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Inteligência Artificial aplicada ao setor empresarial

Inteligência Artificial aplicada ao setor empresarial na oferta de bens e serviços: princípios, riscos e recomendações práticas Cristiano Colombo Guilherme Damasio Goulart Wilson Engelmann Ilustração da capa: rawpixel.com, Freepik. Editoração: Vinícius Fleck / RJR Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) (Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil) Colombo, Cristiano Inteligência artificial aplicada ao setor empresarial na oferta de bens e serviços [livro eletrônico] : princípios, riscos e recomendações práticas / Cristiano Colombo, Guilherme Damasio Goulart, Wilson Engelmann. -- Porto Alegre, RS : Gráfica RJR, 2023. PDF Bibliografia. ISBN 978-85-7146-107-9 1. Administração de empresas 2. Inteligência artificial 3. Proteção de dados pessoais 4. Segurança de dados I. Goulart, Guilherme Damasio. II. Engelmann, Wilson. III. Título. 23-162233 CDD-658.0563 Índices para catálogo sistemático: 1. Inteligência artificial : Organizações : Administração 658.0563 Eliane de Freitas Leite - Bibliotecária - CRB 8/8415 SUMÁRIO 1. Vamos começar?, 4 2. O que é Inteligência Artificial?, 5 3. Riscos da Inteligência Artificial, 12 4. Princípios aplicáveis à Inteligência Artificial, 15 5. Recomendações Práticas, 22 Referências, 25 Autores, 28 1. Vamos começar? Esta Cartilha trata da Inteligência Artificial (IA) aplicada ao setor empresarial. Nossos objetivos são de esclarecer o que é Inteligência Artificial (IA), quais são os setores de aplicação, no oferecimento de bens e de serviços, e, ainda, apontar riscos, refletindo sobre os princípios que devem ser aplicados, que são de interesse do mercado. Vamos indicar quais são os princípios que estão sendo utilizados para a construção do Direito, em matéria de IA, e, ao final, indicaremos recomendações práticas1. 1 Configura-se como um dos resultados que é ofertado à sociedade através do Edital de Pesquisa junto à Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio Grande do Sul (FAPERGS), sob nº ARD 10/2020, iniciativa vinculada ao Mestrado em Direito da Empresa e dos Negócios da Universidade do Vale do Rio dos Sinos (UNISINOS). 4 2. O que é Inteligência Artificial? Ao entrarmos em um elevador e apertarmos o botão do andar que queremos ir, observamos que, após feita esta escolha, tudo passa a acontecer “espontaneamente”, somos levados de um andar a outro, sem a necessidade de uma nova interação humana. O ir e vir do elevador, pelo fato da programação realizada já estar pronta, nos faz chegar ao local previsto, sendo que experimentamos uma decisão automatizada. São instruções pré-ordenadas pelo programação, que, no entanto, não passam por aperfeiçoamentos ou alterações ao longo do trajeto, resumindo-se a comandos, como: “Se acionado o botão 2, então vá ao segundo andar”, ou, ainda, “Se acionado o botão P, então vá ao piso base”. Neste caso, não se trata de Inteligência Artificial, apenas de algo que é automático. A Inteligência Artificial é algo a mais, deve ir além. Para ser uma IA, os elevadores poderiam ter sensores, que, não somente cumpririam a mera instrução de ir de um andar a outro, mas que, efetivamente, através da coleta de dados, como input, reconheceriam padrões, para oferecer como resultado (output) uma experiência mais eficiente e agradável. Na prática, o sistema que organiza o 5 conjunto de elevadores poderia coletar durante um mês, ou, até um ano, a faixa de horário, frequência e número de pessoas, que se direcionam aos andares do prédio, mapeando sua movimentação. A partir destes dados, o quadro de comando já direcionaria os elevadores para que ficassem em modo de espera nos pavimentos mais procurados, de acordo com o dia e horário, em detrimento daqueles que são mais ociosos. Ou, ainda, estabeleceria que, em determinados horários, os