Formação de Palavras: Conhecimento, Representação E Uso

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FORMAÇÃO DE PALAVRAS:

CONHECIMENTO, REPRESENTAÇÃO E USO

MARGARIDA BASILIO
(PUC-Rio / CNPq)

Neste trabalho, seguindo o tema geral da Conferência, pretendo abordar o


léxico, em suas relações com a gramática e o texto, dentro de uma perspectiva
cognitiva. Situando no léxico os temas do conhecimento, representação e uso,
com suas múltiplas imbricações, começo (in)definindo o léxico, para então
considerar as múltiplas interações léxico / cognição / morfologia / texto.
Em trabalhos anteriores, sugeri que o léxico pode ser entendido como
“um sistema de armazenamento e transmissão de formas simbólicas, isto é,
formas que têm ou evocam significados. “ (Basilio, 2005:301). Hoje, prefiro
dizer que o léxico pode ser entendido como um conjunto cambiante de uni-
dades básicas estáveis de caráter simbólico, isto é, formas que se associam a
conceitos. Refiro-me, naturalmente, a formas linguísticas, ou seja, sequên-
cias fônicas e/ou seus correlatos gráficos.1 Estas formas, as unidades lexi-
cais, cujas possibilidades de evocação são infinitas, dependendo de circuns-
tâncias que abrangem desde a história da língua e a história dos falantes en-
volvidos numa situação linguística e sociocultural até relações entre formas e
suas potenciais evocações, são usadas na construção e interpretação de enun-
ciados linguísticos de finalidades diversas, muitas vezes combinadas, cons-
cientemente ou não.
Embora o léxico contenha expressões de vários graus de fixidez e com-
plexidade, a unidade lexical prototípica é a palavra ou, mais especificamente, a
palavra primitiva. Palavras como mar, água, pão, ver, ser, e tantas outras, são
comuns tanto no uso doméstico e familiar quanto no uso profissional e social,
e circulam na esfera tanto da língua popular quanto da culta. São, ainda, pala-
vras morfologicamente básicas, que evocam algo relativamente concreto.2

1
A especificação é necessária, dado que há formas simbólicas visuais, para além das gráficas
e das unidades de línguas de sinais: formas simbólicas como cruzes, estrelas, caveiras, ban-
deiras nacionais etc., a meu ver, não constituem itens lexicais.
2
Neste sentido, podemos constatar que a gramática clássica expressa uma excelente intuição ao
conceber a palavra indivisível como elemento mínimo fundamental da análise linguística.
Estudos Linguísticos/Linguistic Studies, 10, Edições Colibri/CLUNL, Lisboa, 2015, pp. 103-115
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Na língua culta, tradicionalmente se considera como fundamental a pa-


lavra escrita. Assim, nos circuitos acadêmicos, o centro das atenções volta-se
naturalmente para a palavra gráfica, que apresenta uma face mais concreta
do que a palavra estrutural, mais visível, identificada por espaços ou pontua-
ção no sistema gráfico, reconhecida em textos, facilmente encontrada em
dicionários ou em sistemas eletrônicos de busca quando procuramos alguma
informação sobre seu significado, uso, grafia ou tradução.3
Além de palavras prototípicas, o léxico abarca outras unidades que se ir-
radiam por diferentes espaços e/ou domínios periféricos, tais como as fle-
xões, gramaticalmente motivadas; as palavras derivadas, que apresentam um
deslocamento de sua origem para um outro domínio semântico, gramatical
e/ou textual; as palavras compostas, formadas de outras palavras com uso de
fragmentos de estrutura sintática; as palavras constituídas de diferentes tipos
de fragmentos e perspectivas de des/re/construção; e vários tipos de expres-
sões, desde as expressões idiomáticas, cujo potencial evocativo não provém
das unidades lexicais formativas, até as expressões que apresentam signifi-
cado e uso pré-determinados, tais como as expressões aspectuais fixas (aca-
bar de X, começar a X, etc), as expressões do tipo dar uma X-da, as sequên-
cias não inteiramente consolidadas (suco de laranja, óculos escuros, etc.), as
colocações (arregalar os olhos), e assim por diante.
Temos, então, um léxico constituído de unidades lexicais que se esten-
dem por uma vasta gama de possibilidades, algumas mais centrais, outras
mais periféricas, não havendo, portanto, uma demarcação nítida entre léxico
e gramática. De fato, a morfologia, como parte da gramática que trata da
formação de palavras, está relacionada ao léxico como conjunto das unida-
des lexicais que usamos na construção de textos; mas esse conjunto também
abarca construções de ordem sintática, como vimos nos compostos, nas lo-
cuções e diferentes tipos de expressões; e abarca um conjunto significativo
de construções morfológicas, como fica claro nas formas derivadas tradicio-
nais ou nos vários tipos de formações vocabulares reconstituídas que vêm
sendo ativamente estudadas em nossos dias, tais como os cruzamentos voca-
bulares.
Dentro deste quadro, podemos levantar novamente, ou seja, com novo
espírito, a questão “Por que formação de palavras”, colocada em Basilio
(1987) numa perspectiva lexicalista, com o objetivo de salientar a importân-
cia da eficiência do sistema, em relação ao custo de memória e possibilidade
de comunicação imediata com itens lexicais construídos por Regras de For-
mação de Palavras. Inspirada em Jackendoff (1975), a ideia era explicitar a
relevância da transmissão automática de informação já contida no léxico

