Centro de Estudos Estratégicos e Planejamento Espacial Marinho
BOLETIM CEDEPEM
Março/Maio de 2021
Logomarca: Ricardo Salvador De Toma García
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CEDEPEM – Centro de Estudos Estratégicos e Planejamento Espacial Marinho (CEDEPEM)
Idealização e organização:
Prof. Emérito Eurico de Lima Figueiredo
Coordenador
do
Núcleo
de
Estudos
Avançados
Decano do Instituto de Estudos Estratégicos da Universidade Federal Fluminense (INEST/UFF)
Profa. Dra. Etiene Villela Marroni
Programa
de
Pós-Graduação
em
Ciência
Política
GP Política Internacional e Gestão do Espaço Oceânico. Universidade Federal de Pelotas
(NEA)
(PPGCPol/UFPel)
Prof. Alexandre Rocha Violante
Coordenador Executivo (EGN)
Gustavo Gordo de Freitas
Secretário Executivo
Alana dos Santos Tenório
Secretária Adjunta de Mídias Digitais
Pedro Henrique Oliveira
Secretário Adjunto de Mídias Sociais
Coordenadores(as) da Rede CEDEPEM
Doutorando Alexandre Rocha Violante (EGN/UFF)
Prof. Dr. Delmo de Oliveira Torres Arguelhes (NEA/UFF)
Profa. Dra. Fátima Verônica Pereira Vila Nova (IFPE)
Doutorandos Guilherme Tadeu Berriel da Silva Oliveira e Júlia Schutz Veiga (UNL)
Prof. Dr. Marcos dos Santos (IME) e Mestre Thiago Silva e Souza (SGM/MB)
Profa. Dra. Maria Meirice Pereira Barbosa (IFPE)
Mestranda Marina Molina Costa Tavares (UFPel)
Doutorandos Wesley Sá Teles Guerra (UNED) Ricardo Salvador De Toma García (UFRGS)
Boletim CEDEPEM
Idealização: Ricardo Salvador de Toma Garcia.
Editores executivos: Wesley Sá Teles Guerra e Delmo de Oliveira Torres Arguelhes
Editor adjunto: Gustavo Gordo de Freitas
Boletim Volume I/2021 45 páginas 08/03/2021- CEDEPEM - Brasil
Os artigos publicados neste boletim são de autoria e responsabilidade dos autores aqui
indicados e não representam nem constituem o posicionamento do CEDEPEM e/ou organizações
vinculadas.
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ÍNDICE
EDITORIAL
4
EXPANSIONISMO OCEÂNICO: O PODER SUBMERSO
8
Etiene Villela Marroni e Alexandre Rocha Violante
A VIDA, NO MAR OU NA TERRA, DEPENDE DELES: OS MANGUEZAIS!
12
Fátima Verônica Pereira Vila Nova e Anailza Cristina Galdino da Silva
A MENTALIDADE MARÍTIMA BRASILEIRA: ensaios preliminares sobre a sua
relevância para o planejamento espacial marinho
16
Júlia Schütz Veiga e Manuela Bocayuva
O CASO DAS ALGAS NO PLANEJAMENTO ESPACIAL MARINHO
21
Danilo Sorato O. Moreira
MINERAIS ESTRATÉGICOS NO MAR BRASILEIRO
24
Gustavo Gordo de Freitas
AS DINÂMICAS TERRITORIAIS DE ACUMULAÇÃO CAPITALISTA: Portos e “Custo
Brasil”
Pedro Henrique Silva de Oliveira
27
A IMPORTÂNCIA DE UMA ESTRATÉGIA DE SEGURANÇA MARÍTIMA NO ATLÂNTICO
SUL
29
Fabrício Robson de Oliveira e Victória Antonia Salomão
GÊNERO E PLANEJAMENTO ESPACIAL MARINHO: BREVES CONSIDERAÇÕES
33
Marina M.C. Tavares, Aline N.O.L. Ferreira, Carla I.M. Rosa, Cintya R.D. Carvalho
e Stela Xavier Terra.
GÊNERO: CONTEXTUALIZANDO SUSTENTABILIDADE SOCIAL EM SISTEMAS
SOCIOECOLÓGICOS MARÍTIMOS
36
Stela Xavier Terra e Cintya Rayssa Dutra Carvalho
O
PLANEJAMENTO
ESPACIAL
MARINHO
ENTRE
AS
NAÇÕES
CENTRO-
AMERICANAS: LIGEIRAS REFLEXÕES SOBRE DESAFIOS PARA A COOPERAÇÃO NO
GOLFO DE FONSECA
Ricardo Salvador de Toma García
43
EDITORIAL
Por Etiene Villela Marroni (PPGCPol/UFPel)
e Delmo de Oliveira Torres Arguelhes (NEA/INEST/UFF)
Os mares aproximam. Esta assertiva elaborada por Montesquieu, e elevada a lei
científica por vários estudiosos da geopolítica, resume bem a estreia do Centro de Estudos
Estratégicos e Planejamento Espacial Marinho (CEDEPEM), e este respectivo boletim
informativo, que apresentamos ao público. As origens do CEDEPEM remontam à iniciativa
pioneira da Universidade Federal de Pelotas (UFPel), em 2013, quando foi criado um
laboratório multidisciplinar de estudos oceânicos. No ano seguinte, um projeto de ensino,
intitulado Planejamento Espacial Marinho (PEM), foi oferecido aos estudantes daquela
universidade, com resultados muito positivos, o que conduziu a diversos projetos de
pesquisa e participação marcante em seminários regionais, nacionais e internacionais. O
estudo do PEM configurou-se em aporte para o entendimento do espaço oceânico no âmbito
das relações domésticas e internacionais de um Estado costeiro.
A partir de 2018, com a consolidação da temática do PEM nos Estudos Estratégicos,
ocorreu a parceria do Grupo de Pesquisa Política Internacional e Gestão do Espaço
Oceânico (vinculado à Universidade Federal de Pelotas) com a Universidade Federal
Fluminense (UFF). A partir dessa parceria, foi criada e consolidada a linha de Pesquisa
Planejamento Espacial Marinho nos Estudos de Cooperação em Segurança Internacional e
Defesa Nacional. Essa integração institucional consolidou-se a partir das temáticas que
passavam a ser estudadas no grupo: Planejamento Espacial Marinho e Estudos
Estratégicos. Para tanto, no ano início do ano de 2019, fez-se uma chamada pública,
objetivando alcançar estudantes, professores e profissionais que se interessassem pela área
em estudo, sendo alcançados excelentes resultados.
Em 2020, o Núcleo de Estudos Avançados do Instituto de Estudos Estratégicos
(INEST), da UFF, propôs uma parceria institucional com o Programa de Pós-Graduação em
Ciência Política da UFPel. O Centro é uma comunidade de estudos e pesquisas voltada para
a análise do PEM, singularizada pela variedade e abertura do leque metodológico.
Institucionalmente, o CEDEPEM vincula-se ao Núcleo de Estudos Avançados (NEA) do
INEST - UFF, localizado na cidade de Niterói, Rio de Janeiro. A criação do Centro foi uma
iniciativa conjunta da Universidade Federal de Pelotas (UFPel) e Universidade Federal
Fluminense (UFF), desde a consolidação de parceria institucional oriunda do Grupo de
Boletim Trimestral. Março/Maio 2021 - Volume I, número 1
4
Pesquisa do CNPq, denominada Política Internacional e Gestão do Espaço Oceânico. O
CEDEPEM surgiu como um espaço plural, multidisciplinar e multiinstitucional, com o objetivo
de estudar todos os aspectos do Planejamento Espacial Marinho e demais temas
relacionados. Com este boletim, pretendemos devolver à sociedade brasileira a parte que
lhe cabe nesta iniciativa: conhecimento.
Em O artigo “Expansionismo Oceânico: o poder submerso” busca demonstrar que
o crescente uso dos recursos oceânicos é resultado de um fenômeno global, onde os
Estados e suas populações procuram, cada vez mais, um elevado padrão de vida,
aumentando, substancialmente, o consumo dos recursos energéticos provenientes das
plataformas continentais. Embora este argumento pareça esclarecedor, está longe de ser
abrangente e relevante quanto ao comportamento territorial e/ou espacial da geopolítica
oceânica.
Em “A Vida, no Mar ou na Terra, Depende Deles: Os Manguezais" vemos que
manguezais são ecossistemas costeiros inseridos na interface terrestre-marinha que
recebem influência oceânica e fluvial. Esse ambiente apresenta uma expressiva diversidade
de funções, servindo de área de berçário, abrigo, alimentação e reprodução para espécies
marinhas, estuarinas, límnicas e terrestres. Atuam como zonas de amortecimento costeiro,
além de fornecer nutrientes que sustentam a vida nos ecossistemas marinhos. Destacandose ainda, a importância que esse ambiente reflete nas relações socioculturais em diversas
comunidades costeiras. Embora seja reconhecida a relevância deste ecossistema para
conservação da biodiversidade, diversos impactos ambientais têm provocado uma
desenfreada degradação dos manguezais brasileiros, que aliados à inação do Estado
evocam a necessidade de refletir acerca da conservação dos nossos ecossistemas.
Em “A Mentalidade Marítima Brasileira: Ensaios Preliminares sobre a sua
Relevância para o Planejamento Espacial Marinho” as autoras têm
como objetivo
promover uma conscientização sobre relevantes projetos para o fortalecimento da identidade
marítima brasileira. O progresso do LEPLAC e o desenvolvimento do conceito de ‘Amazônia
Azul’ são enaltecidos neste ensaio preliminar. A busca pelo desenvolvimento sustentável e
o progresso da ‘economia azul’ fazem com que o mar ganhe espaço cativo nas agendas,
internacional e nacional. Assim, a análise de fenômenos que construíram (ou constroem) a
mentalidade marítima brasileira são extremamente pertinentes e podem, a partir dela,
promover o aperfeiçoamento das políticas públicas e do manejo do uso do mar e das
atividades marítimas.
Boletim Trimestral. Março/Maio 2021 - Volume I, número 1
5
O artigo “O Caso das Algas no Planejamento Espacial Marinho”
tem como
finalidade apresentar o caso das Algas no planejamento espacial marinho, destacando a
congruência entre a gestão econômica, a ciência e a tecnologia. No exemplo da Embrapa,
percebe-se o potencial que a pesquisa sobre algas poderá trazer ao estado brasileiro,
especialmente se feito com uso racional do recurso. Noutros termos, as algas deverão ser
mapeadas, a fim de que o potencial econômico seja usado de forma sustentável e benéfica
para a sociedade brasileira. Para o boletim foram analisadas fontes secundárias (notícias de
jornais), fontes bibliográficas (literatura sobre planejamento espacial marinho) e fontes
quantitativas (dados econômicos sobre algas).
Em “Minerais Estratégicos no Mar Brasileiro” procura-se apresentar o conceito de
minerais estratégicos aos olhos do Estado brasileiro e em que medida este ente tem
envidado esforços para conhecer o assoalho marinho sob sua jurisdição e para explorá-lo.
Para tal, lançar-se-á mão do Plano Nacional de Mineração 2030 (PNM-2030), dos relatórios
anuais de atividades do Serviço Geológico Brasileiro (CPRM) de 2018 e 2019, bem como
um dos relatórios do Projeto Estal. Por meio da avaliação destes documentos pretende-se
compreender de que modo o Estado brasileiro vem incentivando o desenvolvimento de
pesquisas para a apropriação efetiva e eficiente do espaço marinho em busca de suprir as
necessidades internas de minerais estratégicos.
O artigo “As Dinâmicas Territoriais de Acumulação Capitalista: Portos e ‘Custo
Brasil’” busca versar brevemente sobre a importância da estrutura portuária dentro das
dinâmicas do processo de acumulação capitalista nacionais. Nesse sentido, a discussão
aqui realizada encontra seu fio condutor dentro das determinações que regem o processo
de troca mercantil, tal como descrito por Karl Marx em “O Capital”. Ademais, leva-se o olhar
para as dinâmicas nacionais brasileiras e se verifica o chamado “custo Brasil” como um dos
principais entraves para o desenvolvimento do país.
