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SÍFILIS

RESPOSTA A PARTIR DE ABORDAGENS


POR MÚLTIPLAS DIMENSÕES

Organizadores
Ricardo Valentim
Juciano Lacerda
Karilany Coutinho
Aline Pinho Dias
Carlos Alberto
Carmem Rêgo
Angelica Espinosa
Gerson Pereira
Janaína Rodrigues
SÍFILIS
RESPOSTA A PARTIR DE ABORDAGENS
POR MÚLTIPLAS DIMENSÕES

Natal,RN
2023
Reitor
José Daniel Diniz
Vice-reitor
Henio Ferreira de Miranda

Diretoria Administrativa da EDUFRN


Maria da Penha Casado Alves (Diretora)
Helton Rubiano de Macedo (Diretor Adjunto)
Bruno Francisco Xavier (Secretário)

Conselho Editorial Izabel Souza do Nascimento


Maria da Penha Casado Alves (Presidente) Josenildo Soares Bezerra
Judithe da Costa Leite Albuquerque (Secretária) Ligia Rejane Siqueira Garcia
Adriana Rosa Carvalho Lucélio Dantas de Aquino
Alexandro Teixeira Gomes Marcelo de Sousa da Silva
Elaine Cristina Gavioli Márcia Maria de Cruz Castro
Everton Rodrigues Barbosa Márcio Dias Pereira
Fabrício Germano Alves Martin Pablo Cammarota
Francisco Wildson Confessor Nereida Soares Martins
Gilberto Corso Roberval Edson Pinheiro de Lima
Gleydson Pinheiro Albano Tatyana Mabel Nobre Barbosa
Gustavo Zampier dos Santos Lima Tercia Maria Souza de Moura Marques

Secretária de Educação a distância Isabel Dillmann Nunes – IMD


Maria Carmem Freire Diógenes Rego Ivan Max Freire de Lacerda – EAJ
Secretária Adjunta de Educação a Jefferson Fernandes Alves – SEDIS
Distância José Querginaldo Bezerra – CCET
Ione Rodrigues Diniz Moraes Lilian Giotto Zaros – CB
Marcos Aurélio Felipe – SEDIS
Coordenadora de Produção de Materiais Maria Cristina Leandro de Paiva – CE
Didáticos Maria da Penha Casado Alves – SEDIS
Maria Carmem Freire Diógenes Rêgo Nedja Suely Fernandes – CCET
Coordenadora Editorial Ricardo Alexsandro de Medeiros Valentim – SEDIS
Maurício Oliveira Jr. Sulemi Fabiano Campos – CCHLA
Gestão do Fluxo de Revisão Wicliffe de Andrade Costa – CCHLA
Edineide Marques Revisão Linguístico-textual
Gestão do Fluxo de Editoração Emanuelle Diniz
Maurício Oliveira Jr. Revisão de ABNT
Conselho Técnico-Científico – SEDIS Edineide da Silva Marques
Maria Carmem Freire Diógenes Rêgo – SEDIS Revisão Tipográfica
(Presidente) Flávia Jácome Gonçalves
Aline de Pinho Dias – SEDIS
André Morais Gurgel – CCSA Diagramação, Capa e Projeto gráfico
Antônio de Pádua dos Santos – CS Lucas Almeida Mendonça
Célia Maria de Araújo – SEDIS
Eugênia Maria Dantas – CCHLA
Ione Rodrigues Diniz Morais – SEDIS
Catalogação da publicação na fonte
Universidade Federal do Rio Grande do Norte
Secretaria de Educação a Distância

Sífilis : resposta a partir de abordagens por múltiplas dimensões [recurso


eletrônico] / organizado por Janaína Rodrigues, Gerson Pereira,
Angelica Espinosa, Carmem Rêgo, Carlos Alberto, Aline Pinho Dias,
Karilany Coutinho, Juciano Lacerda e Ricardo Valentim. – 1. ed. –
Natal: SEDIS-UFRN, 2023.
15536 KB; 1 PDF

ISBN nº 978-65-5569-289-1

1. Sífilis. 2. Sífilis – Atenção Básica. 3. Sífilis – Tratamento. 4. Sífilis –


Experiências. I. Janaína Rodrigues. II. Periera, Gerson. III. Espinosa,
Angelica. IV. Rêgo, Carmem. V. Alberto, Carlos. VI. Dias, Aline Pinho.
VII. Coutinho, Karilany. VIII. Lacerda, Juciano. IX. Valentim, Ricardo.

CDU 616-002.6
S573
Elaborada por Edineide da Silva Marques CRB-15/488.
Sumário
Apresentação........................................................ 10
Lavínia Uchoa Azevedo de Araújo
Ricardo Alexsandro de Medeiros Valentim

Capítulo 1.............................................................. 14
Cooperação Técnica Internacional em Saúde
no Âmbito do Projeto “Sífilis Não”
Isabele Magaldi Almeida de Freitas
Thaisa Santos Lima
Mario Orestes Aguirre González
Carlos Alberto Pereira de Oliveira
Ricardo Alexsandro de Medeiros Valentim
Karilany Dantas Coutinho
Aline de Pinho Dias
Sara Marisa de Graça Dias do Carmo Trindade
José António Moreira
Joaquim Luís Medeiros Alcoforado
Carla Padrel de Oliveira
José Antonio Jimenez de las Heras
Lucía Sanjuan Nuñez
Juciano de Sousa Lacerda
Nicolás Lorite-García
Daniele Montenegro da Silva Barros
Agnaldo Souza Cruz
Maria Carmem Freire Diogenes Rego
Maria Cristina Abrão Nachif
Jorgenrique de Azevedo Tinoco
Carla de Carvalho Araújo Lima
Natalia Araújo do Nascimento Batista
Vivekanandan Kumar
Rafael Pinto
Philippi Sedir Grilo de Morais
Rodrigo Dantas da Silva
Azim Roussanaly
Anne Boyer
Capítulo 2.............................................................. 59
Utilização de Mediação Tecnológica na Formação
Humana de Pessoas Privadas de Liberdade
Janaína L. R. da S. Valentim
Sara Dias-Trindade
Eloiza da Silva Gomes de Oliveira
José António Marques Moreira
Ricardo Alexsandro de Medeiros Valentim
Karilany Dantas Coutinho
Maíra Luciano Sidrim

Capítulo 3.............................................................. 80
Qualidade Pedagógica e Inovação
na Produção de Recursos Educacionais Mediados
por Tecnologia para Enfrentamento à Sífilis
Aline de Pinho Dias
Luís Alcoforado
Kaline Sampaio de Araújo
Maurício Oliveira Júnior
Vera Lúcia Kodjaoglanian

Capítulo 4.............................................................110
Formação de Gestantes no Pré-natal
para Enfrentamento à Sífilis e Demais IST:
O uso de ferramenta educacional
mediada por tecnologia
Andressa Cristina de Lacerda Oliveira
Lina Morgado
Josiane Araújo da Cunha
Aline de Pinho Dias
Capítulo 5.............................................................131
A População Jovem e as Infecções
Sexualmente Transmissíveis:
O papel da educação na transformação do
comportamento juvenil frente à sífilis
Cristina Pereira Vieira
Eloiza da Silva Gomes de Oliveira
Maria Valéria Pareja Credidio Freire Alves

Capítulo 6.............................................................169
Desafios e Potencialidades da Educomunicação
como Estratégia no Enfrentamento à Sífilis
Marilyn Anderson Alves Bonfim
Janaína Luana Rodrigues da Silva Valentim
Sara Marisa da Graça Dias do Carmo Trindade
Eloiza da Silva Gomes de Oliveira
José Antônio Marques Moreira
Karilany Dantas Coutinho
Aline de Pinho Dias

Capítulo 7............................................................ 180


Desafios e Perspectivas para a Educação
em Saúde Sexual de Adolescentes e Jovens
no Enfrentamento à Sífilis e Outras IST
Laísi Catharina da Silva Barbalho Braz
Aliete Cristina Gomes Dias Pedrosa da Cunha Oliveira
Pedro Urbano
Arthur Barbalho Braz
Aline de Pinho Dias
Capítulo 8.............................................................197
Olhares Interdisciplinares Sobre a Sífilis:
Diálogos a Partir das Ciências
Humanas e Sociais em Saúde
Lucía Sanjuán Núñez
Elizabethe Cristina Fagundes de Souza
Ana Gretel Echazú Böschemeier
Maria Valéria Credidio Freire Alves

Capítulo 9.............................................................232
O Tratamento da Sífilis na Mídia da Espanha e do Brasil:
Uma Análise das Campanhas (2010-2021)
Ana Cláudia Costa de Araújo
Maria del Mar Marcos Molano
Juciano de Sousa Lacerda
Almudena Muñoz Gallego

Capítulo 10...........................................................252
Análise Qualitativa Audiovisual de Uma Websérie
Sobre Prevenção da Sífilis no Brasil
Análisis Cualitativo Audiovisual de Una Webserie
Sobre Prevención de la Sífilis en Brasil
Juciano de Sousa Lacerda
Nicolás Lorite García
Lucía Sanjuan Nuñez
José Antonio Jiménez de las Heras
Maurício Oliveira Jr.
Kaline Sampaio
Lilian Carla Muneiro
Capítulo 11...........................................................297
Perspectivas Comunicacional, (Inter)Cultural
e Educacional e Competências na Promoção
da Saúde Sexual e na Prevenção da Sífilis
e outras IST em Contextos Interculturais
Natália Ramos
Juciano de Sousa Lacerda
Suelayne Cris Medeiros de Sousa
Anderson Augusto Silva de Almeida

Capítulo 12...........................................................322
Divulgação Científica e Informação em Saúde
para Regiões Fronteiriças: O Enfrentamento à Sífilis
na Tríplice Fronteira Brasil/Paraguai/Argentina
Arthur Barbalho Braz
Bárbara Maria Granês Gonçalves Bäckström
Lilian Carla Muneiro
Laísi Catharina da Silva Barbalho Braz
Suelayne Cris Medeiros de Sousa
Jordana Maria Vieira Soares

Palavras Não Tão Finais Assim............................. 348


Apresentação
Os textos que o leitor tem em mãos foram elaborados por pesqui-
sadores do Projeto “Sífilis Não” que, ao refletirem sobre suas
participações, perceberam a necessidade de contar algumas de
suas experiências por meio de um ENSAIO. Com toda a certeza,
artigos em periódicos e relatórios técnicos não dariam conta de
externar o desejo do grupo que se via diante do que executaram
e do que vislumbram.
Nesse processo, os editores e os autores esforçaram-se para
compartilhar feitos e sonhos com uma ampla gama de leitores não
somente da área da saúde mas também aqueles interessados em
saber sobre saúde pública. Ressalte-se que, para nós, esse pode
ser considerado o pano de fundo de nossas ações, sendo capaz de
impactar nosso tempo e o das futuras gerações. Trata-se, em verda-
de, da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), do
Laboratório de Inovação Tecnológica em Saúde (Lais) e do Núcleo
de Estudos em Saúde Coletiva (Nesc) aproximando, alimentando e
fortalecendo vínculos entre a universidade e a sociedade.
A Análise da Situação de Saúde demonstra a amplitude
do projeto, produtos elaborados, desafios e proposições rumo à
superação. Ações de testagem – tão importantes e urgentes – são
apresentadas para que o leitor conheça os desafios de uma ação
que pode parecer simples, mas que demanda decisão, planeja-
mento e organização para sua adequada execução. Neste e-book,
a urgência dos resultados dos testes para início do tratamento
e o levantamento de dados para dimensionarmos a doença, a
redução das subnotificações e a qualificação das informações do
sistema de notificações estão sublinhados.
Apresentação

Nesta obra, Ensaios, falamos do comunicar, do externar,


trazendo informações de qualidade que são basilares para ações
de educomunicação. Acreditamos que agir para o enfrentamento
da doença e compartilhar o conhecimento que produzimos seja o
caminho para conseguirmos esclarecer as pessoas em relação à
sífilis, romper tabus e estigmas e nos envolver em uma constante
prática de educação em saúde. Para isso, o projeto envolveu todas
as mídias disponíveis para formar uma ecologia comunicativa do
Sistema Único de Saúde (SUS).
O Apoio Institucional no SUS, sempre relevante, foi um dos
pilares das ações de saúde coletiva nos três primeiros anos do
Projeto “Sífilis Não”, que contou com uma rede de apoiadores
(pesquisadores de campo) nos territórios, em movimentos junto
aos gestores e trabalhadores do SUS para fortalecer ações de
vigilância; de gestão e de governança; de cuidado integral; e da
pesquisa-ação. Ademais, dificuldades encontradas, intensificadas
pela pandemia de covid-19, e lições aprendidas foram registradas
nestes Ensaios.
O leitor irá conhecer ainda o caminho percorrido para cons-
truir um modelo de sistematização das pesquisas que adviriam do
Projeto “Sífilis Não”. A esse respeito, destacam-se: a construção
de um termo de referência; a definição de estratégia de trabalho;
a articulação com o apoio institucional nos territórios; e o mode-
lo de gestão e de acompanhamento das pesquisas relatado pelos
autores que evidenciam o cuidado com que esse tema foi tratado
pelo projeto. Destacam-se também os muitos desafios enfrentados.
Ao final, fomos presenteados com uma reflexão sobre
a gestão de casos em sífilis, que expõe os desafios postos pela
fragmentação do cuidado no SUS e aponta para a necessidade
estratégica de uma revisão dos processos de trabalho no âmbito
da gestão, da atenção primária e da vigilância em saúde para o

11
Apresentação

enfrentamento da epidemia de sífilis no Brasil. Tais desafios são


ampliados pelo frágil modelo de notificação da sífilis, que inter-
fere e obscurece a realidade da epidemia no país.
O Projeto “Sífilis Não” representa um marco importante do
Brasil no enfrentamento a uma doença durante muito tempo negli-
genciada. Por pelo menos duas décadas, a sífilis registrou aumento
sucessivo de casos, aspecto que mudou depois que o Brasil decla-
rou uma epidemia de sífilis em 2016. Nesse contexto, podemos
considerar o ano de 2018 como simbólico para a saúde pública no
enfrentamento à sífilis quando foi iniciado este projeto que é resul-
tado de uma pactuação interfederativa a ser executado por meio
de uma cooperação técnica e científica entre a UFRN, o Ministério
da Saúde e a Organização Pan-Americana de Saúde (Opas).
Trata-se de um projeto complexo e de grandes dimensões.
A partir dos primeiros anos, o projeto conseguiu atuar como ferra-
menta de indução de política pública no combate à sífilis, contri-
buindo de forma importante para mudar a tendência de aumento
de casos de sífilis no Brasil, promovendo, para tanto, diversas ações
e articulações em nível nacional, estadual e municipal. Por fim,
um dos mais importantes resultados do Projeto “Sífilis Não” foi,
certamente, ter contribuído para que o tema sífilis passasse a estar
presente na agenda pública de saúde brasileira. Devemos reconhe-
cer que parte desse resultado deve-se ao trabalho dos apoiadores.
Para o Nesc, a oportunidade de disponibilizar sua expertise
em pesquisas no campo da Saúde Coletiva, especialmente com a
finalidade de contribuir para mudanças nos processos de gestão e
de atenção para a redução do impacto da sífilis sobre a saúde da
população, proporcionou, a um só tempo, a possibilidade de apro-
fundar conhecimentos sobre tema de grande relevância e ampliar
a convicção da necessidade de fortalecimento do SUS como polí-
tica pública fundamental para a superação das desigualdades

12
Apresentação

sociais no nosso país. Estes Ensaios são, portanto, ao nosso ver,


mais uma trilha lançada na construção desse caminho.

Lavínia Uchoa Azevedo de Araújo


Coordenadora do Nesc/UFRN

Ricardo Alexsandro de Medeiros Valentim


Coordenador Geral
do Projeto “Sífilis Não”
Diretor Executivo do
Lais/Huol/UFRN

13
Capítulo 1
Cooperação Técnica Internacional
em Saúde no Âmbito do Projeto “Sífilis Não”
Isabele Magaldi Almeida de Freitas 1,
Thaisa Santos Lima1, 3
Mario Orestes Aguirre González 7
Carlos Alberto Pereira de Oliveira 1, 2
Ricardo Alexsandro de Medeiros Valentim 1, 7
Karilany Dantas Coutinho 1, 7
Aline de Pinho Dias 1, 7
Sara Marisa de Graça Dias do Carmo Trindade 4
José António Moreira 4
Joaquim Luís Medeiros Alcoforado 4
Carla Padrel de Oliveira 12
José Antonio Jimenez de las Heras 8
Lucía Sanjuan Nuñez 9
Juciano de Sousa Lacerda 1, 10
Nicolás Lorite-García 10
Daniele Montenegro da Silva Barros 1
Agnaldo Souza Cruz 1
Maria Carmem Freire Diogenes Rego1, 7
Maria Cristina Abrão Nachif 1
Jorgenrique de Azevedo Tinoco 1
Carla de Carvalho Araújo Lima 1
Natalia Araújo do Nascimento Batista 1, 7
Vivekanandan Kumar 5
Rafael Pinto 1,6
Capítulo 1

Philippi Sedir Grilo de Morais 1


Rodrigo Dantas da Silva1
Azim Roussanaly 13,14
Anne Boyer 13,14

1
Laboratório de Inovação
Tecnológica em Saúde da
Universidade Federal do
Rio Grande do Norte.

Instituto Multidisciplinar
2

de Formação Humana com


Tecnologias da Universidade
do Estado do Rio de Janeiro

3
Senado Federal, Brasil

CEIS20 Centro de Estudos


4

Interdisciplinares do Século XX
da Universidade de Coimbra

5
Athabasca University,
Athabasca, Canadá

6
Coordenação de Sistemas de
Informação, Instituto Federal do
Rio Grande do Norte, Natal, Brasil

7
Universidade Federal do Rio
Grande do Norte, Brasil

8
CAI-CREAV, Centro de Apoyo
a la Investigación de Creación
de Contenidos Audiovisuales
y Digitales para la Docencia e
Investigación da Universidade
Complutense de Madri.

15
Capítulo 1

9
GRAFO, Grup de Recerca en
Antropologia Fonamental i
Orientada da Universidade
Autônoma de Barcelona.

PPgEM, Programa de Pós-


10

Graduação em Estudos da
Mídia da Universidade Federal
do Rio Grande do Norte.

11
MIGRACOM, Observatorio
y grupo de investigación
sobre inmigración y comu-
nicación da Universidade
Autônoma de Barcelona.

12
Universidade Aberta de Portugal

13
LORIA - laboratoire lorrain
de recherche en informati-
que et ses applications

14
Université de Lorraine

1. Introdução

A Cooperação Internacional é um instrumento relevante para o


fortalecimento e o desenvolvimento da capacidade dos países nas
mais diversas áreas, entre elas, a saúde. Mediante a transferência
e o compartilhamento de conhecimentos, experiências e tecnolo-
gias, os sistemas de saúde dos países são fortalecidos e os desa-
fios de desenvolvimento são superados (PAN AMERICAN HEALTH
ORGANIZATION, 2013, 2010).
No contexto do compromisso assumido pelos 193 Estados-
Membros da Organização das Nações Unidas (ONU) com os

16
Capítulo 1

Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) estabelecidos


pela Agenda 2030, a Cooperação Internacional mostra-se uma
estratégia ainda mais valiosa para o alcance das metas em nível
nacional e mundial (PAN AMERICAN HEALTH ORGANIZATION,
2010; UN, 2015). Um dos resultados esperados dessa Agenda é
a melhoria da saúde global. Para tanto, é necessário um esforço
conjunto dos estados e dos demais atores de toda a sociedade
para que ações coordenadas de cooperação possam incidir sobre
os fatores determinantes da saúde (HADJIKAKOU et al., 2019;
PRADYUMNA, 2018). Nesse sentido, é primordial acompanhar e
avaliar o desempenho dessas ações, sejam elas em nível nacional
ou internacional, para que estejam alinhadas com os objetivos
pretendidos com a cooperação.
Nesse processo, ainda é evidente a deficiência de estu-
dos acerca de indicadores de desempenho para a avaliação das
cooperações técnicas estabelecidas entre instituições e organismos
internacionais, uma vez que apenas o monitoramento dos recursos
financeiros investidos em um projeto de cooperação técnica inter-
nacional não é o suficiente para identificar os impactos sociais das
ações e as direcionar para a indução das políticas públicas (LIMA,
2011). É fundamental ter em mente que aprender o que funciona
e identificar o porquê disso são pontos cruciais da avaliação da
cooperação internacional (UITTO, 2014). Nessa perspectiva, um
framework para avaliação deve contemplar em seu escopo tanto os
fatores técnicos intrínsecos da cooperação como os fatores políticos
relacionados às parcerias (BRONIATOWSKI et al., 2008).
Nesse contexto, este estudo tem como objetivo propor
um sistema de medição de desempenho para melhorar a efeti-
vidade dos acordos de cooperação técnica internacional. Esta
pesquisa utilizou como caso de estudo o Projeto “Sífilis Não!” do
Ministério da Saúde brasileiro. Esse projeto é operacionalizado

17
Capítulo 1

pelo Laboratório de Inovação Tecnológica em Saúde (Lais) da


Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN). Ainda que
seja uma proposta nacional executada no âmbito do Sistema
Único de Saúde (SUS), esse projeto contempla, para além das
ações de cooperação técnica interfederativas, uma gama de ações
internacionais voltadas para o alcance do objetivo geral do proje-
to, que é a redução dos casos de sífilis no Brasil.
Este capítulo está dividido em cinco seções: a primeira trata da
introdução, contendo a contextualização da temática, a justificativa
e o objeto do estudo. Na seção seguinte, é apresentado o método da
pesquisa, contemplando as etapas cumpridas até a proposta final do
framework para medição de desempenho de acordos de cooperação
técnica internacional. A terceira seção apresenta os resultados do
estudo e a descrição dos elementos do framework que compõem o
sistema de medição de desempenho para os acordos de cooperação
técnica internacional. Por fim, na última seção, são feitas as conside-
rações finais, com conclusão da pesquisa e recomendações.

1.1. Pesquisa no contexto

Globalmente, a cooperação técnica internacional tem acon-


tecido nas mais diversas áreas. No entanto, o modo de controle
dessas ações, a partir de instrumentos padronizados de medição
de desempenho para cooperações internacionais em saúde, não
tem sido difundido na literatura.
Buscamos, no Portal de Periódicos da Coordenação de
Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível (Capes), estudos publicados
desde o início do banco de dados até 16 de maio de 2021, sem
restrição de idiomas. Foram utilizados na busca os descritores
“International Cooperation” ou “International Technical Cooperation

18
Capítulo 1

in Health” e “Performance measurement system”, “International


Cooperation in Health” e “Performance measurement system”,
“International Cooperation in Health” e “evaluation” e “International
Cooperation in Health” e “measurement”. Como resultado, 21 estu-
dos foram encontrados com essa combinação específica.
Estudos anteriores desenvolveram sistemas de medição de
desempenho específicos com o intuito de apresentar uma estrutura
que pode ser usada como base para um sistema de medição de
desempenho em redes de ajuda humanitária e programas globais,
este último estabelecido pelo Grupo Consultivo de Pesquisa Agrícola
Internacional (CGIAR) (BEAMON; BALCIK, 2008; ISKANDARANI;
REIFSCHNEIDER, 2008). Outro estudo focou no potencial e nas
limitações da implementação do Balanced Scorecard, sistema de
medição amplamente difundido, principalmente no meio corpo-
rativo, nos níveis municipais e federais da administração pública
(PŮČEK; ŠPAČEK, 2014). Nessa mesma linha, outro artigo relata os
principais desafios e entraves para a cooperação técnica internacio-
nal em saúde estabelecida entre o Brasil e Moçambique (PEREIRA,
2017). No entanto, nenhum estudo encontrado em nossa busca
forneceu resultados voltados para a medição de desempenho da
cooperação internacional em saúde, mostrando uma lacuna. Por
isso, este estudo visa contribuir com uma proposta de um sistema
de medição de desempenho a partir de uma perspectiva múltipla
e inter-relacionada (NEELY; GREGORY; PLATTS, 1995).

1.2. Valor agregado deste estudo

Após pesquisas nas bases científicas, consideramos que


este é o primeiro estudo a desenvolver um framework para
medição de desempenho aplicada para cooperação técnica

19
Capítulo 1

internacional em saúde. Além disso, este estudo é pioneiro na


análise das cooperações técnicas internacionais a partir da imple-
mentação de um sistema de medição de desempenho inédito,
em um projeto nacional que contempla em seu escopo a coope-
ração internacional. O desenho do sistema de medição propos-
to contempla os aspectos-chave para o sucesso da cooperação
técnica internacional, como demonstraremos adiante.

1.3. Implicações de todas as evidências disponíveis

Descobrimos que, ao utilizar um sistema de medição de


desempenho (SMD) para a cooperação técnica internacional em
saúde, é possível ter um maior controle sobre o andamento das
ações buscando identificar se elas estão apontando para os resul-
tados pretendidos e contribuindo para as metas da cooperação
internacional estabelecidas entre as partes. Quando implementa-
do em diferentes instituições ou projetos, é possível comparar o
recurso investido com os resultados alcançados até determinada
etapa de execução e verificar em que é necessário alocar mais
recursos ou até mesmo reduzir investimentos. A implementação
do SMD no Projeto “Sífilis Não!” mostrou que a cooperação técni-
ca internacional tem contribuído com pesquisas e produtos volta-
dos para a indução da política pública, formação de pesquisadores
e profissionais da saúde, disseminado o conhecimento e levado a
pauta da sífilis para os países cooperantes. Quando comparado
aos benefícios e produtos esperados em termos de contribuição
socioeconômica, o valor investido torna-se ínfimo, demonstrando
que a cooperação técnica internacional pode ser uma ferramenta
muito eficaz no enfrentamento de desafios globais.

20
Capítulo 1

2. Métodos

2.1. Visão geral do procedimento de pesquisa

A pesquisa buscou responder à seguinte questão de pesqui-


sa: Quais seriam os indicadores mais adequados para medir o
desempenho da Cooperação Técnica Internacional?”. Esta pesqui-
sa pode ser caracterizada quanto à sua natureza de aplicada
(DEMO, 1985), abordagem qualitativa-quantitativa (CRESWELL,
2008) com procedimento metodológico no estudo de caso (VOSS;
TSIKRIKTSIS; FROHLICH, 2002; Yin, 2012, 2015).
O procedimento da pesquisa contemplou três etapas,
quais sejam: a pesquisa teórica, a pesquisa de campo e, por fim,
a validação e proposta do sistema de medição de desempenho.
Observar esse procedimento na Figura 1.

Figura 1 - Procedimento da pesquisa.


Fonte: elaborado pelos autores (2019).

21
Capítulo 1

A etapa 1 contemplou a pesquisa teórica, com o propósito


de alcançar uma compreensão mais ampla da temática e do obje-
to de pesquisa. Os conteúdos verificados e estudados foram oriun-
dos de livros, artigos científicos, teses, dissertações, documentos
oficiais de governo, conteúdos disponíveis em meios eletrônicos,
manuais da Agência Brasileira de Cooperação (ABC), relatórios
técnicos da Organização Pan Americana da Saúde (Opas), docu-
mentos provenientes da governança do Projeto “Sífilis Não!” e
dos acordos de cooperação firmados pela UFRN e operaciona-
lizados pelo Lais. Os assuntos contemplados nessa fase foram:
Cooperação Técnica Internacional, Cooperação Técnica em Saúde,
sistema de medição de desempenho e indicadores focados em
projetos. Todo o conteúdo examinado na etapa de elaboração da
fundamentação teórica foi utilizado para a construção do conhe-
cimento na área de pesquisa e elaboração do framework apre-
sentado na seção de resultados.
A etapa 2 consistiu na pesquisa de campo, sendo desenvol-
vido um protocolo de entrevista. Concomitante a essa fase, foram
convidadas, por e-mail, para participar das entrevistas pessoas
identificadas como estratégicas na tomada de decisões no âmbito
do Projeto “Sífilis Não!” e/ou com expertise na área de coopera-
ções internacionais. Após o aceite, foi aplicado um questionário.
O questionário teve o objetivo de reunir informações de necessi-
dades de indicadores de desempenho no âmbito da execução do
projeto e seguido determinado procedimento, a saber:

1. Informar ao entrevistado o objetivo da pesquisa;


2. Apresentar informações macro do Projeto “Sífilis Não!”;
3. Apresentar o sistema de medição de desempenho (SMD)
conceitual;

22
Capítulo 1

4. Permitir que o entrevistado analise as dimensões/pers-


pectivas do SMD apresentado e faça suas observações. Caso
necessário, dar exemplo de tipos de análises possíveis;
5. Apresentar o que é um indicador de desempenho e qual
a sua finalidade;
6. Identificar quais indicadores o entrevistado considera que
devem ser contemplados no sistema de medição do desem-
penho. Solicitar sugestão de outros indicadores;
7. Encerrar.

2.2. Estrutura do modelo, parametrização e premissas

Utilizamos no framework um modelo de causa e efeito,


adaptado do Balanced Scorecard criado por Kaplan e Norton
(1992). Os indicadores do framework foram obtidos na litera-
tura, por meio de documentos oficiais de governo, conteúdos
disponíveis em meios eletrônicos, manuais da Agência Brasileira
de Cooperação (ABC), relatórios técnicos da Organização
Pan-Americana da Saúde (Opas), documentos provenientes da
governança do Projeto “Sífilis Não!”, tais como acordos e planos
de trabalho firmados entre a UFRN e instituições internacionais
de ensino e pesquisa e opinião dos entrevistados.
A construção de dados da pesquisa considerou o perío-
do de 2018 a dezembro de 2020. Durante o levantamento do
número de participantes em eventos científicos produzido pelo
Projeto “Sífilis Não!”, foi considerado o número de assinaturas
coletadas nas listas de presenças no dia do evento. Para os que
tiveram acesso aos eventos virtualmente, foram considerados o
número de visualizações dos vídeos do evento disponibilizados no

23
Capítulo 1

YouTube e o número de inscritos em cursos do Ambiente Virtual


de Aprendizagem do SUS (Avasus), material produzido a partir do
evento. Esses números representam a realidade do dia da coleta
de dados, podendo ser aumentados no futuro. Os indicadores da
dimensão recurso incluíram os valores investidos em pagamen-
tos de taxas e anuidades de cursos de pós-graduação, passagens
aéreas, diárias e ajuda de custo.

2.3. Caso estudo

Esta seção apresenta o estudo de caso que teve como objeti-


vo a validação e o levantamento de novos indicadores para o frame-
work do sistema de medição de desempenho proposto. A primeira
seção descreve o Projeto “Sífilis Não!”, traz à luz o contexto do surgi-
mento do projeto e suas metas para o enfrentamento da sífilis no
Brasil. São relatadas as ações de cooperação técnica internacional
desenvolvidas pelo Laboratório de Inovação Tecnológica em Saúde
no âmbito do Projeto “Sífilis Não!” e a relação dessas ações com
os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável estabelecidos pela
Agenda 2030. Logo em seguida, são apresentados os perfis dos
participantes que contribuíram para esta pesquisa. Por fim, são
descritos os resultados da validação.

2.4. Descrição do Projeto “Sífilis Não!”

Causada pela bactéria Treponema pallidum, a sífilis é uma


infecção sexualmente transmissível que afeta um milhão de gestantes
por ano em todo o mundo. Faz parte da estratégia 2016-2021 adota-
da pela Assembleia Mundial de Saúde, no intuito de diminuir o seu

24
Capítulo 1

impacto como problema de saúde pública até 2030 (ORGANIZACIÓN


MUNDIAL DE LA SALUD, 2015; WORLD HEALTH ORGANIZATION,
2016). No Brasil, nos últimos cinco anos, foi observado um aumento
constante no número de casos de sífilis em gestantes, congênita e
adquirida. No ano de 2019, foram notificados 152.915 casos de sífilis
adquirida, 61.127 casos de sífilis em gestantes e 24.130 casos de sífilis
congênita – entre eles, 173 óbitos (OMS, 2015).
Foi diante desses números que os órgãos de controle
federal pressionaram o Ministério da Saúde no sentido de rever-
ter os números reportados. Isso posto, em janeiro de 2017, foi
aprovada, por meio da Lei Orçamentária Anual (LOA) nº 13.414
(Publicada no DOU de 11.1.2017), a incorporação do montante de
R$ 200.000.000,00 (duzentos milhões de reais) para utilização pelo
Ministério da Saúde (MS) em ações de resposta rápida à sífilis.
Com base nisso, o MS adotou uma estratégia de caráter
estruturante para indução da política pública nacional no campo
da sífilis. Assim, surgiu o Projeto “Sífilis Não!”, operacionalizado
pelo Laboratório de Inovação Tecnológica em Saúde (Lais) da
UFRN, por meio de um plano de trabalho. As atividades previstas
são distribuídas em quatro eixos principais, quais sejam: vigilância,
gestão e governança, cuidado integral e educomunicação.
Esse Plano, ainda que seja uma proposta nacional executa-
da no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS), contempla para
além das ações de cooperação técnica interfederativas, conside-
rando a parceria com os níveis estaduais e municipais brasileiros
e uma gama de ações internacionais (ver meta 6 da Figura 2). A
proposta do Lais é que tais ações contribuam com produtos de
pesquisa e desenvolvimento (P&D) para aplicação direta na indu-
ção nacional da resposta à sífilis, assim como no intercâmbio de
experiências que sejam relevantes para a inovação em saúde no
âmbito do SUS.

25
Capítulo 1

Figura 2 - Metas do Projeto “Sífilis Não!”


Fonte: Projeto Interfederativo Resposta Rápida à Sífilis nas Redes de Atenção (adaptado pelos autores, 2017)

26
Capítulo 1

Atualmente, já foram firmados acordos de cooperação com


as seguintes instituições:

• Universidade de Lorraine (França),


• Universidade Aberta de Portugal (Portugal),
• Universidade de Coimbra (Portugal),
• Universidade Complutense de Madrid (Espanha),
• Universidade Autonoma de Barcelona (Espanha) e
• Universidade de Athabasca (Canadá).

Todas essas instituições possuem um ou mais Plano(s) de


Trabalho em execução no âmbito do Projeto “Sífilis Não!”.
Ademais, foram desenvolvidas parcerias para o desen-
volvimento de projetos e atividades de cooperação técnico-
-científica com a ConqueX, da Universidade de Massachusetts;
a Universidade de Johns Hopkins; a Universidade de Barcelona; e
a Universidade de Harvard.
O Quadro 1 apresenta as áreas de aplicação da cooperação
internacional que estão em desenvolvimento no Projeto “Sífilis
Não!” junto às respectivas instituições parceiras, assim como a
distribuição das respectivas contribuições para o alcance dos
Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS) estabelecidos
pela Agenda 2030. Observa-se que há forte relação do Projeto
principalmente com o objetivo 3, Saúde e Bem-estar; e com o
objetivo 17, Parcerias e Meios de Implementação (WORLD HEALTH
ORGANIZATION, 2016).

27
Capítulo 1

Quadro 1 - Agrupamento das atividades desenvolvidas em cooperação internacional e relação com os ODS
Relação com
País Instituição Aplicação ao Projeto de Resposta Rápida a Sífilis
os ODS
Desenvolvimento de pesquisa aplicada nas
Universidade Aberta de Portugal 3, 4 e 17
áreas de educação e comunicação
Portugal
Fortalecimento da pesquisa aplicada nos campos de educação,
Universidade de Coimbra 3, 4 e 17
comunicação, gestão e governança para resposta à sífilis
Desenvolvimento de pesquisas e recursos educacionais abertos
Universidade Autôno-
para qualificação dos processos de comunicação, produção e
ma de Barcelona
análise de ações de educação a distância em saúde no Brasil
Espanha Produção de novos formatos e narrativas audiovi- 3,4,17
Universidade Complu- suais inovadoras a ser aplicados em comunicação em
tense de Madrid saúde, educação a distância e difusão dos resulta-
dos alcançados pelo Projeto “Sífilis Não!”.
Realização de pesquisas conjuntas nas áreas de Learning analy-
tics, Big data e Machine learning, cujos resultados e/ou tecno-
França Universidade de Lorraine 3,17
logias desenvolvidas deverão ser aplicados na implementação
das Salas de Situação contempladas no Projeto “Sífilis Não!”
Desenvolvimento de atividades conjuntas que visam
Canadá Universidade de Athabasca à mineração e análise de dados da sífilis, relacionan- 3,4,17
do as áreas de Comunicação, Educação e Saúde
Universidade de Massachu- Proposta de P&D de insumos de testagem rápida de sífi-
setts (UMass) - ConquerX lis congênita, para implementação na atenção básica
Estados 3,17
Escola de Saúde Pública
Unidos da Estudos no campo de Resiliência dos sistemas de saúde
de Harvard T.H. Chan
América
Organização Pan-Ame-
Fortalecimento de recursos humanos em saúde 3,4,17
ricana de Saúde
Fonte: elaborado pelos autores (2019).

28
Capítulo 1

2.5. Análise Sensitiva

A análise individual das entrevistas verificou quais os indi-


cadores apresentados possuíam relevância para o sistema de
medição de desempenho da cooperação técnica internacional
considerando a experiência do entrevistado. Os indicadores suge-
ridos pelos entrevistados foram acrescentados e seguiram para
a fase de validação com a coordenação do Projeto “Sífilis Não!”.
O framework para medição de desempenho da cooperação
técnica internacional apresentado neste estudo foi implementado
nas cooperações internacionais estabelecidas pelo Projeto “Sífilis
Não!” com 9 instituições de ensino e pesquisa. Os indicadores
foram calculados utilizando o Microsoft Excel (2019). O perfil dos
participantes das entrevistas segue no Quadro 2, a seguir, confor-
me ordem de realização.

29
Quadro 2 - Perfil dos participantes entrevistados na etapa de campo
Entrevistado nº Perfil
Entrevista nº 1 Coordenador do eixo de educomunicação do Projeto “Sífilis Não!”
Entrevista nº 2 Membro da coordenação do eixo de educomunicação do Projeto “Sífilis Não!”
Gerente do Núcleo de Relações Internacionais e Interinstitucionais do Laboratório de Inovação Tecnológica
Entrevista nº 3
em Saúde (Lais/UFRN)
Entrevista nº 4 Pesquisador e orientador de estudos do Projeto “Sífilis Não!”
Entrevista nº 5 Pesquisador e orientador de estudos do Projeto “Sífilis Não!”
Reitora da UFRN no período de 2011 a 2019 e atual assessora do Gabinete do Reitor da UFRN, background
Entrevista nº 6
em convênios internacionais.
Secretário de Relações Internacionais da UFRN e Ex-Diretor do Colégio de Gestores de Relações Internacionais
Entrevista nº 7
das Instituições Federais de Ensino Superior – CGRIFES/ANDIFES
Especialista em Saúde Global e Diplomacia da Saúde, Coordenadora de cooperação internacional na Assesso-
Entrevista nº 8 ria de Assuntos Internacionais de Saúde (Aisa) do Ministério da Saúde entre os anos 2015 e 2016 e Assessora
especial do ministro da Saúde para assuntos internacionais entre 2019 e 2020.
Fonte: elaborado pelos autores (2020).

30
Capítulo 1

A etapa de entrevistas foi fundamental para a validação e


identificação de outros indicadores de cooperação técnica inter-
nacional em saúde, a partir do modelo conceitual construído com
base na pesquisa teórica.

2.6. Papel da fonte de financiamento

Colaboradores do Ministério da Saúde e membros do


Projeto “Sífilis Não!” estiveram envolvidos no desenho do estu-
do, na interpretação dos resultados e no desenvolvimento do
manuscrito. Nenhum outro financiador teve papel na concepção,
na análise ou na interpretação dos dados deste estudo. Todos os
colaboradores tiveram pleno acesso a todos os dados do estudo.

3. Resultados

Após seguir todas as etapas do método da pesquisa, o


framework para medição de desempenho da cooperação técnica
internacional proposto (ver Figura 3) contemplou um total de 25
indicadores distribuídos em seis dimensões, a saber: sustentabili-
dade, resultado, stakeholders, processos, aprendizado e recurso.
Os indicadores estão apresentados no Quadro 3, bem como a
descrição e a fórmula de cálculo utilizada para cada indicador.
Nesta sessão, será realizada uma breve descrição das dimensões,
identificando como elas se relacionam entre si a partir do modelo
de causa e efeito desenhado para este estudo. Além disso, serão
apresentados os principais resultados da implementação desse
modelo no Projeto “Sífilis Não!”.

31
Figura 3 - Modelo do Sistema de Medição de Desempenho para Projetos de Cooperação Técnica Internacional
Fonte: elaborado pelos autores (2019).
Quadro 3 - Framework para medição de desempenho de Cooperação Técnica Internacional
Dimensão Indicador Descrição Fórmula
Profissionais
Total de pesquisadores matriculados
capacitados em cursos
em cursos de pós-graduação e estágio
de pós-graduação e
pós-doutoral de instituições internacionais.
estágio pós-doutoral
Soma de prêmios de reconhecimento
recebidos por ações desenvolvidas
Sustentabilidade Número de prêmios
no âmbito das cooperações
internacionais firmadas pelo projeto

Número de acordos de
Soma de todos os acordos de
cooperação firmados
cooperação que foram firmados ou
ou renovados no
renovados a partir do projeto
âmbito do projeto

33
Capítulo 1

Dimensão Indicador Descrição Fórmula


Somatório de livros e/ou capítulos de livros
Publicação de livros publicados com a colaboração de instituições
com a colaboração de internacionais no âmbito das cooperações
instituições internacionais internacionais. O capítulo de livro é
equivalente à fração que representa no livro.

Dissertações de mestrado, Consiste no somatório de dissertações


teses de doutorado e de mestrado, teses de doutorado
estágios de pós-doutorado e estágios de pós-doutorado.

Soma de Recursos Educacionais Abertos


(REA) produzidos no âmbito das cooperações
Número de Recursos internacionais voltados para o objeto do
Educacionais Abertos projeto. Incluem os REA incorporados
(REA) produzidos ao Avasus e aqueles disponibilizados nos
canais abertos de compartilhamento
de vídeos como o YouTube.
Somatório de artigos científicos produzidos.
Foram considerados pesos para cada
Publicação de
categoria de publicação, sendo o maior peso
trabalhos científicos
para publicações em periódicos, seguido
de eventos internacionais e nacionais.

Resultado Consiste no somatório de citações


Citações dos artigos
recebidas pelos artigos científicos,
científicos
no período de análise dos dados.
São contemplados todos os pesquisadores
que desenvolveram atividades de
cooperação no país parceiro. As atividades
Pesquisadores em
compreendem o cumprimento de agenda
mobilidade acadêmica
técnica de trabalho, o desenvolvimento de
pesquisas e tecnologias e a participação
em eventos internacionais.
Somatório de cartas patentes depositadas
Número de cartas
a partir do desenvolvimento de produtos
patentes depositadas
no âmbito das cooperações internacionais.
Soma dos registros de softwares
Número registros
solicitados/obtidos desenvolvidos no
de softwares
âmbito das cooperações internacionais.
Somatório de Bancas de Trabalho de
Bancas de Trabalho de
Conclusão de Curso, sejam elas de
Conclusão de Curso
graduação, mestrado ou doutorado,
(TCC) com participação
com participação de pesquisadores
de pesquisadores de
vinculados às instituições dos acordos
instituições do Acordo de
de cooperação Internacional. Existem
Cooperação Internacional
pesos diferentes para cada tipo de TCC.

34
Capítulo 1

Dimensão Indicador Descrição Fórmula


Instituições nacionais e Soma do número de instituições
internacionais envolvidas nacionais e internacionais envolvidas na
na operacionalização operacionalização das metas pelo projeto no
das metas âmbito dos acordos de cooperação firmados.
Somatório de cursos de graduação
Stakeholders e pós-graduação envolvidos no
Número de cursos desenvolvimento de pesquisas/
de graduação e produtos no âmbito das cooperações
pós-graduação envolvidos internacionais. Nesse indicador, são
contabilizados os cursos de universidades
abrangidos nos acordos de cooperação.
Somatório de missões técnicas bilaterais
Número de missões
realizadas no âmbito das cooperações
técnicas realizadas
internacionais firmadas pelo projeto.
Soma das ações de extensão e dos eventos
Ações de extensão científicos promovidos para a troca de
e eventos científicos conhecimento entre pesquisadores,
realizados produzidos no âmbito das cooperações
internacionais firmadas pelo projeto.
Soma de planos de trabalho viabilizados
pelos acordos de cooperação no âmbito
do Projeto. Incluem os planos de trabalho
Planos de trabalho
firmados com grupos de pesquisa de áreas
viabilizados a partir dos
distintas para contribuição em diferentes
acordos de cooperação
projetos, mas que foram viabilizados a
partir das Cooperações Internacionais
Processos estabelecidas pelo projeto original.
Soma de participantes (virtual e presencial)
em eventos. A contagem desse indicador
levou em consideração o número de
Participantes nas assinaturas nas listas de presença dos
modalidades virtual eventos realizados, número de pessoas
e presencial inscritas nos REA incorporados ao Avasus
e o número de visualizações nos vídeos de
eventos produzidos e disponibilizados no
YouTube, no período de análise dos dados.
Soma de ações de pesquisa multilaterais
desenvolvidas a partir das cooperações
Número de ações de internacionais firmadas pelo projeto. P5 = soma de ações de pesquisa multilaterais
pesquisa multilaterais Consideram-se ações multilaterais desenvolvidas a partir das cooperações internacionais
aquelas que envolvem pesquisadores
de mais de duas instituições.

35
Capítulo 1

Dimensão Indicador Descrição Fórmula


Soma de procedimentos de trabalho
estabelecidos para operacionalização
das cooperações internacionais firmadas
pelo projeto, alinhados com a política
Número de procedimentos do Ministério das Relações Exteriores
de trabalho estabelecidos (MRE). Estão contemplados nesse
para operacionalização das indicador instrumentos criados, tais como:
cooperações internacionais modelo de Nota técnica para missão
internacional, instrutivo para emissão de
Aprendizado passaporte oficial, modelos de relatórios
técnicos, modelos de plano de trabalhos
e mapeamento de atores e capacidades.
Somatório de pessoas envolvidas
diretamente na operacionalização das
Número de pessoas
ações estabelecidas no âmbito das
envolvidos diretamente
cooperações internacionais firmadas
na operacionalização
pelo projeto. Contempla pesquisadores e
das ações
assessores de cooperação internacional
das instituições envolvidas no acordo.
Soma dos recursos investidos em cada
Acordo de Cooperação Internacional. São
Valor do investimento por contabilizados nesse indicador os recursos
Acordo de Cooperação investidos em passagens internacionais,
Internacional diárias, ajuda de custo e pagamento
de taxas e mensalidades em cursos de
pós-graduação em instituições estrangeiras.
Orçamento Somatório dos recursos investidos em
cada Acordo de Cooperação Internacional,
Valor per capita bem como nas parcerias internacionais
investido por Acordo de estabelecidas para realização de
Cooperação Internacional ações de cooperação, dividido pelo
firmado pelo projeto número de pesquisadores envolvidos
diretamente na operacionalização
de cada acordo ou parceria.
Fonte: elaborado pelos autores (2019).

36
Capítulo 1

3.1. Sustentabilidade

A dimensão sustentabilidade está no topo do modelo e


representa em que medida os benefícios gerados perdurarão ao
término da vigência dos acordos de cooperação. É composta pelos
indicadores relacionados aos impactos e benefícios decorrentes
de todos os recursos e esforços do Projeto destinados à execução
dos acordos de cooperação técnica internacional.
Até o ano 2022, o Projeto “Sífilis Não!”, ainda em execução,
firmou acordos de cooperação internacional com seis instituições de
ensino e pesquisa. Em Portugal, firmaram-se dois acordos, um com
a Universidade de Coimbra e outro com a Universidade Aberta de
Portugal; na França, com a Universidade de Lorraine; no Canadá, o acor-
do foi firmado com a Universidade de Athabasca; por fim, na Espanha,
foram celebrados dois acordos, um com a Universidade Complutense
de Madrid e outro com a Universidade Autônoma de Barcelona. Além
dessas instituições que possuem acordo de cooperação internacional
firmado entre as partes, o Projeto “Sífilis Não!” desenvolveu ações de
cooperação com outras cinco instituições, a saber: a startup ConquerX,
da Universidade de Massachusetts; a Escola de Saúde Pública de
Harvard; a Universidade de Johns Hopkins; a Universidade Pompeu
Fabra (UPF); e a Universidade de Barcelona (UB).
Estão matriculados ou vinculados em cursos de pós-gra-
duação (mestrado e doutorado) e estágio pós-doutoral em insti-
tuições internacionais parceiras 32 pesquisadores. Todos eles
estão desenvolvendo pesquisas e produtos voltados para o obje-
to do projeto, dos quais 10 estão vinculados à Universidade de
Coimbra; 18, à Universidade Aberta de Portugal; 2, à Universidade
de Lorraine; 1 está vinculado à Universidade de Athabasca; e 1, à
Universidade Complutense de Madrid.

37
Capítulo 1

3.2. Resultado

A dimensão resultado contempla os indicadores relaciona-


dos às metas deliberadas pelos planos de trabalho dos acordos
de cooperação técnica internacional, mas não somente a elas,
essa dimensão pode e deve captar resultados intangíveis, tanto
no tocante ao público-alvo da cooperação quanto aos grupos que
estrategicamente ficam à margem, porém, beneficiam-se dos
resultados obtidos. Por se tratar de um estudo de caso, em que
os acordos de cooperação técnica internacional em saúde são
operacionalizados por uma instituição de ensino superior (IES), é
compreensível que alguns indicadores sejam de interesse apenas
da IES que está operacionalizando o acordo e que tem necessida-
des de monitoramento intrínsecas ao nicho de atuação.
Com o Projeto “Sífilis Não!” ainda em execução, foi possível
mensurar que estão em fase de desenvolvimento, no âmbito das
cooperações internacionais firmadas pelo projeto, 10 dissertações
de mestrado, 20 teses de doutorado e 4 estágios pós-doutoral.
Ademais, foram publicados 3 capítulos de livros. Foram produzi-
dos e disponibilizados 19 Recursos Educacionais Abertos (REA),
sendo 16 no YouTube e 3 no Ambiente Virtual de Aprendizagem
do sistema brasileiro de saúde (Avasus).
Quanto às publicações de trabalhos científicos, foram
contabilizadas 13, sendo 5 desenvolvidos com a colaboração da
Universidade de Lorraine, 2 com a Universidade de Coimbra, 2 com
a Universidade Autônoma de Barcelona, 2 com a Universidade de
Athabasca, 1 com a Universidade Complutense de Madrid e 1
com a Universidade Aberta de Portugal. O projeto registrou, até
o momento, 54 pesquisadores em mobilidade acadêmica desen-
volvendo atividades de pesquisa no âmbito das cooperações inter-
nacionais voltadas para o objeto do projeto.

38
Capítulo 1

Como resultados no âmbito do desenvolvimento de tecno-


logias provenientes das cooperações técnicas internacionais, regis-
tramos, até o momento, seis registros de softwares, sendo um
com a Universidade de Lorraine e cinco com a startup ConquerX.
Houve ainda um depósito de patente internacional, também resul-
tado das ações de cooperação técnico-científica com a startup
ConquerX, sediada na Universidade de Massachusetts.

3.3. Stakeholders

São considerados os stakeholders do acordo de cooperação


internacional as instituições/grupo de pessoas que possuem algum
tipo de interesse nos processos e resultados do projeto que, no caso
de estudo, é o Projeto “Sífilis Não!”. Até o momento da construção
dos dados, havia 12 instituições nacionais e internacionais envolvi-
das na operacionalização das metas estabelecidas pelo projeto no
âmbito dos acordos de cooperação firmados e 16 cursos de gradua-
ção e pós-graduação envolvidos no desenvolvimento de pesquisas
e produtos. Cabe salientar que esse indicador contabiliza as insti-
tuições interessadas de ambas as partes do acordo.

3.4. Processos

Os processos exercem um papel importante no sistema de


medição de desempenho e possuem uma relação direta com a
dimensão aprendizado. À medida que os processos são aperfei-
çoados, é observada uma melhoria significativa no aprendizado da
equipe que, quanto mais capacitada, mais irá aperfeiçoar os seus
processos. Nessa dimensão, são contemplados os indicadores

39
Capítulo 1

relacionados à operacionalização dos acordos de cooperação


técnica internacional para que possam atingir os resultados do
projeto no âmbito das cooperações internacionais firmadas.
No caso de estudo, foram contabilizadas 61 missões técni-
cas bilaterais, sendo 41 realizadas por pesquisadores brasilei-
ros nas instituições parceiras e 20 realizadas por pesquisadores
estrangeiros no Brasil (ver Figura 4). A instituição que teve mais
missões técnicas realizadas por pesquisadores brasileiros foi a
startup ConquerX, sediada na Universidade de Massachusetts
(UMass/ConquerX), com 14 missões técnicas; seguida pela
Universidade de Coimbra (UC), com 6 missões técnicas realizadas;
pela Universidade Aberta de Portugal (UAB-PT) e Universidade
de Lorraine (UL), ambas com 5 missões realizadas por pesquisa-
dores brasileiros; por fim, 1 missão foi realizada por pesquisa-
dores brasileiros em cada uma destas instituições: Universidade
Autonoma de Barcelona (UAB), Universidade Complutense de
Madrid (UCM), Johns Hopkins University (UJH) e Escola de Saúde
Pública de Harvard (ESPH).
Quanto às missões realizadas por pesquisadores estrangei-
ros no Brasil, as instituições que mais participaram de agendas no
Brasil foram: a Universidade Aberta de Portugal e a Universidade
Aberta de Coimbra com 4 e 5 missões realizadas, respectiva-
mente; seguidas da Universidade de Athabasca, Universidade
Autonoma de Barcelona, Universidad Complutense de Madrid e
da startup ConquerX, todas com 2 missões realizadas; e 1 missão
realizada pela Universidade de Johns Hopkins e pela Escola de
Saúde Pública de Harvard.

40
Figura 4 - Missões Técnicas Internacionais do Projeto “Sífilis Não!”
Fonte: elaborado pelos autores (2019).

41
Capítulo 1

Do início do projeto “Sífílis Não!”, em 2018, até dezem-


bro de 2020, foram realizadas 26 ações de extensão e eventos
científicos no âmbito das cooperações internacionais, promo-
vidos para a troca de conhecimento entre pesquisadores (ver
Figura 5), sendo 7 dessas com a Universidade de Coimbra, 4
com a Universidade Aberta de Portugal, 4 com a Universidade
Autónoma de Barcelona, 3 com a Universidade Complutense de
Madrid, 3 com a startup ConquerX, 2 com a Universidade de Johns
Hopkins, 2 com a Universidade de Lorraine e 1 com a Universidade
de Athabasca (UA) e a Escola de Saúde Pública de Harvard.

