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Dicionário de gêneros textuais
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Dicionário de gêneros textuais
E-book327 páginas3 horas

Dicionário de gêneros textuais

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Sobre este e-book

"É no quadro atual de mudança paradigmática no ensino do português que a produção, por Sérgio Roberto Costa, deste Dicionário de gêneros textuais se revela extremamente oportuna e valiosa.

Pesquisador em Lingüística Aplicada e professor de língua portuguesa, Sérgio Roberto, combinando precisão analítica e comprometimento pedagógico, constrói um dicionário que é, ao mesmo tempo, um estudo sério e exaustivo de gêneros e um instrumento fundamental para o ensino. Na Introdução, de forma clara, equilibrada e didática, esclarece conceitos e analisa classificações de gêneros; nos verbetes, registra quase 400 gêneros, caracterizados, exemplificados, incluindo desde os gêneros mais corriqueiros até os mais sofisticados, desde os mais "tradicionais" até os mais recentes e inovadores – aqueles muitos que vêm surgindo com as novas tecnologias e que ele precursoramente analisa com amplitude e profundidade. Oferece, assim, aos professores uma obra de referência fundamental para a utilização competente de gêneros, tanto orais quanto escritos, como objeto e objetivo essenciais no ensino da língua. Oportuna e valiosa contribuição – fruto (tão raro!) do compromisso de um pesquisador e professor universitário com a educação e o ensino."
Magda Soares
IdiomaPortuguês
Data de lançamento3 de mai. de 2018
ISBN9788582179017
Dicionário de gêneros textuais

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    Dicionário de gêneros textuais - Sérgio Roberto Costa

    Dicionário de gêneros textuais

    Sérgio Roberto Costa

    3a edição revista e ampliada

    Prefácio | 1ª edição

    Neste momento de mudança de paradigma que atualmente domina o ensino do português em nosso país, é extremamente oportuna e valiosa a contribuição que Sérgio Roberto Costa oferece aos professores e aos formadores de professores, com a publicação deste Dicionário de gêneros textuais, exaustiva compilação e criteriosa caracterização de gêneros, feitas com a precisão e a clareza que só um competente pesquisador na área da Linguística Aplicada e um experiente professor e formador de professores poderia produzir.

    Contribuição extremamente oportuna e valiosa porque, no quadro daquilo que aqui estou denominando mudança de paradigma no ensino do português, embora estejam presentes outros elementos além da recente inclusão do conceito de gênero, esse conceito é, sem dúvida, um dos componentes essenciais dos novos pressupostos teóricos, e dos princípios pedagógicos deles decorrentes, que, nas últimas décadas, vêm reformulando e reconfigurando o ensino não só do português, em nosso país, mas, mais amplamente, das línguas maternas em vários países do mundo ocidental. Entretanto, embora componente essencial dos novos pressupostos teóricos e decorrentes princípios pedagógicos do ensino da língua, é conceito ainda pouco compreendido e ainda mal assimilado por professores e formuladores de currículos e programas para o ensino da língua.

    São duas as principais causas da recente mudança de paradigma no ensino do português no Brasil. A primeira delas é o desenvolvimento, a partir sobretudo da segunda metade do século passado, das ciências linguísticas, que enfim dotaram o ensino da língua de fundamentos teóricos e substrato científico; a segunda, contemporânea da primeira, é a democratização do ensino, que enfim deu às camadas populares pleno acesso à escola e à educação formal. Os principais elos de articulação entre a primeira e a segunda causa são a Sociolinguística e a teoria dos gêneros.

    Por um lado, a Sociolinguística obrigou ao acolhimento, no ensino da língua, das variedades linguísticas, tanto como objeto de estudo quanto, e certamente mais importante, como denúncia e controle de manifestações de preconceitos linguísticos contra os alunos provenientes de contextos sociais, culturais e linguísticos diferentes dos contextos das camadas médias e altas da população de que provinham, quase exclusivamente, os alunos, antes da democratização do ensino. Os estudos e as pesquisas sobre dialetos, variantes, registros vieram esclarecer o real papel e a real função do ensino da norma culta, reformular o conceito de erro, relativizar os critérios de aceitação de modalidades de expressão oral e escrita.

