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FIFA: Aspectos históricos, organizacionais e políticos

2018, RBFF - Revista Brasileira de Futsal e Futebol

Sendo o esporte um mecanismo cultural utilizado ao longo do século como incentivo à paz e à união dos povos, a FIFA possui um papel fundamental na sua organização em escala mundial. A presente pesquisa tem assim o objetivo geral de analisar e compreender o comportamento da FIFA na questão histórica de desenvolvimento e seus aspectos políticos. Busca-se especialmente observá-la a partir dos anos 1990, devido ao contexto mundial globalizado e ao contexto interno ao qual fora submetido a organização durante a presidência do brasileiro João Havelange (1974-1998).

186 Revista Brasileira de Futsal e Futebol ISSN 1984-4956 versão eletrônica P e r i ó d i c o do I n s t i t u t o B r a s i l e i r o d e P e s q u i s a e E n si n o e m F i s i o l o gi a do E x e r c í c i o w w w . i b p e f e x . c o m . b r / w w w . r b f f . c o m . b r FIFA: ASPECTOS HISTÓRICOS, ORGANIZACIONAIS E POLÍTICOS Juliano Oliveira Pizarro1 Carmen Silvia de Moraes Rial1 RESUMO ABSTRACT Sendo o esporte um mecanismo cultural utilizado ao longo do século como incentivo à paz e à união dos povos, a FIFA possui um papel fundamental na sua organização em escala mundial. A presente pesquisa tem assim o objetivo geral de analisar e compreender o comportamento da FIFA na questão histórica de desenvolvimento e seus aspectos políticos. Busca-se especialmente observá-la a partir dos anos 1990, devido ao contexto mundial globalizado e ao contexto interno ao qual fora submetido a organização durante a presidência do brasileiro João Havelange (1974-1998). FIFA: historical, organizational and political aspects Palavras-chave: FIFA. História. Organização. Política. The sport is a cultural mechanism used throughout the century as an incentive to peace and union of peoples, and the FIFA has a key role in your organization worldwide. This research thus has the general objective to analyze and understand the behavior of the FIFA in the historical development and the political aspects. The work aims to understand especially from the 1990s, due to the globalized world and the internal context in which the organization had been subjected during the presidency of the Brazilian João Havelange (1974-1998). Key words: Policy. 1-Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), Florianópolis-SC, Brasil. FIFA. History. Organization. E-mail do autor: [email protected] [email protected] Revista Brasileira de Futsal e Futebol, São Paulo. v.10. n.37. p.186-192. Maio/Jun./Jul./Ago. 2018. ISSN 1984-4956 187 Revista Brasileira de Futsal e Futebol ISSN 1984-4956 versão eletrônica P e r i ó d i c o do I n s t i t u t o B r a s i l e i r o d e P e s q u i s a e E n si n o e m F i s i o l o gi a do E x e r c í c i o w w w . i b p e f e x . c o m . b r / w w w . r b f f . c o m . b r INTRODUÇÃO Com a “missão” de organizar o futebol em âmbito internacional, a FIFA é uma organização que se autodenomina nãogovernamental e sem fins lucrativos. Contudo, possui uma gestão corporativa que comanda um mercado bilionário a nível global, principalmente a partir do mandato do expresidente João Havelange (1974-1998). Este foi responsável por introduzir um legado de cultura de mercado, como a de uma grande corporação internacional, projetando o futebol como um produto. Cada vez mais, a organização cresce em número de filiados, onde cada confederação possui campeonatos em nível interno, mas que são subordinadas às suas regras internacionais. A presente pesquisa tem assim o objetivo geral de analisar e compreender o comportamento da FIFA na questão histórica de desenvolvimento e seus aspectos políticos. Busca-se especialmente observá-la a partir dos anos 1990, devido ao contexto global e interno ao qual fora submetido a organização durante a presidência