Manejo da distocia de ombro

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FEBRASGO POSITION STATEMENT

Manejo da distocia de ombro


Número 7 – Julho 2022
A Comissão Nacional Especializada em Urgências Obstétricas da Federação Brasileira das Associações de
Ginecologia e Obstetrícia (Febrasgo) referenda este documento. A produção do conteúdo baseia-se em evidências
científicas sobre a temática proposta e os resultados apresentados contribuem para a prática clínica.

PONTOS-CHAVE
• A distocia de ombro é um evento predominantemente imprevisível e não prevenível.
• A incidência progressiva de obesidade e diabetes determinou o aumento contemporâneo da incidência de
distocia de ombro.
• Os principais fatores de risco para distocia de ombro são a macrossomia fetal, o diabetes mellitus, as
distocias nos períodos funcionais do parto e o parto vaginal operatório.
• Os exames de imagem e a pelvimetria clínica não são úteis para identificar mulheres com risco aumentado
para distocia de ombro.
• O diagnóstico e a gravidade da distocia de ombro são subjetivos. A falha da manobra cabeça-ombro e
o sinal da tartaruga são os principais critérios diagnósticos. A necessidade de múltiplas manobras de
delivramento e a ocorrência de lesões maternas e/ou neonatais evidenciam melhor a gravidade dos casos.
• Os profissionais envolvidos na assistência ao parto devem estar preparados para reconhecer a distocia de
ombro e imediatamente executar uma sequência de manobras que permitam a sua correção em tempo
hábil.
• O controle do peso corporal e dos níveis glicêmicos é a principal estratégia passível de reduzir o risco de
distocia de ombro.
• As complicações maternas graves mais comuns da distocia de ombro são a hemorragia pós-parto e as
lacerações perineais complicadas.
• A complicação neonatal mais frequente da distocia de ombro é a paralisia transitória do plexo braquial.
• O treinamento de habilidades e a simulação propiciam melhorias na assistência e na documentação
da distocia de ombro, promovendo o manejo baseado em evidências científicas e reduzindo as lesões
transitórias do plexo braquial.

RECOMENDAÇÕES
• Nas gestações com diabetes e peso fetal estimado acima de 4.500 gramas (g) e nas sem diabetes e
estimativa de peso fetal acima de 5.000 g, a cesárea parece prevenir distocia de ombro.
• No prolongamento do segundo estágio do trabalho de parto de parturientes diabéticas com estimativa
de peso fetal entre 4.000 e 4.500 g, assim como das não diabéticas com peso fetal estimado entre 4.500 e
5.000 g, a cesárea para prevenção de distocia de ombro também se aplica.
• No período pélvico prolongado de fetos com peso estimado acima de 4.500 g, a cesárea intraparto para
prevenção da distocia de ombro é preferível ao parto vaginal operatório baixo ou de alívio. Similarmente, o
parto vaginal operatório com a cabeça fetal na pelve média deve ser evitado em fetos com peso estimado
acima de 4.000 g, estando indicada a cesárea intraparto. Nessas situações, a instrumentação do parto deve
ser considerada apenas diante da presença de operadores experientes, mediante avaliação individualizada
da posição e tamanho fetais, da história dos partos anteriores e dos hábitos maternos.
• A indução do parto para prevenir distocia de ombro está indicada nas gestantes com diabetes gestacional,
39 semanas e peso fetal estimado entre 4.000 e 4.500 g. Nas gestantes sem diabetes, a indução também
pode ser oferecida com 39 semanas diante da estimativa de peso fetal entre 4.000 e 5.000 g, mas a conduta
expectante também é alternativa razoável.

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• Para o tratamento da distocia de ombro, deve-se adotar uma sequência de manobras, que pode variar de
acordo com a posição da parturiente. Na posição de litotomia, sugere-se que a primeira manobra específica
seja a de McRoberts, podendo ser associada a pressão suprapúbica externa (manobra de Rubin I).
• Na posição de litotomia, diante da falha das manobras iniciais, as principais manobras secundárias são
as de Gaskin (quatro apoios), a liberação do braço posterior e as rotatórias internas (Rubin II, parafuso
de Woods e Woods reversa). A tração axilar para a liberação do ombro posterior também pode ser uma
alternativa viável.
• Em posições verticais, o sequenciamento recomendado é aumentar o agachamento (manobra de McRoberts
modificada), pressão suprapúbica externa, posição de quatro apoios (Gaskin), manobras internas e
desprendimento do braço posterior. A tração axilar do ombro não impactado também pode ser uma
alternativa.
• As manobras de resgate para correção da distocia de ombro incluem a tentativa de fratura da clavícula fetal
e a extração do ombro posterior com o auxílio de uma tipoia axilar. Em caso de insucesso, as manobras de
última instância são a de Zavanelli, o resgate abdominal e a sinfisiotomia. Devido à morbidade materna
associada ao procedimento, a sinfisiotomia deve ser precedida de avaliação dos riscos e benefícios e
restrita a locais onde não é possível realizar o resgate abdominal por ausência de salas cirúrgicas.
• A documentação da distocia de ombro deve detalhar a assistência prestada, o ombro fetal impactado,
o tempo até a resolução e as complicações associadas, sendo importante para o aconselhamento
das pacientes e dos seus cuidadores, assim como para assuntos legais. É importante estabelecer uma
comunicação eficaz com a parturiente e seus acompanhantes durante toda a assistência, detalhando as
manobras realizadas, assim como as complicações ocorridas.
• Instituir protocolos e metodologias ativas de ensino propicia o manejo baseado em evidência científica e o
melhor desempenho das equipes assistenciais no tratamento da distocia de ombro.