elevadores 1 e 2 seriam apenas utilizados para atender andares de maior fluxo. Isto reduziria o tempo de espera e também diminuiria os custos com movimentações repetitivas e não eficientes. No primeiro caso, temos um algoritmo estático, atendendo os elevadores de acordo com o acionamento, enquanto, no segundo caso, o algoritmo é dinâmico, é inteligente, havendo uma distribuição com atendimento mais eficaz, levando em conta número de pessoas, e, predição de chamadas, a partir dos dados pessoais coletados. A Inteligência Artificial (IA) representa um “salto” de qualidade na capacidade de “desenvolver e crescer com a experiência”, marcadamente pelo “auto aprendizado”2, 2 RUFFOLO, Ugo. Intelligenza artificiale e diritto. Dispo- 6 gerando versões mais evoluídas de si mesma, aperfeiçoando-se. É esta “fidelidade das máquinas ao desempenho humano”, enfim, o “comportamento” da máquina, que dão fundamento a diversos conceitos para reconhecer o que poderia ser conceituado como IA 3 . DICA - Não se esqueça, as aplicações que utilizam IA podem ser muito variadas. Em alguns casos, a IA pode fazer parte de apenas alguns elementos da solução, sem que isso seja totalmente evidente. Tome cuidado na avaliação das características da solução para ter certeza de que a IA está sendo realmente utilizada. A Inteligência Artificial vem sendo aplicada nos mais diversos setores empresariais, como na saúde, na mobilidade, na criatividade, em finanças, nas redes sociais e na economia. 4 Observamos a sua nível em: https://www.giurisprudenza.uniroma1.it/archivionotizie/lezioni-dautore?fbclid=IwAR3GvsXWHSvJM4Df4apluHJk7cu5yocg4cRKsnZ1igvo1JxtbN5x7NW4B84. Acesso em: 18 jun. 2023. 3 RUSSEL, Stuart; NORVIG, Peter. Artificial Intelligence. A Modern Approach. Pearson Education Limited: Harlow, 2022. 4 ESPOSTI, Mirko Degli. Prefácio. In: RUFFOLO, Ugo (org.). XXVI lezioni di diritto dell’intelligenza artificiale. Turim: Giappichelli, 2021. 7 aplicação nos campos da medicina, psicologia, enfermagem, fisioterapia, farmácia, publicidade, na prestação de serviços em geral, como orientações pessoais e de créditos, no comércio, como em plataformas que conectam interessados em produtos específicos, como clubes de vinhos ou produtos para pets. Está presente em várias iniciativas, como: em veículos autônomos, nos carros e drones; em robôs que se locomovem, inclusive, movimentando “pernas e braços”, como os seres humanos; no planejamento e programação autônoma de tarefas, na prestação de serviços, em geral, desde a mera cobrança de valores em atraso, passando pela projeção de um treino em uma academia, até complexos cálculos de rotas, na malha aérea, para troca de aeronaves; na tradução de textos, nas mais variadas línguas, em documentos; no reconhecimento vocal e assistentes com interação entre seres humanos e máquinas; recomendações para realização de tarefas, de atividades em geral, com base em seu histórico; jogos, como o xadrez; compreensão de imagens; na medicina; na previsão do tempo. 5 5 RUSSEL, Stuart; NORVIG, Peter. Artificial Intelligence. A Modern Approach. Pearson Education Limited: Harlow, 2022. 8 Na prática, a Inteligência Artificial tem cinco características6 , que são bem importantes para identificá-la e compreendê-la: a) Alimenta-se de dados, que servem, portanto, de input para identificar padrões e ofertar resultados (output); b) Pode promover a identificação e rastreabilidade de pessoas ou coisas, valendo-se, inclusive, de geolocalização para verificação da mobilidade; c) Pode utilizar ferramentas de reconhecimento vocal e facial, como input de algoritmos que se valem de IA; d) Pode prever o comportamento de um ente (que pode ser uma pessoa), valendo-se dos dados pessoais, analisando históricos, o que conhecemos como predição; e) Cria perfis comportamentais, classificando e medindo, com a finalidade de ranquear seres humanos, voltando-se a questões profissionais, sociais e afetivas. 