    Por outro lado, a teoria dos gêneros, no quadro da teoria do discurso, trouxe para o ensino da língua o reconhecimento e a prática de gêneros textuais e/ou discursivos, que vieram acrescentar-se aos tipos textuais, até então dominantes na leitura e na escrita escolares: punha-se o foco na natureza linguística de segmentos textuais – descrição, narração, dissertação, argumentação –, ignorando-se aquilo que verdadeiramente institui e constitui o texto: os aspectos sócio-históricos e interativos que definem seu funcionamento e resultam de seu contexto de produção e recepção, ou seja: ignorando-se o gênero do texto. Acolhendo o conceito de textos como representando gêneros, e não apenas tipos, o ensino da língua materna passa a reconhecer e desenvolver diferentes práticas discursivas – aos gêneros literários, únicos admitidos até então nas salas de aula, e aos gêneros de circulação exclusivamente escolar, acrescentam-se aqueles muitos outros gêneros pertencentes a outros domínios discursivos, gêneros que circulam nas práticas sociais fora das paredes da escola.

    No entanto, como sempre ocorre em momentos de mudança de paradigma pela emergência de novos conceitos e, consequentemente, exigência de novos comportamentos, problemas e dificuldades se interpõem.

    Em relação aos novos conceitos e, sobretudo, aos novos comportamentos decorrentes da contribuição da Sociolinguística, problemas e dificuldades têm sido de difícil solução, porque se enfrenta a resistência ao reconhecimento da legitimidade das variedades linguísticas – resistência não propriamente linguística, mas essencialmente ideológica e política, calcada em séculos de uma concepção elitista da língua e de seu uso.

    Em relação aos novos conceitos trazidos pela teoria dos gêneros para o ensino da língua, problemas e dificuldades são de outra natureza (e de mais fácil enfrentamento); são dúvidas teóricas e pragmáticas provenientes da ainda precária socialização, entre os professores, da teoria dos gêneros, que vem sendo construída e difundida, entre nós, muito recentemente: a quase totalidade da produção brasileira sobre gêneros surge a partir da metade dos anos 90 do século passado. Assim, embora o conceito e a prática de gêneros textuais e discursivos venham sendo incluídos em diretrizes curriculares e programas de ensino, é ainda uma lacuna na formação dos professores a compreensão desse conceito e a orientação para o trabalho adequado com gêneros no ensino da língua. Vêm daí as mencionadas dúvidas teóricas e pragmáticas: o que é gênero? quantos e quais são os gêneros? com que gêneros se deve trabalhar no ensino de português? como ensinar tomando como diretriz os gêneros?

    E aqui volto à minha afirmação inicial: é no quadro atual de mudança paradigmática no ensino do português, acima rapidamente esboçado, que a produção, por Sérgio Roberto Costa, deste Dicionário de gêneros textuais se revela extremamente oportuna e valiosa. Pesquisador em Linguística Aplicada e professor de Língua Portuguesa, Sérgio Roberto, combinando precisão analítica e comprometimento pedagógico, constrói um dicionário que é, ao mesmo tempo, um estudo sério e exaustivo de gêneros e um instrumento fundamental para o ensino. Na Introdução, de forma clara, equilibrada e didática, esclarece conceitos e analisa classificações de gêneros; nos verbetes, registra quase 500 gêneros, caracterizados, exemplificados, incluindo desde os gêneros mais corriqueiros até os mais sofisticados, desde os mais tradicionais até os mais recentes e inovadores – aqueles muitos que vêm surgindo com as novas tecnologias e que ele precursoramente analisa com amplitude e profundidade. Oferece, assim, aos professores uma obra de referência fundamental para a utilização competente de gêneros, tanto orais quanto escritos, como objeto e objetivo essenciais no ensino da língua. Oportuna e valiosa contribuição – fruto (tão raro!) do compromisso de um pesquisador e professor universitário com a educação e o ensino.

