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Implicações da uma Era Pós-Biológica

As utopias são historicamente marcadas pela simbiose entre uma problemática social e uma solução técnica. Desde da edificação de cidades à invenção de utensílios que permitiam ultrapassar questões de ordem mecânica, a natureza das utopias teve não só uma origem de fundo numa falha identificada como biológica, como a solução apresentada recorre à técnica para perspectivar uma solução. Neste processo de problema/solução é indesmentível que o próprio humano se foi reconfigurando através do crescente uso da técnica que se expandiu à quase total dimensão da experiência. Digo quase, porque ainda nos consideramos essencialmente biológicos. Apesar de a técnica ser hoje parte fundamental no funcionamento da nossa civilização, é de comum acordo que o limite no qual se funda o biológico ainda não parece ter sido ultrapassado. Mesmo perante as possibilidades que a medicina, principalmente, nos trouxe com as vacinas, os antibióticos ou os pacemakers, invenções tecnológicas que não causam estranheza pela forma como irradiam problemas que na pré-modernidade eram do quotidiano. Hoje em dia, a possibilidade de alguém falecer vítima de uma constipação é reduzida, mas essa conquista possível através da técnica, parece ter-se tornado tão vulgar que todos tomam-na como garantida. Se a técnica era vista fundamentalmente como forma de curar o corpo humano sem “mexer” nele, actualmente à luz dos avanços científicos, nomeadamente nos campos da biotecnologia e da robótica, começa a ser possível teorizar sobre o melhoramento efectivo do corpo humano e das suas capacidades. A ideia de um pós-humanismo afigurou-se como projecção assente na possibilidade de com a ajuda da tecnologia, os humanos aumentarem exponencialmente a sua inteligência, ultrapassarem doenças e debilidades do seu corpo orgânico e enfim, vencer a morte. Neste trabalho irei referir-me em concreto à utopia tecnológica contemporânea chamada Singularidade. Em resumo, a Singularidade remete para a fundamental ligação histórica entre tecnologia e biologia que permitiu o progresso da civilização humana. Autores como Ray Kurzweil e Oswald Spengler encontram neste paralelo a pista para que a tecnologia criada pelo humano, mais cedo ou mais tarde irá ultrapassar a capacidade humana por um desejo inconsciente de imortalidade. Nesta altura, a biologia humana tornar-se-á obsoleta e não teremos outra opção senão permitir que a tecnologia, historicamente exterior, invada definitivamente o corpo humano. A esta definitiva fusão da tecnologia com o corpo humano é chamada pós-humanismo ou Singularidade. Nas previsões da Singularidade, o primeiro passo para a evolução tecnológica será alcançar a capacidade computacional do cérebro humano. Existem várias opções neste campo de investigação: computação com nanotubos (tubos normalmente de carbono com um nanómetro de diâmetro), computação molecular, computação com ADN, computação com electrões (spintronics), computação com luz e computação quântica. Esta última convém referir, tem obstáculo apenas na incapacidade em encontrar forma de manter estável a temperatura ambiente do computador, obstáculo que está prestes a ser vencido conforme relata em notícia o jornal Público . Todas estas tecnologias serão infinitamente superiores à capacidade do cérebro humano que, segundo Hans Moravec, cientista de robótica do Carnegie Mellon University, terá, no caso dos quânticos, a capacidade de executar 100 triliões de instruções por segundo contra por exemplo a retina do olho humano que captura e processa cerca de 10 milhões de imagens por segundo. Para Ray Kurzweil, autor do The Singularity is Near, a evolução tecnológica levou à computação que é um produto dos nossos cérebros e quando a computação atingir o nível do cérebro humano, através de tecnologias de computação e da compreensão/emulação do cérebro, a tecnologia suplantará o humano. Este processo levará à criação de métodos tecnológicos de melhoramento da espécie, através de biotecnologia e nanotecnologia. Kurzweil prevê que o humano fundir-se-á com a sua tecnologia melhorando-se a si próprio. Eventualmente, a tecnologia tornará a biologia obsoleta e o homem passará a ser mais máquina do que biológico. Aqui dar-se-á o início de uma era pós-biológica. Para chegar a este ponto a partir da actualidade (o livro data de 2004), Kurzweil aponta estratégias para o desenvolvimento de três áreas concretas e fala numa revolução “GNR”, genética, nanotecnologia e robótica, que trará um novo patamar evolutivo como relata Lipovetsky, “…segundo a corrente transhumanista, a união da genética, da robótica e das nano tecnologias permitirá transformar a própria definição do ser humano, o que constituirá uma mutação sem precedentes e verá o homem enriquecido nas suas capacidades fisiológicas e intelectuais: o cyborg verá a luz do dia e o techno sapiens terá substituído o homo sapiens. Ao mesmo tempo que exemplifica o poder da razão, a espiral da alta tecnologia não pára de segregar uma enorme quantidade de mitos e utopias….” . Nesta perspectiva, de uma era pós-biológica, várias questões urgem resposta. Tentarei no âmbito do seminário aqui responder às seguintes formulações: afinal, quais as implicações de uma pós-humanidade? Da mesma forma que Leroi-Gourhan afirmou que para sobreviver o humano colocou a memória fora do corpo humano e depositou-a na cultura através do utensílio, será que podemos afirmar que a Singularidade poderá implicar o retorno do utensílio, da técnica ao interior do ser humano? Não será essa fusão entre tecnologia e biologia um novo pharmakon, uma nova divisão do logos e da praxis, que fará o humano “esquecer-se” de ser humano? Por que razão surgem estes discursos que encaram a tecnologia como o El Dourado da civilização? Para tentar responder as estas questões, o caminho que me pareceu mais promissor, e articulando com as matérias do seminário, foi elaborar uma arqueologia da técnica tentando posteriormente perceber de que forma esta regressou ao interior do corpo humano num trajecto que nos leva desde do ponto de vista antropológico de Leroi-Gourhan até aos conceitos de dispositivo e biopolítica em Michel Foucault e Giorgio Agamben. Veremos depois, à luz desta arqueologia, que implicações terá uma era pós-biológica sabendo que o próprio Foucault lembra-nos que o “humanismo foi construído como um rosto na areia”… e um dia virá uma onda.

Trabalho para o Seminário ONTOTECNOLOGIAS DO CORPO Mestrado Ciências da Comunicação - Cultura Contemporânea e Novas Tecnologias Docente Professor Doutor Fernando Cascais - Implicações da uma Era Pós-Biológica - _________________________________________________________________ “The Singularity will represent the culmination of the merger of our biological thinking and existence with our technology, resulting in a world that is still human but that transcends our biological roots” Ray Kurzweil, The Singularity is Near Ano lectivo 2013/2014 Paulo Moisés Silvestre de Figueiredo Nota: este trabalho foi escrito de acordo com a ortografia antiga Índice Introdução……………………………………………………………….