A Opressão Racial e A Exploração Do Trabalho Na Sociedade

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“Questão Social, Pandemia e Serviço Social:

em defesa da vida e de uma educação emancipadora”

Eixo temático: Serviço Social, relações de exploração/opressão e resistências de gênero,


feminismos, raça/etnia, sexualidades
Sub-eixo: Antirracismo e Serviço Social

A OPRESSÃO RACIAL E A EXPLORAÇÃO DO TRABALHO NA SOCIEDADE


CAPITALISTA: notas para o Serviço Social

LEONARDO PATRÍCIO DE BARROS 1

RESUMO

O ensaio teórico aqui proposto analisa a importância da


abordagem dos aspectos fundamentais das relações
raciais nas reflexões acerca da exploração do trabalho na
sociedade capitalista e a urgência de sua incorporação
nas produções do Serviço Social. Buscamos evidenciar
que na formação social dos países latino-americanos, em
especial no Brasil, o racismo é elemento estrutural e
estruturante, e, consequentemente as relações de
exploração e opressão produzidas no bojo do
funcionamento do capital estão baseadas e subsidiadas
pelo racismo. Historicamente os negros têm ocupado os
estratos mais subalternizados da sociedade.

Palavras-chave: Questão racial e Serviço Social;


Racismo; Trabalho e questão racial; Capitalismo e
racismo.

ABSTRACT

1 Estudante de Pós-Graduação. Universidade Do Estado Do Rio De Janeiro

XVII Encontro Nacional de Pesquisadores em Serviço Social


The theoretical essay proposed here analyzes the importance
of approaching the fundamental aspects of racial relations in
the reflections on the exploitation of work in capitalist society
and the urgency of its incorporation in the productions of Social
Work. We seek to show that in the social formation of Latin
American countries, especially in Brazil, racism is a structural
and structuring element, and, consequently, the relations of
exploitation and oppression produced in the midst of the
functioning of capital are based and subsidized by racism.
Historically, blacks have occupied the most subordinate strata
of society.

Keywords: Racial issue and Social Work; Racism; Work and


racial question; Capitalism and racism.

1 INTRODUÇÃO

Nosso trabalho consiste na análise da importância da incorporação dos aspectos


fundamentais das relações raciais nas reflexões acerca da exploração do trabalho
na sociedade capitalista e a urgência de sua aglutinação nas produções do Serviço
Social
Realizamos um debate que nos possibilitou apreender, considerando determinado
período histórico, como a ideologia racial esteve presente na estruturação da
sociedade colonial-escravista e segue atualizada no contexto do capitalismo.
As inquietações que permearam a escolha do tema estão relacionadas ao fato de
que nos territórios latino-americanos a ideia de raça foi essencial para a formação
social desses países, em especial o Brasil, lugar que damos maior destaque na
análise. Entendemos que a noção de raça serviu como base à estruturação da
sociabilidade nesses Estados, em que as classes sociais eram divididas em duas
classes fundamentais, a de senhores e escravizados, como evidencia Moura (2014).

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Durante aproximadamente 400 anos, no Brasil, o sistema de produção colonial-
escravista foi justificado pela ideologia racial e consequentemente a exploração do
trabalho, na transição ao modo de produção tipicamente capitalista se fortaleceu,
ressignificando o racismo.

2 O RACISMO COMO ELEMENTO BASE PARA CONSOLIDAÇÃO DO


CAPITALISMO

Iniciamos nossa reflexão afirmando que no contexto da América Latina 2, para


realizar um debate que busque apresentar na totalidade a interpretação sobre a
dinâmica entre capital e trabalho existente na realidade concreta no cenário do
capitalismo periférico se torna extremamente necessário considerarmos a categoria
raça no processo de construção da sociabilidade burguesa nesse território.
É preciso, em primeiro lugar, evidenciar que para o desenvolvimento do capitalismo
na Europa o processo de vilipêndio, invasão, roubo e morte foi elemento
fundamental. Como já aponta Marx o processo de acumulação primitiva pode ser
compreendido como “(...) uma acumulação que não decorre do modo capitalista de
produção, mas é seu ponto de partida” (MARX, 2017, p. 835).
Partindo da definição citada, podemos observar que no processo de colonização
ocorrido nas Américas, essa acumulação chamada primitiva guardou aspectos
particulares e, podemos dizer, foi antessala para o desenvolvimento do capitalismo
no Velho Mundo e no Novo Mundo.
Partindo do exposto adensamos nossa problematização considerando que
“na América, a ideia de raça foi uma maneira de outorgar legitimidade às relações de
dominação impostas pela conquista” (QUIJANO, 2021, p. 118). Isso significa dizer
que a categoria raça é elemento ideológico que serviu de base à subalternização 3

2 Importante destacar que em linhas gerais realizamos algumas referências a América Latina, entretanto, o
foco principal de nossa produção se mantém no Brasil.

