Academia.eduAcademia.edu

Tecido Afetivo - Por uma Dramaturgia do Encontro

2010, Tecido Afetivo - Por uma Dramaturgia do Encontro

O projeto Tecido Afetivo – Por uma dramaturgia do encontro foi realizado pela Companhia da Arte Andanças em Flecheiras-CE, no ano de 2010, sob a coordenação de Andréa Bardawil. O projeto constituiu-se num encontro, com duração de cinco dias, reunindo em torno de 30 pessoas (entre artistas locais e convidados de outros Estados), tendo a dramaturgia como tema. A convivência e a co-habitação deram o tom do encontro, que não foi idealizado com um formato previamente estabelecido (de seminário, por exemplo), configurando-se numa construção/condução coletiva de todos os participantes, a partir de proposições. O “resultado” proposto seria o que vazasse dessa convivência: improvisações, apresentações comentadas, conversas, momentos de descontração, rastros da convivialidade, resíduos de coisas e causos, registrados pelos próprios participantes (fotografia, vídeo e notas em diários de bordo), desdobramentos compartilhados com o “público” apenas após o encontro em si, através de um site, um vídeo-documentário e uma publicação com registros dos diários de bordo. A opção pelo deslocamento do espaço urbano da capital para o interior, teve como objetivo desmobilizar o regime de urgência no qual estamos mergulhados, possibilitando a instauração de outros regimes de temporalidade. O tecido desse encontro é afetivo, porque todas as pessoas convidadas (além dos artistas cearenses) já estiveram em Fortaleza, e /ou mantiveram relações com artistas da dança na cidade, ao longo dos últimos.

tecido afetivo Por uma dramaturgia do encontro tecido afetivo DE 7 A 12 DE JUNHO DE 2010 Fortaleza | Praia de Flecheiras | CEARÁ Realização 2009 792.9 B245t Bardawil, Andrea (Org.) Tecido afetivo : por uma dramaturgia do encontro. / Andrea Bardawil. - Fortaleza: Cia. da Arte Andanças, 2010. 96 p. ISBN Encontro presencial realizado no período de 07 a 12 de junho de 2010, na Praia de Flecheiras, Trairi, Ceará. 1. Dança contemporânea. 2. Teatro - dramaturgia. I. Titulo. Índice Apresentação --------------------------------------------------------------------------------------------------------------------- 6 Iscas [rastros] -------------------------------------------------------------------------------------------------------------------- 9 Notas sobre a restrição [Paulo Caldas] -------------------------------------------------------------------------------------- 13 Pensando onde em mim essas tessituras principiam dramaturgias [Alexandre Veras] --------------------------------- 16 O mundo como organismo sensório [Pablo Assumpção] ----------------------------------------------------------------- 20 Queridos tecedores [Eleonora Fabião] -------------------------------------------------------------------------------------- 24 Sobre corporeidade [Andréa Bardawil] ------------------------------------------------------------------------------------- 27 Um isca… Flecheiras [Sílvia Soter] ----------------------------------------------------------------------------------------- 28 Acasos são Rastros ao Contrário [Marcelo Evelin] ------------------------------------------------------------------------ 30 Tessituras em ação [Sandra Meyer] ------------------------------------------------------------------------------------------ 34 Das Turbinas do Corpo (Treinamento, Cidade, Capital) [Heber Stalin] ------------------------------------------------ 38 &RQÁLWRFrQLFRVHQVRULDO[Gerson Moreno] -------------------------------------------------------------------------------- 41 9HUEHWHVDIHWLYRV  9HUEHWHVDÁLWLYRV DUUHPHVVRV YHUEDLV PRYLGRV SHOR HQFRQWUR HP )OHFKHLUDV)OHLFKHLUDV Flexeiras/Fleixeiras em Junho de 2010 [André Lepecki] ------------------------------------------------------------------ 42 Anotações – Hipertextos [Marcos Moraes] --------------------------------------------------------------------------------- 48 Algumas notas-sensação sobre presença, presentação e operacionalização… «GHVHMDQGRXPÀFDUFRQYHUVD« …desejando adiar por tempo indeterminado a palavra assertiva… >)HUQDQGD(XJrQLR@ ------------------------------------------------------------------------------------------------------------ 50 Acefalia [Eduardo Jorge] ------------------------------------------------------------------------------------------------------ 54 Arqueologia de ideias, anotações mínimas e disparos. Ou propostas para exercícios. [Micheline Torres] ------------------------------------------------------------------------- 57 De uma perspectiva fragmentada [Eliana Lyra Madeira] ------------------------------------------------------------------ 61 Escrita 1 – Suspensa na rede, Escrita 2 – Distante da rede, Escrita 3 - Para fazer objetos, outros e coisas [Flavia Meireles] --------------------------------------------------------------------------------------------------------------- 64 Por uma dramaturgia do artista [Gustavo Ciríaco] ------------------------------------------------------------------------- 69 Danço [Enrico Rocha] --------------------------------------------------------------------------------------------------------- 70 Quanto tempo dura o amor? [Fátima Souza] -------------------------------------------------------------------------------- 72 “Dramaturgiando” impressões... [Angela Souza] -------------------------------------------------------------------------- 76 O cheiro perigoso da liberdade [Márcio Medeiros da Costa] ------------------------------------------------------------- 80 Tecido Afetivo [Andréa Sales] ------------------------------------------------------------------------------------------------ 83 Sobre os participantes --------------------------------------------------------------------------------------------------------- 84 Sobre a Companhia da Arte Andanças --------------------------------------------------------------------------------------- 94 'HTXHUHFXUVRVGLVS}HXPDSHVVRDRXXPFROHWLYRSDUDDÀUPDUXPPRGR próprio de ocupar o espaço doméstico, de cadenciar o tempo comunitário, de mobilizar a memória coletiva, de produzir bens e conhecimento e fazêlos circular, de transitar por esferas consideradas invisíveis, de reinventar a corporeidade, de gerir a vizinhança e a solidariedade, de cuidar da infância ou da velhice, de lidar com o prazer ou a dor? Que possibilidades restam de criar laço, de tecer um território existencial e subjetivo na contramão da serialização e das reterritorializações propostas a cada minuto pela economia material e imaterial atual? (Peter Pál Pelbart) 6 A escolha do tema em questão – a dramaturgia²VHGHXDSDUWLUGRGHVHMRTXHLGHQWLÀFDPRV já há algum tempo, de aproximar diferentes criadores, com processos distintos de composição, D ÀP GH GLVFXWLU D IXQomR TXH D GUDPDWXUJLD YDL RFXSDQGR DWXDOPHQWH QD FHQD GD GDQoD contemporânea. No que consiste a função do dramaturgista – já considerada na Europa e no Estados Unidos que agora alguns coreógrafos começam a assumir em suas criações, no Brasil? A construção GUDPDW~UJLFDGHXPWUDEDOKRGHGDQoDFRQWHPSRUkQHDVRIUHLQÁXrQFLDGRPRGRGHYLGDGHXP coreógrafo? Como se processa essa elaboração dramatúrgica, quando é o próprio coreógrafo ou intérprete-criador que exerce essa função? No que difere a complexidade de pensar a dramaturgia de um trabalho solo ou duo, para um trabalho em grupo? 6REUHWXGR QRV ~OWLPRV DQRV GH YLGD )RXFDXOW LQWHUHVVRXVH HP UHÁHWLU VREUH D SRWrQFLD FRQWLGDQRSODQRGDVUHODo}HVKXPDQDVQRVHQFRQWURVTXHSRGHPVHHIHWLYDUQXPDH[LVWrQFLD defendendo uma ética fundada na amizade como modo de vida, através da qual novas relações possam ser estabelecidas, inventadas, multiplicadas. Segundo Foucault, um modo de vida pode ser partilhado por indivíduos de idade, estatuto e atividades sociais diferentes. Pode dar lugar, ainda, a relações intensas que não se pareçam com nenhuma daquelas que são institucionalizadas, de forma que é possível considerarmos que “um modo de vida pode dar lugar a uma cultura e a uma ética”. Sendo assim, como pensar o traçado de novas formas de vínculos sociais, permitindo uma SURGXomRGHVHQWLGRTXHQmRWHQKDFRPREDVHXPDWHQGrQFLDKRPRJHQHL]DGRUDHTXHDLQGD IDYRUHoDDXPDpWLFDGDDPL]DGH"&RPRQmRGHVLQYHVWLUGDSRWrQFLDGRVHQFRQWURV"&RQVLGHUDQGR RSURFHVVRFULDWLYRFRPRRSUySULRHVSDoRLQWHQVLYRGRVÁX[RVWHUULWyULRSULYLOHJLDGRSDUDR exercício da composição dos afetos, como pensar a instauração de um lugar/situação como se pensa a criação de uma obra artística? Tal e qual na cena, a construção de novas condições de possibilidade no campo da vida depende fundamentalmente da nossa habilidade em compor afetos (uma dramaturgia de forças), mais que traçar alianças (uma dramaturgia de formas), favorecendo o surgimento de um plano GH FRQVLVWrQFLD SRWHQWH VXEYHUVLYR HP VL H SRU VL DWUDYHVVDGR SRU GLIHUHQoDV H GLVVHQVRV heterotopias, entre-lugares, estados de invenção que se constituem no avesso de um estado de exceção. 7 As questões aqui propostas conectam-se – ou deveriam – com todo pensamento que busca proposições colaborativas nas mais diversas instâncias. Subverter concepções artísticas ou concepções sobre a arte é subverter formas de habitar, subverter modos de vida. 6HUi TXH DSUHVHQWDPRV QRVVDV SURSRVWDV FRP FRQVLVWrQFLD VXÀFLHQWH SDUD QmR HVJDUoDU RV encontros, com espaço alargado para as diferenças? Até onde estamos cientes de que a intensidade de um encontro não pode ser medida por um produto, que talvez o melhor seja nem haver um produto? Como estimular o surgimento de novos formatos de produção, exibição e circulação de WUDEDOKRVDUWtVWLFRVUHFRQÀJXUDQGRRVSDFWRVHVWpWLFRVMiHVWDEHOHFLGRVHLQYHVWLQGRHPQRYDV² e sempre provisórias – relações com o público? Como podemos evidenciar o imensurável sem VDFULÀFDURLQGL]tYHO"&RPRDSURYHLWDUDVIURQWHLUDVGLOXtGDVSDUDH[SORUDUQRYRVWHUULWyULRV PDVVREUHWXGRSDUDSRWHQFLDOL]DUERQVHQFRQWURVTXHVHFRQÀJXUHPHPQRYRVDFRQWHFLPHQWRV TXHSRUVXDYH]GHL[HPUDVWURVpWLFRVHPQRVVDVH[SHULrQFLDVHVWpWLFDV" Não temos a pretensão de responder a todas essas questões. Nosso intuito é, a partir de nossas LQTXLHWDo}HVSURYRFDUQRYRVHSRWHQWHVHQFRQWURVTXHUHYHUEHUHPQDSURGXomRFrQLFDHQDV pesquisas de todos os envolvidos, direta e indiretamente. Andréa Bardawil 8 ‡'HPLFKHOLQHWRUUHV ‡3DUDDQGUHDEDUGDZLO ‡'DWDGHIHYHUHLURGH ‡$VVXQWRWHFLGR Oi querida, como estás? Como foi Cabo Verde? Imagino que deva ter sido maravilhoso, não apenas pelo lugar, mas pelo incrível encontro das pessoas... Sempre acho que esses encontros, sobretudo em lugares "não convencionais", digo, não reconhecidamente centrais, são deveras produtivos e importantes, pq descentralizar é bastante saudável! Bem, poderia desenvolver este assunto em 6598326073 laudas... olha, como vai a feitura do Tecido? Vc já está trabalhando nele? (QWmRWDYDDTXLSHQVDQGRHGHSRLVGDTXHOHWH[WRTYFPDQGRXGR+XEHUWÀTXHLPHVPRPRYLGD a sugerir (ou pensar junto contigo) alguma estrutura ou impulsos propositivos pro Tecido. Pensei, primeiramente, em textos que já circulassem entre nós. Eu chamaria de Textos-iscas. Seriam textos que interessassem a cada um dos envolvidos (por motivos diversos, obviamente), mas textos que fossem, basicamente, caros a cada um de nós. Então cada um de nós lançaria este texto ao grupo como isca. Sim uma isca, que não sabe o que vai pegar, nem "se vai pegar DOJRPDVTXHWHPFRPRSULQFLSDOIXQomRVHUODQoDGDDRPDUHÀFDUOiERLDQGRHVSHUDQGR algum movimento vindo de não sei que lugar. 3TÀTXHLSHQVDQGRQDWUDPDGHUHGHGHWHFLGRHGHVWHWHFLGRTXHpDIHWLYRHPQRVVRFDVR E, além da imagem e estrutura do tecido, me vem muito a ideia de mar entre nós. E de ilhas. VLPLPDJLQRTXHÀFRVXJHVWLRQDGDSRU)RUWDOH]DHRVROHRPDUHRORFDOTXHLPDJLQRVHUR do nosso encontro...) Mas me vem sempre a ideia de mar e ilhas, onde cada um de nós seriamos, ao mesmo tempo, o mar (e suas águas) e as ilhas. Explico (ou tento). 9 A imagem é: ‡6HULDPRVFDGDXPXPDLOKDFRPVXDVFDUDFWHUtVWLFDVHVSHFLÀFDVYHJHWDomRQDWLYDYHORFLGDGH e direção de ventos, ocupação no momento,"o que tem plantado, o que tem colhido", etc. ‡ 2 QRVVR HQFRQWUR R7HFLGR$IHWLYR WHP D VXD IXQomRPDU IXQomRiJXD TXH p SURPRYHU um encontro, fazer encostar diferenças e distâncias, criar a possibilidade de percorrer o espaço entre uma ilha e a outra, traçar restingas, aproximar e separar continentes... ‡$OpPGLVVRFDGDXPGHQyVDOpPGHLOKDVWHPDVXDIXQomRPDUTXHpDGHVHUXPDJHQWH ativo nesta aproximação, ser a própria restinga, ou esticar as pernas e formar continentes... Ok, afora a metáfora, poética, imagética, que eu levanto pra fazer a base desses meus pensamentos, o que eu quero mesmo é fazer proposição e já ir acenando pra uns e outros aqui deste Tecido. E tudo isso vem se formando na minha cabeça há algum tempo, e agora tenho vontade de escrever-lhe e, um pouco, fazer destas ideias proposições. Pois bem, a primeira proposição, que é a dos textos-iscas, seria: ‡&DGDXPHQYLDDRJUXSRXPWH[WRTXHOKHpFDUR8PWH[WRSRGHVHUWDPEpPXPDLPDJHP Para essa proposição imaginei que poderíamos pensar nos textos (ou imagens ou whatever) YLUHPHPSHUtRGRVGHWHPSRGLIHUHQWHVFDGDLVFDpODQoDGDQXPDVHPDQDGLIHUHQWHQXPPrV diferente STDLQGDWHPRVDOJXQVDWHMXQKR HÀFDOiERLDQGR O que acha? Bem, vou confessar, já pensei mil coisas, e em estrutura de blog e coisas para qdo estivermos juntos...! :) Mas, por agora, é isso aí. Me diz o que achas. Beijo beijo, o Rio de Janeiro tá um calor estapafurdio e saio agora pro meu ensaio. Micheline 10 ‡'H)HUQDQGD(XJHQLR ‡3DUD(GXDUGR-RUJH+HEHU6WDOLQ$QGUpD6DOHV$QGUp/HSHFNL$QJHOD6RX]D*UDoD0DUWLQV Marcelo Evelin de Carvalho, Marcos Moraes, Marcio Medeiros, Possi Montenegro, Eleonora Fabiao, Fátima Souza, Alexandre Veras, Flavia Meireles, Micheline Torres, Daniel Pizamiglio, Aspásia Mariana, Isabel Silvino, Pablo Assumpcao, Enrico Rocha, Sandra Meyer, Silvia Soter, Gerson Moreno, Felipe Ribeiro, Paulo Caldas, Andrea Bardawil, António Pedro Lopes ‡'DWDGHMXQKRGH ‡$VVXQWR1RVVRWHFLGR0$,6,6&$6 Queridos, Estou colecionando as iscas com muita alegria. Aqui deste Rio de Janeiro de véspera do encontro, envio um pequeno trecho de uma entrevista do Eduardo Viveiros de Castro, que WDOYH]YRFrVMiFRQKHoDP6mRPXLWDVDVTXHVW}HVTXHFRPHoDPDVHGHVSUHQGHUHDSRQWDUSDUD DVORQJDVFRQYHUVDVTXHYrPSRUDtHHQWUHWRGDVHODVYHMRXPÀRFRPXPJDQKDQGRFRUSRÀR não. novelo ou rede: tecido. e tecido cuja densidade, encorpamento, vem acontecendo porque estamos todos ofertando nossas dádivas, que por sua vez tomamos também de outros, para serem tomadas agora por outros, para serem alter-adas. isso tudo assinala que já nadamos em uma outra noção de criação, de expansão horizontal e ilimitada. “O que pode ser repensado é o HVWDWXWRGDQRomRGHFULDomRQmRSDUDGL]HUTXHQmRpPDLVSRVVtYHOFULDomRPDVSDUDUHGHÀQL lo de uma maneira criativa, digamos assim. Temos que criar um outro conceito de criação. Trabalhamos atualmente com um conceito, por um lado, velho como o Cristianismo (criação bíblica) e, por outro lado, com o do romantistmo, a criação como manifestação, emanação de uma sensibilidade suis generis do indivíduo privilegiado. Esses dois modos de criação não dão PDLVFRQWDGRTXHHVWiVHSURFHVVDQGRQRPXQGRDWXDO  $FULDomRDUWtVWLFDHVWiÀFDQGRFDGD YH]PDLVSDUHFLGDFRPDFULDomRFLHQWtÀFDTXHVHPSUHIRLXPWUDEDOKRHPUHGHXPWUDEDOKR HPTXHYRFrWUDEDOKDHPFLPDGRWUDEDOKRGRVRXWURVTXHH[LJHWRGRXPDSDUDWRLQVWLWXFLRQDO complexo de produção propriamente coletiva. (...) Nós temos que virar Robin Hood. Saquear para dar. (...) A antropofagia o que é? Tirar dos ricos. Entenda-se: ‘vamos puxar da Europa o que nos interessa’. Vamos ser o outro em nossos próprios termos. (...)”E essa coisa de “ser o outro em nossos próprios termos”, como a nossa discussão já está apontando, envolve, na minha percepção, uma enorme disponibilidade para rever a própria noção de eu, eu-artista ou eu-identidade; um desapego, um aceitar perder/ceder/dar pedaços para acoplar outros. um aceitar tecer... beijos e até breve! Fernanda 11 12 Notas sobre a Restrição Restrição e composição Lembro ter lido, uma vez, um trecho de um romance do escritor Georges Perec, em que decidira não utilizar a letra “e”, a mais usada na língua francesa. Ao lado, ele havia deixado uma versão do mesmo texto sem esta restrição e era admirável ver, comparando os textos, o caminho novo da escrita desviada dos “e” e recorrendo a palavras que, do contrário, nunca apareceriam. “La 'LVSDULWLRQµpRQRPHGDREUDXPURPDQFHFRPPDLVGHWUrVFHQWHQDVGHSiJLQDVOLSRJUDPDR QRPHGHWDOSURFHGLPHQWROLWHUiULRQHOHGHWHUPLQDVHTXHXPDRXPDLVOHWUDVÀFDPH[FOXtGDV GDHVFULWD(VVHOLSRJUDPDHP´HµGDWDGH7UrVDQRVPDLVWDUGH²VHJXQGR3HUHFGHYLGR à queixa das outras vogais de que teriam trabalhado demais no livro anterior - escreveria “Les Revenentes”, uma novela breve em que, contrariamente, fazia uso apenas da vogal “e”. Tratava-se, em Perec e também no grupo literário de que faz parte – o Oulipo, de estabelecer outros princípios de escrita, estratégias e regramentos de natureza formal a partir dos quais inventar literaturas e assumir “a embriaguez de sintaxes e palavras novas”. Tratava-se, VREUHWXGRGHHVWDEHOHFHUDLGHLDGHUHVWULomRDÀUPDWLYDPHQWHFRPRDTXLORTXHSURYRFDULDH potencializaria os processos criativos da escrita literária. Mais profundamente, é evidente, qualquer escritura supõe mesmo restrições: do vocabulário, da gramática, da cultura: Roland Barthes dizia que a língua era fascista, não pelo que ela impedia de dizer, mas pelo que ela obrigava a dizer. Mas tais restrições da língua se distinguem, no entanto, daquelas que, deliberadamente, os autores oulipianos se estabelecem: eles recuperam da história da literatura variados procedimentos - lipogramas, anagramas, palíndromos -, eles inventam novas restrições, tão inesgotáveis quanto aquilo que se produzirá a partir delas. Num certo sentido, o OULIPO extrema e tematiza uma dimensão recorrente na literatura; ela é mesmo frequentada por restrições: “as doze sílabas do verso alexandrino, quatorze versos e ULPDVSUHFLVDVSDUDXPVRQHWRDUHJUDGDVWUrVXQLGDGHVGDWUDJpGLDFOiVVLFDµ1 são restrições tão arbitrárias quanto qualquer outra que se invente. $SUHVVRPHHPHVFODUHFHUUHVWULomRHLQÀQLWXGHQmRVHFRQWUDGL]HP ALENCAR, Ana Maria e MORAES, Ana Lúcia. 228/,32HDV2ÀFLQDVGH(VFULWD. Disponível em http://www. letras.ufrj.br/ciencialit/terceiramargemonline/numero13/ii.html. Acesso em: 27 jul. 2010. 