6 MAGLIO, Marco et al. Manuale di diritto alla protezione dei dati personali. Santarcangelo di Romagna: Maggioli, 2019. 9 Enfim, a IA tem a capacidade de autoaprendizado, desenvolvendo-se com a experiência.7 Dessa forma, se você pratica as seguintes atividades, entre outras, no desempenho do seu negócio para oferecer bens e serviços, está utilizando Inteligência Artificial: a) coleta dados pessoais de consumo de sua clientela, com frequência, através de software, que identifica necessidades, levando em conta compras ou serviços que foram tomados anteriormente, e, recomenda melhor momento de oferecimento de ofertas e quantidades a serem disponibilizadas; b) vale-se de aplicativos para disponibilização de bens e serviços, que, inclusive, recolhem a geolocalização, mapeando rotas e deslocamentos havidos, com a realização de predições ou avaliações de comportamento usando algoritmos que podem aprender diante dos cenários apresentados; 7 RUFFOLO, Ugo. Intelligenza artificiale e diritto. Disponível em: https://www.giurisprudenza.uniroma1.it/archivionotizie/lezioni-dautore?fbclid=IwAR3GvsXWHSvJM4Df4apluHJk7cu5yocg4cRKsnZ1igvo1JxtbN5x7NW4B84. Acesso em: 18 jun. 2023. 10 c) usa o reconhecimento facial ou vocal, para identificação e como requisito para acesso, alimentando algoritmo que aprende e toma decisões; d) observa o comportamento e cria perfil dos clientes, através de aplicativos, com pontuação, ranqueamento, inclusive, estabelecendo a maior probabilidade de gostar de um produto, aprendendo diante dos cenários. Assim, você deve estar atento se o software utilizado está de acordo com as boas práticas, evitando riscos aos consumidores, que possam vir a ser configurados como danos, passíveis de responsabilização. 11 3. Riscos da Inteligência Artificial A Inteligência Artificial pode trazer inúmeros riscos, nos ensinamentos de Russel e Norvig8: a) Vigilância e persuasão Por meio de reconhecimento de fala, visão computacional, compreensão da linguagem natural, a Inteligência Artificial pode vigiar massivamente pessoas e identificar suas atividades de interesse, violando a privacidade, a fim de persuadir, de forma a importunar, no oferecimento de bens e serviços. b) Decisões com vieses Na construção dos algoritmos, não poderá haver discriminação injustificada, como, por exemplo, diferenciar acesso a serviços ou produtos por questões de saúde, de idade, étnicas, religiosas ou partidárias.9 8 RUSSEL, Stuart; NORVIG, Peter. Artificial Intelligence. A Modern Approach. Pearson Education Limited: Harlow, 2022. 9 COLOMBO, Cristiano; FACCHINI NETO, Eugênio. Decisões automatizadas em matéria de perfis e riscos algorítmicos: diálogos entre Brasil e Europa acerca dos direitos das vítimas de dano estético digital. In: MARTINS, Guilherme Magalhães; ROSENVALD, Nelson (coord). Responsabilidade civil e novas tecnologias. Indaiatuba: Foco, 2020. 12 É evidente que, em alguns casos, quando houver uma razão valiosa10, o aplicativo poderá promover classificações lícitas, como, por exemplo, uma livraria ecumênica que oferece títulos para os seus consumidores, de acordo com a religião praticada, sendo que, por se tratar de dados sensíveis, deve observar o artigo 11, da LGPD. Ou, ainda, aplicativos de exercícios, que oferecem recomendações específicas, de acordo com a faixa etária, ou softwares que, para a proposta de diagnóstico de determinada doença, considera idade, sexo e comorbidades. Nestes casos, segundo o artigo 11, da Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais, o consentimento deve ser específico e destacado. c) Impacto nos empregos No mundo do trabalho, pode levar ao desemprego, pela eliminação de postos, por atividades passarem a ser feitas por máquinas. d) Cibersegurança A Inteligência Artificial, por tratar grande número de dados pessoais, pode ser alvo de 10 BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio. O conteúdo jurídico do princípio da igualdade. São Paulo: Malheiros, 2011. 