USF EAD Língua Brasileira de Sinais Completo
USF EAD Língua Brasileira de Sinais Completo
USF EAD Língua Brasileira de Sinais Completo
2021
CASA NOSSA SENHORA DA PAZ – AÇÃO SOCIAL FRANCISCANA, PROVÍNCIA
FRANCISCANA DA IMACULADA CONCEIÇÃO DO BRASIL –
ORDEM DOS FRADES MENORES
PRESIDENTE
Frei Thiago Alexandre Hayakawa, OFM
DIRETOR GERAL
Jorge Apóstolos Siarcos
REITOR
Frei Gilberto Gonçalves Garcia, OFM
VICE-REITOR
Frei Thiago Alexandre Hayakawa, OFM
PRÓ-REITOR DE ADMINISTRAÇÃO E PLANEJAMENTO
Adriel de Moura Cabral
PRÓ-REITOR DE ENSINO, PESQUISA E EXTENSÃO
Dilnei Giseli Lorenzi
COORDENADOR DO NÚCLEO DE EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA - NEAD
Renato Adriano Pezenti
GESTOR DO CENTRO DE SOLUÇÕES EDUCACIONAIS - CSE
Fernando Rodrigo Andrian
CURADORIA TÉCNICA
Claudia Maria Poleti Oshiro
CURADOR INSTITUCIONAL
Fabiola Maria Mota da Costa de Souza
DESIGNER INSTRUCIONAL
Paloma Larissa Souza Guimarães de Lima
REVISÃO ORTOGRÁFICA
Bianca Reis Schmidt Simões
PROJETO GRÁFICO
Impulsa Comunicação
DIAGRAMADORES
Andréa Ercília Calegari
CAPA
Andréa Ercília Calegari
UNIDADE 1
1
CONHECENDO A LÍNGUA BRASILEIRA
DE SINAIS
INTRODUÇÃO
De acordo com a Lei de Diretrizes e Bases da Educação de 1996 (LDB) e a Política Nacio-
nal de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva de 2008, os estudantes
com deficiência, síndrome ou transtorno devem ser matriculados, preferencialmente, no
ensino regular. Foi a partir dessa política que a educação inclusiva começou no Brasil,
pois ela configurou o público que seria atendido e como deveria ser organizado esse
trabalho pedagógico. Também é preciso registrar que há uma discussão a respeito da
nova “Política Nacional de Educação Especial: Equitativa, Inclusiva e com Aprendizado
ao Longo da Vida” de 2020, que ainda está em discussão, com sua aprovação pendente.
Embora a política de 2008 preconize que alunos com surdez devem ser incluídos em salas
de aula do ensino regular, o que ocorre, no cotidiano escolar, é o contrário: pois então, as
políticas contribuem ou não para a inclusão? No contexto da sala de aula, há indícios de
que discentes com surdez têm professores que desconhecem o processo de ensino e de
aprendizagem que envolve as pessoas com surdez, principalmente sua história e caracte-
rísticas próprias, que fazem toda a diferença na organização do trabalho em sala de aula.
Apesar de toda a evolução pela qual o país passou em relação ao respeito e a aceitação
de todo e qualquer ser humano, ainda hoje acontecem situações em que as pessoas
com surdez precisam se adequar aos padrões da sociedade, ou seja, à sociedade ou-
vinte. Podemos apontar que o principal aspecto que vigora é tratar-se de uma socieda-
de ouvintista, então as pessoas que não estão “de acordo” precisam buscar alternativas
para se aproximar da norma.
Muitas vezes o ouvinte não percebe o quanto depende da audição em situa-
ções cotidianas, porém quando passa a viver em um “novo mundo”, conhe-
cendo o povo surdo e vivenciando algumas experiências em que essa de-
pendência não existe, ocorre o choque cultural (PEIXOTO et al., 2018, p. 32).
Peixoto et al. (2018, p. 32) explicam que somos tão acostumados a viver no mundo baru-
lhento que nem nos damos conta da importância que isso tem para nossas vidas, assim
como não refletimos acerca da situação que pode estar vivendo a pessoa que não escuta.
EXEMPLO
Ouvimos o som da televisão enquanto lavamos a louça ou fazemos a comida, ouvimos o
rádio enquanto limpamos a casa, trabalhamos e conversamos ao mesmo tempo, podemos
6
andar de bicicleta e falar com alguém que está nos acompanhando. Esses são alguns exem-
plos de ações simultâneas que nós ouvintes fazemos sem dificuldades e sem perceber que
são extremamente difíceis, ou até mesmo impossíveis para quem tem surdez.
1
Refletir e discutir sobre a aquisição da língua de sinais, tanto por crianças com surdez
quanto por crianças ouvintes, no ensino regular, é outra atitude de extrema importância,
para que futuros professores, psicólogos e outros profissionais tenham mais conhe-
cimento sobre área. E essa deve ser uma preocupação comum a toda a sociedade,
mesmo sem conviver diretamente com um surdo é importante conhecer e respeitar a
Língua de Sinais.
Nesta unidade, você vai estudar sobre: a apresentação da Libras no contexto escolar; mar-
cos legais, pedagógicos, educacionais e sociais relacionados à educação de pessoas com
surdez no Brasil; o ensino comum e o Atendimento Educacional Especializado (AEE); e a
aquisição de uma língua de sinais por crianças surdas e ouvintes no ensino regular.
Giodani (2012, p. 66) aponta a diferença como algo positivo, e não negativo, não com
o olhar da falta. Somos todos diferentes e nos constituímos por meio dessas diferen-
ças. Logo, uma pessoa usa óculos e outra não, uma pessoa é alta e outra não, uma
pessoa usa cadeira de rodas e outra não. Cada um de nós é diferente por seus gostos,
vontades e costumes, ou então por suas características físicas, intelectuais, sensoriais
ou sociais. Assim, quando olhamos a surdez por esse viés da diferença, favorecemos
a compreensão de que as pessoas com surdez se diferenciam dos ouvintes sim, talvez
pela comunicação, pelos aspectos culturais, pelo modo de agir ou simplesmente pelo
modo de ver o mundo, mas não por isso deixam de ser seres humanos.
Quanto ao conceito de cultura, Vieira e Peixoto (2018, p. 8) salientam que ela “[...] se
faz por um processo contínuo, resultado de uma interação entre os sujeitos, vemos que
a cultura de um determinado povo parte de cada um para então ser de um todo, pois
cada peça é fundamental para a sua construção”. Posto de outro modo, cada um de
nós compõe o grupo cultural do qual fazemos parte, seja ele de origem étnica, religiosa,
social, cultural ou outro.
Quando vivemos uma cultura, aprendemos os costumes e formas de viver, de pensar e agir
das pessoas que a compõem, e isso vai nos constituir como membros culturais.
A comunidade ouvinte tem seus costumes e hábitos permeados, em sua maioria, por
experiências auditivas, ao passo que a comunidade surda os tem por meio das experi-
ências visuais. Ambas se compõem de artefatos culturais muito parecidos, diferencia-
1 dos, em sua maioria, apenas pela forma de expressão e recepção das informações.
Além dessas diferenças, outra que se destaca é a língua utilizada pela comunidade. De
acordo com Giordani (2012, p. 71), “[a] comunidade de surdos se identifica essencial-
mente pela língua que usa”, língua essa que, juntamente com outros aspectos culturais,
vai auxiliar na construção da identidade surda. No caso do Brasil, usa-se a Língua Bra-
sileira de Sinais, também conhecida por Libras. Deve-se deixar claro que cada país tem
a sua língua de sinais.
Em complemento, Harrisson (2011, p. 54) frisa que “[...] a língua brasileira de sinais e a
língua americana de sinais (American Sign Language – ASL) têm como influência comum
a língua francesa de sinais”. Em outras palavras, os sinais usados no Brasil e nos EUA se
aproximam muito dos sinais franceses, mas apenas são parecidos, e não iguais.
Com o movimento da inclusão social e educacional, muitos aprendizes com surdez pas-
saram a fazer parte da escola regular, sendo necessário fazer algumas adaptações. Uma
das adaptações que mais se destaca diz respeito à língua utilizada por esse grupo, a
língua de sinais, que deveria fazer parte do currículo de todas as escolas brasileiras por
ser reconhecida como forma de expressão das pessoas com surdez (MACHADO, 2006).
IMPORTANTE
Inicialmente, é basilar compreender que há uma diferença entre surdez e deficiência audi-
tiva, de acordo com a quantidade de decibéis de audição que a pessoa tem. Isso influencia
na forma de se comunicar e de viver no mundo, pois muitas pessoas com deficiência auditiva
não fazem uso da língua de sinais, pois escutam um pouco e desenvolvem a leitura labial. Do
mesmo modo, algumas pessoas com surdez também não usam a língua de sinais para se
comunicar, pois também utilizam a leitura labial ou outras formas de comunicação. Logo, de-
pendendo da perspectiva, podemos ter dois pontos de vista a respeito da deficiência auditiva
e da surdez. Do ponto de vista orgânico, são sinônimos utilizados para se referir a qualquer
tipo de perda auditiva em grau leve, moderado, severo ou profundo, em um ou ambos os
ouvidos. Da perspectiva histórica e cultural, enfatiza-se diferentes modos de vivenciar as
diferenças de audição.
8
Essas experiências, mediadas por formas alternativas de comunicação simbólica, en-
contram na língua de sinais seu principal meio de concretização. Também, entende-se
ser uma realidade heterogênea e multifacetada, sendo que cada pessoa é única e cons-
truirá sua identidade a partir das suas experiências sociais e culturais. Dessa forma, 1
compreende-se que as pessoas com surdez têm direito a ter uma educação bilíngue,
É importante levar em consideração que o fato de ter uma deficiência auditiva não signifi-
ca que a pessoa vai fazer uso da língua de sinais, que vai vivenciar a cultura surda e nem
ter uma identidade surda. Tudo vai depender da forma como ela se percebe no mundo,
como ela se reconhece enquanto ser humano. A respeito das causas para a deficiência
auditiva, podemos dividi-las em três tipos, tal como explanada no Quadro abaixo.
Quadro 01. Causas da surdez
CAUSAS
` Virose, rubéola, sarampo, toxoplasmose, citomegalovírus (doenças infectocontagiosas).
` Consanguinidade.
` Exposição à radiação.
` Sofrimento fetal
Anóxia
Fórceps
` Sífilis, herpes
` Pré-maturidade, pós-maturidade
` Sarampo, caxumba e meningites
` Medicações tóxicas
` Traumatismos cranianos
Fonte: elaborado pela autora.
Conhecer essas causas não vai orientar a organização do trabalho pedagógico do pro-
fessor, porém, possibilita o entendimento do que pode ter mais comprometimentos ou
não em razão da causa da sua deficiência, fazendo assim com que o professor possa
1 buscar melhores estratégias de ensino e talvez ir por outros caminhos, mesmo que não
a língua de sinais.
Como destacado anteriormente, nem todas as pessoas com surdez/deficiência vão utili-
zar a língua de sinais para se comunicar. Essa “escolha” tem relação com o modo como
essas pessoas se percebem: com deficiência auditiva, usando aparelho e buscando por
meio da leitura labial sua forma de comunicação; ou então as com surdez que fazem
uso da Libras como forma de comunicação.
É essencial refletir também sobre as pessoas que possuem outras deficiências ou co-
morbidades associadas. No caso de uma deficiência física, por exemplo, essa pessoa
pode precisar de uma adaptação dos sinais, talvez por não conseguir realizar os movi-
mentos da forma “correta” por limitações do seu corpo. Em todos os casos são neces-
sários alguns cuidados por parte do professor.
EXEMPLO
No caso da pessoa que usa a leitura labial, o discente precisa estar sentado bem na frente
da sala, o professor precisa falar sempre deixando que o discente possa ver seus lábios, tam-
bém usar muito os recursos visuais em suas aulas. Já com a pessoa que usa Libras, o docen-
te também vai precisar de muitos materiais visuais, de um intérprete ou que ele mesmo saiba
sinalizar. Enquanto que, caso haja um discente que tenha deficiências ou comorbidades as-
sociadas, faz-se necessário reorganizar os sinais de uma maneira que ele possa realizá-la.
As pessoas com surdez já passaram por diferentes momentos ao longo dos tempos, e,
aos poucos, estão construindo e conquistando o seu espaço na sociedade, porém essa
não é uma tarefa fácil. Exige dedicação, paciência e muita persistência. Porém, também
exige que as pessoas ouvintes se coloquem no lugar delas, desenvolvendo a empatia
e o respeito ao próximo. Toda pessoa tem direito a aprender, mas é fundamental ter
alguém que ensine, e esse papel precisa ser desempenhado pela sociedade.
São as diversas condições sociais, econômicas, culturais, tecnológicas que
interferem na constituição de cada indivíduo. A partir de suas interações e
das condições que possibilitam essas interações, cada sujeito internaliza
formas específicas de se relacionar com os outros, com o meio e com ele
próprio (KRAEMER, 2012, p. 84).
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SAIBA MAIS
O processo de ensino-aprendizagem dos aprendizes com surdez é, sobretudo, um desafio
para os professores de escolares regulares, que devem agir por meio das orientações para 1
a educação inclusiva.
Até mesmo escolas e instituições que oferecem cursos na área e se dizem prepara-
das para atender a diferença, na verdade, não estão. Poderiam ser relatadas diversas
histórias de surdos em relação a esses espaços, mas é importante ao menos destacar
que ao mesmo tempo em que estamos evoluindo com novas descobertas e novas tec-
nologias, estamos deixando de lado o mais importante: o ser humano que precisa da
proximidade, do contato visual, do olho no olho para receber e expressar informações,
sentimentos, emoções ou desejos. Nesse sentido, são criados aplicativos que visam
o desenvolvimento tecnológico da comunicação, mas seus criadores e, por vezes, a
sociedade em geral se esquecem que a comunicação precisa ser feita entre pessoas, e
não com aparelhos (PAIVA et al., 2018).
O uso da língua de sinais parte do pressuposto da interação visual, isto é, os sinais são
produzidos e recebidos de forma visual ou tátil, no caso de quem não ouve e também
não enxerga, conhecidos como pessoas com surdocegueira. Por vezes, o ouvinte não
se dá conta de aspectos simples na comunicação, mas que fazem toda a diferença para
a pessoa com surdez. Por exemplo, a forma de sinalizar, a composição da frase e dos
falantes no espaço, a vestimenta e acessórios utilizados durante a comunicação.
Além da sinalização, a Libras possui uma forma de ser escrita, o sistema SignWriting.
Segundo Paixão e Alves (2018, p. 52), “[n]o Brasil, o sistema de escrita SignWriting
surgiu em 1996, porém, disputa espaço com mais dois sistemas criados aqui mesmo”.
A escrita de sinais segue os preceitos da língua de sinais. Esse sistema ainda é pouco
utilizado dentro da comunidade surda, visto sua complexidade, pois se faz necessário
desenhar o sinal com toda sua composição: configuração de mão, ponto de articulação,
movimento, expressão facial e corporal.
Expressão
Orientação da facial
palma da mão
Configuração
de mão
Movimento
Ponto de
articulação
Fonte: Barros (2020, p. 12).
Podemos compreender, assim, que a língua de sinais (no caso do Brasil a Libras),
constitui-se enquanto língua visuoespacial, que possui uma gramática própria, segue
cinco parâmetros que formam o sinal (as palavras) e tem um vocabulário que por vezes
é difícil de se traduzir para uma língua oral.
Seria legítimo pensar que é uma língua que surge espontaneamente quando
a pessoa nasce com uma perda auditiva, mas seria uma ideia errônea. Na
verdade, o termo “natural” designa a característica das línguas orais e sina-
lizadas utilizadas pelos seres humanos em suas diversas interações sociais,
e se diferencia do que se chama de “linguagem formal”, isto é, linguagens
construídas pelo ser humano, como as linguagens de programação de com-
putador ou a linguagem matemática (HARRISSON, 2013, p. 55).
Costuma-se assumir que a língua de sinais é uma língua natural. Dessa forma, a ideia
que vem junto é a de que a pessoa com surdez já nasce sabendo-a. Mas deve-se
atentar à necessidade de ensinar e trabalhar com a língua de sinais com a pessoa com
surdez em todas as faixas etárias de sua vida, assim como o ouvinte estuda e aprende
as regras do português durante toda a sua vida escolar.
A aquisição da Libras ocorre igual a das línguas orais: o ouvinte não precisa ir para a escola
para aprender a falar o português, mas sim para aprender suas regras e formas de uso.
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A fim de compreender um pouco mais sobre a organização da língua de sinais precisa-
mos pensar na língua oral. Ela acontece de forma sequencial no tempo.
As línguas de sinais, por outro lado, são produzidas por movimentos das mãos,
do corpo e expressões faciais em um espaço à frente do corpo, chamado de 1
espaço de sinalização. A pessoa “recebe” a sinalização pela visão, razão pela
Podemos afirmar que a educação de surdos teve início com o Abade Charles Michel de
L’Epée, por volta de 1750 na França. A partir dele, a língua de sinais francesa começou a
ganhar forma e a se constituir como uma comunicação utilizada pelas pessoas com sur-
dez. Inicialmente, foram atendidas mais ou menos 75 pessoas que passaram a aprender
a língua de sinais, por meio do método manual, com L’Epée (GOLDFELD, 2002).
5 anos mais tarde, ainda na França, a escolarização das pessoas com surdez teve iní-
cio com a fundação da primeira escola para pessoas com surdez. Começou de forma
gratuita e assim continuou até 1791, quando se transformou no Instituto Nacional de
Surdos-Mudos de Paris (hoje Instituto Nacional de Jovens Surdos de Paris).
Em 1778, na Alemanha, foi criada a primeira instituição de pessoas com surdez do pastor
Samuel Heinicke em Leipzig. Tinha-se como base fundamental para o ensino a Oralidade,
que logo será explicada. Já o Congresso Internacional de Educação de “Surdos”, no ano
de 1880 em Milão, na Itália, focou muito na deficiência auditiva (WITCHS, 2014).
SAIBA MAIS
Conhecer a Língua Brasileira de Sinais é mais do que entender como essa língua funciona e
se estrutura; precisa-se conhecer um pouco como se deu a história da educação de pessoas
com surdez no Brasil. Dessa forma, é válido ler o artigo “História da educação dos surdos
no Brasil”, de Nerli Nonato Ribeiro Mor e Ricardo Ernani Sander, no qual apresentam uma
importante reflexão sobre o tema.
1
Para ler o artigo na íntegra, visite: http://www.ppe.uem.br/publicacoes/seminario_ppe_2015/
trabalhos/co_04/94.pdf. Acesso em: 16 ago. 2021.
A educação de pessoas com surdez passou, ao longo da sua trajetória, por algumas
fases: oralismo, comunicação total e bilinguismo.
A intenção, nessa perspectiva, é tornar a pessoa com surdez mais próxima do ouvinte,
desenvolvendo habilidades que não são tão simples, uma vez que ela não escuta e,
assim, não recebe o retorno auditivo que precisaria para “falar”. Além do estímulo au-
ditivo feito com o uso de aparelhos auditivos e do implante coclear, idealiza-se que a
pessoa venha a desenvolver a fala para assim se comunicar com as demais pessoas
sem problemas ou dificuldades.
