Maria IBSMk
Maria IBSMk
Maria IBSMk
NATAL / RN
2006
Divisão de Serviços Técnicos
BANCA EXAMINADORA
Para meu pai Jorge, minha mãe Alia, minhas irmãs Alice e Cláudia e
meu filho Felipe, que mesmo longe estão sempre perto, me
incentivando a superar os desafios.
Para Dudu e Sérgio que me acompanham cotidianamente.
Amo todos vocês, obrigada!
4
RESUMO
______________________________________________________________________
A tese propõe a idéia de que a Máxima de Juvenal: Mens Sana in Corpore Sano, pronunciada
na Antiguidade greco-romana subsume compreensões de corpo, saúde e educação
reapropriadas e reorganizadas por teorias científicas e pedagógicas nos séculos XIX e XX.
Essas teorias, sobretudo, as que receberam contribuições das ciências biomédicas,
influenciaram a Educação Física em busca de cientificidade. Para perceber essa
reapropriação, analisamos as transformações nos conceitos de corpo, saúde e educação
produzidos nos discursos da área, com vistas a apontar elementos para a configuração de
uma teoria que estamos denominando de Corpore Sano, a qual apresenta-se como uma
sistematização possível de conceitos científicos, filosóficos e pedagógicos e como tal, uma
compreensão dos fundamentos científicos da Educação Física. O corpus de análise foi
composto de 148 artigos publicados na Revista Brasileira de Ciências do Esporte digitalizada
no período de 1979 a 2003 e selecionados a partir das seguintes temáticas: corpo, biologia,
atividade física, fisiologia do esforço e saúde. A análise de conteúdo e a interpretação
referencial permitiram combinar a reflexão filosófica com a atenção ao campo empírico numa
dimensão compreensiva. A partir do corpus de análise é possível configurar meta-
argumentos em torno dos conceitos de corpo, saúde e educação na produção científica da
Educação Física. Como uma metapesquisa, nosso estudo não se pretendeu a um julgamento
da produção analisada, mas sim buscar elementos teóricos que possam propiciar a reflexão
sobre a racionalidade científica na Educação Física e seus desdobramentos no campo
pedagógico e das práticas corporais. Uma reflexão dessa natureza poderá ser reconhecida
como uma teoria do corpo vivo, sujeita a transformações e interrogações próprias dos
saberes e práticas da Educação Física. Uma teoria que rejeita a idéia de verdade totalizante
e abarca a compreensão de que a verdade é construída, historicamente, através das
relações entre os saberes e as práticas da Educação Física.
RÉSUMÉ
______________________________________________________________________
La thèse propose l`idée selon laquelle la Maxime de Juvenal Mens Sana in Corpore Sano,
prononcée dans l`Antiquité gréco-romaine dégage des compréhensions de corps, santé et
éducation ré-appropriées et ré-organisées par des théories scientifiques et pédagogiques au
cours des XIXème et XXème siècles. Ces théories, surtout, celles qui ont reçu des contributions
des sciences biomédiques ont influencé l`Éducation Physique en quête de scientificité. Afin
de percevoir cette ré-appropriation, nous avons analysé les transformations des concepts de
corps, santé et éducation produits dans les discours du domaine, ayant le but de montrer
des éléments pour la configuration d`une théorie que nous nommons Corpore Sano, qui se
presente comme une systématisation possible de concepts scientifiques, philosophiques et
pédagogiques et en tant que tel, une compréhension des fondements scientifiques de
l`Éducation Physique. Le corpus de l`analyse comprend 148 articles publiés dans la Revista
Brasileira de Ciências do Esporte digitalisée pendant la période de 1979 et 2003 et
selectionnés à partir des thématiques suivantes: corps, biologie, activité physique,
physiologie de l`effort et santé. L`analyse de contenu et l`interpretation référentielle ont
permis d`associer la réflexion philosophique et l`attention au champ empirique comme une
dimension compréhensible. À partir du corps d`analyse il est possible de configurer des
méta-arguments autour des concepts de corps, santé et éducation dans la production
scientifique de l`Éducation Physique. Comme une méta-recherche, notre étude n`a pas
prétendu un jugement de la production analysée, mais chercher des éléments théoriques
pouvant permettre la réfléxion sur la rationalité scientifique en Éducation Physique et ses
dédoublements dans le champ pédagogique et des pratiques corporelles. Une réfléxion de
cet ordre pourra être reconnue en tant que théorie du corps vivant, soumise aux
transformations et interrogations propres aux savoirs et pratiques de l`Éducation Physique.
Une théorie qui rejette l`idée de la verité totalisante et admet la compréhension selon
laquelle la verité est construite, historiquement, à travers les relations entre les savoirs et les
pratiques de l`Éducation Physique.
ABSTRACT
______________________________________________________________________
This thesis proposes that the idea expressed in Juvenal’s quotation Mens Sana in Corpore
Sano, produced in the Ancient Greek-Roman civilization includes undestandings of body,
heath and education that were reapropriated and reorganized by scientific and pedagogical
theories in the XIX and XX centuries. These theories, especially the ones that received
contributions from the biomedical sciences, have influenced Physical Education in the search
of becoming a science. In order to realize this reapropriation, we have analyzed the
transformations in the concepts of body, health and education produced in the area
discourse, aiming at pointing out elements to the configuration of a theory that is being
called Corpore Sano. The theory constitutes in possible systematization of scientific,
philosophical and pedagogical concepts, and as such, an understanding of the scientific
fundaments of Physical Education. The corpus of this analysis was composed by 148 articles
that were published in Revista Brasileira de Ciências do Esporte digitalized in the period
between 1979 and 2003 and selected according to theme: body, biology, physical activity,
effort physiology and health. The analysis of the content and the referential interpretation
allowed the combination of philosophical reflection with attention to the empiric field as a
comprehensive dimension. Based on the corpus of the analysis it is possible to configure
meta-arguments about the concepts of body, health and education in the scientific
production of Physical Education. As a metaresearch. Our study did not intend to judge the
analyzed production, but look for theoretical elements that may generate a reflection about
the scientific rationality in Physical Education and developments in the pedagogical field and
in body practices. Such a reflection might be recognized as a theory of the living body,
susceptible to modifications and interrogations that are proper of knowledge and practices of
Physical Education. It is a theory rejects the idea of the complete truth and holds the
comprehension that the truth is built historically through relations among different kinds of
knowledge and Physical Education practices.
LISTA DE IMAGENS
______________________________________________________________________
Cena de um jovem saudado pelo seu instrutor de ginástica, quando chega de sua aula de
música (p. 40).
Skýphos de figures vermelhas. 460 a. C. Lowie Museum of Antropology. University of
Califórnia, Bekerley.
IN: YALOURIS, Nicolaos. Os jogos Olímpicos na Grécia antiga. São Paulo: Odysseus, 2004.
SUMÁRIO
________________________________________________________________
APRESENTAÇÃO ........................................................................................................10
A MÁXIMA DE JUVENAL.............................................................................................18
Compreensões de corpo.................................................................................................71
Da Racionalidade ........................................................................................................115
REFERÊNCIAS ..........................................................................................................141
ANEXOS ....................................................................................................................148
APRESENTAÇÃO
Federal do Rio Grande do Norte. Nessa época, entrei em contato com os estudos sobre
ocidental e suas implicações para a Educação Física, resolvi investigar o significado desse
conceito para professores da Educação Física Infantil e as relações para a prática pedagógica
desses profissionais.
O gosto pelos estudos sobre o corpo foi aumentando cada vez mais,
especialmente quando tive a oportunidade de cursar no ano 2000, como aluna especial, a
disciplina Corporeidade e Filosofia, ministrada pela profª Dra. Terezinha Petrucia da Nóbrega
epistemológica.
divulgado por Elenor Kunz com o intuito de ampliar as reflexões sobre este fenômeno,
escolar.
contribuir com as reflexões sobre a episteme da área, como apontam os estudos de Nóbrega
(1999; 2005a; 2005b) e Silva (2001a; 2001c), nos direcionamos para a Máxima de Juvenal:
Mens Sana in Corpore Sano. Do ensino escolar para o ensino universitário, percebemos que
a Máxima de Juvenal: Mens Sana in Corpore Sano está registrada em objetos1, nas
formatura. Essa máxima acompanha essa área há muito tempo, mas percebemos a
o modo como a Educação Física vem ressignificando-a por meio da produção científica da
área.