……….4 Uma antropologia da técnica…………………………………………………….7 A vida nua e a ciência……………………………………………………………9 Interface e reprodução………………………………………………………….13 Grandeza e fatalidade…………………………………………………………..16 Precaução e responsabilidade………………………………………………….19 Conclusão………………………………………………………………………21 Bibliografia……………………………………………………………………..23 Palavras-chave: singularidade, utopia, corpo, dispositivo, técnica Métodos Em relação com as matérias dadas nas aulas, e em articulação com bibliografia e filmografia seleccionada, consultada em diversos meios e formatos (físico e digital) na biblioteca da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa, na Biblioteca Nacional de Portugal, na Internet, e em livros por mim adquiridos. Todas as obras oscilarão entre o idioma português e inglês. Introdução “I regard myself as a patternist (…) the pattern is far more important than the material stuff that constitutes it (…) it’s through the emergent powers of the pattern that we transcend (…) Ordered in an innovative manner, and perhaps with the addition of some software (another pattern), we have the “magic” (transcendence) of technology”. Kurzweil, 2004:388 As utopias são historicamente marcadas pela simbiose entre uma problemática social e uma solução técnica. Desde da edificação de cidades à invenção de utensílios que permitiam ultrapassar questões de ordem mecânica, a natureza das utopias teve não só uma origem de fundo numa falha identificada como biológica, como a solução apresentada recorre à técnica para perspectivar uma solução. Neste processo de problema/solução é indesmentível que o próprio humano se foi reconfigurando através do crescente uso da técnica que se expandiu à quase total dimensão da experiência. Digo quase, porque ainda nos consideramos essencialmente biológicos. Apesar de a técnica ser hoje parte fundamental no funcionamento da nossa civilização, é de comum acordo que o limite no qual se funda o biológico ainda não parece ter sido ultrapassado. Mesmo perante as possibilidades que a medicina, principalmente, nos trouxe com as vacinas, os antibióticos ou os pacemakers, invenções tecnológicas que não causam estranheza pela forma como irradiam problemas que na pré-modernidade eram do quotidiano. Hoje em dia, a possibilidade de alguém falecer vítima de uma constipação é reduzida, mas essa conquista possível através da técnica, parece ter-se tornado tão vulgar que todos tomam-na como garantida. Se a técnica era vista fundamentalmente como forma de curar o corpo humano sem “mexer” nele, actualmente à luz dos avanços científicos, nomeadamente nos campos da biotecnologia e da robótica, começa a ser possível teorizar sobre o melhoramento efectivo do corpo humano e das suas capacidades. A ideia de um pós-humanismo afigurou-se como projecção assente na possibilidade de com a ajuda da tecnologia, os humanos aumentarem exponencialmente a sua inteligência, ultrapassarem doenças e debilidades do seu corpo orgânico e enfim, vencer a morte. Neste trabalho irei referir-me em concreto à utopia tecnológica contemporânea chamada Singularidade. Em resumo, a Singularidade remete para a fundamental ligação histórica entre tecnologia e biologia que permitiu o progresso da civilização humana. Autores como Ray Kurzweil e Oswald Spengler encontram neste paralelo a pista para que a tecnologia criada pelo humano, mais cedo ou mais tarde irá ultrapassar a capacidade humana por um desejo inconsciente de imortalidade. Nesta altura, a biologia humana tornar-se-á obsoleta e não teremos outra opção senão permitir que a tecnologia, historicamente exterior, invada definitivamente o corpo humano. A esta definitiva fusão da tecnologia com o corpo humano é chamada pós-humanismo ou Singularidade. Nas previsões da Singularidade, o primeiro passo para a evolução tecnológica será alcançar a capacidade computacional do cérebro humano. Existem várias opções neste campo de investigação: computação com nanotubos (tubos normalmente de carbono com um nanómetro de diâmetro), computação molecular, computação com ADN, computação com electrões (spintronics), computação com luz e computação quântica. Esta última convém referir, tem obstáculo apenas na incapacidade em encontrar forma de manter estável a temperatura ambiente do computador, obstáculo que está prestes a ser vencido conforme relata em notícia o jornal Público http://www.publico.pt/ciencia/noticia/novo-recorde-deixa-nos-mais-perto-do-computador-quantico-1612766 acesso a 07/12/2013, 18h46. Todas estas tecnologias serão infinitamente superiores à capacidade do cérebro humano que, segundo Hans Moravec, cientista de robótica do Carnegie Mellon University, terá, no caso dos quânticos, a capacidade de executar 100 triliões de instruções por segundo contra por exemplo a retina do olho humano que captura e processa cerca de 10 milhões de imagens por segundo. Para Ray Kurzweil, autor do The Singularity is Near, a evolução tecnológica levou à computação que é um produto dos nossos cérebros e quando a computação atingir o nível do cérebro humano, através de tecnologias de computação e da compreensão/emulação do cérebro, a tecnologia suplantará o humano. Este processo levará à criação de métodos tecnológicos de melhoramento da espécie, através de biotecnologia e nanotecnologia. Kurzweil prevê que o humano fundir-se-á com a sua tecnologia melhorando-se a si próprio. Eventualmente, a tecnologia tornará a biologia obsoleta e o homem passará a ser mais máquina do que biológico. Aqui dar-se-á o início de uma era pós-biológica. Para chegar a este ponto a partir da actualidade (o livro data de 2004), Kurzweil aponta estratégias para o desenvolvimento de três áreas concretas e fala numa revolução “GNR”, genética, nanotecnologia e robótica, que trará um novo patamar evolutivo como relata Lipovetsky, “…segundo a corrente transhumanista, a união da genética, da robótica e das nano tecnologias permitirá transformar a própria definição do ser humano, o que constituirá uma mutação sem precedentes e verá o homem enriquecido nas suas capacidades fisiológicas e intelectuais: o cyborg verá a luz do dia e o techno sapiens terá substituído o homo sapiens. Ao mesmo tempo que exemplifica o poder da razão, a espiral da alta tecnologia não pára de segregar uma enorme quantidade de mitos e utopias….” LIPOVETSKY, Gilles / SERROY, Jean, A Cultura Mundo – Resposta a uma Sociedade Desorientada; Edições 70, 2010. Nesta perspectiva, de uma era pós-biológica, várias questões urgem resposta. Tentarei no âmbito do seminário aqui responder às seguintes formulações: afinal, quais as implicações de uma pós-humanidade? Da mesma forma que Leroi-Gourhan afirmou que para sobreviver o humano colocou a memória fora do corpo humano e depositou-a na cultura através do utensílio, será que podemos afirmar que a Singularidade poderá implicar o retorno do utensílio, da técnica ao interior do ser humano? Não será essa fusão entre tecnologia e biologia um novo pharmakon, uma nova divisão do logos e da praxis, que fará o humano “esquecer-se” de ser humano? Por que razão surgem estes discursos que encaram a tecnologia como o El Dourado da civilização? Para tentar responder as estas questões, o caminho que me pareceu mais promissor, e articulando com as matérias do seminário, foi elaborar uma arqueologia da técnica tentando posteriormente perceber de que forma esta regressou ao interior do corpo humano num trajecto que nos leva desde do ponto de vista antropológico de Leroi-Gourhan até aos conceitos de dispositivo e biopolítica em Michel Foucault e Giorgio Agamben. Veremos depois, à luz desta arqueologia, que implicações terá uma era pós-biológica sabendo que o próprio Foucault lembra-nos que o “humanismo foi construído como um rosto na areia”… e um dia virá uma onda. Uma antropologia da técnica “Ó mon auguste mère, et vous enveloppe de la commune lumière, divin éther, voyez quels injustes tourments on me fait souffrir. Qui compatit à cette grande souffrance, qui s'approche du rocher désert où se tord Prométhée? Quelques pauvres filles, pieds nus” Ésquilo Discutir que efeito a técnica tem sobre o humano foi uma das preocupações fundamentais