    Magda Soares

    Apresentação | 3ª edição

    Estamos na 3ª edição de nosso Dicionário de Gêneros Textuais, o que aumenta nossa responsabilidade (e nosso orgulho também) frente aos leitores e leitoras desta obra de consulta e pesquisa. Novamente, colegas e diversos leitores e leitoras provocaram discussões sobre o dicionário e certos verbetes ou nos fizeram sugestões de acréscimo de novos artigos.

    Os questionamentos geralmente se referem a certos verbetes em que há polêmica teórica sobre se seriam gêneros, suportes, veículos, eventos discursivos ou ambientes. Nessa linha, achamos que Marcuschi, em A questão do suporte dos gêneros textuais, disponível em http://bbs.metalink.com.br, abriu uma ótima discussão sobre o tema, deixando muito claro como muitas vezes é complicado, teoricamente, decidir se determinados verbetes são gêneros ou suportes ou ambos, dependendo do ponto de vista dos pesquisadores.

    Há casos, diz o autor, em que não se sabe ao certo como tratar um determinado fenômeno. O fôlder, por exemplo, poderia ser ao mesmo tempo um suporte para vários gêneros como volante, resumo, esquema, etc., mas já foi (e é tratado, afirmamos) como gênero. Um seminário e uma mesa-redonda certamente não devem ser tratados como gênero e sim como eventos ou talvez até mesmo como suportes. Foi o que fizemos, por exemplo, não colocando Workshop como gênero, mas considerando-o na mesma linha de seminário e mesa-redonda, um evento.

    Portanto, Fôlder, Bâner, Livro didático, Cartaz, Outdoor e outros seriam exemplos clássicos dessa polêmica, embora para Marcuschi Outdoor seja claramente um suporte de vários gêneros. Diz ele que se trata de um suporte e não de um gênero, mesmo que ele próprio já o tenha classificado anteriormente como gênero. Completa Marcuschi: dada a diversidade que esse ‘suporte’ veio assumindo quanto aos gêneros que alberga e quanto à função desses gêneros, eu o classifico hoje como suporte.

    Contudo, como para Marcuschi o outdoor tem peculiaridades muito interessantes e mereceria um estudo à parte, mantivemos esse verbete (e outros) como gênero (e/ou suporte), pelas características que descrevemos dele(s) (v. outdoor, painel, encarte/separata neste dicionário). Mesmo porque, assim como a cartolina pode ser um suporte do cartaz, uma chapa de ferro (ou de outro material) o seria do outdoor ou do painel.

    Por causa dessa polêmica, nas edições anteriores e nesta, sempre fazemos observações no próprio verbete ou em notas de rodapé sobre alguns artigos, mas não deixamos de registrá-los em nosso dicionário, justamente para que sejam objeto de discussão dos pesquisadores e professores. Para leitores leigos que fazem deste dicionário apenas um manual de consulta, essa polêmica não teria tanta importância. Mas valem as informações.

    A partir, pois, dos debates e das sugestões, fizemos algumas modificações, retiramos ou acrescentamos novos verbetes, não necessariamente todos os sugeridos, principalmente os gêneros orais que demandariam pesquisa de campo mais demorada. A primeira edição de 2008 trazia em torno de 400 verbetes; a segunda, 500, e esta, mais de 600.

    Quanto às modificações, além de revisões e correções textuais diversas, resolvemos continuar aportuguesando alguns artigos ou verbetes, termos ou expressões de língua estrangeira, a maioria de origem inglesa, sem nenhum preconceito linguístico ou atitude purista. Como há divergências sobre o aportuguesamento, e fazê-lo no corpo da obra dificultaria bastante, por ser um trabalho de garimpo, e atrasaria a 3ª edição, resolvemos fazer uma lista de sugestões em forma de ADENDO (v. final do dicionário). Quando esse aportuguesamento acontece no corpo do texto, procuramos fazer referência às sugestões já existentes, ou mesmo sugerir alguma nova forma de escrita portuguesa aos estrangeirismos. Quanto aos novos verbetes acrescidos ao dicionário, nossa pesquisa se concentrou em várias obras de consulta e sítios da Internet (v. Referências).

