Iluminismo Ou Iluminismos

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Revista Vernáculo, n. 27, 1o sem.

/2011

ILUMINISMO OU ILUMINISMOS?

Flávio Renato de Aguiar Lopes*

Resumo: O presente artigo propõe que o Iluminismo não foi um movimento


homogêneo, ocorrido somente na França, conforme defendem alguns historiadores
e grande parte do material didático disponível. A perspectiva dominante no ensino
limita o conhecimento dos estudantes de história, pois desconsidera a possibilidade
de se conhecer como o Iluminismo se originou em outras nações. Em um primeiro
momento, estabelecemos uma relação entre ensino e Iluminismo, mostrando a
partir da análise de um livro didático e de questões extraídas de vestibulares como
esse assunto é tratado no âmbito da educação básica. Na sequência, trazemos à
discussão o conceito de Iluminismo, focando as características comuns de todas as
tendências desse movimento intelectual. Encerrado esse debate, apresentamos as
novas correntes que defendem a existência de uma pluralidade de Iluminismos e
destacamos o Português para dar suporte a essa análise. Com esse trabalho,
pretendemos mostrar que existiram diferentes tendências no âmbito do
Iluminismo, bem como apontar possíveis melhorias da discussão desse assunto em
sala de aula.

Palavras-chave: Iluminismo; ensino; Iluminismo Português.

Abstract: This article argues that the Enlightenment was not a homogeneous
movement, occurred only in France, as some historians argue, and much of the
teaching material available. The dominant perspective on teaching limits students'
knowledge of history, because it ignores the possibility of knowing how the
Enlightenment originated in other nations. At first, we establish a relationship
between education and Enlightenment, showing the analysis of a textbook and

*
Graduando em História pela Universidade de Brasília (UnB).

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vestibular issues as extracted from the subject is treated as part of basic education.
Following, we bring to the discussion the concept of Enlightenment, focusing on
the common characteristics of all the intellectual trends of this movement. Ended
this debate, we present the new trends that advocate the existence of a plurality of
Enlightenment and highlight the Portuguese to support this analysis. With this
work, we intend to show that there were different tendencies within the
Enlightenment, and to identify possible improvements of the discussion of this
subject in the classroom.

Keywords: Enlightenment; teaching; Portuguese Enlightenment.

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ILUMINISMO OU ILUMINISMOS?

Flávio Renato de Aguiar Lopes

1. Introdução

Neste trabalho, pretendemos mostrar que o Iluminismo não


foi um movimento de ideias únicas, homogêneo, que ocorreu
somente na França, conforme defendem alguns historiadores e
grande parte do material didático disponível. A perspectiva que
domina o ensino limita o conhecimento dos estudantes de história,
pois não leva em consideração a possibilidade de se conhecer como
se formou o Iluminismo em outras nações, bem como suas
particularidades.
Assim, iniciamos o presente estudo estabelecendo uma
relação entre escola e Iluminismo, mostrando a partir da análise de
um livro didático e de questões extraídas de vestibulares como o
assunto Iluminismo é tratado no âmbito da educação básica. Na
sequência, trazemos à discussão o conceito de Iluminismo (mesmo
sabendo da existência de outros movimentos iluministas,
procuramos conceituar de uma maneira geral o Iluminismo),
focando as características comuns de todas as tendências desse
movimento intelectual. Encerrado esse debate, apresentamos as
novas correntes que defendem a existência de uma pluralidade de

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Iluminismos e destacamos o Português para dar suporte a essa


análise.
A nossa intenção com essa proposta de trabalho é mostrar
que existiram diferentes tendências no âmbito do Iluminismo, bem
como apontar possíveis melhorias da discussão desse assunto em sala
de aula.

2. Relação Escola X Iluminismo

O ensino sobre o Iluminismo, de um modo geral, é feito nas


escolas de maneira simplista, genérica e, até mesmo, equivocada. Isso
se reflete em alguns livros didáticos que dão pouquíssimo destaque
ao Iluminismo em suas páginas. Geralmente, apresentam-se, em
poucas páginas, detalhes escassos sobre as suas características e seus
principais pensadores.
Além disso, o ensino tradicional tende a transmitir que
somente existiu um tipo de Iluminismo na Europa, o francês. Com
isso, os autores de livros didáticos ignoram as diferentes expressões
do pensamento Iluminista em outros países europeus, como na
Alemanha, na Itália, em Portugal, por exemplo.
Para exemplificar, analisamos o livro didático “História da
Civilização Ocidental” (PEDRO & LIMA, 2004), o qual afirma que os
ideais iluministas influenciaram diretamente algumas Revoluções, o
que tem sido questionado por alguns historiadores, mais

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recentemente. 135 Segundo os autores, “A revolução intelectual fazia


parte do processo de transformações por que passavam as sociedades
europeia e americana.” (PEDRO & LIMA, 2004, p. 242)

Os pensadores do Iluminismo contribuíram para os


fundamentos teóricos e práticos das revoluções que já
estavam acontecendo ou iriam acontecer, como a Revolução
Americana, que resultou na independência dos Estados
Unidos, e a Revolução Francesa, que resultou na derrubada
violenta do absolutismo e da nobreza. (PEDRO & LIMA,
2004, p. 242 – grifos meus).