13 ciberataques, com vazamentos que impliquem em violação à privacidade, à imagem, e ao direito à proteção de dados pessoais. e) Atividades de alto risco Existem atividades de alto risco, como sua utilização na área da saúde, ou mesmo, nos veículos autônomos, que podem gerar danos fatais quando houver uma falha nos algoritmos que os comandam. f) A utilização da IA em Armas Letais (Lethal Autonomous Weapons - LAW) São armas que podem se movimentar, selecionar e eliminar pessoas, sem a intervenção humana. DICA - Quando a solução da IA trata dados pessoais, aplicam-se as leis de proteção de dados (no caso brasileiro, a LGPD). Tenha em mente que também será necessário avaliar os riscos inerentes aos tratamentos de dados pessoais. Assim, verificam-se riscos específicos de tratamento de dados pessoais, o que inclui também questões de segurança da informação. 14 4. Princípios aplicáveis à Inteligência Artificial Vamos apresentar os princípios orientadores da Inteligência Artificial, conforme documentos internacionais e estudos desenvolvidos, e, mesmo ainda não havendo lei, no Brasil, são guias úteis para adequação: a) Princípio da Centralidade no Ser Humano Interessante destacar que foi Isaac Asimov, na obra de ficção científica “Eu, Robô”, em que foram redigidas as Três Leis da Robótica, que, na verdade, consagram o princípio da Centralidade no Ser Humano no campo das novas tecnologias. São elas: a primeira, “um robô não pode ferir um ser humano ou, por inação, permitir que um ser humano venha a ser ferido.”; a segunda, que “um robô deve obedecer às ordens dadas por seres humanos, exceto nos casos em que tais ordens entrem em conflito com a Primeira Lei.”, e, a terceira e última, “um robô deve proteger sua própria existência, desde que tal proteção não entre em conflito com a Primeira ou com a Segunda Lei.” Significa que “o ser humano é reconhecido como protagonista, como centro, nas ponderações a 15 serem feitas quanto à preservação de sua existência frente a entes automatizados.”11 Assim, “no sentido pragmático de que conflitos aparentes que relevem a necessidade de ponderações entre o sacrifício da pessoa humana e questionamentos acerca da implementação de avanços tecnológicos devem ser decididos em prol da pessoa humana”. A Centralidade no Ser Humano está ligada ao “respeito à dignidade humana, à privacidade e à proteção de dados pessoais e aos direitos trabalhistas”.12 Conforme a alteração promovida no Considerando 1, da proposta de Regulamento de Inteligência Artificial, da União Europeia, como primeira finalidade “a adoção de uma inteligência artificial centrada no ser humano e fiável e assegurar um elevado nível de proteção da saúde, da segurança, dos direitos fundamentais, da democracia, 11 COLOMBO, Cristiano; GOULART, Guilherme Damásio. Inteligência artificial em softwares que emulam perfis dos falecidos e dados pessoais de mortos. In: SARLET, Gabrielle Bezerra Sales; TRINDADE, Manoel Gustavo Neubarth; MELGARÉ, Plínio (org.). Proteção de Dados: temas controvertidos. Indaiatuba: Foco, 2021, v. 1, p. 95-114. 12 COLOMBO, Cristiano; GOULART, Guilherme Damásio. Inteligência artificial em softwares que emulam perfis dos falecidos e dados pessoais de mortos. In: SARLET, Gabrielle Bezerra Sales; TRINDADE, Manoel Gustavo Neubarth; MELGARÉ, Plínio (org.). Proteção de Dados: temas controvertidos. Indaiatuba: Foco, 2021, v. 1, p. 95-114. 