XIX e XX. Essas teorias científicas e pedagógicas, sobretudo, as que receberam contribuições
1
Refiro-me a um presente que ganhei há uns onze anos de uma aluna da Educação Infantil. Um pote de vidro
que contém no seu interior um boneco representando um professor de Educação Física. Cronômetro no pescoço
e de um lado a inscrição da máxima de Juvenal: Mens Sana in Corpore Sano.
2
Refiro-me aos alunos da Universidade Federal do Rio Grande do Norte e da Universidade Potiguar.
13
corpo, saúde e educação produzidos nos discursos da área, com vistas a apontar elementos
para a configuração de uma teoria que estamos denominando de Corpore Sano, a qual
pedagógicos e como tal, uma compreensão dos fundamentos científicos da Educação Física.
principal entidade científica do Brasil que congrega professores de educação física. O CBCE
conhecimento vem buscando sua consolidação desde o ano de 1978, data da fundação do
CBCE.
Educação Física e Ciências do Esporte e, a partir de 2002, como Educação Física. Entretanto,
apesar de constar no novo estatuto do CBCE a denominação de Educação Física, essa área
do conhecimento vem sendo designada ora como Ciências do Esporte, ora como Educação
3
Estamos nos pautando na apresentação do CBCE em seu site: www.cbce.org.br
14
Física e Ciências do Esporte, ora como Educação Física/Ciências do Esporte como pode ser
visualizado na apresentação tanto na página da Internet, como nos materiais impressos pela
Direção Nacional na gestão do biênio 2003-2005 (Carta Programa, folheto sobre o XIV
2/2005, 4/2005, 7/2005, 1/2006, 7/2006). Nesta tese, estamos nos baseando no que está
desejo pelo reconhecimento acadêmico dessa área e as lutas simbólicas específicas que
aplicação desses conceitos e das regras de utilização dos mesmos. [...] Trata-se da análise
científico é uma realidade tão complexa, que não basta investigá-lo sob uma perspectiva
O corpus de análise foi composto por 148 artigos publicados na RBCE digitalizada
no período de 1979 a 2003 e selecionados a partir das seguintes temáticas: corpo, biologia,
proposta por Bardin (1979), adaptada e trabalhada em Dantas (2002), Nóbrega et al (2003)
e Dias (2004), foi utilizada para a redução dos eixos temáticos4 recorrentes nos artigos
identificação dos núcleos de sentido, que se refere a uma leitura específica dos eixos
baseado na leitura filosófica de Foucault (1984; 1985; 1988; 1999; 2001; 2002; 2004),
Canguilhem (1977; 2002; 2004) e Merleau-Ponty (1990; 1991; 1999a; 1999b; 2000; 2004).
corpo, que não pode desenvolvê-lo e apesar da genealogia foucaultiana da verdade baseada
de que o corpo vivo possui um “logos nascente” e que o fato dele tentar explicar ao máximo
o mundo gerou teorias objetivas e escondeu esta produção, como destaca Dreyfus (1995).
4
Tivemos, em cada artigo analisado, os seguintes eixos temáticos: objeto de estudo, método de pesquisa,
conceitos de saúde, corpo e educação, áreas de conhecimento e principais teóricos, como pode ser visualizado
nos anexos.
Ao longo do texto, as referências da produção analisada estão colocadas em notas de rodapé para diferenciar das
referências teóricas. As referências aos autores e suas obras estão colocadas em um índice onomástico.
16
Para Chauí (2002a), Foucault apresenta no livro “As palavras e as coisas” temas
Signes. A autora também revela que a idéia de uma arqueologia do saber é desenvolvida por
Com relação a Canguilhem (2002; 2004), sabemos que foi leitor dos livros de
elaboração da tese. Durante esse processo buscamos uma rede de relações que colaboraram
estruturas da produção científica da Educação Física, nas suas formas de racionalidade, nos
saúde e educação, cuja sistematização configura uma Teoria do Corpore Sano e está
dos conceitos de corpo, saúde e educação na produção científica da Educação Física. Como
mas sim buscar elementos teóricos que possam propiciar a reflexão sobre a racionalidade
corporais. Uma reflexão dessa natureza poderá ser reconhecida como uma teoria do corpo
Física. Uma teoria que rejeita a idéia de verdade totalizante e abarca a compreensão de que
da Educação Física.
18
19
na Máxima de Juvenal, torna-se necessário conhecer o contexto no qual esse poeta estava
inserido quando a escreveu. Seu pronunciamento ocorreu na décima sátira, por volta dos
[19..]. O poeta Juvenal era influenciado pelo pensamento dos filósofos pré-socráticos, dos
sofistas, de Platão e Aristóteles, cujas idéias antecedem a escrita da máxima Mens Sana in
Corpore Sano. Além disso, o pensamento de Juvenal recebia influências do helenismo e era
entrelaçam e formam uma rede de relações que colaboram com a nossa interpretação sobre
Inspirado pelos vícios e crimes que vigoravam em sua cidade, Juvenal não media
palavras para delatar a corrupção dos imperadores romanos, as guerras que promoviam,
suas festas orgiásticas e suas atitudes despóticas. A atmosfera em que esses homens
realizavam tais feitos pode ser percebida através das palavras do poeta, quando exclama
que:
Através da sátira, gênero literário que censura costumes, instituições ou idéias, zomba das
pessoas que já haviam morrido para falar do seu tempo, pois considera que seria perigoso
falar dos vivos. Esse poeta não concordava com a idéia de honestidade que se espalhava por
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Roma a partir do império de Nerva, como destaca Paratore (1983). Dentre os vários
desigualdades de condições, defendia uma vida digna para as pessoas. Como ressalta Pérez
[19..], o grande princípio desse poeta foi o direito de todos à vida e ao seu bem estar.
paz, celebrar festas, sentir prazeres, dores e de se preocupar com a saúde. Com suas
palavras extravagantes, o poeta questiona o costume dos romanos de realizar pedidos aos
deuses para resolver problemas vitais sem possuir cuidados pessoais, como percebemos no
La Mort de Sardanapale
(Delacroix, 1827)
coletividade, possível de ser percebida na alusão à lenda de Sardanapalo, rei Assírio que
planejou suicídio coletivo em 612 a.C., ao reunir suas riquezas, seus amantes, incendiou o
seu palácio. Percebemos que Juvenal, ao colocar os trabalhos e as provas de Hércules acima
alma, problematizando a teoria órfica-pitagórica da reencarnação. Essa teoria foi aceita por
Platão e se espalhou pela Grécia Continental e pelo mundo helênico. Por essa teoria, as
“roda dos nascimentos”, ou seja, para não precisar mais nascer, alcançar a imortalidade da
esquecimento (Léthe) e não esqueça o que lhe diz o deus. Esses rituais de
purificação – as orgias – se baseavam na crença na imortalidade da alma,
conseguida após muitas reencarnações ou transmigrações, e a finalidade
ritualística era purificar a alma do iniciado (Chauí, 2002b, p. 65).
que cultuavam Dioniso foram herdadas dos gregos e reinterpretadas pelos romanos. Um
seja, senhoras da nobreza, reconhecidas como bacantes, que se reuniam à noite em locais
esse cerimonial religioso e os homens foram admitidos nas iniciações ritualísticas. Mulheres e
homens, da nobreza ou da plebe se entregavam aos delírios das orgias, aos excessos do
juramento de não revelar o que ocorria nos ritos de celebração e, além da embriaguez, dos
posse de bens e riquezas alheias e até de eliminarem àqueles que se recusassem a participar
Senado romano em 186 a.C. proibiu a formação dessas associações, com o intuito de evitar
desgraças e abusos, como a morte de seres humanos. Mas, não houve proibição do culto ao
Deus Dioniso, deus grego da alegria e do vinho, reconhecido como Baco (Bacchus) entre os
romanos, desde que as celebrações fossem públicas, como ressaltam Grimal (1984) e
Brandão (1993).
acesso a uma vida fácil, conquistada por uma minoria e que acabava em tragédia. Essa
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minoria se refere aos imperadores, senadores, generais e cavaleiros que insistiam em alargar
o domínio romano através das guerras, com vistas a obter lucros até então nunca vistos,
mesmo que várias vidas fossem exterminadas. Em contrapartida, o poeta chama a atenção
para que os próprios seres humanos, em vez de se iludirem com os enriquecimentos ilícitos e
Hércules, nome latino do Deus Héracles e que provém do grego Hersklés, por
obter vitória nos Doze trabalhos impostos pela Deusa Hera, foi o mais popular dos heróis
gregos, o único celebrado por todos os helenos e suas aventuras tematizam as experiências
humanas e o valor da vida. Filho adúltero de Zeus com Alcmena, amante da música e dos
amores, Hércules supera os obstáculos que o destino lhe impunha através de trabalhos, sem
órfico-pitagórica que exalta os sofrimentos de Hércules como provas que liberam a alma da
compreensão do umbigo, como centro da vida e como atração sexual, como zona erótica.