CONTEXTO CLÍNICO contemporâneo da DO.(2) O evento ocorre em 0,2% a


A distocia de ombro (DO) é uma emergência obs- 3,0% dos partos, e as variações se relacionam tan-
tétrica caracterizada pela necessidade de manobras to com a subjetividade do seu diagnóstico quan-
tocúrgicas adicionais à suave tração descendente, to com a prevalência de macrossomia e diabetes
exercida para desprendimento dos ombros fetais nas populações. (1) Estima-se que um recém-nascido
(manobra cabeça-ombro). O evento ocorre devido à com encefalopatia isquêmica hipóxica secundária à
impactação do ombro fetal anterior atrás da sínfise DO ocorra a cada 22.000 partos vaginais a termo.(3)
púbica materna, após a exteriorização do polo cefá-
lico. A impactação simultânea do ombro fetal poste- QUAL A FISIOPATOLOGIA DA DO E COMO
rior no promontório sacral pode agravar a distocia. DEVE SER O SEU DIAGNÓSTICO?
Uma vez que a maioria dos casos ocorre na ausência A DO ocorre pela falha da rotação normal dos om-
de fatores de risco pré-natais ou intraparto, o even- bros para o diâmetro oblíquo, no momento da entra-
to é frequentemente imprevisível e não prevenível. da do diâmetro biparietal na pelve. A falha rotacio-
Portanto, os profissionais envolvidos na assistência nal pode ocorrer pela resistência entre a pele fetal
ao parto devem estar preparados para reconhecer o e as paredes vaginais, por um parto precipitado ou
evento e imediatamente executar uma sequência de pela resistência de um tórax de dimensões propor-
manobras que permitam a sua correção em tempo cionalmente maiores em relação ao diâmetro bipa-
hábil.(1) O principal objetivo do tratamento da DO é rietal. Sendo assim, os ombros anterior e posterior
prevenir asfixia fetal e paralisia braquial permanen- permanecem no diâmetro anteroposterior da pelve
te ou morte. Outras lesões neonatais (fraturas) e as materna durante a descida e/ou descem simulta-
lacerações do trajeto também devem ser evitadas. neamente, alterando o processo fisiológico em que o
Para isso, a atuação organizada da equipe e o se- ombro posterior, em um diâmetro oblíquo, desce na
quenciamento rápido e hábil das manobras de deli- frente do ombro anterior.(4) É marcante a subjetivi-
vramento são imprescindíveis.(1) dade do diagnóstico e da gravidade da DO. O evento
fica mais evidente diante da falha da manobra ca-
QUAL A SITUAÇÃO EPIDEMIOLÓGICA DA DO? beça-ombro (Figura 1) e/ou da retração da cabeça
A incidência progressiva de obesidade e diabetes, fetal para o períneo, determinada pela tração rever-
os fatores de risco para macrossomia e o aumento sa do ombro impactado na entrada da pelve (sinal
do peso ao nascimento determinaram o aumento da tartaruga). Retrospectivamente, a necessidade de

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pométricas dos fetos de mães diabéticas favorecem a


ocorrência de DO. Fetos de mães diabéticas com mau
controle glicêmico, além de grandes, são despropor-
cionais, devido ao depósito centrípeto de gordura
corporal. Sendo assim, suas relações tórax-cabeça e
ombro-cabeça se encontram aumentadas, elevando o
risco para DO, mesmo naqueles com peso inferior a
4.000 g.(8)
Apesar de a recorrência da DO ser subestimada
pelas escolhas subsequentes por cesárea eletiva, seu
risco é de pelo menos 10%, podendo alcançar 25%.
A recorrência concomitante de macrossomia fetal é
frequente. O ganho de peso ao nascer secundário ao
Figura 1. Manobra cabeça-ombro (seta azul: impactação do avanço da gestação explica o risco de DO inerente às
ombro anterior atrás da sínfise púbica; seta vermelha: pressão gestações pós-termo. O sexo masculino como fator
inferior exercida no polo cefálico na manobra cabeça-ombro) de risco para DO parece ser explicado pelas medidas
Ilustração: Felipe Lage Starling. antropométricas e maior prevalência de macrossomia
entre os homens. Outros fatores de risco favorecedores
da macrossomia e do diabetes, e consequentemente
múltiplas manobras e a ocorrência de lesões mater- da DO, são a obesidade e o ganho excessivo de peso
nas e/ou neonatais evidenciam melhor a gravidade materno. A demografia materna contemporânea, com
da DO. Critérios mais objetivos, tais como intervalo maior prevalência de gestantes em idade acima de 35
superior a 60 segundos entre o desprendimento da anos, configura risco para a DO, em associação com
cabeça e dos ombros, ainda necessitam de estudos maior prevalência de diabetes, de excesso de peso e
de validação, tanto para o diagnóstico quanto para a de multiparidade entre essas pacientes.(9-11)
previsão de resultados neonatais adversos.(5) Os principais fatores de risco intraparto são as dis-
tocias nos períodos funcionais do parto (dilatação e
pélvico) e o parto vaginal operatório. Isoladamente, as
QUAIS OS PRINCIPAIS FATORES DE anormalidades do período pélvico (período pélvico pro-
RISCO PARA A DO E AS ESTRATÉGIAS longado e parada secundária da dilatação) não são pre-
PARA REDUZIR SUAS INCIDÊNCIAS? ditores úteis de DO. Porém, quando combinados a peso
São vários os fatores de risco para a DO, tanto antepar- fetal estimado maior que 4.000 g e a parto vaginal ope-
to quanto intraparto, e reconhecê-los permite discutir ratório, associam-se ao aumento da incidência de DO.(12)
a possibilidade de cesáreas eletivas e/ou determinar Parto vaginal operatório se relaciona a DO. Porém,
uma vigilância individualizada e atenta do período não existe evidência de que a tração fetal executa-
pélvico. Os principais fatores de risco anteparto são da por fórcipe ou vácuo-extrator aumente o risco de
macrossomia fetal, diabetes mellitus, história pregres- impactação do ombro ou de que o mau posiciona-
sa de DO, gestação pós-termo, sexo fetal masculino, mento prévio do ombro iniba a descida fetal, resul-
obesidade materna/ganho excessivo de peso gesta- tando na necessidade da instrumentação do parto.
cional e idade materna. Desses, o principal é a ma- Aparentemente, os riscos para DO são semelhantes
crossomia fetal; e a obesidade materna, o diabetes e para o fórcipe e o vácuo-extrator.(13)
a idade materna avançada também se relacionam ao Apesar da diversidade de fatores de risco para a DO,
alto peso ao nascer. Entretanto, apesar de a DO au- poucos deles são modificáveis. O controle do peso cor-
mentar progressivamente nos nascimentos de fetos
poral antes e na vigência da gestação e o controle dos
com mais de 4.000 g e a morbimortalidade neonatal
níveis glicêmicos entre as diabéticas são as principais
devido à DO também aumentar significativamente en-
estratégias passíveis de reduzir o risco. Portanto, as in-
tre os recém-natos pesando mais de 4.500 g, o peso
tervenções na dieta e no estilo de vida podem reduzir
fetal não possui bom valor de predição para a DO.(6) A
os índices de fetos macrossômicos e de DO, principal-
maioria dos fetos macrossômicos não evolui com DO;
mente entre as gestantes diabéticas.(14)
aproximadamente metade das DOs ocorre em recém-
-natos com peso ao nascer inferior a 4.000 g, e tanto a
ultrassonografia quanto a avaliação clínica (manobras QUAIS CONDUTAS OU PROCEDIMENTOS
de Leopold, regra de Jonhson) possuem baixa sensibi- SÃO EFICIENTES NA PREVENÇÃO DA DO?
lidade para estimar o peso ao nascer.(7) Uma vez que a DO ocorre predominantemente em partu-
Com relação ao diabetes mellitus, além da sua as- rientes com dimensões pélvicas normais, os exames de
sociação com a macrossomia fetal, as medidas antro- imagem e a pelvimetria clínica não são úteis para iden-