Outro período diz respeito à comunicação total. Nessa perspectiva, para além da lín-
gua oral, são necessários outros recursos que favorecem a comunicação da pessoa
com surdez. Ela surgiu na década de 1970, e foi uma alternativa ao oralismo. Faz uso
de todos os meios que possam facilitar a comunicação: fala, leitura labial, alfabeto ma-
nual, língua de sinais, desenho e escrita. Tem como objetivo auxiliar a compreensão da
língua falada, razão pela qual é vista, por muitos, mais como uma extensão do oralismo
do que como oposição ao mesmo.
14
A filosofia da comunicação total tem como principal preocupação os proces-
sos comunicativos entre surdos e surdos e entre surdos e ouvintes. Esta filo-
sofia também se preocupa com a aprendizagem da língua oral pela criança
surda, mas acredita que os aspectos cognitivos, emocionais e sociais não
devem ser deixados de lado em prol do aprendizado exclusivo da língua oral. 1
Por este motivo, essa filosofia defende a utilização de recursos espaço-vi-
so-manuais como facilitadores da comunicação (GOLDFELD, 2002, p. 38)
L1 – Língua de L2 – Língua
sinais portuguesa
Essa visão “[...] tem como pressuposto básico que o surdo deve ser bilíngue, ou seja,
deve adquirir como língua materna a língua de sinais, que é considerada a língua natu-
ral dos surdos e, como segunda língua, a língua oficial de seu país” (GOLDFELD, 2002,
p. 42). É no bilinguismo que a identidade e a cultura surda ganham cada vez mais força,
pois entende-se a pessoa a partir das suas escolhas, não só de língua, mas no jeito de
ser e viver.
Paixão e Alves (2018, p. 48) explanam que “[a] visão de que a comunidade surda é uma
minoria linguística é muito importante porque interfere no modo de lidar com a surdez,
sobretudo na educação e no modo de interagir com o surdo”. Hoje, no Brasil, ainda se
pode dizer que são poucos os ouvintes usuários da Libras, embora tenham sido criados
diversos cursos envolvendo o aprendizado dessa língua.
na área também são indícios de uma preocupação por parte de, ao menos, uma pequena
parcela da população.
1
Em complemento, Paixão e Alves (2018) ainda abordam o aspecto positivo da difusão
da língua de sinais e, consequentemente, de espaços ocupados por pessoas com sur-
dez, que antes eram destinados apenas a ouvintes. Hoje, por exemplo, ouve-se falar de
pessoas com surdez na faculdade, no mestrado e no doutorado, inclusive no mercado
de trabalho ocupando cargos de mais destaque, não só em funções de baixa remune-
ração, como acontecia.
Conviver com seus pares, com aqueles que compartilham da mesma forma de pensar,
que usam a mesma língua, que têm costumes muito parecidos é o que pode empoderar
a pessoa com surdez. Isso lhe dá status de integrante e participante de uma comunida-
de, da sociedade, e não apenas ser mais um, alguém que compartilha de um mesmo
espaço e segue todas as regras e convenções de pessoas que não compreendem seu
jeito de ser e agir (THOMA, 2012).
16
permanecer com os seus acaba por frequentar apenas escolas especiais de surdos,
clubes ou associações onde a sua língua é respeitada e tem o status de língua materna.
Essa discussão sobre a melhor escola que deveria ser frequentada pelos estudantes 1
com surdez é algo que está muito em pauta nos dias atuais. Isso porque existem os
defensores da escola inclusiva que apresentam os benefícios de estar nesse espaço.
SAIBA MAIS
Para quem tem interesse em aprofundar seus conhecimentos a respeito da Libras enquanto
instrumento de aprendizagem escolar, recomendamos a leitura do artigo de Andrea Guim-
arães de Carvalho e Renata Rodrigues de Oliveira García intitulado “Contexto escolar e o
ensino para surdos: a Libras como instrumento de educação e de identidade”. Disponível
em: https://www.revistas.ufg.br/revsinal/article/view/58737/34015. Acesso em: 16 ago. 2021
Ainda em relação aos aspectos sociais, “[o] próprio conceito de deficiência é um con-
ceito culturalmente formado. As crianças surdas não se sentem diferentes, a não ser de
um modo mediado, secundário, como resultado de suas experiências sociais” (GOLD-
FELD, 2002, p. 82). Posto de outro modo, é a partir das vivências socioculturais de cada
indivíduo que a diferença pode ou não ser percebida de forma mais intensa. À vista
disso, a comunidade surda se organiza em espaços onde diferentes aspectos da cultura
estão em evidência: festas, teatro, encontros e demais situações.
As comunidades surdas brasileiras criaram as associações com o objetivo
de reunir os surdos para se encontrarem e conversarem sobre diferentes
assuntos com fim social, político e esportivo. Nesses espaços, os surdos
encontram seus parceiros, casam e têm filhos. Essa grande família que se
une a partir de traços identitários, tais como ser surdo e usar a língua de
sinais, estabelece espaços que acolhe os surdos e consolida relações de
pertencimento (QUADROS, 2017, p. 23).
Entretanto, até o momento, não temos a língua de sinais enquanto forma de comunica-
ção de todos os espaços culturais e sociais, por exemplo, cinema, teatro, supermerca-
do, feira, área da saúde, escolas, clubes e outros tantos espaços em que as pessoas
costumam circular. Sendo assim, a pessoa com surdez precisa buscar formas para se
comunicar com as pessoas nesses espaços ou nem frequentar, pois a sua língua, na
maioria das vezes, não é utilizada por quem está lá.
De acordo com Quadros (2017, p. 33), a língua de sinais é considerada uma língua de
herança. Isso significa que ela é uma língua que “[...] é passada de geração de surdos
da comunidade (não necessariamente dentro do núcleo familiar) que é uma língua usa-
da por comunidades brasileiras dos grandes centros urbanos em um país”. Em outras
palavras, a língua de sinais precisa ser aprendida para ser ensinada, e vice-versa.
Essa lei passou a vigorar a partir do Decreto 5.626/2005, que indica que a Libras:
Discorre sobre as
Aborda a inclusão da
questões referentes ao
LIBRAS enquanto
acesso de educação
disciplina curricular
e saúde
Decreto 5.626/05
Aborda sobre a
Trata da formação do
formação do tradutor e
professor e do instrutor
intérprete de LIBRAS e
de LIBRAS
língua portuguesa
Apresenta diversos
aspectos sobre o uso
e difusão da LIBRAS e
do português para que
as pessoas com surdez
tenham acesso
à educação
18
Segundo apontam Paixão e Alves (2018, p. 49), no Brasil, existe “[...] um mito de que a
Libras é a segunda língua oficial desse país”, mas isso não é verdadeiro pelo fato que
os documentos e registros oficiais do país são todos feitos apenas na língua portugue-
sa. Portanto, a única língua realmente oficial do país é o português e a língua de sinais 1
fica sendo reconhecida como a língua da comunidade surda somente.
Existem muitas escolas brasileiras com as salas de recursos, entretanto, nem todas
possuem professores que possam atuar nesses espaços. Em alguns casos, os profes-
sores atuam nas salas, mas não possuem a formação necessária para usar os recursos
ou então atender aos estudantes da forma ideal. Há professores que trabalham com dis-
centes com surdez, mas que não sabem Libras, outros que trabalham com estudantes
com deficiência visual, mas não conhecem os recursos disponíveis e nem sabem como
lidar. Enfim, vivemos diferentes situações a respeito desses espaços tão importantes
disponíveis e nas escolas que nem sempre são usados de forma correta e proveitosa.
A partir disso, compreende-se que o estudante com surdez faz parte desse público a ser
atendido pelo profissional do AEE. É fundamental frisar a relevância do trabalho multidisci-
plinar e integrado, com plena participação da família para o bom desempenho dos planos
de atendimento especializados/individuais. Cada um deles tem sua finalidade e importância
dentro da organização de vida escolar do aprendiz com surdez, não só pensando na escola,
mas também nos diferentes espaços onde ele circula e que fazem parte do seu dia a dia.
Precisamos ter em mente que nem todo aprendiz com surdez tem somente a surdez, pois
é comum que se pense que “oferecer a língua de sinais” basta. Ou então, quando recebe-
mos um estudante com deficiência visual, apenas proporcionar o braille lhe dará todas as
condições necessárias para se desenvolver.
Muitos estudantes com condições diferentes de audição e visão, podem apresentar uma ou
mais deficiências associadas à sua condição, sendo necessário organizar o trabalho de uma
forma diferente. Nesses casos, é vital pensar em recursos e possibilidades de aprendizagem
para além do uso da língua de sinais. Portanto, o trabalho do professor do AEE se faz fun-
damental e a elaboração do Plano Educacional Individualizado (PEI) se torna indispensável.
SAIBA MAIS
Todo educador precisa conhecer e saber das leis e normativas que regem a área da edu-
cação especial. Faz-se necessário saber o que está previsto nesses documentos para as-
sim podermos “lutar” por melhores condições e pelos direitos das pessoas que necessitam.
Dessa forma, tanto a Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação
Inclusiva quanto a Resolução nº4 de 2009 são ótimas dicas de material extra de leitura.
Disponíveis em: http://portal.mec.gov.br/arquivos/pdf/politicaeducespecial.pdf e http://portal.
mec.gov.br/dmdocuments/rceb004_09.pdf. Acesso em: 16 ago. 2021.
Espera-se que o professor do AEE organize o seu trabalho de uma forma que possa
oferecer diferentes possibilidades ao discente. Com frequência, costuma-se trabalhar
com um Plano de Atendimento Educacional Especializado, conhecido também como
Plano Educacional Individualizado (PEI). Esse plano é considerado uma proposta de
organização curricular que norteia a mediação pedagógica do professor, servindo,
20
assim, como um registro ou mapeamento daquilo que o já alcançou e daquilo que
ainda precisa ser alcançado.
` Qual a deficiência que o discente possui? Como ela pode afetar seu desenvolvimento?
` O possui uma vida independente? Como ela se relaciona com outras pessoas?
Saber tais informações pessoais é importante e pode, com a elaboração do PEI, impac-
tar seu desenvolvimento. Assim, podemos pensar em quatro etapas para a construção
do PEI, conforme apresentado abaixo.
Pode ser relevante ter mais pessoas participando da elaboração do PEI, para além do
professor da sala regular e do professor do AEE, como ter a participação da família e
dos demais profissionais que o atendem, pois, essas pessoas participam ativamente do
ambiente educativo e conferem, consequentemente, respeito, segurança e afetividade
ao estudante. Isso porque ele não frequenta apenas a escola, já que a grande maioria
1 desses passos também podem ser desenvolvidos nos outros espaços de sua vivência.
Na primeira etapa, então, a família ocupa papel principal, pois são as pessoas que
passam a maior parte do tempo com a criança, jovem ou adolescente, possuindo assim
muitas informações pertinentes.
Nas etapas dois e três, além da família e da escola, pode ser interessante contar com
a presença de outros profissionais que o atendem, por exemplo, psicóloga, fonoaudió-
loga, terapeuta ocupacional, psiquiatra e outros profissionais. Cada um deles desem-
penha uma função no desenvolvimento do estudante, o que pode ser complementado
pela escola e vice e versa; o trabalho em rede proporciona um maior desenvolvimento
ao estudante com surdez. Tanto no estabelecimento de metas, quanto na elaboração do
cronograma, é preciso levar em consideração os avanços que o estudante já alcançou,
muitas vezes antes mesmo de ter ingressado na escola.
Na quarta etapa, pode ser necessário recorrer novamente à equipe, para que haja a
continuidade no trabalho; assim, deve-se fazer uma avaliação do que foi atingido, daquilo
que ainda precisa ser trabalhado e como será alcançado. Esse trabalho em rede é que
faz a diferença nas metas alcançadas, pois cada participante possui informações e co-
nhecimentos acerca da sua área, e, quando contribui com a equipe, favorece o discente.
IMPORTANTE
O PEI deve ser planejado para um ano e, por ser projetado a fim de atender as necessidades
de um discente, deve-se considerar suas dificuldades e suas potencialidades, é único, indi-
vidual. Outro aspecto a ser averiguado são as conquistas do ano anterior (no caso da con-
tinuidade escolar, aquilo que já foi alcançado de um ano para o outro).
O referido plano, embora muito conhecido como PEI, não possui uma nomenclatura
única, nem ao menos um único modelo. Mello (2019) apresenta algumas possibilidades
que encontrou em sua pesquisa de doutorado, a saber:
PEI – Plano Educacional Individualizado: Sassaki (1999), Tannús-Valadão
(2010, 2013), Glat, Vianna e Redig (2012), Pletsch e Glat (2013); PDEI – Pla-
no de Desenvolvimento Educacional Individualizado: Pletsch e Glat (2012);
PDI – Plano de Desenvolvimento Individual: Poker et al. (2013); PEI – Pla-
nejamento Educacional Individualizado: Tannús-Valadão e Mendes (2014),
Campos (2016) (MELLO, 2019, p. 81, grifos do autor).
Essa observação se justifica pelo fato de que, dependendo da escola, da rede, do mu-
nicípio ou do estado, a nomenclatura e o modelo podem ser diferentes, mas todos
eles têm o mesmo objetivo: organizar uma proposta curricular a ser executada com o
estudante. Costa e Schmidt (2019, p. 104) acrescentam que, no conceito do PEI, suas
diversas nomenclaturas “[...] envolvem os termos instrumento, recurso, registro, mapa,
estratégia, ferramenta, documento ou processo”. Embora haja muitas possibilidades,
todos possuem uma orientação comum: todos precisam de autorização dos responsá-
veis para que ele seja elaborado e colocado em prática.
22
Como os discentes, às vezes, precisam de outros suportes, para além da surdez para
dar conta de aprender e se desenvolver, faz-se fundamental o conhecimento das cau-
sas da surdez, conforme apresentado anteriormente, pois dependendo da causa, outros
comprometimentos podem existir. O PEI, de acordo Pereira (2014), pode ser tido como 1
um recurso que visa facilitar o acesso ao currículo regular; deve-se, assim, no momento
QUESTÃO DESCRIÇÃO
Priorizar as habilidades e conceitos do currículo geral que são mais relevantes para
O que ensinar?
o estudante, diante de suas necessidades.
Descobrir formatos de instruções mais relevantes às necessidades do discente,
Como ensinar? identificar quais estratégias, métodos e materiais alternativos devem ser usados
para ajuda-lo a desenvolver habilidades básicas ainda não adquiridas.
Pensar em contextos físicos que podem aumentar a participação do estudante,
Em quais otimizando seu aprendizado. Isso implica em variar os arranjos do contexto físico/
condições? instrucional, proporcionando oportunidades para trabalhar em isolamento e/ou em
grupo; flexibilizar o prazo de cumprimento das atividades
Compreender que o investimento nos estudantes gera avanços que podem ser
sutis e processuais. Para reconhece-los é preciso se desvincular do imediatismo
Por que ensinar?
e buscar estratégias colaborativas que possam atingir os objetivos traçados pela
escola, família e profissionais.
Fonte: adaptado de Pereira (2014, p. 52)
Cada uma dessas perguntas: o que ensinar, como ensinar, em que condições e
por que ensinar vai ajudar o professor e a equipe envolvida a pensar o que realmente
pode auxiliar o estudante. Também, o PEI vai ajudar o professor e demais envolvidos a
realmente conhecer o discente com quem estão trabalhando, quais os recursos e estra-
tégias que vão proporcionar um maior desenvolvimento, sempre respeitando o tempo e
as necessidades de cada um.
Escola:
Estudante: Ano/série:
Equipe de elaboração Período de elaboração:
ÁREAS DE HABILIDADE INTELIGÊNCIAS/METAS METODOLOGIA AVALIAÇÃO
E RECURSOS
Facilidade que o estudante DIDÁTICOS Registro de situações
apresenta para compreender o significativas no
conteúdo que será oferecido desenvolvimento do
discente
1. Habilidades
acadêmicas
(leitura, escrita,
1 soletração, matemática,
línguas)
2. Habilidades da
vida diária
(Vestuário, aparência,
organização de pertences
pessoais, lidar com
dinheiro, locomoção)
3. Habilidades motoras/
atividade física
(Coordenação olho-mão,
equilíbrio, natação, jogar
bola, andar de bicicleta)
4. Habilidades sociais
(Atitudes, comportamentos)
5. Habilidades de
recreação e lazer
(Jogos, esportes,
passeios)
6. Habilidades
pré-profissionais e
profissionais
(Seguir instruções,
uso de ferramentas,
organização do local das
atividades)
Fonte: adaptação do modelo de Romeu Kazumi Sassaki, 1999. The Individual Education Program (IEP), manual compilado
pela Northern California Coalition for Parent Training and Information (NCC), [s. d.]
O Quadro acima apresenta um modelo de PEI que pode ser usado no contexto escolar.
Qual é o sentido de ter um PEI, um Plano Educacional Individualizado que acontece
apenas com um profissional, uma vez por semana, de uma determinada maneira? Esse
questionamento deve estar presente nas discussões a respeito do tema, pois se o do-
cumento tem esse objetivo, ele acaba não sendo tão útil ao desenvolvimento escolar.
O PEI deve ser elaborado e executado nessa parceria, estabelecendo uma sintonia
entre o professor da sala comum e o professor da educação especial (MELLO, 2019).
Quando esse trabalho se organiza de forma articulada e colaborativa, as chances de
dar certo e se obter bons resultados ampliam muito.
Ainda há, contudo, muitos professores que pensam que para o discente com surdez
apenas é necessário oferecer o intérprete de Libras ou então o ensino de língua para
que ele dê conta de acompanhar o andamento das aulas. Em alguns casos sim, pode
ser que seja preciso somente isso, mas em muitas situações apenas essa tomada de
atitude não é suficiente para favorecer o seu desenvolvimento.
24
De acordo com Pereira (2014, p. 53), “[a] elaboração de um PEI pode ser uma oportu-
nidade importante para exercer um trabalho colaborativo entre professores, pais, estu-
dantes, funcionários e especialistas”, uma vez que ele não deve ser desenvolvido ape-
nas no espaço da sala de recursos ou então pelo professor do AEE, mas sim em todos 1
os espaços no quais o discente frequenta. O PEI vai oferecer informações de diversas
Conhecer as leis e normativas que regem o AEE pode garantir que o acesso e perma-
nência do estudante na escola aconteça de maneira correta e com todos os profissio-
nais necessários. Elaborar um PEI centrado no discente, em que ele seja o principal
ator do processo e seguindo as quatro etapas apresentadas para a construção desse
documento é necessário e fundamental.
Ter claro quais áreas serão trabalhadas, quais as metas a serem alcançadas, qual a
metodologia e os recursos didáticos a serem utilizados e como será feita a avaliação
faz com que o trabalho do professor e demais profissionais tenha um caminho a ser
percorrido e que todos tenham os mesmos objetivos a serem alcançados.