3 Entendemos que “A categoria de grupos subalternos-classes sociais subalternas compreende muitos outros
componentes da sociedade, além da “classe operária” e do “proletariado”. G. não usa “subalterno” ou
“subalternos” como simples substituto de “proletariado”, para se esquivar se esquivar da censura carcerária
ou por outras razões. (...) assim se entregam os mesmos subalternos à periferia da cultura e da política,
classificando-os como bizarros, desequilibrados, atípicos, meras curiosidades”. (LUGORI, Guido; VOZA,
Pasquale, 2017, pp. 746 – 749).

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das populações autóctones. A ideia gramsciana de subalternidade nos ajuda a
compreender como indígenas e negros 4, no processo de colonização, foram
destituídos inclusive de humanidade, assim, tornaram-se meras mercadorias.
Pensar o processo de colonização nos possibilita compreender as relações
amalgamadas entre as sociedades coloniais e as capitalistas em desenvolvimento
na Europa. Aqui, daremos ênfase a realidade brasileira, pois a formação social
brasileira nos oferece elementos essenciais para desvendar, em alguma medida,
como a colonização serviu como uma forma de acumulação primitiva e evidencia
que a ideologia de inferioridade racial da população negra segue contribuindo à
continuidade da lógica capitalista.
O processo de escravização do negro esteve pautado no que podemos chamar de
centralidade do homem europeu como padrão de civilidade e desenvolvimento para
os outros territórios do mundo, sendo assim, é preciso observar que a colonização e
escravização foram legitimadas pela ideia de que era necessário civilizar os
selvagens. O pensamento iluminista 5 colocou o homem europeu nesse lugar de
destaque.
O iluminismo tornou-se o fundamento filosófico das grandes revoluções liberais (...).
E foi esse movimento de levar a civilização para onde ela não existia que redundou
em um processo de destruição e morte, de espoliação e aviltamento, feito em nome
da razão e a que se denominou colonialismo (ALMEIDA, 2019, p. 19).

Podemos observar, que esse processo transitório da sociedade feudal para o


capitalismo teve como elemento primordial a centralidade do homem, mas um
homem específico, o europeu, cristão e branco. Isso significou o início de um
processo de aniquilação e destruição de outros povos e culturas que não fossem
consideradas civilizadas.
É desse ponto de análise que compreendemos que o processo de acumulação
primitiva realizado nas colônias teve por principal ideologia o racismo.
Ao longo da história a construção do pensamento racista foi sendo elaborado

4 Importante destacar que em nosso trabalho abordamos o negro e o indígena nesse primeiro momento por
terem sido esses os que passaram elo processo inicial de escravização nos primeiros anos das
colonizações, entretanto, ao longo de nossas elaborações iremos considerar o racismo antinegro, ou seja, a
forma de racismo desenvolvida contra os negros, pois é esse o foco de nossa produção.

5 Movimento cultural e sociopolítico entre os séculos XVII e XVIII que tinha como principal reivindicação a
transformação da sociedade europeia por meio da razão em oposição ao pensamento religioso.

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ao longo dos anos e contou com variadas contribuições, das muitas interpretações
raciais para subalternização do negro é preciso evidenciar a que está relacionada
com um dos pilares do capitalismo, o liberalismo.
John Locke, que pode ser considerado o pai do liberalismo defendia com veemência
a liberdade dos homens, mas não de todos os homens e sim aqueles que não eram
categorizados como mercadoria, ou seja, os escravizados não eram entendidos
como homens e a liberdade não era um direito para esses sujeitos.
Vale destacar que o pensador inglês era “acionista da Royal African
Company” (LOSURDO, 2006, p. 28) e com isso participava ativamente do processo
de lucro gerado pelo tráfico de escravizados, esse era um mercado importantíssimo
e de extrema lucratividade no processo de acumulação primitiva.
Mas o sistema colonial não criaria apenas a escravidão. Criaria, isto sim, a
escravidão africana. De fato, o tráfico negreiro, ao transformar a captura em
empreendimento altamente lucrativo, tornou-se poderoso fator de acumulação
primitiva, gerando, ao mesmo tempo, vultosos excedentes por intermédio da
comercialização do escravo e viabilizando, sem maiores problemas, a reprodução do
estoque de cativos na colônia (KOWARICK, 1994, p. 22).

É preciso compreender que o processo de colonização, instituição do tráfico de


escravizados e expropriação de riquezas e territórios integraram a acumulação
primitiva na América Latina. É nesse sentido que identificamos o racismo como base
essencial na construção e desenvolvimento do capitalismo na Europa, pois foi,
também, por meio das riquezas produzidas pelo colonialismo e escravização,
justificados pelo racismo, que o capitalismo teve seu desenvolvimento financiado,
não somente pelo trabalho livre assalariado, mas também, pela exploração do
trabalho executado pelos sujeitos escravizados.
A escravidão direta é o eixo da indústria burguesa, assim como as máquinas, o
crédito etc. Sem escravidão não teríamos o algodão; sem algodão, não teríamos a
indústria moderna. A escravidão valorizou as colônias, as colônias criaram o
comércio universal, o comércio mundial que é a condição da grande indústria. Por
isto, a escravidão é uma categoria econômica da mais alta importância (MARX,
1985, p. 108).