3
As dimensões da palavra não serão discutidas nesse trabalho, mas ressalto que a palavra
gráfica apresenta uma contraparte de valor menos concreto e mais relevante, a saber, o seu
potencial de evocação.
Formação de Palavras 105

para a redução do custo de memória e consequente maximização da eficiên-


cia do léxico como sistema de armazenamento de formas simbólicas.
Esta motivação continua intacta, visto que tanto a necessidade de acesso
lexical imediato nos atos de fala quanto nossa capacidade cerebral concreta
permanecem inalteradas: por mais capacidade de memória que se tenha, esta
é sempre limitada, em algumas circunstâncias bastante limitada. Por exem-
plo, são muito poucos os números de telefone ou senhas numéricas que al-
guém consegue reter na memória para uso imediato, como forçosamente tem
que ser o uso das palavras num ato de fala. Assim, os mecanismos lexicais
relacionados à formação de palavras são essenciais, visto que o acesso a
padrões de formação é de caráter imediato, isto é, a eficiência de nosso sis-
tema de comunicação baseado em construções simbólicas depende do acesso
imediato tanto às construções quanto aos esquemas de formação, que refor-
çam o fator frequência, assim nos permitindo usar novas formações com
segurança quanto ao êxito comunicativo.
Muitas vezes pensamos em formação de palavras tendo em mente pala-
vras isoladas e significados literais. Numa abordagem cognitiva, no entanto,
é fundamental a frequência de uso para a consolidação das construções lexi-
cais. Embora a relação entre frequência de uso e consolidação seja clara, a
noção de frequência apresenta aspectos não inteiramente elucidados do pon-
to de vista metodológico, não apenas quando estão em jogo as distinções
entre língua falada e escrita e entre língua popular e culta, mas, sobretudo,
quando levamos em conta a situação polissêmica e função polivalente dos
esquemas de formação.4
Mas a questão primordial da formação de palavras no que tange à fre-
quência é de outra natureza, a saber: como se processa a esquematização das
ocorrências, de modo a formar os chamados “clichês lexicais” (Basilio
1997), ou seja, como surgem os padrões lexicais ou esquemas de formação.
No trabalho citado, confrontam-se, para a representação do conhecimento
lexical, a formulação de regras preconizada pelo gerativismo lexicalista e a
proposição saussuriana da analogia proporcional, sendo considerado mais
conveniente o mecanismo de analogia proporcional. Na verdade, este seria o
passo inicial na identificação de paralelismo de construções lexicais para o
reconhecimento posterior da frequência, que levaria à eventual consolidação
do padrão correspondente. Em convergência com propostas de Bybee
(1985), a conexão lexical teria assim mais força quando o padrão fosse evi-
denciado pela crescente frequência de utilização.5 A identificação corres-
ponde ao processo de esquematização (Langacker 1987) aplicado a constru-

4
Alguns destes problemas passam a ser mais visíveis agora, com a utilização da internet para
a formação de corpora de análise. Temos, assim, o polo oposto à restritividade da imagina-
ção do linguista no lexicalismo: a abrangência excessiva de formações de pertinência ques-
tionável em relação ao corpo de conhecimento descritivo, concentrado na língua culta.
5
Embora Bybee (1985) tenha como foco construções flexionais.
106 Margarida Basilio