Em “A Importância de uma Estratégia de Segurança Marítima no Atlântico Sul”
pode-se verificar que se na dimensão global, o Atlântico Sul tem papel secundário, no âmbito
regional e nacional, sua importância econômica e geopolítica é fundamental para o Brasil.
Entretanto, a maioria das Marinhas e Guardas-Costeiras dos países lindeiros ao Atlântico
Sul não estão equipadas e preparadas para garantir a soberania nas suas águas
jurisdicionais e o nosso país não é diferente. A partir desse aspecto, o presente trabalho,com
análise documental, histórica e de políticas públicas, propõe-se a avaliar a forma como o
Estado brasileiro trabalha a segurança marítima e a necessidade de apliacação de uma
política de Planejamento Espacial Marinho.
Boletim Trimestral. Março/Maio 2021 - Volume I, número 1
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Em “Gênero e Planejamento Espacial Marinho: breves considerações” as autoras
visam contemplar oportunidades e desafios ao desenvolvimento do Planejamento Espacial
Marinho (PEM) no Brasil. Buscou-se explorar a forma como o PEM e questões de gênero
associadas têm sido abordados em foros multilaterais. Sendo o PEM um importante
processo público de gestão do espaço, altamente adaptável e de amplo escopo, frisa-se a
necessidade de incorporar a este processo as reivindicações que emergem da luta pela
equidade de gênero. Partindo-se deste raciocínio, este artigo sugere a observação global de
estratégias de inserção das questões de gênero junto ao PEM como forma de estimular o
pensamento crítico.
O artigo “Gênero: Contextualizando Sustentabilidade Social em Sistemas
Socioecológicos Marítimos” as autoras apontam que do nomadismo ao sedentarismo e a
revolução agrícola, o excedente de produção precisou ser escoado fluvialmente.
Posteriormente as grandes navegações e o costume de navegar tanto pela soberania quanto
pelo comércio moldaram as sociedades e as aproximaram do litoral, onde desenvolveramse rápida e complexamente. Um sistema complexo é caracterizado por ser um sistema
aberto, constituído por ampla variedade de elementos e grande número de interações
dinâmicas entre eles. Enquanto isso, um Sistema Socioecológico (SSE) recomenda-se ser
orientado por uma questão, foco ou problema em específico e delimitá-lo por escalas
(dimensões) com importantes contribuições e entre múltiplos níveis constituintes das
escalas. Para que assim, um SSE possa ser visualizado em panorama macro. Planejamento
Espacial Marinho (PEM) preconiza um desenvolvimento sustentável, e como parte
integrante, a dimensão de Sustentabilidade Social visa equilibrar o uso dos recursos do
oceano e processos de política, ponderando também a equidade de gênero.
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EXPANSIONISMO OCEÂNICO: O PODER SUBMERSO
Por Etiene Villela Marroni (PPGCPol/UFPel) e Alexandre Rocha Violante (PPGEST/UFF)
Coordenadora-Geral e Coordenador Executivo do CEDEPEM
Grupos Sociologia e Estudos do Mar e Geopolítica e Gestão Oceânica
Geralmente, as teorias e conceitos de limites são focados em fronteiras terrestres.
Isso não é novidade se considerarmos que, no decurso da história, os conflitos territoriais
entre Estados aconteceram, principalmente, em terra. Entretanto, nos anos subsequentes à
Segunda Guerra Mundial, uma parte considerável das flutuações territoriais do globo
ocorreram muito mais nos oceanos do que nos continentes, resultado das reivindicações
crescentes da extensão das águas territoriais, onde se encontram as plataformas
continentais e as zonas econômicas exclusivas (ZEE) dos Estados costeiros. De acordo com
Sanger (1987), a competição para o controle exclusivo das áreas oceânicas, no período
atual, tem sido comparada à disputa por colônias de países europeus no século XVIII e XIX.
Sem dúvida, este fenômeno gerou iniciativas importantes, como o significativo interesse pelo
estudo dos oceanos em relação à economia e à geopolítica no contexto internacional.
Observa Cohen (1973) que os Estados Unidos da América lamentaram o fato de que dois
quintos do espaço dos oceanos do mundo formam limites de jurisdição dos Estados
costeiros, como consequência da proliferação de zonas econômicas exclusivas, o que
ocorreu na década de 1970. Logo, os limites oceânicos passaram a receber crescente
atenção, em decorrência dos recursos naturais que, neles, podem ser encontrados. O autor
comenta dois motivos pelos quais os oceanos tornaram-se uma arena de disputas e de
conflitos entre os Estados: primeiro, um aumento significativo no valor dos recursos oriundos
dos oceanos; segundo, a rápida disseminação de Estados soberanos para cobrir,
praticamente, todas as áreas do planeta.
Para Rabkin (2007), o hegemônico Estados Unidos da América tem interesse em
trabalhar com outras nações para proteger o meio ambiente global. Por isso, firma uma série
de convênios e acordos, como, por exemplo, acordos de conservação para preservar os
recursos pesqueiros em águas internacionais. Mas, uma coisa é concordar com um padrão
comum, outra é acatar decisões de um conselho regulatório em curso, pelo qual o
hegemônico país pode ser derrotado. Uma coisa é concordar em submeter determinadas
disputas à arbitragem internacional, com o consentimento de ambas as partes. Mas, não é
Boletim Trimestral. Março/Maio 2021 - Volume I, número 1
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interessante para o Governo norte-americano ficar à mercê de um Tribunal Internacional
para os Direitos do Mar em caráter permanente, com jurisdição obrigatória sobre assuntos
importantes, não podendo interferir em disputas particulares. Para os EUA, aceitar a
Convenção é como ficar preso às ações judiciais, que podem fazer uso de sua autoridade,
legitimamente constituída, e favorecer países menos desenvolvidos em seus julgamentos.
O autor observa que, tradicionalmente, os Estados Unidos da América respeitam os limites
soberanos dos Estados, suas fronteiras legitimadas através de acordos multilaterais, mas
não concordam com tamanha autoridade para instituições internacionais, o que poderia,
futuramente, pôr em risco uma governança global oceânica.
Fiori (1997) reitera que autores das mais variadas tendências teóricas ou
ideológicas parecem concordar quanto a um diagnóstico comum da morte das fronteiras.
Esta hipótese, contudo, permanece em estado de maior imprecisão do que a da própria
globalização e, às vezes, parece, apenas, um eco recorrente e complementar da mesma
utopia das economias despolitizadas e sem fronteiras. A questão remete-nos a um novo
contexto territorialista e “imperialista”, no que tange aos limites oceânicos dos Estados
costeiros. Não se trata, apenas, de salvaguardar territórios ou “espaços” delimitados em
acordos multilaterais, mas de ampliar esses “limites” com o intuito de “acumular” territórios
ricos em recursos naturais. O movimento de globalização, observado sob este viés, poderá
tornar-se um novo movimento de territorialização advindo das fronteiras profundas dos
oceanos e poderá transfigurar-se em risco político para muitos países com problemas de
vizinhança nas fronteiras marítimas. Giddens (2000, p.33) observa que “o risco refere-se a
infortúnios ativamente avaliados em relação a possibilidades futuras”. Neste contexto e
avaliando os ganhos futuros, demonstra-se que não há “morte” nas fronteiras oceânicas,
mas uma espécie de “ressurreição” dos bens não explorados em “mundos profundos”. Com
a globalização isto fica mais evidente.
De acordo com Johnston (1988), traçar a história dos modos de criação dos
limites oceânicos pelos Estados costeiros fornece um quadro conceitual para a análise e
avaliação de todas as reivindicações de limites oceânicos, práticas, arranjos e
assentamentos. Isso porque a maioria das reflexões sobre o tema derivou-se da experiência
em terra. O estudo sobre a reivindicação de um limite oceânico é válido, porque favorece
uma análise preliminar do quadro conceitual para decisões políticas em geral. Assim,
possíveis analogias entre a história das fronteiras terrestres e limites oceânicos podem ser
transformadas e influenciadas a partir de uma nova concepção de tomada de limites
Boletim Trimestral. Março/Maio 2021 - Volume I, número 1
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oceânicos pelos países costeiros do globo. Reitera-se que, há bem pouco tempo, os limites
para além mar passaram a constar das preocupações dos governos.
Portanto, pressupõe-se que o crescente uso dos recursos oceânicos é resultado
de um fenômeno global, onde os Estados e suas populações procuram, cada vez mais, um
elevado padrão de vida, aumentando, substancialmente, o consumo dos recursos
energéticos provenientes das plataformas continentais. Embora este argumento pareça
esclarecedor, está longe de ser abrangente e relevante quanto ao comportamento territorial
e/ou espacial da geopolítica oceânica. No entanto, ele permite entrever que, além do fato
dos Estados estarem em busca de alternativas nesses redutos submarinos com vistas à
segurança energética, há, também, toda uma configuração de acúmulo de capital, através
dos dividendos que os recursos naturais oceânicos representam.
Giovanni Arrighi (1996) demonstra preocupação com as mudanças na
configuração espacial dos processos de acumulação de capital, ocorridas na década de
1970. Refere que esta tendência foi predominante, principalmente, em países e regiões de
alta renda para os de baixa renda. Diz o autor que, independente da direção do movimento,
desde a década de 1970 a tendência é de aumento da mobilidade geográfica do capital. Por
este motivo, deve-se repensar a primazia e interesse das nações na ampliação de seus
limites oceânicos a partir do movimento de territorialização, ocorrido nos anos 1970.
Susan Strange (1970) já previa, em seus estudos, que o ritmo desigual da
mudança no sistema político e econômico internacional afetaria as relações entre Estados;
que haveria o aumento da interdependência econômica global, ditado pela aceleração no
ritmo do desenvolvimento das nações. Neste caso, a “corrida pelos recursos naturais” faz
parte do processo geopolítico de um imenso sistema econômico global, que necessita
desses “recursos” para continuar se retroalimentando. Em tal contexto, pode-se considerar
a Amazônia Azul, localizada no litoral brasileiro, como uma área estratégica, pois é onde se
encontram as maiores reservas de petróleo e gás do Brasil.
Quando se fala em “Amazônia Azul”, termo cunhado pela Marinha do Brasil, falase de uma extraordinária fonte de recursos naturais que a nação dispõe em seu imenso
litoral, de 8.200 km de extensão e mais de 5,7 milhões de km 2 de espaço oceânico. Porém,
em pleno século XXI, não se pode falar em “fonte de recursos naturais” sem, antes,
mencionar a questão econômica, social e ambiental, à qual se vincula a exploração das
riquezas distribuídas pelo vasto litoral do país.
Boletim Trimestral. Março/Maio 2021 - Volume I, número 1
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Referências
ARRIGHI, Giovanni. O Longo Século XX: dinheiro, poder e as origens de nosso tempo. Trad. Vera Ribeiro. Rev. Trad. César Benjamin.
São Paulo: Editora Unesp, 1996.
COHEN, Saul. Geography and Politics in a World Divided. New York: Oxford University Press, 1973.
FIORI, José L. Globalização, Hegemonia e Império. In: TAVARES, Maria C. e FIORI, José L. (Org.). Poder e Dinheiro: uma economia
política da globalização. Rio de Janeiro: Vozes, 1997.
GIDDENS, Anthony. Mundo em Descontrole: o que a globalização está fazendo de nós. Rio de Janeiro: Record, 2000.
JOHNSTON, Douglas M. The Theory and History of Ocean Boundary-Making. Québec, Canada: McGill-Queen’s University Press, 1988.
MARRONI, Etiene Villela. Política Internacional dos Oceanos: caso brasileiro sobre o processo diplomatico para a plataforma continental
estendida. Tese de Doutorado. Programa de Pós-Graduação em Ciência Política (UFRGS), 2013.
RABKIN, Jeremy. Law Without Nations? Why Constitutional Government Requires Sovereign States. Princeton, New Jersey: Princeton
University Press, 2007.
SANGER, Clyde. Ordering the Oceans: the making of the law of the sea. London: Zed Books, 1987.
STRANGE, Susan. International Economics and International Relations: a case of mutual neglect. International Affairs, (46)2:304-315,
1970.