42
Figura 5 - Ações de Extensão e Eventos Científicos do Projeto “Sífilis Não!”
Fonte: elaborado pelos autores (2020).

43
Capítulo 1

Até o levantamento de dados deste estudo, o Projeto


“Sífilis Não!” promoveu dois eventos internacionais multilate-
rais. O primeiro foi realizado no Brasil e contou com a colabo-
ração da Universidade Aberta de Portugal, da Universidade de
Athabasca e da Universidade de Harvard. O segundo, realizado em
Portugal, na Universidade de Coimbra, contou com a participação
da Universidade Aberta de Portugal, Universidade Complutense
de Madrid e da Universidade Autônoma de Barcelona.
Durante os eventos científicos realizados pelo Projeto
“Sífilis Não!” com a colaboração dos parceiros internacionais,
foi alcançado o total de 10.098 pessoas, conforme dados apre-
sentados na Figura 6, sendo que 33,5% do total participaram
presencialmente e 66,5% assistiram ao evento, posteriormente,
via YouTube e Ambiente Virtual de Aprendizagem do SUS (Avasus).
Observamos que apenas um evento multilateral realizado – em
cooperação com pesquisadores e professores da Universidade de
Harvard, da Universidade Aberta de Portugal e da Universidade
de Athabasca – teve um total de 2.203 inscrições no curso do
Avasus desenvolvido a partir da gravação das ações. Os eventos
realizados com a Universidade Aberta de Portugal totalizaram o
maior número de participantes presenciais e virtuais.
O Projeto “Sífilis Não!” possui nove planos de trabalho viabili-
zados pelos acordos de cooperação técnica internacional firmados.
Nesse caso, dois são com a Universidade Aberta de Portugal, dois
com a Universidade de Coimbra, dois com a Universidade Autônoma
de Barcelona, e um com cada uma das respectivas instituições:
Universidade Complutense de Madrid, Universidade de Lorraine e
Universidade de Athabasca. Em relação às instituições que possuem
mais de um plano de trabalho, isso se deve ao fato de que um acordo
de cooperação permite que sejam formalizados planos de trabalho
com diferentes grupos de pesquisa de uma mesma instituição.

44
Capítulo 1

3.5. Aprendizado

A dimensão aprendizado é similar à “dimensão aprendizado


e crescimento” presente em sistemas de medição de desempenho
consolidados como o balanced scorecard, e tem papel fundamen-
tal no framework proposto. Nessa dimensão, estão inseridos os
indicadores relacionados à capacitação e ao desenvolvimento
das habilidades das pessoas envolvidas na operacionalização da
cooperação técnica internacional. Também inclui a experiência e
as boas práticas descritas nos procedimentos de trabalho.
O Projeto “Sífilis Não!” foi responsável pela profissionali-
zação do Núcleo de Relações Internacionais (NRI) do Lais/UFRN
criado para articulação, pelo monitoramento e pelo controle das
cooperações internacionais firmadas no âmbito do projeto. Desde
sua criação, em 2018, até julho de 2020, o NRI estabeleceu práti-
cas e fluxos de trabalho a partir da experiência com a cooperação
técnica internacional, quais sejam:

• instrutivo e fluxo para emissão de passaporte oficial;


• fluxo para realização de missão técnica oficial (articu-
lação e elaboração de agenda conjunta de atividades;
nota técnica; solicitação de afastamento do país – para
servidores e docentes; solicitação de custeio da missão
técnica; modelo de relatório técnico elaborado após o
fim da missão);
• fluxo para celebração de acordo de cooperação técni-
ca (manifestação de interesse na cooperação, nego-
ciação do acordo de cooperação e plano de trabalho
entre as instituições cooperantes, abertura de processo
no Sistema Integrado de Patrimônio, Administração e
Contratos (SIPAC/UFRN) encaminhando os documen-
tos à Secretaria de relações Internacionais da UFRN,

45
Capítulo 1

análise pela procuradoria jurídica da UFRN e assinatura


do acordo);
• fluxo para candidatura em programas de pós-gradua-
ção na instituição cooperante;
• prática de monitoramento e prestação de contas das
atividades internacionais.

3.6. Recurso

A dimensão recurso, base do sistema de medição de


desempenho proposto por este estudo, apresentou dois indica-
dores, conforme apresentado no Quadro 3. O recurso destinado
à operacionalização da cooperação técnica em saúde é o meio
pelo qual é possível planejar e executar as atividades e metas
propostas pelo plano de trabalho da cooperação técnica inter-
nacional. Por essa razão, é a primeira dimensão do framework
apresentado. As fórmulas utilizadas para o cálculo dos indicadores
encontram-se no Quadro 3, o N utilizado para o cálculo do valor
per capita foi igual a 141.
Os dados financeiros do Projeto “Sífilis Não!”, conforme
apresentados nas Figuras 7 e 8, apontam que até dezembro de
2020, R$ 3.152.499,28 do recurso do projeto foi investido em
ações de cooperação técnica internacional representando 1,58%
do recurso total do projeto. A Figura 7 mostra o valor investido na
pesquisa realizada na respectiva instituição parceira, cujos obje-
tivos de pesquisa são diversos e únicos para cumprimento das
metas do projeto.

46
Capítulo 1

Figura 6 - Recurso Investido por uma instituição internacional cooperante no Projeto “Sífilis Não!”
Fonte: elaborado pelos autores (2020).

47
Capítulo 1

Figura 7 - Valor per capita por instituição internacional cooperante no Projeto “Sífilis Não!”
Fonte: elaborado pelos autores (2020).

48
Capítulo 1

4. Discussão e conclusão

Projetos de cooperação técnica internacional em saúde


precisam de sistemas de medição de desempenho (SMD) adequa-
dos e eficientes para que os resultados esperados com a parceria
sejam mais eficientes e eficazes. A construção de um framework
próprio, utilizando uma relação de causa e efeito, como a usada
em modelos consolidados como o Balanced Scorecard, fez-se
necessária, pois a cooperação internacional em saúde difere em
propósito e possui particularidades intrínsecas a essa área, dife-
rentemente da finalidade do mundo corporativo para o qual a
maior parte dos SMDs foram desenvolvidos. Dessa forma, as pers-
pectivas e os indicadores devem estar direcionados aos resultados
e produtos esperados pela cooperação internacional.
Observou-se que, com a implementação de um sistema
de medição de desempenho, é possível avaliar uma cooperação
e comparar com outras parcerias internacionais estabelecidas no
âmbito do mesmo projeto a fim de identificar os pontos fortes e
fracos e, assim, sugerir as áreas específicas de preocupação para
as quais devem ser destinados os esforços para melhoria.
O SMD também contribui para o alcance dos objetivos esta-
belecidos pelos planos de trabalho dos acordos de cooperação
técnica internacional firmados, aumentando a transparência e o
acesso a informações, permitindo que os gerentes e formuladores
de políticas de saúde identifiquem e tratem as áreas de fraqueza.
O monitoramento é fundamental durante toda a execução da
cooperação para avaliar se as ações desenvolvidas estão alinha-
das com o objetivo final ou se é necessário que ajustes sejam
feitos durante o percurso. Algumas questões relacionadas às
parcerias internacionais não podem ser contabilizadas numeri-
camente, no entanto, devem ser consideradas nos relatórios de

49
Capítulo 1

monitoramento e avaliação de maneira descritiva, para que os


avanços alcançados possam ser contemplados em sua plenitude.
O estudo de caso desta pesquisa mostra que a coopera-
ção técnica internacional desenvolvida no Projeto “Sífilis Não!”
tem inovado na forma de fazer cooperação técnica, uma vez
que todas as parcerias estabelecidas têm como foco produtos e
pesquisas que contribuem para a indução da política pública de
saúde. Além de permitir o compartilhamento de conhecimento,
técnicas, experiências e tecnologias, a cooperação internacional
mostra-se como um item fundamental para a inovação (BRASIL,
2020). A cooperação internacional é uma estratégia poderosa
para a resiliência, o fortalecimento dos sistemas de saúde dos
países e o enfrentamento dos desafios de saúde (PAN AMERICAN
HEALTH ORGANIZATION, 2013, 2010; UNITED NATIONS, [2020]).
Nesse sentido, observamos que a cooperação técnica interna-
cional realizada pelo Projeto “Sífilis Não!” tem contribuído para
disseminar a pauta da sífilis não só no Brasil, onde se enfrenta
uma epidemia da doença, mas também tem levado essa agenda
para outros países onde são estabelecidas as cooperações, cujos
parceiros apropriam-se do conhecimento desenvolvido na coope-
ração para propor e desenvolver pesquisas em seus territórios.
Há de registrar-se que também a visibilidade da cooperação
internacional induziu universidades latino-americanas e africanas a
pautarem o tema da sífilis e a buscarem a cooperação do Lais/UFRN, a
exemplo da Universidade Nacional da Colômbia e do Instituto Superior
Politécnico Católico de Benguela, em Angola, respectivamente.
Apesar de se tratar de um projeto ainda em execução, o
“Sífilis Não!” tem apresentado bons resultados com a coopera-
ção técnica internacional (CTI). Quando analisado e comparado o
recurso total investido na CTI – em termos de resultados acadêmi-
cos, tecnologias desenvolvidas, pessoas alcançadas com as ações

50
Capítulo 1

desenvolvidas e o conhecimento difundido –, o valor torna-se ínfi-


mo, assumindo que a cooperação técnica internacional pode ser
uma ferramenta muito eficaz no enfrentamento de desafios globais.
A parceria com a startup ConquerX, por exemplo, foi volta-
da para o desenvolvimento de tecnologias para o diagnóstico rápi-
do de sífilis e contou com a participação de 14 pesquisadores. Até
a data da coleta de dados, a parceria resultou em 1 depósito de
patente internacional, 5 registros de software, 2 dissertações de
mestrado, além de 658 pessoas alcançadas, presencial e virtual-
mente, a partir dos eventos científicos realizados.
As cooperações com a Universidade Aberta de Portugal e a
Universidade de Coimbra tem como foco a capacitação de pesqui-
sadores e técnicos do Ministério da Saúde para o enfrentamento
à sífilis. A maior parte do recurso investido nessas cooperações
está relacionada aos cursos de pós-graduação. Atualmente, 28
pesquisadores estão vinculados a essas instituições. Uma ques-
tão relevante observada foi quanto ao valor per capita: a coope-
ração com a Universidade de Coimbra apresentou maior valor
per capita do que a cooperação com a Universidade Aberta de
Portugal (UAb-PT). Esse fato está relacionado com a modalidade
dos cursos ofertados pelas instituições portuguesas. A parceria
firmada entre a UFRN e a UAb-PT proporciona a formação de um
número mais significativo de pós-graduandos, os quais não neces-
sitarão se ausentar de seus postos de trabalho, o que permite o
uso mais eficiente dos recursos, pois os cursos são oferecidos na
modalidade a distância para os discentes de mestrado e douto-
rado, diferentemente da Universidade de Coimbra.
As ações de cooperação com aquelas instituições com as
quais não havia ainda instrumentos institucionais ou acordos de
cooperação internacional firmados, mas que possuíam parceria
ou estreita relação entre os seus pesquisadores e professores,

51
Capítulo 1

a exemplo da Universidade Johns Hopkins e a Universidade


de Harvard, também se mostraram bastante profícuas. Essas
ações de cooperação representaram menos de 4% do recurso
total utilizado para cooperação técnica do Projeto “Sífilis Não!”
e ainda assim apresentaram resultados satisfatórios. Como
exemplo, temos um total de 3.547 profissionais e estudantes
da saúde inscritos em três cursos desenvolvidos a partir dessa
colaboração e que foram disponibilizados no Ambiente Virtual de
Aprendizagem do SUS (Avasus). Além disso, mais 122 visualizaram
o recurso educacional disponibilizado no YouTube.
Cabe destacar que esses números representam a realidade
do dia em que os dados foram coletados. Observamos ainda que
a prática do projeto em disponibilizar em plataformas abertas,
como o Avasus e o YouTube, os recursos educacionais produzidos
pela cooperação técnica internacional permite que o conheci-
mento sobre o objeto do projeto, nesse caso, a sífilis, tenha um
maior alcance. Desse modo, os recursos investidos nessas ações
são diluídos ao longo do tempo em termos de pessoas alcançadas
e difusão de conhecimento.
Dessa forma, assumimos que, se mensurados e monitora-
dos os resultados das cooperações internacionais, eles podem
contribuir para a formação e o debate das políticas públicas em
saúde, como tem apontado este estudo de caso. Apesar de a
pesquisa ter sido desenvolvida no âmbito da cooperação entre
instituições de ensino e pesquisa, o Projeto “Sífilis Não!” é produto
interdisciplinar da cooperação entre a UFRN e o Ministério da
Saúde, portanto, os indicadores propostos para medir as ações
internacionais deste caso de estudo podem ser luz para diferen-
tes instituições ou entidades que queiram monitorar o desem-
penho de ações internacionais planejadas ou realizadas. Ainda
apontamos algumas questões importantes, como sugestões para

52
Capítulo 1

pesquisas futuras, tais como: indicadores comuns aos projetos de


cooperação técnica em saúde; principais fatores que influenciam
a implementação de um sistema de medição de desempenho.
Por fim, exortamos a necessidade de a academia, os
organismos internacionais, os governos e as demais instituições
que lidam com as cooperações internacionais fortalecerem seu
compromisso com a implementação de estratégias de moni-
toramento e avaliação dessas ações. Nesse sentido, destaca-
mos a importância de difundir as lições aprendidas para que a
cooperação técnica internacional seja de fato reconhecida como
meio eficaz para o fortalecimento e a resiliência dos sistemas de
saúde dos países envolvidos e que os compromissos assumidos
pela Agenda 2030 sejam alcançados sem que indivíduo algum
seja deixado para trás. Afinal, a saúde global é um bem comum
(ÅRDAL et al., 2016).

5. Agradecimentos

Esta pesquisa foi financiada com recurso do Ministério


da Saúde brasileiro, proveniente do Termo de Execução
Descentralizada (TED) 54/2017. O recurso é administrado pela
Fundação Norte Riograndense de Pesquisa e Cultura (Funpec). A
pesquisa foi apoiada pelo Laboratório de Inovação Tecnológica
em Saúde (Lais) da Universidade Federal do Rio Grande do Norte
(UFRN) que operacionaliza o Projeto “Sífilis Não!”. As constatações
e conclusões deste estudo são de responsabilidade dos autores e
não representam a posição oficial da agência de fomento.

53
Capítulo 1

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54
Capítulo 1

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58
Capítulo 2
Utilização de Mediação Tecnológica
na Formação Humana de Pessoas
Privadas de Liberdade
Janaína L. R. da S. Valentim, Universidade de Coimbra – Portugal, Brasil.
Pós-graduada em Informática na Saúde pela Universidade
Federal do Rio Grande do Norte (UFRN). Doutoranda em
Estudos Contemporâneos pela Universidade de Coimbra no
Centro de Estudos Interdisciplinares do Século XX (CEIS20).
Consultora na parceria da Fundação Santa Cabrini e
Instituto Multidisciplinar de Formação Humana com
Tecnologia da Universidade do Estado do Rio de Janeiro.
Pesquisadora na área tecnologia, inovação e educação em
saúde – Laboratório de Inovação Tecnológica em Saúde.

Sara Dias-Trindade, Universidade de Coimbra, Portugal.


Doutora em História e pós-doutorado em Tecnologias
Educacionais e da Comunicação pela Universidade de
Coimbra. Professora no Departamento de História, Estudos
Europeus, Arqueologia e Artes da Faculdade de Letras
da Universidade de Coimbra e Investigadora no Centro
de Estudos Interdisciplinares do Século XX (CEIS20), em
Humanidades Digitais na Universidade de Coimbra.

Eloiza da Silva Gomes de Oliveira, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Brasil.


Doutora em Educação pela Universidade Federal do Rio de
Janeiro – Professora Titular da Universidade do Estado do Rio de
Janeiro (UERJ), atuando na Graduação e no Programa de Pós-
graduação em Políticas Públicas e Formação Humana (PPFH).
Capítulo 2

José António Marques Moreira, Portugal.


Doutor em Ciências da Educação pela Universidade de
Coimbra e Professor no Departamento de Educação e
Ensino a Distância, Universidade Aberta, Portugal.
Investigador Integrado no Centro de Estudos Interdisciplinares
do Século XX (CEIS20), Universidade de Coimbra.

Ricardo Alexsandro de Medeiros Valentim, Universidade


Federal do Rio Grande do Norte, Brasil.
Doutor em Engenharia Elétrica e de Computação pela
Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN). Professor
Associado da UFRN no Departamento de Engenharia Biomédica
(DEB) do Centro Tecnologia (CT). Professor Permanente
do Programa de Pós-graduação em Engenharia Elétrica
e de Computação (PPgEEC/UFRN) e do Programa de Pós-
graduação em Gestão e Inovação em Saúde (PPgGIS/UFRN).

Karilany Dantas Coutinho, Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Brasil.


Doutora em Engenharia Mecânica pela Universidade Federal
do Rio Grande do Norte (UFRN). Professora efetiva da UFRN
no Departamento de Engenharia Biomédica (DEB) do Centro
Tecnologia (CT). Professora Permanente do Programa de Pós-
graduação em Gestão e Inovação em Saúde (PPgGIS/UFRN).

Maíra Luciano Sidrim, Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Brasil.


Mestre em Engenharia de Produção pela Universidade
Federal do Rio Grande do Norte. Graduada em Engenharia
de Produção – Centro Universitário UniFBV. Pesquisadora do
Laboratório de Inovação Tecnológica em Saúde – LAIS/UFRN.

60
Capítulo 2

1. Introdução

Este texto surgiu do desejo dos direitos humanos plenos e da


busca da verdadeira reinserção social das pessoas aprisionadas,
ancorada na saúde, na educação e no trabalho. Tomamos como
um dos fundamentos as ideias de Assmann (1998) de que, para
construir uma sociedade do conhecimento ela terá que ser susten-
tada em uma cultura aprendente, compartilhada por todos, em
igualdade de condições.
Diante desse debate, a educação tem um papel funda-
mental no processo de reinserção social das pessoas privadas de
liberdade, além de ser um direito garantido a todos os brasileiros.
Entretanto, o Brasil tem um histórico de dificuldades para promo-
ver o acesso à educação para esse grupo.
Quando nos aproximamos das questões referentes à saúde
prisional e das doenças com infectividade por transmissão sexual,
a sífilis aparece como um agravo altamente negligenciado.
A população privada de liberdade é extremamente vulne-
rável e as condições das prisões favorecem a disseminação da
sífilis. Então, se desejamos fortalecer uma resposta rápida para o
seu controle, a partir do trinômio “teste, trate e cure”, o acesso à
informação ganha contornos de essencialidade e é nesse espaço
que a educação pode trazer efetividade.
Nesse cenário em que o sistema prisional brasileiro não
consegue viabilizar de forma plena o acesso à educação para as
pessoas privadas de liberdade, a mediação tecnológica surge
como um possível caminho. A educação mediada por tecnologia
reduz a demanda por professores presenciais, além de ameni-
zar os custos de manutenção de um programa de educação de
abrangência nacional, porque o mesmo curso pode ser oferecido
em larga escala, para um grande número de alunos, podendo ter

61
Capítulo 2

reofertas sucessivas. O que reduz de forma significativa o custo


por aluno de um programa de ensino a distância.
Por outro lado, a pandemia de Covid-19 acelerou os proces-
sos de digitalização de diversos setores, permitindo que muitas
atividades, que antes eram realizadas apenas de forma presencial,
agora possam também ser feitas de forma virtual. Esse processo
de digitalização tem contribuído para o aumento da demanda e
oferta de cursos mediados por tecnologia. À luz dessa discussão
surge o objetivo deste texto: analisar a viabilidade de utilização
da mediação tecnológica para a formação das pessoas privadas
de liberdade no Brasil, em especial no enfrentamento à sífilis.
Iniciamos com a identificação do perfil da população
carcerária brasileira e dos dados sobre a sífilis em prisões, por
meio da análise dos dados disponibilizados pelo Banco Nacional
de Monitoramento de Presos (BNMP 2.0) e do Levantamento
Nacional de Informações Penitenciárias (INFOPEN).
Para abordar o tema, realizou-se um arcabouço teórico
acerca da formação humana, dos aspectos didático-pedagógicos
que permeiam a educação de pessoas privadas de liberdade e
da base legal que assegura a formação desse grupo por meio da
mediação tecnológica.

62
Capítulo 2

2. Perfil da população prisional do Brasil

O Levantamento Nacional de Informações Penitenciárias


(INFOPEN) mostrou que, em junho de 2016, o número de pessoas
privadas de liberdade no Brasil ultrapassou, pela primeira vez na
história, a marca de 700 mil. Hoje somos o terceiro país do mundo
que mais aprisiona, atrás dos Estados Unidos, China.
Embora os dados relativos às prisões sejam sempre cerca-
dos de certa incerteza e pouca visibilidade, são números muito
significativos e que merecem ser observados.

A seguir, a Tabela 1 apresenta os dados mais recentes rela-


tivos ao perfil da população privada de liberdade com base no
Banco Nacional de Monitoramento de Presos (BNMP 2.0).

63
Número de pessoas privadas de liberdade no Brasil

862003

Presos
Em execução Em execução
Provisórios Prisão civil Total
provisória definitiva
371685 195910 290860 1133 859588
43,24% 22,79% 33,84% 0,13% 100%
Internados

Em execução Em execução
Provisórios Prisão civil Total
provisória definitiva

490 357 1568 - 2415

Tabela 1 - População privada de liberdade no Brasil.


Fonte: Adaptado de Banco Nacional de Monitoramento de Presos (BNMP 2.0) (BRASIL, 2020).

64
Capítulo 2

Os dados apresentados na Tabela 1 chamam a atenção por


diversos motivos. A começar pela marca de 862.003 pessoas priva-
das de liberdade e, dessas, 859.588 encontram-se presas. Além
disso, mais de 43% das pessoas presas configuram-se como presos
provisórios, um número preocupante considerando que umas das
características dos presídios brasileiros é justamente a superlotação.

3. Aspectos didático-pedagógicos que permeiam


a formação de pessoas privadas de liberdade

Diante do contexto das pessoas privadas de liberdade no


Brasil, é preciso ampliar o olhar para o significado da Educação,
incluindo, além de conhecimentos e habilidades, a emancipação
dos indivíduos, tornando-os verdadeiramente cidadãos.
Assim, este texto defende, como condição basilar, a reali-
zação de ações de formação humana que resgatem aos alunos
aptidões que, além da sobrevivência e da reinserção social, possi-
bilitem uma visão de mundo compatível com a ética e a cidadania,
a recuperação da autoestima e a convivência social com o outro
na sua diversidade.
Esse é um investimento formativo no humano, que aponta
nas três direções comumente indicadas à educação: a construção
simbólica da realidade, por meio da aquisição e desenvolvimento
de variadas linguagens; a aquisição de conhecimentos e habilida-
des que vinculam fortemente a teoria à prática; e a formação do
sujeito ético.
Falamos de uma Educação em Direitos Humanos que, como
propõe Benevides ([2007?]), parte de três pontos: é uma educa-
ção permanente, contínua e global; está voltada para a mudança

65
Capítulo 2

cultural; e é uma educação em valores, indo além da transmissão


de conhecimentos.
Para a autora, é

a formação de uma cultura de respeito à dignidade humana


através da promoção e da vivência dos valores da liberdade,
da justiça, da igualdade, da solidariedade, da cooperação, da
tolerância e da paz. Isso significa criar, influenciar, comparti-
lhar e consolidar mentalidades, costumes, atitudes, hábitos
e comportamentos que decorrem, todos, daqueles valores
essenciais citados – os quais devem se transformar em práticas
(BENEVIDES, [2007?], p.1).

É necessário estabelecermos a distinção entre o direito à


educação e a educação para os Direitos Humanos. O primeiro é
claramente enunciado na Constituição Brasileira, em seu artigo
205: “A educação, direito de todos e dever do Estado e da família,
será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade,
visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o
exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho”.
A Educação para os Direitos Humanos é assim definida por
Candau (2007):

1. é indispensável para o desenvolvimento dos direitos huma-


nos; 2) deve articular as categorias da igualdade e da diferença;
3. deve realizar o empoderamento dos atores sociais; 4. é uma
filosofia e deve integrar a cultura escolar; 5. Está assentada no
tripé: a) conhecer e defender direitos; b) respeitar a igualdade
de direitos dos outros e c) deve estar comprometida com a
defesa dos direitos dos outros (CANDAU, 2007, p. 61).

No caso da população penitenciária, embora o direi-


to à educação seja explicitado na Constituição da República e

66
Capítulo 2

referendado pela Lei de Execução Penal (1984), ele não chega


plenamente a essas pessoas, cobertas pela invisibilidade.
Quanto à Educação para os Direitos Humanos, conside-
ramos que ela se apresenta como ação preventiva em relação
ao crescimento assustador do número de pessoas privadas de
liberdade no Brasil, contribuindo para a construção de indivíduos
conscientes do conceito, das nuances, dos direitos e dos deveres
constitutivos da cidadania plena e para a garantia do princípio da
dignidade da pessoa humana.
Diante desse cenário, a Agenda 2030 para o desenvolvi-
mento sustentável, documento elaborado pela Organização das
Nações Unidas (2015) ganha ainda maior sentido.
Apoiada em cinco áreas, pessoas, planeta e prosperidade,
paz e parceria, para a formulação de seus objetivos e metas, a
Agenda traz “Um chamado à ação para mudar nosso mundo”.
Inclui entre as suas metas, ilustrando o que dissemos:

Meta 4.3. Até 2030, assegurar a igualdade de acesso para todas as


mulheres e homens a uma educação técnica, profissional e supe-
rior de qualidade, a preços acessíveis, inclusive a universidade.

Meta 4.4: Até 2030, aumentar substancialmente o número de


jovens e adultos que tenham habilidades relevantes, inclusive
competências técnicas e profissionais, para o emprego, o traba-
lho decente e o empreendedorismo.

Meta 4.5: Até 2030, eliminar as disparidades de gênero na


educação e garantir a igualdade de acesso a todos os níveis
de educação e formação profissional para os mais vulneráveis,
incluindo as pessoas com deficiências, os povos indígenas e as
crianças em situação de vulnerabilidade.

Esse apelo à construção da cidadania plena nos leva ainda


mais à constatação de que a formação humana das pessoas

67
Capítulo 2

privadas de liberdade é uma demanda fundamental para o desen-


volvimento de países como o Brasil. Nesse sentido, enfatiza-se o
quarto Objetivo de Desenvolvimento Sustentável (ODS) da refe-
rida agenda: “Assegurar a educação inclusiva e equitativa e de
qualidade, e promover oportunidades de aprendizagem ao longo
da vida para todas e todos”.
O ODS 4 reitera a necessidade de garantir uma educação
inclusiva e de qualidade a todas as pessoas, sem exceções.
Conflui com o princípio enunciado por Silva e Moreira
(2011, p. 92): “o papel da educação dentro da prisão deve ser única
e exclusivamente o de ajudar o ser humano privado da liberdade
a desenvolver habilidades e capacidades para estar em melhores
condições de disputar as oportunidades socialmente criadas”. A
conjugação do aumento da escolarização e da profissionalização
das pessoas privadas de liberdade, juntamente com o desenvolvi-
mento de habilidades e competências sociais, contribui realmente
para a efetiva ressocialização dos egressos.
A Educação, o trabalho e a consecução de direitos são
questões muito complexas quando se trata do contexto prisional
brasileiro. Ao propor subsídios para a formulação de uma política
pública estadual de expansão de atividades laborais para pessoas
presas e egressas, Tinoco e Pellegrino (2018) trazem várias reco-
mendações necessárias para que essa política pública seja efeti-
vada, entre as quais destacamos: a necessidade de ampliar as
iniciativas de capacitação social e técnica para presos e egressos;
a melhoria da qualidade dos dados sobre a população carcerária;
a criação de um banco de vagas e empregos para egressos, junto
com o mapeamento de espaços laborais disponíveis e a busca
ativa de potenciais contratantes; além da criação de incentivos
para emprego para presos e egressos e do desenvolvimento de

68
Capítulo 2

estratégia de comunicação focada em histórias positivas de rein-


serção social por meio do trabalho.
Segundo Coyle (2002), o preso reabilitado não é uma pessoa
que aprendeu a sobreviver bem na prisão, mas uma pessoa que
tem êxito no mundo externo à prisão na pós-reclusão. Para isso, é
necessária a obtenção de uma sobrevivência plena, que contem-
ple o pleno gozo dos direitos humanos.

4. Aplicabilidade das Iecnologias


de Informação e Comunicação (TIC)

A educação é um processo caracterizado pela mediação


de algum meio de comunicação como complemento ou apoio à
ação do professor em sua interação com os estudantes (BELLONI,
2009). Como o conhecimento não é algo palpável, é necessário um
envolvimento profundo de quem aprende, construindo o conhe-
cimento em etapas. Assim, a mediação consiste na facilitação do
envolvimento dos alunos com o conteúdo e na construção do
conhecimento por etapas, o que permite a interação ativa dos
alunos com o conteúdo transmitido, proporcionando assimilação
e aprendizagem significativa.
Com o desenvolvimento acelerado das tecnologias de
informação e comunicação, existe hoje uma infinidade de novos
instrumentos de mediação para facilitar a aprendizagem. Por meio
de um Ambiente Virtual de Aprendizagem (AVA) é possível aces-
sar o conhecimento acumulado por gerações, construir ideias de
forma colaborativa, ampliar capacidades, descobrir itinerários de
formação antes impossíveis, com uma abrangência inimaginável
tempos atrás.

69
Capítulo 2

Enganam-se os que pensam que a inserção crescente da


tecnologia na educação se opõe a uma prática educacional huma-
nista. Essas realidades são complementares, deslocando o foco
do processo de ensinar para caminhos que levam ao processo
contínuo de aprender a aprender e, sobretudo, à valorização do
humano nesse atual contexto de mudanças.
De um modo geral, a formação das pessoas privadas de
liberdade por meio das TIC pode garantir:

• Práticas pedagógicas centradas nos alunos;


• Tratamento criativo, original e humanizado dos
conteúdos;
• Facilidade de acesso ao conteúdo;
• Estrutura flexível;
• Possibilidade de autonomia do aluno;
• Feedback imediato dos resultados das atividades
propostas;
• Atendimento dos variados estilos de aprendizagem;
• Acesso aberto a repositórios de pesquisas científicas;
• Utilização de software de código aberto para fins
educacionais;

Vale destacar que é preciso utilizar ambientes virtuais de


aprendizagem que apresentem viabilidade para o contexto prisio-
nal brasileiro, além de estar em consonância com os princípios da
Educação com mediação tecnológica, como equidade de possibili-
dades educacionais, autonomia, respeito à cidadania, entre outros.

70
Capítulo 2

5. Base legal para a utilização de mediação tecnológica


na formação de pessoas privadas de liberdade

Com relação às normas legais que dão apoio à utilização


de mediação tecnológica na formação de pessoas privadas de
liberdade, o Decreto nº 9.057, de 25 de maio de 2017, que regu-
lamenta o art. 80 da Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996
reitera, em seu Art. 1º, a definição de Educação a Distância (EAD),
caracterizando-a como:

[...] a modalidade educacional na qual a mediação didático-pe-


dagógica nos processos de ensino e aprendizagem ocorra com a
utilização de meios e tecnologias de informação e comunicação,
com pessoal qualificado, com políticas de acesso, com acompa-
nhamento e avaliação compatíveis, entre outros, e desenvolva
atividades educativas por estudantes e profissionais da educa-
ção que estejam em lugares e tempos diversos (BRASIL, 2017).

Ainda na citada Lei nº 9.394 / 96, que estabelece as dire-


trizes e bases da educação nacional, o Artigo 80 afirma que: “O
Poder Público incentivará o desenvolvimento e a veiculação de
programas de ensino a distância, em todos os níveis e modalida-
des de ensino, e de educação continuada” (BRASIL, 1996).
Nesse sentido, existem ainda outras legislações que servem
de base legal para a formação de pessoas privadas de liberdade
por meio da mediação tecnológica:

• Lei de Execução Penal (LEP) – Lei nº 7.210/1984, já cita-


da, que garante às pessoas privadas de liberdade direi-
tos fundamentais como o direito à educação e o direito
ao trabalho. Essa lei define que o acesso à educação
deve ser fornecido pelo Estado na forma de instrução

71
Capítulo 2

escolar e formação profissional, visando à reintegração


dessa população à sociedade. A lei também determi-
na que o trabalho dessas pessoas deve ter finalidade
educativa e produtiva (Brasil, 1984).
• Resolução nº 03/2009 do Conselho Nacional de Política
Criminal e Penitenciária do Ministério da Justiça (Brasil, 2009).
• Resolução CNE/CEB nº 02, de 19 de maio de 2010, que
dispõe sobre as Diretrizes Nacionais para a oferta de
educação para jovens e adultos em situação de priva-
ção de liberdade nos estabelecimentos penais.
• Decreto nº 7.626/2011, que institui o Plano Estratégico
de Educação no âmbito do sistema prisional (PEESP),
que tem como diretrizes:
I. Promoção da reintegração social da pessoa em
privação de liberdade por meio da educação;
II. Integração dos órgãos responsáveis pelo ensino
público com os órgãos responsáveis pela execução penal;
III. Fomento à formulação de políticas de atendi-
mento educacional à criança que esteja em estabe-
lecimento penal, em razão da privação de liberdade
de sua mãe.

Enquanto os objetivos do PEESP são:


I. Executar ações conjuntas e troca de informações
entre órgãos federais, estaduais e do Distrito Federal
com atribuições nas áreas de educação e de execu-
ção penal;
II. Incentivar a elaboração de planos estaduais
de educação para o sistema prisional, abrangendo
metas e estratégias de formação educacional da
população carcerária e dos profissionais envolvidos
em sua implementação;

72
Capítulo 2

III. Contribuir para a universalização da alfabetiza-


ção e para a ampliação da oferta da educação no
sistema prisional;
IV. Fortalecer a integração da educação profissional
e tecnológica com a educação de jovens e adultos
no sistema prisional;
V. Promover a formação e capacitação dos profis-
sionais envolvidos na implementação do ensino nos
estabelecimentos penais; e
VI. Viabilizar as condições para a continuidade dos
estudos dos egressos do sistema prisional.

Diferentemente da concepção do Código Penal, um decreto


da década de 1940, inspirado na legislação europeia e seu contex-
to de guerra, que admite a pena somente em seu caráter de retri-
buir o mal praticado com a segregação física do apenado, a Lei
de Execução Penal surge como resultado da ideia de que uma
sociedade apenas é defendida à medida que se proporciona a
adaptação do condenado ao meio social, o que, necessariamente,
perpassa pelo estímulo, oferta, acesso à educação.
As resoluções nº 03/2009, do Conselho Nacional de Política
Criminal e Penitenciária do Ministério da Justiça e nº 02/2010, do
CNE/CEB, inicialmente registraram que a Lei de Execução Penal
vigente no Brasil, ao tratar mais especificamente sobre a definição
e cumprimento de pena no ordenamento pátrio, passou a dar
enfoque à recuperação do apenado e sua reinserção social, deter-
minando a prestação de assistências diversas no sentido mais
amplo, conferindo uma feição mais humanizada à penalidade.
Ainda que não se acredite no efeito ressocializador da pena, estu-
diosos não negam a necessidade de sua humanização por meio

73
Capítulo 2

de política de educação e assistência ao preso, permitindo-lhe o


retorno à sociedade em condições de convivência normal.
É justamente nessa nova concepção humanística de
cumprimento de pena no Brasil que as resoluções nº 03/2009
e nº02/2010, de forma inédita, introduzem política pública em
âmbito nacional, voltada para o acesso educacional de pessoas
privadas de liberdade, que abriu espaço para instituir o Plano
Estratégico de Educação no âmbito do sistema prisional (PEESP)
por meio do Decreto nº 7.626/2011.
Por fim, esses atos normativos foram responsáveis não só
pela introdução de uma política pública de educação prisional de
alcance nacional, como também abriram portas para a utilização
de mediação tecnológica no ensino, possibilitando a ampliação de
acesso à educação para as pessoas privadas de liberdade.

6. Conclusões

Com base no que foi apresentado, constata-se que, apesar


da legislação brasileira garantir, às pessoas privadas de liberdade,
direitos básicos como o acesso à educação, a realidade enfrentada
por esse grupo é bem distante do que está previsto nas leis.
Na prática, o cenário dos presídios brasileiros é marcado por
superlotação, precárias condições de vida e raras oportunidades
de educação e de ressocialização.
A base legal apresentada neste artigo consegue fundamentar
a utilização da mediação tecnológica para a formação de pessoas
privadas de liberdade no Brasil. Reiteramos que a educação media-
da por tecnologias tem potencial para ser uma grande aliada no
fortalecimento do acesso à educação por parte desse grupo.

74
Capítulo 2

Por fim, a utilização de mediação tecnológica na educação


das pessoas privadas de liberdade, um caminho apontado como
desejável para promover essa reintegração, pode contribuir para
mitigar os efeitos negativos do aprisionamento e possibilitar a
ressocialização por meio do desenvolvimento pessoal para o exer-
cício da cidadania e para a qualificação profissional.
Ainda há um caminho a seguir, que implica a verdadeira
implementação da legislação que citamos. Isso exige, entre outras
coisas, a criação de espaços educacionais nas unidades prisionais;
a arquitetura de plataformas virtuais seguras, utilizáveis intramu-
ros das prisões; a elaboração de objetos educacionais compatíveis
com essa modalidade educacional; e a formação de professores
para desenvolver as atividades previstas.

75
Capítulo 2

Referências

ASSMANN, H. Reencantar a Educação: rumo à sociedade


aprendente. Petrópolis: Editora Vozes, 1998.

BENEVIDES, Maria Victoria. Educação em Direitos Humanos: de


que se trata?. [S. l.: s. n.], [2007?]. Programa Ética e Cidadania:
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http://portal.mec.gov.br/seb/arquivos/pdf/Etica/9_benevides.
pdf. Acesso em: 28 jul. 2021.

BRASIL. [Constituição (1988)]. Constituição da República


Federativa do Brasil de 1988. Brasília, DF: Presidência da
República, [2016]. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/
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Monitoramento de Prisões 2020 – BNMP 2.0. Brasília, DF:
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Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l7210.
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76
Capítulo 2

BRASIL. Presidência da República. Secretaria-Geral. Subchefia


para Assuntos Jurídicos. Decreto nº 9.057, de 25 de maio de
2017. Regulamenta o art. 80 da Lei nº 9.394, de 20 de dezembro
de 1996, que estabelece as diretrizes e bases da educação
nacional. Brasília, DF: Presidência da República, [2017].
Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-
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BRASIL. Ministério da Justiça. Conselho Nacional de


Politica Criminal e Penitenciária. Resolução nº 03, de 11
de março de 2009. Dispõe sobre as Diretrizes Nacionais
para a oferta de Educação nos estabelecimentos penais.
Brasília, DF: Presidência da República, [2009]. Disponível
em: http://portal.mec.gov.br/index.php?option=com_
docman&view=download&alias=10028-resolucao-3-2009-
secadi&category_slug=fevereiro-2012-pdf&Itemid=30192.
Acesso em: 4 ago. 2021.

BRASIL. Ministério da Educação. Conselho Nacional de


Educação. Câmara de Educação Básica. Resolução CNE/
CEB nº02, de 19 de maio de 2010. Dispõe sobre as Diretrizes
Nacionais para a oferta de educação para jovens e adultos
em situação de privação de liberdade nos estabelecimentos
penais. Brasília, DF: Presidência da República, [2010]. Disponível
em: http://portal.mec.gov.br/index.php?option=com_
docman&view=download&alias=5142-rceb002-
10&Itemid=30192. Acesso em: 4 ago. 2021.

77
Capítulo 2

BRASIL. Presidência da República. Secretaria-Geral. Subchefia


para Assuntos Jurídicos. Decreto nº 7.626, de 24 de novembro
de 2011. Institui o Plano Estratégico de Educação no âmbito do
sistema prisional (PEESP). Brasília, DF: Presidência da República,
[2011]. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_
ato2011-2014/2011/decreto/d7626.htm. Acesso em: 4 ago. 2021.

BRASIL. Ministério da Justiça. Levantamento Nacional de


Informações Penitenciárias (INFOPEN). Brasília, DF: MJ, 2019.
Disponível em: https://dados.mj.gov.br/dataset/infopen-
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Acesso em: 16 jun. 2022.

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para Assuntos Jurídicos. Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de
1996. Estabelece as diretrizes e bases da educação nacional.
Brasília, DF: Presidência da República, [1996]. Disponível em:
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9394.htm. Acesso
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BELLONI, M. L. Educação a Distância. Campinas: Editora


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Londres: Internacional Centre for Prision Studies, 2002.

78
Capítulo 2

ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS. Transformando nosso


Mundo: a Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável.
Brasília, DF: Nações Unidas Brasil, 2015. Disponível em: https://
nacoesunidas.org/pos2015/agenda2030/. Acesso em: 5 maio 2021.

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2018. Disponível em: https://igarape.org.br/wp-content/
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pressos-e-egressos.pdf. Acesso em: 18 jun. 2021.

79
Capítulo 3
Qualidade Pedagógica
e Inovação na Produção de Recursos
Educacionais Mediados por Tecnologia
para Enfrentamento à Sífilis

Aline de Pinho Dias


Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Doutora,
[email protected]

Luís Alcoforado
Universidade de Coimbra, Doutor,
[email protected]

Kaline Sampaio de Araújo


Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Mestre,
[email protected]

Maurício Oliveira Júnior


Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Mestre,
[email protected]

Vera Lúcia Kodjaoglanian


Laboratório de Inovação e Tecnologia em Saúde/LAIS/UFRN, Mestre,
[email protected]
Capítulo 3

1. Introdução

A sífilis é uma Infecção Sexualmente Transmissível (IST), secular-


mente conhecida, que tem preocupado autoridades de saúde no
mundo inteiro e, principalmente no Brasil, onde o referido agravo
tem crescido de forma alarmante. Em 2018, segundo o Boletim
Epidemiológico do Ministério da Saúde (MS) brasileiro, a sífilis foi
considerada epidemia nacional.
O referido boletim aponta, no ano de 2017, 119.800 casos
notificados de sífilis adquirida, 49.013 casos de sífilis em gestan-
tes, 24.666 casos de sífilis congênita e 206 óbitos por sífilis congê-
nita. No período de 2010 a 2017, os casos desse agravo passaram
de “2 casos por 100 mil habitantes” em 2010 para 58,1 casos por
100 mil habitantes em 2017. Os casos de sífilis congênita aumen-
taram 3,6 vezes e sífilis em gestantes 4,9 vezes.
O Tribunal de Contas da União (TCU), no Brasil, após avalia-
ção da política nacional de combate à sífilis, recomendou, entre
outras ações, forte atuação no escopo da comunicação e educação,
voltadas aos profissionais de saúde, população em geral e grupos
específicos, por entender que houve pouca eficiência na atuação
para prevenção à epidemia junto aos referidos públicos. O docu-
mento foi publicado no Diário Oficial da União, Acordão 2019/2017.
O projeto de Resposta Rápida à Sífilis, intitulado Projeto
“Sífilis Não”, foi criado pelo Ministério da Saúde Brasileiro em
parceria com o Laboratório de Inovação Tecnológica em Saúde/
LAIS, da Universidade Federal do Rio Grande do Norte/UFRN,
com o propósito de atuar em diferentes áreas para o enfren-
tamento à sífilis. São elas: vigilância epidemiológica; gestão e
governança; cuidado integral; educação e comunicação. A área
da educação e comunicação vem com o grande desafio de traba-
lhar a formação de diferentes públicos, utilizando, para isso, a

81
Capítulo 3

mediação tecnológica, uma vez que o Brasil é um país de dimen-


sões continentais e com uma população de, aproximadamente,
213.392.853, segundo dados do IBGE de julho de 2021.
Assim, a fim de promover educação de qualidade, com um
caráter inovador, e que possa gerar impacto junto aos públicos
envolvidos, foi realizado um conjunto de ações com forte associa-
ção entre educação e comunicação, considerando os princípios
pedagógicos e comunicativos da educomunicação, que conside-
ram, em sua essência, participação, autogestão, comunicação
dialógica. Neste âmbito, têm sido elaborados produtos de educa-
ção e comunicação a partir de dissertações e teses de mestrado
e doutoramento, tais como recursos educacionais abertos (REA)
autoinstrucionais; webpalestras; webséries; podcasts no forma-
to de programa de rádio; aplicativos com proposta de troca de
experiências entre profissionais de saúde e gestantes. Além disso,
foi criada a câmara técnica de educação com fins de discussão e
avaliação da linguagem utilizada nos recursos educacionais. Outra
ação de destaque é a realização de estudo teórico sobre qualidade
pedagógica de recursos educacionais autoinstrucionais, a fim de
definir parâmetros de qualidade nesse âmbito. A avaliação dos
recursos educacionais com base nestes parâmetros será objeto
de pesquisas posteriores.
Este capítulo tem o objetivo de apresentar a concepção
de qualidade pedagógica, no âmbito da produção de recursos
educacionais e sua relação com a inovação nas ações educacionais
para o enfrentamento da sífilis.

82
Capítulo 3

1.1. Documentos utilizados na construção dos parâmetros


de qualidade pedagógica de recursos educacionais
para enfrentamento à sífilis

Como já afirmado anteriormente, os parâmetros de quali-


dade, na produção de recursos educacionais mediados por tecno-
logia, requer enquadramento contextual. Portanto, não é possível
estabelecer parâmetros universais que se adequem a qualquer
contexto. Essa é a razão pela qual o principal documento nortea-
dor da qualidade na educação a distância, no Brasil, publicado pelo
Ministério da Educação (MEC) em 2003, intitula-se como “referen-
cial” de qualidade. Tratam-se de parâmetros norteadores gerais.
Com revisão em 2007, o documento “Referenciais de
Qualidade Para Educação Superior a Distância” apresenta refe-
renciais que perpassam todo o sistema de educação a distância.
No que diz respeito à produção de material didático, objeto deste
estudo, o documento destaca como elementos orientadores da
qualidade os seguintes aspectos: mídia compatível com proposta
e contexto socioeconômico do público-alvo; possibilitar desenvol-
vimento de competências e habilidades específicas; abordagem
de conteúdo conforme orientação epistemológica, metodológi-
ca e política especificada no projeto pedagógico; produção dos
conteúdos feita com equipe multidisciplinar; elaborar materiais
integrando diferentes mídias, ou seja, explorando convergência
e integração entre materiais distintos, tais como radiofônicos,
impressos, videoconferências, de informática etc.
Além desses aspectos gerais, o documento ressalta a impor-
tância de elementos como: visão geral do curso; materiais de estu-
do disponíveis para o educando; avaliação; garantia de unidade
entre os conteúdos trabalhados; uso da linguagem dialógica;

83
Capítulo 3

disponibilização de formas de interação; detalhar objetivos de


aprendizagem; indicar bibliografias e leituras complementares.
No contexto da formação humana em saúde para enfren-
tamento à sífilis, além dos referenciais acima citados, utilizamos
como fundamento e parâmetro norteador, as diretrizes esta-
belecidas pela política de formação permanente em saúde do
Ministério da Saúde e as necessidades de formação dos distintos
públicos. Ou seja, a construção dos parâmetros de qualidade que
nortearam a produção dos recursos educacionais em discussão
foi fortemente contextualizada e fundada em documentos que
impactam diretamente na resolução dos problemas de formação
para enfretamento da epidemia em pauta.
A política nacional de formação permanente em saúde foi
instituída pelo Ministério da Saúde em 2004 e revisada no ano
de 2018. Segundo o referido documento (PNEP, 2018b), a política
tem como objetivo orientar a formação profissional considerando
aspectos como: valorização da atenção básica; promover integração
entre instituições de ensino superior, serviços de saúde e comuni-
dade; promover abordagem integral do processo saúde-doença.
Além disso, é sugerida maior utilização das novas tecnologias da
informação e comunicação nos processos de formação em saúde
e forte compromisso com novas demandas de saúde pública.
Quanto à educação permanente em saúde (EPS), o referi-
do documento traz a concepção de aprendizagem no trabalho e
transformação das práticas profissionais. Em distintos momentos,
é citada a importância da reflexão sobre o processo de trabalho,
a análise crítica e a busca de soluções criativas. O documento
ainda destaca a EPS como uma estratégia político-pedagógica,
cujos objetos são os problemas e necessidades do processo de
trabalho em saúde, a fim de produzir mudanças.

84
Capítulo 3

Finalmente, o documento destaca a importância da inova-


ção em saúde, em função do caráter dinâmico e complexo da
área, em especial, destaca as mudanças nas demandas sociais,
demográficas, políticas, culturais, epidemiológicas e tecnológicas.
Ressalta ainda a relevância em se desenvolver uma cultura de
inovação em saúde. Como conceito de inovação, o documento
destaca o que segue na citação.

Compreende-se invocação como a introdução e adoção de


novos processos, produtos, práticas, programas ou políticas
criadas para atender a um problema real que se destina a trazer
benefícios significativos para indivíduos, grupos, sociedades ou
organizações. Envolve um processo interativo entre os diver-
sos e diferentes atores imbricados nele e que é fortemente
influenciado pelo contexto no qual está sendo operado, não
se constituindo, portanto, como linear (BRASIL, 2018c, p. 33).

No que se refere às necessidades educacionais, os


documentos norteadores foram os que seguem: Boletim
Epidemiológico da Sífilis 2018 e 2019, publicados pelo Ministério
da Saúde e o Projeto “Sífilis Não”.
O Boletim Epidemiológico 2018 evidencia a necessidade
de forte atuação educacional junto aos profissionais de saúde;
populações jovens, sobretudo homens; gestantes; gestores da
área da saúde; populações com baixa escolaridade. O Boletim
Epidemiológico de 2019 evidencia a necessidade de ações de
prevenção nas escolas, além de destacar estratégia adotada pela
Assembleia Mundial de Saúde (MAS), 2016-2021, do setor global
de Infecções Sexualmente Transmissíveis/IST, a qual inclui expan-
são de intervenções e serviços baseados em evidencias, a fim de
controlar e reduzir o impacto das IST como problema de saúde
pública até 2030.

85
Capítulo 3

Quanto ao documento Projeto “Sífilis Não” e as ações de


educação estabelecidas no Termo de Execução Descentralizada/
TED 54/2017 Ministério da Saúde, é relevante destacar a dimensão
da educomunicação, na qual é proposto o fortalecimento das ações
de educação e comunicação para diferentes públicos, utilizando a
mediação tecnológica. Além disso, é destacada a importância da
educação continuada dos profissionais de saúde com abordagem
integrada nos eixos da clínica, vigilância, promoção e gestão.

2. Fundamentos dos parâmetros de qualidade


pedagógica, no contexto da formação humana
em saúde, para enfrentamento à sífilis

Este estudo é norteado pelo pressuposto fundamental de


que uma concepção de qualidade pedagógica de recursos educa-
cionais precisa estar fortemente ancorada na relação das pessoas
com os seus contextos vida, bem como na transformação que se
deseja empreender. Será, então, fundamental clarificar o perfil
do público-alvo; as suas necessidades de formação (conceituais;
competências; habilidades); tipo de formação (inicial ou perma-
nente); modalidade de ensino (presencial; a distância; híbrida);
o sentido da mudança que se pretende prosseguir. Não é possí-
vel pensar sobre elementos norteadores da qualidade de uma
proposta educacional que tenham apenas um caráter universal,
uma vez que é o atendimento às necessidades específicas de um
dado contexto de formação que fará, desta proposta, uma ação
educacional efetiva e, portanto, de qualidade.
Assim, nesta etapa, serão apresentadas as bases concei-
tuais e documentais para a construção de parâmetros de quali-
dade pedagógica, que envolverão, essencialmente, aspectos da

86
Capítulo 3

formação de adultos; formação humana utilizando a mediação


tecnológica; conceitos da educomunicação e proposições da polí-
tica de formação permanente do Sistema Único de Saúde (SUS).

2.1. Aspectos pedagógicos e da formação


de adultos com uso da mediação tecnológica:
princípios para a construção de parâmetros
de qualidade pedagógica dos recursos
educacionais para enfrentamento à sífilis

Ao longo das últimas décadas, a Educação de Adultos foi


se consolidando como um domínio epistemológico e um campo
de práticas com especificidade própria, revelando um grande
dinamismo, quer na construção de novos conhecimentos, quer
na contínua inovação de práticas pedagógicas, as quais muito
frequentemente vão influenciando a Educação na sua totalidade.
Jobert (2014) traduz a evolução do pensamento e das atividades
educativas com pessoas adultas, situando-as de forma concomi-
tante à ação humana, uma vez que elas devem partir da realidade
das pessoas e dos seus contextos de vida e se devem destinar a
transformar essa realidade.
Dessa forma, a Educação de Adultos é, predominantemen-
te, uma Educação para o Desenvolvimento, entendido como uma
transformação orientada dos recursos disponíveis, pelas pessoas,
pelo coletivo, por um contexto, ou por uma comunidade. Dito de
uma outra maneira, desenvolver, em termos pessoais, ou sociais,
é fazer da ação passada o recurso para uma ação futura, envol-
vendo as pessoas num processo de eliminação progressiva dos
obstáculos que condicionam o controle racional sobre as suas
vidas e os seus projetos, simultaneamente, desafiantes e realistas,

87
Capítulo 3

que pretendem construir para o seu futuro. Por outro lado, como
nos foi enunciado por autores centrais do pensamento educativo
como, por exemplo, Dewey ou Vigotsky, e tem vindo a ser recor-
rentemente demonstrado, sempre que agimos, transformamos o
(nosso) mundo e transformamo-nos a nós próprios, pelo que, se
a ação resulta da mobilização dinâmica dos recursos disponíveis,
ela gera, simultaneamente, novos recursos para novas ações e
cria condições para a mudança nas nossas caraterísticas pessoais
e na nossa realidade contextual.
São, também, estas convicções que constituem a moldura do
entendimento de aprendizagem que Illeris (2013, p. 16) identifica
como “qualquer processo que, em organismos vivos, leve a uma
mudança permanente em capacidades e que não se deva unica-
mente ao amadurecimento biológico, ou ao envelhecimento, (…)
envolvendo um conjunto muito amplo e complicado de processos e
uma compreensão abrangente” integrando todas as condições que
a influenciam e sejam influenciadas por ela. Por sua vez, a educação
pressupõe uma associação dinâmica dessas mudanças a um conjun-
to coerente de valores, dando um sentido (prévio, ou concomitante)
ao desenvolvimento das aprendizagens. Este conjunto de ideias
foi brilhantemente traduzido por Bhola (1989) quando enunciou
que, como qualquer ação concreta, a Educação de Adultos é uma
mistura incontornável das dimensões ideológica e tecnológica, ou,
dito de outra maneira, de fins e meios.
Então, assumindo estes contornos identitários, a Educação
de Adultos foi construindo a sua especificidade na consideração
predominante das pessoas como atuantes, simultaneamente
cognitivas e afetivas, com projetos e utopias, com responsabili-
dades, obrigações e experiências de vida, que condicionam, ou
potenciam, a sua forma de se relacionarem com os seus contextos

88
Capítulo 3

e o mundo, cuja transformação é essencial para visar as mudanças


desejadas, de maneira mais consistente.
Os modelos teóricos do domínio da Educação de Adultos
foram procurando responder exatamente a este desafio estrutu-
rante. Galbraith (1998) trouxe-nos uma síntese das filosofias em
que podem ser enquadradas todas as práticas educativas conheci-
das, destinadas a pessoas adultas, agregando-as em cinco grandes
grupos, a saber: educação liberal; comportamental; progressista;
humanista e crítica. Se as duas primeiras podem ser associadas
às instituições de educação formal, as três últimas surgiram e
desenvolveram-se no quadro da vitalidade diferenciadora que
a educação de adultos procurou construir, ao longo das últimas
sete décadas (Quadro), com o objetivo de transformar a ação e a
vida das pessoas nestas fases da vida.

89
Capítulo 3

Quadro 1 – Quadro comparativo de Modelos Teóricos de Educação de Adultos.