ções morfológicas ou, em outras palavras, ao estabelecimento de um concei-


to abstrato que abrange diferentes instâncias ou elaborações. Conforme ob-
serva Tuggy (2007:94), regras e padrões apresentados em outras teorias exis-
tem na mente como esquemas na visão da Linguística Cognitiva.
Dentro de uma visão cognitiva do léxico, entretanto, devemos ainda sa-
lientar uma outra dimensão, dada a relevância do caráter simbólico atribuído
às construções. Não se trata apenas de saber, por exemplo, que o prefixo re-
- que traz a noção de repetição, conforme reza a gramática tradicional, mas
também de reconhecer que o mesmo elemento pode ocorrer em diferentes
construções lexicais, tendo em vista não apenas a situação polissêmica das
palavras, mas também a polivalência simbólica dos esquemas de formação.
Assim, nesta instância específica, como nas demais, a contribuição semânti-
ca para o potencial evocativo da construção poderá variar, dependendo do(s)
significado(s) do verbo. É o que acontece, de fato, com o prefixo re-. Em
outras palavras, é fundamental pensar na relevância do lado simbólico na
formação de palavras, não apenas em geral, mas também no que tange à
frequência de uso de constituintes numa construção e sua relação com a pro-
dutividade dos respectivos esquemas de formação.
Uma possibilidade de tornar mais relevante e reveladora a relação fre-
quência/força lexical seria a de observar as varias acepções de elementos
envolvidos em construções lexicais e computar sua presença quantitativa,
quer em termos globais, no sentido da frequência de utilização de um de-
terminado afixo em formações regulares, quer em termos da evocação de
significados em diferentes construções em que o mesmo ocorre. Uma aná-
lise preliminar deste tipo foi feita por Andrade (2006) no que tange ao pre-
fixo re-, revelando que o mero conceito de repetição é minoritário na utili-
zação deste prefixo, sendo mais frequentes os conceitos de renovação, co-
mo em reconsiderar, redimensionar, reformular, etc. e recondução a um
estado de coisas anterior, como em redemocratizar, reconduzir, reindustri-
alizar, etc. É provável, assim, que a força lexical das duas últimas acepções
seja muito maior que a do conceito de repetição pura e simples, como em
reler e recontar. Ou seja, a representação do conhecimento de um prefixo
em sua dimensão potencial é insuficiente se apenas computarmos como
fundamentação a ocorrência do mesmo em formações; é necessário catego-
rizar essas ocorrências levando em conta as diferentes facetas do potencial
simbólico do esquema de formação correspondente.
As unidades lexicais se usam na construção de textos pela evocação de
significados potenciais, dentre os quais fará sentido uma escolha específica
que então se concretiza na formação da mensagem; palavras não têm propri-
amente significados, antes evocam potenciais semânticos, dentre os quais
ressaltam aqueles compatíveis com um determinado enunciado, levando-se
em conta o conhecimento enciclopédico e fatores textuais e contextuais.
Potenciais semânticos e pragmáticos das palavras e suas combinações
sempre são cruciais para a construção de nossos textos, já que estes têm co-
Formação de Palavras 107

mo objetivo uma mensagem, cujo significado se (con)funde com seus objeti-


vos interacionais, ideológicos, afetivos, políticos, etc., ou seja, objetivos
pragmáticos. E esses objetivos apresentam requisitos de excelência em sua
realização, seja em relação à forma, seja em relação ao conhecimento enci-
clopédico embutido em nossa teoria da mente, que analisa o domínio de
conhecimento do interlocutor e a melhor forma de transmitir a ele uma men-
sagem.
A concepção do léxico que ora apresentamos corresponde a um me-
lhor entendimento da noção de conhecimento lexical, que abrange não
apenas o conhecimento das unidades lexicais, com seu poder de associação
de cunho semântico / enciclopédico e suas propriedades gramaticais, mas
também o conhecimento da potencialidade de construção ou reconstrução
de enunciados, no ângulo relacionado ao domínio lexical. É, portanto, ne-
cessário, tendo em vista que o espaço lexical não é um espaço fechado,
lembrar que as unidades lexicais não existem isoladamente; ao contrário,
mantêm uma crucial relação de simbiose com a língua em uso, no sentido
de que qualquer mensagem linguística que se capte ou se transmita se es-
teia fortemente em nosso conhecimento lexical; e também com o pensa-
mento em uso, conscientemente ou não. 6
Isto significa que não podemos entender um texto sem recorrer ao léxi-
co; do mesmo modo, nossos textos dependem da extensão de nosso conhe-
cimento lexical. Mais ainda, e talvez seja este o ponto mais relevante, a
constituição do domínio lexical se configura a partir da experiência da língua
em uso. Poderíamos então, talvez, dizer que o léxico é um domínio de for-
mas simbólicas que evocam impressões e conceitos oriundos da língua em
uso e/ou elaborados na mente do falante como resultado da integração de
novas percepções ao material simbólico que constitui o domínio lexical, com
suas interfaces.
Ao abordar o espaço lexical e suas interfaces, no eixo da relação léxi-
co-cognição, não podemos deixar de ressaltar, ainda que rapidamente, a
questão léxico/enciclopédia no significado lexical, assim como o potencial
da metáfora e da metonímia na constituição do conhecimento, de acordo
com a proposição dos cognitivistas de que a língua não é um domínio sepa-
rado do das demais operações mentais, de um modo geral, embora se possa
– ou se deva – manter, do ponto de vista das construções morfológicas,
uma distinção entre as noções de conhecimento linguístico e conhecimento
enciclopédico.
A razão para esta afirmação, fundamentada em Basilio (2005) dentro
de uma perspectiva lexicalista, se mantém numa abordagem cognitiva

