ainda que as mulheres que sofrem violência, ou testemunhas da violência,
tenham meios para realizar a denúncia, à medida que diversos serviços de saúde,
incluindo serviços de saúde reprodutiva, call center, abrigos, assistência e proteção
jurídica e serviços de aconselhamento, começaram a ser reduzidos devido à
pandemia, o risco das mulheres submetidas à violência terem menos oportunidade
de receber apoio e serem encaminhadas para acolhimento aumenta (ROESCH et al.,
2020). Nesse sentido, a comunidade científica, os profissionais de saúde, os
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movimentos sociais e as organizações que lutam pela saúde das populações
começaram a se organizar rapidamente e propor ações de enfrentamento à violência
contra as mulheres no período de pandemia.
Muitas das ações que visam a proteção das mulheres em tempos de COVID-19
partem da ONU, a qual recomenda que os países estabeleçam sistemas de alerta de
emergência em farmácias e mercados; garantam que os sistemas judiciais continuem
funcionando e que os agressores sejam processados; que aumentem o investimento
em serviços online; que considerem os abrigos para mulheres em situação de
violência como serviços essenciais; que haja a criação de formas seguras para as
mulheres buscarem apoio e também que ampliem campanhas de conscientização
pública (ONU Brasil, 2020a).
Pode-se observar que essas recomendações estão presentes, parcialmente ou
integralmente, em alguns países. A França anunciou diversas medidas para
enfrentamento da violência doméstica no país, dentre elas destacamos o pagamento
de quartos de hotel para mulheres em situação de violência, abertura de centros de
aconselhamento e de 20 novos centros em lojas para que as mulheres busquem ajuda
enquanto fazem compras e também uma verba extra de 1 milhão de euros para
organizações de ajuda a mulheres que sofrem violência (CATRACA LIVRE, 2020). Os
EUA criaram acesso remoto para registrar pedidos de proteção contra agressores por
telefone ou e-mail e as linhas nacionais de denúncia a violência doméstica
continuaram em funcionamento (BUENO et al., 2020).
Além disso, foram criadas campanhas que buscam conscientizar e trazer à tona
discussões com o propósito de combater a violência de gênero. A campanha
#HeForSheAtHome ou #ElesPorElasEmCasa é um exemplo 7. O objetivo é destacar o
que as mulheres vêm passando em tempos de isolamento e incentivar os homens a
fazerem a sua parte também. A campanha procura inspirar os homens a assumirem
tarefas e equilibrar o trabalho diário em suas famílias (ONU Mulheres, 2020c) e deriva
do movimento mundial “HeForShe” (no Brasil “ElesPorElas”), lançado em 2014, cujo
objetivo é engajar homens e meninos para novas relações de gênero sem atitudes e
comportamentos machistas (ONU Mulheres, 2020b).
7
Este movimento iniciou-se em 2015, na Argentina, após o assassinato de uma gestante adolescente
pelo seu namorado, também adolescente. Jornalistas, escritores, ativistas sociais se mobilizaram para
reivindicar o fim dos feminicídios. Disponível em: http://niunamenos.org.ar
13
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Alguns países criaram estratégias de denúncia para atender mulheres em risco
durante o período da pandemia. Na Argentina, por exemplo, qualquer mulher que se
aproximar de um vendedor ou ligar para uma farmácia pedindo por uma “máscara
vermelha” (barbijo rojo) irá receber ajuda e será encaminhada para uma central
telefônica que atende casos de violência doméstica no país e funciona 24 horas. A
ligação é anônima, gratuita e nacional. Este canal oferece informações e também
aconselhamento sobre diversas violências como: física, psicológica, sexual,
econômica e patrimonial e simbólica (O GLOBO, 2020). Estratégia similar foi adotada
pela Espanha, que lançou um serviço pelo WhatsApp para que mulheres que estão
em casa possam solicitar ajuda e também possam ir em farmácias, utilizando a
palavra “Máscara 19” para acionar as autoridades (BUENO et al., 2020).