No caso dos estudantes com surdez, o primeiro passo do ensino comum e do AEE
acaba sendo o ensino da língua de sinais, pois muitos estudantes chegam sem esse
conhecimento prévio. “O ambiente mais adequado para que o surdo adquira inicialmen-
te a sua língua natural é o meio familiar. Entretanto, em ambiente não natural também
ocorre a aquisição de língua de sinais” (PAIXÃO; ALVES, 2018, p. 51). Assim, muitas
vezes a escola se torna o espaço onde o estudante com surdez vai aprender a língua
oficialmente, e o grande problema é quando isso acontece tardiamente, a partir dos 6
anos de idade com o início do ensino fundamental, por exemplo.
Quando o aprendiz com surdez chega à escola sem o domínio da língua de sinais, ele
precisa aprender a língua enquanto está se alfabetizando em português. É nesse momen-
to que costumam acontecer os problemas e atrasos de aprendizagem, pois o professor
em sala de aula não poderá apenas se preocupar em ensinar os conteúdos indicados
para aquele ano escolar, mas precisará paralelamente ensinar a língua a esse estudante.
Dessa forma, o trabalho do ensino comum e do AEE precisa estar em sintonia para que o
estudante não seja ainda mais prejudicado (PAIXÃO; ALVES, 2018).
Refletir sobre os conhecimentos que o aprendiz já possui é importante para que o pro-
fessor tenha conhecimento de que ter um discente com surdez em sua sala de aula
com a presença de um intérprete não significa que ele dará sua aula para todos os
1 estudantes da mesma forma; talvez o estudante com surdez precise de mais atividades
que também o auxiliem no aprendizado da língua para além do conteúdo escolar.
“Uma grande mudança dentro da escola seria a de que as crianças ouvintes também
aprendessem a Libras; os [discentes] ouvintes podem aprender a Língua de Sinais”
(STUMPF, 2008, p. 29). Esse é o maior sonho e objetivo de quem atua na área da sur-
dez: todas as pessoas, e professores, surdos e ouvintes aprenderem a língua de sinais
e se comunicarem sem ser necessário contar com a mediação de outra pessoa, no
caso, o intérprete. Não que esse profissional deixaria de ser importante, mas existiriam
situações em que não seria preciso ter o tempo todo alguém fazendo a tradução para
que houvesse a interação entre esses dois grupos.
A língua de sinais não é só da comunidade surda, mas é de todos. Quando isso aconte-
cer na escola regular, poderemos dizer que ela se tornou bilíngue e que respeita todos
que estão nesse espaço.
26
Paixão e Alves (2018) mencionam que a Libras se torna um importante instrumento de
interação para o desenvolvimento humano, sendo necessário dispor de diferentes es-
paços nos quais ela possa ser adquirida e aperfeiçoada pela criança. O primeiro lugar
para esse desenvolvimento seria a família, conforme já foi apontado. Porém, sabe-se 1
que a maioria das crianças com surdez nascem em famílias de pais ouvintes que não
Muitas crianças chegam à escola com essa forma de comunicação inicial: uso de sinais
caseiros (como são chamados os sinais combinados dentro do ambiente familiar), ou
então com o uso de gestos e mímica. Nesses casos, esses recursos precisam ser aper-
feiçoados e transformados numa comunicação formal, que é o que a Libras oferece.
O profissional da educação precisa estar atento a tudo o que acontece em sala de aula,
observar, anotar e refletir são ações básicas de qualquer professor, mas quando se tra-
balha com crianças que necessitam de mais recursos isso se torna fundamental. A partir
dos erros e acertos, é possível refletir e planejar quais seriam os passos necessários
para um maior avanço e desenvolvimento do sujeito.
EXEMPLO
No processo de ensino e de aprendizagem sobre o sistema solar, o professor poderia utilizar,
além de sua explicação falada, vídeos, imagens e até mesmo uma representação por meio
de maquete desse sistema solar, com sua composição espacial, suas especificidades. Isso
fará com que todos os estudantes abstraiam e compreendam o conceito de forma mais ráp-
ida e concreta.
Uma sugestão de trabalho que pode ser realizada em sala de aula com estudantes
com surdez e ouvintes, visando o aprendizado da língua de sinais, é o método de “ex-
periência”. O Método de Experiência vem como um recurso pedagógico, utilizado por
professores na aquisição da linguagem da criança com surdez, principalmente na fase
da Educação Infantil, mas que pode ser utilizado em outras etapas de aprendizagem.
Ele proporciona um ambiente estimulador por meio de pequenas práticas do cotidiano
da criança, como fazer um leite com chocolate, contar uma história ou uma atividade
inusitada que ocorre com ela.
É durante essas práticas, programadas ou não, que também a criança aos poucos
adquire a linguagem por meio de modelos linguísticos da sua língua materna, a Libras.
Podemos destacar como exemplos de experiências:
` Bolo de cenoura;
` Brincadeira;
` História;
` Passeio.
28
` Envolver a família nesse processo através da participação efetiva das crianças nas
atividades da escola.
1
Segue, no Quadro, um exemplo de “agendão”:
Retomando a experiência, ela deve ser realizada juntamente com a criança, de prefe-
rência ela própria é quem deve organizar os ingredientes e preparar a receita, no caso
de uma atividade culinária, por exemplo. Em seguida, é organizado um cartaz ou uma
folha com o registro dessa experiência.
Também deve ser feita uma cópia para que a criança possa levar para casa e organizar
o seu livro de receitas. Ou então seu livro de histórias, se for feito o registro de um pas-
seio, uma história ou uma brincadeira. Nesse registro, além do português escrito que
auxilia na alfabetização, deve-se usar o registro em sinais, para que quando o estudan-
te revisitar o material ele possa lembrar dos sinais que aprendeu.
EXEMPLO
A família é responsável por comprar e organizar os ingredientes. Porém, é fundamental que a
criança participe de todos os momentos, pois é nesse momento que ela irá compreender que
um alimento precisa ser comprado em um estabelecimento para ser utilizado. Pois, até esse
momento, ela acredita que o alimento surge na cozinha, surge no armário. Então ela precisa
participar de tudo, desde a compra dos ingredientes.
Um segundo passo fundamental para a receita é o registro, pois é a partir dele que a criança
terá na sua memória como foi feita a receita. O professor, juntamente com a criança, organi-
za, se possível, a utilização dos rótulos, de todos os ingredientes. Caso não consiga usar o
1 rótulo pode ser um desenho feito de próprio punho; também ao lado da receita e do desenho,
se possível, colocar o sinal da língua de sinais. Dessa receita é importante que seja feita uma
cópia, para que cada criança coloque no seu caderno de receitas, assim elas vão experien-
ciar um aprendizado diferente.
Esse material vai facilitar não só o aprendizado dos estudantes com surdez e ouvintes,
mas seus familiares também, pois vai para casa e pode servir de base para conversas
e momentos de trocas, quando o aprendiz ensina seus pais sua língua e a língua de
seus colegas.
Trabalhar com o ensino de uma língua não é somente ensinar vocabulário, ou seja,
palavras, no caso das línguas orais, ou sinais, no caso das línguas de sinais. A língua é
mais do que isso, precisa-se mergulhar e compreender aspectos culturais e socais que
compõem essa língua. Logo, deve-se atentar ao fato de que “[o] ensino de uma língua
envolve a conexão entre língua e cultura, a compreensão de um sistema complexo de
ideias, valores e costumes.” (GESSER, 2012, p.15-16, grifo nosso).
Ao trabalhar com o ensino de Libras, precisamos ter em mente também que existem
diferentes estilos de aprendizagens e que nem todas as pessoas seguem os mesmos
estilos. À vista disso, Gesser (2012) considera que tais estilos envolvem a visão, audi-
ção e cinestesia, e cada pessoa tem pelo menos um estilo que mais se destaca. É, por-
tanto, fundamental identificar qual é o melhor meio de se proporcionar mais situações
de aprendizagens, tal como estilos de aprendizagem.
Quadro 05. Estilo de aprendizagem
30
ESTILO FOCO DESCRIÇÃO EM LIBRAS...
Auditivo Ouvir e falar Engloba a transferência de ... pode ser relevante no
informação, por meio da escuta desenvolvimento do aprendiz
(a palavra falada ou outros sons de sinais se concebermos a 1
e ruídos). recepção e produção da Libras
na sua “oralidade visual”.
Além desses estilos apresentados acima, podemos frisar outros estilos de aprendiza-
gem, como: concreto, analítico, comunicativo e autoritariamente orientado. Cada um
deles possui suas características particulares e se tornam fundamentais para serem
compreendidos (GESSER, 2012). Aliadas aos estilos temos as estratégias de aprendi-
zagens, que são os modos como o professor organiza e aplica sua aula, favorecendo
ou não o desenvolvimento dos seus estudantes.
Quadro 06. Aspectos que devem ser levados em consideração no momento de ensino do vocabulário
em Libras
CONCLUSÃO
Nesta unidade, discutimos sobre a Libras no contexto escolar, sobre os aspectos culturais
e sociais que definem um grupo, no caso, a comunidade surda com seus costumes e a
formação da identidade surda. Destacamos a importância da Libras como um dos princi-
pais artefatos culturais dessa comunidade, mas que nem todas as pessoas com surdez
vão se identificar enquanto sujeitos surdos, membros da comunidade surda e usuários
da língua de sinais. As possíveis causas da falta de audição podem ou não trazer outros
comprometimentos que podem influenciar no aprendizado da pessoa com surdez.
E finalizamos com a discussão sobre a aquisição de uma língua de sinais por crianças
surdas e ouvintes no ensino regular, quais seriam os benefícios de ambos os grupos
terem a possibilidade de se desenvolver nessa língua o mais cedo possível.
32
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UNIDADE 2
INTRODUÇÃO
Dizer que o conhecimento parte de dentro do sujeito (visão inatista) ou que ele vem de
fora são concepções que polarizam o entendimento de ser humano e que ainda estão
presentes na educação. Por esse motivo, ainda há uma hegemonia frente ao “fazer do
professor”, que se alicerça em uma lógica de que o professor ensina e mecanicamente
o aluno aprende. Como se não houvesse uma relação humana entre eles, como se os
papéis (professor/aluno) não pudessem se misturar. Na busca por uma educação mais
humanizada, aposta-se na ideia de que o conhecimento é construído nas/pelas rela-
ções sociais, estabelecidas por meio da mediação do outro (professor, alunos entre si).
É importante frisar que, algumas vezes, as crianças são vistas como se fossem iguais
entre si e tivessem as mesmas condições de acesso aos saberes culturais e todas no
mesmo tempo. Em relação àquelas que têm alguma deficiência, com frequência, imagi-
na-se que a “falta” de algo no corpo significa a falta de tudo, como “se não possui visão,
não consegue aprender”, “se não possui audição também não consegue aprender” e
assim por diante. Mas, a partir de muitos estudos já se sabe que cada pessoa possui
uma forma de aprender e mesmo tendo uma deficiência, síndrome ou transtorno é pos-
sível, a partir das leis, que ocorram aprendizagens, desde que haja estímulo e sejam
proporcionadas situações em que isso possa acontecer.
Muito antes dos seis anos, as crianças já constroem alguns conhecimentos, antes
mesmo de entrar na escola, pela mediação da família, isto é, aqueles que se colocam
disponíveis para essa tarefa. Nesse contexto, muitas crianças sem deficiência podem
chegar à escola já com conhecimentos de mundo estruturados, já fazendo hipóteses
importantes sobre a leitura e a escrita, entre outros. Neste texto, refletimos a respeito
36
do conhecimento de língua, no caso a língua de sinais, que pode vir a proporcionar o
bilinguismo, que é o uso da língua de sinais e do português escrito.
Precisamos garantir “voz” para todas as pessoas; a todo e qualquer ser humano que 2
está ali, que quer aprender e se desenvolver, precisamos oferecer possibilidades para
que a aprendizagem aconteça. Independentemente do nível de conhecimento que pos-
Precisamos deixar claro que a Libras se configura como uma língua, pois possui todos os
elementos necessários para tanto, dentre eles as regras gramaticais. Com isso, perce-
be-se que cada país possui a sua língua de sinais, e, mesmo dentro de um mesmo país,
podem existir variações devido às questões regionais que também implicam em mudan-
ças. Se, na língua oral, vivenciamos isso, como não teríamos essa diferença na língua de
sinais? O que muda com a variação são os sinais e não a estrutura da língua, esta perma-
nece igual em qualquer parte do país, do mesmo modo que acontece com o português.
de sinais é o alfabeto, que também possui variação de país para país, ou seja, a con-
figuração de mão se modifica de acordo com a língua. Apresentaremos as imagens do
alfabeto em língua brasileira de sinais, língua gestual portuguesa, língua de sinais ame-
2 ricana e língua de sinais britânica. A principal diferença é que no caso dos três primei-
ros, ele é feito com apenas uma mão e no caso do britânico são usadas as duas mãos.
De acordo com Goés e Campos (2011, p. 71), “[...] o alfabeto manual é conhecido tam-
bém como alfabeto datilológico ou datilologia, com o qual é possível soletrar 27 diferen-
tes letras”, assim como o alfabeto da língua portuguesa que possui a mesma quantida-
de de letras. Abaixo podemos conferir algumas possibilidades de representação desse
alfabeto em diferentes línguas de sinais.
38
Figura 02. Língua Gestual Portuguesa (LGP)
Outro alfabeto que temos é o da língua de sinais escrita, conhecido como SignWriting,
ainda pouco utilizado como forma de registro pelas pessoas com surdez. Para que essa
escrita seja feita, existem algumas regras que a norteiam e precisam ser conhecidas por
quem vai tentar escrever. Para que possamos escrever em Libras é necessário repre-
sentar todos os parâmetros do sinal:
` Os Movimentos (M);
40
2
SAIBA MAIS
Se você tem interesse em conhecer mais e estudar sobre a escrita em língua de sinais, consi-
dere acessar o livro: Como escrever em Libras, de Ricardo Barros que traz muitos exemplos
de práticas e teoria.
De acordo com Quadros e Karnopp (2004, p. 47), a Fonologia tem como objetivo “[...]
determinar quais são as unidades mínimas que formam os sinais” e “[...] estabelecer
quais são os padrões possíveis de combinação entre essas unidades e as variações
possíveis”. Nesse sentido, ela se dedica a estudar a composição dos sinais.
A respeito dos parâmetros fonológicos que compõem a língua de sinais, Goés e Cam-
pos (2011, p. 73) afirmam que Stokoe, no ano de 1960, a partir de estudos, apresentou
três parâmetros que constituem os sinais, sendo eles configuração de mão (CM); ponto
de articulação (PA) ou localização (L); e movimento (M). Porém, com o avanço nos estu-
dos, entendeu-se que além desses três parâmetros, a língua de sinais possuía também
orientação de mão (OR) e expressões não-manuais (ENM), e sem a junção desses
cinco parâmetros era difícil ter um sinal completo; daí a importância que cada um tem.
Quando tratamos de configuração de mão, muitas pessoas acreditam que elas se res-
tringem ao alfabeto manual, mas isso não é verdade, pois temos mais CM do que letras.
Isso pode ser observado na imagem abaixo:
42
Figura 08. Configurações de mão
A locação se refere ao local em que o sinal é produzido no espaço, podendo ser produzido
na cabeça, tronco e/ou braços. Costumamos mencionar que temos um espaço para sina-
lizar e que ele deve ser respeitado para melhor compreensão por quem está vendo a sina-
lização. A orientação da mão indica como a mão se posiciona durante o sinal: para cima,
para baixo, virada para o corpo, virada para frente, para a direita ou para a esquerda.
Sobre as expressões não-manuais, enfatiza-se que elas são um dos aspectos mais
importantes, pois complementam o sinal e dão sentido a ele. Fazer um sinal sem utilizar
a expressão correta pode ocasionar o não entendimento de significado.
EXEMPLO
Vamos pensar no sinal de triste. Se você não fizer uma expressão facial e corporal indicando
tristeza, possivelmente, quem estiver vendo o sinal não compreenderá se você está falando,
realmente, que está triste, ou se está fazendo uma piada.
Componente lexical:
Quando abordamos a morfologia nessa área, Quadros e Karnopp (2004, p. 86) expli-
cam ser esse o “[...] estudo da estrutura interna das palavras ou dos sinais, assim como
das regras que determinam a formação das palavras”, ou seja, a partir de diferentes
aspectos é possível formar um novo sinal ou criar um a partir da união de outros.
Sobre a sintaxe, as autoras esclarecem ser esse o espaço no qual os sinais devem ser
produzidos, respeitando o uso do sistema pronominal e nominal (QUADROS; KARNOPP,
2004, p. 127). É possível posicionar pessoas e elementos no espaço e retomá-los durante
o discurso, sem ser necessário mencioná-los novamente, apenas usando um movimento
corporal ou o apontamento para o local onde ele foi posicionado anteriormente.
Se você olhar para uma comunidade linguística, vai notar que a língua é viva, dinâmica
e que pode sofrer modificações constantes no decorrer do tempo. A partir de todas as
considerações feitas até o momento, podemos perceber a importância de a língua de
sinais ser introduzida o mais cedo possível nos espaços em que a criança com surdez
está inserida, pois será com esse contato que ela poderá aprender e se desenvolver
nesse sentido. Mas, antes que a língua efetivamente seja aprendida, outro conhecimen-
to precisa ser adquirido e desenvolvido: a linguagem.
Desde o dia em que nasce, a criança está aprendendo diferentes coisas em diversos
contextos; tudo é aprendizado, que pode ser dividido em não-sistematizado e sistemati-
zado. O primeiro é aquele que acontece a todo o instante e em todo lugar, em que não
há uma sistematização para que ele ocorra; já o segundo poderia ser considerado como
aquele que acontece na escola, por exemplo, que se dá com uma intenção prévia, logo,
é sistematizado (VIGOTSKY, 2007).
Luria (2001, p. 27) frisa que “[...] a linguagem é um complexo sistema de códigos for-
mado no curso da história social” e tem a palavra como elemento principal que desig-
na as coisas, suas características, e nomeia ações e objetos. Além disso, as palavras
possuem a função de categorizar e de generalizar. Elas estão dentro do campo do
pensamento, pois podem ser utilizadas para referenciar não somente o que está pre-
sente, mas aquilo que está distante, que é abstrato. Isto é, somente o ser humano tem
a capacidade de referenciar pessoas e objetos sem que eles estejam presentes, por
meio da linguagem.
44
É importante destacar que, embora alguns animais consigam se comunicar entre si, a comunica-
ção mediada pela linguagem, com seus sentidos e significados, é exclusiva da espécie humana.
2
A linguagem é que permite a comunicação entre as pessoas e se torna a base para que
as aprendizagens aconteçam. A respeito disso, Fiorin (2013, p. 17) esclarece que “[a]
Podemos afirmar que existem diferentes tipos de linguagem e cada uma delas possui
uma finalidade, por um motivo. Dentre elas, podemos citar: linguagem oral, linguagem
espaçotemporal, linguagem sonoro-musical, linguagem gestual-corporal, linguagem do
jogo simbólico, linguagem visual e verbal, linguagem da natureza, linguagem escrita,
linguagem da higiene (JUNQUEIRA FILHO, 2013).
Outro conceito que precisamos abordar é a linguagem do jogo simbólico, do qual fazem
parte as brincadeiras de faz de conta, os jogos com regras estabelecidas, por exemplo,
memória ou dominó, e os jogos e brincadeiras no geral, como estátua, pega-pega etc.