Nesse mesmo livro didático, os autores consideraram a obra


Enciclopédia, apresentada como o marco das ideias iluministas na
França (novamente a “exclusividade” da França), desprezando a
importância de obras como “Do espírito das leis” (1748), de
Montesquieu; “Émile” e “Do contrato social” (1762), de Rousseau.
Por conta disso, os estudantes adquirem uma interpretação limitada
do Iluminismo: “o maior veículo de difusão das ideias iluministas na
França foi a Enciclopédia, obra que pretendia abranger todo o
conhecimento filosófico e científico da época. Com cerca de trezentos
colaboradores, reunia a elite intelectual francesa do século XVIII.”
(2003, p. 240)
Por causa dessas – e outras – limitações teóricas dos livros
didáticos e também dos professores do Ensino Médio, os estudantes

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Ver DARTON, 2005; OUTRAM, 1995.

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saem da escola com um conhecimento escasso acerca desse


importante movimento filosófico-intelectual.
Uma das razões para essa discussão simplificada nas escolas
pode estar relacionada ao tempo limitado do professor para ensinar
um conteúdo tão vasto. Além disso, as provas para vestibulares
também tendem a abordar o Iluminismo como um movimento
único, como podemos perceber nas questões abaixo:

(URCA/CE) Questão 3: O Iluminismo produziu ideias que


serviram de base ideológica para as Revoluções Burguesas dos
séculos XVIII e XIX. Seus pensadores escreveram tratados
filosóficos, econômicos e políticos. Entre eles, o Barão de la
Brède e de Montesquieu (1689 – 1755), mais conhecido
somente por Montesquieu. Assinale a alternativa que diz
respeito ao seu pensamento político.

(UFF/RJ) Questão 11: A Revolução Francesa foi obra coletiva


com a participação de todos os setores da sociedade francesa,
de nobres a camponeses, passando por burgueses e operários.
Essa dimensão coletiva também esteve presente nas idéias que
deram base à revolução, como o Iluminismo, sistema de
pensamento oriundo das reflexões dos intelectuais franceses.
Esses dois aspectos estão presentes numa obra que junta todos
os conhecimentos novos, práticos e teóricos.

Assinale a alternativa que indica a obra que denota o caráter


renovador da Revolução Francesa.

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A - A Enciclopédia dirigida por Voltaire e Rousseau, que


estabelecia as regras de organização da nova sociedade
francesa, com destaque especial para o elogio aos modos de
vida da nobreza, no que diz respeito à educação e aos
costumes refinados.

B - A Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, que


anunciava a possibilidade da revolução resultar de um acordo
entre os filósofos das Luzes e o Antigo Regime, com o intuito
de manter a ordem nos campos e nas cidades.

C - A Declaração Civil do Clero, que cortava radicalmente as


ligações com o feudalismo e introduzia um novo estatuto para
os trabalhadores rurais, garantindo-lhes a propriedade das
terras da nobreza.

D - A Enciclopédia dirigida por Diderot e D'Alembert, que


condensava todas as novas visões sobre o mundo, o homem e
a sociedade. Servia de guia para a oposição aos valores do
Antigo Regime.

E - A Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, que


preconizava a manutenção da autoridade da nobreza sobre
todas as terras da França e dos burgueses sobre as cidades,
dividindo o território em duas grandes partes para manter os
ideais da Revolução.

Gabarito: D

Nos próprios Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs) –


um dos documentos norteadores da educação brasileira – não há

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uma abordagem clara de como o(s) Iluminismo(s) devem ser


discutidos em sala. Uma referência – ainda assim superficial – sobre
o conteúdo é feito nas Orientações Curriculares para o Ensino Médio
(BRASIL, 2006):

O recurso à Filosofia, por sua vez, enriquece e amplia o


conceito, especialmente no que se refere à idéia de cultura
como formação advinda da “paidéia” (ligada à educação) e da
cultura humanista, renascentista e iluminista. Na articulação
dessas abordagens (histórica, antropológica e filosófica), o
conceito de cultura pode alcançar maior abrangência e
significado.

Como apresentado, o ensino traz de maneira genérica e


superficial as importantes contribuições iluministas para a sociedade
ocidental, o que não leva o aluno a refletir acerca dessas
contribuições para o seu dia a dia.
Esse quadro precisa, pois, mudar. E o primeiro passo é
mostrar que o que é tradicionalmente considerado “Iluminismo” se
configura, na verdade, como uma variedade de movimentos
intelectuais e internos e debates que ocorreram na Europa. Nesse
sentido, a França não seria mais vista como o único Estado a abarcar
os ideais iluministas, mas, sim, como o melhor exemplo de onde
essas ideias foram desenvolvidas e divulgadas.
Antes de refletirmos mais acerca do ensino, vamos expor, na
próxima seção, algumas linhas gerais do que foi o “Iluminismo”, e
por que defendemos um ensino plural desse movimento.