O setor não-governamental, em parceria com o setor privado, também se
movimentou para atender às novas demandas da pandemia. A ISA.bot é uma
ferramenta de acolhimento e informações, que oferece respostas e orientações
rápidas para mulheres que sofreram violência doméstica ou online. Foi desenvolvida
com o apoio do Facebook, Google e ONU Mulheres, pelo Conexões que Salvam, da
ONG Think Olga, e pelo Mapa do Acolhimento, do Nossas.org. 8 Ao iniciarmos o chat
pelo Messenger® ou Google Assistente®, uma robô oferece ajuda para se ter uma
experiência mais segura na internet, trazendo informações e oferecendo
acolhimento. Complementa: “No atual contexto de isolamento pela pandemia da
COVID-19, também te ofereço informações e auxílio para situações de violência
doméstica”. Além disso, a robô oferece informações sobre linhas de atendimento,
como o 190 e 180, e informa sobre outras ferramentas que estão disponíveis de forma
online.
Contexto Brasileiro
O que tem sido pensado e oferecido como estratégia para o enfrentamento à
violência no território brasileiro em tempos de COVID-19? O Governo Federal do Brasil
propõe diferentes ações para controle da COVID-19 e situações decorrentes do
isolamento social que envolve todos os Ministérios existentes, dentre as ações
podemos citar: a Portaria nº 86 do Governo Federal, que garante atendimento pelo
8
Disponível em: https://www.isabot.org. Acesso em: 18 jun. 2020.
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SUAS às mulheres vítimas de violência doméstica; Auxilio Emergencial; incentivo a
pesquisas sobre a COVID-19 (AGÊNCIA BRASIL, 2020b).
Em consonância com as diretrizes da ONU, com o aumento de violência contra
mulheres no Brasil e com o aumento de 9% nas ligações para o 180 de 11 a 24 março,
o Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos se manifestou através de
um ofício circular9 sobre as ações de enfrentamento necessárias para o período de
pandemia. A Secretaria Nacional de Políticas para as Mulheres descreve doze ações,
dentre elas destacamos: manter serviços da rede de atendimento, com a devida
segurança dos/as profissionais; atualizar quais serviços estão em funcionamento e
seus respectivos horários; disponibilizar materiais informativos nos estabelecimentos
abertos e também nos sítios eletrônicos; e ainda criar comitês de enfrentamento à
violência no contexto da COVID-19. No momento em que compreendemos que estar
em casa pode representar risco para muitas mulheres, além de pensar sobre as ações
para enfrentar e conter a disseminação do novo coronavírus, é necessário articular
políticas públicas para o enfrentamento da violência. É importante o monitoramento
das medidas de proteção e também a articulação das políticas de Saúde e Assistência
Social nos municípios (SANTOS; DUARTE; TRINDADE, 2020).
Outras medidas institucionais são destacadas por Marques et al. (2020), tais
como garantir a agilidade do julgamento das denúncias de violência contra a mulher
e reforçar as campanhas publicitárias que tenham como foco central a importância
de que todos “metam a colher em briga de marido e mulher”. No nível individual, os
autores sugerem que as mulheres em situação de violência sejam acompanhadas de
familiares durante o distanciamento social e, em situações extremas, elas
mantenham o telefone celular protegido e criem um plano de fuga seguro.
Para além de indicações e sugestões, podemos visualizar ações que já estão
sendo tomadas por diferentes instituições e instâncias. A Câmara dos Deputados, por
exemplo, aprovou em maio um Projeto de Lei que assegura medidas de combate e
prevenção à violência doméstica durante a calamidade pública e o estado de
emergência declarados em decorrência da COVID-19. Destacamos que o Projeto
prevê que os serviços que acolhem as mulheres em situação de violência doméstica
9
Disponível em: https://www.gov.br/mdh/pt-br/assuntos/noticias/2020-2/marco/ministeriorecomenda-que-organismos-de-politicas-para-mulheres-nao-paralisematendimento/SEI_MDH1136114.pdf. Acesso em: 22 mai. 2020.
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sejam reconhecidos como atividade essencial; garante o exame de corpo de delito
em caso de violência doméstica ou violência contra a mulher; estabelece que órgãos
de segurança devem disponibilizar canais de comunicação para atendimento virtual
de situação que envolva violência contra a mulher; prevê que a vítima de violência
doméstica possa solicitar medida protetiva pelo serviço de atendimento online. O
Projeto depende de aprovação no Senado (AGÊNCIA SENADO, 2020).