Criar brincadeiras envolvendo objetos que não possuem uma característica específica,
tal qual um pedaço de madeira que pode se transformar em um carrinho de brinquedo
ou em uma mamadeira para a boneca, são atividades que exigem a leitura e a compre-
ensão do simbólico.
No tocante à aquisição da linguagem para a criança com surdez que vai utilizar a língua
de sinais, o processo é muito próximo do que acontece nas línguas orais. Pois a criança
ouvinte e a criança com surdez passam pelos seguintes estágios de aquisição: período
pré-linguístico; estágio de uma palavra; estágio das primeiras combinações e estágio
das múltiplas combinações.
O período de um sinal começa mais ou menos em 12 meses e vai até mais ou menos
2 anos de idade. Quando temos crianças com surdez, filhas de pais com surdez pode
começar aos 6 meses. Ele vai desaparecer com o uso do apontamento para indicar
coisas. (QUADROS, 1997).
2 O estágio das primeiras combinações vai iniciar por volta de 2 anos de idade. A crian-
ça costuma usar a seguinte ordem para elaborar suas frases: SV, VO e depois SVO (S =
sujeito, V = verbo, O = objeto), e pode apontar para o interlocutor querendo falar sobre
si, assim como os objetos são nomeados e referidos somente em situações do contexto
imediato, sem que seja possível retomá-los (QUADROS, 1997).
SAIBA MAIS
Para saber mais sobre o tema “Aquisição das línguas de sinais por crianças surdas”, assista
à live das professoras Aline Pizzio (UFSC) e Lodenir Karnopp (UFRGS), com a mediação
da Profa. Alessandra Jacqueline Vieira, na qual as docentes esclareceram muitas dúvidas a
respeito do assunto.
Diferente da linguagem, que pode ser utilizada tanto por animais quanto por humanos, a
língua é aprendida e utilizada pelos homens. As pessoas usam a língua, principalmente,
para trocar informações, interagir e representar o mundo. Há uma importante relação
entre linguagem e língua, pois a primeira é a base para o desenvolvimento da segunda.
A língua, enquanto integrante da linguagem, precisa de um repertório de signos para se
desenvolver. Ela é composta por sons, palavras e orações.
Figura 09. Definição de Língua
Uma língua é um conjunto de representações simbólicas do mundo físico e do mundo mental que:
(1) é compartilhado pelos membros de uma dada comunidade humana como recurso comunicativo;
(2) serve para a interação e integração sociocultural dos membros dessa comunidade;
(5) se manifesta concretamente por meio de um repertório limitado de sons emitidos pelo
aparelho fonador de cada indivíduo.
Fonte: adaptada de Bagno (2014, p. 22).
46
Costuma-se associar a língua à fala e, ao ponderar sobre o assunto, concebe-se uma
língua oral ou verbal. No caso das pessoas com surdez, a forma de comunicação mais
utilizada tem sido a língua de sinais, que não recorre à oralidade. A respeito disso,
Bagno (2014, p. 61) expõe que “[a]s línguas de sinais são sistemas tão complexos e 2
completos quanto as línguas faladas e, justamente por isso, são chamadas de línguas
Cada vez que vai se referir a um assunto, o emissor cria combinações de palavras
levando em conta sempre os fatores: contexto e saberes compartilhados entre os inter-
locutores. Quando a criança ainda não domina uma língua, usa diversos métodos para
se comunicar, transmitindo uma mensagem, uma intenção, um desejo ou necessidade
para quem está a sua volta. Na maioria das vezes, cabe ao interlocutor (receptor) com-
preender e até mesmo decifrar essa mensagem ou aquilo que se quer comunicar. Isso
costuma acontecer com a mãe e o bebê, quando ele usa apenas do choro para passar
as informações necessárias: fome, fralda suja, sono ou incômodo.
como isso acontece. Pois estamos tratando de duas línguas com características e es-
truturas que se diferenciam muito e, embora algumas pessoas tentem usá-las ao mes-
mo tempo, estudos apontam que isso não traz benefícios para quem está recebendo a
2 informação. Quadros (1997, p. 27) esclarece que ao refletir acerca do ensino bilíngue,
precisamos “[...] respeitar a autonomia das línguas de sinais e estruturar um plano edu-
cacional que não afete a experiência psicossocial e linguística da criança surda”.
A pessoa ouvinte terá a Língua Portuguesa como sua língua materna tanto na forma
oral quanto na escrita. Já a pessoa com surdez terá a língua de sinais como sua língua
materna e o português escrito como sua segunda língua. No primeiro caso, discorremos
sobre uma mesma língua com duas formas de representação, uma oral e uma escrita.
Já no segundo caso, abordamos duas línguas, uma gestovisual (a língua de sinais) e a
outra escrita (o português).
EXEMPLO
Podemos ter a seguinte escrita feita por pessoa com surdez (a escrita foi mantida como no
original, inclusive em relação à pontuação):
Como descobrir ficou surda, quando eu era bebê tinha 1anos passou febre alto perda auditi-
va, minha mãe me cuido me leve no hospital fique 2 anos meio morava hospital , daí médico
disse tua filha e surda não capaz e também falar muda , minha mãe não aceitava acredita
minha filha vai falar sim , pode escuta lutar futuro capaz sim , passou anos vida lutar foi mé-
dico faz fonoaudióloga fala , uso aparelho auditiva pra escutar melhor , foi muito difícil minha
vida , daí foi na escola especial nunca aprendi de português só lingual segundo Libras, minha
mãe percebe escreva horrível básico nunca aprende escreva boa , daí minha mãe sentar me
ensinar quero melhor escreva boa me apanhava castigo vai estudar quero teu bem futuro
passei sofri, mudei outra na escola inclusão surdos , começa na escola ensino médio , fique
3 anos estudar muito esforça escreva melhor português , graca a a Deus minha professora
português me ensinou foi muito difícil até fim agradeço minha professora recebe coração pa-
ciência muito vez me brigar , chata , faz trabalho entregar muito texto , todo dia queria me dá
bem por futuro . Um ano depois fiz curso administração também foi muito difícil há 2 anos tive
me preconceito pq minha voz diferente falar dificuldade me chama burra e não sabe escreva
, não capaz , faz coitar , eu passei sofreu chorei até também meu trabalho falta conhecimento
surdo , mas infelizmente grande muito preconceito até hoje , mas eu continuar lutar minha
vida “ Eu SOU CAPACIDADE ” não é coitado por causa “surda “ mostra quem é sou eu .., eu
tive depressão há 3 anos meio por que causa trabalho muito fazer me bullying , “ burra, fala
bobogem , não sabe ler , piada idiota , me chamou macaco louca , problema mental , nem
vai casar , não capaz mora sozinha , não capaz dirigir carro , não capaz sozinha sair lugar ,
não capaz trabalha , falta respeito , não é capaz , coita, lixo ...” é uma tristeza dor sofrimento ,
tentar levantar força , não foi fácil até hoje faz parte caminho no momento difícil, essa é meu
sonho administrativo, modelo mas triste preconceito não me respeita meus sonhos estragou
tudo minha vida , estou carregada faz parte levante a cima mostra “ CORAGEM “ capacidade
trabalho vários qualquer lugar pode trabalha sim não é coitada menos preconceito . Até hoje
.... mostra eu pode falar sim não é surda muda, eu posso escuta um pouco quero uso audi-
tiva aparelho pra escutar ser melhor capaz sim . Acredita sim !!!
O exemplo apresentado acima mostra um texto escrito por uma pessoa com surdez,
lembrando que foi mantido a forma original do texto, inclusive a pontuação. Precisamos
ter claro que a escrita da pessoa com surdez segue, em sua maioria, a sinalização, a
48
forma como a pessoa “fala”. Por isso, é indispensável de se trabalhar com o português
escrito constantemente.
Soares (2015, p. 15) explica que “[...] a aprendizagem da língua materna, quer escrita, 2
quer oral, é um processo permanente, nunca interrompido”. Dessa forma, compreen-
de-se que, ao longo de toda a vida, a pessoa vai aprender a sua língua materna, pois
Quando consideramos o ensino bilíngue para os alunos com surdez, precisamos sem-
pre ter em mente que o primeiro passo é aprender a língua materna; no caso daqueles
que vão se identificar com a surdez e fazer uso da língua de sinais, deve-se aprender a
língua de sinais. Em um segundo momento, será preciso aprender a língua portuguesa
na forma escrita, enquanto segunda língua, e esse aprendizado costuma não ser fácil.
Na verdade, qualquer língua tem seu grau de dificuldade durante a apren-
dizagem, da mesma forma que as línguas têm seu grau de complexidade
em sua estruturação. Sendo assim, podemos afirmar que todas as línguas
são difíceis ou fáceis, em um primeiro momento, em correlação com o nível
de distinções ou semelhanças possíveis com nossa própria língua materna
(GESSER, 2012, p. 70).
PARA REFLETIR
Quem ensina a língua portuguesa nas escolas? O professor que tem uma formação espe-
cífica em Letras. Todos os professores acabam trabalhando e fazendo uso do português, mas
quem ensina é o professor que estudou para isso. Quando pensamos no ensino da língua
brasileira de sinais, costumava-se falar que somente a pessoa com surdez poderia ensinar,
pois essa era sua língua materna e só ela tinha os conhecimentos necessários para isso. Mas
muito se evoluiu nesse sentido, e hoje entende-se que o professor que deve ensinar a língua
de sinais é aquele que tem formação para isso, não precisando ser uma pessoa com surdez,
mas sim ser formado e ter fluência na língua.
Planejar o ensino bilíngue para crianças com surdez não é uma tarefa fácil e intuitiva,
exige uma proposta baseada em técnicas e na compreensão de que o ensino da Libras
pode estar articulado a uma segunda língua. Para o trabalho educacional com vistas
ao ensino dessa língua, é indispensável que o professor saiba reconhecer quais habi-
lidades a criança já apreendeu da língua de sinais. Nesse processo, que é complexo e
que envolve reconhecer que existe uma cultura surda que impacta na aprendizagem,
marcam-se, de acordo com Quadros (1997, p. 30), duas possibilidades de trabalho: “[...]
uma delas envolve o ensino da segunda língua quase de forma concomitante à aquisi-
ção da primeira língua e a outra caracteriza-se pelo ensino da segunda língua somente
após a aquisição da primeira língua”.
Para que isso realmente aconteça, precisamos ter claro que uma escola bilíngue e um
ensino bilíngue só se caracterizam dessa forma quando há o trabalho com as duas
línguas, tendo para tanto um professor de Libras e um professor bilíngue. Ou seja, o
professor de Libras vai ensinar a língua de sinais e o professor bilíngue vai trabalhar
os outros conteúdos usando para isso a língua de sinais. Então, os dois profissionais
precisam estar em sintonia.
Tanto o português quanto a Libras se dividem em: social e acadêmico. Na prática, quan-
do temos a língua social, ela é aprendida e usada somente de forma social, para
conversar e interagir com as pessoas, não se tem uma preocupação em estudar suas
2 regras. Ela costuma estar presente nos contextos da família e outras situações cotidia-
nas. Já a língua acadêmica é aquela que foca o estudo das regras e da norma culta a
ser usada. Normalmente, esse aprendizado ocorre na escola, quando você aprende a
língua e aprende sobre a língua. Dentro das escolas, muitas vezes, encontramos alguns
tipos de professores:
I. Professores sem domínio da Libras usando sempre de intérpretes para mediar suas aulas
com os alunos com surdez;
II. Professores bilíngues fluentes em Libras, mas sem saber fazer uso da Libras como língua
de instrução;
III. Professores bilíngues fluentes em Libras sem saber a metodologia apropriada para
ensinar os alunos com surdez; e
Esses quatro tipos de professores representam a grande maioria dos que estão em sala
de aula, porém precisamos que isso mude, no sentido de compreender o que realmente
significa proporcionar um ensino bilíngue aos nossos alunos com surdez, seja em esco-
la especial para surdos ou em escola regular por meio da inclusão escolar. Isso só será
possível quando tivermos mais oferta de formação para os professores, lembrando que
isso está previsto nas leis que regem a educação no Brasil, tanto na Política Nacional
de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva de 2008, como também
na Lei Brasileira de Inclusão de 2015.
Para o aprendizado de uma língua são necessárias algumas habilidades: ouvir, falar, ler e
escrever. Quando você possui essas quatro habilidades, pode-se dizer que você é profi-
ciente nessa língua. Quando nos referimos à língua de sinais, essas habilidades permane-
cem, mas com outro foco: visão (ver), oralidade (sinalizar), leitura (ler) e escrita (escrever);
na verdade, a única que realmente muda é o falar, que passa a ser sinalizar (NOVER;
ANDREWS, 1998). Assim, percebemos o quanto elas se aproximam em características.
SAIBA MAIS
Para conhecer um pouco mais a respeito dessa organização do trabalho envolvendo a língua de
sinais, acesse o livro: Programa curricular de língua brasileira de sinais para surdos, de Neiva
50
de Aquino Albres, disponível em: https://libras.ufsc.br/wp-content/uploads/2017/03/2012-11-
ALBRES-e-SARUTA-Curriculo-LS-IST.pdf. Acesso em: 19 ago. 2021.
Esse material possui um conteúdo muito rico, com exemplos e sugestões de atividades que 2
podem auxiliar no momento de elaborar o trabalho pedagógico em sala de aula.
Podemos apontar o brincar como um exemplo para desenvolvimento social, e que pode
vir a ser acadêmico também. Isso porque, por intermédio do brincar, surgem as primei-
ras práticas discursivas, o que se dá quando a criança brinca de ler, desenhar ou com
os jogos de contar. Nesse momento, ela começa seu contato com o livro, por exemplo,
ela aprende a folhear, depois fala sobre as imagens e chega ao ponto de contar sua
história, imaginando a ação realizada pelos personagens, por meio das imagens. Logo,
[...] a alfabetização só tem sentido quando desenvolvida no contexto de prá-
ticas sociais de leitura e escrita e por meio dessas práticas, ou seja, em um
contexto de letramento e por meio de atividades de letramento; este, por sua
vez, só pode desenvolver-se na dependência da e por meio da aprendiza-
gem do sistema de escrita (SOARES, 2004, p. 97).
Para que haja esse contexto de alfabetização, o professor bilíngue vai trabalhar com
diferentes situações: ensinar outras disciplinas (matemática, história, ciências, entre
outras); atuar na alfabetização bilíngue de estudantes com surdez (que iremos abordar
mais no próximo tópico); e como reforço na alfabetização bilíngue, na tradução e inter-
pretação de texto. O aluno com surdez precisa perceber que existe uma conexão entre
as duas línguas, português e Libras, que é necessário haver compreensão de ambas
para que, assim, possa expandir e aprofundar as duas práticas com êxito.
Para que o trabalho bilíngue realmente aconteça é necessário trabalhar com as duas
línguas, português e Libras, diariamente, envolvendo diferentes habilidades estratégicas
de alfabetização: língua de sinais, letramento visual, datilologia (uso do alfabeto manual
para soletrar as palavras), leitura e escrita. Algumas pessoas se perguntam o porquê de
se trabalhar com a datilologia no ensino bilíngue, a resposta é simples: pois existe uma
forte ligação entre a ortografia e o desenvolvimento de vocabulário, assim como as habili-
dades de alfabetização para os alunos com surdez quando se trabalha com esse recurso.
Abaixo, seguem algumas estratégias que podem ser utilizadas para o ensino bilíngue:
` Para a alfabetização bilíngue pode ser o uso de ditado, seguindo essas etapas: soletrar
uma palavra da língua portuguesa (usando o datilológico), traduzir em Libras o texto im-
presso, escrever em português com as suas próprias palavras a partir do texto.
2
` Pode-se apresentar um resumo da história em Libras, ler a história traduzida de Libras
para o português e fazer uma revisão da história em Libras, apresentando ao professor
e colegas.
CONCEITO SINÔNIMOS
VOCABULÁRIO
O mapa dos vocabulários é mais uma importante ferramenta que pode ser utilizada para
o trabalho bilíngue em sala de aula e pode ser construído coletivamente ou de forma
individual pelos alunos. Tal instrumento favorece a escrita da palavra, seus possíveis
sinônimos, conceitos e exemplos de frases nas quais a palavra pode ser usada e o de-
senho de imagens. Além disso, esse mapa pode ser adaptado para trabalhar com ver-
bos, o uso de antônimos, o significado apresentado pelo dicionário e com mapa léxico,
ou então com palavras de acordo com um assunto. Por exemplo: roupas e acessórios,
roupas masculinas, roupas femininas.
Em geral, as crianças percebem uma palavra como um todo, não como partes que o
compõem; pelas propriedades gráficas e não auditivas. Assim, cada palavra se refere a
um sinal e não há imagem acústica. Por exemplo, “CASA” se refere ao sinal de “casa”,
e não à imagem “casa” (isso a respeito das palavras memorizadas pela criança). A pro-
pósito, Fernandes (2006, p. 8) sustenta que “[...] a constituição dos sentidos na escrita
pelas crianças surdas decorrerá de processos simbólicos visuais e não auditivos”.
52
Para que a alfabetização e o letramento realmente aconteçam em turmas regulares com alu-
nos surdos é importante aprofundar os dois assuntos e buscar possibilidades de se colocar
esse trabalho em prática.
2
O tempo todo nosso cérebro está recebendo informações que chegam de diferentes for-
Esses dois conceitos têm sido bastante estudados a fim de se saber quando eles come-
çam a fazer parte da vida da pessoa, podendo ser inclusive antes do nascimento, visto as
informações que se tem sobre a feto receber informações sobre o ambiente e seus pais,
passadas pela mãe. Ocorre, portanto, uma aprendizagem sensorial desde muito cedo.
A integração sensorial é o processo que organiza as entradas sensoriais
para que o cérebro produza uma resposta corporal útil, bem como emoções,
percepções e pensamentos úteis. A integração sensorial seleciona, ordena
e, em um determinado momento, une todas as entradas sensoriais em uma
única função cerebral (AYRES, 1998, p. 42, tradução nossa).
[a] criança deve lembrar se o “m” sobe ou desce e se “p” vai para a esquerda
ou para a direita. Esse conhecimento vem de um tipo de memória visual ou
muscular que é automática para a maioria das pessoas, mas se a atividade
do cérebro é desorganizada, a criança não consegue encontrar essas me-
2 mórias quando precisa delas (AYRES, 1998, p. 78, tradução nossa).
Para que a criança possa, assim, aprender e vir a ser alfabetizada, torna-se fundamental
que ela esteja com a integração sensorial “organizada”. e funcionando bem. Esse seria o
primeiro passo, mas também precisamos falar de alfabetização, conhecer um pouco da
sua história para entender as estratégias e possibilidades de se trabalhar em sala de aula.
