Análise Amiental e Gestão Do Terrítorio
Análise Amiental e Gestão Do Terrítorio
Análise Amiental e Gestão Do Terrítorio
e gestão do território
contribuições teórico-metodológicas
Organizadores
Fabio Giusti Azevedo de Britto
Letícia de Carvalho Giannella
Rogério dos Santos Seabra
Ministério do Planejamento, Desenvolvimento e Gestão
Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE
Escola Nacional de Ciências Estatísticas
Análise ambiental
e gestão do território
contribuições teórico-metodológicas
Organizadores
Fabio Giusti Azevedo de Britto
Letícia de Carvalho Giannella
Rogério dos Santos Seabra
Rio de Janeiro
2018
Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE
Av. Franklin Roosevelt, 166 - Centro - 20021-120 - Rio de Janeiro, RJ - Brasil
ISBN 978-85-240-4470-0
© IBGE. 2018
Capa
Natália Brunnet
Gerência de Editoração/Centro de Documentação
e Disseminação de Informações - CDDI
Inclui bibliografia.
ISBN 978-85-240-4470-0
CDU 504
GEO
Impresso no Brasil/Printed in Brazil
Sumário
Apresentação
07
Prefácio
09
6
Considerações sobre a questão
da mineração na reorganização do
território em Canaã dos Carajás
179
Raphael Villela Almeida & Fabio Giusti Azevedo de Britto
9
Estudo de impermeabilização pelo processo
de urbanização das bacias da região
hidrográfica da Baía de Guanabara, RJ
297
Roberta de Oliveira Egidio & Luciana Mara Temponi de Oliveira
Sobre os autores
329
Apresentação
Prefácio 11
Em O consumo brasileiro de agrotóxicos sob análise da curva ambien-
tal de Kuznets, Brito e Soares avaliam a hipótese da CKA (Curva Ambiental de
Kuznets), com base na proposição teórica de “paraísos da poluição”. A CKA
determina que a pressão sobre o meio ambiente varia conforme o seu de-
senvolvimento, sendo esta muito maior no início do processo e inversamente
proporcional ao até um determinado ponto, onde há uma inflexão, e partir
daí a pressão diminui em função de diversos fatores. Os autores analisam da-
dos secundários do consumo, importação e exportação de países periféricos
e desenvolvidos e fazem uma comparação de ações de regulação entre dois
países, o caso brasileiro versus o americano, cujo propósito foi identificar a
fragilidade institucional do Brasil frente ao padrão regulatório dos agrotóxicos
nos Estados Unidos. Um dos principais resultados deste artigo, foi o exercício
de cálculo de quanto o Brasil deveria investir para ter, proporcionalmente,
os mesmos custos norte-americanos com o controle e fiscalização de agro-
tóxicos. Os autores concluem que o Brasil deveria ter um custo total com o
controle e registro de agrotóxicos no valor de 5,8% do Produto Interno Bruto
- PIB agropecuário.
O texto de Anache e Beser de Deus, Amazônia: análise do desmata-
mento à luz do planejamento regional a partir da década de 1950, considera
que “A perda de cobertura vegetal original e biodiversidade da floresta ama-
zônica, causadas pelo avanço do desmatamento, representa um dos grandes
problemas ambientais a ser enfrentado por diferentes esferas governamen-
tais e sociedade civil no século XXI”. Com esta preocupação, o texto tem como
objetivo analisar políticas públicas e dinâmicas de ocupação e uso da terra,
responsáveis pelos processos de desmatamento na Amazônia Legal desde a
década de 1950. Analisa também em um período mais recente, 2002-2011,
fatores na área denominada arco do desmatamento. A partir dessas análises
foi possível verificar a ligação entre as condições pretéritas de ocupação e uso
da terra na Amazônia e o desenvolvimento contemporâneo e demonstrar a
importância de se considerar políticas públicas que priorizem o uso menos
agressivo dos recursos naturais, o ordenamento territorial e o uso sustentável
dos recursos naturais.
Prefácio 13
O texto de Egidio e Oliveira, Estudo de impermeabilização pelo pro-
cesso de urbanização das bacias da região hidrográfica da Baía de Guana-
bara, RJ, estima a taxa de impermeabilidade das 14 bacias hidrográficas ao
entorno da Baía de Guanabara, RJ, ilhas e zonas de drenagem. Os autores uti-
lizaram mapas dos setores censitários, população, vegetação, uso da terra e
bacias hidrográficas. Esses setores foram agrupados por bacia hidrográfica.
“Os resultados mostram que as áreas que apresentaram as maiores taxas de
impermeabilização estão localizadas na porção oeste da Baía, onde a concen-
tração populacional é maior”. O método proposto é uma ferramenta para
inferência sobre áreas mais críticas sob o aspecto de impermeabilizações, po-
dendo ser utilizada na gestão de risco de enchentes.
Luiz Goes*
Kaizô Beltrão**
* Graduado em Engenharia Florestal (1970) e mestre em Ciências Ambientais e Florestais (1995) pela Uni-
versidade Federal Rural do Rio de Janeiro - UFRRJ. Atualmente é pesquisador da SCIENCE: Sociedade para
o Desenvolvimento da Pesquisa Científica. Possui experiência na área de planejamento urbano e regional,
atuando principalmente nos seguintes temas: pesquisa socioeconômica, gestão ambiental, desenvolvimento
sustentável e estatísticas ambientais.
** Graduado em Engenharia Mecânica pelo Instituto Tecnológico de Aeronáutica - ITA (1974), mestre em Ma-
temáticaAplicada pelo Instituto de Matemática Pura e Aplicada - IMPA (1977) e doutor em Estatística pela Prin-
cetonUniversity (1981). Atualmente é pesquisador/professor da Escola Brasileira de Administração Pública e
de Empresas - Ebape, da Fundação Getulio Vargas - FGV-RJ. Possui experiência na área de população e políticas
públicas, com ênfase em previdência social e educação, atuando principalmente nos seguintes temas: demo-
grafia, diferenciais por sexo/raça, condições de saúde, demografia (modelagem estatística) e mortalidade.
Introdução
O propósito deste capítulo é apresentar aos leitores um breve his-
tórico da análise ambiental no Brasil e, principalmente, discutir algumas
questões relacionadas à atuação e à formação do analista ambiental.
Buscar-se-á discutir as atividades desenvolvidas pelos analistas ambien-
tais, suas áreas de atuação, formação básica necessária, importância de
seu trabalho e as organizações que os empregam. As seguintes questões
nortearam a condução deste texto: Quem é o Analista Ambiental? O que
faz o Analista Ambiental? Que funções desempenha? Que profissionais po-
dem trabalhar com Análise Ambiental? Que conhecimentos básicos pre-
cisa ter um Analista Ambiental para exercer suas funções? O que distingue
o Analista Ambiental de outros profissionais que trabalham com o meio
ambiente? Onde pode trabalhar um Analista Ambiental? Qual seu papel
e importância nas organizações públicas (governamentais), privadas e do
terceiro setor - Organizações Não-Governamentais (ONGs), Organizações
da Sociedade Civil de Interesse Público (OSCIPs), fundações e institutos
empresariais etc.? Que posturas deve adotar o Analista Ambiental em re-
* O presente texto foi finalizado pelo autor em 09/11/2007 e encontrava-se inédito desde então.
lação ao ambiente como um todo? Embora quase nunca explicitados, es-
tes questionamentos permeiam todo o capítulo. Mais do que responder
a estas questões, procurou-se discuti-las, entender suas consequências e
implicações e englobar princípios, conceitos e considerações gerais sobre o
trabalho do analista ambiental.
Alguns dos temas abordados podem, à primeira vista, parecer margi-
nais, extemporâneos ou desconexos à Análise Ambiental. Estes foram in-
cluídos com o objetivo de apresentar um panorama amplo, embora ainda
incompleto, das atividades associadas à Análise Ambiental.
Em nenhum momento pretende-se esgotar estes assuntos nem apre-
sentar a “versão definitiva e final” para os mesmos, mas suscitar no leitor o in-
teresse por estes temas e o desejo de aprofundar-se nos mesmos, procurando
outros autores e fontes de informação, com outras ideias e visões, algumas
delas complementares e outras divergentes àquelas aqui apresentadas.
A Análise Ambiental não é algo novo, mas sua importância crescente nos
últimos tempos tem suscitado interessantes discussões de conceitos e méto-
dos a serem a ela aplicados. Assim, o presente texto, mais do que ensinar, con-
ceituar ou “doutrinar” os leitores, procura suscitar-lhes o senso crítico, para
que possam criar ou adaptar seus próprios conceitos e métodos, a partir dos
princípios e fundamentos da análise ambiental.
Breve histórico
1 Organismos capazes de realizar a fotossíntese, reação bioquímica na qual gás carbônico (CO ) e água (H O),
2 2
em presença de luz solar, reagem para produzir glicose (C6H12O6) e gás oxigênio (O2). A fotossíntese é realizada
por vegetais e alguns microrganismos, entre eles muitos grupos de bactérias. Foram microrganismos simila-
res a bactérias os primeiros fotossintetizantes da Terra.
2 Atmosfera rica em compostos gasosos reduzidos, em contraponto à atmosfera terrestre atual, marcada
pela presença de oxigênio (O2) e ozônio (O3), gases com forte caráter oxidante.
3 Seres que sobrevivem na ausência do gás oxigênio (O ), realizando a respiração anaeróbica. Para a maioria
2
deles o O2 é tóxico.
Primórdios da humanidade
No contexto do que foi discutido no item anterior, podemos conside-
rar que desde sempre a atividade humana gerou impactos sobre o ambiente,
muitos dos quais nocivos segundo os critérios atuais. Em tempos pré-históri-
cos, quando ainda vivíamos em cavernas e aldeias, fomos responsáveis, por
exemplo, pela extinção de um grande número de espécies animais e vegetais,
4 Populações aborígenes da América, Europa, Oceania e Madagascar são consideradas por alguns
autores como provavelmente responsáveis pelo desaparecimento de boa parte da chamada megafauna
(conjunto de grandes mamíferos e aves não voadoras) que habitava essas regiões há cerca de 10.000 anos
(DIAMOND, 2005; GALETTI, 2005).
5 Equilíbrio é aqui entendido como sustentabilidade, a médio e longo prazos, no uso dos recursos naturais
(energia e materiais).
6 Em 2012, ocorreu novamente na cidade do Rio de Janeiro a Conferência das Nações Unidas sobre Desenvol-
vimento Sustentável, Rio+20. Um dos seus legados de sucesso foi o compromisso assumido por prefeitos das
maiores cidades do mundo de reduzir as emissões de gases de efeito estufa em 12% até 2016, e em 1,3 bilhão
de toneladas até 2030. Essa definição saiu da Cúpula dos Prefeitos, formada pelos prefeitos integrantes do
grupo C40, presidido pelo prefeito de Nova York, e que reuniu 59 das maiores cidades do mundo, entre elas,
São Paulo, Rio de Janeiro e Curitiba (NOTA da Revisora).
7 Movimento social, oriundo dos países mais industrializados, que surge em resposta à crise ambiental cau-
sada pelo crescimento da população humana, superexploração dos recursos naturais, degradação ambiental
(poluição), consumismo e desperdício que caracterizam as sociedades industriais modernas. Além das ques-
tões puramente “ambientais”, o ambientalismo se preocupa também com as sociais, propondo uma socieda-
de mais solidária, menos competitiva, menos consumista, e com melhor repartição das riquezas produzidas
e qualidade de vida. Os ambientalistas estão entre os primeiros a incorporar o Desenvolvimento Sustentável
como novo paradigma de desenvolvimento.
8 Tais como hidrelétricas (Sobradinho foi a primeira), estradas federais, complexos industriais, refinarias, etc.
9 No Rio de Janeiro, a FEEMA, a SERLA (Superintendência Estadual de Rios e Lagoas) e o IEF (Instituto Estadual
de Florestas) estão extintos e foram reunidos no Instituto Estadual do Ambiente (INEA), criado por meio da
Lei nº 5.101, de 4 de outubro de 2007, com a missão de proteger, conservar e recuperar o meio ambiente,
promovendo o desenvolvimento sustentável (NOTA da Revisora).
10 A transversalidade, na Educação, é entendida como a forma de organizar o trabalho didático na qual
alguns temas são integrados nas áreas convencionais (Matemática, Português, História, etc.) de modo a esta-
rem presentes em todas elas. A transversalidade procura instituir, na prática educativa, uma analogia entre
aprender conhecimentos teóricos sobre a realidade e as questões da vida real (aprender na realidade e da
realidade) (MENEZES; SANTOS, 2002).
Senso crítico
O analista tem de ser capaz de avaliar criticamente os conceitos e prá-
ticas relacionados ao meio ambiente. Por exemplo, entender as origens, al-
cance, implicações e limitações de termos e conceitos, como energia limpa
ou desenvolvimento verde, muito difundidos nos últimos tempos. Não há, na
prática, energia limpa ou desenvolvimento verde, ou seja, que não causem
impactos ambientais. Estes conceitos são sempre relativos e, desta forma, de-
vem ser compreendidos pelo profissional de análise ambiental.
Assim, o gás natural, considerado por muitos uma fonte energética
“limpa”, o é apenas quando comparado com outros combustíveis fósseis,
como o carvão ou o petróleo, pois, por unidade de energia gerada, emite me-
Referências
ABREU, M. A. A cidade, a montanha e a floresta. In: _____. Natureza e Socie-
dade no Rio de Janeiro. Rio de Janeiro, Secretaria Municipal de Cultura, Tu-
rismo e Esportes, 1992, p. 54-103.
ALMEIDA, J. R. et al. Política e Planejamento Ambiental. Rio de Janeiro, Editora
Thex, 2004.
BRASIL. Lei 11.516 de 28 de agosto de 2007. Dispõe sobre a criação do Insti-
tuto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade e altera a Lei nº 7.735 e
dá outras providências. Brasília, DF, 28 ago. 2007. Disponível em: <Lei 11.516
de 28 de agosto de 2007>. Acesso: 07 jul. 2017.
CASTRI, F. di. Ecologia: gênese de uma ciência do homem e da natureza. Cor-
reio da Unesco, Rio de Janeiro, n. 9, p. 6-11, 1981.
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Departamento de Recursos Naturais, 1966.
COELHO NETTO, A. L. O geoecossistema da Floresta da Tijuca. In: ABREU, M.
A. Natureza e Sociedade no Rio de Janeiro. Rio de Janeiro, Secretaria Municipal
de Cultura, Turismo e Esportes, p. 104-142, 1992.
COMITÊ NACIONAL DE ORGANIZAÇÃO DA RIO+20. Governos: Alguns compro-
missos assumidos durante a Rio+20. 03 jul. 2012. Disponível em: <http://www.
rio20.gov.br/sala_de_imprensa/noticias-nacionais1/governos-alguns-com-
promissos-assumidos-durante-a-rio-20.html>. Acesso: 07 jul. 2017.
Introdução
Com a industrialização o capitalismo se estabelece plenamente e modi-
fica intensamente a forma como a natureza é vista e utilizada (HARVEY, 2007).
O que se observa nesse modo de produção é que a natureza passa a integrar
os meios de produção e o indivíduo não se identifica mais como natural, as-
sumindo uma postura superior ao meio ambiente, o qual deve ser dominado
e gerido (SANTOS, 1996). Visto isso, percebe-se que a relação que o homem
tem com a natureza é de dominação, na qual esse meio ambiente deve ser
administrado e explorado de acordo com as necessidades e as demandas do
capital, priorizando os seus interesses individuas (HARVEY, 2007). Assim ainda
segundo esse autor com a consolidação do modelo capitalista de desenvol-
vimento econômico a sociedade passa a comercializar e a monetizar o seu
trabalho vindo da sua força física, dos meios de produção e da natureza.
* Este artigo é parte da monografia da autora desenvolvida como pré-requisito para a obtenção do título de
1 Entre os anos de 1967 e 1973, o Brasil atingiu taxas médias de crescimento muito significativas e nunca
vistas anteriormente, que foram resultado em parte da política econômica implementada sobretudo sob a
direção do Ministro da Fazenda Antônio Delfim Neto, assim como de um cenário econômico internacional
muito favorável. Essa época ficou conhecida como o “milagre econômico brasileiro”, uma conotação usada
para as fases de intenso crescimento econômico de alguns países. Esse período fez parte da ditadura militar
que teve seu inicio em 1964 e terminou em 1985. (FUNDAÇÃO GETÚLIO VARGAS).