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tificar mulheres com risco aumentado, exceto nos casos DO, cursa com aumento das morbidades neonatais co-
raros de anormalidades pélvicas ou fetais graves.(6) muns (hiperbilirrubinemia, problemas respiratórios).(17)
A biometria fetal levemente anormal não é preditiva Para mulheres com diabetes pré-gestacional, a defini-
de DO. Os diversos parâmetros biométricos fetais (di- ção do momento do parto deve ser baseada nos riscos
ferença entre os diâmetros abdominal e biparietal, cir- maternos e nos demais riscos perinatais associados à
cunferência torácica, razão circunferência cefálica/cir- doença, com pouco benefício na manutenção da gesta-
cunferência abdominal, razão comprimento femoral/ ção além de 39 semanas e necessidade de interrupção
circunferência abdominal, distância úmero-espinhal, prematura diante de vasculopatia e/ou mau controle
diâmetro bochecha a bochecha, largura do ombro) ou glicêmico. Entre mulheres com diabetes gestacional e
não foram testados em grandes estudos prospectivos peso fetal estimado entre 4.000 e 4.500 g, a indução do
ou não provaram ser úteis para a predição da DO.(15) parto realizada com 39 semanas potencialmente reduz
Apesar do consenso de que a cesárea planejada a DO, com riscos maternos e demais riscos neonatais
para fetos macrossômicos é apropriada para reduzir a (dificuldade respiratória, terapia intensiva) em menor
DO, essa conduta não tem provado ser vantajosa, pois incidência. Devem ser avaliados o peso fetal, o contro-
a maioria dos casos de DO e de lesão de plexo braquial le glicêmico ao longo da gestação, o peso ao nascer e
não podem ser previstos ou evitados, acarretando ele- resultados dos partos anteriores, e as características
vação injustificada das taxas de cesariana. Entretanto, físicas da parturiente (estatura, peso, índice de massa
para fetos de mães diabéticas com peso estimado aci- corpórea, pelvimetria).(18) A indução do parto na 41ª se-
ma de 4.500 g, assim como para os com mais de 5.000 mana de gestação reduz o nascimento de recém-natos
g na ausência de diabetes, avaliados dentro de uma com mais de 4.000 g, com potencial redução da DO.(19)
semana do parto, a cesárea parece ser capaz de reduzir Nas pacientes com história de DO prévia, principal-
a DO e a morbidade associada.(1) mente com lesão neonatal grave, o risco potencial de
O princípio da cesárea para prevenir a DO também recorrência (10% ou mais) e os fatores de risco da ges-
se aplica diante do prolongamento do segundo estágio tação atual (peso fetal estimado, glicemia) devem ser
do trabalho de parto (primíparas com analgesia: quatro considerados na tomada de decisão da via de parto.(9)
horas; primíparas sem analgesia: três horas; multíparas
com analgesia: três horas; multíparas sem analgesia:
COMO DEVE SER O MANEJO INICIAL DA DO?
duas horas) em parturientes diabéticas com estimativa
O manejo da DO tem o objetivo de completar o des-
de peso fetal entre 4.000 e 4.500 g, assim como em
prendimento fetal com segurança, antes da asfixia e
parturientes não diabéticas com peso fetal estimado
lesão cortical decorrentes da compressão do cordão
entre 4.500 e 5.000 g. Cesárea intraparto em vez de par-
umbilical e do impedimento da inspiração, evitando
to vaginal operatório baixo ou de alívio é sugerida para
lesões neurológicas periféricas ou outros traumas fe-
fetos com peso estimado acima de 4.500 g e período
tais e/ou maternos. O tempo-limite que antecede o
pélvico prolongado. Cesárea intraparto em vez de parto
aumento do risco de lesão por asfixia é de cinco minu-
vaginal operatório na pelve média também é sugerida
tos, o que impõe a necessidade instantânea de organi-
diante de fetos com peso estimado acima de 4.000 g,
zação e atuação efetiva da equipe.(20)
na vigência de período pélvico prolongado. Entretanto,
Imediatamente após a suspeita de DO, a parturien-
o parto vaginal operatório nessas situações pode ser
te e seu acompanhante devem ser comunicados e as
considerado diante da presença de operadores expe-
seguintes ações devem ser implementadas: solicita-
rientes, da avaliação individualizada da posição e ta-
ção de ajuda aos demais profissionais (enfermagem
manho fetais, da história dos partos anteriores e dos
assistencial e obstétrica, obstetras, pediatras e anes-
hábitos maternos.(16)
tesistas); documentação do momento do diagnóstico
A indução do parto dos fetos macrossômicos como
e cronometragem da assistência; orientação contrá-
medida de prevenção da DO também é conduta limita-
ria aos puxos voluntários. As seguintes condutas são
da, pela baixa acurácia dos métodos de estimativa do
imprescindíveis:
peso fetal, pela relação desfavorável entre o número
de induções necessárias para prevenir os resultados 1. Não exercer tração excessiva para liberação dos
adversos, pelas consequências maternas e neonatais ombros e não pressionar o fundo uterino, uma
relacionadas ao processo de indução e pela falta de vez que essas ações se associam ao estiramento
evidências científicas da eficácia dessa conduta. A in- do plexo braquial, agravamento da impactação e
dução do parto pode ser oferecida para as gestantes rotura uterina.
sem diabetes, com 39 semanas e peso fetal estimado 2. Não seccionar o cordão umbilical antes da
entre 4.000 e 5.000 g, mas a conduta expectante é al- liberação dos ombros, pois essa ação não contribui
ternativa razoável. Já a indução com 37 ou 38 sema- para a resolução da DO e reduz ainda mais a
nas nessa situação está desaconselhada, uma vez que, oxigenação do feto. Se presentes, as circulares de
apesar de potencialmente promover maior redução na cordão devem ser liberadas sem secção.