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3. O Movimento Iluminista

O significado do nome “Iluminismo” não é algo fácil de


definir para os historiadores e filósofos, pois essa palavra contém
várias interpretações e sentidos diferentes, variando conforme o
campo do conhecimento em que ela é aplicada. Numa acepção
mística, por exemplo, ela se refere à revelação divina; já no
racionalismo, ela remete à valorização da iluminação das ideias,
nacionais contrapondo os séculos anteriores que seriam as “trevas”,
com a iluminação trazida pelos pensadores do século XVIII.
O historiador Francisco José Falcon (2009) também defende
que não existe um consenso entre os especialistas sobre o significado
do nome do Iluminismo:

O problema do vocabulário das “Luzes” é ainda uma questão


em aberto. Não basta estudar cada palavra em si mesma; é
preciso situá-la filológica e historicamente, nacionalmente e
internacionalmente. A rede de significações que constituem o
seu campo semântico não é mera reprodução ou reflexo de
uma realidade histórica, mas é uma reação a essa realidade.
Entre uma coisa e outra há um espaço mental, maior ou
menor, tendente à contestação da própria realidade. Tal é o
caso francês, por isso mesmo considerado “clássico”: distancia
e reação convertem-se aí em crítica violenta ao existente.

Quer na filosofia, com o platonismo e o neoplatonismo, quer


na esfera religiosa, com o judaísmo e o cristianismo, a luz é
sempre imagem ou símbolo que significa verdade ou
conhecimento verdadeiro. A iluminação mística cristão,

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baseada na revelação divina, foi relida e secularizada pelo


pensamento das “Luzes”.

Tal apropriação da metáfora das “Luzes” pelos iluministas,


opondo as “Luzes” às “Trevas” das superstições, dos erros e da
ignorância dos séculos precedentes, possuía também seus
riscos. Pretendendo veicular novos sentidos através da antiga
metáfora, os “filósofos” não podiam impedir que, entretanto,
para muitos, o sentido tradicional se mantivesse vivo.

Sabemos agora que o Iluminismo tanto pode significar a


doutrina dos que acreditam na “iluminação interior” ou
mística, a qual para outros constituía uma espécie de
manifestação “irracionalista”, quanto, justo o oposto,
Iluminismo é sinômino de “filosofia das luzes”, isto é, da
chamada “iluminação racional”. (FALCON, 2009, p.15-17,
passim)

Os estudiosos concordam que o Iluminismo foi um


movimento intelectual europeu do século XVIII, que reuniu os
maiores pensadores e filósofos da época em diversos países.
Os racionalistas influenciaram os pensadores iluministas no
que se refere à valorização da razão, pois se utilizavam da razão e da
ciência para explicar praticamente todos os acontecimentos do
homem. Esse preceito será muito utilizado por boa parte dos
pensadores iluministas, que criticaram as explicações de mundo com
base na religião.
Os filósofos tinham como objetivos gerais para o movimento:
1) a luta contra qualquer tipo de limitação ao conhecimento humano,

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como o que era feito pela Igreja cristã (embora os iluministas, em sua
maioria, não se consideravam ateus, acreditando, inclusive, na Divina
Providência, que está relacionada à intervenção de Deus na Terra
como um castigo); 2) a busca incessante pela felicidade terrena, que
explica o fato de alguns pensadores iluministas valorizarem as cortes,
e o luxo; 3) a valorização da razão, pois, para os iluministas, ela traria
o progresso para a humanidade; 4) o questionamento da Natureza
humana: boa ou ruim? uniforme e imutável? quais seriam as “leis”
que a governavam?
Estes aspectos são legados deixados pelos iluministas para os
séculos posteriores. A felicidade terrena, para exemplificar, de tão
relevante está colocada na Declaração de Independência dos Estados
Unidos, de 1776:

Consideramos estas verdades autoevidentes: que todos os


homens são criados iguais, dotados pelo seu Criador de certos
Direitos inalienáveis, que entre estes estão a Vida, a Liberdade
e a busca da Felicidade. – Que para assegurar esses direitos,
Governos são instituídos entre os Homens, derivando seus
justos poderes do consentimento dos governadores. – Que,
sempre que qualquer Forma de Governo se torne destrutiva
desses fins, é Direito do Povo alterá-la ou aboli-la, e instituir
novo Governo, assentando sua fundação nesses princípios e
organizando os seus poderes da forma que lhe pareça mais
conveniente para a realização da sua Segurança e Felicidade.
(HUNT, 2010, p. 219-220)