Nesse aspecto que percebemos que historicamente os processos de escravização


do negro e colonização dos países como o Brasil foram elementos fundamentais ao
desenvolvimento do capitalismo na Europa e foi determinante para que as colônias
ocupassem o lugar da periferia no capitalismo.
Após essa breve consideração que identifica a raça como elemento central na

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construção do capitalismo, e, consequentemente revela a necessidade de
considerar a raça nas interpretações sobre o capitalismo, especialmente nos países
dependentes, para que se alcance a totalidade, nos interessa partir para o debate
sobre o trabalho em Marx, obviamente, trazendo importantes reflexões sobre as
particularidades de sua exploração na periferia do capital.
Importante sinalizar que entendemos como dependentes os países que
ingressaram no mercado mundial pela porta dos fundos e especialmente no caso
brasileiro, viveu a condição de colônia por aproximadamente três séculos, conforme
Lemos (2014).
Portanto, é importante delimitar que nos interessa refletir sobre a exploração
do trabalho na sociedade capitalista, demonstrando que a forma de sua exploração
na América Latina, em especial no Brasil 6, possui particularidades relacionados à
raça, justamente por ocasião da formação social baseada na escravização do negro
e colonização.
Partindo disso indicamos que categorias de análise marxistas e marxianas,
considerando a questão de raça, nos permitirão compreender de forma mais
aproximada da totalidade a exploração do trabalho no capitalismo periférico.

3 A COMPREENSÃO ONTOLÓGICA DO TRABALHO

Como é possível observar, partindo do resgate histórico feito por Valéria Forti
(2013), a ontologia7 possuiu vários significados. Passando pelas interpretações de
Aristóteles, Parmênides e pelas definições da Igreja, a autora demonstra que ao
longo dos séculos variadas foram as compreensões sobre ontologia, entretanto, nos
apresenta uma ideia sobre ontologia que é a que nos interessa para abordar a
centralidade do trabalho na constituição o ser social.
A ontologia do ser social, apreendida por Marx é aquela que de forma mais

6 Realizamos esse recorte por ocasião de o Brasil estar mais diretamente ligado com nosso objeto de tese,
além de ter sido o último país das Américas a abolir a escravidão o que nos revela o caráter escravocrata e
racista dos interesses das classes dominantes nesse território. “o racismo é uma ideologia que “cimenta”
relações sociais particularmente em um país atravessado historicamente por mais de três séculos de
escravização de africanos abolida de forma conservadora tardiamente”. (OLIVEIRA, 2021, p. 64).

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completa nos fornece as possibilidades de compreender os motivos essenciais de
no capitalismo o trabalho ter tomado centralidade. Para além disso, nos permite,
também, observar a importância que teve o trabalho escravo na construção do
capitalismo, e, consequentemente colocando o racismo como pilar desse processo
de transição de uma sociedade colonial-escravista para uma sociedade capitalista.
No pensamento de Marx, a ontologia possui configuração materialista e social. (...).
Marx trouxe à baila a centralidade da práxis em face do mundo dos homens,
situando-a como atividade humana que se distingue das demais por pressupor
teleologia. (FORTI, 2013, p. 23).

A autora nos permite compreender o trabalho como práxis humana. Afirma que
ele, o trabalho é essencial à nossa sobrevivência e é a partir dele que surge o ser
social.
Para atender suas demandas de subsistência o homem passa a realizar o
trabalho, atividade essa diferenciada das práticas dos demais animais da natureza
pela sua especificidade teleológica8.
É preciso em primeiro lugar o homem criar em sua subjetividade o produto de sua
ação para depois executá-la e é justamente essa capacidade a teleológica,
identificada por Marx (2014). Nesse aspecto podemos compreender o homem, no
sentido do ser social, como sujeito que por meio do trabalho passa a ter relações
sociais, as interações entre esses seres se dão por meio do trabalho coletivo.
Com o desenvolvimento do trabalho e sua complexificação, consequentemente a
sociedade se complexifica e resultado do desenvolvimento do trabalho surge a
divisão técnica do trabalho.
As transformações ao longo dos anos na dinâmica da sociedade estiveram
ligadas a essa complexificação das relações de produção e dos próprios processos
produtivos, entretanto, a divisão social do trabalho “(...) entre cidadãos livres e
escravos materializa uma dada legitimidade e diferença no fazer e pensar no
cotidiano das pessoas. O trabalho humano em sua dimensão técnica amplia, e a
divisão social põe em evidência quem é que comanda e quem é comandado”.
(BATISTA, 2020, p. 105). Aqui se encontra a chave para compreender que a divisão

8 “Pressupomos o trabalho sob forma exclusivamente humana (...) o que distingue o pior arquiteto da melhor
abelha é que ele figura na mente sua construção antes de transformá-la em realidade”. (MARX, 2014, p.211
– 212).