1 13 Matemáticos diriam muito simplesmente: tomemos o conjunto dos números inteiros – nele há os números pares e os ímpares; limitemo-nos então apenas ao conjunto dos números ímpares. Intuitivamente, diríamos que seu conjunto é menor, já que está contido naquele. Mas, nós o VDEHPRV DPERV RV FRQMXQWRV VmR LJXDOPHQWH LQÀQLWRV$VVLP VH SDVVD FRP RV GLVSRVLWLYRV UHVWULWLYRVGHFRPSRVLomRHOHVSURGX]HPXPLQÀQLWRDSHQDVHQJDQRVDPHQWH´PHQRUµ Italo Calvino, integrante também ele do OULIPO, reescreve as palavras de Nietzsche (“o que VHGHQRPLQDLQYHQomRpVHPSUHXPJULOKmRDXWRLPSRVWRµ DRDÀUPDUTXHRMRJRVyID]VHQWLGR com regras de ferro, a auto-imposição de uma disciplina sem sentido transcendente. “Construir seus próprios labirintos e suas respectivas saídas”, como diriam os oulipianos, não deixa de ser um belo modo de conceber o ato de compor. Trata-se de considerar o “jogo” um primeiro esforço possível de composição e de estabelecimento de uma dimensão dramatúrgica. Os regramentos (as “regras de ferro”), de alguma maneira, são um modo de eleger elementos insistentes numa obra. Restrição e insistência 'HVWHPRGRDUULVFRPHDGL]rORDOLQKDGHVHQWLGR TXHpQHFHVVDULDPHQWHSUHFiULDSURYLVyULD e mesmo selvagem, capaz apenas de tracejar um universo afetivo), a linha de sentido traçada por aquilo que insiste – que repete, que ritorna - é um esboço já daquilo que poderíamos experimentar FRPR GUDPDWXUJLD 3RUTXH RFRUUHPH FRQVLGHUDU TXH D FRQVLVWrQFLD GUDPDW~UJLFD TXH IXQGD XPSODQRGHFRPSRVLomRVHOLJDVHPSUHjLQVLVWrQFLDGHDOJRLQVLVWrQFLDRUDDQXQFLDGDFRPR SURMHWRSHORUHJUDPHQWRRUDVLOHQFLRVDWDOYH]PHVPRDWpRÀPLQFRQVFLHQWHPDVVHJXUDPHQWH H[SHULPHQWDGDRXSHUFHELGDRHVWDGRGHXPFRUSRXPDDVVLPHWULDXPÁX[RYHUWLJLQRVRXP VLOrQFLRHXPDTXLHWXGH RVYD]LRVHQWUHRVTXDLVSRVVDVDOWDUXPFDYDORFRPRGL]LDRSLQWRU FKLQrV  XPD OLQKD DEVWUDWD XPD WH[WXUD UHFRUUHQWHV TXH YDULDP QD GXUDomR H VH DFXPXODP ritmadamente em nós. E mesmo a restrição arbitrária - a eventual determinação arbitrária das regras do “jogo” como princípios de composição -, não supõe qualquer gratuidade daquilo que é composto. Trata-se de uma maneira de produzir sentido – uma poética - a partir de uma aposta em que os sentidos emergem das formas, que entre formas e sentidos não há distância, HQÀPTXHRVHQWLGRGDIRUPDOKHpLPDQHQWHFRPRXPDYLUWXDOLGDGH VHPSUHDWXDOL]DGDHP diferença). 14 $TXLQRHQWDQWRDUHVWULomRpXPSULQFtSLRSRUTXHGHÀQHXPPRGXVRSHUDQGLPDVpSULQFtSLR porque início de um esforço composicional que reconhece, depura, desvia, laça e lança sentidos, esforço que supõe camadas sucessivas de tratamento dramatúrgico. Quando um coreógrafo se propõe seus próprios regramentos de composição – suas restrições, seus algoritmos, seus protocolos -, é porque também ele comunga daquela mesma expectativa de que aquela nova proposição possa desviá-lo de sua própria banalidade e conduzi-lo a invenção de QRYDVH[SHULrQFLDVQRYDVHVWpWLFDVHHVWpVLFDVLQYHQomRGHDOJRTXHDÀQDOSRVVDIXQGDUQRYDV modos do corpo e do movimento, novas tensões e torções, atravessamentos que fazem emergir RXWUDVFRUSRUHLGDGHV²SRUTXHDFRUSRUHLGDGHpVHPSUHXPDHPHUJrQFLDFDSD]HVGHH[SDQGLU um “tato” para as várias e próximas dimensões de si mesmo e para as distantes dimensões do outro. Aqui, mesmo o olho à italiana se faz uma pele, uma superfície empática que faz vibrar o corpo. A partilha gravitária de Hubert Godard, a osmose de José Gil, talvez sejam outros nomes para o que já Paul Valéry reclamava como o destino da poesia: o de produzir no leitor o que FKDPDYDGH´HVWDGRSRpWLFRµ(RTXHpXPHVWDGRSRpWLFR"9DOpU\GHÀQHRRXDVVRFLDRD uma ‘sensação de universo’: a sensação de que as coisas, as nossas sensações, estão de certo modo ligadas umas às outras, não se esgotam na pura percepção nem se circunscrevem ao mero conceito, à pura palavra que as denota. Há um estado de ‘conotação’ absoluta, se podemos dizer assim, na poesia.2$FRQRWDomRGRVHQWLGRSDUDDOpPGDGHQRWDomRGRVLJQLÀFDGRµ (A redigir: A restrição como um atributo do corpo) (A redigir: A restrição como uma economia precária da cena) Paulo Caldas 2 COELHO, Marcelo. “Apresentação”. In: VALÉRY, Paul. A Alma e a Dança. Rio de Janeiro: Imago, 1996, p. 11. 15 Pensando onde em mim essas tessituras principiam dramaturgias Princípio de permanência ((VTXHFHUQmRpFULPHQHPSHUPDQHFHU) Assumir a temporalidade da relação é instaurar a memória no campo da dramaturgia. Um pouco como a poeira que, suspensa, parece reter na névoa o tempo que sucede ao agito de uma VXSHUItFLHHGHSRLVVHGHSRVLWDHPÀQDVFDPDGDVSHTXHQRVDF~PXORVPHPyULDVPXVFXODUHV SUHGLVSRVLo}HV SVtTXLFDV ]RQDV GH SHUPDQrQFLD PDWpULD WHQD] GR YLYLGR FRQVWLWXtGR FRPR H[SHULrQFLD$TXLORTXHLQVLVWHHPPLPDFDGDHVTXHFLPHQWRDFDGDDSDJDPHQWRTXHLQVLVWH FRPRXPDSRHLUDVRSUR8PFRUWHXPDLQWHUUXSomRXPLQWHUYDORXPVLOrQFLRXPSHTXHQR sopro e eis a matéria acumulada restituída como névoa de virtualidades. 3HQVDUXPDGUDPDWXUJLDGHSHTXHQRVDF~PXORVpFRQVLGHUDURTXHVHFRQVWUyLFRPRFRQÀJXUDomR sensível na relação com a obra, no decorrer de uma duração concreta. Existe uma disposição do sensível que não pode anteceder a própria relação com a obra. É nessa duração que aquele que se relaciona com a obra vai acumulando variações em seu campo de sensibilidade que vão agindo umas sobre as outras. Essa dobra do que já percebi ou senti sobre o que percebo é que GiVHQWLGRjSHUPDQrQFLD 3HUPDQrQFLDpDF~PXORGHUHODomRpFRQVWLWXLomRGHXPDVXSHUItFLHFDSD]GHUHFHEHUDVÀQDV camadas de poeira que se depositam sobre o corpo, é ter tempo de ver o sopro da obra levantar a cada lance, a névoa dos sentidos compartilhados. 16 Princípios de termodinâmica (A irreversibilidade dos “agoras” que se dissipam) Não há agora suspenso no tempo, um agora é já um atravessamento de durações, de distâncias, de posições. O agora se dissipa em processos irreversíveis e, no entanto, algo insiste, permanece. (VVDSHUPDQrQFLDGHSHTXHQRVDF~PXORVTXHVHLQVLQXDPHQWUHRV´DJRUDVµTXHVHVXFHGHP GLUHFLRQDPRÁXLUGRWHPSRDWUDYpVGDGXUDomR8PDPHPyULDGRWHPSRQmRpRTXHVHÀ[DFRPR SDVVDGRPDVVLPDPHPyULDGDLUUHYHUVLELOLGDGHGDVH[SHULrQFLDVTXHVHGLVVLSDP2DJRUDpR eterno retorno transmutado em uma qualidade de presença. Sua irreversibilidade impõe a cada micromomento uma multidão de micro-acontecimentos que se desdobram numa temporalidade intricada, auto-referenciada e, no entanto, irreversível, o que retorna, só retorna porque não é mais o mesmo, e o agora é uma forma do que retorna. O agora é o tempo onde o presente das coisas passadas e o presente das coisas futuras persiste num ritornelo de diferenciações sutis, constituindo um presente povoado de presenças, um transbordamento de pequenos acúmulos. Princípio de micro-percepção ((PWXGRTXHYLYHKiXPDÀVVXUDSRURQGHRWHPSRVHLQVWDOD) O intensivo não é só uma questão de escala, não é um tempo compactado, hiper-realizado. O intensivo impõe outras estratégias perceptivas, outros regimes de visibilidade e enunciação, outras formas de escoamento de energia. Instalar-se no intensivo implica em corporeidades outras, em regimes de atenção sutil, em estados alterados de percepção e, no entanto, por mais intenso que seja o movimento, existe uma linha de delicadeza que o atravessa. Uma passividade como condição de ser afetado sem o pathos da derrota política, uma disponibilidade às pequenas DIHFo}HV XPD GHVLVWrQFLD XP DEDQGRQR XPD UHVLVWrQFLD DR ÁX[R WRWDO TXH QRV LPS}H XP tempo esvaziado de sentido. “Habitar o tempo dá em habitar-se” (João Cabral de Melo Neto). O intensivo como o instante habitado no vazio pleno de sua duração, de sua espessura, de sua viscosidade. 17 Princípio de economia da cena (o máximo de esforço para um mínimo de resultado) A economia do sensível funciona com base na perda, no gasto, na entrega. A obra não se poupa, não se guarda e, no entanto, não se consome, não desaparece. Seu regime é qualitativo, microYDULDo}HVGHHVWDGRUHODFLRQDOPXGDQoDVTXDOLWDWLYDVQDEDVHGHXPDF~PXORGHH[SHULrQFLDV $IRUPDGHFRQVHUYDomRGDDUWHQmRpDGDPHUFDGRULDTXDQWRPDLVLQWHQVDpDH[SHULrQFLDGH VHXJDVWRQDIUXLomRHVWpWLFDPDLVHODDFXPXODVHQWLGRV$H[SHULrQFLDHVWpWLFDVyJHUDDF~PXOR quando a obra se gasta, quando se oferece para além de seu transbordamento semiótico. Princípio de compartilhamento (você parte, eu escolho) Quando crianças em torno à mesa, numa disputa por alguma iguaria, eu e meus irmãos elaboramos um método de divisão que para mim representou um dos primeiros contatos com uma política GDSDUWLOKD9RFrSDUWHHXHVFROKR4XHPGLYLGHTXHPHVFROKHDSDUWLOKDQmRpXPDVLPSOHV questão de divisão, ela só cria sentido num jogo muito concreto de tensões negociadas, uma FDUWRJUDÀDGHDIHWRVFRQVWUXtGDQXPDUHODomRGHFRPSRVLo}HV Princípio topológico (tomar lugar, tomar posição) Ordenar os pontos de vistas... Arte de estabelecer distâncias... Tomar lugar, não como uma expropriação do lugar do outro, nem como uma anulação do outro como diferença que me constitui. Tomar posição como assumir um lugar, constituí-lo, instaurá-lo como ponto de vista, pois para haver relação é preciso instaurar um intervalo, uma descontinuidade. Tomar posição é sempre estar pelo menos em dois lugares, dentro e fora, constituir um aqui e agora, um regime do visível e do enunciável, uma ponta de presente que já foi e ainda não é e ao mesmo tempo constituir uma opacidade, uma zona de invisibilidade, um extra campo, produzir um invisível, o que não pode ser visto desde ali. 18 Princípio de (in)determinação (meu corpo como hiato) Uma imagem age sobre mim e eu seleciono nela o que pode ser restituído sob a forma de uma nova DomRVREUHRPXQGR %HUJVRQ 0DVDLPDJHPTXHPHDIHWDQmRSRGHVHULGHQWLÀFDGDGHGX]LGD na ação que resulta, pois entre as duas existe meu corpo como centro de indeterminação. Meu corpo retém a ação da imagem sobre mim em forma de uma afecção, algo que se produz nesse intervalo entre o que me afeta e minha reação. A impossibilidade de restituir imediatamente em forma de imagem-ação a imagem-percepção que me atinge, produz um intervalo, um hiato, a forma desse hiato, sua intensidade modula minha atitude frente ao mundo. O acúmulo desse hiato produz uma memória dessa indeterminação. Essa memória da indeterminação é que me SURGX] FRPR ORFXV RQGH DV FRLVDV VH UHFRQÀJXUDP VH WUDQVÀJXUDP VH WUDGX]HP XPDV QDV outras, se adensam, permanecem, constituem durações singulares na ação de uma imagem sobre a outra. Princípio de arremesso 8PDUUHPHVVRFRPHoDVHPSUHDQWHVHVyÀQGDGHSRLVFRPRVHFDGDDUUHPHVVRFRPSRUWDVVH dois sentidos. Um que segue e não sabemos nunca se volta e outro que já segue voltando, uma dobra do sensível. O futuro desse gesto é seu eterno retorno, sua variação por acúmulo. A acumulação é aqui uma função poética (ela engendra mundo), ela entrega o gesto que se gasta em sua repetição como elemento fundador de um novo sentido. Um sentido que surge da SHUPDQrQFLDGRSUD]HUGRMRJRGRJDVWRGHHQHUJLDTXHQmRVHSURGX]FRPRHQFDGHDPHQWRGH ações na cadeia produtiva do sentido teleológico do consumo. É preciso pensar uma dramaturgia do arremesso, de como jogar as coisas, de como se jogar nas coisas, de como jogar junto... Alexandre Veras 19 O mundo como organismo sensório Queixa-se o meio-dia, lento e morno, quando eu entro pela porta da sala de ex-votos, anexa à estátua de Padre Cícero, em Juazeiro do Norte. O espaço está completamente forrado de UHWUDWRVYRWLYRVGH]HQDVGHPLOKDUHVGHIRWRJUDÀDVFRORULGDVDUHSURGX]LURVFRUSRVGHFDUrQFLD HSLHGDGHGRVÀpLV (VWHHVSDoRDVVHPEODJHGHLPDJHQVIRWRJUiÀFDVWUDQVIHUHSDUDPLPXPDIHWRGHOXWRSURGX] HPPHXFRUSRXPODPHQWRTXHQmRVHH[WHULRUL]DVHPDPELYDOrQFLD6LQWRRHVSDoRGHVYLDUR ÁX[RDIHWLYRGRPHXFRUSRPHHQWULVWHFHQGR0DVQmRSDUDOLVRDRFRQWUiULRRTXHROXJDU comunica da expressão popular também me inspira e gera conhecimento. Eu tento articular uma opinião sobre aquilo, mas o afeto ambíguo do espaço me confunde e eu recuo. Não sabendo textualizá-lo, eu abafo este afeto e sigo mudo. Eu começo na sala de ex-votos porque ela é um espaço vibrátil em si mesmo, e eu quero esboçar uma contribuição para o entendimento da dramaturgia da performance a partir da corporeidade e sensorialidade do espaço. Essa sala de ex-votos é um lugar privilegiado para compreender a corporeidade como relação cognitiva que não pertence ao corpo do sujeito, mas TXHVHFRQVWUyLVLVWrPLFDHQmROLQHDUPHQWHQRHQFRQWURHQWUHDVHQVRULDOLGDGHGRFRUSRHD sensorialidade do espaço. Sem dúvida alguma o lamento que meu corpo construiu nesse espaço ritual foi uma projeção psíquica organizada pelos meus sentidos corporais, mas foi a partir de uma densidade sensorial que objetivamente já estava ali, própria daquele contexto. Cada IRWRJUDÀDPDWHULDOL]DYDXPDPHPyULDXPDSHQLWrQFLDXPDYLDJHPDWpRKRUWRXPJHVWR6H meu corpo criou fantasmas, ele não o fez de modo aleatório, mas justamente no encontro com a memória material do contexto onde ele circulava. Essa memória materializada nos objetos não é LQIRUPDomRDVHUGHFRGLÀFDGDSHORFRUSRPDVpHPVLXPVLVWHPDVHQVRULDOIRUDGRFRUSR(P outras palavras: o fantasma pertence ao meu corpo da mesma forma que pertence ao ambiente. 20 A proposta é que o encontro entre sistemas sensoriais organiza uma performance. Para a antropóloga C. Nadia Seremetakis, a paisagem sensória fora do corpo, formada pelos objetos e pela cultura material que condensa memórias e histórias, pessoais e coletivas, é inerentemente transitivo e incompleto. Esse universo da cultura material demanda uma conectividade, uma espécie de completude perceptiva pelo aparato sensorial do corpo, que percebe e gera respostas ao mundo. Em Seremetakis, essa completude perceptiva leva o nome de performance. É através GDSHUIRUPDQFHTXHFDPDGDVGHH[SHULrQFLDSHVVRDOHDIHWLYDWRUQDPVHVHQVtYHLVVXEVWDQFLDGDV por redes materiais e objetuais. Percepção, portanto, é uma poiesis gerada no encontro do aparelho sensorial do corpo e o mundo como sensorialidade e memória. Para Seremetakis, tal poiesis produz uma mutação de sentidos e memórias que refrata a inserção mútua do corpo que SHUFHEHHGRREMHWRSHUFHELGRQXPDH[SHULrQFLDKLVWyULFD ,VVRWXGRSDUDGL]HUTXHDH[SHULrQFLDKLVWyULFDREULJDXPFRQFHLWRGHSHUFHSomRHPHPyULD não-centrada num corpo que percebe, mas gerada no encontro entre o corpo sensível e o mundo VHQVtYHO(PVXDGLPHQVmRKLVWyULFDDSHUIRUPDQFHVHTXDOLÀFDVREUHWXGRFRPRHQFRQWUR² em oposição à concepção de performance como representação. A performance é um instante GHDXWRUHÁH[mRVHQVRULDODWLYDGRSHORQRFRUSRHSHODQDFXOWXUDPDWHULDODRPHVPRWHPSR Esse movimento dialético da sensorialidade, embora localizado internamente, revela a cultura PDWHULDOHPVL RPXQGRRHVSDoRRRXWUR FRPRDSDUDWRTXHSURGX]XPDUHÁH[LYLGDGHVyFLR KLVWyULFD3RUVXDSUySULDQDWXUH]DRPXQGRPDWHULDOSURGX]UHÁH[}HVKLVWyULFDV 21 A dramaturgia da performance e o pensamento do mundo (VVH MHLWR GH SHQVDU D H[SHULrQFLD VHQVRULDO KLVWRULFDPHQWH DVVHQWDGD QR HQFRQWUR HQWUH corporeidades (corpo e mundo) evidencia que a atualização de um devir num dado contexto (um corpo em devir) se dá sempre a partir de duas dramaturgias: a dramaturgia do corpo e a dramaturgia do espaço – do “lugar”, na verdade, já que o espaço nunca é neutro, mas sempre já texturizado por sensorialidades e memórias próprias. Partindo dessa noção sócio-histórica de performance, como imaginar uma dramaturgia do HQFRQWURHQWUHYLGDHDUWH"2UDVHDGLWD´YLGDµMipHPVLXPSURFHVVRGHUHÁH[mRKLVWyULFDR WUDEDOKRGRDUWLVWDGHSHUIRUPDQFHWDOYH]VHMDHQHUJL]DUHVWDUHÁH[mRPHGLDUHVVHSHQVDPHQWR GR PXQGR DEULUVH DR ÁX[R HQHUJpWLFRHSLVWHPROyJLFR H VH WRUQDU XP FDQDO GH HVFRDPHQWR SDUDHOHGLVVHPLQDQGRRUHTXDOLÀFDQGRRLQWHQVLÀFDQGRR3DUHFHWHUVLGRLVWRRTXHSURS{V (OHRQRUD)DELmRQHVWHHQFRQWURHP)OHFKHLUDV(PXPDGLVFXVVmRQRUHGiULRHODDÀUPRXTXH na arte de performance a dramaturgia implica numa diminuição da presença (tomada em seu histrionismo teatral) e um crescimento da obra em si, uma desaceleração da espetacularidade e uma aceleração da receptividade. O corpo da artista de performance toma um passo para trás de modo a se abrir ao outro e ao mundo. Parece-me, sobretudo, tratar-se de uma dramaturgia cujo operador principal é a humildade. A receptividade não-passiva parece sugerir uma humildade em relação ao outro e ao mundo, um “deixa falar” e um “vamos escutar”. Em sua prática de performance – relatada em conversas diversas – a artista elabora uma proposição em que pretende instaurar um diálogo/relação junto ao espectador-participante. Ela não elabora uma LQIRUPDomRXPGLVFXUVRRXXPDRSLQLmRQDUUDWLYDDVHU´WUDQVPLWLGDµPDVXPDH[SHULrQFLD partilhada. Nessa interrupção do sistema clássico de reprodução artística, a performer redistribui politicamente o sensível de modo a dispor ela e o espectador, ambos, como produtores e perceptores do mundo e da arte. 22 A artista de performance como amante do mundo A ideia de humildade a qual me referi não traz consigo uma apologia do martírio. Ao contrário, o performer é menos vítima do que criminoso. Ele trata de gerar uma proposição ativa, uma interpelação, uma questão, um convite, um colocar-se diante do outro não como tela branca a ser inscrita pelo outro, mas sim como interlocutor e colaborador sensorial: corpo vibrante, de sensorialidade ativada e escandalosamente (ou libertariamente, ou ludicamente, ou humildemente) exigindo uma resposta. O valor da humildade aqui é ao mesmo tempo político e erótico, posto que é uma apologia da incompletude, uma conscientização e celebração do ego como bicho inválido frente ao objeto GHGHVHMR2HURWLVPRLQVWDXUDTXDVHVHPSUHXPDLQWHQVLÀFDomRGDLQFRPSOHWXGHQDPHGLGD em que, amando, o ego precisa admitir sua aniquilação diante do outro. Para mim o amor LQDXJXUDXPDFHQDSROtWLFDGHr[WDVHRQGHRVHOIGHSRVLWDVHQDSURPHVVDTXHRFRUSRGRRXWUR pronuncia. Retiro-me de mim mesmo e me coloco na promessa que é o outro. Essa estrutura extática do self no erotismo ao mesmo tempo desvela as bases da sociabilidade: eu só sou possível diante de um outro, e preferencialmente junto às promessas do outro, das quais me aproximo de modo a gerar minha autonomia. Na dramaturgia do amor, é o outro quem me dá autonomia. $DUWLVWDGHSHUIRUPDQFHTXDQGRODQoDPmRGDQmRHVSHWDFXODUL]DomRHSURS}HXPDH[SHULrQFLD de vida junto ao outro, mimetiza uma dramaturgia análoga. Transformando sua receptividade em obra, ela torna-se amante do mundo. Pablo Assumpção 23 Queridos Tecedores, SRLV ÀFDPRV IDODQGR HP YHUEHWHV HP FULDUPRV XPD FROHomR GH YHUEHWHV H JRVWHL GD LGHLD Segue um primeiro movimento. Corpo Performativo Em sua última e inacabada obra publicada postumamente em 1964 — O Visível e o Invisível — Maurice Merleau-Ponty propõe a noção de “entrelaçamento” entre corpo e mundo. Discute suas “inserções recíprocas” e recusa teorias que colocam o corpo no mundo e o sujeito no corpo como se fossem caixas. Merleau-Ponty: “Onde estamos, onde nos posicionamos, para estabelecer um limite entre o corpo e o mundo já que o mundo é carne?”1 O mundo não é receptáculo ou recipiente, anuncia, mas “tecido conectivo;” o corpo não é receptáculo ou recipiente, mas tecido conectivo. Nesta tessitura fenomenológica, o sujeito não possui um corpo, mas é corpo; o mundo não é habitado pelo corpo, mas é uma de suas dimensões. Merleau-Ponty: “Em vez de rivalizar com a espessura do mundo, a espessura do meu corpo é, ao contrário, o único meio que possuo para chegar ao âmago das coisas, fazendo-me mundo e fazendo-as carne.”2 Por conta desta intimidade de entrelaçamento, deste parentesco elemental, corpo e mundo tornamse indissociáveis, ou seja, não podem ser concebidos ou percebidos autonomamente. Anos antes, em 1950, o psicólogo austríaco Paul Schilder lança o livro A Imagem e a Aparência do Corpo Humano. Neste trabalho, desenvolve sua teoria do corpo-imagem propondo que a pele não delimita o corpo, que o corpo se expande no meio em que está inserido. O corpo-imagem QmRpLGrQWLFRjIRUPDFRQFUHWDGRFRUSRPDVHVWiHVWHQGLGRHGLVVROYLGRQRHVSDoRFLUFXQGDQWH 6FKLOGHU´2FRUSRLPDJHPVHH[SDQGHSDUDDOpPGRVFRQÀQDPHQWRVGRFRUSR8PDEHQJDODXP chapéu, qualquer tipo de roupa, tornam-se parte do corpo-imagem. Quanto mais estreita a conexão do corpo com o objeto, mais facilmente o objeto se torna parte do corpo-imagem. Os objetos TXHMiHVWLYHUDPFRQHFWDGRVDRFRUSRVHPSUHUHWrPDOJRGDTXDOLGDGHGRFRUSRLPDJHPQHOHV 1 MERLEAU-PONTY, Maurice. The Visible and the Invisible. Evanston: Northwestern University Press, 1992, p. 138. 