Ônfale, o último amor humano do herói, mantinha com ele relacionamento íntimo e significa
umbigo feminino, útero da mulher, da Mãe - Terra. Desse modo, o mito de Hércules traz a
pelos filósofos da época helenística que se preocupavam com os problemas vitais com o
pelo povo grego como superior a outras culturas. Alexandre Magno, criador do helenismo,
tinha como intuito reunir diversos povos do mundo. Suas idéias contribuíram para derrubar
busca desenfreada pelo prazer, o amor à riqueza, a sede de poder, o desejo de fama, brilho
pensamento de Epicuro. Como destaca Reale e Antiseri (1990), o epicurismo ganha vigor
nos dois primeiros séculos da era cristã. No pensamento de Epicuro, a eliminação do desejo
de imortalidade da alma pode ser percebida pela consideração de que a morte é a privação
Não existe nada de terrível na vida para quem está perfeitamente convencido
de que não há nada de terrível em deixar de viver. É tolo portanto quem diz
ter medo da morte, não porque a chegada desta lhe trará sofrimento, mas
porque o aflige a própria espera: aquilo que não nos perturba quando
presente não deveria afligir-nos enquanto está sendo esperado (Epicuro,
2002, p. 27).
Desse modo, percebemos que tanto para Epicuro quanto para Juvenal, a morte
não deveria ser buscada a qualquer custo para se alcançar a imortalidade da alma, nem ser
temida a ponto de se querer prolongar a vida, o que importava para ambos era a maneira de
resolver problemas vitais, Juvenal indaga sobre a exigência de se pedir ao Deus Júpiter,
Deus supremo da mitologia romana que incorpora as características do Deus grego Zeus, o
ações colaboravam com uma velhice deplorável, o que é enaltecido em sua décima sátira,
quando demonstra de modo veemente, os prejuízos destinados ao ser humano e que são
prejudiciais à saúde. Outro momento relevante se dirige à alusão feita ao sábio Sólon, cujo
(1997), pois não existe somente a preocupação com os jovens, mas também com os velhos.
O que importa para ambos é saber desfrutar do tempo da vida; mesmo que este seja breve,
estão atreladas às preocupações éticas e políticas, nos fazendo perceber reflexões sobre a
honestidade e sobre a moderação dos atos humanos, o que se aproxima com o pensamento
Demócrito, além de ser reconhecido por ter desenvolvido a teoria dos átomos de
seu mestre Leucipo, dedicou-se a problemas éticos, políticos e educacionais. Para esse
filósofo pré-socrático, quem deseja obter uma vida tranqüila não deve se agitar demais,
tanto na sua vida particular, quanto na vida coletiva, devendo tomar cuidado com a sedução
agrícola, era identificada pela posse de terras e era utilizada para qualificar os seres
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sociais, na medida em que instigava os seres humanos à ganância pela busca do dinheiro e
do poder a qualquer custo, sem se preocupar com os que estavam em sua volta. Diante
delimitar e controlar a violência contra a vida alheia, pautava-se na idéia de que a razão
estabelecia limites e controles nos prazeres humanos, com vistas a evitar injustiças. Não
amizade, pela busca da felicidade; o amor entre os rapazes era aceito e era reconhecida a
necessidade dos prazeres para a vida humana, mesmo que sob os desígnios da razão, como
que a moral cristã opera por um sistema global, definindo princípios gerais. Esse filósofo
reforça a idéia de que Platão e Aristóteles não negavam os prazeres, mas que defendiam a
temperança reconhecida por Foucault (1984, p. 54) como “uma arte, uma prática dos
prazeres que é capaz, ao usar daqueles que são baseados na necessidade, de se limitar ela
própria”.
ascetismo ou o hedonismo. Na nossa compreensão, não ter paixões, não significava para
esse poeta satírico desprezar os prazeres corpóreos, mas sim reforçar a necessidade de
cuidados com o corpo, para eliminar os desejos considerados desnecessários para si e para
Além disso, percebemos que a Máxima de Juvenal emerge num período em que
não existia fronteira delimitada entre filosofia e ciência, entrelaçando-se com as práticas
Homero, pela filosofia natural, pela medicina hipocrática, pelo naturalismo biológico de
Aristóteles, pelos aspectos comunitários e políticos da Paidéia grega, pelo helenismo e pelo
sistematizada num espaço ético e mantém relações com o contexto em que está inserida,
(1993, p. 57), “a filosofia vai buscar os seus objectos a uma realidade exterior. Para os
divina e para Aristóteles, era reconhecido como um organismo que possui um dinamismo
interior. O cosmos para Aristóteles é circular, tem como centro a Terra e é ordenado de
percebemos que não considera parte da natureza o que depende de convenção, de decisão
estabelece diferenciações entre o que é dom natural e o que pode ser adquirido através de
28
estudo. Ao expor suas idéias, Platão utiliza a dialética para defender que a virtude pode ser
conceito nos escritos dos filósofos pré-socráticos, pois consideramos que exerceram
uma concepção orgânica, cujas partes são reconhecidas como elementos de um todo. O
conceito de physis não expressa algo que é estático, pois possui dinamicidade. Trata-se do
princípio de tudo, trata-se do próprio ser em relação com as outras partes integrantes da
natureza. Mas, conforme destaca Bornheim (1994), não podemos cair num naturalismo, pois
esse conceito compreende tudo o que existe na realidade e cada parte estabelece relações
ser e, a partir da physis, pode então aceder a uma compreensão da totalidade do real: do
além de relacionar as partes com o todo, considera que os opostos não estão em
mocidade e velhice, transformam-se um no outro, voltando a ser o que era antes. Por essa
perspectiva, percebemos que não há ruptura entre natureza e cultura. As ações humanas
Corpo e saúde
Na Antiguidade, por tudo ser considerado natureza e a natureza ser una, os seres
vivos eram considerados unidos através de uma rede secreta que ligava todos os objetos e
fenômenos do mundo. Os seres vivos eram conhecidos e analisados por suas estruturas
visíveis, o que colaborava com a idéia de que o corpo humano era regulado pelo exterior, de
desfrutava de semelhanças perante os outros seres vivos, mas era identificado por abarcar
um grau mais elevado perante eles. Hierarquias também eram encontradas entre os próprios
qual os seres humanos eram considerados superiores perante os outros seres vivos. Apesar
de considerar que todos possuíam uma alma, cada ser vivo tinha a sua alma específica e o
recorrendo-se à ação de Deus e o calor inato caracterizava a vida. Quando este cessa e há o
esfriamento do corpo, assiste-se à morte. Fonte de vida, o calor foi dividido pelo Criador de
duas maneiras: na primeira, foi inserido entre animais e plantas, possuidores do poder de
forma à matéria contida na semente feminina. Na segunda, o calor foi inserido no sol,
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alma e corpo. A alma está associada a um corpo, reside nele. A concepção de alma, para
Aristóteles, recebe subsídios da noção biológica das espécies fixas e contribui para o filósofo
justificar as hierarquias de suas idéias políticas. A escravidão era defendida pela idéia de que
cada ser ocupava um lugar definitivo, destinado pela natureza, o que fazia com que o
escravo fosse considerado como uma ferramenta animada. O corpo do escravo era
considerado forte para o trabalho servil e o corpo do senhor inútil para o trabalho físico, mas
possuidor de utilidade para a vida política e para as artes. Por essa compreensão aristotélica,
além dos seres humanos diferirem entre si pela forma de seus corpos, pois a beleza do
corpo pode ser vista, e a da alma não; o corpo era considerado inferior à alma, devendo ser
dominado por ela. Apesar de considerar que corpo e alma são inseparáveis, o corpo era visto
poderíamos pensar que o poeta utilizava a noção biológica das espécies fixas, propostas por
Aristóteles para justificar essas hierarquias e estabelecer um dualismo, pela distinção entre
corpo e espírito apresentada na décima sátira e até mesmo para legitimar a superioridade da
alma em relação ao corpo. Entretanto, reconhecemos que por sua preocupação com os
mas também suscita o entendimento de que corpo e espírito são indissociáveis e não são
relação entre a mistura dos humores com os quatro elementos fundamentais presentes
A teoria dos quatro elementos perdurou na Medicina Antiga através das seguintes
qualidades: o quente, o frio, o seco e o úmido. Cada um dos humores é constituído pela
no fleuma, o frio e o úmido; na bile amarela, o seco e o quente, na bile negra, o seco e o
frio. Apesar de cada indivíduo possuir suas singularidades, distinguíveis pelos humores
predominantes nas misturas de cada um, era possível classificar quatro principais
fleumático, o colérico e o melancólico, que variavam de acordo com a relação entre o ser
divino, o que o fez buscar elementos para superar essa idéia e para se diferenciar das
práticas realizadas pelos curandeiros através dos saberes e práticas médicas, conforme pode
Eis o que é a doença sagrada: ela não parece ter nada de mais divino nem de
mais sagrado do que as outras, mas a natureza e a origem são as mesmas
das outras doenças. Sem dúvida, é graças à inexperiência e à imaginação que
atribuímos a sua natureza, e a sua causa a algo divino; de fato, ela não se
parece em nada com as outras afecções. [...] Aqueles que primeiramente
santificaram essa doença foram, a meu ver, os que são atualmente os magos,
expiadores, os charlatães, os impostores, todo aquele que tem ares de
piedade e de sabedoria superior (Hipócrates, 2002, p.112).
