PALAVRAS-CHAVE: Figuras de Linguagem Valor Semântico Das Conjunções Narrador Elementos Do Enredo

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Marcelo Pereira Gomes da Silva

Roteiro de Atividades Original – Preliminar


2º ciclo do 2º bimestre do 9º ano

PALAVRAS-CHAVE: figuras de linguagem; valor semântico das conjunções;


narrador; elementos do enredo.

TEXTO GERADOR I

O Texto Gerador é um conto de um dos grandes autores de nossa literatura:


Machado de Assis. O texto, como outros do autor, apresenta uma temática social,
com um personagem que passa por dificuldades financeiras. Tratase de um texto
cuja leitura deve ser recomendada, uma vez que a narrativa possibilita a elaboração
de várias atividades que comtemplam as habilidades do ciclo.

A carteira

...De repente, Honório olhou para o chão e viu uma carteira. Abaixar-se, apanhá-la e
guardá-la foi obra de alguns instantes. Ninguém o viu, salvo um homem que estava à
porta de uma loja, e que, sem o conhecer, lhe disse rindo:
— Olhe, se não dá por ela; perdia-a de uma vez.
— É verdade, concordou Honório envergonhado.
Para avaliar a oportunidade desta carteira, é preciso saber que Honório tem de pagar
amanhã uma dívida, quatrocentos e tantos mil-réis, e a carteira trazia o bojo recheado.
A dívida não parece grande para um homem da posição de Honório, que advoga; mas
todas as quantias são grandes ou pequenas, segundo as circunstâncias, e as dele não
podiam ser piores. Gastos de família excessivos, a princípio por servir a parentes, e
depois por agradar à mulher, que vivia aborrecida da solidão; baile daqui, jantar dali,
chapéus, leques, tanta coisa mais, que não havia remédio senão ir descontando o
futuro. Endividou-se. Começou pelas contas de lojas e armazéns; passou aos
empréstimos, duzentos a um, trezentos a outro, quinhentos a outro, e tudo a crescer, e
os bailes a darem-se, e os jantares a comerem-se, um turbilhão perpétuo, uma
voragem.
— Tu agora vais bem, não? dizia-lhe ultimamente o Gustavo C..., advogado e familiar
da casa.
— Agora vou, mentiu o Honório.
A verdade é que ia mal. Poucas causas, de pequena monta, e constituintes remissos;
por desgraça perdera ultimamente um processo, em que fundara grandes esperanças.

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Não só recebeu pouco, mas até parece que ele lhe tirou alguma coisa à reputação
jurídica; em todo caso, andavam mofinas nos jornais.
D. Amélia não sabia nada; ele não contava nada à mulher, bons ou maus negócios.
Não contava nada a ninguém. Fingia-se tão alegre como se nadasse em um mar de
prosperidades. Quando o Gustavo, que ia todas as noites à casa dele, dizia uma ou
duas pilhérias, ele respondia com três e quatro; e depois ia ouvir os trechos de música
alemã, que D. Amélia tocava muito bem ao piano, e que o Gustavo escutava com
indizível prazer, ou jogavam cartas, ou simplesmente falavam de política.
Um dia, a mulher foi achá-lo dando muitos beijos à filha, criança de quatro anos, e
viu-lhe os olhos molhados; ficou espantada, e perguntou-lhe o que era.
— Nada, nada.
Compreende-se que era o medo do futuro e o horror da miséria. Mas as esperanças
voltavam com facilidade. A ideia de que os dias melhores tinham de vir dava-lhe
conforto para a luta. Estava com trinta e quatro anos; era o princípio da carreira: todos
os princípios são difíceis. E toca a trabalhar, a esperar, a gastar, pedir fiado ou
emprestado, para pagar mal, e a más horas.
A dívida urgente de hoje são uns malditos quatrocentos e tantos mil-réis de carros.
Nunca demorou tanto a conta, nem ela cresceu tanto, como agora; e, a rigor, o credor
não lhe punha a faca aos peitos; mas disse-lhe hoje uma palavra azeda, com um gesto
mau, e Honório quer pagar-lhe hoje mesmo. Eram cinco horas da tarde. Tinha-se
lembrado de ir a um agiota, mas voltou sem ousar pedir nada. Ao enfiar pela Rua da
Assembleia é que viu a carteira no chão, apanhou-a, meteu no bolso, e foi andando.
Durante os primeiros minutos, Honório não pensou nada; foi andando, andando,
andando, até o Largo da Carioca. No Largo parou alguns instantes — enfiou depois
pela Rua da Carioca, mas voltou logo, e entrou na Rua Uruguaiana. Sem saber como,
achou-se daí a pouco no Largo de S. Francisco de Paula; e ainda, sem saber como,
entrou em um Café. Pediu alguma coisa e encostou-se à parede, olhando para fora.
Tinha medo de abrir a carteira; podia não achar nada, apenas papéis e sem valor para
ele. Ao mesmo tempo, e esta era a causa principal das reflexões, a consciência
perguntava-lhe se podia utilizar-se do dinheiro que achasse. Não lhe perguntava com o
ar de quem não sabe, mas antes com uma expressão irônica e de censura. Podia lançar
mão do dinheiro, e ir pagar com ele a dívida? Eis o ponto. A consciência acabou por
lhe dizer que não podia, que devia levar a carteira à polícia, ou anunciá-la; mas tão
depressa acabava de lhe dizer isto, vinham os apuros da ocasião, e puxavam por ele, e
convidavam-no a ir pagar a cocheira. Chegavam mesmo a dizer-lhe que, se fosse ele
que a tivesse perdido, ninguém iria entregar-lha; insinuação que lhe deu ânimo.
Tudo isso antes de abrir a carteira. Tirou-a do bolso, finalmente, mas com medo, quase
às escondidas; abriu-a, e ficou trêmulo. Tinha dinheiro, muito dinheiro; não contou,
mas viu duas notas de duzentos mil-réis, algumas de cinquenta e vinte; calculou uns
setecentos mil-réis ou mais; quando menos, seiscentos. Era a dívida paga; eram menos