Por muito tempo, acreditou-se haver necessidade de fazer uso de métodos ou metodo-
logias para alfabetizar as crianças, sendo assim, é importante mencioná-las. De acordo
com Soares (2015, p. 15), o significado de alfabetização em seu sentido específico é:
“[...] processo de aquisição do código escrito, das habilidades de leitura e escrita”. No
início do processo de alfabetização, alguns anos atrás, os educadores utilizavam carti-
lhas em suas salas de aula para alfabetizar os alunos. Essas cartilhas visavam alguns
métodos em específico, que iremos abordar para melhor conhecimento do leitor. Ao lon-
go dos tempos, a alfabetização passou por períodos com o uso de diferentes métodos,
que buscavam a “melhor” forma de ensinar a ler e a escrever. Podemos apontar como
exemplo os métodos sintéticos e os analíticos.
O primeiro método que surgiu no fim do século XIX foi o sintético, com a perspectiva de
trabalhar cada parte individualmente, iniciando pela menor parte, partindo da apresenta-
ção das letras, das famílias silábicas, até chegar à formação de palavras e, posteriormen-
te, frases e orações. Os métodos sintéticos trabalham a relação entre oralidade e escrita
– som e grafia –, e se desdobram em: alfabético, silábico e fônico, partindo de elementos
mínimos para o todo. Nesses métodos, as estratégias são organizadas a partir da percep-
ção auditiva, precisando de uma adequada discriminação dos sons. Acredita-se que, ao
associar letra e som, a criança consegue aprender a ler e a escrever.
Rangel, Souza e Silva (2017, p. 499) mencionam que, “[...] no método Alfabético, a
criança aprende o nome das letras nas formas maiúsculas e minúsculas, a sequência
do alfabeto e encaixa as letras entre si, formando sílabas ou palavras”. Já no método
fônico, “[...] o processo se dá de outra forma, em que a criança começa pelo som das
letras, unindo som da consoante ao da vogal, pronunciando a sílaba formada”.
Sobre o processo silábico ou de silabação, as autoras afirmam que “[...] a criança apren-
de a fazer a análise das sílabas, para formar as palavras. São propostas palavras-chave
em cartilhas com a finalidade de apresentar as sílabas e consequentemente formar as
frases” (RANGEL; SOUZA; SILVA, 2017, p. 499). Nesses métodos, as estratégias são
organizadas a partir da percepção auditiva, precisa-se de uma adequada discriminação
dos sons. Nos métodos analíticos, busca-se o reconhecimento global, partindo-se do
todo para a análise individual.
54
sentenciação, as autoras afirmam que o professor vai fazer uso da comparação, isola
as partes conhecidas da palavra para que a criança vá ampliando seu vocabulário.
Sobre o processo global, vai iniciar com histórias simples, separando em frases, depois 2
em palavras, sílabas, até chegar às letras (RANGEL; SOUZA; SILVA, 2017, p. 500). De
acordo com esse método, o processo ocorre ao contrário.
Por volta de 1980, inicia-se a perspectiva construtivista, a qual teria como base a psico-
gênese da aquisição da língua escrita, estudada com profundidade por Emília Ferreiro
e Ana Teberosky. Assim, não se teria a preocupação apenas com o aprendizado do sis-
tema de escrita (sendo grafema e fonema os maiores enfoques), mas sim seria carac-
terizado como um processo ativo, no qual a criança, desde o seu primeiro contato com
a escrita, fosse construindo hipóteses sobre o funcionamento e a natureza da língua
escrita, compreendendo-a como um sistema de representação.
Adotar o ponto de vista de métodos nos quais visão e audição, dentre outras habilidades,
figuram como pré-requisitos para a alfabetização, coloca as crianças que não apresen-
tam esses sentidos ou habilidades fora dessas possibilidades. Além disso, assim como
destaca Moll (1999), oferece ao professor uma justificativa para a não aprendizagem dos
alunos. Sob essa perspectiva, tal professor poderia dizer que seu aluno não aprende
porque não enxerga, não escuta, não caminha. Muitas vezes, esquece-se que há um
sujeito social com diferentes potencialidades e habilidades vivendo rodeado por pessoas
e imerso em uma cultura que pode ser diferente daquela à qual está acostumado.
Cada criança traz consigo conhecimentos de casa, mesmo que não sejam relativos a
como segurar um lápis ou manusear um livro. Cabe ao professor reconhecer e poten-
cializar esses conhecimentos, e não os indicar como insuficientes ou inadequados para
o ambiente escolar. Esse sujeito vivo está ali e pode não acompanhar o ritmo, mas é o
professor que deve lhe acompanhar (FERREIRO; TEBEROSKY, 2007).
A partir da década de 1990, com as pesquisas que atribuem o papel ativo do sujeito
na construção de seu conhecimento sobre a escrita e às teorias interacionistas de lin-
guagem, houve um redirecionamento metodológico nas práticas escolares. Inverteu-se o
método para o processo de leitura e escrita, que se torna “da parte para o todo”. Desse
modo, o caminho foi ampliado em direção às palavras e frases (e em alguns casos, tex-
tos), tendo-os como ponto de partida para a sistematização de sílabas, letras e fonemas.
Essa mudança epistemológica, no entanto, foi apenas aparente, pois a escolha de pala-
vras seguia obedecendo uma progressão fonética com o uso de frases descontextuali-
zadas e que não faziam parte do cotidiano do aluno, também usando ‘textos’ arranjados
para a sistematização de sílabas e fonemas pré-determinados pelo princípio fonético.
Percebe-se que não havia uma preocupação quanto a partir de conhecimentos que o
aluno já possuía ou dos seus interesses por assuntos.
Fernandes (2006) indica que a concepção de linguagem que se tem nessa perspectiva
percebe a língua como um instrumento de comunicação, sendo assim realizada pela
troca de mensagens entre um emissor e um receptor, podendo acontecer tanto na for-
ma oral quanto na forma escrita. À vista disso, é o aluno que precisa treinar e memorizar
o código da língua, organizado em formas fonéticas, lexicais e gramaticais. Essa língua
possui leis rígidas e imutáveis que precisam ser seguidas por quem a utiliza.
Mesmo que os professores se utilizem de textos como ponto de partida para o trabalho
e haja preocupação com suas condições de produção, com interesses e vivências do
estudante, a mediação do processo é realizada pela oralidade, e, na maioria das vezes,
não se busca o uso da língua de sinais para que isso aconteça e faça sentido ao aluno.
56
p. 10-11). Isso, por muito tempo, foi o que apenas acontecia nas salas de aula, mesmo
quando havia alunos com surdez que necessitassem de um trabalho diferenciado. Porém,
engana-se quem parte do pressuposto de que isso acabou. Precisamos seguir estudando
e compreendendo cada dia mais o que realmente significa o trabalho bilíngue, em busca 2
da alfabetização e do letramento dos alunos com surdez.
Quando analisamos o quadro acima, damo-nos conta de que, na maioria das vezes, a
metodologia utilizada pelos professores que são alfabetizadores pode ser um dos princi-
pais motivos pelo qual as crianças com surdez nem sempre conseguem se desenvolver
quanto à aprendizagem da escrita do português. Logo, o contato que elas vão ter com a
escrita acaba não sendo significativo, pois elas não conseguem perceber o mecanismo
da relação letra-som em razão de não ter o retorno auditivo, e assim começam a simples-
mente copiar o desenho de letras e palavras e se tornam ótimos copistas: sabem copiar,
mas não sabem o que estão copiando e nem para que serve (FERNANDES, 2006).
Para que haja uma constituição dos sentidos na escrita, que realmente seja compre-
endida pelos estudantes com surdez, é preciso proporcionar experiências simbólicas
visuais e não auditivas, trabalhando assim com o visual e criando situações em que se
possa construir significados que façam sentido. A língua portuguesa para as pessoas
com surdez se constitui como “[...] um conjunto de signos visuais materializados na es-
2 crita: aprender a escrita significa aprender a língua portuguesa” (FERNANDES, 2006,
p. 13). Posto de outro modo, a escrita e a língua precisam se constituir como um único
conhecimento e ser vivenciado por meio da leitura.
O professor bilíngue é quem deve fazer a mediação, utilizando para isso a associação
e contraste entre a língua de sinais e a língua portuguesa. Assim, as regras de uso
da língua (padrão real) seriam progressivamente apropriadas (FERNANDES, 2006). O
português para as pessoas com surdez é aquilo que elas veem/leem, e a leitura e escri-
ta devem estar atadas a todas as práticas sociais em que se encontram envolvidos os
estudantes com surdez, além das práticas escolares. A leitura demanda compreensão
do significado global do texto, situando-o em determinada realidade social, filiando-o a
determinado gênero discursivo e atribuindo relações e efeitos de sentido entre as uni-
dades que o compõem.
O português é para o estudante com surdez aquilo que se revela nas práticas
de letramento nas quais ele está inserido. Por isso, há que se considerar que
quanto mais diversificadas forem as experiências de leitura, maiores serão as
possibilidades de apreensão da língua em sua riqueza de variedades. Disso
resulta que a seleção dos textos nas práticas de letramento tenha como crité-
rio a abrangência de sua circulação social (FERNANDES, 2006, p. 13).
A seguir, apresentamos uma sequência de jogos e materiais que podem ser utilizados
tanto na alfabetização, quanto no letramento de alunos com surdez em diferentes ida-
des e diferentes contextos. Também, esses materiais podem ser utilizados com alunos
ouvintes tendo como objetivo o ensino da língua de sinais.
O jogo “memória da família” é composto por dois tipos de peças: uma que tem a pala-
vra escrita em língua portuguesa e outra que tem o sinal, representado em desenho. Os
participantes precisam embaralhar as cartas e colocar todas elas viradas para baixo; um
de cada vez escolhe uma peça para virar: se achar o par correto, a pessoa deve pegar as
duas peças, mas caso não acerte, deve virar para baixo novamente. Esse jogo foi criado
pensando no assunto “famílias”, porém, pode-se trabalhar com diferentes assuntos.
58
O jogo “montando a palavra” é muito usado no momento de alfabetização, quando
a criança está aprendendo as letras que compõem a palavra – neste caso, usando o
alfabeto manual. Normalmente, a criança que ainda não sabe ler e escrever toma o
desenho como base para organizar a palavra corretamente. Esse material se torna um 2
importante recurso quando se trabalha com a datilologia da palavra.
O material “alfabeto tátil” pode ser usado tanto no ensino do alfabeto manual, quanto
no do alfabeto tátil, pois ele permite que a pessoa que está segurando toque e sinta o
formato e a posição dos dedos.
Figura 15. Alfabeto tátil
60
Figura 16. Cálculos matemáticos
O jogo “Quem sou eu?” promove muita interação entre os participantes, pois cada um
deles fica com uma faixa presa na testa e uma mão com imagem fixada nela. Em cada
uma das mãos, existe o desenho de um animal. Um dos participantes inicia e faz per-
guntas ao outro a fim de identificar qual o animal que está preso na sua cabeça. Toda a
comunicação precisa ser feita usando a língua de sinais, então os participantes se veem
obrigados a recorrer a diferentes recursos que não sejam os gestos ou a mímica, pois
deixaria muito evidente qual é o animal representado.
A massinha de modelar pode ser usada durante a aprendizagem das letras do alfabeto
em português, seja na alfabetização, seja no letramento. O aluno consegue representar
essas letras por meio de um recurso tridimensional, já que pode pegá-las.
O jogo “bingo português Libras” é um dos primeiros jogos utilizados quando se está
iniciando o aprendizado da língua de sinais, pois é possível trabalhar com as duas
línguas em paralelo. As letras em Libras são sorteadas, a pessoa que está fazendo o
sorteio precisa reproduzir a letra com a mão e quem está marcando precisa encontrar
o correspondente em português, sendo que durante esse jogo é importante manter o
silêncio para que todos os participantes se concentrem ao máximo.
62
O material “formando palavras” costuma ser usado mais como um recurso pedagógi-
co e não necessariamente como um jogo, pois a ideia é olhar a palavra escrita na figura
e reproduzir sua escrita usando as letras na tampinha de garrafa pet. Pode-se propor
variações para esse jogo, por exemplo, ao invés de dar a figura com a escrita, é possível 2
que o professor faça um sinal e os alunos precisem escrever a palavra somente a partir
O jogo “roleta” pode ser usado de acordo com as necessidades do professor em sala
de aula, e o conteúdo pode ser organizado conforme a necessidade de se trabalhar
mais com a escrita, com o datilológico ou, então, com os sinais.
Figura 22. Roleta
Essas são apenas algumas possibilidades de jogos e materiais que podem ser utilizados
pelo professor ou profissional de outra área que vai trabalhar com o aluno surdo. É impor-
tante lembrar que os conteúdos e o que se deve abordar variam de acordo com as necessi-
dades do aluno e do professor. Quando se trabalha usando diferentes recursos, a interação
se torna mais rica e mais produtiva, pois os envolvidos se divertem enquanto aprendem.
CONCLUSÃO
Ao longo desta unidade, tratamos dos seguintes aspectos: a importância da Libras no
2 desenvolvimento da cognição e da linguagem em crianças surdas e ouvintes; o traba-
lho concomitante da Libras e com a Língua Portuguesa em turmas regulares que têm
alunos com surdez na construção de um bilinguismo para todos.
64
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
AYRES, Jean. La Integración Sensorial y el Niño. Tradução: Teresa Carmona Lobo. São Paulo: Trilhas,
1998. 2
BARROS, Ricardo Oliveira. Como escrever em Libras. 1. ed., São José: Ricardo Barros, 2020.
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novembro de 2011.
FERRONI, Giovana Mendes. Representações de brinquedos, relevos e descrição oral por crianças com
deficiência visual. 2016. 216p. Tese (Doutorado em Educação Especial) – Programa de Pós-Graduação,
Universidade Federal de São Carlos, São Carlos, 2016. Disponível em: https://repositorio.ufscar.br/handle/
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FIORIN, José Luiz. Linguística? O que é isso? São Paulo: Contexto, 2013.
FRANCIOLI, Fatima Aparecida de Souza. Métodos de alfabetização: o que diz a proposta pedagógica e o que
se faz na prática docente. In: SEMINÁRIO INTERNACIONAL DE REPRESENTAÇÕES SOCIAIS, 2., 2013,
Curitiba. Anais [...]. Curitiba: EDUCERE, 2013. p. 16186-16194. Disponível em: https://educere.bruc.com.br/
CD2013/pdf/7056_4106.pdf. Acesso em: 21 abr. 2021.
GESSER, Audrei. O ouvinte e a surdez: sobre ensinar e aprender a LIBRAS. São Paulo: Parábola Editorial,
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GÓES, Alexandre Morand; CAMPOS, Mariana de Lima Isaac Leandro. Aspectos da gramática da língua
brasileira de sinais. In: GÓES, Alexandre Morand et al. (Orgs.). Língua brasileira de sinais – Libras: uma
introdução. São Carlos: UAB-UFSCar, 2011. p. 65-82.
JONES, Raymond C. Vocabulary Word Map. Reading Quest Strategies, [S. l.], [s. d.]. Disponível em: https://
www.readingquest.org/pdf/wordmap_2.pdf. Acesso em: 19 ago. 2021.
2 MOLL, Jaqueline. Alfabetização possível: reinventando o ensinar e o aprender. Porto Alegre: Mediação,
1999.
NOVER, Stephen M.; ANDREWS, Jean F. Critical pedagogy in deaf education: Bilingual methodology and
staff development: Year 1 (1997–1998). Santa Fe: NewMexico School for the Deaf, 1998.
QUADROS, Ronice Müller de. Educação de surdos: a aquisição da linguagem. Porto Alegre: Artmed, 1997.
QUADROS, Ronice Müller de; KARNOPP, Lodenir Becker. Língua de sinais brasileira: Estudos linguísticos.
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RANGEL, Franciele de Azevedo; SOUZA, Emmily Cristina Firmino de; SILVA, Ana Carla de Azevedo. Métodos
tradicionais de alfabetização no Brasil: processo sintético e processo analítico. Revista Includere, Mossoró,
vol. 3, n. 1, p. 497-504, 2017. Disponível em: https://periodicos.ufersa.edu.br/index.php/includere/article/
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SOARES, Magda. Alfabetização e Letramento: caminhos e descaminhos. Revista Pátio, [S. l.], n. 29, p. 96-
100 2004. Disponível em: https://acervodigital.unesp.br/bitstream/123456789/40142/1/01d16t07.pdf. Acesso
em: 19 ago. 2021.
VIGOTSKY, Lev Semenovich. A formação Social da Mente. São Paulo: Martins Fontes, 7ª edição, 2007.
66
2
UNIDADE 3
INTRODUÇÃO
Conforme preconiza a lei nº 10.436/2002, os estudantes com surdez têm direito a ter
a Língua Brasileira de Sinais (Libras) como primeira língua (L1), e o Português escrito,
como segunda (L2). Para tais discentes, o aprendizado de conteúdos deve acontecer
a partir da L1, mas com a L2 enquanto forma de registro escrito. Por esse motivo, as
duas línguas precisam estar em evidência e serem trabalhadas o tempo todo com os
estudantes, de modo que eles possam se desenvolver e aprender as habilidades ne-
cessárias de uma pessoa bilíngue; já que utilizam duas línguas para o seu aprendizado.
No cotidiano escolar, vive-se uma situação em que a Libras precisa ser ensinada pelo
professor em sala de aula, principalmente no caso de pais que são ouvintes e seus fi-
lhos surdos. Se esses pais não conhecem ou dominam a língua, além da preocupação
com o conteúdo da disciplina, o professor terá a preocupação de ensino da Libras. Mas,
em casos em que o estudante chega na escola sem o conhecimento básico da L1, e
precisa ao mesmo tempo aprender essa língua e a L2, há um duplo trabalho de apren-
dizado: do conteúdo e da língua.
` Como o discente vai aprender a L1 e a L2 se não tem um professor que conheça ambas
as línguas e possa organizar seu trabalho de uma maneira a facilitar o aprendizado do
estudante?
68
` Como o intérprete poderá dar conta de passar as informações em Libras se o estudante
não tem o domínio dela para compreender o que está sendo dito?
3
Essas questões servem de motor para adentrarmos em um problema pontual quando
se pensa na educação de aprendiz com surdez sem a presença de um professor bilín-
Esses são alguns pontos que precisam de reflexão quando nos debruçamos sobre o
ensino e o aprendizado da Libras e da língua portuguesa para aprendizes com surdez,
tanto nas escolas de educação especial para estudantes surdos, quanto nas escolas
regulares, com a educação inclusiva.
É importante ressaltar que, por mais que o social seja essencial, ele por si só não garante
o aprendizado da língua, é necessário que o sujeito se relacione com o outro, que a cul-
tura humana (como a Libras e o português) sejam mediados por esse outro, o homem.
SAIBA MAIS
Você sabia que Almeida e Valeirão (2015) defendem que o ser humano quando nasce já sabe
e reconhece os objetos e suas funções, ou seja, ele já tem essas aprendizagens “dentro de si”
3
e está pronto para usar?
Se você tiver o interesse em ler mais sobre o assunto, acesse o livro Fundamentos
Psicológicos da Educação. Disponível em: https://wp.ufpel.edu.br/nepfil/files/2019/02/3-
fundamentos-psicologicos-da-educacao.pdf. Acesso em: 8 nov. 2021.
A língua não é uma função humana inata, ela é adquirida na relação social entre os
homens e a partir de determinada cultura. Com a aquisição da língua, se adentra na
dimensão do conhecimento de mundo, que se refere, por exemplo, a conceitos básicos
para viver em sociedade: saber o nome de um objeto, no caso o copo, e saber sua fun-
ção social, serve para tomar água, para tomar chá ou café.