Objetivos Educador Educando Métodos


As necessidades, inte-
Promover o bem-estar Resolução de problemas;
Organizador; guiar a resses e experiências do
social; aumentar a parti- método científico; currí-
aprendizagem através educando são fundamen-
cipação do indivíduo na culo de atividades; currí-
de experiências educa- tais para a aprendizagem;
Progressista sociedade; dar às pessoas culo integrado; método
tivas; estimula, fomenta as pessoas são portadoras
conhecimentos práti- experimental; método
e avalia o processo de um potencial ilimitado
cos e competências na de projetos; aprendi-
de aprendizagem. que deve ser desenvol-
resolução de problemas. zagem cooperativa.
vido pela educação.
Aprendizagem através
O educando está da experiência; tarefas
Auxiliar; ajudante e
Promover o desenvolvi- motivado e direcionado de grupo; discussões
companheiro; promove
Humanista mento pessoal; promover para objetivos; assu- de grupo; ensino em
a aprendizagem, mas
a autoatualização. me responsabilidade grupo; aprendizagem
não de forma diretiva.
pela aprendizagem. autodirigida; ensino
individualizado.
Está em igualdade com
o professor no proces- Diálogo; formulação
Coordenador; sugere
Fazer da educação um so de aprendizagem; de problemas; refle-
mas não determina a
veículo de mudança autonomia pessoal; as xão crítica; interação
Crítica direção da aprendiza-
social, política e econô- pessoas criam e alteram máxima; grupos de
gem; igualdade entre o
mica na sociedade. a história e a cultura discussão; exposição a
educador e o educando.
através da combinação situações da vida real.
da reflexão com a ação.
Fonte: Adaptado de Galbraith (1998).

90
Capítulo 3

A Educação Progressista (Progressive Education) tem no


pensamento de Jonh Dewey e, em particular, nos seus livros
Democracy and Education e Experience and Education, o essencial
do seu suporte teórico, dando um crédito ilimitado à plasticidade
humana, entendendo-a como a possibilidade de aprender a partir
da experiência e, reconstruindo as bases dessa aprendizagem,
aumentar progressivamente a capacidade de agir e aprender ao
longo de toda a vida. Como estas experiências dependem das opor-
tunidades que os contextos proporcionam e levam à transforma-
ção dos próprios contextos, esta proposta pressupõe a existência e
aperfeiçoamento contínuo de sociedades democráticas, razão pela
qual optamos pela tradução para “Educação Progressista”.
Com base nestas bases teóricas foram elaboradas propos-
tas robustas de modelos explicativos de mudança coletiva (como
o training group, de Kurt Lewin) e individual (como a experiencial
learning, de David Kolb), sendo que este último autor propõe que
o desenvolvimento humano, enquanto transformação orientada,
ocorre por meio de um processo dialético que integra experiência
e conceitos, observações e ação (KOLB, 1984). Argyris e Schön
(1974) acrescentam a necessidade de incluir uma reflexão crítica
estruturada, no momento da elaboração dos conceitos.
A Educação Humanista assenta, entre outras referências, no
pensamento de Carl Rogers e Abraham Maslow e das suas convic-
ções de que a pessoa humana possui uma forte e contínua motiva-
ção para a aprendizagem e a mudança, dependendo das condições,
da satisfação das necessidades e da resolução dos problemas mais
significativos, no cotidiano. Embasado no essencial destas reflexões,
Knowles (1980) propôs-se elaborar uma teoria, que designou de
Andragogia, dando-lhe o sentido de ciência e arte de envolver as
pessoas adultas em processos de mudança pessoal, ajudando-os a
clarificar as suas necessidades, a descobrir e potenciar os motivos

91
Capítulo 3

para aprenderem e a reforçar continuamente a sua capacidade de


autodireção da própria aprendizagem.
Mais recentemente, Tappin (2014) reafirmou as suposições
básicas do modelo andragógico: 1) adultos são autodirigidos; 2)
adultos têm experiência de aprendizagem e conhecimento acumu-
lado; 3) adultos são movidos por objetivos; 4) adultos são movidos
pela relevância; 5) adultos são práticos; 6) adultos precisam ser
respeitados. Partindo destes princípios, foi-se generalizando a ideia
de que as atividades educativas para pessoas adultas se devem
desenvolver ao longo de um processo, no qual o facilitador da
aprendizagem e o sujeito que se envolvem começam por construir
um ambiente de empatia, aceitação, compreensão e ajuda, gerindo
e desenvolvendo, em conjunto, todo o decurso das aquisições e
estendendo essa parceria ao julgamento sobre a adequação das
aprendizagens, à satisfação das necessidades de partida.
Por fim, a Educação Crítica, com reflexões e contribu-
tos que atravessam a obra de pensadores como, por exemplo,
Jürgen Habermas e Paulo Freire, alerta-nos para a necessidade
de promover mudanças sociais e nas estruturas econômicas e
políticas das sociedades, sem as quais as mudanças das pessoas
e dos grupos serão sempre limitadas aos interesses e poderes
existentes. Como as pessoas nem sempre têm consciência dos
condicionalismos que lhes são impostos, a finalidade da educação
deve orientar-se, prioritariamente, para a remoção dos obstáculos
que limitam a compreensão do mundo e gerar as condições para
agir sobre as situações de vida, tornando-as progressivamente
mais humanizadas.
Mais que mutuamente exclusivos, os modelos teóricos
revistos podem ler-se como complementarmente desafian-
tes, ajudando a criar propostas que acolham o essencial destes
contributos: envolver as pessoas num processo circunstanciado

92
Capítulo 3

de autoconhecimento e de conhecimento e explicitação da sua


ação; criar condições para uma reflexão crítica sobre as condi-
ções que permitiram a construção de cada um como pessoa e o
acumular de diferentes experiências de vida; gerar condições para
uma conscientização capaz de nos transformar e transformar as
nossas ações. São, exatamente, propostas educacionais com estas
bases teóricas que devem orientar as nossas atividades educati-
vas, junto destes públicos.
Procuraremos, então, mobilizar parâmetros orientado-
res de recursos educativos que serão construídos com base nos
seguintes aspectos: a) Documentos norteadores da qualidade
de recursos educacionais mediados por tecnologia; b) Política
Nacional de Formação de Educação Permanente em Saúde; c)
Dados do Boletim Epidemiológico do Ministério da Saúde; d) O
Projeto “Sífilis Não” para enfrentamento à sífilis; e) Elementos
conceituais da educomunicação; f) Elementos conceituais das
teorias de Educação de Adultos. Os referidos aspectos foram
elencados por trazerem fundamentos suficientes para forte emba-
samento conceitual e contextual, considerados, neste estudo,
como essenciais para construção de parâmetros de qualidade.

2.2. A dimensão da comunicação na construção


dos parâmetros de qualidade pedagógica
de REA para enfrentamento à sífilis

A dimensão da comunicação aparece fortemente nos


parâmetros de qualidade pedagógica porque o uso das novas
tecnologias da educação e comunicação, na formação humana
em saúde implica em considerar um novo modo de se comunicar.
Ou seja, é necessário pensar mais em um modelo de comunicação

93
Capítulo 3

adequado ao público-alvo e menos na tecnologia em si. Além


disso, no contexto do enfrentamento à sífilis, no Brasil, em que
é imprescindível o uso das tecnologias da informação e comuni-
cação a fim de atingir significativo número de pessoas, os recur-
sos educacionais deverão incorporar fortemente a comunicação
didática, sendo autossuficientes, claros e eficientes. Esta é a razão
da grande relevância da dimensão comunicacional neste estudo
sobre a qualidade pedagógica.
Assim, a fim de pensar a dimensão da comunicação para a
elaboração dos referidos parâmetros de qualidade dos recursos
educacionais voltados ao enfrentamento à sífilis, recorremos ao
conceito de educomunicação. A razão desta escolha está na forte
preocupação, nas discussões da educomunicação, com as novas
tecnologias da informação e comunicação e o papel do educador
como mediador da construção do conhecimento, utilizando as
tecnologias. Neste último caso, conforme mencionado anterior-
mente, a preocupação não se dá propriamente com as tecnolo-
gias, mas com o modelo de comunicação adotado.
A educomunicação é um campo de investigação bastante
recente e que se define, segundo Soares (2002), como um conjun-
to de ações que tem por finalidade integrar, às práticas educati-
vas, o estudo dos sistemas de comunicação, criando ecossistemas
comunicativos nos espaços educativos, melhorando assim, o grau
de expressividade e comunicação das ações educativas. Segundo
Soares (2002), a criação de ecossistemas comunicativos implica em
buscar a dialogicidade, a interação, múltiplas vozes. Nesta perspec-
tiva, as tecnologias de informação e comunicação não são pensadas
como simples instrumental de comunicação, mas como um novo
modelo de comunicação no qual estão implicados aspectos como:
predomínio da linguagem audiovisual; comunicação em rede; dife-
rentes espaços de interação; produção de sentidos; dialogicidade.

94
Capítulo 3

Neste estudo, entendemos a dimensão da educomunica-


ção, com seus elementos constitutivos, não como um modelo a
ser seguido, mas como subsídio reflexivo, ou seja, as reflexões
fundamentais que ocorrem neste campo nos servem de inspira-
ção para a construção de um modelo pedagógico que considere
fortemente os processos comunicacionais como parte constitutiva
da ação educacional e não como um acessório. Em outras palavras,
compreendemos a comunicação como um elemento necessário do
processo cognitivo. Neste sentido nos aproximamos da compreen-
são de (KAPLUN, 1998, p. 234, tradução nossa), quando afirma que
“a construção dos significados, meta de todo aprendizado, deixa
de ser um puro problema de compreensão e passa a ser também,
na mesma medida, um problema de expressão”.
Portanto, entendemos que faz parte da construção do
modelo pedagógico a investigação e inclusão de aspectos comu-
nicacionais como: qualidade do diálogo com o educando; lingua-
gens a serem utilizadas (audiovisual; cinematográfica; narrativas
textuais; jogos; quadrinhos; visuais e gráficos; radiofônica); mode-
lo cognitivo de apresentação do conteúdo; tipo de situação didáti-
co-pedagógica para possibilitar aprendizagem; linguagem textual
utilizada; elementos textuais indicadores de processo reflexivo e
crítico (questionamentos, análises, entre outros).

95
Capítulo 3

3. Os parâmetros de qualidade pedagógica


a partir de uma compreensão da qualidade
fundada no contexto do enfrentamento à sífilis

É importante lembrar que, neste estudo, consideramos


a dimensão das tecnologias da informação e comunicação e da
comunicação em geral como elementos constitutivos e de signi-
ficativa relevância no fazer pedagógico.

3.1. A construção e explicitação dos parâmetros


de qualidade pedagógica

A definição dos parâmetros de qualidade pedagógica dos


recursos educacionais produzidos no enfrentamento à sífilis foi
realizada com base nos conceitos e documentos destacados,
analisados e discutidos neste estudo. Além disso, é de grande
importância ressaltar que os referidos recursos, em sua ínte-
gra, deveriam ser pensados e produzidos considerando a forte e
necessária utilização da mediação tecnológica, a fim de atingir o
maior número possível de cursistas. Desse modo, foram estabe-
lecidos parâmetros de avaliação da qualidade pedagógica, consi-
derando os seguintes aspectos gerais: aspectos da comunicação;
aspectos pedagógicos gerais; aspectos explicativos do conteúdo.
Cada um deles tem seus elementos constituintes, explicitados no
quadro a seguir.

96
Capítulo 3

Quadro 2 – Categorias de avaliação da qualidade pedagógica.

• Linguagens diversificadas e adequadas ao público-alvo (audiovisual; cinematográfica;


narrativas textuais; jogos; quadrinhos; visuais e gráficos; radiofônica).
• Linguagem textual adequada ao público-alvo.
• Linguagem oral adequada ao público-alvo.
• Imagens nítidas e de fácil leitura (elementos gráficos).
• Adequação das mídias e/ou tecnologias da informação e comunicação
Aspectos
(vídeos, rádio, plataformas, aplicativos) ao público-alvo.
Referentes à
• Não utilização de estereótipos e/ou simplificações excessivas no
Comunicação processo de adequação da linguagem ao público-alvo.
• Cuidado na abordagem de temas sensíveis.
• Escolha de linguagens que sejam mais adequadas para minimizar
preconceitos relacionados às IST e sífilis.
• Clareza e objetividade do texto escrito e apresentações orais.
• Apresentação prioritária de elementos visuais necessários ao apoio ao aprendizado.

97
Capítulo 3

• Adequação do conteúdo aos objetivos educacionais estabelecidos.


• Adequação do conteúdo ao público-alvo.
• Deixar claro os objetivos das unidades de aprendizagem.
• Fazer relação entre as unidades de aprendizagem.
• Fazer relação do conteúdo apresentado com a realidade vivenciada do participante.
Aspectos
• Fazer resumos das unidades de aprendizagem.
Pedagógicos
• Texto com forte apresentação dialógica.
Gerais • Conteúdo apresentado de forma reflexiva, questionadora.
• Conteúdo inserido no contexto do aluno (social; profissional).
• Conteúdo direcionado às necessidades do aluno (práticas e de conhecimento).
• Utilização de estratégias de interação com o aluno.
• Realização de atividades de avaliação em diferentes momentos da apresentação do conteúdo.

• Elementos visuais e gráficos contextualizados.


• Uso de imagens, figuras, esquemas, gráficos, infográficos, tabelas para explicitação do conteúdo.
Aspectos • Inserção de exemplos contextualizados na realidade do aluno.
explicativos • Uso de situações-problema na apresentação do conteúdo.
do conteúdo • Esclarecimentos de siglas e termos técnicos.
• Uso adequado de recursos de: Saiba Mais; Box; Atenção; Você sabia?; Para refletir;
Leitura complementar.
Fonte: Elaboração dos autores (2022).

98
Capítulo 3

A partir dos referidos aspectos, os recursos educacionais


foram elaborados, considerando os públicos-alvo preconizados
no Projeto “Sífilis Não”.

3.2. A construção de recursos educacionais abertos


com base nos parâmetros de qualidade elaborados

A construção dos recursos educacionais abertos para o


enfrentamento à sífilis, e com base nos parâmetros de qualida-
de apresentados neste estudo, foi realizada a partir de rigoroso
planejamento entre profissionais de diferentes áreas do conhe-
cimento, tais como saúde, educação, comunicação, tecnologia
da informação e comunicação. Os públicos contemplados, com
base no Projeto “Sífilis Não”, foram: profissionais de saúde; gesto-
res; apoiadores; pessoas com baixa escolaridade e pouco acesso
à internet; professores e profissionais de saúde que atuam na
educação sexual de jovens; pessoas privadas de liberdade; profis-
sionais de saúde que atuam no sistema prisional; policiais penais;
adolescentes e jovens; público em geral.
O fluxo geral de elaboração envolveu as seguintes etapas
gerais: formação de produtores de conteúdo para cursos media-
dos por tecnologia; elaboração do conteúdo; revisão técnico-cien-
tífica; revisão pedagógica; revisão de design instrucional; revisão
de ABNT e língua portuguesa; produção de recursos educacionais;
avaliação em plataforma teste; implementação final no espaço
virtual de destino. Entre cada uma destas etapas, foram realizados
acompanhamentos específicos e avaliações da qualidade (técni-
co-científica; pedagógica; comunicacional; tecnológica). Observe
a seguir a imagem gráfica do processo.

99
Capítulo 3

Figura 1 - Fluxo de elaboração de recursos educacionais mediados por tecnologia.


Fonte: Elaboração dos autores (2022).

No que se refere à avaliação da qualidade pedagógica, foram


estabelecidas três categorias-chave de análise, nas quais foram
observados os parâmetros de qualidade apresentados neste estudo.
A referida avaliação, necessariamente, deve ser feita em conjunto,
considerando o todo das categorias e suas relações. São elas: públi-
co-alvo; desenho pedagógico; comunicação/mídias/TIC. Para isso, foi
desenvolvida uma matriz de recomendações que serve como nortea-
dor na avaliação dos recursos educacionais. Veja no quadro a seguir.

100
Capítulo 3

Quadro 3 – Categorias de Análise dos Recursos Educacionais.


DESENHO PEDAGÓGICO COMUNICAÇÃO/MIDIAS/TIC
CONTEXTOS PÚBLICO- ALVO
RECOMENDADO RECOMENDADAS
Baixíssima esco-
laridade. Podcast.
Precário aces- Audiovisual.
CONTEXTO 1 Alta dialogia
so à internet. Celular.
Baixo nível Rádio.
econômico.

Audiovisual.
Textual com apoio visual (imagens;
Média escolaridade.
figuras; infográficos; quadrinhos).
Regular acesso
Podcast.
CONTEXTO 2 à internet. Média Dialogia
Simulações.
Médio nível
Jogos.
econômico.
Celular.
Plataformas Virtuais.

Texto com apoio visual de imagens,


Alta escolaridade.
gráficos, tabelas, figuras, infográficos.
Bom acesso à
CONTEXTO 3 Dialógico Audiovisual.
internet.
Podcast.
Bom nível econômico.
Plataformas Virtuais.
Fonte: Elaboração dos autores (2022).

101
Capítulo 3

Segundo Arentio (2001) apud Filatro (2015), no diálogo


didático simulado, a comunicação entre os atores do processo
ensino e aprendizagem ocorre por meio do texto, seja ele impres-
so, em narrações apresentadas em vídeos, seja em apresentações
orais em formato de áudio. Isso pode ocorrer de forma síncrona
e assíncrona. Orientações sobre como deverá ser este diálogo
são apresentadas por Borje Holmberg. Segundo Holmberg (1995)
apud Filatro (2015), na conversação didática, deve-se apresentar
o conteúdo em linguagem clara e com densidade de informação
moderada; deve-se destacar aquilo que o aluno precisa estar
atento, o que ele precisa evitar, o que necessita ser feito, além
de destacar as relações com outros tópicos ou situações; é impor-
tante promover trocas de ideias, reflexões e estimular o aluno ao
envolvimento com o tema abordado e suas questões relevantes;
finalmente, reforçar uma simulação de proximidade com o aluno
por meio do uso de pronomes pessoais e possessivos. A partir
destas referências, foi desenvolvido, neste estudo, um quadro
com caracterização dos níveis de dialogia. Veja quadro a seguir.

102
Capítulo 3

Quadro 4 – Caracterização dos níveis de dialogia na produção de recursos educacionais, mediados por tecnologia.
- Linguagem direcionada ao aluno.
- Uso de exemplos dentro da realidade contextual do aluno.
- Uso de situações-problema envolvendo a realidade do aluno.
- Uso de recursos explicativos.
- Uso de recursos visuais adequados ao perfil do aluno (imagens, desenhos, esquemas, infográficos).
Texto Dialógico - Predominância da linguagem textual.
- Uso da linguagem audiovisual.
- Uso da linguagem de áudio.
- Estabelecimento de relações entre tópicos, unidades e aulas.
- Elaboração de sínteses.
- Uso de recursos de atenção, você sabia, saiba mais, destaque em box.
- Linguagem direcionada ao aluno.
- Moderada consideração de características da linguagem própria do perfil do aluno.
- Uso moderado de exemplos dentro da realidade contextual do aluno.
- Uso moderado de situações-problema envolvendo a realidade do aluno.
- Uso moderado de recursos explicativos.
- Uso moderado de recursos visuais adequados ao perfil do aluno
Texto
(imagens, desenhos, esquemas, infográficos).
Dialogia Média - Uso moderado da linguagem audiovisual.
- Uso moderado da linguagem de áudio.
- Estabelecimento de relações entre tópicos, unidades e aulas.
- Elaboração de sínteses.
- Uso de recursos de atenção, você sabia, saiba mais, destaque em box.
- Uso moderado da linguagem textual.
- Linguagem direcionada ao aluno.
- Forte consideração de características da linguagem própria do perfil do aluno.
- Uso constante de exemplos dentro da realidade contextual do aluno.
- Forte uso de situações-problema envolvendo a realidade do aluno.
- Forte uso de recursos explicativos.
Texto
- Forte uso de recursos visuais adequados ao perfil do aluno (imagens, desenhos, esquemas, infográficos).
Dialogia Alta - Forte uso da linguagem audiovisual.
- Forte uso da linguagem de áudio.
- Estabelecimento de relações entre tópicos, unidades e aulas.
- Elaboração de sínteses frequentes.
- Uso de recursos de atenção, você sabia, saiba mais, destaque em box.
Fonte: Elaboração dos autores (2022).

103
Capítulo 3

O Projeto “Sífilis Não” evidencia a necessidade de ações


educacionais para públicos muito diversificados. Esta diversi-
ficação envolve nível educacional, nível econômico, diferentes
níveis de acesso à internet e às novas tecnologias da informação e
comunicação, contexto cultural e social diversificado, faixa etária
diversificada. Estas características, significativamente diferen-
ciadas, reforçam a necessidade de forte inserção da dimensão
comunicacional como parâmetro de qualidade pedagógica. A
investigação sobre a realidade desses públicos-alvo foi realizada
por pesquisadores do Projeto “Sífilis Não”, em seus estudos de
mestrado e doutorado.
Assim, foram produzidos recursos educacionais bastante
específicos, respeitando o referido quadro de recomendações.
São exemplos: cursos autoinstrucionais, inseridos na plataforma
AVASUS; podcasts no formato de programa de rádio; aplicati-
vo web com conteúdo educacional; aplicativo para celular com
conteúdo educacional; webséries educacionais para jovens; cursos
autoinstrucionais em formato de live.
Além da construção ter sido feita com base nos parâmetros
estabelecidos neste estudo, avaliações qualitativas dos cursistas
estão sendo realizadas nos trabalhos de investigação produzidos
por integrantes do Projeto “Sífilis Não”, em seus programas de
mestrado e doutorado como parte de suas dissertações e teses.
Estas avaliações servirão de fundamentação para novas altera-
ções nos parâmetros de qualidade.

104
Capítulo 3

4. Considerações finais

O desafio da formação humana em saúde, no âmbito do


Projeto “Sífilis Não”, evidenciou não apenas a necessidade do uso
da mediação tecnológica, mas também de se pensar a comunica-
ção e, em especial, o diálogo didático, de forma inovadora para
que os diferentes públicos e suas respectivas necessidades de
aprendizagem fossem atendidas.
Este contexto impulsionou o estudo sobre a qualidade na
elaboração de recursos educacionais abertos produzidos e ofer-
tados com uso da mediação tecnológica. Assim, foram definidos
parâmetros de qualidade pedagógica para a construção dos referi-
dos recursos, considerando aspectos contextuais relacionados aos
públicos-alvo envolvidos e às necessidades de formação humana
para o enfrentamento à sífilis. Além disso, a dimensão da comuni-
cação foi considerada elemento de significativa importância, pois
no uso da mediação tecnológica o diálogo pedagógico simulado
assume forte protagonismo no processo de ensino e aprendizagem.
Os resultados deste estudo e da aplicação dos parâmetros
de qualidade na elaboração dos recursos educacionais deram
origem a um conjunto de materiais educacionais bastante inova-
dores que se diferenciam não apenas na linguagem utilizada,
como também nas tecnologias da informação e comunicação
que deram suporte a eles. A avaliação dos recursos educacio-
nais produzidos não foram objeto desta investigação, mas estão
sendo parte dos estudos de participantes do Projeto “Sífilis Não”
que, brevemente, serão publicados e servirão de subsídios para
o aperfeiçoamento dos parâmetros estabelecidos.

105
Capítulo 3

Referências

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109
Capítulo 4
Formação de Gestantes no Pré-natal
para Enfrentamento à Sífilis e Demais IST:
O uso de ferramenta educacional
mediada por tecnologia

Andressa Cristina de Lacerda Oliveira


Lina Morgado
Josiane Araújo da Cunha
Aline de Pinho Dias

1. Cenário da epidemia de sífilis no Brasil

Atualmente, enfrentamos inúmeros problemas de saúde pública


relacionados à má adesão a hábitos saudáveis de vida e medidas
de prevenção à saúde. As Infecções Sexualmente Transmissíveis
(IST) consistem em uma dessas problemáticas de saúde pública,
as quais são responsáveis pela ocorrência de mais de um milhão
de casos por dia, conforme estimativa da Organização Mundial da
Saúde (WHO, 2019). A sífilis, especificamente, afeta um milhão de
gestantes por ano, em todo o mundo, levando a mais de 300 mil
mortes fetais e neonatais e colocando em risco de morte prema-
tura mais de 200 mil crianças. No Brasil, entre 2012 e 2017, foi
observado um aumento constante no número de casos de sífilis
em gestantes, congênita e adquirida (BRASIL, 2020).
Capítulo 4

De 2010 para 2018, a taxa de detecção de sífilis adquirida


foi de 2,1 para 76,2 casos por 100.000 habitantes e a de sífilis em
gestante foi de 3,5 para 21,5 casos por 1.000 nascidos vivos. Nesse
mesmo período, a taxa de incidência de sífilis congênita cresceu
de 2,4 para 9 para cada 1.000 nascidos vivos (BRASIL, 2020). Em
2020, conforme dados do Boletim Epidemiológico da Secretaria de
Vigilância em Saúde do Ministério da Saúde, foram notificados no
Sistema Nacional de Agravos Notificáveis (SINAN): 115.371 casos
de sífilis adquirida; 61.441 casos de sífilis em gestantes; 22.065
casos de sífilis congênita (BRASIL, 2021).
Mediante o cenário da epidemia de sífilis que atinge o
Brasil, o Tribunal de Contas da União (TCU), juntamente com
o Ministério da Saúde, lançou, em 2017, a Estratégia Nacional
“Resposta Rápida à Sífilis nas Redes de Atenção”, a qual promove
ações de cooperação para fortalecimento do processo de planeja-
mento de ações em torno do enfrentamento à sífilis nos espaços
locorregionais. Nesse contexto, o Ministério da Saúde convidou
os gestores municipais e estaduais a aderirem à estratégia nacio-
nal de cooperação técnica que envolve as Secretarias Estaduais
e Municipais de Saúde, a Secretaria de Educação a Distância e
o Núcleo de Estudos em Saúde Coletiva da Universidade Federal
do Rio Grande do Norte (SEDIS e NESC-UFRN) e a Organização
Pan-americana da Saúde (OPAS), com objetivos de promover
ações conjuntas, integradas e colaborativas entre as áreas de
vigilância e atenção em saúde no território (LUCAS et al., 2019).
Dentre as ações recomendadas no âmbito da referida estraté-
gia, estão: Gestão e Governança, que prevê a inclusão de ações nos
planos de gestão dos municípios; o Cuidado Integral, o qual propõe
garantir a prevenção e tratamento desde a atenção básica até os
níveis especializados; a Vigilância, a qual tem o objetivo de condicio-
nar as ações anteriores, evitando o retrocesso; e a Educomunicação,

111
Capítulo 4

reforçando a divulgação da doença, a fim de aumentar o conheci-


mento da população sobre o tema (BRASIL, 2017).

2. A Educomunicação e utilização
das Novas Tecnologias da Informação
e Comunicação (NTICs) para o enfrentamento
à epidemia de sífilis

A Educomunicação é a sobreposição da educação e comu-


nicação, a qual se preocupa com o potencial educativo da comuni-
cação midiática, que mesmo em circunstâncias que não tenham a
intenção de educar, fornece informações determinantes para que
as pessoas construam sua visão de mundo. Em Educomunicação,
atua-se com intervenções para a consciência e a participação
crítica dos sujeitos, fomento do diálogo e empoderamento dos
indivíduos (ALMEIDA, 2016).
De maneira semelhante, destaca-se o conceito de Educação
em Saúde que, por sua vez, é uma prática social, cujo processo
contribui para a formação da consciência crítica das pessoas a
respeito de seus problemas de saúde, a partir da sua realidade, ao
estimular a busca de soluções e organização para a ação individual
e coletiva (BRASIL, 2007).
De acordo com o Ministério da Saúde (2012), a Educação
em Saúde consiste na construção de conhecimentos em saúde,
a partir do conjunto de práticas do setor que contribuem para
aumentar a autonomia das pessoas no seu cuidado e no debate
com os profissionais e os gestores, a fim de alcançar uma atenção
de saúde de acordo com suas necessidades.
A Educação em Saúde é entendida como uma importante
vertente direcionada à prevenção e preocupada com a melhoria

112
Capítulo 4

das condições de vida e de saúde das populações. Geralmente,


esse processo ocorre por meio de aconselhamentos interpessoais
ou impessoais. Os primeiros são realizados em consultórios, esco-
las, entre outros, de forma mais direta e próxima do indivíduo.
Já os aconselhamentos impessoais são aqueles que ocorrem por
meio da mídia, com o objetivo de atingir um maior número de
pessoas (OLIVEIRA; GONÇALVES, 2004).
No cenário globalizado no qual vivemos, as novas tecno-
logias de informação e comunicação dão oportunidade a uma
verdadeira revolução nos processos da educação e, consequente-
mente, da educação em saúde, desde os níveis fundamentais até
o universitário, afetando os conceitos e processos de construção
de conhecimento e as metodologias de ensino-aprendizagem
(SCHALL; MODENA, 2005).
Nesse aspecto, é incontestável que a internet se tornou
algo presente no convívio social e as facilidades das ferramen-
tas da Web modificaram diversos contextos, seja nos ambientes
sociocultural, político, econômico, educacional e, inclusive, no
contexto da saúde. Hoje em dia, dispõe-se de serviços médicos e/
ou de Saúde Pública, que servem de apoio tecnológico aos dispo-
sitivos móveis, como telefones celulares, sensores, além de outros
equipamentos vestíveis (dispositivos diretamente conectados ao
usuário) (WHO, 2011).
Entre as potenciais formas de aplicações da tecnologia
dos dispositivos móveis, destacam-se: uso de suporte telefônico
para cuidado em saúde; serviços telefônicos gratuitos de emer-
gência; acompanhamento da adesão ao tratamento; lembretes
de compromissos; ações de promoção à saúde e mobilização
comunitária; campanhas de educação em saúde; vigilância e
monitoramento epidemiológico; monitoramento de pacientes;
disseminação de informações; desenvolvimento de sistemas de

113
Capítulo 4

apoio à tomada de decisão; novas formas de armazenamento de


dados clínicos (WHO, 2011).
A oferta desses serviços que utilizam informações e tecno-
logias de comunicação, no intuito de prestar cuidados de saúde
e melhorar os serviços de saúde é denominada saúde eletrôni-
ca (e-Health) (EYSENBACH, 2001). Dentro da mesma perspectiva
do e-Health, o mobile Health (m-Health) permite a realização de
suporte remoto a pacientes, por meio do uso de celulares, apare-
lhos de monitoramento, assistentes pessoais digitais (PDAs), e
outros aparelhos sem fio”, possibilitando a execução de práticas
médicas e de saúde pública, auxiliadas pelos aparatos portáteis
ou autopromoção (HANDEL, 2011). A saúde móvel cria condições
para a avaliação contínua de parâmetros de saúde, configura um
novo cenário de incentivo a comportamentos saudáveis e auxilia
a autogestão de condições crônicas, entre outras vertentes de
aplicação (ROCHA et al., 2017). A relevância da prática da e-Saúde
acabou por conduzir a Organização Mundial da Saúde (OMS) a
criar um Observatório Mundial de Saúde Eletrônica e propor a sua
expansão ao nível de estratégia de ação (WHO, 2014).
O termo e-saúde (e-Health), também conhecido como
saúde digital, engloba diversos campos, nomeadamente: Registro
eletrônico de saúde, Teleassistência, m-Health e Telessaúde.
O Registro eletrônico de saúde refere-se aos registros dos
exames, consultas, diagnósticos, marcação de consultas, entre
outros relativos ao doente, disponibilizando essa mesma informa-
ção a todas as instituições que constem da rede de informação de
saúde; a Teleassistência (telecare), por sua vez, consiste em toda a
atuação de profissionais de saúde e apoio social baseados em dados
de telemonitorização e dos sinais clínicos do doente, apoiando-se,
nos equipamentos de monitorização a distância; o m-Health diz
respeito à utilização de dispositivos móveis para os cuidados de

114
Capítulo 4

saúde, geralmente monitorização e vigilância de certos parâme-


tros do paciente para registo por meio de relógios digitais, PDAs,
smartphones e apps, entre outros. Por fim, o termo Telessaúde
refere-se à toda e qualquer atividade que diz respeito aos cuida-
dos, envolvendo a saúde e que utilize os sistemas de informação,
telecomunicação e tecnologia para a sua disseminação.
A Telessaúde, por sua vez, subdivide-se em: (a) telemedici-
na que consiste na prestação de cuidados médicos individuais a
pacientes, de carácter mais concreto, utilizando tecnologia que
permite a interação a distância entre médicos e enfermeiros rela-
tivamente a procedimentos associados aos cuidados do doente e
ao diagnóstico e (b) tele-educação em saúde para profissionais ou
para a população em geral, podendo ser síncrona (em formato de
teleconferências, por exemplo) ou assíncrona (pela disponibiliza-
ção de materiais digitais de conteúdo informativo e pedagógico
como folhetos, vídeos explicativos, etc.) (MAIA, 2020).
As tecnologias móveis evoluem constantemente, abarcan-
do uma grande diversidade de suportes, entre eles, smartpho-
nes, tablets, leitores de livros digitais (e-readers), aparelhos portáteis
de áudio e consoles manuais de videogames, os quais permitem a
utilização de uma gama de aplicativos (apps) dos mais variados tipos,
desde aqueles que têm a finalidade de entretenimento, até aos desti-
nados à organização de finanças, negócios, utilização de meios de
transporte, saúde, bem-estar. No contexto educacional, os aplica-
tivos inovam o esquema ensino-aprendizagem e são amplamente
discutidos por pesquisadores na área da educação, já que têm por
objetivo modernizar, dinamizar, ampliar e enriquecer suas experiên-
cias pedagógicas (OLIVEIRA; ALENCAR, 2017).

115
Capítulo 4

3. Os potenciais das aplicações


para a Educação em Saúde

Os aplicativos (apps) são softwares para dispositivos móveis


que capturaram, armazenaram, recuperaram, analisaram, recebe-
ram e compartilham informações. Por serem tecnologias desenvol-
vidas para uso em aparelhos móveis, possibilitam a personalização,
ou seja, o usuário pode customizá-los, de acordo com suas prefe-
rências e particularidades (OLIVEIRA; ALENCAR, 2017). Existem no
mercado variados tipos, desde os que possuem a função de entrete-
nimento até aqueles que buscam orientar pacientes e profissionais
quanto ao cuidado e manutenção da saúde (ROCHA et al., 2017).
Nessa perspectiva, considerando as possibilidades que as tecnolo-
gias móveis de saúde proporcionam para disseminação de informa-
ção em saúde à população, os aplicativos de saúde para dispositivos
móveis potencializam e agilizam a comunicação aos usuários dos
serviços de saúde, encurtando distâncias e levando informações
mais seguras, favorecendo, significativamente, a qualidade do
autocuidado, empoderamento e acompanhamento criterioso dos
processos de saúde-doença. Diante disso, percebe-se um maior
envolvimento e participação dos indivíduos, o que oportuniza a
autonomia dos sujeitos (CHAVES et al., 2018).
Tais ecossistemas digitais de aprendizagem contribuem
para o empoderamento do usuário, incentivando-o a agir como
protagonista de sua saúde, de forma consciente e sensibilizada,
no que diz respeito à adoção de medidas de prevenção, com
vistas à incorporação de hábitos saudáveis de saúde (COSTA et
al., 2014). Nesse sentido, as tecnologias e suas aplicações favore-
cem a autoaprendizagem, as relações sociais, o compartilhamento
de experiências e a aprendizagem colaborativa, proporcionan-
do o acesso ao conhecimento, em qualquer lugar e a qualquer

116
Capítulo 4

momento (COSTA et al., 2014). Além disso, potencializa a comuni-


cação interativa e dinâmica (LUCENA; PEREIRA; OLIVEIRA, 2016).
Sendo assim, aplicativos para celulares, tablets e compu-
tadores são boas estratégias pedagógicas transformadoras
condizentes com a contemporaneidade e ajudam a desenvolver
a autonomia dos envolvidos no processo de aprendizagem. Ao
usar aplicativos, os aprendentes são totalmente ativos, passando
de consumidores a produtores de conteúdo, dotados de maior
liberdade criativa. Usar aplicativos “na” e “para” a educação é
importante para o incentivo ao estudo, à leitura e à escrita e à
pesquisa, em ambientes on-line (COUTO; PORTO; SANTOS, 2016).
As funcionalidades de interatividade, encontradas em alguns
aplicativos, para troca de informações entre os usuários e com
profissionais de saúde, proporcionam maior adesão ao tratamen-
to, geram melhoria da segurança do paciente e estreitam laços
(RODRIGUES; TELES, 2019). Tais evidências reforçam os potenciais
efeitos da interatividade, por meio de funcionalidades como chats,
sala de conversa, fóruns, os quais possibilitam a formação de comu-
nidades, nas quais os usuários possam se sentir à vontade para
compartilhar dúvidas, produzir e trocar informações e experiências.
Os recursos utilizados nas ferramentas tecnológicas para
fins de ensino-aprendizagem, como por exemplo os recursos
audiovisuais, de vídeos, imagens, animações, possibilitam uma
aprendizagem significativa, pois ancoram o aprendizado em dife-
rentes pontes, além de gerarem maior interesse, motivação e um
maior dinamismo (SILVA et al., 2019).
Outras funcionalidades relevantes para aplicações
educacionais em saúde são aqueles referentes à testagem dos
conhecimentos assimilados e à utilização de recursos de gamifi-
cação (jogos), a qual gera uma oportunidade descontraída de se

117
Capítulo 4

construir representações resultantes do processo de aprendiza-


gem e, portanto, consolidando-o.
Algumas pesquisas na área de jogos digitais e eletrônicos
articulam a relação dessas novas mídias com os espaços de apren-
dizagens, sinalizando possibilidades eficazes para essa parceria
entre o lúdico que se aproxima do universo semiótico do apren-
dente e o seu processo de aprendizagem (ALVES, 2008).

4. Aplicações voltadas para educação


em saúde e suas contribuições

A educação para a saúde, por meio da utilização de aplicati-


vos em dispositivos móveis, revela-se como um processo pedagó-
gico que tem permitido maior acesso da população a informações,
de maneira rápida, muitas vezes gratuita, sobre estilo e qualidade
de vida, hábitos saudáveis, entre outros (ROCHA et al., 2017). Um
exemplo de iniciativas relacionadas à educação em saúde apoiada
no m-Health é o aplicativo Emagreça@Saudável, o qual consiste
em um sistema de apoio à educação em saúde que visa a melhoria
da qualidade de vida do seu usuário, por meio da conscientização
de hábitos saudáveis, por meio do qual são apresentadas questões
pertinentes à sobrepeso e obesidade (BARBOSA et al., 2018).
Outra iniciativa de uso de aplicativos voltados para a
educação e promoção à saúde é o aplicativo “Aedes Zero”, o qual
cumpre sua função ao promover, de forma simples, dinâmica e
acessível, as informações sobre prevenção e controle das arbovi-
roses. Esse aplicativo, criado por equipe de discentes, docentes e
técnicos em educação da Universidade Federal do Espírito Santo,
permitiu o desenvolvimento da consciência crítica para a aquisi-
ção de hábitos de vida saudáveis, tornando as pessoas agentes

118
Capítulo 4

de multiplicação de informações contidas na ferramenta (PRIMO;


MIRANDA SANT’ANNA, 2017).
Aplicativos direcionados à educação em saúde da popu-
lação vêm sendo desenvolvidos em diversas áreas. Em relação
à temática de gravidez, parto e puerpério, nela compreendida
a maternidade e paternidade, vários aplicativos estão disponí-
veis para proporcionar informações e orientações, por meio de
dicas, ou vídeos sobre os mais diversos temas, auxiliando os pais
e deixando-os mais preparados e confiantes a enfrentar novos
desafios (CHAVES et al., 2018).
Na mesma perspectiva, o estudo realizado para avaliar o
protótipo do aplicativo GestPro, com orientações para as gestan-
tes sobre as alterações fisiológicas e os cuidados no período gesta-
cional, evidenciou a importância do aplicativo no papel educativo
de incentivo ao autocuidado, por induzir a procura da assistência
pré-natal (CAVALCANTE, 2018).
Outrossim, pesquisa realizada por Gomes et al. (2019), a
qual avaliou os aplicativos móveis disponíveis sobre pré-eclâmp-
sia, nos principais sistemas operacionais para a promoção da
saúde de gestantes, verificou que esses aplicativos podem escla-
recer eventuais dúvidas que as gestantes possam ter acerca dos
fatores de risco, sendo capazes de reconhecer seus sintomas,
mantendo-as atentas a procurar a assistência em saúde, contri-
buindo para a detecção precoce e gerenciamento clínico mais
bem-sucedido da doença.
Outra pesquisa, voltada para o público-alvo de gestantes,
analisou a utilização de um aplicativo móvel intitulado “Gestação
Saudável”, para smartphone, como ferramenta na adesão às
consultas de pré-natal. Na referida pesquisa, observou-se que
as grávidas mais atuantes nas consultas de pré-natal correspon-
diam àquelas que fizeram uso da ferramenta tecnológica, fato que

119
Capítulo 4

comprova a eficácia do aplicativo. O aplicativo impactou direta-


mente no processo de empoderamento das gestantes, tendo em
vista tratar-se de uma tecnologia dinâmica, capaz de impulsionar
o diálogo entre os profissionais e pacientes (SOUZA, 2019).
Pode-se destacar, nesse cenário de enfrentamento às IST,
a pesquisa realizada por Sales e seus colaboradores (2019), os
quais desenvolveram e avaliaram o aplicativo denominado SELP,
responsável por oferecer informações de saúde ao usuário sobre
a sífilis, como sintomas, causas, riscos e tratamento, em texto e
vídeo. Além disso, oferece mapas de direcionamento aos locais de
postos de saúde do município. Dessa forma, a ferramenta auxilia
os profissionais da saúde na convocação e tratamento das gestan-
tes e dos seus parceiros com sífilis, funcionando também como
uma estratégia de promoção à saúde sexual da população.
Nesse contexto, Oliveira e seus colaboradores (2021) elabo-
raram o protótipo de um aplicativo Web, denominado Conversa
de Mãe. Este consiste em uma ferramenta de educação em saúde
mediada por tecnologia para gestantes, no intuito de auxiliá-las
na aquisição de informações referentes aos mais diversos temas
relacionados aos cuidados durante a gravidez como, por exem-
plo, dicas e recomendações sobre alimentação, atividade física,
vacinação, amamentação, pré-natal, parto, e enfrentamento à
sífilis. O aplicativo esclarece informações sobre sinais e sintomas,
prevenção, diagnóstico e tratamento da IST, abordando os assun-
tos de forma dialógica e interativa.
Com suas funcionalidades, o protótipo do referido aplicati-
vo Web desenvolvido se configura como uma potencial fonte de
informações para adoção de medidas preventivas de saúde pelos
usuários, possibilitando a aquisição de conhecimento e inúmeras
habilidades pelo usuário dentro do seu processo de aprendizagem
em saúde, por meio dos recursos disponíveis, buscando contribuir

120
Capítulo 4

para a melhoria dos indicadores e redução dos casos de sífilis em


gestante e de sífilis congênita, a partir de ações de educação em
saúde a distância, durante o pré-natal (OLIVEIRA, 2021).

5. Considerações finais

Mediante a abordagem realizada até aqui, verifica-se que,


quanto às práticas de saúde na prevenção das infecções sexual-
mente transmissíveis, faz-se necessário que as ações assistenciais
sejam realizadas em conjunto com práticas educativas em saúde
eficientes e capazes de sensibilizar a população, no intuito de evitar
comportamentos de riscos, considerando o sujeito e o contexto
biopsicossocial na construção de estratégias de autocuidado,
práticas sexuais seguras e corresponsabilidade (PINTO et al., 2021).
Diante das tecnologias de educação para promoção da
saúde, o meio digital, como uma importante ferramenta de acesso
à internet, amplia a disseminação do conhecimento, e possibilita
por meio de blogs, chats, grupos de conversas, a divulgação de
ações de empoderamento nas relações sexuais e o esclarecimento
de dúvidas frente ao assunto, promovendo redução da fragilidade
para as IST (XAVIER; SANTOS, 2020).
Como vem sendo exposto, a utilização de tecnologias
educacionais voltadas para o cuidado e promoção à saúde geram
diversas possibilidades que podem ser úteis nos campos de educa-
ção e informação em saúde. Nessa perspectiva, é possível verificar
que as Tecnologias da Comunicação e Informação (TIC) aumentam
o potencial de acesso à informação e fornecem alternativas de
educação em saúde, enriquecendo, portanto, o arsenal de estra-
tégias de Educomunicação para o enfrentamento da epidemia
de sífilis no país.

121
Capítulo 4

Dessa forma, os profissionais devem desenvolver a promo-


ção e prevenção da saúde sexual, a partir de estratégias de
educação em saúde com vistas à sensibilização dos usuários, com
relação às práticas sexuais de risco e multiplicidade de parceiros,
por meio do uso da internet como veículo de disseminação do
conhecimento, destacando-se as mídias virtuais, utilizadas pela
maioria da população (CRESPO et al., 2019).
Apesar da relevância e da popularização das mídias virtuais,
em especial dos aplicativos, no âmbito da prevenção, as pesquisas
nesse meio ainda são incipientes. Ressalta-se a importância do
uso de Tecnologias de Informação e Comunicação nas ações do
profissional de saúde, com vistas a auxiliar e facilitar o processo
ações de prevenção de doenças e agravos, que exercem impacto
direto sobre a saúde e qualidade de vida do paciente, bem como
na realidade geral de saúde pública da população.

122
Capítulo 4

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130
Capítulo 5
A População Jovem e as Infecções
Sexualmente Transmissíveis1
O papel da educação na transformação
do comportamento juvenil frente à sífilis

Cristina Pereira Vieira


Doutora em Sociologia. Docente na UAb (Universidade
Aberta, em Portugal), em diferentes graus acadêmicos
em que tem implementado novas áreas de aprendizagem
e novas UCs a partir das áreas da Sexualidade, Jovens e
Gênero – desenvolvendo temáticas que nunca tinham sido
abordadas. É investigadora no CIEG (Centro Interdisciplinar
de Estudos de Gênero) e do CEMRI (Centro de Estudos e de
Migrações Interculturais). Contato: [email protected].

Eloiza da Silva Gomes de Oliveira


Doutora em Educação, é professora Titular da
Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), atu-
ando na Graduação e no Programa de Pós-graduação
em Políticas Públicas e Formação Humana (PPFH), onde
lidera o Grupo de Pesquisa “Aprendizagem, subjetivação
e cidadania”. Coordena o Laboratório de Estudos da
Aprendizagem Humana (LEAH). Pesquisadora associada

1 A primeira versão deste artigo foi publicada no XIII CONGRESSO DA


SOCIEDADE BRASILEIRA DE DST; IX CONGRESSO BRASILEIRO DE AIDS;
IV CONGRESSO LATINO-AMERICANO DE IST/HIV/AIDS; Sessão Especial:
“Sífilis Não”.
Capítulo 5

ao Laboratório de Inovação Tecnológica em Saúde (LAIS),


da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (LAIS/
UFRN). Contato: [email protected].

Maria Valéria Pareja Credidio Freire Alves


Doutoranda no programa de Sustentabilidade Social
e Desenvolvimento na UAb – Universidade Aberta,
em Portugal - é pesquisadora do Laboratório de
Inovação Tecnológica em Saúde (LAIS/UFRN), desen-
volvendo atividades nas áreas de comunicação e
educomunicação. É jornalista e pedagoga, com especia-
lização em docência do ensino superior e mestrado em
Administração. Contato: [email protected].

1. Introdução aos conceitos


de juventude e sexualidade

Quando pensamos na ideia de jovens e de Infeções Sexualmente


Transmissíveis (IST), somos imediatamente remetidos para a
complexidade associada aos conceitos jovens e sexualidade.
Isto porque qualquer um destes dois conceitos não poderá ser
pensado de forma singular e como uma unidade. Nomeadamente,
porque estes conceitos não poderão ser circunscritos com catego-
rizações homogêneas e uniformes, ocultando, na sua essência, as
construções sociais a que são sujeitos. A partir deste pressuposto,
percebemos que as concepções de juventudes e sexualidades,
aqui já pensadas num sentido plural, são produções e objetos de
manipulação, o que as tornam, na sua gênese, subjetivas, estru-
turadas e estruturantes, a partir de um conjunto de valores e de
práticas distintas, situadas em cada momento da história e nas
sociedades, que partilham o mesmo tempo da história.

132
Capítulo 5

1.1. Juventude

Designadamente, quando pensamos no conceito de juven-


tude, podemos garantidamente afirmar que a noção de juventu-
de, tal como se concebe atualmente, na dupla vertente, pensada
como fase da vida e categoria social e cultural, é um produto da
modernidade. Isto porque na sociedade pré-industrial não havia
tempo, nem espaço exclusivo para esta concepção de juventude,
uma vez que ela surgia integrada no mundo dos adultos e nas
suas atividades – a saída da infância era diretamente feita para a
entrada na idade adulta (CICCHELLI, 2001a, 2001b; CUNHA, 2007).
Assim sendo, o que está em pauta é em que medida pode-
mos pensar na noção de juventude como categoria sociológica
(GALLAND, 1991; PAIS, 1993; BOURDIEU, 2002). Associada à lógi-
ca de juventude, assente em demarcações etárias, emerge um
conjunto de práticas que uniformiza discursos e entendimentos
(frequentemente reforçados por uma lógica de intervenção admi-
nistrativa). Neste sentido, são conferidas à noção de juventude
características homogêneas, nomeadamente, uma unidade de
interesses e de problemáticas comuns, com origem em critérios
juridicamente constituídos que determinam a participação em
diferentes sistemas (escolar, médico, proteção social, mercado
de trabalho, etc.).
A partir deste pressuposto e, particularmente, a partir do
critério idade, em que medida podemos pensar nos e nas jovens
enquanto grupo social dotado de uma unidade de representa-
ções e de atitudes? Em resposta a esta questão, sugerimos que se
considere que a noção de idade, baseada em critérios de medida
abstrata, também é construída com base em necessidades admi-
nistrativas, que estabelecem princípios artificiais, arbitrários, rela-
tivos e, por isso mesmo, lhe conferem um sentido não universal e

133
Capítulo 5

heterogêneo (LENOIR, 1998). O que faz com que se possa perce-


ber que associada à noção de idade cronológica e das suas dife-
rentes divisões estão concepções sociais. Nomeadamente, porque
de acordo com a época, os costumes, as instituições e até com a
distribuição da população, as diferentes faixas etárias assumem
mais ou menos importância, dando origem a entendimentos e
respostas também diferenciadas (HALBWACHS, 1972).
Na atualidade, quando refletimos sobre os critérios que
balizam os limites de juventude, entre as fronteiras da infância/
imaturidade e idade adulta/maturidade, percebemos que eles
dependem menos de marcos cronológicos ou biológicos e mais,
muito mais, da produção social que lhes conferem sentidos. Neste
contexto, as categorias nominais atribuídas às diferentes faixas
etárias (para além de adolescentes e jovens se incluem também
infância, adultos, idosos, velhos, terceira ou até quarta idade) não
estão dissociadas de uma manipulação, mais ou menos dissimu-
lada (BOURDIEU, 2002). É nessa manipulação que se redefinem a
importância e os poderes atribuídos aos diversos momentos de
cada ciclo de vida.
Na construção das teias sociais, criam-se relações de força,
em que cada um reclama o seu lugar na estrutura social. Estas
relações, aparentemente objetivas, são determinadas por um
conjunto de significados pré-construídos e de relações de poder
que dominam o sistema de entendimento das estruturas sociais
e das estruturas mentais (BOURDIEU, 1979).
De acordo com esta ordem de ideias e em relação à cate-
goria juventude, percebemos que, por exemplo, na atualidade, a
economia de mercado dirige-se a um grupo de pessoas com intui-
to de dinamizar o mundo de negócios (condição não exigida outro-
ra) e que considera associada à categoria de jovem. Neste sentido,
é frequente encontrar como requisito da oferta de trabalho o

134
Capítulo 5

termo jovem, com um limite de idade não superior entre trinta e


cinco a quarenta anos de idade, dando a entender que a partir daí
a pessoa é percebida como “velha” e não adequada para a função.
Ou seja, a partir deste exemplo, percebemos como é possível
afirmar que a idade enquanto dado cronológico, aparentemente
objetivo e contínuo, encontra-se claramente submetida a lógicas
e variações sociais descontínuas, já que o conceito jovem aparece
associado a idades de fronteira entre os trinta e quarenta anos
de idade. No caso concreto, essa lógica aparece associada a uma
economia que valoriza as pessoas mais novas para a promoção
do mercado de trabalho. Assim sendo, e em reforço, podemos
concluir que a idade é um dado biológico socialmente manipulado
e manipulável (BOURDIEU, 1980, 2002; CRUZ, 1984).
Dessa maneira, o entendimento sociológico de juventude
passa por abolir o mito de uma categoria única, com condutas
homogêneas, centradas em dados indiscutíveis que refletem repre-
sentações, ou seja, por suprimir um conjunto de doxas dominantes
(PAIS, 1990, 1993). Pais (1993) discute esta questão em Culturas
Juvenis, partindo da crença dominante de juventude, pensada
enquanto problema social, traduzido em problemas específicos
dos jovens, referindo-se, entre outros, aos problemas de inserção
profissional; aos problemas de falta de participação; aos problemas
com as drogas; aos problemas de delinquência; aos problemas na
escola e aos problemas com pais e mães. Nessa investigação, sobre
práticas culturais no domínio do lazer, o autor verifica que existe
uma diversidade de circunstâncias sociais que torna a aparente
unidade de juventude numa clara condição heterogênea. Ou seja,
Pais (1993) vem defender que há uma pluralidade e diversidade de
situações, ancoradas a normas próprias, que resulta em diversas
práticas cotidianas e que, por isso mesmo, a noção de juventude
não deve ser pensada como um todo homogêneo e coeso.

135
Capítulo 5

Assim, a sociologia da juventude, oriunda das correntes


“geracional” e “classista”, tem vindo a combater todo o tipo de
crenças e representações sociais fundamentadas em interpre-
tações coletivas. Neste sentido, a sociologia defende a ideia de
que a noção de juventude deve ser entendida como um conjunto
social diversificado, subjacente a um entendimento de cultura
juvenil no plural, que pouco têm em comum, quando pertence,
por exemplo, a grupos sociais, ideológicos e profissionais dife-
rentes (PAIS, 1990).
De acordo com esta ordem de ideias, o conceito de juven-
tude não pode então ser entendido como um fato social imedia-
tamente inteligível, dado que ele está inscrito numa determinada
realidade cultural, com valores e costumes simbólicos próprios
(LEVI; SCHMITT, 1996a, 1996b). E ainda que as sociedades “cons-
truam” uma ideia de juventude como um fato demográfico ou
legal fixo e imediatamente observável, ela deve ser pensada,
antes, como um fato social instável, como uma realidade cultural
carregada de valores e usos simbólicos (LEVI; SCHMITT, 1996a).