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A VIDA, NO MAR OU NA TERRA, DEPENDE DELES: OS MANGUEZAIS!
Por Fátima Verônica Pereira Vila Nova (IFPE) e Anailza Cristina Galdino da Silva (IFPE)
Grupo Conservação Ambiental e Planejamento Espacial Marinho (CEDEPEM)
Sim, a vida em muitos aspectos, no mar ou na terra, depende dos manguezais. Os
manguezais são ecossistemas que ocorrem ao longo das regiões costeiras tropicais e
subtropicais, encontram-se em áreas de transição do ambiente terrestre e marinho. Estimase que cerca de 70% das zonas costeiras sejam cobertas por manguezais. No Brasil estão
distribuídos por toda costa, de forma descontínua, desde o Amapá à Santa Catarina, com
maior área de cobertura na região Norte, mais especificamente nos estados do Amapá, Pará
e Maranhão.
Este importante ecossistema de transição ocorre em áreas sujeitas à inundação das
marés, sofrendo influência fluviomarinha. É um ambiente rico em matéria orgânica e formado
por áreas lodosas, nas quais se desenvolve, predominantemente, uma vegetação natural
conhecida como mangue.
O mangue é composto por plantas halófitas que conseguem sobreviver nesses
ambientes alagados, pobre em oxigênio, com flutuação de salinidade, temperatura e sujeito
ao regime diário das marés. As espécies arbóreas típicas dos manguezais brasileiros são:
Avicennia schaueriana Stapft. e Leechman ex Moldenke, A. germinans L., Conocarpus
erectus L., Laguncularia racemosa Gaertn, Rhizophora mangle L., R. harrisoniie L., R.
racemosa G.F.W. Mayer. Estas árvores popularmente são chamadas de mangue preto,
mangue-de-botão, mangue branco e mangue vermelho, respectivamente.
Devido à escassez de oxigênio no solo, as raízes dos mangues crescem em direção
oposta ao sentido da gravidade e outras projetam-se como raízes-escora, ficando expostas
ao ar. As folhas são adaptadas à excreção do sal absorvido em excesso pelas raízes. E
como característica marcante deste ambiente, os manguezais apresentam um forte odor de
putrefação, devido à presença de sulfeto de hidrogênio no solo.
A diversidade de vida nos manguezais está associada à proximidade com outros
ecossistemas e às condições abióticas deste ambiente. O conhecimento a respeito da
importância deste é recente, pois eram tidos como ambientes inóspitos, no entanto,
informações desse ecossistema tão especial apontam uma realidade bem diferente. Os
manguezais funcionam como área de abrigo, reprodução, desenvolvimento e alimentação
Boletim Trimestral. Março/Maio 2021 - Volume I, número 1
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de espécies marinhas, estuarinas, límnicas e terrestres, pouso e alimentação de aves
migratórias, além de ser fundamental à qualidade de ecossistemas adjacentes.
A vida pujante dos recifes depende dos nutrientes dos manguezais, como também da
sustentação dos sedimentos pelas plantas de mangue no estuário, para que a água não
chegue turva nesse ambiente, pois muitas formas de vida nesse ecossistema necessitam de
águas claras para a penetração da luz e, consequente realização de fotossíntese. Os
manguezais funcionam como exportadores de matéria orgânica para o estuário, contribuindo
para a produtividade na zona costeira. Deste modo, a produção pesqueira está diretamente
relacionada à conservação do ecossistema.
O ecossistema também trabalha como estabilizador da costa, pois as raízes dos
mangues fixam os sedimentos. No norte brasileiro, na zona costeira Amazônica, a retirada
da vegetação de mangue potencializou a erosão marinha, pois o manguezal contribui
diretamente para o processo geomorfológico de progradação, fornecendo um mecanismo
adicional de retenção e fixação de sedimentos, atuando como armadilhas para o sedimento
e servindo, também, como proteção à remoção pela energia das ondas.
A importância das zonas de amortecimento dos mangues protetores não pode ser
considerada um exagero. Em regiões onde essas florestas costeiras têm sido desmatadas
surgiram enormes problemas de erosão e assoreamento, e ocorreram terríveis perdas de
vidas humanas e prejuízos materiais decorrentes de furacões, marés de tormentas e
tsunamis.
O manguezal também funciona como filtro de poluentes retendo inclusive metais
pesados em seus sedimentos. A sua vegetação contribui para o enfrentamento das
mudanças do clima, uma vez que captura dióxido de carbono (CO2), um dos principais gases
responsáveis pelo efeito estufa, mais do que as plantas de outros ecossistemas.
O valor dos manguezais extrapola o reino aquático, pois desempenham papéis
fundamentais no ambiente terrestre, sustentam uma riqueza notável de mamíferos, répteis
e anfíbios em todo o mundo. Suas florestas são usadas como áreas de forrageamento,
reprodução e como refúgio de distúrbios de origem antropogênica, por exemplo.
Destaca-se, ainda, o uso social dos manguezais por comunidades, que criam laços
sociais e culturais assimilados pelo conhecimento tradicional que é repassado de geração
em geração, são “as civilizações dos mangues”, as quais dependem da flora, fauna, ciclos
lunares, de marés, da reprodução de peixes e crustáceos.
No entanto, a produção de conhecimento sobre os manguezais não tem sido
suficiente para deter a perda de habitat, de biodiversidade e conversão desses ecossistemas
Boletim Trimestral. Março/Maio 2021 - Volume I, número 1
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para outros fins. Por ano, cerca de 2% dos manguezais são destruídos, o Brasil já perdeu
25% desse ecossistema. A conversão dos manguezais para assentamentos urbanos
remonta à colonização do país, uma vez que a Zona da Mata representa a primeira zona de
povoamento e estabelecimento da atividade açucareira, na qual se desenvolveram os
primeiros aglomerados urbanos. Atualmente, municípios costeiros concentram 26,6% da
população brasileira, segundo o Censo 2010 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
(IBGE), cujas atividades se apresentam como fatores de degradação, a exemplo do despejo
de resíduos urbanos.
A dinâmica nesse espaço perpassa pela implementação e desenvolvimento de
atividades econômicas ligadas ao capital produtivo e, pela lógica de integração produtiva do
espaço (fluxos materiais e imateriais), que envolve uma interescalaridade das ações, de um
lado a produção espacial resulta do movimento do global para o local, do outro, ela também
deriva do movimento contrário. É um complexo arranjo de agentes extra locais e locais, que
resultam em novas questões para velhos problemas, a exemplo das responsabilidades
relacionadas ao dano ambiental e sua interface com a soberania, responsabilização do
Estado pela perda dos serviços ecossistêmicos, a necessidade de um sistema global de
governança ambiental, uma vez que os impactos negativos das alterações na biosfera
ultrapassam os limites dos Estados, entre outras.
Nos últimos anos, os impactos provocados pelos sucessivos desastres ambientais no
Brasil são incalculáveis. Em 2015, a barragem de Fundão, de propriedade da mineradora
Samarco, controlada pelas empresas Vale e BHP Billiton, rompeu e lançou inicialmente 32
milhões de m³ de rejeitos na bacia hidrográfica do Rio Doce, que foram carreados até o
Oceano Atlântico. Vidas humanas perdidas, desagregação de vínculos sociais das
comunidades, interrupção da pesca por tempo indeterminado, interrupção do turismo, perda
e fragmentação de habitats, mortandade de biodiversidade aquática são algumas
consequências dessa tragédia que, até os dias atuais, afetam os ambientes continentais e
marinhos.
Em 2019, um derramamento de petróleo (óleo bruto) atingiu a costa brasileira e
alcançou a faixa litorânea de 11 estados do Nordeste e Sudeste, desastre que vem sendo
considerado o maior derramamento de óleo bruto da história do país e um dos mais extensos
no mundo. As áreas mais vulneráveis do ambiente costeiro ao derramamento de óleo foram
atingidas: os manguezais, praias e restingas. Mais uma vez, interrupção da pesca por tempo
indeterminado e do turismo, além da perda e fragmentação de habitats, mortandade de vida
aquática, fragilização dos povos e comunidades tradicionais e, o modo de vida nos territórios
Boletim Trimestral. Março/Maio 2021 - Volume I, número 1
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que habitam, risco à saúde do contato direto com o material contaminado e com o pescado,
que é a principal fonte de alimentação para essas populações.
Em comum, além dos impactos negativos, a inação do Estado, que enfraquece os
agentes locais, fortalece as estratégias de controle de agentes extra locais sobre o território
nacional, o que evoca a necessidade de pensar a conservação da biodiversidade enquanto
estratégia de soberania, enquanto o Estado-gestor da maior biodiversidade do mundo.
Referências
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Boletim Trimestral. Março/Maio 2021 - Volume I, número 1
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A MENTALIDADE MARÍTIMA BRASILEIRA: ensaios preliminares sobre a sua
relevância para o planejamento espacial marinho
Por Júlia Schütz Veiga (NSL) e Manuela Bocayuva (NSL)
Grupo Direito no Espaço Marítimo (CEDEPEM)
A história conta que o Brasil nasceu pelo mar. Todavia, deixou de valorizá-lo com o
passar dos anos. O resgate da relevância do mar para o país foi realizado aos poucos por
intermédio de inúmeras iniciativas. A necessidade de atuação conjunta entre os Estados
para responder aos problemas atuais (e.g. alterações climáticas e acidificação do oceano)
impôs esse movimento, que está mais forte a cada ano. Os investimentos no mar estão cada
vez maiores, e a utilização do espaço marítimo para a condução de atividades e/ou para a
coleta de recursos naturais para o desenvolvimento de ciência e tecnologia é cada vez mais
intensa. Nesse cenário, o Brasil ocupa um local de destaque, em razão da grande
concentração de recursos marinhos em suas zonas marítimas, bem como da extensão de
sua costa.
Além disso, a arrancada da Década da Ciência Oceânica para o Desenvolvimento
Sustentável da ONU 2021-2030 anseia pela construção de medidas e de iniciativas que
promovam a evolução da ciência e da tecnologia e, consequentemente, propiciem melhoria
na governança do oceano e avanço da economia azul. No Brasil, o oceano vem ganhando
destaque na agenda governamental nas últimas décadas, e alguns dos seus principais
projetos são o plano de levantamento da plataforma continental brasileira (LEPLAC) e o
desenvolvimento do conceito de ‘Amazônia Azul’ (COSTA & SOUZA-SANTOS, 2009, p.
135). Tais projetos dedicam-se ao estudo da relação do Brasil com o mar, i.e. fomentam a
evolução da sua identidade/mentalidade marítima e a relevância disso para o
desenvolvimento nacional (CEIMBRA, 2012, p. 37).
O LEPLAC, por exemplo, está calcado na proposta brasileira de avançar as suas
fronteiras marítimas. Desde a década de 80, especialistas das ciências oceânicas e oficiais
da Marinha do Brasil recolhem dados sobre a plataforma continental brasileira. A partir da
análise desses dados, atestam a viabilidade de extensão desta zona marítima para além das
200 milhas náuticas (cf. artigo 76(4) da CNUDM).
O Brasil depositou o seu pedido em 2004 logo após a publicação de um documento
da Comissão de Limites sobre Plataforma Continental (CLPC), que continha as diretrizes
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para as submissões e um alargamento de prazo para a propositura (MOHKRIAK, 2017) 1. Os
estudos sobre a plataforma continental brasileira começaram em 1987 (cf. dito
anteriormente); porém, somente em 1989, através do Decreto 98,145/89, que o Plano de
Levantamento da Plataforma Continental brasileira (LEPLAC; plano) foi oficialmente criado.
Entre 1987 e 2010, o LEPLAC pautou o seu desenvolvimento na competência
brasileira para a pesquisa oceânica em uma conjugação de esforços e conhecimentos
técnicos e científicos da Marinha do Brasil, da Petrobras e das Universidades Federais da
Bahia, do Pará e Fluminense. Durante este período, uma expressiva quantidade de dados
hidrográficos, sísmicos e gravimétricos foram coletados. Além disso, houve a oportunidade
para promover a formação e o treinamento de recursos humanos, estimulando o progresso
de diversas instituições nacionais e das ciências marinhas. Por fim, destaca-se a relevância
de certos dados e informações que identificaram campos de petróleo com expressivo
potencial econômico (MACHADO, 2015, p. 87).