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Por sua vez, o destaque à racionalidade humana foi muito


bem aceita pelas comunidades acadêmicas científicas do século XIX,
pois valorizava a ciência, e descobertas nas diversas áreas do
conhecimento humano.
Em resumo, embora haja uma aparente unidade nas
características gerais, o Iluminismo ocorreu em vários países da
Europa e quase que ao mesmo tempo em todos, de formas variadas.
Essa vasta expansão tem provocado recentemente muitos
questionamentos recentemente sobre, por exemplo, a delimitação
geográfica e cronológica (o movimento foi restrito a alguns poucos
países europeus? começou e terminou no século XVIII?); as origens
ideológicas; etc.
Os trechos abaixo ilustram essa diversidade de perguntas e
teorias sobre o(s) Iluminismo(s):

Mas só foi quando os herdeiros intelectuais, os philosophes,


ocuparam o terreno e lançaram-se à campanha que o
Iluminismo emergiu como a causa, com militantes e um
programa. Seus partidários forjaram sua identidade coletiva
em Paris durante as primeiras décadas do século XVIII. À
medida que o movimento ganhou força, ele se espalhou, e à
medida que se espalhou, sofreu mudanças, adaptando-se a
outras condições e incorporando outras idéias. Mas não
chegou a toda, nem cobriu todo o espectro da vida intelectual.
(DARNTON, 2005, p. 20 e 21).

O Iluminismo surgiu de uma grande crise durante os últimos


anos do reinado de Luís XIV. (DARNTON, 2005, p. 23)

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A única resposta possível é que o Iluminismo é uma invenção.


Uma invenção de intelectuais, sobre intelectuais, para
intelectuais, um conceito criado por intelectuais do século
XVIII que é mantido vivo por sucessivas gerações de
intelectuais. (COSTA, 1990, p. 34).

E o Iluminismo, seria uma tendência transepocal, uma


tendência que, certamente, teve na Ilustração a sua realização
histórica mais rica, mas que não começou no século XVIII,
nem terminou no século XVIII. O Iluminismo, nesse sentido,
seria definido como uma tendência de contestação da
existência, através da razão e da crítica. Uma crítica racional
do poder, dos dogmas e superstições que estão a serviço do
poder. (...). Começou com os Gregos. (ROUANET, 1992,
p.14)

O absolutismo e as condições de produção do período


mercantilista já não atendiam às exigências provocadas pelas
novas forças produtivas da Revolução Industrial. O
Iluminismo (ou Ilustração) vinha ao encontro dos novos
anseios, criticando o absolutismo, a religião e o mercantilismo
como elementos limitados do avanço da sociedade como um
todo. Teve intensa repercussão em toda a Europa e nas
Américas, inspirando a independência das colônias inglesas
na América do Norte (os Estados Unidos) e as rebeliões
anticoloniais no Brasil (Inconfidência Mineira, Revolta dos
Alfaiates). (PEDRO & LIMA, 2004, p. 239 e 240).

Mas, por quais motivos o Iluminismo foi um movimento


basicamente europeu, e não aconteceu um movimento de intelectuais
em outras localidades, como nas próprias colônias europeias?
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Para alguns estudiosos, o Iluminismo não conseguiu se


desenvolver fora da Europa, pois nesses lugares os pensadores e
filósofos não tinham uma infraestrutura de qualidade para
desenvolver as suas ideias (bibliotecas, imprensa), e também esses
pensadores tinham um público bem menor em relação ao europeu.
Esses fatores limitavam ainda mais o desenvolvimento de seus
trabalhos intelectuais. Esses problemas foram detectados nas colônias
europeias, e em países que não passaram pelos processos de
transformações sociais e econômicas, pelos quais muitos países da
Europa passaram:

Nesses países, os intelectuais não apenas tinham um público


menor: também lhes faltava o aparato intelectual (ou se
quiserem infra-estrutura) – dinheiro, biblioteca, imprensas,
livraria etc. –, que os intelectuais franceses e ingleses tinham
ao seu dispor. Isso explica o papel secundário como
propagandistas de idéias que os intelectuais das áreas menos
desenvolvidas do mundo tiveram de desempenhar.
Evidentemente, pode-se encontrar nas colônias da Espanha e
de Portugal, indivíduos com competência para extrair de sua
própria experiência conclusões semelhantes às dos filósofos.
Mas eles encontravam um limite nas suas sociedades: no
pequeno tamanho do público, na escassez de bibliotecas,
escolas, livrarias etc. Faltando-lhes as condições que na
Europa estavam criando possibilidades de profissionalização,
eles estavam condenados a depender dos mercados europeus
de idéias. Seu ponto de referência estava inevitavelmente
deslocado (residia fora), mesmo nos momentos de mais
ardente nacionalismo. No entanto é tanto correto dizer que

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eles viam a realidade à sua volta através das lentes da


Ilustração através das lentes da sua experiência cotidiana. E
como suas experiências diferiam consideravelmente, eles
criaram muitas leituras da Ilustração. (COSTA, 1990, p.38).

