USF EAD Língua Brasileira de Sinais Completo

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SUMÁRIO

UNIDADE 01: EXEMPLO DE TEXTO......................................................................103

1. Título de Peso .................................................................................................... 103

2. Mauris tristique velit facilisis nulla hendrerit rutrum. ........................................... 105


LÍNGUA BRASILEIRA DE SINAIS
Fernanda Cristina Falkoski

2021
CASA NOSSA SENHORA DA PAZ – AÇÃO SOCIAL FRANCISCANA, PROVÍNCIA
FRANCISCANA DA IMACULADA CONCEIÇÃO DO BRASIL –
ORDEM DOS FRADES MENORES

PRESIDENTE
Frei Thiago Alexandre Hayakawa, OFM
DIRETOR GERAL
Jorge Apóstolos Siarcos
REITOR
Frei Gilberto Gonçalves Garcia, OFM
VICE-REITOR
Frei Thiago Alexandre Hayakawa, OFM
PRÓ-REITOR DE ADMINISTRAÇÃO E PLANEJAMENTO
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PRÓ-REITOR DE ENSINO, PESQUISA E EXTENSÃO
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COORDENADOR DO NÚCLEO DE EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA - NEAD
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GESTOR DO CENTRO DE SOLUÇÕES EDUCACIONAIS - CSE
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CURADORIA TÉCNICA
Claudia Maria Poleti Oshiro
CURADOR INSTITUCIONAL
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DESIGNER INSTRUCIONAL
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REVISÃO ORTOGRÁFICA
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PROJETO GRÁFICO
Impulsa Comunicação
DIAGRAMADORES
Andréa Ercília Calegari
CAPA
Andréa Ercília Calegari

© 2021 Universidade São Francisco


Avenida São Francisco de Assis, 218
CEP 12916-900 – Bragança Paulista/SP
O AUTOR
FERNANDA CRISTINA FALKOSKI
Doutoranda em Educação Especial pela Universidade Federal de São Carlos - UFSCar;
mestre em Educação pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul - UFRGS
(2017); especialista em Neuroeducação e Educação Especial Inclusiva pela Faculdade
Metropolitana do Planalto Norte – FAMEPLAN (2015); licenciada em Letras - Habilitação
Português pela Universidade do Vale do Rio dos Sinos - UNISINOS (2012); e possui
formação no curso Normal de nível Médio-Magistério pelo Colégio Santa Catarina
(2007). Tradutora-Intérprete de Libras, Guia-Intérprete e Instrutora-Mediadora para
pessoas com surdocegueira e deficiência múltipla sensorial. Atualmente, é coordenadora
pedagógica da Ahimsa (Associação Educacional para a Múltipla Deficiência) em São
Paulo e membro do Grupo Brasil (Grupo Brasil de Apoio ao Surdocego e ao Múltiplo
Deficiente Sensorial).
SUMÁRIO
UNIDADE 01: CONHECENDO A LÍNGUA BRASILEIRA DE SINAIS....................6

1. Apresentação da Libras no contexto escolar....................................................... 7

2. Marcos legais, pedagógicos, educacionais e sociais relacionados à educação de


pessoas com surdez no Brasil ................................................................................ 13

3. O ensino comum e o Atendimento Educacional Especializado (AEE)................. 19

4. Aquisição de uma língua de sinais por crianças surdas e ouvintes no ensino


regular...................................................................................................................... 26

UNIDADE 02: BILINGUISMO NO ENSINO REGULAR..........................................36

1. A importância da Libras no desenvolvimento da cognição e da linguagem em crian-


ças surdas e ouvintes............................................................................................... 37

2. O trabalho concomitante com a Libras e com a Língua Portuguesa em turmas regu-


lares que têm alunos com surdez, na construção de um Bilinguismo para todos... 47

UNIDADE 03: A PRÁTICA DE ENSINO DA LÍNGUA BRASILEIRA DE SINAIS...68

1. O trabalho com a pauta sonora no processo de alfabetização e de letramento na


Língua Portuguesa, em turmas regulares que têm aprendizes com surdez............ 69

2. Conhecimentos práticos na Língua Brasileira de Sinais – diálogos sinalizados.. 80

3. Conhecimentos práticos na Língua Brasileira de Sinais – sinalizando músicas,


poesias e parlendas................................................................................................. 90

UNIDADE 04: EXERCITANDO A LIBRAS...............................................................100

1. Exercitando a Libras – Educação Infantil............................................................. 101

2. Exercitando a Libras – Ensino Fundamental I...................................................... 108

3. Exercitando a Libras - Ensino Fundamental II..................................................... 121

4. Exercitando a Libras – Ensino Médio e Ensino Superior..................................... 126


Conhecendo a Língua Brasileira de Sinais

UNIDADE 1

1
CONHECENDO A LÍNGUA BRASILEIRA
DE SINAIS

INTRODUÇÃO
De acordo com a Lei de Diretrizes e Bases da Educação de 1996 (LDB) e a Política Nacio-
nal de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva de 2008, os estudantes
com deficiência, síndrome ou transtorno devem ser matriculados, preferencialmente, no
ensino regular. Foi a partir dessa política que a educação inclusiva começou no Brasil,
pois ela configurou o público que seria atendido e como deveria ser organizado esse
trabalho pedagógico. Também é preciso registrar que há uma discussão a respeito da
nova “Política Nacional de Educação Especial: Equitativa, Inclusiva e com Aprendizado
ao Longo da Vida” de 2020, que ainda está em discussão, com sua aprovação pendente.

Embora a política de 2008 preconize que alunos com surdez devem ser incluídos em salas
de aula do ensino regular, o que ocorre, no cotidiano escolar, é o contrário: pois então, as
políticas contribuem ou não para a inclusão? No contexto da sala de aula, há indícios de
que discentes com surdez têm professores que desconhecem o processo de ensino e de
aprendizagem que envolve as pessoas com surdez, principalmente sua história e caracte-
rísticas próprias, que fazem toda a diferença na organização do trabalho em sala de aula.

Apesar de toda a evolução pela qual o país passou em relação ao respeito e a aceitação
de todo e qualquer ser humano, ainda hoje acontecem situações em que as pessoas
com surdez precisam se adequar aos padrões da sociedade, ou seja, à sociedade ou-
vinte. Podemos apontar que o principal aspecto que vigora é tratar-se de uma socieda-
de ouvintista, então as pessoas que não estão “de acordo” precisam buscar alternativas
para se aproximar da norma.
Muitas vezes o ouvinte não percebe o quanto depende da audição em situa-
ções cotidianas, porém quando passa a viver em um “novo mundo”, conhe-
cendo o povo surdo e vivenciando algumas experiências em que essa de-
pendência não existe, ocorre o choque cultural (PEIXOTO et al., 2018, p. 32).

Peixoto et al. (2018, p. 32) explicam que somos tão acostumados a viver no mundo baru-
lhento que nem nos damos conta da importância que isso tem para nossas vidas, assim
como não refletimos acerca da situação que pode estar vivendo a pessoa que não escuta.

EXEMPLO
Ouvimos o som da televisão enquanto lavamos a louça ou fazemos a comida, ouvimos o
rádio enquanto limpamos a casa, trabalhamos e conversamos ao mesmo tempo, podemos

6
andar de bicicleta e falar com alguém que está nos acompanhando. Esses são alguns exem-
plos de ações simultâneas que nós ouvintes fazemos sem dificuldades e sem perceber que
são extremamente difíceis, ou até mesmo impossíveis para quem tem surdez.
1

A educação de surdos passou por diferentes momentos ao longo da história, tendo

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contado com marcos legais, pedagógicos, educacionais e sociais cujos conhecimento e
compreensão são fundamentais por parte de quem adentra essa área. O mesmo pode
ser dito quanto aos aspectos que dizem respeito ao ensino comum e ao Atendimento
Educacional Especializado (AEE) que acontece nas escolas.

Refletir e discutir sobre a aquisição da língua de sinais, tanto por crianças com surdez
quanto por crianças ouvintes, no ensino regular, é outra atitude de extrema importância,
para que futuros professores, psicólogos e outros profissionais tenham mais conhe-
cimento sobre área. E essa deve ser uma preocupação comum a toda a sociedade,
mesmo sem conviver diretamente com um surdo é importante conhecer e respeitar a
Língua de Sinais.

Nesta unidade, você vai estudar sobre: a apresentação da Libras no contexto escolar; mar-
cos legais, pedagógicos, educacionais e sociais relacionados à educação de pessoas com
surdez no Brasil; o ensino comum e o Atendimento Educacional Especializado (AEE); e a
aquisição de uma língua de sinais por crianças surdas e ouvintes no ensino regular.

1. APRESENTAÇÃO DA LIBRAS NO CONTEXTO ESCOLAR


Entender a surdez e os surdos a partir da diferença significa uma inversão
do olhar da exclusão pelo isolamento no mundo do silêncio, passando a en-
tender a surdez como uma experiência e uma representação visual (GIOR-
DANI, 2012, p. 66).

Giodani (2012, p. 66) aponta a diferença como algo positivo, e não negativo, não com
o olhar da falta. Somos todos diferentes e nos constituímos por meio dessas diferen-
ças. Logo, uma pessoa usa óculos e outra não, uma pessoa é alta e outra não, uma
pessoa usa cadeira de rodas e outra não. Cada um de nós é diferente por seus gostos,
vontades e costumes, ou então por suas características físicas, intelectuais, sensoriais
ou sociais. Assim, quando olhamos a surdez por esse viés da diferença, favorecemos
a compreensão de que as pessoas com surdez se diferenciam dos ouvintes sim, talvez
pela comunicação, pelos aspectos culturais, pelo modo de agir ou simplesmente pelo
modo de ver o mundo, mas não por isso deixam de ser seres humanos.

Quanto ao conceito de cultura, Vieira e Peixoto (2018, p. 8) salientam que ela “[...] se
faz por um processo contínuo, resultado de uma interação entre os sujeitos, vemos que
a cultura de um determinado povo parte de cada um para então ser de um todo, pois
cada peça é fundamental para a sua construção”. Posto de outro modo, cada um de
nós compõe o grupo cultural do qual fazemos parte, seja ele de origem étnica, religiosa,
social, cultural ou outro.

Quando vivemos uma cultura, aprendemos os costumes e formas de viver, de pensar e agir
das pessoas que a compõem, e isso vai nos constituir como membros culturais.

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Conhecendo a Língua Brasileira de Sinais

A comunidade ouvinte tem seus costumes e hábitos permeados, em sua maioria, por
experiências auditivas, ao passo que a comunidade surda os tem por meio das experi-
ências visuais. Ambas se compõem de artefatos culturais muito parecidos, diferencia-
1 dos, em sua maioria, apenas pela forma de expressão e recepção das informações.

Além dessas diferenças, outra que se destaca é a língua utilizada pela comunidade. De
acordo com Giordani (2012, p. 71), “[a] comunidade de surdos se identifica essencial-
mente pela língua que usa”, língua essa que, juntamente com outros aspectos culturais,
vai auxiliar na construção da identidade surda. No caso do Brasil, usa-se a Língua Bra-
sileira de Sinais, também conhecida por Libras. Deve-se deixar claro que cada país tem
a sua língua de sinais.

Em complemento, Harrisson (2011, p. 54) frisa que “[...] a língua brasileira de sinais e a
língua americana de sinais (American Sign Language – ASL) têm como influência comum
a língua francesa de sinais”. Em outras palavras, os sinais usados no Brasil e nos EUA se
aproximam muito dos sinais franceses, mas apenas são parecidos, e não iguais.

Com o movimento da inclusão social e educacional, muitos aprendizes com surdez pas-
saram a fazer parte da escola regular, sendo necessário fazer algumas adaptações. Uma
das adaptações que mais se destaca diz respeito à língua utilizada por esse grupo, a
língua de sinais, que deveria fazer parte do currículo de todas as escolas brasileiras por
ser reconhecida como forma de expressão das pessoas com surdez (MACHADO, 2006).

IMPORTANTE
Inicialmente, é basilar compreender que há uma diferença entre surdez e deficiência audi-
tiva, de acordo com a quantidade de decibéis de audição que a pessoa tem. Isso influencia
na forma de se comunicar e de viver no mundo, pois muitas pessoas com deficiência auditiva
não fazem uso da língua de sinais, pois escutam um pouco e desenvolvem a leitura labial. Do
mesmo modo, algumas pessoas com surdez também não usam a língua de sinais para se
comunicar, pois também utilizam a leitura labial ou outras formas de comunicação. Logo, de-
pendendo da perspectiva, podemos ter dois pontos de vista a respeito da deficiência auditiva
e da surdez. Do ponto de vista orgânico, são sinônimos utilizados para se referir a qualquer
tipo de perda auditiva em grau leve, moderado, severo ou profundo, em um ou ambos os
ouvidos. Da perspectiva histórica e cultural, enfatiza-se diferentes modos de vivenciar as
diferenças de audição.

A surdez na concepção clínico-terapêutica é uma diminuição da capacidade de per-


cepção normal dos sons, que traz ao indivíduo uma série de consequências ao seu
desenvolvimento, principalmente no que diz respeito à linguagem oral. Considera-se
uma pessoa com surdez aquela cuja audição não é funcional na vida comum, e uma
pessoa com surdez parcial aquela cuja audição, ainda que difícil, é funcional, com ou
sem prótese auditiva. Essa concepção está baseada no laudo médico, aquele feito por
profissionais da saúde a partir do CID (Classificação Internacional de Doenças).

Quando pensamos a surdez na perspectiva pedagógica e social, começamos a en-


tender como uma experiência visual que pode oferecer às pessoas com surdez uma
possibilidade diferente de constituir sua subjetividade por meio de outras experiências.

8
Essas experiências, mediadas por formas alternativas de comunicação simbólica, en-
contram na língua de sinais seu principal meio de concretização. Também, entende-se
ser uma realidade heterogênea e multifacetada, sendo que cada pessoa é única e cons-
truirá sua identidade a partir das suas experiências sociais e culturais. Dessa forma, 1
compreende-se que as pessoas com surdez têm direito a ter uma educação bilíngue,

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priorizando a língua de sinais como sua língua materna e primeira língua, e o aprendi-
zado da língua portuguesa como segunda língua.

É importante levar em consideração que o fato de ter uma deficiência auditiva não signifi-
ca que a pessoa vai fazer uso da língua de sinais, que vai vivenciar a cultura surda e nem
ter uma identidade surda. Tudo vai depender da forma como ela se percebe no mundo,
como ela se reconhece enquanto ser humano. A respeito das causas para a deficiência
auditiva, podemos dividi-las em três tipos, tal como explanada no Quadro abaixo.
Quadro 01. Causas da surdez

CAUSAS
` Virose, rubéola, sarampo, toxoplasmose, citomegalovírus (doenças infectocontagiosas).

` Patologias que causam ruptura uterina, deslocamento prematuro da placenta.

` Gestação de Alto Risco.

` Incompatibilidade sanguínea (RH).

PRÉ-NATAIS ` Desordens genéticas ou hereditárias.

` Consanguinidade.

` Drogas ou alcoolismo materno.

` Desnutrição/subnutrição/carências alimentares maternas.

` Exposição à radiação.
` Sofrimento fetal

 Anóxia

 Fórceps

PERINATAIS  Posição inadequada do feto

 Ruptura precoce da bolsa d’água

` Sífilis, herpes

` Pré-maturidade, pós-maturidade
` Sarampo, caxumba e meningites

` Medicações tóxicas

PÓS-NATAIS ` Exposição a sons muito altos por muito tempo

` Problema físico ou lesões no ouvido

` Traumatismos cranianos
Fonte: elaborado pela autora.

Língua Brasileira de Sinais 9


Conhecendo a Língua Brasileira de Sinais

Conhecer essas causas não vai orientar a organização do trabalho pedagógico do pro-
fessor, porém, possibilita o entendimento do que pode ter mais comprometimentos ou
não em razão da causa da sua deficiência, fazendo assim com que o professor possa
1 buscar melhores estratégias de ensino e talvez ir por outros caminhos, mesmo que não
a língua de sinais.

Como destacado anteriormente, nem todas as pessoas com surdez/deficiência vão utili-
zar a língua de sinais para se comunicar. Essa “escolha” tem relação com o modo como
essas pessoas se percebem: com deficiência auditiva, usando aparelho e buscando por
meio da leitura labial sua forma de comunicação; ou então as com surdez que fazem
uso da Libras como forma de comunicação.

É essencial refletir também sobre as pessoas que possuem outras deficiências ou co-
morbidades associadas. No caso de uma deficiência física, por exemplo, essa pessoa
pode precisar de uma adaptação dos sinais, talvez por não conseguir realizar os movi-
mentos da forma “correta” por limitações do seu corpo. Em todos os casos são neces-
sários alguns cuidados por parte do professor.

EXEMPLO
No caso da pessoa que usa a leitura labial, o discente precisa estar sentado bem na frente
da sala, o professor precisa falar sempre deixando que o discente possa ver seus lábios, tam-
bém usar muito os recursos visuais em suas aulas. Já com a pessoa que usa Libras, o docen-
te também vai precisar de muitos materiais visuais, de um intérprete ou que ele mesmo saiba
sinalizar. Enquanto que, caso haja um discente que tenha deficiências ou comorbidades as-
sociadas, faz-se necessário reorganizar os sinais de uma maneira que ele possa realizá-la.

As pessoas com surdez já passaram por diferentes momentos ao longo dos tempos, e,
aos poucos, estão construindo e conquistando o seu espaço na sociedade, porém essa
não é uma tarefa fácil. Exige dedicação, paciência e muita persistência. Porém, também
exige que as pessoas ouvintes se coloquem no lugar delas, desenvolvendo a empatia
e o respeito ao próximo. Toda pessoa tem direito a aprender, mas é fundamental ter
alguém que ensine, e esse papel precisa ser desempenhado pela sociedade.
São as diversas condições sociais, econômicas, culturais, tecnológicas que
interferem na constituição de cada indivíduo. A partir de suas interações e
das condições que possibilitam essas interações, cada sujeito internaliza
formas específicas de se relacionar com os outros, com o meio e com ele
próprio (KRAEMER, 2012, p. 84).

Precisamos construir, ou melhor, tornar a sociedade e, principalmente, a escola, em


algo “de todos e para todos”, onde todos tenham seu espaço e possam aprender tudo
o que for ensinado, oferecendo todos os recursos de acessibilidade necessários para a
educação de todas as pessoas. Muitas escolas e instituições de ensino, ainda em pleno
século XXI, não estão preparadas para dar conta das necessidades dos discentes que
fazem parte dela; no fim, a escola, muitas vezes, não se adequa ao estudantes, mas ele
é que precisa se adequar para estar naquele espaço.

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SAIBA MAIS
O processo de ensino-aprendizagem dos aprendizes com surdez é, sobretudo, um desafio
para os professores de escolares regulares, que devem agir por meio das orientações para 1
a educação inclusiva.

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Para saber mais a respeito do assunto, acesse o artigo de Luiz André Brito Coelho, Silvana Eli-
sa de Morais Schubert e Ronaldo Quirino da Silva, intitulado “Surdos: o desafio da inclusão no
ensino regular”. Disponível em: https://educere.bruc.com.br/arquivo/pdf2017/25255_12185.pdf.
Acesso em: 16 ago. 2021.

Até mesmo escolas e instituições que oferecem cursos na área e se dizem prepara-
das para atender a diferença, na verdade, não estão. Poderiam ser relatadas diversas
histórias de surdos em relação a esses espaços, mas é importante ao menos destacar
que ao mesmo tempo em que estamos evoluindo com novas descobertas e novas tec-
nologias, estamos deixando de lado o mais importante: o ser humano que precisa da
proximidade, do contato visual, do olho no olho para receber e expressar informações,
sentimentos, emoções ou desejos. Nesse sentido, são criados aplicativos que visam
o desenvolvimento tecnológico da comunicação, mas seus criadores e, por vezes, a
sociedade em geral se esquecem que a comunicação precisa ser feita entre pessoas, e
não com aparelhos (PAIVA et al., 2018).

O uso da língua de sinais parte do pressuposto da interação visual, isto é, os sinais são
produzidos e recebidos de forma visual ou tátil, no caso de quem não ouve e também
não enxerga, conhecidos como pessoas com surdocegueira. Por vezes, o ouvinte não
se dá conta de aspectos simples na comunicação, mas que fazem toda a diferença para
a pessoa com surdez. Por exemplo, a forma de sinalizar, a composição da frase e dos
falantes no espaço, a vestimenta e acessórios utilizados durante a comunicação.

Além da sinalização, a Libras possui uma forma de ser escrita, o sistema SignWriting.
Segundo Paixão e Alves (2018, p. 52), “[n]o Brasil, o sistema de escrita SignWriting
surgiu em 1996, porém, disputa espaço com mais dois sistemas criados aqui mesmo”.
A escrita de sinais segue os preceitos da língua de sinais. Esse sistema ainda é pouco
utilizado dentro da comunidade surda, visto sua complexidade, pois se faz necessário
desenhar o sinal com toda sua composição: configuração de mão, ponto de articulação,
movimento, expressão facial e corporal.

Língua Brasileira de Sinais 11


Conhecendo a Língua Brasileira de Sinais

Figura 01. Como escrever os parâmetros do SignWriting

Expressão
Orientação da facial
palma da mão

Configuração
de mão

Movimento
Ponto de
articulação
Fonte: Barros (2020, p. 12).

A imagem acima apresenta algumas das formas de representar os parâmetros da lín-


gua de sinais, os quais serão abordados em outra unidade. Esses parâmetros são os
aspectos que compõem o sinal, sendo assim de fundamental importância, principal-
mente quando tentamos representá-lo por meio do desenho. Precisamos destacar ain-
da que as línguas de sinais se apresentam em uma “[...] modalidade diferente das
línguas orais; são línguas espaço-visuais, ou seja, a realização dessas línguas não é
estabelecida através dos canais oral-auditivos, mas através da visão e da utilização do
espaço” (QUADROS, 1997, p. 46)

Podemos compreender, assim, que a língua de sinais (no caso do Brasil a Libras),
constitui-se enquanto língua visuoespacial, que possui uma gramática própria, segue
cinco parâmetros que formam o sinal (as palavras) e tem um vocabulário que por vezes
é difícil de se traduzir para uma língua oral.
Seria legítimo pensar que é uma língua que surge espontaneamente quando
a pessoa nasce com uma perda auditiva, mas seria uma ideia errônea. Na
verdade, o termo “natural” designa a característica das línguas orais e sina-
lizadas utilizadas pelos seres humanos em suas diversas interações sociais,
e se diferencia do que se chama de “linguagem formal”, isto é, linguagens
construídas pelo ser humano, como as linguagens de programação de com-
putador ou a linguagem matemática (HARRISSON, 2013, p. 55).

Costuma-se assumir que a língua de sinais é uma língua natural. Dessa forma, a ideia
que vem junto é a de que a pessoa com surdez já nasce sabendo-a. Mas deve-se
atentar à necessidade de ensinar e trabalhar com a língua de sinais com a pessoa com
surdez em todas as faixas etárias de sua vida, assim como o ouvinte estuda e aprende
as regras do português durante toda a sua vida escolar.

A aquisição da Libras ocorre igual a das línguas orais: o ouvinte não precisa ir para a escola
para aprender a falar o português, mas sim para aprender suas regras e formas de uso.

12
A fim de compreender um pouco mais sobre a organização da língua de sinais precisa-
mos pensar na língua oral. Ela acontece de forma sequencial no tempo.
As línguas de sinais, por outro lado, são produzidas por movimentos das mãos,
do corpo e expressões faciais em um espaço à frente do corpo, chamado de 1
espaço de sinalização. A pessoa “recebe” a sinalização pela visão, razão pela

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qual as línguas de sinais são chamadas de visuoespaciais ou espaço-visuais.
Dependendo do tipo de enunciado produzido, dos sinais utilizados, do que se
deseja expressar, poder-se obter uma sinalização em que vários sinais podem
ser feitos simultaneamente, pois, no caso dos movimentos envolvidos, não há
impedimento anatômico. Em outros momentos, os sinais são produzidos um
após o outro, sequencialmente (HARRISSON, 2013, p. 59).

Essa explicação facilita a compreensão de como se dá a organização da língua, e o


motivo dela receber esse nome: língua de modalidade visuoespacial.

2. MARCOS LEGAIS, PEDAGÓGICOS, EDUCACIONAIS E


SOCIAIS RELACIONADOS À EDUCAÇÃO DE PESSOAS COM
SURDEZ NO BRASIL
A educação de pessoas com surdez passou por diferentes situações, assim como acon-
teceu com outros grupos minoritários. Houve um momento em que eles não tinham a
possibilidade de fazer parte da escola, em outro podiam estar apenas nas escolas es-
peciais e em outro, ainda, passaram a fazer parte da inclusão.
A crença de que o surdo era uma pessoa primitiva fez com que a ideia de
que ele não poderia ser educado persistisse até o século XV. Até aquele mo-
mento eles viviam totalmente à margem da sociedade e não tinha nenhum
direito assegurado. A partir do século XVI tem-se notícias dos primeiros edu-
cadores de surdos (GOLDFELD, 2002, p. 28).

Podemos afirmar que a educação de surdos teve início com o Abade Charles Michel de
L’Epée, por volta de 1750 na França. A partir dele, a língua de sinais francesa começou a
ganhar forma e a se constituir como uma comunicação utilizada pelas pessoas com sur-
dez. Inicialmente, foram atendidas mais ou menos 75 pessoas que passaram a aprender
a língua de sinais, por meio do método manual, com L’Epée (GOLDFELD, 2002).

5 anos mais tarde, ainda na França, a escolarização das pessoas com surdez teve iní-
cio com a fundação da primeira escola para pessoas com surdez. Começou de forma
gratuita e assim continuou até 1791, quando se transformou no Instituto Nacional de
Surdos-Mudos de Paris (hoje Instituto Nacional de Jovens Surdos de Paris).

Em 1778, na Alemanha, foi criada a primeira instituição de pessoas com surdez do pastor
Samuel Heinicke em Leipzig. Tinha-se como base fundamental para o ensino a Oralidade,
que logo será explicada. Já o Congresso Internacional de Educação de “Surdos”, no ano
de 1880 em Milão, na Itália, focou muito na deficiência auditiva (WITCHS, 2014).

SAIBA MAIS
Conhecer a Língua Brasileira de Sinais é mais do que entender como essa língua funciona e
se estrutura; precisa-se conhecer um pouco como se deu a história da educação de pessoas

Língua Brasileira de Sinais 13


Conhecendo a Língua Brasileira de Sinais

com surdez no Brasil. Dessa forma, é válido ler o artigo “História da educação dos surdos
no Brasil”, de Nerli Nonato Ribeiro Mor e Ricardo Ernani Sander, no qual apresentam uma
importante reflexão sobre o tema.
1
Para ler o artigo na íntegra, visite: http://www.ppe.uem.br/publicacoes/seminario_ppe_2015/
trabalhos/co_04/94.pdf. Acesso em: 16 ago. 2021.

A educação de pessoas com surdez passou, ao longo da sua trajetória, por algumas
fases: oralismo, comunicação total e bilinguismo.

A primeira perspectiva é o oralismo, em que, para a aquisição, é necessário um tra-


balho sistematizado, contínuo e prolongado, feito por um profissional competente para
desenvolvê-lo. Apesar de ainda ser usado hoje, o oralismo teve seu auge em 1880 (a
partir do Congresso de Milão, quando foi abolido o uso da Língua de Sinais) até 1970,
permanecendo por praticamente um século como abordagem exclusiva na educação
das pessoas com surdez.
O Oralismo percebe a surdez como uma deficiência que deve ser minimi-
zada pela estimulação auditiva. Essa estimulação possibilitaria a aprendiza-
gem da língua portuguesa e levaria a criança surda a integrar-se na comu-
nidade ouvinte e desenvolver uma personalidade como a de um ouvinte. Ou
seja, o objetivo do Oralismo é fazer uma reabilitação da criança surda em
direção anormalidade, à “não-surdez” (GOLDFELD, 2002, p. 34).

A intenção, nessa perspectiva, é tornar a pessoa com surdez mais próxima do ouvinte,
desenvolvendo habilidades que não são tão simples, uma vez que ela não escuta e,
assim, não recebe o retorno auditivo que precisaria para “falar”. Além do estímulo au-
ditivo feito com o uso de aparelhos auditivos e do implante coclear, idealiza-se que a
pessoa venha a desenvolver a fala para assim se comunicar com as demais pessoas
sem problemas ou dificuldades.

Para algumas pessoas, principalmente as mais velhas e que vivenciaram a influência


desse período mais fortemente na escola e na sociedade em geral, isso é possível,
mesmo que com dificuldades. Porém, nem todas as pessoas conseguem se adaptar
a essa forma de comunicação e a esse modo de vivenciar o mundo. Nesses casos
surgem os problemas de aprendizagem, a depressão e outras doenças e dificuldades.
Há relatos de quem vivenciou tal momento, principalmente na escola, de que as mãos
da pessoa com surdez eram amarradas nas suas costas, evitando assim que tentasse
usar as mãos para se comunicar, precisando então recorrer ao uso da fala para interagir
com qualquer pessoa.

Outro período diz respeito à comunicação total. Nessa perspectiva, para além da lín-
gua oral, são necessários outros recursos que favorecem a comunicação da pessoa
com surdez. Ela surgiu na década de 1970, e foi uma alternativa ao oralismo. Faz uso
de todos os meios que possam facilitar a comunicação: fala, leitura labial, alfabeto ma-
nual, língua de sinais, desenho e escrita. Tem como objetivo auxiliar a compreensão da
língua falada, razão pela qual é vista, por muitos, mais como uma extensão do oralismo
do que como oposição ao mesmo.

14
A filosofia da comunicação total tem como principal preocupação os proces-
sos comunicativos entre surdos e surdos e entre surdos e ouvintes. Esta filo-
sofia também se preocupa com a aprendizagem da língua oral pela criança
surda, mas acredita que os aspectos cognitivos, emocionais e sociais não
devem ser deixados de lado em prol do aprendizado exclusivo da língua oral. 1
Por este motivo, essa filosofia defende a utilização de recursos espaço-vi-
so-manuais como facilitadores da comunicação (GOLDFELD, 2002, p. 38)

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Dentro dessa corrente ideológica, acredita-se que fazer uso da língua oral e da língua
de sinais ao mesmo tempo pode facilitar o aprendizado e a comunicação da pessoa
com surdez. Mas é importante salientar o que pode ocorrer e não ser tão benéfico: o uso
do português sinalizado. O que é esse português sinalizado? É quando a pessoa utiliza
a língua de sinais, mas na estrutura do português, falando e sinalizando ao mesmo tem-
po sem seguir as regras gramaticais da língua de sinais, que são diferentes das da
língua portuguesa. Sabemos que quando isso ocorre, muitas vezes a mensagem acaba
não chegando de forma completa e compreensível (QUADROS, 1997).

Já na atualidade, o bilinguismo é a abordagem mais defendida, pois entente que a


língua de sinais é assumida como primeira língua, respeitando a diversidade cultural e
variação linguística das pessoas com surdez.

Figura 02. Variação linguística bilingue

L1 – Língua de L2 – Língua
sinais portuguesa

Fonte: elaborado pela autora.

Essa visão “[...] tem como pressuposto básico que o surdo deve ser bilíngue, ou seja,
deve adquirir como língua materna a língua de sinais, que é considerada a língua natu-
ral dos surdos e, como segunda língua, a língua oficial de seu país” (GOLDFELD, 2002,
p. 42). É no bilinguismo que a identidade e a cultura surda ganham cada vez mais força,
pois entende-se a pessoa a partir das suas escolhas, não só de língua, mas no jeito de
ser e viver.

