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Transversal Aluna Adila Zaira Oliveira
Este relatório resulta de reuniões e debates entre diversas organizações e
ativistas de Direitos Humanos, direitos digitais e direitos sexuais e reprodutivos, com o objetivo de mapear e reconhecer as diferentes formas de violência digital que silenciaram vozes femininas no Brasil. O documento busca entender as dificuldades de acesso à justiça, influenciadas por valores sexistas e racistas, e enfatiza a necessidade de soluções multidimensionais, considerando a natureza multissetorial da governança da internet. Além disso, destaca o contexto de colonialismo digital que dificulta a resposta a abusos nas plataformas online dominadas por empresas do Norte Global, que impõem práticas de censura sem adaptação às legislações locais e carecem de transparência em seus procedimentos.
1)CONTEXTUALIZAÇÃO DO DEBATE NO Subnotificação de violência digital:
A percepção de violência no contexto BRASIL : Histórico de violência no Brasil: digital é alimentada pela falta de dados e A violência contra negros, indígenas e mulheres no subnotificação de casos, especialmente de Brasil tem raízes históricas profundas, ligadas à violência de gênero. colonização, escravidão e conservadorismo religioso. Tipos de violência online: Conservadorismo e gênero: Casos de ciberbullying, exposição de O conservadorismo religioso no Brasil, originado dos imagens íntimas, racismo, gordofobia e colonizadores cristãos, negou a autonomia das assédio são relatados como as principais formas de violência digital no Brasil. mulheres e a existência de identidades não heteronormativas e não binárias. Falta de transparência das plataformas: As plataformas digitais não oferecem Ampliação da vigilância digital: transparência suficiente nas respostas a Houve um aumento da vigilância e criminalização de essas agressões, o que dificulta o combate ativistas e movimentos sociais desde 2013, à violência online. impulsionado por grandes eventos esportivos e leis Crescimento do uso da internet: como a GLO e a Lei 12.850/2013 * São usadas para Com 61% da população brasileira usando a justificar infiltração e perseguição de ativistas nas internet, dos quais 78% são usuários de Redes sociais redes sociais, a tendência de crescimento Movimentos sociais: no acesso à internet agrava o fenômeno da Enquanto conservadores mobilizam ações online, há violência digital. também um aumento de movimentos sociais que defendem direitos sexuais e reprodutivos, e Segundo a Safenet a violação dos direitos problematizam a diversidade de gêneros. umanos mais registrada em 2016 foi Criminalização dos direitos reprodutivos: conteudos de ódio e violentos. A criminalização das mulheres pelo aborto e a 2) MAPEAMENTO DA DIVERSIDADE DE repressão de organizações que lutam por direitos CASOS DE VIOLÊNCIA ONLINE E A reprodutivos são impulsionadas por inquéritos, como a CPI do Aborto. 55% são mulheres não-brancas. DIFICULDADE DE SOLUCIONÁ-LOS Ativismo e violência digital: Ativistas mulheres, especialmente negras e LGBTQI, Reconhecimento da violência online: têm sido alvos de ataques coordenados em redes O primeiro desafio é reconhecer ações online como sociais, com discursos de ódio, violações de manifestações de violência, que têm graves efeitos e privacidade e agressões psicológicas. exigem ações de todos os atores envolvidos. Transversal Banalização da violência digital: Aluna Adila Zaira Oliveira
Minimizar a violência online como sendo
passageira e restrita ao mundo digital é incorreto, 3) PANORAMA DO ARCABOUÇO pois seus efeitos podem se estender à vida offline, LEGAL E SUA INSUFICIÊNCIA resultando até em suicídios. Culpabilização da vítima: Uma forma comum de minimizar a violência de Remoção de conteúdo violento contra mulheres: gênero é responsabilizar a vítima, o que a impede A legislação brasileira trata da remoção de se sentir legitimada para denunciar. de conteúdos ofensivos à dignidade de Minimização da violência psicológica: mulheres na internet, destacando a Há uma tendência de desconsiderar a gravidade necessidade de ações urgentes nesse da violência psicológica online, tratando-a como sentido. inofensiva. Censura de conteúdos: Dificuldades de reconhecimento: Muitas vezes, perfis