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social do trabalho se torna o elemento chave à divisão das classes sociais que
conjugada como racismo possibilitou a divisão entre senhores e escravizados.
Mas sigamos, ainda, na reflexão sobre a importância do trabalho na construção
do ser social e seu desenvolvimento.
As categorias debatidas por Marx são essenciais para compreensão da
importância do trabalho no desenvolvimento do próprio ser social e das relações
sociais. Como podemos observar é partindo da ontologia do ser social que o autor
chega no ponto crucial da compreensão da centralidade da economia, não por uma
via economicista, mas por entender que as categorias econômicas são fundamentais
na produção e reprodução das relações sociais e é nesse ponto que Marx se
diferencia dos demais pensadores clássicos.
(...) originalidade inovadora reside, não menos importante, no fato de que, pela
primeira vez na história, as categorias econômicas aparecem como as categorias de
produção e reprodução da via humana, tornando assim possível uma exposição
ontológica do ser social sobre bases materialistas. (...) A evolução filosófica que leva
Marx ao materialismo culmina nesse voltar-se para a economia. (LUKÁCS, 2012, p.
284 – 285).

Podemos perceber que a compreensão ontológica do ser social está diretamente


ligada ao método histórico-dialético de Marx, justamente no sentido de partir do
material para compreensão da totalidade. Seguindo uma lógica do “existo, logo
penso”, que é uma inversão do pensamento de Descartes, Marx passa a observar
na materialidade os nexos para entender a essência das coisas. Nesse sentido
temos a possibilidade de compreender que o fenômeno é apenas parte do todo e é
por meio das elaborações possibilitadas pela abstração que se pode chegar próximo
do entendimento da realidade que é o concreto pensado.
Assim, como evidencia Lukács (2012), Marx inverte a dialética idealista de Hegel
partindo do material para compreender a realidade. “O concreto é concreto porque é
a síntese de múltiplas determinações, portanto, unidade da diversidade. Por essa
razão, o concreto aparece no pensamento como processo da síntese, como
resultado, não como ponto de partida (...). (MARX, 2011, p. 54).
Foi por meio do método, que Marx teve a possibilidade de fazer o giro
epistemológico e identifica o trabalho como categoria fundamental na constituição
dos sujeitos.

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Considerando o trabalho como práxis humana e imprescindível à sobrevivência
do homem e produtor de valor de uso, conforme Marx (2014), nós temos a
possibilidade de compreender os motivos pelo qual o trabalho ao longo da história
da sociedade é apropriado, a depender do cenário da luta de classes que se
configura.
O que se pretende dizer é que a depender dos interesses antagônicos e da
correlação de forças que estão em jogo na sociedade, o trabalho assume
determinado papel e sua exploração estará ligada, especificamente, em uma
sociedade de classes, à classe dominante.
Concordamos que “a história de todas as sociedades até agora tem sido a história
das lutas de classes” (MARX, 2008, p. 8), sendo assim o trabalho como aspecto
fundamental na construção do ser social assume um papel de protagonismo nas
sociedades.
A exploração do trabalho na sociedade colonial-escravista foi transitória, mesmo
que longa, para sustentar a forma de exploração na sociedade capitalista, portanto,
entendemos que a primeira é prerrogativa à segunda. O que se observa é que a
sociedade capitalista dependeu significativamente, para sua consolidação, da
existência da sociedade colonial-escravista e consequentemente do racismo.

3.1 O racismo como elemento fundamental na configuração da exploração do


trabalho nas economias dependentes

O racismo é, no capitalismo dependente uma determinação fundamental na


racionalização dos desníveis sociais criados pela apropriação dividida da riqueza
entre as classes dominantes internas e externas. Ele antecede a organização
capitalista do trabalho neste território e confere sentido às ações das classes
dominantes internas na tentativa de defender seu status quo frente à dominação
externa. (SOUZA, 2018, p. 176).

Concordamos que nesses territórios, de capitalismo dependente, a divisão de


classe foi fortemente determinada, também, pelo racismo e seu desenvolvimento ao
longo do processo de formação social desde as invasões coloniais.
No caso brasileiro podemos observar especificamente o processo de exploração
do trabalho escravo em que a produção de excedente para comercialização nos
países centrais – principalmente Inglaterra, França, Holanda, Portugal e Espanha –,