O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e a Associação dos Magistrados
Brasileiros (AMB) criou a campanha Sinal Vermelho contra a Violência Doméstica, que
incentiva que as mulheres que sofrem violência desenhem um X vermelho na palma
da mão e mostrem para o atendente ou o farmacêutico. Este será capacitado a
entender que se trata de uma denúncia e deverá, em seguida, acionar a polícia e
encaminhar o acolhimento da vítima (AGÊNCIA BRASIL, 2020c).
A Polícia Civil de Mogi das Cruzes também criou ferramentas para receber
denúncias e prestar suporte a mulheres em situação de violência doméstica durante
o isolamento, sendo que houve um aumento de 9% nas ligações para o 180. Além da
denúncia continuar sendo realizada de forma presencial, agora é possível registrar
Boletim de Ocorrência em caso de violência doméstica através da internet. A
tecnologia é uma aliada, mas pode não atender todas as mulheres que vivenciam
violência em seus lares, por isso a importância de continuar com os atendimentos
presenciais em tais casos, sendo que o atendimento a mulheres em situação de
violência é urgente devido ao estado emocional e de vulnerabilidade que podem se
encontrar (CASTRO, 2020).
A Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) de São Paulo encaminhou ofícios ao
Conselho Nacional de Justiça para pedir ao judiciário a prorrogação automática das
medidas protetivas de urgência concedidas às mulheres em situação de violência
doméstica, evitando, no período de pandemia, que a mulher necessite ir até o fórum
para renová-las; ao Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos foi
pedido que haja intensificação das campanhas de prevenção e de informação sobre
a violência doméstica, com fim de que as mulheres possam ter ciência de serviços e
redes de atendimento que podem estar acionando (CASTRO, 2020).
Diversas estratégias que visam proteger e coibir a violência têm sido
desenvolvidas e utilizadas no Brasil como forma de auxiliar mulheres que sofrem
violência doméstica antes mesmo da pandemia, como por exemplo o Projeto
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Borboleta, no Rio Grande do Sul, que continua reunindo virtualmente as mulheres
durante a pandemia (CAVALHEIRO, 2020). Outro exemplo parte da Secretaria de
Segurança Pública do Rio Grande do Sul (SSPRS) que disponibilizou um número de
celular para as denúncias serem feitas. Aliado a isso, a Patrulha Maria da Penha, da
Brigada Militar, ampliou o atendimento de 46 para 84 cidades do estado (ASCOM BM,
2020). No contexto nacional, outra estratégia é a criação do aplicativo “Direitos
Humanos BRASIL” e um portal, desenvolvidos exclusivamente para enfrentar a
violência doméstica nesta pandemia (AGÊNCIA BRASIL, 2020a).
O número de municípios contemplados pelo programa Patrulha Maria da Penha
teve aumento de 82%. Tal programa busca somar esforços com a rede de proteção
do estado para redução dos casos de feminicídio e da violência contra as mulheres.
Até início de abril de 2020, 5.039 mulheres em situação de violência doméstica foram
cadastradas, passando a receber visitas dos policiais militares com o intuito de
verificar o cumprimento das medidas protetivas. Foram realizadas 7.460 visitas,
mantendo a rede de proteção atenta às situações graves. Outro dado é o número de
flagras de descumprimento de medidas protetivas, totalizando 42, o que sinaliza que
42 mulheres foram protegidas pela Brigada Militar que decretou ordem de prisão ao
agressor (ASCOM BM, 2020).
Os aplicativos de celulares e smartphones são particularmente importantes
em contextos de pandemia. Todavia, sabemos que em muitas situações,
especialmente quando se trata de terrorismo íntimo, as mulheres ficam isoladas
dentro do contexto doméstico e não têm acesso à telefonia. Portanto, elas teriam
que contar com a denúncia por parte de outra pessoa. É possível que a denúncia por
parte de terceiros aconteça, como mostra a pesquisa feita pelo Senado (BRASIL,
2017) sobre violência contra as mulheres. A maioria das entrevistadas (90%) informou
que, caso presenciassem um ato agressivo contra uma mulher, faria denúncia,
acessando, em primeira opção a polícia/delegacia comum (52%) e, em segundo lugar,
a delegacia da mulher (32%). A maioria das participantes na pesquisa afirma que
denunciaria, caso presenciasse um ato de agressão (90%). Todavia, é difícil encontrar
informações quantitativas e descrição do perfil de quem denuncia as violências
contra as mulheres, para além da mulher mesma que sofreu a violência.
