Ens de Língua Materna
Ens de Língua Materna
Ens de Língua Materna
Edair Gorski
Raquel Meister Ko. Freitag
Ensino de Língua
Materna
Florianópolis
2010
Sumário
Apresentação .................................................................................................................... 3
Introduzindo a disciplina: Por que aprender uma língua que já sabemos? ....................... 5
Tópico 4: O contínuo escuta > fala > leitura > escritura ......................................... 21
Queridos alunos!
Edair e Raquel
1
Para ver nossa formação e experiência, visite nossos currículos na Plataforma Lattes:
http://lattes.cnpq.br/9068668791184377 (Edair) e http://lattes.cnpq.br/2582841591375626 (Raquel)
Introduzindo a disciplina: Por que aprender uma
língua que já sabemos?
É tão engraçado ir para a escola para aprender uma coisa que já sabemos. Por
que perder tempo aprendendo uma língua que já sabemos? Como você já deve ter visto
na disciplina de Aquisição da Linguagem, todo ser humano é biologicamente
programado para adquirir uma língua. Assim, ao chegar à escola, já chegamos sabendo
Libras, ou português, ou qual seja a língua a que fomos expostos na aquisição. Não
parece perda de tempo ficar gastando aulas com um conteúdo que já sabemos, ao invés
de tratarmos de coisas mais importantes, como matemática, ciências e geografia?
Provavelmente você já se questionou sobre isso em algum momento da sua vida
escolar...
Com esta disciplina, pretendemos mostrar que, ao contrário do que parece, é
importante, sim, estudarmos aquilo que já sabemos, no nosso caso, a língua materna2.
Já que estamos falando de escola, ainda no período escolar, a língua que
falamos/sinalizamos está presente em todas as matérias: o
professor de Matemática ensina matemática utilizando como
código a nossa língua, a mesma que já trazemos de casa. O
mesmo faz o professor de Geografia e o e História. É por
meio da língua que temos acesso ao conhecimento e à
cultura.
Fonte: http://www.clicfilhos.com.br/site/images/imgs/alfabetizacao.jpg
Não somos uma ilha, vivemos em sociedade, que exige interação, adivinhe?
por meio da língua. Construímos nossa identidade por meio da língua. Exercemos a
nossa cidadania por meio/com a língua. A língua faz parte de um conjunto de
práticas sociais e culturais.
Para termos acesso ao conhecimento e à cultura, e também para exercermos a
cidadania, nos valemos de certas habilidades, aprendidas à medida que as usamos.
Essas habilidades são chamadas de competências.
O desenvolvimento das competências se dá por meio da prática e do exercício,
e na escola, o professor que ensina língua materna deve (ou pelo menos deveria),
propiciar meios de os alunos desenvolverem as competências lingüística e
2
Os termos destacados em negrito encontram-se definidos no glossário, no final deste material.
sociocomunicativa, necessárias para o exercício da cidadania e acesso ao conhecimento
e à cultura.
Uma das primeiras lições que aprendemos na escola é que a língua que
falamos/sinalizamos pode ter uma representação escrita. Mas, se analisarmos com um
pouco de atenção, nós percebemos que não escrevemos a língua que
falamos/sinalizamos, nem falamos/sinalizamos a língua que escrevemos. Entre a
fala/sinalização e a escrita existe um fosso, quase como se fossem duas línguas
diferentes. E, como veremos neste curso, são, e não são, ao mesmo tempo. São
diferentes porque as competências lingüística e sociocomunicativa exigidas por cada
uma das modalidades são diferentes, e porque o
meio básico de expressão de cada uma é
diferente: a língua falada/sinalizada, por
exemplo, faz uso do contexto circundante; já a
escrita não. Por outro lado, ambas se
assemelham, pois permitem a construção de
textos coesos e coerentes, a exposição de
informações diversas, variações, etc; e também
porque existe um sentimento de identidade que
une falantes/sinalizantes que utilizam o código
escrito de uma dada língua. Fonte: http://www.sescsp.org.br/sesc/controle/dynimages/PB362-04alfabetizacao.jpg
Nesta unidade, vamos tratar das relações entre língua, cultura e sociedade.