Paixão e Alves (2018, p. 48) explanam que “[a] visão de que a comunidade surda é uma
minoria linguística é muito importante porque interfere no modo de lidar com a surdez,
sobretudo na educação e no modo de interagir com o surdo”. Hoje, no Brasil, ainda se
pode dizer que são poucos os ouvintes usuários da Libras, embora tenham sido criados
diversos cursos envolvendo o aprendizado dessa língua.

Com o reconhecimento da Língua Brasileira de Sinais como forma de comunicação da co-


munidade surda, muitos foram os avanços conquistados. A inserção da disciplina nos cursos
de formação de professores e de fonoaudiologia, a oferta e o aumento de procura por cursos

Língua Brasileira de Sinais 15


Conhecendo a Língua Brasileira de Sinais

na área também são indícios de uma preocupação por parte de, ao menos, uma pequena
parcela da população.

1
Em complemento, Paixão e Alves (2018) ainda abordam o aspecto positivo da difusão
da língua de sinais e, consequentemente, de espaços ocupados por pessoas com sur-
dez, que antes eram destinados apenas a ouvintes. Hoje, por exemplo, ouve-se falar de
pessoas com surdez na faculdade, no mestrado e no doutorado, inclusive no mercado
de trabalho ocupando cargos de mais destaque, não só em funções de baixa remune-
ração, como acontecia.

Nessa linha, surgem as escolas bilíngues: para garantir o aprendizado da língua de


sinais como primeira língua e do português escrito como segunda, assim como para
favorecer o aprendizado e a difusão da cultura e da identidade surda. Contudo, não
é exatamente isso que tem acontecido, pois, mesmo tendo uma proposta bilíngue, a
maioria das instituições acaba não colocando realmente essa estrutura em prática.

Surgem, assim, as discussões a respeito do local de ensino mais adequado para os


s com surdez: escola inclusiva ou escola especial bilíngue. A partir de vários estudos,
tem-se apontado os benefícios de a criança estudar na escola onde sua língua está em
evidência em todos os espaços e momentos, principalmente enquanto está em seu de-
senvolvimento inicial, nas primeiras aprendizagens. Mas isso se dá desde que a escola
inclusiva ou a escola bilíngue garanta o uso efetivo da língua de sinais por todos, ou
pela maioria das pessoas que fazem parte daquele lugar (CAMPOS, 2013).

Pensar na escola inclusiva vai além de garantir a presença de um intérprete ou profes-


sor bilíngue em sala de aula durante todos os momentos, engloba também favorecer o
aprendizado da língua de sinais pelos discentes da turma, professores, funcionários e,
quando, possível estender a todos da escola.
As escolas têm sido apontadas como o lugar onde as comunidades emer-
gem, e muitos as defendem como sendo de crucial importância para uma
educação bilíngue que reconheça a surdez como diferença linguística e cul-
tural, pois é no encontro com outros surdos que as crianças surdas se perce-
bem como diferentes e não como deficientes e inferiores. Quando isoladas e
convivendo apenas com ouvintes, essas crianças tendem a se olhar e a se
narrar de modo negativo, como sujeitos incompletos, deficitários, inferiores
(THOMA, 2012, p. 97).

Conviver com seus pares, com aqueles que compartilham da mesma forma de pensar,
que usam a mesma língua, que têm costumes muito parecidos é o que pode empoderar
a pessoa com surdez. Isso lhe dá status de integrante e participante de uma comunida-
de, da sociedade, e não apenas ser mais um, alguém que compartilha de um mesmo
espaço e segue todas as regras e convenções de pessoas que não compreendem seu
jeito de ser e agir (THOMA, 2012).

A pessoa com surdez acaba desenvolvendo e aprendendo diferentes formas de intera-


gir com o outro: usando mímica, gestos, desenhos e escrita, por exemplo, e assim con-
segue entender e se fazer entender. Quando ela quer permanecer em escola e espaços
de ouvintes, tende a se esforçar mais para desenvolver a oralidade, mas quando quer

16
permanecer com os seus acaba por frequentar apenas escolas especiais de surdos,
clubes ou associações onde a sua língua é respeitada e tem o status de língua materna.

Essa discussão sobre a melhor escola que deveria ser frequentada pelos estudantes 1
com surdez é algo que está muito em pauta nos dias atuais. Isso porque existem os
defensores da escola inclusiva que apresentam os benefícios de estar nesse espaço.

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Todavia, também há as pessoas que defendem a educação especial bilíngue e que vão
apresentar todos os pontos positivos de fazer parte dessa educação. Não se tem um
consenso de qual seja o ambiente melhor ou mais adequado, o que se sabe é que a
pessoa com surdez precisa ter a língua de sinais como sua primeira língua e o portu-
guês escrito como a segunda língua (CAMPOS, 2013).

SAIBA MAIS
Para quem tem interesse em aprofundar seus conhecimentos a respeito da Libras enquanto
instrumento de aprendizagem escolar, recomendamos a leitura do artigo de Andrea Guim-
arães de Carvalho e Renata Rodrigues de Oliveira García intitulado “Contexto escolar e o
ensino para surdos: a Libras como instrumento de educação e de identidade”. Disponível
em: https://www.revistas.ufg.br/revsinal/article/view/58737/34015. Acesso em: 16 ago. 2021

Ainda em relação aos aspectos sociais, “[o] próprio conceito de deficiência é um con-
ceito culturalmente formado. As crianças surdas não se sentem diferentes, a não ser de
um modo mediado, secundário, como resultado de suas experiências sociais” (GOLD-
FELD, 2002, p. 82). Posto de outro modo, é a partir das vivências socioculturais de cada
indivíduo que a diferença pode ou não ser percebida de forma mais intensa. À vista
disso, a comunidade surda se organiza em espaços onde diferentes aspectos da cultura
estão em evidência: festas, teatro, encontros e demais situações.
As comunidades surdas brasileiras criaram as associações com o objetivo
de reunir os surdos para se encontrarem e conversarem sobre diferentes
assuntos com fim social, político e esportivo. Nesses espaços, os surdos
encontram seus parceiros, casam e têm filhos. Essa grande família que se
une a partir de traços identitários, tais como ser surdo e usar a língua de
sinais, estabelece espaços que acolhe os surdos e consolida relações de
pertencimento (QUADROS, 2017, p. 23).

Entretanto, até o momento, não temos a língua de sinais enquanto forma de comunica-
ção de todos os espaços culturais e sociais, por exemplo, cinema, teatro, supermerca-
do, feira, área da saúde, escolas, clubes e outros tantos espaços em que as pessoas
costumam circular. Sendo assim, a pessoa com surdez precisa buscar formas para se
comunicar com as pessoas nesses espaços ou nem frequentar, pois a sua língua, na
maioria das vezes, não é utilizada por quem está lá.

De acordo com Quadros (2017, p. 33), a língua de sinais é considerada uma língua de
herança. Isso significa que ela é uma língua que “[...] é passada de geração de surdos
da comunidade (não necessariamente dentro do núcleo familiar) que é uma língua usa-
da por comunidades brasileiras dos grandes centros urbanos em um país”. Em outras
palavras, a língua de sinais precisa ser aprendida para ser ensinada, e vice-versa.

Língua Brasileira de Sinais 17


Conhecendo a Língua Brasileira de Sinais

Uma das grandes conquistas da comunidade surda foi o reconhecimento da língua de


sinais como meio de comunicação oficial, a partir do artigo 1º da Lei nº 10.436, de 2002
em que
1 [é] reconhecida como meio legal de comunicação e expressão a Língua Bra-
sileira de Sinais - Libras e outros recursos de expressão a ela associados.
Parágrafo único. Entende-se como Língua Brasileira de Sinais - Libras a
forma de comunicação e expressão, em que o sistema lingüístico de nature-
za visual-motora, com estrutura gramatical própria, constituem um sistema
lingüístico de transmissão de idéias e fatos, oriundos de comunidades de
pessoas surdas do Brasil (BRASIL, [n. p.]).

Essa lei passou a vigorar a partir do Decreto 5.626/2005, que indica que a Libras:

Figura 03. Decreto 5.626/2005

LIBRAS é uma forma


de comunicação legal
da pessoa com surdez

Discorre sobre as
Aborda a inclusão da
questões referentes ao
LIBRAS enquanto
acesso de educação
disciplina curricular
e saúde

Decreto 5.626/05

Aborda sobre a
Trata da formação do
formação do tradutor e
professor e do instrutor
intérprete de LIBRAS e
de LIBRAS
língua portuguesa

Apresenta diversos
aspectos sobre o uso
e difusão da LIBRAS e
do português para que
as pessoas com surdez
tenham acesso
à educação

Fonte: adaptado de Brasil ([n. p.]).

Tanto a referida lei como o decreto supramencionado são extremamente completos e


importantes para a área, mas que nem sempre são cumpridos efetivamente, permane-
cendo sem garantir na prática os direitos assegurados das pessoas com surdez

18
Segundo apontam Paixão e Alves (2018, p. 49), no Brasil, existe “[...] um mito de que a
Libras é a segunda língua oficial desse país”, mas isso não é verdadeiro pelo fato que
os documentos e registros oficiais do país são todos feitos apenas na língua portugue-
sa. Portanto, a única língua realmente oficial do país é o português e a língua de sinais 1
fica sendo reconhecida como a língua da comunidade surda somente.

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3. O ENSINO COMUM E O ATENDIMENTO EDUCACIONAL
ESPECIALIZADO (AEE).
O Atendimento Educacional Especializado (AEE), com este nome, passou a estar pre-
sente nas escolas em 2008, a partir da Política Nacional de Educação Especial na Pers-
pectiva da Educação Inclusiva (BRASIL, 2008), a qual apresenta a inclusão escolar de
discentes com deficiência, transtornos globais do desenvolvimento e altas habilidades/
superdotação em escolas regulares. Antes, esse atendimento acontecia de forma subs-
tituta ao ensino regular, sendo realizado majoritariamente apenas em escolas especiais.

No ano seguinte, a Resolução nº 4, de 02 de outubro de 2009, instituiu as Diretrizes


Operacionais do AEE, o que e como deve ser feito, assim como tem o objetivo de escla-
recer qual o público-alvo a ser atendido por esse serviço. No segundo artigo, apresenta
a função do AEE, que é
[...] complementar ou suplementar à formação do [aprendizes] por meio da
disponibilização de serviços, recursos de acessibilidade e estratégias que
eliminem as barreiras para sua plena participação na sociedade e desenvol-
vimento de sua aprendizagem (BRASIL, [n. p.]).

Juntamente com a política e a resolução, começaram a ser instaladas as Salas de


Recurso Multifuncionais nas escolas brasileiras. Essas salas são divididas em duas
modalidades, tipo I e II, sendo que na segunda constam materiais e recursos específi-
cos para o público que possui deficiência visual, como impressora em braille, reglete,
punção e outros.

Existem muitas escolas brasileiras com as salas de recursos, entretanto, nem todas
possuem professores que possam atuar nesses espaços. Em alguns casos, os profes-
sores atuam nas salas, mas não possuem a formação necessária para usar os recursos
ou então atender aos estudantes da forma ideal. Há professores que trabalham com dis-
centes com surdez, mas que não sabem Libras, outros que trabalham com estudantes
com deficiência visual, mas não conhecem os recursos disponíveis e nem sabem como
lidar. Enfim, vivemos diferentes situações a respeito desses espaços tão importantes
disponíveis e nas escolas que nem sempre são usados de forma correta e proveitosa.

A Resolução nº 4 concebe as Diretrizes Operacionais para o Atendimento Educacional


Especializado na Educação Básica, modalidade Educação Especial, conforme já men-
cionado anteriormente. Ela apresenta informações importantes que devem ser conhe-
cidas e estudadas por todos os professores, tanto aqueles que atuam na sala regular,
quanto aqueles que podem vir a trabalhar nesses espaços.

No quarto artigo, destaca-se quem é o público-alvo da educação especial, quem deve


ser atendido, da seguinte maneira:

Língua Brasileira de Sinais 19


Conhecendo a Língua Brasileira de Sinais

Art. 4º Para fins destas Diretrizes, considera-se público-alvo do AEE:


I – Estudantes com deficiência: aqueles que têm impedimentos de longo
prazo de natureza física, intelectual, mental ou sensorial.
1 II – Estudantes com transtornos globais do desenvolvimento: aqueles que
apresentam um quadro de alterações no desenvolvimento neuropsicomotor,
comprometimento nas relações sociais, na comunicação ou estereotipias
motoras. Incluem-se nessa definição estudantes com autismo clássico, sín-
drome de Asperger, síndrome de Rett, transtorno desintegrativo da infância
(psicoses) e transtornos invasivos sem outra especificação.
III – Estudantes com altas habilidades/superdotação: aqueles que apresen-
tam um potencial elevado e grande envolvimento com as áreas do conheci-
mento humano, isoladas ou combinadas: intelectual, liderança, psicomotora,
artes e criatividade (BRASIL, 2009, [n. p.]).

A partir disso, compreende-se que o estudante com surdez faz parte desse público a ser
atendido pelo profissional do AEE. É fundamental frisar a relevância do trabalho multidisci-
plinar e integrado, com plena participação da família para o bom desempenho dos planos
de atendimento especializados/individuais. Cada um deles tem sua finalidade e importância
dentro da organização de vida escolar do aprendiz com surdez, não só pensando na escola,
mas também nos diferentes espaços onde ele circula e que fazem parte do seu dia a dia.

Precisamos ter em mente que nem todo aprendiz com surdez tem somente a surdez, pois
é comum que se pense que “oferecer a língua de sinais” basta. Ou então, quando recebe-
mos um estudante com deficiência visual, apenas proporcionar o braille lhe dará todas as
condições necessárias para se desenvolver.

Muitos estudantes com condições diferentes de audição e visão, podem apresentar uma ou
mais deficiências associadas à sua condição, sendo necessário organizar o trabalho de uma
forma diferente. Nesses casos, é vital pensar em recursos e possibilidades de aprendizagem
para além do uso da língua de sinais. Portanto, o trabalho do professor do AEE se faz fun-
damental e a elaboração do Plano Educacional Individualizado (PEI) se torna indispensável.

SAIBA MAIS
Todo educador precisa conhecer e saber das leis e normativas que regem a área da edu-
cação especial. Faz-se necessário saber o que está previsto nesses documentos para as-
sim podermos “lutar” por melhores condições e pelos direitos das pessoas que necessitam.
Dessa forma, tanto a Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação
Inclusiva quanto a Resolução nº4 de 2009 são ótimas dicas de material extra de leitura.
Disponíveis em: http://portal.mec.gov.br/arquivos/pdf/politicaeducespecial.pdf e http://portal.
mec.gov.br/dmdocuments/rceb004_09.pdf. Acesso em: 16 ago. 2021.

Espera-se que o professor do AEE organize o seu trabalho de uma forma que possa
oferecer diferentes possibilidades ao discente. Com frequência, costuma-se trabalhar
com um Plano de Atendimento Educacional Especializado, conhecido também como
Plano Educacional Individualizado (PEI). Esse plano é considerado uma proposta de
organização curricular que norteia a mediação pedagógica do professor, servindo,

20
assim, como um registro ou mapeamento daquilo que o já alcançou e daquilo que
ainda precisa ser alcançado.

O Plano Educacional Individualizado (PEI) é um documento, normalmente, elaborado 1


pelo professor do AEE em parceria com o professor da sala regular, e deve ser utilizado
e colocado em prática por todos os envolvidos na educação do discente na escola. Costa

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e Schmidt (2019) comentam que existem países em que o PEI é considerado um dispo-
sitivo educacional e assim tem sua previsão e garantia por meio de lei, sendo as escolas
orientadas a utilizá-lo. Em países como a Itália, a França e os Estados Unidos, por exem-
plo, o PEI é realmente posto em prática pelos professores com os s que necessitam, não
sendo apenas mais um papel ou documento cunhado, mas não colocado em prática.

Durante a elaboração do PEI, alguns detalhes devem ser levados em consideração:

` Qual a deficiência que o discente possui? Como ela pode afetar seu desenvolvimento?

` Quais informações temos sobre as necessidades e preferências aprendiz?

` O possui uma vida independente? Como ela se relaciona com outras pessoas?

Saber tais informações pessoais é importante e pode, com a elaboração do PEI, impac-
tar seu desenvolvimento. Assim, podemos pensar em quatro etapas para a construção
do PEI, conforme apresentado abaixo.

Figura 04. Etapas da construção do Plano Educacional Especializado (PEI)

Etapas para a construção do Plano Educacional Especializado (PEI)

Conhecer o estudante: traçar um perfil com suas habilidades


1ª Etapa e necessidades. Conhecer sua história, seus gostos, seus
conhecimentos prévios e o que precisa desenvolver

Estabelecer metas: definir as metas de curto, médio e longo


2ª Etapa prazo a serem atingidas. Avaliar o que deve ser ensinado em cada
espaço de tempo, a partir do perfil individual de cada estudante.

Elaboração do cronograma: depois de definir as metas, faz-se


3ª Etapa necessário estabelecer como e quando serão executadas, ou
seja, organizar um cronograma.

Avaliação: realizar o registro avaliativo do discente com os


4ª Etapa procedimentos adotados e avaliando as metas alcançadas. Esse
registro deve ser contínuo.

Fonte: elaborado pela autora.

Pode ser relevante ter mais pessoas participando da elaboração do PEI, para além do
professor da sala regular e do professor do AEE, como ter a participação da família e

Língua Brasileira de Sinais 21


Conhecendo a Língua Brasileira de Sinais

dos demais profissionais que o atendem, pois, essas pessoas participam ativamente do
ambiente educativo e conferem, consequentemente, respeito, segurança e afetividade
ao estudante. Isso porque ele não frequenta apenas a escola, já que a grande maioria
1 desses passos também podem ser desenvolvidos nos outros espaços de sua vivência.

Na primeira etapa, então, a família ocupa papel principal, pois são as pessoas que
passam a maior parte do tempo com a criança, jovem ou adolescente, possuindo assim
muitas informações pertinentes.

Nas etapas dois e três, além da família e da escola, pode ser interessante contar com
a presença de outros profissionais que o atendem, por exemplo, psicóloga, fonoaudió-
loga, terapeuta ocupacional, psiquiatra e outros profissionais. Cada um deles desem-
penha uma função no desenvolvimento do estudante, o que pode ser complementado
pela escola e vice e versa; o trabalho em rede proporciona um maior desenvolvimento
ao estudante com surdez. Tanto no estabelecimento de metas, quanto na elaboração do
cronograma, é preciso levar em consideração os avanços que o estudante já alcançou,
muitas vezes antes mesmo de ter ingressado na escola.

Na quarta etapa, pode ser necessário recorrer novamente à equipe, para que haja a
continuidade no trabalho; assim, deve-se fazer uma avaliação do que foi atingido, daquilo
que ainda precisa ser trabalhado e como será alcançado. Esse trabalho em rede é que
faz a diferença nas metas alcançadas, pois cada participante possui informações e co-
nhecimentos acerca da sua área, e, quando contribui com a equipe, favorece o discente.

IMPORTANTE
O PEI deve ser planejado para um ano e, por ser projetado a fim de atender as necessidades
de um discente, deve-se considerar suas dificuldades e suas potencialidades, é único, indi-
vidual. Outro aspecto a ser averiguado são as conquistas do ano anterior (no caso da con-
tinuidade escolar, aquilo que já foi alcançado de um ano para o outro).

O referido plano, embora muito conhecido como PEI, não possui uma nomenclatura
única, nem ao menos um único modelo. Mello (2019) apresenta algumas possibilidades
que encontrou em sua pesquisa de doutorado, a saber:
PEI – Plano Educacional Individualizado: Sassaki (1999), Tannús-Valadão
(2010, 2013), Glat, Vianna e Redig (2012), Pletsch e Glat (2013); PDEI – Pla-
no de Desenvolvimento Educacional Individualizado: Pletsch e Glat (2012);
PDI – Plano de Desenvolvimento Individual: Poker et al. (2013); PEI – Pla-
nejamento Educacional Individualizado: Tannús-Valadão e Mendes (2014),
Campos (2016) (MELLO, 2019, p. 81, grifos do autor).

Essa observação se justifica pelo fato de que, dependendo da escola, da rede, do mu-
nicípio ou do estado, a nomenclatura e o modelo podem ser diferentes, mas todos
eles têm o mesmo objetivo: organizar uma proposta curricular a ser executada com o
estudante. Costa e Schmidt (2019, p. 104) acrescentam que, no conceito do PEI, suas
diversas nomenclaturas “[...] envolvem os termos instrumento, recurso, registro, mapa,
estratégia, ferramenta, documento ou processo”. Embora haja muitas possibilidades,
todos possuem uma orientação comum: todos precisam de autorização dos responsá-
veis para que ele seja elaborado e colocado em prática.

22
Como os discentes, às vezes, precisam de outros suportes, para além da surdez para
dar conta de aprender e se desenvolver, faz-se fundamental o conhecimento das cau-
sas da surdez, conforme apresentado anteriormente, pois dependendo da causa, outros
comprometimentos podem existir. O PEI, de acordo Pereira (2014), pode ser tido como 1
um recurso que visa facilitar o acesso ao currículo regular; deve-se, assim, no momento

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de sua elaboração, responder a quatro perguntas fundamentais que são apresentadas
no Quadro a seguir.
Quadro 02. Descrição dos questionamentos para um PEI como instrumento de acesso ao currículo regular

QUESTÃO DESCRIÇÃO
Priorizar as habilidades e conceitos do currículo geral que são mais relevantes para
O que ensinar?
o estudante, diante de suas necessidades.
Descobrir formatos de instruções mais relevantes às necessidades do discente,
Como ensinar? identificar quais estratégias, métodos e materiais alternativos devem ser usados
para ajuda-lo a desenvolver habilidades básicas ainda não adquiridas.
Pensar em contextos físicos que podem aumentar a participação do estudante,
Em quais otimizando seu aprendizado. Isso implica em variar os arranjos do contexto físico/
condições? instrucional, proporcionando oportunidades para trabalhar em isolamento e/ou em
grupo; flexibilizar o prazo de cumprimento das atividades
Compreender que o investimento nos estudantes gera avanços que podem ser
sutis e processuais. Para reconhece-los é preciso se desvincular do imediatismo
Por que ensinar?
e buscar estratégias colaborativas que possam atingir os objetivos traçados pela
escola, família e profissionais.
Fonte: adaptado de Pereira (2014, p. 52)

Cada uma dessas perguntas: o que ensinar, como ensinar, em que condições e
por que ensinar vai ajudar o professor e a equipe envolvida a pensar o que realmente
pode auxiliar o estudante. Também, o PEI vai ajudar o professor e demais envolvidos a
realmente conhecer o discente com quem estão trabalhando, quais os recursos e estra-
tégias que vão proporcionar um maior desenvolvimento, sempre respeitando o tempo e
as necessidades de cada um.

Desde o ano de 2009, com a Resolução nº 4, já mencionada anteriormente, iniciaram-


-se as discussões e a elaboração dos planos de atendimento educacional especializado
realizados pelo professor de AEE. Por que somente esse profissional é mencionado?
Pois, no Brasil, ainda se tem o pensamento equivocado de que apenas o professor do
AEE é o responsável pelo planejamento, execução e avaliação do PEI com os aprendi-
zes público-alvo. O Quadro abaixo apresenta um modelo de PEI.
Quadro 03. Plano Educacional Individualizado

Escola:
Estudante: Ano/série:
Equipe de elaboração Período de elaboração:
ÁREAS DE HABILIDADE INTELIGÊNCIAS/METAS METODOLOGIA AVALIAÇÃO
E RECURSOS
Facilidade que o estudante DIDÁTICOS Registro de situações
apresenta para compreender o significativas no
conteúdo que será oferecido desenvolvimento do
discente

Língua Brasileira de Sinais 23


Conhecendo a Língua Brasileira de Sinais

1. Habilidades
acadêmicas
(leitura, escrita,
1 soletração, matemática,
línguas)
2. Habilidades da
vida diária
(Vestuário, aparência,
organização de pertences
pessoais, lidar com
dinheiro, locomoção)
3. Habilidades motoras/
atividade física
(Coordenação olho-mão,
equilíbrio, natação, jogar
bola, andar de bicicleta)
4. Habilidades sociais
(Atitudes, comportamentos)
5. Habilidades de
recreação e lazer
(Jogos, esportes,
passeios)
6. Habilidades
pré-profissionais e
profissionais
(Seguir instruções,
uso de ferramentas,
organização do local das
atividades)
Fonte: adaptação do modelo de Romeu Kazumi Sassaki, 1999. The Individual Education Program (IEP), manual compilado
pela Northern California Coalition for Parent Training and Information (NCC), [s. d.]

O Quadro acima apresenta um modelo de PEI que pode ser usado no contexto escolar.
Qual é o sentido de ter um PEI, um Plano Educacional Individualizado que acontece
apenas com um profissional, uma vez por semana, de uma determinada maneira? Esse
questionamento deve estar presente nas discussões a respeito do tema, pois se o do-
cumento tem esse objetivo, ele acaba não sendo tão útil ao desenvolvimento escolar.

O PEI deve ser elaborado e executado nessa parceria, estabelecendo uma sintonia
entre o professor da sala comum e o professor da educação especial (MELLO, 2019).
Quando esse trabalho se organiza de forma articulada e colaborativa, as chances de
dar certo e se obter bons resultados ampliam muito.

Ainda há, contudo, muitos professores que pensam que para o discente com surdez
apenas é necessário oferecer o intérprete de Libras ou então o ensino de língua para
que ele dê conta de acompanhar o andamento das aulas. Em alguns casos sim, pode
ser que seja preciso somente isso, mas em muitas situações apenas essa tomada de
atitude não é suficiente para favorecer o seu desenvolvimento.

24
De acordo com Pereira (2014, p. 53), “[a] elaboração de um PEI pode ser uma oportu-
nidade importante para exercer um trabalho colaborativo entre professores, pais, estu-
dantes, funcionários e especialistas”, uma vez que ele não deve ser desenvolvido ape-
nas no espaço da sala de recursos ou então pelo professor do AEE, mas sim em todos 1
os espaços no quais o discente frequenta. O PEI vai oferecer informações de diversas

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áreas do conhecimento e de diversas áreas da vida do aprendiz.

Em sala de aula, deve-se potencializar o envolvimento e a interação com outros estu-


dantes, buscando formas para que isso aconteça sem que ninguém seja obrigado a
nada, mas que se sintam à vontade e motivados para tal. A integração, o envolvimento
e o sentimento de pertencimento ao espaço educativo são essenciais para o aprendiza-
do. Isso gera segurança, prazer e afetividade.

O Atendimento Educacional Especializado (AEE) surge como um importante serviço


que visa garantir o desenvolvimento dos estudantes público-alvo da educação especial
de forma mais completa. O trabalho realizado por esse profissional, quando em parceria
com o professor da sala de aula, os especialistas que atendem o aprendiz e a família,
oferece mais possibilidades de êxito. Trabalhar em rede, organizar o Plano Educacional
Individualizado (PEI) em parceria com todos esses atores torna sua execução e avalia-
ção mais ricas.

Conhecer as leis e normativas que regem o AEE pode garantir que o acesso e perma-
nência do estudante na escola aconteça de maneira correta e com todos os profissio-
nais necessários. Elaborar um PEI centrado no discente, em que ele seja o principal
ator do processo e seguindo as quatro etapas apresentadas para a construção desse
documento é necessário e fundamental.

Ter claro quais áreas serão trabalhadas, quais as metas a serem alcançadas, qual a
metodologia e os recursos didáticos a serem utilizados e como será feita a avaliação
faz com que o trabalho do professor e demais profissionais tenha um caminho a ser
percorrido e que todos tenham os mesmos objetivos a serem alcançados.

No caso dos estudantes com surdez, o primeiro passo do ensino comum e do AEE
acaba sendo o ensino da língua de sinais, pois muitos estudantes chegam sem esse
conhecimento prévio. “O ambiente mais adequado para que o surdo adquira inicialmen-
te a sua língua natural é o meio familiar. Entretanto, em ambiente não natural também
ocorre a aquisição de língua de sinais” (PAIXÃO; ALVES, 2018, p. 51). Assim, muitas
vezes a escola se torna o espaço onde o estudante com surdez vai aprender a língua
oficialmente, e o grande problema é quando isso acontece tardiamente, a partir dos 6
anos de idade com o início do ensino fundamental, por exemplo.

Quando o aprendiz com surdez chega à escola sem o domínio da língua de sinais, ele
precisa aprender a língua enquanto está se alfabetizando em português. É nesse momen-
to que costumam acontecer os problemas e atrasos de aprendizagem, pois o professor
em sala de aula não poderá apenas se preocupar em ensinar os conteúdos indicados
para aquele ano escolar, mas precisará paralelamente ensinar a língua a esse estudante.
Dessa forma, o trabalho do ensino comum e do AEE precisa estar em sintonia para que o
estudante não seja ainda mais prejudicado (PAIXÃO; ALVES, 2018).

Língua Brasileira de Sinais 25


Conhecendo a Língua Brasileira de Sinais

Refletir sobre os conhecimentos que o aprendiz já possui é importante para que o pro-
fessor tenha conhecimento de que ter um discente com surdez em sua sala de aula
com a presença de um intérprete não significa que ele dará sua aula para todos os
1 estudantes da mesma forma; talvez o estudante com surdez precise de mais atividades
que também o auxiliem no aprendizado da língua para além do conteúdo escolar.

“Quanto ao ensino da língua portuguesa, a proposta bilíngue para surdos concebe o


seu desenvolvimento baseado em técnicas de ensino de segundas línguas” (QUADROS,
1997, p. 29).

Se o aprendiz chega à escola já dominando a língua de sinais, o ensino do português


acontece mais facilmente. Daí a importância de se trabalhar com a língua de sinais o
mais cedo possível com a criança; nos primeiros meses de vida ela já é capaz de ad-
quirir os sinais e aprender frases.

“Uma grande mudança dentro da escola seria a de que as crianças ouvintes também
aprendessem a Libras; os [discentes] ouvintes podem aprender a Língua de Sinais”
(STUMPF, 2008, p. 29). Esse é o maior sonho e objetivo de quem atua na área da sur-
dez: todas as pessoas, e professores, surdos e ouvintes aprenderem a língua de sinais
e se comunicarem sem ser necessário contar com a mediação de outra pessoa, no
caso, o intérprete. Não que esse profissional deixaria de ser importante, mas existiriam
situações em que não seria preciso ter o tempo todo alguém fazendo a tradução para
que houvesse a interação entre esses dois grupos.

A língua de sinais não é só da comunidade surda, mas é de todos. Quando isso aconte-
cer na escola regular, poderemos dizer que ela se tornou bilíngue e que respeita todos
que estão nesse espaço.

4. AQUISIÇÃO DE UMA LÍNGUA DE SINAIS POR CRIANÇAS


SURDAS E OUVINTES NO ENSINO REGULAR
A aquisição da linguagem e, consequentemente, o desenvolvimento da Libras serão
possíveis para a criança que for exposta a situações e ambientes onde esses aspectos
estejam em evidência. A linguagem visual exerce forte influência no desenvolvimento
cognitivo da criança, e se dá, inicialmente, por meio do desenho. Isso porque
[...] a atividade do desenho nos primeiros anos da infância não deveria ser
apenas mero passatempo. É importante que, em um determinado momento,
os primeiros traços da criança comecem a fazer sentido e trazer algum signi-
ficado, e é aí que entra o papel do adulto, da fala e da mediação. O desenho
infantil passa a ser significativo pelo ato de nomear (ZERBATO; LACERDA,
2015, [p.429.]).