1.2. Sexualidade

Da mesma forma quando refletirmos sobre a sexualida-


de, e neste capítulo particularmente sobre a sexualidade dos e
das jovens, o pressuposto sobre este conceito deverá igualmen-
te assentar na ideia de construção social. O que implica, desde
logo, distinguir alguns dos entendimentos a que este conceito
está associado.
Designadamente, quando pensamos em sexualidade, é
frequente se associar diretamente à ideia de “sexo” – termo que
por si só assume uma diversidade de sentidos. Na linguagem do
senso comum, a ideia de “sexo” surge frequentemente aplicada

136
Capítulo 5

à expressão “fazer sexo” ou “ter sexo”, expressão relativa ao


ato sexual, enquanto coito (CAPLAN, 1996). Na generalidade, o
sentido que lhe é atribuído consiste num conjunto de categorias
orgânicas e/ou comportamentais relativas à satisfação sexual.
Subjacente a esta concepção, está a naturalização das relações
heterossexuais (coitais) no sentido da legitimidade da vivên-
cia, enquanto componente essencial do sistema normativo, o
mesmo será dizer a legitimidade da heteronormatividade (BAJOS;
FERRAND; ANDRO, 2008).
A palavra “sexo” surge, igualmente associada à categoriza-
ção feminino/masculino, a partir da distinção dos órgãos sexuais
externos, das potencialidades de reprodução e das caracterís-
ticas físicas e psicológicas. Também este entendimento assenta
sobretudo numa ideia de sexo com base em princípios biológicos.
Nesta concepção, o sexo aparece como a identidade biológica de
indivíduo, o que pressupõe um padrão de expectativas de gênero
(ANDERSEN, 1983). Estas explicações biológicas dos padrões de
gênero estão profundamente centradas, incorporadas e repre-
sentadas nas mentalidades das pessoas, construídas a partir de
diferentes relações de poder e inscritas no cotidiano, de onde
resultam os papéis sexuais. Contudo, quando relativizarmos a
perspetiva universal dos papéis sexuais, percebemos que exis-
te uma mobilidade de comportamentos padronizados para cada
sexo, conforme a história nos tem mostrado.
Na sociedade contemporânea, destacamos, no séc. XX, as
décadas de sessenta e setenta, como períodos de ruptura das
certezas da tradição sexual, quer com emergência dos movimen-
tos feministas porem em causa a violência masculina de subordi-
nação e com as mulheres a reivindicarem o direito ao prazer, quer
com a revolução introduzida com adoção da pílula e a consequen-
te liberalização sexual, dando origem a significativas alterações

137
Capítulo 5

na intimidade e na sexualidade individual e social. Nesse contex-


to, evidenciamos a afirmação dos jovens, com a participação em
movimento de contestação, criticando os valores morais domi-
nantes, os estilos educacionais tradicionais, as relações amorosas
e a sexualidade (VILAR, 2002).
Assim, gradualmente, a sexualidade vai sendo entendida
pelos e pelas jovens como algo que diz respeito à sua esfera priva-
da, na qual eles e elas não esperam que o Estado ou os pais inter-
venham. Deixando perceber que há legitimidade para a atividade
sexual dos e das jovens, que não vem da lei ou de uma idade de
consentimento, mas do entendimento de que só deve acontecer
quando o ou a jovem estão prontos – situação que é percep-
cionada como um produto de agência, de escolha e de controle
mediado pelos próprios (VIEIRA, 2012).
Nesse sentido, enquadrados numa variedade de contex-
tos socializadores, os e as jovens assimilam uma multiplicidade
de mensagens, em que persistem entendimentos e influências
mais tradicionais ou mais modernas. A partir de uma pluralidade
de discursos juvenis, percebe-se que a sexualidade se traduz, de
forma mais ou menos descontínua e incongruente, numa comple-
xidade de vivências heterogêneas (VIEIRA, 2012). Nessa diversi-
dade, verificamos a permanência de uma sexualidade plural e
plástica (GIDDENS, 1996), voltada para a autonomia sexual e para
o prazer, com elementos que sustentam a construção da sexuali-
dade em tempos de modernidade reflexiva.
Dirigidas por paradigmas modernos, quando se percebe
que a sexualidade dos e das jovens está cada vez mais descen-
trada das necessidades reprodutivas e do casamento, ou seja,
apresenta-se como uma sexualidade plástica (GIDDENS, 1996) ou
plasticizada (PAIS, 1998), autonomizada e valorizada por si mesma
(PAIS, 1998; VASCONCELOS, 1998; ALFERES, 2002; ALMEIDA et al.,

138
Capítulo 5

2004; VIEIRA, 2012). Ou quando se percebe que os e as jovens


vivem, hoje, uma sexualidade mais liberal do que as gerações
anteriores, numa ética experimentalista (PAIS, 1993). Ou, ainda,
quando se percebe na relação de casal em que as diferenças e
as regras de estruturação não se baseiam rigidamente em espe-
cificidades identitárias, o que faz com que a distinção entre os
cônjuges baseada nos papéis de gênero venha a perder força.
Nesse sentido, há alterações de relacionamento de casal apoia-
das pela interação, com base em jogos de complementaridade,
orientada por princípios de companheirismo e de reciprocidade
na atividade sexual (BOZON, 2002).
Contudo, e sendo a sexualidade um domínio relevante da
construção da identidade individual e social, é necessário aten-
der que persiste um conjunto de condutas ditadas pela tradição
e que orientam as suas práticas, particularmente, com os jovens
do sexo masculino que se orientam por uma sexualidade compul-
siva (GIDDENS, 1996), a partir de uma atividade sexual de impul-
sos internos do organismo, com referência ao sistema simbólico
androcêntrico (BOURDIEU, 1999). E, em sentido contrário, uma
sexualidade do sexo feminino percebida de forma mais interior,
mais controlada e escondida, demonstrando que, e tal como refe-
re Giddens (1996), apesar de legitimada, nas meninas persiste um
maior constrangimento (VIEIRA, 2012).

1.3. Sexualidade juvenil e saúde

Numa relação entre os domínios da sexualidade juvenil e


saúde, concretamente, procurando entender a entrada na sexua-
lidade e os riscos das IST (da Sífilis), a educação sexual e a preven-
ção, percebe-se que os e as jovens fazem uso do conhecimento

139
Capítulo 5

pela normatividade da medicina, mas persiste um saber leigo que


resiste à regulação das práticas do cotidiano.
O estudo de Vieira (2012) mostra que na relação sexual
prevalece uma ideia de “imunidade da relação séria” (pensada a
partir do que os e as jovens classificam como relação de namoro),
no sentido do não risco de IST, com base na confiança mútua entre
parceiros. Apesar de uma manifesta preocupação com os riscos
de engravidar e da contaminação de IST, em particular Aids, os/as
jovens desvalorizam a sua vulnerabilidade na relação continuada
– situação igualmente encontrada na investigação realizada com
mulheres adultas (VIEIRA et al., 2003; VIEIRA, 2012) e homens
adultos (ALMEIDA; VILAR, 2008). O manifesto desejo de confiar
no parceiro baseado em princípios da relação pura (GIDDENS,
1996), que alicerça a relação no grau de compromisso existente,
na relação de confiança e na estabilidade a longo prazo, estabele-
cida por meio da comunicação do casal. Ou seja, o entendimento
da sexualidade está ancorado à lógica da medicalização de Illich
(1975) que remete para a noção médica de saúde e para a moral
de comportamento responsável (JODELET, 1999; SONTAG, 1993).
Mas é um entendimento que comporta contradição, especifica-
mente no que respeito ao cumprimento das normas pelas quais
o saudável se avalia. Na prática, o conhecimento do saudável que
é adotado como crença não se transforma necessariamente em
disposição para agir (LAHIRE, 2005) – o que os estudos de socio-
logia “do saudável” encontram para a generalidade dos “compor-
tamentos saudáveis” (SILVA, 2008).
Nesse sentido, do ponto de vista da construção identitária,
os e as jovens vão negociando entre uma multiplicidade de infor-
mação, proveniente das diferentes esferas (privada e públicas) e,
com base nelas, fazem as suas escolhas individuais.

140
Capítulo 5

2. Sexualidade e jovens no Brasil

O Brasil, por muito tempo, foi considerado uma país forma-


do por jovens. Com as mudanças demográficas e o envelhecimen-
to populacional, o percentual de jovens na população brasileira
gira em torno de 24%, em um total de mais de 210 milhões de
pessoas. E, entre os mais de 50 milhões de jovens, 85% vivem em
centros urbanos (IBGE, 2019). Conforme preconiza o Estatuto da
Juventude (BRASIL, 2013), o estado brasileiro reconhece como
jovens as pessoas entre 15 e 29 anos e determina os direitos dessa
população, a serem garantidos e promovidos por meio de políti-
cas públicas intersetoriais, programas e ações para a juventude.
Entre esses direitos assegurados estão a educação e o acesso à
saúde, com dignidade. Apesar de somente serem considerados os
jovens a partir dos 15 anos, muitas atitudes, atribuídas para esta
população, vêm sendo colocadas em prática de forma precoce.
De acordo com pesquisas realizadas, a idade de iniciação
sexual entre os jovens, no Brasil, vem sofrendo alterações nos
últimos 20 anos. O último levantamento realizado pelo Ministério
da Saúde, em 2006, demonstra que 33% das mulheres entrevis-
tadas tiveram sua primeira relação sexual antes dos 15 anos. Os
dados, que compõem a Pesquisa Nacional de Demografia, apon-
tam para um crescimento percentual três vezes maior do que na
última coleta de informações, que ocorreu dez anos antes, em
1996 (GARCIA; KOYAMA, 2009).
Assim, no ano de 1996, o percentual de mulheres, nesta
faixa etária, com atividade sexual, girava em torno de 11,5%. O
uso do preservativo na primeira relação sexual também apre-
senta aumento importante, apontando para uma transformação
de comportamento neste grupo (TEIXEIRA et al., 2006; PAIVA et
al., 2008 apud GARCIA; KOYAMA, 2009). O mesmo levantamento

141
Capítulo 5

apontou que 55,2% das jovens de 15 a 19 anos já haviam tido a


primeira relação sexual, porcentagem bem maior do que a regis-
trada no levantamento realizado em 1996, quando os dados gira-
vam em torno de 32%.
Mais recentemente, já em 2015, outros levantamentos
foram realizados, confirmando a mudança de comportamento
entre os jovens, com idades ainda mais novas, como meninos e
meninas entre 13 e 15, o que ainda é considerada a adolescên-
cia. Um desses levantamentos é dos pesquisadores Lara e Abdo
(2015), no qual é apontada uma maior frequência na faixa etária
citada, da primeira relação sexual completa, quando há penetra-
ção completa, entre pessoas de gêneros diferentes. O percentual
de crianças com o primeiro contato erótico entre 9 e 10 anos gira
em torno de 20%, e esse contato erótico é descrito, pelas autoras,
entre outros como, por exemplo, toques sem roupa.
A pesquisa ainda mostra que 20% da população jovem, com
13 anos ou menos, tiveram relações sexuais sem nenhum tipo de
proteção preservativa, tanto para casos de gravidez como para evitar
Infecções Sexualmente Transmissíveis – IST. E outros 26%, este grupo
sendo formado especialmente por meninos, com 13 anos de idade,
já haviam tido mais de três parceiros sexuais (LARA; ABDO 2015).
A alteração da idade mínima da coitarca (como é denomi-
nada a primeira relação sexual) também é analisada por Lerner et
al (2018). Esta análise enfatiza os dados informados pela Pesquisa
Nacional de Amostragem Domiciliar Contínua – PNAD – executa-
da pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE, no
ano de 2006, sendo estas as últimas informações disponíveis. De
acordo com os autores, 55,2% das jovens, com idades entre 15 a
19 anos, já haviam tido a primeira relação sexual, porcentagem
bem maior do que a registrada no levantamento realizado em
1996, quando os dados giravam em torno de 32%.

142
Capítulo 5

Outros resultados analisados são os apresentados na


Pesquisa Nacional de Saúde do Escolar (PeNSE). A pesquisa tem
como objetivo levantar informações que permitem conhecer e
dimensionar os fatores de risco e proteção à saúde dos adoles-
centes. A pesquisa é realizada por amostragem, utilizando como
referência para seleção o cadastro das escolas públicas e privadas
do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio
Teixeira – INEP. De acordo com o levantamento realizado no ano
de 2006, 35,4% dos jovens, com 14 anos, já tiveram relação sexual.
Seis anos depois, em 2012, outro levantamento da PeNSE foi reali-
zado, avaliando 107.468 adolescentes, todos estudantes do 9º ano
do ensino fundamental de escolas públicas e privadas em todo o
Brasil. As idades dos estudantes pesquisados giravam entre 13 e 15
anos. De acordo com o levantamento, mais de ¼ dos pesquisados já
haviam passado pela primeira relação sexual, havendo uma maior
frequência, entre os meninos. (LERNER et al., 2018).
Leal e Fachel (1999) realizaram um trabalho com diver-
sos jovens por meio de entrevistas. Com o resultado foi possível
traçar um perfil da iniciação sexual dos jovens no Brasil. De acordo
com as autoras, uma parcela significativa da população jovem
brasileira tem iniciação sexual igualitária, ou seja, os parceiros da
primeira experiência também são jovens, da mesma idade, e sem
experiências anteriores. Esse envolvimento ocorre com pessoas
com algum tipo de relacionamento, podendo ir desde um amigo
mais próximo até o namorado ou namorada propriamente. Na
análise das pesquisadoras, esse tipo de comportamento está
ligado diretamente à ideia de liberdade de escolha do parceiro,
remetendo, ainda, a “romantização” do ato sexual, quando há
um envolvimento sentimental entre os parceiros. “Trata-se da
iniciação, para cada um dos jovens, de sua vida sexual ativa, da
vida reprodutiva, do casamento e da “adultez”, tudo isso mais ou

143
Capítulo 5

menos encadeado de forma a aparentemente não haver possibi-


lidade social de escolher apenas um evento” (LEAL; FACHEL, 1999,
p. 105). Pode-se observar, então, um envolvimento emocional por
parte dos jovens em seus primeiros contatos sexuais completos.
No entanto, a pesquisa também aponta para casos de
iniciação de tipo violenta, quando o jovem, tanto meninas como
meninos, não fazem sexo consensualmente. No caso das meninas,
geralmente, o parceiro é mais velho, forçando a relação sexual.
Os meninos também relatam uma iniciação violenta quando a
relação é imposta, ocorrendo com parceiras de idade superior à
deles ou com profissional do sexo, tendo uma relação forçada,
direta ou indiretamente (LEAL; FACHEL, 1999).
Em pesquisa qualitativa realizada em uma comunidade do
estado do Rio de Janeiro, Monteiro (2002) confirma a faixa etária
– entre 13 e 15 anos – para a iniciação sexual do jovem. Os dados
para a pesquisa qualitativa foram coletados por meio de entrevis-
ta, o que possibilitou à pesquisadora uma análise mais detalhada
de cada caso. No grupo das meninas, foi possível verificar que
entre as 18 entrevistadas, oito se declaram virgens. O envolvimen-
to de namoro de todas elas continha beijos, abraços e passeios,
não tendo sido citado nenhum tipo de carícia mais íntima. Por
outro lado, os meninos relatam esse tipo de intimidade com suas
namoradas, mesmo elas sendo virgens. “Na visão deles, isso não
é sexo. Sexo é penetração” (MONTEIRO, 2002, p. 88).
A pesquisadora ressalta, ainda, o comportamento adota-
do por cada grupo de garotas. Entre as meninas que não tive-
ram relações sexuais, há um maior controle por parte da família,
principalmente, da mãe. Elas também não relatam envolvimento
com drogas e uma menor frequência aos bailes da comunidade.
Também mantém participação efetiva nas atividades recreativas
e esportivas. Apesar do comportamento social ligado ao universo

144
Capítulo 5

infantil, a pesquisadora não relata “diferenças importantes na


faixa etária e no desenvolvimento físico do grupo sem e com
iniciação sexual” (MONTEIRO, 2002, p. 86).
No entanto, alguns estudos demonstram um comporta-
mento um pouco diferente do que representado nos documentos
já apresentados. Conforme levantaram Bozon e Heilborn (2006),
o jovem brasileiro apresenta um comportamento mais contido,
no que se refere à sua iniciação sexual, contando com um contex-
to estruturado “sobretudo no que diz respeito às relações entre
homens e mulheres” (BOZON; HEILBORN, 2006, p. 155).
Em seus estudos, os pesquisadores se propõem a anali-
sar mais detalhadamente os fatores envolvidos na transição do
adolescente à sexualidade com parceiros, ressaltando pontos
fundamentais como as condições da primeira experiência sexual
dos entrevistados e a existência de um comportamento relevante
no que diz respeito ao uso de preservativo, mesmo sem ter abor-
dado o assunto com seus parceiros.
A coleta de informações sobre o tema, por parte dos jovens,
conta, ainda nos dias atuais, com a participação efetiva da família,
muito presente na figura materna – principalmente no caso das
meninas – assim como outros jovens pertencentes ao mesmo
grupo social. Ainda se tratando das meninas, um ponto impor-
tante para o diálogo sobre sexualidade é a chegada da menarca
– primeira menstruação. Bozon e Heilborn (2006) averiguaram,
ainda, que cerca de 70% das meninas dialogaram com suas mães,
sobre questões acerca da sexualidade, antes mesmo da primeira
menstruação. A pesquisa ressalta, no entanto, que essa abertura
de diálogo precoce está ligada à escolaridade materna: quanto
mais alta a escolaridade da mãe, maior a abertura para abordar o
tema com a filha. Entre as mães com nível de instrução de ensino

145
Capítulo 5

fundamental incompleto, a conversa prévia à menstruação ocorre


em apenas 35% dos casos.
Quando o tema é especificamente gravidez, a mãe e a escola
surgem como as principais fontes de informação. Para os casos de
contaminação pelo HIV ou alguma infecção sexualmente transmissí-
vel, o jovem costuma buscar mais informação institucionalizada, por
meio da escola ou de veículos de comunicação: “[...] as instituições
mencionadas funcionam em parte como elemento de transmissão
de campanha de prevenção” (BOZON; HEILBORN, 2006, p. 157).
Apesar de pertencerem a uma mesma faixa etária, a posi-
ção social e o acesso à educação são fatores com bastante influên-
cia no comportamento adotado pelos jovens em todo o Brasil.
Entre os rapazes de classes populares e com baixa escolaridade,
a busca por informação se dá, principalmente, entre os amigos,
sendo a preferência de 46% dos jovens. Como a segunda opção
para esclarecer suas dúvidas quanto a questões sexuais e de
proteção, surge a figura materna, mesmo sendo pouco procura-
da, uma vez que apenas 19% dos entrevistados fazem essa esco-
lha. Por outro lado, temos que “rapazes de grupos privilegiados
mencionam em proporção iguais a mãe (46%), o pai (44%) e os
amigos, com percentual igual”. Comportamento semelhante se
percebe entre as mulheres, tendo a mãe como a principal fonte
de informação, nas classes mais altas, e os amigos e a escola com
as jovens de classes mais populares.

3. Juventude brasileira e a sífilis

Por se tratar de uma IST, os casos de contágio da sífilis estão


relacionados ao comportamento sexual nas mais diversas faixas
etárias. Entre as pessoas jovens, os casos de sífilis adquirida, em

146
Capítulo 5

sua grande maioria transmitida por meio da relação sexual, e da


sífilis congênita vêm aumentando.
O Boletim Epidemiológico, publicado pelo Ministério da
Saúde (BRASIL, 2020) em seu número especial sobre as IST no
país, ressalta dados da própria Organização Mundial de Saúde
quanto à sífilis no Brasil. De acordo com o documento, publicado
em outubro de 2020 e que analisa dados referentes ao ano de
2019, os casos de sífilis adquirida, um agravo que tem a sua noti-
ficação obrigatória desde o ano de 2010, apresentou uma taxa
de detecção de 75,8 casos por 100.000 habitantes. Também em
2019, a taxa de detecção de sífilis em gestantes foi de 20,8/1.00.
Entre o período de 2010 a junho de 2019, foram notifica-
dos 650.258 casos de sífilis adquirida no Sistema de Informação
de Agravos de Notificação (SINAN). De acordo com o Boletim, a
região Sudeste é a que apresenta o maior número de registros da
IST, com 53,5% dos casos, seguida das regiões Sul e Nordeste com,
respectivamente, 22,1% e 12,9% dos casos, contando ainda com
os dados registrados pelas regiões Centro Oeste (6,5%) e Norte
(4,9%). O documento do Ministério da Saúde explicita também
que, de 2010 a 2018, 347.064 (40,6%) dos casos ocorreram em
homens e 506.873 (59,4%) em mulheres. A maior parte das notifi-
cações ocorreu em indivíduos entre 20 e 29 anos (35,1%), seguidos
pelo grupo de 30 a 39 anos (21,5%). Mas, segundo o Ministério,
houve um incremento da detecção em todas as faixas etárias.
Para os casos de sífilis congênita, quando há a transmissão
da mãe para o filho, por via transplacentária, durante a gravidez
ou no parto, após contato do recém-nascido com lesões mater-
nas, já existentes, os dados obtidos no levantamento realizado
no Brasil apontam para um percentual acima dos 20% para mães
com idades a partir dos 15 anos de idade. Em 2019, os percentuais
mais elevados de casos de sífilis congênita foram registrados em

147
Capítulo 5

crianças cujas mães tinham entre 20 e 29 anos de idade (55,1%).


Logo em seguida, estão as mães com idades variando entre 15 e
19 anos, com um percentual de 22,3%. O levantamento também
registra que, quando a idade materna é superior aos 30 anos, o
percentual de contaminação da criança é de 17,6% (BRASIL, 2020).
Dados já obtidos por pesquisadores do Projeto “Pesquisa
Aplicada para Integração Inteligente Orientada ao Fortalecimento
das Redes de Atenção para Resposta Rápida à Sífilis”, também
conhecido como Projeto “Sífilis Não”, indicam um avanço nos
casos de infeção entre crianças e jovens na faixa etária que varia
entre 11 e 15 anos. De acordo com o levantamento realizado
junto ao Sistema de Informação de Agravo de Notificação em
Saúde – SINAN – do Governo Federal do Brasil, no ano de 2017,
foram notificados 608 casos de sífilis congênita em todo o Brasil
em crianças, cuja progenitora tem entre os 10 e os 14 anos. No
entanto, esses dados sobem para mais de 12 mil casos quando a
faixa etária da progenitora é de 15 a 19 anos, conforme demons-
trado na Tabela 1.

148
Capítulo 5

Faixa
Ano 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014 2015 2016 2017
Etária
10 a 14 anos 88 110 162 203 261 328 370 446 514 608
15 a 19 anos 1.318 1.648 2.109 3.093 3.968 5.352 6.983 8.522 9.903 12.724
Tabela 1 - Sífilis em gestantes, de acordo com a faixa etária materna.
Fonte: SINAN – Sistema de Informação de Agravo de Notificação em Saúde (2017).

Para os casos de sífilis adquirida, o levantamento realizado pelo Ministério da Saúde, aponta um aumento
expressivo e que vem se confirmando ao longo dos últimos 10 anos. Somente no período de 2010 ao mês de
julho de 2020 foi notificado pelo SINAN um total de 783.544 casos de sífilis adquirida.
Este quantitativo chama a atenção quando analisado por faixa etária. Pessoas com idades entre 13 e 19
anos representam 10,7% das notificações realizadas durante o último levantamento. Os dados também podem
ser analisados em uma linha de tempo, construída com os dados. O avanço de casos passa de 319, notificados
no ano de 2010, para 5.277 até junho der 2020. Os dados podem ser observados na Tabela 2.

149
Capítulo 5

Ano de coleta Quantidade Percentual (%)


2010 319 8,1

2011 1.287 7,1

2012 2.273 8,1

2013 3.420 8,7

2014 4.800 9,5

2015 7.070 10,2

2016 9.879 10,8

2017 13.609 11,2

2018 16.850 10,6

2019 16.129 10,5

2020 5.277 10,7


Tabela 2 - Casos de sífilis adquirida, entre 13 e 19 anos. Evolução em 10 anos.
Fonte: Brasil (2020).

Em desenvolvimento desde 2018, o Projeto “Sífilis Não” é


o nome fantasia de um projeto em desenvolvimento denomina-
do Pesquisa Aplicada para Integração Inteligente Orientada ao
Fortalecimento das Redes de Atenção para Resposta Rápida à
Sífilis. O trabalho é resultado de uma parceria entre o Ministério
da Saúde e a Universidade Federal do Rio Grande do Norte, por
meio do Laboratório de Inovação Tecnológica em Saúde (LAIS) e
o Núcleo de Estudos em Saúde Coletiva (NESC).
O projeto conta com quatro eixos de atuação, sendo eles:
educação; comunicação; cuidado integral; e gestão, governança e
cooperações e tem como objetivo reduzir a sífilis adquirida e em
gestantes e eliminar a sífilis congênita no Brasil. Mas a atuação e
desenvolvimento de ações direcionadas a determinados públicos,

150
Capítulo 5

também faz parte do escopo do projeto. Entre esses público-alvo


estão os jovens. E no rol das pesquisas que vêm sendo desenvolvi-
das durante o percurso dos pesquisadores envolvidos, algumas se
destacam por atender, diretamente, às necessidades deste públi-
co, assim como o atendimento ao adolescente, em uma prepara-
ção à faixa etária seguinte.
O quadro a seguir demonstra essas pesquisas desenvolvi-
das pelos pesquisadores, principalmente nos eixos de comunica-
ção e educação.

Quadro 1 - Pesquisas Desenvolvidas no Projeto “Sífilis Não”


Sífilis Não! App Lílian Muneiro
Ufrn Jovem
Narrativas Transmídia em
Recursos Educacionais Kaline Sampaio
Abertos como Metodo-
logia para a Prevenção
da Sífilis entre Jovens
Comunicação em Saúde:
a Sífilis e suas Linguagens Maurício Oliveira Jr.

Saúde Sexual na Adoles-


cência: precisamos Laísi Catharina Da Silva Barbalho Braz
falar mais sobre isso!
A Prevenção da Sífilis
através da Educação
Sexual nas Escolas: uma Maria Valéria Pareja Credidio Freire Alves
Estratégia Formativa
Para Professores
Fonte: Workshop de Pesquisas do Projeto “Sífilis Não” (2021).

Uma das atividades já colocadas em prática foi a elaboração


de stickers – tipos de adesivos com informações rápidas – como

151
Capítulo 5

mídia alternativa para a campanha de massa. Todo o material foi


distribuído nos banheiros utilizados pelos alunos que frequen-
tam o campus central da Universidade Federal do Rio Grande do
Norte. “De forma transversa, auxiliamos comunicativamente dada
a natureza do suporte midiático e inserção em locais com menor
concorrência de imagens ou processos iconofágicos” (MUNEIRO,
2019, p. 178). Estima-se que a UFRN atenda 43 mil estudantes,
entre graduação e pós-graduação.
As temáticas escolhidas para serem trabalhadas foram
as mais diversas, sempre levando informações sobre os cuida-
dos, testagem e tratamento para a sífilis. Os stickers trouxeram,
também, informações para públicos específicos, como gestantes
e comunidade LGBT2 (Lésbicas, Gays, Bissexuais e Transgênero).
“Para gerar engajamento também foram produzidos conjuntos de
stickers, em alguns tendo o humor como vetor de engajamento.
[...] As colagens foram programadas para acontecer semanalmen-
te, durante cinco semanas. Cada sticker tem a dimensão de 7,5
cm para privilegiar a leiturabilidade” (MUNEIRO, 2019, p. 179).

4. O enfrentamento da sífilis por meio


da Educação: alguns indicativos

A definição dos conceitos de juventude e de sexualidade


nos permitiu verificar o caráter polissêmico dos termos, além da
multidisciplinaridade das abordagens que os contemplam.
Situam-se em uma área de entremeio de estudos da
Psicologia, da Filosofia, da Sociologia, da Pedagogia, entre outras

2 LGBT - Sigla que significa Lésbicas, Gays, Bissexuais e Transgênero.

152
Capítulo 5

áreas de conhecimento. Nesta seção do texto, optamos por algu-


mas abordagens da Psicologia da Educação e da Pedagogia.
Vimos também que, infelizmente, as infecções sexualmen-
te transmissíveis (IST) são frequentes nesse estágio desenvolvi-
mental. No que tange à sífilis, bastante prevalente nos jovens,
não temos uma vacina, mas podemos recorrer a procedimentos
preventivos que estão diretamente ligados à Educação e podem
garantir o trinômio “teste, trate e cure”, utilizando informa-
ções facilmente dissemináveis, por meio do binômio Educação
e Comunicação, entre eles o uso de preservativos na relação
sexual, o diagnóstico precoce em mulheres em idade reprodu-
tiva e parceiros, a realização disseminada do teste diagnóstico,
entre outros.
Mas, o grande desafio é: como fazer essas ideias chega-
rem à população jovem de país de dimensões continentais, como
o Brasil? Claro que a Educação assume, nesse caso, dimensão
fundamental. Iniciando, podemos fazer uso de alguns documentos
legais importantes.
A Constituição Brasileira de 1988, em seu Artigo 205, diz
que: “A educação, direito de todos e dever do Estado e da família,
será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade,
visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o
exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho”.
Na Lei 9.394, de 20 de dezembro de 1996, que determina
as Diretrizes e Bases da Educação Nacional, em seu Artigo 1º,
encontramos a educação conceituada como processo que abran-
ge os processos formativos que se desenvolvem na vida familiar,
na convivência humana, no trabalho, nas instituições de ensino
e pesquisa, nos movimentos sociais e organizações da sociedade
civil e nas manifestações culturais.

153
Capítulo 5

Fica claro, portanto, que não falamos apenas da educação


formal, desenvolvida em instituições educacionais, que leva à
obtenção de diplomas e qualificações, que é intencional, ocorre
em contextos estruturados, por meio de atividades planejadas e
orientadas por metas e objetivos.
Existem dois outros tipos:
A aprendizagem não formal, que decorre de ações que se
desenvolvem fora do sistema formal de ensino, não recebe diplo-
mas ou certificações, mas é intencional e motivada. Um exemplo
disso são as aprendizagens realizadas no ambiente de trabalho.
Temos, ainda, a aprendizagem informal, que acontece em
situações não estruturadas e não é intencional. Ela é realizada,
por exemplo, no contexto familiar e no contato com instituições
sociais. No caso dos jovens, sabemos quanto os grupos de pares
são importantes nessa disseminação de conhecimentos.
A abordagem das questões relativas à sexualidade sempre
foi uma questão delicada para as famílias e as escolas. De acordo
com Del Priore (2011), no século XIX apenas as ciências estavam
autorizadas a falar sobre sexo, originando-se daí as primeiras clas-
sificações científicas de certo e de errado, além das regras para
disciplinar as relações sexuais.
Em pesquisa sobre a opinião das mães em relação à educa-
ção sexual, constatou-se que elas sentem dificuldade de abordar
o tema com os filhos por motivos como vergonha, timidez, senti-
mento de despreparo, entre outros (SAVEGNAGO; ARPINI, 2018).
Hoje, que temos no Brasil movimentos bastante conserva-
dores, essa dificuldade aumentou significativamente.
Isso não significa, no entanto, que a inserção de conteúdos
relativos à sexualidade na educação atenda apenas ao enfrenta-
mento da Sífilis e das demais IST.

154
Capítulo 5

Trata-se de interferir, também, nos processos de subjetivação


de crianças e adolescentes relativamente a outras questões, como
atitudes sexuais discriminatórias, constituindo-se em ação inclusi-
va. Não podemos esquecer, também, que é fundamental investir na
capacitação dos professores relativamente a essas questões.
Trazemos as falas de alguns autores que consideramos
importantes para este tema, começando pelos conceitos de cons-
cientização e emancipação, como os enunciou Paulo Freire. Para
ele, o homem é um ser de relações, aberto à realidade, que “não
apenas está no mundo, mas com o mundo” (FREIRE, 1982, p. 39). No
que tange à conscientização, ela é um processo histórico que ocorre
pela tomada de consciência de si e do mundo, e que possibilita ao
homem a emancipação e a integração ao mundo real.
A Educação, segundo o autor, tem o compromisso de possi-
bilitar ao homem a reflexão sobre si mesmo, sobre seu tempo
e suas responsabilidades (FREIRE, 1987). Um dos compromissos
desse modelo educacional é deixar de ser uma “educação narra-
dora” de conteúdos desligados da realidade vivenciada pelos
educandos, rompendo com o paradigma da Educação Bancária e
adotando a perspectiva da Educação Libertadora.
Quando tratamos do tema “sexualidade”, essa necessidade
ainda se torna mais premente, pelo caráter pessoal e de profundo
envolvimento emocional que ele traz.
Um autor que aborda em profundidade o ciclo vital, com
destaque para a transição da adolescência para a adultice é Erik
Erikson. Criticando o modelo de “tempestade e tormenta”, criado
por autores influenciados pelo darwinismo como Stanley Hall, autor
da obra “Adolescence”, escrita em 1904, que apresenta o perío-
do como de turbulência e instabilidade emocional, em função do
surgimento da sexualidade (GALLATIN, 1978), o autor traz a propos-
ta de uma “moratória psicossocial” (ERIKSON, 1972), um período

155
Capítulo 5

admitido socialmente para que o jovem vivencie mudanças ineren-


tes ao período e defina uma identidade adulta consolidada.
Um desses aspectos é a identidade sexual. É na transição
da difusão de identidade para a constituição de uma identida-
de consolidada que o adolescente experimenta papéis, inclusive
sexuais, e constrói um autoconceito que envolve a sexualidade.
Esse é o momento de buscar, por meio da Educação, estabelecer
uma mentalidade de cuidado e prevenção, inclusive em relação
à sífilis e às demais IST.
Outra abordagem teórica que merece consideração é a de
Aberastury e Knobel. Os autores caracterizam a adolescência como
uma espécie de “síndrome normal”, cuja finalidade é a “busca de si
mesmo e da identidade”, que vai desaguar na adultice.
Nesse processo, os autores falam de três “lutos” vivenciados
pelo jovem, que “não só deve enfrentar o mundo dos adultos para o
qual não está totalmente preparado, mas, além disso, deve despren-
der-se de seu mundo infantil” (ABERASTURY; KNOBEL, 1992, p. 10).
Entenda-se o luto, no sentido psicanalítico, como o período
entre a perda de um objeto e o encontro de outro, substitutivo.
Assim, são três esses lutos fundamentais, no caso do jovem: o luto
pelo corpo infantil que, sofrendo inúmeras mudanças, vai dando
origem ao corpo adulto; o luto pelo papel social e pela identidade
infantil, que o obriga, por exemplo, a renunciar à dependência e a
aceitar responsabilidades que ainda desconhece e para as quais
não se sente preparado, embora deseje ser adulto; e o luto pela
perda da imagem idealizada dos pais da infância, que represen-
tavam proteção e refúgio.
É necessário, a partir da interferência da Educação, que
a superação desse luto traga a expectativa e a busca da saúde
física e emocional, superando um fenômeno muito comum nessa
faixa etária: a falta de percepção da própria vulnerabilidade,

156
Capítulo 5

acompanhada de uma fantasia onipotente quanto à contamina-


ção, a de que “não vai acontecer comigo”.
Passemos, então, a apresentar alguns indicativos para a
construção de propostas educacionais que tenham como foco o
enfrentamento da sífilis.
Entre os muitos indicativos possíveis, escolhemos três
dentro de um espectro bem mais amplo, e que nos parecem
muito significativos.

a. Uso de linguagem compatível com a fala dos jovens

Não se trata de empobrecer a linguagem utilizada nas


ações educativas, de torná-la totalmente coloquial, ou criar uma
linguagem digital, repleta de abreviações e neologismos, mas de
aplicar-lhe algumas características de simplicidade, informalidade
e objetividade que caracterizam a linguagem dos jovens de hoje,
atribuindo ao material produzido competência comunicacional.
Afinal, como diz Miranda (2000, p. 40): “A internet repre-
senta, sem dúvida um modo de produção subjetiva contempo-
rânea, um lugar, mesmo que virtual, de produção de valores,
costumes, linguagem”.
Os jovens são, por excelência, criadores de neologismo que,
muitas vezes, acabam incorporados à língua. A comunicação digi-
tal, utilizada na internet, nos aplicativos e nas redes sócias, diversi-
ficou ainda mais os múltiplos usos da língua, tornando-a mais rica.
Ao criar ofertas educacionais voltadas para o enfrentamento da
sífilis, é necessário que a linguagem utilizada seja “amigável”, de fácil
compreensão para o público jovem, considerando que esses meninos
e meninas, pelo efeito do uso acentuado de tecnologias digitais, leem
e escrevem de forma bem diferente de alguns poucos anos atrás.

157
Capítulo 5

b. Aderência ao processo de gamificação

Todos nós conhecemos a adesão e o prazer dos jovens em


relação aos jogos (games). Segundo Romero Tori: “Eles gostam de
jogos, estão acostumados a absorver (e descartar) grande quan-
tidade de informações, a fazer atividades em paralelo, precisam
de motivação e recompensas frequentes, gostam de trabalhar em
rede e de forma não linear” (TORI, 2010, p. 218).
Não falamos aqui apenas da inclusão de jogos no material
produzido, mas da utilização de elementos comumente neles encontra-
dos, como o lançamento de desafios; o cumprimento de regras; estabe-
lecimento de metas claras e bem definidas; efeito surpresa; linearidade
dos acontecimentos; avanço por meio da conquista de pontos, troféus
e outras recompensas; estatísticas e gráficos com o acompanhamento
do desempenho obtido; superação de níveis; criação de avatares.
Nas pesquisas da literatura sobre games, a referência a uma
teoria a respeito da experiência subjetiva que ocorre na mente dos
gamers é frequentemente citada. Trata-se da teoria do flow (em
tradução livre, algo como “fluxo” ou “estado de imersão”), propos-
ta pelo psicólogo norte-americano Mihaly Csikszentmihalyi. Sua
teoria aborda o estado mental de um indivíduo engajado em uma
atividade em que se encontra completamente focado, envolvido e
energizado - tal como acontece com os jogadores de games. Para
ele, estas são as características de uma atividade produtiva de flow.
Csikszentmihalyi (1999) afirma que a experiência de flow
está relacionada ao desafio que a tarefa impõe e às habilidades
do indivíduo requeridas para tal. Quando o desafio é maior do
que a habilidade do indivíduo, o seu estado mental é de ansiedade
seguida de frustração. Caso contrário, quando o desafio é menor
do que a sua habilidade, o indivíduo acaba enfadado. Nos dois
casos a tendência é o abandono da tarefa.

158
Capítulo 5

As ofertas educacionais de que falamos, portanto, precisam


contemplar aspectos da gamificação e proporcionar a experiência
prazerosa de flow.

c. Utilização dos recursos oferecidos pela mediação tecnológica

Observando a grande adesão dos jovens à utilização das


tecnologias de informação e comunicação, a mediação tecnológica é
um bom princípio para essas atividades educacionais que propomos.
Quando usamos o termo mediação nos referimos ao fato
da relação do ser humano com o conhecimento sofrer sempre a
intermediação de alguma instância que faz essa “ponte”, facili-
tando a sua construção. As diversas instituições como a família,
a escola, os grupos sociais e religiosos sempre exerceram esse
papel, oferecendo novos caminhos para o indivíduo na sua relação
com o conhecimento, permitindo, inclusive, que ele descubra as
melhores e mais produtivas formas de aprender.
Nesse cenário, ganham destaque as tecnologias móveis.
Bowker (2000) utiliza a expressão “aprendizagem móvel” para
designar o conjunto de processos de aprendizagem que ocorrem
necessariamente apoiados pelo uso de tecnologias de informação
móveis e que têm como característica fundamental a mobilidade
de atores humanos.
Com o desenvolvimento acelerado das tecnologias digitais, a
inserção destas no interior das práticas didático-pedagógicas, que
alguns autores chamam de intermediação, torna-se muito profícua.
Encerramos lembrando que, na produção de ofertas
educacionais relativas ao enfrentamento da sífilis, adequadas aos
jovens, não podemos esquecer que, como nas gerações anterio-
res, mas de uma forma mais intensa na atual, eles são críticos e

159
Capítulo 5

desejosos de autoria e protagonismo em relação à própria apren-


dizagem, o que nos remete ao conceito de cultura participativa,
enunciado por Jenkins (2009, p. 378): “[...] cultura em que fãs e
outros consumidores são convidados a participar ativamente da
criação e da circulação de novos conteúdos”.
Para os que desejarem ampliar os indicadores de eficácia
desses materiais, que começamos a construir, vale a pena resgatar
as oito “Normas da Geração Internet”, propostas por Tapscott
(1999). São elas: a) Liberdade: desejam flexibilidade de opções nas
situações de aprendizagem; b) Customização: desenvolvimento de
um aprendizado próprio, segundo suas necessidades e interesses;
c) Investigação: tendência a questionar e investigar a informação
que lhes chega; d) Integridade: relacionada aos aspectos éticos
do comportamento; e) Colaboração: capacidade de criar conhe-
cimento com foco coletivo, em equipe; f) Entretenimento: dese-
jam que o aprendizado seja prazeroso, divertido; g) Velocidade:
querem aprender rapidamente, de forma objetiva e prática; h)
Inovação: estímulo à apresentação de soluções novas, diferentes.
É necessário, fundamentalmente, que essas propostas
educacionais possam atuar no apoio à construção da identidade,
da autonomia, e do projeto de vida dos jovens a quem se destinam.
Precisam realizar a superação da falta de domínio dos
jovens em relação às IST, em parte resultante da dificuldade de
abordar a temática, tanto no ambiente familiar quanto no escolar,
devido ao tabu que a cerca.
Para o enfrentamento eficaz da sífilis na população jovem,
torna-se necessária a implementação de uma educação sexual
de qualidade nas escolas, que não esteja concentrada em uma
metodologia conservadora, centralizada em aspectos fisiológi-
cos e meramente preventiva, mas em uma abordagem humana,
imersa no contexto sociocultural do público jovem.

160
Capítulo 5

Referências

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168
Capítulo 6
Desafios e Potencialidades
da Educomunicação como Estratégia
no Enfrentamento à Sífilis

Marilyn Anderson Alves Bonfim


Doutora em Ensino em Biociências e Saúde pela
Fundação Oswaldo Cruz. Pesquisadora no Laboratório
de Inovação Tecnológica em Saúde – LAIS/UFRN.

Janaína Luana Rodrigues da Silva Valentim


Doutoranda em Estudos Contemporâneos -
Centro de Estudos Interdisciplinares do Século
XX (CEIS20) – Universidade de Coimbra.

Sara Marisa da Graça Dias do Carmo Trindade


Doutora em História e pós-doutorado em Tecnologias
Educacionais e da Comunicação (Universidade
de Coimbra) – Professora no Departamento de
História, Estudos Europeus, Arqueologia e Artes da
Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra.

Eloiza da Silva Gomes de Oliveira


Doutora em Educação pela Universidade Federal do Rio
de Janeiro – Professora Titular da Universidade do Estado
do Rio de Janeiro (UERJ). Pesquisadora no Laboratório
de Inovação Tecnológica em Saúde – LAIS/UFRN
Capítulo 6

José Antônio Marques Moreira


Doutor em Ciências da Educação pela Universidade de
Coimbra e Professor no Departamento de Educação e
Ensino a Distância da Universidade Aberta de Lisboa.

Ricardo Alexsandro de Medeiros Valentim


Doutor em Engenharia Elétrica e de Computação
pela Universidade Federal do Rio Grande do
Norte – Departamento de Engenharia Biomédica.
Diretor Executivo do Laboratório de Inovação
Tecnológica em Saúde – LAIS/UFRN.

Karilany Dantas Coutinho


Doutora em Engenharia Mecânica pela Universidade
Federal do Rio Grande do Norte – Departamento de
Engenharia Biomédica. Pesquisadora no Laboratório
de Inovação Tecnológica em Saúde – LAIS/UFRN.

Aline de Pinho Dias


Doutora em Educação pela Universidade Federal do
Rio Grande do Norte – Departamento de Fundamentos
e Políticas da Educação. Pesquisadora no Laboratório
de Inovação Tecnológica em Saúde – LAIS/UFRN.

1. Introdução

A Educomunicação é um campo de estudo que começou a ser


estruturado, a partir dos anos 2.000, de acordo com Soares (2000,
2018), sob uma nova perspectiva de duas áreas: Educação e
Comunicação. Tal perspectiva se coloca como um novo paradigma
a ser considerado para própria educação, durante os processos
de construção do currículo de propostas formativas.

170
Capítulo 6

A natureza relacional deste novo campo vem se construindo


de forma processual, midiática, inter e transdisciplinar e, especial-
mente, interdiscursiva. Esses são elementos centrais ao se pensar
propostas educomunicativas no campo da Saúde, dada a comple-
xidade que o processo de produção saúde-doença apresenta.
Neste sentido, a Educomunicação foi um dos quatro pilares
que constituíram o Projeto de Resposta Rápida à Sífilis nas Redes
de Atenção – “Sífilis Não”, que teve os seguintes objetivos: 1)
induzir ações voltadas ao controle da sífilis nas redes de atenção
à saúde, com atuação de apoiadores locais; 2)produzir conhe-
cimentos por meio de estudos operacionais; e 3) potencializar
a capacidade técnica de vigilância e assistência locais, em 100
municípios prioritários, que representavam mais de 60% de casos
de sífilis do país (BRASIL, 2018).
A perspectiva interdisciplinar orientou as ações de
Educomunicação do projeto, que investiu em ações informativas
diretas e campanhas de combate à sífilis, alcançando a população,
de forma geral, por meio de uma linguagem simples, e também
investiu na formação de trabalhadores do Sistema Único de
Saúde (SUS), ancorada na abordagem e na Política de Educação
Permanente em Saúde (EPS) (BRASIL, 2004).
A reflexão deste capítulo foca na complexidade que envol-
ve a construção de processos formativos para profissionais do
SUS, que precisam ser orientados pela articulação entre ensino e
serviço, com superação do modelo “escolar”, para que promovam
reflexão e ação em relação aos processos de trabalho, na expecta-
tiva de que essa mudança produza resultados positivos (melhora
da condiçao de saúde) diante de problemas de saúde pública,
como é o caso da sífilis (CECCIM; WERKER, 2004; CECCIM, 2005).

171
Capítulo 6

1.1. Desafios da Educomunicação em Saúde

Um dos desafios enfrentados no Eixo Educomunicação


do projeto foi o de desenvolver Recursos Educacionais Abertos
(REAs) a partir da perspectiva apresentada anteriomente. A
disponibilização e acesso se deu por meio do Ambiente Virtual
de Aprendizagem do SUS (AVASUS), desenvolvido pela UFRN, que
tem como missão promover conhecimento integrado e acessível
em educação para a saúde.
A análise desses recursos foi realizada em estudo especí-
fico, que identificou e categorizou as abordagens e objetivos dos
REAs, sob uma perspectiva qualitativa, que exigiu uma profun-
da reflexão sobre como aplicar e aprimorar técnicas de captura
de discursos advindos de contextos de múltiplas significações e
escalas de valoração. Com base na fenomenologia, a dinâmica
interpretativa foi de caráter hermenêutica, baseando-se nos
significados construídos a partir de um conjunto de textos, sem
o objetivo de legitimar pressuspostos, mas sim, de compreender, o
que havia sido produzido (COFFEY; ATKINSON, 1996; MAYS; POPE,
2000; KORTH, 2002; MORAES; GALIAZZI, 2016).
A busca no AVASUS resultou em 20 (vinte) REAs que trata-
vam da temática da sífilis, em diferentes contextos e abordagens,
com os seguintes títulos e objetivos:

1. Sífilis: senta que lá vem informação! – Apresentar, por


meio de uma websérie, informações sobre a sífilis.
2. Vamos falar sobre sífilis: esclarecendo dúvidas sobre
a sífilis – Identificar a sífilis como uma infecção sexualmente
transmissível, entendendo a importância de sua prevenção
para controle e reversão do quadro epidêmico.

172
Capítulo 6

3. Sífilis Adquirida – Conhecer os principais aspectos inse-


ridos no debate da sífilis adquirida.
4. A dinâmica vigilância/assistência em tempos de epide-
mia de sífilis – problemas atuais e perspectivas – Conhecer
a necessidade da integração vigilância/assistência no contex-
to da atenção integral ao paciente com sífilis e seus desafios
contemporâneos.
5. Sífilis no Brasil – novo protocolo - diagnóstico e trata-
mento – Conhecer o novo Protocolo de Controle de Doenças
Transmissíveis (PCDT).
6. Testes para diagnóstico da sífilis – Traçar abordagem
sobre a sífilis, infecção sexualmente transmissível, causada
pela bactéria Treponema pallidum.
7. Vamos falar sobre sífilis - epidemia de sífilis no século
21 – Compreender a sífilis como uma infecção sexualmente
transmissível ainda epidêmica no século 21.
8. Vamos falar sobre sífilis: cenário da sífilis no Brasil –
Apresentar o panorama nacional da incidência da sífilis.
9. Sífilis: Patogênese, desenvolvimento da resposta imune
e métodos diagnósticos – Apresentar as principais característi-
cas da infecção pelo Treponema pallidum, o mecanismo básico
de patogênese da sífilis adquirida e congênita e os principais
métodos utilizados para realização do diagnóstico laboratorial.
10. Estratégias para erradicação do HIV e Sífilis – Discutir
estratégias de erradicação do HIV e Sífilis.
11. Vigilância Epidemiológica das IST – Sífilis – Conhecer os
principais conceitos que envolvem a Vigilância Epidemiológica das
Infecções Sexualmente Transmissíveis, em especial, os da sífilis.
12. Pré-Natal e Puerpério em tempos de pandemia da
Covid-19 – Reconhecer a importância da educação permanente

173
Capítulo 6

das equipes de saúde da Atenção Básica e Especializada para


fortalecimento da Rede Materno-Infantil
13. Transmissão Vertical da Sífilis – Caracterizar a situação clínica
epidemiológica da transmissão vertical da sífilis congênita, bem
como apresentar o manejo terapêutico recomendado pelo PCDT.
14. Metodologia de Pesquisa Científica para Apoiadores –
Instrumentalizar os apoiadores do Projeto de Resposta Rápida à
Sífilis nas Redes de Atenção na metodologia de pesquisa científica.
15. Sífilis e Gonorreia no Brasil - Gonococo no Brasil –
Reconhecer a Gonorreia como importante problema de saúde
pública no Brasil.
16. Vamos falar sobre sífilis: sífilis e HIV: amigos ou inimi-
gos? – Informar o público a respeito das Infecções Sexualmente
Transmissíveis (IST), por meio da abordagem das principais
semelhanças e diferenças entre o Vírus da Imunodeficiência
Humana (HIV) e a sífilis.
17. Sífilis Congênita: do pré-natal ao acompanhamento ambu-
latorial – Atualizar condutas no manejo da sífilis congênita.
18. Vamos falar sobre sífilis - risco de infecção – Discorrer
sobre a epidemia da sífilis, entendendo a importância de sua
prevenção e orientações para evitar a propagação da doença.
19. Vamos falar sobre sífilis - conhecendo os sintomas da sífilis
– Identificar os principais aspectos inseridos no debate sobre sífilis.
20. Políticas de atenção à saúde no sistema prisional – Capacitar
os profissionais de saúde das equipes de atenção básica prisional
para promoção e proteção à saúde das pessoas privadas de liber-
dade, conforme a Política Nacional de Atenção Integral à Saúde
das Pessoas Privadas de Liberdade no Sistema Prisional (PNAISP).

Os objetivos de ensino-aprendizagem expostos e expressos,


predominantemente, pelos termos “conhecer”, “apresentar” e

174
Capítulo 6

“reconhecer” revelam o pressuposto do ‘desconhecimento do


aprendiz’ por parte dos autores/conteudistas, modelo histórico e
hegemônico na educação brasileira, mesmo diante da perspectiva
da educação permanente adotada no projeto. Destacam-se dois
REAs com os seguintes objetivos: “Traçar a abordagem” e “Discutir
estratégias”, estes levaram em consideração a ação e a reflexão
do aprendiz, respectivamente.
Dados, informação e conhecimento em saúde são funda-
mentais para o planejamento de ações de promoção da saúde e
de prevenção de doenças (CASANOVA; PEITER; CARRIJO, 2008).
Neste sentido, embora a perspectiva da EPS almejada nos REAs
disponibilizados não tinha sido plenamente alcançada, é impor-
tante ressaltar que informação qualificada sobre Sífilis é o primei-
ro passo para enfrentá-la.

1.2. Modelo Biomédico x Modelo Social

Optou-se por demonstrar graficamente as análises dos


focos temáticos dos REAs, para elucidar os padrões encontrados.
Estes recursos gráficos representam frequências de termos e são
imagens compostas de palavras utilizadas em um texto, nas quais
o tamanho de cada palavra indica sua frequência ou importância.

175
Capítulo 6

Figura 1 - Nuvem de Palavras – Foco Temático abordado nos REAs.


Fonte: Elaborada pelos autores (2022) - REAs disponíveis em: https://avasus.
ufrn.br/local/avasplugin/cursos/sifilis.php

A representação gráfica apresenta, de forma clara, a preva-


lência de termos clássicos adotados na perspectiva biomédica de
estudos de doenças: transmissão, prevenção, diagnóstico, sinto-
mas e tratamento.
Destacam-se, nesta análise, dois REAs: o primeiro, que teve
como objeto a integração entre a Atenção Primária em Saúde e
a Vigilância em Saúde, que discute o problema da fragmentação
do cuidado no SUS, situando a importância de ações intersetoriais
para promoção do cuidado.
E o segundo, que abordou a Promoção e Proteção à Saúde das
pessoas privadas de liberdade, considerando diversos aspectos sobre
a efetivação dos princípios do SUS e as Redes de Atenção à Saúde.
A reflexão sobre a prevalência do modelo biomédico nos
REAs analisados joga luz à ausência do modelo de determinação
social da saúde (BUSS; PELLEGRINI FILHO, 2007) e uma evidente
sobreposição de aspectos clínicos sobre aspectos sociais.

176
Capítulo 6

Essa ausência destoa da própria orientação da Organização


Mundial de Saúde sobre o tema e é ainda mais preocupante no caso
do Brasil, uma vez que somos um dos países mais desiguais do mundo,
com milhões de brasileiros vivendo em situação de extrema pobreza,
com baixa escolaridade e alta incidência de Doenças da Pobreza.

2. Considerações Finais

No contexto específico do projeto, à luz dos princípios do


SUS e dos determinantes sociais de saúde e diante dos desafios e
potencialidades da Educomunicação apresentados neste capítulo,
buscou-se dar aplicabilidade ao estudo realizado e preencher, em
alguma medida, a lacuna de uma perspectiva formativa centrada
no cuidado para o enfrentamento à sífilis.
Dessa forma, foi elaborado um REA intitulado “O Cuidado
no centro do enfrentamento à Sífilis”, que aborda os seguintes
temas: 1) A Política Nacional de Humanização e a pessoa no
centro do Cuidado; 2) O Método Clínico Centrado na Pessoa; e 3)
Processo de Trabalho na Atenção Primária à Saúde.
A estratégia metodológica adotada foi orientada pela apren-
dizagem baseada em problemas, apresentando um estudo de caso
de abordagem não clínica, ou seja, um caso que apresenta aspectos
biopsicosociais dos atores envolvidos, tais como: moradia, empre-
go, escolaridade, relacionamentos e o próprio atendimento da APS.
Por fim, o que se pretende com esse REA é informar e afetar
o aprendiz, de forma que ele se identifique com o caso narrado,
reflita sobre a importância de uma escuta qualificada e da descons-
trução de conceitos preconcebidos, com estímulo à tomada de deci-
são, à corresponsabilidade pelo cuidado e, consequentes desfechos
positivos dos casos de sífilis no território em que atua.

177
Capítulo 6

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en_1982-6621-edur-34-e200391.pdf. Acesso em: 8 dez. 2020.