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significou base da sociabilidade no país em aproximadamente quatrocentos anos. A
sociedade baseou-se e formou-se tendo como pilar o trabalho escravo, e a
construção das relações sociais tinham como elemento específico a divisão de
classes entre senhores e escravizados, sendo o racismo o elemento legitimador
dessa conformação de classe.
Em sua obra, Demier (2017) faz uma abordagem sobre o processo de “transição
pelo alto” do bonapartismo militar brasileiro para a democracia liberal no Brasil,
embora o autor esteja analisando um período histórico diferente do que estamos, o
conceito de “transição pelo alto”, já anteriormente definido por Coutinho 9 , de que
toma posse para realizar suas elaborações, também, nos auxilia para compreender
que é traço marcado do Brasil as metamorfoses pelo alto, ou seja, encabeçadas
pelas classes dirigentes.
O processo de abolição da escravidão no país, embora resultado de variadas
insurreições negras, como nos revela Moura (2014), a forma com que se extirpou a
escravização dos negros no país foi determinada e orientada pelos integrantes das
classes escravistas que se mantiveram como classes dominantes no pós-abolição e
desenvolvimento do capitalismo no Brasil.
O trabalho livre e assalariado no Brasil teve como seu precursor o trabalho
escravo. O processo de transição do primeiro para o segundo trouxe elementos
importantes de influência para a nova configuração que se moldava a sociedade
brasileira, agora em fase de implementação do modo de produção tipicamente
capitalista, mas ainda guardando traços e ecos do formato colonial-escravista.
Com o fim do trabalho escravo no Brasil o processo de formação da classe
trabalhadora no país teve por base a imigração de trabalhadores europeus,
imigrantes esses já parte do exército industrial de reserva naquele continente. As
fileiras dos trabalhadores no Brasil foram formadas especialmente pela utilização da
força de trabalho dos brancos, sendo o negro relegado aos postos de trabalho mais

9 “O caminho do povo brasileiro para o progresso social – um caminho lento e irregular - ocorreu sempre no
quadro de uma conciliação com o atraso, seguindo aquilo que Lenin chamou de ‘via prussiana’ e Gramsci
designou como ‘revolução passiva’. Em vez das velhas forças e relações sociais serem extirpadas através
de amplos movimentos populares de massa, como é característico da ‘via francesa’, a alteração social se fez
aqui mediante conciliações entre o novo e o velho; ou seja, se consideramos o plano imediatamente político,
mediante um reformismo ‘pelo alto’, que excluiu inteiramente a participação popular”. (COUTINHO, 2011, p.
90-91).

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explorados e consequentemente deixados para ocuparem os espaços da
informalidade.
“Mais tarde, com a abolição da escravidão, o imigrante branco europeu foi
escolhido para o assalariamento urbano industrial como principal alternativa aos
trabalhadores negros, que povoavam a nossa produção agrária”. (ANTUNES, 2018,
p. 253).
Para além de o homem branco ser uma alternativa ao negro, é preciso evidenciar
que com a consolidação das leis trabalhista/CLT esses trabalhadores negros, que
ocupavam os postos de trabalho agrários não tiveram seus direitos garantidas,
seguindo assim, na retaguarda da classe trabalhadora e invisibilizados no contexto
de uma possível cidadania.
Antunes (2018) ainda falando sobre a diferenciação entre trabalhadores negros e
brancos nos evidencia que os direitos provenientes da CLT “excluíam as massas
assalariadas do campo”. (ANTUNES, 2018, p. 254), ou seja, os negros.
É no contexto de territórios colonizados e fortemente racializados que o Brasil 10 e
em geral as economias dependentes que constituem a América Latina se inserem
no capitalismo. Esses territórios acabam por ter um significado de lócus de
exploração de riqueza, dependentes econômica e tecnologicamente dos países
centrais ocupando na divisão internacional do trabalho o lugar de fornecedor de
riquezas e paraíso da expropriação.
O processo de transição do trabalho escravo para o trabalho livre foi desenvolvido
ao longo de anos e contou com marcos importantes à subalternização do negro, no
aspecto jurídico legal variadas legislações foram criadas para lançar as bases
fundamentais à desigualdade de classes, colocando o negro como sujeito que
deveria ocupar os níveis mais subalternos existentes na sociedade.
A proibição de sua inserção nas escolas (Lei nº 1, de 14 de janeiro de 1837) e a
negação do direito à propriedade de terras (Lei nº 601 de 18 de setembro de 1850)
são algumas das variadas legislações que evidenciam o lugar que se pretendia que

10 “No Brasil, o desenvolvimento capitalista não se operou contra o ‘atraso’, mas mediante a sua contínua
reposição em patamares mais complexos, funcionais e integrados” (NETO, 2015, p. 33). Conforme defendo
o autor, podemos afirmar que o Brasil ao desenvolver o modo de produção tipicamente capitalista e
consequentemente a sociabilidade burguesa o fez conjugando o lastro arcaico de forma que fosse
reconfigurado nos padrões do capitalismo.