Na próxima seção, aprofundamos o debate acerca da


pluralidade de iluminismos.

4. Iluminismo ou Iluminismos?

Durante boa parte dos séculos XIX e XX, até


aproximadamente 1970, o Iluminismo foi interpretado por
historiadores do porte de Gay (1966), Hazard (1946) e Cassirer
(1932) como um movimento restrito à França e homogêneo em seu
conjunto de ideias. Os especialistas dos séculos XIX e XX
fundamentavam os argumentos utilizados pelos movimentos pós-
Revolução Francesa e pelos movimentos liberais do século XIX com
base nas ideias do Iluminismo. Essa adaptação causou algumas
interpretações errôneas, como a tradução equivocada de Aufklarüng,
o Iluminismo alemão, na perspectiva de Kant, cujo sentido remete a
uma ação em processo; para um sentido de ideia já acabada. Carvalho
(2008) nos mostra que:

Esta é a maneira como Gay iniciou o livro The


Enlightenment, apresentando o Iluminismo como uma
unidade, como um conjunto de idéias harmoniosas,
elaboradas por grupo de grandes pensadores, no qual as

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pequenas divergências não chegaram a afetar a unidade. A


explicação do autor, muito utilizada entre os anos 1960 e
1970, não foi pioneira nesse tipo de abordagem acerca do
Iluminismo, tendo apenas dado continuidade a uma tradição
historiográfica oitocentista, que, no século XX, teve no
filósofo Ernst Cassirer e no historiador francês Paul Hazard
duas grandes referencias (Chaunu, 1995: 277; Outram, 1995:
3-4).

Tanto na síntese de Cassirer quanto na de Hazard, o


pensamento Iluminista não foi visto em uma perspectiva
plural, isto é, considerando-se as especificidades, os debates,
as diferenças e as tensões inerentes a esse movimento de
idéias. O Iluminismo foi concebido como uma tendência
intelectual do Setecentos baseada em conjunto de idéias –
aparentemente harmônicas – desenvolvido por grupo de
grandes pensadores – em sua maioria franceses –
uniformizado, metonimicamente, como padrão para a Europa
setentista. Esse ponto de vista pode ser inferido da seguinte
colocação de Cassierer: “O pensamento do século XVIII (...)
corresponde em suma ao desenvolvimento analítico que é,
sobretudo, um fenômeno francês” (1997: 50).

O conceito de Iluminismo presente no pensamento de alguns


filósofos setecentistas, entretanto, não foi o mesmo divulgado
nas sínteses históricas realizadas no decurso do século XX.
Nesse interregno, a noção original sofreu revisões e
reelaborações, sendo ideológicos dos intelectuais dos
contextos pós-Revolução Francesa e liberal do século XIX. De
acordo com Dorinda Outram, as discussões em torno do
significado do Iluminismo, iniciadas em pleno ambiente

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intelectual do Setecentos, permanecem sem esmorecimento


até a atualidade. Alguns filósofos contemporâneos às Luzes,
como Moses Mendelssohn (1729-1786) e Immanuel Kant
(1724-1804), entenderam o Iluminismo – denominado
Aufklärung no idioma alemão – diferentemente da forma
como esse movimento de idéias foi interpretado em algumas
obras filosófico-históricas clássicas do século XX, associando-
o mais a noção de “processo” do que à de “projeto acabado”
(Outram, 1995: 1-2). (CARVALHO, 2008, p. 30-32, passim)

Apesar de as críticas ao Iluminismo como movimento único e


centrado na França terem se iniciado por volta de 1970, ainda hoje
encontramos os livros didáticos se limitando a afirmar que se trata de
um movimento homogêneo.

4.1. Quando e por que as interpretações sobre o Iluminismo


começaram a se modificar?

As modificações sobre as interpretações do Iluminismo


começaram a partir de 1970, no momento em que os historiadores
iniciaram uma nova leitura sobre a historiografia do Iluminismo. Isso
aconteceu devido às pesquisas realizadas no âmbito do estudo das
ideias da sociedade do século XVIII, que tinha o objetivo de
pesquisar como os ideais iluministas foram difundidos e recebidos
pela população de sua época. Ademais, as interpretações e traduções
de termos passaram pelas análises de fontes da época antes de
passarem pelas traduções.