Vamos organizar o conteúdo em torno de dois tópicos, um centrado na questão da
língua materna, e outro voltado para a relação entre linguagem, identidade e cidadania.
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LIBRAS, ou Língua Brasileira de Sinais, é a língua materna dos surdos brasileiros e, como tal, poderá ser
aprendida por qualquer pessoa interessada pela ...
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:: FAQ ::
LIBRAS é a língua materna dos surdos brasileiros e, como tal, poderá ser aprendida por qualquer pessoa
interessada pela comunicação com essa comunidade. ...
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Introdução
Dessa forma, considera-se que a LIBRAS é ou deve ser a língua materna dos surdos não porque é a língua
natural dos surdos mas sim porque, tendo os surdos ...
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Considerada a língua materna dos surdos brasileiros, a LIBRAS só foi oficializada em 1991 e só em 2002 foi
aprovada como decreto de lei. ...
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LIBRAS é a língua materna dos surdos e, como tal, compõe-se de todos os componentes pertinentes às línguas
orais, como a gramática semântica, ...
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Policiais ambientais concluem curso de LIBRAS no município ... A Linguagem Brasileira de Sinais é a língua
materna dos surdos brasileiros e, como tal, ...
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A LIBRAS, ou Língua Brasileira de Sinais, é a língua materna dos surdos brasileiros e, como tal, poderá ser
aprendida por qualquer pessoa interessada na ...
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Notícias - Megainfo
A LIBRAS, língua materna dos surdos brasileiros, é uma modalidade de comunicação visuo-gestual, que poderá
ser aprendida por qualquer pessoa interessada em ...
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3
QUADROS, Ronice M. de & KARNOPP, Lodenir B. Língua de sinais brasileira: estudos lingüísticos.
Porto Alegre: Artmed, 2004. p.24-37.
4
Disponível em http://cienciaecultura.bvs.br/scielo.php?pid=S0009-
67252005000200014&script=sci_arttext
o português (pensem no caso de quem é surdo, mas já foi ouvinte até certa fase da
vida).
Vejamos os documentos oficiais que regulamentam a questão no Brasil.
Î O que diz a Constituição Brasileira:
Título II
Dos Direitos e Garantias Fundamentais
Capítulo III
Da Nacionalidade
Senado Federal
Subsecretaria de Informações
Art. 2º Deve ser garantido, por parte do poder público em geral e empresas
concessionárias de serviços públicos, formas institucionalizadas de apoiar o uso e difusão
da Língua Brasileira de Sinais - LIBRAS como meio de comunicação objetiva e de
utilização corrente das comunidades surdas do Brasil.
Língua Materna
Lembre que essa definição é proposta por membros da comunidade web; não
há a atribuição de autoria, mas reflete as características que se costuma atribuir à língua
materna. Ao correlacionarmos essa definição a Libras, vamos nos deparar com
problemas a serem resolvidos.
Para refletir!
A definição do verbete na Wikipédia fala em adaptação do aparelho fonador à
língua. Isso faz sentido em Libras? Os estágios da aquisição de uma língua
oral são os mesmos de uma língua viso-espacial? O que teria de mudar no
verbete da Wikipédia para contemplar as questões motivadas pela Libras?
Apesar dos avanços da medicina, nem sempre os problemas auditivos que
incorram em surdez são detectados nos bebês. Muitos casos são diagnosticados
tardiamente, na maioria das vezes pela própria observação dos pais.
Observe o relato abaixo, que foi extraído de uma entrevista sociolingüística do
Projeto VARSUL – Variação Lingüística Urbana na Região Sul do Brasil (Conheça um
pouco do trabalho do projeto visitando o site institucional
http://www.pucrs.br/fale/pos/varsul/index.php).
Para refletir!
Digamos que os pais podem pagar um intérprete ou moram em uma cidade em
5
Você deve ter percebido que os conteúdos da disciplina de Aquisição da Linguagem estão sendo requisitados. Se você não se
sente seguro, faça uma revisão.
que há um centro de apoio aos surdos. Faz sentido dizer que neste contexto
Libras é língua materna (afinal, não será a “mãe”, nem ninguém do núcleo
familiar, que ensinará a língua)? E se os pais não possuem recursos para
oportunizar à criança o contato com a Libras? Que língua materna terá essa
criança?
