Artigo_08._Isabel_e_Odélio_diagramado[1]
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DA MULHER NA CULTURA
MOÇAMBICANA
Culture and Representation: The Seat of Women in Mozambican
Culture
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Isabel Vilanculo1
Odélio Nhiuane 2
INTRODUÇÃO
Não queremos no presente artigo discutir os conceitos que levantamos, pelo fato de
muitos pesquisadores já terem se ocupado nessa matéria. A nossa preocupação, neste sentido, é
indagar sobre o lugar que a mulher ocupa na cultura moçambicana, assim como os desafios na
aceitação da diversidade cultural no contexto moçambicano. Para compreendermos e
analisarmos o lugar do gênero no ambiente sociopolítico e cultural em Moçambique, nas suas
várias facetas, devemos ter em conta o contexto histórico e cultural de Moçambique e das suas
regiões norte (incluído centro) e sul. É preciso lembrar que Moçambique atravessou na sua
história vários momentos, desde a colonização até a independência, onde afigura-nos ser
necessário mostrar o lugar que a mulher ocupou em todo esse processo (pré-colonial, colonial e
Moçambique pós-independência). É verdade que Moçambique é um país multicultural (língua,
cultura, ideologia etc.,), em que cada região exibe sua cultura e representação. Tanto é verdade
também que em cada região de Moçambique a mulher tem seu espaço e significado para o tecido
social e cultural.
Na região centro e norte do país, por causa das influências islâmicas e a agricultura como
uma das principais bases econômicas, a mulher tem mais significância, ou seja, tem mais poder
de decidir sobre a sua linhagem, E no sul, comparativamente por causa da existência de mais
gado bovino, e ser uma região na sua maioria cristã, os homens é que tem mais poder de decidir
sobre a sua linhagem. Eis então, o contexto em que se assiste questões como: Lobolo, Livirato,
Sororato, Kutchinga, etc., em que alguns serão palco de análise deste estudo. É sobre a
diversidade e globalização de identidades (culturas) que se tece o mundo contemporâneo em que
vivemos, o que permeia um campo fértil de hibridação de pessoas e de culturas que modificam
os hábitos socialmente instituídos, tornando cada vez mais complexo perceber até que ponto as
leis difundidas e defendidas têm tido efeito em todos os lugares. Baseado na revisão bibliográfica
que fizemos, o artigo compreende cinco partes: resumo; introdução; desenvolvimento;
conclusão, e por fim a indicação das referências consultadas.
1
Doutora em Filosofia pela Universidade Pontifícia Salesiana – Roma, Docente no curso de Filosofia na
Universidade Save – Extensão da Maxixe; [email protected]
2
Graduado em Ensino de História, com Habilitações em Geografia pela Universidade Save - Extensão da Maxixe –
Moçambique. Coordenador de Pesquisa na Consultoria de Investigação e Treinamento, CITRE, E.I da Beira. e-mail:
[email protected]
no ano de 1966, por parte do comité central da FRELIMO. Mas, partir daqui podemos dizer que
foram lançadas as bases para o enquadramento da mulher no espectro moçambicano. Pelo fato de
existirem divergências entre os membros da FRELIMO, uns duvidavam da capacidade das
mulheres para a guerra e achavam que a contribuição delas ao processo revolucionário deveria
restringir‐se ao trabalho nas machambas, e nas demais tarefas de apoio, assim como acreditavam
que a participação das mesmas era contrária a tradição.
«Aceitar a participação das mulheres na luta armada, foi um passo significativo para o
reconhecimento das mulheres como agentes de mudança. Que foi acompanhado de muita
resistência, porque nem todos os homens concordavam com a incorporação das mulheres na luta
armada (LILISIA, et al, 2011, p. 9)». O mito de que os homens eram a humanidade, o mundo era
masculino e apenas para estes existiam os direitos e poder fez com que cada vez mais houvesse o
desafio de tal status quo por parte das mulheres. Estas começavam a ocupar os espaços políticos
e sociais por mérito, e por tal questão é preciso congratular a bravura que as mulheres tiveram
neste período. De agentes de casa lutaram para ocupar os espaços políticos, o espírito maternal
extravasou os ângulos da família para uma dimensão da nação.