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3. Evitar a realização de episiotomia, uma vez


que o procedimento não resolve a DO, que é
resultante de impactação óssea. Entretanto,
diante da necessidade de manobras internas, a
episiotomia pode ser necessária nos casos em
que a resistência perineal dificulta a execução
das manobras. A sondagem vesical também pode
ser necessária.
4. Promover comunicação eficiente dos membros
da equipe assistencial, que devem receber
informações claras e objetivas das ações
realizadas e dos desfechos, evitando repetição
desnecessária de manobras e otimizando o
manejo em tempo oportuno.(21)
As evidências sobre a eficácia e o sequenciamen-
to das diversas manobras são escassas. Portanto, não
existe definição sobre qual manobra é superior a outra
e nem sobre qual é a sequência de manobras ideal.
As manobras tentam resolver a DO por meio de três Figura 2. Manobras de McRoberts e de Rubin I
mecanismos: Ilustração: Felipe Lage Starling.

1. Ampliação das dimensões pélvicas maternas.


2. Redução do diâmetro biacromial fetal por meio
da adução dos ombros ou da remoção do braço
posterior.
3. Modificação na relação entre o diâmetro
biacromial do feto e a pelve óssea materna,
girando o tronco fetal para o diâmetro oblíquo da
pelve (mais amplo) e descompactando o ombro
anterior por trás da sínfise púbica ou liberando o
braço e/ou ombro posteriores.(21)
Figura 3. Manobra de Rubin I
COMO DEVE SER O MANEJO DA DO Ilustração: Felipe Lage Starling.

NA POSIÇÃO DE LITOTOMIA?
Em litotomia, a parturiente deve ser posicionada com impactado, flexão da coluna fetal e queda do ombro
as nádegas rente à borda da cama ou maca de par- posterior na concavidade do sacro. Além disso, ocor-
to. A tração para liberação dos ombros deve ser axial rem aumento e redirecionamento da força expulsiva,
e alinhada com a coluna cervicotorácica fetal, em um que se torna perpendicular ao plano de saída. A mano-
componente descendente ao longo de um vetor que bra de Rubin I, executada simultaneamente com a de
não ultrapasse 45o abaixo do plano horizontal da par- McRoberts, otimiza a liberação do ombro por meio da
turiente. A falha da manobra cabeça-ombro, efetuada sua adução. Nas pacientes com obesidade importante,
com força habitual, é indicativa de DO. Portanto, a per- esse é um passo que pode ser omitido. A manobra é
cepção de força excessiva para liberação dos ombros é realizada por um auxiliar que, posicionado do lado do
indicativa da necessidade de manobras específicas.(1) dorso fetal, realiza uma compressão suprapúbica em
Sugere-se que a primeira manobra específica a ser direção inferomedial. A compressão deve ser realiza-
aplicada seja a de McRoberts, que pode ser associa- da com as mãos espalmadas, posicionadas de forma
da à manobra de Rubin I (Figuras 2 e 3). Essas mano- semelhante à massagem cardíaca. Sob o comando do
bras são eficientes e menos invasivas. Na manobra obstetra que efetua a tração inferior na cabeça fetal, a
de McRoberts, os membros inferiores são flexionados manobra de Rubin I deve ser iniciada imediatamente
contra o abdome (hiperflexão das pernas e das coxas), antes da manobra cabeça-ombro. Assim que se inicia
devendo ser previamente removidos quando acomo- a compressão suprapúbica, a cabeça é tracionada infe-
dados em perneiras. Essa posição promove o alinha- riormente, promovendo a liberação do ombro.(1,22)
mento vertical da pelve materna, com rotação cefá- Diante da falha das manobras de McRoberts e de
lica da pube, redução da lordose lombar, retificação Rubin I, o sequenciamento das manobras deve progre-
do promontório, giro da sínfise púbica sobre o ombro dir para o desprendimento completo do braço posterior