da modernidade. Afinal, a revolução industrial trouxe uma reconfiguração civilizacional na qual as máquinas tiveram um papel crucial. Bastará para tal, relembrar o papel da mesma na reestruturação das cidades, após o êxodo dos campos para os centros modernizados, onde as fábricas assumiam protagonismo na corrida para o progresso e para a utopia da abundância generalizada. Apesar desse carácter chave da modernidade na forma como reestruturámos identidades, como veremos em Foucault, a técnica havia já sido pensada pelos gregos que distinguiam sabedoria técnica ou Métis de racionalidade científica ou Episteme. Se a Métis é retractada por Homero com a astúcia, esperteza, habilidade de Ulisses na Ilíada, a Episteme relaciona-se com o descobrir a verdade do ser e em determinar a natureza universal. O homem da Tekné, dotado de Métis, era aquele que podia aduzir motivos razoáveis para as escolhas feitas no decurso da sua acção, para além de ser uma teoria da experiência e não apenas parcial e da teoria, que seria do âmbito da Episteme. Se de um homem dividido entre a Tekné e a Episteme, até ao sujeito soberano, incondicionado do Iluminismo, a modernidade veio pensar o sujeito como produto de selecção natural através de Charles Darwin. Esta progressiva libertação das restrições genéticas não quer dizer que nos libertámos da condição genética, essa condição sofreu transformações lentas (ou pequenas acumulações) e não uma ruptura. Nesse processo de acumulação de informação que é genético (dentro do corpo) e cultural (fora do corpo), o Homem, para sobreviver, colocou a memória fora do corpo depositando-o na cultura e assim, na linguagem que tem efeitos sobre nós através do utensílio. O corpo é assim um veículo/ mediador entre linguagem e utensílio. Leroi-Gourhan diz-nos justamente que esse utensílio estando no exterior tem um efeito sobre nós e cria um meio-ambiente. Dessa forma o utensílio colocado no exterior trará ao homem a possibilidade de fugir à necessidade de adaptação ao ambiente, criando o seu próprio meio libertando o humano de carências artesanais (por exemplo, a invenção do arado), como Karl Steinbuch nos afirma, “a tecnologia liberta o homem da necessidade material e concede-lhe alimento, matéria-prima, energia, higiene e comunicação, em suma, uma vida livre de carências, tornando assim possível uma existência com dignidade humana” In Machine and Man. On the way to a Cybernetic Anthropology (1971), 4ª edição . As implicações desta libertação da técnica para fora do corpo são visíveis desde logo na forma como estes utensílios suprimem determinadas insuficiências, trazendo outras diferentes. Se a técnica é desenvolvida para colmatar falhas biológicas, na verdade estas soluções trarão sempre novas formas de necessidade, nomeadamente a de incorporação da própria técnica, conforme Adriano Duarte Rodrigues nos lembra. “O homem deixa de poder contar para a sua sobrevivência, apenas com o apetrechamento dos seus dispositivos instintivos. Necessita também da incorporação de dispositivos que lhe ensinem as modalidades de concretização das instruções dos dispositivos instintivos, que façam a ponte entre os instintos e o mundo, preenchendo assim o hiato constitutivo do sistema pulsional” RODRIGUES, Adriano Duarte, A Experiência Técnica in CASCAIS, Fernando, MARCOS, Maria Lucília (Org.) (2004) Revista de Comunicação e Linguagens n.º 33: Corpo, Técnica, Subjectividades, Lisboa: ed. Cosmos. Dito de outra forma, a incorporação da técnica é um atributo necessário e progressivo na construção do mundo, uma vez que essa construção é um produto da própria técnica pela mão do homem. Note-se que a versão antropológica através de Leroi-Gourhan compreende a técnica como exterior e formadora de mundo mas ainda sob a alçada da mão, em forma de prótese, “os dispositivos artificiais passaram assim a apresentar-se como próteses destinadas a substituir o organismo humano e como órteses destinadas a aperfeiçoar o seu funcionamento“ Idem. Leroi-Gourhan acredita que no lento processo de passarmos a memória para fora do corpo, o cálculo passou do homem para a máquina, e questiona se o destino do homem será enfim a máquina, a que responde que o homem não muda de espécie ao passar para a máquina, existirá um “prolongamento da mesma” LEROI-GOURHAN, André (1990a), O Gesto e a Palavra, 1 - Técnica e Linguagem. Lisboa: Edições 70. Este carácter biológico conferido à técnica é atestado por Rodrigues “através da sua miniaturização e incorporação (...) restam cada vez menos dimensões da experiência que escapem à intervenção técnica, à medida que a tecnicidade se vai naturalizando” RODRIGUES, Adriano Duarte, A Experiência Técnica in CASCAIS, Fernando, MARCOS, Maria Lucília (Org.) (2004) Revista de Comunicação e Linguagens n.º 33: Corpo, Técnica, Subjectividades, Lisboa: ed. Cosmos. A questão fundamental para ambos os autores parece convergir no imperativo de se perceber quais as novas configurações que surgirão com a obsolescência do corpo humano. Gourhan mostra que ambas dimensão simbólica e técnica irão trazer tal representação da realidade, impossível de circunscrever. “O grande problema do mundo actual está por resolver: como é que este mamífero obsoleto, com necessidade arcaicas que constituíram o motor de toda a sua ascensão, irá continuar a empurrar o seu rochedo encosta acima, se um dia já só lhe restar a imagem da sua realidade?” (1990b: 227) Se tivermos em consideração que a proposta talvez fundamental da Singularidade é vencer a morte e ascender a uma pós-biologia, fará sentido pensarmos que na articulação entre o simbólico e a técnica encontram-se respostas culturais para a angústia ontológica provocada pela consciência da mortalidade, da finitude biológica da vida, não a morte da espécie humana, mas o fim da sua condição biológica. A vida nua e a ciência “Poderíamos dizer que ao velho direito fazer morrer ou de deixar viver se substituiu um poder de fazer viver ou de rejeitar para a morte” Foucault, 1977:142 No seguimento dos seus estudos sobre a loucura, Foucault conclui que a modernidade é uma sociedade atravessada e penetrada por mecanismos disciplinares e normalizadores que produzem realidade. Usando como exemplo o panóptico de Bentham, o autor de Vigiar e Punir conclui que este dispositivo normaliza a excepção e assegura o funcionamento automático do poder através de uma vigilância permanente em seus efeitos, mesmo se descontínuo, invisível e inverificável em sua acção. O individuo é uma peça no próprio sistema panóptico que se difunde assim no corpo social. Foucault aponta para o dispositivo arquitectónico de Bentham como um projecto inicial com vista prisões, mas que a tecnologia aqui explorada permitiu a extensão de métodos disciplinares a hospitais, escolas e oficinas. A utopia do panóptico pretende assim que o todo o individuo se transforme de vigiado a auto-vigiado, actuando sobre ele como sujeito e objecto. A sua subjectividade é assim alterada e o individuo normalizado, na medida do ideal humano da modernidade, nada menos que indivíduos sofisticados, cheios de necessidades e disfunções. Em suma, transformar o individuo num elemento disciplinado e produtivo. O panóptico é um dispositivo de poder na medida em que exerce a manipulação do corpo através das disciplinas com técnicas que tendem a cobrir o campo social inteiro. Na própria produção de poder, o aparelho panóptico normaliza e torna o corpo produtivo e submisso simultaneamente. O corpo mergulhado num campo político de actividade e passividade, traduz-se numa microfísica do poder, isto é, o poder produz-se a si próprio através do dispositivo. Se em Vigiar e