Ao médico cabia facilitar com sua arte a obra da natureza, quando havia algum
desequilíbrio. A medicina era considerada uma tékhne, cuja intenção não era dominar a
natureza, mas utilizá-la em favor dos seres humanos. O conceito de técnica referia-se a toda
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atividade humana efetuada de acordo com certas regras que determinam a experiência,
afastando o acaso. A técnica não precisa ser necessariamente um objeto fabricado pelo ser
humano, mas também se refere a uma ação, como a obra do médico (Chauí, 2002b).
percebemos que Juvenal, ao propor que “cada um pode dar a si próprio uma vida tranqüila,
só tem um caminho, aquele que passa pela sabedoria. Oh Fortuna, você está sem poder, se
nós temos a sabedoria. Somos nós, tenha a certeza, que te fazemos deusa, nós que te
damos lugar no céu” (Juvenal, 2005, p.12), podemos considerar que estava se referindo aos
saberes e práticas médicos, pois os médicos tinham como desafio suplantar o acaso com os
seus conhecimentos. Como destaca Chauí (2002b), “Fortuna” era sinônimo de acaso,
acidentes, o que era casual, inesperado, adverso, contingente. Com suas técnicas, os
médicos antigos podiam buscar a cura por três processos distintos. Aguardar a natureza
seguir seu caminho, ajudá-la com o regime ou intervir no corpo do paciente para recuperar o
equilíbrio extraviado.
individual que mantinha relações com o cosmos. Essa natureza individual está relacionada à
próprio organismo era capaz de se restabelecer ao seu estado normal, o médico limitava-se
a perceber de que maneira poderia colaborar com esse processo. A natureza devia ser guia
para os médicos que, além de estudar a natureza humana, deveriam estudar as relações do
ser humano com as estações do ano, com a qualidade das águas, com as fases do sol, como
também com os costumes dos habitantes e suas experiências de vida (Hipócrates, 2002).
produzidas pelo movimento dos astros e sons musicais. Outro conceito fundamental era o de
medida. O conceito de medida advém dos filósofos pré-socráticos e não se reduz aos
moderação e atribuição de limites. Nem excesso, nem falta, relaciona-se ao que está entre
(Chauí, 2002b).
apresentada por Juvenal, referente aos amores de Sardanapalo, sendo também utilizada
relacionado ao que cada corpo é capaz de suportar. Nesse sentido, conhecer a medida de
cada corpo era fundamental para saber o que é adequado a cada pessoa.
percepção individual positiva ou negativa dos elementos do meio. “Entre o indivíduo e o que
o envolve, supõe-se toda uma trama de interferências que fazem que tal disposição, tal
acontecimento, tal mudança nas coisas irão induzir efeitos mórbidos no corpo; e que
inversamente, tal constituição frágil do corpo será favorecida ou desfavorecida por tal
consideradas, não de modo isolado, mas nas relações estabelecidas. Desse modo, para viver
nos usos dos prazeres, eram consideradas como produtoras de determinados efeitos para a
intensidade dos gestos que realizava ao comer, ao beber, ao praticar exercícios físicos ou
consonância com escolhas e variações estabelecidas pelos cuidados com o corpo. O regime
contribuía com a reação às diversas situações ocasionadas pelas circunstâncias de cada um,
instaurando um ajuste da vida e convidando àqueles que desejavam observar esses fatores,
contribuíam com os cuidados com o corpo em busca de saúde. O autor do “Regime” enfatiza
que essas regras diferem de acordo com as constituições individuais, com a idade, o lugar
consigo e com os outros. Um discurso formado por regras capazes de propiciar formas de
relação individual e coletiva. Um discurso que exacerbava a busca por uma verdade guiada
por uma estética da existência, ou seja, uma estética preocupada com a vida (Foucault,
2004).
colocava à disposição, uma série de auxílios, que poderiam ser utilizados em caso de
falavam com parresía aos enfermos, ou seja, diziam as verdades da natureza que poderiam
alterar o modo de ser do sujeito enfermo. Dirigiam-se aos enfermos, de modo que estes
pudessem constituir uma relação consigo mesmo, capaz de rejeitar a sujeição, que fosse
mestre e discípulo, diz respeito à atitude moral do mestre e a técnica necessária para
à parresía, pois na adulação existe uma relação de dependência do adulado pelo discurso do
regras. No entanto, difere da parresía por não ter a preocupação em saber como e quando
falar para que o discípulo receba o discurso verdadeiro na melhor ocasião. A retórica tem
não tinha a pretensão de estabelecer dependência com as regras relacionadas aos cuidados
do corpo em busca de saúde. Além de ser impossível ditar regras exatas, era necessário
não para estabelecer alguma mudança. Esse processo educativo, característico da relação
Corpo e educação
realismo. Platão (1990) defendia que o conhecimento ocorria pelo mundo das idéias, o
verdadeiro só é possível de ser alcançado pelo pensamento, pelo que é incorpóreo. O mundo
mundo das aparências para o mundo das idéias. A caverna refere-se ao mundo sensível e
reflete a prisão de quem está atrelado às sombras, ao mundo das aparências. A possibilidade
que o que estava acostumado a ver o tempo todo, não passava de ilusões (Platão, 1990).
sejam diferentes, não os considera como opostos, pois atribui uma continuidade entre um e
existe nas formas sensíveis. Mesmo contribuindo com a superação da ruptura entre o
do conhecimento, esse filósofo ainda atribui uma hierarquia ao pensamento, quando busca
superar a idéia de alguns filósofos pré-socráticos que reconhecem que “o processo de pensar
consiste numa função do corpo, à semelhança do sentir as coisas como tais” (Aristóteles,
2001, p. 96). Com o intuito de diferenciar o sentir do pensar, pois defendia a idéia de que
nem todos os animais são capazes de pensar, afirma a supremacia do intelecto, sua
38
Sano, não expressa hierarquias entre corpo e espírito, pois são partícipes de um único ser e
Uma das críticas de Juvenal dirigia-se à educação dos responsáveis por incitar e
comandar guerras, tanto em Roma como em outros países. Uma educação de quem não se
contenta com sua terra e almeja invadir e possuir territórios alheios. Nesse sentido, Juvenal
questiona:
Quantos livros você encontra ao mais famoso dos generais? Ei-lo aquele que
se sentiu no estreito na África batida, de um lado pelo oceano mouro e
tocando com o outro o clima morno do Nilo, estendida ainda mais longe, até
os povos da Etiópia, até a outra terra dos elefantes. Ele acrescenta a Espanha
ao seu império, passa os Pirineus, a natureza lhe opõe aos Alpes e seus picos
nevados: ele abre os rochedos, dissolve a montanha. Ele já ocupa a Itália,
mas seus olhares vão mais longe (Juvenal, 2005, p. 5).