Dez anos após a Rio+10 foi realizada a Rio+20 na cidade do Rio de Janeiro
que teve por objetivo renovar o compromisso político com o desenvolvimento
sustentável através da verificação dos saltos e dos lapsos na realização das de-
cisões filiadas pelas principais cúpulas sobre o assunto (MINISTÉRIO DA EDU-
CAÇÃO, s/a). A Rio+20 foi marcada por pautas a respeito da economia verde e
da estrutura institucional para o desenvolvimento sustentável. Assim Plácido
e Guimarães (2013) asseguram que
com isso, pode-se enfatizar, por exemplo, que a Rio +20 esteve pautada
na permanência de uma economia mercantil, ainda que “pintada de
verde”, numa crença no milagre da tecnologia dissociada dos fins que
lhe dão vida, numa visão da política que ignora seu caráter necessaria-
mente contraditório e, portanto, conflitivo, como faz o documento em
apreço, e que não altera as estruturas das relações sociais de poder que
tentam dar sustentação ao insustentável mundo atual. (p. 2)
Ramos (2001) aponta que a educação ambiental nasceu como uma das
táticas do corpo social para fazer vista aos problemas ambientais que foram
tidos como advertência à qualidade e à vida no planeta. Ainda de acordo com
essa autora o reconhecimento mundial do aumento das atividades que atuam
O que mais uma vez se perde nessa corrente é o caráter político dos
problemas ambientais. A tecnologia e os mecanismos “verde” criados não são
capazes de mudar a sociedade porque continuam a servir à lógica do mercado
2 Vide a recente venda da empresa de laticíneos Verde Campo para a Coca Cola.
3 Quanto à Educação Ambiental Informal, a principal base legal na conjuntura do Licenciamento Ambiental
é a Instrução Normativa do Ibama nº 02, de 27 de março de 2012 que determina os fundamentos técnicos
para programas de educação ambiental postos como medidas mitigadoras ou compensatórias em realização
às condicionantes das licenças ambientais expedidas pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recur-
sos Naturais Renováveis – IBAMA (MINISTÉRIO DO MEIO AMBIENTE). Os Projetos de Educação Ambiental são
definidos no licenciamento ambiental de atividades com potencial poluidor, conforme disserta a Política de
Educação Ambiental nas Leis n 9.795/99 e n 4.281/2002.
Considerações finais
O artigo procurou trazer uma discussão que está presente em alguns
campos do conhecimento acadêmico e algumas práticas que envolvem a edu-
cação ambiental. Nosso objetivo aqui esteve em apresentar tal discussão a
fim de levantar questionamentos a respeito da educação ambiental que é ma-
joritariamente aprendida e realizada pelos profissionais que atuam na área.
Desta forma, percorremos um caminho metodológico, para a redação
do artigo, que parte das primeiras discussões sobre o meio ambiente cujo ob-
jetivo estava em encontrar soluções para reverter os primeiros sinais de esgo-
tamento da natureza. Tratava-se então de uma perspectiva que possibilitava
a reprodução do capital desde um modelo de desenvolvimento geografica-
mente desigual à medida que se fundava na produção de novas tecnologias
pelos países centrais e sua transferência, sob termos bastante desiguais para
os países periféricos, então chamados de subdesenvolvidos.
Esperamos que o artigo tenha evidenciado que, apesar de diversos
encontros internacionais terem sido realizados e diversos marcos legais su-
postamente emancipatórios na compreensão dos problemas como socioam-
bientais, com o reconhecimento de que muito das adversidades ambientais
são provindas do modelo de desenvolvimento capitalista, etc, terem sido ela-
borados desde então, os princípios que nortearam as primeiras discussões so-
bre a problemática ambiental permanecem regendo as práticas da sociedade
neste campo. Recorrentemente essa visão mais conservadora é confrontada,
surgem questionamentos e novos materiais produzidos num viés mais crítico.
Ou seja, apesar do desenvolvimento de um arsenal conceitual e discursivo crí-
tico e transformador, existe um fosso entre as diferentes matizes/tendências
que por vezes se misturam, possuindo um discurso crítico e uma prática con-
servadora, por isso, é tão importante identificar os atores sociais que estão
envolvidos com a elaboração desses documentos e os atores que realmente
os colocam em prática, o que se perde nesse caminho e por quê? Geralmente,
são agentes distintos que escrevem as normas e as colocam em prática.
Referências bibliográficas
BRASIL. Política Nacional de Meio Ambiente LEI No 6.938, DE 31 DE AGOSTO
DE 1981. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L6938.
htm>. Acessado em: Agosto/2016.
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DE 1999. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L9795.
htm>. Acessado em: Agosto/2016.
BRASIL. Carta de Belgrado, 1975. Disponível em: <http://www.mma.gov.br/
port/sdi/ea/deds/pdfs/crt_belgrado.pdf>. Acessado em: Agosto/2016.
BRASIL. Tratado de Educação Ambiental para Sociedades Sustentáveis e Res-
ponsabilidade Global, 1992. Disponível em: <http://www.mma.gov.br/port/
sdi/ea/deds/pdfs/trat_ea.pdf>. Acessado em: Agosto/2016.
Introdução
A ONU dedica os primeiros trinta anos do século XXI a duas iniciativas vi-
sando parcerias globais: os Objetivos de Desenvolvimento do Milênio – ODM,
operacionalizados nos primeiros quinze anos, e os Objetivos de Desenvolvi-
mento Sustentável – ODS com a missão de sucedê-lo e a serem implementa-
dos até 2030. Esse conjunto de ações somam vinte e cinco objetivos.
Os ODM foram considerados pelo ex-secretário-geral da ONU,
Ban Ki-Moon, o mais bem-sucedido esforço de combate à pobreza. Eles surgem
no documento Road Map towards the implementation of the United Nations
Millennium Declaration (UN, 2001) aprovado pela 56a Sessão da Assembleia
das Nações Unidas, em 2001. Esses objetivos definiram, pela primeira vez, um
conjunto integrado de metas quantitativas com prazos especificados, numa
tentativa de dar sentido operacional para algumas das dimensões básicas do
desenvolvimento humano. Para acompanhar os 8 ODM foram estabelecidas
* Os autores agradecem a Sônia Maria M. Oliveira pela leitura e comentários e a estagiária Andrine Mendonça
1 A discussão sobre os indicadores ainda não foi finalizada. Mas já há consenso em 232 deles (Anexo 4, UN -
Statistical Commission 2016). No entanto, como alguns indicadores podem se repetir numa mesma meta ou
em metas diferentes, o total de indicadores de acompanhamento pode chegar, portanto, a 244.
2 Schweinfest fez este comentário, através de videoconferência, quando de sua participação na Reunião
3 Tomamos David Hulme como autor de referência para a história dos ODM em especial Hulme (2007), Hul-
me (2009), Hulme e Scott (2010) e Hulme (2013). Para uma visão de um dos membros da equipe que elaborou
os ODM que é, em boa medida, complementar a de Hulme, vide Vandemoortele 2011.
4 A Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico é um órgão internacional de 34 países
que aceitam os princípios da democracia representativa e da economia de livre mercado. A maioria dos
membros da OECD é composta por economias com um elevado PIB per capita e IDH e são considerados
países desenvolvidos.
A lista inicial dos ODM sofreu duas modificações desde sua formulação
no Road Map6. Em 2007, em função das resoluções do World Summit de 2005
(UN, 2005) e das recomendações do Secretário-Geral, quatro novas metas fo-
ram incluídas. Em 2008, a linha de pobreza foi revista, passando de US$ 1,00/dia
em paridade de poder de compra (ppp) para US$ 1,25 ppp em função de estu-
dos feitos pelo Banco Mundial (RAVILLION, CHEN & SANGRAULA, 2008).
O arcabouço dos ODM foi muito importante, pois se “definiu pela pri-
meira vez um conjunto integrado de metas quantitativas com prazos especifi-
cados numa tentativa de dar sentido operacional para algumas das dimensões
básicas do desenvolvimento humano” (UN System Task team, 2012: 5). Muitos
países em desenvolvimento desenharam estratégias nacionais de desenvolvi-
mento explicitamente orientadas para atingir as metas dos ODM e colocaram
esses objetivos entre suas prioridades nacionais. Os ODM fortaleceram a ca-
pacidade de produção de estatísticas dos países em desenvolvimento que,
para tanto, contaram com apoio dos países ricos.
O Lancet and London International Development Centre Commission
(2010) identificou quatro importantes contribuições positivas dos ODM: es-
timulariam o consenso mundial global; forneceriam foco para a defesa da
ajuda aos países mais pobres; aprimorariam a focalização e o fluxo de ajuda
5 Para ver a estrutura completa dos ODM com objetivos, metas e indicadores acesse: <http://mdgs.un.org/
unsd/mdg/Resources/Attach/Indicators/OfficialList2008.pdf>.
6 Vide <http://mdgs.un.org/unsd/mdg/Host.aspx?Content=Indicators/About.htm>.
7 UN System Task Team (2012), Higgens (2013), Karver, Kenny e Sumner (2012) dentre outros.
8 Vide Carvalho e Barcellos. In Sustentabilidade em Debate v.5, n.3; disponível em: <http://periodicos.unb.br/
index.php/sust/article/viewFile/11176/8976>.
9 Vide UN System Task Team (2012), Higgens (2013), Karver, Kenny e Sumner (2012) Lancet and London Inter-
11 Um balanço recente dos ODM está no Press Kit for the Sustainable Development Summit 2015: Time for
Global Action for People and Planet frequently asked questions (UN, 2015d). Nesta publicação se menciona o
que foi e o que não foi alcançado pelos ODM, mas sem fazer menção às metas fixadas. Com isto, uma leitura
menos atenta, pode deduzir que várias metas foram alcançadas.
12 O ano-base estipulado pela ONU é 2000. Entretanto, por coincidir com a realização do Censo Demográfico
15 Para Lancet and London International Development Centre Commission (2010) os ODS deveriam ser mais
volvimento Sustentável (Rio+20). Este grupo de trabalho com 30 membros ficou encarregado, pela Assem-
bleia Geral das Nações Unidas, de preparar uma proposta sobre os ODS.
17 Uma tradução livre, mas apropriada ao contexto, de gatekeeper seria “leão de chácara”.
18 Por questão de espaço, não é possível relacionar as 169 metas. Em 2015 houve proposta de modificação
da redação de algumas metas (UN, 2015c), mas não chegou a ser implementada.
19 Considerou-se que toda meta que menciona “medidas urgentes” tem implicitamente um prazo, no mí-
Tabela 1
Quantidade e percentual de metas com e sem prazo de cumprimento,
segundo ODS
Metas
Fonte: Elaborada pelos autores com base nas metas dos Objetivos de Desenvolvimento Susten-
tável do Grupo de Trabalho Aberto (2017).
Tabela 2
Avaliação das metas dos ODS ISSC-ICSU
Classificação %
Total 100,0
Classificação %
Total 100,0
21 Posteriormente esse número foi reduzido para 230 e depois, aumentado para 232 indicadores. As estatís-
proposed-indicators-for-the-post-2015-agenda-2>
23 A rigor foram mais de 70 países, pois um dos questionários foi respondido pelo Secretariado da ONU para
a Comunidade do Pacífico sendo, portanto, uma resposta coletiva de 12 países (Ilhas Fiji, Papua Nova Guiné,
Tonga, Tuvalu etc.). China, África do Sul e Paquistão, países importantes, não responderam ao questionário.
24 O texto da ONU (UN, 2015b) dá poucas informações de como foram consolidadas as respostas. Foram
os institutos de estatística dos países que responderam ao questionário e estes, via de regra (o IBGE é uma
exceção), não possuem uma área de geociências, o que pode ter influenciado na avaliação dos indicadores
da área ambiental.
Relação custo-benefício
Quando se discutem os ODS não se menciona a questão de custos e,
principalmente, a relação custo-benefício. O grupo Consenso de Copenhagen27
tem o mérito de colocar esta questão no debate. Segundo um estudo deste
grupo, os ODS deveriam se concentrar em dezenove metas que têm melhor
relação custo-benefício – cada dólar gasto geraria mais US$ 15 de benefício28
(Quadro 2). Foi elaborada também, uma estimativa do custo da mensuração
25 As redes SDSN (Sustainable Development Solutions Network) são vistas como uma plataforma para pro-
mover e partilhar soluções de desenvolvimento sustentável no âmbito das economias emergentes na ASEAN
(Associação de Nações do Sudeste Asiático).
26 Tradução nossa do original “… we believe 100 to be the maximum number of global indicators on which
“o Ambientalista Cético”. O grupo é apoiado por vários cientistas e pela revista The Economist. Para mais
informações vide <http://www.copenhagenconsensus.com/>.
28 Estudo disponível em <http://www.copenhagenconsensus.com/post-2015-consensus/nobel-laureates-
guide-smarter-global-targets-2030>
Da “erradicação da pobreza” a “não deixar ninguém para trás”: os 25 objetivos da ONU 101
dos ODS, que seria de US$ 254 bilhões contra US$ 28 bilhões dos ODM29.
A maior parte desses recursos seria para financiar Censos Demográficos e pes-
quisas domiciliares no mundo todo (JERVEN, 2014).
Quadro 2
Metas de maior custo-benefício segundo o Consenso de Copenhagen
30 A análise no Prefácio está assinada por Jorge Chedieck, representante residente do Programa das Nações
Unidas para o Desenvolvimento no Brasil. A Apresentação, por Dilma Rousseff na condição de Presidente
da República.
Da “erradicação da pobreza” a “não deixar ninguém para trás”: os 25 objetivos da ONU 103
Há ainda uma prática questionável no Relatório de Acompanhamento -
Brasil (e também no da ONU) em retroceder o ponto inicial da série de dados
à década de 1990, produzindo assim, um efeito estatístico que amplifica os re-
sultados obtidos. A realidade é que ainda persistem profundas desigualdades
no país, em especial, entre os diferentes entes federativos e que a equidade
e a justiça social têm caminhado em ritmo lento. O resultado é favorável aos
ODM, mas está longe de ser robusto e de mostrar evidências fortes e con-
clusivas. Outro ponto é que não há como negar que os ODM fortaleceram a
capacidade de produção de estatísticas nos países em desenvolvimento.
Os ODS têm uma tarefa difícil, substituir os ODM que foram uma ini-
ciativa tida como bem-sucedida. A questão vai além da mera substituição,
pois se pretende ampliar o escopo dos objetivos, incorporando novos te-
mas e ampliando a abrangência dos já existentes. Uma dificuldade a mais
é que, recentemente, o Banco Mundial atualizou a linha de pobreza global
para US$ 1,90. Não há dúvida de que com os ODM se avançou muito, mas
será que com relação aos ODS as metas são realistas e existem indicadores
de acompanhamento viáveis? Este estudo demonstrou que a resposta é
não, em ambos os casos. Observou-se, ainda, que 50,9% das metas dos ODS
não têm prazos estipulados para o seu cumprimento. No caso do ODS que
trata de igualdade de gênero, nenhum prazo foi estipulado para o cumpri-
mento de suas metas.
Ninguém discorda das boas intenções e da importância dos ODS, o que
falta é realismo na elaboração de objetivos, metas e, em especial, ao se de-
finir os indicadores. A discussão ainda está em curso31 e, ao que tudo indica,
só será sacramentada à medida que os países efetivamente derem início ao
processo de produção das estatísticas necessárias ao seu acompanhamento.
Se, por um lado, avançou-se num processo participativo em sua elaboração,
agora contando com os institutos de estatísticas, por outro, há de se registrar
a “inflação” de indicadores já aprovados, o que gera uma enorme demanda
por informações para o acompanhamento.
31 No Brasil a discussão de indicadores para os ODS é liderada pelo IBGE que entre os dias 29 de junho
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Da “erradicação da pobreza” a “não deixar ninguém para trás”: os 25 objetivos da ONU 109
O consumo brasileiro de
4
agrotóxicos sob análise da
curva ambiental de Kuznets
Luís Henriques de Brito
Wagner Lopes Soares
Introdução
O debate acerca do crescimento econômico e o meio ambiente é antigo,
uma vez que nos modelos de crescimento dos economistas clássicos como
Smith, Ricardo e Mill, os recursos naturais já seriam uma limitação para a ex-
pansão da produção, de acordo com Andrade e Romeiro (2011). Décadas mais
tarde, com o surgimento da escola neoclássica, esses fatores produtivos pas-
saram a ser relativizados pela crença de que o progresso tecnológico traria
uma solução. Sobre essa ideia de crescimento econômico e poluição, as pes-
quisas atuais tentam responder se existe ou não um possível trade-off 1 entre
eles e se existe a possibilidade de haver crescimento econômico sem muitos
danos ao meio ambiente. E, nesse contexto, surgiram novos campos de pes-
quisa na ciência econômica.
1 Trade-off ou tradeoff é uma expressão que “se caracteriza em uma ação econômica que visa à resolução de
problema, mas acarreta outro, obrigando uma escolha. Ocorre quando se abre mão de algum bem ou serviço
distinto para se obter outro bem ou serviço distinto.
Tais argumentos de uma possível conciliação entre economia e meio
ambiente ficaram ainda contundentes devido ao sucesso, nas décadas de 70
e 80, na redução de algumas emissões e algumas concentrações de poluen-
tes tais como o dióxido de enxofre, o que levou muitos cientistas a acredita-
rem na trajetória de crescimento econômico com menor nível de emissão de
poluentes (Stern, 2004 apud Carvalho e Almeida, 2010). O conceito de que a
poluição somente reduz quando há aumento de renda, fez surgir “crenças”
como países em desenvolvimento são “muito pobres para serem verdes” –
“too poor to be green” (MARTINEZ-ALIER, 1995). Numa visão extremamente
otimista, lançada sobre algumas evidências empíricas sob a relação entre de-
senvolvimento econômico e poluição, Shafik e Bandyopadhyay (1992), Stern
et al. (1996), Stern (2004), Selden e Song (1994), Lucena (2005) e Arraes et al.
(2006), Beckerman (1992, apud CARVALHO & ALMEIDA, 2010) acreditavam
que para se obter um “meio ambiente decente”, a única forma seria a maioria
dos países se tornarem ricos, ou seja, essa seria a “receita” para se enfrentar
os problemas da poluição.
Novos entendimentos foram aparecendo desde então, como os des-
critos por Rocha, Khan e Lima (2012), que constataram que nos primeiros
estágios do crescimento econômico, a degradação e a poluição são acon-
tecimentos inevitáveis e primordiais para alcançar o desenvolvimento para
depois se obter, com a alta no nível de renda, a melhoria do meio ambiente.