16 do Estado de direito e do ambiente contra os efeitos nocivos dos sistemas de inteligência artificial na União, apoiando simultaneamente a inovação e melhorando o funcionamento do mercado interno”.13 Sem dúvida, a sua importância, sendo princípio norteador da aplicação da Inteligência Artificial, para dar apoio às melhores práticas no mercado. b) Princípio da Beneficência O princípio da Beneficência determina que “os robôs devem atuar no interesse dos seres humanos”.14 Expressões como “bem-estar de todas as criaturas sencientes”, “bem-estar do ser humano como resultado em cada design de sistema”, “bem comum”, “benefício da humanidade”, estão presentes nos documentos que tratam sobre Inteligência Artificial.15 O princípio está ligado 13 PARLAMENTO EUROPEU. Proposta de Regulamento de Inteligência Artificial. Disponível em: https://www.europarl.europa.eu/doceo/document/TA-9-2023-0236_PT.html. Acesso em: 25 jun 2023. 14 PARLAMENTO EUROPEU. Resolução de 16 de fevereiro de 2017. Disponível em: https://www.europarl.europa.eu/ doceo/document/TA-8-2017-0051_PT.html#def_1_3. Acesso em: 25 jun 2023. 15 FLORIDI, Luciano. Etica dell’intelligenza artificiale. Milão: Raffaello Cortina, 2022, p. 96-97. 17 à dignidade humana e à sustentabilidade, este que trata sobre a “prosperidade da humanidade e da conservação de um bom ambiente para as próximas gerações”.16 É neste sentido que a Inteligência Artificial deve ser vista de modo construtivo, no sentido de permitir que a pessoa humana tenha mais acesso a bens e serviços, e, que o avanço tecnológico, não se trate de perda de direitos, pelo contrário, resulte em melhor qualidade de vida para a humanidade. c) Princípio da Não-Maleficência O princípio da não-maleficência orienta que “os robôs não devem causar danos aos humanos”.17 Floridi refere que se trata da prevenção à violação da privacidade, ameaça à corrida armamentista, bem como ao cuidado quanto ao auto aperfeiçoamento recursivo da Inteligência Artificial, sem controle ou limites seguros.18 16 FLORIDI, Luciano. Etica dell’intelligenza artificiale. Milão: Raffaello Cortina, 2022, p. 96-97. 17 PARLAMENTO EUROPEU. Resolução de 16 de fevereiro de 2017. Disponível em: https://www.europarl.europa.eu/ doceo/document/TA-8-2017-0051_PT.html#def_1_3. Acesso em: 25 jun 2023. 18 FLORIDI, Luciano. Etica dell’intelligenza artificiale. Milão: Raffaello Cortina, 2022, p. 98. 18 d) Princípios da Justiça e da Equidade Os princípios da Justiça e da Equidade estão ligados à não-discriminação em decisões automatizadas. O corpo eletrônico “não pode ser alvo de injusta discriminação, sobretudo, em algoritmos, pautados pela opacidade, sobretudo, quanto voltados à formação de perfis ou que se liguem a decisões que afetem seus interesses pessoais”.19 As iniciativas legislativas proíbem diferenças quanto “a características pessoais como origem geográfica, raça, cor ou etnia, gênero, orientação sexual, classe socioeconômica, idade, deficiência, religião ou opiniões políticas”.20 19 COLOMBO, Cristiano; FACCHINI NETO, Eugênio. Corpo Eletrônico como Vítima de Ofensas em Matéria de Tratamento de Dados Pessoais e a Viabilidade da Aplicação da Noção de Dano Estético ao Mundo Digital. In: Cristiano Colombo; Wilson Engelmann; José Luiz de Moura Faleiros. (Org.). Tutela Jurídica do Corpo Eletrônico: Novos Desafios ao Direito Digital. 1ed.Indaiatuba, São Paulo: Editora Foco, 2022, v. 1, p. 403-424. 20 BRASIL. Projeto de Lei 2338/2023. Dispõe sobre o uso da Inteligência Artificial. Disponível em: https://legis. senado.leg.br/sdleg-getter/documento?dm=9347622&ts=1684441712955&disposition=inline&_gl=1*u7dxhm*_ga*OTU2MDIxODAyLjE2NzQxNTgwMTI.*_ga_CW3ZH25XMK*MTY4NzcxNzAzMS45LjAuMTY4NzcxNzAzMS4wLjAuMA. Acesso em: 25 jun 2023. 19 e) Princípio da Autonomia Trata-se do equilíbrio entre a “autonomia humana” e a “autonomia artificial”. A IA “não deve comprometer a liberdade dos seres humanos de estabelecer os próprios padrões e normas”.21 Portanto, deve-se promover a autonomia humana, no sentido de protegê-la e reestabelecer o seu controle, limitando a autonomia das máquinas, que podem ser retomadas e revisadas.22 f) Princípio da Explicabilidade O princípio da Explicabilidade garante o desenvolvimento de mecanismos que ofereçam a transparência da operação dos algoritmos que compõem os sistemas de Inteligência Artificial. É necessário que se entenda os processos de decisão da Inteligência Artificial; o funcionamento dos algoritmos não pode ser opaco, invisível ou incompreensível.23 21 FLORIDI, Luciano. Etica dell’intelligenza artificiale. Milão: Raffaello Cortina, 2022, p. 98. 