Estima-se que o LEPLAC produziu em torno de 150 mil quilômetros de perfis
submarinos ao longo do litoral brasileiro (MACHADO, 2015, p. 90). As investigações iniciais
detectaram cinco áreas estratégicas para sustentar a viabilidade de extensão da plataforma
continental, quais sejam, o cone do Amazonas, as cadeias Norte-Brasileira e VitóriaTrindade, o Platô de São Paulo e a elevação do Rio Grande. Todas foram requeridas na
proposta inicial do Brasil, depositado em 2004 (BRASIL, 2004).
Após três anos de análise pela CLPC, o relatório da comissão admitiu o
reconhecimento de 80% do pedido brasileiro. Em contrapartida, rechaçou o requerimento
em uma área com extensão aproximada de 200 mil quilômetros, referindo que ou discordava
da metodologia aplicada ou não havia dados suficientes para embasar o pleito brasileiro
(CLPC, 2004; MACHADO, 2015, pp. 222-227). É sobre essa porção negada que se
debruçou a segunda fase do LEPLAC. Estudos mais aprofundados e a utilização de
tecnologia mais moderna foram alguns dos investimentos realizados. O governo brasileiro
fundamentou a sua posição em decorrência das informações fornecidas pelos seus técnicos
e especialistas que coletaram e processaram os dados e as informações e que garantem a
viabilidade para a conquista do alargamento da plataforma continental nos pontos
controversos (FIGUEIRÔA, 2014, pp. 231 e 232).
1As
deliberações anuais da CLPC definiram que a data limite para a submissão dos pedidos de
extensão da plataforma continental deveriam ser contados a partir da publicação do Scientific and Technical
Guidelines of the Commission on the Limits of the Continental Shelf em 1999 (e não a partir da entrada em
vigor da Convenção). A interpretação argumenta que somente quando do conhecimento deste documento é
que foram estabelecidos os índices e os fundamentos para a construção das proposituras.
Boletim Trimestral. Março/Maio 2021 - Volume I, número 1
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Essa segunda etapa ocorreu em dois momentos (i) entre os anos de 2008 e 2010, e
depois (ii) em 2016 e 2017. No momento de recolhimento desses dados, a CLPC já
apresentava uma atuação mais efetiva (i.e. proporcionou ao Brasil parâmetros mais
concretos sobre a linguagem e a forma requeridas pela comissão), e a tecnologia usada era
mais avançada. Isso influenciou o LEPLAC; os novos dados foram organizados em três
partes (região sul, região equatorial e porção oriental), as quais foram submetidas
separadamente. A submissão da região sul ocorreu em 2015, e o critério restritivo utilizado
foi o de limite exterior (de 350MN); a equatorial, em 2017; e a oriental, em 2018. A porção
oriental foi submetida por último pelo fato de abranger a zona mais importante da plataforma
continental brasileira, qual seja, o polígono do Pré-Sal2 A atividade de exploração e produção
de petróleo incrementa a geração de novos empregos (diretos e indiretos), estimula o
desenvolvimento científico e tecnológico, promove o progresso do setor industrial, aumenta
os rendimentos da União, dos Estados e dos municípios brasileiros e reduz a dependência
em relação à importação do recurso (MACHADO, 2015, pp. 101-127).
A pesquisa extenuante realizada pelo Brasil (até o momento) tem promovido o
desenvolvimento do uso e das diversas atividades do espaço marinho, um relevante fator
para o crescimento econômico do país (PAIM, 2014, pp. 337-342; MENEZES, 2015, pp. 142148), além de viabilizar o aprimoramento e a capacitação profissional e reforçar a
cooperação internacional (MACHADO, 2015, pp. 101-127; FIGUEIRÔA, 2014, pp. 245-260).
Além disso, o avanço da plataforma continental é questão de segurança marítima, uma vez
que as fronteiras marítimas brasileiras avançarão. Portanto, é preciso “adotar uma visão
estratégica do mar segundo três prismas: como espaço de desenvolvimento; como espaço
de projeção de influência externa; e, finalmente, como espaço de segurança e defesa”
(RODRIGUES, 2014, p. 1). Em suma, a proposta submetida pelo país é da monta de 4,2
milhões de quilômetros quadrados (VIDIGAL, 2006, pp. 30 e 31) que, se reconhecida como
sendo pertencente ao Brasil, garante os direitos soberanos sobre os recursos minerais e as
espécies sedentárias dessa zona marítima.
Conjuntamente ao LEPLAC, surgiu o conceito de ‘Amazônia Azul’ (COSTA & SOUZASANTOS, 2009, p. 135). Adotou-o para estabelecer uma comparação com a ‘Amazônia
Verde’3 (MARINHA DO BRASIL), enfatizando a sua grandeza e potencialidade para o
progresso econômico, político, social e cultural do país. Isso porque a ‘Amazônia Verde’
2
O polígono do Pré-Sal é uma região com inúmeros campos de hidrocarbonetos de expressivo valor
econômico (MARTINS, 2010, pp. 25-30; COSTA, 2009, pp. 129-142).
3 ‘Amazônia Verde’ trata-se do espaço geográfico nacional onde encontra-se parte da Floresta
Amazônica.
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contém a maior biodiversidade da Terra. Ali encontram-se grandes volumes do planeta de
água doce e reservas minerais, o que despertou zelo por parte dos legisladores e gestores.
Estes passaram a desenvolver políticas nacionais voltadas para a defesa, a preservação e
o resguardo da soberania nacional sobre o espaço (CARVALHO, 2005). Essa comparação
foi realizada para demonstrar que há outro ambiente igualmente próspero no território
brasileiro. Sua importância estratégica e econômica instiga (ou deve instigar) a mesma
atenção e o mesmo cuidado da sociedade por meio da elaboração e implementação de
medidas e políticas que busquem maximizar o desenvolvimento sustentável desta área, a
qual estava até o momento esquecida (CARVALHO, 2005). Ou seja, a ‘Amazônia Azul’
sustenta o mesmo tratamento que a ‘Amazônia Verde’, porquanto ambas detêm de riquezas
naturais (e potencialmente econômicas) extraordinárias.
Considerando o que fora dito, percebe-se que a consciência marítima é hoje, talvez,
uma das ferramentas mais poderosas para o progresso da sociedade. Por todas essas, o
país mostra-se engajado para a promoção de medidas e políticas públicas que desenvolvam
a mentalidade marítima do Brasil, reforçando o potencial valor do mar e resguardando os
seus recursos marinhos para as gerações futuras. Nesse contexto, De Lucia (2020) atenta
que o direito apresenta-se como a melhor ferramenta para garantir esse movimento, i.e.
refrear os efeitos antropogênicos sobre o planeta requerem um trabalho colaborativo e
coordenado, dentro do qual o desenvolvimento de iniciativas de fortalecimento da
mentalidade marítima inserem-se. Mais do que isso, além da transformação positiva que
essas ações têm sobre o oceano, se mostram valiosas para um melhor entendimento do
meio ambiente marinho brasileiro e para o desenho de novas oportunidades, especialmente
de cunho sustentável, no espaço marinho brasileiro. O planejamento espacial marinho,
portanto, é a ferramenta de gestão que poderá organizar o uso e as atividades no espaço
marinho brasileiro sem que haja ou sobreposição de práticas ou uso/ocupação nocivas para
o oceano.
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O CASO DAS ALGAS NO PLANEJAMENTO ESPACIAL MARINHO
Por Danilo Sorato O. Moreira (PPGEST/UFF)
Grupo Gestão Econômica, de Ciência e Tecnologia no Uso dos Recursos do Mar
(CEDEPEM)
Nas últimas semanas, a Embrapa divulgou a utilização de recursos marítimos para a
inovação tecnológica em alimentos
(EMBRAPA, 2021b). A produção de
corante natural a base alga marítima no
bioma Cerrado demonstra o potencial
que
o
país
biodiversidade,
possui
na
especificamente
sua
em
seus entornos marítimos. A pesquisa
patrocinada
pelo
Boticário
visa
descobrir novos ingredientes para a
indústria cosmética, utilizando-se de
técnicas
sustentáveis
e
que
não
agridem o meio ambiente.
A descoberta científica está em consonância com os objetivos divulgados pela ONU
por meio da “Década Oceânica”. Entre 2021 e 2030, o organismo internacional pretende
ampliar o entendimento sobre os oceanos, conscientizando setores da sociedade civil,
legisladores, empresas e comunidade científica. Nessa mobilização, procura-se cumprir o
Objetivo de Desenvolvimento Sustentável (ODS) 14, que advoga pela conservação e uso
sustentável dos oceanos, dos mares e dos recursos marinhos para o desenvolvimento
sustentável.
Levando em consideração o exemplo no Cerrado, pode-se estender essa experiência
para toda a zona costeira nacional, visto que as algas são organismos vivos presentes em
tais locais. Entretanto, mesmo com essa percepção, o país ainda não conseguiu fazer um
mapeamento adequado da quantidade de recursos e do potencial comercial deles. Qual
seria o potencial econômico desse recurso marítimo?
Segundo dados da FAO, a indústria de algas marinhas tem um valor estimado entre
US $ 5,5 bilhões e US $ 6 bilhões, dentre os quais os produtos para consumo alimentar
somam 5 bilhões de dólares anuais (FAO, 2004, p. 113). As algas podem ser transformadas
Boletim Trimestral. Março/Maio 2021 - Volume I, número 1
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para uma série de produtos, tais como, cosméticos, combustíveis, tratamento de águas
residuais e agentes antivirais. Os maiores produtores mundiais de algas estão localizados
na Ásia, com destaque para as Filipinas e a Indonésia.
Apesar desse potencial econômico, o Brasil ainda não consegue utilizar esse recurso
de forma estratégica, já que todavia não conseguiu transformar o passivo em dividendos
econômicos. Por exemplo, em 2015, o país importou aproximadamente duas toneladas de
goma carragena extraída das algas Kappaphycus alvarezii, para a indústria alimentícia num
custo de 15 milhões de dólares (EMBRAPA, 2021a). Esse dado demonstra certa
dependência nacional dos produtos de fora, o que poderia ser alterado caso fosse bem
planejado o uso dos recursos marítimos de algas.
Mas para a exploração consciente dos recursos marítimos, torna-se necessário fazer
um correto planejamento espacial marítimo que leve em consideração objetivos ecológicos,
econômicos e sociais (VIOLANTE; COSTA, 2020, p. 53). Nesse sentido, o estado brasileiro,
deve agir para o bom cumprimento dessa missão em relação às algas. O mapeamento
adequado da quantidade de algas marítimas nos mares brasileiros é o primeiro passo em
direção ao uso racional dos recursos. Aqui, a atuação sinérgica com as instituições de
pesquisa, como a Embrapa, garantem certa qualidade e legitimidade a esse processo.
Ademais, a participação da iniciativa privada é fundamental, posto que além de garantir
recursos para a pesquisa, direciona os recursos para que sejam utilizados a partir da
demanda do consumidor, como visto no caso do Boticário.
Portanto, as algas marinhas são recursos indispensáveis para que o Brasil alcance
maior desenvolvimento econômico. O bom gerenciamento do espaço marinho por meio do
uso de ciência e tecnologia, poderá garantir mais dividendos econômicos que beneficiem o
meio social do país. Por fim, o mapeamento das algas possibilita um maior conhecimento do
território brasileiro, o que garante informações essenciais para que sejam feitas melhores
políticas de defesa, essenciais para a defesa da soberania nacional.
Boletim Trimestral. Março/Maio 2021 - Volume I, número 1
22
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desenvolvimento e soberania no mar. Hoplos, v. 4, n. 7, p. 49-67.