Tal relação baseia-se em evidências empíricas sob muitos poluentes que têm
diminuído seus níveis nos processos específicos, por unidade de produção,
nos países desenvolvidos que implantam rigorosas normas ambientais e que
inovam em tecnologia. E que transformam os processos de produção cada
vez mais limpos. Isso, no entanto, não corrobora com a ideia de que o au-
mento de renda gere melhorias ambientais. Na verdade, trata-se de transfe-
rência da poluição.
Rocha, Khan e Lima (2012) destacam que esse fato é apenas resultado
do “deslocamento das indústrias intensivas em poluição para os países de
renda mais baixa em função dos diferenciais de regulação ambiental”. E é
com base nessa hipótese que nós vamos flertar aqui neste trabalho, quando
avaliaremos o consumo de agrotóxicos no Brasil tendo como referencial te-
órico a Curva de Kuznets Ambiental. Estudamos se houve uma menor pro-
Gráfico 1
Evolução das vendas de agrotóxicos - mundo X Brasil. 2000 - 2010
200,0
(%)
150,0
100,0
50,0
0,0
-50,0
2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010
Brasil 0,0 -8,0 -24,0 24,0 76,0 69,6 56,8 114,8 184,0 162,4 189,6
Mundo 0,00 0,73 -1,66 17,47 41,12 47,25 49,29 67,83 98,46 94,13 96,07
Figura 1
Representação gráfica da CKA, segundo estágios de desenvolvimento
Pressão Ambiental
II
I III
2 Sabe-se que o processo de descolamento não é automático e que estudiosos nesse assunto afirmam
que “(...) a ligação mais forte entre renda e poluição é, de fato, através da resposta induzida de políticas”
(Grossman e Krueger, 1995, pág. 372 – Tradução Própria).
3 PS: phosphorus surplus from synthetic fertilizer per hectare cultivated area/kg. Tradução: Excedente de
Materiais e métodos
No presente estudo nos valemos de duas etapas metodológicas para
avaliar a CKA com base na proposição teórica de “paraísos da poluição” levan-
tada por Borras (1998). A primeira consiste na avaliação de dados secundários,
tanto do consumo como de importação e exportação de países periféricos e
desenvolvidos, a fim de revelar algum comportamento de duplo-padrão des-
ses últimos países. Já na segunda etapa metodológica, realizamos uma com-
paração de ações de regulação entre dois países, o caso brasileiro versus o
americano, cujo propósito foi identificar a fragilidade institucional do Brasil
frente ao padrão regulatório dos agrotóxicos nos EUA. Ou seja, verificar se
as portas realmente estão mais abertas no Brasil do que nos EUA para essas
substâncias perigosas.
Fizemos uso dos dados da FAO/STAT para avaliar as tendências de uso
de agrotóxicos de alguns países, de quatro continentes, tendo em vista a dis-
ponibilidade de informações comparáveis, a saber: Europa, América do Norte,
América do Sul e América Central. Para tal foram escolhidos países desenvol-
Resultados e Discussão
12 12
10 10
8 8
6 6
4 4
2 2
0 0
1998 2000 2002 2004 2006 2008 2010 1998 2000 2002 2004 2006 2008 2010
Nicarágua El Salvador
Suíça Países Baixos Alemanha
Suécia Dinamarca França
Reino Unido Portugal Itália
Fonte: FAO/STAT
Tabela 1
Ranking dos maiores importadores de agrotóxicos do mundo, segundo
substâncias de elevado risco
*Mercury compounds etc. excl. amalgams, Ethylene dichloride, Ethylene dibromide (1,2-dibro-
moethane), HCH (mixed isomers) / Lindane, Aldrin, Chlordane, Heptachlor, DDT, Hexachloroben-
zene, Pentachlorophenol, Salts of Pentachlorophenol (excl 280811), Dinoseb and dinoseb salts,
DNOC and its salts (excl. 290811-290891), Oxirane (ethylene oxide), Dieldrin, Dinoseb acetate,
Binapacryl, Chlorobenzilate, 2,4,5-T and its salts and esters, Parathion & parathion-methyl, Fluo-
roacetamide, monocrotophos & phosphamidon, Chlordimeform, Captafol & methamidoph.
5 Segundo o Dicionário Novo Aurélio, tóxico significa veneno, venenoso ou que encerra veneno.
Brasil
Tipo de Registro EUA
(Anvisa)
Tabela 3
Custos econômicos com regulação de agrotóxicos nos Estados Unidos
Pimentel,
Pimentel Pimentel
Pimentel Steiner 2005;
et al. and
Ações de regulação and Hart, et al., Pimentel
1991a., Greiner,
2001 1995 and Burgess,
1991b 1997
2014
Registro de agrotóxicos, regulação
X
e monitorização do mercado
Campanhas de sensibilização
do público sobre impacto dos
agrotóxicos
Eliminação de agrotóxico vencidos
X
e não utilizados
Segurança do trabalho X
Controle e Monitoramento X
Cultura e/ou Alimentos X X
Água (superficial, subterrânea
X X X X X
e/ou poços)
gado
Animais selvagens X
Indefinido X X X X
Descontaminação de água X X
Pesquisa de instituições públicas
sobre agrotóxicos
Serviços de extensão
Ineficiência econômica X
Colheita X X X
Água
gado X
Leite X
Pescaria X
ANO 1991 2001 1991 2005 1997
Custos Globais
2.372,34 3.451,19 3.203,00 4.229,13 3.751,06
(Milhões/US$ 2013 por Ano)
Fonte: Elaborado pelo autor com resultados encontrados em trabalhos (PIMENTEL ET AL.
1991AB; PIMENTEL AND HART 2001; STEINER ET AL. 1995; PIMENTEL 2005; PIMENTEL AND
BURGESS 2014; PIMENTEL AND GREINER 1997).
Quadro 3
Custo total dos EUA com regulação dos agrotóxicos
Conclusão
A Hipótese da CKA determina que a pressão sobre o meio ambiente
varia conforme o seu desenvolvimento, ao longo de um período, sob um
formato de “U-invertido”, sendo essa pressão muito maior no início até um
6 Considerando que em julho de 2013 (mesma época que foi levantado o consumo brasileiro) tínhamos:
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Introdução
A perda de cobertura vegetal original e biodiversidade da floresta ama-
zônica, causadas pelo avanço do desmatamento, representa um dos grandes
problemas ambientais a ser enfrentado por diferentes esferas governamen-
tais e sociedade civil no século XXI.
Neste contexto, desde a década de 50 o governo federal planejava a
ocupação e uso da Amazônia, com base no desenvolvimento da produção
extrativista, agrícola e pecuária (Lei 1.806/1953), o que trouxe consequên-
cias negativas para o meio ambiente e populações locais. Assim, a esfera
federal implantou a infraestrutura de energia e transportes, bem como
proporcionou a colonização e a redução de impostos para atrair o capi-
tal privado, que investiu principalmente na agropecuária e na mineração,
* Este trabalho foi apresentado na íntegra para obtenção do certificado de Especialização em Análise Am-
Amazônia: análise do desmatamento à luz do planejamento regional a partir da década de 1950 147
Incorporação da Amazônia brasileira na fronteira
econômica nacional
No contexto do avanço da ocupação da Amazônia, acredita-se que o con-
ceito de fronteira possa apoiar a presente reflexão. Podemos conectá-la a um
significado geopolítico, ou seja, é um espaço para o desenvolvimento social e
econômico, proporcionando conexões e redes regionais e mundiais. Sua expan-
são pode ser vista no âmbito do planejamento regional do Estado, onde este
promove a ocupação e expansão campesina, uma forma não capitalista de pro-
dução em busca de terras e subsistência (BECKER, 1988), que posteriormente
se torna funcional, como mão-de-obra barata ao capital de grandes empreen-
dimentos. A expansão da fronteira moderna “impõe assim uma ordem espacial
vinculada a uma prática e uma concepção de espaço global, racional, logística,
de interesses gerais, estratégicos" (BECKER, 1988), representada pela figura do
Estado e agentes privados, contraditórios as práticas e concepção local.
O conceito também pode ser visto como essencialmente o lugar da al-
teridade (MARTINS, 1996), ou seja, um local singular do encontro e conflito de
ideias e culturas diferentes. Este autor possui importância no que tange a di-
ferenciação de ideias sobre a frente de expansão e a frente pioneira. Sucinta-
mente, a primeira corresponde à área ocupada por camponeses, populações
indígenas e posseiros, sendo uma faixa intermediária à fronteira econômica
(MARTINS, 1996; BECKER, 1988; SILVA, 2007). Já a frente pioneira é dominada
por empreendedores, empresários, fazendeiros, que com a propriedade da
terra, tem a possibilidade de expropriar terras e forças de trabalho, visando à
expansão da produção comercial (MARTINS, 1996).
Entre os anos 50 e 80, a Amazônia foi entendida como despovoada, de-
vendo ser ocupada de maneira planejada e produtiva por meio da instalação
da infraestrutura de transportes e energia. Assim, a fronteira é vista como
área a ser incorporada a dita civilização a partir do discurso do vazio demo-
gráfico. O planejamento frisava o desenvolvimento de vias de circulação no
intuito de integrar político-economicamente a região. Destarte, o debate so-
bre a expansão da fronteira na Amazônia se desenvolve em torno de ações
do Estado, que promove condições para apropriação de terras devolutas em
Rondônia e no Mato Grosso pelos atores mais organizados oriundos, princi-
Amazônia: análise do desmatamento à luz do planejamento regional a partir da década de 1950 149
Na década de 70, a política do Estado manteve-se debruçada sobre in-
vestimentos em infra-estruturas para viabilizar o avanço da fronteira agro-
mineral (STELLA, 2009). Por meio do I Plano Nacional de Desenvolvimento
(PND), que perdurou de 1972 a 74, foi implantado o Programa de Integração
Nacional (PIN) como mecanismo financeiro para viabilizar a ocupação e in-
tegração da região ao restante do país. Sua estratégia foi voltada a constru-
ção de estradas, como a BR-319, bem como a continuidade do esfalfamento
das demais anteriormente citadas. Também houve a expansão da fronteira
agrícola e a colonização com migrantes nordestinos, promovida pelo Incra
(MELLO, 2006). Até 1974 foram desenvolvidas a BR-230 (Transamazônica),
que liga o estado do Amazonas até o estado da Paraíba para escoar a produ-
ção oriunda da Amazônia, e a BR-163 que ligaria o estado Pará ao Rio Grande
do Sul (Figura 2).
Cabe destaque também a Zona Franca de Manaus (ZFM). Criada em
1957 e por meio do Decreto-lei 288/1967, ela passou a ser uma área indus-
trial de livre comercio para importação e exportação no interior da Ama-
zônia tendo por objetivo o armazenamento, beneficiamento e comércio de
mercadorias estrangeiras, principalmente eletro-eletrônicos e peças para
veículos, visando principalmente fomentar o mercado interno, notada-
mente o centro-sul.
Já no âmbito do II PND (1975-79) a estratégia foi voltada para expansão
da frente pioneira, optando-se pelo desenvolvimento de grandes empreendi-
mentos, visando à exportação de produtos industrializados e agropecuários,
frente ao cenário mundial de crise do petróleo de 74. A implantação e mo-
dernização de empresas foram viabilizadas pela Superintendência de Desen-
volvimento da Amazônia (SUDAM), que com incentivos fiscais abriu espaço
a empresas como Camargo Corrêa, Goodyear e Volkswagen (MELLO, 2006).
Neste período destaca-se a ampliação do desmatamento por queimadas vi-
sando o desenvolvimento da atividade pecuária, porém, a rápida degradação
das pastagens diminuiu o lucro e o interesse pela atividade (KOHLHEPP, 2002),
principalmente entre 1975 e 80.
Ainda no II PND, houve o desenvolvimento do Programa de Pólos Agro-
pecuários e Agrominerais da Amazônia (Polamazônia), composto por 15 pólos
regionais, tendo como prioridade a produção de energia e a implantação de
1 A siderurgia produzia basicamente ferro-gusa, tendo como principal insumo o carvão vegetal, que oriundo
quase exclusivamente das madeiras florestais extraídas ao longo da ferrovia Carajás, proporcionou a devas-
tação da área entorno da ferrovia.
Amazônia: análise do desmatamento à luz do planejamento regional a partir da década de 1950 151
Figura 2
Ações implementadas entre o período JK e militar voltadas para o
desenvolvimento energético e rodoviário
2 Complexo agroindustrial (CAI) ocorre quando há integração dos setores da agricultura a indústria, que
juntos intervém na elaboração de determinado produto. Os CAIs possuem estruturas de estocagem, trans-
formação, transporte e comercialização (ERTHAL, 2006).
3 Francisco Alves Mendes Filho ou Chico Mendes foi um ambientalista influente em sua época. Figurou no
ambientalismo internacional, ao pôr no centro do debate ambiental as populações tradicionais afetadas por
projetos de desenvolvimento. Foi um dos ideólogos das reservas extrativistas (RESEX), onde uma população
tradicional, que vive na floresta, teria o direito de perpetuar seu modo de vida de coleta sustentável dos
recursos florestais.
4 O G7, Grupo dos sete, era composto pelos seguintes países: Alemanha, Canadá, Estados Unidos, França,
Amazônia: análise do desmatamento à luz do planejamento regional a partir da década de 1950 153
e; a regularização fundiária de 2 milhões de hectares de Reservas Extrativistas
(RESEX), incluindo seus planos de manejo (MMA, s.d.).
Porém, muitas iniciativas não tiveram sua sustentabilidade garantida,
pois, apesar da regularização fundiária de áreas protegidas (unidades de con-
servação e terras indígenas), havia necessidade da implantação de instrumen-
tos de gestão socioeconômica destes territórios. Seria necessário também o
constante acompanhamento no caso dos projetos demonstrativos, com assis-
tência técnica e extensão rural para pequenos produtores.
Por outro lado, o modelo exógeno de desenvolvimento da região foi re-
tomado com o Programa Brasil em Ação, no âmbito do Plano Plurianual – PPA
(1996-1999) e posteriormente no PPA (2000-2003), com o Programa Avança
Brasil. Os projetos voltados para a região envolviam a consolidação de vias
de transporte e geração de energia por hidrelétricas e linhas de transmissão.
Um dos principais objetivos deste período era de possibilitar o escoamento
da produção agropecuária por meio dos modais fluvial e rodoviário. Como
destaca KOHLHEPP (2002) “a via navegável do Madeira (...) foi melhorada com
custos baixos, ganhando importância no transporte, principalmente, da soja
por chatas (...) até Itacoatiara, possibilitando o transporte para o mercado eu-
ropeu por cargueiros”. Desta forma foram reduzidos custos de transporte e
tempo, já que os grãos seguiam majoritariamente até Paranaguá (PR) ou San-
tos (SP), para então serem exportados.
Em suma, na década de 90 as atividades do Estado na região apontaram
contradições entre políticas desenvolvimentistas e os objetivos do Programa
Piloto. Por um lado o Estado impulsionava o crescimento econômico e inte-
gração com mercados e, por outro, devido a pressões nacionais e interna-
cionais de frentes ambientalistas, buscava com o PPG7 o desenvolvimento
regional sustentável, com apoio a comunidades locais (KOHLHEPP, 2002;
PINZÓN RUEDA, 2006). Apesar do corte de grandes projetos de infraestrutura
do governo federal para desenvolvimento econômico da Amazônia, os ante-
riores formaram um importante arcabouço que garantia a continuidade da
exploração dos recursos naturais da região.
5 Unidades de Conservação são espaços com recursos ambientais e características naturais relevantes insti-
tuídas pelo Poder Público, com o objetivo de conservar seus limites de quaisquer atividade que venha causar
impactos ao seu ambiente (BRASIL, 2000).
Amazônia: análise do desmatamento à luz do planejamento regional a partir da década de 1950 155
para agropecuária e o desenvolvimento da mineração. Claramente, estas ati-
vidades não dialogam com a dinâmica socioambiental indígena. Estes utilizam
os recursos da natureza há séculos, com base numa estreita relação sustentá-
vel entre comunidades e meio ambiente, já que dependem deste para subsis-
tência (MACHADO, 2009).
Estatisticamente, as terras indígenas representavam cerca 93 milhões
de hectares no território amazônico ao final da década de 1990, sendo que,
entre as décadas de 1960 e 1990 foram criadas 271 terras indígenas.
Tabela 1
Área (ha) dos estabelecimentos agropecuários na Amazônia Legal
Variação entre
ha/Ano 1970 1980 1995
1995 e 1970
Menos de 10 ha 1 079 527 1 401 590 921 276 -14,66%
10 a menos de 100 ha 5 069 604 9 485 280 12 693 379 150,38%
Menos de 100 ha 6 149 131 10 886 870 13 614 655 121,41%
100 a menos de 1000 ha 14 756 493 22 267 553 31 298 081 112,10%
1000 ha e mais 30 349 182 58 093 730 75 846 467 149,91%
Amazônia: análise do desmatamento à luz do planejamento regional a partir da década de 1950 157
Gráfico 1
Incremento no efetivo do rebanho bovino entre 1970 e 2000
na Amazônia Legal e restante do Brasil
130.000.000
110.000.000
90.000.000
70.000.000
50.000.000
30.000.000 Brasil
Tabela 2
Efetivo do rebanho bovino no restante do Brasil e na Amazônia Legal,
descontando os municípios prioritários, destacados em seguida
Variação entre
Rebanho bovino 2002 2011
2011 e 2002
Fonte: IBGE/SIDRA. Efetivo dos rebanhos, por tipo de rebanho (série encerrada). Ano 1974 a 2012.