22 FLORIDI, Luciano. Etica dell’intelligenza artificiale. Milão: Raffaello Cortina, 2022, p. 98. 23 FLORIDI, Luciano. Etica dell’intelligenza artificiale. Milão: Raffaello Cortina, 2022, p. 98. 20 DICA - Quando a solução tratar dados pessoais, aplicam-se todos os princípios de proteção de dados pessoais. Caso seja um serviço prestado em uma relação de consumo, também serão aplicados os princípios de proteção do consumidor. 21 5. Recomendações Práticas A partir dos princípios de Inteligência Artificial, apresentamos a seguintes recomendações práticas: 1º) Na utilização de aplicativos ou websites, atividades que impliquem em coleta de dados pessoais devem ser informadas aos consumidores, inclusive, com o termo de consentimento (artigos 7º e 11 da Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais), quando esta for a hipótese de tratamento, observando a finalidade proposta, tratando apenas os dados que forem necessários para a prestação de serviço ou de colocação do bem, no mercado; 2º) Em decisões automatizadas, com base na Inteligência Artificial, não poderá haver discriminação injustificada, sobretudo, com base em dados pessoais sensíveis, conforme artigo 5º, II, como “origem racial ou étnica, convicção religiosa, opinião política, filiação a sindicato ou a organização de caráter religioso, filosófico ou político, dado referente à saúde ou à vida sexual, dado genético ou biométrico, quando vinculado a uma pessoa natural”; 22 3º) Em um círculo virtuoso, deve o setor empresarial buscar medidas para que a Inteligência Artificial seja a possibilidade de ofertar novas profissões, com a capacitação técnica dos empregados, que possam migrar de tarefas repetitivas para criativas; 4º) Devem ser adotados meios para proteger os dados pessoais dos consumidores, com a contratação de nuvens (Clouds) que promovam segurança dos dados pessoais dos clientes, com treinamento de seus colaboradores, e, de maneira geral, estabelecendo protocolos rígidos de segurança da informação; 5º) Em atividades de alto risco, como são os dispositivos médicos, por exemplo, os wearables, deve o fornecedor zelar pela observância de padrões técnicos e éticos; 6º) IA não deve ser utilizada para criar armas letais autônomas (Lethal Autonomus Weapons Systems - LAWS); 7º) O ser humano deve estar no centro, com a promoção ao “respeito à dignidade humana, à privacidade e à proteção de dados pessoais e aos direitos trabalhistas”; 23 8º) A Inteligência Artificial deve ser vista de modo construtivo, no sentido de permitir que a pessoa humana tenha mais acesso a bens e serviços, e, que o avanço tecnológico não se trate de perda de direitos, pelo contrário, signifique melhor qualidade de vida para a humanidade; 9º) Deve-se promover a autonomia humana, no sentido de protegê-la e reestabelecer o seu controle, em face da autonomia das máquinas, limitando-a, bem como sendo possível revisões e imediata retomada; 10º) As decisões automatizadas por Inteligência Artificial não podem ser incompreensíveis, opacas, devendo ser inteligíveis, podendo ser solicitado o devido esclarecimento pelo consumidor, devendo o fornecedor estar preparado para explicar o resultado, forte no princípio da explicabilidade. 24 REFERÊNCIAS BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio. O conteúdo jurídico do princípio da igualdade. São Paulo: Malheiros, 2011. BRASIL. Projeto de Lei 2338/2023. Dispõe sobre o uso da Inteligência Artificial. Disponível em: https://legis.senado.leg.br/ sdleg-getter/documento?dm=9347622&ts=1684441712955&disposition=inline&_ gl=1*u7dxhm*_ga*OTU2MDIxODAyLjE2NzQxNTg wMTI.