Fonte: http://ctc.fmrp.usp.br/casadaciencia/bibliotecas/imagens/grupos/diversidade.jpg
Olhe ao seu redor. O ser humano vive em
grupos, que são formados por critérios os
mais variados. Por exemplo, os jovens, que
na fase difícil da adolescência rebelam-se e
agrupam-se para marcar presença na
sociedade. Diferentes “tribos” compõem a
nossa sociedade, variando conforme a
época; já tivemos hippies, yuppies, grunges, e agora emos. Tais grupos não são
aleatórios; seus membros compartilham características e afinidades, traços de
identidade. Pode ser o tipo de roupa, o tipo de música, o tipo de arte.
Mais ou menos a mesma coisa acontece com a língua. Grupos se formam em
função de identidade lingüística. A língua não é uma unidade política, é uma unidade
de identidade. Podemos marcar nossa identidade pelo pertencimento a certos grupos
sociais, como vimos acima, a certas comunidades, ou a grupos regionais (ser gaúcho,
ser carioca, ser nordestino, etc). Ao fazer parte de determinado grupo, compartilhamos
com os membros daquele grupo a mesma linguagem e os mesmos hábitos culturais, e,
assim, constituímos a nossa identidade, apoiada em valores de solidariedade e lealdade.
E com Libras?
Com Libras, não parece ser diferente. O português não é a língua materna da
maioria dos surdos, logo, os valores sócio-histórico-culturais associados ao português
não são os mesmos do universo surdo.
Sugestão de leitura:
CURIONE, Alex. Aquisição da Língua de Sinais como Primeira Língua: Direito dos Surdos.
Disponível em
http://www.feneis.com.br/LIBRAS/anexos/aquisi%E7ao_LIBRAS_Alex_Curione.htm.
Acessado em 30/09/2006.
GUIMARÃES, Eduardo. Apresentação Brasil: país multilíngüe. Ciência e Cultura, vol.57, n.2,
p.22-23, abr./jun. 2005.
QUADROS, Ronice Muller de, KARNOPP, Lodenir. Língua de sinais brasileira: estudos
lingüísticos. Porto Alegre: Artmed, 2004.
_____. Aquisição de L1 e de L2: o contexto da pessoa surda. In: Anais do Seminário: Desafios
e possibilidades na educação bilíngüe para surdos. 1996, p. 70-87.
UNIDADE II: Pressupostos teóricos para o
ensino de língua materna
Fonte: http://www.unicamp.br/unicamp/unicamp_hoje/ju/junho2006/fotosju328-online/ju328pg04a.jpg
http://www.estacaodaluz.org.br/wps/wcm/connect/resources/file/eb1fbf0e5ab64a3/Atali
ba%20-%20Que%20se%20entende%20por%20lingua.pdf?MOD=AJPERES.
Sugestão de leitura:
Fonte: http://www.unimes.br/academico/odontopediatria/images/gestante4.gif
Um dos marcos mais importantes na infância é quando
aprendemos a andar. O dia dos primeiros passinhos é muito
festejado pela família. Mas, para andar, a criança passou por etapas
anteriores. Primeiro, aprendeu a sustentar a cabeça. Depois, a
apoiar os braços, levantar o tronco e sentar. Em seguida, aprendeu
a coordenar o movimento de braços e pernas para engatinhar. Já
engatinhando, o bebê aprendeu a parar em pé. E, por fim, culmina com o caminhar.
Não dá para caminhar sem passar por essas etapas, é a ordem natural das coisas...
Com a língua, também existem etapas a serem seguidas. Primeiro temos que
percebê-la para depois produzi-la. Do mesmo modo que há etapas para aprender a
andar, há etapas para desenvolver plenamente as competências lingüísticas, que podem
ser resumidas ao contínuo escuta > fala > leitura > escritura. (Uma variante deste
contínuo é apresentada por Mary Kato (1986): fala1 > escrita1 > fala2 > escrita2.
Sugerimos a leitura do livro.
“Contínuo” porque as etapas são pressupostas como
continuadas, do mesmo modo que no andar do bebê. Depois que ele
aprende a andar, ele não desaprende a engatinhar (Talvez o faça
menos, mas ele não perde essa habilidade). O fato de desenvolver a
fala não significa que a escuta é deixada de lado. Ao contrário, são
habilidades complementares, que só fazem sentido se forem inter-relacionadas. A
escuta é uma habilidade de percepção, que se faz necessária para o desenvolvimento da
habilidade de produção, a fala.