feministas e Discursos que minimizam a violência online ativistas são bloqueados devido a dificultam o reconhecimento dessas ações como denúncias políticas, o que viola a formas graves de violência. liberdade de expressão e pode ter Obstáculos ao acesso à justiça: consequências negativas em vários Problemas no acesso à justiça, falta de aspectos. sensibilização das autoridades e a ineficácia das Uso da Lei Maria da Penha: políticas das plataformas contribuem para a Embora seja possível aplicar medidas dificuldade de solução. protetivas da Lei Maria da Penha em Caso de Carolina: casos de agressão online, isso raramente Carolina, ativista, sofreu com fotomontagens acontece, apontando uma lacuna na racistas espalhadas online, enfrentou dificuldades legislação. para remover o conteúdo e precisou de uma rede Marco Civil da Internet: de apoio para lidar com o caso. Essa lei define a responsabilidade de Caso de Marta: intermediários digitais em remover Marta, artista baiana, foi alvo de ataques racistas conteúdos após ordem judicial, mas sua e misóginos em um concurso online, que a eficácia e transparência ainda são prejudicaram e resultaram em sua derrota, sem limitadas. nenhuma ação legal. Ofensas e incitação ao ódio: Caso de Letícia: Ofensas e incitações ao ódio racial ou Letícia, artivista, foi ameaçada após publicar um de gênero podem ser enquadradas na Lei vídeo de protesto e acabou abandonando sua Antirracista e no Código Penal, porém cidade e militância por causa das agressões existem desafios na aplicação dessas online. leis. Impacto na vida das vítimas: Ação penal privada e pública: Esses casos ilustram como a violência online visa Crimes contra a honra, como injúria e silenciar vozes dissidentes, especialmente de difamação, mulheres, causando danos profundos tanto no ambiente digital quanto na vida pessoal das vítimas. 14% dos casos de violencia contra a mulher no ambiente ubiversitario é envolveldo não consentimento de imagens íntmas Transversal 1O Projeto de Lei PLS 236/2012 visa Aluna Adila Zaira Oliveira
Existe discussão sobre a "federalização" de crimes
transformar o "Perseguição Obsessiva ou de propagação de ódio ou misoginia, defendendo Insidiosa" em um novo tipo de ameaça no que a Polícia Federal seria mais eficaz na Código Penal (art. 147). investigação desses casos. O "impersonation" (falsa identidade) é crime Desde 2013, projetos de lei têm sido propostos no no Brasil, previsto no Código Penal (art. Brasil para enfrentar a violência de gênero online, 307), com pena de detenção de 3 meses a 1 incluindo o PL 5555/13, que tramita no Senado ano ou multa. como PLS 18/2017. A Lei Carolina Dieckmann (Lei 12.737/2012) O PL 4614/2016 propõe que a Polícia Federal criminaliza a invasão de dispositivos investigue crimes online que difundam conteúdo eletrônicos para obtenção, adulteração ou misógino. destruição de dados sem autorização. O PL 8309/2017 propõe alterações no ECA e no A exposição de dados pessoais com o Código Penal para aumentar a pena pela objetivo de ameaçar ou constranger pode ser divulgação de imagem íntima de criança ou combatida por leis setoriais, como a Lei adolescente e tipificar a exposição de intimidade Carolina Dieckmann, e ações civis. sexual. . O Marco Civil da Internet (art. 21) permite O PL 8125/2017 visa proibir a exposição pública que a vítima solicite diretamente às de imagens eróticas ou pornográficas, apensado plataformas a remoção de conteúdos íntimos ao PL 11/2003, que trata da proibição de imagens divulgados sem autorização. sexuais em publicidades. A utilização indevida da imagem pode ser O PL 8309/2017 prevê pena de reclusão de 1 a 4 punida civilmente com indenização e anos para quem divulgar material íntimo sem penalmente como crimes contra a honra, consentimento. especialmente nos casos de difamação e injúria. A disseminação não consentida de imagens 4) SETOR PRIVADO íntimas (NCII) pode ser tratada como crimes As plataformas de redes sociais desempenham contra a honra, lesão corporal, extorsão ou um papel central no enfrentamento à violência estupro, dependendo das circunstâncias. contra a mulher na Internet, além das políticas Há lacunas na legislação brasileira em estatais. O Marco Civil da Internet estabelece relação à proteção de dados pessoais e ao