*_ ga _CW3ZH25XMK*MTY4NzcxNzAzMS45LjAuMTY4NzcxNzAzMS4wLjAuMA. Acesso em: 25 jun 2023. COLOMBO, Cristiano; FACCHINI NETO, Eugênio. Decisões automatizadas em matéria de perfis e riscos algorítmicos: diálogos entre Brasil e Europa acerca dos direitos das vítimas de dano estético digital. In: MARTINS, Guilherme Magalhães; ROSENVALD, Nelson (coord). Responsabilidade civil e novas tecnologias. Indaiatuba: Foco, 2020. 25 COLOMBO, Cristiano; GOULART, Guilherme Damásio. Inteligência artificial em softwares que emulam perfis dos falecidos e dados pessoais de mortos. In: SARLET, Gabrielle Bezerra Sales; TRINDADE, Manoel Gustavo Neubarth; MELGARÉ, Plínio (org.). Proteção de Dados: temas controvertidos. Indaiatuba: Foco, 2021, v. 1. COLOMBO, Cristiano; FACCHINI NETO, Eugênio. Corpo Eletrônico como Vítima de Ofensas em Matéria de Tratamento de Dados Pessoais e a Viabilidade da Aplicação da Noção de Dano Estético ao Mundo Digital. In: Cristiano Colombo; Wilson Engelmann; José Luiz de Moura Faleiros. (Org.). Tutela Jurídica do Corpo Eletrônico: Novos Desafios ao Direito Digital. 1ed.Indaiatuba, São Paulo: Editora Foco, 2022, v. 1 ESPOSTI, Mirko Degli. Prefácio. In: RUFFOLO, Ugo (org.). XXVI lezioni di diritto dell’intelligenza artificiale. Turim: Giappichelli, 2021. FLORIDI, Luciano. Etica dell’intelligenza artificiale. Milão: Raffaello Cortina , 2022. 26 MAGLIO, Marco et al. Manuale di diritto alla protezione dei dati personali. Santarcangelo di Romagna: Maggioli, 2019. PARLAMENTO EUROPEU. Resolução de 16 de fevereiro de 2017. Disponível em: https://www.europarl.europa.eu/doceo/ document/TA-8-2017-0051_PT.html#def_1_3. Acesso em: 25 jun 2023. PARLAMENTO EUROPEU. Proposta de Regulamento de Inteligência Artificial. Disponível em: https://www.europarl. europa.eu/doceo/document/TA-9-20230236_PT.html. Acesso em: 25 jun 2023. RUFFOLO, Ugo. Intelligenza artificiale e diritto. Disponível em: https://www.giurisprudenza.uniroma1.it/archivionotizie/ lezioni-dautore?fbclid=IwAR3GvsXWHSvJM4Df4apluHJk7cu5yocg4cRKsnZ1igvo1JxtbN5x7NW4B84. Acesso em: 18 jun. 2023. RUSSEL, Stuart; NORVIG, Peter. Artificial Intelligence. A Modern Approach. Pearson Education Limited: Harlow, 2022. 27 AUTORES CRISTIANO COLOMBO. Pós-Doutor em Direito, Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS). Doutor e Mestre em Direito, Programa de Pós-Graduação em Direito da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Professor Permanente do Mestrado Profissional em Direito da Empresa e dos Negócios da UNISINOS; Professor de graduação em Direito e Relações Internacionais da UNISINOS; Professor de Graduação em Direito da Faculdade Verbo Jurídico; Pesquisador FAPERGS em Projeto: “Inteligência Artificial e Proteção de Dados Pessoais: Diálogos entre princípios da Centralidade do ser Humano e Eticidade rumo à concretização no ordenamento jurídico brasileiro.” Membro da Red Iberoamericana de Universidades e Institutos con investigación en Derecho e Informática (RED CIIDDI). E-mail: [email protected]. GUILHERME DAMASIO GOULART. Doutor e Mestre em Direito pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Atua como advogado, professor e consultor em 28 Segurança da Informação e Direito da Tecnologia. E-mail: [email protected]. WILSON ENGELMANN. Pós-Doutor em Direito Público-Direitos Humanos, Universidade de Santiago de Compostela, Espanha; Doutor e Mestre em Direito Público, Programa de Pós-Graduação em Direito da Universidade do Vale do Rio dos Sinos – UNISINOS, Brasil; Coordenador Executivo do Mestrado Profissional em Direito da Empresa e dos Negócios da UNISINOS; Professor e Pesquisador do Programa de Pós-Graduação em Direito - Mestrado e Doutorado - da UNISINOS; Bolsista de Produtividade em Pesquisa do CNPq. E-mail: [email protected]. ORCID: https://orcid.org/0000-0002-0012-3559. 29 ANOS