    Acima de tudo, gostaríamos ainda de destacar que o espírito das edições anteriores se mantém nesta edição (v. Apresentação – 1ª. e 2ª. edições), no que concerne às questões teóricas – nossas concepções ou posições –, às propostas práticas do uso pedagógico dos gêneros textuais e a outros quejandos. E, como já salientamos anteriormente, nosso dicionário continua aberto a discussões e sugestões.

    Sérgio Roberto Costa

    Apresentação | 1ª e 2ª edições

    Este pequeno Dicionário de Gêneros Textuais, que ora publicamos, é fruto de vários anos de nossa experiência em pesquisas linguísticas e em ensino de Linguística aplicada à Língua Materna (LM, daqui em diante) e de Língua Portuguesa no ensino superior, médio e fundamental de rede pública e particular. Esta nossa experiência de longos anos se deu (e se dá) em disciplinas que abordam teorias e práticas sociais de produção e recepção de textos, nos nossos cursos de Letras, Extensão e de Pós-Graduação, stricto e lato sensu, na FEPI (Itajubá), na UFU (Uberlândia), na UFJF (Juiz de Fora), na FAFISM (Muriaé) e na UNINCOR (Três Corações).

    Ao tratar desses temas, pudemos perceber quanto os professores, nossos alunos, que atuam principalmente no ensino fundamental e médio, precisariam de um manual de consulta (não de receitas), que contivesse preliminarmente uma pequena discussão teórica sobre Gêneros Discursivos e Textuais (v. Introdução). Além disso, uma obra que, ao mesmo tempo, lhes apresentasse um rol dos principais gêneros escritos e orais, com suas definições e características, e lhes deixasse mais claro o que são essas práticas sociais de oralidade, escrita e leitura que podem ser transpostas como objetos didáticos para as salas de aula de LM do ensino fundamental, médio e superior.

    Selecionamos em torno de 500 verbetes ou artigos e procuramos, na medida do possível, dar-lhes a origem, fazer-lhes a definição ou a descrição temática, composicional e estilística, apresentar-lhes o espaço de circulação, o domínio discursivo, interlocução... (e, de alguns, procuramos dar exemplos e ilustrações, coisa que pretendemos fazer mais profundamente numa próxima edição). Contudo manter um equilíbrio entre as informações discutidas em cada verbete (v.) ou artigo (v.) nem sempre foi possível totalmente, pois há gêneros totalmente consagrados pela tradição e outros ainda carecem de pesquisas para que se possa detalhá-los com mais precisão. Trata-se de uma limitação que nos cerceou o aprofundamento das informações sobre alguns verbetes.

    A escolha dos verbetes ou artigos se pautou no princípio da diversidade ou heterogeneidade dos gêneros, princípio teórico básico bakhtiniano. Por isso este dicionário traz gêneros escritos e orais clássicos, já consagrados pelo discurso literário, jurídico, religioso, cotidiano e outros e traz também verbetes ou artigos de gêneros emergentes como os do discurso eletrônico/digital, ainda geradores de polêmica classificatório-tipológica.

    Mas essa polêmica se estende também, por um princípio metonímico da linguagem, a determinados verbetes (v.) ou artigos (v.) que podem ser lidos ora como gêneros ora como suportes ou portadores de textos, como o cartaz, o banner, o outdoor, etc. Outros ainda podem ser ambientes (v. NR 17), ou seja, domínios de produção e processamento de textos onde emergem novos gêneros textuais aí abrigados ou condicionados. Neste caso, optamos por inseri-los no Dicionário, sempre discutindo a questão ou chamando a atenção para a polêmica, ou no próprio corpo do texto ou remetendo o leitor para uma nota de rodapé (NR, daqui em diante).