limites à responsabilidade dos intermediários por uso da Lei Maria da Penha para crimes conteúdos de terceiros, visando proteger a relacionados à internet. liberdade de expressão. Contudo, essas A Lei Carolina Dieckmann não se aplica plataformas também têm a responsabilidade de diretamente a invasões de contas em redes garantir segurança, privacidade e preservar a sociais, focando na invasão de dispositivos liberdade de expressão, evitando discriminação eletrônicos. por etnia, raça ou classe. O relatório da CPI de Crimes Cibernéticos reconhece lacunas na legislação, propondo Um problema observado é que muitas plataformas novos projetos para regulamentar práticas controlam conteúdos de maneira mais restritiva do que exige a legislação nacional. Por exemplo, a como phishing. proibição de exposição de nudez pode impactar negativamente a expressão de movimentos feministas, enquanto discursos racistas e misóginos permanecem com dificuldade de remoção. Transversal Outro desafio é a dificuldade de acesso a Aluna Adila Zaira Oliveira
canais de denúncia. Muitas plataformas não Censura Cultural:
disponibilizam formulários ou suporte em Muitas plataformas não consideram diferenças culturais todos os idiomas das usuárias, dificultando a em seus termos de uso, resultando em censura de remoção de conteúdos abusivos. Além disso, discursos e performances de gênero que desafiam a maioria das comunicações é automatizada, normas tradicionais. sem atendimento direto ao usuário, o que Privacidade e Pseudo-anonimato: limita a capacidade de resolução de Proteger a privacidade e o pseudo-anonimato é crucial problemas. para mulheres que se expressam ativamente online. Governança Multissetorial: A falta de transparência nas decisões de A resposta à violência de gênero online deve considerar moderação de conteúdo é uma preocupação, a complexidade da governança, especialmente em já que as plataformas geralmente não contextos de desigualdade. informam quem aplica as políticas e que tipo Recomendações para o Estado: de treinamento essas pessoas recebem, 1. Alternativas Não Penais: Aplicar medidas gerando desconfiança entre os usuários. protetivas de forma autônoma para casos de Poucas plataformas divulgam relatórios violência online, em conformidade com a Lei Maria detalhados sobre a remoção de conteúdos da Penha. problemáticos, como a divulgação não 2. Reconhecimento de Relações Virtuais: Instruções consensual de imagens íntimas (NCII), com específicas para considerar relações virtuais como a Microsoft sendo uma exceção. íntimas para aplicação da Lei Maria da Penha. 3. Formação e Infraestrutura: Capacitação de As configurações de segurança e agentes estatais em questões de violência online e privacidade também são uma questão, pois revisão das categorias de registro nos sistemas de muitas plataformas não oferecem padrões delegacias. robustos por padrão, exigindo que as 4. Novos Tipos de Provas: Padronização e usuárias alterem manualmente, expondo modernização dos meios de obtenção de provas em dados pessoais desnecessariamente. Por casos de violência virtual. fim, são escassas as campanhas de 5. Canais de Denúncia: Reestabelecer canais de conscientização sobre a violência online e denúncia online e coletar dados anonimizados sobre seu impacto em grupos vulneráveis, além de violência virtual. haver pouca discussão sobre tecnologias que poderiam prevenir a reincidência de Recomendações para o Setor Privado: conteúdos abusivos. 1. Transparência e Diversidade: Maior clareza nas políticas de moderação de conteúdo e diversidade nas 5) RECOMENDAÇÕES/ equipes das plataformas. CONSIDERAÇÕES FINAIS 2. Acessibilidade nas Denúncias: Facilitar o acesso a formulários de denúncia e garantir comunicação clara Conexão entre Online e Offline: com os usuários. A violência de gênero não pode ser separada Recomendações Comunitárias: entre os ambientes online e offline. 1. Segurança Digital: Apoio para a formação em segurança digital para mulheres e grupos Limitações da Liberdade de Expressão: vulneráveis. O direito à liberdade de expressão não é 2. Redes de Feministas Online: Incentivar a absoluto e deve respeitar outros direitos, como a formação de redes entre ativistas feministas para não discriminação. compartilhar estratégias e fortalecer ações.