Artigo Enchentes
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A situação dramática que vivemos no Rio Grande do Sul foi amplamente negligenciada em todas
as esferas dos governos, conforme explica o ambientalista Heverton Lacerda. “Está evidente que sim,
tanto o Estado quanto as administrações dos municípios atingidos não trataram do assunto com a
seriedade que as comunidades merecem e que a situação exige, subestimando o conhecimento
científico e os alertas climáticos (mais amplos que os meteorológicos)”, pontua o pesquisador. Para
ele, “há um despreparo muito grande de nossos governantes do Estado e dos municípios. Eles estão
perdidos e não sabem como agir. Estão aprisionados em uma bolha opaca, pressionados pelo modelo
socioeconômico vigente e mau assessorados para compreender a realidade climática que se impõe”,
sinaliza.
Não é de hoje que os cientistas e ambientalistas soam o alarme da mudança climática. “Em
1974, José Lutzemberger já alertava que, em suas palavras, ‘à medida que progride a desnudação das
montanhas, das cabeceiras e margens dos rios, à medida que desaparecem os últimos banhados, outros
grandes moderadores do ciclo hídrico, a paisagem mais e mais se aproxima da situação de deserto, os
rios se tornam mais barrentos e mais irregulares. Onde havia um fluxo regular, alternam-se então
estiagens e inundações catastróficas’”, relembra Lacerda, em entrevista concedida por e-mail
ao Instituto Humanitas Unisinos - IHU.
Heverton Lacerda também explica que a degradação de áreas, que deveriam ser de proteção
ambiental, agrava os danos das enchentes. “As planícies de inundações dos rios estão desmatadas e
urbanizadas. As matas ciliares, que desempenham importantes funções junto aos cursos d’água,
protegendo-os, foram dizimadas ao longo das últimas décadas. Prédios, casas e lavouras tomaram seus
lugares, além de se instalarem em encostas de morros” assinala o pesquisador. Desse modo, “rios mais
rasos, assoreados pela terra pobre e sem matas ciliares, não conseguem deter, em seus cursos e
margens, volumes um pouco mais expressivos de água da chuva. Com isso, as águas se alastram ainda
mais”, complementa.
Lacerda ainda destaca que, ancorado na promessa de um “desenvolvimento”, o Rio Grande do
Sul segue preso a uma “concentração de riqueza econômica e destruição ambiental, em uma lógica de
privatização de lucros e socialização de danos. Isso tem origem na correlação de forças que conduzem
as políticas públicas do Estado, por hora a favor de interesses econômicos de pequenos grupos
economicamente empoderados”, expõe.
Além de ações imediatas para mitigar os efeitos da crise climática, devemos eliminar a queima de
combustíveis fósseis, propõe o jornalista, pois, segundo ele “o que está acontecendo no Rio Grande do
Sul pode ser apenas o começo de uma situação que tende a aumentar muito. Isso pode parecer
alarmista para alguns, mas o que acontece hoje já era previsível, e isso está fartamente documentado. É
preciso agir com responsabilidade ecológica e precaução ambiental”, sinaliza.