do brasileiro Havelange. MATERIAIS E MÉTODOS A pesquisa possui duas dimensões de análise – histórica e organizacional – partindo para uma discussão das questões políticas que envolvem a FIFA, onde se busca entender essa relação, baseando-se principalmente em fontes bibliográficas, documentais, sites e pesquisas acadêmicas publicadas. Os procedimentos metodológicos que norteiam a presente pesquisa são de caráter exploratório-descritivo, estudando-se o caso da FIFA com uma abordagem qualitativa, buscando compreendê-la como o principal ator da governança global desportiva, através de suas características e comportamentos. RESULTADOS Em 1974, substituindo Stanley Rous, tomou posse como presidente da FIFA o brasileiro João Havelange, sendo o primeiro presidente não europeu, ficando no cargo por 24 anos. Foi na gestão de Havelange frente à FIFA que a entidade passou a ter uma visão comercial, sendo o futebol visto como um negócio global. Primeiramente, Havelange conquistou a presidência da FIFA e anunciou que venderia um produto chamado “futebol” ao mundo, além de apontar como novos protagonistas do futebol mundial países da África, Oriente Médio e Ásia, o qual deram a ele uma ampla base de apoio (Darn, 2011, p. 61-62). João Havelange tinha um plano de governança ambicioso para a FIFA. Visava expandir o futebol para regiões até então pouco atendidas, fazendo com que essas ações lhe garantissem sua permanência na presidência por muitos anos. Porém, aliado a isso, trouxe à tona a importância da instituição em possuir parceiros comerciais, mantendo a parceria com a CocaCola e trazendo a Adidas como sua patrocinadora e fornecedora de materiais esportivos. Sobre os patrocínios desse período, Giglio (2013, p. 102) aponta que entre os patrocinadores mais fiéis à FIFA estão a Adidas e a Coca-Cola. A Adidas tomou-se ao longo do tempo uma grande aliada de Havelange (Jennings, 2011; Smit, 2007), porém, ele diz que nem sempre foi assim: “Quando eu cheguei à FIFA em 74, a Adidas já era [a patrocinadora] e ela fez naquela ocasião uma campanha a favor do Stanley Rous contra mim". Já a Coca-Cola, muito atenta à visibilidade e disseminação de sua marca por meio do esporte, patrocina os Jogos Olímpicos desde 1928 e segundo Soares e Vaz (2009, p. 488), o contrato com o COI vai até 2020 e ela “[...] foi uma dessas empresas que nos anos 70 investiu na disseminação da imagem que o gosto de seu produto atinge todas as culturas, povos e etnias". Para Sugden e Tomlinson (1998, p.25), Havelange teve méritos resolvendo tensões entre a FIFA e suas confederações filiadas. Tensão com a Confederação SulAmericana de Futebol (CONMEBOL), por exemplo, tiveram desfechos pacíficos, pois Havelange advogava em nome dos emergentes do Terceiro Mundo e em nome de suas demandas, assim como lidava com empresas e federações. Além disso, outras grandes transformações ocorreram no período em que Havelange assumiu o poder, fazendo com que Revista Brasileira de Futsal e Futebol, São Paulo. v.10. n.37. p.186-192. Maio/Jun./Jul./Ago. 2018. ISSN 1984-4956 188 Revista Brasileira de Futsal e Futebol ISSN 1984-4956 versão eletrônica P e r i ó d i c o do I n s t i t u t o B r a s i l e i r o d e P e s q u i s a e E n si n o e m F i s i o l o gi a do E x e r c í c i o w w w . i b p e f e x . c o m . b r / w w w . r b f f . c o m . b r houvesse uma grande mudança e um grande aumento da entidade. Magalhães (2013, p. 43) aponta que Havelange, presidente da FIFA durante 24 anos, comandou um período de profundas mudanças na organização. Nadador e jogador de polo aquático olímpico quando jovem, Havelange se destacou como administrador de futebol pelo aumento do número de participantes da Copa do Mundo da FIFA de 16 para 32, pela criação de novas competições (os Mundiais Sub-17 e Sub-20 no final da década de 80; a Copa das Confederações da FIFA e a Copa do Mundo Feminina da FIFA no início da década de 