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o negro ocupasse.
Observamos, portanto, que variadas foram as iniciativas para impedir que no
processo de transição para o capitalismo o negro saísse da condição de exploração.
Apropriado pelo capital o racismo segue como ideologia legitimadora dessa
inferiorização da população negra, entretanto, passa a ter novas configurações e o
negro deixa de ser mercadoria, mas segue como cidadão de segunda classe.
Ousamos dizer que a divisão sociotécnica do trabalho livre assalariado foi
influenciado diretamente pelo racismo nos países periféricos, ficando a desigualdade
social marcada pelo traço racial, obviamente entendemos que a exploração do
trabalho é peça fundamental ao funcionamento da produção do valor, que é o
objetivo central do capital, produção e reprodução do valor de troca, entretanto, no
contexto dos países dependentes as desigualdades produzidas pelo próprio
funcionamento do capital estão marcadas pela raça e pelo gênero 11.
Dessa forma o que observamos é que na sociedade capitalista para que se
realize o valor e sua valorização a produção de mais valia é o elemento essencial,
entretanto, os níveis de exploração da força de trabalho são diferentes nos variados
espaços e grupos sociais, sendo aqueles entendidos como minorias os que sofrem
os impactos mais agudizados dessa exploração.
O racismo no bojo da sociedade capitalista é estratégico, estrutural e estrururante
e tem, também, a função de reduzir drasticamente o valor da força de trabalho
objetivando a manutenção da taxa de lucro do capital em superávit.

4 A PERTINÊNCIA DO DEBATE DA QUESTÃO RACIAL NO SERVIÇO SOCIAL

Considerando o Serviço Social uma profissão que historicamente está inserida


diretamente no trato das questões diretamente ligadas a relação capital e trabalho,
nos interessa, nesse momento, fazer uma abordagem sobre a importância da
incorporação do debate das relações étnico/raciais pelo do Serviço Social, de forma

11 Embora tenhamos consciência de que as desigualdades nos países dependentes são agudizadas pela
subalternização de variados grupos diferentes como mulheres, comunidade lgbtqia+, negros, dentre outros,
nós nos ocupamos, dentro dos limites desse trabalho, com as questões que envolvem raça.

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bastante dedicada, inclusive problematizando sobre as condições de exploração da
classe trabalhadora considerando as marcas do racismo nessa exploração. A
gênese da profissão é marcada pela vinculação com a Doutrina Social da Igreja, o
que particularmente indica a influência conservadora 12 e racista13 a qual foi
historicamente submetida a construção do Serviço Social brasileiro.
O Serviço Social surge como parte de um movimento social mais amplo, de bases
confessionais, articulado à necessidade de formação doutrinária e social do laicado,
para uma presença mais ativa da Igreja Católica no ‘mundo temporal’, nos inícios da
década de 30 (...) A profissão não se caracteriza apenas como nova forma de
exercer a caridade, mas como forma de intervenção ideológica na vida da classe
trabalhadora, com base na atividade assistencial: seus efeitos são essencialmente
políticos: o enquadramento dos trabalhadores nas relações sociais vigentes,
reforçando a mútua colaboração entre capital e trabalho. (IAMAMOTO, 2004, p. 18 –
20).

Assim, podemos observar que o Serviço Social assume um papel central na


“domesticação” da classe trabalhadora no contexto da consolidação do sistema de
produção tipicamente capitalista no Brasil. É no contexto da industrialização
brasileira que a profissão é demandada pelo Estado para enquadrar a classe
trabalhadora em um misto de coerção e consenso.
Com o desenvolvimento do capitalismo nessas regiões, o racismo permaneceu,
pois ele foi ideologia essencial na construção das relações sociais nesses territórios
e, apropriado pelo capital, as práticas e aparatos racistas foram reconfigurados para
atender a lógica da sociabilidade burguesa.
É justamente nesse aspecto que nos interessa afirmar que nesse cenário de
reconfiguração e consolidação do sistema de produção tipicamente capitalista no
Brasil, que o Serviço Social surge como profissão chamada para “dar o tom” da
dominação sobre a classe trabalhadora, inclusive sendo responsável pelo trato da
12 Nesse momento de nossas considerações a interpretação que utilizamos para compreender o termo
conservador está de acordo com a seguinte definição: “A fonte de inspiração do pensamento conservador
provém de um modo de vida do passado, que é resgatado e proposto como uma maneira de interpretar o
presente e como conteúdo de um programa viável para a sociedade capitalista” (IAMAMOTO, 2004, p. 22).
Isso significa dizer que compreendemos que o conservadorismo que influenciou a construção do Serviço
Social teve por base os pilares da formação social brasileira que podemos identificar como racismo,
colonialismo, machismo, patriarcado e homofobia. Obviamente, considerando o contexto da consolidação do
modo de produção tipicamente capitalista no Brasil, o conservadorismo que se apresentou à profissão
articulou esses pilares no contexto das necessidades de produção e reprodução do capital o que significa
que não cabia a esse conservadorismo a defesa da escravização negra, mas sim da subalternização desses
sujeitos na formação da classe trabalhadora.