Punir Foucault estuda o dispositivo do poder, em Vontade de Saber, o autor prossegue percebendo como o poder se apropria dos corpos, chegando ao dispositivo da sexualidade. Para tal, começa por perceber de que forma a civilização ocidental olhou para a ars erótica e para o corpo.Se nas civilizações antigas (grega e romana) e politeístas os prazeres e o uso do corpo configuram uma deontologia que perfila uma sociedade da vergonha e da aphrodisia, Foucault identifica na ascensão do cristianismo uma sociedade que explora a culpa e impõe uma relação do individuo com a carne. Uma ontologia monoteísta onde o prazer existe e é para ser reprimido pelo combate espiritual, renúncia e ascese. O facto de ser monoteísta implica que “todos os homens são iguais e criados à imagem de Deus” e que o mal é intrínseco à carne de toda a humanidade que se deve expurgar do pecado. O cristianismo inaugura com a “carne” uma matéria-prima transversal a toda a sociedade. Assim, antes do século XX não se fazia a experiência da sexualidade como na modernidade. Tinha lugar uma experiência cristã da carne e antes, uma experiência antiga pagã. Essa experiência adquire na modernidade novos contornos e como resposta à teoria da repressão proposta pela psicanálise, Foucault chega desta forma à scientia sexualis. Foucault diz-nos que com a evolução da medicina começam a surgir discursos produzidos sobre a sexualidade. Nomeadamente, diagnósticos e boas práticas que produzem pela primeira vez identidades sexuais e inclui a vida médica nos costumes das populações, “a clínica deve a sua real importância ao facto de ser uma reorganização em profundidade não só dos conhecimentos médicos, mas da própria possibilidade de um discurso sobre a doença. A discreção do discurso clínico remete às condições não-verbais e partir do que ele pode falar: a estrutura comum que recorta e articula o que se vê e o que se diz” (Foucault, 1980: 18). A clínica passa assim a estabelecer um discurso entre médico e doente, implementando uma “experiência clínica” (idem, pág. 131). Karin Knorr-Cetina chama a esta produção culturas epistémicas KNORR-CETINA, Karin, Epistemic Cultures: How the Science Makes Culture, Harvard University Press, New York, 1999, na medida em que a comunidade científica se interessa não na construção do conhecimento, mas nas máquinas que constroem o conhecimento, ou construccionismo social da ciência BOURDIEU, Pierre, Para uma Sociologia da Ciência, Lisboa: Edições 70, 2004 como diz Bourdieu. Contra o direito canónico, cristão e direito civil, a sexualidade passa a ser biomedicalizada, a produção da verdade do sexo é feita a partir da scientia sexualis e da ars erótica, e o conceito de “sexualidade” é o correlato discursivo da própria scientia sexualis. A ciência da sexualidade é assim a própria ars erótica da modernidade. A sexualidade é o meio pelo qual somos humanos e isso faz da sexualidade algo político, económico e social. Mas é uma criação moderna, por meio de discursos científicos, deixando de ser parte da vida privada passando para o domínio das preocupações do Estado que responsabiliza o individuo pela forma como se transmite e se reproduz, a sexualidade passa assim para o domínio da administração através da vanguarda científica. Nesta articulação de produção de poder e reconfiguração do sexo, através do aparelho Panóptico e dos discursos científicos sobre o corpo, e recuperando Heidegger quando este encara a técnica como capaz de colocar o mundo em estado de disponibilidade, fornecem a Foucault a fundamental noção de dispositivo que é nada menos que a rede performativa e de carácter estratégico, que se estabelece entre as práticas discursivas e não-discursivas, terminando a distinção entre técnica e linguagem. Para Knorr-Cetina, esse dispositivo técnico de produção de máquinas que constroem conhecimento seria o laboratório, espaço onde ocorrem transformações de objectos e se reconfiguram os cientistas. O resultado desta produção é uma comunicação das ciências, ou esbatimento da distinção comunicação/acção através da publicação e na elaboração de resultados científicos. O desenvolvimento de órgãos mediáticos inteiramente dedicados às descobertas científicas, atesta uma comunicação científica preocupada com o colocar descobertas em discussão no espaço público, embora em causa possam estar razões estritamente políticas, como a aposta da NASA na extensa cobertura no robô-sonda Curiosity, ou corporativas, bem explicito na guerra das patentes no mercado biotecnológico e nas telecomunicações como atestam recentes disputas entre a Google e a Samsung Patent wars: Tech giants sue Samsung and Google, http://www.bbc.co.uk/news/technology-24771421, acesso 11:24, 20/12/2013, o essay de Yongwook Paik e Feng Zhu The Impact of Patent Wars on Firm Strategy: Evidence from the Global Smartphone Market, http://hbswk.hbs.edu/item/7340.html, acesso 16:27, 12/12/2013 sobre estratégias corporativas de patenteamento e o documentário sobre a corporação Monsanto, Patent for a Pig (2006). No passado, estas práticas discursivas e não-discursivas da ciência como o Darwinismo Social e o Eugenismo, levaram à materialização de utopias de purificação e higiene racial em que, através de práticas sociais da tecnologia do sexo, o Estado administrava território e população, as suas características e os seus corpos. “Toda a prática social cuja forma simultaneamente exasperada e coerente foi o racismo de Estado, conferiu a esta tecnologia do sexo um poder temível e efeitos longínquos” (Foucault, 1977:123). E se estas estratégias de purificação elegem uma norma cuja fasquia é protótipo de excelência (uma campeão olímpico, um Nobel, um herói de guerra), criam também deste modo mecanismos de expulsões e rejeições a todos os que não se identificam. Ou seja, é o próprio sistema biopolítico que cria exclusões e condicionamentos sem que haja uma intervenção directa, como Agamben mais tarde observou. No caso do nazismo, implicava uma raça ariana pura livre de miscigenações e de doenças, onde o Eugenismo actuou. Para Foucault estes efeitos provenientes do nazismo disseminaram-se mesmo após o fim da 2ª Guerra Mundial, dando origem ao que ao autor chama de nascimento da biopolítica. Assiste-se a um crescimento e ordenação pelo poder produzido através da ortogénese, do trabalho, da normalização de comportamentos como vimos a partir do dispositivo panóptico. Retomando a citação com que abri este capítulo, Foucault aí demonstra que o Estado apodera-se da “vida nua” AGAMBEN, Giorgio, (1998) Homo Sacer: O Poder Soberano e a Vida Nua; trad. António Guerreiro. 