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algumas despesas urgentes. Honório teve tentações de fechar os olhos, correr à
cocheira, pagar, e, depois de paga a dívida, adeus; reconciliar-se-ia consigo. Fechou a
carteira, e com medo de a perder, tornou a guardá-la.
Mas daí a pouco tirou-a outra vez, e abriu-a, com vontade de contar o dinheiro. Contar
para que? Era dele? Afinal venceu-se e contou: eram setecentos e trinta mil-réis.
Honório teve um calafrio. Ninguém viu, ninguém soube; podia ser um lance da
fortuna, a sua boa sorte, um anjo... Honório teve pena de não crer nos anjos... Mas por
que não havia de crer neles? E voltava ao dinheiro, olhava, passava-o pelas mãos;
depois, resolvia o contrário, não usar do achado, restituí-lo. Restituí-lo a quem? Tratou
de ver se havia na carteira algum sinal.
“Se houver um nome, uma indicação qualquer, não posso utilizar-me do dinheiro,”
pensou ele.
Esquadrinhou os bolsos da carteira. Achou cartas, que não abriu, bilhetinhos
dobrados, que não leu, e por fim um cartão de visita; leu o nome; era do Gustavo. Mas
então, a carteira?... Examinou-a por fora, e pareceu-lhe efetivamente do amigo. Voltou
ao interior; achou mais dois cartões, mais três, mais cinco. Não havia duvidar; era
dele.
A descoberta entristeceu-o. Não podia ficar com o dinheiro, sem praticar um ato
ilícito, e, naquele caso, doloroso ao seu coração porque era em dano de um amigo.
Todo o castelo levantado esboroou-se como se fosse de cartas. Bebeu a última gota de
café, sem reparar que estava frio. Saiu, e só então reparou que era quase noite.
Caminhou para casa. Parece que a necessidade ainda lhe deu uns dois empurrões, mas
ele resistiu.
“Paciência, disse ele consigo; verei amanhã o que posso fazer.”
Chegando a casa, já ali achou o Gustavo, um pouco preocupado, e a própria D. Amélia
o parecia também. Entrou rindo, e perguntou ao amigo se lhe faltava alguma coisa.
— Nada.
— Nada?
— Por quê?
— Mete a mão no bolso; não te falta nada?
— Falta-me a carteira, disse o Gustavo sem meter a mão no bolso. Sabes se alguém a
achou?
— Achei-a eu, disse Honório entregando-lha.
Gustavo pegou dela precipitadamente, e olhou desconfiado para o amigo. Esse olhar
foi para Honório como um golpe de estilete; depois de tanta luta com a necessidade,
era um triste prêmio. Sorriu amargamente; e, como o outro lhe perguntasse onde a
achara, deu-lhe as explicações precisas.
— Mas conheceste-a?
— Não; achei os teus bilhetes de visita.
Honório deu duas voltas, e foi mudar de toilette para o jantar. Então Gustavo sacou

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novamente a carteira, abriu-a, foi a um dos bolsos, tirou um dos bilhetinhos, que o
outro não quis abrir nem ler, e estendeu-o a D. Amélia, que, ansiosa e trêmula, rasgou-
o em trinta mil pedaços: era um bilhetinho de amor.