Normalmente, essas duas habilidades são pré-escolares, ou seja, a criança já
chega à escola fazendo uso da escuta e da fala. Na escola, a criança, além de aprimorar
as habilidades lingüísticas que já possui, desenvolve novas habilidades, a leitura e a
escrita.
Fonte: http://www.uems.br/proec/editora/imagens/livros/Historia%20concisa%20da%20escrita.jpg
Fonte: http://www.unicamp.br/unicamp/divulgacao/indice/images/NPI_656_imagempequena.jpg
Fonte: http://www.ufmg.br/boletim/bol1213/magda.jpg
Fonte: http://www.weno.com.br/blog/archives/doceira.gif
Fonte: http://www.weno.com.br/blog/archives/pipa.gif
também variação regional quando existem diferenças lingüísticas entre os falantes da
zona urbana e da zona rural.
Fonte: http://www.parabolaeditorial.com.br/marcosusp.jpg
E o papel da escola?
Fonte: http://www.unb.br/abralin/imagens/livros/6.jpg
_____ . A norma oculta: língua & poder na sociedade brasileira. 2ª ed. São Paulo: Parábola
Editorial, 2003.
CASTILHO, Ataliba t. de. A língua falada e o ensino de língua portuguesa. São Paulo:
Contexto, 2000.
HIGOUNET, Charles. História concisa da escrita. São Paulo: Parábola Editorial, 2003.
Fonte: http://www.buscaprat.com/webcaspa/imagenes/bolsa/logo-bolsa-artista.gif
Fonte: http://students.fct.unl.pt/~mpm17965/icp/Mota/woodcut.gif
Mas o que é “hábil”? Vejamos a acepção do Houaiss Eletrônico:
Hábil
adjetivo de dois gêneros
1 que tem a mestria de uma ou várias artes ou um
conhecimento profundo, teórico e prático de uma
ou várias disciplinas;
2 diz-se de quem tem uma disposição de espírito e
de caráter que o torna particularmente apto para
resolver as situações que se lhe apresentam ou
para agir de maneira apropriada aos fins a que
visa; astucioso, sutil, manhoso; esperto, sagaz;
3 dotado de habilidade e rapidez; destro, ligeiro, ágil;
4 que atende ao estabelecido por lei, regulamento
etc;
5 Termo jurídico que atende ao estabelecido por lei
para produzir determinados efeitos jurídicos.
Fonte: http://www.editoracontexto.com.br/files/livro/_thumb_alfabetizacao_letramento_gd189.jpg
Para que o aluno seja capaz de ouvir, falar, ler e escrever adequadamente, bem
como refletir sobre os fenômenos da linguagem, é preciso considerar que:
a) “a razão de ser das propostas de leitura e escuta é a
compreensão ativa e não a decodificação e o silêncio;
b) a razão de ser das propostas de uso da fala e da escrita
é a interlocução efetiva, e não a produção de textos
para serem objetos de correção;
c) as situações didáticas têm como objetivo levar os
alunos a pensar sobre a linguagem para poder
compreendê-la e utilizá-la apropriadamente às situações
e aos propósitos definidos.” (BRASIL, 1998b, p. 19)
Fonte: http://novaescola.abril.com.br/ed/157_nov02/imagens/leitura6.gif
Fonte: http://www.bahai.pt/var/bahai/storage/images/a_fe_baha_i/unidade_na_diversidade_imagelarge.jpg
O quadro mostra que a análise lingüística (ou seja, a reflexão sobre a língua
nos seus diferentes níveis: fonológico, morfológico, sintático, semântico-pragmático)
não está desvinculada das habilidades de escuta/ fala/ leitura/ escritura. De fato, o uso
lingüístico – que se dá através de textos e não de palavras ou frases isoladas – fornece
material para análise de diferentes fenômenos lingüísticos; e a análise lingüística, por
sua vez, realimenta as práticas de uso.
