Técnicas Radiográficas

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Resumo Texto (PT)  PDF
Medicina Veterinária • Arq. Bras. Med. Vet. Zootec. 64 (1) • Fev 2012 •
https://doi.org/10.1590/S0102-09352012000100010

COPIAR
Mielografia em ouriço-cacheiro (Sphiggurus
villosus)

Myelography in orange-spined-hairy-dwarf-porcupine (Sphiggurus


villosus)

Resumos
Relata-se o procedimento de mielografia em um ouriço-cacheiro Sphiggurus villosus, adulto,
procedente de vida livre. Após o exame e com o animal sob anestesia geral, evidenciou-se
um desvio dorsal do contraste na altura da sétima vértebra torácica (T7), causado por com-
pressão em região ventral dessa vértebra, sugestivo de edema ocasionado pela hemorragia
intramedular secundária ao trauma sofrido pelo animal em vida livre. Assim sendo, a mielo-
grafia em ouriço-cacheiro mostrou ser bastante válida e eficiente ao apresentar como vanta-
gens a maior precisão para delimitar e localizar a lesão presente na coluna vertebral.

roedor; radiografia contrastada; coluna vertebral

The myelography procedure is reported in an adult of the Sphiggurus villosus (hairy-tree-por-


cupine) species coming from the wild, in the region of Curitiba/PR. After proceeding with the
examination, while the animal was under general anesthesia, there was a dorsal deviation of
the contrast in the height of the seventh thoracic vertebra (T7) caused by compression in the
ventral region of the vertebra. This is suggestive of edema caused by intramedullary hemor-
rhage secondary to trauma suffered by the animal in the wild. Therefore, the use of myelo-
graphy in Sphiggurus villosus (hairy-tree-porcupine) proved to be quite valid and efficient, pre-
senting the advantages of greater precision to delimit and locate the lesion present in the ver-
tebral column.

rodents; contrast radiography; vertebral column


MEDICINA VETERINÁRIA

Mielografia em ouriço-cacheiro (Sphiggurus villosus)

Myelography in orange-spined-hairy-dwarf-porcupine (Sphiggurus villosus)

N.T. Sant AnnaI; B.S. SilvaII; G.C. SoresiniIII; L.C.S. SilvaIV

IViva Bicho Clínica Veterinária e Consultoria - Piracicaba, SP

IIAluna de pós-graduação - Pontifícia Universidade Católica do Paraná PUCPR, PR

IIICentro de Triagem de Animais Silvestres Cetas - PUCPR/IBAMA, PR

IVAluna de pós-graduação - Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia - FMVZ-USP, SP

RESUMO

Relata-se o procedimento de mielografia em um ouriço-cacheiro Sphiggurus villosus, adulto,


procedente de vida livre. Após o exame e com o animal sob anestesia geral, evidenciou-se
um desvio dorsal do contraste na altura da sétima vértebra torácica (T7), causado por com-
pressão em região ventral dessa vértebra, sugestivo de edema ocasionado pela hemorragia
intramedular secundária ao trauma sofrido pelo animal em vida livre. Assim sendo, a mielo-
grafia em ouriço-cacheiro mostrou ser bastante válida e eficiente ao apresentar como vanta-
gens a maior precisão para delimitar e localizar a lesão presente na coluna vertebral.

Palavras-chave: roedor, radiografia contrastada, coluna vertebral

ABSTRACT

The myelography procedure is reported in an adult of the Sphiggurus villosus (hairy-tree-por-


cupine) species coming from the wild, in the region of Curitiba/PR. After proceeding with the
examination, while the animal was under general anesthesia, there was a dorsal deviation of
the contrast in the height of the seventh thoracic vertebra (T7) caused by compression in the
ventral region of the vertebra. This is suggestive of edema caused by intramedullary hemor-
rhage secondary to trauma suffered by the animal in the wild. Therefore, the use of myelo-
graphy in Sphiggurus villosus (hairy-tree-porcupine) proved to be quite valid and efficient, pre-
senting the advantages of greater precision to delimit and locate the lesion present in the ver-
tebral column.

Keywords: rodents, contrast radiography, vertebral column

INTRODUÇÃO

O ouriço-cacheiro (Sphiggurus sp.) pertence à maior ordem da classe dos mamíferos, os roe-
Brasil Nesta classe, atualmente se encontram 2.021 espécies, 443 gêneros e 29 famílias
dores.
(Wilson e Reeder, 1993), sendo o gênero Sphiggurus (F. Cuvier, 1823) composto por cinco
espécies encontradas no Brasil. Na região Sul, são encontradas duas espécies, S. spinosus
Arquivo Brasileiro
e S. villosus de Medicina
(Oliveira Veterinária
e Bonvicino, e Zoo… 
2006).
O conhecimento da anatomia é fundamental para a avaliação das radiografias, sendo o des-
conhecimento um dos elementos que dificultam a interpretação dos exames de animais sel-
vagens. Exames contrastados, como urografia excretora, uretrocistografia, fistulografia, mie-
lografia, sinografia, peritoneografia, angiografia, traqueografia, broncografia e artrografia,
também podem ser realizados em animais selvagens, todavia suas descrições na literatura
ainda são escassas (Pinto, 2007).