Afirmamos na introdução deste artigo, que a mulher nos diversos espaços moçambicanos
(norte, centro e sul), ocupa status ou posições diferentes. «Moçambique tem uma cultura
patriarcal muito forte nas estruturas familiares e nas relações sociais em todos os territórios do
país, com diferenças regionais; o sul possui uma cultura familiar patrilinear, ao passo que o
Norte dispõe de valores matrilineares, mas ambos são grandemente dominados pelos homens
(WDR, 2012; BAUER, 2007 apud KARBERG, 2015, p.5)», é preciso vincar que não é na sua
generalidade.
Com o autor, concordamos com a ideia de que a família baseia-se num sistema
grandemente hierárquico, que gera a desigualdade entre o Homem e a Mulher. E Moçambique
está dividido em uma sociedade patrilinear e matrilinear. A sociedade patrilinear define as raízes
familiares, seguindo a linhagem masculina, e a sociedade matrilinear define as raízes familiares
seguindo a linhagem feminina. Essas normas sociais e culturais desempenham um papel
essencial na posição da Mulher na sociedade Moçambicana:
É necessário, ao menos com economia de palavras (sendo que não é o íntimo do nosso
artigo), mostrar o contexto do surgimento dos sistemas matrilineares e patrilineares como forma
de entendermos a diversidade regional e o papel que a mulher acaba ocupando nessas regiões
moçambicanas. No contexto moçambicano, Pires (2000, p. 30) afirma que os sistemas
matrilinear e patrilinear surgem ligados às atividades econômicas fundamentais desenvolvidas
pelas sociedades. Desta forma, o autor afirma que o sistema matrilinear abunda no norte do
Zambeze, que teve a prática da pecuária impossibilitada devido a mosca “Tse-tsé”. Tal questão,
no entanto, fez com que houvesse a ocorrência da prática da agricultura, atividade que
maioritariamente era praticada pelas mulheres. Desta forma, isto conferiu a mulher poderes sobre
o homem. E o sistema patrilinear é dominante no sul do Zambeze, onde a pastorícia conferiu
maiores poderes ao homem sobre a mulher.
É verdade que o sistema matrilinear, como descreve Pires (2000), é impulsionado pela
prática da agricultura. Contudo, não devemos ignorar o fato de Moçambique ter adquirido fortes
influências islâmicas, especialmente na costa norte (norte do Zambeze, na terminologia de Pires),
marcando fortemente a cultura nesta região. Em sociedades matrilineares os bens geralmente
passam de geração para geração através da família da mulher. Com isso, as culturas matrilineares
fortalecem a posição da Mulher na sociedade, dado que a casa e as crianças continuam a fazer
parte da família da mulher após um divórcio ou falecimento. Entretanto, a descendência
matrilinear não significa que as mulheres mantêm o poder formal; na realidade, o poder de
decisão pertence ao irmão da mãe (tio materno), que detém o direito de distribuir os bens e
recursos. Portanto, ambos os mecanismos culturais refletem o domínio masculino (SARMENTO,
2011).
3
Jornal o País. O papel da mulher no desenvolvimento rural. 2014. Consultado em:
http://www.ipcinfo.org/fileadmin/user_upload/faoweb/lisbon/docs/O_Pa%C3%ADs_6_8_214.pdf
O lovolo5 é muito complexo, como instituição cultural, de tal forma que é bastante difícil
esgotar o seu conteúdo através de uma definição feita em algumas linhas (como tentamos fazer
anteriormente). Mas, pode se considerar como uma cobrança feita ao homem pelos pais da
mulher com quem ele deseja casar, como condição para a legitimação da união conjugal, além da
obtenção de direitos sobre ela. Há também a questão da fixação do parentesco sobre a
descendência gerada pela sua união com essa mulher. Esta cobrança assume um caráter
compensatório ou simbólico, encenado cerimonialmente.
As tradições, hábitos e costumes de cada região sofrem mutações com o decorrer do
tempo, como forma de se adequar a esse contexto, perdendo elas ou não o seu significado. Por
isso, Litsure e Cumbe (2021) deixam claro que:
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O lobolo é um ato que define a situação das mulheres e dos homens, bem como estrutura as posições e como as
relações sociais entre os dois passam a ser estabelecidas, vislumbrando-se manifestações do poder masculino em
nome da cultura e da tradição.