Boletim Trimestral. Março/Maio 2021 - Volume I, número 1
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MINERAIS ESTRATÉGICOS NO MAR BRASILEIRO
Por Gustavo Gordo de Freitas
Grupo Gestão Econômica, de Ciência e Tecnologia no Uso dos Recursos do Mar
(CEDEPEM)
Neste escrito, procurar-se-á apresentar o conceito de minerais estratégicos aos olhos
do Estado brasileiro e em que medida este ente tem envidado esforços para conhecer o
assoalho marinho sob sua jurisdição e para explorá-lo. Para tal, lançar-se-á mão do Plano
Nacional de Mineração 2030 (PNM-2030), dos relatórios anuais de atividades do Serviço
Geológico Brasileiro (CPRM) de 2018 e 2019, bem como um dos relatórios do Projeto Estal.
Por meio da avaliação destes documentos pretende-se compreender de que modo o Estado
brasileiro vem incentivando o desenvolvimento de pesquisas para a apropriação efetiva e
eficiente do espaço marinho em busca de suprir as necessidades internas de minerais
estratégicos.
São considerados “estratégicos” os minerais localizados no território de um
determinado Estado aos quais este atribua crucial importância para o completo
desenvolvimento do País. Atualmente, o documento que indica quais minerais são
estratégicos para o Brasil é o Plano Nacional de Mineração 2030 (PNM-2030), publicado em
2011. Ali, explica-se que três situações podem levar o Estado brasileiro a considerar um
determinado mineral como estratégico, sejam: 1. aqueles cuja necessidade de importação é
alta a fim de suprir determinados setores da economia nacional; 2. aqueles cuja importância
econômica espera-se que aumente nos próximos anos devido a seus usos para fins
tecnológicos; e 3. aqueles nos quais o País tenha vantagens comparativas no cenário
internacional (BRASIL; MME, 2011).
Entre os primeiros estão os minerais utilizados na fertilização do solo (Nitrogênio,
Potássio e Fósforo), tendo-se em vista a grande necessidade nutrientes, inerente ao solo
brasileiro, a fim de garantir o abastecimento de alimentos em um mercado gigantesco, “o
que acarreta em forte impacto na balança comercial” (BRASIL; MME, 2011, p.85).
Atualmente, o Brasil é um dos maiores importadores de fertilizantes do mundo, totalizando
cerca de 33 milhões de toneladas para fins agrícolas em 2020 (ANDA, 2021).
Entre os minerais utilizados para fins tecnológicos verifica-se as terras raras, o lítio, o
cobalto, o tântalo e outros materiais utilizados na produção de artigos de alta tecnologia. No
Boletim Trimestral. Março/Maio 2021 - Volume I, número 1
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contexto do PNM-2030, as terras raras são bastante evidenciadas tendo-se em vista a
grande quantidade de reservas existentes do Brasil. Contudo, estatui-se que
“A estratégia aqui não deve se limitar à descoberta e produção destes bens
minerais no País. [...] com a necessidade de programas específicos
coordenados entre governo e setor privado para o desenvolvimento de
processos e produtos em cadeias produtivas de alto valor agregado,
eventualmente atuando em determinados nichos, em um ambiente de intensa
competitividade internacional.” (BRASIL; MME, 2011)
Em relação ao minerais sobre os quais o País tem vantagens comparativas, pode-se
dizer que o principal seja o minério de ferro compreendendo à maior parte do faturamento
total do setor, com cerca de 138,7 bilhões de reais em 2020, 39% a mais do que no ano
anterior (IBRAM, 2021). Comparativamente, o segundo mineral mais rentável é o minério de
ouro que, mesmo tendo um aumento de 76% em relação ao ano anterior, representou um
faturamento total de 23,2 bilhões de reais em 2020 (IBRAM, 2021).
Segundo relatório do Projeto Estal (BEZERRA, 2009) sobre as potencialidades
minerais na região Nordeste, havia no ano de sua publicação uma série de depósitos de
conchas calcárias ao longo da costa e plataforma continental da Bahia, bem como a
potencialidade apontada por pesquisas da época de uma série de reservas do mesmo
mineral em partes da costa do Ceará e Pernambuco. Também aponta para o potencial de
exploração de Potássio na bacia do Recôncavo baiano em área submarina, então, fato
inédito. No estado da Bahia ainda, a Companhia Baiana de Pesquisa Mineral indicava a
potencialidade de exploração de calcário biodetrítico marinho no sul do estado.
O Relatório do CPRM de 2018 (BRASIL;MME;CPRM, 2019) indica que, durante o
referido ano, cinco projetos de pesquisa foram realizados nas águas brasileiras, sendo três
no âmbito do REMPLAC e dois no âmbito do PROAREA. O primeiro projeto, chamado
“Plataforma Rasa”, analisou áreas marinhas do Ceará, Pernambuco, Alagoas e Fernando
de Noronha. O segundo chama-se Projeto Jequitinhonha, que mapeou a desembocadura
dos rios Jequitinhonha e Pardo-Salabro, ao sul da Bahia. O terceiro, é o Projeto Fosforita
que processou os dados recolhidos sobre a área do Terraço do Rio Grande em 2010 e 2011
para a elaboração de mapas. O quarto é o Projeto Elevação do Rio Grande que, trabalhando
com a Autoridade Internacional dos Fundo Marinhos, procura fazer o mapeamento da
Elevação do Rio Grande. No ano de referência foi realizado mapeamento bentônico da área.
Boletim Trimestral. Março/Maio 2021 - Volume I, número 1
25
Por último, há o Projeto Cordilheira que procura mapear a cordilheira equatorial mesooceânica.
Segundo o relatório da mesma entidade referente a 2019 (BRASIL; MME; CPRM,
2020) aponta-se que durante o ano de referência “foram estudadas as plataformas do Ceará
Oeste, Paraíba, Pernambuco e Alagoas” em busca de minerais pesados. Cita-se o Projeto
Fosforitas Marinhas que então se ocupa da identificação de fósforo no Terraço do Rio
Grande, considerado mineral estratégico.
Assim, avaliando-se os resultados de dois anos de trabalho do CPRM e do Projeto
Estal, bem como conhecendo de antemão o contexto geral de estudos dos recursos
marinhos brasileiros, pode-se verificar que embora o conhecimento que se tenha sobre os
mesmos não venha sendo construído numa perspectiva linear e concatenada entre
diferentes instituições, há em certa medida uma progressão em seus estudos individuais
rumo à descoberta de fontes de recursos minerais no mar. Neste sentido, pode-se dizer que
é necessário que o Estado brasileiro procure desenvolver modelos de PEM para a final
conectar todos os estudos feitos sobre geologia marinha em diferentes entidades e criar uma
base de dados sólida e eficiente que permita a exploração consciente dos recursos naturais
existentes e permita que a sociedade desfrute efetivamente de seus benefícios.
Referências
ANDA. Principais Indicadores do Setor de Fertilizantes. Associação Nacional para Difusão de Adubos. Publicado em 08 de fevereiro
de 2021. Disponível em: <https://anda.org.br/wp-content/uploads/2021/02/Principais_Indicadores_2020_.pdf>. Acesso em: 25 fev. 2021.
BEZERRA, Marcelo S. Potencial do Incremento do Setor Mineral do Nordeste. Ministério de Minas e Energia. Banco Mundial. Projeto
Estal. Publicado em novembro de 2009. Disponível em: <https://www.gov.br/mme/pt-br/assuntos/secretarias/geologia-mineracao-etransformacao-mineral/relatorios-de-apoio-ao-pnm-2030-projeto-estal-1/estudosespecificos/documentos/p55_rt81_perfil_do_setor_mineral_no_nordeste_e_anxlise_das_possib.pdf/@@download/file/P55_RT81_Perfil_
do_Setor_Mineral_no_Nordeste_e_anxlise_das_possib.pdf>. Acesso em: 27 fev. 2021.
BRASIL; MME. Plano Nacional de Mineração 2030: Geologia, Mineração e Transformação Mineral. Secretaria de Geologia, Mineração
e
Transformação
Mineral.
Publicado
em
maio
de
2011.
Disponível
em:
<http://antigo.mme.gov.br/documents/36108/469987/PNM_2030.pdf/c1c58bf5-d32b-00be-5b70-8bf73e4923ad>. Acesso em: 25 fev.
2021.
BRASIL; MME; CPRM. Relatório da Administração 2018/2019. Serviço Geológico do Brasil. Publicado em
[2020]. Disponível
em:<http://www.cprm.gov.br/publique/media/informacao_publica/rel_anual_2019.pdf>. Acesso em: 27 fev. 2021.
IBRAM. Setor Mineral
2020. Instituto Brasileiro de Mineração. Publicado em
02 de fevereiro de 2021.
Disponível
em:<http://portaldamineracao.com.br/wp-content/uploads/2021/02/Apresentacao_Resultados_Setor_Mineral_2020-1.pdf>. Acesso em: 25
fev. 2021
Boletim Trimestral. Março/Maio 2021 - Volume I, número 1
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AS DINÂMICAS TERRITORIAIS DE ACUMULAÇÃO CAPITALISTA:
Portos e “Custo Brasil”
Por Pedro Henrique Silva de Oliveira (PPGCPol / UFPel)
Grupo Gestão Econômica, de Ciência e Tecnologia
no Uso dos Recursos do Mar (CEDEPEM)
O transporte marítimo possui uma centralidade única dentro do processo de
acumulação capitalista. Esse fato se configura como uma consequência histórica da
formação desse modo produtivo, pois, durante grande parte da história da humanidade, o
mar se configurou como o meio mais eficiente de transporte entre as mais distantes
civilizações. Sua importância é tamanha que certas escolas de pensamento, principalmente
aquelas que derivam seu olhar dos escritos de autores como Fernand Braudel, encontram a
própria origem do capitalismo e da modernidade em eventos como as grandes navegações
do século XV.
Nesse sentido, a garantia do acesso ao mar sempre se configurou como um fator
estruturante da economia internacional, conferindo uma vantagem comparativa para todos
os países capazes de usufruir desse recurso. Trata-se de um argumento que é
especialmente verdadeiro no caso do Brasil, uma nação que possui 7941 quilômetros de
extensão costeira.
A dependência brasileira da exploração marítima pode ser verificada quando
trazemos nosso olhar para as características de nossa economia. Segundo dados coletados
pelo Ministério da Indústria, Comércio Exterior e Serviços (MDIC) 4, apenas no ano de 2020,
cerca de 80 por cento das exportações brasileiras foram realizadas por via marítima. Esses
dados tornam evidente que nossos mecanismos de mediação com o mar, os portos, se
configuram como uma prioridade estratégica que deve ser considerada em quaisquer
projetos de desenvolvimento nacional.
Contudo, basta que tragamos nosso olhar para a realidade objetiva do Brasil para que
encontramos uma grande deficiência em nosso desenho econômico, a baixa qualidade de
nossa infraestrutura. Trata-se de um fenômeno altamente documentado na literatura
especializada e que se manifesta diretamente em todas as esferas de distribuição das
mercadorias brasileiras, o “Custo Brasil”.
4
Disponibilizados pela plataforma < http://comexstat.mdic.gov.br/pt/home>
Boletim Trimestral. Março/Maio 2021 - Volume I, número 1
27
Podemos compreender o Custo Brasil como uma categoria ampla, que engloba a
totalidade das deficiências de deslocamento mercantil da infraestrutura brasileira. Trazendo
o nosso olhar para o presente objeto, encontramos o fato de que, segundo dados coletados
pelo relatório Global Competitiviness Report, o Brasil apresenta uma das piores
infraestruturas portuárias do mundo
É inserido nesse contexto que a presente pesquisa encontra sua problemática,
trata-se de uma investigação que objetiva compreender as maneiras nas quais um processo
de Planejamento Espacial Marinho brasileiro deve englobar as dimensões pertinentes à
infraestrutura portuária. Relativo ao percurso metodológico, o estudo será realizado por meio
de uma análise documental e será baseado em dados divulgados por autoridades oficiais.
Boletim Trimestral. Março/Maio 2021 - Volume I, número 1
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A IMPORTÂNCIA DE UMA ESTRATÉGIA DE SEGURANÇA MARÍTIMA NO
ATLÂNTICO SUL
Por Fabrício Robson de Oliveira e Victória Antonia Salomão (PPGCPol / UFPel)
Grupo Segurança e Defesa (CEDEPEM)
Introdução
Se na dimensão global, o Atlântico Sul tem papel secundário, no âmbito regional e
nacional, sua importância econômica e geopolítica é fundamental para o Brasil. Entretanto,
a maioria das Marinhas e Guardas-Costeiras dos países lindeiros ao Atlântico Sul não estão
equipadas e preparadas para garantir a soberania nas suas águas jurisdicionais e o nosso
país não é diferente.