90) e pela maior participação de seleções da Ásia, África, CONCACAF e Oceania, regiões que juntas haviam tido apenas três vagas na Copa do Mundo da FIFA 1974. O número de funcionários da sede da FIFA em Zurique passou de 12 para quase 120 em função das maiores responsabilidades comerciais e de organização. Responsável por alguns dos maiores eventos do planeta, utiliza o futebol como produto e lucro para o turbo capitalismo (Keane, 2001). Principalmente com o ex-presidente João Havelange, a FIFA inseriu o futebol no processo de globalização, adotando planejamentos globais de marketing, através da associação comercial da organização e do esporte a corporações multinacionais (Cruz, 2010, p. 37). Expandindo o futebol, com federações espalhadas pelo mundo inteiro, o futebol se tornou um negócio altamente rentável a partir da gestão de Havelange. Giglio (2013, p. 103) traz um trecho de uma entrevista com o exdirigente, mostrando que nem sempre foi assim. Nela, Havelange fala que em sua primeira Copa do Mundo em 1978 o resultado bruto foi de 78 milhões de dólares, 4 anos depois, no seu segundo mundial à frente da federação o resultado foi de 82 milhões de dólares, sendo que hoje em dia a arrecadação de uma copa do mundo passa dos 2 bilhões de dólares. E que, além disso, hoje a FIFA tem 210 países filiados, e com isso, analisando em média o número de clubes com funcionários, atletas, comissões técnicas, em média o futebol emprega mais de 200 mil pessoas, que esse é o seu maior legado. Sobre as receitas da FIFA, Ramos (2011, p.53) aponta em dados da sua pesquisa que na Fifa, apesar das anuidades pagas todo dia primeiro de janeiro por cada uma das suas federações afiliadas - com valor fixado a cada quatro anos, são iguais para todos os membros e não devem exceder mil dólares -, a parcela substancial dos recursos da organização vem mesmo outras fontes principais, como: da venda de direitos televisivos; da venda de direitos de marketing às empresas parceiras, como Coca-Cola, Sony, Visa e Adidas; e das taxas pagas por cada jogo disputado entre seleções nacionais de qualquer categoria (principal, sub-15, sub20...) no mundo, que destinam à organização 2% de toda receita do jogo, incluindo venda de ingressos, direitos de propaganda, direitos de transmissão em rádio e televisão, direitos de filme e vídeo etc, entre outras fontes. Em seus 24 anos à frente da presidência da FIFA, Havelange aumentou também os contratos publicitários, transformando a entidade em um grande modelo empresarial. Em 2011, já ex-presidente, denúncias1 (1 - Em 2012, o dirigente respondeu às denúncias sobre seu envolvimento e no suborno recebido pela empresa Intemational Sports Leisure (ISL), responsável pela transmissão das Copas do Mundo e que trabalhava com o marketing da FIFA) contra Havelange foram tema de investigação pela justiça suíça com ampla repercussão na imprensa mundial. Tais acusações fizeram com que Havelange renunciasse ao seu cargo no COI em dezembro de 2011, e em julho de 2012 a justiça suíça tornou públicos os valores das comissões que teriam sido recebidas, assim como o processo envolvendo o expresidente (Magalhães, 2013, p. 43-44). Atualmente, mesmo com os números apresentados, modelo empresarial claro em sua gestão e diversas denúncias contra seus membros, a FIFA continua com o discurso de ser uma organização sem fins lucrativos, típico do 3º setor. Recentemente em entrevista, o ex-secretário-geral Jérôme Valcke (Terra, 2013) disse que não sabe porque é tão difícil compreender como a FIFA trabalha. Ele diz que a Fifa vendeu os direitos comerciais da Copa do Mundo por US$ 4 bilhões, que há mais 19 campeonatos mundiais de outras categorias, que gastaram US$ 1,4 milhões a US$ 1,5 milhões na Copa Revista Brasileira de Futsal e Futebol, São Paulo. v.10. n.37. p.186-192. Maio/Jun./Jul./Ago. 2018. ISSN 1984-4956 189 Revista Brasileira de Futsal e Futebol ISSN 