6
É difícil dizer se podemos falar em pensamento em uso como algo distinto de língua em
uso, mas prefiro colocar a possibilidade, sobretudo por causa da interpretação mais comum
da expressão “língua em uso”, que, em geral, não contempla a atividade de reflexão interna,
da qual podem advir novas associações lexicais.
108 Margarida Basilio

quando se pensa mecanismos derivacionais. Tomando como exemplo um


esquema de formação como [[X]Adj izar]v na formação de verbos a partir
de adjetivos, o conhecimento que permite ao falante formar um novo verbo
adicionando –izar a um adjetivo ou inferir o significado “tornar(se) X”
para uma construção [[X]Adj izar]v é de natureza linguística, isto é, trata-
-se do conhecimento de um esquema de formação, de um padrão lexical
consolidado; construções lexicais associadas a este padrão serão interpre-
tadas de acordo com o conhecimento semântico/enciclopédico eventual-
mente associado a estas construções.
A questão significado linguístico/enciclopédico pode ser vista de dife-
rentes ângulos, e existem vários problemas relacionados a esta discussão,
conforme o que se considere como linguístico. O conhecimento enciclopédi-
co pode ser entendido como o conhecimento do mundo. É clássico o exem-
plo da palavra ouro, que, do ponto de vista linguístico literal, remete a um
metal precioso de cor amarelada, com um certo brilho. Esta noção, no entan-
to, não nos habilita a reconhecer a presença e proporção do metal num or-
namento e, definitivamente, não nos habilita a dizer, dado um pedaço de
metal que nos apresentem, se se trata de ouro ou não.7 Do mesmo modo,
para tomar outro exemplo frequentemente citado, o significado prototípico
de pintar corresponde a algo como ”revestir uma superfície com tinta usando
um pincel”, mas o conhecimento enciclopédico do ato correspondente inclui
técnicas que estão no domínio dos profissionais da pintura, embora não pro-
priamente no dos falantes/ouvintes.
Alguns cognitivistas consideram, ainda, que a distinção entre o linguís-
tico e o enciclopédico no significado lexical é inviável, tendo em vista a
concepção do significado que “envolve o conhecimento do mundo que é
integrado com outras capacidades cognitivas” e a noção de que o significado
linguístico é baseado no uso e na experiência (Geeraerts 2006:5).
Enfim, a distinção entre significado linguístico e significado enciclopé-
dico é ainda objeto de controvérsia. Neste trabalho, acolho a posição da Lin-
guística Cognitiva no sentido de evidenciar a virtual impossibilidade de se
estabelecer uma separação entre o que seria linguístico ou enciclopédico no
significado dos itens lexicais, embora mantenha a ressalva anteriormente
feita, no que concerne aos esquemas de formação de palavras.
Na realidade, quando pensamos em língua, léxico e cognição, é difícil
deixar de concordar com os cognitivistas, dada a necessidade de enfocar
conceitos lexicais como dependentes de cadeias de significação que se entre-
cruzam de todos os modos, da hipotenusa ao dedo, passando por todos os
objetos funcionais e divisões arbitrárias de nosso mundo, tais como lápis e
férias.