A partir desse aspecto, o presente trabalho, com análise documental, histórica e de
políticas públicas, propõe-se a avaliar a forma como o Estado brasileiro trabalha a segurança
de suas águas jurisdicionais, que de acordo com a Lei 13123 de 2015 são: águas marítimas
abrangidas por uma faixa de doze milhas marítimas de largura, medidas a partir da linha de
baixa-mar do litoral continental e insular brasileiro; as águas marítimas abrangidas por uma
faixa que se estende das doze às duzentas milhas marítimas, contadas a partir das linhas
de base que servem para medir o Mar Territorial, que constituem a Zona Econômica
Exclusiva; as águas sobrejacentes à Plataforma Continental, quando esta ultrapassar os
limites da Zona Econômica Exclusiva e as águas interiores, compostas de hidrovias
interiores, assim consideradas rios, lagos, canais, lagoas, baías, angras e áreas marítimas
consideradas abrigadas.
Nesse sentido, considera-se a Política Nacional de Defesa e respectiva Estratégia
Nacional, que aquela prevê, e a necessidade de um Planejamento Estratégico Marinho, que
para que seja eficaz e eficiente necessita de uma série de programas e iniciativas
intersetoriais, conforme explicaremos a seguir.
Entorno estratégico brasileiro, Atlântico Sul e faixas de fronteira brasileira
O entorno estratégico brasileiro conta com fronteiras terrestres e marítimas e a
proposta da presente pesquisa é avaliar a importância das faixas de fronteira com o Atlântico
para se pensar uma estratégia nacional de defesa. Assim, o monitoramento para a
Boletim Trimestral. Março/Maio 2021 - Volume I, número 1
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segurança marítima brasileira é relevante por diversas razões, principalmente em função
dos pontos variados de riscos das áreas de meio ambiente, comércio, segurança, pontos
estratégicos, Direitos Humanos e de soberania nacional. A área marítima acarreta para o
país a possibilidade de ameaças internas e externas, como
imigração ilegal e frotas
internacionais próximas à zona brasileira e arquipélagos. Atlântico Sul é mar de interesse
brasileiro e é parte compreendida entre o paralelo 16°N, a costa oeste da África, a Antártica,
o leste da América do Sul e o leste da Antilhas Menores, excluindo-se o Mar do Caribe.
Para o Brasil, ele importa em termos de estratégia nacional porque 80% da população
habita a até 200 km do litoral e porque a área litorânea inclui 17 Estados e 13 Capitais. Em
termos econômicos, o Brasil conta com produção de petróleo com cerca de 82% proveniente
do mar. Conforme dados de 2017 da Fundação Alexandre de Gusmão (FUNAG), 67% das
reservas totais de gás natural estão localizadas no mar. A área marítima conta com mais de
140 plataformas de petróleo. Outro ponto é a localização dos três arquipélagos estratégicos:
Arquipélago de São Pedro e São Paulo, Arquipélago de Fernando de Noronha e Arquipélago
Trindade e Martim Vaz.
Segurança Marítima e Planejamento Estratégico Marinho
Na literatura selecionada para o presente artigo,
Segurança Marítima engloba
principalmente a noção de “maritime security”, isto é, de proteção contra atos criminosos
intencionalmente praticados no Mar. Dessa maneira, o conceito está concentrado em
requisitos operacionais de cunho militar, cuja responsabilidade condiz à ação dos Estados
(FELDT; ROELL; THIELLE, 2013).
Desta forma, reveste-se de importante precaução por parte da sociedade, como um
todo, em relação a possíveis desejos financeiros (recursos naturais) dos demais países.
Além disso, a passagem de inúmeras rotas aéreas na área do Atlântico Sul torna o
monitoramento, por meio do CINDACTA (Centro Integrado de Defesa Aérea e Controle de
Tráfego Aéreo), um trabalho de grande demanda, como na área em que o Brasil é
responsável por atuar nos trabalhos de Busca e Salvamento (SAR – Safe and Rescue), que
ultrapassa os limites da Amazônia Azul. A fiscalização e monitoramento de territórios
marítimos é uma atividade que necessita de muita tecnologia embarcada em seus meios.
Diante dessa contextualização, tem-se no Planejamento Espacial Marinho (PEM) um
instrumento público, multissetorial, de aspecto operacional e jurídico, indispensável para
garantir a regência e a soberania da Amazônia Azul. Observa-se na Estratégia Nacional de
Boletim Trimestral. Março/Maio 2021 - Volume I, número 1
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Defesa (END), formalizada em 2008, por meio do Decreto nº 6.703 e atualizada em 2016,
a diretriz quanto à implementação do PEM. Ademais, entende-se que, de forma sustentável,
resultará em ações que vão contribuir para que as metas do ODS 14 da Agenda 2030
possam ser atingidas.
No que se refere à agenda governamental, a manutenção do PEM é um dos objetivos
do Programa Oceanos, Zona Costeira e Antártida do Plano Plurianual (PPA) para o período
de 2020 a 2023, o primeiro passo para se prever e, posteriormente, prover recursos
orçamentários para sua efetivação, não apenas no âmbito do Ministério da Defesa (MD), a
qual compete a coordenação do mesmo, mas por ser um programa multissetorial sob a ótica
de um instrumento de política pública capaz de somar, impulsionar, fazer crescer esse PIB
do Mar brasileiro. Contudo, cabe ressaltar que nesse programa específico, há envolvimento
de muitos outros Ministérios, componentes da chamada Comissão Ministerial para os
Recursos do Mar (CIRM), onde ao Comando da Marinha (MB) compete a função de
coordenação da SECIRM (Secretaria da CIRM), e onde diversos bancos de dados marinhos,
fundamentais à implementação do PEM, ainda carecem de um entendimento de objetivo
comum, típico de um processo de maturidade das organizações, públicas em especial. Desta
forma, reitera-se quão imprescindível se torna o apoio mútuo de que cada Ministério, em
especial no financiamento de políticas públicas voltadas para o ambiente marinho, como o
ocorrido para os subsídios ao PPA 2020-2023, com recursos orçamentários necessários,
por exemplo, para a disponibilização de seus bancos de dados de informações do ambiente
marinho e costeiro.
Além disso, há diferentes programas, entre eles o Programa de Desenvolvimento de
Submarinos (PROSUB) que investe na expansão da força naval e no desenvolvimento da
indústria da defesa. Neste ponto, em específico, a END estabeleceu que o Brasil deveria
buscar uma "força naval de envergadura", incluindo um submarino com propulsão nuclear,
para além dos submarinos de propulsão convencionais. Por resultado, há que se registrar
que o PROSUB está provendo à indústria brasileira da defesa um grande avanço em
conhecimento da tecnologia nuclear de ponta. Outro projeto de destaque é o Sistema de
Gerenciamento da Amazônia Azul (SisGAAz), iniciado em 2015.
Conclusão
Conforme o exposto, há necessidade de incrementar estratégias de cooperação
regional no Atlântico Sul, para sua segurança, uma vez que os desafios que impõem são de
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natureza transnacional. Entretanto, mais do que importância regional, ele tem relevância
nacional e um alto custo ao desenvolvimento brasileiro. Avaliando essa realidade, o presente
artigo se propôs a traçar, em linhas gerais, os programas nacionais em curso pela defesa do
mar brasileiro. Mostrou-se de suma urgência a implementação de um programa de
Planejamento Estratégico Marinho para defesa do Atlântico Sul, com motivos para
investimento na defesa da Zona Marítima Brasileira, incentivo financeiro governamental e o
cumprimento de programas de aquisições e construções na área de defesa. Observa-se,
pois, que PEM tem por propósito, dentre outros pontos, a promoção e geração de divisas e
de empregos, sendo necessária a segurança jurídica aos meios participantes, referente às
atividades econômicas desenvolvidas no ambiente marinho e costeiro, respeitada a
salvaguarda de interesses estratégicos, ambientais e de Defesa Nacional.
Referências
FELDT, Lutz; ROELL, Peter; THIELE, Ralph D. Maritime Security – Perspectives for a Comprehensive Approach. ISPSW Strategy Series:
Focus on Defense and International Security. The Institute for Strategic, Political, Security and Economic Consultant, n. 222, 2013, p. 1-25.
SILVA, Alberto da Costa e. Um rio chamado Atlântico: a África no Brasil e o Brasil na África. Rio de Janeiro: Ed. UFRJ, 2003.
VIZENTINI, Paulo Fagundes. A Geopolítica Brasil-África: A Dimensão do Atlântico Sul. Aracaju: Editora UFS, 2013. p. 195-224.
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GÊNERO E PLANEJAMENTO ESPACIAL MARINHO:
BREVES CONSIDERAÇÕES
Por Marina Molina Costa Tavares (PPGCPol/UFPel),
Aline Nemitz de Oliveira Lajas Ferreira (UNESA),
Carla Infante Mateus Rosa (PPGEM/EGN),
Cintya Rayssa Dutra Carvalho (UFPel) e Stela Xavier Terra (UFRGS)
Grupo Sociologia e Estudos do Mar (CEDEPEM)
A atuação global voltada ao uso sustentável dos ambientes marinhos tem obtido
destaque. A Conferência das Nações Unidas para o Oceano, ocorrida de 2 a 6 de junho de
2020, em Lisboa, Portugal, é considerada um dos primeiros marcos da Década de Ação para
os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS). As associações entre o conceito de
sustentabilidade, questões relacionadas ao Mar, e discussões sobre gênero, têm igualmente
sido consideradas relevantes. Desde 2019 estas questões têm sido correlacionadas de
forma concisa, a partir da comemoração do Dia Mundial dos Oceanos, que recebeu o lema
“Gênero e o Oceano”. A Organização das Nações Unidas (ONU) destacou, a partir do
evento, sua intenção de descobrir caminhos para a promoção da igualdade de gênero em
atividades relativas ao oceano, especialmente em se tratando de pesquisa científica,
trabalho no mar, questões humanitárias, e decisões políticas (ONU NEWS, 2019).
Em relação às decisões políticas e à gestão do espaço marinho, a ONU tem atuado
através da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura
(UNESCO),
que
possui
sob
sua
responsabilidade
a
Comissão
Oceanográfica
Intergovernamental (COI), criada em em 1967. É através da comissão que a ONU tem
atuado na difusão do Planejamento Espacial Marinho (PEM): um instrumento público
multissetorial de análise e distribuição das atividades humanas em áreas marinhas, que
busca alcançar objetivos ecológicos, econômicos e sociais de forma harmônica e sustentável
(UNESCO, 2020).
O PEM apresenta-se, portanto, como um importante processo público de gestão do
espaço marinho, cujo papel socioeconômico é evidenciado ainda mais se contraposto à
crescente importância das políticas públicas associadas a esse processo na agenda
nacional do Brasil, que destaca-se no sistema internacional por suas visíveis mudanças
tecnológicas, econômicas e políticas, visando uma exploração mais intensiva de seus
Boletim Trimestral. Março/Maio 2021 - Volume I, número 1
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recursos marinhos, especialmente no setor de gás e petróleo (MARRONI, 2014). Quanto à
forma deste processo, a própria página da COI aponta que
O PEM não é um fim em si aponta que, mas uma forma prática de criar e estabelecer um
uso mais racional do espaço marinho e das interações entre seus usos, equilibrar demandas
de desenvolvimento com a necessidade de proteger o meio ambiente e de proporcionar
resultados sociais e econômicos de forma aberta e planejada (UNESCO, 2020).