Tendo como unidade central o texto, e a partir do eixo USO Æ REFLEXÃO Æ
USO, é que são pensadas as práticas pedagógicas e os diferentes conteúdos a serem
modo que cada leitura torna-se uma experiência única, resultado dos diferentes focos de
interesse de cada indivíduo.
Apesar de ser mais disseminado no meio eletrônico, no nosso dia-a-dia
também nos deparamos com diferentes tipos de hipertextos: em livros (capa, orelhas,
índice); revistas e jornais (legendas, fotos, mapas, tabelas, etc).
Como vimos na unidade II, aprimorar a competência de leitura neste universo
social torna-se essencial para o exercício da cidadania na sociedade em que o eletrônico
predomina.
Para aprofundar o conhecimento neste campo, sugerimos a leitura do seguinte
texto de Luiz Antônio Marcuschi: “O hipertexto como um novo espaço de
escrita em sala de aula”, disponível em
http://rle.ucpel.tche.br/php/edicoes/v4n1/f_marcuschi.pdf .
Um último aspecto que queremos destacar neste tópico diz respeito à língua e
interdisciplinaridade. Vamos iniciar refletir sobre a nossa prática com a linguagem.
Vamos pensar numa aula de história, de geografia, de biologia, de matemática... Qual é
o objeto de estudo de cada uma delas?
Podemos dizer, em termos gerais, que a
história se ocupa de eventos passados com
referência a um povo, país, época; que a
geografia trata da descrição da terra e dos
fenômenos que nela ocorrem; que a biologia
estuda os seres vivos e as leis que os regem;
que a matemática estuda números e as
relações existentes entre eles. Mas, de que
Fonte: http://www.cerebromente.org.br/n06/opiniao/image5.jpg
modo tratamos dessas questões? Como aprendemos sobre história, geografia, biologia,
matemática? Tratamos desses assuntos, nas diferentes disciplinas, através da
linguagem. No nosso caso específico, ou através da língua portuguesa ou através da
língua de sinais. Podemos dizer, então, que a língua perpassa todas as áreas do
conhecimento. Essa é, sem dúvida, uma das principais formas de interdisciplinaridade:
a atuação da linguagem na mediação do conhecimento.
A interdisciplinaridade é tão importante que as Diretrizes Curriculares
Nacionais para o Ensino Médio a colocam como um dos princípios pedagógicos que
devem orientar a organização dos currículos. Os conhecimentos escolares podem ser
articulados de várias formas. Uma delas é a multidisciplinaridade: o mesmo tema é
abordado por diferentes disciplinas. Outra forma de articulação de conteúdos é através
de eixos conceituais que funcionam como eixos integradores.
É em torno de eixos conceituais que os PCNs recomendam que o ensino da
língua deve articular-se com os temas transversais. Esses temas remetem a questões
sociais contemporâneas: Ética, Pluralidade Cultural, Meio
Ambiente, Saúde, Orientação Sexual, Trabalho e Consumo. Ao
trazer esses temas para a sala de aula, o professor possibilita que
o aluno: expresse seus pontos de vista sobre questões efetivas;
conviva democraticamente com posições ideológicas diferentes
das suas; exercite o uso da linguagem articulado às diversas
temáticas; desenvolva a capacidade de análise crítica e de
reflexão. Enfim, possibilita a participação efetiva e responsável do sujeito-cidadão,
levando à transformação da realidade relacionada a esses temas.
•
Fonte: http://www.uems.br/proec/editora/imagens/livros/Aula%20de%20portugues.jpg
concepções: O que é a linguagem? O que é uma língua?
• objetivos: Para que ensinamos? Com que finalidade?
• procedimentos: Como ensinamos?
• resultados: O que temos conseguido?
Essas questões orientam as ações educativas no
sentido de ampliar a competência
sociocomunicativa dos alunos. A Profa. Irandé
formula uma série de princípios que devem ser
observados no ensino das habilidades lingüísticas,
que apresentamos a seguir.
Fonte: http://www.unicamp.br/unicamp/unicamp_hoje/ju/maio2005/fotos-ju286online/ju286pg11b.jpg
A LEITURA
(1) A leitura é parte da interação verbal escrita, enquanto
implica a participação cooperativa do leitor na
interpretação e na reconstrução do sentido e das
intenções pretendidas pelo autor.