percebemos que os imperadores romanos primavam por uma educação capaz de preparar
para as guerras através dos exercícios para o corpo. Tinham como intenção conquistar
literatura. Nesse período, os filósofos eram expulsos de Roma, pois atacavam a tirania dos
aristocrática, baseada nos valores de uma nobreza fundiária e guerreira. Nesse tipo de
luxúria, tendo em vista que o ócio era um valor positivo, pois não tinha preocupação com o
conjunto do que é necessário para sustentar a vida. Sua educação ocorria nos ginásios e
seus valores eram apresentados nos Jogos Olímpicos, nos torneios religiosos e nas guerras
(Chauí, 2002b).
preocupada com a formação política de cidadãos para exercer a democracia. Quando Juvenal
ressalta que, para se adquirir uma vida tranqüila, é preciso que cada um dê a si próprio o
que se pode dar pelo caminho da virtude, atribuímos essa idéia a uma educação que
percebemos que a tragédia de Sardanapalo pode ter sido usada com a intenção de mostrar a
tradicional.
Grimal (1984; 1981) e Rostovtzeff (1983), Roma, ao conquistar a Grécia recebeu diversas
ou pelo menos de respeito” (Grimal, 1984, p.70). Destacamos também, que existiram
romanos considerados arcaicos. Na Paidéia grega, o cuidado do corpo não excluía a oratória.
Grécia antiga. Além de aprender o alfabeto, de cantar os poemas líricos, também se tinha
como objetivo realizar exercícios físicos, tendo como ideal de educação a Paidéia (Cambi,
1999).
consciente e tinha como propósito a formação de um ser humano vivo, um ser humano
(Jaeger, 1994).
educação do corpo e da alma. A conexão entre educação musical e ginástica, que tinha
como objetivo o desenvolvimento harmônico do ser humano, pode ser percebida na cena em
que o jovem acaba de chegar de sua aula de música e ainda segura a lira, sendo saudado
pelo instrutor de ginástica, que lhe dá o estrígil, um implemento de metal usado para
hierarquizações.
práticas de exercícios físicos, também tinham a formação intelectual através dos exercícios
de literatura, como podemos perceber no estudo de Grimal (1981; 1984). Para o referido
autor, esse poeta gostaria que Roma se mantivesse no tempo de Trajano e de Adriano,
gosto pela luxúria e pela ostentação usada pelos aristocratas para uma minoria e para as
5
O ócio no período da Antiguidade greco-romana não estava relacionado a falta de exercícios físicos, como é
atualmente, mas sim à falta de participação nas decisões políticas, pois para os aristocratas, os deuses é que
tomavam essas decisões, como percebemos no livro de Chauí (2002b).
42
aristocratas. O trabalho não é mais visto como motivo de desonra, como era para os
aristocratas, que não queriam admitir a pobreza, sendo agora valorizado como possibilidade
Percebemos ainda, que a política do Pão e Circo denunciada por Juvenal em sua
sátira, não expressa a idéia de que os prazeres dos jogos, dos teatros, das atividades
circenses devessem ser suprimidos; mas chama a atenção para a idéia de que a diversão e a
colaborar para que o povo romano fosse perdendo aos poucos a sua sensibilidade, deixando
foram criados originariamente para comemorar as festividades dos deuses, mas se tornaram
costumes de um povo acostumado aos encontros públicos e aos prazeres das diversões, seja
nos teatros, nos circos ou nas termas (Friedlaender, 1947; Grimal, 1984).
A política do Pão e Circo foi instaurada por Augusto e reforçada por outros
imperadores, contribuindo com estratégias sutis de dominação. O dinheiro era gasto com
ostentosos espetáculos, no circo ou nos teatros e também com a distribuição de pão para os
Juvenal se dirige ao povo romano e destaca que “ele que antigamente dispôs do
comando, da argumentação, das legiões, enfim, de tudo, não tem mais ambições, não sente
nada mais do que um duplo desejo apaixonado: o do pão e o dos jogos” (Juvenal, 2005, p.
3). Juvenal chamava a atenção para a necessidade de uma educação que despertasse os
sentidos, que fosse capaz de refletir sobre as intenções e ações dos imperadores ao oferecer
esses atrativos, sobre a possibilidade de exigir seus direitos e exercer os deveres políticos,
em versos:
43
escolhiam seus representantes para combater a arbitrariedade dos magistrados patrícios. Até
287 a.C. várias reformas sociais e políticas eram votadas nas assembléias e favorecia os
plebeus. Com a denúncia da Política do Pão e Circo, os versos de Juvenal suscitam ainda, a
idéia de que o corpo humano está cercado por relações de poder, sendo capaz de provocar
mudanças no que é instituído. O corpo humano não está condenado a obedecer sempre às
que há uma preocupação com uma educação que valorize os indivíduos no processo de
busca pelo conhecimento sem se guiar como autômatos, seguindo regras exteriores de
modo passivo.
pois vivemos presos aos preconceitos que são estabelecidos. Com esse pensamento,
Sócrates tece críticas aos sofistas por exacerbarem a heteronomia aos seus alunos, na
medida em que os submetem às normas impostas através da retórica. Com vista a superar o
44
método utilizado pelos sofistas, Sócrates utiliza o diálogo, método que recebeu influência da
e participativo. Para Sócrates, conhecer a si mesmo significa reconhecer que “se nossa
razão, isto é, nossa alma tem o poder para encontrar em si mesma suas próprias regras e
normas de pensamento, terá o mesmo poder para nos dar as regras e normas de conduta e
Desse modo, quando Juvenal solicita um espírito são em um corpo são, podemos
contribuindo com a idéia de que a razão estabelecia limites e controles nas ações humanas,
no intuito de adquirir virtudes para se evitar injustiças. Esse poeta tinha a preocupação de
relacionar com os outros através de uma prática reflexiva da liberdade, pois para cultura
greco-romana, liberdade significava não ser escravo, nem de outra pessoa, nem de si
mesmo, dos seus desejos, estabelecendo a liberdade como ética (Castro, 2004).
a liberdade como ética, pode ser percebida quando o sujeito se relaciona com o seu mestre
e obtêm uma série de conhecimentos que poderá utilizar quando houver necessidade, de
modo a caracterizar uma soberania sobre si mesmo. A liberdade como ética suscita a idéia
45
de que existem diferentes condutas e reações que se constituem através do governo de si,
cenário em que emerge a máxima de Juvenal, suscita tanto o cuidado com as vivências
individuais, como o cuidado com os outros e exigia certa aprendizagem. Era necessário saber
detalhes das variações da relação da existência com o restante da natureza, para que fosse
possível adotar ou não, certos procedimentos. O contexto em que emerge a máxima “Mens
Sana in Corpore Sano” traz embutida a preocupação do poeta com uma educação que
contribua com a aquisição de uma vida que possa ser vivida com dignidade. Que não se guie
pelo excesso de cuidados com o corpo, nem tampouco pela falta. Uma educação que
entre elas, de modo a colaborar com o enfrentamento dos desafios individuais, mas sempre
atenta aos aspectos comunitários. Uma educação capaz de despertar os sentidos e provocar
contexto em que emerge a Máxima de Juvenal são reapropriados e reorganizados por teorias
científicas e pedagógicas nos séculos XIX e XX. Essas teorias científicas e pedagógicas,
reconhecida como uma prática social que desde o final do século XIX e início do XX intervém
No final do século XIX e início do XX, Fernando de Azevedo, intelectual que lutava
ideal educativo capaz de eliminar a fraqueza do povo brasileiro através de uma educação
physica scientifica, tendo como inspiração os ideais gregos. O referido autor levanta nesse
sana in corpore sano, que synthetiza o mais brilhante e estupendo ideal educativo?
em 1920, torna novamente a ressaltar a Máxima de Juvenal, quando diz que “nenhum povo
mais dos que os gregos se compenetrou daquela máxima – mens sana in corpore sano, a
unidade da perfeição do ser humano, a união da beleza física e da beleza moral, uma bela
intelectual expressar o desejo pela unidade entre corpo e mente, suas palavras suscitam o
dualismo, por se remeter ao contexto grego, porém com idéias da Medicina moderna. Sua
regeneração do povo brasileiro, era necessária uma mente sã, ditada dentro dos moldes da
como na moral antiga, segue um sistema global, definindo princípios gerais. As formas
categorias elaboradas no Cristianismo, que ao perderem seu teor religioso, incorporam novas
6
Azevedo (1920) destaca três itens que considera capaz de formar a base scientífica da Educação Física e a
reconhece como uma sciência biológica exata. São eles: a bio-mecânica, ou seja, a ação das influências
mecânicas sobre a estrutura dos seres vivos, a adaptação dos órgãos às suas funções e a transmissão hereditária
dos caracteres adquiridos.