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É usado o termo Lovolo no sul de Moçambique (em Funhalouro concretamente) para se referir ao Lobolo.
Neste ponto, temos aqui uma reflexão sobre duas questões: qual é o significado que o
lobolo imprime para a mulher; e como ele tem sido interpretado na contemporaneidade no sul de
Moçambique.
Antigamente, o gado vacum era o principal patrimônio de uma linhagem, isto é, era o
principal marcador de riqueza. Assim sendo, fazia sentido que aquela compensação tão
importante, que era o cerne da instituição do lovolo, fosse paga através do elemento mais
valorizado e prestigioso, no caso, o gado bovino, acompanhado sempre por outras coisas (bebida,
rapé, vestuário, farinha de milho), de acordo com a demanda de cada período (LITSURE;
CUMBE, 2021, p. 22). É preciso vincar que as formas de pagamento do lobolo não só
dependiam da demanda dos períodos, mas também das condições econômicas das partes
envolvidas. Com a vinda da insegurança pela perda maciça de gado durante a conquista nguni do
século XIX, e também a pandemia de rinderpest de finais de XIX, o pagamento de lovolo passou
a ser feito de outras maneiras: no caso do Sul de Moçambique foram usadas enxadas de ferro,
regra geral fabricadas pelos ferreiros vindos das montanhas do nordeste da África do Sul. Estas
enxadas não eram usadas para cultivar, eram compradas e guardadas como tesouro para o dia que
fossem necessárias (HARRIES, 1994).
nas negociações do lobolo não significam compra (como tal), mas sim uma forma de manter o
equilíbrio entre as famílias.
Deste modo, a mulher adquirida, ainda que conserve o nome da sua linhagem, insere-se
no grupo do noivo numa situação de subalternidade. Pertence a nova família tanto ela como os
filhos que tiver. Assim como é difícil traduzir lovolo, também o são os termos da nova condição
jurídica da esposa. Em português costuma-se dizer que ela é propriedade da nova linhagem. Não
é a posse individual de um homem, mas a propriedade coletiva de um grupo. Isto baseia-se nos
princípios do próprio direito tradicional tsonga, em que ao indivíduo cabe o direito de uso da
propriedade comunitária, mas não tem o direito de posse da propriedade individual. Isto era
também aplicável relativamente ao direito do homem sobre a mulher lovolada.
Para Litsure e Cumbe (2021), o gado ora levado para o lovolo da mulher é um bem
comunitário da linhagem, esta é a razão pela qual a mulher lobolada tem para além do marido,
outros compromissos com os restantes membros da linhagem deste, tal como é o caso dos
cunhados e sogros. É exatamente aqui onde o levirato e o sororato encontram fundamento como
formas secundárias do matrimônio neste tipo de sociedades. Nesta perspectiva, o lovolo constitui
um fator que contribui para a redução da dignidade da mulher, uma vez que esta é transformada
em um bem ao serviço das vontades dos homens, limitando o seu direito de escolher de livre
vontade o parceiro conjugal. Esta é a razão pela qual certas raparigas são entregues pelos seus
progenitores como esposas de velhos, da idade dos seus pais ou avôs, em substituição das suas
parentes falecidas no lar.
Atendendo que entre os Tsongas, o sistema de terminologia de parentesco é
classificatório, em que as irmãs, primas e tias da mesma linhagem são colocadas todas na mesma
categoria de va hahane (irmãs), a sobrinha pode ser indicada como substituta, pelos membros da
sua linhagem, no lar da sua tia em caso de falecimento. Isto acontecia, ou possivelmente
acontece ainda porque, por um lado, os bens pagos no ato de lovolo não podem se perder,
devendo ser rentabilizados pela reprodução das mulheres lovoladas para a continuidade da
linhagem. Por outro lado, a linhagem que recebeu os bens do lovolo não pode os devolver
enquanto existirem dentro da linhagem mulheres ainda não lovoladas.