7
Aliás, há outra discussão, que versa sobre a identificação ou não entre conhecimento do
mundo e conhecimento científico ou técnico, a qual, entretanto, está fora do escopo deste
trabalho.
Formação de Palavras 109

Em síntese, então, podemos considerar o léxico como uma parte da lín-


gua que reflete a constituição de conceitos relativos consolidados que se
associam a formas, as quais podem ser utilizadas para evocá-los. Natural-
mente, operações mentais podem elaborar novos conceitos, os quais, entre-
tanto, só poderão ser objeto de comunicação na medida em que se associa-
rem a formas através das quais possam ser evocados. Também naturalmente,
operações mentais podem criar novas formas, associadas a conceitos. Assim,
podemos dizer que as unidades lexicais correspondem à evocação de concei-
tos que são linguísticos, no sentido de que se associam a unidades lexicais e
são consolidados como resultado do uso linguístico; e que são enciclopédi-
cos, pois têm como origem a experiência e conhecimento do mundo. Itens
lexicais como pé, mão, olho, lápis e férias são construções que associam
conceitos a forma; são entendidos em termos de nosso conhecimento do
mundo; e são consolidados como resultado do uso constante das formas cor-
respondentes que os evocam.
A afirmação abrange tanto exemplos específicos, como os mencionados
acima, quanto expansões metafóricas e metonímicas no significado de itens
lexicais. Considerando nossos mecanismos mentais subjacentes a processos
como metáfora, metonímia e analogias várias, usamos itens lexicais em
construções que expandem o domínio de significação. Na medida em que as
expansões são estabilizadas ou incorporadas, passam a fazer parte do signifi-
cado linguístico de uma unidade lexical.
Assim, por exemplo, incorporamos expressões como pé-de-pato e olho-
-mágico, dentre inúmeras outras, derivadas de operações de composição e
associações de vários tipos; mas seu entendimento depende, mais uma vez,
não apenas do conhecimento incorporado nos itens lexicais básicos e do
conhecimento de padrões de composição, dentre outros aspectos do conhe-
cimento linguístico, mas também do vasto conhecimento enciclopédico en-
volvido nas formas mais complexas. Por exemplo, o conceito de pé-de-pato
corresponde, dentre outros, ao conhecimento do que é um pé como parte do
corpo, de como é o pé ou algo análogo no que concerne a patos e do fato de
que um artefato de borracha feito num formato que apresenta alguma seme-
lhança com o “pé” dos patos é usado para dar maior velocidade ao nadador;
olho-mágico conjuga o conhecimento da forma, dimensão e função do olho
com o conhecimento da necessidade de proteger o domicílio de visitantes
indesejáveis, o conhecimento do que poderia ser considerado mágico e, natu-
ralmente, o conhecimento do mecanismo que permite ao morador olhar o
candidato a visitante – ou assaltante – sem ser visto. É de se ressaltar, além
disso, que todo esse conhecimento, necessário embora para o reconhecimen-
to da razão de ser das expressões a posteriori, não é suficiente para a inferên-
cia do significado a partir da forma.
A enciclopédia permeia, portanto, as unidades lexicais. Neste aspecto, é
de se observar, aliás, que a forte base enciclopédica necessária à interpreta-
ção de itens lexicais é de se esperar, dada a função designadora de itens lexi-
110 Margarida Basilio

cais. A polissemia, portanto, é um fato natural, assim como a não composi-


cionalidade, dado que padrões lexicais existem para a formação e reconhe-
cimento de unidades a serem usadas na designação e na comunicação. As-
sim, a motivação é um fator bem mais eficiente do que parece quando consi-
deramos a natureza do léxico.
Isto, entretanto, não contradiz a noção de que esquemas de formação
não apresentam contraparte enciclopédica, ou seja, não se relacionam dire-
tamente ao conhecimento do mundo, mas apenas ao conhecimento de pa-
drões de associação de forma e função/significado linguístico. Assim, por
exemplo, o conhecimento do esquema [[X]v ção]s, correlato a substantivos
deverbais, é de natureza linguística, embora as diferentes instâncias de cons-
truções associadas ao mesmo sejam interpretadas em termos semânti-
co/enciclopédicos.
Mas, se é necessário pensar numa semântica enciclopédica dos itens le-
xicais, o contrário não é automaticamente verdadeiro: nosso conhecimento
do mundo, ou, ainda, nossos pensamentos e sonhos sobre o mundo vão bem
além daquilo que historicamente se constituiu em itens lexicais. Esta discre-
pância encontra exemplos em nosso ofício: a profusão de elementos conside-
rados como x, y, etc., no decorrer de uma exposição científica e técnica cor-
responde muitas vezes a conceitos que serão eventualmente incorporados
numa teoria com uma forma determinada – mas que ainda não podem ser
considerados propriamente como itens lexicais, mesmo que circunscritos a
um jargão determinado, já que ainda não se fixou a especificidade de uma
forma fonológica correspondente.
Naturalmente, quando um conceito precisa ser referido com um certo
nível de frequência e relevância, acaba sendo associado a uma forma: a exis-
tência como item lexical é o destino dos conceitos relevantes em termos de
comunicação. O exemplo descrito acima é oriundo de uma situação já bas-
tante abstrata. Mas há exemplos mais concretos, como o de Jackendoff
(1983), num diálogo aproximadamente como: – O que é isto? – Não sei, mas
só sei que está vindo depressa em nossa direção e é melhor correr!; ou o
caso do objeto de madeira de quatro lados, com uma parte móvel, em cujo
verso está escrita a frase o que é isto?. Estes são, certamente, exemplos ex-
tremos. De caráter menos extremado e, por este motivo, geralmente não per-
cebidos, são os casos de novos conceitos (objetos, sistemas, funções, etc.)
que surgem a cada instante e demandam uma denominação.
Passando agora à parte relativa à formação de palavras, retomo afirma-
ções que fiz ao longo do tempo, no sentido de que dentre as estruturas mais
abordadas, na perspectiva do léxico mental, estão as estruturas morfológicas,
responsáveis pela produção e interpretação estrutural de construções deriva-
das e compostas.
Padrões morfológicos de formação de palavras, que correspondem a es-
quemas de conhecimento lexical, conectam-se a noções semânticas gerais
(negação, reversão, agente, instrumento, etc.). O falante/ouvinte de uma
Formação de Palavras 111