13 Ao longo do processo de colonização e escravização do negro a Igreja Católica teve centralidade na


disseminação de ideologias racistas que legitimaram a inferiorização do negro nas variadas esferas da vida
social. Para maior aprofundamento ver Moura (2003).

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Questão Social em um formato estritamente regulador e punitivo.
Identificamos o lastro de uma formação profissional baseada em ideias
conservadoras. A profissão, principalmente nos períodos iniciais, pode ser
caracterizada “por ser um movimento ao qual se dedicam mulheres de famílias
abastadas (...)” (IAMAMOTO, 2014, p. 229), o que significa uma profissão
solidificada pelos padrões ideológicos burgueses e consequentemente
enquadramento e controle do proletariado.
Ao longo do desenvolvimento da profissão e das demandas impostas pelo
avanço do capitalismo as reconfigurações do mundo do capital se apresentam e em
meio pungência das demandas que a luta de classes apresenta, a profissão passou
por processos de transformação assim, e podemos identificar os movimentos de
reconceituação, a nível latino-americano, e o movimento de renovação do Serviço
Social no Brasil como os marcos de transformação da profissão.
É importante salientar que foram dois movimentos distintos que ocorreram na
profissão e em períodos diferentes, entretanto, em alguma medida se relacionam no
sentido de uma crítica ao Serviço Social tradicional e são resultado das demandas
da classe trabalhadora e das elaborações sobre as respostas profissionais.
O movimento de reconceituação que teve maior força em países da América
Latina como Uruguai, Argentina e Chile e deve ser identificado como “(...) fenómeno
tipicamente latinoamericano (...)” (NETO, 2007, p. 85). O que se quer delimitar aqui
é justamente a especificidade da reformulação da profissão na periferia do capital, o
que nos possibilita observar que no contexto de um capitalismo em ambiente
periférico, colonizado e racializado os enfrentamentos e a correlação de forças entre
a classe trabalhadora e as possuidoras dos meios de produção se acirram
permitindo particularidades diferentes dos centros do capital.
Nesse aspecto entendemos que os avanços alcançados pelo Serviço Social
latino-americano e especialmente no território brasileiro são resultado, também, das
possibilidades de luta que se apresentam diante do acirramento da barbárie
capitalista.
Mesmo que tenhamos acordo que os fatores que influenciaram o deflagramento
do movimento de reconceituação “radica Afuera del ámbito profisional, radica em

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factores exógenos al proprio Servicio Social (...) (NETO, 2007, p. 87)”, entendemos
que foi essencial uma reconsideração entre os sujeitos da própria categoria, foi
preciso que uma vanguarda analisasse as suas práticas profissionais e as
interpretassem como arcaicas, conservadoras e impossíveis de atender as reais
demandas de interesse da classe trabalhadora.
Seja o movimento de reconceituação nos demais países da América Latina e o
movimento de renovação do Serviço Social brasileiro, podemos dizer que foram
especificamente importantes processos de reconfiguração da profissão que
possibilitaram um giro da profissão na construção de uma lógica em defesa de um
projeto societário de superação do capitalismo.
É importante destacar que ao longo de sua reconfiguração, o Serviço Social
avançou sobremaneira desde sua constituição como profissão.
Na especificidade brasileira passou pela modernização conservadora,
reatualização do conservadorismo e pela intenção de ruptura. Os três momentos
que destacamos, nos termos influência de Neto (2015), nos permite compreender
que estamos diante de um processo gradual de avanço e, também, de retrocessos,
que estão interligados a dinâmica do desenvolvimento da sociedade, pois se
realizam como parte de seu desenvolvimento.
Assim, identificamos que o Serviço Social ao longo de sua construção passou
por variados processos históricos, inclusive de revisão, porém podemos identificar
que o movimento transformação da profissão é permanente e passível de
continuidade, desenvolvimento ou mesmo retrocessos, pois, embora na atualidade
tenhamos, no Brasil, um projeto profissional hegemônico alinhado com a defesa dos
interesses da demanda real da classe trabalhadora e superação do capitalismo, isso
não significa dizer que o apoio da categoria a esse projeto é unânime.
Observamos no cotidiano elementos importantes que nos permitem identificar
vertentes alinhadas com o conservadorismo e que apresentam uma gama de
proposta retrógradas frente aos avanços que a profissão conquistou ao longo dos
anos. As propostas de um Serviço Social clínico ou o próprio Serviço Social libertário
significam a tentativas de reintroduzir na atualidade práticas, em geral, já superadas
pela categoria.