Vocabulário

Esquadrinhou – verificou.
Mofinas – tristes, acanhadas.
Pilhérias – gozação, algazarra.
Toillete – banheiro, trocar de roupas.
Voragem – abismo, redemoinho.

LEITURA

QUESTÃO 1
Uma história é contada por um narrador que, diante dos fatos apresentados, pode
assumir um ou outro ponto de vista: personagem ou observador.
Releia este trecho do conto A carteira e reconheça o tipo de narrador, justificando
sua resposta com elementos do texto.

“Podia lançar mão do dinheiro, e ir pagar com ele a dívida? Eis o ponto. A
consciência acabou por lhe dizer que não podia, que devia levar a carteira
à polícia, ou anunciá-la; mas tão depressa acabava de lhe dizer isto,
vinham os apuros da ocasião, e puxavam por ele, e convidavam-no a ir
pagar a cocheira. Chegavam mesmo a dizer-lhe que, se fosse ele que a
tivesse perdido, ninguém iria entregar-lha; insinuação que lhe deu
ânimo.”

Habilidade Trabalhada
Identificar o foco narrativo (narrador), espaço, tempo, personagens e conflito.

Resposta Comentada
Temos o narrador observador ou em 3ª pessoa, que é onisciente e revela o sentimento
das personagens. Como exemplo, pode ser retirado este trecho: “Chegavam mesmo a
dizer-lhe que, se fosse ele que a tivesse perdido, ninguém iria entregar-lha; insinuação
que lhe deu ânimo.”

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QUESTÃO 2
O conto é uma narrativa curta que apresenta as seguintes partes: apresentação,
complicação, clímax e desfecho.
Em “A carteira”, o problema a ser superado é a dificuldade financeira pela qual
passa o personagem principal, que possui muitas dívidas. A partir dele será
desenvolvida a parte do enredo que denominamos complicação. Tendo como base
essas informações, aponte, no conto A carteira, o fato que desencadeia a
complicação.

Habilidade Trabalhada
Identificar os elementos do enredo: apresentação, complicação, clímax e desfecho.

Resposta Comentada
Para apresentarmos a complicação, primeiro temos que identificar a apresentação. O
conto se inicia com a complicação, que é o momento em que Honório encontra a
carteira, que poderia – pelo menos aparentemente – solucionar alguns de seus
problemas. A apresentação é quando se fala das dívidas dele, que por diversos fatores
alcançaram valores difíceis de serem pagos. O fato de ele achar uma carteira na rua é
que cria a complicação deste conto.

TRECHO REMOVIDO

USO DA LÍNGUA

QUESTÃO 4
As figuras de linguagem referemse à significação das palavras, que podem se
distanciar de sua significação convencional. Utilizamos esses recursos para realçar o
que queremos dizer ou mesmo para que nosso interlocutor tenha uma ideia mais clara
daquilo que queremos comunicar. Observe o fragmento retirado do texto e identifique a
figura de linguagem utilizada:
“...o credor não lhe punha a faca aos peitos...”

( a ) Antítese;

( b ) Pleonasmo;

( c ) Silepse;

( d ) Elipse;

( e ) Hipérbole.

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Habilidade trabalhada
Identificar a presença de figuras de palavra, pensamento e de sintaxe nos gêneros
estudados.

Resposta Comentada
Nesta questão os alunos deverão retomar as aulas sobre figuras de linguagem, e
relembrar que na antítese deve haver emprego de palavras ou expressões contrastantes.
No pleonasmo há emprego de termos desnecessários com objetivo de enfatizar a
comunicação. A silepse concorda com a ideia latente, e não com a palavra escrita.
Elipse é a omissão de uma palavra ou de uma expressão facilmente subentendida. A
resposta correta é a opção (e) Hipérbole, que é o exagero na afirmação. No caso em
tela a expressão não lhe punha a faca aos peitos quer dizer que o credor não estava
pressionando para receber o pagamento. Entretanto, é bom frisar que também
poderíamos considerar como metáfora, outra figura de linguagem, que é o emprego de
palavra fora de seu sentido normal, por efeito de analogia.

QUESTÃO 5
As ações e os pensamentos de uma personagem podem ser transmitidos em um
texto pelo discurso direto ou pelo indireto. Identifique o discurso predominante no
conto e retire duas passagens que justifiquem sua resposta.

Habilidade Trabalhada
Identificar o uso dos discursos direto e indireto.

Resposta Comentada
O aluno deverá perceber que neste conto há predominância do discurso direto, pois o
narrador praticamente não utiliza o discurso indireto. Como exemplos daquele tipo de
discurso, temos:
“— Olhe, se não dá por ela; perdia-a de uma vez.”
“— É verdade, concordou Honório envergonhado.”
“— Nada.”
“— Nada?”
“— Por quê?”

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