    E mais... Como se trata de um dicionário que tem certo caráter pedagógico, tomamos a liberdade de, algumas vezes, oferecer pequenas orientações ou fazer pequenos comentários que talvez possam ajudar no ensino de leitura e produção de textos de línguas materna e estrangeira. Esse caráter pedagógico também nos deu a liberdade de oferecer informações teóricas, referências bibliográficas e outras em forma de NRs, tanto nos textos introdutórios (Apresentação e Introdução) como no desenvolvimento dos verbetes ou artigos. Essas informações, achamos, podem ajudar os leitores deste dicionário a aprofundar seus conhecimentos de teorias de gêneros e de referências sobre o tema.

    Em síntese: entendendo os gêneros como formas heterogêneas, sociodiscursivo-enunciativas, orais e escritas, dadas pela tradição e pela cultura – ontem e hoje –, é que escrevemos a primeira versão deste dicionário, que, embora limitado em quantidade de verbetes ou artigos, procura compensar essa limitação pela qualidade dos verbetes selecionados e pela extensão temporal, social e discursiva que procura abranger. Este dicionário traz definições, características, informações, correlações dos principais gêneros escritos e orais que circulam nas várias esferas sociais e culturais, passadas e presentes. Contudo, por se constituir um dicionário inédito, está aberto a discussões e sugestões para uma possível nova edição.

    É justamente esta a segunda edição que ora colocamos no mercado, devido à boa procura que este dicionário teve. Em função de debates com colegas em vários eventos de que participei e das sugestões que recebi, faço uma edição ampliada com mais de setenta novos verbetes, além de burilar e ilustrar outros que já compunham a lista de artigos. Também fiz uma revisão geral para que a 2ª edição já fosse publicada segundo a nova ortografia. Mais uma vez, salientamos que o dicionário continua aberto a discussões e sugestões.

    Sérgio Roberto Costa

    Introdução

    Esta introdução, mais do que uma explicação do dicionário, pois já a fizemos na Apresentação, traz uma discussão teórica sobre gêneros e põe em destaque um princípio básico da teoria: a compreensão das práticas de oralidade, escrita e leitura como atividades enunciativo-discursivas presentes em várias instituições e em várias esferas sociais, isto é, em vários domínios discursivos, mediadas por enunciados – os gêneros discursivos e textuais¹ orais e escritos – (sendo que estes últimos circulam em suportes/portadores diversos: livros, revistas, jornais, painéis (outdoors), cartazes, telas de TV e de computador, panfletos, orelhas de livro ou de fichários, embalagens,² etc.).

    A compreensão e o domínio teóricos desses conceitos são fundamentais. Assim, embora os conceitos de gêneros sejam bastante diversificados e os gêneros sejam de grande e imensa heterogeneidade, vamos tentar defini-los e caracterizá-los aqui de uma maneira simples e objetiva, sem banalizá-los, para que o uso deste dicionário possa ser útil na práxis cotidiana de estudantes, profissionais e diletantes que dele fizerem uso. Iremos tratar dos gêneros tanto sob o enfoque discursivo de Bakhtin (1953/1973) quanto textual de Bronckart (1999, p. 69-77).

    Comecemos com o conceito de Gêneros Discursivos de Bakhtin. Inicialmente, observemos nosso dia a dia. Há atividades ou práticas discursivas, principalmente orais, como a conversação, que usamos na relação imediata com nossos interlocutores. Dialogamos diariamente com pessoas a nosso redor, respondendo a perguntas, opinando, contando casos, piadas, dando ordens, etc. São atos conversacionais diversos à nossa disposição, desde há muito tempo. Ou seja, o ato de conversar – a conversação – é um dos gêneros primários da oralidade humana. Gênero primário porque apareceu primeiro, é primitivo, original; não porque é elementar, superficial ou limitado e, por ser oral, poderia ser interpretado como mal construído ou inferior a outro escrito, principalmente porque vivemos numa sociedade grafocêntrica. Bakhtin o chama de enunciado de gênero primário. Nesse enfoque enunciativo-discursivo, um enunciado de gênero primário vai ser compreendido por sua relação com o contexto imediato, onde acontece a ação comunicativa. Nessa situação privada, imediata e injuntiva de interlocução face a face de produção, há um autocontrole dos textos que os falantes produzem e esses tipos de enunciados são considerados primários (mais simples?) por isso.