47
faz uma revisão no livro escrito em 1920, percebemos transformações nos fundamentos
biológicos, quando acrescenta outra justificativa para não perder a credibilidade na Educação
Fernando de Azevedo contribuiu para que o papel da Educação Física não fosse
menosprezado, mesmo com a afirmação dos estudos de Mendel. Para o referido autor,
mesmo não sendo possível produzir o que a natureza não lhe proporcionou, é viável o seu
autor, o exercício físico corrige e modela a estrutura de cada ser humano, ativando também
de uma raça forte e saudável, através da idéia de responsabilizar os pais pela saúde dos
filhos. Primeiramente, tem como fundamento a transmissão dos caracteres adquiridos das
culpabilização ocorre somente pelo reforço à adoção de hábitos adequados aos padrões
regeneração da raça brasileira através da modelagem dos brasileiros, em uma raça perfeita.
se sutilmente através das relações estabelecidas no final do século XIX e início do XX.
Estado, exalta as políticas sobre a vida. A vida biológica é estatizada; o biopoder se instaura,
controlado para ser inserido no campo produtivo e econômico, servindo, desse modo, para o
direito de morte vai aos poucos perdendo espaço. A morte passa a ser considerada como o
há de mais secreto da existência, ao mesmo tempo, em que o poder sobre a vida instaura
da saúde deixa de estar vinculada ao que cada corpo é capaz de suportar e a tragédia de
biopolítico. Tudo o que é considerado fora da doutrina estabelecida pela sociedade industrial
de uma relação de dependência com saberes e práticas disciplinares. O controle dos corpos
do século XVIII através da sociedade disciplinar. Organizar o espaço, regular o tempo, vigiar
o indivíduo e controlar o seu comportamento são estratégias utilizadas para incluí-lo num
entre o normal e o patológico, observa que esta é verificada apenas pela sua variação
localizada em alguma parte do corpo, contribuindo para a idéia de que, se nada for
localizado, o ser humano apresenta-se saudável. Esse conceito de saúde, assentado a partir
de variações quantitativas, é reforçado pela busca de um tipo idealizado de saúde, pelo que
é considerado normal. Todavia, esse normal não é estipulado por variações individuais, mas
por uma ciência determinista que se submete a explicar os fenômenos, submetendo-os a leis
que os reduzem a uma medida comum e menosprezam seus dados qualitativos. Essa
ideologia é propagada na sociedade pelos médicos e tem como intuito instaurar na vida
medicina européia.
Numa sociedade em que a tarefa do médico tornava-se política e seu dever era
informações sobre os saberes médicos. Para atingir seus objetivos, então, a Medicina
50
abrangia ainda um conhecimento do ser humano saudável, um ser humano modelo, ausente
de doença. Com essa postura normativa, não é mais cabível aos médicos unicamente
aconselhar sobre a vida em equilíbrio. Estes passam a regular as relações físicas e morais
sociedades, inclusive no final do século XIX e início do século XX, no Brasil. A favor da
normalidade ideal, em prol do saneamento do corpo, de um físico atlético, de uma moral sã,
de uma inteligência culta e científica (Fróes, 1923). Nesse contexto, os conceitos de corpo,
saúde e educação são reorganizados através dos estudos científicos daquela época e
diversas práticas vão sendo mediadas por um discurso normalizador de acusação do sujeito
pela responsabilidade da sua saúde, bem como pela saúde dos seus filhos. Um discurso
formado por regras pautadas nos determinismos e que exacerbava a busca por uma
verdade, não mais orientada pela estética da existência da Antiguidade greco-romana, que
existencial em relação à natureza e aos seus próprios desejos. Esse discurso passava, então,
a exacerbar modelos educativos que eram ditados pelos médicos e iam se espalhando pela
7
A relação de heteronomia é discutida no livro de Silva (2001c), quando a autora relaciona as pesquisas
realizadas na Medicina do Esporte com a Educação Física, constituindo-se, desse modo, como um referencial
importante para a área.
51
de profissionais civis de EF, bem como da afirmação desta enquanto curso de formação de
Educação Física ser reconhecida como disciplina acadêmica ou ciência, sua permanência ou
olhar pedagógico, para um objeto que tinha como guia a melhoria da performance ou do
Educação Física, intitulada de Colégio Brasileiro de Ciências do Esporte (CBCE) no final dos
Corpore Sano a partir dos discursos de corpo, saúde e educação na Revista Brasileira de
Ciências do Esporte.
52
53
Compreensões de ciência
meados da década de 1980, possui uma ascendência marcante da área médica e, além do
CBCE ser presidido por médicos até esse referido período, também é influenciado pelas
políticas da saúde e do lazer gestadas na década de 70, dentre as quais Soares (2003)
destaca as campanhas do ‘Esporte Para Todos” e “Mexa-se”, bem como o Plano Nacional de
Educação Física que compreendia o desporto como solução dos problemas nacionais.
pesquisa, ocorrida nos anos de 1970, pelo Ministério da Educação e dos Desportos nas
americano Keneth Cooper para preparar os oficiais da Força Aérea americana. Essa
seleção brasileira de futebol, que afirmava ser mérito desse método o excelente preparo
aptidão física, reafirmando, dessa maneira, alguns episódios da política nacional, iniciados
naquela época9.
8
Anzai (2000).
9
Carvalho (1992).
54
estão ligados aos laboratórios de fisiologia10, recebendo destaque em 1980 da RBCE, na sua
primeira publicação que contém artigos11. Três dos cinco artigos existentes referem-se à
Ciências do Esporte (Conbrace), coordenada pelo Dr. Maurício Leal Rocha, também médico e
Janeiro (Labofise). Esse laboratório tinha sua sede na Escola de Educação Física e Desportos
da referida Instituição, mas mantinha suas portas fechadas para os alunos do curso de
Nesse contexto, é notável a relação existente entre o CBCE e o esporte de alto rendimento,
como pode ser visualizado nos editoriais da época. O responsável por um dos editoriais13,
declara que tem “andado com um pouco de astenia física e mental. Penso muito em novas
aventuras. Nem sei quantas vezes fui aos aeroportos despedir e receber meu pessoal que
10
Laboratório de Performance da UGF, Laboratório de Aptidão Física de São Caetano do Sul, Laboratório de
Fisiologia do Exercício da UFRJ, Laboratório de Pesquisa do Exercício da Escola Superior de EF da UFRGS,
Laboratório de Hemodinâmica do Instituto de Biofísica, Laboratório de Fisiologia do Esforço da Universidade
Estadual de Londrina da UFSM, Laboratório de Investigação em Exercício de Volta Redonda, Centro de Medicina
de Brasília da UNB, Laboratório de Fisiologia do Exercício da Escola de EF da UFMG. Além desses laboratórios, as
seguintes instituições estão representadas: UFV, USP, UFSC, Unicamp e Unesp. Do total de 47 artigos desse
período, 68,08% eram da região Sudeste, 25,53% da Sul e 6,39% da Centro-Oeste. Somente 8 artigos citam
instituições que possivelmente apoiaram as pesquisas, dentre as quais: a Secretaria de EF e Desportos do MEC,
CAPES, SEME de SP e o Centro Olímpico de Treinamento.
11
A publicação da RBCE de 1979 contém somente resumos. Portanto, nossa análise iniciou em 1980, e estamos
nesse primeiro momento nos reportando até o ano de 1985.