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As consequências dessas alterações foram sentidas pelos


próprios especialistas, que passaram a entender o Iluminismo não
mais como um movimento homogêneo, um bloco único de ideias
iguais, sem ramificações, centrado quase que exclusivamente na
França; agora passava a ser interpretado como um movimento
heterogêneo, com várias ramificações com algumas ideias em
comum, mas longe de serem uniformes.
São exemplos de historiadores que se utilizaram dessa busca
das fontes mais confiáveis para realizar essas modificações no
movimento iluminista: Robert Darton, Dorinda Outram.
Essas reformulações no estudo do Iluminismo, ocorridas no
final do século XX, foram importantes, trazendo muitas
consequências para o mundo acadêmico, como demonstra os
historiadores Flávio Carvalho (2008) e Tereza Kirschner (2009):

A dilatação da área geográfica do Iluminismo foi, na


concepção de Dorinda Outram, um processo decorrente do
revisionismo historiográfico iniciado a partir dos anos 1970.
Nessa época, os historiadores começaram a se dedicar ao
estudo social das idéias, procurando descobrir a maneira
como os conhecimentos de cunho iluminista foram
difundidos e acolhidos pela sociedade. Os pesquisadores
passaram a analisar o impacto desses saberes nas várias
regiões do globo, assim como nas várias camadas sociais
(Outram, 1995: 6-8). Isso suscitou uma série de questões
novas aos historiadores do Iluminismo, extrapolando o
horizonte das Luzes até então deslumbrado por intermédio
dos modelos interpretativos de Cassirer, Hazard e Gay. De

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acordo com o historiador norte-americano Franklin Le Van


Baummer, essas investigações recentes, baseadas em novas
abordagens e em novos problemas, transformaram o
Iluminismo em um “alvo móvel”, permeado por dúvidas,
mudanças de espírito, divisões internas, temporalidades
distintas e por características peculiares, conforme o contexto
dos vários países (Baumer, 1990: 164).

Essa guinada historiográfica desequilibrou, gradualmente, a


coerências interna da síntese Iluminista, até então bastante
aceita entre os historiadores, de modo que a balança da
consciência historiográfica começou a pender em favor da sua
reavaliação. Assim, as pesquisas acerca do Iluminismo, até
então focadas na imagem homogêneo, harmônica, coesa e
unilateral das Luzes, passaram a considerar a pluralidade de
nuances com as quais o ideário iluminista se manifestou nos
diferentes contextos cultural e geográfico. (CARVALHO,
2008, p. 31)

A partir da década de 1970, pesquisadores começaram a dar


maior atenção às diferenças e às tensões existentes no âmbito
do pensamento do século XVIII. Desde então, tem sido
publicado vários estudos sobre as especificidades do
movimento iluminista em diversos contextos culturais. É
significativo o relativo abandono de um tipo de interpretação
que privilegia o contexto francês. O historiador norte-
americano questiona a associação do Iluminismo aos homens
de letras de Paris. (KIRSCHNER, 2009, p. 292)

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4.2. O caso do Iluminismo português

Nesta subseção, focaremos um exemplo claro que, em estudos


futuros mais aprofundados, pode vir a comprovar a existência da
pluralidade de iluminismos: o Iluminismo português, o qual, assim
como o Iluminismo alemão, foi interpretado de forma equivocada.
O Iluminismo português foi um movimento tardio em
relação a outras manifestações iluministas, por causa da
predominância do ensino jesuítico nas universidades e nas escolas,
tendo o tomismo como a base ideológica da educação (equilíbrio
entre razão e fé).
Por isso, havia uma forte resistência por parte de alguns
intelectuais portugueses em relação às novas ideias filosóficas que
estavam surgindo na Europa e penetravam em Portugal no final do
século XVII. Essas ideias eram contrárias à e diferentes da tradição
jesuítica. Além disso, algumas ideias eram consideradas subversivas
pela Igreja Católica e, assim, criticadas pelos intelectuais. A formação
do Iluminismo português foi, portanto, diferente do de outros países,
como a França, em que as ideias racionalistas e da filosofia moderna
já tinham se disseminado em alguns grupos. Conforme Kirschner
(2009):

a filosofia moderna que já circulava na Europa desde fim do


século XVII, ao alcançar Portugal, encontrou uma reação por
parte dos defensores da tradição jurídica e filosófica
fundamentada no tomismo. Enquanto os demais países
europeus se abriam para novas formas de pensar a realidade

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natural e moral, Portugal permaneceu sob o domínio de um


ensino jesuítico avesso a especulações filosóficas estranhas à
tradição. Tudo que pudesse ser considerado ofensivo à fé
católica não encontrava boa acolhida. (KIRSCHNER, 2009, p.
296).