1ªed. Lisboa: Presença dos seus cidadãos conforme nos aponta Agamben. A biopolítica não só transforma o biológico, ou Domus, em assunto prioritário de Estado, como adquire o poder de destituir qualquer um dos seus direitos, abandonando-o à natureza e suspendendo as suas possibilidades de ser. O homem moderno torna-se assim um “animal na política do qual a sua vida de ser vivo está em causa” Idem, diferente do “animal capaz de existência política” presente na filosofia aristotélica. Se na pólis grega os cidadãos eram-no na medida em que nasciam de homens livres e faziam uso da palavra, na modernidade a articulação entre o que os gregos chamavam de Zōē (vida, o biológico) e o Bios (forma de vida) é suspensa, e a potência aberta do homem de organizar de determinada maneira o mundo através da linguagem regride à vida nua ou seja, à incapacidade do homem fazer algo consigo próprio, estado que Agamben associa aos prisioneiros dos campos de concentração nazis. Esta zona de indistinção entre o fora o dentro, o autor apelida de estado de excepção ou da possibilidade do Estado poder devolver o homem ao seu estado biológico. Concluindo, se o advento do Cristianismo transformou a “carne” em matéria-prima, a ciência trabalhou-a e abriu caminho para a técnica voltar ao corpo. Mas não só. Neste processo, percebemos que o Estado aproveitou a deixa e apropriou-se da vida (Zōē e Bios) concedendo a si próprio o direito de, através de dispositivos normalizadores, encetar manobras de inclusão/exclusão do estatuto quer de cidadania, quer da definição de homem livre. Interface e reprodução “Each new technology is a reprogramming of sensory life” McLuhan 1969: 33 Após percebermos de que forma a técnica foi colocada fora do corpo e qual o caminho do seu regresso, tiremos agora algumas considerações e implicações de uma era pós-biológica. Agamben, no seu livro O Aberto: o Homem e o Animal refere que a máquina antropológica, onde o homem fazia uma produção de si próprio e construía o mundo com a linguagem, foi reconfigurada através da ciência. Partindo de uma iluminura pintada numa Bíblia hebraica do séc. XIII, conservada na Biblioteca Ambrosiana de Milão, ao autor atravessa autores como Bataille, Kojève, Lineu, Von Uexküll e Heidegger, para estabelecer que a criação de apparatus trouxe a linha que divide o humano do inumano e que cria uma cicatriz, uma fronteira / ferida entre homem e animal que é desviada para dentro do homem, colocando-o como estado de excepção. Ou seja, o homem só o é, na medida em que se reconhece como não sendo animal. Esta reconfiguração aproxima, por via das ciências do humanismo e do apparatus, o homem do não-ser, e a cesura ou ferida deslocada permite a reentrada da técnica no corpo. Técnica que se havia exteriorizado com a colocação da memória fora do corpo, como Leroi-Gourhan nos lembra, e que a alteridade entre ser e não-ser “convida” a reentrar. Por este ponto de vista, percebemos a razão para propostas que atribuem à técnica uma papel tão fundamental na evolução do humano. Do ponto de vista da arqueologia descrita faz sentido que assim o seja, apesar de ser evidente a necessidade de perceber de que forma esta redefinição do corpo ocorrerá. Para Kurzweil, será um processo de incorporação da tecnologia à medida que ela evolua no sentido de trazer benefícios medicinais. Mas também sabemos que ao mesmo tempo que a ciência possibilita esses benefícios, tem sido a mesma a reconfigurar a nossa relação com o corpo. “Diz-nos Panofsky que Leone Battista Alberti e Leonardo da Vinci são, respectivamente, profeta e inaugurador de uma revolução na representação do corpo humano – que se consumaria com Albrecht Dürer – e os únicos a terem dado passos decisivos para o desenvolvimento de uma teoria das proporções para além dos padrões medievais” CASCAIS, António Fernando, Entrar pelo Olhos Dentro: A Cultura Visual da Medicina, (2004) Revista de Comunicação e Linguagens n.º 33: Corpo, Técnica, Subjectividades, Lisboa: ed. Cosmos, esta possibilidade de corpo como objecto representacional privilegiado é, como Foucault nos diz, produto de uma nova subjectividade, em que o rigor científico assume preponderância em confronto com a estética. Passa a haver “uma procura feroz da transparência dos corpos” (Le Breton, 1989:160, 208), através de representações minuciosas, mais tarde aprofundadas com tecnologias que permitiram ver o interior do corpo e revelar discursivamente a imagem do seu interior. E o que está em causa, é precisamente uma dupla acção da ciência que ao mesmo tempo que reconfigura discursivamente o corpo, produz a realidade. Para Maria Augusta Babo, na redefinição do corpo, “as próteses passam a fazer um todo com o corpo, isto é, ganham uma aderência e um estatuto de carne (…) a pele torna-se uma interface, um lugar de articulação entre o corpo e os dispositivos”. Esta ideia de pele como interface relembra-nos também como a forma como a carne e a natureza se tornaram matéria-prima, e a biopolítica assumiu toda a sua preponderância. Se recordarmos as discussões públicas relativas à clonagem de seres humanos percebemos que os assuntos referentes ao corpo adquirem um estatuto de tópico não só de Estado como de Direitos Humanos universais. E embora, esta prática aguarde por dias menos conversadores da opinião pública, outras indústrias trabalham já a interface da pele de outros modos. A capacidade de construção de bases de dados mundiais de ADN MURPHY, Erin, The U.S. Is Building Massive DNA Databases http://www.scientificamerican.com/article.cfm?id=united-states-building-massive-dna-databases, acesso 08/12/2013, 18:17 e o licenciamento de venda de chips subcutâneos GREENBERG, Andrew, Want An RFID Chip Implanted Into Your Hand? http://www.forbes.com/sites/andygreenberg/2012/08/13/want-an-rfid-chip-implanted-into-your-hand-heres-what-the-diy-surgery-looks-like-video/ acesso 12/12/2013, 16:13 ou os recentes Google Glass Médicos portugueses testam Google Glass em cirurgias, http://www.noticiasaominuto.com/tech/144382/medicos-portugueses-testam-google-glass-em-cirurgias#.UqnmifRdXkU, acesso 12/12/2013, 16:40, redefinem já a maneira como observamos o corpo como matéria-prima e passível de ser penetrada por tecnologia. O ex-director da revista Wired e presidente da 3D Robotics (empresa que fabrica drones) diz justamente numa entrevista ao jornal Expresso que “a biologia sintética será o próximo grande acontecimento (…) a natureza é a derradeira fábrica (…) talvez o primeiro computador sintetizador de ADN apareça na próxima década” In Revista Expresso, nº 2146, 14 Dezembro 2013.. Nesta nova reconfiguração do corpo podemos tirar duas considerações. A primeira tem que ver com a noção de possibilidade de aperfeiçoamento como Maria Augusta Babo nos lembra, “o corpo humano, define-se não só pelas suas propriedades intrínsecas, mas por uma aptidão à adição que é a sua forma de ser afectado pelo meio exterior: corpo aberto ao acolhimento da prótese” BABO, Maria Augusta, Do Corpo Protésico ao Corpo in CASCAIS, Fernando, MARCOS, Maria Lucília (Org.) (2004) Revista de Comunicação e Linguagens n.º 33: Corpo, Técnica, Subjectividades, Lisboa: ed. Cosmos. A prótese passa assim a ser meio entre uma condição biológica entendida como falível ou incompleta, tal como o mito prometeico o sugere No conto de Prometeu Acorrentado, o motivo para o castigo dos deuses a Prometeu é pelo facto de este ter roubado o fogo aos deuses para entregar aos homens. Menos relevado é que Prometeu entrega o fogo aos homens devido a Epimeteu ter-se esquecido de agraciar os homens com qualidades que lhes permitissem sobreviver. O início da cultura tem deste modo uma premissa de falha biológica. O homem precisava da técnica para sobreviver., e a procura de um ideal de perfeição que não se distancia muito das premissas eugénicas. A questão da técnica incorporada no corpo acelera um projecto entendido como melhoramento (enhancement) e constitui o fim de uma ideia de humano. A segunda questão remete-nos para as possibilidades deste corpo híbrido que fica entre a carne e o objecto. Vários são os contos que nos sugerem cautela na procura de um equilíbrio nesta passagem a um pós-humano. A dificuldade em situar politicamente seres tecnicamente produzidos como o monstro de Frankenstein ou o robô de Metrópolis, entre o sujeito e o utensílio, conduzem-nos a uma questão fundamental prevista de algum modo por Walter Benjamin. Diz o autor que “o ritmo acelerado da técnica, a que corresponde também uma rápida decadência da tradição, faz emergir muito mais depressa do que antes o que há de inconsciente colectivo, o rosto arcaico de uma época, é fá-lo tendo em vista já a época que se segue. É daí que