12
Referimo-nos ao período de 1984 a 1988, época em que cursei a graduação nessa instituição.
13
Editorial de 1980, v.2, n.1
55
em grande número, estava convocado para seleções nacionais e para os Jogos Olímpicos de
Moscou”.
Encontros com dirigentes esportivos, idas aos aeroportos para se despedir das
de corpo, saúde e educação, nesse novo cenário epistemológico, inserem-se num contexto
interpretação dos fatos. O ideal de cientificidade é norteado pelo critério de validade de suas
afirmações e, através das experiências, procura superar a tradição racionalista que tem
sujeito que conhece como se houvesse um espírito puro separado das coisas, na tradição
coisas como puros objetos, sem nenhum atributo humano” (Merleau-Ponty, 2004, p. 27).
14
Editorial de 1980, v.2, n.1. e Editorial de 1981, v.2, n.2.
56
essa comunidade científica voltava suas atenções, prioritariamente, a uma elite da população
brasileira, dirigindo suas pesquisas para dar respaldo a uma minoria, mesmo emergindo uma
ensino superior. Outro desejo latente dos pesquisadores era a busca por padrões nacionais
15
Editorial de 1981, v.2, n.3.
57
urina e de ácido úrico, pesagem hidrostática, dentre outros. Procedimentos analisados por
tratamento estatístico, sem aprofundamento das discussões, como reforça Carvalho (1995) e
ótica científica, insere-se num contexto regido pela racionalidade técnica, priorizando o rigor
da quantificação e das medições como no final do século XIX e início do XX. No entanto,
outros instrumentos passaram a ser empregados para a aferição, bem como outros padrões
em vez de utilizar a linguagem cotidiana para elaborar a razão, como fazia a ciência
científico é organizado com base no racionalismo. Esse projeto de uma ciência da ordem foi
alcançar a certeza perfeita e erguer juízos perfeitos. Nesse sentido, o saber mantém relação
16
Ribeiro (1980), Bonjardim e De Rose Jr. (1980), Matsudo (1980), Araújo (1981b) e Moura (1984).
58
no rigor da medição e quantificação do ser humano corrobora com a idéia de que a natureza
transformar o ser humano em dono e senhor da natureza tem sido abarcada por muitos
pensadores, tendo sua origem no pensamento das Luzes, como também “na origem do
desenvolvimento da ciência e da técnica nos séculos XIX e XX” (Châtelet, 1993, p. 69).
natureza a partir da inter-relação das coisas do mundo, de cuja totalidade o ser humano
fazia parte, deixa de vigorar. Na concepção mecanicista de natureza, além do ser humano
não se conceber como natureza, mantém a idéia de que é superior e de que precisa dominá-
la. Tudo o que é considerado natural mantém relações com a animalidade e se encontra em
ser humano perante os outros seres vivos, por ser considerado dono e senhor da natureza,
produtor de cultura e desejar se afastar da sua animalidade, tida como sinal de inferioridade
fundamentos das ciências naturais, é concebida como verdadeira e imutável. Nessa acepção,
a natureza não é viva, mas matéria inanimada, criada e controlada por Deus, através de leis
responsáveis por moldar o corpo humano, para que este fosse reconhecido (Merleau-Ponty,
2000).
rigor da medição e quantificação do ser humano e que relacionamos aos cuidados com o
Podemos dizer que esses conceitos são reorganizados nos artigos investigados
por meio de uma visão hegemônica, orientada pelo poder político dos militares, contribuindo
esporte e da Educação Física no século XX, como possibilidade de aglutinação social num
período de ditadura. Sob uma concepção de ciência pautada nos moldes positivista e
determinista, que preconiza a dominação da natureza e dos outros seres humanos, tendo
como meta a busca pela melhor performance esportiva. Num contexto epistemológico em
60
que promover saúde, impor ordem e disciplina através da boa forma, conquistar medalhas
e educação que relacionamos com os cuidados com o corpo em busca da boa forma. Esses
Sociais17.
da saúde nas escolas, corroborando com a idéia da aptidão física18. Nesse cenário
de Massa Corporal (IMC) emerge nos artigos da RBCE para determinar a gordura corporal19.
A re-significação dos cuidados com o corpo em busca da boa forma ocorre, então, sob uma
17
Soares (1986); Oliveira (1986); Carmo (1988); Gonçalves (1989); Gonçalves e Ferrari (1990); Santin (1990);
Carvalho (1992); Gonçalves et al (1992); Rigo (1995); Gonçalves et al (1995); Gonçalves (1996); Silva (1996);
Matiello Júnior e Gonçalves (1997); Silva (1997); Della Fonte e Loureiro (1997); Pires et al (1998); Silva (1999a);
Sant`Anna (1999); Rago (1999); Vaz (1999); Lovisolo (1999); Barreto (1999); Nóbrega e Moreira (1999); Gomes
da Silva (1999); Silva (1999b); Moreno (1999); Medeiros (1999); Hasse (1999); Paiva (1999); Ramos et al
(1999); Monteiro et al (1999a; 1999b); Ortiz et al (1999); Quint e Matiello (1999); Schneider (1999); Rodrigues
(2000); Anzai (2000); Romero (2000); Carvalho (2001); Palma (2001); Ferreira (2001); Melo (2001); Silva
(2001d); Faria Junior (2002); Vieira e Sousa (2002); Mendes (2002); Vaz (2003); Nogueira e Palma (2003); Góis
Júnior e Lovisolo (2003).
18
Anjos (1990), Dinoá e Assis (1990), Petroski e Silva (1992), Denadai (1994), Francalacci e Nahas (1995),
Gonçalves e Samulski (1997); Silami-Garcia e Rodrigues (1998); Borin et al (1999), Schmidt e Bankoff (1999),
Olivoto (1999), Silva e Petroski (1999), Martins e Jesus (1999), Camargo Júnior e Grocks (1999), Silva et al
(1999a), Pitanga (1999), Marchand (1999), Souza et al (1999), Silva et al (1999b), Rezende et al (1999), Silva
(1999c), Silva e Kalinine (1999), Guidarini et al (1999), Krug et al (1999), Vale Filho (1999), Nunes et al (2000),
Biesek et al (2000), Kalinine; Giacomini e Augusti (2000), Bara Filho et al (2000), Paulo e Forjaz (2001), Godoi e
Barela (2002), Duarte et al (2002), Amorim et al (2002), Silva et al (2002), Raso et al (2002), Bankoff e Moutinho
(2002), Guedes e Grondin (2002), Almeida et al (2002), César et al (2002), Eleno et al (2002), Leite e Nunes
(2002), Pellegrinotti et al (2002).
19
Dinoá e Assis (1990); Petroski (1990); Olivoto (1999); Silva e Petroski (1999); Silva et al (1999a); Pitanga
(1999); Silva (1999c); Bara Filho (2000); Biesek et al (2000); Guedes e Grondin (2002); Bankoff e Moutinho
(2002); Leite e Nunes (2002).
61
modelo atlético, mas a partir do peso corporal ideal e do estilo de vida ativa, dentro dos
American Alliance for Health Physical Education, Recreation and Dance e da National
busca pelo corpo magro e pelo aumento da capacidade aeróbica é alvo a ser alcançado,
como podemos observar nos artigos analisados20. A relação entre o alto teor de gordura e os
20
Anjos (1990); Denadai (1994); Petroski e Silva (1992); Francalacci e Nahas (1995); Gonçalves e Salmuski
(1997); Silami-Garcia e Rodrigues (1998); Guidarini et al (1999); Krug et al (1999); Vale Filho (1999); Silva e
Petroski (1999); Camargo Júnior e Grocks (1999); Schmidt e Bankoff, 1999); Olivoto (1999); Marchand (1999);
Rezende et al (1999); Pitanga (1999); Silva et al (1999a); Silva (1999c); Borin et al (1999); Vale Filho (1999);
Martins e Jesus (1999); Nunes et al (2000); Pulo e Forjaz (2001); Duarte et al (2002); Amorim et al (2002);
Guedes e Grondim (2002); Almeida et al (2002); Leite e Nunes (2002); Raso et al (2002); Bankoff e Moutinho,
2002).
21
Silva e Petroski (1999, p. 803).