Enquanto desenha, o mediador vai estabelecendo uma comunicação com a criança


com surdez. Normalmente, após uma história infantil, brincadeira ou jogo pedagógico,
esse momento, que é tido como lazer e divertimento, pode proporcionar situações ricas
de aprendizagens, não somente da língua. Da mesma forma como acontece com a
criança ouvinte, as primeiras aprendizagens podem se dar por meio do desenho.

26
Paixão e Alves (2018) mencionam que a Libras se torna um importante instrumento de
interação para o desenvolvimento humano, sendo necessário dispor de diferentes es-
paços nos quais ela possa ser adquirida e aperfeiçoada pela criança. O primeiro lugar
para esse desenvolvimento seria a família, conforme já foi apontado. Porém, sabe-se 1
que a maioria das crianças com surdez nascem em famílias de pais ouvintes que não

Universidade São Francisco


dominam a Libras. Nesses casos, a língua não fica em evidência desde cedo e isso
pode vir a prejudicar seu aprendizado.

Muitas crianças chegam à escola com essa forma de comunicação inicial: uso de sinais
caseiros (como são chamados os sinais combinados dentro do ambiente familiar), ou
então com o uso de gestos e mímica. Nesses casos, esses recursos precisam ser aper-
feiçoados e transformados numa comunicação formal, que é o que a Libras oferece.

“A instituição educacional é um espaço de formação humana e sociocultural para os in-


divíduos que dela participam quando propicia espaços de respeito e promoção de iden-
tidade e cultura dos grupos aos quais atende” (PAIXÃO; ALVES, 2018, p. 51). Ou seja,
escolas onde se tenha um currículo bilíngue são fundamentais para essas crianças.

Pensar no trabalho pedagógico do professor em sala de aula, tendo ou não a presença


de intérprete ou professor bilíngue, é necessário buscar diferentes recursos e materiais
que possam facilitar o processo de aprendizagem. Focar em aspectos visuais e concre-
tos proporciona aulas interessantes não somente para os discentes com surdez, mas
sim para todos. O uso de vídeos para explicação de conteúdo, imagens reais e dese-
nhos, maquetes, diferentes formas de representação, de acordo com vários estudos,
são recursos e metodologias diferenciadas que favorecem a aprendizagem de toda e
qualquer criança.

Pode-se analisar no uso de método de experiência de diferentes situações: receitas


culinárias, brincadeiras, passeios ou situações, sempre com registro. O uso de histó-
rias também é um importante facilitador desse processo; é interessante propiciar ao
estudante que ele seja o protagonista da sua aprendizagem, que ele possa ajudar a
conduzir as aprendizagens necessárias para cada momento.

O profissional da educação precisa estar atento a tudo o que acontece em sala de aula,
observar, anotar e refletir são ações básicas de qualquer professor, mas quando se tra-
balha com crianças que necessitam de mais recursos isso se torna fundamental. A partir
dos erros e acertos, é possível refletir e planejar quais seriam os passos necessários
para um maior avanço e desenvolvimento do sujeito.

EXEMPLO
No processo de ensino e de aprendizagem sobre o sistema solar, o professor poderia utilizar,
além de sua explicação falada, vídeos, imagens e até mesmo uma representação por meio
de maquete desse sistema solar, com sua composição espacial, suas especificidades. Isso
fará com que todos os estudantes abstraiam e compreendam o conceito de forma mais ráp-
ida e concreta.

Por vezes, esquecemos da importância do concreto e do visual.

Língua Brasileira de Sinais 27


Conhecendo a Língua Brasileira de Sinais

Aprender uma nova língua envolve tempo, dedicação e esforço. Trata-se de


uma tarefa altamente complexa, pois muitos fatores estão em jogo: interes-
se, aptidão, aspectos sociopsicológicos tais como motivação, personalidade,
crenças, estilos cognitivos e estratégicos. Esse repertório de elementos é
1 de suma importância para que se compreenda se ocorre e como ocorre a
aprendizagem (GESSER, 2012, p. 37, grifos do autor)

Uma sugestão de trabalho que pode ser realizada em sala de aula com estudantes
com surdez e ouvintes, visando o aprendizado da língua de sinais, é o método de “ex-
periência”. O Método de Experiência vem como um recurso pedagógico, utilizado por
professores na aquisição da linguagem da criança com surdez, principalmente na fase
da Educação Infantil, mas que pode ser utilizado em outras etapas de aprendizagem.
Ele proporciona um ambiente estimulador por meio de pequenas práticas do cotidiano
da criança, como fazer um leite com chocolate, contar uma história ou uma atividade
inusitada que ocorre com ela.

É durante essas práticas, programadas ou não, que também a criança aos poucos
adquire a linguagem por meio de modelos linguísticos da sua língua materna, a Libras.
Podemos destacar como exemplos de experiências:

` Passeios a uma fazenda pedagógica;

` Pão com doce de leite;

` Café com leite;

` Bolo de cenoura;

` Brincadeira;

` História;

` Passeio.

A experiência se inicia antes da sua execução. Após a escolha da experiência o profes-


sor elabora um “Agendão”. Essa preparação e o agendamento prévio da experiência
têm como objetivo não só a organização familiar, mas também envolver a família neste
processo por meio da participação efetiva das crianças nas atividades da escola. Desde
casa, a criança se prepara para a realização da experiência, sendo também uma forma
de incentivar a comunicação entre os pais e os filhos.

O “agendão” é uma programação de curto prazo, em que constam as atividades a se-


rem desenvolvidas nas aulas, os materiais solicitados aos estudantes designados. Ele
tem como objetivo:

` Informar aos pais algumas atividades que serão feitas na escola;

` Promover a comunicação por meio da Libras entre pais e filhos;

` Proporcionar uma organização prévia aos pais;

28
` Envolver a família nesse processo através da participação efetiva das crianças nas
atividades da escola.

1
Segue, no Quadro, um exemplo de “agendão”:

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Quadro 04. Proposta de “Agendão”

DIA ATIVIDADES MATERIAIS


Trazer:
João
1 saco de pipoca
AGENDÃO 16/06 (Segunda- Experiência da em grãos;
Maria
feira) pipoca
Senhor Pais! 1 lata de óleo;
Ana
Nesta semana, estamos Sal
iniciando o trabalho
sobre o tema “Festa Trazer uma roupa Todos os
17/06 (Terça-feira) Quadrilha
junina”. Começaremos de caipira discentes
com a experiência Confecção de Material da sala
da pipoca. Vejam a 18/06 (Quarta-feira) Professora
bandeirinhas de aula
programação:
Confecção de Material da sala
19/06 (Quinta-feira) Professora
jogo da memória de aula
Material da sala
20/06 (Sexta-feira) Ensaio da quadrilha Professora
de aula
Fonte: elaborado pela autora.

Retomando a experiência, ela deve ser realizada juntamente com a criança, de prefe-
rência ela própria é quem deve organizar os ingredientes e preparar a receita, no caso
de uma atividade culinária, por exemplo. Em seguida, é organizado um cartaz ou uma
folha com o registro dessa experiência.

Também deve ser feita uma cópia para que a criança possa levar para casa e organizar
o seu livro de receitas. Ou então seu livro de histórias, se for feito o registro de um pas-
seio, uma história ou uma brincadeira. Nesse registro, além do português escrito que
auxilia na alfabetização, deve-se usar o registro em sinais, para que quando o estudan-
te revisitar o material ele possa lembrar dos sinais que aprendeu.

EXEMPLO
A família é responsável por comprar e organizar os ingredientes. Porém, é fundamental que a
criança participe de todos os momentos, pois é nesse momento que ela irá compreender que
um alimento precisa ser comprado em um estabelecimento para ser utilizado. Pois, até esse
momento, ela acredita que o alimento surge na cozinha, surge no armário. Então ela precisa
participar de tudo, desde a compra dos ingredientes.

Inicialmente, é feita a organização dos passos, e o professor juntamente com os estudantes


separa os ingredientes necessários para efetivação da receita, nas quantidades corretas, e
os organiza em uma mesa — mas cada discente irá organizar e fazer a sua parte. É impor-
tante que a criança seja protagonista da situação: não é ela que vai assistir, mas sim ela que
vai fazer, vai realmente “colocar a mão na massa”.

Língua Brasileira de Sinais 29


Conhecendo a Língua Brasileira de Sinais

Um segundo passo fundamental para a receita é o registro, pois é a partir dele que a criança
terá na sua memória como foi feita a receita. O professor, juntamente com a criança, organi-
za, se possível, a utilização dos rótulos, de todos os ingredientes. Caso não consiga usar o
1 rótulo pode ser um desenho feito de próprio punho; também ao lado da receita e do desenho,
se possível, colocar o sinal da língua de sinais. Dessa receita é importante que seja feita uma
cópia, para que cada criança coloque no seu caderno de receitas, assim elas vão experien-
ciar um aprendizado diferente.

Trabalhar com as receitas possibilita desenvolver a língua de sinais e o estudante surdo


poderá em algum momento da sua vida usar desse conhecimento para mostrar que é capaz
e que tem muitas potencialidades. Essa é mais uma forma de interação com a sociedade.
Então a receita pode ser feita, e a experiência pode ser feita não apenas com receitas, mas
também brincadeiras, histórias ou um passeio.

Esse material vai facilitar não só o aprendizado dos estudantes com surdez e ouvintes,
mas seus familiares também, pois vai para casa e pode servir de base para conversas
e momentos de trocas, quando o aprendiz ensina seus pais sua língua e a língua de
seus colegas.

Trabalhar com o ensino de uma língua não é somente ensinar vocabulário, ou seja,
palavras, no caso das línguas orais, ou sinais, no caso das línguas de sinais. A língua é
mais do que isso, precisa-se mergulhar e compreender aspectos culturais e socais que
compõem essa língua. Logo, deve-se atentar ao fato de que “[o] ensino de uma língua
envolve a conexão entre língua e cultura, a compreensão de um sistema complexo de
ideias, valores e costumes.” (GESSER, 2012, p.15-16, grifo nosso).

Ao trabalhar com o ensino de Libras, precisamos ter em mente também que existem
diferentes estilos de aprendizagens e que nem todas as pessoas seguem os mesmos
estilos. À vista disso, Gesser (2012) considera que tais estilos envolvem a visão, audi-
ção e cinestesia, e cada pessoa tem pelo menos um estilo que mais se destaca. É, por-
tanto, fundamental identificar qual é o melhor meio de se proporcionar mais situações
de aprendizagens, tal como estilos de aprendizagem.
Quadro 05. Estilo de aprendizagem

ESTILO FOCO DESCRIÇÃO EM LIBRAS...


Visual Ler e observar Utilizam-se coisas para serem ... é primordial no
vistas ou observadas, incluindo desenvolvimento do aprendiz
fotos, filmes, diagramas, de sinais.
demonstrações, apostilas
exposições etc.

30
ESTILO FOCO DESCRIÇÃO EM LIBRAS...
Auditivo Ouvir e falar Engloba a transferência de ... pode ser relevante no
informação, por meio da escuta desenvolvimento do aprendiz
(a palavra falada ou outros sons de sinais se concebermos a 1
e ruídos). recepção e produção da Libras
na sua “oralidade visual”.

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Cinestésico Tocar e fazer Conta com a experiência física: ... pode ser relevante no
sentir, mexer, explorar, aprender desenvolvimento do aprendiz
fazendo e experiências com as de sinais se pensarmos a
mãos. importância do uso das mãos
e do corpo para a produção
linguística dos sinais.

Fonte: Gesser (2012, p. 51-52).

Além desses estilos apresentados acima, podemos frisar outros estilos de aprendiza-
gem, como: concreto, analítico, comunicativo e autoritariamente orientado. Cada um
deles possui suas características particulares e se tornam fundamentais para serem
compreendidos (GESSER, 2012). Aliadas aos estilos temos as estratégias de aprendi-
zagens, que são os modos como o professor organiza e aplica sua aula, favorecendo
ou não o desenvolvimento dos seus estudantes.
Quadro 06. Aspectos que devem ser levados em consideração no momento de ensino do vocabulário
em Libras

AO ENSINAR VOCABULÁRIO DA LIBRAS...


Devote algum tempo ao ensino de vocabulário da língua de sinais, mas não toda a aula:
o ensino de vocabulário é importante, mas uma aula de língua é mais que ensinar uma
lista de palavras isoladas.

Contextualize os sinais: aborde o léxico de forma que os s saibam em quais contextos


estruturais (na sentença) e comunicativos (no uso) os sinais podem ser introduzidos para
ampliar o repertório linguístico dele.

Estimule o uso de dicionários bilíngues: dar ao aprendiz oportunidade de desenvolver


autonomia e senso investigativo. Há uma escassez de dicionários impressos em Libras
se compararmos com as outras línguas, e o acesso dos discentes também é limitado,
mas o professor pode trazer o dicionário e uma boa opção é fazer atividades com buscas
de sinais e estimular a pesquisa na internet.
Encoraje os s no desenvolvimento de estratégias: utilize formas e técnicas para que
seu discente compreenda o que você está sinalizando, através de associações, compa-
rações, mímicas, por exemplo. Isso extingue a necessidade de tradução ou confirmação
de significado a todo momento.

Língua Brasileira de Sinais 31


Conhecendo a Língua Brasileira de Sinais

AO ENSINAR VOCABULÁRIO DA LIBRAS...


Envolva-se com os momentos de ensino não planejado do vocabulário: em algum
momento da aula, pode surgir interesse de vocabulário que não estava previsto em seu
1 plano de ensino. Se isso ocorrer, trabalhe o vocabulário solicitado, pois pode ser uma
ótima oportunidade de focar nas necessidades individuais dos discentes.

É indispensável trabalhar, para além do vocabulário, aspectos gramaticais e a datilolo-


gia da Libras, ou seja, o uso do alfabeto manual, conforme já foi trabalhado. Alguns pro-
fessores ainda acreditam que basta trabalhar com o ensino de sinais isolados (palavras
soltas), mas, assim como acontece em outras línguas, muitos sinais podem ter mais de
um significado e serem produzidos de formas diferentes, dependendo do contexto em
que estão sendo realizados.

CONCLUSÃO
Nesta unidade, discutimos sobre a Libras no contexto escolar, sobre os aspectos culturais
e sociais que definem um grupo, no caso, a comunidade surda com seus costumes e a
formação da identidade surda. Destacamos a importância da Libras como um dos princi-
pais artefatos culturais dessa comunidade, mas que nem todas as pessoas com surdez
vão se identificar enquanto sujeitos surdos, membros da comunidade surda e usuários
da língua de sinais. As possíveis causas da falta de audição podem ou não trazer outros
comprometimentos que podem influenciar no aprendizado da pessoa com surdez.

Abordamos alguns dos marcos legais, pedagógicos, educacionais e sociais relaciona-


dos à educação de pessoas com surdez no Brasil que já influenciaram e/ou continuam
influenciando o ensino dessa população. Tratamos das fases pelas quais a educação de
pessoas com surdez já passou: oralismo, comunicação total e bilinguismo, apontando os
principais pontos de cada um deles e como esta postura marcou a comunidade surda.

Tratamos a respeito do ensino comum e o Atendimento Educacional Especializado


(AEE), qual é o papel do professor da sala de recursos, os benefícios da elaboração de
um PEI e o quanto ele ser seguido pode favorecer no desenvolvimento do estudante
com surdez, em sala de aula e nos outros espaços em que frequenta. Apresentamos as
leis que regem tanto a educação de surdos quanto a educação inclusiva, que assegu-
ram o direito à educação de qualidade e com o uso da língua de sinais como forma de
comunicação e primeira língua e o ensino do português escrito como segunda língua.

E finalizamos com a discussão sobre a aquisição de uma língua de sinais por crianças
surdas e ouvintes no ensino regular, quais seriam os benefícios de ambos os grupos
terem a possibilidade de se desenvolver nessa língua o mais cedo possível.

Também apresentamos o método da experiência com o “agendão”, que são recursos


que podem favorecer o aprendizado da criança com surdez e da criança ouvinte ao
mesmo tempo. E, ainda, discutimos acerca de como as experiências visuais são fun-
damentais para a pessoa com surdez e como auxiliam na comunicação e na aprendi-
zagem. Os professores, então, precisam estar cada dia mais preparados para atuar na
área da surdez, visto que a inclusão é uma realidade que bate à porta e não é possível
depender única e exclusivamente do intérprete para se comunicar com o seu aprendiz.

32
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Língua Brasileira de Sinais 35


Bilinguismo no ensino regular

UNIDADE 2

BILINGUISMO NO ENSINO REGULAR


2

INTRODUÇÃO
Dizer que o conhecimento parte de dentro do sujeito (visão inatista) ou que ele vem de
fora são concepções que polarizam o entendimento de ser humano e que ainda estão
presentes na educação. Por esse motivo, ainda há uma hegemonia frente ao “fazer do
professor”, que se alicerça em uma lógica de que o professor ensina e mecanicamente
o aluno aprende. Como se não houvesse uma relação humana entre eles, como se os
papéis (professor/aluno) não pudessem se misturar. Na busca por uma educação mais
humanizada, aposta-se na ideia de que o conhecimento é construído nas/pelas rela-
ções sociais, estabelecidas por meio da mediação do outro (professor, alunos entre si).

Por essa perspectiva, ao considerar a alfabetização e as aprendizagens da criança,


entende-se que o contato com a leitura e com a escrita acontece, geralmente, antes de
iniciar seu percurso escolar, o que ocasiona, às vezes, da criança chegar sabendo ler
e escrever seu nome. Assim, no trabalho pedagógico com vistas à alfabetização, é de
costume que a criança leve livros da biblioteca da escola para fazer a leitura em casa
com seus familiares. Dessa forma, pais, responsáveis e professores desempenham
papéis inter-relacionados e fundamentais no processo de aprendizagem; tanto na es-
cola quanto em casa, ambos devem proporcionar momentos em que possam ocorrer
vivências da criança com o mundo letrado.

É importante frisar que, algumas vezes, as crianças são vistas como se fossem iguais
entre si e tivessem as mesmas condições de acesso aos saberes culturais e todas no
mesmo tempo. Em relação àquelas que têm alguma deficiência, com frequência, imagi-
na-se que a “falta” de algo no corpo significa a falta de tudo, como “se não possui visão,
não consegue aprender”, “se não possui audição também não consegue aprender” e
assim por diante. Mas, a partir de muitos estudos já se sabe que cada pessoa possui
uma forma de aprender e mesmo tendo uma deficiência, síndrome ou transtorno é pos-
sível, a partir das leis, que ocorram aprendizagens, desde que haja estímulo e sejam
proporcionadas situações em que isso possa acontecer.

Muito antes dos seis anos, as crianças já constroem alguns conhecimentos, antes
mesmo de entrar na escola, pela mediação da família, isto é, aqueles que se colocam
disponíveis para essa tarefa. Nesse contexto, muitas crianças sem deficiência podem
chegar à escola já com conhecimentos de mundo estruturados, já fazendo hipóteses
importantes sobre a leitura e a escrita, entre outros. Neste texto, refletimos a respeito

36
do conhecimento de língua, no caso a língua de sinais, que pode vir a proporcionar o
bilinguismo, que é o uso da língua de sinais e do português escrito.

Precisamos garantir “voz” para todas as pessoas; a todo e qualquer ser humano que 2
está ali, que quer aprender e se desenvolver, precisamos oferecer possibilidades para
que a aprendizagem aconteça. Independentemente do nível de conhecimento que pos-

Universidade São Francisco


sui, ele busca estratégias para viver, se comunicar e se desenvolver. Quando não há
uma comunicação formal, ela pode se dar por meio de gestos, expressões faciais ou
corporais, as quais explicarão seus desejos e vontades – tais como fome, sede, sono –,
encontrando formas para se expressar.

Antes de ser possível o aprendizado da leitura e da escrita, faz-se necessário o conhe-


cimento de uma língua; no caso dos ouvintes nascidos no Brasil, o português, e das
pessoas com surdez nascidas no Brasil, a Língua Brasileira de Sinais – Libras. Dessa
forma, esta unidade pretende abordar os seguintes aspectos: a importância da Libras
no desenvolvimento da cognição e da linguagem em crianças surdas e ouvintes; o tra-
balho concomitante com a Libras e com a Língua Portuguesa em turmas regulares que
têm alunos com surdez na construção de um Bilinguismo para todos; e a alfabetização
e o letramento em turmas regulares com alunos surdos.

1. A IMPORTÂNCIA DA LIBRAS NO DESENVOLVIMENTO DA


COGNIÇÃO E DA LINGUAGEM EM CRIANÇAS SURDAS E
OUVINTES
Uma das crenças mais recorrentes quando se fala em língua de sinais é que
ela é universal. Uma vez que essa universalidade está ancorada na ideia de
que toda língua de sinais é um “código” simplificado aprendido e transmitido
aos surdos de forma geral, é muito comum pensar que todos os surdos falam
a mesma língua em qualquer parte do mundo (GESSER, 2009, p. 11).

Ao discutir sobre a língua de sinais, diversos aspectos se colocam em evidência, tal


como se ela:

` Pode ser considerada uma língua ou seria correto chamar de linguagem;

` É universal: em qualquer parte do mundo você consegue se comunicar com as pessoas


usando os mesmos sinais, dentre outros.

Precisamos deixar claro que a Libras se configura como uma língua, pois possui todos os
elementos necessários para tanto, dentre eles as regras gramaticais. Com isso, perce-
be-se que cada país possui a sua língua de sinais, e, mesmo dentro de um mesmo país,
podem existir variações devido às questões regionais que também implicam em mudan-
ças. Se, na língua oral, vivenciamos isso, como não teríamos essa diferença na língua de
sinais? O que muda com a variação são os sinais e não a estrutura da língua, esta perma-
nece igual em qualquer parte do país, do mesmo modo que acontece com o português.

Podemos destacar alguns aspectos gramaticais da Libras, dentre eles, o alfabeto e os


parâmetros fonológicos e morfológicos, por exemplo. Um dos componentes da língua

Língua Brasileira de Sinais 37


Bilinguismo no ensino regular

de sinais é o alfabeto, que também possui variação de país para país, ou seja, a con-
figuração de mão se modifica de acordo com a língua. Apresentaremos as imagens do
alfabeto em língua brasileira de sinais, língua gestual portuguesa, língua de sinais ame-
2 ricana e língua de sinais britânica. A principal diferença é que no caso dos três primei-
ros, ele é feito com apenas uma mão e no caso do britânico são usadas as duas mãos.

De acordo com Goés e Campos (2011, p. 71), “[...] o alfabeto manual é conhecido tam-
bém como alfabeto datilológico ou datilologia, com o qual é possível soletrar 27 diferen-
tes letras”, assim como o alfabeto da língua portuguesa que possui a mesma quantida-
de de letras. Abaixo podemos conferir algumas possibilidades de representação desse
alfabeto em diferentes línguas de sinais.

Figura 01. Alfabeto em Língua Brasileira de Sinais (Libras)

Fonte: Goés e Campos (2011, p. 72).

38
Figura 02. Língua Gestual Portuguesa (LGP)

Universidade São Francisco


Fonte: Goés e Campos (2011, p. 73).

Figura 03. American Sing Language (ASL)

Fonte: Goés e Campos (2011, p. 74).

Língua Brasileira de Sinais 39


Bilinguismo no ensino regular

Figura 04. British Sing Language (BSL)

Fonte: Goés e Campos (2011, p. 73).

Outro alfabeto que temos é o da língua de sinais escrita, conhecido como SignWriting,
ainda pouco utilizado como forma de registro pelas pessoas com surdez. Para que essa
escrita seja feita, existem algumas regras que a norteiam e precisam ser conhecidas por
quem vai tentar escrever. Para que possamos escrever em Libras é necessário repre-
sentar todos os parâmetros do sinal:

` As Configurações de Mão (CM);

` Os Pontos de Articulação (PA);

` Os Movimentos (M);

` As Expressões Não Manuais (ENM).

A Orientação da Palma da Mão (OR) já está representada diretamente no símbolo da


CM (BARROS, 2020, p. 12). Esses parâmetros são conhecidos como grafemas. Nas
imagens abaixo estão: o sinal feito em Libras com a mão, o desenho desse sinal à
esquerda, mais forte, e à direita está a representação de quando se tenta escrevê-lo à
mão, pois também é possível.
Figura 05. Escrita em língua de sinais (SignWriting)

40
2

Universidade São Francisco


Fonte: Barros (2020, p. 70).

Figura 06. Escrita em língua de sinais (SignWriting)

Fonte: Barros (2020, p. 71).

Língua Brasileira de Sinais 41


Bilinguismo no ensino regular

Figura 07. Escrita em língua de sinais (SignWriting)

Fonte: Barros (2020, p. 72).

SAIBA MAIS
Se você tem interesse em conhecer mais e estudar sobre a escrita em língua de sinais, consi-
dere acessar o livro: Como escrever em Libras, de Ricardo Barros que traz muitos exemplos
de práticas e teoria.

Para acessar o material, visite: https://www.signwriting.org/archive/docs13/sw1278_BR_


Como_escrever_em_Libras_Ricardo_Barros_05292020.pdf. Acesso em: 19 ago. 2021.

De acordo com Quadros e Karnopp (2004, p. 47), a Fonologia tem como objetivo “[...]
determinar quais são as unidades mínimas que formam os sinais” e “[...] estabelecer
quais são os padrões possíveis de combinação entre essas unidades e as variações
possíveis”. Nesse sentido, ela se dedica a estudar a composição dos sinais.

A respeito dos parâmetros fonológicos que compõem a língua de sinais, Goés e Cam-
pos (2011, p. 73) afirmam que Stokoe, no ano de 1960, a partir de estudos, apresentou
três parâmetros que constituem os sinais, sendo eles configuração de mão (CM); ponto
de articulação (PA) ou localização (L); e movimento (M). Porém, com o avanço nos estu-
dos, entendeu-se que além desses três parâmetros, a língua de sinais possuía também
orientação de mão (OR) e expressões não-manuais (ENM), e sem a junção desses
cinco parâmetros era difícil ter um sinal completo; daí a importância que cada um tem.

Quando tratamos de configuração de mão, muitas pessoas acreditam que elas se res-
tringem ao alfabeto manual, mas isso não é verdade, pois temos mais CM do que letras.
Isso pode ser observado na imagem abaixo:

42
Figura 08. Configurações de mão

Universidade São Francisco


Fonte: Goés e Campos (2011, p. 76).

O movimento diz respeito à forma como as mãos se movem no espaço, podendo se


apresentar em diferentes posições, e o sinal pode ser feito com uma ou com as duas
mãos. Ele é considerado um parâmetro complexo, pois envolve uma vasta gama de for-
mas e direções que englobam: movimentos internos das mãos; movimentos do pulso;
movimentos direcionais no espaço e séries de movimentos em um mesmo sinal.

A locação se refere ao local em que o sinal é produzido no espaço, podendo ser produzido
na cabeça, tronco e/ou braços. Costumamos mencionar que temos um espaço para sina-
lizar e que ele deve ser respeitado para melhor compreensão por quem está vendo a sina-
lização. A orientação da mão indica como a mão se posiciona durante o sinal: para cima,
para baixo, virada para o corpo, virada para frente, para a direita ou para a esquerda.

Sobre as expressões não-manuais, enfatiza-se que elas são um dos aspectos mais
importantes, pois complementam o sinal e dão sentido a ele. Fazer um sinal sem utilizar
a expressão correta pode ocasionar o não entendimento de significado.

EXEMPLO
Vamos pensar no sinal de triste. Se você não fizer uma expressão facial e corporal indicando
tristeza, possivelmente, quem estiver vendo o sinal não compreenderá se você está falando,
realmente, que está triste, ou se está fazendo uma piada.

Língua Brasileira de Sinais 43


Bilinguismo no ensino regular

Essas expressões são compreendidas como “não-manuais”, e são utilizadas em duas


situações nas línguas de sinais: marcação de construções sintáticas e diferenciação
dos itens lexicais.
2
Função sintática:

Marcar sentenças interrogativas sim-não, orações relativas, topicalizações, concordância


e foco.

Componente lexical:

Marcam referência específica, referência pronominal, partícula negativa, advérbio, grau ou


aspecto. (KARNOPP, [s. d.])

Quando abordamos a morfologia nessa área, Quadros e Karnopp (2004, p. 86) expli-
cam ser esse o “[...] estudo da estrutura interna das palavras ou dos sinais, assim como
das regras que determinam a formação das palavras”, ou seja, a partir de diferentes
aspectos é possível formar um novo sinal ou criar um a partir da união de outros.

Sobre a sintaxe, as autoras esclarecem ser esse o espaço no qual os sinais devem ser
produzidos, respeitando o uso do sistema pronominal e nominal (QUADROS; KARNOPP,
2004, p. 127). É possível posicionar pessoas e elementos no espaço e retomá-los durante
o discurso, sem ser necessário mencioná-los novamente, apenas usando um movimento
corporal ou o apontamento para o local onde ele foi posicionado anteriormente.

Se você olhar para uma comunidade linguística, vai notar que a língua é viva, dinâmica
e que pode sofrer modificações constantes no decorrer do tempo. A partir de todas as
considerações feitas até o momento, podemos perceber a importância de a língua de
sinais ser introduzida o mais cedo possível nos espaços em que a criança com surdez
está inserida, pois será com esse contato que ela poderá aprender e se desenvolver
nesse sentido. Mas, antes que a língua efetivamente seja aprendida, outro conhecimen-
to precisa ser adquirido e desenvolvido: a linguagem.

Desde o dia em que nasce, a criança está aprendendo diferentes coisas em diversos
contextos; tudo é aprendizado, que pode ser dividido em não-sistematizado e sistemati-
zado. O primeiro é aquele que acontece a todo o instante e em todo lugar, em que não
há uma sistematização para que ele ocorra; já o segundo poderia ser considerado como
aquele que acontece na escola, por exemplo, que se dá com uma intenção prévia, logo,
é sistematizado (VIGOTSKY, 2007).

Luria (2001, p. 27) frisa que “[...] a linguagem é um complexo sistema de códigos for-
mado no curso da história social” e tem a palavra como elemento principal que desig-
na as coisas, suas características, e nomeia ações e objetos. Além disso, as palavras
possuem a função de categorizar e de generalizar. Elas estão dentro do campo do
pensamento, pois podem ser utilizadas para referenciar não somente o que está pre-
sente, mas aquilo que está distante, que é abstrato. Isto é, somente o ser humano tem
a capacidade de referenciar pessoas e objetos sem que eles estejam presentes, por
meio da linguagem.

44
É importante destacar que, embora alguns animais consigam se comunicar entre si, a comunica-
ção mediada pela linguagem, com seus sentidos e significados, é exclusiva da espécie humana.

2
A linguagem é que permite a comunicação entre as pessoas e se torna a base para que
as aprendizagens aconteçam. A respeito disso, Fiorin (2013, p. 17) esclarece que “[a]

Universidade São Francisco


linguagem é uma atividade simbólica, o que significa que as palavras criam conceitos e
eles ordenam a realidade, categorizam o mundo”. É fundamental para a compreensão
e a expressão, pois dá sentido ao mundo por meio dela, os seres humanos podem se
expressar sobre coisas existentes e coisas criadas pela imaginação.

Podemos afirmar que existem diferentes tipos de linguagem e cada uma delas possui
uma finalidade, por um motivo. Dentre elas, podemos citar: linguagem oral, linguagem
espaçotemporal, linguagem sonoro-musical, linguagem gestual-corporal, linguagem do
jogo simbólico, linguagem visual e verbal, linguagem da natureza, linguagem escrita,
linguagem da higiene (JUNQUEIRA FILHO, 2013).