    Agora observemos os diálogos – escritos ou orais – em outros tipos de gêneros, como as conversas de personagens em um romance, em um conto, em uma novela, em uma peça de teatro; uma entrevista publicada em um jornal, em uma revista, ou a entrevista realizada, ao vivo, no rádio ou na televisão. Nesses casos, os atos de conversar foram tomados emprestados da esfera do cotidiano por uma esfera mais complexa, pública, em que a interlocução não é mais imediata e, portanto, as condições de produção do discurso se tornam secundárias, mais complexas. A conversação (gênero primário) do cotidiano se transforma em um diálogo (gênero secundário) de personagens de um discurso literário em um romance, conto ou novela ou em um diálogo assimétrico de uma entrevista jornalística, radiofônica ou televisiva.

    Temos, então, o que Bakhtin chama de enunciado de gênero secundário que constitui uma ação em si mesmo e vai ser compreendido pelas (co)referências entre os enunciados dentro do próprio texto, que deve ter sua própria rede de indicações coesas e coerentes. Um gênero primário – a conversação – se transforma em um secundário – o diálogo entre personagens ou a entrevista. Nesse processo de transformação, o secundário traz características do primário, acrescenta novas características da nova esfera discursiva em que circula e se realiza como um novo gênero. Há semelhanças, sim, entre eles, mas são gêneros diferentes. Não podemos estabelecer claramente as fronteiras entre eles, contudo, por suas características individuais, constituem-se um objeto sempre único, resultado de transformações histórico-sociais.

    Outros exemplos de gêneros secundários emergentes, bem atuais, podem ser encontrados na internet. Muitos pesquisadores de textos produzidos na internet apontam, por exemplo, o nascimento de alguns gêneros que, embora tenham semelhança com gêneros já existentes, não são os mesmos, devido a novas finalidades discursivas que remetem a novas práticas sociais. Assim, mesmo usado na comunicação interindividual, o bate-papo virtual (chat) é diferente de uma conversa face a face (ou telefônica, que também é transformação de uma conversação). Ou seja, as conversas diretas, em grupos ou privadas, na internet, são diferentes dos seus gêneros correspondentes já consagrados, historicamente, no cotidiano. Ou ainda podemos acrescentar: blog não é diário pessoal ou agenda; endereço eletrônico possui características/categorias diferentes de endereço postal, etc. (v. Costa, 2006). Isso porque os gêneros ditam o que dizer e como dizer por suas coerções,³ já que são formas relativamente estáveis de enunciado, tanto em relação ao conteúdo temático-figurativo quanto à estrutura textual e ao estilo. Além disso, circulam em novos espaços e em novos suportes.

    Essa classificação de Bakhtin, que expusemos acima, teve o grande mérito de reavaliar o conceito de gênero, que ele chamou de gêneros do discurso, mudando o enfoque de análise do campo da Linguística para o da Pragmática, estendendo essa noção para o conjunto das práticas discursivas. O falante disporia, então, além das formas da língua (= recursos linguísticos: lexicais, fraseológicos, gramaticais...), das formas dos enunciados (= construção/estruturação composicional de gênero: narração, relato, argumentação, explicação...) na comunicação discursiva do conteúdo cujos sentidos determinam as escolhas que o sujeito concretiza a partir do conhecimento empírico que tem dos gêneros à sua disposição (por exemplo, conversa, carta, palestra, entrevista, resumo, notícia...).

    Em outras palavras, todo gênero, segundo Bakhtin, é definido por três dimensões essenciais:

    a) os conteúdos, que são e se tornam dizíveis pelo gênero (conversa, carta, palestra, entrevista, resumo, notícia...) e não

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