Estudos sobre o PEM evidenciam a necessidade de envolvimento e participação de
diferentes atores, bem como sua multidisciplinaridade, envolvendo áreas como a Ciência
Política, Relações Internacionais e Estudos Estratégicos (MARRONI et al., 2019). Sendo
este um processo altamente adaptável e de amplo escopo, é também apropriado para
examinar uma série de reivindicações que dele derivam, com destaque para as
oportunidades e desafios que surgem na busca da justiça social dentro de uma estrutura de
sustentabilidade mais ampla, incluindo-se a luta pela equidade de gênero (SAUNDERS et
al, 2020).
No entanto, ainda existem lacunas importantes no conhecimento sobre gênero e
oceano. Relações humanas generificadas com o mar envolvem debates sobre condições e
padrões de trabalho, seja ele remunerado ou não; sobre o acesso a recursos e capital; e,
ainda, sobre relações familiares e de gênero que permeiam certos tipos de atividade. A forma
como a vida diária de pessoas em contextos costeiros é organizada ocorre com base em
papéis de gênero, e merece mais estudo (FRANGOUDES; GERRARD; SAID, 2020). É nesta
dimensão que abrem-se possibilidades para a transversalização do gênero junto ao PEM
Brasileiro.
Tendo tomado uma posição de liderança na Conferência da ONU para os Oceanos
em 2017, o Brasil assumiu o compromisso voluntário de implementar o PEM até 2030. A
data de 2030 também é limite para a implementação de outro compromisso brasileiro: a
Agenda para o Desenvolvimento Sustentável, na qual o país se comprometeu a atingir os
objetivos da Igualdade de Gênero (ODS 5) e da conservação e uso sustentável dos oceanos,
mares e recursos marinhos (ODS14).
Buscando encontrar caminhos para a adoção efetiva dos compromissos internacionais
brasileiros, questões de gênero e estratégias associadas têm sido analisadas no âmbito do
CEDEPEM. O grupo tem conduzido revisões bibliográficas sobre as principais contribuições
de autoras feministas para a compreensão dos impactos das relações humanas com o mar,
especialmente a partir do ecofeminismo e da Economia Política Internacional de Gênero.
Boletim Trimestral. Março/Maio 2021 - Volume I, número 1
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Ademais, tem sido construído um mapeamento global para a análise de como as
questões de gênero têm sido inseridas nos documentos norteadores de iniciativas de PEM
em diversos países. A análise que resulta destes trabalhos busca justificar a necessidade
de aprofundamento das pesquisas que relacionem as questões de gênero a todos os tópicos
associados ao processo público de gestão do espaço marinho, a exemplo das áreas de
Segurança e Defesa, Proteção e Conservação, e Economia do Mar.
A partir das pesquisas conduzidas a nível do grupo de pesquisa, busca-se estimular
o pensamento crítico quanto às oportunidades e desafios ao desenvolvimento do PEM no
Brasil. Analisando outras experiências de consideração das questões de gênero junto a este
processo, busca-se levantar proposições para que o projeto brasileiro considere as
desigualdades, visando transcendê-las através de uma observação atenta às mesmas
desde suas bases, até sua efetiva implementação.
Referências
FRANGOUDES, Katia; GERRARD, Siri; SAID, Alicia. Commentary 6 to the Manifesto for the Marine Social Sciences: gender and the role
of women. Maritime Studies, online, vol. 19, p. 137-138, Jul. 2020.
MARRONI, Etiene Vilella. The importance of public policy for Blue Amazon marine spatial planning. Development Studies Research, vol.
1, n.1, p. 161-167, Sep. 2014.
MARRONI, Etiene Vilella. et al. Planejamento Espacial Marinho nos Processos de Cooperação em Segurança Internacional: Estudos de
políticas integrativas nacionais como base para a defesa e segurança do Atlântico Sul. Revista Brasileira de Estudos Estratégicos, Niterói,
v. 11, n. 21, p. 1-36, Jan./Jun. 2019.
ONU NEWS. Em Dia Mundial dos Oceanos, ONU pede atenção ao impacto das ações humanas (2019). Disponível em:
<https://news.un.org/pt/story/2019/06/1675231>. Acesso em dezembro de 2020.
SAUNDERS, Fred et al. Theorizing Social Sustainability and Justice in Marine Spatial Planning: Democracy, Diversity, and Equity.
Sustainability, online, v.12, n. 2560, s. p., 2020.
UNITED NATIONS EDUCATIONAL, SCIENTIFIC AND CULTURAL ORGANIZATION (UNESCO). About Us (2020). Disponível em:
<https://ioc.unesco.org/about>. Acesso em dezembro de 2020.
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GÊNERO: CONTEXTUALIZANDO SUSTENTABILIDADE SOCIAL EM SISTEMAS
SOCIOECOLÓGICOS MARÍTIMOS
Por Stela Xavier Terra (UFRGS) e Cintya Rayssa Dutra Carvalho (UFPel)
Grupo Sociologia e Estudos do Mar (CEDEPEM)
A partir do Período Neolítico, também chamado da Idade da Pedra Polida,
gradativamente, as civilizações mudariam os hábitos de convivência de nômades,
seminômades a sedentários (e.g. 8 mil anos a.c. Índia; 7 mil anos a.c. China; 6,5 mil a.c.
Europa). As sociedades nessa época passaram por uma revolução agrícola. Este novo estilo
de vida, agora não mais nômade, possibilitou o desenvolvimento das técnicas agrícolas e o
crescimento populacional.
Por mais que as sociedades agrícolas necessitassem de fontes de água doce para
plantar, como um recurso básico desse novo modo de sobrevivência, também passaram a
necessitar de uma organização social mais cooperativista, à medida que faziam escambo
dos produtos agrícolas. O excedente de produção precisava ser escoado fluvialmente.
Desse modo, primeiramente, originou-se uma agricultura de subsistência, e após milênios,
uma agricultura industrial e exportadora.
Antes mesmo da agricultura e outros setores da sociedade tornarem-se
industrializados, as sociedades ditas sedentárias já transportavam itens de troca e
abastecimento des- e embarcados nas costas litorâneas. A dinâmica oriunda das Grandes
Navegações favoreceu o assentamento das sociedades atuais, nas áreas costeiras. Hoje,
grande parte das cidades mais desenvolvidas economicamente são localizadas no litoral.
Estima-se que 40% da população mundial reside no âmbito de até 100 km da costa
(Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar, 2017).
A dinâmica dos oceanos é afetada pelas zonas costeiras através de processos tanto
biogeofísicos quanto sociais (GLASER; GLAESER, 2014). Um olhar sobre a sustentabilidade
social parte do princípio de que os oceanos e as costas são sistemas integrados. No Brasil,
contando com uma população em torno de 210 milhões de habitantes, a estimativa é que
80% das pessoas vivam a menos de 200 km do litoral (MARINHA DO BRASIL, 2021). Assim,
o ambiente litorâneo é caracterizado por ser um setor de grande desenvoltura e impacto
econômico para o Brasil.
Diante do exposto, ressalta-se a importância da sustentabilidade social na
governança do espaço marinho e costeiro. Assim, o Planejamento Espacial Marinho (PEM)
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emerge como um processo essencial para abordar as questões marítimas de maneira
transversal e multissetorial. Tendo em conta os sistemas socioecológicos dos oceanos e
mares como sistemas complexos, caracterizados por serem sistemas abertos, constituídos
por ampla variedade de elementos e grande número de interações dinâmicas entre eles
(RIGHI; SAURIN, 2015), devemos considerar a plena integração entre fronteiras geográficas
e políticas, setores, e categorias de conhecimento, como fundamental (MORF et al., 2019).
Glaser e Glaeser (2014) são enfáticos, há mais de uma dezena de definições para
sistemas socioecológicos, cada um com suas finalidades e aplicações, mas de acordo com
os principais desafios e problemas em pesquisa e prática de sustentabilidade global atual,
um sistema socioecológico pode ser definido pela sua composição, consistindo em: (1) um
território biogeofísico, (2) um assunto/problema identificado e (3) os agentes sociais e
instituições associadas.
Segundo os mesmos autores, essa definição de sistema socioecológico orientada a
um problema específico implica que, após um foco de questão ou problema definido, um
sistema socioecológico pode estender-se por várias escalas (ou dimensões, ver Glaser e
Glaeser p.2042, Figura 1) com importantes contribuições e entre múltiplo níveis constituintes
das escalas. Tal que, este tipo de conceitualização do sistema socioecológico estudado
permite integrá-lo ou visualizá-lo em panorama macro.
Não é novidade que o conceito de Sustentabilidade está fortemente ligado ao PEM,
no entanto, dentre as três dimensões estabelecidas a partir do Relatório de Brundtland
(WCED, 1987) e difundidas sob a ótica organizacional por Andrew Savitz e Karl Weber
(2007), a dimensão social é vista, relativamente, subteorizada e pouco elaborada na prática
política, uma vez que, a atenção acadêmica e política centrou-se amplamente na
sustentabilidade ambiental e econômica (SAUNDERS et al., 2019).
Christie (2011) apontou o desequilíbrio significativo entre as dimensões ecológica e
social para o uso dos recursos do oceano e processos de política quando se trata do nível
de esforço no seu monitoramento. Possivelmente, segundo os autores, baseado em como
a sociedade ocidental e uma influente “construção” da comunidade epistêmica sobre o meio
ambiente e a relação da sociedade com o meio ambiente, na qual as ciências naturais
desempenham um papel extraordinariamente importante na descrição do problema e nas
recomendações de políticas. Os autores exemplificam, o discurso em defesa por uma rede
global de áreas marinhas protegidas, sem a consideração adequada de impactos e
respostas da sociedade, como um desequilíbrio.
Boletim Trimestral. Março/Maio 2021 - Volume I, número 1
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Eizenberg e Jabareen (2017) são unânimes, há escassez de estudos teóricos e
empíricos considerando a sustentabilidade social, e esta foi a dimensão integrada mais tarde
em debates sobre desenvolvimento sustentável. Os autores são da opinião de que risco é
um constitutivo da Sustentabilidade e os riscos presentes na atualidade derivam das
mudanças climáticas e suas incertezas decorrentes, representando sérias ameaças sociais,
espaciais, estruturais e físicas para as sociedades humanas contemporâneas e seus
espaços de vida. De modo que, no âmbito da Sustentabilidade, a dimensão social precisa
esforçar-se para enfrentar esses riscos ao mesmo tempo em que aborda as questões de
equidade social.
Ainda os mesmos autores propõem um arcabouço conceitual para Sustentabilidade
Social sustentado por quatro pilares, a saber: equidade, segurança, ecoprossumo e formas
urbanas. Segundo Eizenberg e Jabareen (2017), a Equidade busca prevenir políticas
desiguais e promover um envolvimento público substantivo na produção do espaço.
Consequentemente, assim, reduziria a alienação e aumentaria a civilidade e o senso de
comunidade e apego ao local. Contudo, os autores enxergam a Equidade como um “meio”
para fins ambientais: “melhora sua capacidade de lidar com vulnerabilidades e promover o
desenvolvimento de objetivos ambientais viáveis.” (p. 12, Tabela 1). O segundo pilar,
Segurança, refere-se ao direito de não apenas estar seguro, mas adotar todas as medidas
de adaptação e segurança para prevenir vítimas e danos físicos. Ecoprossumo, refere-se
aos modos de consumir, produzir e agregar valores de e para formas social e
ambientalmente responsáveis. E ainda diz respeito aos esforços e responsabilidades de uma
sociedade em termos de políticas de mitigação. Finalmente, o último pilar, formas urbanas
sustentáveis são as dimensões físicas dos meios urbanos e comunitários socialmente
desejados. A forma física desejada deve promover um senso de comunidade, segurança,
saúde e apego ao local, entre outros objetivos ambientais.
Gerhardinger et al. (2020) trazem importantes considerações acerca da equidade
social. Segundo os autores, a inclusão de objetivos de equidade social na formulação de
experimentos de sustentabilidade, por meio da participação de constituintes mais diversos
da sociedade civil, tornará as compensações de planejamento mais claras e influenciará o
desenho de políticas futuras que permitam a avaliação de considerações da Equidade.
Cisneros-Montemayor et al. (2019) apud Gerhardinger et al. (2020) revisaram o que uma
economia azul equitativa significa para os setores marinhos estabelecidos e emergentes e
apontaram as diretrizes existentes para incorporar aspectos de Equidade no planejamento.