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ou para a liberação do ombro posterior. Embora mais A axila é deslocada em direção à cabeça fetal, posicio-
invasiva, a manobra para o desprendimento completo nando o ombro posterior em um nível inferior ao da
do braço posterior (manobra de Jacquemier) apresenta sínfise púbica. Simultaneamente, a outra mão segura a
alta taxa de sucesso na resolução da DO.(1,22) O obstetra cabeça do feto. A cabeça e o ombro são girados jun-
deve apreender o braço posterior adiante do tórax fetal. tos em 180°, em direção à face fetal, liberando o ombro
Portanto, se o dorso fetal estiver voltado para o lado posterior, anteriormente na pelve. Alocado posterior-
materno direito, a mão direita do operador deverá exe- mente após a rotação do tronco fetal, o ombro anterior
cutar a manobra pelo lado esquerdo da pelve materna, é o último a se desprender (Figura 5).(23)
e vice-versa. A manobra é executada em três tempos e Diante da falha em remover o braço posterior, im-
uma episiotomia pode ser necessária para facilitar o posta pela dificuldade em alcançar o cotovelo ou o an-
procedimento. Primeiramente, a mão é introduzida na tebraço, outra estratégia é executar tração axilar para
vagina, progride através do vazio sacral e apreende o descida ou liberação do ombro posterior (manobra de
braço posterior, com os dedos posicionados parale- Menticoglou).(24) A manobra é realizada por meio do en-
lamente ao úmero. Em um segundo tempo, o braço é trelaçamento dos dedos médios de cada mão do ope-
deslocado adiante do tórax fetal. Se o braço fetal es- rador na axila posterior do feto. Enquanto um auxiliar
tiver estendido, é necessário executar uma pressão na flexiona a cabeça fetal em direção ao ombro anterior
fossa antecubital para otimizar o deslocamento. Em um impactado, o operador introduz o dedo médio da sua
terceiro passo, o antebraço e a mão são apreendidos mão esquerda no lado direito da pelve materna e o
e tracionados para fora da vagina, passando adiante dedo médio direito no lado contralateral. Os dedos são
do tórax fetal, promovendo a rotação anterior do tron- entrelaçados no cavo axilar fetal e uma tração inferior é
co fetal e, subsequentemente, a liberação do antebra- executada ao longo da curvatura sacral (Figura 6). Essa
ço, braço e ombro posteriores pelo espaço anterior da manobra também facilita uma nova tentativa de remo-
pelve materna (Figura 4). A remoção do braço posterior ção completa do braço posterior ou a execução sub-
promove redução de 2 a 3 cm no diâmetro biacromial, sequente de uma manobra rotatória interna para des-
transformando-o em um diâmetro axiloacromial, de 10 prendimento do ombro anterior impactado. Também,
a 11 cm, e possibilitando a resolução da DO.(3) Diante da frequentemente, essa manobra promove a liberação
dificuldade para apreensão e deslocamento anterior do espontânea do ombro anterior.(24)
braço posterior (braço estendido ou posicionado atrás Uma abordagem alternativa para o desprendimen-
do dorso fetal), a manobra de Shrug é uma alternativa to do ombro posterior é realizar a apreensão da axila
eficiente à manobra de Jacquemier. Nessa manobra, a e tração inferior do ombro com mão única. Nessa si-
mão do operador apreende a axila posterior do feto, en- tuação, o dedo indicador envolverá a axila pelo dorso
trelaçando os dedos polegar e indicador no cavo axilar. fetal e o polegar deslizará anteriormente ao ombro. As

Figura 4. Desprendimento do braço posterior pela manobra de Jacquemier


Ilustração: Felipe Lage Starling.

Figura 5. Desprendimento do braço posterior pela manobra de Shrug


Ilustração: Felipe Lage Starling.

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Figura 6. Desprendimento do ombro posterior pela manobra Figura 7. Manobra de Gaskin


Ilustração: Felipe Lage Starling.
de Menticoglou
Ilustração: Felipe Lage Starling.

pontas dos dedos devem tocar-se no cavo axilar fetal.


Subsequentemente, a tração inferior é executada.(25)
Diante da falha na abordagem inicial, manobras se-
cundárias devem ser instituídas. As principais são a
manobra de Gaskin e as manobras rotatórias internas
(Rubin II, parafuso de Woods e Woods reversa).(1,22)
Na manobra de Gaskin, a parturiente é posiciona-
da em “apoio nos quatro membros” (mãos e joelhos)
(Figura 7). Alternativamente, pode-se adotar a posição
de “largada de corrida”, em que o membro inferior Figura 8. Posição de “largada de corrida”
homolateral ao dorso fetal será flexionado e desloca- Ilustração: Felipe Lage Starling.
do anteriormente à pelve materna, enquanto a outra
perna permanece estendida posteriormente (Figura 8).
Essas posições ampliam o espaço na concavidade do
sacro e são beneficiadas pela gravidade (verticaliza-
ção do tronco materno). A tração pode ser efetuada
em direção inferior (liberação do ombro posterior) ou
superior (liberação do ombro anterior). Essas mano-
bras são opções interessantes devido à alta eficácia
e à baixa morbidade, principalmente para parturien-
tes sem analgesia e/ou assistidas em camas de parto. Figura 9. Sequenciamento das manobras rotatórias internas
Também podem, opcionalmente, anteceder a tentativa de Rubin II, parafuso de Woods e Woods reversa
de remoção do braço ou ombro posterior, manobras Ilustração: Felipe Lage Starling.
tecnicamente mais difíceis.(26)
As manobras rotatórias internas devem ser aplica-
das em sequenciamento (Figura 9). A primeira tenta-
tiva deve ser a adução do ombro anterior impactado, pressão posterior de adução do ombro impactado e a
por meio da manobra de Rubin II. A mão do operador mão inferior comprime anteriormente o ombro pos-
a efetuar a manobra deve ser a do lado correspon- terior, abduzindo-o e otimizando a tentativa de des-
dente ao do dorso fetal. A mão deve ser introduzida locamento do diâmetro biacromial para o diâmetro
pelo vazio sacral homolateral ao do dorso fetal, ser oblíquo da pelve. A manobra efetuada na frente do
deslocada superiormente e alocada atrás do ombro ombro posterior é denominada parafuso de Woods.
anterior impactado, para promover a sua adução. O Caso essa segunda tentativa seja frustra, a mão in-
objetivo é deslocar o ombro para o diâmetro oblíquo ferior do operador é removida do trato genital e a
da pelve, de dimensões mais amplas. Diante da falha, mão superior é deslocada inferiormente, alocando
a mão deve ser mantida atrás do ombro fetal anterior atrás do ombro posterior para efetuar a manobra de
enquanto a outra mão é introduzida no vazio sacral Woods reversa, que também promove rotação interna
contralateral e alocada adiante do ombro posterior. do dorso fetal de 180°, invertendo os ombros fetais
Assim, simultaneamente, a mão superior efetua com- para uma posição oblíqua de desprendimento.(1,22,27)

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Alves AL, Nozaki AM, Polido CB, Knobel R