Amazônia: análise do desmatamento à luz do planejamento regional a partir da década de 1950 159
Os estados do Amazonas (60%), Roraima (54%) e Rondônia (52%), regis-
traram o maior crescimento do rebanho no período, totalizando 14,2 milhões
de cabeças. O Mato Grosso teve um crescimento de 32% do rebanho no pe-
ríodo, e totalizou 28,7 milhões de cabeças, 10 milhões a mais que o e o Pará.
Quanto à soja pode-se apontar que o rápido crescimento e avanço da
fronteira agrícola foram induzidos na década de 70 no cerrado mato-grossense,
por meio do desenvolvimento tecnológico, que adaptou a cultura da soja às con-
dições do meio tropical. Segundo Alencar (et al., 2004) algumas variedades de
soja permitem a produção em ambientes mais úmidos, possibilitando o avanço
da fronteira agrícola, tornado-a um importante motor do desmatamento.
A área dedicada à plantação da soja também teve considerável incre-
mento no decênio 2002-2011. Não muito distante da pecuária, nota-se que
há uma concentração da produção na parte dos municípios que compõem a
frente de avanço da fronteira agrícola na Amazônia.
Tabela 3
Área (ha) plantada da soja no restante do Brasil, na Amazônia Legal,
descontando os municípios prioritários, destacados em seguida
Variação entre
Área/ Ano 2002 2011
2011 e 2002
Amazônia: análise do desmatamento à luz do planejamento regional a partir da década de 1950 161
O acordo vem sendo renovado a cada 2 anos e perdura até a presente
data, 2016, onde a renovação deste ano toma o seu prazo como indetermi-
nado, ou seja, a moratória perdurará enquanto for necessária. Segundo o
Greenpeace (2016) o desmatamento reduziu cerca de 86% desde 2006 nos
76 municípios em que ela é válida.
Em suma, verifica-se que para o decênio 2002-2011 o desenvolvimento
permaneceu pautado no crescimento da produção pecuária, mas que por ou-
tro lado o governo federal tentou engendrar políticas que prezam pelo orde-
namento territorial e maior controle no desmatamento ilegal da Amazônia,
associado a uma produção que melhor interagia com o meio ambiente e com
as populações locais.
Gráfico 2
Evolução das taxas de desmatamento por estado e médias entre as
décadas 1992-2001 e 2002-2011 na Amazônia Legal
30000
25000
Desmatamento (km2)
20000
15000
10000
5000
0
1992
1993
1994
1995
1996
1997
1998
1999
2000
2001
2002
2003
2004
2005
2006
2007
2008
2009
2010
2011
Desmatamento Desmatamento
Média da década
entre 1992 e 2001 entre 2002 e 2011
Amazônia: análise do desmatamento à luz do planejamento regional a partir da década de 1950 163
Classificados entre os estados que possuem municípios no arco do
desmatamento (Gráfico 3), verifica-se que o Mato Grosso e o Pará com-
põem a maior parte do desmatamento do arco. Juntos eles registraram
consideráveis quedas a partir de 2004, sendo que Mato Grosso e Rondônia
registraram um leve incremento entre 2010 e 2011. Destaca-se somente os
três estados supracitados foram responsáveis por 94,8% do desmatamento
no arco, o que demonstra a importância de conter o avanço da devastação
das florestas na Amazônia.
Gráfico 3
Evolução das taxas de desmatamento entre os estados que compõem o
arco do desmatamento entre 2002 e 2011.
80%
70%
60%
Desmatamento (%)
50%
40%
30%
20%
10%
0%
2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013
AM MT RO
MA PA RR
Amazônia: análise do desmatamento à luz do planejamento regional a partir da década de 1950 165
Fonte: PRODES/INPE (INPE, [s.d]).
Nota: Incremento entre 2002 e 2011 nos municípios prioritários destacados em azul nos mapas.
Não foram registrados incrementos no desmatamento nos municípios em branco.
6 Segundo o novo código florestal, entende-se como Área de Preservação Permanente (APP), aquela que
coberta ou não por vegetação nativa, possui a função ambiental de preservar os recursos hídricos, a paisa-
gem, a estabilidade geológica e a biodiversidade (BRASIL, 2012).
7 Entende-se por Reserva Legal, a área do interior de uma propriedade, delimitada com a função de assegu-
rar a utilização voltada para rendimentos econômicos de modo sustentável dos recursos naturais, bem como
auxiliar a conservação e a resiliência dos processos ecológico (BRASIL, 2012).
Amazônia: análise do desmatamento à luz do planejamento regional a partir da década de 1950 167
ͫͫ Reserva Legal (RL): no caso do bioma Amazônia deve ser preservada
80% da área de qualquer propriedade. Porém, caso seja necessário
recuperar a RL, ficou previsto no novo código a recomposição de so-
mente 50% do total no caso de imóveis com área rural consolidada;
ͫͫ Áreas de Preservação Permanente (APPs): áreas que devem ser man-
tidas para preservação integral, porém, com o novo código os produ-
tores que possuem até quatro módulos fiscais e que tenham áreas ru-
rais consolidadas em APPs, deverão recompor, entre 5 m para imóveis
com até um módulo fiscal, e 30 m para imóveis com mais de quatro
módulos fiscais. Esta foi uma grande mudança, pois anteriormente
nesta lei, os agricultores deveriam manter minimamente uma APP de
30m para os cursos d’água de menos de 10m, até 500m para os cur-
sos d’água que tinham largura superior a 600m (Lei 7803/1989), o que
melhor estendia a proteção sobre os domínios naturais.
ͫͫ Criação do Cadastro Ambiental Rural (CAR): este cadastro propõe o
registro eletrônico obrigatório de todos os imóveis rurais no país.
Com ele, o governo federal concentrará informações ambientais das
propriedades rurais, visando fomentar o controle, monitoramento,
planejamento ambiental e econômico.
Em resumo, as alterações propostas no código florestal partiram do dis-
curso da ampliação das áreas agricultáveis visando garantir a competitividade
brasileira e produção de alimentos para o mercado interno, incluindo a ocupa-
ção de APPs e RLs. Porém, a atual quantidade de áreas abertas seria suficiente
para intensificar a produção agropecuária, associando isto ao uso de tecnolo-
gias e manejo agrícola (SPAROVEK et al., 2010).
É notável que o Brasil obteve sucesso na redução do desmatamento na
Amazônia nos últimos anos. No entanto, este avanço não está assegurado,
pois recentemente, as taxas de desmatamento deixaram de cair na Amazônia,
mantendo uma média anual de 5,5 mil km² de áreas desmatadas, entre 2012
e 2015. Para SOARES-FILHO (et al., 2014) será essencial implantar medidas que
visem não só a redução das emissões do desmatamento, mas também a im-
plantação de medidas para a conservação dos estoques de carbono florestal
e manejo florestal sustentável.
8 “II – aquicultura: a atividade de cultivo de organismos cujo ciclo de vida em condições naturais se dá total
ou parcialmente em meio aquático, implicando a propriedade do estoque sob cultivo, equiparada à atividade
agropecuária e classificada nos termos do art. 20 desta Lei” (Lei 11.959/2009).
Amazônia: análise do desmatamento à luz do planejamento regional a partir da década de 1950 169
A produção pecuária poderia ser intensificada nas áreas já desmatadas
e as inovações para esta área deveriam objetivar a sustentabilidade como um
todo. O planejamento desta atividade no cenário nacional e, observando o de-
senvolvimento desta na Amazônia, deveria conter elementos de maior partici-
pação social (associação de produtores, cooperativas de leite, carne, agências
de ATER, setor empresarial e centros de pesquisa), incluindo metas e limites
de produção nas propriedades rurais (GOMES et al., 2012).
Conclusão
O principal objetivo desta pesquisa foi analisar as políticas públicas e
dinâmica pretérita de ocupação e uso da terra responsáveis pelo processo
de desmatamento na Amazônia Legal e, posteriormente, averiguar os fatores
contemporâneos na área denominada arco do desmatamento, entre os anos
de 2002 e 2011.
Desta maneira foi possível ver no período pretérito, a apropriação do
espaço realizada a partir de ações exógenas a atores da região, promovendo
a instalação de infra-estruturas, notadamente rodovias federais, pólos de de-
senvolvimento e redes de energia, bem como a exploração dos recursos natu-
rais voltados para produção agropecuária e mineral, buscando a inserção da
região na economia nacional e mundial.
O desmatamento teve considerável incremento a partir de políticas pú-
blicas aplicadas em infra-estrutura. Na retomada do liberalismo no cenário
mundial no princípio dos anos 90, as políticas públicas passaram a se de-
dicar, não somente a exploração predatória de recursos da Amazônia, mas
também ao desenvolvimento dito sustentável e endógeno. Isso demonstra
o quanto às políticas vindas do poder central não priorizam uma produção
menos agressiva ao meio ambiente, fazendo com que o desenvolvimento
sustentável tenha de caminhar lado a lado com a exploração predatória de
recursos naturais.
O que se nota com o planejamento voltado para o ordenamento territo-
rial da região, é que este canalizou benesses para o exterior da região a partir
de grandes projetos de exploração agropecuária e energética. Nos grandes
Amazônia: análise do desmatamento à luz do planejamento regional a partir da década de 1950 171
As alterações realizadas no Código Florestal (Lei 12.651/2012) represen-
tam outro desafio no âmbito do planejamento ambiental e manutenção dos
ecossistemas amazônicos, devido os passivos ambientais perdoados até 2008 e
a possibilidade de não recomposição de APPs e RLs em pequenas propriedades,
ainda a serem identificadas pelo Cadastro Ambiental Rural. Assim, acredita-se
que para a consolidação de um cenário de ordenamento territorial e uso me-
nos agressivo dos recursos naturais é necessário compatibilizar o crescimento
econômico com a conservação dos recursos naturais, desta forma, as políticas
públicas, dedicadas a conservação das florestas, podem ser mais bem desen-
volvidas mediante a interação e identificação de responsabilidades entre os di-
ferentes setores, incluindo esferas governamentais, empresas e sociedade civil,
para que assim sejam continuamente reduzidos os impactos ambientais.
Programas como o Fundo Amazônia demonstram ser uma opção viá-
vel para um cenário sustentável, porém seria relevante que este se tornasse
referência para a produção agropecuária, a fim de consolidar e conter o
avanço das áreas já desmatadas, ampliando a produção de maneira susten-
tável. Alternativas econômicas ditas sustentáveis, fora das cadeias da soja e
pecuária bovina, representam uma estratégia indireta de combate ao desma-
tamento. O apoio ao desenvolvimento de sistemas agroflorestais, o manejo
florestal com cadeias extrativistas, a pesca e o ecoturismo podem representar
oportunidades para geração de renda no âmbito das comunidades locais e
familiares, bem como proporcionar menor degradação sobre as florestas.
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Amazônia: análise do desmatamento à luz do planejamento regional a partir da década de 1950 177
Considerações sobre a
6
questão da mineração na
reorganização do território
em Canaã dos Carajás
Raphael Villela Almeida
Fabio Giusti Azevedo de Britto
Introdução
O Brasil é um dos grandes players globais no setor extrativista mineral,
uma vez que figura entre os principais produtores e exportadores de bens
minerais, com destaque para o minério de ferro. Neste sentido, a contribui-
ção da mineração para a economia nacional é expressiva, sobretudo, no que
diz respeito ao superávit da balança comercial. Entre os anos de 2000 e de
2011, o valor da produção mineral brasileira cresceu de US$ 6,5 bilhões para
US$ 53 bilhões. Todavia, desde então, este valor seguiu uma trajetória decli-
nante até alcançar o valor de US$ 26 bilhões, em 2015. Ainda assim, como o
saldo da balança mineral brasileira foi positivo em cerca de US$ 15,2 bilhões,
este setor foi responsável por 77,15% do superávit – de US$ 19,7 bilhões – da
balança comercial do país em 2015 (Ibram, 2012; 2016a; 2016b).
Em razão do grande potencial mineral existente em seu subsolo, po-
rém ainda pouco explorado, a Amazônia, em especial a sua porção Oriental,
consolida-se como o território privilegiado para a reprodução das atividades
de extração mineral no Brasil. O estado do Pará possui a maior produção em
valor da região (93,7%) e a segunda maior produção do país (28,4%), atrás
apenas de Minas Gerais (46%), no ano de 2015 (DNPM, 2016).
A principal área mineradora do estado do Pará está localizada à Sudeste
do estado, com destaque para os municípios mineradores de Parauapebas
(58,1%), Marabá (13,5%) e Canaã dos Carajás (8,14%) que em 2015 foram, res-
pectivamente, os três maiores produtores. Enquanto Parauapebas é o maior
produtor de minério de ferro do país (29,5%), Marabá e Canaã dos Carajás
são, respectivamente, o maior (46,5%) e o segundo maior (28,2%) produtores
nacionais de minério de cobre (DNPM, 2016).
A mineração em Canaã dos Carajás é relativamente recente quando
comparada com os demais municípios vizinhos, Marabá e Parauapebas, cuja
exploração mineral iniciou-se na década de 1980, com a implantação do Pro-
jeto Ferro Carajás – principal projeto que integrava o Programa Grande Cara-
jás. Contudo, estes três municípios compartilham uma trajetória que lhes é
comum: o processo de fragmentação/emancipação política. Assim, como a
então Vila de Parauapebas emancipou-se do município de Marabá, em 1987,
posteriormente, em 1994, foi a vez de Canaã dos Carajás emancipar-se de
Parauapebas (IBGE, 2014a; 2014b).
A exploração de cobre em Canaã dos Carajás teve início em 2004, após
dois anos de implantação da mina do Sossego que à época era o maior empre-
endimento de mineração de cobre já realizado no país. Posição, esta, perdida
após a implantação do Projeto Salobo, também sob o comando da minera-
dora Vale, em Marabá no ano de 2012 (VALE, 2015).
A partir do Projeto Sossego, Canaã dos Carajás experimentou um pro-
fundo e acelerado processo de transformação econômica e social (CABRAL et
al., 2011). Esta transformação foi captada pelos Censos Demográficos de 2000
e de 2010. Neste período, a população canaãnense mais que dobrou: aumen-
tou de 10.992 para 26.716 habitantes. Também, o PIB municipal cresceu de
R$ 27,7 milhões para R$ 2,1 bilhões (IBGE, 2000; 2010; 2014b).
Além disso, outras questões são identificadas no município, como: a
precariedade das redes de água e esgoto; aumento da violência, da explora-
ção sexual, dos conflitos trabalhistas e fundiários; e da degradação do meio
físico-biótico local que se dá tanto pelo aumento do desmatamento, quanto
Considerações sobre a questão da mineração na reorganização do território em Canaã dos Carajás 181
questão motivadora e a qual pretende-se responder é definida, simplifica-
damente, na forma da seguinte pergunta: quem são os atores que mais se
beneficiam da reorganização do território impulsionada pela mineração em
Canaã dos Carajás?
O objetivo deste trabalho consiste em analisar como a mineração reor-
ganiza o território em Canaã dos Carajás. Para tanto, três objetivos específicos
são propostos: (a) compreender a lógica de reprodução do território no Su-
deste do Pará; (b) analisar os potenciais efeitos positivos e negativos causados
pela mineração em Canaã dos Carajás; (c) identificar os atores que mais se
beneficiam e quais são as suas estratégias de apropriação do território em
Canaã dos Carajás.
Para avaliar a evolução das condições locais de vida, além da revisão
bibliográfica, foram consultadas as seguintes bases de dados do(a): Instituto
Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), com destaque para os Censos
Demográficos de 2000 e 2010; Instituto Brasileiro de Mineração (IBRAM);
Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM); Centro de Tecnologia
Mineral (CETEM) e; Agência Nacional de Transportes Aquaviários (ANTAQ);
entre outras bases.
Considerações sobre a questão da mineração na reorganização do território em Canaã dos Carajás 183
nicípio de Oriximiná, cujas jazidas forma descobertas pela Aluminium Limited
of Canada – a Alcan – na década de 1960. O Estado, através da CVRD tornou-
se o maior acionista na joint-venture Mineração Rio do Norte, a MRN. A mina
entra em operação em 1979, quando comercializa pela primeira a produção
de bauxita para o Canadá. Contudo, como o Estado desenvolvimentista am-
bicionava mais do que a simples exploração e comercialização da bauxita ele
articula-se, mais uma vez, com o capital estrangeiro, desta vez de origem ni-
pônica, para promover a transformação da bauxita em alumina, para então
produzir o alumínio. A CVRD torna-se, assim, acionista majoritária em duas
joint-ventures localizadas em Barcarena no Pará: na Alumínio Brasileiro, a
Albrás, e; na Alumina do Norte do Brasil, a Alunorte (MONTEIRO, 2005).
Já no polo Carajás, o início da implementação do projeto levou mais
tempo em razão, sobretudo, das disputas entre o Estado e a siderúrgica norte-
-americana US Steel. Ainda no ano de 1970, antes, portanto, da implementa-
ção do Polamazônia, o Estado já havia estabelecido um acordo com a US Steel
para a criação de uma joint-venture entre a siderúrgica e a CVRD, no que deu
origem a Amazônia Mineração S.A. – AMZA. A CVRD detinha 51% dos capitais
da AMZA, enquanto que a US Steel os 49% restantes. A AMZA seria responsá-
vel, assim, pela implantação do Projeto Carajás. Em 1974, os primeiros estu-
dos sobre a viabilidade técnica e econômica são concluídos e o Projeto orçado
em US$ 930 milhões, com capacidade inicial de 12 milhões de ton./ano, em
1979, e de 50 milhões de ton./ano de minério de ferro, em 1985 (MONTEIRO,
2005; VALE, 2012).