língua forma e reconhece novas palavras que designam agentes e instrumen-


tos, denotam reversão de atos, e assim por diante. Do mesmo modo, o falan-
te/ouvinte interpreta e adquire novas construções usando pistas fornecidas
pela estrutura morfológica e pela especificidade dos elementos vocabulares,
além das informações dadas ou inferidas pelos elementos textuais e contex-
tuais numa determinada situação de comunicação linguística. Assim, padrões
de formação de palavras exercem um papel relevante, embora parcial, na
aquisição e expansão do léxico.
Quando pensamos no papel das estruturas morfológicas na expansão le-
xical, não podemos deixar de pensar na integração da gramática com o léxi-
co e na proposição da Linguística Cognitiva, em especial na Gramática Cog-
nitiva de Langacker, no sentido de que as estruturas gramaticais são simbóli-
cas. Por exemplo, todas as formações prefixais são motivadas, e não apenas
em termos das alterações semânticas dos radicais, ou, mais exatamente, não
apenas em termos dos resultados semântico-enciclopédicos da dinâmica de
combinações de formas livres e presas, mas também em termos da forma
resultante, que revela um nível de incorporação semântica e compactação
que não se verifica em construções alternativas em termos de condições de
verdade, por exemplo. Assim, se confrontamos frases como Fulano é infeliz e
Fulano não é feliz, verificamos que, embora em ambas seja falsa a afirmação
da felicidade de Pedro, a forma prefixada apresenta uma força expressiva,
recorrente em outras construções do mesmo padrão (indiscreto, indecente,
impotente, etc.) que não se encontra no correlato não prefixal.8 Vemos, portan-
to, que a construção morfológica apresenta um aspecto semântico que interage
com os significados dos elementos constituintes da construção lexical.
Por outro lado, o fato de que novas formações lexicais surgem para de-
signar eventos, coisas e situações do mundo não pode ser subestimado; as-
sim, ainda que possamos admitir que há uma determinação de possibilidades
semânticas evocadas pelo esquema que se abstrai de determinados tipos de
construção, na verdade as construções morfológicas apresentam sua especi-
ficidade, correlata ao ato de nomeação. Por exemplo, embora jornalista e
jornaleiro sejam ambas construções de nomes de agente, projetando o signi-
ficado genérico de “agente em relação a jornal”, o ato de nomeação deu a
cada uma seu destino, designando dois tipos de agente que exercem diferen-
tes tipos de ação em relação a jornal e ocupam diferentes situações em nosso
mundo sociocultural. Analogamente, a evocação da ideia de reversão que o
prefixo des- nos traz assume diferentes matizes, conforme podemos observar
em exemplos como desmontar, descobrir, desdizer, etc.
Um dos grupos mais significativos de processos de formação de pala-
vras do ponto de vista gramatical é o constituído por processos que efetuam
mudança de classe de itens lexicais. Mas, embora as classes de palavras se-