Nem todas as pessoas, porém, chegam à aquisição de uma língua, seja oral ou sinaliza-
da, algumas permanecem apenas se expressando e recebendo “informações” a partir
do uso de objetos, de apontamentos, olhares, imagens, sem que tenha uma língua
propriamente dita por trás disso. Por isso dizemos que a aquisição da língua depende
da linguagem, mas a linguagem não depende da língua.
IMPORTANTE
70
Língua: De acordo com Bagno (2014), há relação entre linguagem e língua, pois a primeira
é a base para o desenvolvimento da segunda. A língua, enquanto integrante da linguagem,
precisa de um repertório de signos para se desenvolver. Ela é composta por sons, palavras
e orações. 3
Tornar-se alfabetizado por meio da Libras, em um mundo histórico e cultural, é tão impor-
tante quanto se alfabetizar com a leitura e a escrita, ou seja, com os códigos alfabéticos.
Depois de toda essa discussão, precisamos nos focar no conceito de alfabetização.
Alfabetização pode ser entendida, então, como a aquisição das habilidades
de ler e escrever – ou seja, é o momento em que o sujeito se apropria
da versão codificada em sinais gráficos da mesma língua que ele já
utiliza apenas em sua versão codificada em sinais orais. O ponto central
e para o qual convergem todos os esforços empenhados no processo de
alfabetização é a aquisição deste conjunto de sinais gráficos, já que eles
estão presentes em inúmeras situações do dia a dia e é necessário saber
reconhecê-los (KOERNER, 2010, p. 21).
E é aí que precisamos discutir outro conceito que pode nos ajudar a entender o que
acontece, o conceito de letramento. De acordo com Soares (2021) o termo letramento
vai surgir com o entendimento de que não precisamos somente aprender o código alfa-
3 bético da escrita e da leitura, mas também como utilizá-los em práticas sociais.
Partir da realidade do estudante, daquilo que ele tem contato e pode realmente fazer
sentido. Dessa maneira, Rojo (2009) aborda a importância de buscar os conhecimentos
locais e globais e apresentar ao discente, para não trabalhar somente com aquilo que
ele já conhece sem ao menos dar oportunidades de ampliar suas aprendizagens.
A partir desses dois conceitos: alfabetização e letramento, podemos afirmar que, por
muito tempo, o conceito e a forma de trabalhar que prevaleceu nas escolas foi a al-
fabetização, sendo usado para isso cartilhas e alguns métodos, como o sintético e o
analítico já abordados na unidade anterior. Em seguida, surge a visão de letramento
que vai ter o aprendizado da leitura e da escrita a partir de práticas sociais, vivências e
experiências que o discente tem.
Com base nos conceitos separados, acabou surgindo outra visão, por vezes controver-
sa, por vezes conciliatória
[...] como resposta à questão dos métodos, que, em sua dimensão pedagógi-
ca, isto é, em sua prática em contextos de ensino, a aprendizagem inicial da
língua escrita, embora entendida e tratada como um fenômeno multifacetado,
deve ser desenvolvida em sua inteireza, como um todo, porque essa é a na-
tureza real dos atos de ler e de escrever, em que a complexa interação entre
as práticas sociais da língua escrita e aquele que lê ou escreve pressupõe o
exercício simultâneo de muitas e diferencias competências. É o que se tem
denominada alfabetizar letrando (SOARES, 2021, p. 35, grifos da autora).
Agora você deve estar se perguntando por que abordamos tudo isso para então começar a
discutir e falar sobre a alfabetização e o letramento da criança com surdez? A resposta é que
precisamos compreender como se dá o processo com o ouvinte para que possamos pensar
como pode e deve ser organizado o trabalho pedagógico que vise a alfabetização e o letra-
mento do aprendiz com surdez. Entendendo cada uma das duas propostas e pensando em
formas de tornar esse aprendizado coerente e com sentido para o estudante usar uma língua
que não tem a oralidade em sua estrutura.
72
Mas seria possível, ao refletir sobre a consciência fonológica, pensar esse assunto vol-
tado para os estudantes com surdez, uma vez que a Libras não tem o som como uma
característica da língua? Sim, pois, enquanto língua, a Libras também possui regras e
especificidades fonológicas. 3
Fonologia das línguas de sinais é o ramo da linguística que objetiva identifi-
William C. Stokoe, por volta de 1960 e 1970, pesquisou sobre a língua de sinais americana
e encontrou três parâmetros que formariam os sinais: configuração de mão (CM), locação
da mão (L) e movimento da mão (M). Porém, a partir de outros estudos foram acrescenta-
dos mais dois parâmetros: orientação de mão (Or) e expressões não-manuais (ENM).
01 02 03 04 05
06 07 08 09 10
11 12 13 14 15
16 17 18 19 20
21 22 23 24 25
26 27 28 29 30
31 32 33 34 35
74
36 37 38 39 40
46 47 48 49 50
51 52 53 54 55
56 57 58 59 60 61
A partir das imagens do Quadro acima, podemos destacar que as letras do alfabeto
também são representadas pelas configurações de mão, assim temos:
A: 1 B: 53 C: 29 D: 16 E: 8 F: 46 G: 15
3 H: 50 I: 5 J: 5 K: 50 L: 38 M: 52 N: 33
O: 22 P: 50 Q: 15 R: 34 S: 7 T: 47 U: 33
V: 50 W: 51 X: 13 Y: 4 Z: 14
Fonte: elaborada pela autora.
Em seguida temos a locação (L) também conhecida como ponto de articulação (PA) que
é o espaço de enunciação na Libras. Envolve o espaço em frente ao corpo da pessoa
ou uma área do corpo onde são produzidos os sinais.
Cabeça
Mão
Braço
Tronco
Espaço
Fonte: Quadros e Karnopp (2004, p. 57).
A imagem acima apresenta o espaço que a pessoa deve usar enquanto está sinalizan-
do, ou seja, precisamos respeitar para que o receptor da mensagem consiga acompa-
nhar os sinais e compreender a mensagem que está sendo repassada. Se passamos
muito desse espaço (abaixo da linha da cintura e acima da cabeça), corremos o risco de
comprometer a sinalização e dificultar para quem está recebendo a informação.
76
Quadro 02. Categorias do parâmetro movimento
Direcional
Unidirecional: para cima, para baixo, para direita, para esquerda, para
dentro, para fora, para o centro, para lateral inferior esquerda, para lateral
inferior direita, para lateral superior esquerda, para lateral superior direita,
para específico ponto referencial;
Bidirecional: para cima e baixo, para esquerda e direita, para dentro e fora,
para laterais opostas – superior direita e inferior esquerda;
Não-direcional
E em relação à FREQUÊNCIA:
Repetição
3 Simples;
Repetido.
Outro parâmetro se refere a orientação de mão (Or), ou seja, a direção para a qual a
palma da mão aponta na produção de um sinal. Temos as seguintes direções possíveis:
Quadro 03. Orientação da mão
78
3
E passamos então para as expressões não-manuais (ENM) que se prestam dois pa-
peis na língua de sinais: (I) marcação de construções sintáticas e (II) diferenciação dos
itens lexicais. Sobre a função sintática, podemos dizer que eles marcam sentenças
interrogativas sim-não, orações relativas, topicalizações, concordância e foco. E como
componente lexical eles marcam referência específica, referência pronominal, partícula
negativa, advérbio, grau ou aspecto. As marcas não-manuais possuem peso linguístico
nos itens lexicais das línguas de sinais.
Quadro 04. Algumas expressões faciais
APAIXONADO SONOLENTO
Fonte: acervo pessoal.
HOJE AGORA
Fonte: acervo pessoal.
O sinal “hoje” é produzido com dois movimentos sequenciais. Já o sinal “agora” é produ-
zido com um único movimento rápido indicando a intensidade. Essa é a única diferença
entre os dois sinais: o movimento, pois ambos são feitos com a mesma CM, a mesma
Or, a mesma ENM e mesma L, tendo somente o M diferente.
80
nos ajudar a ampliar os conhecimentos. Inicialmente, conheceremos o alfabeto, que no
caso do Brasil é feito com apenas uma mão (a que for dominante).
As pessoas que são destras, ou seja, usam a mão direita para realizar a maioria das 3
ações, farão seus sinais usando essa mão, já as pessoas que são canhotas, usarão a
mão esquerda. Percebe-se que em algumas situações, independentemente de ser ca-
A B C D
E F G H
I J K L
M N O P
Q R S T
U V W X
Y Z
Fonte: acervo pessoal.
O alfabeto é apenas mais um recurso utilizado quando se usa a Libras, sendo que ele
em si não é a língua. Dessa forma, não soletramos todas as palavras que vamos “falar”,
algumas pessoas quando estão aprendendo Libras, acham que por terem decorado o
alfabeto já sabem ou consegue se comunicar com as pessoas com surdez. Existe um
sinal para quase todas as palavras e, assim, recorremos à datilologia quando precisa-
mos informar o nome de uma pessoa ou de uma rua, que na maioria das vezes não
tem sinal. No caso das pessoas, primeiro sinalizamos o nome com o alfabeto e depois
fazemos o sinal, caso a pessoa já tenha um.
Quando nos referimos a uma cidade, estado ou palavra que não tenha sinal ou não co-
nhecemos o sinal, podemos recorrer ao alfabeto manual. Assim como no momento em
que as crianças estão aprendendo a ler e a escrever, ou seja, se alfabetizar, também
é importante utilizar as letras do alfabeto manual, pois a partir delas a criança vai com-
preendendo que cada palavra, sinal, possui uma combinação de letras que são usadas
para que ela seja escrita.
SAIBA MAIS
Para que você conhecer melhor o modo como fazer as letras do alfabeto, indico o
vídeo “Alfabeto em Libras”, gravado por Fernanda Falkoski para o canal Universo da
82
Surdocegueira – Grupo Brasil, disponível em: https://youtu.be/3uwvM4XPYoc. Acesso em:
13 set. 2021.
3
Quadro 07. Números em língua brasileira de sinais
0 1 2 3
4 5 6 7
8 9 10
Fonte: acervo pessoal.
Os sinais dos números são utilizados quando vamos quantificar algum objeto ou pes-
soa, ou então quando queremos indicar número para qualquer situação, também são
mais um complemento da Libras.
SAIBA MAIS
Para que você conhecer melhor o modo como fazer os números, indicamos o vídeo “Núme-
3 ros em Libras”, gravado por Fernanda Falkoski para o canal Universo da Surdocegueira
– Grupo Brasil, disponível em: https://youtu.be/k-MODu0ldYo. Acesso em: 13 set. 2021.
84
3
OBRIGADA DE NADA
SAIBA MAIS
Para que você conhecer melhor o modo como fazer os números, indicamos que assista ao vídeo
“Cumprimentos em Libras” gravado por Fernanda Falkoski para o canal Universo da Surdoceguei-
ra – Grupo Brasil, disponível em: https://youtu.be/SzcsBXPL2D4. Acesso em: 13 set. 2021.
Para que possamos pensar em um diálogo envolvendo os sinais aprendidos até o mo-
mento, exibimos mais alguns sinais diversos.
Quadro 09. Sinais diversos em língua brasileira de sinais
SAIBA MAIS
Para que você conhecer melhor o modo como fazer os sinais diversos apresentados, suge-
rimos que assista ao vídeo “Sinais diversos 1 em libras” gravado por Fernanda Falkoski para
o canal Universo da Surdocegueira – Grupo Brasil, disponível em: https://youtu.be/_sFCcv-
T9f8M. Acesso em: 13 set. 2021.
EXERCÍCIO
Com base nos sinais apresentados até aqui, você já está preparado para treinar um diálogo em Libras.
Lembre-se que a ideia é treinar, pois com a prática você vai desenvolvendo suas habilidades e criando
mais agilidade na sinalização. O local onde está com “...” significa que você deve fazer o seu nome usando
o alfabeto datilológico para isso. E onde está a outra indicação logo após o sinal, é que você deve fazer o
seu sinal em Libras, caso o tenha. O sinal representa o nome da pessoa, é como se fosse o batismo, você
recebe, normalmente de uma pessoa com surdez, e sempre que for se apresentar ou se referir a alguém
vai utilizar ele.
Diálogo em Libras
OI
B- SIM, QUER?
B- TCHAU.
86
Quadro 10. Sinais de calendário em língua brasileira de sinais
BOM DIA
BOM TARDE
BOM NOITE
HOJE AGORA
Fonte: acervo pessoal.
EXEMPLO
Para que você possa ter uma ideia melhor de como fazer os sinais de calendário sugiro que
assista ao vídeo “Calendário em Libras” gravado por mim, disponível em: https://youtu.be/
YOt1YHUAJGA. Acesso em: 13 set. 2021.
88
3
JUNHO JULHO
NOVEMBRO DEZEMBRO
MÊS
Fonte: acervo pessoal.
EXEMPLO
Para que você conhecer melhor o modo como fazer os sinais de meses do ano sugiro que
3 assista ao vídeo “Meses do ano em Libras” gravado por Fernanda Falkoski para o canal
Universo da Surdocegueira – Grupo Brasil, disponível em: https://youtu.be/zv5bz7m7R8M.
Acesso em: 13 set. 2021.
No Quadro 11, temos 10 frases em que, na primeira coluna está a indicação do número,
na segunda como seria a frase em português e na terceira como seria em Libras. Note
como elas se diferenciam, lembrando que na coluna de Libras estão as palavras que
possuem sinal e elas estão escritas com um [ – ] sempre que temos um sinal para as
duas palavras.
Quadro 12. Diálogo em português e a correspondência em Libras
Quando pensamos na Libras, precisamos lembrar que ela tem uma estrutura que se
diferencia do português, caso façamos os sinais na mesma estrutura do português,
estamos a fazer o português sinalizado.
90
palavra, porque, às vezes o sinal pode representar mais de uma palavra e podemos ter,
também, mais de um sinal para compor uma palavra.
CHAPEUZINHO VERMELHO.
Este livro faz parte de uma coleção de 10 livros, além das histórias, acompanha um livro
com sugestões de atividades pedagógicas para cada história. Destacamos algumas
dessas atividades.
Figura 02. Sugestão de atividade a partir da
história “Chapeuzinho Vermelho”
CORPO HUMANO
Fonte: Honora (2010b, p. 15).
CABEÇA
TRONCO
MEMBROS
A CABEÇA TEM:
92
Figura 04. Sugestão de atividade a partir da história
“Chapeuzinho Vermelho”
BRAÇOS
PESCOÇO
PERNAS
BARRIGA
PÉS
Na proposta da Figura 04, a criança precisa colocar o que aprendeu anteriormente em prática,
pois terá que recortar os sinais e colocar nos locais corretamente, seguindo o que já vivenciou.
Figura 05. Sugestão de atividade a partir da
história “Chapeuzinho Vermelho”
CINCO SENTIDOS
Fonte: Honora (2010b, p. 24).
De modo similar, a Figura acima exibe frases com a escrita em português e a sequência
dos sinais correspondentes em Libras.
Figura 06. Atividade para trabalhar números e quantidades
3 a partir da história “Chapeuzinho Vermelho”
DATA:
DESENHE A QUANTIDADE DE DOCES QUE CHAPEUZINHO VERMELHO
TEM NA CESTA:
4 8
3
5
Era uma vez, uma linda menina que morava Muito tempo-atrás menina linda, morar jun-
com sua mãe numa bela casinha. Ela sempre to mãe, casa-pequena bonita. Sempre usar
usava uma capa com um chapeuzinho bem capa também nome chapeuzinho vermelho.
vermelho.
Um dia, mãe pedir ela levar cesta doces casa
Certo dia, sua mãe pediu que ela fosse levar vovó:
uma cestinha de doces, para sua vovó:
– Chapeuzinho, não ir caminho floresta por-
– Chapeuzinho, evite o caminho da floresta que perigoso, ir bosque não falar pessoas
que é perigoso, vá pelo bosque e não fale com não conhecer.
estranhos.
Chapeuzinho adorar vó, ir rápido, cantar mui-
Chapeuzinho adorava sua avó, e saiu em to feliz. Fazer surpresa vovó colher flores ver
disparada, cantando de alegria. Queria fazer caminho. Menina distraída segurar flores,
uma surpresa para vovó e começou a colher perceber lobo mau na frente. Ela não-saber
as flores que encontrava no caminho. A meni- ele lobo malvado, mas não assustar também
na estava distraída com as flores, não sentir medo.
94
PORTUGUÊS CORRESPONDENTE EM LIBRAS
quando deu de cara com o lobo mau. Ela não – Bom dia, chapeuzinho Vermelho.
sabia que ele era o lobo malvado, mas não se
assustou e nem sentiu medo. – Bom dia. 3
– Bom dia, chapeuzinho Vermelho. – Onde ir você?
– Aonde você está indo, assim, tão cedinho? Lobo, muito esperto, falar bem depressa:
– Vou visitar minha vovozinha, que está muito – Por que não ir floresta, mais perto?
doente.
Ela dúvida, porque não-gostar desobede-
O lobo, como era muito esperto, disse a ela cer mãe, mas resolver ir caminho lobo falar.
bem depressa: Chapeuzinho caminhar floresta, lobo rápido
ir bosque, cantar também correr. Lobo casa
– Por que não vai pela floresta, que é bem vovó bater porta:
mais perto?
_Quem bater? — Perguntar vovó.
Ela ficou em dúvida, porque não gostava de
desobedecer a sua mãe, mas resolveu seguir Lobo responder, trocar voz falar:
o conselho do lobo. Enquanto chapeuzinho
seguia pelo caminho da floresta, o lobo rapi- – Eu, Chapeuzinho Vermelho.
damente seguiu pelo bosque, cantando e cor-
rendo. O lobo chegou na casa da vovozinha – Entrar querida, porta aberta.
e bateu na porta:
Lobo, rápido, entrar engolir vovó. Depois
_Quem está aí? — Perguntou a velhinha. usar roupas dela, esperar Chapeuzinho Ver-
melho. Casa encontrar lobo perguntar:
O lobo respondeu, disfarçando a voz:
– Vovó! Por que orelhas grandes?
– Sou eu, Chapeuzinho vermelho.
– Porque ouvir melhor.
– Entre, minha querida, aporta está aberta.
– Vovó! Por que olhos grandes?
O lobo, que era muito rápido, foi entrando e
de uma só vez engoliu a vovozinha. Depois – Ver melhor.
vestiu as roupas dela, e ficou esperando
– Vovó, por que boca grande?
Chapeuzinho vermelho. Chegando na casa
da vovó, ela encontrou o lobo e perguntou:
– Porque comer você! — responder lobo.
– Vovó! Por que suas orelhas estão tão gran-
Lobo correr pegar Chapeuzinho. Depois tro-
des?
peçar-cair chão. Menina esconder dentro-ar-
mário. Lobo dormir roncar. Caçador caminhar
– É para te ouvir melhor.
ouvir:
– Vovó! Para que esses olhos tão grandes?
– Ronco esquisito?
– É para te ver melhor.
Entrar, encontrar lobo:
– Credo vovó, por que a senhora está com
– Ah! Você malvado!
essa boca tão grande?