O desenvolvimento da linguagem é um assunto que merece bastante atenção: desde


o nascimento, a partir do contato com a mãe, há aprendizado das formas de expressar
dor, fome, desconforto e alívio. Sobre esse entendimento por parte dos bebês, de que
os sons assumem funções e que, existem comportamentos comunicativos importan-
tes no seu desenvolvimento, é que ele começa a produzir diferentes sons para determi-
nadas situações. Mesmo sem saber dizer que está com fome, ele chora de uma forma
que sua mãe o compreenda, e isso acontece para outras ações também. Dessa forma,
mesmo ainda sem distinguir os tipos de linguagens que estão sendo usadas, existem
comportamentos comunicativos (linguagem) em desenvolvimento.

Outro conceito que precisamos abordar é a linguagem do jogo simbólico, do qual fazem
parte as brincadeiras de faz de conta, os jogos com regras estabelecidas, por exemplo,
memória ou dominó, e os jogos e brincadeiras no geral, como estátua, pega-pega etc.
Criar brincadeiras envolvendo objetos que não possuem uma característica específica,
tal qual um pedaço de madeira que pode se transformar em um carrinho de brinquedo
ou em uma mamadeira para a boneca, são atividades que exigem a leitura e a compre-
ensão do simbólico.

No tocante à aquisição da linguagem para a criança com surdez que vai utilizar a língua
de sinais, o processo é muito próximo do que acontece nas línguas orais. Pois a criança
ouvinte e a criança com surdez passam pelos seguintes estágios de aquisição: período
pré-linguístico; estágio de uma palavra; estágio das primeiras combinações e estágio
das múltiplas combinações.

No período pré-linguístico, o balbucio ocorre em todos os bebês – com surdez e ou-


vintes, pois as crianças com surdez balbuciam (oralmente) até determinado período.
Existem duas formas de balbucio manual: balbucio silábico (combinações que fazem
parte do sistema fonético das línguas de sinais) e balbucio gesticulado (não apresenta
organização interna) (QUADROS, 1997).

O período de um sinal começa mais ou menos em 12 meses e vai até mais ou menos
2 anos de idade. Quando temos crianças com surdez, filhas de pais com surdez pode

Língua Brasileira de Sinais 45


Bilinguismo no ensino regular

começar aos 6 meses. Ele vai desaparecer com o uso do apontamento para indicar
coisas. (QUADROS, 1997).

2 O estágio das primeiras combinações vai iniciar por volta de 2 anos de idade. A crian-
ça costuma usar a seguinte ordem para elaborar suas frases: SV, VO e depois SVO (S =
sujeito, V = verbo, O = objeto), e pode apontar para o interlocutor querendo falar sobre
si, assim como os objetos são nomeados e referidos somente em situações do contexto
imediato, sem que seja possível retomá-los (QUADROS, 1997).

A respeito do estágio de múltiplas combinações, por volta de 2 anos e meio e 3 anos,


ocorre a explosão do vocabulário. Começam a usar o sistema pronominal não-presente,
podem “empilhar” os referentes não-presentes em um único ponto no espaço, ou seja,
sinalizar a mãe, o pai, o irmão, todos no mesmo local, sem diferenciar os pontos do
espaço. Já o domínio completo de recursos morfológicos da língua é adquirido por volta
dos cinco anos (QUADROS, 1997).

SAIBA MAIS

Para saber mais sobre o tema “Aquisição das línguas de sinais por crianças surdas”, assista
à live das professoras Aline Pizzio (UFSC) e Lodenir Karnopp (UFRGS), com a mediação
da Profa. Alessandra Jacqueline Vieira, na qual as docentes esclareceram muitas dúvidas a
respeito do assunto.

A roda de conversa está disponível no Canal GEALin Grupo de Estudos em Aquisição da


Linguagem: https://youtu.be/AD57FqXhlD0. Acesso em: 19 ago. 2021.

Diferente da linguagem, que pode ser utilizada tanto por animais quanto por humanos, a
língua é aprendida e utilizada pelos homens. As pessoas usam a língua, principalmente,
para trocar informações, interagir e representar o mundo. Há uma importante relação
entre linguagem e língua, pois a primeira é a base para o desenvolvimento da segunda.
A língua, enquanto integrante da linguagem, precisa de um repertório de signos para se
desenvolver. Ela é composta por sons, palavras e orações.
Figura 09. Definição de Língua

Uma língua é um conjunto de representações simbólicas do mundo físico e do mundo mental que:

(1) é compartilhado pelos membros de uma dada comunidade humana como recurso comunicativo;

(2) serve para a interação e integração sociocultural dos membros dessa comunidade;

(3) se organiza fonomorfossintaticamente (sons + palavras + frases) segundo convenções


firmadas ao longo da história dessa comunidade;

(4) coevolui com os desenvolvimentos cognitivos e os desenvolvimentos culturais dessa


comunidade, sendo então sempre variável e mutante, um processo nunca acabado;

(5) se manifesta concretamente por meio de um repertório limitado de sons emitidos pelo
aparelho fonador de cada indivíduo.
Fonte: adaptada de Bagno (2014, p. 22).

46
Costuma-se associar a língua à fala e, ao ponderar sobre o assunto, concebe-se uma
língua oral ou verbal. No caso das pessoas com surdez, a forma de comunicação mais
utilizada tem sido a língua de sinais, que não recorre à oralidade. A respeito disso,
Bagno (2014, p. 61) expõe que “[a]s línguas de sinais são sistemas tão complexos e 2
completos quanto as línguas faladas e, justamente por isso, são chamadas de línguas

Universidade São Francisco


e já não de ‘linguagens’”.

O uso da língua ocorre de acordo com a situação comunicativa e o público-alvo envol-


vidos. A situação comunicativa envolve obrigatoriamente: um emissor, um receptor, um
contexto e uma intenção. Emissor é a pessoa que passa a informação, receptor é quem
recebe, contexto é a situação na qual a comunicação acontece (uma conversa, uma
aula, uma consulta médica) e a intenção se refere à finalidade de estar acontecendo.
Por exemplo, em uma aula, quando o professor pergunta algo a seus alunos ele tem
uma intenção para tal, pois não fala sem um motivo, independente de qual for.

O “ato comunicativo” ou “elementos da comunicação”, tem a “mensagem” como fator de


partilha/troca. A “mensagem” é tida como o objeto utilizado na comunicação; o conteúdo, o
conjunto de informações transmitidas e retroalimentadas pelos atores sociais envolvidos.

Cada vez que vai se referir a um assunto, o emissor cria combinações de palavras
levando em conta sempre os fatores: contexto e saberes compartilhados entre os inter-
locutores. Quando a criança ainda não domina uma língua, usa diversos métodos para
se comunicar, transmitindo uma mensagem, uma intenção, um desejo ou necessidade
para quem está a sua volta. Na maioria das vezes, cabe ao interlocutor (receptor) com-
preender e até mesmo decifrar essa mensagem ou aquilo que se quer comunicar. Isso
costuma acontecer com a mãe e o bebê, quando ele usa apenas do choro para passar
as informações necessárias: fome, fralda suja, sono ou incômodo.

Para que a comunicação se desenvolva, é necessário oferecer ambientes estimulan-


tes à criança, conversar sempre que possível, buscando não infantilizar a fala por ser
um bebê ou criança pequena. Por exemplo, quando a criança ainda não sabe ou não
consegue falar, mas as pessoas à sua volta procuram interagir com ela, aos poucos,
a criança aprende as diversas possibilidades de usos e significados de sua língua, vai
adquirindo linguagem e poderá iniciar o desenvolvimento de uma comunicação e pos-
teriormente a aprendizagem.

Com base no exposto, pode-se compreender a importância de se trabalhar com a lín-


gua de sinais para que haja o desenvolvimento da cognição e da linguagem, tanto em
crianças com surdez quanto em crianças ouvintes, pois todos precisam desses conhe-
cimentos para desenvolver uma língua, independentemente da forma como for.

2. O TRABALHO CONCOMITANTE COM A LIBRAS E COM


A LÍNGUA PORTUGUESA EM TURMAS REGULARES QUE
TÊM ALUNOS COM SURDEZ, NA CONSTRUÇÃO DE UM
BILINGUISMO PARA TODOS
Ao pensar sobre o trabalho concomitante envolvendo a Libras e o português em turmas
regulares que têm alunos com surdez, é necessário um olhar cuidadoso a respeito de

Língua Brasileira de Sinais 47


Bilinguismo no ensino regular

como isso acontece. Pois estamos tratando de duas línguas com características e es-
truturas que se diferenciam muito e, embora algumas pessoas tentem usá-las ao mes-
mo tempo, estudos apontam que isso não traz benefícios para quem está recebendo a
2 informação. Quadros (1997, p. 27) esclarece que ao refletir acerca do ensino bilíngue,
precisamos “[...] respeitar a autonomia das línguas de sinais e estruturar um plano edu-
cacional que não afete a experiência psicossocial e linguística da criança surda”.

A pessoa ouvinte terá a Língua Portuguesa como sua língua materna tanto na forma
oral quanto na escrita. Já a pessoa com surdez terá a língua de sinais como sua língua
materna e o português escrito como sua segunda língua. No primeiro caso, discorremos
sobre uma mesma língua com duas formas de representação, uma oral e uma escrita.
Já no segundo caso, abordamos duas línguas, uma gestovisual (a língua de sinais) e a
outra escrita (o português).

EXEMPLO
Podemos ter a seguinte escrita feita por pessoa com surdez (a escrita foi mantida como no
original, inclusive em relação à pontuação):

Como descobrir ficou surda, quando eu era bebê tinha 1anos passou febre alto perda auditi-
va, minha mãe me cuido me leve no hospital fique 2 anos meio morava hospital , daí médico
disse tua filha e surda não capaz e também falar muda , minha mãe não aceitava acredita
minha filha vai falar sim , pode escuta lutar futuro capaz sim , passou anos vida lutar foi mé-
dico faz fonoaudióloga fala , uso aparelho auditiva pra escutar melhor , foi muito difícil minha
vida , daí foi na escola especial nunca aprendi de português só lingual segundo Libras, minha
mãe percebe escreva horrível básico nunca aprende escreva boa , daí minha mãe sentar me
ensinar quero melhor escreva boa me apanhava castigo vai estudar quero teu bem futuro
passei sofri, mudei outra na escola inclusão surdos , começa na escola ensino médio , fique
3 anos estudar muito esforça escreva melhor português , graca a a Deus minha professora
português me ensinou foi muito difícil até fim agradeço minha professora recebe coração pa-
ciência muito vez me brigar , chata , faz trabalho entregar muito texto , todo dia queria me dá
bem por futuro . Um ano depois fiz curso administração também foi muito difícil há 2 anos tive
me preconceito pq minha voz diferente falar dificuldade me chama burra e não sabe escreva
, não capaz , faz coitar , eu passei sofreu chorei até também meu trabalho falta conhecimento
surdo , mas infelizmente grande muito preconceito até hoje , mas eu continuar lutar minha
vida “ Eu SOU CAPACIDADE ” não é coitado por causa “surda “ mostra quem é sou eu .., eu
tive depressão há 3 anos meio por que causa trabalho muito fazer me bullying , “ burra, fala
bobogem , não sabe ler , piada idiota , me chamou macaco louca , problema mental , nem
vai casar , não capaz mora sozinha , não capaz dirigir carro , não capaz sozinha sair lugar ,
não capaz trabalha , falta respeito , não é capaz , coita, lixo ...” é uma tristeza dor sofrimento ,
tentar levantar força , não foi fácil até hoje faz parte caminho no momento difícil, essa é meu
sonho administrativo, modelo mas triste preconceito não me respeita meus sonhos estragou
tudo minha vida , estou carregada faz parte levante a cima mostra “ CORAGEM “ capacidade
trabalho vários qualquer lugar pode trabalha sim não é coitada menos preconceito . Até hoje
.... mostra eu pode falar sim não é surda muda, eu posso escuta um pouco quero uso audi-
tiva aparelho pra escutar ser melhor capaz sim . Acredita sim !!!

O exemplo apresentado acima mostra um texto escrito por uma pessoa com surdez,
lembrando que foi mantido a forma original do texto, inclusive a pontuação. Precisamos
ter claro que a escrita da pessoa com surdez segue, em sua maioria, a sinalização, a

48
forma como a pessoa “fala”. Por isso, é indispensável de se trabalhar com o português
escrito constantemente.

Soares (2015, p. 15) explica que “[...] a aprendizagem da língua materna, quer escrita, 2
quer oral, é um processo permanente, nunca interrompido”. Dessa forma, compreen-
de-se que, ao longo de toda a vida, a pessoa vai aprender a sua língua materna, pois

Universidade São Francisco


como já foi visto anteriormente, podem ocorrer mudanças com o passar do tempo pelo
fato da língua ser algo vivo.

Quando consideramos o ensino bilíngue para os alunos com surdez, precisamos sem-
pre ter em mente que o primeiro passo é aprender a língua materna; no caso daqueles
que vão se identificar com a surdez e fazer uso da língua de sinais, deve-se aprender a
língua de sinais. Em um segundo momento, será preciso aprender a língua portuguesa
na forma escrita, enquanto segunda língua, e esse aprendizado costuma não ser fácil.
Na verdade, qualquer língua tem seu grau de dificuldade durante a apren-
dizagem, da mesma forma que as línguas têm seu grau de complexidade
em sua estruturação. Sendo assim, podemos afirmar que todas as línguas
são difíceis ou fáceis, em um primeiro momento, em correlação com o nível
de distinções ou semelhanças possíveis com nossa própria língua materna
(GESSER, 2012, p. 70).

PARA REFLETIR

Quem ensina a língua portuguesa nas escolas? O professor que tem uma formação espe-
cífica em Letras. Todos os professores acabam trabalhando e fazendo uso do português, mas
quem ensina é o professor que estudou para isso. Quando pensamos no ensino da língua
brasileira de sinais, costumava-se falar que somente a pessoa com surdez poderia ensinar,
pois essa era sua língua materna e só ela tinha os conhecimentos necessários para isso. Mas
muito se evoluiu nesse sentido, e hoje entende-se que o professor que deve ensinar a língua
de sinais é aquele que tem formação para isso, não precisando ser uma pessoa com surdez,
mas sim ser formado e ter fluência na língua.

Planejar o ensino bilíngue para crianças com surdez não é uma tarefa fácil e intuitiva,
exige uma proposta baseada em técnicas e na compreensão de que o ensino da Libras
pode estar articulado a uma segunda língua. Para o trabalho educacional com vistas
ao ensino dessa língua, é indispensável que o professor saiba reconhecer quais habi-
lidades a criança já apreendeu da língua de sinais. Nesse processo, que é complexo e
que envolve reconhecer que existe uma cultura surda que impacta na aprendizagem,
marcam-se, de acordo com Quadros (1997, p. 30), duas possibilidades de trabalho: “[...]
uma delas envolve o ensino da segunda língua quase de forma concomitante à aquisi-
ção da primeira língua e a outra caracteriza-se pelo ensino da segunda língua somente
após a aquisição da primeira língua”.

Para que isso realmente aconteça, precisamos ter claro que uma escola bilíngue e um
ensino bilíngue só se caracterizam dessa forma quando há o trabalho com as duas
línguas, tendo para tanto um professor de Libras e um professor bilíngue. Ou seja, o
professor de Libras vai ensinar a língua de sinais e o professor bilíngue vai trabalhar
os outros conteúdos usando para isso a língua de sinais. Então, os dois profissionais
precisam estar em sintonia.

Língua Brasileira de Sinais 49


Bilinguismo no ensino regular

Tanto o português quanto a Libras se dividem em: social e acadêmico. Na prática, quan-
do temos a língua social, ela é aprendida e usada somente de forma social, para
conversar e interagir com as pessoas, não se tem uma preocupação em estudar suas
2 regras. Ela costuma estar presente nos contextos da família e outras situações cotidia-
nas. Já a língua acadêmica é aquela que foca o estudo das regras e da norma culta a
ser usada. Normalmente, esse aprendizado ocorre na escola, quando você aprende a
língua e aprende sobre a língua. Dentro das escolas, muitas vezes, encontramos alguns
tipos de professores:

I. Professores sem domínio da Libras usando sempre de intérpretes para mediar suas aulas
com os alunos com surdez;

II. Professores bilíngues fluentes em Libras, mas sem saber fazer uso da Libras como língua
de instrução;

III. Professores bilíngues fluentes em Libras sem saber a metodologia apropriada para
ensinar os alunos com surdez; e

IV. Professores bilíngues preocupados em somente ensinar tudo em Libras, deixando o


português em segundo plano.

Esses quatro tipos de professores representam a grande maioria dos que estão em sala
de aula, porém precisamos que isso mude, no sentido de compreender o que realmente
significa proporcionar um ensino bilíngue aos nossos alunos com surdez, seja em esco-
la especial para surdos ou em escola regular por meio da inclusão escolar. Isso só será
possível quando tivermos mais oferta de formação para os professores, lembrando que
isso está previsto nas leis que regem a educação no Brasil, tanto na Política Nacional
de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva de 2008, como também
na Lei Brasileira de Inclusão de 2015.

Para o aprendizado de uma língua são necessárias algumas habilidades: ouvir, falar, ler e
escrever. Quando você possui essas quatro habilidades, pode-se dizer que você é profi-
ciente nessa língua. Quando nos referimos à língua de sinais, essas habilidades permane-
cem, mas com outro foco: visão (ver), oralidade (sinalizar), leitura (ler) e escrita (escrever);
na verdade, a única que realmente muda é o falar, que passa a ser sinalizar (NOVER;
ANDREWS, 1998). Assim, percebemos o quanto elas se aproximam em características.

O alfabeto manual permite a representação de grafemas e fornece aos alunos a habili-


dade de acessar o novo vocabulário que estão aprendendo. A natureza sequencial de
soletrar o alfabeto manual compete às características da língua portuguesa escrita. As-
sim, possui um papel fundamental nesse aprendizado, servindo enquanto habilidade que
promove a união das duas línguas: Libras e português, sendo percebida como uma ponte.

SAIBA MAIS
Para conhecer um pouco mais a respeito dessa organização do trabalho envolvendo a língua de
sinais, acesse o livro: Programa curricular de língua brasileira de sinais para surdos, de Neiva

50
de Aquino Albres, disponível em: https://libras.ufsc.br/wp-content/uploads/2017/03/2012-11-
ALBRES-e-SARUTA-Curriculo-LS-IST.pdf. Acesso em: 19 ago. 2021.

Esse material possui um conteúdo muito rico, com exemplos e sugestões de atividades que 2
podem auxiliar no momento de elaborar o trabalho pedagógico em sala de aula.

Universidade São Francisco


Como a Libras também pode ser dividida em língua social e acadêmica, é crucial sa-
ber que cada uma delas é proporcionada em situações e contextos diferenciados, mas
a principal diferença se dá da mesma forma que acontece com as línguas orais. Por
exemplo, a língua social pode ser trabalhada ao se compartilhar experiências e durante
a conversação em Libras, quando se escreve um bilhete, um aviso, um pequeno texto
informal. Já a língua acadêmica é trabalhada ao se aprender o seu processo de orga-
nização e estrutura, seja Libras ou português, e para isso são necessárias habilidades
de pensamento metalinguístico.

Podemos apontar o brincar como um exemplo para desenvolvimento social, e que pode
vir a ser acadêmico também. Isso porque, por intermédio do brincar, surgem as primei-
ras práticas discursivas, o que se dá quando a criança brinca de ler, desenhar ou com
os jogos de contar. Nesse momento, ela começa seu contato com o livro, por exemplo,
ela aprende a folhear, depois fala sobre as imagens e chega ao ponto de contar sua
história, imaginando a ação realizada pelos personagens, por meio das imagens. Logo,
[...] a alfabetização só tem sentido quando desenvolvida no contexto de prá-
ticas sociais de leitura e escrita e por meio dessas práticas, ou seja, em um
contexto de letramento e por meio de atividades de letramento; este, por sua
vez, só pode desenvolver-se na dependência da e por meio da aprendiza-
gem do sistema de escrita (SOARES, 2004, p. 97).

Para que haja esse contexto de alfabetização, o professor bilíngue vai trabalhar com
diferentes situações: ensinar outras disciplinas (matemática, história, ciências, entre
outras); atuar na alfabetização bilíngue de estudantes com surdez (que iremos abordar
mais no próximo tópico); e como reforço na alfabetização bilíngue, na tradução e inter-
pretação de texto. O aluno com surdez precisa perceber que existe uma conexão entre
as duas línguas, português e Libras, que é necessário haver compreensão de ambas
para que, assim, possa expandir e aprofundar as duas práticas com êxito.

Para que o trabalho bilíngue realmente aconteça é necessário trabalhar com as duas
línguas, português e Libras, diariamente, envolvendo diferentes habilidades estratégicas
de alfabetização: língua de sinais, letramento visual, datilologia (uso do alfabeto manual
para soletrar as palavras), leitura e escrita. Algumas pessoas se perguntam o porquê de
se trabalhar com a datilologia no ensino bilíngue, a resposta é simples: pois existe uma
forte ligação entre a ortografia e o desenvolvimento de vocabulário, assim como as habili-
dades de alfabetização para os alunos com surdez quando se trabalha com esse recurso.

Abaixo, seguem algumas estratégias que podem ser utilizadas para o ensino bilíngue:

` Libras – datilologia – português, indo e voltando, português – datilologia – Libras. De-


ve-se usar, para tal estratégia, materiais didáticos em Libras e em português, glossários,
conteúdos, vídeos, jogos, atividades, avaliações, literatura e mapas lexicais e semânticos.

Língua Brasileira de Sinais 51


Bilinguismo no ensino regular

` Para a alfabetização bilíngue pode ser o uso de ditado, seguindo essas etapas: soletrar
uma palavra da língua portuguesa (usando o datilológico), traduzir em Libras o texto im-
presso, escrever em português com as suas próprias palavras a partir do texto.
2
` Pode-se apresentar um resumo da história em Libras, ler a história traduzida de Libras
para o português e fazer uma revisão da história em Libras, apresentando ao professor
e colegas.

` Pode-se ensinar um vocabulário sinalizando e soletrando com os dedos a palavra,


escrever ela no papel e traduzir novamente, assim como o contrário.

` Ou então mostrar a imagem de um objeto, sinalizar a palavra do objeto (seu nome),


soletrar a palavra, escrever em português o significado e interpretar em Libras o seu sig-
nificado. Um exemplo poderia ser: ler uma história sobre POLVO; apontar para a palavra
POLVO escrita no quadro; soletrar a palavra POLVO; sinalizar o significado de POLVO;
mostrar a imagem de um POLVO; escrever POLVO no caderno.

Figura 10. Mapa dos vocabulários

CONCEITO SINÔNIMOS

VOCABULÁRIO

EXEMPLO DAS FRASES DESENHAR AS IMAGENS

Fonte: Traduzido de Jones ([s. d., n. p.]).

O mapa dos vocabulários é mais uma importante ferramenta que pode ser utilizada para
o trabalho bilíngue em sala de aula e pode ser construído coletivamente ou de forma
individual pelos alunos. Tal instrumento favorece a escrita da palavra, seus possíveis
sinônimos, conceitos e exemplos de frases nas quais a palavra pode ser usada e o de-
senho de imagens. Além disso, esse mapa pode ser adaptado para trabalhar com ver-
bos, o uso de antônimos, o significado apresentado pelo dicionário e com mapa léxico,
ou então com palavras de acordo com um assunto. Por exemplo: roupas e acessórios,
roupas masculinas, roupas femininas.

Em geral, as crianças percebem uma palavra como um todo, não como partes que o
compõem; pelas propriedades gráficas e não auditivas. Assim, cada palavra se refere a
um sinal e não há imagem acústica. Por exemplo, “CASA” se refere ao sinal de “casa”,
e não à imagem “casa” (isso a respeito das palavras memorizadas pela criança). A pro-
pósito, Fernandes (2006, p. 8) sustenta que “[...] a constituição dos sentidos na escrita
pelas crianças surdas decorrerá de processos simbólicos visuais e não auditivos”.

52
Para que a alfabetização e o letramento realmente aconteçam em turmas regulares com alu-
nos surdos é importante aprofundar os dois assuntos e buscar possibilidades de se colocar
esse trabalho em prática.
2
O tempo todo nosso cérebro está recebendo informações que chegam de diferentes for-

Universidade São Francisco


mas e por diversos sentidos (cheiro, barulho, toque, visão ou gosto). Elas são captadas
pelos órgãos dos sentidos, que passam para o cérebro processar essas informações
e significar, fazendo com que compreendamos o que nos passa. Ferroni (2016, p. 28)
afirma que “[...] a percepção visual tem uma grande importância por dar acesso à infor-
mação à distância, sem requerer a proximidade com os aspectos do ambiente destaca-
dos em determinada interação”. De todos os órgãos de sentido, a visão é a que mais se
destaca, proporcionando muitas aprendizagens para o ser humano.

Além da percepção, a sensação também desempenha uma função importante. Ferroni


(2016, p. 28-29) cita os estudos de Berger (2003) e aponta que a sensação favorece
que haja interação de pessoas e ambientes. Por meio dos estímulos externos e internos
e dos canais sensoriais, é possível ter interpretação e compreensão das informações.
Quando esses dois processos acontecem (essa codificação dos estímulos e compreen-
são de sentidos), ocorre a percepção.

Esses dois conceitos têm sido bastante estudados a fim de se saber quando eles come-
çam a fazer parte da vida da pessoa, podendo ser inclusive antes do nascimento, visto as
informações que se tem sobre a feto receber informações sobre o ambiente e seus pais,
passadas pela mãe. Ocorre, portanto, uma aprendizagem sensorial desde muito cedo.
A integração sensorial é o processo que organiza as entradas sensoriais
para que o cérebro produza uma resposta corporal útil, bem como emoções,
percepções e pensamentos úteis. A integração sensorial seleciona, ordena
e, em um determinado momento, une todas as entradas sensoriais em uma
única função cerebral (AYRES, 1998, p. 42, tradução nossa).

Segundo a autora, quando todas as funções do cérebro passam a estar integradas, os


movimentos do corpo se tornam adaptativos, o que possibilita que as crianças possam
aprender e tenham um comportamento adequado em cada situação vivenciada. Ayres
(1998) também salienta que para que uma criança possa integrar as sensações, ela
precisa se adaptar a elas.

A integração sensorial tem um papel fundamental no desenvolvimento da criança; a


resposta adaptativa nada mais é do que quando o corpo oferece uma resposta, uma re-
ação condizente com o que está acontecendo com ele. Por exemplo, quando a criança
está quase caindo da cadeira, mas seu corpo não consegue responder com uma ação
para que ela não caia, ou então que se proteja enquanto isso estiver acontecendo, quer
dizer que ela não está tendo integração sensorial, seu corpo não está respondendo aos
estímulos que chegam do meio externo.

Quando se pensa na aprendizagem de leitura e escrita, a integração sensorial também


desempenha papel fundamental, pois a criança precisa reativar diversos sistemas para
conseguir ler e escrever. Ayres (1998) explica que

Língua Brasileira de Sinais 53


Bilinguismo no ensino regular

[a] criança deve lembrar se o “m” sobe ou desce e se “p” vai para a esquerda
ou para a direita. Esse conhecimento vem de um tipo de memória visual ou
muscular que é automática para a maioria das pessoas, mas se a atividade
do cérebro é desorganizada, a criança não consegue encontrar essas me-
2 mórias quando precisa delas (AYRES, 1998, p. 78, tradução nossa).

Para que a criança possa, assim, aprender e vir a ser alfabetizada, torna-se fundamental
que ela esteja com a integração sensorial “organizada”. e funcionando bem. Esse seria o
primeiro passo, mas também precisamos falar de alfabetização, conhecer um pouco da
sua história para entender as estratégias e possibilidades de se trabalhar em sala de aula.

Por muito tempo, acreditou-se haver necessidade de fazer uso de métodos ou metodo-
logias para alfabetizar as crianças, sendo assim, é importante mencioná-las. De acordo
com Soares (2015, p. 15), o significado de alfabetização em seu sentido específico é:
“[...] processo de aquisição do código escrito, das habilidades de leitura e escrita”. No
início do processo de alfabetização, alguns anos atrás, os educadores utilizavam carti-
lhas em suas salas de aula para alfabetizar os alunos. Essas cartilhas visavam alguns
métodos em específico, que iremos abordar para melhor conhecimento do leitor. Ao lon-
go dos tempos, a alfabetização passou por períodos com o uso de diferentes métodos,
que buscavam a “melhor” forma de ensinar a ler e a escrever. Podemos apontar como
exemplo os métodos sintéticos e os analíticos.

O primeiro método que surgiu no fim do século XIX foi o sintético, com a perspectiva de
trabalhar cada parte individualmente, iniciando pela menor parte, partindo da apresenta-
ção das letras, das famílias silábicas, até chegar à formação de palavras e, posteriormen-
te, frases e orações. Os métodos sintéticos trabalham a relação entre oralidade e escrita
– som e grafia –, e se desdobram em: alfabético, silábico e fônico, partindo de elementos
mínimos para o todo. Nesses métodos, as estratégias são organizadas a partir da percep-
ção auditiva, precisando de uma adequada discriminação dos sons. Acredita-se que, ao
associar letra e som, a criança consegue aprender a ler e a escrever.

Rangel, Souza e Silva (2017, p. 499) mencionam que, “[...] no método Alfabético, a
criança aprende o nome das letras nas formas maiúsculas e minúsculas, a sequência
do alfabeto e encaixa as letras entre si, formando sílabas ou palavras”. Já no método
fônico, “[...] o processo se dá de outra forma, em que a criança começa pelo som das
letras, unindo som da consoante ao da vogal, pronunciando a sílaba formada”.

Sobre o processo silábico ou de silabação, as autoras afirmam que “[...] a criança apren-
de a fazer a análise das sílabas, para formar as palavras. São propostas palavras-chave
em cartilhas com a finalidade de apresentar as sílabas e consequentemente formar as
frases” (RANGEL; SOUZA; SILVA, 2017, p. 499). Nesses métodos, as estratégias são
organizadas a partir da percepção auditiva, precisa-se de uma adequada discriminação
dos sons. Nos métodos analíticos, busca-se o reconhecimento global, partindo-se do
todo para a análise individual.

Esses métodos se desdobram em: palavração, sentenciação e global. Sua intenção


é buscar a alfabetização com sentido, partindo do maior para o menor. Em relação ao
primeiro, as “[...] palavras significativas são apresentadas em agrupamentos retiradas
de um texto ou de uma história e os alunos aprendem a partir da visualização e pela
configuração gráfica” (RANGEL; SOUZA; SILVA, 2017, p. 500). Sobre o processo de

54
sentenciação, as autoras afirmam que o professor vai fazer uso da comparação, isola
as partes conhecidas da palavra para que a criança vá ampliando seu vocabulário.

Sobre o processo global, vai iniciar com histórias simples, separando em frases, depois 2
em palavras, sílabas, até chegar às letras (RANGEL; SOUZA; SILVA, 2017, p. 500). De
acordo com esse método, o processo ocorre ao contrário.

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Depois de algum tempo trabalhando com cada um dos dois métodos separadamente, resol-
veram então unir-se e os trabalhar paralelamente, isto é, em 1930 surgiu o método misto,
que tinha como perspectiva usar de textos, palavras, sílabas e letras sem uma ordem espe-
cífica, podendo iniciar pelo mais amplo, ou pelo mais simples (FRANCIOLI, 2013).