179
Capítulo 7
Desafios e Perspectivas para a Educação
em Saúde Sexual de Adolescentes
e Jovens no Enfrentamento
à Sífilis e Outras IST

Laísi Catharina da Silva Barbalho Braz


Doutoranda em Estudos Contemporâneos – Universidade
de Coimbra. Mestre em Enfermagem – Universidade
Federal do Rio Grande do Norte (UFRN). Enfermeira
da Secretaria Estadual de Saúde Pública do Estado
do Rio Grande do Norte (SESAP/RN), pesquisadora
do Laboratório de Inovação Tecnológica em Saúde
(LAIS/UFRN). E-mail: [email protected]

Aliete Cristina Gomes Dias Pedrosa da Cunha Oliveira


Professora adjunta, Unidade científico-pedagó-
gica de Enfermagem de saúde pública comunitária
e familiar. Doutora em Ciências da Saúde, ramo
enfermagem. Docente na Escola superior de enfer-
magem de Coimbra e investigadora UICISA:E e
CEIS20 – UC. E-mail: [email protected]
Capítulo 7

Pedro Urbano
Professor da Faculdade de Psicologia e Ciências da
Educação da Universidade de Coimbra. Doutor em
Psicologia - Universidade de Coimbra. Investigador
do Centro de Estudos Interdisciplinares do
Século XX (CEIS-20) da Universidade de Coimbra,
Portugal. E-mail: [email protected]

Arthur Barbalho Braz


Doutorando em Estudos Contemporâneos -
Universidade de Coimbra. Pesquisador do Laboratório
de Inovação Tecnológica em Saúde (LAIS/UFRN).
E-mail: [email protected]

Aline de Pinho Dias


Professora do Departamento de Educação da
Universidade Federal do Rio Grande do Norte
(UFRN), doutora em Educação. Pesquisadora do
Laboratório de Inovação Tecnológica em Saúde
(LAIS/UFRN). E-mail: [email protected]

Apesar dos esforços técnico-científicos e avanços tecnológicos,


chegamos à segunda década do século XXI com uma constata-
ção: adolescentes e jovens estão se expondo a riscos cada vez
maiores, tanto no abuso de substâncias entorpecentes como
nas práticas sexuais sem proteção. Como reflexo, observa-se
o aumento dos casos de sífilis e outras Infecções Sexualmente
Transmissíveis (IST) nessa população. Uma das maiores limita-
ções observadas para o fortalecimento e efetivação das políticas
de promoção, prevenção e assistência à saúde sexual decorre
da ausência de estratégias para dialogar adequadamente com

181
Capítulo 7

este público. Nesse contexto, é importante destacar o papel da


família e da escola para a formação e promoção da saúde desses
indivíduos. É perante este pano de fundo que abordaremos, neste
capítulo, alguns desafios e possibilidades no âmbito das ações de
educação em saúde e sexualidade de adolescentes e jovens, bem
como o percurso metodológico para a elaboração de um Recurso
Educacional Aberto (REA) direcionado a familiares e educadores,
com vistas a fomentar o diálogo e educação participativa.

1. A importância do ambiente familiar


e escolar para a promoção da saúde sexual

Simplificando um tema complexo, podemos afirmar que a


adolescência é um período de vida cada vez mais longo nas socie-
dades ocidentais (devido, em especial, à precocidade da puber-
dade), tantas vezes marcado por conflitos e contradições, mas
igualmente por explorações e descobertas. Sendo um período
de importantes e, por vezes intensas, transformações em nível
físico/biológico, assim como em nível psicossocial, caracteriza-se
em primeiro lugar por ser um processo dinâmico e vital para o
crescimento e desenvolvimento da pessoa.
Caracteriza-se igualmente, por outro lado, pela constru-
ção da identidade, nomeadamente em nível da imagem corporal
(concomitante do crescimento do corpo e do aparecimento dos
caracteres sexuais secundários). Caracteriza-se sem com isto esgo-
tar o rol de transformações, por um conjunto extenso de vivências,
em particular das relações sociais, bem como de experimentações
(nos vários planos da existência), que irão contribuir para a cons-
trução da personalidade da pessoa, entendendo-se esta como um
ser único e singular, em processo de crescimento e aprendizagem.

182
Capítulo 7

É fundamental referir neste ponto que para muitas pessoas,


a adolescência representa ainda um momento de descoberta em
nível sexual e um período no qual irão, normalmente, decorrer
as primeiras relações sexuais. Dito por outras palavras, a adoles-
cência tende a ser (um pouco por todo o mundo) o momento em
que o acesso à educação e informação, em ambos os casos, de
qualidade, se torna essencial.
Como resultado de uma puberdade que se inicia cada vez
mais precocemente (fenômeno multifatorial, que vem ocorrendo
desde o século XIX), o início da atividade sexual na adolescência
tem vindo a ocorrer cada vez mais cedo e, na maioria das vezes
(pelo menos, no que diz respeito à situação brasileira), sem a devi-
da orientação ou aconselhamento prévio. Ou, o que é pior, sem
acesso à informação de qualidade ou fonte confiável, obtida por
meio da internet e meios similares.
A precocidade da primeira relação sexual, para além de
outras consequências (em particular, psicológicas), tem vindo a ser
referida na literatura científica como um fator importante relacio-
nado à maior vulnerabilidade ao contágio por IST, como é o caso
do HIV e sífilis, e aumento de casos de gravidez não planejada,
tornando-se uma questão preocupante, que se constitui como
problema de saúde pública em todo o mundo.
Com efeito, segundo Gomez Suárez et al. (2015), existem
alguns fatores que contribuem ou estão estritamente relacio-
nados ao aumento do risco de adquirir alguma IST ou ter uma
gravidez indesejada na adolescência. Dentre eles, destacam-se a
falta de conhecimento e acesso à informação de fonte confiável,
ambiente familiar desfavorável ao diálogo, influência do grupo
social em que o adolescente está inserido e ausência de estraté-
gias educativas mais participativas.

183
Capítulo 7

O Brasil não constitui exceção neste panorama, apesar da


existência de políticas públicas e programas de atenção à saúde de
adolescentes e jovens, observa-se aumento da vulnerabilidade dessa
população a situações de abuso e violência, uso e abuso de álcool
e outras drogas, ocorrência de gravidez não planejada, contamina-
ção por sífilis e outras IST. Atualmente, o país vive uma epidemia de
sífilis, com aumento de casos em todas as faixas etárias, e entre as
populações mais afetadas pela IST, está a de adolescente e jovens.
Dados apresentados pelo Ministério da Saúde brasileiro, reve-
laram que a população representada por jovens negras, do sexo femi-
nino, na faixa etária dos 20 aos 29 anos, correspondem a 28% do total
de casos de sífilis notificados em 2020. Com relação aos casos de sífilis
em gestantes, durante o ano de 2020, observou-se que 56,4% das
gestantes diagnosticadas com sífilis encontravam-se na faixa entre
20 e 29 anos, e 23,3% na faixa de 15 a 19 anos (BRASIL, 2021).
Considerando que ações de prevenção de problemas da
saúde podem ocorrer a partir de ações coletivas e estratégicas
dos setores da saúde, educação, família e sociedade em geral,
surgem-nos algumas questões: Qual seria o papel da família e
da escola, na prevenção agravos e promoção da saúde sexual de
adolescentes e jovens? Familiares e educadores estão preparados
para dialogar sobre saúde e sexualidade durante a adolescência?
Quais seriam as dificuldades e como auxiliar familiares e educa-
dores frente a esta demanda tão importante?
Não temos respostas definitivas para estas questões, mas
podemos ainda assim lembrar que o ambiente familiar é considerado
como indispensável para a sobrevivência e crescimento saudável de
seus integrantes, independentemente de sua dinâmica ou estrutura-
ção. É a partir deste tipo de espaço social que se favorece a sustenta-
ção da afetividade. Ele também desempenha um papel fundamental
na educação de seus membros, pois as primeiras noções de vida em

184
Capítulo 7

sociedade, bem como princípios éticos e humanitários, são transmi-


tidos durante a convivência em família (NERY et al., 2015).
Ora, se a adolescência é também (mas não somente) um
período de dúvidas e descobertas acerca da própria existência,
a vida sexual não foge (nem poderia fugir) a esse fato. Dito por
outras palavras, as dúvidas existenciais que marcam a adolescência
estendem-se ao plano sexual. Durante esta fase, os adolescentes
necessitam de intenso suporte familiar e orientações; contudo, e
paradoxalmente, não permitem fortes imposições e não aceitam
bem opiniões contrárias, já que (entre outras razões) estão em ativo
processo consolidação de sua individualização e formação do cará-
ter, além de toda a modificação fisiológica pertinente à puberdade.
Na prática, em muitas situações, os familiares não sabem como
proceder frente às descobertas e primeiras demonstrações da sexua-
lidade de seus filhos. Este torna-se, por conseguinte, um momento
delicado, porém de extrema importância para os que virão a seguir,
pois as primeiras conversas servirão de alicerce para uma boa relação
de diálogo entre pais e filhos. Diante disto, torna-se necessária uma
alteração de paradigma na comunicação e nas posturas, por exem-
plo, despindo-se de preconceitos e estereótipos, estarem abertos a
entender as diferenças de ideias, e prontos a gerenciar conflitos ou
tensões que possam surgir (MAROLA; SANCHES; CARDOSO, 2011).
Apesar de existir conhecimento e consciência destas
(e outras) necessidades, a verdade é que a literatura científica
aponta a existência de algumas dificuldades no sentido de forta-
lecer e (sobretudo) efetivar o diálogo familiar e medidas educa-
tivas relevantes, nomeadamente, pela carência de profissionais
capacitados atuando no ambiente escolar, dificuldade de aces-
so e adesão aos avanços tecnológicos e metodologias ativas no
processo ensino-aprendizagem, ou mesmo resistência por parte

185
Capítulo 7

de alguns educadores e familiares em abordar temas relacionados


à sexualidade no ambiente escolar (FARRE et al., 2018).
Entre as dificuldades para efetivação do diálogo, alguns
familiares apontam o fato de não saber quando e como iniciar a
conversa, dúvidas sobre o que deve ser abordado em cada faixa
etária, e se as informações que irão repassar estão de fato corre-
tas. Fatores culturais, religiosos e socioeconômicos também são
apontados como influenciadores para a dificuldade de diálogo
nesse momento (SILVA et al., 2015; HABERLAND; ROGOW, 2015;
GROSSMAN; JENKINS; RICHER, 2018).
Nesse contexto, observa-se que a família, nas suas diferen-
tes configurações, necessita conhecer e assumir o seu importante
papel como educadora e norteadora em primeira instância, capaz de
dialogar sobre a saúde e a sexualidade na adolescência, no intuito de
orientar seus filhos diante das dúvidas e descobertas do início da vida
sexual, assim como em todo o decorrer da adolescência e juventude.
Na ausência da participação ativa dos pais, o papel da esco-
la e dos profissionais da saúde torna-se ainda mais importante e
decisivo, principalmente no tocante ao esclarecimento de dúvidas
relacionadas ao primeiro ato sexual, contracepção e prevenção
de infecções sexualmente transmissíveis.
Nessa perspectiva, destaca-se a importância do fortale-
cimento das ações da Atenção Primária em Saúde (APS), bem
como o incentivo à criação de políticas e programas intersetoriais
que visem a articulação dos setores da saúde e educação. Nesse
contexto, instituído pelo Decreto Presidencial Interministerial nº
6.286, de 05 de dezembro de 2007, surge o Programa Saúde na
Escola (PSE), que prevê a atuação conjunta das áreas da saúde e
educação no ambiente escolar, buscando realizar intervenções de
promoção a saúde no principal espaço de convívio de crianças,
adolescentes e jovens em idade escolar (BRASIL, 2007).

186
Capítulo 7

Atualmente, as ações desenvolvidas pelo programa, consis-


tem em: ações de combate ao mosquito Aedes aegypti; promoção
das práticas corporais, da atividade física e do lazer nas escolas;
prevenção ao uso de álcool, tabaco, crack e outras drogas; promo-
ção da cultura de paz, cidadania e direitos humanos; prevenção
das violências e dos acidentes; identificação de educandos com
possíveis sinais de agravos de doenças em eliminação; promoção
e avaliação de saúde bucal e aplicação tópica de flúor; verifica-
ção e atualização da situação vacinal; promoção da alimentação
saudável e prevenção da obesidade infantil; promoção da saúde
auditiva e identificação de educandos com possíveis sinais de
alteração; direito sexual e reprodutivo e prevenção de IST/AIDS;
e promoção da saúde ocular e identificação de educandos com
possíveis sinais de alteração (BRASIL, 2017a).
Levando em consideração a resistência ou mesmo dificulda-
de em procurar os serviços de saúde, atualmente, as ações desen-
volvidas pelo PSE são fundamentais para viabilizar a aproximação
de adolescentes e jovens em idade escolar a informações de fonte
confiável e assistência em saúde disponibilizados pela APS, princi-
palmente quando se trata dos aspectos relacionados à saúde sexual.
No entanto, apesar da regulamentação das ações educati-
vas direcionadas à saúde sexual pelo PSE, é possível observar que
a atuação do programa nesse sentido ainda é limitada, pois no
ambiente escolar observa-se que a abordagem dos temas saúde
e sexualidade ainda é voltada, maioritariamente, para o ensino
de questões relacionadas à biologia e anatomia. Com relação aos
profissionais de saúde, ainda existem dificuldades formativas e
estruturais para atender a esta demanda, o que leva a serem
procurados somente após algum agravo à saúde já ter ocorrido.
Em síntese, observa-se que tal como sucede no ambiente
familiar, os setores da saúde e educação, ainda necessitam evoluir

187
Capítulo 7

no que diz respeito ao uso de novos métodos de abordagem ao


adolescente, com o intuito de ampliar conhecimentos e efetivar o
empoderamento desses sujeitos, por meio da educação em saúde,
inserindo-os em um ambiente de reflexões e discussões sobre
questões inerentes a sua faixa etária, a partir de linguagens e
ferramentas que fazem parte do cotidiano.

2. Ações do Projeto “Sífilis Não”: estímulo ao diálogo


e a educação sobre saúde e sexualidade na adolescência

A educação em saúde, principalmente voltada a adolescentes


e jovens, exige uma práxis que estabeleça conexões entre saberes e
habilidades, que favoreça o reconhecimento do indivíduo e da cole-
tividade e de uma aprendizagem ativa, que considere o contexto e a
multidimensionalidade, atuando de modo interdisciplinar, compreen-
dendo o ser humano e a saúde em toda a sua complexidade.
No momento em que os adolescentes não se sentem acolhi-
dos para obter respostas para suas dúvidas, adotam o hábito buscá-
-las com amigos da mesma faixa etária, parceiros ou mesmo por
meio digital em pesquisas na internet, e fontes que provavelmente
irão repassar informações imprecisas ou equivocadas, e sem a devi-
da confiabilidade. Tal situação além de resultar no distanciamen-
to dos pais, pode comprometer a compreensão das informações
buscadas e culminar em algum agravo à saúde (BRAZ, 2019).
Diante disso, para os familiares e educadores, torna-se
necessário buscar capacitação para atender esta demanda e
despir-se de preconceitos e estereótipos, permitindo abertura
para a discussão dúvidas e de ideias divergentes, prontidão para
gerenciar conflitos ou tensões que possam surgir no dia a dia, no
intuito de estabelecer uma relação de confiança com seus filhos,

188
Capítulo 7

favorecendo assim, o processo de formação de personalidade e


educação, bem como de promoção da saúde.
Nessa perspectiva, torna-se primordial a criação de ambientes
de discussão e educação mais abertos, acolhedores, sem preconcei-
tos ou juízo de valor, para que assim a assistência em saúde sexual
de adolescentes e jovens, seja ampliada e mais qualificada, contando
com a participação da família como aliada na prevenção de agravos
e promoção da saúde na adolescência e juventude.
E diante dos dados preocupantes relacionados à sífilis e
outras IST, na população adolescente e jovem brasileira, emerge
a necessidade de maior articulação entre a escola, ambiente fami-
liar e serviços de saúde, bem como a elaboração e implementação
de estratégias que visem a promoção da saúde e prevenção de
agravos nessa população.
Desde o ano de 2016, o Ministério da Saúde (MS) brasileiro
admitiu que o país vivencia uma epidemia de sífilis. A situação foi
reforçada em virtude do acórdão 2019/20171, do Tribunal de Contas
da União (TCU), que em seu texto reforça a importância da adoção
de medidas com vistas a mitigar os impactos da sífilis no sistema de
saúde brasileiro. De acordo com o artigo número 128 do documento:

Com a ampliação e implementação de estratégias diversifica-


das para prevenção da sífilis, é possível atingir maior impacto na
conscientização sobre a gravidade da sífilis em contrapartida à
facilidade da prevenção e tratamento da doença, maior impacto
da distribuição de preservativos, aumento do número de procura
por tratamento de portadores de IST, redução da cadeia de trans-
missão e redução do preconceito e estigmas relacionados às IST.

1 Disponível em: https://pesquisa.apps.tcu.gov.br/#/documento/acordao-


completo/3030020169.PROC/%2520/DTRELEVANCIA%2520desc%252C%
2520NUMACORDAOINT%2520desc/0/sinonimos%253Dfalse. Acesso em:
26/03/2022.

189
Capítulo 7

Conforme demostrado nos resultados alcançados na implementa-


ção do Programa Saúde na Escola (PSE) (parágrafo 125), é possível
perceber maior efetividade em programas de educação em saúde,
quando direcionados a públicos específicos (BRASIL, 2017b, p. 24).

Com o objetivo de modificar esse cenário, o MS criou


o Projeto de Pesquisa Aplicada para Integração Inteligente
Orientada ao Fortalecimento das Redes de Atenção para Resposta
Rápida à Sífilis (Sífilis Não!), executado por meio do Laboratório de
Inovação Tecnológica em Saúde do Hospital Universitário Onofre
Lopes (LAIS/HUOL), da Universidade Federal do Rio Grande do
Norte (UFRN). O projeto surge, assim, como o propósito também
de segmentar as iniciativas para o enfretamento da doença junto a
estes públicos específicos, como é o caso dos jovens e adolescen-
tes, populações que tendem a estar desassistidas de informações
relevantes sobre o tema no ambiente escolar.
Estratégias de pesquisa em educação em saúde que forta-
leçam cenários e sujeitos locais fazem parte da linha de pesquisa
do Projeto “Sífilis Não”, tendo como principal meta a intervenção
sobre o problema da sífilis no Brasil. O uso de mediação tecno-
lógica com foco na educação e comunicação para disseminação
de informações voltadas para profissionais, gestores, usuários,
população geral é previsto expressamente como tática a ser
implementada pela iniciativa.
Nesse contexto, foi planejado e elaborado um Recurso
Educacional Aberto (REA), intitulado “Saúde sexual na adolescên-
cia: precisamos falar mais sobre isso!”, direcionado a melhorar a
formação de familiares e educadores para a abordagem de temas
fundamentais para a discussão da saúde sexual de adolescentes e
jovens, bem como elucidar a necessidade de diálogo sobre ques-
tões pertinentes à saúde e sexualidade desta população.

190
Capítulo 7

Este REA surgiu com o intuito de preencher lacunas na área


tecnológica, identificadas pelo Ministério da Saúde: a ausência de
soluções locais produzidas no âmbito da capacitação em saúde
para a vida e, neste caso em especial, para a prevenção, tratamen-
to e promoção da saúde voltada à sífilis e outras IST no contexto
da população de adolescentes e jovens.
O processo de pesquisa, planejamento e elaboração do REA
foi ancorado nos conceitos pedagógicos de Paulo Freire, pauta-
do na perspectiva dialógica e reflexiva da educação popular em
saúde, buscando estabelecer uma relação de construção do saber
de forma compartilhada, respeitando os conhecimentos prévios
de cada indivíduo.
Desse modo, foram criadas rodas de conversa, no formato
virtual entre especialistas das áreas da saúde e educação, resul-
tando na criação de uma websérie, composta por dez episódios.
Para fomentar o debate virtual, foram elaboradas situações-pro-
blema, envolvendo dados estatísticos e casos fictícios relaciona-
dos às temáticas de cada episódio. Essas situações foram utilizadas
como um ponto de partida para o debate, mas não limitaram os
pontos abordados durante a discussão.
É válido salientar que o formato virtual das rodas de conver-
sa se deu em virtude da situação de pandemia de Covid-19 em
todo o mundo, e mediante as limitações impostas pelo cenário
(isolamento social, número limitado de pessoas por ambiente,
pessoas no grupo de risco), e impossibilidade de reuniões presen-
ciais. Foi necessária a adoção de maiores cuidados no processo
de desenvolvimento do recurso educacional, optando-se pela
utilização de plataformas de reunião virtual.
A ideia central desse momento de debate era trazer à tona
a discussão questões pertinentes à saúde sexual do adolescente
e que, por vezes, geram dúvidas ou insegurança entre familiares e

191
Capítulo 7

educadores, buscando evidenciar que diálogo aberto e horizontal


pode ser uma ferramenta útil para que estes indivíduos possam atuar
de forma ativa na promoção da saúde sexual dos adolescentes.
O curso foi dividido em duas unidades educacionais: 1 -
Diálogo familiar e educação saúde: estratégias para promoção
da saúde sexual entre adolescentes e jovens e 2 - Sífilis e outras
IST no contexto da saúde sexual de adolescentes e jovens. Cada
unidade é composta por cinco aulas, nas quais foram abordados
temas motivadores específicos que se relacionaram com os temas
das aulas subsequentes, seguindo assim, uma sequência peda-
gógica de aprendizagem, e de discussão de temas pertinentes à
promoção da saúde sexual de adolescentes.
Os debates virtuais e as aulas foram divididas de acordo
com os temas descritos a seguir:

Unidade 1 - Diálogo familiar e educação saúde:


estratégias para promoção da saúde sexual
entre adolescentes e jovens

1. A adolescência e a descoberta da sexualidade.


2. A precocidade da primeira relação sexual, comportamen-
to de risco, vulnerabilidade dos adolescentes.
3. Estratégias e programas voltados aos adolescentes. Onde
podemos melhorar?
4. O ensino sobre saúde sexual na escola: diálogo e uso de
métodos educativos inovadores.
5. A importância do diálogo aberto e horizontal sobre saúde
sexual em casa.

192
Capítulo 7

Unidade 2 - Sífilis e outras IST no contexto


da saúde sexual de adolescentes e jovens

6. O que são as IST e quais as mais prevalentes no Brasil?


7. A vulnerabilidade e o conhecimento dos adolescentes e
jovens sobre saúde e IST.
8. A epidemia de sífilis no Brasil.
9. Sífilis em gestantes e sífilis congênita: repercussões da
transmissão da sífilis para a criança ainda no útero.
10. Prevenção, testagem e tratamento da sífilis e outras IST:
a importância da promoção à saúde.

Após a gravação dos debates virtuais, o material passou pelos


processos de pós-produção e adaptação para o formato de REA, utilizado
nos cursos disponibilizados pelo Ambiente Virtual de Aprendizagem do
SUS (AVASUS). Foram inseridos materiais com textos de apoio e questões
avaliativas. Com o fim desta etapa, o REA foi encaminhado para a etapa
de validação de conteúdo por especialistas nas áreas de atenção à saúde
do adolescente, educação em saúde e educação mediada por tecnologia.
Com a conclusão das etapas de elaboração e validação, foram
realizados os ajustes pertinentes e o REA foi disponibilizado via internet
por meio da plataforma AVASUS com acesso aberto e gratuito para
toda a comunidade.
Espera-se que o constructo deste material seja capaz de aliar
conhecimentos científicos a atividades práticas, numa relação de ensi-
no-aprendizagem que demonstre a importância do diálogo e da educa-
ção sobre saúde e sexualidade. Para tal, este conteúdo visa fornecer
subsídios para familiares e educadores atuarem de forma efetiva na
promoção da saúde de adolescentes e jovens, bem como na diminui-
ção da vulnerabilidade desses sujeitos à sífilis e as demais infecções
sexualmente transmissíveis.

193
Capítulo 7

Referências

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Condições Crônicas e Infecções Sexualmente Transmissíveis
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194
Capítulo 7

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196
Capítulo 8
Olhares Interdisciplinares Sobre a Sífilis
Diálogos a Partir das Ciências
Humanas e Sociais em Saúde

Lucía Sanjuán Núñez


Universitat Autônoma de Barcelona, professora do
Departamento de Antropologia social e cultural, licenciada
em Medicina, diploma em saúde pública e doutora em
Antropologia social e cultural, [email protected].

Elizabethe Cristina Fagundes de Souza


Universidade Federal do Rio Grande do Norte. Professora
Titular. Doutora em Saúde Coletiva. [email protected] .

Ana Gretel Echazú Böschemeier


Universidade Federal de Rio Grande do Norte;
Professora Adjunta do DAN/PPGAS e pesquisadora
NESC e CNPQ. Mestre e PhD em Antropologia, Pós-
doutorado em Saúde Coletiva, [email protected].

Maria Valéria Credidio Freire Alves


Universidade Federal do Rio Grande do Norte; pesquisadora do
Laboratório de Inovação Tecnológica em Saúde - LAIS e dou-
toranda do Programa de Desenvolvimento e Sustentabilidade
Social da UAB-Portugal. [email protected] .
Capítulo 8

1. Introdução

A sífilis é hoje uma Infecção Sexualmente Transmissível (IST) de fácil


diagnóstico, testagem e tratamento de baixo custo. Contudo, reapa-
receu como um problema de saúde pública, com mais de 12 milhões
de pessoas infectadas no mundo (OMS, 2008), agravado pela croni-
cidade quando não ocorre o tratamento adequado e pela transmis-
são vertical durante a gestação, que produz sífilis congênita, com
cerca de 930 mil pessoas afetadas no mundo (KORENROMP et al.,
2019). Tais dados revelam apenas uma parte do problema, sendo
preciso reforçar caminhos teórico-metodológicos que tensionem
e complementem a perspectiva biomédica e epidemiológica sobre
a sífilis, ampliando o olhar para suas especificidades sociopolíticas,
históricas, econômicas e culturais. O presente capítulo apresenta,
de forma introdutória, visões plurais no campo da saúde coletiva
a partir do diálogo com algumas das áreas conexas ao subcampo
das ciências humanas e sociais em saúde: antropologia da saúde
e da parentalidade, feminismos interseccionais, decolonialidade e
educação popular em saúde, que podem contribuir para um olhar
multidimensional sobre a sífilis.

198
Capítulo 8

Faz-se importante destacar que a sífilis se situa entre muitos


outros agravos negligenciados1 no mundo e, além disso, causas estru-
turais relacionadas à queda da produção mundial da matéria-prima
da penicilina levaram vários países ao desabastecimento, acarretando
prejuízos no tratamento. No Brasil, vale salientar a pressão exercida
pelos órgãos de controle público federal para enfrentamento da sífilis.
Em setembro de 2017, o Tribunal de Contas da União emitiu Acórdão
em que recomenda ao Ministério da Saúde algumas iniciativas, entre
elas, o monitoramento e avaliação sistemáticos nos serviços de saúde
municipais, a priorização de ações dirigidas à populações-chave para
a sífilis adquirida, às gestantes e suas parcerias, o fortalecimento de
ações articuladas com estados e municípios para eliminação da sífilis
congênita, com identificação das principais causas do diagnóstico
tardio e tratamento inadequado das gestantes com sífilis, além de
estratégias para capacitação de profissionais de saúde na prevenção,
diagnóstico e tratamento da sífilis (LUCAS et al., 2019).
Entre as iniciativas desencadeadas para enfrentar o proble-
ma, o Ministério da Saúde superou o desabastecimento com a
compra centralizada da penicilina e convidou as esferas de gestão

1 Doenças negligenciadas são aquelas que persistem em várias partes


do mundo e atingem populações mais pobres, em áreas tropicais e
subtropicais, sendo negligenciados o desenvolvimento e investimentos
da indústria farmacêutica para tratamentos e também medidas eficazes
de saúde pública. São consideradas doenças geradas por condições de
pobreza, geradoras de pobreza e de estigmas sociais. A OMS estimou
que mais de um milhão de pessoas sofrem de uma ou mais de uma
dessas doenças e residem em lugares com alto risco de contraí-las.
Entre elas estão doença de Chagas, fasciolíase, helmintíases transmiti-
das pelo solo, hanseníase, leishmaniose, filariose linfática, oncocerco-
se, peste, raiva humana transmitida por cães, esquistossomose, sífilis
congênita, tétano neonatal, tracoma e algumas arboviroses. O Brasil
lidera na América Latina o número de casos de doença de Chagas,
leishmaniose, hanseníase, dengue e esquistossomose (PAHO, 2016;
FERREIRA, ANDRICOPULO, 2019).

199
Capítulo 8

municipais e estaduais a aderirem à estratégia nacional “Resposta


Rápida ao Enfrentamento da Sífilis nas Redes de Atenção” com
denominação usual Projeto “Sífilis Não”, desenvolvido em parceria
com a Universidade Federal do Rio Grande do Norte, e opera-
cionalizado a partir de duas grandes linhas de indução, apoio e
cooperação técnica (LUCAS et al., 2019). Sua ampla abrangência
de ações já foi apresentada na introdução desta coletânea.
A sífilis adquirida, talvez por ter tratamento e cura relati-
vamente simples quando comparados a outras infecções sexuais
transmissíveis (IST), por exemplo, HIV/Aids, parece não preocupar
tanto as pessoas quanto a sua prevenção. Isto pode também estar
relacionado ao fato de ainda predominar desconhecimento por
parte da maioria da população sobre as complicações da evolução
crônica da doença, em sua fase tardia com manifestações derma-
tológicas, cardíacas e neurológicas, e também sobre a transmissão
vertical da mãe para a criança durante a gestação (sífilis congêni-
ta) para além dos mais conhecidos e aparentes sinais e sintomas
que provocam desconfortos em órgãos genitais.
Também é importante destacar que as IST, de um modo
geral, são atravessadas pelos aspectos da complexidade que
compõem a sexualidade humana. No caso específico da sífi-
lis congênita, faz-se necessário ultrapassar a visão do binômio
mulher-“mãe”– criança, tradicionalmente presente nas práticas
e ações de saúde. Nestas prevalecem abordagens prescritivas de
responsabilização a partir do controle conceptivo do corpo lido
como “feminino” e dos corpos que não se enquadram dentro
da classificação de “feminino”2, de comportamento sexual e de

2 Neste trabalho, realizamos uma leitura de gênero que inclui a discussão


sobre o feminismo transgênero, colocando a necessidade de visibilizar os
corpos que nem sempre se identificam como “femininos” (JESUS, 2010).

200
Capítulo 8

direcionamento de práticas de puericultura, mesmo que tenha


havido esforços para ampliar o olhar no cuidado desta díade para
uma rede mais ampla de pessoas.
Destacamos que apesar de iniciativas oficiais de órgãos
internacionais e de sistemas nacionais de saúde para estimular o
desenvolvimento de políticas de saúde integrais, fruto de conquis-
tas da luta histórica de movimentos feministas e interseccionais,
ainda predomina nas ações e práticas sanitárias a visão restrita
de uma reprodução humana desarticulada da vida sexual e social
das pessoas, em seus diferentes ciclos etários.
Se nos concentrarmos no caso da sífilis, podemos apontar
certas limitações da biomedicina no que diz respeito a uma abor-
dagem abrangente: ela se baseia em uma estratégia de conhe-
cimento fundamentalmente biológica, que tende a fazer uma
interpretação unidimensional e universal da doença, desconsi-
derando as variáveis sociais e econômicas que condicionam sua
contração e as possibilidades de enfrentamento entre diferentes
grupos humanos, obliterando os conteúdos culturais relacionados
às representações da doença e os recursos para buscar ajuda. Ao
mesmo tempo, a biomedicina tem dificuldades em reconhecer
a existência de padrões culturais e fatores históricos, políticos e
socioeconômicos condicionantes de suas próprias categorias diag-
nósticas e da organização do atendimento em saúde. Contudo,
esta crítica não envolve negar a capacidade da biomedicina de
compreender os processos fisiopatológicos e de desenvolver uma
terapêutica que permita o controle da doença.
Neste texto, partimos da percepção da sífilis como um
problema de saúde complexo, socialmente relevante e atravessado
por desigualdades de ordem interseccional, que exige transcender
as disciplinas e as profissões em suas atuações de forma isolada.
Nesse sentido, é que propomos um diálogo, no marco da saúde

201
Capítulo 8

coletiva, entre as diversas disciplinas e olhares emergentes das ciên-


cias humanas e sociais em saúde como são a antropologia da saúde
e da parentalidade, os feminismos interseccionais, a decolonialida-
de e a educação popular em saúde, para ensaiar possíveis aborda-
gens que borrem limites disciplinares na perspectiva de alcançar
algumas limitações na nossa percepção do problema que possam
estar relacionadas ao reaparecimento da doença no contexto atual.

2. Potencialidades teóricas e metodológicas


das Ciências Humanas e Sociais em Saúde

A fins introdutórios, precisamos relembrar que o campo


da saúde coletiva no Brasil tem sido organizado a partir de três
grandes áreas: epidemiologia, políticas, planejamento e gestão em
saúde, e ciências humanas e sociais em saúde (PAIM; ALMEIDA
FILHO, 1998). Pretendemos traçar genealogias plurais que contri-
buam ao fortalecimento desta terceira área que se apresenta
como sendo minoritária na prática acadêmica e profissional da
saúde coletiva tanto no Brasil quanto em outros países. Sem
pretender apresentar um quadro exaustivo no que diz respeito à
gama de abordagens socioculturais, de gênero e comunicacionais
possíveis sobre a doença da sífilis, apresentamos essa sistemati-
zação com o intuito de facilitar uma construção teórica e meto-
dológica mais densa e multifacetada. Nesse ponto, é fundamental
salientar que as ciências humanas e sociais em saúde bebem de
diversas fontes. Assinalamos quatro delas: a antropologia da
saúde e da parentalidade, os estudos do feminismo interseccional,
as abordagens decoloniais e os olhares da comunicação popular
em saúde, que passamos a descrever colocando eles em diálogo
com a epidemiologia e outras especialidades biomédicas.

202
Capítulo 8

a. Antropologia da saúde e da parentalidade

A Antropologia da saúde é o ramo da Antropologia social


e cultural que estuda os processos de saúde, doença, atenção
e cuidados, abordando as diferentes conceptualizações sobre
o corpo, a pessoa, a saúde e a doença, os diversos fatores que
influenciam o estado de saúde e as necessidades de saúde das
populações, assim como os conhecimentos, práticas e instituições
que os grupos humanos utilizam para lidar com essas questões
(MARTÍNEZ, 1996; SANJUÁN et al., 2018).
O uso neste texto da expressão “Antropologia da saúde”
no lugar de “Antropologia médica” tem um duplo objetivo. Por
um lado, evitar-se a tendência de tomar a biomedicina como refe-
rência a partir da qual outros sistemas terapêuticos e compor-
tamentos relacionados à saúde são avaliados, salientando que
todas as populações têm concepções sobre saúde e doença que
se traduzem em comportamentos preventivos ou terapêuticos
que podem ou não coincidir com os biomédicos, mas que estão
presentes na vida diária dos/as sujeitos/as, independentemen-
te de serem (re)conhecidos. Por outro lado, a expressão tenta
superar a polarização entre as correntes internas, apresentando
o objeto de estudo da disciplina de uma forma abrangente.
De forma muito resumida (MARTÍNEZ, 2008), podemos
destacar que, desde os anos setenta do século passado, consoli-
dou-se uma perspectiva interpretativa ou hermenêutica e, mais
recentemente, fenomenológica, interessada nas dimensões cultu-
rais da doença, que presta mais atenção às representações do que
às suas causas, enfocando os discursos de aflição. Dentro disso,
destacam-se os estudos de Byron Good, que propõe entender a
doença não apenas como um processo biológico, mas também
como um conjunto de experiências e significados construídos

203
Capítulo 8

no curso da interação social (GOOD, 1977; GOOD, GOOD, 1981;


GOOD, 1994). Outro autor destacado, Arthur Kleinman, propõe
o estudo das interpretações das doenças, não só pelos pacientes,
mas também pelos profissionais e familiares, levando em conta
tanto as explicações “leigas” como também as da biomedicina e
de outros sistemas terapêuticos. Com uma abordagem “centra-
da no significado”, aponta que a doença pode ser compreendida
como um produto cultural de um grupo (KLEINMAN, 1980, 1988).
Posteriormente, surge a Clinically Applied Anthropology
(Antropologia Clínica Aplicada), que postula a aplicação do conhe-
cimento antropológico em colaboração com a biomedicina para
contribuir para a solução dos problemas de saúde das populações
(CHRISMAN; JOHNSON, 1990).
Desde o construtivismo social, autores como Allan Young (1982)
defendem o estudo das representações da doença e dos discursos de
aflição, assim como a dimensão social (sickness) em que são enqua-
drados, criticando o individualismo das abordagens interpretativistas
e propondo estratégias que focam na desigualdade social.
Desde a fenomenologia, as abordagens se centraram no
corpo, desde a experiência do sofrimento (KLEINMAN, 1995), a
superação da dualidade corpo-mente (SCHEPER-HUGHES, LOCK,
1987) ou a corporificação dos conflitos de hegemonia-subalterni-
dade (SCHEPER-HUGHES, 1997) (MARTÍNEZ, 2008).
Outros enfoques, abraçados pela Anthropology of Western
Medical Systems (Antropologia dos Sistemas Médicos Ocidentais),
focalizaram seu interesse na construção das doenças pela
biomedicina, compreendida, ela própria, como produto cultural
(MISHLER, 1981; HAHN; KLEINMAN, 1983; LOCK, GORDON, 1988).
No polo oposto, encontramos as correntes materialistas.
Desde o início da década de 1980, a Critical Medical Anthropology
(Antropologia Médica Crítica) surgiu na esfera anglo-saxônica,

204
Capítulo 8

incluindo aspectos da medicina social alemã, do marxismo e da


crítica ao colonialismo. São autores interessados nas desigualdades
sociais em saúde, que argumentam que a doença não é apenas um
conjunto de representações ou significados em torno dos sintomas
e do sofrimento, nem está ligada apenas à normatização, mas é
também uma consequência da pobreza e das relações de explora-
ção. Há uma diversidade de abordagens nesta corrente (MARTÍNEZ,
2008): por um lado, um setor materialista crítico (SINGER, 1989,
1990; BAER, 1982; SINGER, BAER, LAZARUS, 1990), centrado no
papel da economia política global e do capitalismo na produção de
doenças e nas possibilidades de cuidados, colocando o papel das
representações em um segundo lugar. Segundo essa abordagem,
a antropologia deve mostrar o papel das desigualdades de classe,
étnica e de gênero no processo de doenças e cuidados, negando em
alguns casos o trabalho conjunto com a biomedicina, mas insistindo,
na chamada Critically Applied Medical Anthropology (Antropologia
Médica Crítica Aplicada) (SCHEPER-HUGHES, 1990; SINGER, 1995)
na colaboração com esta para a eliminação das desigualdades.
Desde um culturalismo crítico, autores/as como Michael
Taussig (1980) e Nancy Scheper-Hughes (1997) entendem que a
doença é moldada por elementos sociais e culturais e criticam a
biomedicina por sua tendência a desconsiderar a ligação entre as
condições de vida e o desenvolvimento e experiência da doen-
ça, bem como a reprodução da ordem capitalista em categorias
diagnósticas e terapêuticas e, finalmente, sua ligação com meca-
nismos de controle social.
Finalmente, vale a pena destacar a produção de áreas não
anglo-saxãs, tais como Itália, Espanha, Brasil e México. Desde o
México, por exemplo, temos o trabalho de Eduardo Menéndez
(2018), que é mostrado como uma referência teórica com espírito
compilador de contribuições similares. Menéndez (1981) propõe

205
Capítulo 8

o termo Modelo Médico Hegemônico (MMH) para se referir ao


papel dominante da biomedicina em relação com outros sistemas
terapêuticos e aponta as estratégias das classes populares para
responder à sua posição subordinada, mostrando as limitações
crônicas e o domínio do discurso das elites que desconsideram
seus conhecimentos e práticas terapêuticas.
No Brasil, começa a se formar o campo da antropologia
da saúde a partir dos anos de 1990 (LANGDON, FOLLER, MALUF,
2012; FERREIRA, FLEISCHER, 2014). O médico e antropólogo
Martín Alberto Ibáñez Novión foi pioneiro no campo na década de
1980 – os textos dele foram organizados em coletânea de forma
póstuma (FLEISCHER, SAUTCHUK, 2012). Destacamos também a
antropóloga Madeleine Richeport que realiza pesquisas em antro-
pologia médica aplicada à análise dos sistemas de saúde, utiliza-
dos em um bairro da periferia de Natal, Rio Grande do Norte, no
Nordeste brasileiro (RICHEPORT, 1985), em uma joia etnográfica
que mostra um processo de construção dialógica do conheci-
mento e do papel reflexivo de uma antropóloga-articuladora em
campo, entre profissionais da psiquiatria e mães e pais de santo.
Na tentativa de conciliar esta multiplicidade de posições, a
antropologia da saúde propõe uma abordagem holística que enten-
de a saúde como um campo no qual as questões biológicas, sociais,
econômicas, históricas, ecológicas, políticas e culturais convergem e
se inter-relacionam em diferentes níveis e de uma forma dinâmica e
particular. Prestando atenção a conceitualizações sobre a pessoa e
o corpo, representações e narrativas sobre saúde e doença, observa
os processos de aquisição e transmissão de conhecimentos sobre
saúde e a construção de itinerários terapêuticos, tendo em vista a
diversidade de sistemas e instituições terapêuticas e pessoas legi-
timadas para o cuidado da saúde, assim como sua ligação com as
estruturas de poder e controle social (SANJUÁN et al., 2018).

206
Capítulo 8

Nesse sentido, a antropologia da saúde se entrosa com


fenômenos sociais subalternos com uma força analítica que emer-
ge de um forte viés etnográfico. Seja em serviços de saúde, seja
nas comunidades, seja dentro das casas, seja nas ruas, a antropo-
logia da saúde se ocupa do fenômeno multidimensional da saúde,
a doença e o cuidado de forma crítica e fundada nas demandas da
observação participante do fenômeno social sob análise.
Gostaríamos também de sinalizar uma nota rápida a respei-
to da abordagem da parentalidade, que dialoga de perto com os
estudos da antropologia da saúde. Os estudos da parentalidade
se dedicam às práticas de cuidado parental socialmente consti-
tuídas em sociedades contextualizadas têmporo-espacialmente.
A partir de contribuições pioneiras como a de John Borneman
(1997), que coloca a importância de pensar na centralidade das
relações de cuidado de forma a tensionar a abordagem conven-
cional dos estudos de parentesco na antropologia, algumas linhas
da antropologia do parentesco passam a abraçar os estudos de
gênero e realiza importantes contribuições dentro dos estudos
da parentalidade (DINIZ, 2000; FONSECA, 2004, 2008). Esses, por
sua parte, trazem ferramentas estratégicas para abordar questões
pouco estudadas relativas à alta prevalência da sífilis gestacio-
nal, problema sanitário fortemente atravessado por questões de
gênero – heterossexualidade compulsória, culpa e vergonha como
sentimentos cultivados socialmente na subjetividade feminina e
das pessoas com útero, cultura machista e masculinidades tóxicas,
arranjos de casamento violentos, injustos e desiguais, responsa-
bilização dos cuidados às mulheres, entre outros.
Em termos metodológicos, a antropologia baseia sua pesqui-
sa na etnografia, um processo de construção do conhecimento pelo
qual o/a antropólogo/a adquire conhecimento sobre uma realidade
sociocultural particular a partir da aplicação de técnicas de pesquisa

207
Capítulo 8

que lhe permitem construir/problematizar dados empíricos, em


um processo de ordenamento, seleção e análise realizado com a
finalidade de elaborar hipóteses sobre os temas que estão sendo
pesquisados (KOTTAK, 2002). A etnografia se baseia no trabalho de
campo, durante o qual o/a etnógrafo/a estabelece relações progres-
sivas e empáticas, respeitando os padrões de relacionamento social
do grupo com o qual trabalha, no contexto cotidiano em que vive
e durante o tempo necessário para que o conhecimento do fenô-
meno se torne robusto. No trabalho de campo, a sensibilidade é
desenvolvida por meio de uma série de técnicas de pesquisa funda-
mentalmente qualitativas e que são selecionadas de acordo com
as características da população e os objetivos do estudo (GUASCH,
2002). Dentre elas, se destacam a observação participante e as
entrevistas em profundidade.
A observação participante envolve o registro da vida diária
das populações a partir de uma imersão completa e próxima
no grupo e participação direta em suas atividades, por tempo
suficiente para compreender adequadamente os fenômenos de
interesse (PUJADAS, 2004). Esta técnica facilita o estabelecimen-
to gradual de relações de confiança, possibilita a familiarização
mútua, permite estar presente quando e onde as coisas aconte-
cem, facilita a compreensão do funcionamento das instituições,
a dinâmica interna das populações e as relações entre as pessoas,
instando a compreender e relacionar os fenômenos e, sobretudo,
a lógica subjacente às formas de pensar, decidir e agir no contexto
específico em que estes comportamentos ocorrem. A contextua-
lidade da produção das informações em antropologia represen-
ta um parâmetro central de confiabilidade científica dentro dos
parâmetros da área (SAN ROMÁN, 2009).

208
Capítulo 8

b. Feminismos interseccionais

Termo proposto na década de 1980 pela advogada e femi-


nista negra Kimberlé Crenshaw (1991), cuja genealogia descen-
tralizadora pode se remontar ao trabalho de feministas negras
brasileiras como Lélia González (1984), o termo foi depois explo-
rado por intelectuais engajadas, tais como a feminista norte-ame-
ricana Angela Davis (1981). A perspectiva interseccional postula
uma situacionalidade radical na produção do conhecimento. No
que diz respeito à área da saúde,

as abordagens de gênero na área da saúde procuram ir além das


mudanças individuais e, em vez disso, concentram-se na reestrutu-
ração das relações de poder que criam e mantêm as desigualdades
de gênero. A teoria da interseccionalidade é bem adequada para o
estudo da transformação de gênero em saúde, mas falta consen-
so sobre uma metodologia intersetorial claramente definida no
campo da saúde pública, particularmente para estudos quantita-
tivos (FEHRENBACHEL; DHARA, 2020, p. 1, tradução nossa).

A abordagem das interseccionalidades com foco na rela-


ção entre vulnerabilidade de gênero e racismo estrutural levou à
construção do campo de estudos críticos da “justiça reprodutiva”
(GUETA, 2020), que se propõe a analisar as barreiras de acesso
aos serviços de saúde, anticoncepção, cuidados pré e pós natais,
práticas de parto, acesso à informação confiável e outros direitos
essenciais que afetam as vidas das mulheres, e muito especial-
mente das mulheres racializadas como não brancas.
Na América Latina hispanofalante, abordagens vindas desde
os feminismos populares, feminismos comunitários e uma ética
do cuidado crítica pensados desde academia, movimentos sociais,
ONGs e dentro de setores progressistas dos próprios Estados
de países como Chile, Argentina, Uruguai e México têm trazido

209
Capítulo 8

mudanças significativas na maneira de encarar políticas de saúde


sexual e reprodutiva integral. Já no Brasil, as abordagens intersec-
cionais nos diversos campos de saber cresceram com força na últi-
ma década, impulsionadas por reflexões com alto impacto social
desde a filosofia (RIBEIRO, 2017) e o serviço social (AKOTIRENE,
2019). No que diz respeito ao estudo do contexto social de recepção
da sífilis, há dez anos, a pesquisadora Stella Taquette (2010) aponta-
va para alta incidência de IST, entre elas a sífilis, entre jovens negras
desde uma perspectiva interseccional. De forma mais contempo-
rânea, há estudos da área da psicologia (MORAIS et al., 2019) que
continuam reforçando a significatividade deste olhar teórico para
explicar a alta incidência de sífilis gestacional entre mulheres negras
e pardas no Brasil. Da mesma maneira, um estudo interseccional
nos permitiria compreender o acesso privilegiado a direitos, tais
como informação qualificada e atenção em saúde para mulheres
brancas e/ou de classes médias e altas.
A abordagem da interseccionalidade, para além de ser
compreendida como uma abordagem teórica com fortes bases
nos movimentos de luta pelos direitos civis norte-americanos
(CRENSHAW, 1991), também é uma estratégia metodológica críti-
ca especialmente significativa para a discussão e visibilização de
contextos de extrema vulnerabilidade social, assim como o forta-
lecimento da própria postura reflexiva do/a pesquisador/a no que
diz respeito a seu “lugar de fala” (RIBEIRO, 2017) e posicionamento
intersubjetivo dentro da grade de opressões e privilégios. No que
diz respeito à identificação de casos extremos, um exemplo do uso
da metodologia interseccional foi a experiência de articulação de
projetos da Fundação Oswaldo Cruz (2017) que abordaram casos
complexos na perspectiva de uma abordagem intersetorial desde
a gestão pública. Assim, o projeto Redes que teve lugar no ano
2017 em várias cidades do Brasil se dedicou a identificar mulheres

210
Capítulo 8

que sofriam violência de gênero em intersecção com outros tantos


fatores de vulnerabilidade social: raça-cor, etnicidade e classe eram
colocados em um lugar de visibilidade e tensionados ainda por
variáveis mais específicas, tais como situação de prisão, responsa-
bilidade por cuidados a vulneráveis, deficiência ou doença crôni-
ca, consumos problemáticos de drogas ilegais, orientação sexual,
nacionalidade e pertencimento religioso, entre outras.

c. Estudos da decolonialidade

Os estudos da decolonialidade se originam na década de


1990 a partir de reflexões latino-americanas sobre o caráter depen-
dente da formação de nossos sistemas de conhecimento (LANDER,
1993). O Sul Global, categoria de análise, corresponde mais à detec-
ção de espaços de poder submetidos a lógicas colonizadoras/colo-
nizadas do que a espaços propriamente geográficos, ainda quando
em muitos casos haja uma sobreposição de ambos (MIGNOLO,
2002). O Sul Global como projeto político colonizador partilha não
somente problemas semelhantes, mas também maneiras seme-
lhantes de encará-los. Para o filósofo espanhol Paul Preciado (2020),

a sífilis materializou nos corpos dos séculos XVI a XIX as formas


de repressão e exclusão social que dominavam a modernidade
patriaco-colonial: a obsessão pela pureza racial, a proibição dos
assim chamados ‘matrimônios mistos’ entre pessoas de dife-
rente classe social e ‘raça’ e as múltiplas restrições que pesa-
vam sobre as relações sexuais e extramatrimoniais. A utopia de
comunidade e o modelo de imunidade da sífilis é o do corpo
branco, burguês e sexualmente confinado na vida matrimo-
nial como núcleo da reprodução do corpo nacional (PRECIADO,
2020, p. 168-169, tradução nossa).

211
Capítulo 8

No ano 1899, o jovem médico negro baiano Juliano Moreira


publicou tese na qual indagou sobre as possíveis causas da doença
de acordo com a bibliografia da época e, por meio de observações
etnográficas, questionou a existência de preconceitos raciais em
relação a essa doença. Ele observou que a discussão sobre o caráter
degenerativo da sífilis de acordo com algumas raças era superficial e
limitada e refutou, enfaticamente, a tese da mestiçagem como fator
de degeneração. “Quantas são as raças? Onde termina a raça bran-
ca? Onde começa a amarela? Onde acaba? Onde começa a preta?”,
se perguntava, questionando a realidade biológica da diferenciação
racial (JACOBINA, 2014, p. 458). Esse pensador, longe de fortalecer
o preconceito racial, de classe e colonial próprio das análises tipi-
camente conservadoras da literatura médica da época, observou
que a sífilis era uma questão que devia interessar à saúde pública
da mesma forma que outras doenças epidêmicas mais visíveis tais
como cólera e febre amarela, por exemplo.
Alguns anos depois, em sua análise da “sociedade patriarcal
brasileira”, Gilberto Freyre destacou a doença da sífilis que teria sido
trazida para o Brasil pelos europeus e considerou que, devido ao regi-
me escravista, “o negro se sifilizou no Brasil” (JACOBINA, 2014, p. 338)
e o Brasil, de fato, teria “se sifilizado, antes de se tornar civilizado”
(JACOBINA, 2014, p. 83). Posteriormente, o antropólogo brasileiro
Sérgio Carrara (1996) trouxe as implicações histórico-antropológicas do
modelo de tratamento da sífilis dentro de uma ciência higienista nacio-
nal, mostrando pautas de definição desta como um produto do pensa-
mento atrelado ao cerne da política nacionalista no país. O fantasma da
sífilis produzia o medo do/a outro/a, e esse medo reforçava o ideário
eugenista nacional (LEYS, 1990), segundo o qual a barbárie das raças
inferiores devia ser expulsa do país, ou bem absorvida de forma lenta
e cuidadosa. É assim que, como outros tantos problemas sociossanitá-
rios, a sífilis – não em si mesma, mas em seus efeitos sociais, simbólicos

212
Capítulo 8

e culturais – pode ser compreendida como uma doença atrelada a uma


política dos corpos: uma política disciplinar, normalizadora e higieni-
zante, que se manifesta em práticas necropolíticas (MBEMBRE, 2003)
quando se direciona à periferia do Estado capitalista.
Gonzalo Basile (2020), sanitarista do Grupo de Trabalho sobre
Soberania Sanitária do Centro Latino-americano de Ciências Sociais,
salienta uma intensificação dos processos de neoliberalização, milita-
rização e tecnificação das doenças transmissíveis que se encontram
atrelados à cultura eugenista impressa nas escolas de formação em
saúde latino-americanas. Nos dois casos, a biocolonialidade do poder
(CAJIGAS-ROTUNDO, 2007) age de formas complementares, manten-
do o statu quo da ordem patriarcal, colonial, herteronormativa e racista
impressa nos corpos. À “episteme da escassez” sinalizada pelo autor, se
contrapõe a “episteme da abundância” e busca constante por horizon-
tes de bem viver nas culturas ancestrais (ACOSTA; MARTÍNEZ, 2009).
As abordagens metodológicas dos estudos da decolonialida-
de em saúde privilegiam o encontro de saberes (CARVALHO, 2018),
a construção dialógica de saberes em campo e postulam o lugar
do/a cientista não somente como “observador/a participante” mas
também como “mediador/a” de processos não somente sanitários,
mas também políticos, epistemológicos e culturais ao interior de
cada grupo ou comunidade (OCAÑA; ARIAS, 2019). O Sul Global,
ao reconhecer a si mesmo nas suas múltiplas localizações, ativa
diálogos Sul-Sul que permitem a resolução de problemas comuns a
partir de histórias convergentes e potencialidades compartilhadas.

d. Educação popular em saúde

Segundo Eymard Vasconcelos (2007), podemos definir


a educação popular como um saber que orienta nos difíceis

213
Capítulo 8

caminhos da ação pedagógica voltada para a apuração do sentir/


pensar/agir de todos os setores sociais – com foco no trabalho
realizado a partir dos setores subalternizados – contribuindo com
a construção de uma sociedade fundada na solidariedade, justi-
ça e participação de todos. Moacir Gadotti (1996) destaca Paulo
Freire, criador do Método de Alfabetização de Adultos, colocado
em prática inicialmente no interior do Rio Grande do Norte, como
uma das principais referências da educação popular. Seu método,
que recebe o próprio nome em sua denominação – Método Paulo
Freire –, é muito mais do que simples técnicas ligadas ao apren-
dizado da leitura e da escrita. O autor é enfático quando ressalta
que quando as pessoas

se percebem como fazedores de cultura, está vencido, ou


quase vencido, o primeiro passo para sentirem a importância,
a necessidade e a possibilidade de se apropriarem da leitura
e da escrita. Estão alfabetizando-se, politicamente falando
(GADOTTI, 1996, p. 37).