8
Bybee (1985) analisa uma situação análoga em referência a flexões de tempo e modo na
conjugação verbal. V. nota 5.
112 Margarida Basilio

jam frequentemente descritas em termos de propriedades sintáticas, talvez


possamos afirmar, hoje, que é relativamente rara a motivação puramente
gramatical na mudança de classe, a não ser como um elemento secundário.
Vejamos, por exemplo, o caso de mudança de classe mais focalizado,
porque mais antigo e de interesse para a sintaxe gerativa: a formação de
substantivos deverbais, ou nominalização. Se pensarmos na dinâmica de
interação léxico-texto, é fácil observar que, tanto nos textos produzidos
quanto nos consumidos, um tipo de evento expresso por um verbo também
pode ser conceptualizado nominalmente e ocorrer como substantivo.
De fato, conforme colocado por Langacker, “Em geral, os significados
das expressões linguísticas se subdividem em predicações nominais ou ver-
bais. Estes dois tipos não diferem necessariamente na natureza de seu conte-
údo intrínseco, como vemos, por exemplo, em pares como círculo/redondo e
explodir/explosão, mas no modo como este conteúdo é construído e esboça-
do” (2002:74). Argumentando a favor da definição do substantivo em termos
de nomeação de coisas, Langacker observa ainda que “o substantivo e o
verbo constroem o evento com imagens contrastantes e são, portanto, seman-
ticamente distintos, pois a nominalização envolve um tipo de reificação con-
ceptual”. (2002:63).
Ou seja, até o caso clássico de abordagem sintática de um fenômeno
morfológico, o da nominalização, pode ser reconsiderado de um ponto de
vista primordialmente conceitual, o que nos dá uma diferença semântica de
enfoque: a noção verbal prototípica pode ser considerada como uma visão
dinâmica de uma relação, em convergência com a proposição de Câmara
(1970), que via verbos como processos e uma distinção entre uma visão está-
tica ou dinâmica de um processo verbal na distinção entre o nome e o verbo;
ou na proposição de Langacker, segundo o qual a diferença entre verbos e
outras relações complexas poderia ser caracterizada uma diferença entre
conceptualização sequencial ou compacta (2002:153)
Para Langacker (2002:74), como vimos, os significados de expressões
linguísticas se subdividem em predicações nominais e relacionais, sendo a
diferença não tanto da natureza de conteúdo mas do modo em que o conteú-
do é construído e esboçado. Uma predicação nominal pressupõe a intercone-
xão entre um conjunto de entidades e delineia a região assim estabelecida,
pois “um nome designa uma região em algum domínio” (2002:63). Por outro
lado, uma predicação relacional pressupõe um conjunto de entidades e iden-
tifica as interconexões entre estas entidades. As predicações relacionais po-
dem identificar processos, que correspondem a verbos.
A relação entre estruturas verbais e nominais foi bastante estudada, do
ponto de vista sintático, na Teoria Padrão da Sintaxe Gerativa. De acordo
com a Hipótese Transformacionalista, estruturas verbais podem se converter
em estruturas nominais através de regras transformacionais de nominaliza-
ção – a nomenclatura provém da noção de operações sintáticas de transfor-
mação. Na Hipótese Lexicalista, em que as relações entre verbo e nome,
Formação de Palavras 113

ainda consideradas como de impacto sintático, poderiam ser descritas na


esfera do léxico, surge a possibilidade de considerarmos uma relação bidire-
cionada Verbo <-> Nome no léxico (Jackendoff 1975), embora nunca tenha
sido realmente abandonada a direcionalidade V->N nas proposições lexica-
listas.
Com o desenvolvimento de modelos de representação lexical, em espe-
cial de representação de regras responsáveis pela análise estrutural das pala-
vras, a relação Verbo-Nome passou a ter um foco maior na forma, em termos
de questões tais como as relações lexicais, a produtividade lexical, as condi-
ções de produção e a distinção entre objetos morfológicos e construções
lexicais gramaticalmente irrelevantes. A abordagem morfológica do lexica-
lismo gerativista, no entanto, não atinge a questão da relação Verbo-Nome
no aspecto da configuração do texto.
De acordo com Basilio (2004), há diferentes motivações para a mudan-
ça de classe que é efetuada por esses processos. Mas é preciso esclarecer o
próprio termo mudança de classe, de ordem tradicional, ou seus equivalentes
lexicalistas, mudança ou transposição categorial. No caso da formação de
substantivos deverbais, pressupõe-se um verbo como base para a formação
de um substantivo, o que é um fato morfológico na maioria esmagadora des-
sas construções em Português, sobretudo se levarmos em conta que as for-
mações consideradas como regressivas também são deverbais.
Entretanto, se voltarmos às reflexões de Langacker sobre as diferentes
possibilidades de encararmos algo em termos de sequência linear ou de mo-
do compacto, podemos sugerir que não há, propriamente, uma mudança de
classe, mas apenas um processo morfológico de marcação de uma das duas
possibilidades de uso e conceito de uma base verbal: a sequencial, que se
multiplica em inúmeras marcações correspondentes a categorias verbais, que
correspondem a formas flexionadas; e a compacta, que assume as caracterís-
ticas gramaticais de substantivos. O essencial, naturalmente, não é a marca
morfológica de uma transposição categorial, mas a concretização da noção
verbal numa perspectiva nominal ou verbal, à qual estariam conectadas dife-
rentes características semânticas e gramaticais.9
Essa dupla perspectiva, ao invés da mudança de classe, explica por que
temos uma conexão fundamental entre verbos e substantivos deverbais no
léxico, ou, numa perspectiva lexicalista, a expectativa de que, havendo um
verbo no léxico, haverá um substantivo correspondente (Basilio 1980): se
temos as duas possibilidades conceituais, segue-se que poderemos escolher
uma ou outra, donde a efetivação da possibilidade de concretização de am-
bas na maior parte dos casos.