Por volta de 1980, inicia-se a perspectiva construtivista, a qual teria como base a psico-
gênese da aquisição da língua escrita, estudada com profundidade por Emília Ferreiro
e Ana Teberosky. Assim, não se teria a preocupação apenas com o aprendizado do sis-
tema de escrita (sendo grafema e fonema os maiores enfoques), mas sim seria carac-
terizado como um processo ativo, no qual a criança, desde o seu primeiro contato com
a escrita, fosse construindo hipóteses sobre o funcionamento e a natureza da língua
escrita, compreendendo-a como um sistema de representação.

Em seu processo de aprendizagem, o aluno não é apenas um coadjuvante. Nesse


sentido, não se fala em relação de ensino ou relação de aprendizagem: a relação entre
professor e aluno se constitui como uma relação de ensino e de aprendizagem.
Em tal relação, ambos constroem juntos o conhecimento, que passa a ser compreendi-
do no processo de ensino e de aprendizagem, e não no produto, ou seja, nas avaliações
finais. Ao focalizar o processor, espera-se que o professor parta do conhecimento prévio
dos alunos, levando em consideração que ele não é uma “tábua rasa” e que é um sujei-
to que aprende, desde o momento em que nasce.

Adotar o ponto de vista de métodos nos quais visão e audição, dentre outras habilidades,
figuram como pré-requisitos para a alfabetização, coloca as crianças que não apresen-
tam esses sentidos ou habilidades fora dessas possibilidades. Além disso, assim como
destaca Moll (1999), oferece ao professor uma justificativa para a não aprendizagem dos
alunos. Sob essa perspectiva, tal professor poderia dizer que seu aluno não aprende
porque não enxerga, não escuta, não caminha. Muitas vezes, esquece-se que há um
sujeito social com diferentes potencialidades e habilidades vivendo rodeado por pessoas
e imerso em uma cultura que pode ser diferente daquela à qual está acostumado.

Cada criança traz consigo conhecimentos de casa, mesmo que não sejam relativos a
como segurar um lápis ou manusear um livro. Cabe ao professor reconhecer e poten-
cializar esses conhecimentos, e não os indicar como insuficientes ou inadequados para
o ambiente escolar. Esse sujeito vivo está ali e pode não acompanhar o ritmo, mas é o
professor que deve lhe acompanhar (FERREIRO; TEBEROSKY, 2007).

As crianças começam a criar e elaborar hipóteses a respeito da escrita pensando que


a ação de “escrever corresponde a reproduzir os traços típicos” identificados por ela
como escrita (MOLL, 1999, p. 108). Ademais, elas iniciam a ação de ler mesmo quando
ainda não sabem ler ou escrever as letras, mas já estão reconhecendo a função social
dessas duas ações, reconhecendo símbolos, placas, logotipos. A partir do brincar, vão

Língua Brasileira de Sinais 55


Bilinguismo no ensino regular

aparecendo as primeiras práticas discursivas: a criança brinca de ler, desenhar ou com


os jogos de contar, mesmo sem ainda saber fazê-lo corretamente. E é no momento
quando começa a ter contato com o livro e aprende a folhear, passando depois a falar
2 sobre as imagens que viu e pode contar as histórias, imaginando as ações que foram
realizadas pelos personagens, por meio das imagens que viu.

Ao pensar sobre os métodos de alfabetização, faz-se necessário refletir sobre a for-


mação de professores. Como se dá essa formação, se há um trabalho voltado para os
futuros professores que vão atuar em salas de aula e, em alguns casos, vão precisar
recorrer a esses métodos para organizar a sua prática pedagógica, a fim de propiciar a
alfabetização dos seus alunos.

A partir da década de 1990, com as pesquisas que atribuem o papel ativo do sujeito
na construção de seu conhecimento sobre a escrita e às teorias interacionistas de lin-
guagem, houve um redirecionamento metodológico nas práticas escolares. Inverteu-se o
método para o processo de leitura e escrita, que se torna “da parte para o todo”. Desse
modo, o caminho foi ampliado em direção às palavras e frases (e em alguns casos, tex-
tos), tendo-os como ponto de partida para a sistematização de sílabas, letras e fonemas.

Essa mudança epistemológica, no entanto, foi apenas aparente, pois a escolha de pala-
vras seguia obedecendo uma progressão fonética com o uso de frases descontextuali-
zadas e que não faziam parte do cotidiano do aluno, também usando ‘textos’ arranjados
para a sistematização de sílabas e fonemas pré-determinados pelo princípio fonético.
Percebe-se que não havia uma preocupação quanto a partir de conhecimentos que o
aluno já possuía ou dos seus interesses por assuntos.

Fernandes (2006) indica que a concepção de linguagem que se tem nessa perspectiva
percebe a língua como um instrumento de comunicação, sendo assim realizada pela
troca de mensagens entre um emissor e um receptor, podendo acontecer tanto na for-
ma oral quanto na forma escrita. À vista disso, é o aluno que precisa treinar e memorizar
o código da língua, organizado em formas fonéticas, lexicais e gramaticais. Essa língua
possui leis rígidas e imutáveis que precisam ser seguidas por quem a utiliza.

Quando iniciamos essa discussão, pensamos no processo de alfabetização, sendo ne-


cessária a aprendizagem da leitura e escrita tomadas como o “domínio do código”. Tra-
ta-se de um processo de treinamento e reconhecimento entre as relações que existem
entre oralidade e escrita, ou seja, entre fonemas e grafemas. Podemos assumir, em
outras palavras, que esse processo envolve um conjunto de habilidades como: codificar
e decodificar letras, sons, sílabas, palavras (FERNANDES, 2006).

Mesmo que os professores se utilizem de textos como ponto de partida para o trabalho
e haja preocupação com suas condições de produção, com interesses e vivências do
estudante, a mediação do processo é realizada pela oralidade, e, na maioria das vezes,
não se busca o uso da língua de sinais para que isso aconteça e faça sentido ao aluno.

Continua-se associando ser necessário trabalhar com a sistematização das unidades


menores que compõem a escrita, sendo esses sons, sílabas e letras. Posto de outro modo,
“[...] partindo de textos, de palavras, de famílias silábicas ou de letras isoladas, o processo
de alfabetização baseia-se em relações entre fonemas e grafemas” (FERNANDES, 2006,

56
p. 10-11). Isso, por muito tempo, foi o que apenas acontecia nas salas de aula, mesmo
quando havia alunos com surdez que necessitassem de um trabalho diferenciado. Porém,
engana-se quem parte do pressuposto de que isso acabou. Precisamos seguir estudando
e compreendendo cada dia mais o que realmente significa o trabalho bilíngue, em busca 2
da alfabetização e do letramento dos alunos com surdez.

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Quando refletimos sobre a alfabetização, no sentido puro, entendemos que ela, muitas
vezes, distancia-se da forma de apropriação da escrita pelos alunos com surdez, pois o
ato de codificar e decodificar pressupõem a habilidade de reconhecer as letras e sons.
Mas essa ação não é possível quando temos pessoas que não possuem experiência
auditivas que vão dar esse retorno, ficando difícil de acontecer (FERNANDES, 2006).

Apresentamos na sequência um quadro que mostra um pouco das estratégias utiliza-


das pelos professores em uma fase inicial de alfabetização e as possíveis implicações
para que não aconteça a aprendizagem dos alunos com surdez.
Quadro 01. Implicações do processo de alfabetização para alunos surdos

PROCEDIMENTOS ADOTADOS NA IMPLICAÇÕES PARA A APRENDIZAGEM


ALFABETIZAÇÃO DE ALUNOS SURDOS
Parte-se do conhecimento prévio da criança sobre Não há conhecimento prévio internalizado; a criança
a língua portuguesa, explorando-se a oralidade: não estrutura narrativas orais e desconhece o
narrativas, piadas, parlendas, trava-línguas, rimas, universo “folclórico” da oralidade.
etc.
O alfabeto é introduzido relacionando-se letras a Impossibilidade de estabelecer relações letra x
palavras do universo da criança: nomes, objetos da som; a criança desconhece o léxico (vocabulário)
sala de aula, brinquedos, frutas, etc. da língua portuguesa, já que no ambiente familiar
sua comunicação restringe-se a gestos naturais ou
Ex. A da abelha, B da bola, O do ovo... caseiros (na ausência da língua de sinais).
As sílabas iniciais ou finais das palavras são desta- A percepção de sílabas não ocorre já que a
cadas para a constituição da consciência fonológica palavra é percebida por suas propriedades visuais
e percepção que a palavra tem uma reorganização (ortográficas) e não auditivas.
interna (letras e sílabas).
A leitura se processa de forma linear e sintética A leitura se processa de forma simultânea e analítica
(da parte para o todo); ao pronunciar sequências (do todo para o todo); a palavra é vista como uma
silábicas, a criança busca a relação entre as unidade compacta; na ausência de imagens
imagens acústicas internalizadas e as unidades de acústicas que lhes confiram significado, as palavras
significado (palavras). são memorizadas mecanicamente sem sentido.

Fonte: Fernandes (2002, p. 7-8).

Quando analisamos o quadro acima, damo-nos conta de que, na maioria das vezes, a
metodologia utilizada pelos professores que são alfabetizadores pode ser um dos princi-
pais motivos pelo qual as crianças com surdez nem sempre conseguem se desenvolver
quanto à aprendizagem da escrita do português. Logo, o contato que elas vão ter com a
escrita acaba não sendo significativo, pois elas não conseguem perceber o mecanismo
da relação letra-som em razão de não ter o retorno auditivo, e assim começam a simples-
mente copiar o desenho de letras e palavras e se tornam ótimos copistas: sabem copiar,
mas não sabem o que estão copiando e nem para que serve (FERNANDES, 2006).

Para que haja uma constituição dos sentidos na escrita, que realmente seja compre-
endida pelos estudantes com surdez, é preciso proporcionar experiências simbólicas

Língua Brasileira de Sinais 57


Bilinguismo no ensino regular

visuais e não auditivas, trabalhando assim com o visual e criando situações em que se
possa construir significados que façam sentido. A língua portuguesa para as pessoas
com surdez se constitui como “[...] um conjunto de signos visuais materializados na es-
2 crita: aprender a escrita significa aprender a língua portuguesa” (FERNANDES, 2006,
p. 13). Posto de outro modo, a escrita e a língua precisam se constituir como um único
conhecimento e ser vivenciado por meio da leitura.

O professor bilíngue é quem deve fazer a mediação, utilizando para isso a associação
e contraste entre a língua de sinais e a língua portuguesa. Assim, as regras de uso
da língua (padrão real) seriam progressivamente apropriadas (FERNANDES, 2006). O
português para as pessoas com surdez é aquilo que elas veem/leem, e a leitura e escri-
ta devem estar atadas a todas as práticas sociais em que se encontram envolvidos os
estudantes com surdez, além das práticas escolares. A leitura demanda compreensão
do significado global do texto, situando-o em determinada realidade social, filiando-o a
determinado gênero discursivo e atribuindo relações e efeitos de sentido entre as uni-
dades que o compõem.
O português é para o estudante com surdez aquilo que se revela nas práticas
de letramento nas quais ele está inserido. Por isso, há que se considerar que
quanto mais diversificadas forem as experiências de leitura, maiores serão as
possibilidades de apreensão da língua em sua riqueza de variedades. Disso
resulta que a seleção dos textos nas práticas de letramento tenha como crité-
rio a abrangência de sua circulação social (FERNANDES, 2006, p. 13).

A seguir, apresentamos uma sequência de jogos e materiais que podem ser utilizados
tanto na alfabetização, quanto no letramento de alunos com surdez em diferentes ida-
des e diferentes contextos. Também, esses materiais podem ser utilizados com alunos
ouvintes tendo como objetivo o ensino da língua de sinais.

O jogo “memória da família” é composto por dois tipos de peças: uma que tem a pala-
vra escrita em língua portuguesa e outra que tem o sinal, representado em desenho. Os
participantes precisam embaralhar as cartas e colocar todas elas viradas para baixo; um
de cada vez escolhe uma peça para virar: se achar o par correto, a pessoa deve pegar as
duas peças, mas caso não acerte, deve virar para baixo novamente. Esse jogo foi criado
pensando no assunto “famílias”, porém, pode-se trabalhar com diferentes assuntos.

Figura 11. Memória da família

Fonte: acervo pessoal da autora.

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O jogo “montando a palavra” é muito usado no momento de alfabetização, quando
a criança está aprendendo as letras que compõem a palavra – neste caso, usando o
alfabeto manual. Normalmente, a criança que ainda não sabe ler e escrever toma o
desenho como base para organizar a palavra corretamente. Esse material se torna um 2
importante recurso quando se trabalha com a datilologia da palavra.

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Figura 12. Montando a palavra

Fonte: acervo pessoal da autora.

No jogo “memória de diversos assuntos”, segue-se a mesma ideia do jogo de me-


mória, porém em uma das peças está o sinal e a palavra, já no outro está uma imagem
do que se quer representar com aquele sinal. O modo de jogar é idêntico ao do jogo já
explicado, “memória da família”.
Figura 13. Memória de diversos assuntos

Fonte: arquivo pessoal.

O “jogo de relacionar” é muito interativo e trabalha diferentes habilidades para além


dos sinais, palavras e desenhos. Isso porque a pessoa precisa usar o elástico de
dinheiro colorido e posicioná-lo de maneira a relacionar a primeira peça com a segunda.

Língua Brasileira de Sinais 59


Bilinguismo no ensino regular

Figura 14. Jogo de relacionar

Fonte: acervo pessoal da autora.

O material “alfabeto tátil” pode ser usado tanto no ensino do alfabeto manual, quanto
no do alfabeto tátil, pois ele permite que a pessoa que está segurando toque e sinta o
formato e a posição dos dedos.
Figura 15. Alfabeto tátil

Fonte: acervo pessoal da autora.

O jogo “cálculos matemáticos” foi elaborado para trabalhar a matemática, usando


para isso os sinais de números. O uso da língua de sinais se dá durante a interação
entre o professor e os alunos.

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Figura 16. Cálculos matemáticos

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Fonte: acervo pessoal da autora.

O jogo “memória de números” segue a ideia de trabalhar com os números e as


quantidades, pois você precisa ver o número que está na caixinha de fósforo e colocar
a quantidade correta de itens dentro.
Figura 17. Memória dos números

Fonte: arquivo pessoal.

O jogo “Quem sou eu?” promove muita interação entre os participantes, pois cada um
deles fica com uma faixa presa na testa e uma mão com imagem fixada nela. Em cada
uma das mãos, existe o desenho de um animal. Um dos participantes inicia e faz per-
guntas ao outro a fim de identificar qual o animal que está preso na sua cabeça. Toda a
comunicação precisa ser feita usando a língua de sinais, então os participantes se veem
obrigados a recorrer a diferentes recursos que não sejam os gestos ou a mímica, pois
deixaria muito evidente qual é o animal representado.

Língua Brasileira de Sinais 61


Bilinguismo no ensino regular

Figura 18. Quem sou eu?

Fonte: acervo pessoal da autora.

A massinha de modelar pode ser usada durante a aprendizagem das letras do alfabeto
em português, seja na alfabetização, seja no letramento. O aluno consegue representar
essas letras por meio de um recurso tridimensional, já que pode pegá-las.

Figura 19. Massinha de modelar

Fonte: arquivo pessoal.

O jogo “bingo português Libras” é um dos primeiros jogos utilizados quando se está
iniciando o aprendizado da língua de sinais, pois é possível trabalhar com as duas
línguas em paralelo. As letras em Libras são sorteadas, a pessoa que está fazendo o
sorteio precisa reproduzir a letra com a mão e quem está marcando precisa encontrar
o correspondente em português, sendo que durante esse jogo é importante manter o
silêncio para que todos os participantes se concentrem ao máximo.

Figura 20. Bingo português e Libras

Fonte: arquivo pessoal.

62
O material “formando palavras” costuma ser usado mais como um recurso pedagógi-
co e não necessariamente como um jogo, pois a ideia é olhar a palavra escrita na figura
e reproduzir sua escrita usando as letras na tampinha de garrafa pet. Pode-se propor
variações para esse jogo, por exemplo, ao invés de dar a figura com a escrita, é possível 2
que o professor faça um sinal e os alunos precisem escrever a palavra somente a partir

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do sinal, sem nenhum auxílio visual. De acordo com a evolução dos alunos, é possível
ir ampliando as possibilidades e as dificuldades para que o aluno precise pensar mais.

Figura 21. Formando palavras

Fonte: arquivo pessoal.

O jogo “roleta” pode ser usado de acordo com as necessidades do professor em sala
de aula, e o conteúdo pode ser organizado conforme a necessidade de se trabalhar
mais com a escrita, com o datilológico ou, então, com os sinais.
Figura 22. Roleta

Fonte: arquivo pessoal.

Essas são apenas algumas possibilidades de jogos e materiais que podem ser utilizados
pelo professor ou profissional de outra área que vai trabalhar com o aluno surdo. É impor-
tante lembrar que os conteúdos e o que se deve abordar variam de acordo com as necessi-
dades do aluno e do professor. Quando se trabalha usando diferentes recursos, a interação
se torna mais rica e mais produtiva, pois os envolvidos se divertem enquanto aprendem.

Língua Brasileira de Sinais 63


Bilinguismo no ensino regular

CONCLUSÃO
Ao longo desta unidade, tratamos dos seguintes aspectos: a importância da Libras no
2 desenvolvimento da cognição e da linguagem em crianças surdas e ouvintes; o traba-
lho concomitante da Libras e com a Língua Portuguesa em turmas regulares que têm
alunos com surdez na construção de um bilinguismo para todos.

A respeito da importância da Libras no desenvolvimento da cognição e da linguagem


em crianças surdas e ouvintes, discutimos a acerca da necessidade do trabalho com a
língua de sinais o mais cedo possível com o aluno. A criança precisa estar em contato
com a Libras para desenvolver a linguagem, viver aprendizagens e, aos poucos, ir se
apropriando da língua. Abordamos diferentes tipos de alfabeto: em língua brasileira de
sinais, língua gestual portuguesa, língua de sinais americana e língua de sinais britâni-
ca, assim como apresentamos o alfabeto em escrita de sinais. Trouxemos os compo-
nentes da língua de sinais e dos fatos que a caracterizam enquanto uma língua e não
uma linguagem. Também discorremos sobre os períodos de aquisição da linguagem por
crianças surdas a como esse processo costuma acontecer.

Apresentamos um pouco sobre a relevância do trabalho concomitante entre a Libras e a


Língua Portuguesa em turmas regulares que têm alunos com surdez na construção de
um bilinguismo para todos (conceituando o bilinguismo) e pontuamos que, inicialmente,
deve-se trabalhar com a língua de sinais para que haja uma comunicação para então
lidar com o português escrito usando a língua de sinais. Tratamos sobre o fato de que
muitas escolas se dizem inclusivas, mas, na verdade, não o são. Mencionamos algu-
mas possibilidades de realização do trabalho do professor bilíngue e do professor de
Libras, que ambos precisam trabalhar em parceria para que a atuação em sala de aula
faça sentido ao aluno surdo e ao aluno ouvinte, quando presente.

E finalizamos a unidade discutindo sobre alfabetização e letramento em turmas regula-


res com alunos surdos, apresentando um pouco dos conceitos que envolvem a alfabe-
tização e o que se entende por letramento. Trouxemos ainda, ao final, alguns exemplos
de jogos e materiais que podem ser utilizados tanto em sala de aula com alunos com
surdez, quanto com alunos ouvintes.

64
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

AYRES, Jean. La Integración Sensorial y el Niño. Tradução: Teresa Carmona Lobo. São Paulo: Trilhas,
1998. 2

Universidade São Francisco


BAGNO, Marcos. Língua, linguagem e linguística: pondo os pingos nos ii. São Paulo: Parábola Editorial,
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Língua Brasileira de Sinais 65


Bilinguismo no ensino regular

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VIGOTSKY, Lev Semenovich. A formação Social da Mente. São Paulo: Martins Fontes, 7ª edição, 2007.

66
2

Universidade São Francisco

Língua Brasileira de Sinais 67


A prática de ensino da Língua Brasileira de Sinais

UNIDADE 3

A PRÁTICA DE ENSINO DA LÍNGUA


3
BRASILEIRA DE SINAIS

INTRODUÇÃO
Conforme preconiza a lei nº 10.436/2002, os estudantes com surdez têm direito a ter
a Língua Brasileira de Sinais (Libras) como primeira língua (L1), e o Português escrito,
como segunda (L2). Para tais discentes, o aprendizado de conteúdos deve acontecer
a partir da L1, mas com a L2 enquanto forma de registro escrito. Por esse motivo, as
duas línguas precisam estar em evidência e serem trabalhadas o tempo todo com os
estudantes, de modo que eles possam se desenvolver e aprender as habilidades ne-
cessárias de uma pessoa bilíngue; já que utilizam duas línguas para o seu aprendizado.

O contexto educacional é tocado por discussões a respeito das melhores estratégias de


ensino para aprendizes com surdez e é consenso que todas devem ter a Libras como
forma de instrução, porém, nem sempre isso acontece na escola. Muitas vezes, ter um
aprendiz com surdez, em sala de aula regular, junto de ouvintes, pressupõe que a pre-
sença de um intérprete dê conta das necessidades do aprendiz com surdez, mas não
dá. Precisamos ter em mente que o intérprete não tem a responsabilidade de ensinar a
língua, e sim interpretar, traduzir para a língua de sinais o que o professor está falando
em português; ou o caminho contrário, interpretar em português o que o a aprendiz com
surdez sinaliza para o professor.

No cotidiano escolar, vive-se uma situação em que a Libras precisa ser ensinada pelo
professor em sala de aula, principalmente no caso de pais que são ouvintes e seus fi-
lhos surdos. Se esses pais não conhecem ou dominam a língua, além da preocupação
com o conteúdo da disciplina, o professor terá a preocupação de ensino da Libras. Mas,
em casos em que o estudante chega na escola sem o conhecimento básico da L1, e
precisa ao mesmo tempo aprender essa língua e a L2, há um duplo trabalho de apren-
dizado: do conteúdo e da língua.

Nesse caso, verifica-se a realidade que se apresenta em muitas escolas: a presença


de um intérprete em sala de aula, e não de um professor bilíngue que possa ensinar a
Libras e interpretar. Dessa complexidade que se apresenta frente ao trabalho educativo
com a Libras, levanta-se algumas problemáticas, tais como:

` Como o discente vai aprender a L1 e a L2 se não tem um professor que conheça ambas
as línguas e possa organizar seu trabalho de uma maneira a facilitar o aprendizado do
estudante?

68
` Como o intérprete poderá dar conta de passar as informações em Libras se o estudante
não tem o domínio dela para compreender o que está sendo dito?

3
Essas questões servem de motor para adentrarmos em um problema pontual quando
se pensa na educação de aprendiz com surdez sem a presença de um professor bilín-

Universidade São Francisco


gue. Com isso, o discente demonstra muita dificuldade em aprender o português o que
pode acarretar desinteresse pelas aulas e pode vir a desistir de frequentar a escola. Na
maioria das vezes, o aprendiz com surdez não tem o conhecimento da Libras ou, então,
as atividades propostas não visam o ensino do português como segunda língua e assim
não dão conta das reais necessidades desse estudante.

Esses são alguns pontos que precisam de reflexão quando nos debruçamos sobre o
ensino e o aprendizado da Libras e da língua portuguesa para aprendizes com surdez,
tanto nas escolas de educação especial para estudantes surdos, quanto nas escolas
regulares, com a educação inclusiva.

Nesta unidade, estudaremos acerca da prática de ensino da língua brasileira de sinais,


para isso teremos três tópicos que serão discutidos: (I) o trabalho com a pauta sonora
no processo de alfabetização e de letramento na língua portuguesa em turma regulares
que têm aprendizes com surdez; (II) conhecimentos práticos na língua brasileira de si-
nais: diálogos sinalizados; e, (III) conhecimentos práticos na língua brasileira de sinais:
sinalizando músicas, poesias e parlendas.

1. O TRABALHO COM A PAUTA SONORA NO PROCESSO


DE ALFABETIZAÇÃO E DE LETRAMENTO NA LÍNGUA
PORTUGUESA, EM TURMAS REGULARES QUE TÊM
APRENDIZES COM SURDEZ
Antes de adentrarmos na temática do trabalho de alfabetização e de letramento para
aprendizes com surdez, é preciso retomarmos alguns conceitos importantes para tratar
desses dois assuntos de forma geral.

Inicialmente, quando se estuda a respeito do desenvolvimento da linguagem, nos de-


paramos com teorias que focalizam o caráter inatista. A esse respeito Freire e Macedo
(1990, p. XVI) enfatizam que “[...] a aptidão para a linguagem é inata, mas só se pode
concretizar em uma situação social”. Ou seja, a pessoa precisa estar em situações
sociais onde seja estimulada e possa desenvolver a linguagem, obtendo assim, um
conhecimento de mundo que servirá de base para outras aprendizagens.

É importante ressaltar que, por mais que o social seja essencial, ele por si só não garante
o aprendizado da língua, é necessário que o sujeito se relacione com o outro, que a cul-
tura humana (como a Libras e o português) sejam mediados por esse outro, o homem.

Língua brasileira de sinais 69


A prática de ensino da Língua Brasileira de Sinais

SAIBA MAIS
Você sabia que Almeida e Valeirão (2015) defendem que o ser humano quando nasce já sabe
e reconhece os objetos e suas funções, ou seja, ele já tem essas aprendizagens “dentro de si”
3
e está pronto para usar?

Se você tiver o interesse em ler mais sobre o assunto, acesse o livro Fundamentos
Psicológicos da Educação. Disponível em: https://wp.ufpel.edu.br/nepfil/files/2019/02/3-
fundamentos-psicologicos-da-educacao.pdf. Acesso em: 8 nov. 2021.

A língua não é uma função humana inata, ela é adquirida na relação social entre os
homens e a partir de determinada cultura. Com a aquisição da língua, se adentra na
dimensão do conhecimento de mundo, que se refere, por exemplo, a conceitos básicos
para viver em sociedade: saber o nome de um objeto, no caso o copo, e saber sua fun-
ção social, serve para tomar água, para tomar chá ou café.

Quando se está em processo de aquisição da língua, torna-se possível aprender sobre


as coisas (saber que para beber água é necessário copo). Além disso, as palavras
possibilitam nomear as coisas, como copo mencionado, e suas variações de formatos,
que podem ser feitos de vidro, porcelana, plástico, entre outros. Por fim, que esse copo
pode ser de diferentes tamanhos e texturas, ou então de diferentes estampas, mas,
que independente de todas essas variações de sentidos, ele continua sendo um copo e
servindo para a mesma função.

Esse conhecimento possibilitado pela linguagem é conhecido como significação e ser-


ve para todos os tipos de coisas. Quando a criança adquire esse conhecimento ela
começa a reconhecer e entender que tudo tem um nome, um conceito e serve para
alguma coisa, ou seja, nesse momento ela está desenvolvendo a linguagem. Pode ser
que, mais tarde, ela consiga desenvolver uma língua dentro de uma comunidade que
utiliza a Libras. Isso acontece porque o desenvolvimento da linguagem não depende
da aquisição de uma língua, ou seja, precisamos primeiro entender o significado dos
objetos e seus conceitos: desenvolver a linguagem. Depois disso conseguimos, ou não,
nomeá-los e nos comunicar com outras pessoas utilizando uma língua.

Nem todas as pessoas, porém, chegam à aquisição de uma língua, seja oral ou sinaliza-
da, algumas permanecem apenas se expressando e recebendo “informações” a partir
do uso de objetos, de apontamentos, olhares, imagens, sem que tenha uma língua
propriamente dita por trás disso. Por isso dizemos que a aquisição da língua depende
da linguagem, mas a linguagem não depende da língua.

IMPORTANTE

Afinal, o que é língua e linguagem?

Linguagem: Segundo Fiorin (2013), a linguagem permite a comunicação e é base para o


aprendizado, ela é fundamental para a compreensão e a expressão, pois dá sentido ao mun-
do. A linguagem é uma possibilidade de expressão. É adquirida e precisa ser desenvolvida
por meio da interação social.

70
Língua: De acordo com Bagno (2014), há relação entre linguagem e língua, pois a primeira
é a base para o desenvolvimento da segunda. A língua, enquanto integrante da linguagem,
precisa de um repertório de signos para se desenvolver. Ela é composta por sons, palavras
e orações. 3

Universidade São Francisco


Quando as pessoas começam a utilizar sinais ou vocalizar o nome dos objetos, elas
estão no caminho de aquisição de uma língua, seja oral ou sinalizada. Isso serve para
pessoas ouvintes ou com surdez. Assim, podemos dizer que “[...] a leitura do mundo
precede mesmo a leitura da palavra. Os alfabetizandos precisam compreender o mun-
do, o que implica falar a respeito do mundo” (FREIRE; MACEDO, 1992, p. 33). Para que
a criança possa desenvolver certos aspectos que serão necessários na alfabetização, é
preciso primeiro conhecer o que está ao seu redor e conseguir falar sobre.

Freire e Macedo (1990, p. 29) apresentam a ideia de “[...] alfabetização emancipado-


ra, ou seja, quando as pessoas se alfabetizam, elas precisam partir de suas histórias,
de suas vivências e de suas relações com a cultura”. Entretanto, também precisam
aprender o código utilizado pela maioria das pessoas com quem convivem. Essas duas
aprendizagens precisam andar juntas, mas nem sempre isso é fácil. Aqui no Brasil,
usa-se o sistema alfabético de escrita.

Tornar-se alfabetizado por meio da Libras, em um mundo histórico e cultural, é tão impor-
tante quanto se alfabetizar com a leitura e a escrita, ou seja, com os códigos alfabéticos.
Depois de toda essa discussão, precisamos nos focar no conceito de alfabetização.
Alfabetização pode ser entendida, então, como a aquisição das habilidades
de ler e escrever – ou seja, é o momento em que o sujeito se apropria
da versão codificada em sinais gráficos da mesma língua que ele já
utiliza apenas em sua versão codificada em sinais orais. O ponto central
e para o qual convergem todos os esforços empenhados no processo de
alfabetização é a aquisição deste conjunto de sinais gráficos, já que eles
estão presentes em inúmeras situações do dia a dia e é necessário saber
reconhecê-los (KOERNER, 2010, p. 21).

Além dessa visão de alfabetização, podemos pensar que,


[c]onhecer a “mecânica” ou o funcionamento da escrita alfabética para ler e
escrever significa, principalmente, perceber as relações bastante complexas
que se estabelecem entre os sons da fala (fonemas) e as letras da escrita
(grafemas), o que envolve o despertar de uma consciência fonológica da
linguagem: perceber seus sonos, como se separam e se juntam em novas
palavras etc (ROJO, 2009, p. 61, grifos da autora).

Quando focamos na definição de alfabetização, a primeira coisa que vem à mente é


que se faz necessário ter o som para que ela aconteça, ou seja, para uma pessoa se
alfabetizar ela precisa ouvir o que fala e assim conseguirá aprender a escrever e a ler.
Porém, quando pensamos nas pessoas com surdez que já se alfabetizaram e fazem
uso da leitura e da escrita de forma fluente, nos damos conta que essa necessidade de
ouvir o som não é totalmente verdadeira, pois se fosse assim, elas não teriam chegado
nesse aprendizado.

Língua brasileira de sinais 71


A prática de ensino da Língua Brasileira de Sinais

E é aí que precisamos discutir outro conceito que pode nos ajudar a entender o que
acontece, o conceito de letramento. De acordo com Soares (2021) o termo letramento
vai surgir com o entendimento de que não precisamos somente aprender o código alfa-
3 bético da escrita e da leitura, mas também como utilizá-los em práticas sociais.