Apesar de uma das estratégias para coibir a violência doméstica ser a criação
de campanhas que visem desconstruir o mito legitimador “em briga de marido e
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mulher ninguém mete a colher”, sabemos que as pessoas, no geral, têm medo de
denunciar e acabam fazendo “vistas grossas” à violência que muitas vezes “mora”
ao seu lado. Essa dificuldade em denunciar nos conduz à reflexão sobre a dicotomia
entre a esfera pública e a esfera privada, que faremos a seguir.
Terrorismo íntimo e a dicotomia público x privado
Na introdução, trouxemos a definição de terrorismo íntimo, entretanto, essa
definição merece atenção especial em tempos de pandemia. Recorrendo à definição
filosófica de terrorismo feita por Teichman (1989), entendemos que a expressão
“terrorismo íntimo” precisa ser diferenciada da noção de violência doméstica ou
violência contra as mulheres que circula no senso comum e, até mesmo, entre
profissionais da saúde. Terrorismo íntimo é uma prática de cunho político, coercitiva,
que aterra a pessoa sobrevivente no contexto privado do/a perpetrador/a,
impedindo-a, por meio de táticas de terror, à participação desta nas esferas privadas
e de qualquer contato com pessoas a não ser o/a próprio/a perpetrador/a. Não se
restringindo às relações heterossexuais, abarca violências físicas, patrimoniais ou
simbólicas cometidas em ambiente privado (residência, quarto de alojamento ou
hotel) ou público (parques, escolas, trabalho, etc.) por esposo/a, noivo/a,
parceiro/a, namorado/a ou mesmo por um estranho. As táticas terroristas são
sistemáticas; quer dizer, elas não são eventuais ou situacionais, como pode ser o
caso de violência doméstica, elas são persistentes e contínuas. Incluem ataques
imprevisíveis, encarceramento, privação de consumo (não comprar absorvente,
alimentos, corte de eletricidade e telefonia, não permitir higiene pessoal),
sabotagem, tortura física e psicológica (aliás, não há tortura física desconectada da
psicológica e não há tortura psicológica sem efeitos no corpo).
Enraizado no patriarcado, o terrorismo íntimo é uma continuação do
terrorismo de Estado e ao mesmo tempo uma insurgência às injustiças de gênero.
Nesse sentido, o entendimento sobre o terrorismo íntimo migraria do campo da moral
e do comportamento individual para entrar no campo da ética enquanto instância
crítica e propositiva. A reflexão a ser constituída aqui seria o quanto o terrorismo
íntimo pode servir como uma insurgência radical que faz, ao mesmo tempo, uma
denúncia ao Estado e às inequidades de gênero engendradas pelo patriarcado e
sofisticadas pelo sistema político e econômico neoliberal. Assim, é preciso considerar
que “os objetivos do terrorista não são irrelevantes” (TEICHMAN, 1989, p. 517) e
18
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merecem um olhar sensível a este problema social para além da moralidade. Ao invés
de julgar a ação como errada, culpabilizando o sujeito perpetrador, é imprescindível
adotar uma ética Brechtiana 10, entendendo a violência a partir das margens que
aprisionam o insurgente, no caso as normatizações, regras, as filosofias do sistema
liberal e patriarcal.
Por que alguém se insurgiria desta forma? Ou melhor, que condições produzem
esse insurgente? O que há de diferente entre um/a terrorista íntimo/a e um/a pessoa
que comete aquele tipo de violência doméstica mais (rapidamente) reportada aos
agentes públicos? Como a dicotomia entre público-privado opera nesse sujeito? Em
tempos de pandemia, que contornos essa tipificação adquire? Para refletir sobre
estas questões, iremos adensar a discussão já levantada pelas feministas sobre a
dicotomia entre o privado e o público. Como relembrou Cyfer (2010, p. 137), citando
Mackinon (1987), “as criminalizações da violência doméstica e, em particular, do
estupro marital estão entre as discriminações de gênero que mais desafiam a
dicotomia público-privado, em qualquer de suas versões”.