vem o olhar surrealista sobre a História” In Adenda a Teses sobre o Conceito de História, Walter Benjamin. Por tradição o autor entende o saber artesanal que era transmitido de mestre para aprendiz, sobretudo por via oral, ao que se opõe uma técnica originária na decisão fundadora na produção de objectos e na divisão entre homem, animal e mundo, que Agamben pretendia reconfigurar em O Aberto. Com o emergir da técnica, Benjamin pretende afirmar que o objecto se liberta do sujeito e produz-se na História, entrando na era da sua reprodutibilidade. Assim sendo, assumindo que a Singularidade propõe uma condição pós-humana em que o corpo passa progressivamente do híbrido biológico-máquina para objecto-total, entrará o próprio na era da sua reprodutibilidade técnica sob a égide da tecnociência. “O corpo é matéria-prima informacional como toda a natureza na era da tecnociência, sendo que a linguagem informacional não é meramente descritiva, mas operativa, cria aquilo que descreve (…) perdeu ao mesmo tempo a sua opacidade e a fronteira que o separava do mundo, a pele (…) é um simulacro que remodela a própria percepção (…) o corpo passa a ser pura informação calculável e puro organismo quantificável” CASCAIS, António Fernando, O Insacrificável, da Sacrificabilidade à Reticularidade, 2002. Mas antes de falarmos desta possibilidade do humano como objecto, algumas palavras sobre uma visão apocalíptica da técnica. Grandeza e fatalidade “Let me put it this way, Mr. Amor. The 9000 series is the most reliable computer ever made. No 9000 computer has ever made a mistake or distorted information. We are all, by any practical definition of the words, foolproof and incapable of error.” HAL, 2001 – Odisseia no Espaço O imaginário humano na modernidade está repleto de futurismos distópicos. Desde do “Prometeu moderno” presente em Frankenstein de Mary Shelley publicado pela primeira vez em 1818 até aos recentes Blade Runner (1982) e Matrix (1999), passando pela discussão da revolução industrial em Metropolis (1927) e Modern Times (1936), os avanços da tecnologia sempre causaram reacções polarizadas entre benefícios e perversidades. A ciência conseguiu inclusivamente criar uma identidade para aqueles que têm medo da tecnologia, os tecnofóbicos, ou em uma versão politizada se tornam em ambientalistas ou naturalistas. Rousseau dizia que a ciência e as suas consequências são produzidas por pessoas “ociosas que espalham paradoxos que podem comprometer a moralidade e a virtude na sociedade” (1978, p. 326). O autor acreditava que as ciências se originaram em sociedades que se encontravam em decadência e enfraquecimento moral, sociedades nas quais as virtudes foram perdendo o seu espaço na vida dos homens à medida que estes foram conhecendo e gostando do luxo, da vaidade e do prazer com diversões ociosas, trocando a colectividade por um individualismo, com vista apenas interesses e desejos próprios. É a partir desta visão que Rousseau defende a tese de que as ciências (e as artes) contribuíram para corromper a sociedade, ao invés de aprimorá-la. Heidegger exprime uma descrença na possibilidade do utopismo humanista proporcionar antídoto eficaz para os perigos da técnica e à qual Jonas chama de “heurística do medo” Heuristik der Furcht na tradução original que daria “heurística do temor” na sua crítica a Kant pelo seu modelo antropocêntrico de ética. Heidegger faz, neste sentido, uma crítica da concepção antropológica de técnica ultrapassando uma desvalorização da Tekné que aparece na Grécia Antiga, e que opunha Theoria e Tekné. Para ele, o sujeito não controla a técnica, é feito por ela e critica que a técnica seja a aplicação prática da ciência moderna da natureza, ou seja, que do lado da ciência esteja o pensamento (Episteme), e do lado da técnica esteja a execução (Tekné). Heidegger diz que a ciência moderna é experimental e quantificadora que produz conhecimento, baseado em experimentação, método experimental e aparato experimental que é conseguido por um conjunto de instrumentos de mediação. Do ponto de vista de Heidegger, a teoria é assim já técnica. O rigor da ciência moderna é eficácia técnica, e o critério do rigor científico é a eficácia para criar o real, sem variáveis e como deve de ser. A logoteoria, ou o pensamento como objecto, passa assim a logotécnica ou tecnociência. Para o autor, a essência da técnica não está, no entanto, nos seus produtos, mas na capacidade de produção de sentido e linguagem. Enquanto a técnica artesanal humanizava e libertava, transformando a natureza, a técnica moderna responde pela produção de sentido que é uma produção / interferência dos seus próprios fins, ou antes, uma resposta de cálculo. A capacidade de pensar foi, para Heidegger, capturada pelo cálculo das máquinas, e salvaguarda o pensamento estético (o jogo do produzir sentido, da possibilidade) que ainda foi transferido do homem para a técnica. Heidegger adverte que a crescente produção de sentido traduz-se num mundo onde cada vez mais os objectos dominam a realidade. O mundo onde “caímos”, que está cada vez mais preenchido de objectos e ao qual temos de nos adaptar se quisermos tornarmo-nos seres-aí. O que o autor receia é que a adaptação ao mundo dos objectos seja também ela instrumentada pela técnica de modo que para uma bem-sucedida inserção o homem seja obrigado a pôr à disposição e transformar tudo em matéria-prima, como também relembra Spengler, dizendo que a técnica possibilita a realização de desejos permanentemente insatisfeitos através da manipulação de recursos disponíveis. O perigo não está na técnica, mas no que Heidegger apelidou de Gestell, ou estado de disponibilidade total do mundo para servir os propósitos de uma adaptação a um mundo de objectos. Assim como Junger, Heidegger, acreditava que a característica sobre-humana exigia um esforço sobre-humano para a combater. Ambos advogavam uma mobilização total. Enquanto a técnica mobilizava as energias de uma nação inteira, um grupo, uma geração, só um sobre-humano para mobilizar essa mesma nação para superar a técnica. Em Heidegger esta mobilização é analítica existencial do Dasein, ou a experiência de queda num mundo ao qual não pedimos para vir. O homem procura a partir daqui a sua autenticidade, ele é primeiro ex-istência e só depois in-sistência, que culmina no ser-no-mundo (Dasein), mas num mundo que para onde olho vejo objectos técnicos. Esta independência e aperfeiçoamento da técnica são secundados por Spengler que rejeita o processo evolucionista lento de Darwin e acredita que houve uma mutação repentina que deu ao homem o uso total da mão. Spengler identifica o mesmo processo mutacional originário que Heidegger: a linguagem. “A característica exclusiva da técnica humana, está radicada no facto de ela ser independente da vida da espécie humana. O homem é, em toda a história, do mundo dos seres vivos, o único exemplo de individuo capaz de escapar à coesão da espécie. (…) Na existência do homem a técnica é consciente, voluntária, susceptível de modificação, pessoal, imaginativa e exaustiva. Pode ser apreendida ou aperfeiçoada. O homem tornou-se no criador da sua própria técnica vital; nisto consiste a sua grandeza e a sua fatalidade” SPENGLER, Oswald, O Homem e a Técnica (1931); pref. de Luís Furtado; trad. de João Botelho. Lisboa: Guimarães Editores, 1980. Uma versão totalizante da técnica compreende uma progressiva imersão do humano num mundo de objectos e numa segunda realidade. Da mesma forma que no filme Matrix, tomar a pílula azul ou a vermelha levar-nos-ia sempre a um mundo dominado pelas máquinas. No entanto, saindo de livre vontade do Matrix, Neo será