O mnemônico ALEERTA é proposto para o treina- de Gaskin ou de “largada de corrida”). Caso não ocor-
mento profissional no manejo da DO na posição litotô- ra a resolução, a parturiente será mantida em quatro
mica (Quadro 1). Após avisar a parturiente e providen- apoios para tentativa subsequente das manobras in-
ciar ajuda e anestesista, o sequenciamento proposto ternas. A sequência sugerida é a mesma da posição de
inclui as manobras de McRoberts e Rubin I, a avaliação litotomia: manobras de Rubin II, parafuso de Woods e
da necessidade de episiotomia, a remoção do braço Woods reversa. A técnica adotada para execução das
posterior, as manobras internas e, por último, a altera- manobras também será praticamente a mesma. O que
ção da posição para quatro apoios.(28) muda é que os ombros fetais estão invertidos pela al-
teração da posição materna, ou seja, o ombro anterior
Quadro 1. Mnemônico ALLERTA para o sequenciamento de impactado na pube materna está situado inferiormen-
manobras no tratamento da distocia de ombro te e o ombro posterior se encontra superiormente.
A Chamar Ajuda; Avisar a parturiente; Anestesista a postos
Assim, comparando com a posição de litotomia, as
manobras são efetuadas nos ombros contrários. Então,
L Levantar os membros inferiores em hiperflexão a manobra de Rubin II é realizada atrás no ombro pos-
(manobra de McRoberts) terior, agora posicionado superiormente; o parafuso
de Woods é efetuado adicionando uma pressão com
E Pressão suprapúbica externa (manobra de Rubin I)
a outra mão adiante do ombro anterior, posicionado
E Considerar episiotomia inferiormente; e a manobra de Woods reversa é rea-
lizada inferiormente, atrás do ombro anterior, após o
R Remover o braço posterior operador deslocar a mão inferiormente. Diante da fa-
lha do sequenciamento das manobras internas, a pró-
T Toque para manobras internas (Rubin II, parafuso de xima tentativa é o desprendimento do braço posterior
Woods, Woods reversa)
(manobra de Jacquemier), aqui situado superiormente.
A Alterar a posição para quatro apoios (manobra de A mão do operador penetra superiormente pelo vazio
Gaskin) sacral e apreende e desloca o braço posterior anterior-
mente no tórax fetal. Em seguida, o operador desloca
sua mão para apreensão da mão fetal, efetuando nela
Caso a DO não seja resolvida após as tentativas das uma tração inferior e promovendo o giro do corpo fe-
manobras iniciais e secundárias descritas acima, a assis- tal e o delivramento ordenado da mão, braço e ombro
tência deve progredir para as manobras de última instân- posteriores.(29) As figuras 10, 11 e 12 ilustram o sequen-
cia (resgate).(1,22) ciamento das manobras de acordo com o mnemônico
A SAÍDA.
COMO DEVE SER O MANEJO DA DO
NAS POSIÇÕES VERTICAIS?
Quadro 2. Mnemônico A SAÍDA para o sequenciamento de
O benefício evidente da liberdade de posição e das
manobras no tratamento da distocia de ombro nas posições
posições verticais tem contribuído para maior adoção
das posições de cócoras, Gaskin e dos bancos de apoio verticais
na assistência ao segundo período do trabalho de par- A Chamar Ajuda; Avisar a parturiente; Anestesista
to. Nessas situações, a DO pode ser solucionada por a postos; Aumentar o agachamento (manobra de
meio de outro sequenciamento de manobras, visando McRoberts modificada)
evitar perda adicional de tempo.(29)
S Pressão suprapúbica externa
O mnemônico A SAÍDA (Quadro 2) é proposto para
o treinamento profissional no manejo da DO em par- A Alterar a posição para quatro apoios (manobra de
turientes na posição vertical, livres de uma maca ou Gaskin)
mesa cirúrgica. O sequenciamento se inicia com o
aumento do agachamento materno, o que promove- Í Manobras internas (Rubin II, parafuso de Woods,
Woods reversa)
rá a hiperflexão dos membros inferiores, ampliando o
diâmetro funcional da pelve, similarmente à manobra D Desprender o braço posterior
de McRoberts (manobra de McRoberts modificada). Se
a hiperflexão isolada não for suficiente para resolver A Avaliar manobras de resgate
a DO, o próximo passo é exercer pressão suprapúbi-
ca externa, mantendo a parturiente em agachamento
ampliado. A pressão é efetuada posicionando as mãos
no abdome inferior materno, como na manobra de Caso não ocorra a resolução com esse sequencia-
Rubin I. Diante da falha, o passo subsequente é alterar mento, a assistência deve progredir para as manobras
a posição da parturiente para quatro apoios (posições de última instância (resgate).(29)

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Manejo da distocia de ombro

Figura 10. Sequenciamento inicial das manobras no mnemônico A SAÍDA. Aumentar o agachamento
(manobra de McRoberts modificada); pressão suprapúbica e alterar a posição da parturiente (quatro apoios)
Fonte: Adaptada de Amorim et al. (2013).(29)

Figura 11. Sequenciamento intermediário das manobras no mnemônico A SAÍDA. Manobras de Rubin II,
parafuso de Woods e Woods reversa
Fonte: Adaptada de Amorim et al. (2013).(29)

gravidade e aumentando o diâmetro anteroposterior da


pelve posterior. Aliada à movimentação corporal, a con-
tranutação sacral ajuda a resolver a DO. Estando a par-
turiente em litotomia, as nádegas são deslocadas rente
à borda da cama (ou maca) de parto e os membros infe-
riores são soltos abaixo do nível da pelve, em posição de
Crouzat-Walcher, ampliando o estreito superior. Logo em
seguida, a parturiente é posicionada em McRoberts. Esse
mesmo movimento de contranutação do sacro também é
proposto para outras posições adotadas no parto (Sims,
joelhos, Gaskin).(30) O protocolo de Tully (2012)(31) propõe
que as manobras sejam iniciadas com a parturiente na
posição de Gaskin ou em “largada de corrida”. Realiza-se
a manobra de Rubin II deslocando o diâmetro biacromial
do feto para o diâmetro oblíquo da pelve materna e am-
Figura 12. Sequenciamento final das manobras no mnemônico
pliando o espaço para inserção da mão que realizará a
A SAÍDA. Desprendimento do braço posterior em posição de
remoção do braço posterior.(31)
quatro apoios (Gaskin)
Fonte: Adaptada de Amorim et al. (2013).(29)
QUAIS SÃO AS MANOBRAS DE ÚLTIMA
INSTÂNCIA (RESGATE) NO TRATAMENTO DA DO?
QUAIS OUTROS SEQUENCIAMENTOS A fratura da clavícula e a extração do ombro posterior
DE MANOBRAS PODEM SER ADOTADOS com o auxílio de uma tipoia são manobras que podem
NO TRATAMENTO DA DO? ser tentadas imediatamente antes das manobras clás-
Uma abordagem situacional pode ser adotada de acordo sicas de última instância (Zavanelli, resgate abdominal
com a posição materna no momento da DO e com os e sinfisiotomia). No entanto, elas não se enquadram no
movimentos da pelve. No sequenciamento proposto por manejo inicial da DO acima descrito, pois são associa-
Harder (2005),(30) antes das manobras internas, são exe- das a maior morbidade neonatal.(22,32) A clavícula ante-
cutados movimentos para promover uma contranutação rior pode ser intencionalmente fraturada, reduzindo o
do sacro, levantando a articulação lombossacra contra a diâmetro biacromial e delivrando o ombro impactado.