2 Ibid. p. 135. 24 Seja lá o que se origine em ou que emane do corpo, ainda se manterá como parte do corpoLPDJHP$YR]DUHVSLUDomRRRGRUDVIH]HVVDQJXHPHQVWUXDOXULQDVrPHQVmRDLQGDSDUWHV do corpo-imagem mesmo quando separados do corpo no espaço”.3 Se os corpos sólidos da física newtoniana são rígidos e impenetráveis, aqui, ao contrário, o FRUSRLPDJHPDÀUPDDHVSDFLDOL]DomRGRFRUSRHDFRUSRUHLGDGHGRHVSDoRDFLUFXODomRGH interioridades e exterioridades, as misturas corpo-mundo e mundo-corpo. Anos mais tarde, outro austríaco — o arquiteto, artista, ecologista e ativista Hundertwasser — concebe uma..., deixe-me ver como palavrar..., uma espécie de geo-política cutânea, anatomia conectiva, plano bio-social, baseado na ideia de que nossos corpos são formados por cinco peles. A primeira delas é mesmo a epiderme — que envolve e sustenta nossos esqueletos e carnes, o maior órgão sensorial, o único que não pode ser fechado como a boca e os olhos, ou ser bloqueado como os ouvidos e o nariz (a pele não pode recusar vibrações ou descargas elétricas); um órgão liminal, fronteiriço, dentro-fora, paradoxal. A segunda das cinco peles é a roupa; a terceira é a moradia; a quarta é o meio social (família, grupos, nação); e a quinta pele é o planeta. Se as duas primeiras são individuais (epiderme e roupa), e a terceira (a casa) pode ser individual ou grupal, as duas últimas (o meio social e o planeta) são coletivas. O corpo multi-dimensional de Hundertwasser é sempre e simultaneamente privado e público, micro e macro, individual e coletivo, biocósmico: um corpo plural marcadamente conectivo e político. Buscando palavras... Tempo. Copo dágua. :::::::: Um corpo-mundo que gera o mundo-corpo que o gera. 3 SCHILDER, Paul. The Image and Appearance of the Human Body. New York: International University Press, 1950, p. 213. 25 Proponho que o corpo performativo é aquele que dá visibilidade poética através de práticas HPLQHQWHPHQWH FRUSyUHDV DR SULQFtSLR GH FRQHFWLYLGDGH TXH R ÀOyVRIR 0HUOHDX3RQW\ R psicólogo Paul Schilder e o artista ativista Hundertwasser articulam de modos muito diversos porém dialógicos. O corpo performativo dá visibilidade poética, abre dimensão crítica e enfatiza a politicidade da condição de entrelaçamento. Para um performer é imprescindível interagir diretamente com o meio no qual se insere e, na medida de seu propósito e alcance, rearranjá-lo e rearranjar-se através das operações performativas que realiza. Para tanto, não utiliza recursos tradicionais de mediação entre artista e mundo como, por exemplo, o objeto artístico, o espetáculo FrQLFRRXDQDUUDWLYDÀFFLRQDO5HFXVDHVWHVUHFXUVRVHSULYLOHJLDDo}HVLPHGLDWDVYLYHQFLDGDV no espaço-tempo atual e voltadas para a criação de modos de pertencimento ativo. Ações que privilegiam o corpo — do performer, do público, do mundo — como tema, matéria e meio. 8PFRUSRSHUIRUPDWLYRSRUTXHÁH[LELOL]DDQRomRGHindivíduo ao evidenciar que corpo não é separável de mundo, que corpo e mundo são multidões de relações. Um corpo performativo porque desestabiliza a noção dura de identidade que passa a ser compreendida como conjunto de atos (inclusive atos de fala)—“identidade” como ato performativo e, assim sendo, em permanente formação e desformação. Um corpo performativo porque voltado para a investigação das muitas SHOHVGRPXQGR(GLJDVHGHSDVVDJHPWDQWRID]VHHVWHFRUSRVHFRQÀJXUDQDSHUIRUPDQFHQR teatro, na dança, na sala de aula, na sala de ensaio, na sala de estar em casa, na cama do quarto, QDUXDQDFKXYDQDID]HQGDRXQXPDFDVLQKDGHVDSr8PFRUSR SHUIRUPDWLYRSRUTXHQmRVHSUHQGHDJrQHURVDHVWLORVHWDOYH]VHTXHUDDUWH2FRPSURPLVVRp com a circulação de afetos, com a ativação crítica e política do entrelaçamento corpo-mundo, e FRPDH[SHULPHQWDomRSVLFRItVLFDVHPSUHFRPDGHYLGDGRVHGHSUXGrQFLDHDLPSUHVFLQGtYHO torção poética. Eleonora Fabião 26 Sobre Corporeidade A modernidade trouxe consigo, além de uma série de transformações, um novo foco de interesse sobre o estudo da percepção. Por volta da metade do século XX, a fenomenologia de Edmund Husserl ganha nova força com o trabalho de Merleau-Ponty. $R UHIHULUVH DR FRUSRFDUQH 0HUOHDX3RQW\ R DSUHVHQWD FRPR R FRQMXQWR GH VLJQLÀFDo}HV YLYLGDVXPVLVWHPDGHSRWrQFLDVPRWRUDVRXGHSRWrQFLDVSHUFHSWLYDV'HÀQHDLQGDRHVSDoR FRPRVHQGRDSRWrQFLDXQLYHUVDOGHVXDVFRQH[}HV3HQVDUPRVQRHVSDoRGRFRUSRVHJXQGR HVVDVGHÀQLo}HVSUHVVXS}HSRUWDQWRUHFRQKHFHUPRVTXHQRVVRFRUSRQmRHVWiSULPHLUDPHQWH no espaço, mas que ele é o espaço. Assumimos também, com isso, que a percepção é o modo como temos acesso ao mundo, é aquilo que funda nossa ideia de verdade. Dessa forma, faz sentido pensarmos que o termo corporeidade refere-se a diferentes estados de um corpo vivo em ação no mundo. Tal noção parece-nos determinante para o pensamento sobre uma construção dramatúrgica, sobretudo quando entendemos a cena como a constituição GHXPDDPELrQFLD (VVD TXHVWmR SDUHFH XOWUDSDVVDU DV TXHVW}HV SHUWLQHQWHV D YRFDEXOiULRV HVSHFtÀFRV H PHVPR opções estéticas distintas, que optem entre o trabalho com o movimento formal ou ações físicas, por exemplo. É uma questão que se situa no próprio cerne da composição e, como tal, evidencia-se como uma questão técnica, também de ordem dramatúrgica, que implica na escolha de procedimentos, estratégias e metodologias de trabalho. De que estratégias podemos dispor para estimular e propor diferentes estados corporais, ou seja, diferentes corporeidades num plano de composição? Andréa Bardawil 27 Uma isca... O dramaturg é, de algum modo, um crítico. Um crítico que injeta esta crise num processo ainda em curso. Ouvi de um outro dramaturg _ o mineiro Alex Guerra, colaborador em algumas das peças de Marcelo Evelyn _ que a sua função era segurar um espelho diante de Marcelo, onde ele pudesse ver o que criava para decidir se era aquilo mesmo que pretendia e daquele modo. Acho boa essa imagem do espelho. Evidentemente, não há neutralidade na imagem que o dramaturg envia DRFRUHyJUDIR6HXROKDUFRPRRGHTXDOTXHURXWURHVSHFWDGRUVHUiÀOWUDGRSRUVXDVSUySULDV UHIHUrQFLDV'HWRGRPRGRpXPµRXWURµROKDU2ROKDUGH´XPRXWURµ(GXUDQWHRPHUJXOKR no cotidiano de uma criação, essa imagem, ainda que um pouco distorcida ou desfocada, pode ser extremamente útil. Este “outro” está por perto, embora nem sempre presente. Flecheiras Dia 07: a minha perspectiva neste tecido começou de véspera. Ontem, antes de partir para )OHFKHLUDV H[SHULPHQWHL R GHVOL]DU H RV QyV GH XP WHFLGR FRQMXQWLYR (GXDUGR UROÀVWD SHUJXQWRXGHPLQKDVGRUHVHLQF{PRGRV)DOHLGHDOJXPDVDQWLJDVHGHRXWUDVPDLVUHFHQWHV Seus dedos, ao mesmo tempo pregos e antenas, atravessaram várias camadas, dos tecidos de minhas roupas a outros mais profundos, e foram deslocando-os, descobrindo-os, convocandoos a entrar em Ação, em tensão. Tecido conjuntivo. Tecido conectivo. Substância fundamental, forma, represa, muralha, membrana. Prazer. Elástico. Plástico. Camadas de tempo, fragmentos de tecido. Colcha de retalhos. Dia 09: RV HQFRQWURV FULDP FDPSRV SUDLDV ÁRUHVWDV GH LGHLDV 'H RQGH YLP" 2 TXH WURX[H GHQWURGHPLPGHVVHOXJDU"'HVWHVOXJDUHV"4XDQGRIDORGRTXHÀ]VHPHLRLGHLDVSHQVDPHQWRV questões não compreendidas, que se encontram com o que está do outro. Do que vem do outro. 'RTXHYHLRFRPRRXWURTXHFKHJRXGHRXWURVOXJDUHV2TXHÀFRXGRRXWUR"2TXHHOHQmR TXLVPDQWHU"2TXHQmRRDWUDYHVVRX"1HVWHFtUFXORGHOLYURVVHWHFH2TXHOLÀFRXHPPLP" Por que não trouxe o Grande Sertão? Colcha de retalhos? 28 Trama de sentidos. Trama de acasos? Lembro de ter lido que, apesar da aparição da teoria da relatividade, o trajeto dos foguetes ainda é calculado a partir da física newtoniana. Penso nisso hoje. Ao ouvir tantas falas, ao tentar seguir RVÀRVGRVSHQVDPHQWRVVREUHRFRUSRVREUHDDUWHVREUHDGUDPDWXUJLDPHXFRUSRSDUHFHVH GHL[DUSHUPHDUSHODVLGHLDVQRYDVPDVQmRFRQVHJXHGHIDWRVDLUGHDOJXPDVUHIHUrQFLDVTXH me são constitutivas. Constitutiva. Seria esse o termo? Dentro de mim. Achar a minha física newtoniana. De onde não consigo escapar? Sílvia Soter 29 Acasos são Rastros ao Contrário A ideia de dramaturgia faz parte de minha prática de bailarino e coreógrafo desde o princípio, chegando mesmo a se confundir com o que reconheço hoje como sendo o meu trabalho autoral. Meu percurso como criador se deu desde sempre como uma aprendizagem embutida nesse fazer relacionado, ação de troca subcutânea que fundamenta a percepção do que está sendo gerado. 'HSRLVGRPXLWRTXHIRLGLWRHUHGLWRVREUHGUDPDWXUJLDQRH[HUFtFLRHQJDMDGRGHUHÁH[}HVTXH DOLPHQWDUDPQRVVDUHVLGrQFLDFDORURVDHP)OHFKHLUDVGHFLGLHVFUHYHUVREUHRPHXFRQYtYLRFRP alguns dos dramaturgos que acompanharam e acompanham meu percurso de criador, percurso esse tão absolutamente alterado por eles. Dramaturgia para mim foi, inicialmente, o modo de tornar visíveis os pensamentos do corpo, um corpo não mais compreendido pelo virtuosismo e a expressividade, não mais modelado na representatividade, mas o corpo que fala por si, colocado no centro do terreno instável da criação contemporânea. Ouvi pela primeira vez a palavra dramaturge pronunciada em língua alemã. No Brasil a tradução GDSDODYUDYLURXSROrPLFDHIRLDGRWDGRRWHUPRGUDPDWXUJLVWDDLQGDHVWUDQKRSUDPLPTXH continuo usando e usarei aqui a minha tradução ao pé da letra: dramaturgo. Lembro-me de ter visto Raimund Hoghe pela primeira vez por volta de 1987 sentado em VLOrQFLRDRODGRGH3LQD%DXVFKQRJUDQGHVDOmRRQGHWUDEDOKDD&RPSDQKLDGH:XSSHUWDO na Alemanha. Nos anos seguintes eu passara a frequentar a Companhia, até ser aceito como estagiário no ano de 1988 e me tornar seu amigo. Raimund estava ali como dramaturgo, falava pouco, mas observava tudo, e às vezes trazia a todos algumas histórias relacionadas, de forma não literal, com algum material que aparecia nos ensaios. Muitas vezes cochichava no ouvido de Pina sem que pudéssemos ouvir. Ela lhe voltava uma atenção demorada e esboçava pequenos sorrisos com o que ouvia. Para mim aquela era uma dramaturgia do sussurro, através de palavras que entravam suavemente por um ouvido-alvo receptor, para oxigenar um corpo em gestação. 31 Passei a conviver com Hoghe a quem perguntava constantemente o que era dramaturgia. Ele apenas contava histórias, lembranças de encontros com pessoas que lhe pareciam especiais, observações de habitantes de Dusseldorf onde vivia e muitas memórias de sua infância. Falava de sentimentos e situações entremeadas nessas memórias e como isso podia ser trazido para a cena, falando de modo a parecer simples, mas extremamente poético. Sua dramaturgia para Pina parecia vir daí, de lembranças, canções e notas quase melancólicas, numa busca pessoal por amor e aceitação, temas da coreógrafa que se tornavam seus também. Seus livros, muitos deles escritos a partir de processos, de questões tiradas dos ensaios e da própria percepção da coreógrafa durante as montagens, continham trechos de cartas e cartões postais, pedaços de estórias contadas pelos intérpretes e descrição de lugares e encontros, reaproveitados de modo peculiar por ele. Ele parecia colecionar verbetes daqueles corpos abandonados em uma busca pelo mais secreto neles mesmos, o indizível dos desejos, das projeções de felicidade e pertencimento ao outro, em meio a um mar de pequenas fragilidades HIDVFLQDo}HVQDGHÀQLomRGHXPUHDOFKHLRGHSRVVtYHO Em 1989 comecei o meu trabalho como coreógrafo frente a um pequeno grupo de bailarinos SURÀVVLRQDLV(VWDYDDFRPSDQKDGRGH3LHWHU&6FKRRWHQFRPRGUDPDWXUJRTXHWDPEpPGDYD seus primeiros passos nessa direção. Não iniciamos aí apenas um processo entre um coreógrafo e um dramaturgo em torno de uma obra. Esse foi o início de uma busca pela execução do que seria uma dramaturgia para a dança que queríamos fazer, a dança que estávamos testando cada um de sua posição, numa colaboração que durou até o ano de 1998 com a realização de mais de dez espetáculos. Pieter começava os processos me questionando e esmiuçando o que eu trazia - uma palavra, uma imagem – antes de começar os ensaios. Traçava uma ideia geral de como abordar aquele XQLYHUVRFRPRVHQWLGRGRWRGRPRYLPHQWRVP~VLFDFHQiULRÀJXULQROX] 32 Frequentava os ensaios assiduamente. Presente, mas calado e reticente, cercava os assuntos tratados, desfazendo alguns limites na nossa compreensão deles, ampliando fronteiras para que o corpo pudesse se constituir de outros modos. Pensava os espaços da ação como um desdobramento do corpo, abordando os sentidos que apareciam nele para que pudessem se DGHTXDUGHYROWDDHVVHHVSDoRFRPFRHUrQFLDHSUHFLVmR1DQRVVDLQH[SHULrQFLDFRQMXQWDGH jovens artistas, dedicávamo-nos a horas de conversa sobre as peças passadas antes de começar uma nova, tentando mapear erros e acertos e sobretudo reconhecer os rastros do que se construía no intuito e no acaso desses quereres compartilhados. Com Robert Steijn trabalhei em duas obras nos anos 90, em um momento onde parecia haver XPDQHFHVVLGDGHJHUDOGDÀJXUDGRGUDPDWXUJRHPXPSURFHVVRGHGDQoDQD(XURSD2FRUSR SDVVDYDDVHURWHUUHQRIpUWLOGDH[SORUDomRLGHQWLÀFDGRFRPRSRWrQFLDGHXPDGDQoDKtEULGD GHFRGLÀFDGD IUDJPHQWDGD H SHVVRDOL]DGD DEULQGR FDPLQKR SDUD RXWURV ID]HUHV SRVVtYHLV H isso nos excitava a todos. Robert entendia o corpo na cena como em um processo ritualístico, SDVVtYHOGHWUDQVIRUPDomRTXDQGRWUHVSDVVDGRSRUXPDH[SHULrQFLDFRUSRULÀFDGD$ERUGDYDR material do processo pelo cheiro, quando nos pedia que sentíssemos o cheiro do que estava em volta, o cheiro do outro, e o nosso próprio em cada movimento que fazíamos, para que servisse de bússola para nossa orientação. Propunha-nos investigar esses materiais em outros ambientes, quase sempre em ambientes relacionados com o que buscávamos nas obras, mas não diretamente como em uma pesquisa de campo. Era como perseguir o rastro do que desconhecíamos, SRVVLELOLWDQGRXPDH[SHULrQFLDTXHQmRSRGHUtDPRVWHUQRHVSDoRFRPSUHHQGLGRFRPRHVSDoR FrQLFR Com Alex Guerra experimentei uma dramaturgia centrada no encontro entre dois brasileiros há muito vivendo e trabalhando fora de seu país. Colaboramos pela primeira vez em um espetáculo criado em Salvador com intérpretes baianos, e nos deparamos imediatamente com a necessidade de uma espécie de adaptação dos modos de fazer europeus, para outros modos de pensar, criar e ver a dança no Brasil, justamente o que nos interessava naquela obra. 33 1RVVDFRODERUDomRVHPSUHHVWHYHEDVHDGDHPUHIHUrQFLDVFRPXQVHLQWHUHVVHVUHFtSURFRVHP XPSURFHVVRGHSUR[LPLGDGHHDIHWLYLGDGHTXHQRVSHUPLWLDDUULVFDUSDUDUHGHÀQLUDVUHJUDVGR jogo, amassando como massa de pão o material das peças, destilando aqueles micro sentidos que acabavam por afunilar nossa percepção dos enunciados do corpo em ação. Minha mais recente colaboração se dá com Loes van der Pligt, iniciada quando decidi trabalhar em uma trilogia sobre minhas origens no Brasil. A questão inicial foi o que ainda restava no entorno do meu corpo que pertencia a ele, o que sobrara nele das metáforas desse exterior, mais imaginário do que real, mais transposto do que original. Loes parece atuar na ruptura com o que se apresenta ali e não mais pertence ao momento presente, descartando o evitável e desmascarando os adornos. Assim como numa fuga para o lugar abismal do futuro próximo, seguindo obstinadamente no encalço do devir. Escolhi uma dramaturga holandesa para acompanhar essa trilogia, pela necessidade de um olhar distanciado e estrangeiro sobre essas obras, olhar alheio ao meu comum. Esse projeto pedia uma posição neutra frente a possíveis armadilhas do identitário, uma posição não facilmente suscetível ao reconhecimento de elementos “de casa”, que seriam absorvidos apenas por EUDVLOHLURVRXPDLVHVSHFLÀFDPHQWHQRUGHVWLQRV1RVVDFRODERUDomRYHPVHGDQGRXOWLPDPHQWH mais por emails e conversas por skype em meio aos encontros presenciais, numa adequação a outros modos de gerar e compartilhar essas obras. Anjos da guarda ou advogados do diabo, os dramaturgos funcionam às vezes como um terceiro olho que enxerga não necessariamente de fora, mas sempre deslocado da visão do criador. Costumam apaziguar sentidos contraditórios e revigorar as certezas, muitas vezes atuando no confronto com o que o criador ainda não pode admitir, segurando um espelho na frente GHOH2SHUDPHPXPHVSDoRGHFRQÀDQoDHGHGLFDomRSOHQDSDUDFRPDREUDHPXPDFRUGR LQFRQGLFLRQDOGHÀGHOLGDGHP~WXD O meu convívio com esses e alguns outros dramaturgos nem sempre foi afável, nem sempre gentil, às vezes era cruel e sangrento como os partos, mas sempre necessário e transparente, SRQWLDJXGRHDÀDGRFRPRRELVWXULTXHFRUWDDFDUQHHPUDVJRVGHÀQLGRVSDUDGHVREVWUXLUXP ÁX[RHVWDQFDGR Marcelo Evelin 34 Tessituras em ação 7 breves notas sobre dramaturgia: tecer tramas sem dramas ou dramas sem tramas. 1. Incluir o outro. Raciocinar empaticamente. Tirar as aspas, juntar as iscas numa boa pescaria. 