1984-4956 versão eletrônica P e r i ó d i c o do I n s t i t u t o B r a s i l e i r o d e P e s q u i s a e E n si n o e m F i s i o l o gi a do E x e r c í c i o w w w . i b p e f e x . c o m . b r / w w w . r b f f . c o m . b r do Brasil e ainda ajudam federações em todo o mundo. São custos que a Fifa que financia, e afirma a Fifa ser uma instituição sem fins lucrativos e que tem que investir muito no futebol. Afirma ainda que gastaram mais de US$ 350 milhões em outros torneios em todo mundo, sendo a organização internacional mais transparente do mundo. É evidente que após a gestão de Havelange o futebol transformou-se, que houve uma grande valorização dos eventos assim como de muitos profissionais do esporte. O atual presidente, o suíço Joseph Blatter, que já trabalhava na FIFA há 23 anos, assumiu a presidência em 1998 e manteve o mesmo tipo de gestão, ampliando ainda as competições organizadas pela entidade, como o Torneio de Clubes da FIFA, e os mundiais de Futebol de praia (Beach Soccer) e de futsal (Giglio, 2013, p. 103). Contudo, ao final da presente pesquisa, devido a diversas denúncias e prisões de membros do alto escalão da FIFA, mesmo sendo reeleito (Globo, 2015) no 65° Congresso FIFA para seu 5° mandato à frente da organização, Blatter convoca novas eleições – de forma extraordinária – para 2016 e anuncia que não irá concorrer novamente (Globo, 2015a). DISCUSSÃO Com o intuito de internacionalizar e padronizar o esporte criado pelos ingleses, no dia 21 de maio de 1904, dirigentes de diversos países, como Bélgica, Dinamarca, Espanha, França, Holanda, Suécia e Suíça, reunidos na capital francesa, Paris, fundaram a Fédération Internationale of Football Association (Federação Internacional das Associações de Futebol), hoje mundialmente conhecida simplesmente pela sigla FIFA. Os fundadores criaram os primeiros estatutos da FIFA, unificando as leis do jogo para torná-lo justo e claro para todos, e buscaram estabelecer a base para todo o futuro desenvolvimento do futebol2 (2 - Favero (2009, p. 21-22) mostra em seu estudo que: “Talvez o maior dono do campo do mundo seja a Fifa. Só para se ter uma ideia, a Organização das Nações Unidas (ONU) possui 192 filiados – já a Fifa pode ser encarada como uma corporação que atua em 208 países [atualmente 210], e a cada ano aumenta seu alcance global. De 1974 até 2006, houve um crescimento espantoso da Fifa: ela conquistou 72 novos países (um aumento de 53%), enquanto a ONU atingiu mais 61 países (cerca de 46% de acréscimo). Muitos países procuraram primeiro a entidade que decide sobre os rumos do futebol, para só depois pensar se querem fazer parte das Nações Unidas. A Suíça, por exemplo, decidiu integrar-se à ONU apenas em 2002, mas já fazia parte da Fifa desde 1904. Na Oceania, Tonga entrou em 1994 para a Fifa e somente em 1999 para a ONU”). Sob a perspectiva jurídica, Ramos (2011, p. 40) diz que do ponto de vista organizacional, é considerada uma organização internacional não-governamental (ONGI), gerida segundo o artigo 60 do código civil suíço – país no qual está sediada, mais especificamente na cidade de Zurique –, a lei que governa associações com objetivos políticos, religiosos, científicos, artísticos, de caridade, sociais ou qualquer outro que não seja o industrial. Além da condição de ONGI, a Fifa ainda beneficia-se da Suíça no que diz respeito ao status de Offshore Financial Centre (OFC) do país3 (3 - Artigo 60 do Código Civil Suíço - Associações que tiverem objetivo político, religioso, científico, artístico, de caridade, social, ou qualquer outro além do industrial, adquirem o status de pessoa assim que mostrarem através das suas constituições suas intenções de existirem como corporação. A constituição deve ser redigida por escrito e deve determinar o propósito, o capital e a organização da sociedade. (Darn, 2011, p. 20). considerável influência econômica da FIFA confunde a noção