Por isso, o movimento iluminista português começou de uma


maneira significativa tardiamente, somente a partir de 1772, com a
reforma da Universidade de Coimbra, feita pelo Marquês de Pombal.
Kirschner (2009) considera que a reforma oficializou a entrada das
ideias ilustradas em Portugal e tinha como principal objetivo garantir
a educação iluminista para os futuros funcionários régios. Para isso, o
Marquês de Pombal diminuiu o campo de influência da Igreja
Católica na administração do Estado e aumentou o poder
administrativo do rei. Nas palavras de Kirschner:

embora o ambiente intelectual português tenha se renovado a


partir do inicio do século XVIII e o impacto da obra de
Antonio Verney tenha sido importante em pequenos grupos
da sociedade, foi a reforma da Universidade de Coimbra, em
1772, que, por assim dizer, oficializou a entrada das idéias
ilustradas em Portugual. Concebida no âmbito de um projeto
de governo que pretendia fortalecer a autoridade régia e
enfraquecer a interferência da Igreja em assuntos temporais, a
reforma do ensino universitário tinha como objetivo
assegurar uma formação ilustrada para futuros funcionários
régios. (2009, p. 298)

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Entretanto, a reforma não teve um caráter anticatólico,


diferentemente do que ocorreu em outros países europeus em que
foram feitas inúmeras críticas à Instituição católica. Nesses países, os
pensadores consideravam que a Igreja não se utilizava de elementos
racionais para explicar os acontecimentos ocorridos no passado e no
presente. Os pensadores estrangeiros avaliaram os valores da Igreja
como um limitador do conhecimento humano e da razão humana,
dois temas que estavam em voga na época.
Uma das características marcantes do Iluminismo português,
e que difere dos demais movimentos iluministas europeus, é a relação
harmônica entre a razão e fé, ou seja, os intelectuais ligaram e
complementaram duas ideias opostas: a razão moderna e o princípio
da origem. Kirschner (2009) propõe as seguintes hipóteses:

O iluminismo português não adquiriu uma feição anti-


religiosa e Portugal permaneceu fiel à defesa da fé e da
Revelação.

Embora os estatutos da universidade tenham retirado o


ensino da filosofia moral da Faculdade de Teologia, isto não
traduziu uma ruptura com a tradição tomista. Tratava-se
apenas de reconhecer a validade de cada plano naquilo que
lhe era próprio. Tanto no que se refere ao direito natural,
quanto à ética, reconheciam-se os limites do racionalismo.
Ambos necessitavam do apoio, ou do complemente, da
Revelação para suprir a falibilidade da razão humana.

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O Iluminismo em Portugal articulou a razão moderna, a


filosofia experimental e o princípio da origem e do
fundamento divinos do direito natural. A lei era promulgada
diretamente por Deus, e a lei natural, em última análise,
também de natureza divina, consistia naquilo que os homens
podiam acessar por meio da razão e,assim, conhecer o bem.

O princípio sobre o qual se assentava o iluminismo português


– a complementaridade entre fé e razão –, foi defendido
também, sob distintas perspectivas, por filósofos católicos e
protestantes em toda a Europa, e constituiria o núcleo da
apologética cristão.

A base do tomismo – a harmonia entre a razão e a fé –


permaneceu intocada. Uma peculiar articulação das novas
idéias à antiga tradição caracteriza o iluminismo português.
Questões como a natureza intrinsecamente social do homem,
a necessidade da Revelação para complementar as limitações
da razão humana e a origem e fundamento divinos do direto
natural eram aceitas sem questionamentos em Portugal
setecentista. (KIRSCHNER, 2009, p. 198-299)

Além dessa característica marcante do Iluminismo português,


este movimento também apresentou outros aspectos que divergiam
dos demais movimentos iluministas da época, como o
distanciamento das questões sobre o deísmo, feita por Voltaire, e o
ceticismo, feita por David Hume, pois os pensadores portugueses
enxergavam falhas existentes nas ideias sobre o deísmo e o ceticismo.
Por isso, em Portugal, esses temas religiosos sobre o deísmo, ateísmo

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e ceticismo não tiveram a mesma repercussão e polêmica que foi


gerada na França, no século XVIII. Para Kirschner (2009):

Em Portugal, o ambiente intelectual da segunda metade do


século XVIII não se caracterizou pela existência de fortes
polêmicas intelectuais como na França. Passadas as reações
provocadas pelas idéias de Antonio Verney e à própria
reforma da universidade, não havia dúvidas, para a maior dos
ilustrados portugueses, quanto à inconsistência das idéias
deístas e da religião natural.

Se o deísmo de Voltaire, o ateísmo de Holbach e de Helvetius,


ou o ceticismo de David Hume forem tomados como
parâmetros do pensamento filosófico europeu do século
XVIII, o panorama intelectual português da segunda metade
do século XVIII parece muito distante das Luzes. Entretanto,
esses autores não poderiam ser considerados representativos
do movimento intelectual europeu com um todo. A crise do
pensamento europeu não foi tão demolidora da tradição.
(KIRSCHNER, 2009, p. 299)

Devido a esses fatores apresentados, não podemos afirmar


que o Iluminismo português teve as suas características iguais aos
outros movimentos iluministas. Como também, não podemos
afirmar que os iluministas portugueses não apresentaram nenhuma
peculiaridade e singularidade em relação aos franceses, pois o
movimento português tinha um objetivo em comum com o
Iluminismo francês, que era a valorização da razão.