2. Será preciso que uma força se exerça sobre um corpo para que a sensação/percepção/ação se produza. No começo (era) é a percepção/ação. A percepção propicia a ação, que por sua vez propicia a percepção. Segue-se o tempo todo de uma a outra. Nosso aparato perceptivo não se contenta em receber informações sensórias passivamente, ele busca as informações importantes para o curso da ação. Lá em seu plano próprio de composição, os sentidos já determinam nossas escolhas. Por uma dramaturgia do sensório. Por uma poética da percepção. Dramaturgia FRPRSURGXomRGHLQWHQVLGDGHVIRUoDVTXHLQVWDUHPDGLIHUHQoD HSRUTXHQmRFRQÁLWRV TXHVH LQVWLWXHPQXPFDPSRGHH[SHULrQFLDVH[SHULPHQWDomR 3. De como o olho da coruja captou o meu olhar. O contexto dramatúrgico pode ser percepcionado na grande aventura que se estabelece entre as ações tecidas a priori (mas que postas no aqui HDJRUDVHDWXDOL]DPSHORVHVWDGRVGRFRUSR HRVDFRQWHFLPHQWRVDVRFRUUrQFLDVGRDFDVRe o olho da coruja4, que inadvertidamente e astutamente, como um atrator, adensa e condensa o que vem antes e o depois. Como descrever este devir-coruja? “Poesia é voar fora da asa” (Essa é do Manoel de Barros5). Sendo o corpo simultâneo produtor de estratos e agenciador de H[SHULrQFLDVRTXHLQWHUURPSHRÁX[RDSRQWRGHQRVGHWHUHVWHVLFDPHQWHIUHQWHDXPREMHWR sujeito arte? É quando no meio do caminho entramos em relação com..., somos detidos por... “No meio do caminho tinha uma pedra. Nunca me esquecerei desse acontecimento na vida de minhas retinas tão fatigadas. Nunca me esquecerei que no meio do caminho”... (Essa outra é do Drummond6) 4 Após assistir ao curta “As Corujas”, direção de Fred Benevides, em um dos momentos do encontro “Tecido Afetivo”. 5 BARROS, Manoel. O livro das Ignorãças. RJ: Civilização Brasileira, 1994. 6 ANDRADE, Carlos Drummond de. Alguma Poesia. Ed. Pindorama, 1930. 35 4. Dramaturgia e produção de imagens instáveis. Estabelecer um plano dramático pressupõe D FULDomR RX D HPHUJrQFLD GH LPDJHQV" &RPR RSHUDU FRP LPDJHQV GHVHVWDELOL]DQGRDV RX VXEYHUWHQGRDVIUHQWHjWHQGrQFLDGHFRQÀJXUDomRGHXPDWHODSUHYLDPHQWHFRQÀJXUDGD"&RPR se resguardar das imagens prontas, de esquemas prontamente legíveis, “meros decalques do empírico”7 SDUD QRV DSUR[LPDUPRV GD SRWrQFLD FRPSRVLWLYD GR FRUSR H GD DUWH" +i GH VHU prudente. Não sabemos o quanto podemos afetar e ser afetado, até que nos coloquemos em estado de experimentação. Afetar e ser afetado com arte e astúcia; abrir os estratos do corpo para conexões que supõem agenciamentos. O corpo é ao mesmo tempo lugar de produção de representação e de sua desestabilização: constrói-se e destrói-se nas metamorfoses do corpo. Ao desestabilizar as leis da estática e afrontar os seus limites, o corpo consegue criar na instabilidade outra estabilidade de nível mais complexo, que por sua vez retornará novamente para o lugar do instável. Como lidar com a relação que se estabelece entre a estabilidade do que se produz e o que emerge sem o nosso controle? O que emerge como imagem potente pode provir de VpULHVGHVHQWLGRGLYHUJHQWHVTXHVHLQWHQVLÀFDPTXHRSHUDPQXPFHUWRSRQWRGHFRQWDWRQXP HQFRQWUR TXH UHVVRD GLVSDUD VHQVDo}HV$ FRQVLVWrQFLD TXH UH~QH KHWHURJHQHLGDGHV 2 MRJR dramatúrgico: entre o sentido das ações e as ações dos sentidos. O que ocorre conosco quanto experienciamos a arte? Quando uma série “agarra” a outra, compactua e produz singularidade. E talvez enigmas, que cada micro/macro percepciona a seu modo, pelas imagens da carne e dos sentidos do movimento. Imagens em pensamentos sonoros, visuais, auditivos, cinestésicos e sinestésicos. 5. Proposições de criação de situações experienciais para percepções não habituais. Um corpo pode percepcionar do exterior do interior8 , diluindo a zona de fronteira entre o dentro e o fora, por meio de combinações de modos de ser, e não por conta de uma “unidade psicofísica”? Seria como agir não somente por meio de um mundo pré-dado, prévio e preservado, mas des-criar o fato que aí está e inventar modos de ser e atuar no mundo. Falou-se de tantas categorias para dar conta do CORPO compositor de dramaturgia: vibrátil, sem órgãos, aberto, conjuntivo, glorioso, SUHVHQWHDIHWLYRDIHWDGRÁHFKDDPLJRVLQWRPDVLWXDomRHVWLOKDoDGRVLVPRJUDIDGR 7 PELBART, Peter Pál. (OHPHQWRVSDUDXPDFDUWRJUDÀDGDJUXSDOLGDGH p.3. 8 Gil, José. “Abrir o corpo”. In: FONSECA, Tânia, ENGELMAN, Selma. &RUSRDUWHHFOtQLFD Porto Alegre: UFRGS Editora, 2004. 36 Falamos não precisamente a respeito “do” corpo, mas do que se dá a partir do encontro entre FRUSRVFRUSRHPUHODomRDFRUSRUHLGDGHV6mRFRUSRVGDH[SHULrQFLDVREUHWXGRFRUSRVHP situação, em estado de ação. O termo drama, em sua etimologia “em ação”, já abriga o aspecto dinâmico e processual que o conceito de dramaturgia pode adquirir na contemporaneidade. De ação em ação... emerge um sentido fora da lógica de princípio ou origem, no calor de um acontecimento.  &RPR H[SHULPHQWDUVH QXPD ÁHFKDULD VHQVtYHO 3UHVHQoD 3UHFLVmR 3URQWLGmR 'HFLVmR 'LVSRQLELOLGDGH'RFRUSR1RFRUSR$DUWHGHDWLUDUÁHFKDVVHPVHUXQLGLUHFLRQDO2SDUDGR[R GD ÁH[LELOLGDGH QD SUHFLVmR 1RWD SHVTXLVDU VREUH FHUWD FRPXQLGDGH ´VHP FRPXQLGDGHµ GH PXOKHUHVÁHFKHLUDVGDFLGDGHKRP{QLPDQR&HDUi&RQVXOWDUDVIRQWHVSULPHLUDV",QYHVWLUVH GHXPGHYLUPXOKHUÁHFKD" (VWDUQRUHFLQWRGDH[SHULrQFLD$EULJXHPRVDLQFHUWH]DDLQVWDELOLGDGHQDWXUDOGDVFRLVDVe SUHFLVRDLQGDWHFHUDIHWLYDDIHFWLYDDIHWXRVDPHQWH(VWiQDKRUDGRS{UGRVROHP)OHFKHLUDV eTXDVHXPOXJDUFRPXPWHPTXDVHWRGRGLDQRHQWDQWRpVHPSUHRXWUDH[SHULrQFLD Sandra Meyer 37 Das Turbinas do Corpo (Treinamento, Cidade, Capital) Dramaturgias de uma perguntação )RUWDOH]DJHRJUDÀFDPHQWHÀFDHPXPDEHLUDGHPDUGHUHJLmRGHDWHQomRSROtWLFRVRFLDOGH abismos. A problemática social da cidade se esgarça de forma trágica: assaltos, assassinatos, drogas, transtornos mentais, prostituição. A riqueza da cidade está dividida entre algumas IDPtOLDVGHFODVVHDOWDTXHGHWrPDFRQFHQWUDomRGHUHQGD9LYHPRVHPXPDFLGDGHRQGHRV privilégios são para pouquíssimos. O movimento da dança na cidade também se asssemelha DRUHFRUWHGHSRGHUHVWDEHOHFLGRSHODVXDJHRJUDÀDWHUULWRULDOFDSLWDOtVWLFD2ID]HUGDQoDHP Fortaleza ainda encontra-se marcado pela prática das academias que direcionam também um dar DYHUHVSHFtÀFR$TXHOHVTXHVDHPGHWDOFRQGLomRSDUDH[SHULPHQWDURXWUDIRUPDGHVHSUDWLFDU dança, chega impresso de valores estéticos e sociais. Na maioria das vezes o diálogo com a dança contemporânea não se dá de forma confortável. Processos solitários de desestabilização VH FRQVWLWXHP SURYRFDQGR D UHYLVmR GRV FRQFHLWRV H GHVPLVWLÀFDQGR SUpFRQFHLWRV VREUH D prática da dança que prescindam de espelho, sapatilha e linóleo. 2TXHVHPRGLÀFDHPQyVTXDQGRQRVSURSRPRVHVVDGHVFREHUWD"$LQGDIDODPRVGHHVWUDQKDPHQWR ao optarmos por pés descalços? O que determinou o desuso das sapatilhas de ponta, sapatos de sapateado, tchutchus. Em Fortaleza podemos perceber que quem tem dinheiro se familiariza PDLV IDFLOPHQWHFRP GLYHUVDV WpFQLFDV GH GDQoD HQTXDQWR TXHP QmR WHP ÀFD j HVSUHLWD GH oportunidades eventuais, cursos livres, workshops e projetos sociais que fomentem o trabalho HPGDQoD2TXHVREUD²DERDVREUD²pRGHVHMRGHVHSUHVHQWLÀFDUQDGDQoD(DWpDTXLR capital manifesta, limitando possibilidades, fomentando seleções competitivas e editais. Como então traçar planos de trabalhos que provoquem afetos, que desestabilizem a lógico do impossível? Como pensar em uma não-presença que turbine a presença? E o que se estabelece como presença nessa lógica capitalista? Como não ser leviano? 38 Não quis fazer citações de Marx, Engels, Gadotti, Ivo Tonnet... Paulo Freire disse em algum lugar “o mundo não é, o mundo está sendo”. Estou tentando acompanhar o mundo, tentando entender por onde ele vai, fazendo minha crítica, ainda que calado, atravessado, mais sentido do que ofensivo, mais gente do que bicho, lutando internamente,estou tentando ser um “sendo”. Um amigo outro dia me disse uma frase que me emocionou bastante, falou que estava quieto SRUTXH HVWDYD LQFHQGLDQGR SRU GHQWUR WHQGR XP LQFrQGLR LQWHUQR (VVHV LQFrQGLRV QLQJXpP FRQVHJXHYHURXDSDJDUQHPVHQWLURFKHLURGRTXHLPDGRDTXLORÀFRXHPPLPDFKHLERQLWDD imagem, assim como a achei dolorosa... quase que fez chorar, calei. 3HQVDUHVHQWLUFRPRXPLQFrQGLRLQWHUQRPHSDUHFHOyJLFRDJHQWHSDVVDPXLWRIRUQRTXHQWXUD secura na lida diária em nossos afazeres que se propagam externamente, para o mundo e com o mundo. O que vaza disso é o encontro, o mínimo de contato, às vezes como espinho que fura o dedo do pé, miudinho, mas faz ver. Fazer incendiar possibilidades, encontros, discussões e afetos parece também lógico e genuíno, pois isso escapa ao dizer, escapa ao tocar com as mãos, QmRVHPROKDQHPVHTXHLPD7DOYH]RLQFrQGLRLQWHUQRVHMDRTXHPHWXUELQD(WDOYH]RTXH ID]RIRJRFUHVFHUVHMDDUHVLVWrQFLD4XHHXQmRPHSHUFDTXHHXQmRGHVLVWDTXHQmRQRV percamos, que não nos desistamos. Heber Stalin 39 &RQÁLWR&rQLFR6HQVRULDO O corpo é um texto a ser lido. A dança, diferente do teatro clássico, não se faz através de textos aprendidos, de personagens que transitam dentro de uma história, de diálogos, de começos, PHLRV H ÀQV (OD OLGD ² RX GHYH OLGDU ² FRP WHFLGRV LQYLVtYHLV TXH VH FULVWDOL]DP GHQWUR GH SURFHVVRVGHFRPSRVLomRGHTXDOLGDGHVGHSUHVHQoDGRFRUSRGHDPELrQFLDVHGHVORFDPHQWRV 4XDQGRVHIDODHP´FRQÁLWRµVHSHQVDHP´GLIHUHQoDVµRSRVLo}HVGHIRUoDVFRQWUDGLo}HVRX caminhos contrários que irão se sobrepor, sempre com o pretexto de deixar espaços vazios ou YiFXRVHQWUHDPERV2´HQWUHµSURYRFDGRSHODGLYHUJrQFLDGHIRUoDVpROXJDUGRGHOHLWHGRV r[WDVHVVHQVRULDLVGRVDWUDYHVVDPHQWRVHUHÁH[}HVGRYHUVHGHQWURHQWUHRXGLVWDQWHGHVVDV forças contrárias, do reencontro com substâncias essenciais do ser, invisibilidade que deixa-se conhecer ou revela-se no ato do sentir-sentindo-se, do contemplar além do olho, vendo-se e revendo-se, do tátil além do toque, tocando-se e deixando-se tocar. Em meio a eloquentes discussões conceituais acerca das artes no âmbito da pesquisa e produção FRQWHPSRUkQHD SHUPHLD XP ´VXPRµ TXH H[WUDSROD WHUPRORJLDV DFDGrPLFDV D LQYHQomR GRVHQVtYHOFRPRREUDGHDUWH2TXHQDYHUGDGHLQWHUHVVDpDSRWrQFLDSRpWLFDGDREUDVXD FDSDFLGDGH GH DIHWDU H LQIHFWDU LQGHSHQGHQWH GH WHU VH FRQÀJXUDGR GHQWUR GDV WHQGrQFLDV PHWRGROyJLFDVHVWpWLFDVRXÀORVyÀFDVDWXDLV2FRQÁLWRSRpWLFRGRFRUSRVHPSUHVHUiDQWHV GHWXGRRSUySULRFRUSRVXMHLWRREMHWR(VWDUHLQWHUYLUQRPXQGRpDJrQHVHGDWHRULDSRUYLU $QWHVGDVFRQFOXV}HVHVFULWDVHHGLWDGDVTXHVHÀUPHPDVSUiWLFDVLQGLYLGXDLVRXFROHWLYDVe fundamental que o corpo, com suas possibilidades e capacidades, apresentese, experimentando, na ânsia de criar arquiteturas físicas que dialoguem com os públicos vigentes. Cada lugar vai DVSLUDUSRUXPFRUSRHVSHFtÀFRFDGDFRUSRHYLQGHQFLDUiXPDVLQJXODUQHFHVVLGDGHGHGDQoD FDGDGDQoDWHUiXPUHJLVWURHIrPHURGHSHUJXQWDVHUHVSRVWDVTXHVLPXOWDQHDPHQWHDSDUHFHPHVH GHVLQWHJUDPQRFRUSRPHPyULDVHQWLGRVFDGDS~EOLFRWUDUiRVHXROKDUVHGHQWRVXDH[SHULrQFLD particular de relação com o mundo e consequentemente sua forma de ler e escrever, de ver-se e sentir-se na obra exposta, e de inscrever-se também nela. Eis o grande apelo da contemporaneidade: acolher muito mais que negar. Romper com préconceitos acerca do que pode ou do que deve ser a dança numa perspectiva contemporânea, vislumbrando sobretudo possibilidades de encontro com os plurais olhares-anseios que GLYHUVLÀFDPSRUVXDYH]RVOXJDUHVDVHKDELWDU(PIRFRHVWmRDVTXHVW}HVGUDPDWXUJLDDVHU FRQVWUXtGDGHVFRQWUXtGDFRPTXHP"2QGH"&RPR"3DUDTXr" Gerson Moreno 40 9HUEHWHVDIHWLYRV9HUEHWHVDÁLWLYRVDUUHPHVVRVYHUEDLVPRYLGRVSHORHQFRQWURHP Flecheiras/Fleicheiras/Flexeiras/Fleixeiras em Junho de 2010. Dramaturgia: 3URS}HVHXPDGHÀQLomRSURYLVyULDGRWHUPRFRPR modo de inventar, acessar e ativar os planos de composição (ou de consistência) da obrapor-vir. Premissas: a)(QWHQGLPHQWRGHGUDPDWXUJLDFRPRSURFHVVR (QmRFRPRÀPQHPFRPR´OLQKDGHVHQWLGRµ TXHVHUHYHODUHWURVSHFWLYDPHQWHDRFKHJDUPRVQRÀQDOGHXPDSHoD  b)(QWHQGLPHQWRGDREUDFRPRIRUoDYRQWDGHDXW{QRPDeMXVWDPHQWHSRUFDXVDGHVXDDXWRQRPLD que a obra permanece nebulosa para si mesma -- até o momento em que agenciamentos autorais provoquem as primeiras e ainda vagas concretizações da obra. Ou seja, até o momento em que uma outra força-vontade (podemos chamá-la de “função-autor”) se resolva a acessá-la, a entrar em composição criativa com essa ainda nebulosa-obra. Esse acesso (que é também e já ativação) pode acontecer em ensaio, já com bailarinos ou atores, ou em delineamento ainda apenas conceitual. De qualquer modo, esses primeiros passos a caminho da obra-por-vir VmR DR PHVPR WHPSR LQYHQomR LGHQWLÀFDomR IDEULFDomR SURVSHFomR SURMHFomR LQYRFDomR DWLYDomR H DWXDOL]DomRGRV YiULRV HOHPHQWRVTXH LUmRÀQDOPHQWHFRPSRUD REUD  PDWHULDLV ULWPRVVRQVFRUSRVWHPDVFRQFHLWRVSDODYUDVFRUHVSDVVRVJHVWRVVLOrQFLRVJHQWHJHVWRV lugares… Essas primeiras tentativas, esses primeiros ensaios (tal como todos os outros que se seguem), são também e imediatamente e sempre um re-alinhamento da obra-por-vir; e, consequentemente, do próprio plano de composição/dramaturgia. Re-alinhamento levando a outras invenções, invocações e ajustes do e no plano de composição na medida em que a obra YDLVHQGRDWXDOL]DGD DWXDOL]DomR FRQFUHWL]DomRGRYLUWXDOUHGHÀQLomRGRYLUWXDOSRUYLDGR arremesso de concretos para o vago da invenção necessária). c)2SODQRGHFRPSRVLomRQmRpHVWiWLFRPDVHOiVWLFRHVHPRGLÀFDSHODVXDSUySULDDWLYDomR sem, no entanto, deixar nunca de ser imanente àquilo que quer vir-a-ser: a obra-por-vir. Cada 42 novo obrar e cada novo des-obrar do que já foi feito e do que está sendo feito e do que se quer que seja feito, são tantas re-concretizações do virtual da obra ou do seu por-vir ainda não atualizado. d) A obra se cumpre algures a meio caminho entre intenções autorais mais ou menos claras, PDLVRXPHQRVFRQVFLHQWHVHVHXSODQRSRUYLU,QWHQo}HVDXWRUDLVTXHWrPVHPSUHP~OWLSODV origens (“coreógrafo,” “bailarinos,” “colaboradores”) todas agenciando outras forças-vontades FULDGRUDVQRSODQRGHFRPSRVLomR(VVHSODQRpHQWmRSRSXODGRSRUGLVWULEXLo}HVKHWHURJrQHDV GLUHFLRQDGDV SHOR YHWRU GH FRQVLVWrQFLD FKDPDGR ´DXWRUµ RX FRUHyJUDIR H SHOR YHWRU GH FRQFUHWL]DomRGDQpEXODYLUWXDOFKDPDGRFRUSRULÀFDomR1HVVHFDPLQKDU TXHPWHPVHPSUH mais que um sentido) coisas interferem. As tais das pedras no meio do caminho: rabanada de vento, queda inadvertida, surgimento de algo inesperado que é perfeitamente adequado ao plano, que faz o plano se adequar a si mesmo: uma ideia ou gesto ou fala que não se sabe de onde veio, mas que, por vir, faz o plano (e a composição) acontecer. Agentes a-conscientes cocriadores do e no plano de composição. Por via da coisa que faz acontecer o acontecimento que DXPHQWDDSRWrQFLDGDREUDRSODQRGHFRPSRVLomRHQTXDQWRSODQRGHGUDPDWXUJLDVHUHYHOD como necessariamente aberto ao que já está ali, o ali da coisa que também invoca/produz a obra-por-vir. A coisa nomeia todos os inesperados despegados que se agregam ao que ainda está por-vir: âncoras do concreto. Repetindo: a coisa sempre interfere de modo a que o plano de composição permaneça sempre um plano aberto ao que já está ali, e não apenas ao que está por-vir. Ou seja: e) dramaturgia: plano dinâmico, criativo, rigoroso de invocação e de escuta da obra porvir e de suas forças desejantes de atualização; plano de composição aberto, inventado mas também invocado pelas múltiplas forças-vontades autorais que se agenciam no plano, bem como pelas forças agregantes/perturbantes/dispersantes da coisa, que sempre criam inesperadas singularidades, ou eventos, no plano. (A coisa, ou a sua capacidade de interferir, é o anti-plano fundamental que faz com que o plano seja eventualmente bem sucedido). Ou seja: 43 e) dramaturgia: zona espumante onde atuais e virtuais zig-zagueiam, plano povoado por feixes GHVLQJXODULGDGHVHQWUHODoDPHQWRPXOWLGLUHFLRQDOFRQVLVWHQWHFRPRVHOHPHQWRVKHWHURJrQHRV que tecem o plano de composição, e que se vai organizando de acordo com uma força inventiva TXH p VHPSUH H WDPEpP XPD DGHTXDomR DR PRGR H[SUHVVLYR GR JrQHUR TXH LQYRFDLQYHQWD DWXDOL]D D REUD SRU YLU JrQHUR  VLQJXODULGDGH RX ]RQD GH DIHWDomR FKDPDGD ´GDQoDµ RX “teatro”, ou “cinema”, ou “ópera” ou “performance,” etc). Dramaturgista: 3URS}HVHXPDGHÀQLomRSURYLVyULDGRWHUPRFRPR desdobramento da chamada “função-autor”; sujeito que colabora no acesso ao plano de composição; pessoa que pentelha o lugar do “sujeito que é suposto saber” dentro da “função-autor”. Qualidade ética principal do dramaturgista – trabalhar não para o autor, mas para a obra-por-vir. Qualidade corporal principal do dramaturgista: saber criar para si mesmo novos órgãos sensoriais que acessem as zonas de sentido e de sentir da obra-por-vir. Qualidade psicológica principal do dramaturgista: paciência. Precisão / Prontidão: 3URS}HVHXPDGHÀQLomRSURYLVyULDGRVWHUPRVFRPR mecanismos de rigor (de presença?) que nos fazem perder o sono. Ambos operam no inconsciente do dramaturgista como fantasmas. Presença: 3URS}HVHXPDGHÀQLomRSURYLVyULDGRWHUPRFRPR GXDV SRVVLELOLGDGHV SHOR PHQRV    SUHVHQoD FRPR FDWHJRULD ÀORVyÀFD 'HUULGD WRGD D KLVWyULDGDÀORVRÀDRFLGHQWDOpXPDPHWDItVLFDGDSUHVHQoDFRPRVDLUGHVVHPRGRGHSHQVDU como criar um pensamento longe da ideia e do império da presença?); ou 2) presença como PRGRGHDFHVVDUDHVSHFLÀFLGDGHGDFULDomRDUWtVWLFDQDV´DUWHVGRFRUSRµ RXDUWHVGHFR presença), como o teatro, a dança, a performance e mesmo naquelas artes que entendem objeto como corpo ou como presença. 