No entanto, as duas proprietárias discordavam quanto ao modal de
transportes a ser adotado, o hidroviário ou o ferroviário, para escoar a pro-
dução de ferro da Serra dos Carajás até os mercados globais. O modal ferro-
viário era estratégico pela CVRD, pois representava a possibilidade de ampliar
a comercialização do minério de ferro, principalmente para o mercado japo-
nês. Esta disputa contou inclusive com o envolvimento dos governos do Pará
e do Maranhão, motivados que estavam pelos potenciais efeitos sinérgicos
da ferrovia sobre suas economias, que a partir de Marabá (PA) atravessaria
o Sudeste Paraense, a Pré-Amazônia e a Baixada Maranhenses até alcançar
o porto de Itaqui em São Luís (MA) – um porto de águas profundas e apto,
Considerações sobre a questão da mineração na reorganização do território em Canaã dos Carajás 185
agroflorestal e infraestrutural, cujos valores previstos, em 1981, totaliza-
vam a cifra de US$ 22,5 bilhões. Além de outros US$ 39,2 bilhões que pode-
riam ser investidos em projetos potenciais (BECKER, 1989).
Os cinco principais projetos minero-metalúrgicos – Projeto Ferro
Carajás, Projeto Trombetas, Albrás, Alunorte e Alumar – somados alcan-
çavam o montante de US$ 8,687 bilhões, enquanto que a UHE de Tucuruí,
por si só, custou US$ 7,5 bilhões. Estes empreendimentos geraram uma
grande expectativa por oportunidades de emprego, o que motivou um
grande fluxo migratório para a região. No entanto, após o pico das obras,
trabalhadores desempregados dedicaram-se à agropecuária de subsis-
tência (Quadro 1) – muitos dos quais, sem o título de propriedade da terra
(BECKER, 1989).
É possível perceber que o Governo Federal concentrou um grande
esforço de investimento no PGC, o que demonstra, portanto, a centrali-
dade do Programa dentro do planejamento estatal (Quadro 1) (BECKER,
1988;1989). Logo, em razão da natureza estratégica do PGC, o Estado am-
pliou sobremaneira a sua atuação na Amazônia Oriental. O que acarretou
em uma participação nula ou inexpressiva das autoridades regionais e lo-
cais de planejamento e de desenvolvimento. Até mesmo a SUDAM esteve à
margem das principais decisões que eram tomadas pela tecno-burocracia
estatal representada, sobretudo, pela CVRD (BECKER & EGLER, 2006[1992]);
KOHLHEPP, 2002).
Investi-
Inaugu- Participa- Principais Empregos mento em
Projeto Localização Empresas Produto
ração ção (%) Mercados criados milhões
de dólares
Japão
Ferro Marabá Ferro
1985 CVRD 100,0 Alemanha 7 000 US$ 3 616
Carajás (PA) Manganês
Brasil
CVRD 46,0
Canadá
Oriximiná Votorantim 10,0
Trombetas 1979 Bauxita EUA 1 600 US$ 500
(PA) Alcan 24,0
Venezuela
Billington 10,0
CVRD
Barcarena Nippon 51,0 Japão
Albrás 1985 Alumínio 3 032 US$ 2 500
(PA) Steel 49,0 Valesul
(NAAC)
Valesul
São Luís Alcoa 60,0 Alumina Alcan
Alumar 1984 2 000 US$ 1 500
(MA) Billiton 40,0 Alumínio EUA
Brasil
CVRD
Albrás
UHE de Tucuruí Energia
1984 Eletronorte 100,0 Alunorte 30 200 US$ 7 500
Tucuruí1 (PA) elétrica
Alumar
CCM2
Considerações sobre a questão da mineração na reorganização do território em Canaã dos Carajás 187
Assim, apesar do alto custo envolvido o PGC poderia gerar, logo após a sua
implementação, vultosas somas de recursos para a companhia (BECKER, 1989).
Para o Estado, o PGC representava a possibilidade de manter, ao me-
nos, a posição que o país alcançara no sistema mundial, como potência re-
gional e como país semiperiférico, em um contexto de recrudescimento da
competição econômica internacional impulsionada pela globalização finan-
ceira comandada pelos Estados Unidos. A CVRD tornou-se, assim, um braço
importante do Estado neste processo. Desta forma, a ampliação e a diversifi-
cação das atividades da CVRD eram essenciais para a transnacionalização da
companhia e, consequentemente, para a manutenção do status internacional
do Brasil, como potência regional, em um cenário de forte crise interna tanto
econômica, quanto política (BECKER, 1989; BECKER & EGLER, 2006[1992]).
É válido destacar que à época a CVRD, então estatal, já havia alcançado
o reconhecimento internacional como uma firma eficiente e moderna, além
de líder no setor de minério de ferro (BECKER, 1989). Ademais, a CVRD possuía
larga experiência no setor marítimo internacional, onde controlava cerca de
20% do frete transoceânico de minério de ferro (VALE, 2012). A companhia
estatal havia adquirido, ainda, ampla experiência nos setores de metalurgia
e silvicultura, a partir de projetos que foram anteriormente desenvolvidos na
região Sudeste do Brasil (BECKER, 1989).
Com o PGC há a formação/consolidação de quatro corredores de ex-
portação na Amazônia Oriental. Um primeiro, e mais antigo, que conecta a
produção de manganês na Serra do Navio até o porto de Santana no Amapá;
um segundo, que articula as minas de bauxita no município de Oriximiná
(PA) e de Juruti (PA) até os polos metalúrgicos de Barcarena (PA) e de São
Luís (MA) – cuja produção é escoada pelo portos de Vila do Conde (PA) e de
Itaqui (MA), respectivamente; e, um terceiro, que através de um mineroduto
conecta a produção de caulim em Ipixuna do Pará (PA) e de bauxita em Pa-
ragominas (PA) até o porto de Vila do Conde (PA). Além, é claro, do corredor
Carajás, o maior e mais dinâmico da região, que através da Estrada de Ferro
Carajás – com 892 km de extensão – escoa a produção mineral da Serra dos
Carajás, até o Terminal Marítimo da ponta da Madeira, no porto de Itaqui
em São Luís (MA), atravessando o Sudeste Paraense, a Pré-Amazônia e a
Baixada Maranhenses.
Considerações sobre a questão da mineração na reorganização do território em Canaã dos Carajás 189
de ferro e; ao potencial usufruto do aparelho de Estado no caso das forças
sociopolíticas emergentes locais (BECKER, 1988).
Entretanto, este novo pacto político não se traduziu em uma melhoria
significativa das condições locais de vida. Os investimentos nas infraestruturas
de suporte à extração mineral, à sídero-metalurgia e à agropecuária, entre
outras atividades, drenam, até hoje, grande parte dos recursos públicos que
poderiam ser destinados à melhoria da qualidade de vida da população. Esta
dinâmica não se reproduz apenas pela ineficiência da administração pública,
mas, muito pelo contrário, ela é intencional. A debilidade do tecido sociopolí-
tico e socioeconômico local é fundamental para a reprodução desta lógica de
organização do território. Tal debilidade se traduz, simultaneamente, numa
baixa capacidade de resistência e numa elevada oportunidade de cooptação
das populações locais.
Dinâmica esta, que está totalmente consonante com a lógica do modo
de “desenvolvimento exógeno” (BECKER, 2001:3) que privilegia a integração da
Amazônia – da sua porção Oriental, em particular – à economia internacional
através de grandes corredores logísticos multimodais que escoam a produção
das commodities agrícolas, minerais e metálicas desta região. Sua contribui-
ção para o superávit da balança comercial e para a consolidação da posição
hegemônica da CVRD é considerável (COELHO et al., 2005; MONTEIRO, 2005).
Contudo, este modo de desenvolvimento produz, em contrapartida, questões
de ordem socioeconômica, sociopolítica e socioambiental que se reproduzem
no território até os dias atuais (BECKER, 2001; COELHO et al., 2005).
Na raiz de todas estas questões está a disputa pela posse da terra, que
envolve pequenos produtores rurais, comunidades tradicionais, trabalhadores
rurais sem-terra e assentados, de um lado e; do outro, grandes fazendeiros que
se apropriam da terra com uma lógica mercantil, para fins de especulação ou
para introdução da produção silvícola e agrícola – de carne e grãos (BECKER,
1988; COELHO et al., 2005).
A esta questão soma-se, ainda, a expansão da indústria madeireira, cuja
produção destina-se às serrarias e carvoarias. Como também, das guseiras e
siderúrgicas que produzem o ferro-gusa, para posterior produção de aço, cujo
insumo básico é o carvão de origem vegetal – que atua como redutor do miné-
rio de ferro e como fonte de energia no alto-forno das siderúrgicas. Nesta ca-
Considerações sobre a questão da mineração na reorganização do território em Canaã dos Carajás 191
guaia-Tocantins – GETAT – que resultou nos Centros de Desenvolvimento
Regional, os CEDERE I, II e III. Seu objetivo consistia em atenuar os conflitos
fundiários decorrentes da expansão da fronteira agrícola, sobretudo, na re-
gião do Bico do Papagaio, no estado do Tocantins, e em Carajás, no Pará
(ARAUJO et al., 2014; CABRAL et al., 2011; IBGE, 2014b).
A Vila CEDERE II, que daria origem ao município de Canaã dos Carajás,
tornou-se uma das áreas agrícolas mais importantes do Pará, com desta-
que para as lavouras de milho, arroz e feijão. Além da agropecuária, o ga-
rimpo foi outra atividade que se desenvolveu neste território, cujo principal
marco é a exploração do garimpo do Sossego em 1983. Entre os anos de
1982 e de 1985, 1.551 famílias foram assentadas. Todavia, apenas 52,6%
destas famílias receberam o título de posse definitiva da terra até o ano de
1985, quando o Governo Federal extingue o GETAT e, consequentemente, o
processo de assentamento dos trabalhadores rurais sem-terra. As áreas de
produção agrícola entram assim em declínio, sendo rapidamente incorpora-
das pela pecuária e pela indústria madeireira. Num processo que resultará
em concentração fundiária e na expansão do desmatamento (ARAUJO et al.,
2014; CABRAL et al., 2011; IBGE, 2014b).
Neste primeiro momento é possível identificar, grosso modo, a exis-
tência de três grupos sociais importantes: os assentados, os pecuaristas e
os madeireiros. Posteriormente, na década de 1990, tem início o processo
de mobilização política em prol da emancipação da Vila CEDERE II em rela-
ção ao município de Parauapebas, justamente quando se iniciam as análises
tanto do potencial, quanto da viabilidade técnica e econômica da explora-
ção das reservas minerais existentes.
Em outubro de 1994, após a realização de um plebiscito, o outrora
distrito, emancipa-se do município de Parauapebas, sendo denominado:
Canaã dos Carajás (IBGE, 2014b). A emancipação política constitui-se em
uma condição primordial para a reprodução do novo pacto político formado
neste território. Em 1997, a CVRD anuncia publicamente a existência de im-
portantes reservas de minério de cobre no subsolo de Canaã dos Carajás
– em maio deste mesmo ano, a CVRD foi privatizada. A mineradora estimou
que os corpos minerais de Sequeiro e Sequeirinho possuíam reservas de
244,7 milhões de toneladas de cobre e ouro associados. Em 1999, logo após
Considerações sobre a questão da mineração na reorganização do território em Canaã dos Carajás 193
cobre – e de ouro associado. Este era, até então, o maior empreendimento de
exploração de cobre no país, além de ser o primeiro de uma série de outros
projetos de cobre que a mineradora implementaria na região de Carajás – 118,
Salobo, Cristalino e Alemão – fundamentais, portanto, para tornar o Brasil de
importador em exportador de cobre. Em Canaã dos Carajás, o minério de cobre
é extraído em cavas a céu aberto para então seguir para a usina de beneficia-
mento, onde é produzido o concentrado de cobre. Em seguida, a mineradora
transporta, em caminhões, a produção de cobre contido em concentrado até o
Armazém de Cobre, localizado em Parauapebas – que está conectado à EFC. Fi-
nalmente, a produção é escoada até o Terminal Marítimo da Ponta da Madeira,
em São Luís (MA), para daí abastecer os mercados nacional e internacional. A
vida útil da mina é estimada em 20 anos (VALE, 2004b).
Assim como na inauguração do canteiro de obras, a CVRD realizou uma
grande cerimônia para a inauguração do empreendimento e que contou, mais
uma vez, com a participação de lideranças políticas, das esferas de poder lo-
cal, estadual e nacional (BRASIL, 2004; VALE, 2004a). Cabe aqui destacar a
continuidade da estratégia do Governo Federal de impulsionar, através das
exportações minerais, tanto o superávit da balança comercial, quanto o cres-
cimento econômico e o desenvolvimento do país – uma política de Estado.
O então Presidente Luís Inácio Lula da Silva, assim ressaltou no seu discurso,
durante a inauguração do Projeto Sossego:
Aqui em Carajás, debaixo deste solo, existem riquezas imensas que
têm contribuído muito para o desenvolvimento e o progresso social do
nosso querido Brasil. A produção daqui e, em breve, das outras minas
que integram o projeto, vai levar o Brasil à autossuficiência em cobre
e ampliará, mais ainda, a nossa capacidade exportadora no setor mi-
neral. A Vale, como vocês sabem, além de ser uma das maiores mine-
radoras do Planeta, é também a maior exportadora nacional (...). A
alavanca exportadora, uma das mais destacadas prioridades do nosso
governo, tem alcançado objetivos extraordinários. O superávit cres-
cente em nossa balança comercial comprova o acerto desse caminho.
E isso não vem ocorrendo por acaso. Trata-se de uma forte ação estra-
tégica composta pela agenda criativa de nossa diplomacia e por nossa
presença ousada no comércio exterior (BRASIL, 2004: 2).
Gráfico 1
Evolução do PIB de Canaã dos Carajás, em milhares de reais (R$),
2000-2013
4.000
3.500
3.000
Desmatamento (km2)
2.500
2.000
1.500
1.000
500
0
2000
2001
2002
2003
2004
2005
2006
2007
2008
2009
2010
2011
2012
2013
Ano
Elaboração Própria. Fonte: IBGE – Produto Interno Bruto dos Municípios.
Considerações sobre a questão da mineração na reorganização do território em Canaã dos Carajás 195
Apesar do crescimento do valor adicionado pela agropecuária e pelo setor de
serviços, este incremento foi muito inferior ao que foi obtido pela indústria –
principalmente a indústria extrativa mineral e, em menor medida, a constru-
ção civil – o que explica, portanto, o brutal decréscimo da participação relativa
da agropecuária, em especial, e dos serviços entre 2000 e 2013 (Gráfico 2).
É importante ressaltar que em dezembro de 2008, a CVRD inaugurou,
em Canaã dos Carajás, a Usina Hidrometalúrgica de Carajás (UHC), que apesar
do seu caráter experimental, foi fundamental para que as novas tecnologias
desenvolvidas pela CVRD no processamento do concentrado de cobre1 para
a produção do catodo de cobre fossem testadas em escala industrial. A pro-
dução do catodo de cobre da UHC de Carajás destina-se principalmente ao
mercado interno (VALE, 2009).
Gráfico 2
Evolução da composição do PIB de Canaã dos Carajás, por setores,
entre 2000-2013
100
90
80
Participação (%)
70
60
50
40
30
20
10
0
2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013
Ano
1 Concentrado de cobre: Material extraído a partir da concentração de minerais de cobre contidos no minério
de cobre. É a matéria-prima usada nas refinarias (smelters) para produzir metal de cobre. Catodo de cobre:
Placa de cobre com pureza igual ou superior a 99,9%, produzida por processo eletrolítico (VALE, 2009: 154).
Considerações sobre a questão da mineração na reorganização do território em Canaã dos Carajás 197
Seria isto que estaria a ocorrer em Canaã dos Carajás a partir da implan-
tação do Projeto Sossego. A magnitude das verticalidades – comandada pela
CVRD – se sobrepõe às horizontalidades, que privilegiam a interdependência
pela contiguidade espacial. Portanto, a partir deste raciocínio, como a lógica
da mineração comandada pela Vale em Canaã dos Carajás privilegia a ação das
verticalidades (redes) – abastecimento dos mercados consumidores interna-
cionais e provisão de dividendos aos seus acionistas nacionais e internacionais
– este município torna-se assim mais vinculado (e vulnerável) à racionalidade
dos mercados financeiros e de commodities globais.
Por outro lado, quando consideramos os processos demográficos e so-
cioeconômicos que se reproduzem em Canaã dos Carajás desde a implantação
do Projeto Sossego é possível observar, portanto, as principais contradições
deste empreendimento para o município. Entre 2000 e 2010, a população mu-
nicipal aumentou de 10.992 para 26.586 habitantes – uma variação de 143%
em apenas dez anos, o que representa uma taxa média de crescimento geo-
métrico anual de 9,6% (Tabela 1).
Este crescimento populacional se deu sobretudo nas áreas urbanas, o
que explica, portanto o aumento do percentual de população urbana neste
município, de 35,9% em 2000, para 77,6% em 2010. As migrações desempe-
nharam um papel fundamental neste processo, pois o saldo migratório líquido
– diferença entre imigrantes e emigrantes – foi positivo, sendo medido em
5.337 habitantes entre 2005-2010. Logo, do total da população observada em
Canaã dos Carajás no ano de 2010, 20,1% deste aumento, é resultado líquido
dos fluxos migratórios entre 2005-2010 (Tabela 1).