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Alves AL, Nozaki AM, Polido CB, Knobel R

Figura 13. Desprendimento do ombro posterior com o auxílio de tipoia


Ilustração: Felipe Lage Starling.

Na técnica, o operador deve utilizar os dedos para tra-


cionar a clavícula para fora, até que se quebre. O pro-
cedimento pode ser tecnicamente difícil e se associar
a lesões das estruturas vasculares e pulmonares fetais
subjacentes. Entretanto, é um procedimento menos
mórbido do que as manobras de última instância.(22) O
ombro posterior pode ser extraído com o auxílio de uma
tipoia aplicada na axila posterior. Fratura umeral pare- Figura 14. Manobra de Zavanelli
ce ser a principal morbidade neonatal associada. Uma Ilustração: Felipe Lage Starling.
sonda urinária n° 12 ou 14 (ou um cateter de sucção) é
dobrada em alça na extremidade do dedo indicador que
será alocado atrás do ombro posterior. A alça é empurra-
transabdominal do ombro anterior. Efetuada a rotação
da por detrás da axila posterior, até ser recuperada pelo
do diâmetro biacromial para o diâmetro oblíquo da
outro dedo indicador, que é introduzido no lado contra-
pelve, a extração fetal é realizada por via vaginal por
lateral da pelve, anteriormente ao tórax fetal. O laço é
outro operador.(34)
subsequentemente desdobrado, formando uma tipoia
Apesar de poder salvar vidas, a sinfisiotomia deve
ao redor do ombro posterior. As extremidades da tipoia
ser manobra de exceção, devido à falta de evidências
são apreendidas e uma tração inferior moderada é exe-
quanto a sua eficácia e segurança, assim como pelas
cutada, até a liberação do ombro posterior (Figura 13).
possíveis morbidades associadas, particularmente a
A tipoia também pode ser utilizada para promover uma
instabilidade pélvica. A divisão cirúrgica da cartilagem
rotação dos ombros em 180°, com o auxílio de uma con-
da sínfise púbica amplia a abertura pélvica, desobs-
trapressão efetuada atrás do ombro anterior.(32)
truindo o ombro. Apesar de poder solucionar a DO, deve
As manobras de última instância (Zavanelli, resgate
ser realizada apenas diante da falha das demais mano-
abdominal e sinfisiotomia) apresentam maior morbida-
bras e em locais onde não é possível realizar o resgate
de, e seus riscos e benefícios devem ser avaliados con-
abdominal por ausência de salas cirúrgicas. A técnica
siderando as condições fetais e as possibilidades locais
é realizada sob anestesia local, com a parturiente em
para a realização das intervenções e tratamento das com-
litotomia e membros inferiores abduzidos. Após sonda-
plicações. Relaxamento muscular (sedação, anestesia ge-
gem vesical, o anestésico deve ser infiltrado na pele e
ral) e uterino otimiza o sucesso dessas manobras. São
subcutâneos sobrejacentes à cartilagem púbica. O ope-
recomendadas a terbutalina (0,25 mg, via subcutânea) e
rador desvia a uretra lateralmente com uma das mãos
a nitroglicerina (50 mcg a cada minuto até a obtenção do
e realiza uma incisão de 1 a 3 cm com uma lâmina de
relaxamento; dose máxima 250 mcg).(33)
bisturi. A incisão deve ser suficiente para o afastamento
A manobra de Zavanelli (Gunn-Zavanelli-O’Leary) re-
dos ramos púbicos e delivramento do ombro impacta-
posiciona a cabeça fetal na pelve para uma cesárea sub-
do. Portanto, não é necessário incisar a espessura total
sequente (Figura 14). O passo inicial é a reversão da ro-
da cartilagem. Após o procedimento, repouso absoluto
tação externa, posicionando o occipital anteriormente. A
está recomendado por dois dias, seguido de mobiliza-
seguir, a cabeça é fletida e, por meio de pressão firme
ção progressiva. Abdução dos membros inferiores deve
exercida com a palma de uma das mãos, empurrada su-
ser evitada entre 7 e 10 dias.(35)
periormente na vagina, o mais alto possível. A outra mão
pode deprimir o períneo simultaneamente, aliviando a
compressão do cordão umbilical e facilitando o reposi- QUAIS AS PRINCIPAIS COMPLICAÇÕES
cionamento vaginal da cabeça.(33) MATERNAS E NEONATAIS ASSOCIADAS À DO?
No resgate abdominal, a parturiente é submetida As complicações maternas graves mais comuns da DO
a laparotomia e histerotomia para a rotação manual são a hemorragia pós-parto (atonia uterina e lesões do