Principalmente nas sociedades capitalistas, estas discussões nos remetem às
relações entre feminismo e liberalismo. De acordo com Pateman (1983), nem
liberalismo nem feminismo são concebíveis sem alguma concepção de liberdade,
igualdade e emancipação das hierarquias tradicionalmente instituídas socialmente.
Para as feministas que enfrentam esta problemática, o liberalismo, de acordo com
Pateman (1983), é entendido como sendo “estruturado pelas relações patriarcais e
de classe, considerando a esfera doméstica (privada) e a sociedade civil (pública)
como interligadas. Estas esferas “são os dois lados da mesma moeda do
patriarcalismo liberal” (PATEMAN, 1983, pp. 284-285). Por este prisma, a dicotomia
entre público e privado acaba por obscurecer “a sujeição das mulheres aos homens
dentro de uma ordem aparentemente universal, igualitária e individualista”
(PATEMAN, 1983, pp. 282-283). Esta sujeição é sustentada e reforçada pela
naturalização desta sujeição aos homens e pela repetição nas representações e
imaginário social da esfera doméstica privada como sendo a mais adequada às
mulheres (selada pela maternidade e pela disponibilidade ao ato sexual), ainda que
10
Referência ao verso do poema de Bertold Brecht (2000): Do rio que tudo arrasta se / diz que é
violento / Mas ninguém diz violentas as / margens que o comprimem.
19
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o capitalismo cada vez mais demande a mão-de-obra das mulheres em contextos
públicos, principalmente em trabalhos com remuneração inferior ao dos homens e
em contextos ligado ao cuidado, tais como Enfermagem, Serviço Social, docência,
Psicologia, algo que ficou evidente na pandemia.
A expressão popular “a mulher é a rainha do lar” é ideologia que cria a noção
distorcida do real: é o homem, por meio de seu lugar de fala, que reina nesse
contexto “os homens habitam e governam adequadamente ambas as esferas”
(PATEMAN, 1983, p. 283), pois não bastaria ocupar uma esfera, já que é a
participação na esfera pública que poderá garantir seus interesses (particulares),
além de proteger e aumentar sua propriedade (privada). O homem só é capaz de
ocupar duas esferas ao mesmo tempo porque está liberado da responsabilidade das
tarefas de alta demanda não-remuneradas do espaço privado, tais como preparar
alimento, limpeza da casa, cuidados com os filhos, economia doméstica, etc., e se
a mulher “também é uma trabalhadora remunerada, assumirá um turno adicional de
trabalho” (IBIDEM, p. 296). Em outras palavras, para que o patriarcado, enquanto
domínio do pater/daquele que detém o poder de propriedade, continue a existir, os
homens precisam ocupar “por direito natural” ambas as esferas, cada uma de um
modo específico. A representação social de que o espaço doméstico é do domínio
das mulheres mantém esse sistema vivo, lembrando que muitas mulheres e homens
alimentam essa hiper-representação.
Essa separação entre as esferas é deletéria à equidade de gênero, o que tem
sido reconhecido há tempos pelas feministas críticas e materializado no slogan “o
pessoal é político”. Esse enunciado rejeita explicitamente a separação liberal entre
privado e público, também implica que nenhuma distinção pode ou deve ser traçada
entre as duas esferas e que problemas "pessoais" podem ser resolvidos apenas por
meios políticos e ação política (PATEMAN, 1983, p. 295). De fato, “a esfera da vida
doméstica está no coração da sociedade civil ao invés de aparte ou separada dela”
(IBIDEM, p. 297). Essa perspectiva feminista crítica contribui para “iluminar muitos
aspectos desagradáveis da vida sexual e doméstica, em particular no que se refere
às violências” (IBIDEM, p. 297), principalmente em contextos de epidemia, como o
que estamos vivendo agora frente ao novo coronavírus, cuja recomendação é “fique
em casa”, permaneça apenas na esfera doméstica, corroborando o discurso do
perpetrador da violência.