Tabela 1
População total, taxa de urbanização, saldo migratório líquido e
taxa líquida de migração, em Canaã dos Carajás, entre 2000 e 2010
Gráfico 3
Origem dos migrantes em Canaã dos Carajás, por Grandes Regiões,
2000-2010
100
90
80
67,96
70 64,03
Grandes Regiões (%)
60
50
40
30 23,57
20 14,82
10,97 9,92
10 3,98 4,21
0,26 0,28
0
2000 2010
Ano
Considerações sobre a questão da mineração na reorganização do território em Canaã dos Carajás 199
O rápido crescimento populacional em Canaã dos Carajás e que se deu
sobretudo nas áreas urbanas produziu, consequentemente, uma grande
demanda por infraestruturas e serviços urbanos básicos (AMARAL, 2012;
ARAUJO et al., 2014; CABRAL et al., 2011). Entre os Censos Demográficos de
2000 e de 2010, o município conseguiu avançar na provisão destes serviços e
infraestruturas. Em 2010, entre os domicílios urbanos: 85,1% tinham acesso
à coleta direta de lixo; apenas 27,5% possuíam acesso à rede geral de água;
somente 25,8% à rede coletora de esgoto; enquanto que totalidade possuía
iluminação elétrica (Tabela 2).
Contudo, entre os anos de 2004 e de 2014, a CVRD alega ter investido
cerca de R$ 200 milhões em ações para o desenvolvimento das condições de
vida da população canaãnense e que contaram, inclusive, com a participação
do poder municipal (VALE, 2014). Entre as medidas compensatórias implemen-
tadas pela mineradora até o ano de 2004, como parte dos requisitos legais
para a implantação e operação do Projeto Sossego, destacam-se: a constru-
ção de um hospital de média complexidade com 40 leitos, de uma escola com
700 vagas, de uma delegacia de Polícia, de um quartel para a Polícia Militar do
Pará e de uma casa de cultura; a pavimentação de 100km de rodovias – neces-
sária para escoar a produção do concentrado de cobre até Parauapebas – de
20km de ruas; a expansão das redes de abastecimento de água e de coleta de
esgoto. Todos estes investimentos somaram cerca de R$ 39 milhões, segundo
a companhia (VALE, 2004a).
Estas medidas compensatórias são, todavia, insuficientes para asse-
gurar a oferta de infraestruturas e serviços urbanos básicos em ritmo igual
à demanda de uma população cada vez maior e mais urbana – em Canaã
dos Carajás, dos domicílios urbanos, 72,5% não têm acesso à rede geral de
água, enquanto que 74,2% não possuem acesso à rede coletora de esgoto
(Tabela 2). Aliás, é importante destacar que esta não é uma atribuição do se-
tor privado, pelo contrário, pois cabe ao poder público municipal a provisão
destes bens e serviços.
Serviços e infraestruturas
2000 2010
urbanas básicas
Considerações sobre a questão da mineração na reorganização do território em Canaã dos Carajás 201
a empresa encontra-se livre de qualquer responsabilidade nestas matérias
e, consequentemente, a ampliação destas infraestruturas e serviços urbanos
torna-se insuficiente, em razão da omissão (intencional) do Poder Municipal.
Tal característica é observada em Parauapebas, o principal município mine-
rador do país e vizinho de Canaã dos Carajás. Nele, o percentual de domicí-
lios urbanos atendidos pela rede coletora de esgoto diminuiu de 16,3% para
14,6% entre 2000-2010 (AMARAL, 2012; IBGE, 2000; 2010).
O Projeto Sossego também exerceu uma grande influência sobre as ex-
pectativas da população local no que corresponde à geração de novas opor-
tunidades de emprego e de renda. Ademais, o grande fluxo de migrantes que
chegaram ao município se deu em razão, sobretudo, da potencial oferta de
empregos durante a fase de obras do Projeto e, posteriormente, com as ope-
rações da mina e da usina de beneficiamento do minério de cobre (AMARAL,
2012; ARAUJO et al., 2014; CABRAL et al., 2011). Segundo a CVRD, durante o
pico de obras foram empregados cerca de 5.000 trabalhadores. Já a operação
do empreendimento, gerou 520 empregos diretos (VALE, 2004a).
A partir dos dados censitários observa-se que entre 2000-2010 a taxa
de atividade aumentou de maneira significativa, alcançando o percentual de
66,6% da população do município. No entanto, a taxa de ocupação experi-
mentou um declínio, pois passou de 96,9% em 2000, para 89,9% em 2010.
O que significa que a taxa de desocupação – ou de desemprego – aumen-
tou de 3,1%, para 10,1% da população em idade ativa neste período. Entre as
pessoas que encontravam-se ocupadas no ano de 2000, apenas 1,4% delas
estavam ocupadas na mineração. Em 2010, após a implantação do Projeto de
Sossego, este percentual aumentou para 7,6% (Gráfico 4).
O que evidencia, portanto, que apesar do expressivo aumento da taxa
de trabalhadores ocupados na mineração, esta taxa é bastante modesta
quando confrontada com a retórica utilizada em defesa dos grandes empre-
endimentos mineradores. A potencial capacidade de geração de empregos é,
sem dúvida, um dos argumentos mais amplamente utilizados por aqueles que
buscam a legitimação do empreendimento. Todavia, a realidade observada
em Canaã dos Carajás demonstra que esta retórica tem pouca sustentação
empírica – ao menos para o caso deste município.
96,9
(%) 100
89,9
90 Taxa de
atividade
80
66,6
70 Taxa de
ocupação
60 54,9
50 Taxa de
40 desocupação
30 Ocupação
20 na mineração
10,1 7,6
10
3,1 1,4
0
2000 2010
Ano
Elaboração Própria. Fonte: IBGE – Censos Demográficos de 2000 e de 2010.
Considerações sobre a questão da mineração na reorganização do território em Canaã dos Carajás 203
Gráfico 5
Rendimento por classes de salário mínimo para os ocupados
(trabalho principal) na extração mineral e nos demais setores
de atividade, em Canaã dos Carajás, 2010
Mineração Demais setores
100
Setor de Atividade 6,22
19,52 5,20
90
9,12
Elaboração80Própria. Fonte: IBGE – Censos Demográficos de 2000 e de 2010
Participação relativa (%)
70
26,98
31,71
60
50
40
32,22
30
47,76
20
10 21,27
0
Mineração Demais setores
Setor de Atividade
0 a 1 SM 1 a 2 SM 2 a 3 SM 3 a 5 SM Mais de 5 SM
80
70
Taxa por 100 mil habitantes
60
50
40
30
20
10
0
2000
2001
2002
2003
2004
2005
2006
2007
2008
2009
2010
2011
2012
2013
2014
Ano
Considerações sobre a questão da mineração na reorganização do território em Canaã dos Carajás 205
de exploração e de beneficiamento do minério de cobre – que se reproduzem
numa pequena porção do território, cujo controle é exercido pela CVRD.
A mineração produziu, portanto, em Canaã dos Carajás, um efeito de
sombra e de luz sobre o território. Segundo Milton Santos (2012[1996]), isso
ocorreria em razão da seletividade espacial das redes (verticalidades) – uma
vez que a sua função não é a de preencher áreas contíguas, mas a de ativar ou
criar pontos e linhas, capazes de articular territórios espacialmente distantes.
O que possibilitaria, segundo Leila Dias (2005[1995]), a emergência de uma
lógica de organização reticular do território, cujo sentido é garantir a circula-
ção de mercadorias, capitais e informações entre os nós que integram a rede.
Assim, segundo Rogério Haesbaert (2011[2004]), as redes ao privilegiarem à
conexão entre estes territórios descontínuos – os territórios-rede – produz,
simultaneamente, um efeito-túnel sobre aqueles que são atravessados, mas
que não estão conectados à rede. O que explicaria a limitação dos poten-
ciais ganhos da mineração, como também as suas contradições em Canaã dos
Carajás, pois apenas uma pequena parcela do território – que seria a parte
luminosa – está efetivamente integrada (conectada) ao espaço produtivo da
CVRD, enquanto que o restante não.
Na escala regional, a centralidade que o município de Parauapebas pos-
sui no espaço produtivo organizado pela CVRD no Corredor Carajás limita,
portanto, os ganhos potenciais que Canaã dos Carajás poderia obter tanto
com a implantação de infraestruturas, quanto com serviços de comando e
controle. Somente com o Projeto Ferro Carajás S11D que a CVRD irá expandir
a EFC até Canaã dos Carajás, o que elevará a posição que o município ocupa
dentro do seu espaço produtivo.
Já nas escalas nacional e global, é possível identificar os atores que mais
se beneficiam da mineração em Canaã dos Carajás, além é claro da própria
CVRD. Graças às redes, os atores produtivos podem conectar territórios des-
contínuos assegurando, assim, o fluxo contínuo e célere de informações, ca-
pitais e mercadorias. Em outras palavras, esta maior interconexão, segundo
Rogério Haesbaert (2011[2004]), viabilizaria, a articulação entre as múltiplas
escalas existentes, desde a local até a global. Neste sentido, a capacidade
de transcender (agir verticalmente sobre) esta multiplicidade de escalas é
o que definiria o poder no mundo contemporâneo. Neste sentido, a CVRD
Considerações sobre a questão da mineração na reorganização do território em Canaã dos Carajás 207
Tabela 3
Participação acionária na Vale, em 31 de dezembro de 2015
Governo Federal
5,3% 6,5% 3,4%
(BNDESPAR)
78,4
21,21
0,04
Considerações sobre a questão da mineração na reorganização do território em Canaã dos Carajás 209
tem enfrentado uma forte desvalorização, até atingir o valor de R$ 61 bilhões
em 2015 (G1, 2016; UOL, 2013; 2015).
Para os acionistas, nacionais e internacionais da CVRD, o compromisso
público assumido pela companhia em oferecer grandes dividendos aos seus
acionistas representa, portanto, uma excelente oportunidade para a acu-
mulação/reprodução de capitais. Entre 2000 e 2015, a mineradora pagou
US$ 41,6 bilhões em dividendos aos seus acionistas. Apenas no ano de 2011,
esta cifra foi de US$ 9 bilhões – recorde histórico (VALE, 2016).
Considerações finais
Entre as considerações finais deste trabalho, cabe aqui destacar, mais
uma vez, a importância que a mineração desempenha na reorganização do
território na Amazônia Oriental, sobretudo, ao longo do corredor Carajás,
cujo sentido é muito bem definido: a obtenção de divisas através das ex-
portações minerais, pelo Estado, além da consolidação da CVRD enquanto
empresa global, líder no mercado de minério de ferro, porém com uma diver-
sificação cada vez maior das suas atividades. O Projeto Sossego, implantado
pela CVRD em Canaã dos Carajás, está evidentemente inserido nesta lógica
de reprodução do território.
Os potenciais efeitos positivos decorrentes do crescimento econômico
impulsionado pela mineração em Canaã dos Carajás são bastante reduzidos.
Isso porque, em razão da seletividade espacial das redes, que privilegiam a
conexão entre os polos que integram o espaço produtivo da CVRD, desde o
corredor Carajás até os mercados consumidores globais, produz um efeito-
túnel sobre o restante do território municipal. Em outras palavras, a mine-
radora não necessita construir uma relação mais solidária com o restante do
território, mas apenas com a porção que lhe é indispensável para explorar e
beneficiar o minério de cobre para a sua posterior comercialização.
Graças às redes, de telecomunicações, transportes e finanças, a CVRD
pode transcender escalas e, desta forma: comandar e controlar suas ações à
distância, sem a necessidade de maiores contratações de trabalhadores em
Canaã dos Carajás; escoar a sua produção até os mercados consumidores
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Introdução
Tem sido cada vez mais frequente a busca pelo conhecimento do estado
do ambiente atual, da avaliação do quanto este ambiente foi afetado pelo
homem e suas atividades e se distancia da sua condição natural ou ideal para
o seu equilíbrio e desempenho de suas funções ecossistêmicas.
Contudo, reconhecer e estabelecer um padrão para tal estado é tarefa
árdua e complexa, na medida em que envolve uma multiplicidade de elemen-
tos e as relações entre eles.
Mas acredita-se que distinguir o estado dos elementos que compõem
determinado sistema ambiental e os processos a ele relacionados permitem
avaliar o equilíbrio desse sistema ou o nível de qualidade ambiental nele exis-
tente (BOTELHO; SILVA, 2004).
O fato é que qualidade ambiental não é um conceito de fácil definição
(MAZETTO, 2000; CARIBÉ; DIAS, 2011). Segundo Munn (1979), a qualidade
ambiental se refere ao estado do ambiente objetivamente percebido, por
meio da medição de seus componentes, e subjetivamente, quando se consi-
dera atributos como beleza e valor. De acordo com Gallopin (1981), qualidade
ambiental pressupõe juízos de valor atribuídos ao estado do ambiente, que
refletirá os valores (não necessariamente numéricos) adotados em uma si-
tuação e um momento dados, pelas variáveis ou componentes do ambiente
que exercem maior influência sobre a qualidade de vida presente e futura de
uma comunidade. Definições mais simples podem ser encontradas, como a de
Horberry (1984), que sintetiza que se trata do “estado do ar, da água, do solo e
dos ecossistemas, em relação aos efeitos da ação humana”. No Glossary of En-
vironment Statistics (1997), o termo é definido como o estado das condições
do meio ambiente, expressas em termos de indicadores ou índices relaciona-
dos com os padrões de qualidade ambiental.
Nesse sentido, a busca por atributos que possam representar esses in-
dicadores e refletir o estado do ambiente ou de determinado componente da
paisagem tem sido um caminho adotado pelos pesquisadores. No entanto, o
estabelecimento de padrões e limites entre diferentes estados (ruim, regular,
bom e ótimo, por exemplo) ainda são desafios, notadamente no que se refere
a certos elementos do sistema ambiental. Quanto ao estabelecimento de pa-
drões, Caribé e Dias (2011) afirmam que “quanto mais apuradamente forem
definidos a função e o usuário e um maior entendimento sobre as relações
causais e outros mecanismos relevantes, mais precisos os padrões poderão
ser construídos”. Destaca-se, neste sentido, a importância da apreensão da
natureza para uma determinada finalidade.
Ademais, há que se considerar, a variabilidade espaço-temporal de de-
terminados parâmetros, notadamente os do meio físico-biótico e ressaltar
certo grau de subjetividade intrínseca na avaliação da qualidade de qualquer
ambiente. Sobre isto, Caribé e Dias (2011) alertam, ainda, que a “qualidade
do meio ambiente é, em parte, objeto da percepção humana, portanto sub-
jetiva, pois a organização dos elementos naturais e artificiais possibilita, atra-
vés do arranjo de diferentes concepções paisagísticas, o gosto ou o repúdio
ao meio ambiente”.
Não se pretende aqui discutir todas as questões envolvidas nos proces-
sos de conceituação, avaliação e determinação da qualidade ambiental e que
a caracterizam como complexa. A intenção é promover a ideia de que qual-
quer método, seja ele baseado em valores numéricos ou não, que busque a
Parâmetros de Avaliação
O número de parâmetros em um PAR pode ser variável, em função das
caraterísticas da área e dos objetivos da pesquisa, novos parâmetros podem
ser criados e outros subtraídos ou substituídos. Contudo, o ideal é a manu-
tenção sempre que possível de parâmetros já existentes, a fim de propiciar
possíveis comparações e classificações entre diferentes cursos de água e um
diagnóstico mais amplo, considerando categorias territoriais mais abrangen-
tes. Fernández e Raven (2001) alertam que a falta de padronização dos dados
coletados dificulta a análise de séries históricas. No trabalho precursor de
Callisto et al. (2001), foram apresentados 11 parâmetros, todos relacionados
a condições que favorecessem ou não a colonização por macroinvertebrados
bentônicos, como tipos de fundos e frequência de remansos (curvas). Entre-
tanto, muitos deles, como alterações no canal do rio, presença de vegetação
ripária e estado das margens, são parâmetros fundamentais para qualquer
estudo em ambientes fluviais.
Os trabalhos de Rodrigues (2008) e Rodrigues et al. (2008) apresentam
13 parâmetros (Figura 1), que em Rodrigues et al. (2010) foram sintetizados
em 11 parâmetros definidos detalhadamente. Destaca-se que alguns parâme-
tros foram sugeridos como sendo aplicáveis apenas para trechos de alto curso
e outros apenas para trechos de baixo curso.
Proporções relativas
Parâmetros
(Unidade de avaliação)
(A) parâmetros avaliados em trechos de rios de alto curso; (B) baixo curso.
Quadro 1
Descrição dos parâmetros do Protocolo de Avaliação Rápida de Rios (PAR-R)
Parâmetros Descrição
X. Estado de
conservação Mede o estado de conservação da vegetação da mata ciliar, ou
da vegetação seja, avalia a qualidade da vegetação, estimando a quantidade
do entorno de espécies nativas e invasoras.
XI. Aspectos Avalia cor, transparência e odor da água, que refletem muitas
da água vezes situações de poluição e/ou contaminação e repelem a
(cor e odor) população que deseja desfrutar até mesmo apenas da beleza
cênica que o curso de água pode ter.