Partir da realidade do estudante, daquilo que ele tem contato e pode realmente fazer
sentido. Dessa maneira, Rojo (2009) aborda a importância de buscar os conhecimentos
locais e globais e apresentar ao discente, para não trabalhar somente com aquilo que
ele já conhece sem ao menos dar oportunidades de ampliar suas aprendizagens.

A partir desses dois conceitos: alfabetização e letramento, podemos afirmar que, por
muito tempo, o conceito e a forma de trabalhar que prevaleceu nas escolas foi a al-
fabetização, sendo usado para isso cartilhas e alguns métodos, como o sintético e o
analítico já abordados na unidade anterior. Em seguida, surge a visão de letramento
que vai ter o aprendizado da leitura e da escrita a partir de práticas sociais, vivências e
experiências que o discente tem.

Com base nos conceitos separados, acabou surgindo outra visão, por vezes controver-
sa, por vezes conciliatória
[...] como resposta à questão dos métodos, que, em sua dimensão pedagógi-
ca, isto é, em sua prática em contextos de ensino, a aprendizagem inicial da
língua escrita, embora entendida e tratada como um fenômeno multifacetado,
deve ser desenvolvida em sua inteireza, como um todo, porque essa é a na-
tureza real dos atos de ler e de escrever, em que a complexa interação entre
as práticas sociais da língua escrita e aquele que lê ou escreve pressupõe o
exercício simultâneo de muitas e diferencias competências. É o que se tem
denominada alfabetizar letrando (SOARES, 2021, p. 35, grifos da autora).

A ideia de alfabetizar letrando parte do entendimento de que, para haver um melhor


desempenho da alfabetização, faz-se necessário tomar como ponto inicial os conhe-
cimentos que o estudante possui e também seu contexto e sua realidade, por meio
de práticas sociais que vão possibilitar um aprendizado de maior qualidade e que faça
sentido ao estudante.

Agora você deve estar se perguntando por que abordamos tudo isso para então começar a
discutir e falar sobre a alfabetização e o letramento da criança com surdez? A resposta é que
precisamos compreender como se dá o processo com o ouvinte para que possamos pensar
como pode e deve ser organizado o trabalho pedagógico que vise a alfabetização e o letra-
mento do aprendiz com surdez. Entendendo cada uma das duas propostas e pensando em
formas de tornar esse aprendizado coerente e com sentido para o estudante usar uma língua
que não tem a oralidade em sua estrutura.

Tanto a alfabetização quanto o letramento de ouvintes pressupõem o trabalho com a


consciência fonológica. Morais (2019, p. 45, grifos do autor) pondera que ser “[...]
um conhecimento consciente, uma capacidade de analisar os sons que compõem as
palavras”. Configurando-se, portanto, como uma habilidade importante para o desen-
volvimento da leitura e da escrita alfabética.

72
Mas seria possível, ao refletir sobre a consciência fonológica, pensar esse assunto vol-
tado para os estudantes com surdez, uma vez que a Libras não tem o som como uma
característica da língua? Sim, pois, enquanto língua, a Libras também possui regras e
especificidades fonológicas. 3
Fonologia das línguas de sinais é o ramo da linguística que objetiva identifi-

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car a estrutura e a organização dos constituintes fonológicos, propondo mo-
delos descritivos e explanatórios. A primeira tarefa da fonologia para línguas
de sinais é determinar quais são os padrões possíveis de combinação entre
essas unidades e variações possíveis no ambiente fonológico (QUADROS;
KARNOPP, 2004, p. 47).

A fonologia da Libras pressupõe alguns aspectos que a diferenciam da língua portu-


guesa que, no caso da língua oral, são estudados os sons da fala, ao passo que, no
caso da língua sinalizada são estudadas as unidades que o compõem o sinal. Assim,
a língua brasileira de sinais é produzida por meio das mãos, tendo os movimentos do
corpo e do rosto como constituintes importantes (QUADROS; KARNOPP, 2004).

William C. Stokoe, por volta de 1960 e 1970, pesquisou sobre a língua de sinais americana
e encontrou três parâmetros que formariam os sinais: configuração de mão (CM), locação
da mão (L) e movimento da mão (M). Porém, a partir de outros estudos foram acrescenta-
dos mais dois parâmetros: orientação de mão (Or) e expressões não-manuais (ENM).

Um dos primeiros conhecimentos necessários para quem tem interesse em aprender a


Libras é conhecer as configurações de mão (CM), pois elas se referem ao formato da(s)
mão(s) no momento de produzir o sinal, cada língua de sinais possui um determinado
número de CM que fazem parte do seu sistema linguístico. Existem muitos autores que
vão abordar o tema e inclusive vão apontar diferentes quantidades de CM existem, in-
clusive dentro de um mesmo país. Na imagem abaixo estão as principais configurações
usadas, lembrando que pode existir variação em relação a essa quantidade.
Quadro 01. Configurações de mão

01 02 03 04 05

06 07 08 09 10

Língua brasileira de sinais 73


A prática de ensino da Língua Brasileira de Sinais

11 12 13 14 15

16 17 18 19 20

21 22 23 24 25

26 27 28 29 30

31 32 33 34 35

74
36 37 38 39 40

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41 42 43 44 45

46 47 48 49 50

51 52 53 54 55

56 57 58 59 60 61

Fonte: acervo pessoal.

A partir das imagens do Quadro acima, podemos destacar que as letras do alfabeto
também são representadas pelas configurações de mão, assim temos:

Língua brasileira de sinais 75


A prática de ensino da Língua Brasileira de Sinais

Tabela 01. Correspondência do Alfabeto manual em Língua Brasileira de Sinais e as configurações


de mão

A: 1 B: 53 C: 29 D: 16 E: 8 F: 46 G: 15
3 H: 50 I: 5 J: 5 K: 50 L: 38 M: 52 N: 33
O: 22 P: 50 Q: 15 R: 34 S: 7 T: 47 U: 33
V: 50 W: 51 X: 13 Y: 4 Z: 14
Fonte: elaborada pela autora.

Na Tabela acima são apresentadas as correspondências das configurações de mão e


as letras do alfabeto manual, porém, elas serão apresentadas de forma separada em
momento posterior.

Em seguida temos a locação (L) também conhecida como ponto de articulação (PA) que
é o espaço de enunciação na Libras. Envolve o espaço em frente ao corpo da pessoa
ou uma área do corpo onde são produzidos os sinais.

Figura 01. Espaço de sinalização

Cabeça

Mão
Braço
Tronco

Espaço
Fonte: Quadros e Karnopp (2004, p. 57).

A imagem acima apresenta o espaço que a pessoa deve usar enquanto está sinalizan-
do, ou seja, precisamos respeitar para que o receptor da mensagem consiga acompa-
nhar os sinais e compreender a mensagem que está sendo repassada. Se passamos
muito desse espaço (abaixo da linha da cintura e acima da cabeça), corremos o risco de
comprometer a sinalização e dificultar para quem está recebendo a informação.

O parâmetro seguinte é o movimento, considerado um dos mais complexos, pois envol-


ve uma gama de formas e direções, dentre elas destacamos: movimentos internos das
mãos, movimentos do pulso, movimentos direcionais no espaço e série de movimentos
num único sinal.

76
Quadro 02. Categorias do parâmetro movimento

Em relação ao TIPO, podemos ter:

Contorno ou forma geométrica: retilíneo, helicoidal, circular, semicircular, 3


sinuoso, angular, pontual;

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Interação: alternado, de aproximação, de separação, de inserção, cruzado;
Contato: de ligação, de agarrar, de deslizamento, de toque, de esfregar, de
riscar, de escovar ou de pincelar;
Torcedura do pulso: rotação, com refreamento;
Dobramento do pulso: para cima, para baixo;
Interno das mãos: abertura, fechamento, curvamento e dobramento
(simultâneo/ gradativo)

Quanto à DIRECIONALIDADE, temos:

Direcional
 Unidirecional: para cima, para baixo, para direita, para esquerda, para
dentro, para fora, para o centro, para lateral inferior esquerda, para lateral
inferior direita, para lateral superior esquerda, para lateral superior direita,
para específico ponto referencial;

 Bidirecional: para cima e baixo, para esquerda e direita, para dentro e fora,
para laterais opostas – superior direita e inferior esquerda;

Não-direcional

Em relação ao TIPO, podemos ter:

Contorno ou forma geométrica: retilíneo, helicoidal, circular, semicircular,


sinuoso, angular, pontual;

Interação: alternado, de aproximação, de separação, de inserção, cruzado;

Contato: de ligação, de agarrar, de deslizamento, de toque, de esfregar, de


riscar, de escovar ou de pincelar;

Torcedura do pulso: rotação, com refreamento;

Dobramento do pulso: para cima, para baixo;

Interno das mãos: abertura, fechamento, curvamento e dobramento


(simultâneo/ gradativo)

Sobre a MANEIRA observamos:

Qualidade, tensão e velocidade


 Contínuo;
 De retenção;
 Refreado.

Língua brasileira de sinais 77


A prática de ensino da Língua Brasileira de Sinais

E em relação à FREQUÊNCIA:
Repetição
3  Simples;
 Repetido.

Fonte: adaptado de Ferreira Brito (1990, p. 33).

Outro parâmetro se refere a orientação de mão (Or), ou seja, a direção para a qual a
palma da mão aponta na produção de um sinal. Temos as seguintes direções possíveis:
Quadro 03. Orientação da mão

PARA CIMA PARA BAIXO

PARA DENTRO PARA FORA

78
3

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PARA O LADO (CONTRALATERAL) PARA O LADO (IPSILATERAL)

Fonte: Quadros e Karnopp (2004, p. 59-60).

E passamos então para as expressões não-manuais (ENM) que se prestam dois pa-
peis na língua de sinais: (I) marcação de construções sintáticas e (II) diferenciação dos
itens lexicais. Sobre a função sintática, podemos dizer que eles marcam sentenças
interrogativas sim-não, orações relativas, topicalizações, concordância e foco. E como
componente lexical eles marcam referência específica, referência pronominal, partícula
negativa, advérbio, grau ou aspecto. As marcas não-manuais possuem peso linguístico
nos itens lexicais das línguas de sinais.
Quadro 04. Algumas expressões faciais

CHATEADO TRISTE ALEGRE BRAVO

NERVOSO FELIZ PENSATIVO ESQUISITO

Língua brasileira de sinais 79


A prática de ensino da Língua Brasileira de Sinais

ADMIRADO COM MEDO COM DÚVIDA ASSUSTADO

APAIXONADO SONOLENTO
Fonte: acervo pessoal.

No Quadro 04 apresentamos apenas algumas expressões faciais, lembrando que exis-


tem muitas outras e que elas se compõem com o movimento corporal, pois enquanto é
feita uma expressão facial, o corpo se move paralelamente dando o sentido desejado.
Cada um desses parâmetros apresentados anteriormente é que faz com que o sinal te-
nha sentido e seja produzido com o conceito deseja, por exemplo, quando fazemos um
sinal com um movimento diferente, podemos ter outro sentido, como no exemplo abaixo.
Quadro 05. Sinais “hoje” e “agora”

HOJE AGORA
Fonte: acervo pessoal.

O sinal “hoje” é produzido com dois movimentos sequenciais. Já o sinal “agora” é produ-
zido com um único movimento rápido indicando a intensidade. Essa é a única diferença
entre os dois sinais: o movimento, pois ambos são feitos com a mesma CM, a mesma
Or, a mesma ENM e mesma L, tendo somente o M diferente.

2. CONHECIMENTOS PRÁTICOS NA LÍNGUA BRASILEIRA DE


SINAIS – DIÁLOGOS SINALIZADOS
Depois de termos trabalhado com a fonologia da língua de sinais e os cinco parâmetros
que compõe os sinais, podemos adentrar em algumas categorias de sinais que podem

80
nos ajudar a ampliar os conhecimentos. Inicialmente, conheceremos o alfabeto, que no
caso do Brasil é feito com apenas uma mão (a que for dominante).

As pessoas que são destras, ou seja, usam a mão direita para realizar a maioria das 3
ações, farão seus sinais usando essa mão, já as pessoas que são canhotas, usarão a
mão esquerda. Percebe-se que em algumas situações, independentemente de ser ca-

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nhoto ou destro, algumas pessoas utilizam a outra mão no momento de sinalizar, pois
não existe certo ou errado. Mas sim, cada pessoa deve usar a mão que se sentir mais
confortável e tiver maior agilidade e mobilidade.
Quadro 06. Alfabeto manual em língua de brasileira de sinais

A B C D

E F G H

I J K L

M N O P

Língua brasileira de sinais 81


A prática de ensino da Língua Brasileira de Sinais

Q R S T

U V W X

Y Z
Fonte: acervo pessoal.

O alfabeto é apenas mais um recurso utilizado quando se usa a Libras, sendo que ele
em si não é a língua. Dessa forma, não soletramos todas as palavras que vamos “falar”,
algumas pessoas quando estão aprendendo Libras, acham que por terem decorado o
alfabeto já sabem ou consegue se comunicar com as pessoas com surdez. Existe um
sinal para quase todas as palavras e, assim, recorremos à datilologia quando precisa-
mos informar o nome de uma pessoa ou de uma rua, que na maioria das vezes não
tem sinal. No caso das pessoas, primeiro sinalizamos o nome com o alfabeto e depois
fazemos o sinal, caso a pessoa já tenha um.

Quando nos referimos a uma cidade, estado ou palavra que não tenha sinal ou não co-
nhecemos o sinal, podemos recorrer ao alfabeto manual. Assim como no momento em
que as crianças estão aprendendo a ler e a escrever, ou seja, se alfabetizar, também
é importante utilizar as letras do alfabeto manual, pois a partir delas a criança vai com-
preendendo que cada palavra, sinal, possui uma combinação de letras que são usadas
para que ela seja escrita.

SAIBA MAIS
Para que você conhecer melhor o modo como fazer as letras do alfabeto, indico o
vídeo “Alfabeto em Libras”, gravado por Fernanda Falkoski para o canal Universo da

82
Surdocegueira – Grupo Brasil, disponível em: https://youtu.be/3uwvM4XPYoc. Acesso em:
13 set. 2021.

3
Quadro 07. Números em língua brasileira de sinais

Universidade São Francisco


NÚMERO

0 1 2 3

4 5 6 7

8 9 10
Fonte: acervo pessoal.

Os sinais dos números são utilizados quando vamos quantificar algum objeto ou pes-
soa, ou então quando queremos indicar número para qualquer situação, também são
mais um complemento da Libras.

Língua brasileira de sinais 83


A prática de ensino da Língua Brasileira de Sinais

SAIBA MAIS
Para que você conhecer melhor o modo como fazer os números, indicamos o vídeo “Núme-
3 ros em Libras”, gravado por Fernanda Falkoski para o canal Universo da Surdocegueira
– Grupo Brasil, disponível em: https://youtu.be/k-MODu0ldYo. Acesso em: 13 set. 2021.

Agora abordando propriamente os sinais, iniciamos nossos estudos pelos cumprimen-


tos, aquelas palavras que costumamos dizer quando encontramos com uma pessoa ou
então quando estamos nos despedindo. Aqui são apresentados somente alguns sinais,
sendo que existem muitos outros possíveis. Precisamos ter em mente que, a partir de
agora, os sinais sofrem regionalismo, os que são apresentados aqui são os mais utiliza-
dos no estado de São Paulo, mas eles podem variar de uma cidade para a outra.
Quadro 08. Sinais de cumprimentos em língua brasileira de sinais

CUMPRIMENTO OI OLÁ TCHAU

MEU NOME SEU NOME

MEU SINAL TEU SINAL

84
3

Universidade São Francisco


TUDO BEM DESCULPA

OBRIGADA DE NADA

PRAZER CONHECER LEGAL


Fonte: acervo pessoal.

SAIBA MAIS
Para que você conhecer melhor o modo como fazer os números, indicamos que assista ao vídeo
“Cumprimentos em Libras” gravado por Fernanda Falkoski para o canal Universo da Surdoceguei-
ra – Grupo Brasil, disponível em: https://youtu.be/SzcsBXPL2D4. Acesso em: 13 set. 2021.

Para que possamos pensar em um diálogo envolvendo os sinais aprendidos até o mo-
mento, exibimos mais alguns sinais diversos.
Quadro 09. Sinais diversos em língua brasileira de sinais

PORQUE FESTA CASA

Língua brasileira de sinais 85


A prática de ensino da Língua Brasileira de Sinais

GOSTAR PROBLEMA QUER


Fonte: acervo pessoal.

SAIBA MAIS

Para que você conhecer melhor o modo como fazer os sinais diversos apresentados, suge-
rimos que assista ao vídeo “Sinais diversos 1 em libras” gravado por Fernanda Falkoski para
o canal Universo da Surdocegueira – Grupo Brasil, disponível em: https://youtu.be/_sFCcv-
T9f8M. Acesso em: 13 set. 2021.

EXERCÍCIO
Com base nos sinais apresentados até aqui, você já está preparado para treinar um diálogo em Libras.
Lembre-se que a ideia é treinar, pois com a prática você vai desenvolvendo suas habilidades e criando
mais agilidade na sinalização. O local onde está com “...” significa que você deve fazer o seu nome usando
o alfabeto datilológico para isso. E onde está a outra indicação logo após o sinal, é que você deve fazer o
seu sinal em Libras, caso o tenha. O sinal representa o nome da pessoa, é como se fosse o batismo, você
recebe, normalmente de uma pessoa com surdez, e sempre que for se apresentar ou se referir a alguém
vai utilizar ele.

Diálogo em Libras

OI

B- OI, TUDO BEM?

SIM. OBRIGADO. SEU-NOME?

B- MEU-NOME “………...” MEU SINAL “.......”. SEU-NOME?

MEU-NOME “…..” MEU SINAL”…..” VOCÊ HOJE FESTA CASA?

B- SIM, QUER?

LEGAL. EU GOSTAR. DESCULPA PROBLEMA.

B- PROBLEMA-NÃO. PRAZER CONHECER VOCÊ.

GOSTAR CONHECER VOCÊ TAMBÉM. TCHAU!

B- TCHAU.

Na sequência, apresentamos, para a aquisição e ampliação de seus conhecimentos, os


sinais de calendário e meses do ano, como observamos abaixo.

86
Quadro 10. Sinais de calendário em língua brasileira de sinais

Universidade São Francisco


CALENDÁRIO DIA

SEMANA ANO ANO PASSADO

ANO QUE VEM SEGUNDA-FEIRA TERÇA-FEIRA QUARTA-FEIRA

QUINTA-FEIRA SEXTA-FEIRA SÁBADO DOMINGO

BOM DIA

Língua brasileira de sinais 87


A prática de ensino da Língua Brasileira de Sinais

BOM TARDE

BOM NOITE

HOJE AGORA
Fonte: acervo pessoal.

EXEMPLO
Para que você possa ter uma ideia melhor de como fazer os sinais de calendário sugiro que
assista ao vídeo “Calendário em Libras” gravado por mim, disponível em: https://youtu.be/
YOt1YHUAJGA. Acesso em: 13 set. 2021.

Quadro 11. Sinais dos meses do ano em língua brasileira de sinais

JANEIRO FEVEREIRO MARÇO

88
3

Universidade São Francisco


ABRIL MAIO

JUNHO JULHO

AGOSTO SETEMBRO OUTUBRO

NOVEMBRO DEZEMBRO

MÊS
Fonte: acervo pessoal.

Língua brasileira de sinais 89


A prática de ensino da Língua Brasileira de Sinais

EXEMPLO
Para que você conhecer melhor o modo como fazer os sinais de meses do ano sugiro que
3 assista ao vídeo “Meses do ano em Libras” gravado por Fernanda Falkoski para o canal
Universo da Surdocegueira – Grupo Brasil, disponível em: https://youtu.be/zv5bz7m7R8M.
Acesso em: 13 set. 2021.

No Quadro 11, temos 10 frases em que, na primeira coluna está a indicação do número,
na segunda como seria a frase em português e na terceira como seria em Libras. Note
como elas se diferenciam, lembrando que na coluna de Libras estão as palavras que
possuem sinal e elas estão escritas com um [ – ] sempre que temos um sinal para as
duas palavras.
Quadro 12. Diálogo em português e a correspondência em Libras

NÚMERO PORTUGUÊS LIBRAS


1 Hoje está muito quente Hoje muito-quente
Boa tarde, meu nome é Boa tarde, meu-nome
2
Rafaela Rafaela
Papai reza todos os dias
3 Papai rezar Deus todo-dia
para Deus
No domingo, minha tia se
4 Domingo tia separar marido
separou
5 Amanhã deve estar muito frio Muito-frio amanhã
Em junho será o aniversário
6 Aniversário sogra junho
da minha sogra
Ontem eu comi massa com Ontem comer almoço massa
7
carne no almoço carne
Terça-feira vou comer
Terça-feira comer panqueca
8 panqueca de morango com
morango chocolate
chocolate
Demora muito para chegar Demorar dezembro muito-
9
dezembro e ser quente quente
Como pão de queijo de
10 Comer pão-de-queijo manhã
manhã
Fonte: elaborado pela autora.

Quando pensamos na Libras, precisamos lembrar que ela tem uma estrutura que se
diferencia do português, caso façamos os sinais na mesma estrutura do português,
estamos a fazer o português sinalizado.

3. CONHECIMENTOS PRÁTICOS NA LÍNGUA BRASILEIRA DE


SINAIS – SINALIZANDO MÚSICAS, POESIAS E PARLENDAS
Seguindo na ideia de trabalhar com a prática de Libras, apresentamos a seguir uma
sequência de imagens com as ilustrações, o texto escrito e os devidos sinais que com-
põe o livro “Chapeuzinho Vermelho”. Destacamos que não usamos um sinal para cada

90
palavra, porque, às vezes o sinal pode representar mais de uma palavra e podemos ter,
também, mais de um sinal para compor uma palavra.

A seguir mostraremos duas páginas de um livro que apresenta a ideia de acessibilidade. 3


Quadro 13. Sequência de páginas da história “Chapeuzinho Vermelho” em Libras

Universidade São Francisco


ERA UMA VEZ, UMA MENINA

MUITO BONITA QUE MORAVA EM UMA

FLORESTA. SUA AVÓ HAVIA LHE DADO

DE PRESENTE UM CAPUZ VERMELHO E, POR

ESSE MOTIVO, TODOS A CHAMAVAM DE

CHAPEUZINHO VERMELHO.

Fonte: Honora (2010a, p. 1-2).

Este livro faz parte de uma coleção de 10 livros, além das histórias, acompanha um livro
com sugestões de atividades pedagógicas para cada história. Destacamos algumas
dessas atividades.
Figura 02. Sugestão de atividade a partir da
história “Chapeuzinho Vermelho”

CORPO HUMANO
Fonte: Honora (2010b, p. 15).

O CORPO HUMANO É DIVIDIDO EM TRÊS PARTES:

CABEÇA

TRONCO

MEMBROS

Língua brasileira de sinais 91


A prática de ensino da Língua Brasileira de Sinais

A Figura 03 apresenta a sugestão de atividade para se trabalhar com as partes do corpo


humano, sendo exposta uma frase em português e Libras, uma imagem e logo abaixo
a indicação das partes do corpo e seus sinais.
3
Figura 03. Sugestão de atividade a partir da
história “Chapeuzinho Vermelho”

A CABEÇA TEM:

BOCA NARIZ OLHOS ORELHAS

CABELO CÍLIOS SOBRANCELHAS

Fonte: Honora (2010b, p. 16).

Em relação a Figura acima, podemos observar uma continuação do trabalho com as


partes do corpo, mas focando na cabeça. Os membros são nomeados em português,
com o desenho e o sinal em Libras. Ou seja, essa atividade tem um foco na alfabeti-
zação por meio do letramento. Inicialmente, foi exposta uma história, em seguida são
propostas atividades que visam a alfabetização, mas partindo de algo que a criança
tenha tido contato de forma lúdica.

92
Figura 04. Sugestão de atividade a partir da história
“Chapeuzinho Vermelho”

VAMOS APRENDER OS SINAIS DAS PARTES DO

Fonte: Honora (2010b, p. 20).


CORPO COM A CHAPEUZINHO VERMELHO! 3

Universidade São Francisco


CABEÇA

BRAÇOS
PESCOÇO

PERNAS
BARRIGA

PÉS

Na proposta da Figura 04, a criança precisa colocar o que aprendeu anteriormente em prática,
pois terá que recortar os sinais e colocar nos locais corretamente, seguindo o que já vivenciou.
Figura 05. Sugestão de atividade a partir da
história “Chapeuzinho Vermelho”
CINCO SENTIDOS
Fonte: Honora (2010b, p. 24).

PODEMOS PERCEBER AS COISAS AO NOSSO REDOR

POR MEIO DOS CINCO SENTIDOS.

CHAPEUZINHO VAI MOSTRAR QUAIS SÃO:

Língua brasileira de sinais 93


A prática de ensino da Língua Brasileira de Sinais

De modo similar, a Figura acima exibe frases com a escrita em português e a sequência
dos sinais correspondentes em Libras.
Figura 06. Atividade para trabalhar números e quantidades
3 a partir da história “Chapeuzinho Vermelho”

DATA:
DESENHE A QUANTIDADE DE DOCES QUE CHAPEUZINHO VERMELHO
TEM NA CESTA:

4 8

3
5

Fonte: elaboração própria.

Ainda trabalhando sobre a história chapeuzinho vermelho, podemos realizar a proposta


de focar nos números e suas quantidades, conforme a sugestão da Figura acima.

No Quadro a seguir, ainda com foco na história da “Chapeuzinho vermelho, apresentamos


um exemplo das diferenças que existem entre um texto em português e um texto em Libras.
Quadro 14. História em português e a correspondência em Libras

PORTUGUÊS CORRESPONDENTE EM LIBRAS


Chapeuzinho vermelho Chapeuzinho vermelho

Era uma vez, uma linda menina que morava Muito tempo-atrás menina linda, morar jun-
com sua mãe numa bela casinha. Ela sempre to mãe, casa-pequena bonita. Sempre usar
usava uma capa com um chapeuzinho bem capa também nome chapeuzinho vermelho.
vermelho.
Um dia, mãe pedir ela levar cesta doces casa
Certo dia, sua mãe pediu que ela fosse levar vovó:
uma cestinha de doces, para sua vovó:
– Chapeuzinho, não ir caminho floresta por-
– Chapeuzinho, evite o caminho da floresta que perigoso, ir bosque não falar pessoas
que é perigoso, vá pelo bosque e não fale com não conhecer.
estranhos.
Chapeuzinho adorar vó, ir rápido, cantar mui-
Chapeuzinho adorava sua avó, e saiu em to feliz. Fazer surpresa vovó colher flores ver
disparada, cantando de alegria. Queria fazer caminho. Menina distraída segurar flores,
uma surpresa para vovó e começou a colher perceber lobo mau na frente. Ela não-saber
as flores que encontrava no caminho. A meni- ele lobo malvado, mas não assustar também
na estava distraída com as flores, não sentir medo.

94
PORTUGUÊS CORRESPONDENTE EM LIBRAS
quando deu de cara com o lobo mau. Ela não – Bom dia, chapeuzinho Vermelho.
sabia que ele era o lobo malvado, mas não se
assustou e nem sentiu medo. – Bom dia. 3
– Bom dia, chapeuzinho Vermelho. – Onde ir você?

Universidade São Francisco


– Bom dia. – Ir visitar minha vovó, muito doente.

– Aonde você está indo, assim, tão cedinho? Lobo, muito esperto, falar bem depressa:

– Vou visitar minha vovozinha, que está muito – Por que não ir floresta, mais perto?
doente.
Ela dúvida, porque não-gostar desobede-
O lobo, como era muito esperto, disse a ela cer mãe, mas resolver ir caminho lobo falar.
bem depressa: Chapeuzinho caminhar floresta, lobo rápido
ir bosque, cantar também correr. Lobo casa
– Por que não vai pela floresta, que é bem vovó bater porta:
mais perto?
_Quem bater? — Perguntar vovó.
Ela ficou em dúvida, porque não gostava de
desobedecer a sua mãe, mas resolveu seguir Lobo responder, trocar voz falar:
o conselho do lobo. Enquanto chapeuzinho
seguia pelo caminho da floresta, o lobo rapi- – Eu, Chapeuzinho Vermelho.
damente seguiu pelo bosque, cantando e cor-
rendo. O lobo chegou na casa da vovozinha – Entrar querida, porta aberta.
e bateu na porta:
Lobo, rápido, entrar engolir vovó. Depois
_Quem está aí? — Perguntou a velhinha. usar roupas dela, esperar Chapeuzinho Ver-
melho. Casa encontrar lobo perguntar:
O lobo respondeu, disfarçando a voz:
– Vovó! Por que orelhas grandes?
– Sou eu, Chapeuzinho vermelho.
– Porque ouvir melhor.
– Entre, minha querida, aporta está aberta.
– Vovó! Por que olhos grandes?
O lobo, que era muito rápido, foi entrando e
de uma só vez engoliu a vovozinha. Depois – Ver melhor.
vestiu as roupas dela, e ficou esperando
– Vovó, por que boca grande?
Chapeuzinho vermelho. Chegando na casa
da vovó, ela encontrou o lobo e perguntou:
– Porque comer você! — responder lobo.
– Vovó! Por que suas orelhas estão tão gran-
Lobo correr pegar Chapeuzinho. Depois tro-
des?
peçar-cair chão. Menina esconder dentro-ar-
mário. Lobo dormir roncar. Caçador caminhar
– É para te ouvir melhor.
ouvir:
– Vovó! Para que esses olhos tão grandes?
– Ronco esquisito?
– É para te ver melhor.
Entrar, encontrar lobo:
– Credo vovó, por que a senhora está com
– Ah! Você malvado!
essa boca tão grande?
Chapeuzinho ouvir depois contar história ca-
– É para te comer! — respondeu o lobo.
çador. Aproveitar lobo dormir, cortar barriga
tirar vovó. Feliz abraçar.

–Fazer o-que lobo malvado?

Língua brasileira de sinais 95


A prática de ensino da Língua Brasileira de Sinais

PORTUGUÊS CORRESPONDENTE EM LIBRAS


Dizendo isso, o lobo começou a correr atrás de Três juntos resolver encher-barriga pedras
Chapeuzinho. Depois de algum tempo, ele tro- lobo. Lobo acordar, tentar fugir, mas cair nunca
3 peçou e caiu no chão. Enquanto isso, a menina mais levantar. Todos felizes. Caçador ir, vovó
escondeu dentro de um velho armário. O lobo e Chapeuzinho sentar comer doces. Chapeuzi-
resolveu dar uma cochilada e começou a ron- nho prometer nunca desobedecer mãe.
car. Um caçador que passava escutou:

– Que ronco esquisito?

Ele entrou, e encontrou o lobo:

– Ah! É você que está aí, seu malvado!

Escutando isso, Chapeuzinho apareceu e


contou toda a história para o caçador. Aprovei-
tando que o lobo estava dormindo, cortaram a
sua a barriga, e tiraram a vovozinha de dentro.
As duas se abraçaram muito felizes.

– E agora, o que faremos com esse malvado?

Os três resolveram encher a barriga do lobo de


pedras. Quando o lobo acordou, tentou fugir,
mas ele caiu e nunca mais se levantou. Todos
ficaram aliviados e felizes. O caçador foi em-
bora, e as duas foram se sentar na varanda
e saborear os doces. Chapeuzinho prometeu
nunca mais desobedecer a sua mãezinha.
Fonte: elaborado pela autora.