A dinâmica verificada na instituição do lovolo, resulta das crises sucessivas, já
apresentadas nas secções anteriores, e os correspondentes ajustes e adaptações que a cada
momento se tornaram necessários para garantir a continuidade desta instituição do casamento
tradicional tsonga. De fato, o lovolo é um bom indicador das mudanças nas relações de força
entre os gêneros, não só entre as linhagens, mas também no interior de cada uma destas
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O etnônimo tsonga tem a sua origem na palavra thonga do idioma zulu. Trata-se de uma designação locativa zulu
que em português significa Oriente ou Levante. Como etnônimo, foi empregue inicialmente pelos zulus para
(GRANJO 2005; FARRÉ 2015). Parte-se da proposição de que há linhagens com mais gado e
outras com menos ou nenhum. Segundo as linhagens envolvidas e o seu nível de riqueza, podia
aceitar-se que o pagamento não fosse feito de uma só vez, mas sim adaptado ao ciclo de
reprodução do gado.
Dado que o gado tem a capacidade de reproduzir, o lovolo, na sua definição ideal, tem
uma base material de dupla reprodução interna. Por um lado, está a reprodução de uma linhagem
e por outro a reprodução da manada de outra linhagem. Portanto, o uso de gado para pagar o
lovolo está centrado nas novilhas. A mulher casada produz uma entrada de vacas na sua
linhagem, que vai contribuir para reproduzir a manada que, por sua vez, vai servir para pagar o
lovolo dos irmãos dela. Idealmente, caso se partisse do pressuposto de que todas as linhagens
têm uma manada, e todas mais ou menos o mesmo número de filhos e filhas, poderia haver uma
contabilidade paralela onde o lovolo se «autofinanciasse».
Ora, isto não acontece assim. Possivelmente nunca aconteceu, mas no presente é claro
que não acontece por várias razoes: há linhagens sem gado, por causa dos efeitos das guerras e
da desigualdade. Nem sempre as filhas são as mais velhas, o que possibilita entrar na roda com
algumas vacas já recebidas; a estratégia de linhagem pela gestão conjunta da manada da
linhagem se perdeu com a maior capacidade de decisão individual. O individualismo é reforçado
pelos efeitos da vida moderna, mas também porque as crises sucessivas e a erosão ou
desaparecimento das manadas linhageiras obrigaram os indivíduos a procurar uma estratégia de
casamento que, embora sempre dependente da aceitação da própria linhagem, é mais individual.
Uma maneira de conseguir uma primeira novilha era de o rapaz trabalhar apascentando o
gado de outra linhagem. Tradicionalmente, depois de um ano ou dois o rapaz tinha direito a
receber uma novilha em pagamento. A partir daí, o rapaz podia ir criando a sua manada. Ora,
hoje também não há tantas linhagens com necessidade de contratar rapazes, e muitos homens não
têm hipótese de começar a criar a sua manada. Com a evolução do tempo associada à crises
sociais sucessivas, transformações econômicas, bem como o impacto da modernidade, o lovolo
foi se transformando. O que fica claro desta evolução é que o lovolo não é uma simples
cerimônia de um dia, ou um pagamento pontual. O lovolo é, antes de mais, um acordo entre duas
linhagens diferentes, e este acordo se ajusta às dinâmicas de cada período e possibilidades das
partes envolvidas. O acordo pode ser uma aceitação da dívida, numa reunião entre as duas
linhagens onde fica escrito o que deve ser entregue, quando possível. Por isso, no fim das contas
ninguém fica sem casar por falta de artigos exigidos no lovolo.
O lovolo tem valor porque garante a estabilidade da mulher no lar. Porque caso
não se efectue, parece que a mulher I nuya tsamela wa nuna (foi se oferecer ao
homem), e ela também não se sentirá comprometida e a qualquer momento
pode abandonar o lar. O lovolo dá compromisso às partes e garante a
estabilidade do lar. Mas, seu valor não é material, é simbólico (LITSURE e
CUMBE, 2021, p. 28).