No desenvolvimento de ações efetivas para a transforma-


ção das pessoas, a educação popular se fortalece em movimen-
tos e políticas públicas, tendo como base os saberes das classes
populares, a construção e compartilhamento do conhecimento.
Conforme ressalta Vasconcelos (2007), a educação popular conta
com a participação de agentes eruditos, englobando neste grupo,
professores e profissionais da saúde e agentes sociais do povo. A
abordagem da educação popular tem como foco a construção de
uma participação coletiva efetiva “fomentando formas coletivas
de aprendizado e investigação para promover o crescimento da
capacidade de análise crítica sobre a realidade e o aperfeiçoamento
das estratégias de luta e enfrentamento” (VASCONCELOS, 2007, p.
21) às injustiças históricas que a sociedade padece.

214
Capítulo 8

Na mesma trilha de concepção, surge a educação popular


em saúde, um processo educativo direcionado para construção
do conhecimento na área da saúde. Documentos do Ministério da
Saúde do Brasil (BRASIL, 2018) ressaltam que esta área, envolvendo
educação e saúde, é formada por um conjunto de práticas voltadas
para aumentar a autonomia das pessoas, tanto no cuidado indivi-
dual como no diálogo com profissionais e gestores/as de saúde.
De acordo com César Augusto Paro (2020), a ideia de
Educação Popular em Saúde é reforçada “por componente cole-
tivo em que se produz os sentidos para o saber, para a saúde
e para a própria vida” (PARO, 2020, p.17). A mudança de práti-
cas na saúde, incluindo também o processo de formação dos/
as profissionais em saúde, tem como base uma sólida proposta
calcada em pilares de ação como o diálogo, a amorosidade, a
problematização, a construção compartilhada do conhecimento,
a emancipação e o compromisso com a construção de um projeto
democrático e popular. Esses aspectos, ressaltados por Souza et
al. (2020) são fundamentais no tocante à articulação entre uma
teoria e uma prática da saúde. Por toda a sua amplitude, o proces-
so de educação popular em saúde conta com diversos atores,
protagonizando as ações executadas em cada um de seus âmbi-
tos. Entre eles, podem-se destacar os movimentos sociais, agentes
populares de saúde, profissionais da área da saúde e professores/
as e pesquisadores/as de universidades (PEDROSA, 2007).
A educação em saúde espelha um campo diverso de conhe-
cimento, para o qual convergem diferentes concepções, com várias
compreensões do mundo, demarcadas por distintas posições político-
-filosóficas sobre o homem e a sociedade (SCHALL; STUCHINER. 1999).
A educação popular em saúde se apresenta como uma
alternativa para transformar a realidade vivenciada na aten-
ção básica, colocando conhecimento, tradições e costumes das

215
Capítulo 8

comunidades em consonância com as práticas científicas dos


cuidados à saúde. Essa consonância, de acordo com Machado et
al. (2007), parte do envolvimento de atores prioritários, partici-
pantes de três segmentos diferentes, composto por profissionais
de saúde, gestores e a população, individual e coletivamente, que
tem necessidade de construir conhecimentos e aumentar a auto-
nomia em seus cuidados.
Como processo político pedagógico, a educação popular
em saúde estimula o pensamento crítico e reflexivo, permitin-
do transformações que levem a comunidade à sua “autonomia e
emancipação como sujeito histórico e social, capaz de propor e
opinar nas decisões de saúde para cuidar de si, de sua família e
de sua coletividade” (MACHADO et al., 2007, p. 341).
A partir de revisão bibliográfica de estudos sobre práticas
de prevenção e tratamento da sífilis congênita desenvolvidas em
serviços de saúde, Débora Navega (2016) identificou destaque
para a importância de se estabelecer estratégias comunicacionais
e educativas que sejam dialógicas, compreensíveis e que evitem
julgamentos preconceituosos, contemplando as concepções e
histórias de vida das mulheres e de suas parcerias sexuais. Do
mesmo modo, foram destacadas a realização de testagem, acon-
selhamento psicossocial e a veiculação de informação da popu-
lação em geral. Nesse sentido, consideramos que as abordagens
educativas e comunicacionais sobre prevenção e tratamento da
sífilis pautadas nas metodologias da educação popular em saúde
podem ser uma estratégia potente para a promoção e atenção
à saúde integral.

216
Capítulo 8

3. Possibilidades e dimensões
de um diálogo interdisciplinar

O campo da saúde coletiva tem sido, desde sua constituição


por volta dos anos 1980, um espaço de tensionamentos teóricos e
também político-epistemológicos. Dentro dele, as ciências sociais
em saúde gozam de um lugar chave, gerando dados que problema-
tizam e complementam aqueles propostos pela abordagem epide-
miológica e da gestão de políticas públicas em saúde. O presente
texto faz parte de nosso posicionamento dentro da saúde coletiva
sinalizando a importância de um olhar horizontalizado, engajado e
integrador das ciências sociais em saúde dentro do campo.
Em consonância com esta abordagem, temos apontado a
capacidade da antropologia e as perspectivas emergentes dos
estudos interseccionais, decoloniais e da educação popular em
saúde para estabelecer uma relação de construção de conheci-
mento focada na qualidade dos vínculos em campo e na contex-
tualidade dos processos, coisa que permite um conhecimento
holístico e contextualizado das várias dimensões da sífilis.
A bagagem teórica e metodológica destas abordagens faci-
lita o acesso às diferentes dimensões da realidade que desem-
penham um papel no comportamento afetivo e sexual e nas
percepções sobre reprodução, que são fundamentais para a
abordagem da sífilis. A análise das diferentes variáveis macro e
microeconômicas e sociais também permitiria identificar os fato-
res associados às condições de vida e relações sociais que desem-
penham um papel em termos das possibilidades de transmissão
da doença e sua prevenção, assim como as consequências do
diagnóstico e as possibilidades de tratamento adequado.
A capacidade destas abordagens no que diz respeito ao
trabalho direto com as populações permite identificar também

217
Capítulo 8

os processos de transmissão de conhecimento sobre a doença:


o conteúdo, os meios e as pessoas que desempenham um papel
nestas questões e que precisam ser levadas em conta no geren-
ciamento da doença.
O trabalho conjunto da antropologia junto a abordagens
críticas emergentes no diálogo com as ciências humanas e sociais
em saúde permitem ter acesso às diferentes práticas e sistemas
terapêuticos que os/as sujeitos/as utilizam para atender à sua
saúde, podendo identificar como e de acordo com que critérios as
terapias e terapeutas são selecionadas/os ou não, as maneiras em
que os itinerários terapêuticos são construídos e que lógicas estão
subjacentes a eles, possibilitando propor projetos e ações de saúde
focados nas necessidades das pessoas e no reconhecimento de seus
direitos. Tais estratégias de produção de conhecimento também
permitem observar questões centrais para a compreensão de hábi-
tos socioculturalmente condicionados relacionados ao manejo da
sífilis, tais como a mudança de posição do/a sujeito/a no grupo,
família ou casal quando a doença é diagnosticada, como funcionam
as redes de apoio à saúde e o papel que elas desempenham em
seus contextos familiares e comunitários.
A antropologia da saúde e as abordagens emergentes
referidas resultam relevantes para a prevenção e a promoção da
saúde, pela sua capacidade para gerar um conhecimento aplicá-
vel de uma maneira útil e, ao mesmo tempo, ética e respeitosa.
Nos permitem reconhecer a raiz social da transmissão da doença,
problematizar o tabu, o estigma e a impureza do corpo com sífi-
lis, questionando abordagens prescritivas e descontextualizadas
da vida concreta de quem adoece, elaborados em programas de
saúde verticalizados e com enfoque no comportamento indivi-
dual. Nesse sentido, estratégias metodológicas das abordagens
das ciências humanas e sociais em saúde aqui apresentadas

218
Capítulo 8

trazem para o diálogo a agência e a subjetividade de pessoas e


populações afetadas pela sífilis para o centro do debate e podem
dialogar com as políticas públicas orientadas ao enfrentamento da
sífilis. Destaca-se, assim, a importância deste olhar na configura-
ção de uma educação sexual integral como educação cidadã, para
pessoas – sejam elas mulheres, homens, pessoas trans, pessoas
não binárias e outras dissidências sexuais (SALINAS, 2010) – de
todas as orientações sexuais, atribuições étnico-raciais, marca-
dores de deficiência e classes sociais.
O/a profissional que dialoga desde e com essas abordagens
se nutre de ferramentas que o/a permitam compreender a doen-
ça do ponto de vista dos diferentes atores envolvidos. Também
pode refletir junto a vários/as profissionais (da saúde, assistentes
sociais, educadores/as, entre outras profissões), enquanto que
“construtor/a de pontes”. Isso poderá fornecer elementos para
um exercício de distanciamento quando sujeitos/as em ato profis-
sional contemplam sua própria prática, seus próprios conheci-
mentos, lacunas e constrangimentos, incentivando a participação
corresponsável junto às populações e sujeitos/as, a compreensão
e respeito mútuos, o reconhecimento de capacidades e limita-
ções. Enfim, poderá fortalecer o potencial de grupos/atores
em campo para o mútuo aprendizado dentro da perspectiva de
encontros entre saberes.
Da mesma forma que ocorre com a biomedicina, a antro-
pologia e as abordagens emergentes que destacamos neste texto
apresentam potencialidades e limitações para enfrentar a enorme
complexidade dos fenômenos relacionados ao estado de saúde e
às necessidades particulares de saúde das populações. O cenário
se torna mais complexo quando nos referimos às desigualdades
sociais em saúde, múltiplas opressões ou populações minori-
zadas ou vulneráveis. Embora existam divergências e possíveis

219
Capítulo 8

críticas mútuas, celebramos a necessidade de alimentarmos


formas diferentes de ver a realidade e de acessá-la, estimulando
diálogos, assumindo tensionamentos e alimentando possíveis
complementariedades.
O desafio centra-se na abordagem dinâmica de uma reali-
dade complexa, heterogênea e mutável, utilizando o melhor de
nossa bagagem teórica e metodológica vinda de perspectivas
diversas da produção do conhecimento, aumentando as poten-
cialidades destes diálogos e diminuindo, desta mesma forma,
suas limitações. O desafio é nos aproximarmos da honestidade,
lucidez e generosidade consciente que envolve a compreensão
de que, em questões de saúde, a inter/transdisciplinaridade se
apresenta muito mais do que como uma disquisição intelectual: é
uma exigência inevitável que nos permite compreender, dialogar
e intervir melhor e de forma mais resoluta e ética nas realidades
sociais e culturais que acompanhamos.
Observamos que apenas a generosidade intelectual não
será suficiente para mudar as estruturas organizacionais que
sustentam as relações de poder legitimadoras de um saber sobre
outro e blindam territórios disciplinares como estratégia de sua
própria sobrevivência. No entanto, parece ser um passo importan-
te para abrir brechas de diálogo tendo o comum interdisciplinar
como o motor da produção de novas disciplinas mais includentes,
abrangentes e multifacetadas, naquilo que se propõe a transdis-
ciplinaridade ou, indo mais além do saber disciplinar para outros
saberes/abordagens, ou como sugeriu o filósofo argentino Juan
Samaja (2000) uma necessária “trans-sapiência”.
Resulta aconselhável, então, uma formação inter/transdis-
ciplinar básica em ciências humanas e sociais em saúde disponível
para os/as vários/as profissionais envolvidos/as neste assunto.
Combinar o treinamento de biomedicina, antropologia e outras

220
Capítulo 8

abordagens pode ser estratégico para oferecer cuidados qualifi-


cados em saúde abrangentes em seu sentido mais amplo, ou seja,
satisfatórios e eficazes não apenas do ponto de vista biológico/
epidemiológico, mas também do ponto de vista social e cultural.
Isso permitiria uma atenção mais completa e respeitosa à saúde
das populações, o que resultaria em melhorias em sua qualidade
de vida e, por extensão, na saúde pública e no âmbito mais amplo
da justiça social.
Finalmente, esperamos que nossa breve genealogia teóri-
co-metodológica de contribuições existentes e possíveis para o
campo das ciências humanas e sociais em saúde, a partir da pers-
pectiva da antropologia da saúde, os feminismos interseccionais, a
abordagem decolonial e a educação popular em saúde contribua
a problematizar a sífilis – e dentro desta, a sífilis congênita – como
doenças cruzadas por significados e condicionamentos sociais.
Tais fenômenos se encontram profundamente enraizados não
somente no campo de práticas da população geral, mas também
no campo técnico e de especialistas no tema. Esperamos que
outras iniciativas nesta direção continuem fortalecendo o diálo-
go interdisciplinar e alertando para a importância estratégica do
olhar das ciências humanas e sociais em saúde dentro do campo
da saúde coletiva.

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YOUNG, A. The Anthropology of illness and sickness. Annual


Review of Anthropology, [S. l.], v. 11, p. 257-285, 1982.

231
Capítulo 9
O Tratamento da Sífilis na Mídia
da Espanha e do BrasilL
Uma Análise das Campanhas (2010-2021)
Ana Cláudia Costa de Araújo
Doutoranda do Programa em Estudos da Mídia
da Universidade Federal do Rio Grande do Norte
e da Universidade Complutense de Madrid,
e-mail: [email protected].

Maria del Mar Marcos Molano


Professora Titular da Universidade Complutense
de Madrid (Facultad CC. de la Información).
[email protected].

Juciano de Sousa Lacerda


Professor associado do Departamento de Comunicação
Social da Universidade Federal do Rio Grande do Norte
e do programa de Pós-Graduação em Estudos da
Mídia (PPgEM). [email protected].

Almudena Muñoz Gallego


Investigadora Postdoctoral de la Universidad Complutense
de Madrid, e-mail: [email protected].
Capítulo 9

1. Histórico das campanhas do Ministério


da Saúde no combate às Infecções
Sexualmente Transmissíveis no Brasil

A sífilis é uma Infecção Sexualmente Transmissível causada pela


bactéria Treponema Pallidum que pode ser transmitida por meio
da relação sexual desprotegida ou durante a gestação da mãe
para o bebê. Em 2012, dados da Organização Mundial da Saúde
(OMS) estimaram a existência de aproximadamente 18 milhões
de casos de sífilis no mundo (WHO, 2016). Com isso, ainda que a
infecção apresente tratamento e cura, os índices de contágio da
doença seguem crescendo em países como o Brasil e a Espanha.
Embora os cenários epidemiológicos de cada país sejam
divergentes, a sífilis e outras IST de transmissão sexual passaram
a fazer parte da realidade de jovens e adultos que não conviveram
com a doença durante a década de 1980. Diante de um aumento
no número de casos, faz-se necessário que as autoridades em
saúde pública como Ministérios da Saúde promovam campanhas
de conscientização destinadas principalmente ao público jovem,
incentivando o uso do preservativo durante o ato sexual como
forma de se prevenir não só da sífilis, mas também de outras
doenças transmitidas através do sexo desprotegido.
Desse modo, para entendermos a forma com que as campa-
nhas de comunicação sobre IST são abordadas nesses dois países,
o capítulo foi estruturado em três tópicos: o primeiro tópico reali-
za um retrospecto sobre as campanhas de combate às IST realiza-
das pelo Ministério da Saúde no Brasil no período de 2010-2021; o
segundo tópico faz um relato sobre a comunicação empregada na
Espanha para combater essas infecções e, por fim, realizamos um
conclusão traçando um paralelo sobre as diferentes estratégias
empregadas em cada um dos países.

233
Capítulo 9

A narrativa de cuidados com a saúde e prevenção às doenças


sempre foi um discurso reforçado nas campanhas de saúde veicu-
ladas no Brasil. Desde o final da década de 1980, o Ministério da
Saúde promove campanhas para conscientizar a população quanto
à prevenção de enfermidades como o HIV/Aids (LACERDA et al.,
2019), dengue, tabagismo, câncer, entre outras doenças. Contudo,
enquanto a Aids era uma doença pautada periodicamente pelos
grandes portais de comunicação, a sífilis e outras infecções sexual-
mente transmissíveis foram pautas restritas e não receberam o
mesmo nível de atenção por parte da mídia e nem das campanhas
de comunicação pública desenvolvidas pelo Governo Federal.
Para entender como a sífilis tornou-se pauta dessas campa-
nhas no Brasil, selecionamos as campanhas do período de 2010 a
2021 que abordaram a temática em diferentes meios de comuni-
cação. Salientamos que os anos de 2011 e 2012 não apresentaram
nenhuma campanha citando a sífilis dentro do seu discurso de
comunicação em saúde.
Em 2013, o cenário mudou e a sífilis passou a ser abordada
nas campanhas do Ministério da Saúde de forma individual ou ao
lado de outras infecções como HPV, Gonorreia e Herpes. No ano
de 2017, instituiu-se o terceiro sábado do mês de outubro como
o Dia Nacional de Combate à Sífilis e à Sífilis Congênita através
da Lei nº 13.430/2.017 que visa incentivar profissionais de saúde,
gestores e a população em geral a participar de campanhas que
tratam sobre prevenção, diagnóstico e tratamento da sífilis congê-
nita e adquirida. Logo após a instituição dessa lei, a sífilis ganhou
notoriedade nas ações de comunicação do Ministério da Saúde
que passou a realizar periodicamente campanhas sempre no mês
de outubro em alusão ao dia D de combate à sífilis.
Após dois anos consecutivos sem realizar nenhuma campa-
nha voltada para o combate à sífilis congênita e adquirida, em

234
Capítulo 9

2013, o Ministério da Saúde motivado pelos altos índices de sífilis


em gestantes desenvolveu uma campanha destinada às mulhe-
res gestantes, profissionais de saúde e gestores com o intuito de
conscientizar essa população-alvo sobre a importância de realizar/
incentivar o diagnóstico da sífilis durante o pré-natal como forma
de prevenir o bebê da sífilis. Com o mote “seu bebê precisa da sua
proteção antes mesmo de nascer” (BRASIL, 2013), todas as peças
da campanha foram protagonizadas por uma mulher gestante,
de cabelos lisos e escuros, pele branca e traços caucasianos que
está segurando a barriga e é incentivada a realizar o teste rápido
da sífilis em uma Unidade Básica de Saúde.
A campanha foi veiculada na mídia impressa por meio de
cartazes com os temas “grávida” e “profissional de saúde”. Na
internet, as peças foram veiculadas principalmente nas redes
sociais digitais – neste caso, o Facebook – por meio de banners,
capa de Facebook, post para as redes sociais, filme publicitário
de 45 segundos, além de e-mail marketing destinado aos profis-
sionais de saúde e gestores. No vídeo, a mulher gestante surge
caminhando pela rua em direção a uma Unidade Básica de Saúde,
enquanto que a narração é realizada também por uma voz femi-
nina ressaltando a importância de proteger o futuro do bebê e
realizar o teste rápido da sífilis no início da gravidez.
No ano seguinte, no período de 25/02/2014 a 31/12/2014,
o Ministério da Saúde lançou durante o carnaval a campanha “Se
tem festa, tem que ter camisinha” (BRASIL, 2014) destinada à
população em geral com o intuito de conscientizar a sociedade
sobre a importância de usar preservativo na prevenção contra
a Aids, sífilis e hepatites virais. Embora a sífilis não tenha sido a
pauta principal da campanha, todas as peças que foram veiculadas
citaram a infecção e reiteraram a necessidade de realizar o teste
da sífilis como forma de tratar e se curar da doença.

235
Capítulo 9

A campanha foi veiculada por meio da mídia impressa,


televisiva, rádio e internet através das seguintes peças: cartazes
impressos, banner para redes sociais, mini folder e material de
apoio como camiseta, porta-documentos, bolsa, bandana, dois
filmes publicitários veiculados na TV e Internet com duração de
30” intitulados por “Festa” e “Fantasia”. A divulgação da campa-
nha foi reforçada no decorrer dos períodos festivos do ano de
2014 como forma de incentivar o público, principalmente, a popu-
lação jovem, a usar preservativo no momento da relação sexual,
evitando infecções como sífilis, hepatites, entre outras.
Em 2015, para o Dia das Mães, o Ministério da Saúde propôs
uma campanha sucinta de combate às Infecções Sexualmente
Transmissíveis como Sífilis, Hepatites virais e Aids. Os materiais
publicitários elaborados para essa campanha de comunicação
pública foram: cartaz para impressão, vídeo de 42 segundos, peças
para veiculação em redes sociais e sites. As peças da campanha
foram protagonizadas pela mesma atriz da campanha veiculada
em 2013, isto é, mais uma vez, o Ministério da Saúde usou uma
atriz branca, com traços caucasianos e cabelo liso para ser porta-
dora do discurso de cuidado e saúde sobre uma infecção que
atinge majoritariamente mulheres pretas e pardas.
Com o discurso “Estes sorrisos são o resultado de um pré-na-
tal completo” (BRASIL, 2015), a campanha teve o intuito de incenti-
var as futuras mães a realizarem os testes de sífilis, hepatite e Aids
antes mesmo de o bebê nascer, evitando a transmissão vertical
dessas infecções. O conceito criativo atribuiu a felicidade da mãe
e do bebê ao fato de que os dois estão saudáveis. O vídeo tem
como cenário um quarto de bebê, espaço onde se passam todas
as cenas do filme que tem apenas como personagens a mãe e o
bebê. A trilha sonora é uma música de ninar em paralelo que uma
voz feminina narra o vídeo e todos os momentos de cuidado que a

236
Capítulo 9

mãe tem com o seu filho como o momento do banho, aleitamento,


e realização dos testes de HIV, sífilis e hepatites. Por fim, o narra-
dor de voz masculina encerra o vídeo incentivando a procura por
uma unidade de saúde e também a realização dos testes durante o
pré-natal. Nenhuma das peças da campanha de 2015 cita a parceria
sexual como responsável por também realizar o teste de sífilis, um
padrão que se repete desde as campanhas anteriores.
No ano de 2016, o Ministério da Saúde seguiu abordando
a sífilis congênita sem qualquer tipo de abordagem sobre a sífilis
adquirida. Com o slogan: “Casal que combina em tudo não pode
deixar de proteger seu bebê” (BRASIL, 2016), a campanha teve
como objetivo a conscientização não só da gestante, mas também
da parceria sexual que pela primeira vez passou a protagonizar
as campanhas do Ministério da Saúde no combate à sífilis congê-
nita. A campanha foi destinada principalmente às redes sociais
(Facebook e Twitter) e veiculada por meio de banner, e-mail
marketing, vídeo, cartazes e folder.
Em 2017, o Ministério da Saúde elaborou pela primeira vez
no país duas campanhas direcionadas ao combate à sífilis congêni-
ta. A primeira direciona o discurso de prevenção e cuidado para a
figura paterna. Se antes essa responsabilidade era colocada exclu-
sivamente para a mãe, a campanha de 2017 consolida a figura do
pai como alguém importante no combate à infecção, visto que é
fundamental que não só a gestante, mas também o seu parceiro
sexual realize o teste da sífilis durante a gestação. Com o enun-
ciado “Filho, fazer o pré-natal junto com a mamãe foi o primeiro
passo para esperar você” (BRASIL, 2017a), a campanha foi veicu-
lada por meio de cards e vídeos para as redes sociais (Facebook e
Twitter), além de e-mail marketing e cartazes para mídia impressa.
Ainda no ano de 2017, o Ministério da Saúde produziu
uma nova campanha direcionada ao Dia de Combate à Sífilis. A

237
Capítulo 9

mensagem “Faça o teste de sífilis. Proteja o seu futuro e o do seu


filho” (BRASIL, 2017b) teve o objetivo de conscientizar homens
e mulheres a realizarem o teste da sífilis durante o pré-natal da
gestante. As peças trazem um tom lúdico que marca a identida-
de da campanha, com a ideia de futuro associada a elementos
gráficos tridimensionais e animações do que poderia ser o futuro
da criança na barriga das mulheres grávidas” (LACERDA et al.,
2019, p. 7). Diferentemente das campanhas anteriores, a campa-
nha também consolidou a ideia de que o cuidado com a saúde
do bebê é responsabilidade do casal e, portanto, os dois devem
fazer o teste de sífilis para proteger o futuro do filho. A campanha
foi protagonizada por três casais representados por: uma mulher
branca + homem branco, uma mulher negra + homem negro e um
homem branco + mulher negra. No enunciado das peças gráficas,
chama a atenção que, pela primeira vez, o Ministério da Saúde
menciona nas suas campanhas o fato de o Brasil vivenciar uma
epidemia de sífilis. Desse modo, a veiculação contemplou peças
para mídia impressa, internet, rádio e mídia televisiva.
No mês de outubro de 2019, após a veiculação de uma
campanha massiva sobre sífilis, o Ministério da Saúde divulgou
uma nova campanha de combate não só da sífilis, como também
da gonorreia, HIV, hepatite, herpes, cancro mole e gravidez não
planejada. Com o enunciado “Sem camisinha, você assume o
risco de pegar uma Infecção Sexualmente Transmissível” (BRASIL,
2019), percebe-se que o conceito proposto para essa campanha
foi de encontro ao posicionamento que vinha sendo adotado nos
anos anteriores. Ao invés de apresentar um discurso de prevenção
e educação sexual, o Ministério da Saúde adotou um tom hostil,
e vinculado ao medo, reforçando ainda mais o estigma em torno
das IST. Os cartazes foram protagonizados por atores jovens, que
sob uma expressão de repulsa, pesquisam o termo ‘sífilis imagens’,

238
Capítulo 9

entre outras IST. A campanha teve veiculação na mídia impressa


(cartazes), mídia exterior (mobiliário urbano e minidoor), internet
(banner, Facebook, Twitter, Instagram e Youtube), VT publicitário
com versão de 15”, 30” e mais de um minuto. No vídeo oficial
da campanha, os jovens aparecem olhando imagens das IST e
reagindo com medo, repulsa e pânico, enquanto que a locução
masculina fala “Se ver já é desagradável, imagine pegar”, refor-
çando o tom agressivo e pouco instrutivo adotado em todas as
peças da campanha.
A campanha “Usar camisinha é uma responsa de todos”
(BRASIL, 2020) foi veiculada no ano de 2020 pelo Ministério da Saúde
e abordou não só a sífilis, mas também outras Infecções Sexualmente
Transmissíveis como o HPV, HIV, herpes genital, gonorreia, hepatites
(B e C). As peças direcionaram a mensagem principal da campanha
para o uso do preservativo durante a relação sexual como forma de
prevenção, contudo, o discurso de cuidado e saúde da campanha não
evidenciou o quão importante é realizar o teste rápido para diagnos-
ticar tais infecções e, assim, buscar o tratamento adequado em uma
Unidade Básica de Saúde. A campanha foi veiculada na internet, mídia
impressa e rádio, por meio de folder, spot, cartazes, vídeo e posts
para divulgação nas redes sociais do Ministério da Saúde. Com o intui-
to de dialogar com a população jovem, a campanha foi protagonizada
por homens e mulheres na faixa dos 20 a 29 anos. Dentre as peças
gráficas disponíveis no repositório do Ministério da Saúde, os cartazes
e folders foram protagonizados por um jovem branco que aparece
sorrindo e segurando um preservativo na mão. Os demais materiais
de divulgação escolhem uma IST como tema principal informando os
possíveis sintomas da enfermidade, acrescido de uma foto da lesão
com o intuito de “chocar” os receptores da mensagem.
Para 2021, o Ministério da Saúde propôs a campanha
“Sífilis’’. O diagnóstico é o primeiro passo para a cura” (BRASIL,

239
Capítulo 9

2021) visando combater a sífilis congênita. A campanha foi veicu-


lada durante o mês de outubro, em alusão ao Dia Nacional de
Combate à Sífilis, destinada a gestantes, parcerias sexuais, profis-
sionais de saúde e população em geral. Ademais, as peças voltadas
para a conscientização de gestantes e parceria sexual relembram
as campanhas iniciais do MS que eram destinadas, principalmente,
à abordagem da sífilis gestacional e congênita. Embora o material
de campanha proposto pelo MS trate sobre a sífilis adquirida,
a maior parte das peças tratam sobre a sífilis congênita, trata-
mento, diagnóstico e a importância de realizar o teste da sífilis
durante o pré-natal como forma de se prevenir da enfermidade. A
veiculação da campanha foi realizada por meio de material gráfico
disponível para uso digital e impresso como cartazes e folders,
além de e-mail marketing, peças em formato de card/vídeos para
redes sociais (Facebook, Instagram, Twitter e WhatsApp) e spot
para veiculação em rádio.

2. A comunicação sobre Infecções


Sexualmente Transmissíveis na Espanha

Em 2019, a imprensa espanhola advertiu sobre o cresci-


mento das infecções sexualmente transmissíveis, um crescimento
entre 20 e 40% (MOUZO, 2019). O objetivo era alertar a popula-
ção, já que o documento mencionava como estas doenças estão
disparando na Espanha: de acordo com o Ministério da Saúde, em
10 anos, só a sífilis cresceu 155%.
Neste sentido, que tipo de comunicação interessa ao
comunicador científico para combater a doença? Qual é a comu-
nicação mais eficaz? Este debate torna possível nos situarmos
na complexa linha de popularização (com) a ciência. Porque

240
Capítulo 9

embora o propósito da comunicação seja informar e oferecer o


que consideramos importante para os cidadãos e submetê-los à
sua análise e reflexão, outros propósitos ainda mais complexos
de comunicação envolvem convencer – querer que mensagens
sejam aceitas e assumidas – ou persuadir – incitando à ação. É
aqui que está provado que a mensagem informativa eficaz passa
por uma comunicação que vai diretamente ao cérebro com razões
e argumentos que são aceitos pelo cérebro, mas também provoca
sentimentos e, portanto, a reação do cidadão para modificar e
colocar em prática certos comportamentos.
O discurso da persuasão combina a parte racional com
a parte afetiva, convencendo o cérebro e os sentimentos (DE
SANTIAGO GUERVOS, 2017). Primeiro, devemos convencê-los
da bondade de nossa proposta com argumentos apropriados e
depois provocar reações afetivas que os predispõem a aceitar
nossa proposta. Se conseguirmos despertar as emoções do ouvin-
te, eles estarão mais receptivos às nossas palavras.

2.1. Essas campanhas são eficazes?

Os jovens espanhóis pensam erroneamente que as


Infecções Sexualmente Transmissíveis só podem ser transmitidas
por estranhos, que só existem em ambientes ligados às drogas e
à prostituição, e até mesmo que algumas dessas doenças, as mais
comuns, não existem mais. O problema das doenças venéreas,
no contexto das campanhas publicitárias realizadas na Espanha,
foi transferido para o uso de preservativos, como demonstra esta
comunicação persuasiva, talvez não científica, porém mais eficaz
na medida em que atinge mais a sociedade. As campanhas procu-
ram conscientizar os jovens sobre o uso de preservativos diante

241
Capítulo 9

do aumento das infecções sexualmente transmissíveis e, no entan-


to, enquanto estas aumentam em 26%, o uso de preservativos cai
para 75% (RTVE, 2019).
Em 2019, o Ministério da Saúde lançou a campanha “No te
compliques #SiemprePreservativo”, com a intenção de transmitir
à população, especialmente aos mais jovens, que os preservativos
são a melhor barreira e proteção contra as infecções sexualmente
transmissíveis, diante do aumento destas. A campanha é marcan-
te pelo aspecto ingênuo de seu design: sobre um fundo limpo
e monocromático de verdes ou rosas muito suaves, aparecem
desenhos de uma cama de casal, de um carro e de uma barraca
de acampamento. Estes desenhos dão lugar a um texto que se
sobrepõe ao fundo à medida que as letras aparecem.

Figura 1 – Campaña No te compliques #SiemprePreservativo, 2019.


Fonte: Ministerio de Sanida (2019).

242
Capítulo 9

Uma frase dá sentido às imagens ao descrever ações


comuns dos jovens: “es normal que quieras hacerlo en la cama
de tus padres; es normal que quieras probar los asientos traseros
del coche y de meter primera y segunda y tercera; o de darte un
festival… lo que no es normal es que tengas ganas de complicarte
la vida: no te compliques y usa siempre preservativo”. O Ministério
da Saúde espanhol dedica poucas campanhas às infecções sexual-
mente transmissíveis, dando maior presença a infecções como a
Aids, que tem uma campanha por ano em seu site, pelo menos
para o Dia Mundial da Aids.
Curiosamente, a campanha de 2021 vai além da descrição
da doença ou do aviso de que é um vírus que ainda é relevante –
“A AIDS não é uma coisa do passado, tenha isso em mente” (2014);
“Sem preservativo não há volta a dar” (2017) – lançando a campa-
nha #LivePositive, que aborda o estigma e a discriminação histori-
camente associados ao HIV, e assegura igualdade de tratamento
e oportunidades, respeito e diversidade de pessoas, conforme
delineado no Pacto Social para a não discriminação e igualdade
de tratamento associado ao HIV promovido pelo Ministério em
2019: “Los avances en los tratamientos y en la atención sanitaria
han mejorado la esperanza y la calidad de vida de las personas con
el VIH convirtiendo la infección en una enfermedad de evolución
crónica. Sin embargo, siguen experimentando un trato discrimi-
natorio en ámbitos como el sanitario, el laboral y en el acceso
a prestaciones y seguros” (Ministerio de Sanidad, Campaña Día
Mundial Del Sida 2021).

243
Capítulo 9

2.2 Marcas para campanhas eficazes:


o caso de Durex na Espanha

A marca Durex tem trabalhado para informar os jovens


sobre outras consequências das infecções sexualmente trans-
missíveis, incluindo doenças como o câncer e a infertilidade.
Fazer sexo sem camisinha parece ser um gesto normal entre os
jovens que muitas vezes “esquecem” os riscos envolvidos. Estas
campanhas encorajaram uma mudança de comportamento em
relação ao uso de preservativos e a visibilidade das consequências
da contração de doenças que, embora curáveis, também podem
acompanhá-los para o resto de suas vidas.
Em 2018, a Durex lança sua campanha “Ten una cita con
Durex”, 4 vídeos de 20 segundos que utilizam a nova imagem
dos modelos para provocar emoção. Uma locução acrescen-
ta significado às imagens, talvez um pouco estranhos – fundos
limpos, neutros, artificiais, atuação exagerada.... No cenário,
desfilam personagens representando jovens com uma aparência
extraordinária: “Procurando um livro..., este é Pablo, esportivo,
carismático, autoconfiante... e ele tem herpes genital, mas não
o conhece. Quando você encontra alguém, você só vê o melhor
neles” (LOCUÇÃO). Em uma segunda parte, oferece o fato de que
um caso de DST é diagnosticado a cada 30 minutos, e até acres-
centa a fonte para dar mais rigor institucional aos dados: “Ten una
cita segura con Durex, cumple con la normativa”.
Muito mais agressiva é a campanha 2019 intitulada “Tú
Decides, #UsaCondon”, que usa uma linguagem fictícia com
uma montagem tremendamente rítmica de imagens de festas,
imagens noturnas e a própria voz-off da protagonista provocando
a reação emocional e predispondo o público a ouvir a mensagem.
Enquanto isso, o texto oferece informações sobre os riscos da

244
Capítulo 9

doença: “Eu nem pensei em usar um preservativo. A clamídia


que me deixou infértil. O que ela fez naquela noite, inesquecível”
(locução anúncio). A voz-off nos leva ao desfiladeiro enquanto
vemos a protagonista sentada em sua cama nos encarando. O
texto apela para o cérebro, uma vez que ele tenha apelado para
as emoções (ele está em conformidade com os regulamentos de
produtos de saúde). Você decide o que pode acontecer com você
se não usar preservativo. A campanha consiste em 4 vídeos de 25
segundos, nos quais um jovem personagem, usando flashback,
conta a história de um encontro sexual improvisado e infeliz por
falta de proteção, seja por gosto de ter sexo de forma “natural”,
seja por esquecer de usar preservativo: o final do vídeo termina
com o personagem olhando para a câmera e descrevendo alguns
dos sintomas que ele desenvolve após aquela “noite inesquecível”
(Figura 2). A campanha sofre de uma realidade crua para expor os
resultados destas práticas, o que é um exercício interessante de
responsabilidade corporativa e linguagem persuasiva.

Figura 2 – Campanha Tú decides #Usacondón, 2019.


Fonte: We are cp (2019).

245
Capítulo 9

Na Espanha, são as marcas comerciais que geram campanhas


maciças de conscientização para os jovens sobre a importância das
infecções sexualmente transmissíveis. Essas campanhas procuram
destacar comportamentos inadequados diante de práticas sexuais
desprotegidas. Estas campanhas, longe de dar lições aos jovens, procu-
ram incentivar as boas práticas sexuais, o que só pode acontecer quan-
do as pessoas se sentem seguras. Estes vídeos procuram um lugar
de reflexão, de questionamento de más práticas, de educação e de
liberdade sexual. Em suma, desfrutar de uma sexualidade prazerosa,
mas, sobretudo, uma sexualidade “inesquecível” porque é saudável.

3. Conclusões

O Brasil tem um forte histórico de campanhas de comunicação


de cunho institucional realizadas pelo Ministério da Saúde. No perío-
do analisado, de 2010 até 2021, identificamos nove campanhas com
discurso de combate às Infecções Sexualmente Transmissíveis que
com o passar dos anos distinguiram-se quanto ao público-alvo, objeti-
vo de comunicação, IST abordadas como pauta-chave da campanha,
além dos meios de comunicação utilizados para sua veiculação. Além
disso, verificamos que as campanhas de combate às IST tornaram-se
mais frequentes por parte do Ministério da Saúde à medida que o
número de casos de sífilis adquirida e congênita foram crescendo.
Esse esforço por parte do Ministério da Saúde consolidou-se logo
após a promulgação da Lei nº 13.430/2.017, responsável por insti-
tuir o terceiro sábado do mês de outubro como o Dia Nacional de
Combate à Sífilis e à Sífilis Congênita.
Por outro lado, na Espanha, descobrimos que a comunica-
ção se concentra principalmente no HIV, uma doença que passou
por uma extraordinária progressão em seu desenvolvimento,

246
Capítulo 9

passando de alertar sobre seus efeitos para oferecer um olhar


sobre o estigma sofrido por seus pacientes. As campanhas agora
visam a conscientizar “o outro”, aquele que não sofre da doença,
aquele que pode mudar a maneira de ver e entender as pessoas
que vivem com Aids.
No que diz respeito à comunicação sobre Infecções
Sexualmente Transmissíveis, verificamos que as campanhas do
Ministério da Saúde são poucas com apenas uma expressamen-
te dedicada a elas nos últimos dez anos. Dado que o problema do
aumento dessas infecções foi transferido para o não uso de preser-
vativos, são as grandes marcas como a Durex que têm as melhores
campanhas. Campanhas com uma linguagem muito próxima ao públi-
co jovem que adaptam sua gramática aos novos meios de comunica-
ção, numa tentativa de provocar uma mudança de comportamento.
Entretanto, um aspecto muito interessante aparece aqui:
a desinstitucionalização das campanhas no caso da Espanha.
Em outras palavras, são as marcas sem um selo institucional
que promovem este tipo de práticas em favor da marca. Este
desenvolvimento gera controvérsia entre o público ao mudar a
natureza da fonte da mensagem. Os jovens ou o alvo específico
das campanhas publicitárias realizadas por uma marca recebem
a informação como consumidores e sentem intrinsecamente a
natureza do consumo do produto que está sendo induzido.
É claro que, neste sentido, a marca está explorando um
nicho publicitário que não é coberto pela instituição competente.
Entretanto, aqui reside o nível de comprometimento de cada país
– Brasil e Espanha – em sua tentativa de diminuir as taxas de trans-
missão de doenças infecciosas. A comunicação em saúde pública
é altamente relevante para o comportamento saudável de nossa
sociedade e deve estar sempre sob regulamentação responsável
e sustentada.

247
Capítulo 9

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Combate à Sífilis Congênita 2016: casal que combina em tudo
não pode deixar de proteger seu bebê. Brasília, DF: Ministério
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Capítulo 9

BRASIL. Ministério da Saúde. Campanha Dia Nacional de


Combate à Sífilis 2017: proteja o seu futuro e o futuro do seu
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http://www.aids.gov.br/pt-br/campanha/dia-nacional-de-
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Congênita 2017: filho, fazer o pré-natal junto com a mamãe foi
o primeiro passo para esperar você. Brasília, DF: Ministério da
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2CAE702284E6FF5639329D0431B524?sequence=1. Acesso em:
29 mar. 2022.

251
Capítulo 10
Análise Qualitativa Audiovisual
de Uma Websérie Sobre Prevenção
da Sífilis no Brasil
Análisis Cualitativo Audiovisual
de Una Webserie Sobre Prevención
de la Sífilis en Brasil

Juciano de Sousa Lacerda


Laboratório de Inovação Tecnológica em Saúde
da Universidade Federal do Rio Grande do Norte.
Programa de Pós-graduação em Estudos da Mídia
da Universidade Federal do Rio Grande do Norte.
E-mail: [email protected].

Nicolás Lorite García


MIGRACOM, Observatorio y grupo de investigación
sobre inmigración y comunicación da Universidade
Autônoma de Barcelona. E-mail: [email protected].

Lucía Sanjuan Nuñez


GRAFO, Grup de Recerca en Antropologia
Fonamental i Orientada da Universidade Autônoma
de Barcelona. E-mail: [email protected].
Capítulo 10

José Antonio Jiménez de las Heras


CAI-CREAV, Centro de Apoyo a la Investigación de
Creación de Contenidos Audiovisuales y Digitales
para la Docencia e Investigación da Universidade
Complutense de Madri. E-mail: [email protected].

Maurício Oliveira Jr.


Laboratório de Inovação Tecnológica em Saúde
da Universidade Federal do Rio Grande do Norte.
E-mail: [email protected].

Kaline Sampaio
Laboratório de Inovação Tecnológica em Saúde
da Universidade Federal do Rio Grande do Norte.
E-mail: [email protected].

Lilian Carla Muneiro


Laboratório de Inovação Tecnológica em Saúde
da Universidade Federal do Rio Grande do Norte.
Departamento de Comunicação Social da
Universidade Federal do Rio Grande do Norte.
E-mail: [email protected].
Este texto forma parte del
proyecto “Investigación Aplicada
a la Integración Inteligente
Orientada al Fortalecimiento
de las Redes de Atención de
Respuesta Rápida a la Sífilis”
(LAIS/UFRN, TED 54/2017 SVS/MS).

253
Capítulo 10

Resumen

Introducción: El objetivo principal de este artículo es evaluar la


calidad audiovisual, así como la eficacia comunicativa y el efecto
dinamizador inclusivo de la webserie “Senta que lá vem infor-
mação” (“Piense que ahí tiene la información”) de la campaña
sobre prevención de la sífilis del Ministério da Saúde de Brasil
(2017). Metodología: Se utiliza una perspectiva multimodal
(LORITE, 2011; BONIN; GARCÍA; MALDONADO, 2016; LORITE;
GRAU; LACERDA, 2018) de evaluación cuali-cuantitativa del
mensaje publicitario desde su producción, emisión, recepción y
dinamización social. Resultados: Constatamos que si bien no hay
una gran diversidad fenotípica (la mayoría de protagonistas son
blanco-caucásicos), sí que hay paridad de género y de diferen-
tes orientaciones e identidades sexuales, que la descripción de
la enfermedad es correcta para un formato divulgativo, aunque
no se abordan sus aspectos más complejos, y que la realización
audiovisual se adecúa a los programas de entrevistas televisivos
unidireccionales, simulando el directo en plató. Conclusiones:
Si bien podemos afirmar, de un lado, que esta propuesta on line
es fácilmente decodificable por las clases medias con Internet
a las que va dirigida la webserie, según pretendía la agencia de
publicidad encargada de la campaña, constatamos, de otro, que
cabría presentar la información sanitaria de manera más comple-
ta, evitando simplificaciones, así como desde lenguajes inclusivos
destinados a los distintos contextos e identidades sociocultu-
rales, tal y como recomiendan organismos competentes como
Autocontrol (2011), la Cámara de Comercio Internacional (2018)
o el Consejo del Audiovisual de Cataluña (2017).
PALABRAS CLAVE: Comunicación Científica; Webserie; Sífilis;
Audiovisual; Publicidad; Educación para la Salud; Sexualidad.

254
Capítulo 10

Abstract

Introduction: The main objective of this article is to evaluate the


audiovisual quality, as well as the communicative efficiency and
the inclusive dynamizing effect of the web series “Senta que la vem
informação” (“Sit, information is coming”) of the syphilis preventive
campaign of the Ministry of Health of Brazil (2017). Methodology:
A multimodal perspective is used (LORITE, 2011; BONIN; GARCÍA;
MALDONADO, 2016; LORITE; GRAU; LACERDA, 2018) of qualita-
tive-quantitative evaluation of the advertising message from its
production, emission, reception and social dynamization. Results:
We found that,although there is not a wide phenotypical diversity
(most of the protagonists are white-Caucasian), there is gender pari-
ty and different sexual orientations and identities, that the descrip-
tion of the disease is correct for an informative format although
its most complex aspects are not discussed and the audiovisual
production is adapted to one-way television interview programs,
simulating live on set. Conclusions: Although we can affirm that
this online proposal is easily decodable by the middle classes with
Internet, to which the web series is directed, as the advertising
agency in charge of the campaign intended, we can verify that it
would be possible to present the health information in a more
complete way, avoiding simplifications, as well as from inclusive
languages aimed at different socio-cultural contexts and identities,
as recommended by competent bodies such as Autocontrol (2011),
the International Chamber of Commerce (2018) or the Audiovisual
Council of Catalonia (2017).
KEYWORDS: Scientific Communication; Webserie; Syphilis;
Audiovisual; Publicity; Health Education; Sexuality.

255
Capítulo 10

1. Introducción

El objetivo principal de este artículo es mostrar los resul-


tados del análisis cualitativo audiovisual de los 10 episodios de la
webserie “Senta que lá vem informação” (“Piense que ahí tiene
la información”), producidos y difundidos desde el “Projeto de
Resposta Rápida à Sífilis”, del Ministério da Saúde de Brasil, con
el eslogan “Lembre de se cuidar” (“Acuérdese de cuidarse”).1
El estudio se ha realizado desde la perspectiva metodológica
multimodal (LORITE, 2011; BONIN; GARCÍA; MALDONADO, 2016;
LORITE; GRAU; LACERDA, 2018), consistente en comprender la
eficacia del mensaje publicitario desde la producción, la emisión
y la recepción-dinamización social y tomando como referencia las
recomendaciones teóricas y prácticas en las que se basa la reali-
zación audiovisual publicitaria de calidad e inclusivas, recogidas
por organismos como Autocontrol (2011), la Cámara de Comercio
Internacional (2018) o el CAC (2017).
En concreto, se pretende analizar si la interpretación concep-
tual, entendida desde la perspectiva del concepto creativo publici-
tario (BENAVIDES, 1997; RICARTE, 2000; NOS, 2007), así como las
informativa y formativa que se articulan desde las productoras audio-
visuales publicitarias, a partir de las propuestas de las organizaciones
e instituciones (en este caso el Ministerio de la Salud de Brasil) y que
se plasma en el contenido de los mensajes difundidos, es la adecuada
para suscitar el efecto concienciador y dinamizador deseados en los
usuarios o potenciales receptores de los mensajes (KATZ; BLUMLER;
GUREVITCH, 1985; MORAGAS, 1985; LORITE, 2003).

1 Webserie “Senta que lá vem informação”- con Penélope Nova. Canal del
Youtube Sífilis Não. Disponible en: https://www.youtube.com/playlist?re-
load=9&list=PL0MemhgkWDRwUkvayuEkBClIeWHx2-Bb5. Acceso 05 jul 20.

256
Capítulo 10

La implantación de las redes sociales digitales y las platafor-


mas de producción y circulación de contenidos por Internet han
permitido el crecimiento exponencial del uso de los metalengua-
jes multimedia como soporte fundamental para la comunicación
de la salud (LACERDA, 2014; BACALLAO-PINO, 2015; LACERDA
et al., 2016; ARAGÃO et al., 2018; MARINA; FELIZ, 2018). Esta
perspectiva de las ciencias de la comunicación, combinada con
las aportaciones desde las ciencias de la salud y la antropología,
permite innovar continuamente las narrativas audiovisuales desde
diferentes géneros informativos, de entretenimiento, webseries,
así como con el desarrollo de juegos interactivos y hasta videos
feed e stories en plataformas como Instagram, con el objetivo de
concienciar y socializar a los diferentes usuarios sobre la preven-
ción y el seguimiento adecuado de enfermedades como la sífilis.
La perspectiva investigadora multimodal desde la que
abordamos este objeto de estudio en el proyecto de investiga-
ción “Pesquisa Aplicada para Integração Inteligente Orientada
ao Fortalecimento das Redes de Atenção para Resposta Rápida
à Sífilis» (LAIS/UFRN, TED 54/2017 SVS/MS), permite acotarlo
desde una perspectiva transdisciplinar que combina el ámbito
de la salud, en relación con las Enfermedades de Transmisión
Sexual (ETS), y el de la información y comunicación audiovisual, en
concreto con perspectivas como la eficacia de los lenguajes audio-
visuales multimedia (MASSAROLO; MESQUITA, 2014; SCOLARI,
2015), para contribuir a frenar el avance de estas enfermedades.
En el caso de la sífilis, es conveniente comprobar si la informa-
ción sanitaria difundida abarca adecuadamente los elementos que
conforman la descripción de la enfermedad, desde la etiología
al tratamiento, pasando por la sintomatología, el diagnóstico y,
por supuesto, las vías de contagio y modos de prevención. Pero,
al mismo tiempo, hemos de verificar si va acompañada de una

257
Capítulo 10

presentación bien orientada al público al que van destinados estos


discursos audiovisuales multimedia y contempla con profundi-
dad y rigor los factores de muy diversa índole que intervienen en
las conductas relacionadas con la salud y la sexualidad, insepa-
rables del contexto socioeconómico y cultural en el que se dan
(MARTÍNEZ-HERNÁEZ, 2008).
Tras llevar a cabo el análisis multimodal de la webserie cons-
tatamos que estos discursos audiovisuales multimedia han de
ampliar y afinar sus contenidos y dirigirlos a un público diverso en
cuanto a los estratos socioeconómicos, las identidades fenotípicas
y las percepciones en torno a la sexualidad, así como ajustar su
estrategia comunicativa para lograr concienciar sobre la preven-
ción de la sífilis. Una propuesta pasa por mejorar la selección
de los protagonistas y abordar la temática desde un tratamiento
que, sin descuidar el planteamiento cercano y divulgativo, sea más
preciso y riguroso en cuanto a la información sanitaria.

2. Antecedentes, objetivos e hipótesis

2.1. Antecedentes

La campaña publicitaria y la idea de realizar la webserie


“Senta que lá vem informação” (“Piense que ahí tiene la infor-
mación”) nacen en 2017, tras constatarse por parte del gobierno
brasileño que el país estaba experimentando una importante
epidemia de sífilis (BRASIL, 2017). El Tribunal de Contas da União
(TCU) (2017) recomendó al Ministério da Saúde do Brasil desarro-
llar diferentes acciones de educación y comunicación para comba-
tir la infección. Para ello, firmó un acuerdo con la Universidad

258
Capítulo 10

Federal de Rio Grande do Norte (UFRN), con el objetivo de llevar


a cabo el “Projeto de Resposta Rápida à Sífilis nas Redes de
Atenção” (Proyecto de Respuesta Rápida a la Sífilis en las Redes
de Atención), denominado “Sífilis Não” (Sífilis, No).
Se contrató mediante concurso público a la agencia de
publicidad Fields360 para plasmar las recomendaciones del TCU
en una campaña con un enfoque comunicativo audiovisual impor-
tante. Tras un briefing inicial, la agencia se decantó por el concep-
to “Lembre de se cuidar – sífilis: teste, trate e cure” (“Recuerde
cuidarse – sífilis: testee, trate y cure”). Al diseñar la estrategia de
difusión se prestó especial interés a los 100 municipios con mayor
número de casos de contagio de sífilis de Brasil, según datos facili-
tados por el Ministério da Saúde do Brasil (2017). En esta muestra
estaban las principales capitales de estado y regiones metropo-
litanas como São Paulo, Rio de Janeiro, Salvador, Porto Alegre,
Florianópolis, Manaos y Natal.
Entre los productos de la campaña, la agencia realizó la
webserie “Senta que lá vem informação” (“Piense que ahí tiene la
información”), con el objetivo de focalizarla en ciertas tipologías
de usuarios de las capas socioeconómicas medias y con facili-
dad para comunicarse por Internet. Fragmentó la webserie en
diez episodios de una duración media bastante breve, adecuada
para su fácil circulación por las redes: en concreto, entre 1:37
segundos el de menor duración y 4:32 segundos, el de mayor.
El formato de cada episodio se estructuró de la misma mane-
ra que los programas de entrevistas de entretenimiento de los
magazines televisivos (BALSEBRE; MATEU; VIDAL, 1998). Los diez
episodios se grabaron en un solo día mediante un modelo de
guion abierto en el que se reitera una estructura fragmentada
en tres partes (presentación, nudo, despedida) y se incorporan
de manera improvisada ciertas vivencias experimentadas por los

259
Capítulo 10

personajes invitados. Se procuró lograr de esta manera que “el


contenido de los episodios se aproximara a la realidad”, según
constató A. Campos, director de la Agencia Fields360, en la entre-
vista realizada para la investigación (comunicación personal, 10
de octubre de 2020).
Durante su lanzamiento en 2018, la webserie se difundió
únicamente en la plataforma de vídeo de Internet YouTube y el
canal de televisión de pago HBO. Además, se decidió ampliar su
difusión como Recurso Educativo Abierto (REA) del Sistema de
Educación a Distancia AVASUS, dirigido principalmente a la forma-
ción de los profesionales de la salud. En la portada de la página
web del “Projeto de Resposta Rápida à Sífilis” se observa la impor-
tancia que se le otorga a la webserie, que aparece destacada en
el centro de la parte superior de un menú pensado para acceder
a otro tipo de informaciones (Imagen 1). Es posible constatar,
además, cómo la palabra WEB se resalta del resto mediante un
tamaño de letra mayor.

Imagen 1 - Portada de la página web del “Projeto de Resposta Rápida à Sífilis”.


Fuente: Proyecto “Sífilis Não” (LAIS/UFRN, TED 54/2017 SVS/MS). Disponible
en: http://sifilisnao.com.br/. Acceso 10 sept 2020

260
Capítulo 10

2.2. Objetivos

Los objetivos de este trabajo son:

1. Mostrar lo más significativo del análisis cualitativo audiovisual


y multimodal (LORITE; GRAU; LACERDA, 2018) de los 10 episodios de
la webserie “Senta que lá vem informação” (“Piense que ahí tiene la
información”) para evaluar, desde diferentes elementos del lenguaje
audiovisual y desde las recomendaciones de los organismos compe-
tentes −Autocontrol (2011), Cámara de Comercio Internacional (2018)
o CAC (2017) − si se aborda, de manera adecuada y con criterios inclu-
sivos, la educación para la salud con este tipo de formato multimedia.
2. Proponer modelos comunicativos más eficaces y sociali-
zadores y haciendo uso de las narrativas audiovisuales, aplicadas
a la comunicación interactiva on line.
3. Mostrar la versatilidad que ofrece el audiovisual publici-
tario como modelo de información sanitaria de calidad.