(2) A leitura é uma atividade de acesso ao conhecimento
produzido, ao prazer estético e, ainda, uma atividade de
acesso às especificidades da escrita.
Fonte:
(3)http://www.jf-ameixoeira.pt/bia/ler.jpg
A leitura envolve diferentes processos e estratégias de realização na
dependência de diferentes condições do texto lido e das funções pretendidas
com a leitura.
(4) A leitura depende não apenas do contexto lingüístico do texto, mas também do
contexto extralingüístico de sua produção e circulação.
(Antunes, 2003, p. 66-84)
filhos; os pais têm o hábito de ler histórias para o filho e dialogam sobre elas, etc. Isso
reforça a idéia de que o indivíduo não pode ser visto excluído de seu processo histórico
e cultural ao longo de sua socialização.
Dado o papel social da escola de formar sujeitos-cidadãos, espera-se que ela
oportunize aos alunos uma rica convivência com a diversidade de textos que
caracterizam as práticas sociais, tais como: notícias, editoriais, reportagens, entrevistas,
cartas, textos publicitários, verbetes de
dicionário e verbetes enciclopédicos,
artigos de divulgação científica,
poesias, contos, romances, etc.
É importante que se trabalhe com os
alunos no sentido de reconhecer
recursos expressivos que permeiam os
diferentes textos: os efeitos de sentido
Fonte: http://www.ca.ufsc.br/biblioteca/sug_leitura.jpg de uma frase lida em um outdoor, as
entrelinhas de um texto publicitário, as ambigüidades intencionais, as metáforas, e
assim por diante.
No que diz respeito
particularmente ao texto literário, o
professor deve ter em mente que esse tipo
de texto se caracteriza pela expressão da
subjetividade do autor, instaurando um tipo
de mediação de sentidos entre o sujeito e o
mundo que não passa necessariamente pela
observação factual. Por sua especificidade, o texto literário apresenta uma linguagem a
serviço da estética, por isso muitas vezes rompe com padrões gramaticais estabelecidos.
Nesse sentido, a leitura por prazer, para perceber a representação simbólica e o valor
estético da obra deve ser estimulada. O mesmo se diga de outras instâncias de uso
expressivo da linguagem, como o teatro e o cinema.
Sugestão de leitura:
A ESCRITA
Quanto à evolução da produção escrita, é possível traçar,
grosso modo, a seguinte trajetória: a partir de rabiscos
aleatórios seguidos de rabiscos significativos, o aprendiz
começa a interpretar letras como desenhos, a diferenciar
palavras, a relacioná-las com a fala, para então passar a
perceber que as palavras não refletem diretamente a fala –
é o entendimento da escrita como representação simbólica.
A partir daí, a situação de interlocução fica mais evidente:
Fonte: http://www.senado.gov.br/sf/senado/portaldoservidor/jornal/jornal65/Imagens/logo_escrever.jpg
a escrita é percebida como mecanismo de registro e transmissão de informações
deslocadas do contexto situacional imediato; constrói-se uma imagem dos
interlocutores e desenvolve-se a noção de mudança de perspectiva (o colocar-se no
lugar do outro); valoriza-se o papel da revisão (cf. princípios descritos anteriormente).
Leia mais sobre isso no texto de Magda Soares: A reinvenção da alfabetização,
disponível em http://www.meb.org.br/biblioteca/artigomagdasoares.
Fonte: http://www.parabolaeditorial.com.br/itande.jpg
Sugestões de leitura:
Fonte http://cajondesastre.juegos.free.fr/Images/puzzle_gramatica.gif
A GRAMÁTICA
São os seguintes os princípios que devem nortear o ensino da
gramática:
(1) A gramática compreende o conjunto de regras que especificam
o funcionamento de uma língua.
(2) A gramática existe não em função de si mesma, mas em função do que as
pessoas falam, ouvem, lêem e escrevem nas práticas sociais de uso da língua.
(3) A gramática reflete as diversidades geográficas, sociais e de registro da língua.
(4) A gramática existe em função da compreensão e da produção de textos orais e
escritos.
(5) A gramática da língua deve ser objeto de uma descrição rigorosa e consistente.