1 Para definir as margens esquerda e direita dos cursos de água basta dar as costas para a nascente ou ficar
de frente para o sentido do fluxo de água e do lado esquerdo do seu corpo estará a margem esquerda e do
seu lado direito, estará a margem direita.
Quadro 2
Protocolo de Avaliação Rápida de Rios (PAR-R)
20 19 18 17 16 15 14 13 12 11 10 9 8 7 6 5 4 3 2 1 0
20 19 18 17 16 15 14 13 12 11 10 9 8 7 6 5 4 3 2 1 0
20 19 18 17 16 15 14 13 12 11 10 9 8 7 6 5 4 3 2 1 0
Quadro 3
Descrição dos parâmetros do Protocolo de Avaliação Rápida para Praias
(PAR-P)
Parâmetros Descrição
Legenda
1- Praia das Flexeiras 5- Praia da Bica 8- Praia de Quitiguara 11- Praia da Viola
2- Praia da Gamboa 6- Praia do Gato 9- Praia do Boi 12- Praia Grande
3- Praia do Saco da Gamboa 7- Praia do Leste 10- Praia de Águas Lindas 13- Praia da Guarda
4- Praia de Sapioeira
Quadro 4
Protocolo de Avaliação Rápida para Praias (PAR-P)
20 19 18 17 16 15 14 13 12 11 10 9 8 7 6 5 4 3 2 1 0
Parâmetro 8: Efluentes
20 19 18 17 16 15 14 13 12 11 10 9 8 7 6 5 4 3 2 1 0
20 19 18 17 16 15 14 13 12 11 10 9 8 7 6 5 4 3 2 1 0
20 19 18 17 16 15 14 13 12 11 10 9 8 7 6 5 4 3 2 1 0
20 19 18 17 16 15 14 13 12 11 10 9 8 7 6 5 4 3 2 1 0
*A pontuação atribuída para o parâmetro 13 foi decorrente da comparação entre as praias observadas.
Quadro 5
Resultado da aplicação do PAR-P nas praias da Ilha de Itacuruçá (RJ)
Praias
8. Quitiguara
Parâmetros
4. Sapioeira
1. Flexeiras
de Baixo
Gamboa
12. Grande
13. Guarda
2. Gamboa
3. Saco da
Lindas
10. Águas
11. Viola
7. Leste
6. Gato
5. Bica
9. Boi
I- Forma da praia 4 3 5 6 6 15 15 15 6 17 17 15 7
II- Posição da praia 5 5 9 9 10 14 15 16 16 19 19 17 8
III- Cobertura vegetal 5 0 18 9 3 18 12 4 17 3 16 6 4
IV- Erosão no entorno 4 1 6 8 17 15 10 12 18 3 11 8 3
V- Valor cênico 12 2 16 6 8 12 16 5 17 15 17 5 3
VI- Grau de ocupação 0 0 16 8 5 16 6 9 15 0 18 2 5
VII- Tipo de ocupação 7 0 13 8 11 15 12 6 14 4 15 5 6
VIII- Efluentes 16 0 18 17 15 17 18 15 18 10 2 15 13
IX- Resíduos sólidos 6 1 20 9 20 15 16 20 20 20 6 17 12
X- Frequência e atividades 16 5 19 16 17 19 14 16 18 18 6 9 16
XI- Embarcações 2 0 16 10 16 20 17 8 8 18 14 3 19
XII- Estruturas de apoio náutico 0 1 20 16 6 6 12 12 18 13 17 4 15
XIII- Características da água 3 1 10 14 17 16 18 16 18 20 19 17 2
Média 6,2 1,5 14,3 10,5 11,6 15,2 13,9 11,8 15,6 12,3 13,6 9,5 8,7
Legenda
9. Boi
6. Gato
3. Saco da Gamboa
7. Leste
11. Viola
8. Quitiguara
10. Águas Lindas
5. Bica
4. Sapioeira
12. Grande
13. Guarda
1. Flexeira
2. Gamboa de Baixo
0,0 2,0 4,0 6,0 8,0 10,0 12,0 14,0 16,0
Média final
Ótima Boa Regular Ruim
2 A trilha consolidada não se refere apenas a uma trilha conhecida e frequentada. Considera-se trilha con-
solidada aquela que dispõe de, no mínimo, quatro das seguintes condições: planejamento prévio de imple-
mentação; traçado mapeado e divulgado; estruturas de acesso e segurança (rampas, degraus, corrimãos,
passarelas, etc.); placas de sinalização e/ou informativas e/ou educativas; grau de dificuldade conhecido e
divulgado; frequência de visitação conhecida. A trilha incipiente, como o próprio nome já diz, seria aquela
em estado inicial de implantação ou utilização e que ainda carece da maioria das condições para sua conso-
lidação (Botelho, 2016).
Quadro 6
Descrição dos parâmetros do Protocolo de Avaliação Rápida para Trilhas
(PAR-T)
Parâmetros Descrição
I. Largura do leito Tamanho do leito da trilha como proposto por Neiman (2002) para
da trilha trânsito seguro dos usuários, tendo como limite inferior 0,6 metro.
II. Pontos para Presença de áreas abertas, isto é, onde o leito não é estreito, nas
descanso ou áreas quais os usuários podem descansar ou contemplar a vista pela
de avistamento presença de mirantes.
Quadro 7
Protocolo de Avaliação Rápida para Trilhas de Montanha (PAR-TM)
Mais de 70% do trecho avalia- De 50% a 70% do trecho ava- Menos de 50% do trecho
do possui largura do leito da liado possui largura do leito da avaliado possui largura do
trilha entre 0,6 e 0,95 metro. trilha entre 0,6 e 0,95 metro. A leito da trilha entre 0,6 e
A largura do corredor é supe- largura do corredor compre- 0,95 metro. A largura do
rior a 1,3 metro. ende o intervalo entre 1,0 e corredor da trilha é inferior a
1,3 metro. 1 metro.
15 14 13 12 11 10 9 8 7 6 5 4 3 2 1
Há, no trecho avaliado, três Há, no trecho avaliado, uma Não há, no trecho avaliado,
ou mais áreas para descanso ou duas áreas para descanso nenhuma área para
ou mirantes para contemplar ou mirantes para contemplar descanso, nem mirantes para
a vista. a vista. contemplar a vista.
15 14 13 12 11 10 9 8 7 6 5 4 3 2 1
Parâmetro 5: Declividade
BOA REGULAR RUIM
Trecho apresenta pontos com Trecho apresenta pontos com Trecho apresenta pontos
declividade média entre 0% e declividade média entre 15% e com declividade média
15%. Além disso, não há decli- 25%. Além disso, há presença superior a 25%. Além disso,
ves ou aclives acentuados. de declives ou aclives pouco há presença de declives ou
acentuados. aclives acentuados.
15 14 13 12 11 10 9 8 7 6 5 4 3 2 1
Tabela 1
Pontuação do PAR-TM aplicado na trilha Sahy-Rubião, no Parque Estadual
Cunhambebe, Mangaratiba (RJ)
4 Movimentos de massa e
4 6 9 5 9 11 1 5 1 10
perda de borda crítica
5 Declividade 4 5 3 2 1 11 9 4 12 5
6 Canais fluviais 13 10 5 15 15 15 15 15 1 6
7 Situação do Piso 8 10 11 5 1 1 11 14 1 8
8 Obstáculos naturais 12 11 15 15 3 11 8 10 4 11
9 Estruturas de manejo 1 5 6 5 1 1 1 1 1 1
10 Sinuosidade da trilha 2 4 5 4 1 1 3 1 4 4
12 Impacto Humano 5 5 9 8 13 12 6 12 13 1
Total PAR-TM** 5,0 7,3 8,5 7,2 6,3 6,4 6,5 7,8 5,0 8,3
*O parâmetro 11 (proteção das bordas pela vegetação) está representado pela média das observações do
talude superior (TS) e talude inferior (TI).
** O Total PAR-TM é representado pela média de todos os parâmetros avaliados.
Considerações finais
Neste trabalho, foi apresentada uma das ferramentas existentes de
apoio à análise e à gestão ambiental ainda pouco explorada no Brasil: os Pro-
tocolos de Avaliação Rápidas (PARs). Foram apresentados os pressupostos da
sua criação e a estrutura para sua elaboração, por meio do estabelecimento
de parâmetros, seus significados e atribuição de suas pontuações, de modo
a divulgar o método e propiciar que o mesmo possa ser aplicado pelo leitor.
Buscou-se ressaltar a praticidade e a flexibilidade do PAR, que permite a
adição, subtração e/ou adaptação de parâmetros em função das característi-
cas do ambiente analisado e também do objetivo mais específico do trabalho.
A intenção aqui foi enfatizar a avaliação da integridade/qualidade dos aspectos
físicos do ambiente, observáveis in loco, como presença de vegetação nas mar-
gens, sua densidade e estado de preservação, sinais de erosão nas mesmas,
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Resumo
Nos últimos anos, devido aos Mega Eventos Esportivos, a Bacia Hidrográfica
de Jacarepaguá vem sofrendo um intenso processo de ocupação. Uma forma
de conhecer este processo consiste em elaborar o mapa de uso e cobertura
da terra e estimar a densidade demográfica efetuando o mapeamento da-
simétrico da distribuição da população. Destarte, este trabalho apresenta
um método para efetuar o mapeamento dasimétrico empregando dados
populacionais de setores censitários de 2010 e como dado auxiliar o mapa
de uso e cobertura da terra, obtido através da classificação supervisionada
de imagens de alta resolução usando método de máxima verossimilhança.
O mapeamento dasimétrico obtido representa de maneira mais realística a
distribuição espacial da população no espaço interurbano, abolindo os po-
lígonos de setores censitários que superestimavam a densidade demográ-
fica da região por terem localidades inabitáveis. O método empregado se
mostrou adequado distribuindo a população a cada 5 m de forma heterogê-
nea entre as classes de uso e cobertura da terra, representando 99,96 % da
população original.
Introdução
As transformações urbanas configuram-se em um importante desafio
para o século XXI, pois grande parte dos problemas ambientais e socioeco-
nômicos advém dos processos de expansão e, ao mesmo tempo, concen-
tração urbana, uma vez que estes acontecem de forma não planejada no
âmbito público. Compreender os padrões de ocupação do espaço e seus
significados socioeconômicos e ambientais é imprescindível para que ações
de planejamento urbano, no mínimo, atenuem esses efeitos. Entretanto,
para que isto ocorra de forma eficaz, informações acerca desses espaços e
sua população devem ser coletadas de modo a corresponder à realidade de
forma cada vez mais precisa.
No Brasil, as principais fontes de dados populacionais são os censos
demográficos realizados pelo IBGE. Estes são decenais e, por uma série de
questões, dentre elas a confidencialidade, a representação cartográfica é
efetuada por mapas coropléticos (valor por área) que assumem um valor
constante por toda área operacional do censo, o setor censitário. Este tipo
de representação gera distorções ao assumir que o valor dentro de um po-
lígono é constante mesmo que o comportamento real das variáveis não
obedeça a divisões administrativas e operacionais definidas de forma arbi-
trária (LANGFORD, 2004).
Por exemplo, o IBGE, ao traçar os limites de seus setores censitários,
considera o tipo de uso e cobertura da terra em superfícies desabitadas
como florestas e zonas estritamente comerciais. Desta forma, o mapa coro-
plético representando o total de pessoas por setor censitário no município
do Rio de Janeiro apresentado na Figura 1 causa uma distorção denomi-
nada Falácia Ecológica (EICHER; BREWER, 2001; FRANÇA et al., 2014) que se
dá devido ao fato de os limites dos setores serem artificiais e arbitrários e
possuírem tamanhos muitas vezes discrepantes entre si. Isso acaba fazendo
com que a análise seja enviesada, ocasionando perda de detalhes e especi-
ficidades (STRAUCH; AJARA, 2015).
Método dasimétrico
Um dos primeiro mapas representando a densidade populacional mun-
dial foi elaborado em 1833 pelo britânico George Poulett Scrope (1797-1876),
utilizando uma técnica dasimétrica rudimentar para delimitar com linhas de
espessura variável as regiões completamente povoadas, rarefeitas e inabita-
das da Terra (SCROPE, 1833).
Na literatura, a origem do termo e do método dasimétrico é citada
em versões conflitantes, mas, segundo França (2009), é esclarecido por
Petrov (2008). De acordo com Petrov (2008), foi o cartógrafo russo Veniamin
Petrovich Semenov-Tian-Shansky (1870-1942) quem descreveu a técnica em
um texto encaminhado à Sociedade Russa de Geografia em 1911. Entretanto,
muitos autores citam a origem russa do mapeamento dasimétrico mas falham
em creditar corretamente o autor, atribuindo o invento ao seu pai, o geógrafo
e explorador Petrovich Semenov-Tyan-Shansky (1827-1914), ou mesmo ci-
tando apenas o sobrenome (MAANTAY et al., 2007).
Tabela 1
População residente no município do Rio de Janeiro, segundo Regiões
Administrativas
Unidade Taxa de
1960 1970 1980 1996 2000
Territorial Crescimento
Rio de Janeiro 3 307 163 4 251 618 5 090 700 5 551 538 5 857 904 1,77
RA Jacarepaguá 164 092 235 238 428 073 446 360 469 682 2,86
RA Barra da Tijuca 2 580 5 779 98 229 129 632 174 353 67,57
Tabela 2
Área total licenciada
Unidade
2009 2010 2011 2012 2013 2014
Territorial
RA Jacarepaguá 1 005 359 1 230 806 893 011 1 064 947 954 973 875 989
RA Barra 864 521 669 910 1 516 213 2 087 729 2 241 264 891 244
AP IV 1 870 561 1 900 811 2 478 387 3 153 976 3 196 875 1 770 153
Total Rio de Janeiro 5 065 210 4 900 223 5 301 706 5 192 019 5 951 075 4 399 796
Materiais e métodos
O vetor de limite da bacia hidrográfica em questão foi obtido junto à
Fundação CEPERJ do Rio de Janeiro, e o vetor de limites das Regiões Admi-
nistrativas (RA) do município do Rio de Janeiro foi obtido junto ao Instituto
Pereira Passos (IPP).
O mapa de uso e cobertura da terra foi obtido por classificação super-
visionada de imagens do sensor RapidEye, que possuem resolução espacial
de 5m, adquiridas nos dias 24-07-2012 e 06-12-2012. Essas imagens foram
gentilmente cedidas a este trabalho pelo Instituto Brasileiro de Geografia e
Estatística (IBGE). O mosaico é apresentado na Figura 3 com a composição
colorida 3R5G1B.
Equação 1
B 121
520 A 22
C 377
1 2 3 4 5 6 7 8 9 10
Classe de População Fração de Nº pixels
Ʃ4 3*4 Ʃ6 6/7 2*8 9/4
ocupação agregada densidade da seção
A 0,1 25 2,5 0,04 22 0,88
B 520 0,3 45 140 13,5 58 0,23 121 2,68
C 0,6 70 42,0 0,72 377 5,38
Legenda
1. Classes de uso e ocupação do solo 6. Ponderação da área de cada classe de ocupação
do solo pela fração de densidade
2. População agregada a seção estatística 7. Somatório do item 6
3. Densidade populacional relativa a amostrada 8. Porcentagem de população a alocar a cada
para cada classe de uso e ocupação do solo classe de uso e ocupação do solo
4. Número de pixels de cada classe de ocupação 9. População a alocada por classe de ocupação
do solo na seção estatística do solo
5. Número total de pixels com função residencial 10. População atribuída a cada pixels
Uso e Setor
cobertura Reclassify Rdensity Join Vetorial
da terra
Poligon To
raster
Setor Setor
Total E
População Poligon To Popu2010
raster
Raster
Calculation
População
estimada por
célula
Figura 6
Fluxograma para validar o mapa dasimétrico
CdSetor
Zonal
Statistics PopCheck = Popu2010
F(SUM)
População
estimada
por célula
Tabela 3
Pixels amostrados por classe
Classes Pixels
Figura 7
Distribuição das amostras
Tabela 4
Área por classe em km²
Total
Classe A V UM UA PR A% V% UM% UA% PR%
Colunas
A 46 0 0 0 0 46 92 0 0 0 0
V 1 89 1 0 8 99 2 89 5 0 27
UM 0 0 13 1 0 14 0 0 65 2 0
UA 1 1 3 48 1 54 2 1 15 96 3
PR 2 10 3 1 21 37 4 10 15 2 70
Total Linhas 50 100 20 50 30 250 Total (%) 100 100 100 100 100
Mapeamento Dasimétrico
O método dasimétrico proposto por Strauch e Ajara (2015) pressupõe
uma ponderação do dado auxiliar de uso e cobertura da terra. Deste modo,
foram atribuídos os seguintes pesos para as classes, reclassificando-as e rea-
grupando-as em quatro classes, de acordo com os seguintes critérios:
ͫͫ Peso 0: para classe de Água e Vegetação, de modo a excluí-las do
processo;
ͫͫ Peso 5: para as classes de Pastagens e Descampados, devido à pos-
sibilidade de existência de pequenos contingentes populacionais
nessas áreas;
ͫͫ Peso 35: para a classe de Área Urbana de Média Densidade, uma
vez que a região apresenta muitos condomínios residenciais de ca-
sas e vilas; e
Quadro 1
Cálculos do total e das proporções de pixels para cada classe de uso e
cobertura da terra
total = value 5 + value 35 + value 60
p5 = value 5 / total
p35 = value 35 / total
p60 = value 60 / total
Equação 2
(Rdensity * popu2010 *5 *5) / (e * total)
Figura 9
Mapa dasimétrico da densidade populacional pelo método Strauch
e Ajara (2015)
Figura 10
Mapa coroplético: total de pessoas por setor censitário em 2010
Figura 11
Validação do mapa dasimétrico
Agradecimento
À Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro (Faperj)
pelo apoio financeiro.