44 Ou seja: Tratando apenas do ponto #2, é possível ainda uma outra divisão: presença entendida como: a)LPSHUDWLYRGHPRVWUDUGHGHPRQVWUDUGHHQIDWL]DUXPDWpFQLFDKHJHP{QLFDGHWXUELQDomR da soberania de um “eu actuante” sobre todo o plano de expressão da obra; a presença então como uma espécie de máscara que realçaria o virtuosismo carismático do actuante (dançarino, DFWRUHWF SUHVHQoDHQWmRFRPRPHFDQLVPRGHDÀUPDomRHGHGHPRQVWUDomRGHTXHRDFWXDQWH SRVVXL´DOJRPDLVµQRVHXVHU MXVWDPHQWH´SUHVHQoDµ GRTXHRV´PHURVPRUWDLVµ>9HULÀFDU o livro de Mark Franko sobre dança renascentista e a sua noção de “epideietic dance”: p. 33: ´D GDQoD WLQKD SRU ÀP QDGD PDLV GR TXH a exibição da pessoa de cada um.” (The Dancing Body in Renaissance Choreography; tradução minha). Comentário meu numa aula sobre o livro: “Desde o seu início, a dança é refém de uma certa falta modéstia, é prisioneira deste espetáculo da ‘pessoidade’”]. Ou então presença como: b) QRPH TXH LGHQWLÀFD D GLPHQVmR relacional de um projeto artístico, modo de existir ou de fazer arte que retira do objeto estético a “presentitude” (presentness) da arte modernista. Ou seja, presença como aquilo que invoca HDWLYDDGLPHQVmRGHGXUDomRGDH[SHULrQFLDDHQWUDGDQRÁX[RGDVPDWpULDVHFRUSRVHPFR H[LVWrQFLDUHODFLRQDO(VWUDQKDPHQWHDGHÀQLomRD HDGHÀQLomRE UHYHODPSRORVVHPkQWLFRV opostos para o mesmo termo: a) enfatiza o aspecto raro e transcendente da presença; b) sugere a presença como cotidiana, corriqueira, e daí justamente potente na destruição da ideia de obra de arte como algo que transcende o dia-a-dia dos meros mortais. O aspecto b) leva a noção de presença imediatamente ao campo de uma política da relação e de uma crítica ativa da ideia de representação. Ainda no ponto b), podemos pensar no ensaio de Michael Fried de 1968, “Art and Objecthood,” crítica fortíssima à escultura minimalista, a qual Fried sempre chamou (até hoje) de “arte OLWHUDOLVWDµ3HUDQWHD´SUHVHQoDµTXHHOHLGHQWLÀFDQDHVFXOWXUDPLQLPDOLVWDGH0RUULV-XGG H RXWURV )ULHG DÀUPD ´$$UWH VH GHJHQHUD TXDQGR VH DSUR[LPD GD FRQGLomR GR WHDWURµ 2 TXHVLJQLÀFDHVWHDEVXUGR"2XPHOKRURTXHGHYHPRVID]HUVHWRPDUPRVWDOIUDVHFRPRQmR absurda? Devemos entender a frase como um projeto estético-político para a presença. De acordo com Fried, quando um objeto artístico sai da “presentitude” (presentness) onde sempre esteve (a-temporal, a-histórica, e auto-reiterativa na sua eterna recusa de devir) e entra na SUHVHQoD VLQFU{QLFDWHPSRUDOKLVWyULFDDÀUPDWLYDGRHVWDGRSHUPDQHQWHGHSHUHQLGDGHHFR relação do objeto com o mundo) esse objeto deixa de ser o soberano impositivo daquilo que 45 seria o modo certo de sua fruição estética apropriada (ou seja, deixa de ser soberano sobre seu UHJLPHGHVLJQLÀFDomRHVREUHRUHJLPHGHSHUFHSomRFRQVLGHUDGRSUySULRDRVHXXVXIUXWR ´XPTXDGURVHYrFRPRVROKRVµ´XPDP~VLFDVHRXYHFRPRVRXYLGRVµ (QTXDQWRpresença (ao contrário de “presentitude”), o objeto passa a ser cúmplice do espaço, das matérias e das corporeidades-afetos do público que o circulam. Nessa cumplicidade, o objeto entra em fuga GHVLPHVPR(VVDFRGHSHQGrQFLDHQWUHREMHWRHVXMHLWRHQWUHREMHWRHPHLRHQWUHREMHFWRH tempo, essa quebra da soberania do objeto artístico em relação ao seu suposto domínio sobre RV VHXV PRGRV GH DSDULomR VLJQLÀFDomR H IUXLomR p MXVWDPHQWH D ´WHDWULFDOLGDGHµ TXH )ULHG condena. Para Fried, o objeto teatral, porque dependente das condições de cada local onde se apresenta, porque dependente das variações na qualidade de performance de um dia para o RXWURRXGHDWRUSDUDDWRUSRUTXHGHSHQGHQWHGHXPS~EOLFRFDWLYRVRIUHGHXPGpÀFLWJUDYHH ontológico de soberania estética. Teatro é apenas em relação, o seu sistema de presença depende GDLPSRQGHUiYHODomRGHRXWURVTXHDSHQDVSRUHVWDUHPDOLHPFRSUHVHQoDRUHFRQÀJXUDP DFDGDGLDDFDGDPRPHQWRPHVPR,URQLFDPHQWHRTXH)ULHGYrFRPRDSHUGDGHVREHUDQLDGR REMHWRpH[DWDPHQWHRTXHSHUPLWHUHDUWLFXODUDDUWHFRPRYHWRUOLEHUWDGRUGHVXEMHFWLÀFDomR *XDWWDUL HFRPRPRGRLQYHQWLYRGHDXPHQWRGHSRWrQFLDSDUDPRGRVGHH[LVWLUHGHUHODFLRQDU Fred Moten, em seu livro In the Break, aponta como Fried, na sua recusa de ver “presença” QRREMHWRGHDUWH RTXDGURDHVFXOWXUDPRGHUQLVWDV UHPHWHDREUDDXPVLOrQFLRLQWROHUiYHO igual àquele que Marx tinha visto como constitutivo da “commodity”. Mas Moten nos lembra como, na história do capitalismo, existiram sempre commodities falantes: escravos, coisasPiTXLQDVFXMRHVWDWXWROHJDORVUHPHWLDDRVLOrQFLRPDLVDEMHFWRPDVFXMDDUWHVHPSUHUHÁHWLX RPRGRFRPRVXDH[LVWrQFLDHQTXDQWRobjetoFULRXUHVLVWrQFLDVHSHUVLVWrQFLDVHYRFDOL]Do}HV extraordinariamente potentes -- expressas por via da criação de um entendimento de arte em que esta seria sempre uma arte da fuga, mesmo quando amarrada entre quatro paredes (fuga, entendida nunca como escapismo, mas como busca célere de uma arma para lutar e resistir e SHUVLVWLU QXPD H[LVWrQFLD DÀUPDWLYD FRPR TXHULD 'HOHX]H  6H )ULHG QmR VXSRUWD D LGHLD GH uma visualidade que vocifera, grita, sussurra ou canta, e ainda menos, a noção de objetos que dancem e que façam dançar (mesmo que aparentemente parados), Moten nos mostra que objetos DSDUHQWHPHQWHFRQGHQDGRVDRVLOrQFLRHjSDUDJHP FRLVDVHVFUDYRVTXDGURVHVFXOWXUDV WrP sempre voz e movimento. De fato vocalizam e se movem a todo o instante, e essa vocalização e inesperada atividade do objeto não são mais do que a execução de sua arte da fuga, fuga da FRLVDSDUDORQJHGHVXDREMHFWLÀFDomRRQWROyJLFDGDQoDVRQRUDGDSUHVHQoD André Lepecki 46 47 Anotações - hipertextos Assim começo. (minha frase-isca: DVHVSHFLÀFLGDGHVRFRUSR ) I Sobre dramaturgia (primeiro dos temas que discutimos – nas sessões coletivas), recolho pontos que resultam iluminadores de inquietudes minhas. A ideia de nomear e re-nomear é inevitável. Fico com certas palavras-chave: a ideia do ‘desaparecimento’ e do ‘trabalho sobre as ações’(Barba). E a ideia dos regimes de ‘visibilidade’, que me remetem diretamente ao trabalho político - que se tornou um ‘lugar-identidade’ da minha ‘Persona’ no mundo da dança brasileira desde minha volta ao Brasil - e com a qual travo uma relação de atração e repulsa. Num destes dias, em conversa com André L., comentando sobre as articulações entre diversos fazedores da dança, exponho minha hipótese sobre a Economia da Dança: a necessidade de EXVFDUPRVXPDHVWUDWpJLDSDUDTXDQWLÀFDURLQYHVWLPHQWRTXHRFROHWLYRGRVSURÀVVLRQDLVGD dança faz para que a dança exista. &RPR TXDQWLÀFDU R YDORU GH QRVVR WUDEDOKR UHFHEHQGR VHPSUH PHQRV GR TXH HVVH WUDEDOKR vale); de colocar ‘minha casa’ à disposição; ‘meu computador’; de todos os investimentos que são feitos por cada um para suprir a falta de recursos? Isso se contrapõe à ideia do ‘pires na mão’, ou seja, de que a dança vive de editais, apoio público, etc. Minha tese é que a dança vive principalmente da iniciativa privada dos próprios fazedores, apoiada também em eventuais e descontínuos recursos públicos e raríssimos patrocínios privados (outros), portanto, do empreendedorismo artístico voluntarioso e associado ao apoio estatal, se é que se pode colocar dessa maneira. Algo que só pode produzir o efeito que produz porque se baseia em associações HQWUHSURÀVVLRQDLVYHUGDGHLUDV¶MRLQWYHQWXUHV·QmRGHYLGDPHQWHPDSHDGDVDLQGD« André dá uma pista: isso é uma dramaturgia. 48 II Falando de Performance (Eleonora diz: “não abro mão de buscar uma dramaturgia na Performance”) Pergunta: como operacionalizar essas coisas no corpo? Fica aberto o campo para debruçar-se ativamente sobre estas possibilidades/demandas do objeto-coisa/obra. Penso em dois pontos de partida, anteriores: a memória do corpo; a transmissão pessoa a pessoa. E como ponto focal a SURSULRFHSomRFRPRXPVDEHUHVSHFtÀFRGRFRUSR Em outros dias falamos de campos morfológicos/campos energéticos (palavras minhas) como SDUWH GR WHFLGR FROHWLYR RX GH XPD DPELrQFLD TXH HVWDEHOHFH XP FDPSR IDYRUiYHO D FHUWDV condições, ainda que não seja o caso de uma abordagem linear (ou baseada apenas na razão). Portanto, uma abordagem possível da construção de uma dramaturgia pode ser o olhar para HVVDDPELrQFLD LQFOXVLYHRHVWDEHOHFLPHQWRFRQVFLHQWHGHGHWHUPLQDGRVHOHPHQWRVSDUDXPD DPELrQFLD [ RX \  XPD FRPSRVLomR GHVWH FDPSR OHYDQGRVH HP FRQWD TXH VHPSUH KDYHUi fatores determinantes e fatores indeterminantes; escolhas conscientes e inconscientes; e outras escolhas que não pertencem aos sujeitos, mas que se colocam a partir daquilo que André Lepecki chamou de ‘A Coisa’ e, em relação a este tópico, de ‘empuxo’, como possibilidades de ativar o '(9,59ROWRjLGHLDDPELomRGDV5HVLGrQFLDVQmRVyFRPRLQFXEDGRUDVPDVWDPEpPFRPR HOHPHQWRVGHXPDFRPSRVLomRDSDUWLUGDFULDomRGHGHWHUPLQDGDVDPELrQFLDV«5HVLGrQFLDV [resíduos], de que sexo sois…? Andréa Bardawil – Será que temos condições de escolher algo que não seja o que nos atravessa? (afetos) Pergunta: Como evocar (e escutar) esses ‘acasos’ e ‘invisíveis’? (penso em Cage, Cunningham e em mim mesmo, que utilizo a escuta, o ‘emergente’ e o aleatório para compor). III O Jogo do Oráculo. Metáforas. Uma lata existe para conter algo, mas quando o poeta diz: lata Pode estar querendo dizer o incontível. Uma meta existe para ser um alvo, mas quando o poeta diz: meta. Pode estar querendo dizer o inatingível … (Gilberto Gil) Falamos de iscas, falamos de pescar, terminei com a resposta: peixe. Muito peixe! Marcos Moraes 49 Algumas notas-sensação sobre presença, presentação e operacionalização… «GHVHMDQGRXPÀFDUFRQYHUVD« …desejando adiar por tempo indeterminado a palavra assertiva… 9HQKRSHQVDQGRH[SHULPHQWDQGRÀFDQGRDWHQWDDXPDSUHVHQoDTXHVHGHVGREUDHP3UHFLVmR e Prontidão, ou Delicadeza e Abertura Inquieta (prontidão só uma outra voltagem da precisão, em que ela é antes um grande precisar do outro, um saber-se esburacado, buraco-desejo-derelação, ânsia desnudada de ansiedade). Presença não como reduzir-se a um agora limpo, inteiriço, só presente. Presença como um antecipar-se e um atrasar-se, fazendo um apresentar-se. Nisso fazer também uma entrada singular, memória em uso. Presença como singularidade, ato de acúmulo-descarte. Ou: clareza do(s) (tantos) outro(s) que faz(em) um ‘mim’. Resíduos com os quais fazer novas condições para o relacionar, a cada vez. Presença então, não como hiper-presença; não como radiância ou sublinhar dos contornos do eu, mas talvez como diligente, minucioso e ininterrupto negociar. Algo como um Duvidar-se. Presença como percorrer (in)quieto de um continuum precisão-prontidão (nunca estando só num deles, mas ora numa ora noutra das gradações de mistura de ambos, emergindo em relação. Por um lado, deter-se, demorar-se, esparramar-se (isso a dimensão da precisão); por outro lado, DQWHFLSDUVHXPVDOWDUQRTXHDLQGDQmRVHVDEHXPDGLVSRQLELOLGDGHÁH[tYHOSDUDXPD invenção que é tão somente um justo encaixe (isso a dimensão da prontidão). Nisso tudo, então, lava-se a presença do que ela carrega de representação, insinua-se presença como instrumento de presentação. E me ocorre então que trabalhar pela presentação é de imediato trabalhar pela relação. Trabalhar por um mundo que não seja mais repartido entre sujeitos e objetos. Em se revele a dimensão sempre coletiva da criação. Tão diferente da LQVWDXUDomRJHQHUDOL]DGDGR6DTXHDR2XWURTXHpRUHJLPHKHJHP{QLFRGRPXOWLFXOWXUDOLVPR asséptico em que vivemos hoje, que “inclui” sob a condição de etiquetar, e no qual proliferam mais Autores, talvez, do que nunca. Trabalhar por um mundo em que Saque e Dádiva se HTXLSDUHPVH´MXVWLÀTXHPµHTXHVHWUDWHMXVWDPHQWHGLVVRR´SUHVHQWDUVHµ3RLVVHQmRKiR perigo de que ele também escoe pelo funil asseptizante da “inclusão”, converta-se em estilo ou FOLFKrSHUSHWXHR6DTXHDR2XWUR&RQYHUWDVHHPLPDJHPVHPUDVWURFRQYLWHSDUDTXHHVVH 50 Outro possa emancipar-se, de fato, de uma condição de Objeto. Interessa, então, não gastar assim tanta energia apenas com palavras, não entender esse esforço SDODYUHDGRSRUHVIRUoRGHGHÀQLU3RUTXHVHPSUHVHÁHUWDDRXViODVFRPRSHULJRGHWUDEDOKDU mesmo que seja sem saber, para apenas cristalizar um “Certo”. Daí uma vontade de investigar como se pode operacionalizar o “presentar-se”. 7DOYH]DtXPDGUDPDWXUJLD8PDGUDPDWXUJLDFRPRDLQYHVWLJDomRLQFDQViYHOGDSHUPDQrQFLD estado de pedra-elástico, que vá fazendo da presentação um trabalho de adensamento do Intervalo, ou da relação. Uma dramaturgia que seja sobre a operacionalização do intervalo como plano de tessitura, composição, invenção, acontecimento, encontra, como primeira tarefa RXGHVDÀRXPDVpULHGH´GHVSLVWDUHVµ  GHVSLVWDU R FOLFKr )RUPD VHP )RUoD R FOLFKr p &DUFDoD p SUHFLVR GHVFREULU D FDGD YH] QDV)RUoDVXPDHPHUJrQFLDGH)RUPDTXHQmRHVWDQTXHDSURSDJDomRGDV)RUoDVPDVTXH permita apresentar ao Outro uma conversa, que permita seu ingresso e sua fazeção também, que DVVHJXUHVXDGHVREMHWLÀFDomRTXHOLEHUHVXDDJrQFLD  - despistar o ego/identidade (forma anti-relacional, ralo relativista, a identidade encerra o assunto, ou seja, a relação) - despistar o tempo-trator (o impulso, a fome de novo, de mudança-esbanjamento, gratuita) 51 7DOYH]HQFRQWUDUXPPRGRGHH[HFXWDUHVVDWDUHIDMiVHMDRVXÀFLHQWH&RORFDUHPPDUFKDR DFRQWHFLPHQWR$SDUWLUGDtRGHVDÀRVHUiRGHVXSRUWDUÀFDUQRPHLRRXQR,QRPLQDGR Para executar a primeira tarefa, ou operacionalizar o intervalo, vejo como que duas estratégias que colocam pensar e fazer no mesmo plano de simultaneidade: revelam a dramaturgia como PENSAÇÃO. No momento, elas se materializam para mim na observação do funcionamento de dois criadores PDVVmRPRGXODo}HVGHIUHTXrQFLDQmRPDUFDVLQGLYLGXDLVRXHVWLORV  - a de Bacon, segundo Deleuze: introdução do acidente, do acaso, do traço-rompante. Para a SDUWLUGHOHWHUXPDFKDQFHFRQWUDRFOLFKr8P$55(0(662TXHSHUPLWHDEULUXPDEUHFKDGH escape. Um Fazer (-se) (de) Elástico. - a de João Fiadeiro: introdução da espera, da CONTENÇÃO, para aplacar os arremessos do FOLFKrLPSXOVRHLQWURGX]LUXPDVHQVLELOLGDGHGHHVFXWDDRDFLGHQWHTXHpWDPEpPR2XWUR8P Fazer(-se) (de) Pedra. Mas logo reparo que as duas são gradações de um mesmo funcionamento, o do Acaso Manipulado. E ambas comportam uma Pensa-ação ocupada com o compromisso de fazer algo DSHQDVVXÀFLHQWHFRPDPDWpULDGRDFLGHQWH2FXSDGDFRPDTXHVWmRRTXHVHID]FRPLVVR"QR VHQWLGRGHMXQWRQmRGHDSDUWLUGH2TXHVHID]FRPHVVDEUHFKDDEHUWDQRFOLFKr"SDUDPDQWHU DSRUWDDEHUWDHSDUDID]rODSUROLIHUDUHP2EUD)LJXUDQmRÀJXUDWLYD3DUDID]rODSUROLIHUDU em relação ética com o Outro. As duas envolvem também uma estratégia de “apartamento” (no sentido de apartar-se), de “deserção”: de fazer-se ilha desertada. Sonhar ilhas: divisar a singularidade de que se dispõe para entrar em relação. Escolher o que levar para a relação: as GiGLYDV &DPXÁDU VXÀFLHQWHPHQWHR HX GHVSLVWDUVH SDUD FODUHDU DV SHUIXUDo}HV GH 2XWUHP E os encaixes não usurpadores. Há qualquer coisa de: “responsabilizar-se”. Entender, a todo instante, a delicadeza do que se tem em mãos. 52 Para então misturar-se no acaso e manipulá-lo, é preciso antes gastar um tempo produzindo clareza sobre o que se dispõe para ofertar à mistura, e o que convém à mistura (não a mim) para entrar em relação com ela. Desertarme (como n’A Ilha Deserta,de Deleuze). Ou: Juntar-me. Como quem foge ou se perdeu: se separou para se recriar. A ilha é “ovo”, lembra Deleuze, é fazer para si uma “segunda origem”. E o ovo também é o próprio intervalo: ponto em que não se está nem subindo nem descendo, mas subindo E descendo). 3RWrQFLD(PTXHDSUHFLVmRHDSURQWLGmRHVWmRGREUDGDVXPDVREUHDRXWUDSHGUHODVWLFDGDV2 ovo é então simultaneamente saque e dádiva, acúmulo e descarte. Dramaturgia aí seria esticar em linha o ponto-ovo: percorrer não sequencial, mas gradual, passando por gradações, temperaturas. Isso então o presentar-se. Propagação empática e não ordenação intelígel. Invenção-imitação como em Tarde, Forma sem deixar de ser Força. Sem objeto nem sujeito. 'UDPDWXUJLD(VWLOLQJXH 3RLV SHGUHODVWLFDU UHSDUR ID] RX VROLFLWD XP 7HUFHLUR ÀQFDGRU GH situação, o corpo-base em Y do estilingue é o próprio operador da relação, refaz a pedra em pedra e o elástico em elástico, somente sob a condição de deslocá-los, cada qual, de seus “devidos lugares”, permitindo um Lançar ou Acontecimento (a Obra?): Sentido-Direção que se propaga, ÀQDOLGDGHVHPÀP Fernanda Eugênio 53 54 ACEFALIA [dança não fala, dança não pensa] Um nó górdio para a dança: uma mudez, um não pensar. Uma mudez, uma não-fala: uma infância. Uma infância que atravessa a história, TXHFRUUHHYLEUDHQÀPTXHFDQVDRWHPSRSRUTXHVHDSURSULDGRHVSDoRSHUIXUDQGRR8PQmR pensar que seria um modo de pensar a dança. Um golpe sem logos de corpos vibráteis e sensitivos. Protege-los do pensamento? Até que ponto a proteção permanece? Proteger é fragilizar. Essa fragilidade, por sua vez, é uma abertura à vulnerabilidade. Corpos vulneráveis aos acidentes da forma. Proteger não seria abrir e inscrever uma dramaturgia do acidente no corpo do outro? Fazer dramas: prever e predizer a queda. Dança não fala, dança não pensa [uma abertura para a queda]. O quebrar, o espatifar, o espalhar um corpo em outros corpos menores, fragmentos de distintos tamanhos. Proteger, portanto, talvez seja uma operação de fragmentar. Um modo de dramatizar o futuro pelos cuidados. O corpo quebrável torna exuberante sua própria escassez. É em uma estranha simetria que uma dramaturgia da proteção se une a uma dramaturgia da pobreza: somos precavidos porque somos precários. Livrar-se da proteção, abrir o corpo para os acidentes da matéria, para uma determinação entrecruzada de acasos porque no modo de mover-se sem logos reside uma morfologia e multiplicidade [fragmentos, cacos, corpúsculos, movimentos próprios e distintos]. Multiplicidade essa que possui um ethos frágil: uma economia que pode atravessar outras a partir da sua própria. De uma dança sem logos que atravessa o poema, o cinema, a performance, as artes visuais enquanto dança. E atravessa muda e acéfala. Sem entrar no jogo do sim ou não às perguntas de outras economias surpreendidas: mas o que fazes aqui? É torvelinho, é furacão: é furação. Nesse corpo capital desprotegido, desse Capital em queda, surge a imagem do seu corpo fragmentado em corpos menores, estruturas mínimas monetárias: moedas. A moeda em termos escriturais nos forneceria corpúsculos condutores para “curto-circuitos estéticos-políticos” quando se põe as letras para dançar: a moeda tornaVH SRHPD $OWHUDQGR ² FRUHRJUDIDQGR RX DUPDQGR FRPSRVLo}HV ² D SDODYUD UHFRQÀJXUDVH criticamente. Dança não fala, dança não pensa: dança não é útil. E se não é útil, não serve. Estaria aí sua soberania acéfala. Seu princípio de poema – descartando a metáfora e encarnando RJHVWR²VHXSULQFLSLRGHPRHGD0RHGDVHPHItJLHPRHGDVHPFDEHoDIDOVLÀFDGDHFtQLFD [Diógenes de Sínope], que se prolongaria em um cheque de Duchamp, em uma cédula de Cildo Meireles ou na segunda moeda, de Arturo Carrera. Atravessando e alterando economias fazendo DVXDSUySULD6HULDQRVHX´QmRIDODUµ´QmRSHQVDUµTXHUHVLGLULDVXDLQLFLDomRÀORVyÀFD8P nó complicado a ser desfeito no mais simples gesto de corte, num não mudo, todo corpo. Eduardo Jorge 55 Arqueologia de ideias, anotações mínimas e disparos. Ou propostas para exercícios. *sugestão de leitura/ação: pode-se ler o texto de uma vez só, pode-se, a cada sublinhado, ler o exercício correspondente, pode-se ir direto aos exercícios, pode-se experimentar os exercícios HHVFUHYHUHPUHWRUQRSRGHVHH[SHULPHQWDUGHRXWUDVPDQHLUDV Insistir em pontos e derivar ao redor deles. Começou assim, no interesse insistente em discutir Dança e Dramaturgia e seus entornos. )DODPRVGHDVSHFWRVKLVWyULFRVGRGUDPDWXUJLVWDFRPRDÀJXUDGRVXSRVWRVDEHUHVXDKHUDQoD européia. Discutimos DGUDPDWXUJLDQHFHVViULDHHVSHFtÀFDGHFDGDREUD, que só se constrói no ato mesmo de erguer a obra. Aproximamos a construção dramatúrgica de uma peça com a construção das relações estéticas, IRUPDLVVRFLDLVHVSDFLDLVHFRQ{PLFDVHSROtWLFDVTXHHVVDSHoDSURS}H Daí fomos esgarçando o tema e encostando no que apareceu ao lado dessa discussão: modos de se produzir sentido, construções discursivas e construções corporais, a produção de espetacularidade, sistemas de visibilidade, outros modos de produzir e de estar junto, ser subúrbio e ser centro de algo, políticas culturais, políticas públicas, instâncias de legitimação do que pode ser dança e a um pedido quase oração: que eu tenha olhos e ouvidos para perceber outras possibilidades de produzir, compartilhar, convidar e engendrar maneiras para que as invenções possam continuar se experimentando. 