(6) Existem regras e descrições gramaticais que particularizam o uso da norma
padrão da língua ou o uso lingüístico do grupo de prestígio da sociedade.
(Antunes, 2003, p. 85-99)
As regras gramaticais que mais nos interessam, no caso do ensino da língua
portuguesa, são aquelas que descrevem a variedade padrão ou norma culta da língua.
As regras gramaticais recobrem os diferentes níveis lingüísticos: fonológico,
morfológico, sintático e semântico-pragmático. Vale relembrar, aqui, o que discutimos
sobre variedade padrão na unidade II desta disciplina.
Vimos que as línguas são heterogêneas, portanto sujeitas à variação e
mudança. Vimos também que a língua portuguesa é constituída de muitas variedades.
Fonte http://www.inventario.ufba.br/05/img05/o_que_foi_que_eu_fiz.jpg
Essas variedades têm a ver com fatores como: origem geográfica do indivíduo; nível
sócio-econômico; nível de formalidade da situação comunicativa. As diferenças
também têm a ver com a modalidade oral ou escrita. Muitas vezes as diferenças
lingüísticas percebidas na fala de brasileiros são tão grandes que parece estarmos diante
de duas línguas diferentes.
As diferenças que mencionamos acima
ficam mais evidentes entre falantes da zona rural e da
zona urbana, ou entre falantes de nível sócio-
econômico baixo e com pouca ou nenhuma
escolaridade, e aqueles de nível mais alto, tanto na
escala social como no grau de escolaridade. Não é à
toa que muitos estudiosos dessas questões dizem que
a língua portuguesa ensinada na escola, que é a
variedade padrão, de prestígio, é como uma língua estrangeira para muitos indivíduos
que utilizam uma variedade não-padrão do português. Outros falam em
“bidialetalismo”, ou seja, falantes de dialeto não-padrão aprendem o dialeto padrão para
dele fazer uso nas situações em que é requerido.
Face ao que discutimos acima, podemos nos perguntar: como a escola vai
ensinar a língua materna?
Consideremos que a criança entra na fase escolar (1a. série) aos 6 anos de
idade. Se for uma criança ouvinte, ela já adquiriu a língua materna, no caso o
português, na sua comunidade de interação (pais, familiares, amigos, vizinhos, etc).
Como já vimos, não existe “a língua portuguesa” (como se fosse única e uniforme),
mas existem “várias línguas portuguesas”, em razão
de diferenças dialetais de natureza geográfica ou
social, ou mesmo em razão de diferenças contextuais
(grau de formalidade) ou ainda devido a mudanças
que a língua sofre ao longo do tempo. Ao chegar na
escola a criança traz como bagagem lingüística a
variedade da língua portuguesa que ela adquiriu no
seu ambiente de interação. Como proceder então?
Fonte http://www.livre.escolabr.com/ferramentas/wq/user_image/skiqnt565254.gif
Sugestões de leitura:
1. Os textos indicados a seguir são entrevistas com dois lingüistas brasileiros:
Sírio Possenti e Leda Tfouni, publicadas na revista Letra Magna. Leia-os
procurando identificar qual é o pensamento dos autores sobre o ensino de
gramática.
http://www.letramagna.com/siriopossenti.htm
http://www.letramagna.com/ledatfouni.htm
A ORALIDADE
Fonte http://www.leonardodavinci.com.br/capas/738/8524907738.jpg
ANTUNES, Irandé. Aula de português: encontro & interação. São Paulo: Parábola,
2003.
POSSENTI, Sírio. Por que (não) ensinar gramática na escola? Campinas, SP:
Mercado de Letras, 1996.
RAMAL, Andréa. Linguagem oral – usos e formas. Uma abordagem a partir da
educação de jovens e adultos. Disponível em
http://www.instructionaldesign.com.br/artigos/linguagem%20oral_usos_e_formas.pdf
SILVA, Ivani R.; CHEFFER, Rosana. A construção de histórias por alunos surdos.
Disponível em: http://143.106.58.55/revista/viewarticle.php?id=112
TRAVAGLIA, Luiz Carlos. Gramática: ensino plural. São Paulo: Cortez, 2003.
GLOSSÁRIO
Alfabetização processo de apropriação do sistema alfabético da
escrita; ação de ensinar/aprender a ler e escrever.