2.3. Hipótesis

La hipótesis principal de la que se parte en el proyecto de


investigación y que se pretende verificar es que la eficacia socio-
sanitaria de propuestas on line como la de esta modalidad de
webseries es la adecuada, y, por tanto, la podemos considerar
una buena práctica mediática inclusiva, desde el momento que el
formato y género aplicado, los temas abordados y su tratamiento,
así como los personajes que participan y los escenarios que se
presentan, permiten focalizar el mensaje en el público objetivo
al que va destinado, en particular, jóvenes en general y colectivos
LGBTQI+ de clase media que tienen fácil acceso a Internet.

261
Capítulo 10

3. Metodología y conceptos de referencia

3.1. Metodología multimodal

El presente estudio se lleva a cabo mediante un análisis


multimodal (LORITE; GRAU; LACERDA, 2018), consistente en anali-
zar la webserie y evaluarla desde perspectivas educomunicativas
audiovisuales (BONIN; GARCÍA; MALDONADO, 2016), orientadas
desde la comunicación e investigación audiovisual aplicada y la
educación en salud y teniendo en cuenta los diferentes elementos
e indicadores que se recogen a continuación:

1. En primer lugar, partimos de la emisión o análisis de conte-


nido de los diez episodios de la webserie, desde los principales
elementos del lenguaje audiovisual que se delimitan a continua-
ción y teniendo en cuenta su valor narrativo de calidad e inclusivo:

• Estructura y serialidad narrativa (CUADRADO, 2016;


GARIN, 2017).
• Imagen: composición visual (tipologías de planos),
movimientos y desplazamientos de cámara (panorá-
mica y travelling), escenario, vestimenta, luz y color
(MILLERSON, 1993; MORALES, 2017).
• Sonido: voz y música (CHION, 1999; RODRÍGUEZ, 1998).
• Sincronía audiovisual: transiciones y duración de los
planos, ritmo y montaje (EISENSTEIN, 2001).
• Protagonistas: para comprender si se trata de un trata-
miento audiovisual adecuado y dinamizador social,
concienciador, formativo e inclusivo, analizamos diferen-
tes indicadores de cada uno de los ocho personajes (siete

262
Capítulo 10

entrevistados más la presentadora) como son: fenotipo


(DAWKINS, 2015) o rasgos fisiológicos y morfológicos,
sexo, edad e interacciones (coyunturales y estructurales)
entre los personajes (LORITE; GRAU; LACERDA, 2018).
• Mensaje multimedia y metalenguaje interactivo en Internet
(SCOLARI, 2015): se tiene en cuenta este género audiovisual
en red (GUBERN, 1987; COELHO; LACERDA, 2020), aplicado
a esta perspectiva y función educativa y social, que es dife-
rente a otras producciones, principalmente de ficción, pero
que en cualquier caso detenta características similares de
partida, al tratarse de un producto pensado y realizado para
ser difundido únicamente por Internet, aunque su conteni-
do se asemeje a los géneros informativos televisivos como
la entrevista (BALSEBRE; MATEU; VIDAL,1998) y cumpla
una función unidireccional propia de los medios de comu-
nicación tradicionales antes que de los medios interactivos
(PROSS; BETH, 1990).

2. En segundo lugar, se contrastan las conclusiones del análi-


sis de la emisión desde el punto de vista de la producción, en
concreto desde la agencia de publicidad Fields360, encargada
de realizar y difundir la webserie. mediante una entrevista a
su director Ângelo Campos y la obtención de los documentos
disponibles sobre la producción de la webserie.
3. Y, en tercer lugar, se evalúan desde la recepción, en particu-
lar desde los usos sociales (KATZ; BLUMLER; GUREVITCH, 1985;
LORITE, 2003; BONIN, 2018) y potenciales procesos de dinamiza-
ción social (LORITE, 2003, 2011, 2016), además de la perspectiva
interdisciplinar del equipo de investigación del proyecto formado
por profesionales de la información, la comunicación audiovisual,
la antropología de la salud, la sociología y la educación.

263
Capítulo 10

3.2. Muestra y unidad de análisis

La muestra se compone de los 10 episodios de la webserie


“Senta que lá vem informação” (“Piense que ahí tiene la información”).
Para partir de criterios homogéneos y comparativos entre los
diferentes episodios creemos conveniente definir la unidad de análi-
sis, tomando como referencia la misma denominación que hemos
utilizado para analizar muestras de unidades publicitarias y unida-
des informativas (LORITE; GRAU; LACERDA, 2018; BONIN; GARCÍA;
MALDONADO, 2016; LORITE, 2011). La unidad de análisis es cada uno
de los diez episodios o capítulos en los que se divide la webserie. Cabe
entender por episodio esa narración con una duración determinada
que tiene sentido por sí misma, sin necesidad de ver el resto. Es un
concepto extraído del lenguaje audiovisual, televisivo y cinematográ-
fico (AUMONT; MARIE, 1990; COELHO; LACERDA, 2020). Aun así, cada
unidad forma parte de un mismo nudo o trama narrativa centrada en
redundar sobre el complejo problema de la sífilis y en la necesidad de
la prevención adecuada (OLIVEIRA JUNIOR et al., 2019).
En el cuadro 1 es posible ver el título de cada episodio,
los temas abordados, los personajes que aparecen, alguno de los
planos habituales y su duración.

264
Capítulo 10

Cuadro 1 - Episodios de la webserie “Senta que lá vem informação”: título, tema abordado, participantes, imagen y duración.

Episodio/
Temas abordados Personajes Imagen Tiempo
título

Presentación de los persona-


1 Presentadora y los
jes que serán entrevistados
O elefante demás personajes que
en los demás episodios para 1:37”
pelado en serán entrevistados en
abordar diferentes pers-
la sala los diferentes episodios
pectivas de la sífilis

Una pareja, ella embaraza-


2 da, explica cómo combinan Presentadora,
Papai los fetiches sexuales con la mujer embarazada 2:42”
e mamãe prevención de las enfermeda- y su compañero
des de transmisión sexual

3
Hablan de las experiencias
Jogar Presentadora y Joven
sexuales de un joven soltero y 2:24”
descalço soltero de 21 años
sobre si usa el preservativo
pode

265
Capítulo 10

Episodio/
Temas abordados Personajes Imagen Tiempo
título

4 Presentadora y
Sobre el contagio y prevención
I kissed mujer que hace poco 3:39”
de la sífilis en la homosexualidad
a girl asumió ser lesbiana

Hombre explica su salida del


5 Armário, Presentadora y
armario y habla sobre preven- 4:32”
tô fora chico homosexual
ción en las dos situaciones

Combinación de la versión de
6
una mujer trans que además Presentadora y
Xiii, 4:55”
es farmacéutica y hace peda- mujer trans
deu ruim!
gogía sobre la prevención

266
Capítulo 10

Episodio/
Temas abordados Personajes Imagen Tiempo
título

Un especialista en enfermedades
Presentadora y espe-
7 infecciosas aporta datos sobre
cialista en enferme-
Pega geral uso de preservativos y la sífilis
dades infecciosas
como enfermedad silenciosa

Abordan fantasías sexuales Presentadora, mujer


8
como el golden shower y el embarazada, su
Fetiche 2:36”
fisting para insistir en el uso compañero, chico
em grávida
del preservativo al aplicarlas gay y joven hetero

267
Capítulo 10

Episodio/
Temas abordados Personajes Imagen Tiempo
título

Se aborda quién puede ser un


Presentadora, especia-
come quieto o persona que
9 lista en enfermedades
acepta todo sin rechistar y cómo 4:06”
Come Quieto infecciosas, mujer
la sífilis también puede ser igual-
trans, y mujer lesbiana
mente silenciosa y “discreta”

Presentadora y los
Mediante el juego de la botella
otros seis personajes:
que gira le van preguntado todos
10 mujer embarazada y
los personajes a la presentado-
Jogo su compañero, mujer 4:11”
ra sus experiencias sexuales y
da verdade lesbiana, chico gay,
se aprovecha para subrayar la
joven hetero, mujer
importancia de la prevención
trans y médico

Fuente: Diseño propio a partir de la información obtenida del Proyecto “Sífilis Não” (LAIS/UFRN, TED 54/2017 SVS/MS).

268
Capítulo 10

4. Resultados

4.1. Estructura y realización audiovisual

Lo primero a destacar del análisis de las diferentes unidades


es el concepto de serialidad/repetición aplicado a la estructura
narrativa, que dentro de un estilo de realización desenfadado y
juvenil o, al menos, conceptualizado como tal por la tradición
más reciente, mantiene una estructura del relato férrea en los
10 episodios (CUADRADO, 2016; GARIN, 2017). Esa estructura se
define en tres bloques diferenciados:

1. La presentación por parte de Penélope Nova. Esta repite


también la misma estructura de imagen: Penélope, subida en
el carrier de una Dolly (grúa pequeña con ruedas que da gran
movilidad en interiores), presenta el capítulo. Esto introduce
ya una movilidad que es característica esencial del formato:
casi ningún plano será fijo, excepto el general que se introduce
de forma sistemática en la entrevista entre dos travellings, e
incluso este estará hecho a mano para que tenga cierta movili-
dad/ inestabilidad. La idea con ello es acercar el formato a una
sensibilidad por la imagen más juvenil, desenfadada, que es,
sin duda, el público prioritario de la serie; el ritmo de montaje
de la imagen es rápido/acelerado, con constantes cortes en
movimiento, en donde las palabras de la presentadora y el
entrevistado se solapan, casi sin silencios. Estas característi-
cas de perpetua movilidad de la cámara, de ritmo rápido y
de constante diálogo, se unirán a unas duraciones que nunca
superan los cuatro minutos y medio, de forma que favorezca
el consumo a través de móviles e Internet entre la población
juvenil en que prepondera el uso de estos dispositivos.

269
Capítulo 10

2. El segundo bloque es el esencial del formato, en el que


la presentadora establece un diálogo, más que una entre-
vista, con uno o varios personajes. El primer capítulo, como
presentación de la serie, sirve para introducir a los personajes
y, también, a los temas que se van a tratar, de manera infor-
mal, con un lenguaje que recoge expresiones populares y con
un tratamiento directo y desprejuiciado de los denominados
“tabúes” sexuales: el sexo en el embarazo, los juguetes sexua-
les, el fenómeno trans, la homosexualidad y otros diversos
temas. Todos ellos van siendo abordados en los siguientes
capítulos, ahora en entrevistas individuales con los persona-
jes que se han presentado en el primero, eso sí manteniendo
firme la estructura de realización y narrativa, que parece casi
programada de un capítulo a otro.
3. Por último, el breve bloque final es la despedida del capí-
tulo con una última pregunta, charla informal y divertida, casi
a modo de chiste entre el entrevistado y la presentadora, que
se cierra con los grafismos de la propia serie.

En cuanto al modelo de realización audiovisual es posible


constatar que se lleva a cabo desde el tradicional sistema multi-
cámara, simulado en continuidad y acudiendo a unas tipologías
también habituales de planos propios de la realización de entrevis-
tas en plató, capaces de combinar el plano medio o primer plano
de la presentadora con los planos medios abiertos de los entrevis-
tados, pasando por los planos americanos, algún escorzo y planos
generales de conjunto de todos los personajes (ver cuadro 2).
A resaltar que cada toma incorpora un leve movimiento
de cámara a modo de travelling horizontal, algo inquieto, que
le otorga al relato una tímida mirada, desde la perspectiva de
cámara subjetiva, pretendiendo situar al receptor/usuario del

270
Capítulo 10

mensaje como un protagonista más de la escena. Observación que


contrastamos al entrevistar a A. Campos, de la Agencia Fields360,
encargada de producir la webserie, quien aseguró que las tomas
con la cámara fueron pensadas para ser realizadas mediante un
movimiento continuo que permitiera aproximarse al “ritmo vital
del público objetivo: jóvenes y adultos con vida sexual activa” (A.
Campos, comunicación personal, 10 de octubre de 2020).
La duración de la mayoría de los planos es mínima para
tratarse de una webserie, oscilando entre dos y tres segundos
cada uno. Es ritmo de spot publicitario, aunque con reiteración
de los mismos planos. Se trata de un montaje lineal-cronológico
(MILLERSON, 1993; EISENSTEIN, 2001; MORALES, 2017) en el que
se van sucediendo diferentes planos mediante transiciones por
corte, al compás de la música (interpretada por un ukelele), escu-
chada en segundo plano sonoro durante todo el tiempo y en todos
los episodios, con una función simplemente de acompañamiento
simpático (RODRÍGUEZ, 1998), más que mediante la interacción
pregunta-respuesta de entrevistado-entrevistadora, como suele
ser habitual para suscitar el interés de las audiencias por lo que se
está abordando (BONIN; GARCÍA; MALDONADO, 1998).
El decorado es fundamental para comprender a qué colec-
tivo va dirigido el mensaje. Es minimalista, pero a su vez tiene un
punto recargado, incluso “kitsch”, a través de los colores pastel
que dominan ese entorno y que contrastan con la imagen más
dura, de estilo rockero, de la presentadora. También es funda-
mental el fondo: una cristalera traslucida (no transparente) que
deja entrever un bosque, en una metáfora de libertad, naturali-
dad e integración con el mundo que refuerza el mensaje positivo
sobre los contenidos a tratar, desde la tolerancia, la compren-
sión y la desdramatización. Es el escenario adecuado para que
el chico homosexual cuente cómo su “salida del armario” fue

271
Capítulo 10

absolutamente normalizada por sus padres y su entorno, muy al contrario de lo que suele suceder en socieda-
des tan machistas/heteropatriarcales como la brasileña.

Cuadro 2 - Tipologías de planos de la webserie “Senta que lá vem informação”.

Fuente: Elaboración propia a partir de la webserie difundida por Youtube en el canal del Proyeto “Sífilis Não” (LAIS/UFRN, TED 54/2017 SVS/MS).

272
Capítulo 10

4.2. Características de los protagonistas

En la webserie intervienen ocho personajes, siete entrevis-


tados más la conductora (ver cuadro 3). Un indicador sociocultural
y sociocomunicativo fundamental de los personajes es su fenoti-
po, entendido, principalmente desde la identidad de la persona
en función de sus rasgos fisiológicos y morfológicos, sobre todo
por lo que Dawkins (2015) denomina genotipo de origen, asocia-
do con color de piel, un tipo y color de cabello y un somatotipo o
dimensiones corporales determinadas, entre otros rasgos (LORITE;
GRAU; LACERDA, 2018).
En el cuadro 3, se observa cómo la webserie procuró selec-
cionar una submuestra cualitativa significativa de fenotipos de
un país como Brasil, capaz de abarcar una de las mayores diver-
sidades fenotípicas del mundo. Aun así, llama la atención que
el protagonismo se decante hacia el fenotipo blanco-caucásico
o rasgos que podríamos considerar de origen europeo, a veces
denominados también occidentales. En concreto, cinco de los
ocho personajes muestran estos rasgos. Tan sólo dos protagonis-
tas podríamos considerar que presentan rasgos de origen africano
y algo la presentadora, en la que se observa un cierto mestizaje
entre ambos orígenes.
Desde la perspectiva metodológica multimodal procuramos
verificar lo que constatamos en el análisis de contenido sobre el
mensaje difundido con la versión desde la producción audiovi-
sual. Al preguntar a la agencia de publicidad sobre los criterios
que tuvieron en cuenta para seleccionar a estos personajes con
sus respectivas identidades, su respuesta fue que esta selección
es la adecuada para suscitar el efecto concienciador y dinami-
zador de la amplia diversidad fenotípica brasileña afectada por
la sífilis y que éste es el público al que se dirigían en Internet

273
Capítulo 10

porque tuvieron muy en cuenta el corte juvenil, que se concretó


en el briefing “con un amplio recorte de las audiencias principales
(mujeres embarazadas y sus relaciones sexuales) y secundarias
(jóvenes, gais y hombres que tienen relaciones sexuales con otros
hombres)”, según confirmó el director de la Agencia Fields360 (A.
Campos, comunicación personal, 10 de octubre de 2020).
Además, también pudimos constatar desde la producción
que el casting de los personajes de la webserie fue propuesto
por la agencia y validado por el Proyecto “Sífilis Não” a través de
la Cámara Técnica de Comunicación, compuesta por investiga-
dores y profesionales de la comunicación y la salud de la UFRN
(Universidad Federal de Rio Grande del Norte) y el Ministerio de la
Salud de Brasil. El objetivo principal era que todos los protagonis-
tas contratados guardaran relación con los temas de los episodios
y que fueran de diferente identificación y orientación sexual. Por
lo tanto, para abordar la sífilis en el contexto de las relaciones
homosexuales masculinas fue seleccionado un joven gay, para
tratar la sífilis congénita se seleccionó una pareja heterosexual en
la que la mujer estaba embarazada, para abordar algunas cues-
tiones más de tipo científico se invitó a un médico real y no a
un actor que simulara ese papel, para que abordara con mayor
veracidad y soporte científico el tema del contagio, el diagnóstico
y el tratamiento de la sífilis.
Con respecto a la representación de la diversidad de orien-
taciones sexuales, se observa que aparecen tanto una pareja hete-
rosexual como un hombre hetero con relaciones esporádicas y
tanto un hombre como una mujer homosexuales. La presentado-
ra, que también habla de su sexualidad, podría representar bien
al personaje heterosexual sin pareja estable, aunque habría sido
buena idea incluir a un personaje específico, para evidenciar más
la libertad sexual y plantear la importancia de la autoprotección

274
Capítulo 10

en las mujeres. Y la realidad trans está representada en la farma-


céutica (ver cuadro 3). La elección de este personaje tiene impli-
caciones: por una parte, parece claro que una farmacéutica (a
la que se estima un nivel formativo y económico medio-alto) no
representaría el perfil más frecuente de persona trans en Brasil;
por otra, mostrar precisamente a alguien de estas característi-
cas contribuye a desestigmatizar a esta población (SILVA; LUPPI;
VERAS, 2020). Curiosamente, el único personaje que no da infor-
mación respecto a sus actitudes en materia sexual es el médico,
lo que podría tener el inconveniente de situar la información en
un plano menos personal y más abstracto.
Con relación a la representación de diversidad de sexo, en
la serie se da un equilibrio: cuatro mujeres (incluida la presenta-
dora) y cuatro hombres; y, en lo referente a la edad, la mayoría de
los personajes parecen estar entre los 20 y los 30 años, con tres
excepciones: la presentadora, el médico y la farmacéutica. Tras
una presentación de los siete en el episodio 1, van apareciendo de
manera individual, por este orden y caracterizados de la manera
siguiente: una pareja heterosexual cuya mujer está embarazada,
en el episodio 2; un joven heterosexual, soltero, de 21 años, en
el episodio 3; una mujer que hace poco se declaró lesbiana, en
el episodio 4; un joven gay que también “salió del armario” hace
poco y que anteriormente se comportaba como heterosexual, en
el episodio 5; una mujer trans, farmacéutica, en el episodio 6; un
hombre, especialista en enfermedades infecciosas, en el episodio
7. Los siete personajes son presentados y entrevistados por una
mujer, la presentadora, que explica haber tenido una intensa vida
sexual, según se constata en el último episodio.

275
Capítulo 10

Cuadro 3 - Fenotipo, orientación sexual y rol de los protagonistas.

Mujer trans
Joven heterosexual Joven lesbiana Joven gay
Origen Blanco-caucásico
Origen africano Origen africano Origen blanco-caucásico
Farmacéutica

Mujer heterosexual Hombre heterosexual Hombre Mujer heterosexual


Embarazada Esposo de la mujer embarazada Origen blanco-caucásico Mestizaje afro-caucásico
Origen blanco-caucásico Blanco-caucásico Médico Presentadora
Fuente: Diseño propio a partir de la webserie del Proyecto “Sífilis Não” (LAIS/UFRN, TED 54/2017 SVS/MS).

276
Capítulo 10

Por lo que respecta a los lenguajes visuales, verbales y


no verbales, cabe tener en cuenta ante todo que para conducir
la puesta en escena del programa y realizar las entrevistas fue
elegida la histórica presentadora de televisión Penelope Nova,
conocida por presentar programas del mismo género de entre-
vistas durante la década de los 90, principalmente en MTV Brasil.
Se eligió expresamente a esta profesional porque se sabía que
parte importante del público al que iba destinada la campaña
eran sus telespectadores habituales (OLIVEIRA JUNIOR et al.,
2019). La presentadora usa un discurso verbal y no verbal muy
televisivo y una capacidad comunicativa e interactiva, proxémica
y quinésica (HALL, 1978; BALSEBRE; MATEU; VIDAL, 1998; KNAPP,
2001) a veces excesivamente teatral pero bastante efectiva para
sus audiencias juveniles. Llama la atención su tono de voz algo
agudo pero que regula adecuadamente en lo que a intensidad y
timbre se refiere, lo que le permite combinar adecuadamente
lo conciso e informativo, con lo festivo y divertido. Ese tipo de
interpretación verbal y no verbal es posible observarla cuando
usa la exclamación “¡¡guau!!” en el episodio 2, tras contarle el
matrimonio de la mujer embarazada la fantasía del bombero y
cómo se apagaron el fuego mutuamente, incitados por ella. Sabe
reorientar rápidamente la expresión corporal y la comunicación
verbal hacia el mensaje aséptico y efectivo con que cierra cada
episodio, destinado a redundar sobre la prevención de la enfer-
medad, antes que ampliar la fantasía sexual.
Se observa, asimismo doble intencionalidad con ciertas
expresiones verbales de la presentadora. En el capítulo 9 se
acude a la expresión coloquial “come-quieto” (tímido, discreto)
para expresar, por un lado, que la sífilis durante gran parte de su
evolución no provoca síntomas evidentes (es decir, es discreta),
mientras que, por otro, se resalta la responsabilidad de avisar a

277
Capítulo 10

las parejas sexuales cuando se tiene el diagnóstico (es decir, no


ocultar la información, no ser come-quieto). Este lenguaje colo-
quial, incluso jerga para la terminología sexual, resulta adecuado
para el público al que va dirigido el material. Su uso es diferencial,
estando en un extremo los personajes varones jóvenes sin pareja
estable y, en el opuesto, los profesionales sanitarios, ocupando
posiciones intermedias la mujer lesbiana y la pareja heterosexual.
Un elemento fundamental del lenguaje visual a tener en
cuenta es el vestuario de la protagonista/entrevistadora de la
webserie. Llama la atención que la presentadora repita vestimenta
en todos los episodios. Obedece a que la webserie fue grabada en
un solo día, pero, también, para evitar los problemas de raccord o
continuidad narrativa, según confirmó al ser entrevistado Ângelo
Campos, director de la Agencia Fields360: “Foi levado em consi-
deração para que não houvesse erro de continuidade, visto que
estamos falando de uma webserie… Foi decidido em conjunto com
a equipe do projeto no set de gravação e privilegiou-se a vera-
cidade com que as pessoas se vestem no dia a dia para que não
ficasse fake”2 (A. Campos, comunicación personal, 10 de octubre
de 2020). Esto ayuda, por una parte, a dar continuidad a la serie,
dentro de ese sentido de serialidad/repetición, pero también a
crear un personaje que juega con la imagen pública de una mujer
madura y atractiva que viste de forma juvenil y, por tanto, estable-
ce un puente entre las generaciones más jóvenes y las más mayo-
res. En este sentido, la búsqueda/construcción de esa imagen
guarda relación con su pasado como presentadora del canal
de música juvenil MTV, periodo durante el cual fue clave para

2 “Se tuvo en cuenta para que no hubiera ningún error de continuidad, ya


que estamos hablando de una webserie... Se decidió junto con el equipo del
proyecto en el set de grabación y se centró en la veracidad con la que la gente
se viste en una vida cotidiana para que no fuera falsa” (traducción nuestra).

278
Capítulo 10

redefinir los contenidos televisivos, la realización de los mismos y


sus estructuras narrativas. En cualquier caso, es posible constatar
que se trata de una ropa de sport o casual, pero de marca (chaque-
ta de piel, pantalón tejano ajustado, botas elegantes con tacones
gruesos y altos), asimismo resalta bastante un reloj algo lujoso en
la muñeca derecha, un peinado medio informal de cabello casi liso
(aunque da la sensación de haber sido alisado a propósito), uñas
pintadas de tono oscuro, algo “gatonas” (expresión que usa ella
con la invitada trans) y camiseta con un motivo que no se acaba
de distinguir bien. A destacar los tatuajes artísticos y costosos que
muestra por brazos y manos y que, sin duda, le otorgan una iden-
tidad que le permite transitar entre varias generaciones, géneros,
identidades y orientaciones sexuales.
Una referencia fundamental es la de las interacciones entre
los personajes como un indicativo del potencial efecto dinamizador
social de los mensajes (LORITE; GRAU; LACERDA, 2018). Es posible
constatar que los siete personajes entrevistados aparecen juntos
en el primer y último episodio (ver cuadro 1), pero no se obser-
van interacciones verbales y no verbales entre ellos. Se constata
un tipo de comunicación interpersonal entre presentadora y cada
personaje de manera aislada independientemente de que estén
agrupados en un episodio. Se establece una dinámica de pregunta
de la presentadora y respuesta individual de cada personaje, que
no da pie al debate colectivo ni a la interacción espontánea entre
ellos. Es, en definitiva, la representación de un tipo de comunica-
ción interpersonal e intergrupal, verbal y no verbal, que no permite
suscitar un potencial efecto dinamizador activo (LORITE, 2011) entre
los usuarios del mensaje. Se trata de una apuesta por una cierta
diversidad multicultural pero no por la relación intercultural.

279
Capítulo 10

4.3. Descripción biomédica de la sífilis

Respecto a la etiología de la enfermedad, llama la aten-


ción que solo hay un momento, ya en la unidad 9, en el que se
menciona explícitamente el Treponema pallidum. Frente a esta
parquedad, destaca la extensión de la información sobre vías de
transmisión, formas de prevención y sintomatología. Así, aparece
bien explicada la posibilidad de contagio en prácticas no coitales,
como el sexo oral, o durante el uso de juguetes sexuales en pare-
jas homo o heterosexuales; también, que la transmisión no se
da solo en las primeras fases de la enfermedad, sino que puede
hacerse tiempo después (cuando la persona ya no recuerda ese
contacto sexual) o la tendencia a no usar preservativo en relacio-
nes percibidas como estables.
En lo que se refiere a la sífilis gestacional, aunque se resal-
ta la falta de información respecto al tema, apuntando un área
destacada para la educación sexual (especialmente en embarazos
no deseados), la información sobre el riesgo de contagio y las
afectaciones en el feto es algo confusa (OPS, 2019).
De la misma manera, se explica que se trata de una enfer-
medad de muy alto riesgo de contagio, pero la posibilidad de rein-
fección solo se menciona explícitamente en uno de los capítulos.
En cuanto a las formas de prevención, el mensaje central
se centra en fomentar el uso del preservativo, tratando de abor-
dar algunos de los estereotipos más extendidos: sobre todo, la
tendencia a no usarlo en parejas estables y su uso fundamental-
mente para evitar embarazos, pero no para prevenir las ETS. Sin
embargo, la prevención aparece casi siempre sujeta a la disponi-
bilidad de información y a la responsabilidad de los individuos,
eludiendo los elementos contextuales que influyen en estas cues-
tiones (MARTÍNEZ-HERNÁEZ, 2008). Por ejemplo, en el capítulo 10,

280
Capítulo 10

se señala que la responsabilidad facilita el ejercicio de la libertad


sexual, pero no se reconoce que las elecciones en salud no siem-
pre son completamente libres.
La sintomatología de la enfermedad aparece tratada en la
mayor parte de los capítulos, con diferentes estilos. Las explica-
ciones procedentes de la presentadora son, en general, dema-
siado rápidas como para permitir una comprensión completa de
la enfermedad, pero muestra los aspectos más destacados en
cuanto a prevención y diagnóstico en un lenguaje asequible y
con un formato orientado al público destinatario. Las explicacio-
nes procedentes de los profesionales sanitarios (médico y farma-
céutica) son más completas y contribuyen a rellenar las lagunas
dejadas por la presentadora. En el caso de la farmacéutica, la
elección del personaje, la actitud corporal, el tono de voz y el
lenguaje, facilitan una información correcta al tiempo que llana
y comprensible, resaltando el hecho de que los síntomas pueden
confundirse o pasar desapercibidos, haciendo que la enfermedad
avance hacia formas más graves e incrementando su expansión.
En el caso del médico, emplea un lenguaje sencillo a la par que
contundente, explicando de forma breve las fases de la enferme-
dad y calificándola reiteradamente de “silenciosa” y “traicionera”,
en un ejercicio de claridad muy necesario (CDC, 2015).
En lo que se refiere al diagnóstico, se aborda en varios capí-
tulos, con un mensaje claro: la sífilis es de muy fácil contagio y
difícil detección (CDC, 2015). La frase del médico en el capítulo 9
relacionando sexo con responsabilidad recalca el mensaje central:
la importancia de hacerse los tests ante cualquier sospecha, insis-
tiendo también en el testeo en embarazadas y sus parejas. La
información respecto a que tanto el diagnóstico como el trata-
miento son gratuitos en el sistema público está claramente expli-
cada, en texto sobreimpreso. Pero cabe una reflexión respecto a

281
Capítulo 10

la forma en la que se presentan éstos por la presentadora: como


algo fácil e inmediato, cuando no siempre es así, de manera que el
mensaje, pretendiendo ser simple y desenfadado, corre el riesgo
de ser banalizador. Sin embargo, en el capítulo 7, sí se aporta un
mensaje más realista sobre la posibilidad de que el tratamien-
to no sea en una única dosis. Aunque en materiales divulgati-
vos es importante que la información sea sencilla y no pinte un
cuadro de complejidad inabordable, es importante reconocer que
el diagnóstico no siempre es fácil y que tras el tratamiento es
fundamental mantener controles durante meses (WHO, 2016).
La adherencia de los pacientes a este proceso debe ir asociada a
su comprensión de los motivos, por lo que debe estar presente
también en los materiales educativos.

4.4. Seguimiento de la webserie

La webserie se mostró a nivel nacional en Brasil en el canal


pago HBO entre el 5 y el 23 de diciembre de 2018, lo que represen-
ta una gran parte del público objetivo joven. Una de las referen-
cias objetivas para constatar el seguimiento de la webserie y sus
posibles usos sociales, podemos obtenerlas de los indicadores que
muestra Youtube (desde las fechas de inicio de la difusión, entre
el 3 a 13 de diciembre de 2018) y de su adaptación en recurso
educacional abierto en la plataforma AVASUS - Ambiente Virtual
de Aprendizaje del Sistema Único de Salud de Brasil.
Según recoge el cuadro 4 es posible constatar que la
webserie concentra su máximo interés en el primer episodio de
presentación (es el más breve, tan sólo dura 1:35” y de más fácil
circulación por las redes) con 4.933 visualizaciones. El interés
se reduce considerablemente en los demás episodios. El último

282
Capítulo 10

reúne menos de la mitad de visualizaciones que el primero: 2.303.


Es posible constatar que el interés decae a la mitad a partir del
tercer episodio con 2.849 visualizaciones, según puede observarse
en la columna de visualizaciones del tabla 1.

Me No me
Episodio/ título Visualizaciones Comentarios
gusta gusta3
1 O elefante
4.933 80 12 3
pelado en la sala
2 Papai e mamãe 3.802 33 17 1
3 Jogar
2.849 23 9 1
descalço pode
4 I kissed a girl 2.840 18 3 0
5 Armário, tô fora 3.303 30 15 3
6 Xiii, deu ruim! 2.525 15 0 0
7 Pega geral 2.357 16 1 1
8 Fetiche em grávida 3.673 34 5 4
9 Come Quieto 2.341 12 2 1
10 Jogo da Verdade 2.303 13 5 0
Tabla 1 - Seguimiento de la webserie por YouTube.
Fuente: Diseño propio a partir de los datos disponibles en YouTube en el canal
del Proyecto “Sífilis Não” (LAIS/UFRN, TED 54/2017 SVS/MS).

El interés por clicar los “me gusta” o “no me gusta” es insignifi-


cante en comparación con el de visualizaciones pero esta correlación
es común en videos del youtube. También podemos constatar con
estas informaciones de Youtube que las visualizaciones son también
muy superiores en proporción a los comentarios. Sólo se han dejado 14
comentarios de las 30.926 visualizaciones en total de los 10 episodios.

3 La plataforma de videos Youtube eliminó la opción de “no me gusta”


el 10 de noviembre de 2021. Los datos obtenidos para este trabajo se
recopilaron antes de la eliminación.

283
Capítulo 10

Es importante señalar que youtube, en este caso, es solo un


repositorio de un canal que aún era nuevo cuando se publicaron los
videos, es decir, no es un espacio con el objetivo de difundir. De esta
forma, no hubo estrategias de participación paga y divulgaciones
de acceso para este canal, es decir, todos los visitantes de los videos
llegaron de forma orgánica, lo que explica la cantidad de visitas.
Los videos producidos fueron ensamblados en un curso en
línea para la formación de profesionales de la salud y población en
general. Un equipo pedagógico analizó el contenido, lo estructuró
en forma de recurso educativo con cuestionarios evaluativos que
fue publicado en el Ambiente Virtual de Aprendizaje del Sistema
Único de Salud (AVASUS) en Brasil. La plataforma solicita a los
estudiantes una evaluación al final del curso para que se emita el
certificado de finalización. Actualmente, hay 5017 alumnos matri-
culados y 3191 evaluaciones. Las valoraciones se realizan median-
te estrellas, donde 1 es la valoración mínima y 5 la máxima. Existe
la posibilidad de comentario de texto después de la evaluación
cuantitativa, que es opcional.
La gran mayoría de las respuestas se puntúan con la nota
máxima. Por otro lado, apenas hay valoraciones intermedias, solo
puntuaciones mínimas (hay pocos registros de estas) con comen-
tarios relacionados principalmente con el lenguaje utilizado en los
vídeos, considerándolo inadecuado para los recursos educativos.
Los comentarios de texto asociados a las puntuaciones positivas
ensalzan, precisamente, el lenguaje coloquial en un tema de salud
como punto positivo para facilitar la comprensión.

284
Capítulo 10

4.5. Saturación informativa


con los metalenguajes interactivos

Llama la atención que al hacer los visionados de la webserie


por Internet se perciba la compleja red que se articula mediante
el metalenguaje interactivo (SCOLARI, 2015) y cómo ello puede
dispersar el interés de los usuarios por profundizar en la campaña
informativa sobre la sífilis. Si pausamos el episodio que estamos
viendo en la página web de la webserie aparecen debajo del cuadro
informaciones que nos derivan a otros videos. Por ejemplo, al dete-
ner la imagen en el episodio 2, “Papai e mamãe”, mientras la mujer
embarazada cuenta sus experiencias de prevención sexual, tene-
mos la posibilidad de clicar sobre otros vídeos para ampliar nuestros
conocimientos sobre lo que está comentando sobre “Herpes labial”,
o bien otro que se pregunta: “Ferida no colo do útero?”.
Si clicamos el vídeo en YouTube del episodio 5, destinado
a abordar la versión del joven gay, podemos ver cómo a la dere-
cha aparece una columna de propuestas de videos para ampliar
la información sobre la sífilis, pero también para ver partidos de
futbol o escuchar música. De cinco sugerencias, sólo dos guardan
relación con la sífilis, una destinada a saber más sobre la enferme-
dad y otra sobre la sífilis congénita. Suelen ser recomendaciones
que se activan mediante los algoritmos del sistema de YouTube y
que actúan como amplificadores de la narrativa y de las temáticas
(MASSAROLO; MESQUITA, 2014) sobre diagnósticos y tratamientos
de la sífilis, aunque también puede producir mayor confusión desde
la perspectiva de la saturación informativa y las fakenews.

285
Capítulo 10

Imagen 2 - Los episodios en Internet y el metalenguaje interactivo.

Fuente: Diseño propio a partir de la webserie difundida por Youtube en el canal


del Proyeto “Sífilis Não” (LAIS/UFRN, TED 54/2017 SVS/MS).

5. Conclusiones y propuestas

El análisis audiovisual cualitativo y multimodal de la webse-


rie “Senta que lá vem informação”, permite validar sólo parcial-
mente la hipótesis principal planteada con esta investigación. Es
posible afirmar que esta propuesta on line es la adecuada para

286
Capítulo 10

lograr la eficacia sociosanitaria prevista y cubrir parte del obje-


tivo principal de la campaña, reducir la propagación de la sífilis,
desde el momento que la realización audiovisual de cada uno de
los 10 episodios aplica los elementos oportunos para ajustar los
mensajes al público juvenil de clases medias al que van dirigidos.
Constatamos que la composición visual (tipologías de
planos), uso de la cámara (en movimiento horizontal continuo y
desde un punto de vista algo subjetivo), escenario (sala de clase
media con vistas al jardín), vestuario (casual y juvenil), montaje
lineal-continuo, transiciones por corte de planos de dos o tres
segundos que permite otorgarle un ritmo rápido y comunicar,
según Millerson “vigor, excitación, impetuosidad” (MILLERSON,
1993, p. 355), son elementos que permiten producir una narra-
tiva fácilmente decodificable por el público al que va dirigida la
webserie: jóvenes en general y colectivos LGBTQI+ de clase media
que tienen Internet y que coinciden con los criterios que preten-
de optimizar la agencia de publicidad (A. Campos, comunicación
personal, 10 de octubre de 2020).
Sin embargo, al analizar otros elementos que consideramos
fundamentales como son los fenotipos o rasgos socioculturales
de los protagonistas, vemos que se decantan claramente hacia el
origen blanco-caucásico, por lo que no son representativos de la
amplia diversidad a la que va dirigido el mensaje. No es, por tanto,
una práctica inclusiva, sino que sería claramente excluyente de
ciertos colectivos también afectados por la enfermedad, si nos
atenemos a las recomendaciones sobre buenas prácticas publici-
tarias recogidas por ciertos organismos como Autocontrol (2011),
la Cámara de Comercio Internacional (2018) o el CAC (2017). De
esta manera, cabe preguntarse si la muestra seleccionada (ver
cuadro 3) ha sido la más adecuada entre las posibles para suscitar
el impacto social concienciador deseado en la amplia diversidad

287
Capítulo 10

fenotípica de Brasil o es conveniente ampliarlos a otros colectivos


juveniles de otros fenotipos y estratos sociales, tratándose de una
campaña pública y destinada a la sociedad en general.
En lo que se refiere a la utilidad de la serie como instrumento
para la educación para la salud, puede afirmarse que se trata de un
producto útil, aunque también cabe reflexionar sobre que el hecho
de que la información “exista” y esté “disponible” no necesariamen-
te va unido a que sea accesible para toda la población destinataria,
ni que siempre sea comprensible o lo sea de la misma manera para
todos los sectores implicados. En este sentido, la serie resulta útil
para trasladar información básica pero completa, en un lenguaje
comprensible y en un formato coherente con el público al que va
dirigido, pero sería necesario ir un poco más allá y valorar su capa-
cidad para incrementar los conocimientos sobre la enfermedad.
De manera complementaria a lo anterior, no podemos olvidar que
existen condicionantes socioculturales que influyen en los compor-
tamientos sexuales, y factores socioeconómicos que condicionan
las posibilidades de exposición, la capacidad de prevención y de
obtención de cuidados (MARTÍNEZ-HERNÁEZ, 2008). La negocia-
ción del uso del preservativo (enormemente influenciada por los
roles de género) o las dificultades asociadas a creencias religiosas o
éticas, sociales, económicas, etc. para el acceso a los condones no
aparecen ni siquiera mencionadas, lo que constituye una carencia
significativa en la serie desde el punto de vista de la promoción
de la salud. En el ámbito estrictamente sanitario, las limitaciones
serían menores y se situarían sobre todo en ciertas carencias en la
explicación del curso de la enfermedad, la supuesta facilidad del
diagnóstico y el tratamiento y la presentación no del todo precisa
de los problemas asociados a la sífilis en el embarazo.
No obstante, las ventajas y potencialidades son, sin duda,
evidentes. Se realiza una descripción bastante completa de la

288
Capítulo 10

enfermedad incidiendo, como corresponde en materiales orien-


tados a la educación para la salud, en las vías de transmisión y las
estrategias de prevención. Aunque ampliables, hay una repre-
sentación de diversas opciones en cuanto a la identificación y
orientación sexual y sobre las prácticas que pueden asociarse al
contagio de la enfermedad, señalando, sin hacerlo de manera
culpabilizadora, las principales lagunas de los jóvenes en cuanto
a la enfermedad.
Como sugerencia a una posible segunda temporada (la serie
podría dar de sí para ello a la perfección), se podrían incluir lo que
podríamos denominar “fugas” aportando algo de diversidad a esa
repetición de la estructura narrativa y de imagen, imágenes de los
personajes “reconstruyendo” esa cotidianeidad de la que hablan,
de forma parecida a un reality; dada la duración, el ritmo que impo-
ne la presentadora, apoyado en una personalidad arrolladora que
seduce al entrevistado y al espectador, no se llega a notar una cierta
monotonía que afecta al formato cuando se han visto varios de ellos
seguidos; de esta forma, con esa “fuga” se sorprende al espectador
y se rompe su estructura de percepción, evitando la sensación de
rutina que algunas veces transmite la realización, al ser tan repetiti-
va. Sin embargo, la duración y el contenido “distrae” al espectador
de esta rutina que si percibe el analista.

289
Capítulo 10

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296
Capítulo 11
Perspectivas Comunicacional, (Inter)
Cultural e Educacional e Competências
na Promoção da Saúde Sexual
e na Prevenção da Sífilis e outras IST
em Contextos Interculturais

Natália Ramos
Universidade Aberta e Centro de Estudos das Migrações e
Relações Interculturais/CEMRI, Portugal,
[email protected].

Juciano de Sousa Lacerda


Laboratório de Inovação Tecnológica em Saúde
da Universidade Federal do Rio Grande do Norte.
Programa de Pós-graduação em Estudos da Mídia da
Universidade Federal do Rio Grande do Norte,
[email protected].

Suelayne Cris Medeiros de Sousa


Laboratório de Inovação Tecnológica em Saúde
da Universidade Federal do Rio Grande do Norte.
Secretaria de Ensino a Distância da Universidade
Federal do Rio Grande do Norte,
[email protected].
Capítulo 11

Anderson Augusto Silva de Almeida


Laboratório de Inovação Tecnológica em Saúde
da Universidade Federal do Rio Grande do Norte.
Secretaria de Ensino a Distância da Universidade
Federal do Rio Grande do Norte,
[email protected].

1. Introdução

O mundo atual, multicultural, global, interdependente e em rede, é


confrontado com a globalização, com conflitos políticos e armados
e com a mobilidade das populações, cujos números de migrantes e
de refugiados e contatos interculturais aumentaram. Estes fatores
contribuíram para intensificar a diversidade cultural das socieda-
des e para aumentar a complexidade das relações interpessoais e
interculturais e das questões comunicacionais, educacionais, inter-
culturais e de cidadania no âmbito social e da saúde.
As sociedades contemporâneas são confrontadas com
novas configurações e problemáticas no campo da saúde, algu-
mas de grande emergência e globalização, como a pandemia da
Covid-19, e com outras pandemias mais silenciosas e contextua-
lizadas, como a da sífilis, acentuando vulnerabilidades, desigual-
dades sociais e de saúde e discriminações, particularmente em
populações mais desfavorecidas, em certas minorias e entre os
migrantes (RAMOS, 2021c, 2021d).
O mundo contemporâneo é confrontado igualmente com
desafios relacionados com a importância dos media1 e da dimen-

1 Expressão na língua portuguesa em Portugal, para expressar o conceito


de “mídia”, ou seja, meios de comunicação de massa. Em Portugal se
usa a expressão em latim para meios, cujo plural é media.

298
Capítulo 11

são comunicacional e tecnológica, com o aumento e diversidade


de recursos comunicacionais e tecnológicos na educação e na
promoção da saúde, designadamente na prevenção da sífilis e
outras IST, bem como com o recurso ao audiovisual, à Internet e à
comunicação digital para o desenvolvimento, divulgação e infor-
mação do conhecimento científico. Estas questões fazem emergir
a importância da comunicação, da informação e da educação na
intervenção em saúde dos indivíduos, grupos e comunidades numa
perspectiva integrativa, intersetorial, multi/interdisciplinar e inter-
cultural e trazem a importância e debate da saúde, da informação e
do conhecimento científico para o campo mediático e para o espaço
público (RAMOS, 2004, 2008a, 2008b, 2012a, 2012b, 2017, 2021d,
2022; SERAFIM; RAMOS, 2014; RANGEL; RAMOS, 2017).
Estas são igualmente questões que colocam desafios à
comunicação e educação em saúde, ao nível da pesquisa, forma-
ção e intervenção, assim como à qualidade, equidade, direi-
tos humanos e cidadania em saúde, sobretudo de populações
socialmente mais vulneráveis e indivíduos culturalmente
diferentes e migrantes. Trata-se de problemáticas e desafios que
implicam um novo paradigma e reposicionamento metodológico,
epistemológico e ético ao nível da pesquisa e intervenção; que
exigem a implementação de políticas e desenvolvimento de
competências para o enfrentamento às questões de saúde na
sociedade aberta, em rede e pluricultural, designadamente às
infeções sexualmente transmissíveis (IST) e à sua prevenção, como
a sífilis; que implicam na promoção do acesso e informação à
saúde de todos, bem como de intervenções em saúde social e
culturalmente competentes e adaptadas (RAMOS, 2020, 2021a,
2021b, 2021c, 2021d, 2022).

299
Capítulo 11

2. Paradigma intercultural em saúde

O paradigma intercultural vem introduzir a pluralidade, a


complexidade e a interdisciplinaridade na pesquisa e na intervenção
em saúde, implicando um novo reposicionamento metodológico,
epistemológico e ético, com base em três vertentes estruturantes
(RAMOS, 2004, 2008a, 2008b, 2011, 2012a, b, 2021, c, d, 2022):
Conceitual – É necessário integrar e refletir problemas
sociais e culturais concretos, vivenciados nos territórios e comu-
nidades locais e regionais. A contextualização dos problemas
acentua a necessidade de situar as questões de saúde nos seus
vínculos territoriais e sociais (geográficos, ecológicos, políticos,
comunitários e culturais) e de promover intervenções e políti-
cas públicas cultural e socialmente enraizadas e articuladas, que
respeitem a integridade e a dignidade do ser humano e incorpo-
rem a defesa dos direitos humanos e a consolidação da cidadania
em cada setor e contexto, tendo por base um direito universal,
ou seja, o direito à saúde e de ser cuidado, indiferentemente da
sua origem social, cultural ou étnica.
Metodológica – Necessidade de ter em conta uma pers-
pectiva global e integrada dos cuidados de saúde que respeite
o utente/usuário na singularidade da sua identidade individual,
cultural e linguística e da sua história pessoal nos contextos cultu-
ral, social e ambiental de origem. Importância de ter em conta os
espaços institucionais de produção de cuidados e as relações que
aí se estabelecem entre os indivíduos e as dinâmicas organiza-
cionais, de gestão/administração, comunicacionais e relacionais,
por exemplo ao nível relacional, clínico e comunicacional entre
usuários, gestores e profissionais de saúde, em que se verificam
frequentemente problemas e manifestações de preconceitos e
discriminações de várias ordens, sobretudo em contextos multi/

300
Capítulo 11

interculturais. Trata-se, para o pesquisador ou interveniente, de


adquirir familiaridade com o universo social, cultural e de saúde
sobre o qual trabalha, de compreender as representações e práti-
cas que o animam e de se interrogar de forma reflexiva não só
sobre a cultura e os comportamentos do outro, mas também, e
em primeiro lugar, sobre a sua própria cultura e comportamentos.
Ética – Necessidade de conhecer as culturas, mas, sobre-
tudo, de afirmar o respeito pela diferença como condição para
a igualdade de acesso a um atendimento digno e qualificado em
saúde e do direito à informação e comunicação adequadas como
um direito à saúde e cidadania. Implica uma atitude de descen-
tração e uma reflexão sobre a forma de respeitar a diversidade
individual, social e cultural, de conciliar o universal e o particular,
o global e o local, de adaptação à complexidade e especificidade
dos contextos, organizações, grupos e indivíduos e às suas confli-
tualidades, contradições, dinâmicas e mudanças.

3. Saúde sexual e prevenção da sífilis


e outras IST em contextos interculturais

A evidência científica tem vindo a revelar que certos grupos


de migrantes e minorias reúnem um maior número de patologias
graves, devido ao diagnóstico e tratamento tardios, às dificuldades
ou falta de acessibilidade aos cuidados de saúde e à carência psicos-
social. Muitos migrantes enfrentam, igualmente, mais limitações
a serviços e bens que promovem a saúde e previnem a doença,
apresentando mais dificuldades de acesso aos serviços de saúde,
recorrendo, por exemplo, menos aos cuidados preventivos, pré-na-
tais, aos rastreios do cancro e a comportamentos preventivos

301
Capítulo 11

relacionados com comportamentos sexuais, comparativamente


aos nacionais (RAMOS, 2004, 2008a, 2009, 2012c, 2015).
Na área da saúde sexual e reprodutiva, é importante ter
em conta as diferenças e as necessidades específicas de cada
indivíduo/comunidade, reconhecendo a importância da intera-
ção entre fatores culturais (saberes populares, papéis tradicionais
associados ao gênero e desigualdades de gênero, diferenças de
poder nas relações sexuais), fatores religiosos e familiares, estilos
de vida (atitudes, valores, comportamentos) e condições de vida
(ambiente, nível socioeconômico, físico e laboral), que afetam o
cotidiano dos indivíduos e influenciam as suas atitudes, decisões
e comportamentos sexuais.
O desenvolvimento de programas de intervenção em saúde
exige que os comportamentos sexuais e reprodutivos sejam contex-
tualizados na realidade em que a comunidade está inserida, espe-
cificamente nas dinâmicas epidemiológicas, migratórias, étnicas,
socioeconômicas, culturais e de gênero, sobretudo na atualidade, face
ao aumento da mobilidade humana e da interculturalidade. Contudo,
os indivíduos, nacionais ou migrantes e minorias, não podem ser
considerados como grupos homogêneos no que diz respeito a conhe-
cimentos, crenças, atitudes e comportamentos em saúde sexual e
reprodutiva (RAMOS, 2004, 2008a; ROCHA; DIAS; GAMA, 2010).
No que diz respeito à adoção de medidas preventivas, exis-
tem diferenças e desigualdades de gênero na capacidade da mulher
e do homem de se protegerem, pois os valores e normas sociocul-
turais colocam muitas vezes a mulher em posições mais vulneráveis
quanto à proteção das IST. As diferenças nos papéis sociais de gêne-
ro e nas variáveis socioeconômicas e culturais refletem-se, muitas
vezes, na exposição das mulheres a maiores riscos para a saúde e a
desigualdades de gênero, comprometendo a eficácia das políticas
de desenvolvimento, de prevenção e de saúde.

302
Capítulo 11

Dados de organizações internacionais e de pesquisas


internacionais têm apontado para uma maior vulnerabilidade
em saúde sexual e reprodutiva nas mulheres imigrantes. Estudos
com mulheres migrantes, designadamente de origem africana em
contexto português e internacional, registram, sobretudo, proble-
mas de saúde sexual e reprodutiva, apontando piores indicadores
de saúde associados a esta população, revelando poucos conhe-
cimentos sobre os serviços sociais e de saúde e utilizando, em
geral, menos frequentemente os serviços de saúde reprodutiva
e menos medidas de proteção do que as mulheres não migrantes
(LOPES, 2007; RAMOS, 2004, 2009, 2012c; SACRAMENTO et al.,
2020; MORAES, RAMOS; CAMARGO, 2020).
Um estudo realizado em Portugal (GASPAR et al., 2006),
dirigido a jovens e pais, majoritariamente oriundos dos Países
Africanos de Língua Portuguesa (PALOP), sobre fatores relacio-
nados com o risco, a proteção e os contextos que envolvem os
adolescentes no âmbito dos comportamentos sexuais, conheci-
mentos e atitudes face ao HIV/Aids, identificou comportamen-
tos sexuais de risco (por exemplo, jovens africanos iniciam mais
cedo a atividade sexual comparativamente com os portugueses;
os adolescentes portugueses apresentam uma maior frequência
de uso do preservativo nas relações sexuais do que os jovens afri-
canos). Já os jovens portugueses referem falar mais com os pais
enquanto fonte de informação, ao passo que os jovens africanos
referem informar-se mais por meio de folhetos e da televisão.
Estudos avaliaram o comportamento sexual de risco e fato-
res associados à infeção pelo HIV nos imigrantes, tendo concluído
que um grande número de imigrantes adota comportamentos
sexuais de risco para o HIV e que o grupo mais vulnerável e de
risco é o dos imigrantes não documentados, recorrendo estes
menos aos serviços de saúde. Concluiu-se igualmente que uma

303
Capítulo 11

grande parte dos trabalhadores do sexo imigrantes desconhecia


o seu estado soropositivo, sendo que os não documentados deste
grupo não recorriam aos serviços de saúde, sobretudo, por receio
ou por desconhecimento dos serviços (DIAS et al., 2010, 2016).
Em Portugal e em outros contextos europeus, estudos
evidenciam a vulnerabilidade da mulher africana subsaariana
relativamente ao HIV/Aids, devido a fatores de gênero (violência e
desigualdades de gênero, recusa de proteção do parceiro quanto
ao uso de preservativo), psicossociais (vitimização, dependência,
contexto relacional, problemas de saúde mental, de prostituição) e
sociocognitivos (nível de conhecimentos acerca do HIV/Aids, cren-
ças e competências relacionadas com a prática do sexo seguro e a
autoeficácia). Constata-se também que as mulheres em geral, espe-
cialmente as imigrantes e africanas, estão mais expostas aos fatores
de risco e de contração relacionados com o vírus, bem como a IST,
devido às condições de relações sexuais abusivas, desigualdades
entre homens e mulheres, situações de pobreza e exclusão, falta
de acesso à informação e educação, menores recursos de proteção
que os homens (RAMOS, 2004, 2008a, 2012c; LOPES, 2007; ROCHA;
DIAS; GAMA, 2010; SACRAMENTO et al., 2020).
Estudos de 2007 e 2009 com mulheres africanas e brasilei-
ras em Portugal registaram que um maior conhecimento sobre
planeamento familiar, métodos de contraceptivos e IST está
associado a níveis educacionais mais elevados. As mulheres que
apresentam níveis maiores de conhecimento tendem a perceber
a doença como um risco pessoal e a reconhecer a importância
de adotar medidas protetoras. As mulheres africanas, além de
demonstrarem desconhecimento em relação ao tema, referem
que a sua vulnerabilidade às IST está associada ao comporta-
mento sexual adotado pelos seus parceiros (relações sexuais não
protegidas e promiscuas), (LOPES, 2007; DIAS; ROCHA, 2009).

304
Capítulo 11

Os programas de promoção da saúde sexual e de educa-


ção e prevenção das IST a serem realizados devem ser cultural e
comunicacionalmente adaptados e devem levar em consideração
fatores psicossociais, sociocognitivos e culturais, que afetam a
prevenção, a capacitação e a adoção de comportamentos promo-
tores de saúde.