Referências bibliográficas
ALVES, S. F. et al. Modelagem espacial para análise da densidade demográfica
na bacia do Córrego Cercadinho, Belo Horizonte/MG. EGAL, 2012.
Disponível em: http://observatoriogeograficoamericalatina.org.mx/egal12/
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CONGALTON, R. G. A Review of Assessing the Accuracy of Classifications of
Remotely Sensed Data. Remote Sensing Environment, v. 37, n. 1, p. 35-46, 1991
COSENTINO, R. Barra da Tijuca e o Projeto Olímpico: a cidade e o capital. 2015.
153f. Dissertação (Mestrado em Planejamento Urbano e Regional) – IPPUR –
UFRJ, Rio de Janeiro, 2015.
Introdução
O processo de urbanização do Estado do Rio de Janeiro, nos últimos 50
anos, foi reflexo da situação sócio-econômica do país, com migrações de ca-
ráter rural-urbano. No caso específico da Região Metropolitana do Rio de Ja-
neiro, os processos de ocupação dos municípios que a compõem não tiveram
a preocupação em preservar o ambiente, o que resultou na impermeabilização
destas áreas que ficam ao entorno da Baía de Guanabara. Todos esses fatores,
de maneira sinérgica, influenciam diretamente no escoamento superficial.
À medida que a população foi aumentando, ocorreu um aumento ex-
pressivo das vazões devido à impermeabilização do solo, às edificações, cana-
lização de rios, retirada da cobertura vegetal nas áreas de encosta, aumento
na produção de sedimentos de forma significativa, associada aos resíduos
sólidos, esgotos doméstico, industrial, além da colocação de revestimentos
asfálticos nas ruas e o aterramento das áreas de várzeas, resultaram em uma
modificação do regime hidrológico, que acarretou a redução da infiltração das
águas das chuvas e um aumento na velocidade do escoamento superficial.
A Região Hidrográfica da Baía de Guanabara não foge a esta regra e os
municípios que a compõem têm sofrido as consequências típicas das cheias
em bacias hidrográficas consideradas urbanas, resultado do processo de
urbanização. Estas cheias não são mais suportadas pelos canais principais
dos rios da bacia hidrográfica que a região se encontra e acabam resultando
em extravasamento, ocasionando inundações que muitas vezes implicam em
sérios impactos que afetam não só o meio natural, mas o homem e conse-
quentemente a qualidade de vida.
Esse recorte de bacia hidrográfica tem sido, assim, utilizado como
ferramenta administrativa e política para a gestão do espaço urbano por
constituir um sistema natural bem limitado no espaço, composto por um
conjunto de terras topograficamente drenadas por um curso de água e seus
afluentes, que vivem um acelerado processo de degradação ambiental,
sendo tratadas como unidades geográficas, onde os recursos naturais se
integram e ainda constitui uma unidade espacial de fácil reconhecimento e
caracterização (ALVES, 2004).
O presente trabalho trata essa questão ambiental urbana, da impermea-
bilização do solo, à luz de uma ferramenta de análise da densidade populacio-
nal em bacias hidrográficas da Baía de Guanabara, no estado do Rio de Janeiro,
para planejamento da cidade e reformulação/criação de planos diretores.
Objetivos
O objetivo do trabalho é estimar a área impermeabilizada das bacias
hidrográficas da Região da Baía de Guanabara, que sofreram diferentes pro-
cessos de urbanização, avaliar a aplicação do modelo proposto por Campana
e Tucci (1994) na estimativa da taxa de impermeabilidade em cada bacia hi-
drográfica da região da Baía de Guanabara e contribuir para o planejamento
urbano de bacias hidrográficas situadas em áreas que apresentam elevada
densidade populacional. Também avaliar a aplicabilidade do modelo para as
zonas de drenagem e para ilhas que compõem a região em estudo e, por úl-
timo, confrontar os resultados provenientes do modelo aplicado com mapas
de vegetação, uso de solo e das reservas e unidades de conservação.
Figura 1
Delimitação de uma Bacia Hidrográfica por Lencastre (1992)
Urbanização e impermeabilização
Em bacias onde a superfície do solo está em estado natural, a infiltração
depende da porosidade do solo, do tipo de solo, da cobertura vegetal e do
estado de fissuração das rochas (MARTINS, 1976).
O processo de urbanização acarreta significativas mudanças no escoa-
mento superficial, a partir do momento em que a quantidade de água que
antes infiltrava no solo passa a escoar pelos canais e condutos, devido à im-
permeabilização do solo, através de telhados, asfaltamento, calçamento de
ruas e calçadas, a construção de edificações etc.
Segundo Martins (1976), em locais onde há tráfego constante de ho-
mens ou veículos, ou em áreas de utilização intensa por animais, como por
exemplo, as pastagens, a superfície é submetida uma compactação que acaba
tornando-o relativamente impermeável.
Para Genz e Tucci (1995) os principais impactos que decorrem do de-
senvolvimento de uma área urbana sobre os processos hidrológicos, estão
ligados à forma de ocupação da terra, que geram um aumento das superfícies
impermeáveis em grande parte das bacias que se localizam próximas a zonas
de expansão urbana ou inseridas no perímetro urbano.
A urbanização intensifica as transformações do uso e ocupação do solo,
causando efeitos diretos sobre os recursos hídricos no meio ambiente antró-
pico. Como já dito, a impermeabilização dos solos promove sensíveis mudan-
ças nas respostas hidrológicas nas áreas urbanas, sendo os principais efeitos
o aumento e antecipação da vazão máxima do escoamento superficial e da
diminuição da infiltração, ocasionando inundações e alagamentos.
Os danos e prejuízos causados pelo desequilíbrio ambiental, em parte, é
atribuído ao crescimento desordenado das cidades, ao desmatamento, à des-
truição da vegetação ciliar, à deteriorização dos cursos de água e o mau uso
1 De acordo com a fundação CIDE (2000), a Região Metropolitana Fluminense é constituída por vinte muni-
cípios, a saber: Rio de Janeiro; Belford Roxo; Duque de Caxias, Guapimirim; Itaboraí; Itaguaí; Japeri; Magé;
Mangaratiba; Maricá; Nilópolis; Niterói; Nova Iguaçu; Mesquita; Paracambi; Queimados; São Gonçalo; São
João de Meriti; Seropédica e Tanguá.
Em que:
I = área impermeável
D1 = parcela da bacia com densidade habitacional < 50 hab/ha
D2 = parcela da bacia com densidade habitacional entre 50 hab/ha e 100 hab/ha
D3 = parcela da bacia com densidade habitacional superior a 100 hab/ha.
Equação 2
I = 0,54 * D ─ 4,936
Em que:
I = área impermeável
D = densidade média da bacia
Alves (2004) utilizou esta técnica para estimar a área impermeável den-
tro da bacia hidrográfica do Arroio Dilúvio (Porto Alegre/RS), afirmando que
este tipo de avaliação é uma aproximação da realidade, pois a distribuição
espacial da população não acontece de forma homogênea dentro de cada po-
lígono ou setor censitário.
Área de estudo
A Região Hidrográfica da Baía de Guanabara (RHBG) (Figura 2) está loca-
lizada entre os paralelos 22º24’ e 22º57’ de latitude sul, e entre os meridianos
42º33’ e 43º19’ de longitude oeste, incluindo o corpo hídrico da Baía de Gua-
nabara e abrangendo 17 municípios do Grande Rio, sendo eles: Rio de Janeiro,
Duque de Caxias, São João de Meriti, Nilópolis, Mesquita, Nova Iguaçu, Bel-
ford Roxo, Queimados, Petrópolis, Magé, Guapimirim, Cachoeira de Macacu,
Rio Bonito, Tanguá, Itaboraí, São Gonçalo e Niterói.
Figura 2
Bacias da Região Hidrográfica da Baía de Guanabara – RJ
Duque
465,70 772 327,00 3 129,00 775 456,00 99,60 1 665
de Caxias
São João
34,90 449 476,00 0 449 476,00 100,00 12 879
de Meriti
Cachoeira
900,70 41 117,70 7 426,00 48 543,00 84,70 54
de Macacu
Dados
Para calcular a densidade populacional e aplicar o método de CAMPANA
e TUCCI (1994) na área de estudo, utilizaram-se os seguintes dados:
ͫͫ CECA – Subdivisão e codificação das Bacias Hidrográficas da RHBG
em sub-bacias de 4º ordem, de acordo com a Resolução 804, defini-
das na deliberação CECA nº504, em 14 bacias;
ͫͫ SERLA – Superintendência de Rios e Lagoas. Atual, INEA (Instituto
Estadual do Ambiente);
ͫͫ Folhas Topográficas na escala de 1:50000, elaborado pelo IBGE
e DSG;
ͫͫ Base Cartográfica Planialtimétrica Digital, elaborado pelo IEF, a par-
tir da escala original de 1:50000;
ͫͫ Consórcio ECOLOGUS/AGRAR de 2005;
ͫͫ IMAGENS LANDSAT 7 de 2002;
ͫͫ Base Cartográfica Municipal disponível no banco digital do Instituto
Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) do ano de 2000;
ͫͫ Base Cartográfica com as informações por setor segundo o Censo
de 2000, realizado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatís-
tica (IBGE).
Aplicativos
Os dados censitários e municipais foram adquiridos pelo IBGE (Instituto
Brasileiro de Geografia e Estatísticas). Já os mapas de uso de solo e da divisão
das bacias da região foram disponibilizados pela Fundação Superintendên-
cia Estadual de Rios e Lagoas (SERLA), atual Instituto Estadual do Ambiente
(Inea). Estas camadas de informações foram processadas no programa ARGIS
versão 9.1, disponibilizado pelo Laboratório de Geoprocessamento (LABGEO),
no Instituto de Comunicação e Informação Científica e Tecnológica em Saúde
(ICICT), da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz).
Métodos
Para calcular a densidade populacional, os dados vetoriais de setores
censitários baixados foram trabalhados em ambiente de Sistema de Informa-
ção Geográfica. Foram realizadas as seguintes etapas:
1 - Cálculo da área de cada setor censitário;
2 - Cômputo da densidade populacional por setor censitário, habitantes
por hectare (hab/ha), em conformidade com a equação 1.
Fonte: Divisão Estadual e Municipal - Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE, 2000;
Bacias: Instituto Estadual do Ambiente - INEA, 2004 e Laboratório de Geoprocessamento da
FIOCRUZ/ICICT. Elaboração do Mapa: Roberta Egidio, 2009. Escala aproximada 1:500.000.
Resultados e discussões
Para a área em estudo, foi necessário unir as informações por setores
censitários que são dispostos por município, divididos em setores rurais e
urbanos. Assim, 11.528 setores urbanos e 145 setores rurais, juntos, com-
puseram 11.673 setores censitários da RHBG, e, destes, 102 setores se apre-
sentaram sem informação, divididos em 28 setores urbanos sem informação
e 74 setores rurais sem informação.
Figura 4
Setores rurais e urbanos da RHBG e a localização dos Setores Censitários
com população “zero”, segundo o censo de 2000 do IBGE
Área Densidade
Bacias Municípios
(Km2) (pop/hectare)
do Rio Guarai 29,36 0 Guapimirim e Itaboraí
do Rio Guapi–Macacu 1 250,89 10,34 Cachoeira de Macacu, Guapimirim.
Itaboraí, Magé, Petrópolis e Rio Bonito
do Rio Suruí 75,17 14,76 Magé
do Rio Roncador 110,7 19,91 Guapimirim, Magé e Petrópolis
do Rio Caceribu 822,38 31,36 Cachoeira de Macacu, Guapimirim.
Itaboraí, Niterói, Rio Bonito, Tanguá
e São Gonçalo.
do Rio Estrela 349,85 59,01 Duque de Caxias, Magé e Petrópolis.
Canal da Tomada 20,21 59,93 Duque de Caxias
do Rio Iguaçu-Sarapuí 699,43 127,12 Belford Roxo,Duque de Caxias,
Nilópolis, Nova Iguaçu, Queimados,
São João de Meriti, Mesquita e Rio
de Janeiro.
do Alcântara 145,4 184,59 Itaboraí, Niterói e São Gonçalo
do Rio São João de 167,07 203,17 Duque de Caxias, Nilópolis, São João
Meriti de Meriti e Rio de Janeiro
do Rio Imboaçú 29,09 211,66 São Gonçalo
do Irajá 17,4 218,6 Rio de Janeiro
Ilhas 41,58 237,66 Rio de Janeiro
Canal do Mangue 44,61 332,11 Rio de Janeiro
do Canal do Cunha 63,09 341,95 Rio de Janeiro
Zona de Drenagem 203,03 392,47 Duque de Caxias, Guapimirim,
Itaboraí, Magé, Niterói, Rio de Janeiro
e São Gonçalo.
TOTAL 4 068,94 2 444,67 17 municípios
Fonte: Censo 2000, Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE); Divisões das Bacias
Hidrográficas, Plano Diretor da RHBG, 2004.
Quadro 4
Índice de Impermeabilização das Bacias Hidrográficas da Baía de
Guanabara, segundo a metodologia de Campana e Tucci (1994)
Fonte: Dados de População _IBGE/Censo de 2000; Divisão das Bacias: CECA, SERLA/INEA, Esti-
mativa de impermeabilização de bacias hidrográficas, metodologia de Campana e Tucci (1994).
Figura 6
Taxa de Impermeabilização do solo na Região Hidrográfica da Baía de
Guanabara
Fonte: Fonte de Dados: Censo 2000, Divisão Estadual e Municipal - Instituto Brasileiro de Geo-
grafia e Estatística - IBGE, 2000; Índices – Campana e Tucci (1994), Bacias: Instituto Estadual do
Ambiente -INEA, 2004 e Laboratório de Geoprocessamento da FIOCRUZ/ICICT. Escala aproxi-
mada 1:500.000.Elaboração do Mapa: Roberta Egidio, 2009.
Ressalta-se que uma classe foi criada para a bacia do Guaraí, que apesar
de estar dentro da área de estudo da RHBG, não tinha informações censitárias
na forma desejada para a aplicação do método, e, por isso, está representada
na cor branca e na classe zero.
Legenda
Unidades de conservação
1- APA Tinguazinho 10- APA Estrela 19- APA de Gericino/Mendanha
2- APA Tinguá 11- APA Engenho Pequeno 20- APA da Pedra Branca
3- APA São José 12- APA dos Pretos Forros 21- APA da Ilha do Pinheiro
4- APA São Bento 13- APA do Varzea Contry Clube 22- APA da Fazendinha da Penha
5- APA Sacopã 14- APA do Morro do Valqueire 23- APA da Bacia do Rio Macacu
6- APA Rio D'ouro 15- APA do Morro da Saudade
7- APA Retiro 16- APA de São José Bacias
8- APA Morros da Babilônia e São João 17- APA de Petrópolis Municípios do RJ
9- APA Morro da Viúva 18- APA de Guapimirim
A terceira classe, que apresenta o ‘I’ com as mais altas taxas de imperme-
abilização, de acordo com o mapa da Figura 7, indica uma grande mancha de
alta densidade populacional, que ocupa a maior parte do território das bacias
deste bloco. Na bacia dos rios Iguaçu-Sarapuí, apresenta uma particularidade
Conclusões e recomendações
A relação entre área impermeável e a densidade populacional foi utili-
zada para calcular a porcentagem de área impermeável nas bacias hidrográfi-
cas ao entorno da Baía de Guanabara, conforme a metodologia descrita neste
artigo. Segundo ALVES (2004), este é um procedimento rápido para estimar
áreas impermeáveis em bacias urbanas, pois é feita através do cruzamento
das informações censitárias com as informações espaciais, com auxílio das fer-
ramentas do geoprocessamento.
Os resultados mostraram que a ferramenta é eficiente, apesar de
considerar a distribuição da população homogeneamente em cada setor
censitário, o que, na maioria das vezes, não ocorre. Os resultados também
apontaram as áreas mais impermeáveis onde o uso da terra era de alta den-
sidade de ocupação.
Para utilizar os dados de setores censitários na estimativa de áreas im-
permeáveis, deve-se considerar que determinados setores cruzam os limites
das bacias ou municípios, fazendo com que o pesquisador duplique a informa-
ção, já que não é possível estimar exatamente onde está localizado o morador.
As iniciativas de integrar os limites dos setores censitários com os de bacias
evitariam possíveis erros de duplicação dos dados de densidade populacional,
trazendo maior precisão ao método.
Referências bibliográficas
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Cidades. Dezembro, 1999b Brasília: Câmara dos Deputados. p. 37. Disponível
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ALVES, C. A. Estimativa da área impermeável dentro da bacia hidrográfica do
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Rio Grande do Sul, Rio Grande do Sul: UFRGS, 2004. 137 p.
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Urbano e Regional. Rio Claro: Laboratório de Planejamento Municipal –
Deplan – UNESP – IGCE, 2003.
BRASIL. Congresso. Senado. Lei n.º 9.433/67. Institui a Política Nacional de Re-
cursos Hídricos, cria o Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídri-
cos, regulamenta o inciso XIX do art. 21 da Constituição Federal, e altera o art.
1º a Lei nº 8.001, de 13 de março de 1990, que modificou a Lei nº 7.990, de 28
de dezembro de 1989. Brasília,DF.15 p. jan.1997.
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