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Por fim, com início da Revolução Francesa, em 1789,


recomeçaram a surgir correntes de pensamentos contra o movimento
iluminista, os chamados contra revolucionários, e em Portugal a
presença deles foi mais acentuada, pois vários teóricos da época
associaram, de forma equivocada, o Iluminismo com a Revolução
Francesa. Os teóricos afirmavam que os iluministas, de uma maneira
geral, tinham o conhecimento que a Revolução Francesa aconteceria,
e nada fizeram para “evitar” a Revolução. Com isso, os
contrarrevolucionários criticaram com veemência o Iluminismo e as
suas respectivas ideologias, relacionando-as ao movimento jacobino
francês. E também, os contrarrevolucionários consideravam que os
adeptos da Revolução Francesa, os deístas, dentre outros, seriam
traidores que alvejavam tomar o trono português. Esse movimento
anti-iluminista é relatado por Kirschner (2009):

A eclosão da Revolução Francesa alteraria esse quadro,


consistindo um fator decisivo para a radicalização dos debates
no ambiente intelectual europeu, ao associar, difusamente, os
filósofos à Revolução. A “tragédia revolucionária” seria uma
prova dos perigos que podiam advir da imprensa filosófica.

O discurso contra-revolucionário suscitou uma


reinterpretação do passado, radicalizou a crítica aos filósofos e
atribuiu-lhes a responsabilidade pelo terror desencadeado
pela revolução. Abade Barruel, chegou a afirmar que a
revolução fora previamente meditada e prevista pelos
“filósofos” e ficou conhecido como teórico do “complô”.
Embora reducionista e superficial, essa representação que

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associou o Iluminismo à Revolução foi poderosa e


conveniente. Não é o caso de apontar aqui as incorreções de
interpretações e simplificações nelas contidas. O que importa
é que ela foi vivenciada pela maior parte das elites europeias
como uma verdade praticamente indiscutível. Os adeptos da
Revolução, por sua vez, também reinterpretaram o passado, e
nele os filósofos ocuparam um lugar positivo de destaque.
Ambas as representações tiveram seus porta-vozes na
República das letras, repercutiram em tendências
historiográficas e produziram efeitos sobre as práticas
políticas no fim do século XVIII e ao longo do século XIX.

Para os contra-revolucionários em geral, o termo “filósofo”


passou a ser identificado com jacobino, o que contribuiu para
a elaboração de uma das correntes historiográficas sobre as
causas da Revolução.

A idéia do Iluminismo como causa da revolução teve ampla


acolhida em Portugal. Voltaire, Rousseau, Raynal e Mably
foram considerados autores perigosos e a circulação de suas
obras foi proibida.

Deístas, defensores da religião natural e, agora, simpatizantes


da Revolução, formavam uma legião de traidores que
ameaçavam o trono e o altar. A palavra filósofo sinalizava
perigo. (KIRSCHNER, 2009, p. 300-301)

A partir do movimento anti-iluminista e do movimento que


igualava o Iluminismo com a Revolução Francesa do final do século
XVIII e início do século XIX, teremos novas formas de historiografia
e de administração política no decorrer do século XIX e XX, como
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Kirschner (2009) relatou. E umas das consequências trazidas pela


associação do Iluminismo com a Revolução Francesa foi a
homogeneidade do movimento iluminista, centrado na França e nos
filósofos franceses, ou seja, o assunto que permeou esse trabalho
nasceu dessa relação entre o Iluminismo e a Revolução Francesa.

5. Conclusão

Com esse trabalho tentamos desmistificar a existência de um


conceito singular do Iluminismo, cujo foco está voltado para a
França e para os pensadores franceses. Para isso, utilizamos do
Iluminismo português com o objetivo de demonstrar que existiu
mais tipo de movimento intelectual do século XIII.
Além disso, fizemos uma análise do conteúdo do Iluminismo
em um livro didático para termos uma noção de como o tema é
ensinado nas salas de aula. Deparamo-nos com um conteúdo falho e
limitado para a verdadeira contribuição do conhecimento do século
XVIII e as suas manifestações intelectuais para o século XXI. Essa
limitação também foi percebida em duas questões de vestibular.
Depois da análise do ensino do Iluminismo no ensino médio,
tentamos definir o que foi o movimento iluminista e as suas
consequências para o mundo. Mesmo sabendo que existiu mais de
um tipo de Iluminismo, fizemos um apanhado geral das
características gerais presentes nos movimentos intelectuais,
principalmente no francês e no português.

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Esperamos que, com esse trabalho, que de modo algum se


encerra aqui, ter mostrado que o Iluminismo é um tema
extremamente rico e que deve ser tratado com mais profundidade
nas escolas e no material didático.
Para o futuro, pretendemos ampliar ainda mais esse debate,
levando-o, na prática, para a sala de aula e, quem sabe, despertar nos
alunos o gosto pelo estudo dos movimentos iluministas.

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