9
Aliás, por incrível que pareça, esta situação é melhor representada na proposta lexicalista de
Chomsky, que concebeu entradas lexicais “neutras”, com dupla escolha de categoria, de tal
modo que consequências sintáticas e semânticas dependeriam de cada uma das escolhas.
114 Margarida Basilio

Quanto à conexão léxico-texto, observe-se que essa escolha da constru-


ção lexical é determinada no nível da elaboração do texto, sendo que as ca-
racterísticas gramaticais de construções particulares decorrem, portanto, de
decisões tomadas no nível textual. Assim, a perspectiva escolhida determina
como se desenvolve o texto e tem por objetivo fundamental fazer com que o
leitor do texto assuma essa mesma perspectiva.
Mas a construção nominal abarca diferentes alternativas de uso do subs-
tantivo deverbal decorrente. Por exemplo, para além da perspectivação no-
minal de uma estrutura que poderia ter sido apresentada como verbal, pode-
mos também fazer referência a um tipo de noção verbal em termos genéri-
cos, o que ocorre quando, por exemplo, falamos em geral de sofrimento,
animação, conhecimento, vadiagem, e assim por diante. Outra possibilidade
é o uso da noção verbal como base para denotar um evento, processo, meca-
nismo, etc., ou, por metonímia, seu efeito.
Como substantivos são elementos designadores, é natural que a noção
verbal se concretize como substantivo. É notório, por exemplo, o uso de
substantivos deverbais em função denotativa tanto na nomenclatura técnica
quanto no uso geral ou de jargões profissionais. Alguns exemplos em nossa
disciplina são: flexão, derivação, composição, transformação, referência,
ocorrência, denotação, conotação, neutralização, variação, construção,
etc... Dentre as formações de uso mais generalizado, temos ocorrência, cons-
trução, depressão, transferência, repressão, denominação, expressão e mui-
tos outros. Nestas construções, a evocação do ato representado pelo verbo
constitui apenas uma parte do significado pretendido, sendo uma parte supri-
da pelo conhecimento enciclopédico e/ou por mecanismos cognitivos como
metáfora ou metonímia, dentre outros.
Vimos neste trabalho que o léxico abarca diferentes tipos de unidades
de caráter simbólico, que se encontram em estado de consolidação dinâmica,
dada a permanente interação entre seu potencial evocativo e suas concretiza-
ções; e analisamos brevemente, confrontando a perspectiva do lexicalismo
gerativista com a perspectiva da Gramática Cognitiva de Langacker, a rela-
ção lexical entre verbo e substantivo, provavelmente a relação lexical mais
estudada na descrição do Português, com o objetivo de marcar as múltiplas
interações entre conhecimento, representação e uso de unidades lexicais.
Em síntese, o léxico apresenta nessa relação um processo gramatical de
mudança de classe ou de escolha de perspectivas semânticas, ligado a pro-
priedades gramaticais e marcado nas características morfológicas da deriva-
ção; esta escolha está disponível em termos gramaticais, textuais e denotati-
vos, mas depende do fator cognitivo que determina a escolha para a constru-
ção do texto. Ou seja, não podemos ir muito longe na investigação sobre o
conhecimento lexical, a gramática ou o texto sem levar em conta suas inter-
conexões na representação e uso da língua.
Formação de Palavras 115

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