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Manejo da distocia de ombro

trajeto) e as lacerações perineais complicadas. Outras delivramento. As manobras devem ser descritas con-
complicações incluem a diástase da sínfise púbica, as forme o sequenciamento ocorrido. Deve-se detalhar o
lesões do trato urinário (uretra e bexiga) e a neuro- tempo gasto em cada manobra, assim como o intervalo
patia cutânea femoral lateral transitória, secundária à de tempo até a resolução.(39)
manobra de McRoberts. As manobras de última instân- Também devem ser relatados a perda sanguínea es-
cia podem se associar mais a rotura uterina, diástase timada, os detalhes da revisão do canal de parto, o
da sínfise púbica e lesões do trato urinário.(36) índice de Apgar, o pH do cordão umbilical e a avaliação
As lesões neonatais incidem em 5% das DOs. Podem neonatal.(39)
ocorrer mesmo quando o tratamento é adequadamen-
te instituído. A continuidade da descida da cabeça fe- QUAL O IMPACTO DO TREINAMENTO
tal simultânea à impactação do ombro promove o es-
DE HABILIDADES E DA SIMULAÇÃO
tiramento dos nervos do plexo braquial, com potencial
NO TRATAMENTO DA DO?
agravamento das lesões determinado pelas manobras de
O treinamento de habilidades e a simulação propiciam
delivramento executadas. Adicionalmente, a compressão
melhorias no uso das manobras, na comunicação entre
dos vasos do cordão umbilical e do pescoço fetal e a es-
os membros das equipes e na documentação do evento.
timulação vagal excessiva são eventos que resultam em
O uso de protocolos e de metodologias ativas de ensino
asfixia neonatal. A complicação neonatal mais frequente
promove o manejo baseado em evidências científicas e
é a lesão do plexo braquial. O estiramento do plexo bra-
a redução das lesões transitórias do plexo braquial.(40)
quial é significativamente mais incidente quando três ou
mais manobras são realizadas. As lesões nas raízes C5 e
C6 ou em C5, C6 e C7 (paralisia de Duchenne-Erb) são de CONSIDERAÇÕES FINAIS
melhor prognóstico e se recuperam dentro de seis meses A imprevisibilidade e a potencial gravidade da DO, as-
em mais da metade dos infantes. Já as lesões envolvendo sim como a limitação do tempo para sua resolução
todas as raízes de C5 a T1 se restabelecem em cerca de sem sequelas, fazem desse evento um dos mais desa-
14% dos casos.(37) fiadores da urgência em obstetrícia, exigindo dos cui-
Apesar de a DO e a força excessiva do operador se- dadores atuação conjunta e organizada, com institui-
rem fatores de risco importantes para o estiramento ção rápida e hábil de manobras tocúrgicas específicas.
do plexo braquial, essas lesões frequentemente ocor- Contemporaneamente, o cenário epidemiológico da DO
rem na ausência de impactação do ombro, em cesá- é marcado pelo aumento da sua incidência, determi-
reas ou associadas a injúrias ocorridas no período nado pela alta prevalência de obesidade e diabetes na
pré-natal. Portanto, parece que as forças propulsoras, gestação. Diante desses aspectos, podemos afirmar que
a posição fetal e os puxos maternos podem ser sufi- todos os profissionais que assistem partos devem estar
cientes para ocasionar tração lesiva do plexo braquial. capacitados para o rápido reconhecimento e resolução
(38)
Outras complicações neonatais graves são as fratu- desse evento, objetivando prevenir a asfixia e morte
ras da clavícula e do úmero, pneumotórax, encefalopa- neonatal, a paralisia braquial permanente e as compli-
tia hipóxico-isquêmica e óbito neonatal. Complicações cações maternas associadas. Uma vez que o treinamen-
neonatais mais raras incluem a paralisia diafragmáti- to de habilidades e a simulação otimizam a resolução
ca, a síndrome de Horner (paralisia óculo-simpática), clínica e a documentação da DO, instituir protocolos e
a lesão do nervo facial, a fratura espiral do rádio e a metodologias ativas de ensino é imprescindível para
paralisia do nervo laríngeo.(36) propiciar o manejo baseado em evidência científica e o
melhor desempenho das equipes assistenciais no en-
frentamento desse “pesadelo obstétrico”.
QUAIS OS PRINCIPAIS ASPECTOS
NA DOCUMENTAÇÃO DA DO?
O registro dos eventos relacionados à DO, com detalha- REFERÊNCIAS
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mento da assistência prestada e das complicações, é 2017;129(5):e123-33. doi: 10.1097/AOG.0000000000002043
estritamente recomendado. A documentação adequada
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do evento é importante para o aconselhamento das pa- DE. Management of shoulder dystocia: trends in incidence
cientes e dos seus cuidadores quanto aos riscos futuros, and maternal and neonatal morbidity. Obstet Gynecol.
assim como para assuntos legais. O uso de formulários 2007;110(5):1059-68. doi: 10.1097/01.AOG.0000287615.35425.5c
padronizados propicia melhoria documental.(39) 3. Hoffman MK, Bailit JL, Branch DW, Burkman RT, Veldhusien
A documentação deve citar os membros da equipe PV, Lu L, et al. A comparison of obstetric maneuvers for the
acute management of shoulder dystocia. Obstet Gynecol.
que participaram da assistência, assim como o tempo 2011;117(6):1272-8. doi: 10.1097/AOG.0b013e31821a12c9
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review. BJOG. 2011;118(4):474-9. doi: 10.1111/j.1471-0528.2010.02834.x
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Manejo da distocia de ombro

Como citar: Comissão Nacional Especializada em Urgências Obstétricas


Alves AL, Nozaki AM, Polido CB, Knobel R. Manejo da distocia de da Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e
ombro. Femina. 2022;50(7):415-27. Obstetrícia (Febrasgo)

*Este artigo é a versão em língua portuguesa do trabalho Presidente:


“Management of shoulder dystocia”, publicado na Rev Bras Álvaro Luiz Lage Alves
Ginecol Obstet. 2022;44(7):723-35.
Membros:
Gabriel Costa Osanan
Álvaro Luiz Lage Alves Samira El Maerrawi Tebecherane Haddad
Hospital das Clínicas, Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Adriana Amorim Francisco
Horizonte, MG, Brasil. Alexandre Massao Nozaki
Brena Carvalho Pinto de Melo
Alexandre Massao Nozaki
Breno José Acauan Filho
Hospital Maternidade Interlagos, São Paulo, SP, Brasil. Carla Betina Andreucci Polido
Carla Betina Andreucci Polido Eduardo Cordioli
Faculdade de Medicina, Universidade Federal de São Carlos, São Frederico José Amedée Peret
Carlos, SP, Brasil. Gilberto Nagahama
Laíses Braga Vieira
Roxana Knobel Lucas Barbosa da Silva
Faculdade de Medicina, Universidade Federal de Santa Catarina, Marcelo Guimarães Rodrigues
Florianópolis, SC, Brasil. Rodrigo Dias Nunes
Roxana Knobel
Conflitos de interesse:
nada a declarar.

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