de organização internacional não-governamental com a da OFC (Offshore Financial Centre), que foi definido como um centro que acolhe as atividades financeiras que são separados a partir de unidades de regulação (Estados) pela sua legislação. A autonomia política e fiscal da FIFA (e seu não accountability) é sublinhada pela localização da sede da FIFA, na Suíça, o centro internacional de OFC (Sugden, Tomlinson, 1998, p. 48). Como qualquer outro esporte, o futebol tem regras específicas para o jogo. Contudo, as chamadas Leis do Jogo não são apenas de responsabilidade da FIFA, são mantidas pela chamada International Football Association Board (IFAB). A FIFA tem membros em seu conselho (quatro representantes); os outros quatro são Revista Brasileira de Futsal e Futebol, São Paulo. v.10. n.37. p.186-192. Maio/Jun./Jul./Ago. 2018. ISSN 1984-4956 190 Revista Brasileira de Futsal e Futebol ISSN 1984-4956 versão eletrônica P e r i ó d i c o do I n s t i t u t o B r a s i l e i r o d e P e s q u i s a e E n si n o e m F i s i o l o gi a do E x e r c í c i o w w w . i b p e f e x . c o m . b r / w w w . r b f f . c o m . b r fornecidos pelas associações de futebol do Reino Unido: Inglaterra, Escócia, País de Gales e Irlanda do Norte. As alterações às Leis do Jogo devem ser aprovadas por pelo menos seis dos oito delegados4 (4 “Regulations Governing the Application of the Statutes - V. Laws of the Game” (Fifa, 2015a). Todas essas definições estão expressas no Estatuto da FIFA, que contém toda a forma organizacional institucional e desportiva da entidade. Com o esporte sendo uma alternativa para o bem-estar social, a massificação do futebol torna-se cada vez maior, o consumo e o investimento aumentam consideravelmente a cada ano. A FIFA, com sua hegemonia no cenário do futebol, surge como um novo e poderoso ator dentro da governança global. A partir daí, cabe a análise da governança da entidade e a de seu controle do esporte. Além do aspecto simbólico, Haesbaert (apud Darn, 2011, p. 19-20) apresenta outros fatores importantes para a consolidação da FIFA no cenário internacional, enfatizando aspectos políticos e econômicos. Em relação ao poder político, Darn (2011, p. 20) versa que na primeira vertente, do ponto de vista político, o espaço do futebol é delimitado e controlado e sobre ele incide o poder de vários atores, a depender de ser uma prática lúdica ou profissional. Como o recorte deste trabalho está no futebol profissional, destacamos o poder hegemônico da FIFA, que controla toda a prática profissional do esporte no mundo, através das confederações regionais, federações nacionais e estaduais e clubes onde atuam os atletas. A difusão da organização da entidade por todos os continentes e vários países, a obediência às suas leis e regulamentos, o poder de movimentar bilhões de dólares em todo o mundo conferem a ela um poder soberano no território do futebol. A autora traz o aspecto político pois o futebol é um espaço delimitado e controlado sobre o qual se exerce determinado poder. Em relação ao aspecto simbólico, afirma que o futebol é um espaço onde há a concepção de aspectos culturais, sendo um produto da apropriação subjetiva do imaginário. Em relação ao poder simbólico, Darn (2011, p. 27) aponta que na segunda vertente sugerida por Haesbaert, a vertente simbólica, os símbolos no futebol, sua formação e afirmação, são construídos através das memórias individuais e coletivas, como apropriação de poder, que reforçam as identidades sociais, patrimônios culturais materiais e imateriais. Configuram-se como singularidades marcantes para um time ou seleção de um país, podendo ser considerados como “símbolos sagrados”. São exemplos hinos, flâmulas, bandeiras, mascotes, uniformes, logomarcas, entre outros. E, por fim, em relação à ótica econômica, o futebol é visto como fonte de recursos no embate entre classes sociais e na relação capital-trabalho. No