Em relação aos resultados da pesquisa de Gerhardinger et al. (2020), o modelo avaliativo
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de experimentos de transição da sustentabilidade do PEM aplicado aos membros do Grupo
de Trabalho "Uso Compartilhado do Ambiente Marinho" (Resolução 222/2013, Marinha do
Brasil) mostrou que a existência de um foco predominantemente orientado para a Economia
amplamente baseado na Exploração de petróleo e outros recursos destaca que a
sustentabilidade ambiental e as preocupações com a equidade social ainda estão distantes
da discussão do PEM em suas percepções da situação atual.
Além disso, os autores enfatizam a relevância do papel das ciências sociais marinhas
nas arenas de planejamento azul, particularmente a Pesquisa inter e transdisciplinar sobre
a transformação das economias oceânicas. Adicionalmente, os autores consideram como
uma narrativa futura para a gestão oceânica, a necessidade de “fornecer espaço para as
partes envolvidas confrontarem as relações assimétricas de poder na formação de uma
economia oceânica mais ambientalmente sustentável e socialmente justa”. De modo que
esta abordagem pode apoiar ‘inovadores sociais’ em formas alternativas de governança,
antecipação de tendências futuras, imaginação de futuros desejáveis e facilitação de
processos e resultados de políticas marinhas socialmente justas.
A comunidade marítima pode ser entendida como um conceito diversificado e aberto,
que abrange desde os grupos civis aos militares, passando por administradores de
empresas de navegação e fretamento, comunidades pesqueiras locais e oficiais navais
(MEDEIROS et al., 2019). De acordo com Amani et al. (2019) não existe fórmula padrão
para administrar e resolver a falta de equidade de gênero no ambiente marinho e costeiro.
As autoras são da opinião de que os oceanos e os mares se deteriorarão menos e terão
mais chances de recuperação se mais mulheres e os grupos vulneráveis estiverem
envolvidos no gerenciamento costeiro. Nesse sentido, esse estudo contribui para a
conscientização sobre as desigualdades e preconceitos de gênero em um setor que se
acredita estar na vanguarda da globalização e internacionalização da vida em sociedade.
Um dos poucos estudos encontrados na literatura científica, ou que pelo menos
conhecemos até o presente momento, e que se preocupa com a questão gênero em
ambiente marinho e costeiro foi realizado pelas pesquisadoras Sara Fröcklin (Suécia) e
Maricela de la Torre-Castro (Suécia). Em 2017, as pesquisadoras e mais três colegas
realizaram uma pesquisa sobre a importância do gênero especificamente no PEM em um
contexto de desenvolvimento usando a tipologia de gênero proposta por Harding (1986), a
qual engloba o gênero por estrutura, simbolismo e identidade. Dessa maneira, o estudo de
Torre-Castro et al. (2017) mostrou que a paisagem marinha e os recursos associados são
generificados (as mulheres ocupavam o espaço em que as atividades de reprodução não
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seriam prejudicadas), além disso, a renda diferiu entre os gêneros seguindo um padrão de
homens ganhando mais. A conclusão do estudo foi de que a população amostral definiu o
que era masculino e feminino criando identidades e comportamentos padrões que
impactavam o uso do espaço e recursos. Sendo dada, para os homens, uma identidade fixa
(como pescadores), e às mulheres identidades diversas, com sinais de mudanças lentas em
novas funções (por exemplo, agricultoras, comerciantes, mulheres de negócios, fabricantes
de artesanato). E por fim, o conhecimento e a valorização de bens e serviços ao longo da
paisagem marítima também foram generificados.
O que vai de encontro com Medeiros et al. (2019) que dissertam sobre o histórico da
navegação militar ou comercial ser um ambiente masculinizado. Na paisagem marítima as
mulheres são representadas figurativamente como risco e perigo, e realisticamente
apresentam papel ativo e sólido em diferentes áreas socioeconômicas, mesmo assim, isto
não lhes garante equidade moral e material, de modo que as mulheres no mercado de
trabalho marítimo e atividades relacionadas ainda buscam consolidação de direitos e
reconhecimento. No Brasil, Medeiros et al. (2019) apontam que o levantamento da literatura
realizado pelas autoras fornece esclarecimentos sobre as dificuldades e problemáticas
enfrentadas pelas mulheres, indicando um sistema estrutural de opressão herdado da
realidade social e dos costumes brasileiros.
A desigualdade de gênero geral reflete no setor marítimo do Brasil, que continua
essencialmente masculino incorporado pelas relações de poder entre homens (maioria) e
mulheres (minoria). O que é exemplificado pelas ocupações de trabalho que seguem
divisões sociais naturalizadas e derivadas de qualidades físicas e psicológicas generificadas.
Por isso, a profissão no panorama marítimo ainda está masculinizada, desencadeando
relações disfuncionais que fundamentam as desigualdades de salários, cargos, benefícios,
reconhecimento e assim por diante. No exército, por exemplo, raras as vezes que se
encontram superiores de comando do sexo feminino, essencialmente as mulheres atuam
nas atividades de assistência médica (MEDEIROS et al., 2019).
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Referências
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O Planejamento Espacial Marinho entre as nações centro-americanas: Ligeiras
reflexões sobre desafios para a cooperação no Golfo de Fonseca.
Por Ricardo Salvador de Toma Garcia (UFRGS)
Grupo Gestão Econômica, Ciência e Tecnologia (CEDEPEM)
Mapa 1: Golfo de Fonseca, espaço marino semifechado configurado pelo sistema
costeiro que se estende pelos territórios de El Salvador, Honduras y Nicarágua, nações
centro-americanas irmãs, imersas em controvérsias insulares e a delimitação de áreas
A determinação exata da extensão da linha costeira, e o cálculo das projeções
marinhas a partir das linhas de baixa-mar ou linhas de base definidas por um Estado
litorâneo, assim com a eventual realização de estudos sobre as condições geomorfológicas
inerentes à prolongação do território nacional por debaixo do mar tem sido uma constante
preocupação entre os Estados adjacentes aos mares semifechados ou golfos. Geralmente
essas preocupações estão associadas às pretensões de aproveitamento dos recursos
subjacentes à mar e ao desenvolvimento de atividades econômicas.
No caso do Golfo de Fonseca, um espaço geográfico situado na vertente pacífica do
braço centro-americano que une as massas continentais da nossa América, persiste uma
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controvérsia limítrofe-fronteiriça entre as repúblicas de El Salvador, Honduras e Nicarágua.
Uma controvérsia fundada na confrontação de direitos ou a invocação de tais direitos sobre
aproximadamente 2000 km² de espaços marinhos, cujas costas constituem uns dos maiores
portos naturais do mundo, más também um dos ecossistemas mais vulneráveis do planeta
a respeito das mudanças climáticas. Nesse espaço destaca a emersão 33 ilhas e ilhotas,
alguma delas permanecem em disputa entre El Salvador e Honduras.
A pesar de que uma parte essencial dessa controvérsia territorial foi dirimida em
instancias jurisdicionais, a sentença relativa ao caso recomendou
que ditos países
acordassem uma formula de negociação que considerasse uma lógica de reconhecimento
de direitos entre as partes sobre o entorno aquático-marinho do Golfo de Fonseca, aos fins
de estabelecer delimitações marinhas que permitissem a hipotética execução unilateral de
atos de soberania, jurisdição e exclusividade econômica em determinadas áreas do golfo.
A pesar dessa recomendação e da continua organização de grupos de trabalho, a
organização de reuniões de alto nível e a publicação de declarações conjuntas, os
sucessivos representantes políticos dos países que compõem ao golfo de Fonseca não tem
atingido o objetivo central das negociações consistente na delimitação, um procedimento
que, em razão das características desse espaço, ocasionará insatisfações entre as partes
facilitando o recrudescimento de um litigio cujos resultados poderão ocasionar
distanciamentos desnecessários entre verdadeiras nações irmãs, nações altamente
vinculadas por fatores históricos, culturais, etnográficos e até políticos.
Diante da ausência de concórdia e sindéreses ante um assunto de elevada
complexidade, estas ligeiras reflexões propõem a busca de uma alternativa harmoniosa à
lógica de delimitação lineal sobre os espaços marinhos do Golfo de Fonseca. Porquanto a
vigência desse estado de indefinição limítrofe, caracterizado pela continua dilação do
assunto e por um ambiente de suspense e receios, tem dificultado a coordenação de
processos de integração tripartite entre El Salvador, Honduras e Nicarágua.
Em virtude dessa realidade, estas ligeiras reflexões sugerem a desconstrução dos
critérios ‘soberanistas’ exclusivistas e excludentes, em favor da prospecção de fórmulas
práticas que façam desse importante cenário de interface, um verdadeiro núcleo regional de
gerenciamento costeiro e gestão integrada de espaços marinhos, seja mediante a definição
de um regime de condomínio ou pela conformação de uma Zona Especial de Cooperação.
As características do Golfo de Fonseca; o relativo grau de simetria entre as nações
adjacentes; e a importância desse entorno geográfico caracterizado pela existência de
manguezais e espécies marinhas endêmicas sob risco de extinção supõe a adopção de
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medidas urgentes, consonas com os objetivos definidos na agenda 2030 das Nações
Unidas. A soma dessas potencialidades e vulnerabilidade configuram condições idôneas
para a celebração de um projeto macro de genuína cooperação regional que passe a
constituir um exemplo global em matéria de governança oceânica.
As apostas centradas na gestão autárquica ou independente desses espaços
marinhos além de garantir a continuidade de um improdutivo statu quo, também favorecerá
a gradual inserção de potencias externas ou de corporações transnacionais interessadas em
exercer a territorialização geoeconômica dessas áreas, explorando os recursos e as
potencialidades do médio, enquanto aceleraram os receios, desavenças e a eclosão de
eventuais crises diplomáticas ou conflitos. Sob esse cenário pouco favorável para a causa
centro-americana, privarão as assimetrias derivadas do uso de tecnologias e capitais -por
parte de fatores externos- para a prospecção de informações estratégicas, a exploração de
matérias e a sua eventual valorização como recursos.
A contraproposta a esse cenário desfavorável e altamente conhecido pelas nações
sul-americanas, somente será gestada a partir da compreensão inteligente do espaço, a sua
natureza integradora e da suma das melhores capacidades nacionais para a criação e
implementação de estratégia articulada entre suas diversas instituições, ergo, um
Planejamento Espacial Marinho entre os salvadorenhos, hondurenhos e nicaraguenses.
Referências
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DECLARACIÓN CONJUNTA. Reunión Trinacional sobre el Golfo de Fonseca. Suscrita por los Presidentes de El Salvador, Honduras e Nicaragua. Managua
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DECLARACIÓN CONJUNTA. Reunión Trinacional sobre el Golfo de Fonseca. 15 de agosto de 2017.
DECLARACIÓN DE MANAGUA. Golfo de Fonseca una Zona de Paz, Desarrollo Sostenible y Seguridad. Managua, Nicaragua. Suscrita por los Presidentes
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efectos en la agricultura, acuicultura y las pesquerías para los pequeños productores. Proyecto cambio climático del Golfo de Fonseca (DCI-ENV/2010/256823). Co-financiado por la Unión Europea; Universidad Centroamericana, Nicaragua (Instituto CIDEA e Instituto Nitlapan);Funsalprodese, El Salvador; ICADE
y ADEPES, Honduras; OIKOS, Portugal y GVC, Italia. Managua. 2015
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UNITED NATIONS. Letter dated 20 November 2013 from the Permanent Representative of Honduras to the United Nations addressed to the President of the
Security Council. 27 November 2013.
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Boletim CEDEPEM
Idealização: Ricardo Salvador de Toma Garcia.
Editores executivos: Wesley Sá Teles Guerra e Delmo de Oliveira Torres Arguelhes
Editor adjunto: Gustavo Gordo de Freitas
Boletim Volume I/2021 45 páginas 08/03/2021- CEDEPEM - Brasil
Os artigos publicados neste boletim são de autoria e responsabilidade dos autores aqui
indicados e não representam nem constituem o posicionamento do CEDEPEM e/ou organizações
vinculadas.
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