A radiografia convencional é o método mais utilizado para obtenção de imagens neurológicas


veterinárias, devido ao seu baixo custo e ampla disponibilidade, já a mielografia é o procedi-
mento de contraste que mais traz benefícios diagnósticos para a neuroradiologia (Slatter,
1998).

A mielografia é realizada após a efetuação do estudo radiográfico rotineiro da coluna verte-


bral e consiste na aplicação de meio de contraste à base de iodo no canal medular, iopamidol
e iohexol, por exemplo. A introdução desse meio de contraste é feita no espaço subaracnoi-
deo com o propósito de demonstrar lesão em medula espinhal, podendo ser intramedular,
devido a tumores medulares ou edema de medula em decorrência de traumatismo, ou extra-
medular, devido à herniação de disco intervertebral, fratura ou luxação vertebral, ou tumores
de origem extradural (Slatter, 1998; Kealy e McAllister, 2005; Knipe, 2007). As regiões de es-
colha para aplicação do meio de contraste são a lombar, entre a última vértebra lombar e a
primeira sacral, ou a região da cisterna magna, entre o crânio e a primeira vértebra cervical,
após assepsia prévia do local (Kealy e McAllister, 2005).

O exame pode confirmar a lesão vista ou suspeita em radiografias simples, definir a extensão
da lesão, ou identificar pacientes que possam ser beneficiados por meio de procedimento
cirúrgico (Thrall, 2002). A mielografia está contraindicada quando o diagnóstico é obtido me-
diante radiografia simples, ou quando as informações por ela obtidas não alterarem o curso
do tratamento (Slatter, 1998), e em quadros de doença inflamatória (Kealy e McAllister,
2005).

Possíveis complicações deste exame podem decorrer em razão da neurotoxicidade, ainda


que baixa, do contraste utilizado, causando convulsão após a realização do exame, apneia,
arritmias cardíacas e sinais neurológicos associados ao traumatismo causado pela inadequa-
da aplicação da agulha. A convulsão é facilmente revertida com o uso de diazepam intrave-
noso (Barone et al., 2002; Kealy e McAllister, 2005).

Este trabalho tem como objetivo relatar o procedimento de mielografia em um indivíduo adul-
to de ouriço-cacheiro procedente de vida livre.

CASUÍSTICA

Um exemplar adulto de ouriço-cacheiro (Sphiggurus villosus) com massa corpórea de 1,3kg,


proveniente da cidade de Curitiba/PR, foi recebido para tratamento médico veterinário espe-
cializado.

Foi realizado, então, um exame físico completo, estando o animal sob anestesia geral por
meio do protocolo de administração de zoletil 50 na dose de 5mg/kg/IM, associado ao butor-
fanol no volume de 0,12mL/SC, quando foi constatado que o animal se apresentava com
prostração, anorexia, secreção nasal bilateral, paresia de membros pélvicos e lesões em
pele severamente contaminadas. Havia uma lesão de cinco centímetros de diâmetro em dor-
so, localizada em região pélvica, bastante profunda e com um odor fétido, além também de
algumas lesões perfurantes com secreção purulenta na região da cauda, sugestivo de ata-
que por carnívoros. A auscultação cardiorrespiratória mostrou-se dentro dos parâmetros nor-
mais para a espécie. Não foi detectada crepitação em nenhum segmento vertebral durante o
exame ortopédico realizado. O paciente demonstrou resposta à dor profunda em membros
pélvicos.

Devido à inexistência de diagnóstico preciso até o momento do exame clínico, o animal foi
encaminhado para exames radiográficos.

Inicialmente foram feitas radiografias simples, de dupla exposição - ventrodorsal e laterolate-


ral -, de todos os segmentos vertebrais, não sendo observadas quaisquer alterações. Dessa
maneira, optou-se por realizar um exame contrastado, a mielografia. Para a realização do
exame, o paciente estava sob anestesia geral (Zoletil 50- 5mg/kg/IM), e a pele da região da
articulação atlanto-occipital foi preparada com tricotomia e assepsia cirúrgica correta. Não foi
possível efetuar a entubação do paciente, porém ele se encontrava sob monitoramento cardi-
orrespiratório. Como não foram encontradas doses sugestivas para o uso de contraste em
ouriços, utilizou-se, então, experimentalmente, a mesma dose indicada para cães de
0,3mL/kg de peso corporal (Tudury et al., 1997; Slatter, 1998; Kealy e McAllister, 2005), totali-
zando, assim, 0,4mL de ioversol 320mg I/mL (Tudury et al., 1997).