que tange à questão econômica do futebol, Darn (2011, p. 29) diz que na terceira vertente, do ponto de vista econômico, o território do futebol caracteriza-se pela relação capital-trabalho existente nele, explicada pelo futebol como produtor que gera várias possibilidades de emprego e renda, não só para os atletas na sua prática, mas para uma cadeia de profissionais que lhe dão suporte. Bilhões de dólares são movimentados, anualmente, na “indústria do futebol”. O aspecto econômico que se insere o futebol é complexo, fazendo-se necessários estudos específicos sobre o tema para se entender sua importância. Um desses estudos foi o relatório do Plano de Modernização do Futebol Brasileiro (2000, apud Leoncini; Silva, 2005), realizado pela Fundação Getúlio Vargas em parceria com a Confederação Brasileira de Futebol, que traz uma estimativa que o futebol mundial movimenta, em média, cerca de 250 bilhões de dólares anuais. Nesse cenário, a FIFA tem grande parte do controle, pois há regras para todo e qualquer tipo de transferência de atletas ao redor do mundo. A partir daí, cabe a análise da governança da instituição. A instituição cresceu muito nas últimas décadas, tendo em vista sua inserção junto ao processo de globalização e com o discurso de valorização ao seu produto, o futebol, se fazendo valer do soft power. Isso se deu a partir de uma lógica empresarial, onde se observa suas características híbridas. De acordo com Cruz (2010, p. 36), um dos maiores motores nesse processo de transformação foi, sem sombra de dúvida, a nova marca impressa ao esporte levada a cabo pela FIFA (especialmente durante o período da presidência do brasileiro João Revista Brasileira de Futsal e Futebol, São Paulo. v.10. n.37. p.186-192. Maio/Jun./Jul./Ago. 2018. ISSN 1984-4956 191 Revista Brasileira de Futsal e Futebol ISSN 1984-4956 versão eletrônica P e r i ó d i c o do I n s t i t u t o B r a s i l e i r o d e P e s q u i s a e E n si n o e m F i s i o l o gi a do E x e r c í c i o w w w . i b p e f e x . c o m . b r / w w w . r b f f . c o m . b r Havelange), uma entidade cujo tamanho e alcance se desenvolveu ao passo da transformação do futebol em um esporte verdadeiramente global, tanto esportiva e cultural quanto economicamente. De uma organização que estava com os cofres vazios em 1974 (Yallop, 2002, p.16), quando Havelange é eleito presidente, a uma organização que conta com mais filiados que as Nações Unidas e que durante o período 2003-2006 (ou seja, os quatro anos compreendidos entre uma Copa do Mundo (Japão/Coréia do Sul 2002) e outra (Alemanha 2006), gerou recitas na ordem de R$5 bilhões e 436 milhões, registrando um lucro final para o período de R$1 bilhão e 369 milhões (Fifa Financial Report 2006, p.14 e segs). A FIFA também é quem controla e decide como e onde serão feitos esses grandes eventos. Muitas vezes, dita suas regras, mesmo sendo essas diferentes da lei do país sede. Como afirma Favero (2009, p. 69), a entidade se expande tanto verticalmente quanto horizontalmente. Uma outra característica que torna a Fifa uma corporação é sua ampla escala de operações. A Fifa organiza torneios, vende cotas de patrocínio, dita as regras do futebol no mundo, negocia os direitos de televisão, fornece produtos licenciados, faz parcerias com multinacionais, age politicamente sobre a negociação de jogadores, toma partido em disputas entre países, proíbe certos tipos de uniformes ou chuteiras, dispõe sobre os estádios e os torcedores etc. Tudo isso também dá à Fifa um caráter multifuncional, pois ela tem suas afiliadas espalhadas pelo mundo, participa de diversos tipos de negócio dentro do futebol e ainda escolhe onde investir mais ou menos. Assim, a entidade se expande tanto verticalmente quanto horizontalmente. Aumentando o número de países que disputam a Copa do Mundo para as confederações que as apoiam, as federações nacionais têm de seguir seu