Nestes depoimentos encontram-se algumas das razões pelas quais as mulheres pedem
para ser lovoladas, mesmo se muitas vezes a instituição foi usada contra elas. Pelo ato, elas
sentem-se valorizadas pelos seus pais e maridos, na medida em que cumprem com o desejo dos
seus pais e celebra-se compromisso entre as duas partes. Além de se sentirem reconhecidas como
pessoas capazes de chefiar um lar, também é uma garantia de que os seus filhos têm um pai
conhecido e elas são, portanto, pessoas com um comportamento regido pelo decoro. O lovolo
não constitui o fim da relação entre as partes, mas sim o início de uma relação de
comprometimento mútuo, celebrado no contrato que vai se aprofundar cada vez mais, na medida
em que nascerão do casal filhos que irão constituir um elo de ligação consanguíneo entre as duas
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Lobolar cadáver é uma prática comum em Moçambique, com particular enfoque na região Sul do país. A defesa da
realização do lobolo de cadáver, como algo tradicional, é definida pela situação biográfica dos indivíduos. Isto
significa que ele tem a sua história, ou é a combinação de todas experiências anteriores desses indivíduos que
orienta a sua interpretação e ação, pois na tradição o passado orienta o presente através de crenças e sentimentos
coletivos. Esta prática tem sido caracterizada por conflitos que surgem devido ao valor cobrado e pelo fato de uma
partes que nunca mais poderá se desfazer. No que tange aos direitos, a mulher também ganha
autoridade e confiança quando sabe que a sua linhagem está em sua retaguarda, pronta para a
defender quando houver problemas com a linhagem do marido. Afinal, o lovolo é um ato
explícito de um homem que aceita publicamente que ele quer casar com uma mulher, e aceita
compensar a família desta pela perda que vai sofrer sua linhagem. Dependendo do nível de
riqueza das partes envolvidas, a compensação será mais ou menos elevada, mas o casamento não
vai depender nunca do que se pagou, senão do acordo público entre as duas partes.
Apesar das modificações atribuídas ao lobolo durante a sua prática, há algumas fases
básicas tradicionais para sua realização: a primeira etapa está associada à intenção do noivo
estabelecer um vínculo com a mulher desejada; para tal, parentes e amigos próximos aparecem
na casa da mulher num encontro denominado hikombela-mati (pedir água). Nesse caso, seus
representantes levam alguns presentes específicos e abrem o diálogo para futura cerimônia de
lobolo, identificando a mulher designada pelo noivo. Esse encontro estabelece o primeiro laço
com a mulher e seus familiares por parte do noivo e de sua família, e os presentes servem como
mão de entrada. Nessa ocasião, os familiares da noiva aproveitam para entregar a lista de
exigências (carta de lobolo) para realização da cerimônia. Após alguns meses ou anos,
dependendo da capacidade do noivo para adquirir os presentes, o lobolo é realizado
(FERNANDES, 2018).
O lobolo assumidamente transcende ao amor, tratando-se de uma relação intrínseca com
o mundo dos antepassados da noiva e do noivo, em que se estabelece um contato direto e
contínuo entre os vivos e os mortos e, por intermédio da conexão com os espíritos antepassados e
a realização de suas exigências, fundamenta-se na harmonia social entre os noivos; e, sobretudo,
sela o laço social entre ambas as famílias, abençoando e garantindo prosperidade à família que
está por vir. Em Moçambique, para além do lobolo, quer nas comunidades patrilineares, quer nas
matrilineares, existem outras práticas que, em nome da cultura e tradição, reforçam a condição
subalterna e submissa das mulheres. Essas práticas permitem vislumbrar também “o lugar da
mulher na cultura moçambicana “Podemos apontar, por exemplo, a poligamia, o livirato, ritos de
iniciação, Kutchinga etc. Essas práticas desempenham um papel de inferiorizar a mulher.
Considerações finais
das famílias não partilhar a tradição de lobolo, ou mesmo estar filiada à uma religião em que os seus crentes não
devem se envolver em assuntos como lobolo de cadáver.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
COLLIER, Edda. Um perfil das relações de género. Edição actualizada de 2006: Para a
igualdade de género em Moçambique. Estocolmo: Agência Sueca de Cooperação Internacional
para o Desenvolvimento (ASDI), 2007.
FARRÉ, ALbert., «Women as mediators in postwar Mozambique. Pushing lobolo from
price to propriety». Keith Hart (ed.) Economy for and against Democracy. NY: Berghahn
Books. 2015, pp. 83-102.
FERNANDES, Rhuann. Lobolo: celebração litúrgica e tradicional no Sul do Moçambique.
Ensaio etnográfico. 2018.
GRANJO, Paulo. Lobolo em Maputo. Um velho idioma para novas vivências culturais. Lisboa:
Campo das Letras, 2005.