4. Competências comunicacionais
e interculturais em saúde

Os profissionais necessitam conhecer e compreender as cultu-


ras das populações com as quais trabalham, as suas particularidades
comunicacionais e a sua relação com as representações, crenças,
comportamentos de saúde e práticas preventivas, sendo uma das
estratégias a comunicação e educação culturalmente competentes.
Estudos e organismos evidenciam a necessidade de os profissio-
nais e decisores que trabalham em meios autóctones ou interculturais
adquirirem formação e competências no âmbito intercultural e comu-
nicacional, competências que agrupamos deste modo (RAMOS, 2004,
2007, 2008a, 2008b; 2012a, 2012b, 2017, 2020, 2021c, 2021d, 2022):
Competências pessoais/individuais: que promovam atitu-
des, comportamentos, conhecimentos e valores, que favoreçam
os indivíduos a serem responsáveis pelos seus comportamentos
de saúde; que desenvolvam capacidades cognitivas e socioemo-
cionais, relações interpessoais e interculturais construtivas, o
autoconhecimento, a empatia, a solidariedade, a reflexão crítica
e uma atitude de descentração. Esta atitude permitirá flexibilizar
e relativizar princípios e métodos, apresentados como superiores
e universais, e evitar muitos comportamentos etnocêntricos, de
intolerância, discriminação e exclusão.

305
Capítulo 11

Competências interculturais: sobretudo linguísticas, comu-


nicacionais e pedagógicas, que facilitem, por um lado, a comunica-
ção intercultural e a formação e conscientização cultural em saúde
e, por outro, que promovam organizações e intervenções cultural
e comunicacionalmente competentes e inclusivas, designadamen-
te no âmbito da saúde, bem como profissionais e serviços cultu-
ralmente preparados, sensíveis e implicados e preparados para
interagir, comunicar e intervir na sociedade multicultural, aberta
e tecnológica atual.
Competências de cidadania: que tornem possível o funcio-
namento democrático e plural das sociedades, organizações e
serviços, designadamente de saúde.
Competências tecnológicas e comunicacionais: desig-
nadamente ao nível das tecnologias audiovisuais, da utilização
das novas tecnologias da informação e comunicação, da Internet
e dos media. Estes meios poderão ter um papel importante na
educação, informação e comunicação e intervenção em saúde,
na sensibilização para as questões da diversidade cultural e no
combate a estigmas, preconceitos, estereótipos, racismo e discri-
minação, seja em relação a indivíduos e grupos, como minorias
étnico-culturais e migrantes, seja na educação e prevenção rela-
tivamente a certas doenças, a determinadas práticas culturais e
a comportamentos de risco em saúde.

5. Paradigma intercultural aplicado


ao audiovisual científico

Perante esse contexto de saúde e comunicacional, desen-


volveu-se uma pesquisa denominada “O audiovisual como ferra-
menta de divulgação científica em saúde: um estudo aplicado no

306
Capítulo 11

Projeto ‘Sífilis Não’” (SOUSA, 2022), com o objetivo de analisar


quais os aspetos da linguagem audiovisual que favorecem, ou não,
o interesse de jovens por conteúdos científicos relacionados com
a saúde. No trabalho, foi possível destacar a presença das três
vertentes estruturantes do paradigma intercultural: conceitual,
metodológica e ética.
Do ponto de vista conceitual, a reflexão desse trabalho
está voltada para o problema social que representa o alto núme-
ro de notificações de sífilis contraída entre o público jovem (na
faixa etária entre os 20 e os 29 anos) no Brasil. Essa população
representava 38,8% dos casos notificados em 2020, de acordo
com o SINAN (Sistema de Informação de Agravos de Notificação)
(BRASIL, 2020). Nesse sentido, discutiu-se sobre comunicação em
saúde como uma forma de intervenção, já que esta pode ser utili-
zada para “informar e influenciar os comportamentos e as deci-
sões dos indivíduos, dos grupos e das comunidades, no sentido
da promoção da saúde, bem-estar e prevenção das situações de
doença, risco e vulnerabilidade” (RAMOS, 2012b, p.3).
No que se refere à perspectiva metodológica desse para-
digma, a utilização de um formulário on-line, em que se obteve
a participação de 300 jovens universitários, permitiu compreen-
der melhor a relação entre esse público e os produtos audiovi-
suais científicos, pois forneceu informações sobre quais formatos
audiovisuais interessam mais a este público, quais os aspetos
técnicos destes vídeos que podem ser decisivos nesse processo
comunicacional, além de questões comportamentais como, por
exemplo, que tipo de media habitualmente esses jovens utilizam
para ter acesso a esses conteúdos.
Levando em consideração que a divulgação científica
permite a veiculação de informações sobre ciência e tecnologia,
como também sobre saúde, para um público amplo e diverso que

307
Capítulo 11

não está necessariamente inserido em contextos acadêmicos e/


ou de pesquisa científica (BUENO, 2010), podemos destacar ainda
que o uso do audiovisual nesse processo de comunicação possi-
bilita um diálogo intercultural, no qual a linguagem audiovisual se
apresenta como uma ferramenta que facilita a compreensão de
conteúdos mais complexos, os quais geralmente são discutidos
em grupos mais específicos da sociedade. Dessa forma, a verten-
te ética está presente, pois a divulgação científica se apresenta
como um processo que pode ampliar o acesso à informação em
saúde, contribuindo para que mais pessoas exerçam o seu direito
à comunicação e cidadania.
A partir dos resultados obtidos com essa pesquisa (SOUSA,
2022), apresentamos várias orientações para a construção de um
produto audiovisual científico relacionado à saúde e direcionado
aos jovens, ou seja, podem ser aplicados esses resultados na cons-
trução de vídeos que trabalhem a questão da prevenção e trata-
mento de sífilis e dialoguem com os jovens, por exemplo. Com
isso, podemos destacar algumas competências comunicacionais
e interculturais em saúde que a aplicação dessa pesquisa pode
gerar, como as competências tecnológicas e comunicacionais e
as competências pessoais/individuais.
Por fim, destaca-se que a aplicação da pesquisa se integra
nas competências tecnológicas e comunicacionais, já que é suge-
rida a produção de vídeos que tenham um caráter científico e
estejam relacionados à promoção em saúde no contexto da sífilis.
Além disso, o conhecimento gerado por esses produtos audiovi-
suais também permite a promoção de competências pessoais/
individuais, uma vez que a ideia é divulgar informações que possi-
bilitem mudanças de atitudes e comportamentos entre os jovens,
tornando-os responsáveis pelos seus comportamentos de saúde.

308
Capítulo 11

6. Paradigma intercultural aplicado à publicidade

Diante da análise multissetorial da comunicação em saúde,


e frente ao contexto da interculturalidade e seus paradigmas, é
apresentada a investigação em curso sobre a percepção de sujei-
tos negros frente à representação da terceira fase da campanha
publicitária de combate à sífilis no Brasil (ALMEIDA, 2022).
Baseado no Boletim Epidemiológico/20202, o Brasil passa
por uma epidemia de sífilis, com destaque para índices eleva-
dos de contaminação entre jovens pardos e negros, com idade
entre os 20 e os 29 anos, sendo as mulheres as mais atingidas. O
Ministério da Saúde do Brasil, por meio do Projeto Interfederativo
de Resposta à Sífilis nas Redes de Atenção (“Sífilis Não”), produ-
ziu a terceira fase da campanha publicitária de combate à doen-
ça, intitulada “Sífilis – Eu sei, você sabe?”, que tinha o objetivo
de fortalecer o discurso preventivo da doença com estratégias
focadas nas plataformas de comunicação digital, além de peças
publicitárias impressas, audiovisuais, spots para rádios e digitais.
Segundo Castro (2006), “a publicidade é reconhecida como um
processo de produção de formas culturais e se afirma então como
suporte visível de representação de identidades” (CASTRO, 2006,
p. 103). As peças publicitárias objetivaram destacar a represen-
tatividade étnico-cultural, com o intuito de atender a população
negra, até recentemente menosprezada no que diz respeito à
presença em materiais de divulgação institucional.
Como saber se a representatividade implantada na campa-
nha foi assertiva na perspectiva dos representados? Existe iden-
tificação desse público-alvo com o material criado? Após vasta
revisão bibliográfica, dentro do contexto que integra a doença

2 (http://www.aids.gov.br/pt-br/pub/2020/boletim-sifilis-2020)

309
Capítulo 11

e o público-alvo da pesquisa, é necessário pontuar a adequação


conceitual do paradigma intercultural em saúde, ao analisar ques-
tões sociais da representatividade – conforme Pinho et al. (2002),
em trechos históricos, a conjuntura histórico-social do Brasil escra-
vocrata apontada por Santos (2016), a sexualidade do público-alvo,
bem como a sua situação educacional, social e econômica, segundo
o IBGE (2019), a fim de compreender e solidificar a compreensão
de toda a conjuntura circunstancial presente nesta análise.
Do ponto de vista metodológico, a investigação baseia-se
na tipologia que Gil (2008) aponta como quantitativa e, segundo
Kauark, Manhães e Medeiros (2010), descritiva, visto que busca
compreender os fatores que determinam o nível de implicação da
população negra na campanha “Sífilis – Eu sei, você sabe?”, a sua
identificação e se os elementos de representatividade adotados
foram favoráveis. Foram usados 300 questionários com jovens
negros, entre os 20 e os 29 anos, em Natal, no Rio Grande do
Norte, numa aproximação do modo de investigação baseado nas
autoras Dias e Gama (2014), que destacam a “Investigação parti-
cipativa baseada na comunidade em saúde pública”.
É legítimo destacar que nas investigações científicas, que
tenham a participação de seres humanos, é necessário analisar a rela-
ção entre o interesse de cada pessoa que será exposta à investigação
e o interesse científico. A pesquisa em questão é diretamente ligada
à área da saúde pública, por isso devemos levar em consideração a
Declaração de Helsinki (1964), da Associação Médica Mundial, apon-
tando que a pesquisa deve suprir as necessidades da população onde
foi realizado o estudo e beneficiá-la com os resultados encontrados,
o que, de fato, é um dos objetivos dessa investigação.
Do ponto de vista da competência individual, é de esperar
que a campanha publicitária “Sífilis – Eu sei, você sabe?” tenha
sido recebida de forma positiva pela população negra, que é alvo

310
Capítulo 11

do estudo, e atingido um nível considerável de identificação e


representatividade. Essa configuração se dá na medida em que
essas pessoas foram impactadas e passaram a pensar sobre a
sífilis, a tomar as medidas protetivas, a debater com amigos e
familiares e, assim, a evitar o contágio, a diminuir e a erradicar a
contaminação no Brasil.
Nos aspectos da interculturalidade, é possível apontar
pontos destacáveis na investigação em curso (ALMEIDA, 2022),
entre eles a relevância de se apontar a assertividade de uma
comunicação adequada para cada público e de atingir a dimen-
são inclusiva, em termos de sociedade e representatividade. Ao
mesmo tempo, diante dos resultados dessa investigação, na condi-
ção de cidadania, é de esperar-se a efetivação de uma comunica-
ção em saúde democrática que inclua e possa representar todos
os brasileiros, suas etnias, grupos culturais e regionalizações. A
conclusão desses dados será compartilhada com o Ministério da
Saúde do Brasil de modo a implementar políticas públicas em
saúde, possivelmente para todo o país, e ainda estabelecer linhas
norteadoras para novas campanhas publicitárias.
Por fim, a investigação baseia-se em uma campanha publi-
citária criada para as redes sociais. Aqui destacamos as competên-
cias tecnológicas e comunicacionais. Na análise em questão, foi
observada a divulgação, principalmente nas plataformas digitais,
que reúne fortemente o público-alvo da investigação, apontado
por D’Angelo (2022), e que funcionou de forma indireta como
ferramenta para a educação em saúde (BERNARDES et al., 2018).

311
Capítulo 11

7. Considerações finais

O diálogo multi/interdisciplinar e holístico entre saúde,


comunicação e cultura coloca novos paradigmas e desafios estra-
tégicos, políticos, teóricos, metodológicos e éticos na prevenção,
informação, educação, comunicação e promoção em saúde, assim
como acentua a necessidade de desenvolver competências diver-
sificadas e adequadas neste âmbito.
Revela-se importante que pesquisadores, decisores políti-
cos, profissionais e gestores da área da saúde tenham em conta
as dimensões comunicacional, cultural, socioeconômica e política
entre os fatores que determinam, promovem ou minimizam a
qualidade e as desigualdades em saúde das populações nacionais,
migrantes ou de minorias étnico-culturais, designadamente no
âmbito da saúde sexual e das IST, como é o caso da sífilis (RAMOS,
2008a, 2012a, 2012b, 2012c, 2015, 2017, 2021a, 2021c, 2021d;
RANGEL; RAMOS, 2017). Da mesma forma, é essencial que este-
jam atentos aos usos e apropriações que tais populações fazem
das tecnologias da comunicação como forma de competência
cultural e de cidadania (LACERDA; TEIXEIRA, 2020).
É necessário que os profissionais de saúde tenham acesso
a uma formação sólida sobre a complexidade de fatores explicati-
vos e intervenientes nos comportamentos sexuais e de saúde e no
recurso aos cuidados, os quais não são unicamente de ordem indivi-
dual, mas de um conjunto indissociável de fatores culturais, sociais,
econômicos, psicológicos, ambientais e políticos. A integração de
conhecimentos psicossociais, interculturais e comunicacionais,
incluindo as tecnologias audiovisuais e de informação e comuni-
cação, na formação dos profissionais de saúde, poderá ajudar a
melhorar a comunicação e informação em saúde e a combater os
estigmas e os estereótipos, contribuindo para a compreensão dos

312
Capítulo 11

processos de comunicação e dos sentidos individuais e culturais


dos comportamentos, segundo as idades, as gerações, os gêneros,
os meios sociais e culturais (RAMOS, 2004, 2017, 2021a, 2021b).
Relativamente às IST, como por exemplo, a sífilis, com as
quais encontramos associados muitos imigrantes e minorias, reve-
la-se fundamental o reforço de medidas de proteção, de sensibi-
lização e informação sobre os riscos e a importância da adoção
de estratégias e políticas de proteção e intervenção, a partir de
materiais e meios adaptados ao nível linguístico, comunicacional,
cultural e tecnológico, do fortalecimento de parcerias, da coordena-
ção intersetorial e interinstitucional e do reforço da cooperação das
redes comunitárias e associativas das populações, designadamente
de imigrantes e refugiados com as autoridades e unidades de saúde
pública e hospitalar (RAMOS, 2012b, 2020; 2021b, 2021c, 2022).
São necessários mais estudos relativos à sexualidade nas
comunidades migrantes e de minorias étnico-culturais para um
conhecimento mais aprofundado dos comportamentos sexuais
e das medidas preventivas mais adequadas, designadamente ao
nível das IST.
Importa desenvolver competências, políticas, estratégias
e intervenções em saúde resilientes, sustentáveis e inovadoras,
adaptadas à diversidade individual, social e cultural e às necessi-
dades dos diversos contextos e situações de saúde e promotoras
da saúde de todos, sobretudo dos mais vulneráveis.
Levando em consideração a perspectiva sistêmica e inte-
grada da prevenção e promoção da saúde, a abordagem da saúde
sexual e reprodutiva representa também uma das suas principais
vertentes, afetando a saúde em geral e o bem-estar dos indiví-
duos, grupos e comunidades.
A discussão e a abordagem destas questões vêm contri-
buir para a concretização e promoção dos Objetivos de

313
Capítulo 11

Desenvolvimento Sustentável das Nações Unidas para 2030 (UN,


2015), sobretudo para os seguintes:

• Assegurar uma vida saudável e promover o bem-estar e a


qualidade de vida para todos, em todas as idades (ODS 3).
• Assegurar a educação inclusiva, equitativa e de quali-
dade e promover oportunidades de aprendizagem ao
longo da vida para todos (ODS 4).
• Promover a igualdade de gênero (ODS 5).
• Reduzir as desigualdades no interior dos países e entre
os países (ODS 10).

314
Capítulo 11

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321
Capítulo 12
Divulgação Científica e Informação em
Saúde para Regiões Fronteiriças
O Enfrentamento à Sífilis na Tríplice
Fronteira Brasil/Paraguai/Argentina

Arthur Barbalho Braz


Mestrando em Relações Interculturais na Universidade
Aberta de Portugal. E-mail: [email protected].

Bárbara Maria Granês Gonçalves Bäckström


Professora associada da Universidade Aberta
de Portugal. E-mail: [email protected].

Lilian Carla Muneiro


Professora adjunta do Departamento de Comunicação
Social da Universidade Federal do Rio Grande
do Norte. E-mail: [email protected].

Laísi Catharina da Silva Barbalho Braz


Doutoranda em Estudos Contemporâneos na Universidade
de Coimbra. E-mail: [email protected].

Suelayne Cris Medeiros de Sousa


Mestranda em Relações Interculturais na Universidade
Aberta de Portugal. E-mail: [email protected].
Capítulo 12

Jordana Maria Vieira Soares


Graduanda em Jornalismo na Universidade Federal do Rio
Grande do Norte. E-mail: [email protected] .

1. A sífilis em áreas de fronteira do Brasil

A amplitude do Brasil é uma questão que não se limita ao seu tama-


nho geográfico: o país constitui-se como um amplo território dotado
de diferenças sociais, políticas, econômicas e étnicas. Tais porme-
nores representam um desafio para a implementação de políticas
públicas em saúde, ainda mais quando se trata do combate a uma
doença que em situação epidêmica, como é o caso da sífilis. E em um
contexto como este, iniciativas de comunicação que promovam uma
real mudança de comportamento, sobretudo em setores sensíveis da
sociedade, fazem-se importantes para o êxito de qualquer iniciativa.
Visando dar maior capacidade de resposta à problemática
da sífilis, dada a já citada situação epidêmica no país, com o regis-
tro de crescimento em praticamente todos os anos após a sua
notificação compulsória, uma auditoria realizada pelo Tribunal de
Contas da União (TCU) propôs uma série de recomendações para
conter o aumento de casos em território nacional, publicadas por
meio do acórdão 2019/2017.
O documento reúne e direciona uma série de recomendações
ao Ministério da Saúde e propõe, entre outras questões, que se “reali-
ze avaliação dos motivos que prejudicam a efetividade das medidas
de prevenção primária da sífilis adquirida e, com base nos resultados,
desenvolva novas e diversificadas campanhas/estratégias de preven-
ção, abordando diferentes formas de comunicação, segmentadas
a públicos específicos (por exemplo: adolescentes, profissionais do
sexo, população sem acesso à internet etc.), com vistas a reforçar
o impacto das medidas de prevenção na população”, ou seja, que

323
Capítulo 12

sejam realizadas novas estratégias de comunicação que dialoguem


diretamente com esses públicos-alvo preestabelecidos.
Nesta perspectiva que surgiu o Projeto de Resposta Rápida
à Sífilis nas Redes de Atenção, também chamado “Sífilis Não”, ação
interfederativa desenvolvida pelo Ministério da Saúde por meio do
Departamento de Vigilância, Prevenção e Controle das IST, do HIV/
Aids e das Hepatites Virais/DIAHV, viabilizado pela Universidade
Federal do Rio Grande do Norte (UFRN) por meio do Laboratório de
Inovação Tecnológica em Saúde (LAIS) e executado pela Fundação
Norte-Rio-Grandense de Pesquisa e Cultura (FUNPEC). O projeto
contou com apoio da Organização Mundial de Saúde (OMS), através
da Organização Pan-Americana de Saúde (OPAS/OMS).
Toda a articulação realizada tinha o propósito de induzir
práticas de saúde para controle da sífilis e promover o desen-
volvimento de metodologias inovadoras para o enfrentamento
da doença. Neste espectro, diversas pesquisas e parcerias foram
estabelecidas no Brasil e em âmbito internacional com órgãos de
controle, instituições de ensino e conselhos de saúde para a reali-
zação de tais ações. Cabe registrarmos que o referido projeto se
divide em quatro eixos: vigilância, gestão e governança, assistên-
cia e educomunicação. Desta forma, foram desenvolvidas ações
que visaram contemplar estes respectivos eixos e suas carências.
Há, porém, um fator crucial para entendermos as dificul-
dades do potencial de alcance e a complexidade das iniciativas
adotada nos eixos do projeto “Sífilis Não”.
Por sua ampla extensão, o país apresenta características
distintas em cada uma de suas regiões, que podem ser impactadas
pela cultura oriunda de outros países do continente, uma vez que

324
Capítulo 12

há fronteiras terrestres com 10 países na América do Sul1. Dentre


as cidades que apresentam tais características, destaca-se o muni-
cípio de Foz do Iguaçu, na região Oeste do estado brasileiro do
Paraná. Ele compõe a região conhecida como “Tríplice Fronteira”,
formada em conjunto com as cidades vizinhas de Puerto Iguazú,
na Argentina, e principalmente Ciudad Del Este, no Paraguai.
Aqui, a interseção de fatores sociais (como a língua, costumes,
religião, etc.) impacta diretamente em questões como a econo-
mia, a educação, e também na saúde pública.
Antes de prosseguirmos com nossa investigação, vale
apresentar, mesmo que de modo breve, um conceito de inter-
culturalidade. Lopez-Hurtado Quiroz (2007, p. 21-22) apresenta
da seguinte forma:

Desde este ponto de vista, a interculturalidade supõe agora


também abertura diante das diferenças étnicas, culturais e
linguísticas, aceitação positiva da diversidade, respeito mútuo,
busca de consenso e, ao mesmo tempo, reconhecimento e acei-
tação do dissenso, e na atualidade, construção de novos modos
de relação social e maior democracia (QUIROZ, 2007, p.21-22).

Tal interculturalidade, por vezes, não é levada em conta


em ações mais amplas de saúde e bem-estar públicos na esfera
federal, embora muitas vezes a densidade de relações entre todos
os entes seja marcante para os indivíduos de uma determinada
região. Assim, este capítulo teve como foco identificar quais os
pormenores que impactam na disseminação de informação sobre
a sífilis no contexto de regiões fronteiriças do Brasil, bem como

1 Brasil: fronteiras terrestres. Disponível em: https://www.funag.gov.


br/ipri/images/analise-e-informacao/fronteiras-terrestres-bra-
sil-13052015.pdf. Acesso em: 14 jun. 2021.

325
Capítulo 12

da necessidade de políticas específicas de promoção à educação


em saúde para tais regiões.
O Brasil é o país com maior território da América do Sul, o
que corresponde a cerca de 47% da área total do continente. Tal
característica possibilita que o país tenha fronteiras com a maioria
de seus vizinhos sul-americanos. Este cenário tende a possibilitar
trocas culturais constantes, mesmo que muitas dessas áreas não
correspondam a regiões com grandes índices demográficos.
Assim, estas relações diárias em territórios de fronteira
possibilitam o surgimento de relações interculturais bem distintas
entre os brasileiros e demais povos vizinhos da América do Sul, se
comparadas com as relações entre aqueles que vivem em centros
urbanos distantes da fronteira, como o litoral, onde historicamen-
te está a maior concentração demográfica no país.
De acordo com dados do Instituto Brasileiro de Geografia e
Estatística (IBGE), 588 municípios brasileiros estão localizados na
chamada “faixa de fronteira”, que correspondente a toda frontei-
ra terrestre do país com seus vizinhos sul-americanos. A extensão
total dessas divisas é de 16.885,7 km, sendo que não há fronteiras
somente com o Chile e o Equador. Tais dados correspondem a 16,7%
do território brasileiro, com uma população estimada de 10 milhões
de pessoas, o que equivale a 4,74% da população nacional.
A configuração de um município classificado como de fron-
teira se dá por meio da Lei n° 6.634, de 02/05/1979, regulamenta-
da pelo Decreto n° 85.064, de 26/08/1980 , cujo teor foi ratificado
pela Constituição Federal de 1988, no parágrafo segundo do arti-
go 2°, que cria o Cadastro dos Municípios brasileiros com área
total ou parcialmente localizada na Faixa de Fronteira, que é a
faixa interna de 150 km de largura, paralela à linha divisória terres-
tre do território nacional, agregando as informações existentes
(código geográfico e nome do município) com as produzidas na

326
Capítulo 12

identificação e/ou classificação do município dentro da faixa, tais


como: fronteiriço, parcial ou totalmente na faixa, referências da
sede à linha de fronteira e ao limite da faixa interna.
Tal regulamentação, porém, não leva em conta características
socioculturais, políticas e ambientais dessas regiões, que contemplam
desde áreas que abrangem desde a bacia amazônica, passando pela
região do Pantanal, áreas do chamado gran chaco, regiões de selva
subtropical, os pampas do sul do continente e áreas de planície e coli-
nas baixas, que propiciam ajuntamentos populacionais, tendo como
exemplo as cidades fronteiriças entre Brasil e Uruguai.

2. Interculturalidade e Projeto “Sífilis Não”

Conforme Santos-Melo, Andrade e Ruoff (2018, p. 106), as


interculturalidades geradas por esta integração social e econômi-
ca ocorrem de maneira natural nas faixas territoriais de fronteira.
As regiões de fronteira podem ser complexas, visto que municí-
pios de fronteira se integram cultural, social e economicamente de
maneira natural. Criam uma espécie de terceiro espaço, forman-
do uma nova sociedade, com cultura e valores próprios dessas
localidades, o que lhes oferecem uma identidade diferente do
contingente restante dos países aos quais pertencem. (SANTOS-
MELO; ANDRADE; RUOFF, 2018, p. 106).
Todas estas características tendem a afetar questões como
economia, educação e saúde pública destas regiões. E neste âmbi-
to da saúde, há um desafio de garantir que tais regiões e seus
habitantes tenham acesso aos serviços, que por vezes também
são impactados por populações de países vizinhos.
No que diz respeito à sífilis, é importante destacar que até
meados de 2018, o Brasil nunca havia desenvolvido ação integrada

327
Capítulo 12

sequer no âmbito nacional para o enfrentamento da doença, que


há anos se encontra em situação epidêmica no país. Cabe registrar
que somente em 2010 sua notificação passou a ser compulsória,
e tal ação permitiu identificar o crescimento da taxa de detecção,
que saltou de 2,0 casos por 100 mil habitantes em 2010 para 58,1
casos por 100 mil habitantes em 2017.
Assim, fez-se necessário o uso de metodologias diferen-
tes para o enfrentamento desta doença em território nacional.
E é justamente nesta esteira que nasceu o Projeto de Resposta
Rápida à Sífilis nas Redes de Atenção – Sífilis Não, com o intuito de
desenvolver pesquisas acadêmicas e médicas, uma série de ações
educativas e ampla comunicação sobre as formas de combate e
tratamento de infecção sexualmente transmissível (IST). Desde
sua concepção, foram definidos 100 municípios prioritários, esco-
lhidos por concentrarem cerca de 60% dos casos de sífilis de todo
o país. Cerca de 40% do número de casos de sífilis no Brasil estão
em cidades da chamada região de fronteira.
Visando clarificar a densidade de tais populações e seu impacto
nos dados epidemiológicos da sífilis no Brasil, realizamos busca na base
de dados do Sinan (Sistema de Informação de Agravos de Notificação),
fazendo um quantitativo de números de casos de sífilis adquirida,
sífilis em gestantes e de sífilis congênita em todos os municípios que
compõem as áreas de fronteira terrestre do Brasil. Aferimos que, em
2019, foram registrados 47.436 casos de sífilis adquirida nestes muni-
cípios, ou seja, pouco mais de 31% do total de casos de todo o país.
Sobre a sífilis em gestantes, foram 27.144 (44% dos casos nacionais), e
de sífilis congênita 8.036 casos (33,3% dos casos).

328
Capítulo 12

Quadro 1 – Números de casos de sífilis em cidades de fronteira do Brasil.


A SÍFILIS NAS CIDADES DE FRONTEIRA DO BRASIL
Percentual em relação
Tipo Total de casos
ao total de casos do Brasil
Sífilis adquirida 47.436 casos 31%
Sífilis em gestantes 27.144 casos 44%
Sífilis congênita 8.036 casos 33,3%
Fonte: Elaboração própria (2021).

Os dados do Sinan apontam para um cenário que merece


atenção, uma vez que embora representem pouco mais de 30%
dos casos de sífilis no Brasil, se levarmos em conta a densidade
populacional destas regiões (com pouco mais de 4% da população
da população nacional), tais números tornam-se ainda mais alar-
mantes. Assim, faz-se necessário que nestas regiões as iniciativas
de prevenção e atenção à saúde sejam desenvolvidas com um
foco específico para as suas realidades, levando em conta a parti-
cularidade de cada uma delas e os pormenores sociais, culturais
e sociológicos que compõem a equação do problema da saúde.
Dentre as chamadas cidades de fronteira, há aquelas em que
a proximidade gera o que podemos chamar de interdependência,
quando um ou mais serviços de uma determinada área tende a
contemplar as populações fronteiriças de ambos os municípios
envolvidos. No Brasil, o caso mais emblemático é o de Foz do Iguaçu,
na região Oeste do Paraná. A cidade está localizada na chamada
Tríplice Fronteira, fazendo divisa com os municípios de Ciudad Del
Este, no Paraguai, e Puerto Iguazú, na Argentina. Tal proximidade
fortalece a relação entre os moradores desta região, onde há livre
circulação de pessoas, políticas públicas distintas e baseadas em
acordos internacionais, e sobretudo, uma interseção entre as cultu-
ras que compõem tais povos, formando assim um arranjo popula-
cional. Araújo (2018, p. 59) define os arranjos populacionais como

329
Capítulo 12

uma consequência dessa relação entre os entes que compõem


cidades de fronteira, delimitando da seguinte maneira:

Os arranjos populacionais são uma consequência direta dessas


interações espaciais entre cidades, uma vez que eles surgem da
articulação entre duas ou mais cidades. Os arranjos populacio-
nais fronteiriços tornam-se ainda mais particulares em função
de serem produtos de uma dinâmica de atividades econômicas
e produtivas entre cidades gêmeas, atividades estas que promo-
vem a divisão territorial do trabalho num aspecto ainda mais
singular (ARAÚJO, 2018, p. 59).

As estruturas dos arranjos populacionais, ainda mais em


regiões fronteiriças, tendem formar estruturas sociais maiores
que, por sua vez, trazem uma interdependência entre as cidades
e/ou regiões que as compõem.

3. Desafio premente:
saúde e estratégias comunicativas

No âmbito da saúde, há um desafio constante, uma vez


que cada país possui sua política pública de monitoramento de
doenças. Logo, nestas regiões, o rastreio de agravos como a sífilis
e demais infecções sexualmente transmissíveis corresponde a um
desafio para os órgãos de saúde pública. E muito por isso, o uso
de estratégias de comunicação se faz necessário para tais regiões,
sempre respeitando as características culturais dos povos que
fazem parte destas. Especificamente no caso de Foz do Iguaçu,
os dados do Sinan apontam 1.844 casos de sífilis adquirida, 566
casos de sífilis em gestantes e 345 casos de sífilis congênita.
Assim, percebemos que ao não se adotar estratégias de
comunicação inovadoras direcionadas especificamente para a

330
Capítulo 12

figura do “homem de fronteira”, deixa-se de contemplar parcela


significativa da população, mesmo que significativa parcela popu-
lacional possa ser classificada outros públicos-alvo.
Foz do Iguaçu constitui uma região classificada pelo IBGE como
um “arranjo populacional”. Trazendo para a perspectiva de Foz do
Iguaçu, é possível fazer um recorte sobre o que aponta Araújo (2018,
p. 53), em relação aos arranjos populacionais na área de fronteira:

O arranjo populacional na área de fronteira é impulsionado assim,


pela formação de redes polarizadas em grande parte motivado
pela dissimetria espacial do que se refere à oferta de bens e servi-
ços, o que gera uma constante migração periódica, um número
cada vez maior de pessoas que se deslocam de seu município e
atravessam a faixa de fronteira em busca de mercadorias e serviços
como educação, trabalho, entre outros. (ARAÚJO, 2018, p. 53).

Nesta perspectiva de bens e serviços, podemos incluir aqui


os serviços de saúde, que por vezes recebem pacientes oriundos de
outros países. No caso específico do município de Foz do Iguaçu,
indivíduos vindos tanto da Argentina (com o município de Puerto
Iguazú), como do Paraguai (com os municípios de Ciudad Del Este,
Presidente Franco, Hernandárias e Minga Guazú), tendem a buscar
os serviços em território brasileiro. Quantificar os dados de notifica-
ção de sífilis como oriundos de pacientes vindos dos demais países
que compõem a Tríplice Fronteira, porém, não é possível, uma vez
que o Sinan não contempla este tipo de categorização. Contudo, a
melhor estruturação da rede de atenção primária, em virtude da
complexidade do Sistema Único de Saúde (SUS), coloca o município
brasileiro em posição de evidência neste contexto, o que, por sua vez,
demandaria mais ações de prevenção, com ênfase na comunicação.
Carneiro Filho (2013, p. 147) afirma que a relação entre
as cidades desta Tríplice Fronteira é baseada em uma estrutura

331
Capítulo 12

socioeconômica que “caracteriza-se pela complementaridade e pela


interdependência, ainda que as três cidades estejam submetidas a
decisões externas a elas, como aquelas provenientes de órgãos nacio-
nais, como a Receita Federal e o Ministério da Fazenda do Brasil [...]”.
Tal interdependência impacta diretamente toda a rede de atenção e
serviços da saúde, sobretudo em território nacional.
Para além dos já discutidos contextos socioeconômicos, que
impactam na questão da saúde pública, há ainda outro fator: os
idiomas e suas particularidades em função da sociolinguística que
aportam. Foz do Iguaçu abrange pelo menos três: o português,
o espanhol e o guarani, este último amplamente falado do lado
paraguaio da fronteira e em menor escala nos outros dois países.
As ações de comunicação desenvolvidas no Brasil ao mesmo tempo
em que não levam em conta a particularidade da figura do indivíduo
transfronteiriço, também negligenciam ao não adotar iniciativas de
comunicação – sejam elas por meio de mídia impressa ou digital.
Com vistas em compreender a percepção que as pessoas
que vivem em regiões de fronteira têm em relação às iniciativas de
saúde, com destaque para a comunicação, realizamos uma série de
entrevistas com pessoas que vivem na região da Tríplice Fronteira.
A população inicial do estudo foi constituída por 20 indiví-
duos, moradores da região de fronteira, nas cidades de Presidente
Franco e Ciudad Del Este, no Paraguai, e Foz do Iguaçu, no Brasil.
Os convites para participação foram realizados por meio de conta-
to telefônico e de e-mail.
Como critérios de inclusão, foram considerados participantes
com idade superior aos 18 anos, com residência comprovada em
região de fronteira, e que apresentaram disponibilidade e consen-
timento livre e esclarecido para participar das entrevistas semies-
truturadas. Foram excluídos os indivíduos que não compareceram
ou não se disponibilizaram a participar das entrevistas de modo

332
Capítulo 12

integral. Após a aplicação dos critérios de inclusão e exclusão, a


amostra final do estudo foi constituída por 11 participantes.
A coleta de dados ocorreu entre os dias 2 e 6 de agosto
de 2021, nos quais foram realizadas entrevistas presenciais com
os participantes. Estava prevista ainda para o mês de novembro
uma nova rodada de entrevistas, com vistas em complementar
a amostra, uma vez que no período a fronteira com a Argentina
havia sido reaberta, mesmo que com limitações. Todavia, ques-
tões financeiras que envolvem o projeto “Sífilis Não”, bem como
o cumprimento integral da agenda de entrevistas prevista, acaba-
ram por inviabilizar esta segunda etapa da coleta, limitando o
estudo aos dados registrados em agosto de 2021.
As entrevistas ocorreram nas cidades de Foz do Iguaçu, no
Brasil; Ciudad Del Este e Presidente Franco, no Paraguai. A escolha das
cidades levou em conta dois fatores: sua localização, que as coloca
como os principais municípios da fronteira terrestre que mais rece-
bem pessoas no Brasil (no caso de Foz do Iguaçu) e no Paraguai (no
caso de Ciudad Del Este e Presidente Franco); e também a ampla
presença de cidadãos brasileiros nas três cidades citadas, reforçada
por contextos que envolvem sobretudo questões econômicas, visto
que a região tem uma das maiores zonas de livre comércio do mundo.
Segundo Muller e Oliveira (2005), estas características dos
povos que compõem o perfil sociocultural da região sintetizam
uma consciência coletiva no que diz respeito à concepção espacial
da Tríplice Fronteira.

Acreditamos que ali também são construídas, reelaboradas e


constituídas uma outra cultura e identidade diferenciada, capaz
de dar conta das demandas específicas do local. Ao trilhar por ruas,
praças, rios e pontes nas fronteiras em questão, passamos a experi-
mentar distintos processos de interação e perceber práticas cultu-
rais e intercâmbios estabelecidos pelos moradores locais. As trocas

333
Capítulo 12

entre lá e cá, as articulações entre o eu e o eles, as influências de


ambos os lados e a ‘consciência’ de um nós, ultrapassam barreiras,
cruzam limites, por vezes de modo silencioso, por outras de forma
gritante, dando concretude ao fenômeno fronteira, tornando-a
‘viva’, porosa, diluída, borrada e extremamente dinâmica a partir
de ações compartilhadas. Ações que sustentam o exuberante
multiculturalismo e personaliza a identidade dos homens e a ‘alma’
do lugar. (MULLER; OLIVEIRA, 2005, p. 2).

É nesta vivacidade identificada que é a fronteira brasilei-


ra com maior fluxo de indivíduos, o que justifica a realização da
pesquisa no local em questão, uma vez que tal interculturalidade
ajuda a conceber uma espécie de ideal comum aos que lá estão.
O processo de coleta de dados levou em conta um questio-
nário semiestruturado relacionado a questões sociodemográficas; e
entrevista presencial com ênfase no problema da comunicação em
saúde pública em região de fronteira com roteiro preestabelecido.
A adoção deste formato deve-se ao contexto proposto para a
coleta da amostra, com encontros presenciais e a realização de visita
técnica à região onde viviam os entrevistados. As entrevistas tive-
ram uma duração média de uma hora, e foram conduzidas de forma
flexível, respeitando a disponibilidade dos participantes, bem como
a particularidade de cada indivíduo para a elaboração das respostas.
Nossa pesquisa foi diretamente afetada pela pandemia da
covid-192, que assolou o mundo inteiro, mas que no Brasil teve um
desenvolvimento especialmente negativo. A ausência da adoção
de políticas de enfrentamento ao coronavírus por parte do gover-
no brasileiro impactou negativamente a histórica política de rela-
ções exteriores do Brasil, com destaque para a relevância no país
no âmbito do Mercosul, claramente diminuída. Cabe registrarmos

2 Disponível em: https://news.un.org/pt/story/2020/03/1706881. Acesso


em: 11 maio 2021.

334
Capítulo 12

que a não realização de entrevistas na cidade de Puerto Iguazú, na


Argentina, ocorreu em virtude do fechamento das fronteiras do
país vizinho com o Brasil, que só foram reabertas, e ainda assim
com restrições, em meados de outubro de 2021.
Com o intuito de responder ao problema e aos objetivos
que o presente estudo se propôs, optou-se pela utilização do
método de análise de conteúdo de Bardin, que consiste na divi-
são do conteúdo das entrevistas em categorias, agrupadas analo-
gicamente. Segundo Bardin (2016), esse tipo de análise é uma
relevante alternativa quando se opta pela investigação de valores,
opiniões, atitudes e crenças, por meio de dados qualitativos.
Para a análise dos dados, foram seguidas as etapas pré-análise,
exploração do material, tratamento dos resultados obtidos e inter-
pretação. Para dar início a estas etapas, realizou-se uma decupagem
3
de todos os registros. Em seguida, os dados obtidos foram divididos
em categorias temáticas, a partir das ideias centrais contidas nos
registros e, por fim, analisados de acordo com a Análise de Conteúdo
de Bardin (2016). Os dados registrados durante as entrevistas foram
agrupados nas seguintes categorias temáticas: disponibilidade de
informações sobre IST na região de fronteira; comunicação, informa-
ção e conhecimento sobre sífilis; e fatores que impactam no acesso
à informação sobre saúde na região da fronteira.
Com o intuito de preservar o anonimato, os relatos dos
participantes da pesquisa foram identificados com a letra inicial R,
seguida do número correspondente a ordem de apresentação dos
relatos registrados. Os entrevistados que compuseram a amostra
utilizada neste estudo têm perfil sociodemográfico relativamente
amplo. Foram critérios para participar da pesquisa apenas a maio-
ridade e residência em região de fronteira, o que possibilitou um

3 Processo de escuta e transcrição das entrevistas.

335
Capítulo 12

perfil social bastante distinto entre as fontes ouvidas na coleta


de dados.
Dos 11 entrevistados, a maioria (oito, no total) eram do
sexo feminino. Destas, três eram paraguaias de nascimento,
quatro brasileiras de nascimento (sendo uma destas naturaliza-
da paraguaia, a qual se define como “brasiguaia”) e uma russa de
nascimento. Dos três homens, dois eram brasileiros e um para-
guaio nato. Os dados estão detalhados na tabela a seguir.

Tabela 1 - Características sociodemográficas dos participantes do estudo.


Natal/RN, 2021 (n=11).

VARIÁVEIS PARTICIPANTES (n) %


Sexo
Masculino 3 27,27%
Feminino 8 72,72%
Idade
18 a 30 anos 4 36,36%
31 a 60 anos 7 63,63%
Nacionalidade
Brasileira 6 54,54%
Paraguaia 4 36,36%
Outras 1 9,09%
País de residência
Brasil 2 18,18%
Paraguai 9 81,81%
Estado conjugal
Solteiro 6 54,54%
Namorando 0 0%
Com companheiro fixo 5 45,45%

336
Capítulo 12

VARIÁVEIS PARTICIPANTES (n) %


Escolaridade
Ensino médio 1 9,09%
Ensino superior completo 2 18,18%
Ensino Superior incompleto 6 54,54%
Não informado 2 18,18%
Fonte: Elaboração própria (2021).

Após a coleta das entrevistas, foi realizada análise das infor-


mações contidas nos documentos, para identificar os problemas
comuns relatados pelos entrevistados e possíveis questões não
estabelecidas nos pressupostos desta pesquisa e quem poderiam
ser relevantes para ela.
Assim, foram definidas três categorias temáticas, com ques-
tões de cunho relevante e que se destacaram nos relatos dos entre-
vistados durante a fase de campo da pesquisa. A primeira categoria
se trata da disponibilidade de informações sobre infecções sexual-
mente transmissíveis na região da Tríplice Fronteira; a segunda está
relacionada à comunicação, informação e conhecimento sobre a
sífilis; por fim, temos a terceira categoria que se refere aos fatores
que influenciam no acesso à informação e conhecimento sobre
saúde na região da fronteira. As categorias temáticas foram rele-
vantes no âmbito desta pesquisa porque indicaram os problemas
comuns apontados pelas fontes ouvidas, o que, por sua vez, indica
questões sociais intrínsecas destas sociedades.
O perfil misto dos participantes da amostra revela um conhe-
cimento relativamente diverso em relação à problemática da sífilis.
Muito embora haja conhecimento prévio da doença como infecção
sexualmente transmissível, que se apresenta como um problema de
saúde pública no Brasil e também no Paraguai, os relatos atestam
que as informações científicas sobre a doença limitam-se àquelas

337
Capítulo 12

disponíveis nas ações desenvolvidas, sobretudo dentro de esta-


belecimentos de saúde, sem que haja a percepção por parte dos
participantes de ações diretas de divulgação científica sobre a IST
em questão por meio de outras estratégias comunicacionais.

4. Descortinando cenários: relatos em fragmentos

Constatamos que os relatos dos entrevistados apontam


que as informações relativas à doença se limitam ao contexto
diário das unidades de saúde, sem que sejam estabelecidas inicia-
tivas para que metodologias diferentes possam ser utilizadas para
popularizar tais conhecimentos. Não há, por exemplo, relatos de
mídias on-line ou off-line que abordem o problema da sífilis com
ênfase no contexto das regiões de fronteira do Brasil. Também
reforçam a percepção de que as ações por meio de outras mídias
são escassas, isso quando existem de fato.
Isto é corroborado pelos depoimentos 4 e 7:

Normalmente quando as pessoas vêm falar sobre esse tema,


sempre é por panfleto, eles trazem um panfleto, dão explica-
ções breves e o resto colocam tudo no panfleto. (Relato 4) [...]
E as enfermidades sexualmente transmissíveis (sic) é uma coisa
que deveriam ficar sempre divulgando em revista, jornal, em
algum programa. Fazer mais entrevistas, chamar mais especia-
listas, essas coisas. É uma carência bastante grande, continua
aqui no Paraguai e no Brasil também (sic)” (Relato 7).

Ficou evidente que muito embora existam, as ações de


comunicação que são utilizadas no contexto da Tríplice Fronteira
tendem a cair no senso comum, uma vez que ao se fazer em
formatos que pouco ou quase não dialogam com este usuário que
muito embora tenha um breve conhecimento, ele ainda carece

338
Capítulo 12

de mais informações sobre um problema de saúde pública com


potencial para ser grave. É possível afirmar ainda que as ações de
comunicação para enfrentamento da sífilis são negligenciadas,
uma vez que outros problemas de saúde sexual – sobretudo o
VIH/Sida (HIV/Aids, no Brasil) – têm mais destaque nos formatos
de mídia em que são (ou quando são) veiculadas.
“[...] na TV sempre tem as propagandas de prevenção, mas
eu não vejo tanto. E geralmente não eram sobre sífilis, eram sobre
outras doenças, por exemplo, HIV. Nunca tive informações sobre
sífilis por esses meios de comunicação.” (Relato 5).
Tal histórico de negligenciamento nas ações de preven-
ção podem ajudar a explicar o cenário de avanço da doença nos
últimos anos também na Tríplice Fronteira, por ser um lugar de
passagem, que culminam com a admissão por parte do governo
brasileiro que o país vive de epidemia, a partir de 20164.
Aferimos o quanto a falta de ações de promoção à saúde
aliadas às iniciativas de divulgação científica impactam no cuidado
para com o usuário dos serviços primários de saúde. E por que se
fazem tão importantes neste contexto iniciativas de comunica-
ção científica? Para Massarani e Dias (2018, p. 41-42), é ela que
vai promover a familiarização do leitor – e aqui trazendo para o
contexto abordado, ao usuário dos serviços de saúde – ao conhe-
cimento intrínseco sobre a ciência.

Se quiséssemos definir o objetivo da divulgação científica, pode-


ríamos dizer que ela procura familiarizar o leitor com o espírito
da ciência. Para atingir essa meta, o divulgador tem de recorrer
a vários meios. Um deles é a explicação, em linguagem acessível

4 Disponível em: https://noticias.uol.com.br/saude/ultimas-noticias/


estado/2016/10/20/ministro-da-saude-admite-que-brasil-vive-uma-
-epidemia-de-sifilis.htm. Acesso em: 26 dez. 2021.

339
Capítulo 12

ao grande público, dos fatos da ciência à proporção que eles são


obtidos; assim o leitor aprecia a ciência como processo pelo qual
se produz o conhecimento, a ciência em seu sentido dinâmico e
não como disciplina estática. (MASSARANI; DIAS, 2018, p. 41-42).

Logo, formas diversas de divulgação científica no contexto


da Tríplice Fronteira precisam ter este caráter dinâmico, visando
maior eficácia das ações junto ao cidadão destas regiões. É bem
verdade que em uma pesquisa qualitativa como esta se propõe a
ser, o tom subjetivo sobre um determinado problema de pesquisa
tende a se manifestar ao questionarmos os participantes da amos-
tra. Todavia, é possível estabelecer algumas proposições comuns
apontadas por eles, que terminam por estabelecer um caminho
importante para que soluções possam ser pensadas e desenvol-
vidas para os problemas identificados. De acordo com Cardin e
Albuquerque (2018, p. 119), é a partir das relações que desenvol-
vem nestes contextos de fronteira que se desenvolvem as noções
de identidade e alteridade das pessoas que vivem nestas regiões.

As pessoas que vivem nesses lugares singulares desenvolvem


suas vidas cotidianas a partir de múltiplas relações de diferenças e
desigualdades com os “outros” vizinhos, com os estrangeiros que
vivem “do lado de cá da fronteira” e com aqueles que transitam por
estes territórios. A fronteira como lugar é um espaço intercultural
de produção de identidades, alteridades, estereótipos e formas de
discriminação, mas também de convivências, relações de parentes-
cos, trocas culturais e simbólicas variadas com os vizinhos imediatos
e com outros grupos étnicos e nacionais que vivem nessas cidades
fronteiriças. (CARDIN; ALBUQUERQUE, 2018, p. 119).

Em pelo menos seis entrevistas realizadas durante a coleta,


as fontes destacaram a questão do machismo estrutural como
um problema para o enfrentamento da doença, e também na
forma como as pessoas consomem informação sobre o tema. Tal

340
Capítulo 12

problemática foi identificada dos dois lados da fronteira, sendo


um problema apontado como existente tanto no Brasil quanto no
Paraguai. Conforme aponta o relato 6, este “modelo” de socieda-
de é historicamente passado de uma geração para outra, o que
impacta o combate não só da sífilis, mas também de outras IST e
demais problemas de saúde que contemplem a comunidade de
alguma maneira.
Tais percepções reforçadas pelas respostas coletadas
durante a fase de entrevistas da pesquisa, como mostram os
recortes dos relatos reproduzidos a seguir:

[...] Se uma mulher vai na ginecologista isso cria uma suspeita do


marido dela, inclusive, mulheres têm vergonha de ir porque pensa
que alguém vai julgá-las. (Relato 1). [...] Eu acho que sim, porque
como aqui a visão é bem masculina, né? Aqui tem muita mentalidade
que a mulher tem que ficar em casa trabalhando, essas coisas. E que
o homem é o “macho”. Então, eu acho que isso faz com que a mulher
se sinta um pouco mais pressionada. (Relato 4).

Para além de tais questões estruturais, a barreira do idioma


também foi citada como uma questão que impacta no acesso à
informação em ambos os lados da fronteira. Especificamente no
caso da Tríplice Fronteira, além dos majoritários português e espa-
nhol (falados em Brasil, Paraguai e Argentina), utiliza-se também o
guarani, língua indígena falada por mais de 7 milhões de pessoas
e que tem caráter de “língua oficial” no Paraguai, onde é adotada
tanto por não indígenas quanto por indígenas. No caso desta últi-
ma população, é importante destacar que o guarani tende a ser a
“primeira língua”, em detrimento do espanhol ou do português.
Os entrevistados apontaram esta questão como um desafio
no desenvolvimento de iniciativas de acesso à informação cien-
tífica sobre saúde, uma vez que muitos dos usuários do serviço

341
Capítulo 12

utilizam o idioma em questão, que é por vezes complexo em rela-


ção aos dois idiomas de origem latina. Aliado a isto, há a questão
das práticas culturais típicas dos povos guarani que habitam a
região, com o uso de medicina tradicional no enfrentamento de
problemas de saúde, como reforça o relato de número 7: “Aqui
na fronteira não existem muitas políticas públicas porque aqui
tem os guaranis, que são índios, então eles têm toda uma cultu-
ra própria e tem o costume de usar ervas medicinais para tratar
alguma enfermidade.” (Relato 7).

5. Considerações finais

Os relatos coletados destacam que muito embora haja


diversas características comuns aos povos de fronteira, indepen-
dentemente de sua nacionalidade, as características culturais
inerentes de cada sociedade que forma a região também impac-
tam no acesso à informação sobre a sífilis e outras IST na região.
É importante frisar que, conforme apontam os dados
populacionais do próprio IBGE, a região em questão contempla
uma população estimada de 674.669 pessoas, com fluxo contínuo
que ultrapassa as 100 mil pessoas por dia entre as fronteiras, entre
locais e pessoas vindas de outras regiões do Brasil e do mundo.
Logo, da maneira como são feitas hoje, as iniciativas de
comunicação em saúde não levam em conta os elementos cons-
titutivos da cultura e identidade fronteiriça da região em questão,
que se baseia na ampla circulação de bens, serviços e, principal-
mente, pessoas entre as regiões dos três países. A conurbação
destas três regiões gera um ambiente com a presença de múltiplas
culturas que, por sua vez, contemplam práticas que agreguem os
personagens inseridos no contexto de cada uma delas.

342
Capítulo 12

Ora, observarmos que a interculturalidade da região finda


por gerar uma cultura distinta, que traz características de ambas
as fontes de que se alimenta, faz-se necessário que as políticas de
saúde pública e de comunicação e educação em saúde também
contemplem esta particularidade.
É preciso, então, que se crie uma atmosfera comunicativa,
dando ênfase justamente a estas questões, tão particulares da
interculturalidade existente na região da Tríplice Fronteira, que
não se limite somente à problemática da língua, mas que também
se baseie nos costumes, nos modos de vida, e que consiga
transpassar as barreiras estruturais dos arranjos familiares dos
povos desta região. Só assim será possível compor um universo de
iniciativas de comunicação em saúde que realmente contemplem
os anseios e demandas da região, sempre levando em conta as
particularidades aqui apresentadas.

343
Capítulo 12

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org/10.1590/1982-0194201800015.

347
Palavras não tão
finais assim...
A organização deste ensaio nos colocou diante do desafio da escri-
ta coletiva. Entre tantas atividades, esta nos exigiu uma revisão
temporal da participação de cada um no Projeto “Sífilis Não”, ao
mesmo tempo, o vislumbre de outras possibilidades ao término
dele. Percebemos a necessidade de conduzirmos uma publicação
que fosse de ampla abrangência para qualquer leitor interessado
no assunto.
Não era nosso desejo a elaboração de textos com vista a
um artigo para publicação. Também não poderia pender para uma
grande crônica, por mais sedutor que nos parecesse o recorte
factual de um de muitos acontecimentos vividos, por isso, deci-
dimos trabalhar com Ensaios.
Essa decisão nos deu a liberdade para colocarmos nossas
ideias sem tanta documentação comprobatória. Ainda assim,
tateamos para não errar a dose e nos equivocarmos na escrita
e apresentar relatórios ao leitor (daí a provocação expressa no
título). Depois de celebrarmos esse acordo – “teremos ensaios” –,
foi o momento de eleger temáticas. Um projeto da magnitude do
“Sífilis Não” oferece múltiplas facetas e, nesse sentido, também
foi importante delimitar.
Assim, os Ensaios, compilados nesta publicação, em certa
medida, expressam apenas uma fração dessa magnitude, porém,
deixam clara a sua diversidade. O componente da Epidemiologia
e da Vigilância é destacado no relato de como a análise de situa-
ção de saúde se estabeleceu como um elemento estratégico para
subsidiar reflexões sobre os pontos de ação e os possíveis efeitos
do projeto. O suporte da Vigilância foi fundamental para pensar
a testagem como uma intervenção central em direção a uma
melhor articulação com a atenção primária. Essas ações, por sua
vez (e também com o suporte da Vigilância), conectam-se com
a gestão de casos, que traz uma contribuição não apenas para o
enfrentamento da sífilis mas também para o SUS como um todo.
O apoio institucional, espinha dorsal da vertente de intervenção
do projeto, alimenta e se alimenta das ações de comunicação e
de formação, as quais fizeram o projeto “sair da caixinha”, indo
além da assistência e adentrando no terreno da comunicação de
massa, o que nos traz uma reflexão importante sobre o nosso
sistema de saúde que precisa avançar nas ações intersetoriais.
Enfim, embora este conjunto de experiências discutido neste
livro pareça desconectado, na verdade, faz parte de uma rede de
processos que teve um foco comum, expresso no mote “Teste-
Trate-Cure” e que buscou contribuir para um melhor enfrenta-
mento da sífilis no país, em suas diversas frentes. Muitos produtos
têm sido gerados no âmbito do projeto, incorporando inovações
para o enfrentamento da sífilis, e nós recomendamos uma visita
ao site oficial do projeto (https://sifilisnao.com.br) e às suas redes
sociais, como o Instagram (https://www.instagram.com/sifilisnao)
e o Youtube (https://www.youtube.com/c/SífilisNão).
Você é nosso convidado a engajar-se na luta contra a
sífilis congênita!!

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