57 Essas questões são grandes e foram abordadas no Tecido Afetivo em 2 meses de trocas de emails e 6 dias de LQWHQVDFRQYLYrQFLD, sem a menor pretensão de “elucidá-las” como questões, mas girando mesmo sobre elas, esgarçando-as, boiando e marcando paragens importantes, certas bóias. E é esse o texto-exercício que proponho através dessa folha: Insistir em pontos e derivar ao redor deles. Começando por aqui, dentro do assunto que cada XPGHVHMHWUDEDOKDUFRQWLQXDUUHVLVWLUFDUUHJDUH[WUDLUUHSHWLUÀQFDURSpQRDVVXQWRHPTXH se começou a explorar, quer seja uma frase de movimento, uma palavra, uma imagem, um texto, uma sensação, um objeto. Teimar neste começo e rodeá-lo à procura de outros aspectos. Investigar DGUDPDWXUJLDQHFHVViULDHHVSHFtÀFDGHFDGDREUD, considerando dramaturgia como DIRUoDGDVHVFROKDVIHLWDVQHVWHWUDEDOKR4XHHVFROKDVYRFrHVWiID]HQGRQHVWHWUDEDOKR"( TXDQWRDVTXHYRFrQmRWHPFRQVFLrQFLDGHHVWDUID]HQGRPDVTXHHVWmROiWDPEpP" Atentar para DVUHODo}HVHVWpWLFDVIRUPDLVVRFLDLVHVSDFLDLVHFRQ{PLFDVHSROtWLFDVTXHHVVH trabalho propõe. Talvez fosse interessante colocar esta frase como uma interrogação, então ÀFDULDTXHUHODo}HVHVWpWLFDVIRUPDLVVRFLDLVHVSDFLDLVHFRQ{PLFDVHSROtWLFDVHVVHWUDEDOKR propõe? Procurar responder e desenvolver a questão. Utilizar para isso os materiais que achar necessários, encostando no que apareceu ao lado dessa discussão, boiando e marcando paragens importantes, certas bóiasSDUDYRFr Pensar que existem todas as escolhas que não fazemos, mas que recebemos ao fazer outras, e isso poderia talvez ser visualizado como o movimento das espumas brotando de uma panela em HEXOLomRXPPLVWRGHFDXVDFRQVHTXrQFLDHFDRVDOJRGDRUGHPGREULQFDQWHGRHVTXLYRGR jogador. Lidar com esse movimento espumoso no registro da experimentação, entre doses de SUXGrQFLDHGHQHJRFLDomR Desenvolver como quem explora um terreno baldio. E, uma vez nesse terreno baldio, avistar e navegar entre construções discursivas e construções corporais DOpP GH RXWUDV  UHÁHWLQGR sobre modos de se produzir sentido, sem ignorar que eles não são necessariamente ligados a GLVFXUVLYLGDGHHLQWHOLJLELOLGDGHSURFXUDQGRSRUWDQWRROKDUSDUDRODGRDRLQYpVGDWHQGrQFLD frontal. 58 Talvez isso seja uma boa ferramenta. Como também pensar que existem pistas quase sutis, transformações mínimas e também disparos impressentidos, desvios de caminho e longos VLOrQFLRVHpFODURDVFRORUDo}HVHQWUHHVWHVWHUPRV(DTXLjprodução de espetacularidade, eu relaciono a construção da presença do performer, ator, bailarino. Contudo “presença” pode ser palavra mesmo esmagadora e brilhante demais, que arrasta pra si uma ideia de prontidão e precisão. Nesse ponto Eleonora interrompeu e insistiu em jogar a ideia de “qualidades de SUHVHQoDµFRQVWUXo}HVGHFRUSRVSHUIRUPiWLFRVDSDUWLUGDÀVLFDOLGDGHTXHFDGDWUDEDOKRSURS}H GHULYDQGRDSDUWLUGDtXPFRUSRHVSHFtÀFRSUySULRGDTXHODFRQVWUXomR4XHWDODFRQVWUXomR não começar com uma marreta, mas com uma lixinha? E foi aí que a conversa explodiu. Para testar esta hipótese eu dancei. )RL QHFHVViULRXPVLOrQFLRHFDGDXPIRLSDUDRVHXFDQWR­QRLWHR*HUVRQ0RUHQRIDORX da construção da dança dele com os operários com os quais ele insiste e sobre a necessidade de outros modos de produzir e estar junto. Falei da coleção do Boaventura de Souza Santos, “Reinventar a Emancipação Social: para novos manifestos”, minha atual obsessão literária, e colocamos mais voltagem na questão ser subúrbio e ser centro de algo&RPRRTXHDÀUPDPRV QmRVHUQHFHVVDULDPHQWHH[FOXGHQWHGRTXHQmRHVWDPRVDÀUPDQGR"$RQGHDOLDULQVWLWXLomRH experimentação em doses de reciprocidade e complementaridade? Que negociações estabeleço entre mim e as instâncias de legitimação? Eu próprio funcionando como instância de legitimação? 6RETXHFLUFXQVWkQFLDVH[LVWHLQWHUHVVHSHVVRDOHPFULDUXPÁX[RGLDOyJLFRFRPDVSROtWLFDV públicas a nível municipal, estadual e federal? O quanto eu corro de discursos políticos? O quanto eu me aproximo e sob que circunstâncias? Onde o sistema das políticas públicas no qual estou inserido condiciona minha produção estética? Espaços complementares: a sala de aula, o espaço de criação, o festival. Ou a conversa, o debate entre dezenas e o livro. Ou, aqui, as trocas de emails, a LQWHQVDFRQYLYrQFLD e a conversa depois do café da manhã. Possibilidades diferentes de acolhimento e expansão. Olhei pro computador do Enrico e tinha um adesivo colado: ATENÇÃO, PERCEPÇÃO REQUER ENVOLVIMENTO. É um trabalho do artista catalão Antoni Muntadas. 59 E, aqui, como estratégias de envolvimento, tivemos que iniciar uma conversa com quem não se LPDJLQDFRUUHVSRQGrQFLDHVWpWLFDYHUYtGHRVMXQWRVHLQLFLDUDSURVDDSDUWLUGRTXHRVYLGHRV VXVFLWDUDP&KHJDUSDUDDOJXpPHGL]HUJRVWDULDGHFRQKHFHUVHXWUDEDOKRYRFrPHPRVWUD" E retribuir mostrando o seu, da maneira que estiver. Iniciar um encontro entre o grupo todo com uma rodada de poucas palavras sobre o que cada um pensa (de primeira) sobre o tema. Inaugurar um dia de trabalhos a partir dos livros que cada um está interessado agora, olhar esse mar de livros e derivar a prosa daí. Insistir nas mesmas questões no dia seguinte, girando mesmo sobre elas, “turbinando” o assunto, como Eleonora apontou. Experimentar tudo isso num exercício constante de provocar empuxos, pensar fora de foco, ÀVLFDOL]DUTXHVW}HV0HLQWHUHVVDHVVHYtUXVHVVHYHQHQRHVVDLQWULJD E é esse o texto-exercício que proponho através dessa folha. E esse texto-exercício só foi possível porque lá estiveram Andréa, Alexandre, Eduardo, Daniel, Aspásia, Marcio, Micheline, Marcos, Paulo, Marcelo, Andréa, Eleonora, Eliana, Flavia, Gustavo, )iWLPD(QULFR)UHG$QWRQLR)HUQDQGD*HUVRQ$QGUp$QJHOD*UDoD+HEHU3RVVLG{QLR Silvia, Pablo, Sâmia, Sandra, Thereza, porque estiveram antes Felipe, Denise, Airton, Rosa e Thais, porque passou um enterro no último dia, porque faltou luz, porque o mar estava quente e WLQKDPXLWRYHQWRSRUTXHDLQWHUQHWHVWDYDHVFDVVDSRUTXHR)UHGPRVWURXRÀOPHGHOHSRUTXH seremos sempre diferentes e isso é jóia, porque alguém perguntou “como continuar?” e porque teve outro que respondeu: “Quais são as estratégias para se maquinar experimentações?” Micheline Torres 60 De uma perspectiva fragmentada De caneta na mão e em coletivo. Não mais solitária e em digitalizações. A provocação no diário de bordo, esvaziar o gesto de cada dia. Penso em esvaziar também o pensamento, a fala. Para mais uma vez encher. Encher de dramaturgia, de gesto e movimento, de conexões, teias, corporeidades diversas, imagens, perguntas e mais perguntas. Mudar percursos internos. Tentar organizar o pensamento. Confuso. Decido trabalhar, pensar por notas, por tópicos. Uma redução necessária para a incapacidade do momento em desenvolver um texto. Alguns abraços. Ricos. Dramaturgia 2TXHÀFRXGHGUDPDWXUJLD'UDPDWXUJpTXHPFRQWDKLVWyULDVSDUDRFULDGRU sussurra ao ouvido do criador. 6XVVXUUDUpGHOLFDGH]DVXWLOH]DH[SHULrQFLDGHHVFXWD Cada peça chama um jeito de fazer, já que é relacional. O conjunto de relações é que leva a obra adiante. Presença A relação entre presença e circulação. Só circula o que é perceptível em algum nível da comunicação, entre diversas qualidades de presença. Na relação com a obra, quanto menos presença, mais a obra. Estado de presença, condição de presença, qualidade de presença. Singularidades de presença. Singularidade O que me singulariza são as memórias, outra corporeidade no tempo e no espaço. ([SHULrQFLDV 61 Corporeidade (YLGrQFLDVGHSUHVHQoDHGLIHUHQWHVGLQkPLFDV$IHWRV&RQWUDGLo}HV &RQÁLWRVQDPDUFDGDSHOHGDH[SHULrQFLDHGRJHVWR2PXQGRGHVPRURQDH o corpo resiste, duramente. 7HFLGDVIDODVGHDÀQLGDGHVHOHPEUDQoDVÁHFKDGDVQDSHOH Um corpo em experimentação atrai. Corporeidade sofre a dinâmica da experimentação, vive em regime de temporalidade e de espacialidade. Performance É da ordem do brincante. Dança também! Lidar com o enigma. Lidar com o desejo de fazer. /LGDUFRPRVLOrQFLRpWDPEpPOLGDUFRPRWHPSR 3DUDGR[RVLQFRHUrQFLDV Formalizações Corpo pombo correio. Formalizar ou não, eis a questão. Sim, e depois recuperar as forças constituintes da forma, podendo então encontrar outras formas, formalizações... Pode ser. Ou transformar as condições em visibilidade, tornar visível a manobra, o desejo de fazer. A manobra visível. A manobra visível. A manobra visível. Devir Ativar o devir. Ele vem. Ao fazer, há um chamamento. &RPSRQGRYDLVHPRGLÀFDQGRRSDVVDGRFULDQGRRIXWXUR 5HFXUVRVGHFRPSRVLomRGHFRQÀJXUDomR Improvisação, formação, função motora, a relação com o ritmo, com o espaço, com o outro, tecidos conjuntivos, tecidos afetivos... Vou no primeiro impulso, arrisco? Arremessar ou segurar, restringir. Tudo a serviço de encontrar outros circuitos, desenhar outras vias cerebrais, outras respostas e mais perguntas. Temperaturas, modulações e texturas. E as tantas conexões decorrentes. 62 O corpo acústico me instiga. (DVFHQDVTXHQmRWrPIXWXURHPVXVSHQVmRWDPEpP Ações que escrevem no corpo uma imagem. Temperaturas, modulações e texturas. E as tantas conexões decorrentes. Preparação, treinamento, metodologia... Como penso tecnicamente, que tipo de treinamento eu preciso para trazer o que a peça necessita? Não dá para privilegiar uma técnica. É através do tecido afetivo entre os criadores, da situação criada e de como lidamos com isso segundo o que nos toca, sensibiliza e segundo os desejos emergentes do tecido. Na música, contra a música, sem a música. &RPVRPGDYR]HPVLOrQFLR Contatos em si, no outro. Objetos? Fantasmas 0DWpULDIDQWDVPDJyULFD ÀQDOTXHQmRDFDERX $VLPDJHQVTXHÀFDPDSyVDSHoDVmRDVGDPHPyULDH[SHULrQFLDGR H[SHFWDGRU$RYHUHPHUJHHH[LJHHPHUJrQFLDXPDVROLFLWDomRDJXGDTXH FREUDXPUHWRUQRXPÀFDUHPTXHREVHUYD²QmRDFDERX² Que impacto é esse? 1mRpHIrPHURSRUTXHUHVXOWDHPFLUFXODomRDJHQWHFDUUHJD Ao compor a imagem/cena, não ignorar o invisível. Estarei vendo o invisível? Deixo a ver, o invisível? Filme Atualizando uma obra primeira, como se comunica e se torna outra obra. O que chega para o outro é incontrolável. Sem delírio não rola! Aos tecedores e ao tecido, reverberando afetos Eliana Lyra Madeira 63 Escrita 1 – Suspensa na rede Suspensa na rede. Eu escrevo daqui. Do descanso de centímetros acima da areia vivo abalos e embalos sísmicos provocados pela fala - pelo de lá - dos outros entrando em mim – o de cá. De lá pra cá ... de cá pra lá ... de lá pra cá ... balanço chacoalhante incitando giros no pensamento, PHUJXOKRVQRFRUSRHPHUJrQFLDGHHVFULWD Para estar viva e pulsante escuto esse movimento de ida e de vinda, entre Alexandres, Michelines, Fernandas, Enricos, Possis, Isabéis, Daniéis, Aspásias, Therezas, Silvias, Marcios, Eleonoras, Pablos, Andreas, Andrés, Paulos, Fátimas, Fredes, Eduardos, Gustavos, Antonios, Valentinas, Samias, Gersons, Sandras, Heberes, Elianas, Marcos e Angelas por hora deixando algo se fazer em mim. (VWDH[SHULrQFLDpXPFLUFXLWRDEHUWRGHHVWDUVHQVtYHODUHVSRQGHUXPDTXDOLGDGHLQWHUHVVDQWH da presença.) Estou suspensa e em suspensão, em ebulição. Mas não etérea. Curiosamente mais densa e espessa, como uma gelatina, que conjuga mobilidade e densidade. Aparada pelo ar e acolhida SHORVRXWURV7HQWRH[WUDSRODUPLQKD PLQKD" H[SHULrQFLDSUDHVVHJUXSRPXOWLFpIDORHSHUFHER DUHODomRFRPRPHLR7HQWRDGHQViODXPFRPSURPLVVRGHVWDH[SHULrQFLDXVDQGRRVLPFRPR palavra-caminho, como bem disse Eleo. (VWiYDPRVUHXQLGRVQDWDEDQROXJDURQGHVHFRQVWUXtDPÁHFKDV'RDJRUDSDUDWUiVGHDQWHVH do imediatamente vivido as falas se costuram e se contrapõem dando textura ao espaço, dando a ver os furacões que somos nós em relação ao abismo que é o outro. 64 'RFDGHUQRSURYDGRUHDOVDFRXPDÁHFKDGHXPDGDV(OHRQRUDVRLPSRUWDQWHVmRDVWiWLFDV para maquinar a experimentação, para fazer emergir corpos em buscação, brincantes. Que metodologias (=maneiras de seguir experimentando) eu crio? E ainda, como transformar H[SHULPHQWDomRHPHYLGrQFLDHVWpWLFD IRUPDOL]DomR "2QGHVHDSRVWD"(PTXDOFRQWH[WR" Me interessa, particularmente, agir na relação sujeito/objeto na produção em arte, trazer à tona VHXVFRQÁLWRVHVXDLQVWDELOLGDGHFXWXFDUWHQGrQFLDVjVSRODUL]Do}HVSHUJXQWDUFRPRSUDTXH HSUDTXHPVXMHLWR RXREMHWR DFKDURXWUDVGLVWkQFLDVHQWUHRVWHUPRV$OJXPDVRXWUDVÁHFKDV ODQoDGDVQDVFRQYHUVDVREMHWLWXGHFRLVDRXWURPXQGR2XWUDÁHFKD GHVVDYH]FXUYDHHPIRUPD de espiral associando eu-outro): penso em corporeidade como chave de entrada - corporeidade como ato de dar corpo, ou ainda como metodologia de experimentação, luxuriosamente paradoxal e ambidestra. Ainda e mais uma vez o desejo de tornar palpável uma relação entrevista, imprevista, imaginada. Aqui penso corporeidade não como ato necessariamente instalado no corpo, mas antes na relação (o que não exclui a possibilidade da relação ser estritamente corporal). De lá pra cá e de cá pra lá, sacudida nesse movimento, sigo boiando silenciosamente. 65 Escrita 2 – Distante da rede Copio e colo do meu caderno as anotações do dia 11 de junho: Encontro no redário. Andrea fala sobre os diários e a vasculhação neles para desenvolver alguns temas ou tópicos. A manhã é dedicada a uma “sala de escritas”. Esta manhã. Trocamos as DQRWDo}HVGHQRLWH2HQFRQWURpQDKRUDGRS{UGRVRO Passei esses dias sem essa escrita alinhada e estabilizadora do computador. Agora volto a ele SUD WHQWDU FRPSRU OLQKDV GHVVD HVFULWD GLVSHUVD H VDOSLFDGD FRP UHVtGXRV H LQVLVWrQFLDV GDV falas de todos e de como esses resíduos se fazem em mim. Busco interceptar algumas questões. 66 Alguns dias depois do dia 11 de junho: Olho de novo meu caderno que mudou de função: agora, em vez de escrever, edito o que está escrito, reelaboro, converso com ele. Neste movimento, penso no objeto (caderno) como o outro, como uma possibilidade de alteridade e alteração. (PXPDGDVFRQYHUVDVDRS{UGRVROIDOiYDPRVVREUHHVFROKDV,VVRPHYROWRXKRMHDRDFRUGDU O quanto deliberadamente escolhemos, Silvia pergunta. Ouço um burburinho entre nós de que FHUWDPHQWH H[LVWHP FRLVDV TXH QmR HVFROKHPRV GLUHWDPHQWH 3ULPHLUR ÁDVK GH HODERUDomR escolhemos e recebemos a escolha, simultaneamente. Onde escolho e onde reajo ao mundo (ao outro, ao objeto, à coisa, etc)? Talvez sejamos exatamente este ponto de cruzamento, esse quiasma de fazer algo e de algo se fazer em nós. Thereza joga na roda de conversa que a escolha chama o devir, inventa e convoca um futuro. Bonita possibilidade ... (to be continued, num outro momento) Para além de um ato voluntário, escolher parece envolver reciprocidade no ato, invenção e também escuta. Muitas estratégias de criação podem ser desenvolvidas a partir daí. Imagem-ação: espumar (acho que deve tocar em Sloterdijk, mas isso é pra depois). 67 Escrita 3 – Para fazer objetos, outros e coisas 3URFXUHGDVXDH[SHULrQFLDSDODYUDVIDODGDV9 que te tenham aberto caminhos. Encha seu corpo delas. Atente para que existam buracos ou palavras incompletas. Pelos buracos, puxe outras palavras abrindo margens, abas ou frestas. Descarte as palavras iniciais conforme a necessidade de circulação. Faça uma pausa e escute. Recolha o que estiver à mão. Diga sim ao imprevisível, mesmo o aparentemente sem relação direta. Observe se o corpo absorveu a palavra. 'HL[HDPLVWXUDDEHUWDSDUDHYLWDUVLPSOLÀFDo}HV Flavia Meireles 9 68 As palavras faladas podem ser as escritas, desde que o falador as tenha articulado verbalmente. Por uma dramaturgia do artista Um ponto de partida. Ou antes, um standing point. A posição de onde se fala. O meu. O de artista enquanto aquele que propõe um diálogo, que apresenta, que compõe o que vai ser compartilhado. É daqui que me ponho a pensar em dramaturgia. Em nossas primeiras discussões no Tecido Afetivo, um texto do John Cage, cujo nome agora me foge à memória, relaciona a produção de uma obra à dimensão de um compromisso, uma espécie de aposta em um futuro determinado, de acordo com um plano ou esquema, embora sujeito à imprevisibilidade inerente às coisas e aos seus processos de acontecimento. 'HVVHWH[WRÀFRXPHIRUWHVREUHWXGRDSDODYUDFRPSURPLVVR1mRVHLDWpRQGHHVVDSDODYUD FRPSRUWDXPDGHULYDÀOROyJLFDLUUHVSRQViYHOPDVHODPHIH]SHQVDUHPRXWUDVFRPSURPHWHU prometer com, prometer em relação. Fiquei com esta última: prometer em relação. Pensei assim a dramaturgia como aposta de relacionamento. Entre pessoas, entre histórias, fatos e ações. Vendo uma peça concluída, ou seja, que se preste a ser vista, convivida, é presente, na concretude de como dispõe, no tempo e no espaço, os elementos que a constituem, as escolhas TXHQRUWHDUDPDVXDFRQVWUXomR9rVHQHVVHVHOHPHQWRVFRQVWLWXLQWH HVSpFLHVGHÀQFDVVHQVtYHLV HLQWHOLJtYHLVTXHDOLFHUoDPHWULGLPHQVLRQDOL]DPDREUD DSURSRVLomRGHUHDOLGDGHVÀFFLRQDLV SRVVtYHLV&DGDREUDQRPHLRGHVXDH[LVWrQFLDGRVHXSURFHVVRGHDFRQWHFLPHQWRJUDGXDOID] dialogar futuro e presente, projeto e atualização, mais do que prospecção e retrospecção. Não há espaço,e nem não há tempo em seus absolutos. Há apresentação de coisas que se tornam SRQWRVGHUHIHUrQFLDFULDGRUDVGHHVSDoRVHWHPSRUDOLGDGHV Acidentes no plano, na planície. Elementos que põem em relação as pessoas presentes ao espetáculo, os espectadores e os performers, as suas ações e o seu conjunto, as sensações provocadas e os seus conectores. Um compromisso com o futuro incerto, aberto ao devir do presente. Uma dramaturgia em progresso. Gustavo Ciríaco ___________________________________________________________________________ 69 Danço. Será que consigo começar este texto como quem convida a dançar? Aqueço-me. Toque os olhos nesta página como se segurasse a minha mão estendida. Neste momento seguimos o ritmo das palavras, enquanto os movimentos internos e involuntários procuram acompanhar as vibrações GRPXQGRDVIUHTXrQFLDVWDPEpPWXGRRTXHLQVLVWHLQFRQVWDQWH3RGHVHUP~VLFDRTXHVRDH talvez sejamos capazes de suar. $WHPSHUDWXUDGDVXDSHOHPXGDjPHGLGDTXHDFRPSDQKDHVVHLUURPSHUGRVLOrQFLR"$TXHoR me desde que convoquei desejante a sua presença. Traço essa linha no papel como um horizonte que nossos olhos alcançam simultaneamente de lados opostos. Permaneceremos alinhados, em cada letra um breve gesto. São possíveis descompassos, mas sempre com FRQÀDQoDHFRPSURPLVVR Movo-me a partir do desejo de experimentar a liberdade. (Não escrevo um manifesto, nem mesmo descrevo um programa estético.) Há antes uma vontade, quero saber-me um corpo e muitos encontros e o mundo e a vida. Mas saber-me vivente, saboreando o tempo antes de ser sujeito, verbo, predicado e sentido. Experimentar a descoberta dos sensíveis no ato de sentir. ,QYHQWDUGLUHo}HVHVLJQLÀFDGRVDSDUWLU G RLQVWDQWH3DUWLFLSDUGRSDVVDGRHGRIXWXURQHVWH presente. Corpo e espaço a um só tempo. Incessante movimento mesmo quando em ato não há ação. Um estado de presença que menos fabrica e mais brinca. Com coragem e valentia, feito criança. Há pouco formávamos uma grande roda (nosso festejo junino), e entoávamos hinos de amor à dança. Não, não era uma ciranda, ainda não há nome. Improvisávamos. Como faço agora GLDQWHGHVWHSODQRVHPUHÁH[RRQGHWHQWRYHUYRFrMXQWRDPLPeSRVVtYHOHVVHRQGH"2Xp mesmo no encontro que onde é tecido? Aqui, faço uma pausa. Já sinto outro gosto na língua. Como houvesse acabado de dar aquele beijo, lembra? Que põe a delicada engrenagem a movimentar-se, protegida por uma necessidade cósmica. Agora, embora haja distâncias, seguimos juntos, de mãos dadas. É fundamental dançar em boa companhia. Enrico Rocha 70 71 Fortaleza, sexta-feira, 11 de junho de 2010. Impressões ... QUANTO TEMPO DURA O AMOR? UM INSTANTE. O TEMPO QUE DURA UMA VIDA. [1] ............................................................ DE QUANDO VOCÊ VEM ME VISITAR marca pele escrita surpresa rede mar brilho estender olhar ........................................................................ DE QUANDO NOS PROPOMOS ENCONTRAR [2] Para onde caminham os espaços abertos dentro de nós... Por hora, em pequenas frestas da realidade, algo se move em deslocamentos contínuos e ininterruptos. Mas eu não me movo, a não ser para estender a mão. E nesses espaços que se formam entre uma mão e outra avisto RKRUL]RQWHHXPLQÀQLWRGHWHPSR2FRUSRWUHPH7UHPXODDOJXPVHQWLPHQWRGDHVSpFLHGR abandono e não da solidão. Eu passo novamente por aquela rua deserta de onde nunca saí. E sigo passando. Meu coração registra pequenos espaços de ar por onde trafegam os pensamentos... delirantes... A forma da rua, ladrilhos de tempo, atravessaram os segundos do nosso olhar. (R TXHVH LD QHVVHLQVWDQWHÀFRXFRPRPDUFDLQFRORUHPPLQKDSHOH3(/(7(66,785$ DOS ENCONTROS. Quando resolvíamos nos visitar, revolvíamos os bosques áridos cheios de ruídos. Suas mãos coreografavam losangos em meu corpo. Era um mapeamento de norte a sul. Era de ilhas. Ilhas em linha. Linha convertida em caminhos. Caminho abrigo de encontro. &DIpOLPmRÁRUHV0HXFRUDomRSXOVDYDDVVLPHQWmR1DGDVHREVHUYDYDDRUHGRU,PSUHVVRV em si mesmos os pensamentos, os sentimentos íntimos da viagem. Eram muitos os viajantes desse inverno sem chuva. Sua qualidade era de vento. VISITANTE, que se ia. Nesse momento, abria a cortina, abria a porta, limpava a ponte entre meu corpo e o seu. Espaços para fora de mim percorriam a grama. 72 Eu olhava os corpos naquele ambiente: gramíneos sentimentos capazes de se arrepiarem... Era, GHTXDQGRYRFrVXUJLDDLGHLDGHVHLU(PRXWUDVSDUDJHQVHPRXWURVIUDJPHQWRV+RMHHX encontrei abrigo em meus próprios movimentos nossos... ............................................................................................................................ Minha querida amiga, WHHVFUHYRSDUDIDODUGHGHOLFDGH]DV9RFrVDEHGHTXDQWDVGUDPDWXUJLDVHODVVmRIHLWDV"$FUHGLWR TXHYRFrVyWHQKDHQXPHUDGRDOJXPDVSRVVtYHLV3RLVVyTXDQGRFKHJXHLDTXLSHUFHELRTXDQWR SUHFLVDYDJULWDUXPJULWRURXFRSUDYRFrRXYLU(XQXQFDWLQKDWUD]LGRSUDPLPSHUFHSo}HVWmR óbvias: eu preciso te contar que sismografava as palavras. Eram elas cheias de sentidos, feitas de muitos sons: podiam ser rede, árvore, planta, mar, horizonte. A delicadeza principal estava no estado da PERFORMANCE, na FORMA PER. Era próprio um habitar de movimentos invisíveis na urbe que passavam despercebidos. E isso pouco importava. Descobri que havia ali sentidos muitos. E nada disso, nenhum movimento, tinha forma. Os linguistas são PERFORMERS, eles VLVPRJUDIDPRSHQVDPHQWR$tpTXDQGRHQWUDYRFrHRWHPSRTXHSHUPDQHFHPRVMXQWDV$V JHRJUDÀDVWDPEpPVmR&25(2*5$),$6$tHQWUDPRVOLWHUDWRV(OHVVmRSHVVRDVSUy[LPDV do nosso pensamento. E tão longe estão de seus próprios movimentos... São ensimesmados. Em seus próprios gestos desdobram um mundo que está sempre à deriva, registro dos pensamentos. ´$DUWHVHGHJHQHUDTXDQGRVHDSUR[LPDGRWHDWURµ(VVDLGHLDÀFRXUHVYDODQGRHPPLP3DUD HVWHQGrODDWLHUDSUHFLVRSHQVDUQRVWH[WRVQDVOHLWXUDVQDVLPSUHVV}HVQRVUHJLVWURVGH92= e PENSAMENTO. A dramaturgia se apresentava para pensarmos de formas diferentes do habitual, embora fosse assim o momento de minha singularização. Antes que YRFrPHSHUJXQWHHXWHSURSRQKRYDPRVD1RYD,RUTXH"(VVDVHULDQRVVDYLROrQFLD²QRHVWDGR de transição de algo privado que aparece para o público: NOSSO ESTADO DESEJANTE. ............................................................................................................................ 73 [4] MAPA DOS AFETOS ______________ ........................... / BLOCO I / ´TXHH[SHULrQFLDVWrPSHUPDQrQFLDQROXJDUTXHRXWURVROKDUHVSRGHPFDEHUµ lápis rastro escritural dispositivo estratégico de invisibilidade lápis gesto escritural captando o tremor estado de generosidade ocupar o espaço doméstico: lápis em registro de circulação disponibilidade da imagem entre a impossibilidade e a possibilidade da solução: drama(s) arrancando o tremor do autor crítico como tradutor o que me move entre as formas de habitar? desacelerar disponibilidade da imagem em aproximar distanciar a intensidade do que atravessa: afetividade circulação transição preocupação relação turbinação a ação é uma forma atualizada pela lógica da força “vivo minha vida em círculos crescentes” MAPA DOS AFETOS ______________ ........................... ........................... / BLOCO II / maneira maneira maneira estar sair mundo: pedidos escapa escolha. persiste insiste. fazer feitura: tessitura DOJRSRUWUiVGDVHVFROKDVYRFrFULDSDUDYRFr outros desejos: uma zona desejante muda radicalmente a direção ______________________________ POLIFONIA POLISONIA _______________________________”algo entre o som e o sentido” DVVLPVmRDVSDODYUDVFRPRÁHFKDV ÁHFKHLUDVY{RVGHULYDVPRGXODo}HVFKDPDPHQWRSRVVLELOLGDGHGHDWLYDU o devir: tu derivas na necessidade distante de dissolver as coisas 74 MAPA DOS AFETOS ______________ ........................... ........................... ........................... / BLOCO III / corpo: metáfora epistolar de fragmento: discurso bicho modulações arremessam procedimentos restritivos mecanismos de ampliação, parâmetros para uma história contemporânea: teatralidades / temporalidades poéticas da amizade. “fecha a porta, meu querido. abre a porta...” Fátima Souza 75 onze.jun.dois mil e dez “Dramaturgiando” impressões...... $HVFULWDpPDWHULDOL]DomRGHXPVLVWHPDWL]DUGDUÁX[RDRVDWUDYHVVDPHQWRVTXHDH[SHULrQFLD que está vivo e em viva (pro)movem. Escolher transubstanciar em prosa a amplidão do vivido nos últimos dias, fazme questionar que ideias-palavras-corpos ganharam expansão no eu-corpoideia-palavras. De relance todos os GLWRVHRTXHHVWiVXWLOPHQWHQHOHVGHQVLÀFDGRPHPRELOL]DP DRAMATURGIA ...UMA TECEDURA DE AÇÕES PODENDO OU NÃO INCLUIR A PALAVRA... TRANS CRIAÇÃO CONCEITOS _ DRAMATURGIA OUVIDOSATENTOS DRAMATURGO = Ñ TUTOR INVISIBILIDADE DE TOPEIRA SE AMPARAR NO AQUIAGORA ACOLHIMENTOS OLHOSABERTOS TEORI(A)ÇÃO '(6(67$%,/,=$d¯(6 REFRASEANDO ALGUÉNS EMPATIA [MIMETISMO INTERNO, RESONÂNCIA EM TEORI(A)ÇÃO] 76 AÇÃO TEÓRICA PERFORMATIVA Falar de dramaturgia, de criação em dança, de composição, dos modos de sovar as percepções/ sensações/desejos transcriados em diversos sensíveis e deixando crescer a massa que se materializa em obra, peça, dança, encontro, afeto... Pensar na dramaturgia como trabalho doméstico que alimenta a invenção, limpa o terreno ou SRUYH]HVDPSOLÀFDRVUXtGRV3HQVDUQRGUDPDWXUJRFRPRDOJXpPSDUDFRQYHUVDUFRQYHUVD VpULDHÀDGDTXHGHVFUHYHGHQVDPHQWHRTXHYrPHLRHWQyJUDIRPHLRIRIRTXHLURVXVVXUUDQGR no ouvido, transcriando o olhar, compartilhando o caminhar. Farejar os Afetos, cuidar do jardim, o Padeiro cuidando das crianças... Quais as metáforas para o Olhar Dramatúrgico? Que coisa boa... RTXHDVUHODo}HVHQWUHGHVFULomRHWQRJUiÀFDHGUDPDWXUJLDSRGHPVXVFLWDU sondar mais isso... LQWHUSUHWDomRFLUFXORKHUPHQrXWLFR²H[SHULrQFLDSUy[LPD²H[SHULrQFLDGLVWDQWH 2VHQVDWRRTXHLQWHQVLÀFDpDLGHLDGHQmRDIRUPDOL]DomRHRFRPR"6HUiTXHGL]HURFRPR" -iEDVWD-ipFRUSRHPDomR7HPDOJRTXHÀFDQDVLQWHQo}HVQRVPRGRVGHRSHUDUTXHQmRSRGH ser reduzido a “modelo”, “montagem”, “organização”... São os meios?!? Até aqui, dramaturgia, façamos agora uma curva espiralada. Chegando ao gap, que muito me apetece - fresta, espaço em branco – quando o pensamento do corpo-propioceptivo-somático-âncora encontra o pensamento corpo-conectivo-rizomaÁX[R$OH[DQGUH9HUDVOHYDQWRXHVVDTXHVWmRTXHpPLQKDWDPEpPH[LVWHPFRUSRUDOLGDGHV idealizadas que tratam de conceitos contemporâneos de corpo e de vida, que não parecem incorporados, encarnados nos modos de construção de corporalidade, reporto-me aos modos de formação, autoprodução de um corpo dançante. 77 f o r m a ç ã o ODQoDRÀRSDUDFRUSRUHLGDGH [ Corporeidade ] em sua acepção moderna, tem em Merleau-Ponty um rastro visível, no qual o entendimento do corpo-vivo, corpo-próprio vai sendo desvelado, “o corpo é agente e é a base da subjetividade humana.”1 A percepção se torna tema chave de alguns de seus livros, nos quais descreve o corpo como nosso modo de ser (estar)-no-mundo, engajamento sensível com RPXQGRHÁX[RFRQVWDWHGHLQIRUPDo}HVHQWUHRLQWHUQRHH[WHUQR 0LJXHO9DOHGH$OPHLGDQRWH[WR´&RUSR3UHVHQWHµQR/LYURKRP{QLPRGH&HOWD(GLWRUD 1 78 $VFLrQFLDVFRJQLWLYDVVHH[SDQGLUDPQDVHJXQGDPHWDGHGRVpFXOR;;HDSHUFHSomRWRUQRX VHWHPDGHPXLWRVHVWXGLRVRVRÀOyVRIR0LFKHO%HUQDUG$ODQ%HUWKR]+XPEHUWR0DWXUDQDH Francisco Varela, etc. [ Corporeidade ] engajamento social, cultural, simbólico e biológico. Atravessamentos das e nas cinco camadas do corpo – pele, roupa, casa, sociedade e mundo - citadas no Palavrando*. Atravessamentos e engajamentos psicológicos, biológicos, culturais, políticos, éticos, visibilidades e invisibilidades. Desculpem-me se pareço pleonástica, repetitiva, no entanto repetir é um dom do estilo, já dizia 0DQRHOGH%DUURVHDTXLH[HUFLWRXPDHVFULWDFRUHRJUiÀFDXPDYRQWDGHGHPRYHUPHHVFUHYHdançando. FRUA. Ângela Souza * PALAVRANDO é uma palestra-performance, de André Lepecki e Eleonora Fabião, que investiga o ato de fala HRDWRGHHVFXWD3DUDFDGDOXJDUHPFDGDHGLomRGRSURMHWRHVFROKHPRVSDODYUDVHDo}HVHVSHFtÀFDV3DODYUDVH ações que consideramos importantes para pensarmos dança, teatro e performance naquele momento e circunstância. 79 O cheiro perigoso da liberdade Hoje eu vi uma formiga ajoelhada numa pedra (Manoel de Barros) (PHXDY{QDPRUDYDDVROLGmR 0DQRHOGH%DUURV 6RXÀOKRGHXPSDGHLURH HX Tive uma infância doente (eu) Por onde começar Onde é o começo Onde é que começa De vez em quando Quase sempre ou na maioria das vezes Tremo minha voz treme e eu choro Partilhar, compartilhar Co-habitar, colaborar Quero o que todas as palavras bonitas da moda podem me dar, apoio. Me perdoem, mas num encontro desse formato não posso fugir de um depoimento, relato que não passe por algo um tanto quanto emocional, passional, pessoal. O que me predomina alem de muitas ânsias que tento acalmar, é essa vontade do encontro sem um compromisso que possa afetar minha deriva. Para falar em dramaturgia aproprio-me irUHVSRQVDYHOPHQWHGHXPDIUDVHVROWDDRYHQWRÁH[HLURGH$QGUp/HSHFNL´GUDPDWXUJLDpDOJR PLVWHULRVRHTXHSDUDDFRQWHFHUpQHFHVViULRXPDGLPLQXLomRGDSUHVHQoDµ)RLRTXHÀ]SDUD que nesse encontro eu pudesse entender muitas coisas. Ainda em Lepecki “eu conferi ao outro a capacidade de presença”. Tentei me anular não por motivos que possam gerar alguns comentários maiores, mas por tentar fazer o inverso do que disse Alexandre Veras. Eu quis tentar me UHODFLRQDUFRPRPXQGRVHPXPDH[SHULrQFLDDQWHULRU2XWURGLDFRQWDQGRFRPDSUHVHQoD luxuosa de Silvia Soter e Sandra Meyer, à deriva pelas ruasde Flexeiras, cantamos juntos: “não quero lhe falar meu grande amor, das coisas que aprendi nos livros. Quero lhe contar como vivi e tudo o que aconteceu comigo.” É brega sim. Eu sei. Mas quem não for brega por favor levante o braço e me perdoe. O Paulo Caldas dentro de sua calma compenetrada disse: ”dramaturgia supõe-se insistir sobre algo”. E eu insisto, porque como disse Thereza Rocha: “eu quero dissolver em favor do que aqui, ali se faz necessário”. 80 0DUFRV0RUDHVGLVVHµpXPDFRQYHUVDVLOHQFLRVDµHHVVHVLOrQFLR6DQGUD0H\HUPHGLVVH´p bom desestabilizar e descriar imagens”. Fred Benevides disse: “aparecer no seu desaparecimento”, e o meu desaparecer nesse encontro talvez tenha sido muito aparente. Tentei dançar aqui. Eduardo Jorge me disse em sua provocação:” mover a pequena biblioteca, o corpo”. Fui e estou, como disse Eleonora Fabião, com sua voz suave, doce e conquistadora: “devemos ser partner do espaço”. Porque, como disse Pablo Assumpção, e eu já me aproprio; “a performance continua mediando ações mesmo depois de acontecida”. Assim como tem se dado as falas dos nossos encontros todos os dias. O que talvez tenha até preocupado Andréa Bardawil, e o que o 3RVVLHD$VSiVLDGLVVHUDPµYRorWHPVHWRUQDGRLQDFHVVtYHOµ Dentre tantas coisas que me afetaram, eu fui construindo meu tecido com as falas e os olhares cúmplices da Flavinha (Flavia Meireles) e da Micheline, que são inexplicavelmente lindas, pelas quais eu já me apaixonei. Tem a paz da Eliana Madeira, a energia da Gracinha e a pureza da Valentina. 'RVTXHQmRIDOHLpSRUTXHHXÀ]FRPRIH]&ODULFH/LVSHFWRUHPVHXFRQWR´)HOLFLGDGH&ODQGHVtina”: “eu os escondia para ter a sensação de sempre encontrá-los novamente”. Portanto quero que se sintam contemplados. Teve ainda as provocações de Gustavo (Ciríaco) e Antonio. Elas me deixaram com pulgas atrás da orelha. O Enrico em algum momento falou com sua suave e agradável voz sobre a estética do real .e sobre isso ainda não sei muito o que falar, só sei viver. E pergunto a todos: “o que é real?” E volto ao que falei no início: onde começa? onde termina ? Meu sossego quer tentar ser discreto, tem sido muito aparente. Queria contemplar a todos com algo. Mas, perdão novamente, sou do signo de escorpião. Finalizo então meu diário, emocional, passional e pessoal com uma frase que me tranquiliza nessa minha incompletude. É do Michel Foucault. Ele diz: “e pensar que o que existe está longe de preencher todos os espaços possíveis”. Márcio Medeiros da Costa 81 82 Tecido Afetivo $V FRQYHUVDV VREUH GUDPDWXUJLD H SUHVHQoD PH À]HUDP SHQVDU HP PHX SURMHWR &$6$ TXH consistia em descobrir estados corporais a partir da posição de cócoras.Interessava-me encontrar particularidades em meu corpo nesta posição tão limitadora. Quando me vi, nela, veio então a pergunta: O que vou fazer com isso? Lembro-me que não sabia onde aquilo ia dar, mas tinha a intuição de que ao me colocar GLVSRQtYHO DOJR FHUWDPHQWH FKHJDULD (QWmR SRU PRPHQWRV PXLWR ORQJRV ÀFDYD DFRFRUDGD como se esperasse por algo. Nesse esperar, agucei os sentidos através da qualidade das imagens que estava a ver e dos sons que me atravessavam. A qualidade de presença me fazia pensar na ideia de carregar / encher. Então durante o processo quis me “encher” do que fosse relacionado a esta posição: imagens, sensações, textos. Não me interessava buscar o espetacularizado, mas sim encontrar uma justeza que poderia ser visível e sentida no corpo. Algo que me chamou atenção durante as conversas no Tecido foi quando alguém, falando sobre seu próprio espetáculo, colocou a questão: “Por que as pessoas veem imagens que não colocamos ali?”. Havia feito essa pergunta sobre o meu trabalho também. Após uma demonstração feita por mim, do processo CASA, uma pessoa veio falar-me que havia visto um velho. Fiquei me perguntando o que havia se instalado, em meu corpo, que o fez ver aquela imagem. 4XHDPELrQFLDIRLFULDGD"(VVDLPDJHPID]LDSDUWHGRXQLYHUVRGRHVSHFWDGRURXHXDFDUUHJXHL comigo? Seria meu pai que estava em mim? O ponto de partida para essa pesquisa foi a imagem dele, de cócoras. Andréa Sales 83 Sobre os participantes Alexandre Veras é fundador do Alpendre em 1999 onde atua como curador e coordenador GHPRVWUDVH[SRVLo}HVHQFRQWURVHFXUVRV9rPGHVHQYROYHQGRSHVTXLVDVFRPYtGHRGDQoD documentário e vídeo-instalações e realizou entre outros trabalhos em vídeo: As Vilas Volantes, O Tempo da Delicadeza, Partida, Marahope 14/07, O Regresso de Ulisses, Máscara ou 3HUWHQoD2V7HPSRV)RLFRQWHPSODGRFRPR3UrPLR6pUJLR0RWDGH$UWHH7HFQRORJLDFRP D%ROVDGH3HVTXLVDHP0tGLDV'LJLWDLVHFRPR3UrPLR,QWHUDo}HV(VWpWLFDVHP3RQWRVGH Cultura da Funarte. Nos últimos anos desenvolveu intensa atividade de formação com cursos de vídeo-dança e vídeo-arte. É curador e diretor artísitico do Encontro Terceira Margem e GLUHWRUGRSURJUDPDGH79KRP{QLPR Andréa Bardawil é coreógrafa e habitante de um lugar chamado Alpendre – Casa de Arte, 3HVTXLVD H 3URGXomR HP )RUWDOH]D GHVGH  RQGH HQFRQWURX DÀQLGDGHV H YHUWLJHQV QR contágio com outras linguagens, sobretudo o vídeo e as artes visuais. Compartilha tempos e possíveis com a Companhia da Arte Andanças desde 1991, com quem realizou alguns trabalhos: Os Tempos (2008), O Tempo da Paixão ou O Desejo é um Lago Azul (2005), Vagarezas e Súbitos Chegares (2000). Foi uma das selecionadas pelo Rumos Itaú Cultural Dança/2009-2010, com R SURMHWR *UDoD$FUHGLWD TXH D SHUPDQrQFLD p FRQGLomR D VHU FXOWLYDGD FRPR UHVLVWrQFLD WDOYH]DRHVWDGRGHXUJrQFLDGHWRGDVDVFRLVDV André Lepecki é Associate Professor no Departamento de Estudos da Performance, New York University. Doutorado pela NYU, é curador, crítico, e dramaturgista. Autor de ([KDXVWLQJ Dance (Routledge 2006; traduzido em 6 línguas). Curador e director do Festival IN TRANSIT H +DXVGHU.XOWXUHQGHU:HOW%HUOLQ3UHPLDGRGD$VVRFLDomR,QWHUQDFLRQDOGH Críticos de Arte pela direcção e co-curadoria da recriação de 18 Happenings in 6 Parts de Allan Kaprow. Andréa Sales é intérprete-criadora e faixa-roxa de Karate-do. Estudou no Colégio de Dança do Ceará em 2000 e 2001. Por sete anos, foi membro da Cia. da Arte Andanças. Atualmente desenvolve o projeto A carne não é fracaFRQWHPSODGRFRPR3UrPLRGH'DQoD.ODXVV9LDQQD 2009. Foi selecionada pelo Rumos Itaú Cultural Dança - 2009/2010 com o projeto CASA. 84 Ângela Souza é artista-pesquisadora de Dança, pesquisadora dos estados do Ceará, Maranhão e Piauí no mapeamento do Rumos Itaú Cultural Dança, mestranda em Dança da UFBa, é graduada HP&LrQFLDV6RFLDLVSHOD8)&  7HPXPDIRUPDomRGLYHUVLÀFDGDQDiUHDGD'DQoDHP especial sua participação de 1996 a 2002 na Companhia da Arte Andanças. De 2000 a 2002 foi aluna-coreógrafa do Colégio de Dança do Ceará. Atualmente realiza Especialização no Sistema Laban/Bartenieff na Faculdade Angel Vianna e investiga processos compositivos, as relações entre dança e teatro e os artistas e companhias “independentes” de Fortaleza. Aspásia Mariana é Bailarina Contemporânea com formação técnica em sapateado, Atriz, Performer, Concluiu o Curso Técnico em Dança do Senac / IACC / Secult, Integrante fundadora da Artelaria Produções e diretora da Companhia do Barulho. Integrou o corpo docente de arteeducadores do projeto Dançando na Escola. Concluiu o Curso de Extensão Dança e Pensamento. Aluna do curso Doc-web do núcleo de audiovisual da Vila das Artes, Integrou como ArteEducadora o Projeto Dançando na Escola, realizado pela Vila das Artes e Prefeitura de Fortaleza e desenvolve um trabalho com dança, mídias digitais e tecnologia. Arte – Educadora da SEMAS – no projeto PETI (projeto de erradicação do trabalho infantil) desenvolve pesquisa na linguagem dança e tecnologia, entre a técnica e a tecnologia, com colaboração de Armando Menicacci. Daniel Pizamiglio é performer, bailarino e pesquisador. Aluno concludente da segunda turma GR&XUVR7pFQLFRHP'DQoD²&(DOXQRGR,)&( ,QVWLWXWR)HGHUDOGH(GXFDomR&LrQFLDH Tecnologia) no curso Licenciatura em Teatro. Pesquisador de relações entre coisas e fantasmas: Percepção, Performance, João Fiadeiro e a Composição em Tempo Real. Realiza trabalhos solos e colaborativos. Criou a proposta de intervenção urbana em dança “eu, ROXO” (2009) e performa o projeto “Cavalos” (2010) com Andréia Pires e Leonardo Mouramateus. Eduardo Jorge é mestre em Teoria da Literatura pela Universidade Federal de Minas Gerais UFMG. Publicou San Pedro (2004)(VSDoDULD(Lumme Editor, 2007) e Caderno do estudante de luz (Lumme Editor, 2008)Colabora para o caderno Pensar (Estado de Minas) e Suplemento /LWHUiULR GH 0LQDV *HUDLV Participa das reuniões em livro: Poesia Brasileira do Início do Terceiro Milénio, 2008 (Portugal - org. por Cláudio Daniel), Tigertail, 2008 (EUA – org. por Horácio Costa e Charles Perrone), 8 poetas brasileños (Espanha - Revista Quimera - org. Aníbal Cristobo) e Meio-dia, 2009 (Argentina - org. por Diego Vinhas). 