esta espécie de homem heróico ou o Übermensch nietzscheano. A sua queda no mundo verdadeiro e a procura da sua autenticidade por intermédio da relação com Trinity, levam-no a assumir o papel de combate contra a técnica omnipresente, luta virtualmente impossível de perpetuar no programa delineados pelas máquinas para controlo dos humanos. Mas para que o Matrix fosse possível, entende-se que as máquinas conquistaram algures a peça que lhes falta: o pensamento estético, ou pelo menos, uma forma de cálculo que o simule. Precaução e responsabilidade “A vida perdeu o seu mistério” Lucien Sève A possibilidade de uma “reprodução técnica do corpo” transmite-nos inquietações quanto as suas práticas e urge perceber se, primeiro, o modelo civilizacional actual é propício a uma Singularidade tecnológica. Segundo, que propostas se podem fazer para promover uma transição que não envolva premissas de exclusão que resultem em algo similar ao Eugenismo? Lopes Barbosa identifica duas dimensões de discussão BARBOSA, João Lopes, (2004) Um Segundo Génesis? Inquietações de um Tempo em que a Tecnociência Acaba com Barreiras Ancestrais, 1ª ed. Lisboa: Apenas Livros, uma de ordem intrínseca (as práticas são aceitáveis em si mesmas?) e outra de ordem extrínseca (as práticas são aceitáveis pelas suas consequências?). De um lado admite-se uma visão dualista de que a natureza (bom e puro) está de um lado e o homem de outro (impuro, artificial e nocivo) que existe de facto uma lei ou ordem natural das coisas que não deve ser ultrapassada e uma manipulação da natureza é encarada como subversiva, acusando-se o homem de quer ser “senhor e possuidor da natureza”, como Descartes defendia que devia ser a aliança entre ciência e técnica. Este naturalismo encontra paralelo igualmente no argumento da condição religiosa em que homem manipula a natureza e quer fazer de Deus. Aquilo a que Gaston Bachelard chamou de complexo de Prometeu In Psicanálise do Fogo, Lisboa: Litoral, 1989 que consiste em querermos saber tanto ou mais do que os nossos progenitores. Neste devir do Homem da cultura deverá ele deverá fazer da natureza um seu património e explorá-la em si proveito para satisfação de necessidades. Como diz Lopes Barbosa, “a natureza passa a ser contabilizada em função da sua maior ou menor potencialidade para servir o ser humano”. O autor indica que não só a natureza se submete ao homem, como este a transforma e modifica geneticamente. Não só dominamos a vida e a colocámos ao nosso serviço (como dizia Heidegger, “pôr tudo à disponibilidade”), como a criamos previamente exactamente à medida das nossas necessidades. Do lado das inquietações de ordem extrínseca, figuram riscos concretos como a saúde e o ambiente. Existem três atitudes no que concerne aos riscos: optimismo (progresso científico sem riscos ou com riscos perfeitamente controláveis), pessimismo (os que receiam resultados catastróficos e poluição genética) e reservada-moderada (existem alguns problemas a ter em conta). No âmbito destes argumentos, Lopes Barbosa coloca duas questões fundamentais: estaremos a ir demasiado depressa e se, apesar da tecnologia existente apontar de facto para algo similar à proposta da Singularidade a “breve” trecho, estaremos preparados para isso? A segunda questão prende-se com a responsabilidade desse progresso tecnológico atender certas necessidades e não o inventar “só porque sim”. Em ambas as questões residem problemas fundamentais: será que um sistema económico que premeia lucro e competitividade a todo o custo e uma fixação nos atributos é o sistema mais indicado para uma Singularidade tecnológica? Tomemos por exemplo a questão de acesso à tecnologia cuja dinâmica se prende com oferta-procura e valorização-desvalorização. Sabendo que no actual paradigma económico tanto a biotecnologia, como obviamente a nanotecnologia e a robótica não serão de todo acessíveis a qualquer consumidor. Este modo de acesso poderá inclusivamente adquirir contornos políticos uma vez que reconfigura a noção que temos de humano, e tornar-se mais que biopolítica, uma tanato-política como previa Foucault. Entrando no domínio de Estado, o acesso a esta tecnologia exigirá não só poder financeiro como um manancial de competências ao alcance apenas de alguns. Sabemos que, como observava Breton, a obsolescência do corpo humano é algo desejado pela cibercultura e pelo pós-humanismo, e que a ciência reconfigurou a forma como pensamos o corpo na modernidade, serão estes requisitos uma condição geralmente aceite socialmente? Ou estaremos a caminhar demasiado rápido nesse sentido, em que quem ficar para trás, perderá simplesmente a corrida? Essa é inclusive uma das premissas dos pós-humanistas: a obsolescência do corpo é também a obsolescência das competências enquanto ser biológico. Observamos actualmente uma reconfiguração do mercado de trabalho com a crescente mecanização do trabalho e respectivo desemprego tecnológico, e podemos por aqui perceber um dos riscos de uma Singularidade antes do seu tempo: um desajuste com as competências das populações, para quem o acesso a tais tecnologias será um desafio. Gilbert Hottois propõe neste sentido uma via intermédia na bioética. O autor começa por atribuir à espécie humana uma plasticidade e, recorrendo a Packard/Delgado reformula a pergunta “o que é o homem” para “que tipo de homem iremos fazer”. Para Hottois a questão de o que vamos fazer do homem, torna-se assim urgente, na medida em que este está cada vez mais interpelado pela tecnociência. Diz também que resposta poderá “por em causa as gnoses escatológicas da humanidade e da história”. Existem três respostas possíveis a esta questão: a escolha do todo tecnocientífico e dar total liberdade à tecnociência para realizar as suas capacidades. Por outro lado, a renúncia à tecnologia e conservação do homem-natureza. E uma terceira via média de certos possíveis tecnocientíficos em função de critérios a determinar, mediante ao Hans Jonas descreveu como avanços cautelosos, pesando consequências para futuras gerações. Conclusão “Agora os objectos vêem-me” Paul Klee (2001) Com o auxílio de diversos autores, vimos nestas páginas que, se numa primeira instância a técnica foi colocada fora do corpo, foi através dos dispositivos de poder e da sexualidade, que a ciência conseguiu reconstruir as identidades e reentrar no campo do biológico. A linguagem através do discurso científico abriu assim caminho para uma discussão sobre o interior do corpo reconfigurando-o, e deste modo a técnica se alarga à totalidade da experiência, sendo objecto de vontade e finalidade. Se a representação do corpo se reconfigura através do seu meio, adaptando a premissa de McLuhan de que “a mensagem é o médium”, é compreensível que tanto os Raios X, como a fotografia e mais tarde o cinema, tenham progressivamente trazido novas perspectivas sobre o corpo que se alastram a toda a dimensão da vida. Maria Teresa Cruz observa justamente que “o que está em causa no simulacro e na sua tecnologia específica é (…) a possibilidade de recriar a experiência da tangibilidade da vida, em todas as suas dimensões, e não a mera aparência das coisas” (Cruz, 2003:67). Kittler dizia precisamente que o que está em projecto é uma integração dos media, e uma redefinição da experiência total em que o homem irá coincidir com a sua simulação KITTLER, Friedrich, Gramophone, Film, Typewriter (1986), Trad. Geoffrey Winthrop-Young e Michael Wutz, Stanford University Press, California 1999 . Walter Benjamin diz que nada separa o homem e a natureza, existe um “entre” que é preenchido com a técnica e sendo em certo grau natureza coexiste com as duas