20
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Essa recomendação propiciou um estremecimento na dicotomia públicoprivado. Ainda não temos estudos longitudinais que abordem o que acontece quando
também ao homem é demandado que se afaste da esfera pública, que saia das ruas,
do local tradicional de trabalho e permaneça no local de “sua rainha”. Pouco
sabemos sobre como se sente a mulher que agora precisa conviver o dia e a noite
com este homem e menos ainda sabemos dos efeitos do “fique em casa” nas relações
afetivas, sexuais. É tudo muito novo; ainda estamos especulando e estas questões
merecem a atenção dos cientistas sociais. Podemos especular que a medida “fique
em casa” deve gerar efeitos mesmo naqueles homens que não podem permanecer
em casa durante a pandemia por exigências laborais e que já mantinham relações
violentas com a mulher, pois, agora, suas demandas de isolamento à mulher são
corroboradas por instituições de autoridade. Problemas antigos permanecem, mas
podem ser interpretados sob uma nova ótica, tanto pelo perpetrador quanto por
quem sofre a violência.
O que fazer diante da separação entre esfera pública e privada, separação
esta que pode estar sendo reconfirmada pelas medidas de isolamento social? Embora
Pateman (1983, p. 300) entenda que possa ser “utópico supor que a tensão entre o
pessoal e o político, entre amor e justiça, entre individualidade e comunalidade
desaparecerá com o patriarcalismo liberal”, ela acredita que a dicotomia público x
privado precisa ser radicalmente transformada, de modo que as mulheres possam
participar plenamente e equitativamente na vida social e os homens, por sua vez,
comecem a compartilhar igualmente a parentalidade e as outras tarefas domésticas.
Essa transformação envolve reorganização produtiva, mudança nos significados e
práticas do “trabalho” e da cidadania.
Desse modo, devemos compreender que não basta pensar e implementar
aquelas ações estratégicas, apontadas anteriormente por nós, para abordar a
problemática da violência e do terrorismo íntimo em tempos de COVID-19 (ou em
quaisquer outros tempos em que persistirem as violências). Para nós, cientistas
sociais e para profissionais da saúde teremos que articular modos inventivos para que
a população desconstrua suas representações sobre masculinidades, sobre o que é
tornar-se mulher, sobre o que é violência e terrorismo e, acima de tudo, romper com
a dicotomia entre a esfera pública e a esfera privada. Isso implica, inclusive, discutir
sobre o que é equidade de gênero, já que “quanto mais abstrata e formalista a
21
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concepção de igualdade, mais intensa será a separação entre o público e o privado;
ao passo que, quanto mais focada na igualdade material, mais essa separação terá
de ser atenuada” (CYFER, 2010, p. 137).
Ao refletirmos sobre público x privado e equidade de gênero também
precisaremos nos distanciar de visões que colocam as mulheres como vítimas e os
homens como vilões. Trazer a problemática do terrorismo íntimo nos convoca a nos
deslocar desse tipo de visão à medida que compreendemos que a pessoa que comete
violência é um insurgente contra todo um sistema, ainda que isso não se dê no nível
consciente e possa ser de difícil compreensão. O maior número de adoecimento com
COVID-19 no mundo são homens, o maior número de encarcerados são homens. Se
pudermos enxergar para além da superfície desses números, veremos que os homens
se insurgem contra toda a maleficência de um sistema à sua moda, a partir daquilo
que lhes é possível.
Considerações finais
“Fechamento” dos acontecimentos narrados no início do artigo. O juiz
absolveu o marido da senhora e sua companheira que residia com ele na casa, em
Sorocaba. Ele entendeu que o casal procurava cuidar da mulher, na medida dos seus
recursos. “A sentença acatou a tese da defesa, de que [ela] era portadora de
esquizofrenia e precisava ficar fora do convívio familiar por ser agressiva. O quarto
ficava desprovido de conforto (...), porque a mulher poderia se ferir” (STEGANHA,
2011, on-line). Quanto ao segundo acontecimento, em Cuiabá, o marido da jovem
teve a prisão decretada e está foragido (SOARES, 2016). Já no terceiro
acontecimento, em Fortaleza, o empresário prestou esclarecimentos a respeito das
duas armas de fogo encontradas no apartamento da família e, depois, foi liberado
(G1, 2017). Não encontramos novas informações na mídia ou via mecanismos de
busca da internet sobre este acontecimento.