85 Eleonora Fabião é performer e teórica da performer. Professora Adjunta do Curso de Direção Teatral da UFRJ onde leciona desde 1997, é Doutora em Estudos da Performance (New York University) e Mestre em História Social da Cultura (PUC-RJ). Ao longo dos anos 90 atua como membro de grupos de pesquisa e experimentação teatral no Rio de Janeiro. A partir de  LQWHUHVVDVH WDPEpP SHOD DUWH GD SHUIRUPDQFH H D KLEULGDomR GH JrQHURV )DELmR WHP DSUHVHQWDGR SHoDV OHFLRQDGR H SXEOLFDGR QR %UDVLO (8$ 3HUX 0p[LFR &XED &RO{PELD Noruega, França e Alemanha. Eliana Lyra Madeira é coreógrafa-pedagoga, graduada em Educação Física pela UFRJ, pós – graduada em Dança Elementar/Elementarer Tanz/Maja Lex na DSHS-Deutsche Sporthochschule .|OQ&RO{QLD$OHPDQKDRQGHSRUDQRVDWXRXFRPRGDQoDULQDIRWyJUDIDGHGDQoDWHDWUR e professora da DSHS na cadeira formação corporal. A partir dos anos 80 em Fortaleza, cria a CasaEspaço, desenvolve seu trabalho com a metodologia movimento elementar-o trabalho no corpo-pessoa, apresenta espetáculos como Desaprendendo e Comqueagentetem, com intérpretes leigos em dança, e promove rodas de dança para massa de pessoas em parques da cidade. Em 2009, de volta a Fortaleza atua como professora nos Módulos Análise do Movimento para o Curso Técnico em Dança II, Secretaria de Cultura e Instituto de Arte e Cultura do Ceará/Senac CE , e no Curso Iniciação à Dança Contemporânea da Escola Pública de Dança Vila das Artes/ Prefeitura de Fortaleza(CE). É professora de Dança Contemporânea no Alpendre, Casa de Arte, Pesquisa e Produção, em Fortaleza. Enrico Rocha é mestre em Linguagens Visuais pela UFRJ e bacharel em Comunicação Social pela UFC. Participou do Núcleo de Artes Visuais do Alpendre - casa de arte e produção, em 2001. No mesmo ano, foi premiado como artista contemplado no programa Rumos Itaú Artes Visuais 2001/2003. Entre as exposições coletivas, destaca o salão Arte Pará, em 2005, e o SUrPLR$WRV 9LVXDLV )XQDUWH HP $SUHVHQWRX LQGLYLGXDOPHQWH RV SURMHWRV ´3HUJXQWDV Ordinárias em Percursos Existenciais”, em 2006, e “Onde Aqui se Localiza”, em 2008. Vive e trabalha em Fortaleza. Fátima Souza É MESTRE EM LETRAS - LITERATURA BRASILEIRA com estudo sobre a poesia de Orides Fontela. Além da leitura transita pelo universo da sala de aula, da gestão pública na área de literatura, das políticas públicas para juventude e é uma pessoa completamente apaixonada pela dança. 86 Fernanda Eugenio é doutora e mestre em Antropologia Social pelo Museu Nacional/URFJ e formada em Dança pela Escola Angel Vianna. É Professora Adjunta do Departamento de Sociologia e Política da PUC-Rio e pesquisadora associada do Cesap/Ucam. Desenvolve experimentações propositivas e situacionais e trabalhos em performance e vídeo, investigando a relação corpo-cidade e os processos de subjetivação contemporâneos. Foi artista-bolsista do SURJUDPDGHUHVLGrQFLDV&R/$%RUDWyULR Flávia Meireles é artista de dança e professora licenciada pela Faculdade Angel Vianna. Colabora em projetos dos coreógrafos Marcela Levi, Gustavo Ciríaco, Micheline Torres e colaborou nos projetos de João Saldanha e de Paulo Caldas. Orientou o grupo de estudos em dança pósmoderna americana (RJ). Leciona História da Dança no Curso Técnico da Escola Angel Vianna. Seu trabalho Sem nomeWRGRVRVXVRVJDQKRXR3UrPLR)8$157(GH'DQoD.ODXVV9LDQQD 2008 e a bolsa no Centre International de Exchanges d’Artistes Récollets (Paris, 2010). Com Marcela Levi, participa do trabalho In-organic (2007) e do trabalho (PUHGRUGREXUDFRWXGR é beira  3DUWLFLSRXFRP0DUFHOD/HYLGRSURJUDPD$UWLVWDVHQ5HVLGrQFLD/D&DVD Encendida e Universidad de Alcalá de Henares (Madrid, 2008). É interlocutora do trabalho Nada. Vamos ver,GRFRUHyJUDIR*XVWDYR&LUtDFR&RUHRJUDIRXRVWUDEDOKRV´7UrV'HVHMRV7mR Deseperados” (2004) e “chance meeting” (2002), trabalho em parceria com Micheline Torres. Participou como artista dos trabalhos de dança de João Saldanha de 2004 a 2007 e dos trabalhos de dança de Paulo Caldas de 1997 a 2001. Gerson Moreno é Pedagogo, arte-educador, ator-dançarino, coreógrafo formado pelo Colégio GH'DQoDGRFHDUiLGHDOL]DGRUHGLUHWRUGD&LD%DOp%DLmRGH,WDSLSRFD SLRQHLUDHPGDQoDFrQLFD no interior), curador do Festival de Dança do Litoral Oeste e atual presidente da Associação de $UWHV&rQLFDVGH,WDSLSRFD $$57, 3HVTXLVDHSURGX]GDQoDKi$QRVQDUHJLmRGR9DOHGR Curu, Litoral Oeste do Ceará. Graça Martins é dançarina, coreógrafa, professora de Flamenco, historiadora e especialista em Cultura Folcórica Aplicada. Criadora e diretora do Grupo de Dança Tablado (Flamenco) e Trabalha com Cultura Popular Tradicional desde sempre. Vice presidente da Prodança Associação dos Bailarinos, Coreógrafos e Professores de Dança do Ceará e uma das Diretoras da Comissão Cearense de Folclore. Integrante do Fórum de Dança do Ceará e do Fórum de Cultura Popular. 87 Gustavo Ciríaco p FRUHyJUDIR H EDLODULQR HVWXGRX FLrQFLD SROtWLFD H IRUPRXVH HP GDQoD contemporânea na Escola Angel Vianna. De 1995 a 2005, formou com Frederico Paredes a Dupla de Dança Ikswalsinats. Desde 2003, tem desenvolvido projetos independentes em associação com outros artistas brasileiros e estrangeiros no Brasil e no exterior. Em 2007, estreou Still – sob o estado das coisasSUrPLR$3&$GHPHOKRUFRQFHSomRGHGDQoDHLQGLFDGRDR3UrPLR%UDYR como um dos melhores espetáculos de dança do ano. É professor de história da dança da Escola Angel Vianna. Foi também professor da Faculdade de Dança da UniverCidade e professor substituto do Dep. de Artes Corporais da UFRJ. Desde 1996, ministra cursos e workshops de história da dança. Heber Stalin é bailarino e coreógrafo, diretor Geral da Companhia dos Pés Grandes, integrante fundador da Companhia do Barulho, formando em pedagogia pela Universidade Estadual do Ceará. Formado pela primeira turma do Curso Técnico em Dança e do curso de extensão da UFC e Vila das Artes - Dança e pensamento. Articulador da Bienal Internacional de Dança. Atuante na dança desde 2000. Marcelo Evelin é coreógrafo, pesquisador e intérprete e criador. É criador residente do Hetveem Theater em Amsterdam com sua Companhia demolition Inc., e ensina improvisação e composição na Escola Superior de Mímica de Amsterdam-Holanda, onde tambem cria projetos e orienta estudantes em processos criativos. Orienta workshops e projetos colaborativos em vários paises da Europa, Estados Unidos, Africa, America do Sul e Brasil. Seus dois ultimos espectáculos, “Bull Dancing” (2006) e “Mono” (2008), se spresentando no Brasil e exterior. Desde 2006 coordena em Teresina-Piaui, o Núcleo do Dirceu, um coletivo de artistas independentes e plataforma de pesquisa e desenvolvimento das Artes Performáticas Contemporâneas. Márcio Medeiros é bailarino. Ator. Diretor. Performer. Integrante da Cia. de Teatro Máquina e da Cia da arte andanças. Com formação de ator pelo CAD-UFC, Curso de Artes Dramáticas e CDT- Colégio de Direção Teatral do Inst. Dragão do Mar. Na dança tem formação pelo Curso Técnico em Dança do Ceará (SENAC/SECULT/IACC) e pelo Curso de Extensão Dança e Pensamento (Prefeitura Municipal de Fortaleza/UFC). Desenvolve pesquisa em dramaturgia na junção das linguagens dança, teatro e performance. Marcos Moraes é bailarino, coreógrafo e ator, formado em “Técnicas Psico-corporais para 88 R 'HVHQYROYLPHQWR +DUP{QLFRµ SHOR (VSDFLR GH 'HVDUUROOR $UPyQLFR ² 5LR $ELHUWR GH Montevidéu, Uruguai. Foi membro do “Grupo Espacio” companhia de Dança Teatro dirigida pela coreógrafa Graciela Figueroa (1995 a 2002). Trabalha como artista, docente, produtor cultural e consultor para alguns dos principais eventos e festivais de dança contemporânea do Brasil, tais como o Festival Panorama de Dança (RJ), a Bienal de Dança do Ceará, o DANÇA EM FOCO FESTIVAL DE VIDEO & DANÇA (RJ E SP), entre outros. Integrou o Movimento Mobilização Dança (São Paulo) e ocupou o cargo de Coordenador de Dança da Funarte (2004 a 2006). Atualmente desenvolve o projeto de dança e performance DatingSoccerFood. Micheline Torres é bailarina, coreógrafa e performer. Formada em ballet clássico e dança FRQWHPSRUkQHD (VWXGRX $UWHV &rQLFDV QD 81,5,2 H )LORVRÀD QD 8)5- 7UDEDOKRX SRU 12 anos como bailarina e assistente da Lia Rodrigues Companhia de Danças. Desde 2000 desenvolve trabalhos próprios situados entre a dança contemporânea, a performance e as artes visuais. Atualmente desenvolve o segundo trabalho do projeto Meu corpo é minha política, FRQWHPSODGRFRPRSUrPLR)XQDUWH.ODXVV9LDQQDGH'DQoDGHHRSURMHWRGHUHVLGrQFLD do Centre National de la Danse (Paris). O primeiro trabalho deste projeto, chamado CARNE, foi apresentado no Rio de Janeiro, São Paulo, Recife, Vitória, Salvador, Brasília, França, Portugal, Noruega, Holanda, Mexico, Argentina e Cuba. Integrante do coletivo internacional Sweet and Tender Collaborations (www.sweetandtender.org) Pablo Assumpção é artista multidisciplinar e pesquisador. Atualmente, faz doutorado no departamento de Estudos da Performance da New York Univeristy (NYU), e tem dois mestrados (Estudos da Performance, NYU, 2002; e Comunicação e Semiótica, PUC-SP, 2006). 6XDSURGXomRDFDGrPLFDDWXDOLQYHVWLJDDPL]DGHHH[SHULrQFLDFROHWLYDDSDUWLUGHWHRULDVGD performance e do erotismo e de metodologias da antropologia política dos sentidos do corpo. Junto com Christine Greiner, coordena um grupo transnacional de pesquisa sobre performance como método de pesquisa, ligado ao Instituto Hemisférico de Performance e Política, de Nova York. Seus trabalhos artísticos incluem textos para teatro e cinema, vídeo, instalação e arte de performance. Paulo Caldas é coreógrafo e bailarino, fundou a companhia de dança Staccato, no Rio de Janeiro, em 1993. É professor dos cursos de Dança da UniverCidade (RJ) e da Faculdade Angel Vianna (RJ), onde criou e coordena o curso de pós-graduação “Estéticas do Movimento: 89 Estudos em Dança, Videodança e Multimídia”. Idealizou e dirige o DANÇA EM FOCO – Festival Internacional de Vídeo & Dança. Possidônio Montenegro é bailarino e professor, formado pelo Colégio de Dança do Ceará, do instituto Dragão do Mar. É integrante da Companhia da Arte Andanças. Graduando em ÀVLRWHUDSLD$UWHWHUDSHXWDIRUPDGRQRSHOR,QVWLWXWR$TXLODH$WXDQDiUHDGHPDVVRWHUDSLD Trabalha como professor na equipe multidisciplinar do CAPS – Centro de Atenção Psicossocial; E ministra cursos junto a entidades e movimentos populares em outras regiões do estado. Sâmia Bittencourt é atriz e bailarina, com formação na Escola Nacional de Circo (RJ) e no &XUVR6XSHULRUHP$UWHV&rQLFDV3DUWLFLSRXGR,)HVWLYDOGH7HDWURGH)RUWDOH]D &(  na Mostra Sesc – Cariri-Ce (1999-CE) e no I Festival Internacional de Teatro dos Países do Mercosul (1997- Paraná), dentre outros. Foi premiada como melhor atriz no I Festival de Teatro de Fortaleza (2002-CE), na Mostra Sesc – Cariri-Ce (1999-CE) e no I Festival Internacional de Teatro dos Países do Mercosul (1997- Paraná), dentre outros. Sandra Meyer é professora da Universidade do Estado de Santa Catarina (UDESC), onde leciona dança e técnicas corporais no Curso de Bacharelado e Licenciatura em Teatro e no Programa de Pós-Graduação em Teatro. É doutora em Comunicação e Semiótica pela PUC/ SP. Realiza pesquisas, publicações e orientações na área de dança e teatro, com interfaces nas artes plásticas. É autora do livro A Dança Cênica em Florianópolis (1994) e As metáforas do corpo em cena (2009). É co-autora dos livros 7XERGH(QVDLRH[SHULrQFLDVHPDUWHHGDQoD contemporânea (2006), Seminários de Dança I e II (2008 e 2009) e Coleção Dança Cênica – Volume 1 (2008). Silvia Soter é bailarina, graduada em dança pela Universidade Paris 8 (França / 1996), Mestre em Teatro pela UNIRIO (2005), crítica de dança pelo Jornal O Globo e professora de Ginástica Holística formada na França. Com Roberto Pereira organizou a publicação Lições de Dança. É professora do Curso de Dança da UniverCidade (RJ), onde criou o Curso pós-graduação em Educação Somática. É dramaturgista da Lia Rodrigues Cia. de Dança e autora do livro Cidadãos dançantes: a experiência de Ivaldo Bertazzo com o corpo de dança Maré (UniverCidade Editora / 2007). 90 Tecido Afetivo: Concepção e elaboração: Andréa Bardawil Realização: Cia da Arte Andanças Produção: Isabel Silvino Estagiários: Aspásia Mariana e Daniel Pizamiglio 3URMHWR*UiÀFREduardo Jorge Diagramação: Eduardo Jorge e Victor da Matta Site desenvolvido por Victor da Matta [designdamatta] Revisão: Fátima Souza Direção e edição do documentário: Alexandre Veras Imagens e som direto: Alexandre Veras e Fred Benevides, com imagens de apoio dos participantes. Fotos: Enrico Rocha, Eduardo Jorge, Micheline Torres, Fátima Souza Daniel Pizamiglio, Márcio Medeiros e demais tecedeiros. Participantes: Alexandre Veras, André Lepecki, Andréa Bardawil, Andréa Sales, Ângela Souza, Aspásia Mariana, Daniel Pizamiglio, Eduardo Jorge, Eliana Lyra Madeira, Eleonora Fabião, Enrico Rocha, Fátima Sousa, Fernanda (XJrQLR )ODYLD 0HLUHOHV *pUVRQ 0RUHQR *UDoD 0DUWLQV *XVWDYR &LUtDFR +HEHU 6WiOLQ 0iUFLR 0HGHLURV 0DUFRV0RUDHV0LFKHOLQH7RUUHV3DEOR$VVXPSomR3DXOR&DOGDV3RVVLG{QLR0RQWHQHJUR6kPLD%LWWHQFRXUW Sandra Meyer, Silvia Soter. Correspondentes (pessoas que participaram virtualmente, através de troca de e-mails): Airton Tomazzoni, Denise Stutz, Felipe Ribeiro, Thaís Gonçalves, Rosa Primo. Visitantes DFRPSDQKDQWHVHYHQWXDLVGDVHJXQGDHWDSDGRSURFHVVRRHQFRQWURSUHVHQFLDO $QW{QLR3HGUR/RSHV (Portugal), Ana Cristina Mendes (CE), Fred Benevides (CE), Marcelo Evelin (PI), Sylvia Sousa (CE), Thereza Rocha (RJ). Apoio: 3UrPLR.ODXVV9LDQQD)81$57( Alpendre – Casa de Arte, Pesquisa e Produção ([SUHVVmR*UiÀFD A Cia da Arte Andanças está sediada no Alpendre Rua José Avelino, 495 Praia de Iracema Fortaleza-CE/Brasil Contatos: [email protected] http://ciadaarteandancas.wordpress.com/ http://tecidoafetivo.com WUDGXomRSDUDRLQJOrV VLWH 'LRJR-~QLRU ‡2HQFRQWURSUHVHQFLDOGRSURMHWR7HFLGR$IHWLYR²3RUXPD'UDPDWXUJLDGRHQFRQWURIRLUHDOL]DGRQRSHUtRGR GHDGHMXQKRQD3UDLDGH)OHFKHLUDV&HDUi 92 Cia da Arte Andanças A Companhia da Arte Andanças surgiu em 1991 e investiu na sua pesquisa de linguagem, intinerando por várias VDODV H HVSDoRV SHUPXWDQGR VHUYLoRV D ÀP GH FRQVHJXLU XP HVSDoR SDUD HQVDLRV DSRVWRX SHOD SULPHLUD YH] numa sede própria em 1994, ao abrir a Escola da Arte Andanças, que funcionou até 1996. A intinerância teve seu curso suspenso desde 1999, quando passa a sediar-se no Alpendre – Casa de Arte, Pesquisa e Produção, dividindo espaço, tempo e inquietações com outros artistas interessados na arte contemporânea, constituindo um novo espaço GHHQFRQWUR$OpPGDVLQIRUPDo}HVWpFQLFDVSHUWLQHQWHVjGDQoDHVSHFLÀFDPHQWHLQLFLDVHXPSURFHVVRLQWHQVRGH WURFDHSURGXomRFRPDV$UWHV3OiVWLFDVR9tGHRD/LWHUDWXUDHD)RWRJUDÀD No Alpendre, responsável pelo núcleo de dança, o trabalho da Cia ganha novos traços. Novos espetáculos são montados, cada vez mais na interface com outras linguagens– A Dança de Clarice (2000); Furdunço (2001); Vagarezas e Súbitos Chegares (2001); O Tempo da Delicadeza (2002), trabalho premiado pela Bolsa Vitae de Artes, que gerou o espetáculo e um vídeo-dança, realizado pelo vídeomaker Alexandre Veras; O Tempo da Paixão ou O Desejo é um lago azul (2005), livremente inspirado na obra do artista plástico Leonilson; Os Tempos (2008). (P  D &LD FRQFOXL MXQWR FRP RV SHVTXLVDGRUHV GR Q~FOHR R SURMHWR ,QWHUIHUrQFLD San Pedro, pesquisa trabalhada na interface entre as linguagens da Dança, da Literatura e do Vídeo, que resultou na produção de mais um vídeo-dança (San Pedro), de um vídeo documentário (Um navio à deriva) – ambos exibidos na TVC – e numa SXEOLFDomRGR1~FOHRDUHYLVWD,QWHUIHUrQFLDSan Pedro(PFRPRSUrPLR.ODXVV9LDQQDD&LDFRQVHJXH manter uma série de atividades de formação, ao longo de seis meses: disponibilização de acervo, aulas gratuitas para atores e bailarinos, curso e mostra de vídeo-dança, encontros com coreógrafos e artistas (3URMHWR (QWUH lugares). O projeto Tecido Afetivo – por uma dramaturgia do encontroWHYHSRUÀP²RXFRPHoRDUHDOL]DomRGHXP HQFRQWUR$R ORQJR GH  DQRV GH WUDEDOKR GH] GHOHV YLYLGRV LQWHQVDPHQWH QD H[SHULrQFLD FRPSDUWLOKDGD GR $OSHQGUH FDGDYH]PDLVUHDÀUPDPRVDLPSRUWkQFLDGRHQFRQWURHPQRVVDSUiWLFDDUWtVWLFDSURFHGLPHQWRIXQGDQWH de campos de forças, na arte e na vida. Atentos a diluição das fronteiras, entre linguagens e entre instâncias (arte e vida, por exemplo), interessa-nos UHÁHWLUFRPPDLVVLVWHPDWLFLGDGHVREUHDUHOHYkQFLDGRVPRGRVGHYLGDQDFRQVWLWXLomRGRVSURFHVVRVFULDWLYRVH PDLVHVSHFLÀFDPHQWHQRWHFLGRGUDPDW~UJLFRGDVREUDVFrQLFDVHSHUIRUPiWLFDV 2SURMHWRVHSURS{VDFRQYLGDUDUWLVWDVHRXSHVTXLVDGRUHVGHGLIHUHQWHVORFDLVGR%UDVLOGDiUHDGDGDQoDHGD SHUIRUPDQFHSDUDXPDFRKDELWDomRFROHWLYDGHGLDVQR&HDUiDÀPGHFRQYHUVDUHPHDSUR[LPDUHPLQTXLHWDo}HV sobre dramaturgia. Dela participaram também, além os integrantes da Cia da Arte Andanças, alguns artistas/ SHVTXLVDGRUHVFHDUHQVHV$H[SHULrQFLDJDQKDUiQRYRVGHVGREUDPHQWRVDSDUWLUGHVHXUHJLVWURDFRQIHFomRGH um site, a realização de um documentário, e a publicação de uma revista, contendo trechos dos diários de bordo do encontro. Atualmente, ainda habitamos o Alpendre, junto com outros artistas e grupos. 94 Produção Apoio Realização 2009