estatuto. A FIFA hoje representa tanto seu poder político como o sucesso do objetivo principal de seus fundadores: unificar, sob uma entidade mundial, as diversas associações nacionais de futebol que se formavam com a expansão do futebol (Magalhães, 2013, p.37-38). CONCLUSÃO A FIFA, após o mandato do presidente João Havelange, passou por uma reestruturação e fez com que a entidade se readequasse às políticas globalizadas de mercado. Em termos de número de países filiados, ele ultrapassa o da própria ONU. Impressiona a estrutura interna da organização, com “divisão” de poderes institucionais em executivo, legislativo e judiciário. Atualmente, o futebol possui um dos mercados que mais movimenta a economia mundial, sendo a FIFA responsável por intermediar e fiscalizar muitas dessas transações. Através da simbologia do futebol, exerce influência nos âmbitos político, econômico e cultural. Em razão disso, torna-se relevante o estudo do presente objeto de pesquisa para a ciência política e para as relações internacionais. Identificou-se que a FIFA é uma organização não-governamental que se auto apresenta como uma instituição sem fins lucrativos. Apesar de seu comportamento oscilar por vezes como mercado, expressa características híbridas e contraditórias na dinâmica da governança global – ora como empresa multinacional, ora como organização do Terceiro Setor, ora como instituição internacional. REFERÊNCIAS 1-Cruz, A. H. O. A virada econômica do futebol: observações a partir do Brasil, Argentina e uma Copa do Mundo. Tese de Doutorado. Universidade Federal do Rio de Janeiro. 2010. 2-Darn, T. Reflexões sobre o território do futebol e a copa do mundo FIFA 2014 no Brasil. Tese de Doutorado. Universidade Estadual Paulista. Rio Claro. 2011. 3-Favero, P. M. Globalização, mercantilização e geopolítica do futebol. Monografia. Universidade de São Paulo. 2006. Revista Brasileira de Futsal e Futebol, São Paulo. v.10. n.37. p.186-192. Maio/Jun./Jul./Ago. 2018. ISSN 1984-4956 192 Revista Brasileira de Futsal e Futebol ISSN 1984-4956 versão eletrônica P e r i ó d i c o do I n s t i t u t o B r a s i l e i r o d e P e s q u i s a e E n si n o e m F i s i o l o gi a do E x e r c í c i o w w w . i b p e f e x . c o m . b r / w w w . r b f f . c o m . b r 4-Fifa. Associations. Acesso em 14 de junho de 2017 em: <http://www.fifa.com/associations>. 2017. 5-Fifa. Statutes. Acesso em 16 de junho de 2017 em: <http://www.fifa.com/mm/Document/AFFederat ion/Generic/02/58/14/48/2015FIFAStatutesE N_Neutral.pdf>. 2015. 6-Giglio, S. S. COI x FIFA: a história política do futebol nos Jogos Olímpicos. Tese de Doutorado. Universidade de São Paulo. 2013. <http://esportes.terra.com.br/futebol/copa-dasconfederacoes/somos-a-organizacaointernacional-mais-transparente-do-mundo-dizvalcke,c83b02a28b67f310VgnVCM3000009ac ceb0aRCRD.html>. 2013. Acesso em 25/06/2017. Recebido para publicação em 26/08/2017 Aceito em 13/11/2017 7-Globo. Blatter é reeleito presidente da Fifa após desistência de concorrente. Acesso em 25 de junho de 2017 em: <http://globoesporte.globo.com/futebol/futebolinternacional/noticia/2015/05/blatter-e-reeleitopresidente-da-fifa-apos-desistencia-deconcorrente.html>. 2015. 8-Globo. Blatter decide deixar presidência da Fifa e convoca novas eleições. Acesso em 25 de junho de 2017 em: <http://globoesporte.globo.com/futebol/futebolinternacional/noticia/2015/06/blatter-colocacargo-disposicao-e-sugere-novas-eleicoesfifa.html>. 2015a. 9-Keane, J. A Sociedade Civil: velhas imagens e novas visões. Lisboa: Temas e Debates. 2001. 10-Leoncini, M. P.; Silva, M. T. Entendendo o futebol como um negócio: um estudo exploratório. Gestão e Produção. São Carlos. 2005. 11-Magalhães, L. G. Com a taça nas mãos: sociedade, Copa do Mundo e ditadura no Brasil e na Argentina. Tese de Doutorado. Universidade Federal Fluminense. 2013. 12-Ramos, P. O. 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