Uma agulha 25mmx0,7mm (22G 1) foi inserida na cisterna magna, com o animal posicionado
em decúbito lateral e a saída de líquido cefalorraquidiano (LCR) constatou o correto posicio-
namento dela. Após a saída de quatro gotas de LCR, procedeu-se à administração de 0,4mL
do meio de contraste à base de iodo não iônico, ioversol, lentamente, por um período de dois
minutos. Após tal procedimento, o animal teve sua cabeça e pescoço elevados para que o
contraste fluísse caudalmente no interior do canal medular. Ao término da injeção do meio de
contraste, iniciaram-se, então, exames radiográficos em intervalos de cinco minutos cada.
Foram obtidas duas incidências radiográficas, decúbito lateral e dorsal, dos segmentos verte-
brais cervical, torácico e toracolombar. Foi evidenciado desvio dorsal da coluna de contraste
na altura da sétima vértebra torácica (T7), causado por compressão em região ventral desta
vértebra. A coluna de contraste não alcançou a região da cauda equina (Fig. 1).

O animal, após o procedimento radiográfico, foi monitorado até o seu completo retorno da
anestesia efetuada e não apresentou qualquer indício de alteração de comportamento.

DISCUSSÃO

Segundo Cooper (1996), as interações intraespecíficas e interespecíficas podem resultar em


lesões traumáticas em animais de vida livre, como em casos de predação, defesa de territó-
rio e atividades relacionadas com o acasalamento, fato esse observado no presente trabalho,
em que o animal relatado apresentava lesões sugestivas de interação interespecífica, prova-
velmente advindas de alguma espécie de carnívoro. Esse autor ainda citou que os animais
afetados por injúrias traumáticas geralmente exibem sinais de dor com feridas externas visí-
veis ou palpáveis, podendo também ocorrer paresia e paralisia no animal. E como forma de
diagnóstico, além de uma completa avaliação à procura de escoriações, hematomas ou ou-
tros indícios de trauma, exames radiográficos ou mesmo outras técnicas imaginológicas po-
dem ajudar no fechamento de um correto diagnóstico para certos tipos de trauma, o que cor-
robora com os achados no presente relato.
Os resultados radiográficos do exame contrastado evidenciaram a existência de lesão intra-
medular, tendo como possível causa o edema ocasionado pela hemorragia intramedular se-
cundária ao trauma, conforme descreve Knipe (2007). Entretanto atualmente a mielografia
está sendo substituída pela ressonância magnética devido a sua maior precisão e à ausência
de eventuais efeitos colaterais associados com a administração do meio de contraste iodado
(De Lahunta e Glass, 2007), bem como pela tomografia computadorizada, a qual é uma fer-
ramenta muito útil na avaliação de estruturas como a cabeça e a coluna vertebral, pois mini-
miza os efeitos de sobreposição de tecido ósseo e de tecidos moles, os quais ocorrem nas
radiografias (Evans e Souza, 2010).

O tratamento paliativo para a lesão descrita consiste em uma combinação de restrição de


espaço, reabilitação física e a administração de analgésicos e anti-inflamatórios. O uso deste
último ainda é um assunto de considerável debate, existindo casos de melhora e de piora
quando tais drogas são prescritas (Srugo et al., 2010).

Como alguns casos de fatalidades traumáticas envolvendo animais selvagens não podem
ser tratados de maneira satisfatória, a eutanásia é uma opção de escolha. Os fatores que de-
vem ser levados em consideração incluem a severidade das lesões, a espécie animal, as exi-
gências e a perspectiva a longo prazo (Cooper, 1996). No presente caso, a eutanásia foi rea-
lizada devido às condições desfavoráveis de tratamento, recuperação e sobrevivência do pa-
ciente em seu hábitat.

CONCLUSÕES

A utilização da mielografia em Sphiggurus villosus (ouriço-cacheiro) mostrou ser bastante vá-


lida e eficiente, apresentando como vantagens a maior precisão para delimitar e localizar a
lesão presente na coluna vertebral.

Recebido em 9 de maio de 2011

Aceito em 21 de junho de 2011

E-mail: [email protected]

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Datas de Publicação
» Publicação nesta coleção
23 Mar 2012
» Data do Fascículo
Fev 2012

Histórico
» Recebido
09 Maio 2011
» Aceito
21 Jun 2011
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