Tentamos deixar claro a correspondência da frase em Libras com a frase em português


para que seja possível identificar as diferenças entre uma e outra. À vista disso, é pre-
ciso lembrar que essa organização se repete para o trabalho com histórias, músicas,
poesias e parlendas.

Um aspecto importante de ser pensado é o de que, ao sinalizarmos uma história, músi-


ca, poesia ou parlenda, precisamos primeiro estudar a escrita e a organizá-la dentro da
estrutura da língua de sinais, para depois sinalizar com fluidez. A partir desse primeiro
“estudo”, conseguimos visualizar os sinais necessários e focar nos aspectos fundamen-
tais que vão possibilitar uma melhor compreensão como: expressão facial e corporal.

SAIBA MAIS
Dica de sinalização de história

Para que você possa ver uma história sendo sinalizada, sugerimos que assistam ao vídeo
“O som de arrepiar”, gravado por Tatiane Cristina Bonfim, para o canal Casa Libras (2021),
disponível em: https://youtu.be/N9X55oScA2I. Acesso em: 13 set. 2021.

Incentivamos também que assista a outros vídeos com histórias disponíveis nesse canal,
criado como projeto da Universidade Federal de São Carlos.

96
Quando focalizamos o trabalho na sinalização de músicas, a primeira coisa que precisa-
mos pensar é o público a quem se destina: criança, jovem ou adulto. Depois, devemos
refletir sobre o gênero musical que vamos sinalizar; isso é, o que vai definir os sinais
que serão utilizados e principalmente a forma como vamos sinalizar. Nem todas as 3
pessoas se sentem aptas para fazerem esse tipo de sinalização, pois exige muito das

Universidade São Francisco


expressões faciais e corporais que juntamente com os movimentos vão passar a emo-
ção e o ritmo musical de cada música.

SAIBA MAIS
Dica de sinalização de música

Para que possam conhecer uma boa sinalização de música, sugiro que assistam ao vídeo
“Trem Bala (Ana Vilela) ‘LIBRAS’”, interpretado por Wanessa Sanches no canal Rebeca Ne-
mer (2018), disponível em: https://youtu.be/YYE4a1h_1wI. Acesso em: 13 set. 2021.

Todas as pessoas podem trabalhar com música, parlenda, poesia ou história. Às vezes,
haverá a necessidade de praticar mais e buscar outros conhecimentos para que seja
feito da melhor forma possível, mas precisamos sempre ter em mente o quanto isso
pode favorecer ou não o entendimento da pessoa com surdez.

Todos devem ter a possibilidade de acessar o que quiserem e ter acessibilidade para
que isso aconteça. Muitas vezes, o professor que propiciará essas oportunidades, por
isso é desejável que ele tenha conhecimentos de Libras e não dependa de um intérpre-
te para se comunicar ou interagir com seus estudantes.

CONCLUSÃO
Esta unidade teórico-prática de ensino da Língua Brasileira de Sinais teve como ob-
jetivo apresentar algumas possibilidades de se trabalhar com o assunto. Inicialmente,
abordamos o trabalho com a pauta sonora no processo de alfabetização e de letra-
mento na língua portuguesa em turma regulares que têm aprendiz com surdez. Trouxe-
mos, para tanto, alguns conceitos fundamentais para nortear o trabalho pedagógico, tal
como: alfabetização, letramento, alfabetizar letrando, atuação do professor bilíngue e
do intérprete de Libras. Cada um desses conceitos e abordagens são importantes para
que seja pensado e organizado o trabalho pedagógico para os estudantes com surdez.

Apresentamos também o que se entende por consciência fonológica e como isso pode
ser aplicado aos discentes com surdez, entendendo que existe um trabalho fonológico
na Libras, com cinco parâmetros que forma o sinal, para isso falamos de: configuração
de mão, movimento, locação da mão, movimento da mão, orientação da mão e expres-
sões não-manuais.

Discutimos também alguns conhecimentos práticos na língua brasileira de sinais: diálo-


gos sinalizados. Para isso, apresentamos o alfabeto manual que é um dos componen-
tes da Libras; os números; os sinais de cumprimentos, diversos, calendário e meses. A
partir disso, propomos um diálogo usando esses sinais e a forma de como organizar a
estrutura da frase em português e em Libras.

Língua brasileira de sinais 97


A prática de ensino da Língua Brasileira de Sinais

Finalizamos com alguns conhecimentos práticos na língua brasileira de sinais: sinalizan-


do músicas, poesias e parlendas. À vista disso, reproduzimos uma versão da história
“Chapeuzinho vermelho”, por meio de um livro com as ilustrações, escrita em português
3 e sinais. Destacamos algumas possibilidades de atividades que podem ser propostas
com os aprendizes com surdez a partir da história. Assim como apresentamos a escri-
ta da história em português com a correspondência em Libras, ou seja, a escrita em
português, mas na estrutura da língua de sinais. Ao longo da unidade, destacamos
a importância de assistir aos vídeos com os sinais apresentados, facilitando assim a
compreensão do estudante.

98
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ALMEIDA, Ana Lúcia. Fundamentos Psicológicos da Educação e Principais Abordagens Teóricas. ALMEIDA,
Ana Lúcia; VALEIRÃO, Kelin. (Orgs.) Elementos de Fundamentos psicológicos da educação. Pelotas: 3
NEPFIL online, 2015. Disponível em: https://wp.ufpel.edu.br/nepfil/files/2019/02/3-fundamentos-psicologicos-

Universidade São Francisco


da-educacao.pdf. Acesso em 16 out. 2021.

BRASIL. Lei nº 10.436, de 24 de abril de 2002. Dispõe sobre a Língua Brasileira de Sinais - Libras e dá
outras providências. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/l10436.htm. Acesso em: 5
nov. 2021.

BAGNO, Marcos. Língua, linguagem e linguística: pondo os pingos nos ii. São Paulo, Parábola Editorial,
2014.

FERREIRA BRITO, Lucinda. Uma abordagem fonológica dos sinais da LSCB. Espaço: Informativo Técnico-
Científico do INES, Rio de Janeiro, vol. 1, n. 1, p. 20-43, 1990. Disponível em: https://www.ines.gov.br/seer/
index.php/revista-espaco/article/view/179. Acesso em: 13 set. 2021.

FIORIN, José Luiz. Linguística? O que é isso? São Paulo, Contexto, 2013.

FREIRE, Paulo; MACEDO, Donaldo. Alfabetização: leitura do mundo leitura da palavra. 3ª edição. Rio de
Janeiro: Paz e Terra, 1990.

HONORA, Marcia. Chapeuzinho Vermelho. São Paulo: Ciranda Cultural, 2010a.

HONORA, Marcia. Coleção pedagógica contos clássicos. Chapeuzinho Vermelho. São Paulo: Ciranda
Cultural, 2010b.

KOERNER, Rosana Mara. Entre saberes e fazeres da/na alfabetização: o ato de mediar do professor
alfabetizador. Curitiba: Editora CRV, 2010.

MORAIS, Artur Gomes de. Consciência fonológica na educação infantil e no ciclo de alfabetização. 1.
Ed. Belo Horizonte: Autêntica Editora, 2019.

QUADROS, Ronice Müller de; KARNOPP, Lodenir Becker. Língua de sinais brasileira: Estudos linguísticos.
Porto Alegre: Artmed, 2004.

ROJO, Roxane. Letramentos Múltiplos: escola e inclusão social. São Paulo: Parábola Editorial, 2009.

SOARES, Magda. Alfabetização: a questão dos métodos. 1ª ed., 5ª reimp. São Paulo: Contexto, 2021.

Língua brasileira de sinais 99


Exercitando a Libras

UNIDADE 4

EXERCITANDO A LIBRAS
4

INTRODUÇÃO
Há semelhanças nas diferentes etapas da vida escolar. Da educação infantil, passando
pelo ensino fundamental I, ensino fundamental II, ensino médio e ensino superior, a
forma como os professores organizam suas aulas pode favorecer ou não o desenvolvi-
mento dos seus estudantes. Por essa razão, é primordial oferecer oportunidades para
que esses educandos venham participar do processo educacional em sua integralida-
de. É importante que as crianças, desde pequenas, desenvolvam habilidades para que
possam chegar a níveis mais elevados de conhecimento.

Pensar no trabalho a ser desenvolvido com aprendizes com surdez incluídos na sala de
aula regular exige do professor conhecimentos para que ele possa ser sensível a ponto
de se colocar no lugar dos seus alunos. Estudantes esses que não escutam e muitas
vezes acabam tendo uma compreensão diferente da matéria. Assim, é papel do docen-
te pensar como ele resolveria as situações, como aluno, caso não utilizasse a mesma
língua que os demais. Uma boa dica é focar em situações lúdicas que proporcionem
muitas vivências.

O trabalho com histórias infantis oportuniza a criança à exploração de aspectos da vida,


pois, quando se joga ou brinca, tem-se uma compreensão maior de como o mundo fun-
ciona e de diferentes maneiras de se lidar com novas situações. Ao contar uma história,
o professor tem a oportunidade de compartilhar emoções, despertar o prazer de escutar
o outro e de conviver em grupo. Ao “ouvir” uma história, pode-se fazer e refazer, produ-
zir e reproduzir imagens mentais e estimular a criatividade e a imaginação.

É nesse campo da ludicidade que os jogos podem se apresentar como aliados das
histórias trabalhadas. Por exemplo, eles melhoram a socialização entre os alunos, que
por sua vez, vivenciam situações de competição e de colaboração, culminando no de-
senvolvimento da capacidade de observação. Esse movimento, que acontece por cau-
sa da elaboração de conceitos, é um exemplo das ações e propostas que podem ser
organizadas com e para os alunos em sala de aula.

Nesta unidade, temos o objetivo de apresentar sinais em Libras relativos a: cores, fa-
mília, natureza e tempo. Para isso, dividimos a unidade em quatro sessões. Em cada
uma delas, apresentaremos um conjunto de sinais focalizando a educação infantil, o
ensino fundamental I, o ensino fundamental II, o ensino médio e o superior. Para cada

100
etapa escolar, nós nos voltamos para as possibilidades de atividades que podem ser
trabalhadas pelo professor com seus discentes em sala de aula – pensando nos apren-
dizes com surdez, que precisam estudar a língua, e nos alunos ouvintes que precisam
conhecê-la também. 4

Universidade São Francisco


IMPORTANTE
Enfatizamos aqui que, ao longo desta unidade, apresentamos os sinais que são utilizados
pela comunidade surda do estado de São Paulo. Com isso, apontamos que há a possibilida-
de de que, a depender da região, eles sofram variações.

1. EXERCITANDO A LIBRAS – EDUCAÇÃO INFANTIL


Na educação infantil, assim como nas outras etapas escolares, focaliza-se o trabalho
visual, para que o aprendiz com surdez possa ter mais facilidade de compreender o
que está sendo ensinado, uma vez que ele não se vale dos recursos auditivos que o
professor utiliza em sala de aula. Ao usar como apoio: imagens, figuras, fotos, vídeos,
objetos e ações reais, a criança pode aprender com mais facilidade, pois assim vivencia
as situações de forma lúdica e próxima do real.

Nesse contexto, Albres e Saruta (2012, p. 43) apresentam uma prévia de como orga-
nizar a rotina dos estudantes de educação infantil: “[...] calendário, hora da notícia,
lavagem das mãos, merenda, higiene dental, recreio, repouso e brincadeiras”. Sempre
tendo em mente que, entre uma atividade e outra, é possível que o professor se volte
para dois recursos: a contação de histórias e o Método da Experiência. Esse método
proporciona um ambiente estimulador por meio de pequenas práticas do cotidiano da
criança, tal como fazer um leite com chocolate e contar uma história ou atividade inusi-
tada que ocorre com ela.

O Método da Experiência é um recurso pedagógico que pode ser utilizado pelos do-
centes na aquisição da linguagem da criança com surdez na fase da Educação Infantil.
Inicialmente, o professor organiza com seus discentes o que será feito: uma receita, por
exemplo, pensa nos ingredientes que serão utilizados e, assim, cria o “agendão”, ou seja,
um bilhete que terá a informação do que será feito e dos ingredientes necessários, assim
como a indicação do estudante responsável por cada ingrediente. É de fundamental im-
portância que os aprendizes participem de todos os passos da receita para que possam
compreender a sequência, aumentar o vocabulário e desenvolver diversas habilidades.

A seguir, apresentamos a sequência de três etapas que foram realizadas durante o méto-
do de experiência do pão de queijo. Primeiro, a professora escolheu com seus estudantes
a receita que seria feita; em seguida, organizou o “agendão” com as informações neces-
sárias – para que as famílias providenciassem os ingredientes – e a indicação do dia em
que se realizaria a atividade. No dia combinado, os discentes iniciaram a atividade.

Língua brasileira de sinais 101


Exercitando a Libras

Figura 01. Etapa 1: alunos sentados preparando a


receita

Fonte: acervo pessoal.

A primeira etapa do método de experiência é destacada com a Figura acima, em que


dois estudantes da educação infantil com dois anos de idade estão iniciando o preparo
da receita do pão de queijo. Foram as crianças que fizeram todo o processo, desde
colocarem os ingredientes na bacia, mexerem a massa e fizeram as bolinhas. A profes-
sora estava auxiliando e aproveitando todas as ações das crianças para lhes ensinar o
máximo de sinais e estabelecer um diálogo com eles.

Figura 02. Etapa 2: Aprendizes sentados experimentando


o pão de queijo

Fonte: acervo pessoal.

Na segunda etapa do método, depois de preparar a receita, é importante propor o


momento em que os estudantes provem o que eles fizeram, sendo essa mais uma
oportunidade de ampliar o vocabulário de Libras e estabelecer diálogo. O docente e
os estudantes podem “discutir” a respeito da receita, se ficou como esperavam ou
não, se ficou macio ou duro, isto é, trabalhar com diferentes conceitos possíveis a
partir de uma receita.

102
Figura 03. Etapa 3: Registro da experiência

Universidade São Francisco


Fonte: acervo pessoal.

Já na terceira etapa do método de experiência, depois de finalizar a receita e degustar,


é a hora de registrar. Nesse momento, o professor usa de diferentes materiais para o
registro, como a embalagem dos produtos usados ou fotografia, escrita e desenho dos
sinais. A ideia é que o docente organize junto com a turma a sequência das ações que
foram realizadas, escreva as palavras no português, proporcionando o contato com a
escrita desde cedo e, principalmente, insira os sinais de tudo que foi usado na receita.

Esse registro costuma ser feito em cartaz e exposto na sala de aula, mas também pode
ser replicado em uma folha de ofício para que os discentes deixem no seu caderno.
Quando o material vai para o caderno, as famílias podem retomar o que foi feito em sala
de aula e, inclusive, testarem a receita em casa, sendo essa mais uma oportunidade
para estabelecer diálogo, mas agora entre a família e a criança.

O trabalho com o referido método de experiência pode ser realizado não só a partir de re-
ceitas, mas também depois de passeios ou brincadeiras ou, então, como registro de uma
história que foi contada pelo professor em sala de aula. Quanto mais o professor utilizar a
experiência em seu registro, mais vai favorecer o desenvolvimento dos seus estudantes.

Outro tipo de trabalho pedagógico a ser realizado com os discentes da educação infantil
envolve o uso específico de histórias infantis, pois a partir delas podem ser trabalhados
diversos conteúdos indicados à faixa etária. Para trabalhar com os sinais das cores,
indicamos a história “Branca de Neve e os Sete Anões”. Apontamos, a seguir, uma pos-
sível sequência de ações a serem realizadas e também a indicação de vídeo, sinais ou
atividades a serem realizadas, todos já na ordem para facilitar a compreensão:

I. Contar a história em Libras utilizando o livro: o professor pode organizar os personagens


da história em fantoches, sendo que cada um deles possui uma cor específica;

Língua brasileira de sinais 103


Exercitando a Libras

II. Mostrar um pequeno vídeo com a história em Libras para que os estudantes possam
visualizar cada cena e a sinalização junto (conforme apresentado na caixa de destaque
abaixo). Esse vídeo pode ser exibido mais de uma vez, pois é possível que a turma foque
4
primeiro nas ações e depois na sinalização. Quanto menores forem os educandos, mais
vezes é necessário mostrar o vídeo. Isso não deve acontecer em um único dia, para que
as crianças não se cansem.

SAIBA MAIS

A história em Libras pode ser apresentada utilizando o vídeo “Branca de Neve e os 7 Anões –
conto em Língua Brasileira de Sinais (Libras), com legendas”, interpretada por Ellen Oliveira,
no canal Os Amiguinhos (2020). Disponível em: https://youtu.be/3wOfy5KIm_c. Acesso em:
14 set. 2021.

III. O professor pode mostrar os sinais das cores em Libras. Reforçamos que os sinais apre-
sentados aqui são os utilizados pela comunidade surda de São Paulo.

Quadro 01. Cores em língua brasileira de sinais

AMARELO AZUL

BEGE BRANCO CINZA

LARANJA LILÁS MARROM PRETO

104
4

Universidade São Francisco


ROSA ROXO VERDE VERMELHO

VINHO
Fonte: acervo pessoal.

EXEMPLO
Para você conhecer melhor o modo como fazer os sinais das cores, indicamos o vídeo “Cores
em Libras”, gravado por Fernanda Falkoski para o canal Universo da Surdocegueira – Grupo
Brasil, ([s. d.]), disponível em: https://youtu.be/vp_k1m_dfgM. Acesso em: 21 nov. 2021.

IV. O próximo passo é solicitar aos discentes que façam relação entre os anões e suas co-
res. Pode-se usar os personagens feitos em fantoches ou em desenho, mas precisa-se
atentar para que os elementos (lápis, pedaço de papel, de tecido etc.) sejam de cores
diferentes e pedir que os alunos unam os que são iguais.

V. Outra possibilidade é criar um jogo da memória, com cartões com os anões e cartões com
as cores, de modo que os educandos precisem encontrar os pares corretos.

VI. O docente pode organizar atividades que envolvam trabalho com as cores, como cons-
truir um castelo com peças de encaixe e estabelecer uma ordem de cores. Para isso, ele
pode usar os materiais que há disponíveis em sala de aula para criar brincadeiras em que
os sinais trabalhados sejam utilizados.

É importante destacar que, na educação infantil, as crianças necessitam do trabalho


com brincadeiras e jogos, pois a partir deles é possível proporcionar muitas situações
em que a língua seja utilizada, ampliando o vocabulário dos discentes. Essas atividades
apresentadas podem ser utilizadas em salas regulares com a presença de crianças
surdas, pois o aprendizado será proveitoso a todos os alunos.

A seguir, apresentamos outras alternativas de atividades que podem ser desenvolvidas


com os estudantes na educação infantil, favorecendo a aquisição da língua e,
consequentemente, o aumento de vocabulário:

Língua brasileira de sinais 105


Exercitando a Libras

I. Atividade de rotina em sinais:

 organizar a rotina escolar utilizando figuras reais (fotos) dos sinais e as palavras escritas
4 correspondentes às ações. Isso fará com que todos os discentes da sala compreendam
que existe uma ordem para as ações da rotina, e qual ordem é essa.

II. Antecipar o que vai acontecer na sequência, fazendo com que os discentes realmente se
envolvam no que estão fazendo naquele momento, pois já sabem o que virá em seguida.
Brincadeiras e jogos em sinais:

 é possível confeccionar diferentes jogos utilizando os desenhos dos sinais, figuras e a


escrita, possibilitando-os de serem utilizados por todos os alunos da sala, não somente
por alguns.

Quadro 02. Jogos em língua brasileira de sinais

Twister: nesse jogo são trabalhados os sinais


de cores e números. O estudante atira o dado e
contempla qual é o número que sai; então, ele
se posiciona em uma das fileiras. Depois disso,
ele pega uma ficha que vai indicar uma cor, e
precisa colocar a mão ou o pé na cor indicada.

Trilha: nesse jogo são indicadas ações que o


discente precisa cumprir para seguir na trilha.
Pode-se ter cartões que peçam que ele ache
um objeto de determinada cor.

106
4

Universidade São Francisco


Jogo das emoções: nesse jogo de memória,
a intenção é trabalhar com as emoções a partir
da expressão facial.

Fonte: acervo pessoal.

III. Hora do conto em sinais:

 o professor pode organizar o momento de contar suas histórias utilizando para isso a
Libras.

IV. Trabalhar com as configurações de mão e expressões faciais e corporais:

 proporcionar momento de dramatização e mímica pode ajudar os alunos a desenvolver


habilidades que no futuro serão tão importantes no uso da Libras;

 organizar histórias ou mesmo brincadeiras que tenham essas habilidades em destaque.

Todas as atividades apresentadas são sugestões para que o professor possa trabalhar
com discentes na educação infantil. À vista disso, visa-se o desenvolvimento da língua
por meio dos conceitos e do vocabulário. Assim, é possível que o estudante chegue ao
ensino fundamental I com uma base sólida para ser direcionado ao ensino da língua
portuguesa escrita, sem deixar de trabalhar a Libras.

Outra possibilidade é trabalhar com o “Saco de novidades”, uma atividade realizada na


segunda-feira, em que o educando conta o que fez no seu final de semana. Nela, há
os objetivos de incentivar a criança a se comunicar por intermédio da Libras; exercitar
o uso da língua em situações do cotidiano por meio da interação entre pais e filhos; e
promover a aquisição da língua por meio de vivências significativas para a criança.

Língua brasileira de sinais 107


Exercitando a Libras

Quadro 03. Etapas fundamentais da atividade “Saco de novidades”

ETAPA DESCRIÇÃO
Tarefa de casa Os pais e seu filho, em casa, escolhem uma atividade significativa que a crian-
4 ça vivenciou. Os pais, com a participação efetiva da criança, registram a ativi-
dade (desenho, material concreto, fotografias, gravuras...). Este registro deve-
rá vir dentro de um saquinho de pano com o nome do aluno.
Na sala de aula No momento da rodinha, cada criança mostra e conta o que tem no saco das
novidades. Nesse momento, toda a forma de comunicação deve ser incentiva-
da – o importante é passar a mensagem.
Fonte: elaborada pela autora.

Cabe ao professor, nesse contexto:


` Incentivar as crianças a se comunicarem;

` Fazer interferências necessárias e apoiar a criança nesse momento, apresentando mo-


delos linguísticos;

` Dramatizar as novidades;

` Registrar as atividades em forma de cartaz e individualmente.

2. EXERCITANDO A LIBRAS – ENSINO FUNDAMENTAL I


O ensino fundamental I compreende do 1º ao 5º ano, e é o momento em que o educan-
do tem uma professora generalista e formada em pedagogia. Dependendo da cidade e
do estado, pode ser que o professor generalista também lecione educação física, inglês
e outra disciplina. Mas essa organização se faz de acordo com a rede de ensino: muni-
cipal, estadual ou particular. Assim, quando o professor organiza suas aulas, ele precisa
levar em consideração que todas as suas disciplinas precisam ser acessíveis, ou seja,
serem pensadas para todos os seus estudantes.

De acordo com Albres e Saruta (2012, p. 24), “[...] para o trabalho com os gêneros de
fala, a estratégia que deve permear todas as fases da escolarização é iniciar o trabalho
pelas situações comunicativas praticadas naturalmente em sala de aula”. O docente
pode partir de situações reais, que acontecem em sala de aula com sua turma, para
favorecer o desenvolvimento da Libras.

Embora a Constituição Federal, no art. 208, inciso I tenha sido revista e por meio da
Emenda Constitucional 59/2009 exista a indicação de que a educação básica é obriga-
tória dos 4 aos 17 anos de idade, há situações em que os alunos de 4 a 6 anos, etapa
da educação infantil, ainda não frequentem a escola. Ainda que essa ‘não escolariza-
ção’ venha sendo modificada, em ocasião das políticas públicas, quando se focaliza a
criança com surdez, pode ser que ela não tenha frequentado a educação infantil, e isso
pode significar que ela não tenha a Libras como sua primeira língua.

É imprescindível, dessa forma, que o professor proporcione situações em que, para


além dos conhecimentos do ano em questão, o discente possa desenvolver ou mesmo
aprender a Libras. Deve-se, assim, criar momentos de oportunidade para trabalhar a

108
língua com todos os seus estudantes, independentemente dos conhecimentos prévios
do aprendiz com surdez.

No contexto educacional, ainda há poucas produções de materiais didáticos que pos- 4


sam ser utilizados pelos aprendizes com surdez no ensino do português como segunda
língua, mas é possível destacar o livro Em mãos, português como segunda língua, que

Universidade São Francisco


foi lançado na Feira do Livro de Porto Alegre de 2018, por Donatella Camozzato, Maria
da Graça Casa Nova, Suzana Silva Zaffari e Tatiane Folchini dos Reis. Essa obra é ba-
silar, pois traz, de forma didática, dicas para facilitar o ensino de Língua Portuguesa em
Língua Brasileira de Sinais. Apresentamos duas páginas que tratam do tema “família”,
assunto que abordaremos na sequência.
Quadro 04. Páginas do livro Em mãos, português como segunda língua

Fonte: Camozzato et al. (2017 p. 60-61).

SAIBA MAIS
Para ler o livro na íntegra, ele está disponível na versão online no site da Fundação de Arti-
culação e Desenvolvimento de Políticas Públicas para PCD e PCAH NO RS – FADERS
–, da Secretaria de Igualdade, Cidadania, Direitos Humanos e Assistência Social. É interes-
sante apontarmos que, no início da obra, você observará que é apresentada uma iconografia,
isto é, o significado das imagens que são utilizadas ao longo do material.

CAMOZZATO, Donatella et al. Em mãos, Português como segunda língua – Para surdos.
Porto Alegre: Pacartes, 2017. Disponível em: https://faders.rs.gov.br/cartilha-em-maos-portu-
gues-como-segunda-lingua. Acesso em: 14 set. 2021.

Língua brasileira de sinais 109


Exercitando a Libras

Deixamos como sugestão trabalhar com as duas páginas do livro, porque elas podem
dar uma base do assunto a ser abordado com os discentes. O professor pode pedir às
turmas que tragam fotografias das pessoas que compõem as suas famílias para que
4 possam organizar uma árvore genealógica e trabalhar com os respectivos sinais.
Quadro 05. Homem e mulher em língua brasileira de sinais

HOMEM MULHER
Fonte: acervo pessoal.

É importante destacarmos que, quando vamos fazer os sinais de pessoas, precisamos


primeiro indicar o gênero (homem ou mulher) e, em seguida, fazer o sinal correspon-
dente, sempre nessa ordem.
Quadro 06. Família em língua brasileira de sinais

AMIGO AMIGA

BEBÊ CASADO

CASADA COLEGA HOMEM

110
4

Universidade São Francisco


COLEGA MULHER MÃE

CUNHADO

CUNHADA

FILHO

FILHA

IRMÃO

Língua brasileira de sinais 111


Exercitando a Libras

IRMÃ

NAMORADO NAMORADA

NOIVO NOIVA

PESSOA PAI

PRIMO PRIMA

SOLTEIRO SOLTEIRA

112
4

Universidade São Francisco


TIO TIA

VOVÔ VOVÓ

SOGRO

SOGRA

PROFESSOR

PROFESSORA
Fonte: acervo pessoal.

Língua brasileira de sinais 113


Exercitando a Libras

EXEMPLO
Para você conhecer melhor o modo como fazer os sinais da família, indicamos o vídeo “Família
4 em Libras” gravado por Fernanda Falkoski para o canal Universo da Surdocegueira – Grupo
Brasil, ([s. d.]), disponível em: https://youtu.be/YEN4JuMCiWg. Acesso em: 21 nov. 2021.

Essa é apenas uma sugestão de atividade que pode ser trabalhada com os discentes, a partir
dos sinais propostos. Outra proposta é iniciar de uma história, tal como “Os três porquinhos”.

SAIBA MAIS
Sugerimos a contação da história “Os Três Porquinhos”, interpretada por João Pedro de Oli-
veira Nascimento, um menino surdo totalmente em Libras, para o canal Audiovisual TILSP
(2020). O vídeo tem o apoio de imagens ao longo da narrativa. Disponível em: https://youtu.
be/NMWrn61ZCFw. Acesso em: 14 set. 2021.

Após assistir à história, o docente pode discorrer sobre os sinais apresentados e pro-
mover discussões a respeito do que não conhecem ou não entenderam, para que tudo
fique compreendido. É possível tratar também do livro, pois nele estará a história escrita
em português, que servirá de fonte para que o professor organize atividades.
Quadro 07. Representação da história feita com materiais recicláveis

Na imagem ao lado, encontram-se os


materiais utilizados pelo professor para
organizar com seus estudantes os obje-
tos necessários para representar a his-
tória e seus personagens – feitos com
materiais recicláveis.

Maquete pronta. Esse recurso é utilizado


para que os discentes tenham, visual-
mente, a representação da história que
estão trabalhando.

` Vale destacarmos que é possível in-


serir os sinais em Libras de cada per-
sonagem e material utilizado.

Fonte: acervo pessoal.

114
Enquanto se trabalha com histórias, é possível que o docente inicie atividades que
envolvam a escrita com o alfabeto – manual e em português – para que os educandos
possam ir se apropriando desses dois sistemas que serão muito utilizados por eles. De
mesmo modo, indicamos também a atividade de caça-palavras, da seguinte maneira: 4
Quadro 08. Caça-palavras em Libras

Universidade São Francisco


Procure no caça-palavras as seguintes palavras:

01. Casa

02. Lobo

03. Porquinho

04. Madeira

05. Palha

06. Tijolos

Figura 04. Caça-palavras envolvendo a história

Fonte: acervo pessoal.

Fonte: elaborado pela autora.

A seguir, vamos apresentar um plano de atividades organizado para alunos do 3º ano do


ensino fundamental, idealizado por professores do Instituto Nacional de Educação de Sur-
dos (INES), mas que pode ser utilizado por todos os discentes em sala de aula. O recorte
dessas atividades sugeridas no livro pode auxiliar o professor no início da sua atuação.

As atividades abaixo servirão como exemplo para a construção futura de trabalhos mais
dinâmicos com os estudantes em sala de aula.

Língua brasileira de sinais 115


Exercitando a Libras

Quadro 09. Sugestões de atividades do livro E-BOOK Unidades Didáticas para Aprendizes Surdos

PLANO DE ATIVIDADES
INSTITUTO NACIONAL DE EDUCAÇÃO DE SURDOS – INES
4 DEPARTAMENTO DE ENSINO SUPERIOR – DESU
METODOLOGIAS DE ENSINO DE LÍNGUA PORTUGUESA COMO L2 PARA SURDOS

PROFESSOR(A) DURAÇÃO DA ATIVIDADE

Augusto Machado ou acompanhamento de um responsável (ensino Dois encontros de 50 minutos


remoto) cada
1. Tema: Característica dos animais
2. Público-alvo: 3º ano do Ensino Fundamental
3. Objetivo(s): Ao final da atividade, o estudante deverá ser capaz de:
` Identificar o grupo de animais;

` Identificar habitat de animais: terra, ar e mar;

` Articular imagens e sinais em Libras: tipo de lugares;

` Produzir uma atividade sobre separar uns grupos: tipo de animais.