Chapeuzinho ouvir depois contar história ca-
– É para te comer! — respondeu o lobo.
çador. Aproveitar lobo dormir, cortar barriga
tirar vovó. Feliz abraçar.
SAIBA MAIS
Dica de sinalização de história
Para que você possa ver uma história sendo sinalizada, sugerimos que assistam ao vídeo
“O som de arrepiar”, gravado por Tatiane Cristina Bonfim, para o canal Casa Libras (2021),
disponível em: https://youtu.be/N9X55oScA2I. Acesso em: 13 set. 2021.
Incentivamos também que assista a outros vídeos com histórias disponíveis nesse canal,
criado como projeto da Universidade Federal de São Carlos.
96
Quando focalizamos o trabalho na sinalização de músicas, a primeira coisa que precisa-
mos pensar é o público a quem se destina: criança, jovem ou adulto. Depois, devemos
refletir sobre o gênero musical que vamos sinalizar; isso é, o que vai definir os sinais
que serão utilizados e principalmente a forma como vamos sinalizar. Nem todas as 3
pessoas se sentem aptas para fazerem esse tipo de sinalização, pois exige muito das
SAIBA MAIS
Dica de sinalização de música
Para que possam conhecer uma boa sinalização de música, sugiro que assistam ao vídeo
“Trem Bala (Ana Vilela) ‘LIBRAS’”, interpretado por Wanessa Sanches no canal Rebeca Ne-
mer (2018), disponível em: https://youtu.be/YYE4a1h_1wI. Acesso em: 13 set. 2021.
Todas as pessoas podem trabalhar com música, parlenda, poesia ou história. Às vezes,
haverá a necessidade de praticar mais e buscar outros conhecimentos para que seja
feito da melhor forma possível, mas precisamos sempre ter em mente o quanto isso
pode favorecer ou não o entendimento da pessoa com surdez.
Todos devem ter a possibilidade de acessar o que quiserem e ter acessibilidade para
que isso aconteça. Muitas vezes, o professor que propiciará essas oportunidades, por
isso é desejável que ele tenha conhecimentos de Libras e não dependa de um intérpre-
te para se comunicar ou interagir com seus estudantes.
CONCLUSÃO
Esta unidade teórico-prática de ensino da Língua Brasileira de Sinais teve como ob-
jetivo apresentar algumas possibilidades de se trabalhar com o assunto. Inicialmente,
abordamos o trabalho com a pauta sonora no processo de alfabetização e de letra-
mento na língua portuguesa em turma regulares que têm aprendiz com surdez. Trouxe-
mos, para tanto, alguns conceitos fundamentais para nortear o trabalho pedagógico, tal
como: alfabetização, letramento, alfabetizar letrando, atuação do professor bilíngue e
do intérprete de Libras. Cada um desses conceitos e abordagens são importantes para
que seja pensado e organizado o trabalho pedagógico para os estudantes com surdez.
Apresentamos também o que se entende por consciência fonológica e como isso pode
ser aplicado aos discentes com surdez, entendendo que existe um trabalho fonológico
na Libras, com cinco parâmetros que forma o sinal, para isso falamos de: configuração
de mão, movimento, locação da mão, movimento da mão, orientação da mão e expres-
sões não-manuais.
98
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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Ana Lúcia; VALEIRÃO, Kelin. (Orgs.) Elementos de Fundamentos psicológicos da educação. Pelotas: 3
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BRASIL. Lei nº 10.436, de 24 de abril de 2002. Dispõe sobre a Língua Brasileira de Sinais - Libras e dá
outras providências. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/l10436.htm. Acesso em: 5
nov. 2021.
BAGNO, Marcos. Língua, linguagem e linguística: pondo os pingos nos ii. São Paulo, Parábola Editorial,
2014.
FERREIRA BRITO, Lucinda. Uma abordagem fonológica dos sinais da LSCB. Espaço: Informativo Técnico-
Científico do INES, Rio de Janeiro, vol. 1, n. 1, p. 20-43, 1990. Disponível em: https://www.ines.gov.br/seer/
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FIORIN, José Luiz. Linguística? O que é isso? São Paulo, Contexto, 2013.
FREIRE, Paulo; MACEDO, Donaldo. Alfabetização: leitura do mundo leitura da palavra. 3ª edição. Rio de
Janeiro: Paz e Terra, 1990.
HONORA, Marcia. Coleção pedagógica contos clássicos. Chapeuzinho Vermelho. São Paulo: Ciranda
Cultural, 2010b.
KOERNER, Rosana Mara. Entre saberes e fazeres da/na alfabetização: o ato de mediar do professor
alfabetizador. Curitiba: Editora CRV, 2010.
MORAIS, Artur Gomes de. Consciência fonológica na educação infantil e no ciclo de alfabetização. 1.
Ed. Belo Horizonte: Autêntica Editora, 2019.
QUADROS, Ronice Müller de; KARNOPP, Lodenir Becker. Língua de sinais brasileira: Estudos linguísticos.
Porto Alegre: Artmed, 2004.
ROJO, Roxane. Letramentos Múltiplos: escola e inclusão social. São Paulo: Parábola Editorial, 2009.
SOARES, Magda. Alfabetização: a questão dos métodos. 1ª ed., 5ª reimp. São Paulo: Contexto, 2021.
UNIDADE 4
EXERCITANDO A LIBRAS
4
INTRODUÇÃO
Há semelhanças nas diferentes etapas da vida escolar. Da educação infantil, passando
pelo ensino fundamental I, ensino fundamental II, ensino médio e ensino superior, a
forma como os professores organizam suas aulas pode favorecer ou não o desenvolvi-
mento dos seus estudantes. Por essa razão, é primordial oferecer oportunidades para
que esses educandos venham participar do processo educacional em sua integralida-
de. É importante que as crianças, desde pequenas, desenvolvam habilidades para que
possam chegar a níveis mais elevados de conhecimento.
Pensar no trabalho a ser desenvolvido com aprendizes com surdez incluídos na sala de
aula regular exige do professor conhecimentos para que ele possa ser sensível a ponto
de se colocar no lugar dos seus alunos. Estudantes esses que não escutam e muitas
vezes acabam tendo uma compreensão diferente da matéria. Assim, é papel do docen-
te pensar como ele resolveria as situações, como aluno, caso não utilizasse a mesma
língua que os demais. Uma boa dica é focar em situações lúdicas que proporcionem
muitas vivências.
É nesse campo da ludicidade que os jogos podem se apresentar como aliados das
histórias trabalhadas. Por exemplo, eles melhoram a socialização entre os alunos, que
por sua vez, vivenciam situações de competição e de colaboração, culminando no de-
senvolvimento da capacidade de observação. Esse movimento, que acontece por cau-
sa da elaboração de conceitos, é um exemplo das ações e propostas que podem ser
organizadas com e para os alunos em sala de aula.
Nesta unidade, temos o objetivo de apresentar sinais em Libras relativos a: cores, fa-
mília, natureza e tempo. Para isso, dividimos a unidade em quatro sessões. Em cada
uma delas, apresentaremos um conjunto de sinais focalizando a educação infantil, o
ensino fundamental I, o ensino fundamental II, o ensino médio e o superior. Para cada
100
etapa escolar, nós nos voltamos para as possibilidades de atividades que podem ser
trabalhadas pelo professor com seus discentes em sala de aula – pensando nos apren-
dizes com surdez, que precisam estudar a língua, e nos alunos ouvintes que precisam
conhecê-la também. 4
Nesse contexto, Albres e Saruta (2012, p. 43) apresentam uma prévia de como orga-
nizar a rotina dos estudantes de educação infantil: “[...] calendário, hora da notícia,
lavagem das mãos, merenda, higiene dental, recreio, repouso e brincadeiras”. Sempre
tendo em mente que, entre uma atividade e outra, é possível que o professor se volte
para dois recursos: a contação de histórias e o Método da Experiência. Esse método
proporciona um ambiente estimulador por meio de pequenas práticas do cotidiano da
criança, tal como fazer um leite com chocolate e contar uma história ou atividade inusi-
tada que ocorre com ela.
O Método da Experiência é um recurso pedagógico que pode ser utilizado pelos do-
centes na aquisição da linguagem da criança com surdez na fase da Educação Infantil.
Inicialmente, o professor organiza com seus discentes o que será feito: uma receita, por
exemplo, pensa nos ingredientes que serão utilizados e, assim, cria o “agendão”, ou seja,
um bilhete que terá a informação do que será feito e dos ingredientes necessários, assim
como a indicação do estudante responsável por cada ingrediente. É de fundamental im-
portância que os aprendizes participem de todos os passos da receita para que possam
compreender a sequência, aumentar o vocabulário e desenvolver diversas habilidades.
A seguir, apresentamos a sequência de três etapas que foram realizadas durante o méto-
do de experiência do pão de queijo. Primeiro, a professora escolheu com seus estudantes
a receita que seria feita; em seguida, organizou o “agendão” com as informações neces-
sárias – para que as famílias providenciassem os ingredientes – e a indicação do dia em
que se realizaria a atividade. No dia combinado, os discentes iniciaram a atividade.
102
Figura 03. Etapa 3: Registro da experiência
Esse registro costuma ser feito em cartaz e exposto na sala de aula, mas também pode
ser replicado em uma folha de ofício para que os discentes deixem no seu caderno.
Quando o material vai para o caderno, as famílias podem retomar o que foi feito em sala
de aula e, inclusive, testarem a receita em casa, sendo essa mais uma oportunidade
para estabelecer diálogo, mas agora entre a família e a criança.
O trabalho com o referido método de experiência pode ser realizado não só a partir de re-
ceitas, mas também depois de passeios ou brincadeiras ou, então, como registro de uma
história que foi contada pelo professor em sala de aula. Quanto mais o professor utilizar a
experiência em seu registro, mais vai favorecer o desenvolvimento dos seus estudantes.
Outro tipo de trabalho pedagógico a ser realizado com os discentes da educação infantil
envolve o uso específico de histórias infantis, pois a partir delas podem ser trabalhados
diversos conteúdos indicados à faixa etária. Para trabalhar com os sinais das cores,
indicamos a história “Branca de Neve e os Sete Anões”. Apontamos, a seguir, uma pos-
sível sequência de ações a serem realizadas e também a indicação de vídeo, sinais ou
atividades a serem realizadas, todos já na ordem para facilitar a compreensão:
II. Mostrar um pequeno vídeo com a história em Libras para que os estudantes possam
visualizar cada cena e a sinalização junto (conforme apresentado na caixa de destaque
abaixo). Esse vídeo pode ser exibido mais de uma vez, pois é possível que a turma foque
4
primeiro nas ações e depois na sinalização. Quanto menores forem os educandos, mais
vezes é necessário mostrar o vídeo. Isso não deve acontecer em um único dia, para que
as crianças não se cansem.
SAIBA MAIS
A história em Libras pode ser apresentada utilizando o vídeo “Branca de Neve e os 7 Anões –
conto em Língua Brasileira de Sinais (Libras), com legendas”, interpretada por Ellen Oliveira,
no canal Os Amiguinhos (2020). Disponível em: https://youtu.be/3wOfy5KIm_c. Acesso em:
14 set. 2021.
III. O professor pode mostrar os sinais das cores em Libras. Reforçamos que os sinais apre-
sentados aqui são os utilizados pela comunidade surda de São Paulo.
AMARELO AZUL
104
4
VINHO
Fonte: acervo pessoal.
EXEMPLO
Para você conhecer melhor o modo como fazer os sinais das cores, indicamos o vídeo “Cores
em Libras”, gravado por Fernanda Falkoski para o canal Universo da Surdocegueira – Grupo
Brasil, ([s. d.]), disponível em: https://youtu.be/vp_k1m_dfgM. Acesso em: 21 nov. 2021.
IV. O próximo passo é solicitar aos discentes que façam relação entre os anões e suas co-
res. Pode-se usar os personagens feitos em fantoches ou em desenho, mas precisa-se
atentar para que os elementos (lápis, pedaço de papel, de tecido etc.) sejam de cores
diferentes e pedir que os alunos unam os que são iguais.
V. Outra possibilidade é criar um jogo da memória, com cartões com os anões e cartões com
as cores, de modo que os educandos precisem encontrar os pares corretos.
VI. O docente pode organizar atividades que envolvam trabalho com as cores, como cons-
truir um castelo com peças de encaixe e estabelecer uma ordem de cores. Para isso, ele
pode usar os materiais que há disponíveis em sala de aula para criar brincadeiras em que
os sinais trabalhados sejam utilizados.
organizar a rotina escolar utilizando figuras reais (fotos) dos sinais e as palavras escritas
4 correspondentes às ações. Isso fará com que todos os discentes da sala compreendam
que existe uma ordem para as ações da rotina, e qual ordem é essa.
II. Antecipar o que vai acontecer na sequência, fazendo com que os discentes realmente se
envolvam no que estão fazendo naquele momento, pois já sabem o que virá em seguida.
Brincadeiras e jogos em sinais:
106
4
o professor pode organizar o momento de contar suas histórias utilizando para isso a
Libras.
Todas as atividades apresentadas são sugestões para que o professor possa trabalhar
com discentes na educação infantil. À vista disso, visa-se o desenvolvimento da língua
por meio dos conceitos e do vocabulário. Assim, é possível que o estudante chegue ao
ensino fundamental I com uma base sólida para ser direcionado ao ensino da língua
portuguesa escrita, sem deixar de trabalhar a Libras.
ETAPA DESCRIÇÃO
Tarefa de casa Os pais e seu filho, em casa, escolhem uma atividade significativa que a crian-
4 ça vivenciou. Os pais, com a participação efetiva da criança, registram a ativi-
dade (desenho, material concreto, fotografias, gravuras...). Este registro deve-
rá vir dentro de um saquinho de pano com o nome do aluno.
Na sala de aula No momento da rodinha, cada criança mostra e conta o que tem no saco das
novidades. Nesse momento, toda a forma de comunicação deve ser incentiva-
da – o importante é passar a mensagem.
Fonte: elaborada pela autora.
` Dramatizar as novidades;
De acordo com Albres e Saruta (2012, p. 24), “[...] para o trabalho com os gêneros de
fala, a estratégia que deve permear todas as fases da escolarização é iniciar o trabalho
pelas situações comunicativas praticadas naturalmente em sala de aula”. O docente
pode partir de situações reais, que acontecem em sala de aula com sua turma, para
favorecer o desenvolvimento da Libras.
Embora a Constituição Federal, no art. 208, inciso I tenha sido revista e por meio da
Emenda Constitucional 59/2009 exista a indicação de que a educação básica é obriga-
tória dos 4 aos 17 anos de idade, há situações em que os alunos de 4 a 6 anos, etapa
da educação infantil, ainda não frequentem a escola. Ainda que essa ‘não escolariza-
ção’ venha sendo modificada, em ocasião das políticas públicas, quando se focaliza a
criança com surdez, pode ser que ela não tenha frequentado a educação infantil, e isso
pode significar que ela não tenha a Libras como sua primeira língua.
108
língua com todos os seus estudantes, independentemente dos conhecimentos prévios
do aprendiz com surdez.
SAIBA MAIS
Para ler o livro na íntegra, ele está disponível na versão online no site da Fundação de Arti-
culação e Desenvolvimento de Políticas Públicas para PCD e PCAH NO RS – FADERS
–, da Secretaria de Igualdade, Cidadania, Direitos Humanos e Assistência Social. É interes-
sante apontarmos que, no início da obra, você observará que é apresentada uma iconografia,
isto é, o significado das imagens que são utilizadas ao longo do material.
CAMOZZATO, Donatella et al. Em mãos, Português como segunda língua – Para surdos.
Porto Alegre: Pacartes, 2017. Disponível em: https://faders.rs.gov.br/cartilha-em-maos-portu-
gues-como-segunda-lingua. Acesso em: 14 set. 2021.
Deixamos como sugestão trabalhar com as duas páginas do livro, porque elas podem
dar uma base do assunto a ser abordado com os discentes. O professor pode pedir às
turmas que tragam fotografias das pessoas que compõem as suas famílias para que
4 possam organizar uma árvore genealógica e trabalhar com os respectivos sinais.
Quadro 05. Homem e mulher em língua brasileira de sinais
HOMEM MULHER
Fonte: acervo pessoal.
AMIGO AMIGA
BEBÊ CASADO
110
4
CUNHADO
CUNHADA
FILHO
FILHA
IRMÃO
IRMÃ
NAMORADO NAMORADA
NOIVO NOIVA
PESSOA PAI
PRIMO PRIMA
SOLTEIRO SOLTEIRA
112
4
VOVÔ VOVÓ
SOGRO
SOGRA
PROFESSOR
PROFESSORA
Fonte: acervo pessoal.
EXEMPLO
Para você conhecer melhor o modo como fazer os sinais da família, indicamos o vídeo “Família
4 em Libras” gravado por Fernanda Falkoski para o canal Universo da Surdocegueira – Grupo
Brasil, ([s. d.]), disponível em: https://youtu.be/YEN4JuMCiWg. Acesso em: 21 nov. 2021.
Essa é apenas uma sugestão de atividade que pode ser trabalhada com os discentes, a partir
dos sinais propostos. Outra proposta é iniciar de uma história, tal como “Os três porquinhos”.
SAIBA MAIS
Sugerimos a contação da história “Os Três Porquinhos”, interpretada por João Pedro de Oli-
veira Nascimento, um menino surdo totalmente em Libras, para o canal Audiovisual TILSP
(2020). O vídeo tem o apoio de imagens ao longo da narrativa. Disponível em: https://youtu.
be/NMWrn61ZCFw. Acesso em: 14 set. 2021.
Após assistir à história, o docente pode discorrer sobre os sinais apresentados e pro-
mover discussões a respeito do que não conhecem ou não entenderam, para que tudo
fique compreendido. É possível tratar também do livro, pois nele estará a história escrita
em português, que servirá de fonte para que o professor organize atividades.
Quadro 07. Representação da história feita com materiais recicláveis
114
Enquanto se trabalha com histórias, é possível que o docente inicie atividades que
envolvam a escrita com o alfabeto – manual e em português – para que os educandos
possam ir se apropriando desses dois sistemas que serão muito utilizados por eles. De
mesmo modo, indicamos também a atividade de caça-palavras, da seguinte maneira: 4
Quadro 08. Caça-palavras em Libras
01. Casa
02. Lobo
03. Porquinho
04. Madeira
05. Palha
06. Tijolos
As atividades abaixo servirão como exemplo para a construção futura de trabalhos mais
dinâmicos com os estudantes em sala de aula.
Quadro 09. Sugestões de atividades do livro E-BOOK Unidades Didáticas para Aprendizes Surdos
PLANO DE ATIVIDADES
INSTITUTO NACIONAL DE EDUCAÇÃO DE SURDOS – INES
4 DEPARTAMENTO DE ENSINO SUPERIOR – DESU
METODOLOGIAS DE ENSINO DE LÍNGUA PORTUGUESA COMO L2 PARA SURDOS
116
4
Por exemplo:
Marque com números onde cada animal vive. (1) TERRA; (2) ÁGUA; (3) AR.