Em nossa escrita, tecemos reflexões acerca das possíveis intersecções entre
violência contra as mulheres, as relações de gênero e a medida de distanciamento
social em tempos de pandemia da COVID-19, tratando particularmente do terrorismo
íntimo. Mostramos que as violências contra as mulheres, que são históricas, tiveram
22
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as possibilidades de denúncia cerceadas, gerando um aumento nas taxas de
feminicídio, em comparação ao ano anterior no mesmo período.
Em particular, não sabemos se o terrorismo íntimo aumentou durante a
pandemia da COVID-19, mas este aumento no registro de feminicídios é a evidência
de que o acesso a recursos de proteção e promoção de saúde mental e direitos das
mulheres está sendo obtusado. As casas que já são porões obscuros e alienados
continuarão a ser o que são, mas as mínimas frestas de luz que poderiam entrar e
sair desses lugares de terror são apagadas pelo pânico de se contaminar pelo outro.
O Estado falha, nós falhamos. “Ficar em casa”, enquanto medida de proteção à
saúde, não deveria provocar e acirrar o silêncio sobre as vidas dos outros, sobre as
nossas vidas; deveria ser o momento para um silêncio de outra ordem, um silêncio
interno, de conversa consigo, com o mundo, uma conversa ética, de reflexão sobre
o mundo que desejamos para nós. Durante a pandemia, a violência doméstica foi
assunto recorrente nas mídias, o que parece ter provocado o pensar ações específicas
de enfrentamento à violência no contexto da pandemia, pois, como mostramos,
diversas ações foram postas em prática durante este contexto.
Por outro lado, evidenciar as violências nas mídias termina por reduzir a
problemática a uma questão numérica e contextual, levando as pessoas a pensarem
que a violência e o terrorismo íntimo serão amenizados ou exterminados ao término
da pandemia. É responsabilidade da mídia contextualizar o aumento da violência
doméstica durante a pandemia como resultado de uma sociedade injusta, onde
comportamentos coercitivos são incorporados como um padrão regular dos
relacionamentos afetivos. Isso também torna evidente que os autores desse tipo de
violência não são pessoas com graves transtornos mentais, mas sim, homens comuns
que se sentem “donos” das mulheres de suas famílias e são legitimados nesse lugar
por discursos e práticas sociais. Dessa forma, a pandemia apenas evidencia
desigualdades estruturais. Assim, consideramos urgente colocar em pauta nas mídias
e nos discursos, para reverberar no senso comum, a perversidade da dicotomia
público x privado, inclusive ressaltando a persistente e silenciosa prática do
terrorismo íntimo marcada pelas inequidades de gênero, raça/etnia, geracional e
tantas outras. Esta é uma questão ética que precisamos enfrentar para além do
contexto da pandemia de COVID-19.
23
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Por fim, queremos salientar que não temos a intuito, com esse artigo, afirmar
a soberania semântica da expressão “terrorismo íntimo”. A intenção foi chamar a
atenção com relação aos usos diferentes modos de uso do poder (dominação) que
adquirem um caráter de terror. A decisão por colocar em evidência o sintagma
“terrorismo íntimo” para discutir violência a partir de perspectivas sociológicas e
psicossociais não deve anular a importância de outros constructos analíticos e
jurídicos que orbitam a esfera pública, tais como “violência doméstica” e “violência
contra a mulher”. Este sintagma deve associar-se, quando pertinente, a estes e
outros constructos de modo a auxiliar na compreensão sobre as diferentes práticas
de violência de gênero. Sugerimos novos estudos empíricos que observem as
representações indicativas de violência, buscando identificar nódulos linguísticos
que sejam sinais de práticas de terrorismo dentro da gramática “violência
doméstica”, “violência contra a mulher”, “violência de gênero”, etc.
Referências
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Recebido: 20 junho 2020
Aceito: 19 agosto 2020
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