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O que nos interessa afirmar, partindo dessa argumentação é evidenciar, como
nos demonstra Lukács (2012), que a história não segue um padrão retilíneo bem
delineado e de evolução cartesiana, mas que os avanços e atrasos fazem parte da
construção da história.
Assim, observamos que embora o Serviço Social no Brasil tenha rompido com o
projeto societário alinhado com os interesses da burguesia e se posicionado em
defesa da classe trabalhadora, existem lastros conservadores que permanecem na
profissão e que em muitos aspectos contribuem para novas propostas de projetos
profissionais que são verdadeiros rompimentos com os avanços conquistados.
Partindo do exposto, podemos inclusive identificar que no bojo o debate racial na
profissão tem ganhado força apenas nos últimos anos, o que significa que os
intelectuais da profissão foram capazes de construir conhecimento de forma
bastante robusta e sólida nos debates sobre o funcionamento da produção
capitalista e seus impactos sobre a classe trabalhadora, mas é preciso observar que
historicamente as produções não deram o devido destaque a questões relacionadas
ao gênero e a raça que são imprescindíveis para compreender o capitalismo na
particularidade latino-americana.
O que significou uma continuidade de práticas profissionais ainda influenciadas
pelo racismo, como podemos observar nas intervenções de assistentes sociais na
retirada da guarda de crianças de responsáveis por motivos relacionados as crenças
e práticas de religiões de matrizes africanas, o que configura a prática de racismo
religioso.
Se o atual código de ética dos assistentes sociais identifica como princípio
fundamental a “empenho na eliminação de todas as formas de preconceito,
incentivando o respeito à diversidade, à participação de grupos socialmente
discriminados e à discussão das diferenças” (CFESS, 1993, p. 23) é preciso que as
análises realizadas pela categoria estejam alinhadas a essas particularidades do
preconceito que não são meros detalhes que se encontram nas relações sociais,
mas que foram pilares da formação social brasileira e seguem a cada dia mais
fortalecidos justamente pela relação amalgamada entre capitalismo e
conservadorismo.

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Quando abordamos sobre as análises e sobre a importância do corpo intelectual
se debruçar considerando importantes conceitos e categorias que estão presentes
no debate da questão racial, o fazemos por compreender a importância do papel
dessas reflexões realizadas no interior da universidade que contribuíram de forma
ímpar para os processos de transformação do Serviço Social.
Não pretendemos impor um messianismo sobre a categoria, mas a
interpretamos como uma potente aliada no processo de transformação da
sociedade.
Ao fazer uma análise sobre os equívocos do movimento de reconceituação,
Santos (2007) identifica que não é a teoria que determina a prática e nem a prática
que determina a teoria, mas são um conjunto que possibilita a elaboração do
conhecimento.
É partindo dessa observação que compreendemos que é preciso que a
intelectualidade da profissão esteja engajada e comprometida com as análises
sociais, realizando as mediações que considerando a extrema importância das
questões de raça, classe e gênero, pois são esses os elementos que de forma
importante possibilitam a continuidade do modo de produção tipicamente capitalista.
Não é por mero acaso que no Brasil as camadas mais exploradas da classe
trabalhadora são negras e em contrapartida dentre os sujeitos que constituem a
classe dominante são brancos. Não podemos ficar na superfície da aparência dos
fenômenos e cair no erro de pensar que essa realidade se construiu apenas como
resultado de uma herança do escravismo colonial e que esse está superado.
O que de fato se identifica para além do fenômeno é que na lógica do capital a
necessidade exacerbada pela produção de mais-valia demanda que entre a classe
explorada exista estratificações de classe que sejam superexploradas, e os
marcadores de raça e gênero são essenciais nesse processo de estratificação.
É nesse sentido que observamos que é essencial que o Serviço Social considere
suas elaborações teóricas tendo a questão racial como elemento fundamental nas
análises e que a categoria profissional que tem como principal contingente de
usuários pessoas negras tome consciência desse debate para assim assumir uma
postura além de anticapitalista, também, antirracista.

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5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Embora não se esgote aqui o debate realizado, entendemos que a contribuição


que fizemos se apresenta como extremamente necessária, mesmo que em caráter
provocativo. Frente a realidade latino-americana que teve, guardadas as
particularidades de cada região, sua formação social fundamentada no racismo, é
imprescindível que os processos de análise sobre o funcionamento do capital
tenham o debate de raça aglutinado nas mediações.
Se a luta de classes está presente até aqui em todas as sociedades, é preciso
evidenciar que nas sociedades latino-americanos e especialmente no Brasil, a luta
de classes desde as invasões resultantes das grandes navegações é marcada pela
subalternização dos não brancos, relegando-os aos estratos mais explorados e
expropriados da classe trabalhadora.
Como observamos ao longo de nossa produção, não se pretendeu realizar uma
hierarquização entre as lutas sociais, mas evidenciar que há, na particularidade dos
países da América Latina, o racismo como mecanismo que agudiza a exploração do
trabalho e intensifica as desigualdades sociais.
Sendo o Serviço Social uma profissão que reivindica a defesa da classe
trabalhadora e dos seus interesses reais, no que tange à superação do capitalismo,
é preciso que a categoria esteja comprometida com a superação do racismo,
sexismo e misoginia.

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