4. Recurso(s) Didático(s) utilizado(s):
` Atividade impressa;

` Vídeo em Libras sobre características de animais pela plataforma YouTube;

` Imagens com sinais


5. Metodologia utilizada:
Conversa na turma de 3º ano sobre uma proposta de interação dialógica entre professor surdo e apren-
dizes surdos e discentes entre si, explorando o conhecimento prévio dos alunos sobre o tema abordado
e construindo em conjunto novos conhecimentos de Ciências

6. Atividade(s) proposta(s): seguir Ramos (2004)

Atividade de Ciências sobre característica dos animais: características, habitat


1) Primeiro, vamos apresentar a atividade de ciências sobre grupo de animais:
Vamos aprender juntos sobre CONHECER O GRUPO DE ANIMAIS: onde eles vivem a vida: na terra, na
água e no ar – tem imagem de característica dos animais.

116
4

Universidade São Francisco


Professor surdo dando uma aula de Ciências para mostrar o grupo de animais, o que os estudantes
podem conhecer, tipo de animais: TERRA = cachorro, gato e leão. / ÁGUA = peixe e sapo. / AR =
pássaro, abelha e pomba. É uma oportunidade para saber o que os discentes já conhecem.

2) Agora, os estudantes precisam perceber as imagens: onde os animais moram?

Por exemplo:

Marque com números onde cada animal vive. (1) TERRA; (2) ÁGUA; (3) AR.

Os aprendizes surdos terão assistido ao vídeo no Youtube ou a explicação do professor e vão respon-
der onde eles moram (viver).
https://www.youtube.com/watch?v=k2QEELAWGZ4&feature=youtu.be

3) Escreva em cada quadrinho a letra que corresponde a característica do animal.

Tem uma foto de casa e outra foto de floresta, coloque as letras: D: para animais domésticos e S: para
animais selvagens, apenas Libras:

Língua brasileira de sinais 117


Exercitando a Libras

ANIMAIS DOMÉSTICOS = D ANIMAIS SELVAGENS = S

4) Vamos mostrar as imagens de corpo de animais o que os estudantes podem observar e depois ligar:

118
4

Universidade São Francisco


5) Professor surdo percebeu, no contato com os aprendizes surdos, que eles gostam de
fazer os desenhos sobre animais. Então, aproveitou para colocar um quadro branco para
escolher um animal que gosta mais.

6) Última atividade: Professor surdo precisa mostrar animais e suas mães grávidas e os
alunos precisam saber de onde nascem. As figuras de animais com palavras porque os
alunos surdos precisam conhecer as palavras em português.

Língua brasileira de sinais 119


Exercitando a Libras

NASCEM DA BARRIGA
NASCEM DE OVOS
DAS MÃES
4

SAPO COELHO

TARTARUGA PATO

GATO CACHORRO

7. Avaliação:

Professor surdo faz uma avaliação para saber se os alunos surdos compreenderam a
atividade de ciências sobre característica dos animais. Os aprendizes surdos serão ava-
liados em todo tempo, por meio de observação e atividades de ciências propostas com
imagens em Libras e com palavras.

Sempre comparando o desenvolvimento dos alunos surdos e como atuavam antes e de-
pois das atividades.

O professor poderá verificar se os discentes alcançaram um nível de compreensão.

8. Observações importantes

` A avaliação dos estudantes vai acontecer durante todos os encontros;

120
` O professor surdo tem que mostrar o registro sobre as atividades de ciências, obser-
vando se os alunos surdos conseguem responder sozinhos;

` É importante observar o nível de dificuldade apresentado pelos aprendizes surdos nas 4


atividades de Ciências, de forma a orientar a atuação nas próximas etapas;

Universidade São Francisco


` A avaliação é indispensável e a resposta para o discente deve ser para estimular, para
melhorar cada vez mais. Por isso, os comentários na avaliação ajudam o estudante a
crescer e acreditar nele.

Fonte: adaptado de Machado e Cruz (2021, p. 20-25).

Ressaltamos que o educador precisa ter claro que, quanto maior o número de recursos
visuais utilizados em suas aulas, mais formas de trabalhar o conteúdo ele terá.

Desde o ensino fundamental I, orienta-se o professor a recorrer ao trabalho com leitura de


diferentes gêneros textuais. De acordo com Salles et al. (2004, p. 19): “[t]radicionalmente,
o conceito de leitura está vinculado ora ao ato de decifrar os grafemas impressos, ora a
uma certa atitude em compreender textos”. Porém, hoje, tem-se uma visão diferente. Nas
palavras das autoras, “[...] a leitura é um processo de interpretação que um sujeito faz do
seu universo sócio-histórico-cultural”. Quanto mais oportunidades o professor oferecer
aos seus discentes, mais possibilidades de desenvolver habilidades ele terá.

O ensino de português para pessoas com surdez por vezes se mostra um desafio, mas
se apresenta como algo fundamental para o desenvolvimento escolar e para a vida.

SAIBA MAIS
Recomendamos que você assista ao vídeo “Comunicação surda: Libras ou Língua Portugue-
sa?”, diálogo com a Profa Dra. Mariana Campos e com os intérpretes Hector Calixto e Ariela
Siqueira. No vídeo, uma pessoa com surdez discorre sobre a importância de ter aprendido o
português e o quanto isso auxiliou em diferentes situações. Disponível em: https://youtu.be/
tfL4ReCby4M. Acesso em: 14 set. 2021.

Nesse vídeo, evidencia-se o caráter constitutivo da Libras no aprendizado de outra língua,


como a língua portuguesa, para as pessoas com surdez. Esse trabalho precisa seguir a or-
ganização de ensino de língua estrangeira, ou seja, ser pensado da mesma maneira como
se faz com uma pessoa que está aprendendo uma nova língua.

É a partir da leitura que o discente poderá desenvolver a escrita, vivenciando diferentes


situações em que precise recorrer ao que leu para escrever – da mesma maneira que
acontece com os ouvintes, quanto mais leem, melhores possibilidades de escrita têm.

3. EXERCITANDO A LIBRAS - ENSINO FUNDAMENTAL II


O ensino fundamental II compreende do 6º ao 9º ano. Nessa etapa escolar, os educan-
dos possuem mais de um professor e cada um deles é responsável por uma disciplina,
por exemplo: disciplina de português, matemática, história, geografia etc. A partir dessa
etapa da educação básica, o aprendiz com surdez precisa se esforçar nas atividades
escolares, visto que há pouco tempo com cada professor. Nessa fase, espera-se que o

Língua brasileira de sinais 121


Exercitando a Libras

aprendiz com surdez domine a Libras e só precise focar no aprendizado dos conteúdos
de cada disciplina.

4 Albres e Saruta (2012) frisam que o professor necessita trabalhar com diferentes gê-
neros textuais com seus estudantes. Principalmente com o aprendiz com surdez, para
que ele desenvolva habilidades necessárias para a produção de seus textos. Assim,
sugere-se trabalhar:
Quadro 10. Sugestões de habilidades

HABILIDADE DESCRIÇÃO
Cuidar do conteúdo (uma preocupação comum a todas as situações
Planejamento do texto comunicativas), com a forma como as informações são passadas. É necessário
trabalhar as diferenças entre a língua formal e a informal.
O conteúdo da expressão precisa ser apresentado de forma clara e coerente –
Estrutura da exposição o objetivo é facilitar a compreensão de seu sentido geral. Para que isso ocorra,
o texto em sinais deve ter uma sequência organizada.
A intensidade dos sinais do emissor e a amplitude da execução da articulação
Características da
dos sinais devem ser adequadas aos objetivos da interação com os
expressão face a face
interlocutores.
Olhares, gestos, expressões faciais afetivas e movimentos corporais são
Postura corporal
importantes na comunicação face a face.
Fonte: Albres e Saruta (2012, p. 34).

Para que cada uma dessas habilidades seja trabalhada é essencial recorrer a: piadas,
narrativas, poesias, entrevistas, descrições, opiniões, argumentação, convites, agrade-
cimentos, dentre outros tipos situacionais. Existe um material intitulado Programa Cur-
ricular de Língua Brasileira de Sinais para Surdos (2017), que pode nortear o trabalho
pedagógico do professor em sala de aula.

SAIBA MAIS
O material Programa Curricular de Língua Brasileira de Sinais para Surdos (2017), de Neiva de
Aquino Albres e Moryse Vanessa Saruta, apresenta possibilidades de como se trabalhar com
os estudantes, desde a educação infantil até o ensino médio, por intermédio da proposta de
ensino de Libras para pessoas com surdez. Disponível em: https://libras.ufsc.br/wp-content/
uploads/2017/03/2012-11-ALBRES-e-SARUTA-Curriculo-LS-IST.pdf. Acesso em: 14 set. 2021.

Para que as aulas possam ser pensadas de forma acessível é essencial que o professor
tenha, ao menos, um conhecimento básico da Libras, mesmo que conte com a pre-
sença de um intérprete em sala de aula. Não adianta apenas saber o que trabalhar, é
preciso entender o como. Uma vez que a função do intérprete é passar para a língua de
sinais as mensagens ditas pelo professor em português e vice-e-versa, ter uma noção
da língua favorece o trabalho do professor.

122
Quadro 11. Sugestão de atividade a partir de um texto
Atividade 6 – desenvolvida pelo mesmo aluno do Escrita do aluno:
texto anterior. O texto, extraído do livro Novo Tempo -
4 série, de Maria Helena Bernadete. Ed. Scipione, foi Carolina muito triste vê colega crianças muito
lido, depois explicado em Língua Brasileira de Sinais, brinca bola. Ela sozinha não gosto não vai eles 4
ao final do que a professora solicitou que o aluno re- brinca muito bola, basquete, corrida. As crianças

Universidade São Francisco


produzisse por escrito o texto. chuta bola porta Carolina pega bola vai corrida
para casa.
A menina solitária
Carolina sozinha brinca bola. Não gosto muito
Num dia ensolarado, Carolina caminha sozinha chato brinca sozinho. Carolina chora bola não
pela calçada. De repente, é atraída pela algazarra mais.
vinda de um grande colégio.
Como na atividade anterior, o aluno atende à so-
Com o nariz colado às grades, fica olhando as licitação da professora e reproduz o texto com
crianças que saem da sala correndo em direção suas palavras e não copiando trechos do origi-
ao pátio, fazendo um barulho de corpos e vozes. nal. Na sua reprodução constam as informações
mais relevantes, o que mostra que ele conseguiu
Eis que uma bola cai no meio da garotada. Tudo se atribuir sentido ao texto, ainda que uma ou outra
transforma. Forma-se uma roda. A bola passa de palavra possa não ter sido entendida. Além das
mão em mão. Circula. Todos seguem o seu trajeto. informações constantes do texto original, o aluno
Todos vibram, todos estão felizes. enriqueceu a sua reprodução com detalhes, como
as crianças brincarem de basquete, informação
Carolina não desprega os olhos do grupo animado. que parece ter resultado de sua experiência an-
"Por que eles estão tão alegres?", pensa a garoti- terior com bolas. Este dado evidencia que, na
nha. “Ah, é a bola!" atividade de compreensão do texto, o aluno arti-
cula as informações do texto com o conhecimento
Justamente naquele momento, um dos alunos dei-
adquirido previamente, como já foi observado na
xa a bola cair. Ela vai rolando, rolando, até o por-
atividade anterior.
tão. Carolina pega a bola e corre para casa, certa
de carregar consigo a felicidade.

No pátio do colégio, dissolve-se a roda, acaba a


vibração.

E Carolina? Ela chega em casa e começa a brincar


sozinha. Joga a bola contra a parede. Uma, duas,
três vezes. Depois abandona a bola e começa a
chorar.

Valfredo Tepe (adaptação).

Fonte: Pereira (2009, p. 45-46).

A partir dessa atividade, pode-se trabalhar com a turma os sinais envolvendo a nature-
za. Mesmo que a atividade sugerida seja pensada para os aprendizes com surdez,
reforçamos ser possível trabalhar com todos os discentes.
Quadro 12. Natureza em língua brasileira de sinais

AREIA ÁRVORE

Língua brasileira de sinais 123


Exercitando a Libras

CÉU CHUVA FLOR

ESTRELA LUA

MAR MUNDO

NUVEM PEDRA

PRAIA SOL
Fonte: acervo pessoal.

124
SAIBA MAIS
Para você conhecer melhor o modo como fazer os sinais da natureza, indico o vídeo “Natureza
em Libras” gravado por Fernanda Falkoski para o canal Universo da Surdocegueira – Grupo 4
Brasil, ([s. d.]), disponível em: https://youtu.be/J8RnyVMqveg. Acesso em: 21 nov. 2021.

Universidade São Francisco


Um aspecto que precisa ser muito discutido é referente à escrita do português, uma vez
que a pessoa com surdez vai utilizar essa ferramenta para fazer seus registros escritos.
Assim, quando os estudantes chegam ao ensino fundamental II, fica a cargo do pro-
fessor organizar diferentes modos de trabalho com o português escrito, trabalhando-o
como segunda língua para os aprendizes com surdez.

Muitas vezes, quando vai produzir um texto, o aprendiz com surdez pensa como se
estivesse sinalizando. De modo semelhando, o ouvinte, em alguns momentos, também
escreve como fala, mas quando leem o que escreveram, conseguem identificar e fazer
os ajustes necessários. Porém, nem sempre a identificação do equívoco de escrever o
português no padrão da sinalização acontece com o aprendiz surdo, pois quando ele
faz essa leitura, tem como base os sinais, e não o apoio auditivo, como os ouvintes.

O que diferencia essa escrita são alguns aspectos que fazem muita diferença ao se
fazer a leitura, do ponto de vista dos ouvintes:

` os verbos não são conjugados, em sua maioria, estão no infinitivo;


` não usam artigos, preposições, conjunções ou interjeições, tampouco palavras que exer-
cem a função de substituir outras palavras e dar uma fluidez para o texto;
` costuma apresentar muita repetição das palavras julgadas mais importantes por quem escreve;
` por vezes, a pontuação não está de acordo com as regras, pois, ao sinalizar, ela nem
sempre fica tão claro quanto quando se lê o texto em voz alta.

Figura 05. Escrita de um aprendiz com surdez

Fonte: Pereira (2009, p. 66).

Língua brasileira de sinais 125


Exercitando a Libras

Pereira (2009, p. 66) explica que essa produção (Figura 05) teve como base três ce-
nas “[...] que mostravam um menino, o mar, barcos, sol, coqueiro e na última cena um
homem fazendo um curativo no menino”. Foi a partir dessa proposta que o discente
4 teve que fazer a sua produção. A autora afirma que o estudante não recorreu apenas
à descrição das imagens, mas construiu uma narrativa a partir delas. Ele também fez
uso de seus conhecimentos prévios sobre as imagens representadas, seguindo uma
sequência temporal das ações.

SAIBA MAIS
Caso você tenha interesse em saber mais sobre o assunto e ver outros exemplos de escrita
feita por pessoas com surdez, acesse o material organizado por Maria Cristina da Cunha Pe-
reira (2009), intitulado “Leitura, escrita e surdez”. Disponível em: http://cape.edunet.sp.gov.br/
textos/textos/leituraescritaesurdez.pdf. Acesso em: 14 set. 2021.

Além do bilhete trazido, outro tipo de trabalho importante nessa etapa escolar é por meio
de jogos na sala de aula, dos quais destacamos algumas vantagens de usá-los, a saber:

` ajuda os educandos a se relacionarem de maneira mais eficaz e cooperativa;

` incentiva os discentes em sua liberdade criativa, fazendo com que eles se sintam menos
embaraçados ou receosos e se tornem mais autoconfiantes;

` aproxima estudantes e professor, o que pode ajudar a diminuir a tensão e a ansiedade que
impedem os alunos de aprender;

` promove uma atmosfera agradável;

` os educandos passam a usar a língua de maneira mais natural.

Como exposto acima, essas são apenas algumas das vantagens que o uso do jogo
em sala de aula pode propiciar tanto para a turma quanto para os docentes. Contudo,
salientamos que, independentemente da etapa escolar, todos os estudantes se benefi-
ciam desse tipo de proposta.

4. EXERCITANDO A LIBRAS – ENSINO MÉDIO E ENSINO


SUPERIOR
Tanto no ensino médio quanto no ensino superior se faz necessário trabalhar com a
prática da língua e oferecer jogos e brincadeiras com os quais os estudantes possam
aprender brincando. Mas, antes de tratarmos de sinais ou de jogos, vamos definir al-
guns aspectos que ainda não foram abordados.

Na Libras, não são utilizadas marcas de tempo nas formas verbais, por isso, na frase, eles
ficam sempre em sua forma infinitiva. O tempo, por sua vez, é marcado, sintaticamente,
por meio de advérbios de tempo, que indicam se a ação está ocorrendo no presente:
HOJE, AGORA; se ocorreu no passado: ONTEM, ANTEONTEM; ou se irá ocorrer no
futuro: AMANHÃ. Por essa razão, os advérbios, geralmente, vêm no começo da frase,
mas podem ser usados também no final. Quando não há, na frase, um advérbio de

126
tempo específico, de modo geral, não há especificação temporal. Já para futuro, pode-
se utilizar o sinal FUTURO.

IMPORTANTE 4
` NENHUMA MARCA – traz a ideia de tempo presente;

Universidade São Francisco


` PASSADO – traz a ideia de ação/evento que já foi realizado;

` FUTURO – traz a ideia de ação/evento que será realizado.

Na Libras, utilizamos as expressões faciais e corporais para marcar o tipo de frase, assim
como acontece com o uso da entonação na língua portuguesa. Dessa maneira, para que
o interlocutor reconheça qual tipo de frase está sendo dita – afirmativa, exclamativa, inter-
rogativa ou negativa –, é imprescindível observar as expressões faciais e corporais que
são utilizadas enquanto elas são sinalizadas, pois a indicação se dará dessa maneira. Em
outras palavras, de acordo com cada tipo de frase, é necessário averiguar que:

` Na frase afirmativa: a expressão facial utilizada é neutra, ou seja, a pessoa precisa ob-
servar esse aspecto.

` Na frase interrogativa: o sinalizante utiliza das sobrancelhas franzidas e um breve movi-


mento de cabeça para cima indicando que está fazendo uma pergunta.

` Na frase exclamativa: levante-se as sobrancelhas e movimentar-se a cabeça para cima


e para baixo, assim como pode ser utilizada a expressão e o movimento de fechar a boca
para baixo.

` Já na frase negativa: pode-se utilizar três indicações: (I) acrescentando o não na frase,
(II) incorporando o movimento contrário ou diferente do original (que assim indica a nega-
ção) ou, então, (III) com um movimento de cabeça indicando a negação.

Temos ainda outras duas formas de frases: a negativa-interrogativa e a exclamativa-


-interrogativa. Na primeira, é necessário franzir a sobrancelha e negar com a cabeça,
ao passo que, na segunda, precisa-se levantar a sobrancelha e movimentar a cabeça
para cima e para baixo juntamente com o movimento negativo da cabeça.
Quadro 13. Tempo em língua brasileira de sinais

COMEÇAR ACABOU

Língua brasileira de sinais 127


Exercitando a Libras

FIM SIM NÃO

TALVEZ NÃO SEI

HOJE AGORA

AMANHÃ ONTEM

MANHÃ TARDE

128
4

Universidade São Francisco


NOITE ANTES

DEPOIS DEMORAR

FRIO QUENTE TEMPO

PRESENTE PASSADO

FUTURO SEMESTRE
Fonte: acervo pessoal.

Língua brasileira de sinais 129


Exercitando a Libras

EXEMPLO
Para que você possa ter uma ideia melhor de como fazer os sinais de tempo, indico o vídeo
4 “Tempos em libras” gravado por Fernanda Falkoski para o canal Universo da Surdocegueira –
Grupo Brasil, ([s. d.]), disponível em: https://youtu.be/0FNgTgKz1h4. Acesso em: 21 nov. 2021.

Para que possamos trabalhar com jogos e brincadeiras, tanto com aprendizes com sur-
dez quanto com os ouvintes, é necessário observar alguns aspectos que os discentes
precisam:
` saber claramente quais são as regras do jogo e qual é o objetivo que se tem;

` ter um conhecimento mínimo do vocabulário necessário para jogar.

Uma sugestão ao professor é escrever algumas dessas palavras no quadro para que
os estudantes tenham um local rápido de consulta. Abaixo seguem, algumas possibili-
dades de atividades e brincadeiras que podem ser realizadas com os alunos no ensino
médio e no ensino superior para trabalhar vocabulário em Libras.

Quando pensamos em discentes ouvintes, pode ser que esse momento seja o primeiro
em que têm contato com a língua, assim, estão aprendendo. Mas ao pensar nos apren-
dizes com surdez, espera-se que já dominem a língua e possam auxiliar o professor
nas propostas.

Atividade 1: Grave um vídeo, em Libras, a partir do roteiro proposto. Não esqueça de numerar as frases
antes de gravar: faça o número e a frase.

01. O! Tudo bem?

02. Meu-nome ____________ (soletre seu nome utilizando o alfabeto manual).

03. Minha-idade ________.

04. Bem-vindo.

05. Prazer conhecer você.

06. Boa tarde, com licença.

Obs.: essa atividade visa desenvolver os sinais iniciais aprendidos e como organizar um diálogo, ou seja, o
jogo de corpo que é necessário de ser feito enquanto uma pessoa sinaliza a conversa entre duas pessoas.

Uma dica: sempre que você estiver sinalizando uma conversa entre duas pessoas, use do posicionamento
dos seus ombros e um leve mover para a direita ou esquerda. Você se posiciona de um lado quando uma
pessoa fala e de outro quando a outra fala, lembrando que seu corpo não se mexe, apenas acontece um
leve mover de ombros.

Atividade 2: Grave um vídeo, em Libras, a partir do roteiro proposto. Não esqueça de numerar as frases
antes de gravar: faça o número e a frase.

01. Oi! Meu nome Camila (Camilo).


02. Meu aniversário dia 6 mês abril.

130
03. Eu namorado (namorada). Nome meu namorado Francisco (Francisca).

04. Eu comer banana.


4
05. Meu filho ter 3 cachorros.

Universidade São Francisco


06. Hoje dia muito quente.

07. Semana que-vem comer maçã vermelha.

08. Árvore ter laranja boa.

09. Ontem aniversário minha mãe.

10. Gostar cachorro-quente comer junto refrigerante.

Obs.: nessa atividade tem-se como foco trabalhar o uso dos números e também das frases, lembrando que
elas estão escritas de acordo com os sinais que serão utilizados quando você for sinalizar.
Deve-se estar atento: você faz o número e sinaliza a frase, mas quando vai para o próximo número e
frase, precisa esperar alguns segundos para que haja uma separação entre uma e outra. Gravar essa sina-
lização é importante, para que, ao final, seja possível ver o que foi feito e pensar nas possíveis mudanças
que são necessárias, a fim de tornar as frases o mais compreensível possível.

Atividade 3: Telefone sem fio

É um jogo que provoca gargalhadas dos participantes e requer muita atenção para compreender a mensa-
gem que o companheiro transmite. Iniciar, organizando os jogadores em fila, um ao lado do outro.

` O primeiro comunica uma mensagem em Libras, que ele inventou, à pessoa seguinte.

` Quando o segundo recebe a mensagem, ele a transmite ao seguinte, procurando repetir em Libras
o que entendeu, o mais rápido possível.

` Quando o último receber a mensagem, comunica aos demais o que recebeu depois de haver pas-
sado por todos os jogadores e o primeiro comunica a mensagem original.

` Variação: em vez da mensagem em Libras, poderá transmitir uma palavra em alfabeto manual
(treino de alfabeto manual).

Obs.: nessa brincadeira são trabalhadas diferentes habilidades, mas a principal delas é ver uma frase
sendo sinalizada, copiar e reproduzir ela da mesma maneira, sem deixar informações importantes de fora.
A variação de utilizar o alfabeto manual é um recurso importante, pois é preciso entender a palavra para
reproduzir corretamente, sem tirar ou acrescentar letras que não sejam pertencentes a palavra.

Atividade 4: Nem sim, nem não

Um singular duelo em que não se pode distrair um só momento. Em duplas, os combatentes começam o
jogo dizendo os vocabulários em Libras que não podem usar durante a partida: “SIM”, nem “NÃO”.

A partir desse momento, cada jogador tenta fazer com que o outro sinalize os vocabulários proibidos, fazen-
do perguntas de todo tipo, e toma muito cuidado com as que ele lhe faz.

O primeiro que sinalizar “SIM” ou “NÃO” (com os dedos ou cabeça) perde, e o outro jogador ganha 1 ponto.

A lista de vocabulários em Libras proibidos vai sendo ampliada, para tornar o jogo mais difícil, conforme
avançam as partidas. Por exemplo: “SIM”, “NÃO”, “BRANCO”, “PRETO”...

Língua brasileira de sinais 131


Exercitando a Libras

Obs.: nessa brincadeira, além de compreender o que está sendo perguntado, o participante precisa pensar
em possibilidades de resposta sem utilizar os vocabulários proibidos em cada rodada. Favorece a habili-
dade de pensar, ter atenção, rapidez, agilidade e, sem dúvida, aumenta o vocabulário dos participantes.
4
Atividade 5: Jogo de memória

Um jogo que colocará à prova a memória dos participantes e sua capacidade de concentração. É preciso
formar um círculo de jogadores sentados, de forma que após o último volte-se ao primeiro.

` O primeiro jogador faz o sinal de um vocabulário qualquer em Libras. Por exemplo: “CASA”.

` O segundo jogador repete o sinal que o primeiro fez e acrescenta outra: “CASA, AVIÃO”.

Cada jogador deve repetir todos os vocábulos anunciados até o momento na mesma ordem e acrescentar
um novo à série. Assim, quanto mais jogadores participarem e mais voltas forem dadas, o jogo se tornará
cada vez mais complicado, pois o número de palavras ficará cada vez maior e, consequentemente, mais
difícil será memorizá-las. Quando alguém se atrapalha, os demais jogadores podem ajudá-lo. O jogo termi-
na quando não restar ninguém que seja capaz de memorizar toda a série.
Obs.: essa brincadeira é interessante, pois faz com que os participantes trabalhem com sua memória,
lembrando as palavras que são sinalizadas e, principalmente, a ordem com que são produzidas. Uma
variação, pode ser a construção de histórias. Ou seja, seguindo a mesma lógica, mas ao invés de usar
palavras aleatórias, os participantes precisam usar palavras que organizem uma frase ou um parágrafo que
tenha um significado. Assim, além de precisar memorizar, é necessário compreender os sinais que estão
sendo feitos para que quando chegar a sua escolha, você consiga seguir a mesma lógica e não sinalize
uma palavra fora de contexto.

Atividade 6: O Espelho

Um jogo de imitação de Libras com expressão facial e corporal, em que se deve ficar muito atento e segurar
o riso. É conveniente que o professor de Libras dirija o jogo.

Coloca-se os participantes emparelhados, frente a frente, formando duas filas. A um sinal, os participantes
de uma das filas começam a fazer Libras lentamente com expressão facial e corporal. Os da outra fila
devem imitar o seu par o melhor possível, como se fossem seu espelho. É proibido rir, a menos que esteja
imitando o jogador.

Passado um minuto, invertem-se os papéis, isto é, quem imitou passa a ser imitado.
Obs.: essa brincadeira, além de ser muito divertida, proporciona aos participantes desenvolver as expres-
sões faciais e corporais, pois é necessário copiar tudo o que a pessoa que está a sua frente faz.

Todas essas sugestões são possibilidades de se trabalhar com o ensino da língua e praticá-la.
É preciso ter em mente que elas foram indicadas nessa etapa escolar, ensino médio e supe-
rior, pois acredita-se que os adultos também aprendem mais fácil de forma lúdica e prática.

CONCLUSÃO
Esta unidade teve um aspecto mais prático, tanto no que diz respeito ao conhecimento
de alguns sinais da língua, quanto sobre a sugestão de atividades, jogos e brincadeiras
que podem ser usados com os aprendizes com surdez e no ensino de Libras.
Destacamos a apresentação de atividades que abordem o ensino de português como
segunda língua para aprendizes com surdez, que é um dos assuntos mais discutidos
na atualidade, principalmente quando se pensa no ensino bilíngue de aprendizes com

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surdez. Assim, dividimos a unidade em quatro seções que abordaram: educação infantil,
ensino fundamental I, ensino fundamental II, ensino médio e superior.

Na primeira seção da unidade, apresentamos diferentes aspectos a respeito da edu- 4


cação infantil, e também apontamos como se pode organizar a rotina dos discentes
e algumas das atividades a serem realizadas com eles. Tratamos sobre o método de

Universidade São Francisco


experiência com a apresentação da experiência do pão de queijo e sobre como fazer o
registro dessa ação com os estudantes.

Exibimos os sinais de cores em língua brasileira de sinais e uma possibilidade de tra-


balho partindo da história “Branca de Neve e os Sete Anões”, com o passo a passo do
que e como fazer. Também mostramos algumas possibilidades de jogos que envolvem
a língua e podem ser utilizados com os alunos em sala de aula, sempre proporcionando
o aumento do vocabulário.

Na segunda seção, abordamos sobre o ensino fundamental I, na qual expomos algu-


mas possibilidades de se trabalhar a partir do livro Em mãos, português como segunda
língua, lançado em 2018 e que tem como foco atividades que proporcionem o aprendi-
zado do português como segunda língua para os aprendizes com surdez.

Discorremos sobre os sinais referentes a família e uma série de propostas de ativida-


des a partir da história “Três porquinhos”, que poderiam ser utilizadas com os alunos
em sala de aula. Todas envolvendo a Libras, o alfabeto manual e o português escrito.
Citamos ainda algumas ideias de atividades para trabalhar com os educandos do 3º ano
do ensino fundamental, com o assunto animais.

Na terceira seção, tivemos como objetivo apresentar aspectos sobre o ensino funda-
mental II, abordando o trabalho com diferentes gêneros textuais, a importância de tra-
balhar com a leitura para que os discentes desenvolvam a escrita do português. Sugeri-
mos uma atividade realizada com um aprendiz com surdez a partir do trabalho com um
texto e em seguida foram apresentados os sinais de natureza.

Exibimos uma escrita feita por um aprendiz com surdez e também a reflexão sobre o
trabalho realizado, para que o futuro docente possa ter uma ideia do que precisa focar
em sala de aula, finalizando com a importância de trabalhar os jogos em sala de aula.

Na última seção, trouxemos o ensino médio e superior, a partir de aspectos sobre as


marcas de tempo nas formas verbais e como usar e reconhecer o advérbio de tempo
nas frases. Também, explanamos sobre o uso das expressões faciais e corporais para
marcar o tipo de frase: afirmativa, exclamativa, interrogativa ou negativa. E, por fim,
apresentamos os sinais de tempo e seis propostas de atividades, jogos e brincadeiras
que podem ser utilizados para o ensino e trabalho da língua de sinais em sala de aula.

Língua brasileira de sinais 133


Exercitando a Libras

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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4 Sinais para Surdos. São Paulo: IST, 2012.

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BRASIL. Emenda Constitucional nº 59, de 11 de novembro de 2009. Acrescenta § 3º ao art. 76 do Ato


das Disposições Constitucionais Transitórias para reduzir, anualmente, a partir do exercício de 2009, o
percentual da Desvinculação das Receitas da União incidente sobre os recursos destinados à manutenção e
desenvolvimento do ensino de que trata o art. 212 da Constituição Federal, dá nova redação aos incisos I e VII
do art. 208, de forma a prever a obrigatoriedade do ensino de quatro a dezessete anos e ampliar a abrangência
dos programas suplementares para todas as etapas da educação básica, e dá nova redação ao § 4º do art. 211
e ao § 3º do art. 212 e ao caput do art. 214, com a inserção neste dispositivo de inciso VI. Disponível em: http://
www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/emendas/emc/emc59.htm. Acesso em: 10 nov. 2021.

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MACHADO, Augusto dos; CRUZ, Osilene. Estratégias de ensino sobre características dos animais para estudantes
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