Os aprendizes surdos terão assistido ao vídeo no Youtube ou a explicação do professor e vão respon-
der onde eles moram (viver).
https://www.youtube.com/watch?v=k2QEELAWGZ4&feature=youtu.be
Tem uma foto de casa e outra foto de floresta, coloque as letras: D: para animais domésticos e S: para
animais selvagens, apenas Libras:
4) Vamos mostrar as imagens de corpo de animais o que os estudantes podem observar e depois ligar:
118
4
6) Última atividade: Professor surdo precisa mostrar animais e suas mães grávidas e os
alunos precisam saber de onde nascem. As figuras de animais com palavras porque os
alunos surdos precisam conhecer as palavras em português.
NASCEM DA BARRIGA
NASCEM DE OVOS
DAS MÃES
4
SAPO COELHO
TARTARUGA PATO
GATO CACHORRO
7. Avaliação:
Professor surdo faz uma avaliação para saber se os alunos surdos compreenderam a
atividade de ciências sobre característica dos animais. Os aprendizes surdos serão ava-
liados em todo tempo, por meio de observação e atividades de ciências propostas com
imagens em Libras e com palavras.
Sempre comparando o desenvolvimento dos alunos surdos e como atuavam antes e de-
pois das atividades.
8. Observações importantes
120
` O professor surdo tem que mostrar o registro sobre as atividades de ciências, obser-
vando se os alunos surdos conseguem responder sozinhos;
Ressaltamos que o educador precisa ter claro que, quanto maior o número de recursos
visuais utilizados em suas aulas, mais formas de trabalhar o conteúdo ele terá.
O ensino de português para pessoas com surdez por vezes se mostra um desafio, mas
se apresenta como algo fundamental para o desenvolvimento escolar e para a vida.
SAIBA MAIS
Recomendamos que você assista ao vídeo “Comunicação surda: Libras ou Língua Portugue-
sa?”, diálogo com a Profa Dra. Mariana Campos e com os intérpretes Hector Calixto e Ariela
Siqueira. No vídeo, uma pessoa com surdez discorre sobre a importância de ter aprendido o
português e o quanto isso auxiliou em diferentes situações. Disponível em: https://youtu.be/
tfL4ReCby4M. Acesso em: 14 set. 2021.
aprendiz com surdez domine a Libras e só precise focar no aprendizado dos conteúdos
de cada disciplina.
4 Albres e Saruta (2012) frisam que o professor necessita trabalhar com diferentes gê-
neros textuais com seus estudantes. Principalmente com o aprendiz com surdez, para
que ele desenvolva habilidades necessárias para a produção de seus textos. Assim,
sugere-se trabalhar:
Quadro 10. Sugestões de habilidades
HABILIDADE DESCRIÇÃO
Cuidar do conteúdo (uma preocupação comum a todas as situações
Planejamento do texto comunicativas), com a forma como as informações são passadas. É necessário
trabalhar as diferenças entre a língua formal e a informal.
O conteúdo da expressão precisa ser apresentado de forma clara e coerente –
Estrutura da exposição o objetivo é facilitar a compreensão de seu sentido geral. Para que isso ocorra,
o texto em sinais deve ter uma sequência organizada.
A intensidade dos sinais do emissor e a amplitude da execução da articulação
Características da
dos sinais devem ser adequadas aos objetivos da interação com os
expressão face a face
interlocutores.
Olhares, gestos, expressões faciais afetivas e movimentos corporais são
Postura corporal
importantes na comunicação face a face.
Fonte: Albres e Saruta (2012, p. 34).
Para que cada uma dessas habilidades seja trabalhada é essencial recorrer a: piadas,
narrativas, poesias, entrevistas, descrições, opiniões, argumentação, convites, agrade-
cimentos, dentre outros tipos situacionais. Existe um material intitulado Programa Cur-
ricular de Língua Brasileira de Sinais para Surdos (2017), que pode nortear o trabalho
pedagógico do professor em sala de aula.
SAIBA MAIS
O material Programa Curricular de Língua Brasileira de Sinais para Surdos (2017), de Neiva de
Aquino Albres e Moryse Vanessa Saruta, apresenta possibilidades de como se trabalhar com
os estudantes, desde a educação infantil até o ensino médio, por intermédio da proposta de
ensino de Libras para pessoas com surdez. Disponível em: https://libras.ufsc.br/wp-content/
uploads/2017/03/2012-11-ALBRES-e-SARUTA-Curriculo-LS-IST.pdf. Acesso em: 14 set. 2021.
Para que as aulas possam ser pensadas de forma acessível é essencial que o professor
tenha, ao menos, um conhecimento básico da Libras, mesmo que conte com a pre-
sença de um intérprete em sala de aula. Não adianta apenas saber o que trabalhar, é
preciso entender o como. Uma vez que a função do intérprete é passar para a língua de
sinais as mensagens ditas pelo professor em português e vice-e-versa, ter uma noção
da língua favorece o trabalho do professor.
122
Quadro 11. Sugestão de atividade a partir de um texto
Atividade 6 – desenvolvida pelo mesmo aluno do Escrita do aluno:
texto anterior. O texto, extraído do livro Novo Tempo -
4 série, de Maria Helena Bernadete. Ed. Scipione, foi Carolina muito triste vê colega crianças muito
lido, depois explicado em Língua Brasileira de Sinais, brinca bola. Ela sozinha não gosto não vai eles 4
ao final do que a professora solicitou que o aluno re- brinca muito bola, basquete, corrida. As crianças
A partir dessa atividade, pode-se trabalhar com a turma os sinais envolvendo a nature-
za. Mesmo que a atividade sugerida seja pensada para os aprendizes com surdez,
reforçamos ser possível trabalhar com todos os discentes.
Quadro 12. Natureza em língua brasileira de sinais
AREIA ÁRVORE
ESTRELA LUA
MAR MUNDO
NUVEM PEDRA
PRAIA SOL
Fonte: acervo pessoal.
124
SAIBA MAIS
Para você conhecer melhor o modo como fazer os sinais da natureza, indico o vídeo “Natureza
em Libras” gravado por Fernanda Falkoski para o canal Universo da Surdocegueira – Grupo 4
Brasil, ([s. d.]), disponível em: https://youtu.be/J8RnyVMqveg. Acesso em: 21 nov. 2021.
Muitas vezes, quando vai produzir um texto, o aprendiz com surdez pensa como se
estivesse sinalizando. De modo semelhando, o ouvinte, em alguns momentos, também
escreve como fala, mas quando leem o que escreveram, conseguem identificar e fazer
os ajustes necessários. Porém, nem sempre a identificação do equívoco de escrever o
português no padrão da sinalização acontece com o aprendiz surdo, pois quando ele
faz essa leitura, tem como base os sinais, e não o apoio auditivo, como os ouvintes.
O que diferencia essa escrita são alguns aspectos que fazem muita diferença ao se
fazer a leitura, do ponto de vista dos ouvintes:
Pereira (2009, p. 66) explica que essa produção (Figura 05) teve como base três ce-
nas “[...] que mostravam um menino, o mar, barcos, sol, coqueiro e na última cena um
homem fazendo um curativo no menino”. Foi a partir dessa proposta que o discente
4 teve que fazer a sua produção. A autora afirma que o estudante não recorreu apenas
à descrição das imagens, mas construiu uma narrativa a partir delas. Ele também fez
uso de seus conhecimentos prévios sobre as imagens representadas, seguindo uma
sequência temporal das ações.
SAIBA MAIS
Caso você tenha interesse em saber mais sobre o assunto e ver outros exemplos de escrita
feita por pessoas com surdez, acesse o material organizado por Maria Cristina da Cunha Pe-
reira (2009), intitulado “Leitura, escrita e surdez”. Disponível em: http://cape.edunet.sp.gov.br/
textos/textos/leituraescritaesurdez.pdf. Acesso em: 14 set. 2021.
Além do bilhete trazido, outro tipo de trabalho importante nessa etapa escolar é por meio
de jogos na sala de aula, dos quais destacamos algumas vantagens de usá-los, a saber:
` incentiva os discentes em sua liberdade criativa, fazendo com que eles se sintam menos
embaraçados ou receosos e se tornem mais autoconfiantes;
` aproxima estudantes e professor, o que pode ajudar a diminuir a tensão e a ansiedade que
impedem os alunos de aprender;
Como exposto acima, essas são apenas algumas das vantagens que o uso do jogo
em sala de aula pode propiciar tanto para a turma quanto para os docentes. Contudo,
salientamos que, independentemente da etapa escolar, todos os estudantes se benefi-
ciam desse tipo de proposta.
Na Libras, não são utilizadas marcas de tempo nas formas verbais, por isso, na frase, eles
ficam sempre em sua forma infinitiva. O tempo, por sua vez, é marcado, sintaticamente,
por meio de advérbios de tempo, que indicam se a ação está ocorrendo no presente:
HOJE, AGORA; se ocorreu no passado: ONTEM, ANTEONTEM; ou se irá ocorrer no
futuro: AMANHÃ. Por essa razão, os advérbios, geralmente, vêm no começo da frase,
mas podem ser usados também no final. Quando não há, na frase, um advérbio de
126
tempo específico, de modo geral, não há especificação temporal. Já para futuro, pode-
se utilizar o sinal FUTURO.
IMPORTANTE 4
` NENHUMA MARCA – traz a ideia de tempo presente;
Na Libras, utilizamos as expressões faciais e corporais para marcar o tipo de frase, assim
como acontece com o uso da entonação na língua portuguesa. Dessa maneira, para que
o interlocutor reconheça qual tipo de frase está sendo dita – afirmativa, exclamativa, inter-
rogativa ou negativa –, é imprescindível observar as expressões faciais e corporais que
são utilizadas enquanto elas são sinalizadas, pois a indicação se dará dessa maneira. Em
outras palavras, de acordo com cada tipo de frase, é necessário averiguar que:
` Na frase afirmativa: a expressão facial utilizada é neutra, ou seja, a pessoa precisa ob-
servar esse aspecto.
` Já na frase negativa: pode-se utilizar três indicações: (I) acrescentando o não na frase,
(II) incorporando o movimento contrário ou diferente do original (que assim indica a nega-
ção) ou, então, (III) com um movimento de cabeça indicando a negação.
COMEÇAR ACABOU
HOJE AGORA
AMANHÃ ONTEM
MANHÃ TARDE
128
4
DEPOIS DEMORAR
PRESENTE PASSADO
FUTURO SEMESTRE
Fonte: acervo pessoal.
EXEMPLO
Para que você possa ter uma ideia melhor de como fazer os sinais de tempo, indico o vídeo
4 “Tempos em libras” gravado por Fernanda Falkoski para o canal Universo da Surdocegueira –
Grupo Brasil, ([s. d.]), disponível em: https://youtu.be/0FNgTgKz1h4. Acesso em: 21 nov. 2021.
Para que possamos trabalhar com jogos e brincadeiras, tanto com aprendizes com sur-
dez quanto com os ouvintes, é necessário observar alguns aspectos que os discentes
precisam:
` saber claramente quais são as regras do jogo e qual é o objetivo que se tem;
Uma sugestão ao professor é escrever algumas dessas palavras no quadro para que
os estudantes tenham um local rápido de consulta. Abaixo seguem, algumas possibili-
dades de atividades e brincadeiras que podem ser realizadas com os alunos no ensino
médio e no ensino superior para trabalhar vocabulário em Libras.
Quando pensamos em discentes ouvintes, pode ser que esse momento seja o primeiro
em que têm contato com a língua, assim, estão aprendendo. Mas ao pensar nos apren-
dizes com surdez, espera-se que já dominem a língua e possam auxiliar o professor
nas propostas.
Atividade 1: Grave um vídeo, em Libras, a partir do roteiro proposto. Não esqueça de numerar as frases
antes de gravar: faça o número e a frase.
04. Bem-vindo.
Obs.: essa atividade visa desenvolver os sinais iniciais aprendidos e como organizar um diálogo, ou seja, o
jogo de corpo que é necessário de ser feito enquanto uma pessoa sinaliza a conversa entre duas pessoas.
Uma dica: sempre que você estiver sinalizando uma conversa entre duas pessoas, use do posicionamento
dos seus ombros e um leve mover para a direita ou esquerda. Você se posiciona de um lado quando uma
pessoa fala e de outro quando a outra fala, lembrando que seu corpo não se mexe, apenas acontece um
leve mover de ombros.
Atividade 2: Grave um vídeo, em Libras, a partir do roteiro proposto. Não esqueça de numerar as frases
antes de gravar: faça o número e a frase.
130
03. Eu namorado (namorada). Nome meu namorado Francisco (Francisca).
Obs.: nessa atividade tem-se como foco trabalhar o uso dos números e também das frases, lembrando que
elas estão escritas de acordo com os sinais que serão utilizados quando você for sinalizar.
Deve-se estar atento: você faz o número e sinaliza a frase, mas quando vai para o próximo número e
frase, precisa esperar alguns segundos para que haja uma separação entre uma e outra. Gravar essa sina-
lização é importante, para que, ao final, seja possível ver o que foi feito e pensar nas possíveis mudanças
que são necessárias, a fim de tornar as frases o mais compreensível possível.
É um jogo que provoca gargalhadas dos participantes e requer muita atenção para compreender a mensa-
gem que o companheiro transmite. Iniciar, organizando os jogadores em fila, um ao lado do outro.
` O primeiro comunica uma mensagem em Libras, que ele inventou, à pessoa seguinte.
` Quando o segundo recebe a mensagem, ele a transmite ao seguinte, procurando repetir em Libras
o que entendeu, o mais rápido possível.
` Quando o último receber a mensagem, comunica aos demais o que recebeu depois de haver pas-
sado por todos os jogadores e o primeiro comunica a mensagem original.
` Variação: em vez da mensagem em Libras, poderá transmitir uma palavra em alfabeto manual
(treino de alfabeto manual).
Obs.: nessa brincadeira são trabalhadas diferentes habilidades, mas a principal delas é ver uma frase
sendo sinalizada, copiar e reproduzir ela da mesma maneira, sem deixar informações importantes de fora.
A variação de utilizar o alfabeto manual é um recurso importante, pois é preciso entender a palavra para
reproduzir corretamente, sem tirar ou acrescentar letras que não sejam pertencentes a palavra.
Um singular duelo em que não se pode distrair um só momento. Em duplas, os combatentes começam o
jogo dizendo os vocabulários em Libras que não podem usar durante a partida: “SIM”, nem “NÃO”.
A partir desse momento, cada jogador tenta fazer com que o outro sinalize os vocabulários proibidos, fazen-
do perguntas de todo tipo, e toma muito cuidado com as que ele lhe faz.
O primeiro que sinalizar “SIM” ou “NÃO” (com os dedos ou cabeça) perde, e o outro jogador ganha 1 ponto.
A lista de vocabulários em Libras proibidos vai sendo ampliada, para tornar o jogo mais difícil, conforme
avançam as partidas. Por exemplo: “SIM”, “NÃO”, “BRANCO”, “PRETO”...
Obs.: nessa brincadeira, além de compreender o que está sendo perguntado, o participante precisa pensar
em possibilidades de resposta sem utilizar os vocabulários proibidos em cada rodada. Favorece a habili-
dade de pensar, ter atenção, rapidez, agilidade e, sem dúvida, aumenta o vocabulário dos participantes.
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Atividade 5: Jogo de memória
Um jogo que colocará à prova a memória dos participantes e sua capacidade de concentração. É preciso
formar um círculo de jogadores sentados, de forma que após o último volte-se ao primeiro.
` O primeiro jogador faz o sinal de um vocabulário qualquer em Libras. Por exemplo: “CASA”.
` O segundo jogador repete o sinal que o primeiro fez e acrescenta outra: “CASA, AVIÃO”.
Cada jogador deve repetir todos os vocábulos anunciados até o momento na mesma ordem e acrescentar
um novo à série. Assim, quanto mais jogadores participarem e mais voltas forem dadas, o jogo se tornará
cada vez mais complicado, pois o número de palavras ficará cada vez maior e, consequentemente, mais
difícil será memorizá-las. Quando alguém se atrapalha, os demais jogadores podem ajudá-lo. O jogo termi-
na quando não restar ninguém que seja capaz de memorizar toda a série.
Obs.: essa brincadeira é interessante, pois faz com que os participantes trabalhem com sua memória,
lembrando as palavras que são sinalizadas e, principalmente, a ordem com que são produzidas. Uma
variação, pode ser a construção de histórias. Ou seja, seguindo a mesma lógica, mas ao invés de usar
palavras aleatórias, os participantes precisam usar palavras que organizem uma frase ou um parágrafo que
tenha um significado. Assim, além de precisar memorizar, é necessário compreender os sinais que estão
sendo feitos para que quando chegar a sua escolha, você consiga seguir a mesma lógica e não sinalize
uma palavra fora de contexto.
Atividade 6: O Espelho
Um jogo de imitação de Libras com expressão facial e corporal, em que se deve ficar muito atento e segurar
o riso. É conveniente que o professor de Libras dirija o jogo.
Coloca-se os participantes emparelhados, frente a frente, formando duas filas. A um sinal, os participantes
de uma das filas começam a fazer Libras lentamente com expressão facial e corporal. Os da outra fila
devem imitar o seu par o melhor possível, como se fossem seu espelho. É proibido rir, a menos que esteja
imitando o jogador.
Passado um minuto, invertem-se os papéis, isto é, quem imitou passa a ser imitado.
Obs.: essa brincadeira, além de ser muito divertida, proporciona aos participantes desenvolver as expres-
sões faciais e corporais, pois é necessário copiar tudo o que a pessoa que está a sua frente faz.
Todas essas sugestões são possibilidades de se trabalhar com o ensino da língua e praticá-la.
É preciso ter em mente que elas foram indicadas nessa etapa escolar, ensino médio e supe-
rior, pois acredita-se que os adultos também aprendem mais fácil de forma lúdica e prática.
CONCLUSÃO
Esta unidade teve um aspecto mais prático, tanto no que diz respeito ao conhecimento
de alguns sinais da língua, quanto sobre a sugestão de atividades, jogos e brincadeiras
que podem ser usados com os aprendizes com surdez e no ensino de Libras.
Destacamos a apresentação de atividades que abordem o ensino de português como
segunda língua para aprendizes com surdez, que é um dos assuntos mais discutidos
na atualidade, principalmente quando se pensa no ensino bilíngue de aprendizes com
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surdez. Assim, dividimos a unidade em quatro seções que abordaram: educação infantil,
ensino fundamental I, ensino fundamental II, ensino médio e superior.
Na terceira seção, tivemos como objetivo apresentar aspectos sobre o ensino funda-
mental II, abordando o trabalho com diferentes gêneros textuais, a importância de tra-
balhar com a leitura para que os discentes desenvolvam a escrita do português. Sugeri-
mos uma atividade realizada com um aprendiz com surdez a partir do trabalho com um
texto e em seguida foram apresentados os sinais de natureza.
Exibimos uma escrita feita por um aprendiz com surdez e também a reflexão sobre o
trabalho realizado, para que o futuro docente possa ter uma ideia do que precisa focar
em sala de aula, finalizando com a importância de trabalhar os jogos em sala de aula.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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MACHADO, Augusto dos; CRUZ, Osilene. Estratégias de ensino sobre características dos animais para estudantes
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