dimensões: o insalvável e o salvável. Na natureza, Benjamin inscreve as ideias e as obras de arte é contrapõe à história como esfera da revelação. A “noite salva” é o nome de uma natureza restituída a si própria. As ideias recuperam a animalidade não para resgatar da noite, mas antes para restitui-la ao seu fechamento. A técnica não é o domínio da natureza, é o domínio da relação entre a natureza e o homem. Segundo Benjamin a máquina antropológica já não articula natureza e homem para produzir o humano através da suspensão e captura do inumano. A máquina, por assim dizer, parou, está em estado de detenção e, na suspensão recíproca dos dois termos, instala-se entre natureza e humanidade algo para o qual ainda não temos nome, mas que se mantém na noite salva. Note-se que ao longo deste trabalho o objecto tem progressivamente acentuado uma transferência de poder do corpo-individual para a espécie-massificada. Isto é, se a microfísica do poder no dispositivo panóptico se ocupava do individuo, a biopolítica ocupa-se do que Toni Negri chamou de multidões por exclusão ou inclusão. Deste modo podemos aferir que o desenvolvimento da técnica criou condições para o condicionamento entre estes estados de vida e forma de vida. Diria que este condicionamento é do presente, mas assume uma condição totalizante quando pensa até o futuro em forma de planeamento estratégico. Peter Drucker disse em tempos que “a melhor maneira de prever o futuro é criá-lo”, apelando a um investimento forte na área das ciências com o objectivo de materializar uma ideologia de criatividade e empreendedorismo cimentada nas novas tecnologias. Podemos encontrar a mesma apologia no nosso objecto de estudo: a Singularidade promove um condicionamento da espécie através do objecto sob o tecto de uma suposta obsolescência da carne. Agamben observa que as características biológicas não são condição do homem livre, mas uma falsa cidadania. O pós-humanismo aufere à carne um atributo de exclusão e admite que a cedência ao cyborg será condição para se ter direito a viver. Nas palavras de Hans Moravec, um dos mais famosos pós-humanistas, o radicalismo acentua-se, “o mundo pós-biológico é um mundo em que a raça humana foi varrida pela vaga de mudança cultural, espoliada pela sua progenitura artificial. Quando tal acontecer, o nosso ADN ficará sem emprego, tendo perdido a corrida evolutiva contra um novo tipo de concorrente” MORAVEC, Hans, (1992) Homens e Robots: O Futuro da Inteligência Humana e Robótica; trad. José Luís Malaquias F. Lima; Rev. Científica de Carlos Fiolhais. Lisboa: Gradiva. Percebemos que todo este aparato tecnológico constitui a máquina sem rosto a qual o cidadão não pode responsabilizar porque é “infalível”, e assume-se como a negação última do humanismo e a melhor definição da heideggeriana segunda natureza que captura o Homem. A Singularidade promove um condicionamento da espécie através do objecto sob o tecto de uma suposta obsolescência da carne auferindo-lhe um atributo de exclusão e admite que a cedência ao cyborg será condição para se ter direito a viver, ou a “vida que não merece viver” Título de capítulo da obra Homo Sacer de Agamben. Como observou oportunamente Ieda Tucherman, “o pós-humano não é o fim do mundo, mas o fim de uma concepção do humano” TUCHERMAN, Ieda, Breve História do Corpo e de seus Monstros, 2a ed. Lisboa, Vega, 2004 porém, os desafios da condição pós-humana, surgem a partir do momento em que os discursos políticos, sociais e económicos alicerçados no humanismo se mostram insuficientes para fazer face a novos devires do humano. Neste âmbito parece-me pertinente o estudo de discursos emergentes que trabalham as implicações da pós-humanidade, por forma a evitar erros cometidos no passado. Bibliografia exploratória: AGAMBEN, Giorgio, (2011) O Dispositivo, Lisboa: Edições 70 AGAMBEN, Giorgio, (2011) O Aberto: o Homem e o Animal; trad. André Dias, Ana Bigotte Vieira; rev. Davide Scarso. Lisboa: Edições 70 AGAMBEN, Giorgio, (1998) Homo Sacer: O Poder Soberano e a Vida Nua; trad. António Guerreiro. 1ªed. Lisboa: Presença AGAMBEN, Giorgio, (2010) Estado de Excepção; trad. Miguel Freitas da Costa. Lisboa: Edições 70 BARBOSA, João Lopes, (2004) Um Segundo Génesis? Inquietações de um Tempo em que a Tecnociência Acaba com Barreiras Ancestrais..., 1ª ed. Lisboa: Apenas Livros MARCOS, Maria Lucília; MIRANDA, José A. Bragança de (Org), Revista de Comunicação e Linguagens n.º extra: A Cultura das Redes, Lisboa, Relógio d'Água, 2002 CASCAIS, Fernando; MARCOS, Maria Lucília (Org.) (2004) Revista de Comunicação e Linguagens n.º 33: Corpo, Técnica, Subjectividades, Lisboa: ed. Cosmos KNORR-CETINA, Karin, Epistemic Cultures: How the Science Makes Culture, Harvard University Press, New York, 1999 FOUCAULT, Michel, (1984) Vigiar e Punir, Petrópolis: Vozes, 3ª ed. Lisboa FOUCAULT, Michel (1977) A Vontade de Saber. Lisboa: Edições António Ramos HOTTOIS, Gilbert, (2004) Philosophie des Sciences, Philosophie des Techniques, Paris: Odile Jacob HOTTOIS, Gilbert, O Paradigma Bioético: Uma Ética Para a Tecnociência (1990); trad. Paula Reis. Lisboa: Salamandra, 1992 JONAS, Hans, Ética, Medicina e Técnica (1985); pref. e trad. Fernando António Cascais. 1ªed. Lisboa: Veja, 1994 KAKU, Michio, (2001) Visões: Como a Ciência Irá Revolucionar o Século XXI; trad. Maria Carvalho; rev. Científica J. Félix Costa. 3ªed. Lisboa: Bizâncio KURZWEIL, Ray, (2006) The Singularity is Near, Gerald Duckworth & Co Ltd, USA LEM, Stanislaw, Summa Technologiae, Electronic Mediations (1964) trad. Joanna Zylinska. Edição University of Minnesota Press, EUA 2013 LEROI-GOURHAN, André (1990a), O Gesto e a Palavra, 1 - Técnica e Linguagem. Lisboa: Edições 70 LEROI-GOURHAN, André (1990b), O Gesto e a Palavra, 2 - Memórias e Ritmos. Lisboa: Edições 70 MORAVEC, Hans, (1992) Homens e Robots: O Futuro da Inteligência Humana e Robótica; trad. José Luís Malaquias F. Lima; rev. Científica de Carlos Fiolhais. Lisboa: Gradiva SPENGLER, Oswald, O Homem e a Técnica (1931); pref. de Luís Furtado; trad. de João Botelho. Lisboa: Guimarães Editores, 1980 TUCHERMAN, Ieda, Breve História do Corpo e de seus Monstros, 2a ed. Lisboa, Vega, 2004 Bibliografia on-line: MURPHY, Erin, The U.S. Is Building Massive DNA Databases http://www.scientificamerican.com/article.cfm?id=united-states-building-massive-dna-databases, acesso 08/12/2013, 18h17 GREENBERG, Andrew, Want An RFID Chip Implanted Into Your Hand? http://www.forbes.com/sites/andygreenberg/2012/08/13/want-an-rfid-chip-implanted-into-your-hand-heres-what-the-diy-surgery-looks-like-video, acesso 12/12/2013, 16h13 Médicos portugueses testam Google Glass em cirurgias, http://www.noticiasaominuto.com/tech/144382/medicos-portugueses-testam-google-glass-em-cirurgias#.UqnmifRdXkU, acesso 12/12/2013, 16h40 Novo Recorde Deixa-nos Mais perto do Computador Quântico, http://www.publico.pt/ciencia/noticia/novo-recorde-deixa-nos-mais-perto-do-computador-quantico-1612766, acesso a 07/12/2013, 18h46 Anunciado Megaprojecto Norte-Americano de Mapeamento do Cérebro, http://www.publico.pt/ciencia/noticia/anunciado-megaprojecto-norteamericano-de-mapeamento-do-cerebro-1589904, acesso 07/12/2013, 18h48 The Impact of Patent Wars on Firm Strategy: Evidence from the Global Smartphone Market, http://hbswk.hbs.edu/item/7340.html, acesso 12/12/2013, 16h27 Patent wars: Tech giants sue Samsung and Google, http://www.bbc.co.uk/news/technology-24771421, acesso 20/12/2013, 11h24 Filmografia: KUBRICK, Stanley, 2001 – Odisseia no Espaço, Warner Bros, 1968 JENTZSCH, Christian, Patent for a Pig, Documentário, 2006 WACHOWSKI, Andy, WACHOWSKI, Larry, Matrix, Warner Bros, 1999 28