62
boa forma vai sendo sutilmente incutida na sociedade através do estilo de vida ativa. Como
saúde, e educação que consideramos estarem relacionados com os cuidados com o corpo
em busca da boa forma e do estilo de vida ativa aparecem nas produções analisadas em
22
No final do século XIX e início do XX o índice de robustez de um indivíduo era referência para os médicos
brasileiros e era adquirido através de um método estabelecido por um médico militar francês, o Dr. Pignet,
servindo para determinar o valor físico da pessoa. Esse índice era calculado pela fórmula E-(P+P), ou seja, era
necessário subtrair dos centímetros da estatura de uma pessoa, o resultado dado pela soma do peso com os
centímetros do perímetro torácico (Kehl, 1920).
23
Anjos (1990); Dinoá e Assis (1990); Denadai (1994); Francalacci e Nahas (1995); Gonçalves e Samulski
(1997); Silami-Garcia e Rodrigues (1998); Martins e Jesus (1999); Borin et al (1999); Silva e Petroski (1999);
Guidarini et al (1999); Krug et al (1999); Vale Filho (1999); Olivoto (1999); Silva et al (1999a); Pitanga (1999);
Marchand (1999); Silva et al (1999b); Souza et al (1999); Silva (1999c); Silva e Kalinine (1999); Schmidt e
Bankoff (1999); Camargo Júnior e Grocks (1999); Rezende et al (1999); Nunes et al (2000); Bara Filho et al
(2000); Biezek et al (2000); Kalinine et al (2000); Paulo e Forjaz (2001); Pellegrinotti et al (2002); Leite e Nunes
(2002); César et al (2002); Eleno et al (2002); Godoi e Barella (2002); Bankoff e Moutinho (2002); Raso et al
(2002); Amorim et al (2002); Silva et al (2002); Almeida et al (2002); César et al (2002).
24
Soares (1986); Oliveira (1986); Carmo (1988); Gonçalves (1989); Gonçalves e Ferrari (1990); Santin (1990);
Carvalho (1992); Gonçalves et al (1992); Rigo (1995); Gonçalves et al (1995); Gonçalves (1996); Silva (1996);
Matiello Júnior e Gonçalves (1997); Silva (1997); Della Fonte e Loureiro (1997); Pires et al (1998); Silva (1999a);
Sant`Anna (1999); Rago (1999); Vaz (1999); Lovisolo (1999); Barreto (1999); Nóbrega e Moreira (1999); Gomes
da Silva (1999); Silva (1999b); Moreno (1999); Medeiros (1999); Hasse (1999); Paiva (1999); Ramos et al
(1999); Monteiro et al (1999ª; 1999b); Ortiz et al (1999); Quint e Matiello (1999); Schneider (1999); Rodrigues
(2000); Anzai (2000); Romero (2000); Carvalho (2001); Palma (2001); Ferreira (2001); Melo (2001); Silva
(2001); Faria Junior (2002); Vieira e Sousa (2002); Mendes (2002); Vaz (2003); Nogueira e Palma (2003); Góis
Júnior e Lovisolo (2003).
.
63
desse período, principia um processo de mudanças radicais no próprio CBCE, cuja direção
dos dados reduzida à análise das dimensões anátomo-fisiológica do corpo humano em sua
versão positivista e à ausência nos debates sobre as definições das políticas nacionais de
baixo salário mínimo e a exploração desenfreada dos recursos naturais. Paisagens que
a partir de olhares que não os estigmatizam. Manifestos que contribuem com a recusa em
esporte como direito social e a preocupação de seus pesquisadores passa a ser a legitimação
Metamorfoses que não ocorrem sem dificuldades, sejam elas financeiras, operacionais,
25
A partir de 1986, a presidência do CBCE passa a ser composta por professores(as) de Educação Física. No
biênio de 1985-1987, o presidente foi Laércio Pereira. De 1987 a 1991 a presidente foi Celli Taffarel. De 1991 a
1995, o presidente foi Valter Bracht. De 1995 a 1999, o presidente foi Elenor Kunz. De 1999 a 2002, o presidente
foi Lino Castellani. De 2002 a 2003, período final dessa investigação, a presidente do CBCE foi Ana Márcia Silva,
que permaneceu no cargo até 2005.
26
Editoriais de 1986, v. 7, n.2; 1987, v. 9, n.1; 1988, v. 9, n. 2; 1988, v. 9, n.3; 1989, v. 10, n. 2; 1989, v. 10, n.
1; 1989, v. 10, n. 2; 1987, v. 9, n.1; 1997, v. 18, n. 2; 1988, v. 9, n.3; 2002, v. 23, n. 3.
27
Editoriais de 1986, v.7, n.2; 1986, v.7, n.3; 1986, v.8, n.1; 1987, v.9, n.1; 1988, v.9, n.2; 1988, v.9, n.3; 1988,
v.10, n.1; 1989, v.10, n.2; 1989, v.10, n.3; 1990, v.11, n.2; 1991, v.13, n.1; 1993, v.15, n.1; 1994, v.15, n.2;
1995, v.16, n.2; 1996, v.17, n.3; 1999, v.21, n.1; 1996, v.18, n.1; 1997, v.18, n.2; 2000, v.21, n.2 e 3; 2000,
v.22, n.1; 2001, v.22, n.3; 2001, v.23, n.1; 2002, v.23, n.3; 2003, v.24, n.2; 2003, v.24, n.3.
64
qualificada, como destacam Paiva, Goellner e Melo (1998). Durante esse percurso, as
dessa comunidade científica contribuem para que o CBCE se preocupe com a aquisição de
novas leituras perante a relação entre atividade física e saúde29, tema a partir do qual a
como um desafio a ser perseguido por seus pesquisadores desde então. No ano em que o
CBCE comemorou seus 25 anos de existência, Amarílio Ferreira Neto, editor da RBCE (1999-
Nascido de uma forte motivação por um espaço que possibilitasse luz própria
ao anseio de se pensar e discutir as Ciências do Esporte, arriscou, a partir da
década de 80 trilhar por caminhos possíveis no horizonte de uma sociedade
que se libertava do jugo de governo militares. A sintonia com a
redemocratização do país traduziu, em seu interior, a busca de um fazer
científico comprometido socialmente, permitindo-lhe dessa forma firmar-se
como instância organizativa da comunidade da área acadêmica
convencionalmente denominada educação física e um de seus mais legítimos
interlocutores junto às demais áreas e instâncias institucionais (RBCE, v. 24,
n.2, 2003).
28
Editorial de 1989, v. 11, n.1; Editorial de 1987, v. 8, n. 2 e 3.
29
Editorial de 2001, v. 22, n. 2.
65
ainda, nesse contexto de discussões, que o ideal de cientificidade que sustenta os conceitos
com o reforço aos medos que são exacerbados pela ciência e tecnologia. Uma ciência
ambientais e por ter se mostrado incapaz de colaborar com a sua superação. Outras
reflexões também são apresentadas quando é dito que, ao mesmo tempo em que ocorrem
avanços na ciência que poderiam estar sendo desfrutados por todos, a maioria das pessoas
órgãos, a fauna e a flora. Discursos que denunciam a destruição das riquezas minerais, como
30
Silva (1997); Silva (1999a).
31
Silva (2001d).
32
Vaz (1999).
33
Barreto (1999); Vaz (2003).
66
questionada, por contribuir com a idéia de que o ser humano é superior e está separado do
mundo em que vive. Outro argumento levantado é o da fragmentação dos saberes, que
Uma ciência que se prende na apreensão dos dados, no seu cálculo e classificação,
posições fixas, quase o tempo todo intolerante, também são questionadas, por fazer parte
desse ideal de cientificidade e por desconsiderar a alteridade. Um ideal que opera ora com o
são inconciliáveis.
dar cabo da ciência, para não haver o reforço a qualquer tipo de obscurantismo36. Nesse
laboratório através de uma experiência para a vida em sociedade, considerada como sendo
de difícil controle37.
34
Silva (1997); Nóbrega e Moreira (1999); Palma (2001); Mendes (2002).
35
Silva (1999a); Silva (1999b); Nóbrega e Moreira (1999); Vaz (1999); Mendes (2002); Vaz (2003).
36
Silva (1999a); Silva (1999b); Nóbrega e Moreira (1999); Vaz (1999); Mendes (2002); Vaz (2003).
37
Vaz (1999); Vaz (2003).
38
Nóbrega e Moreira (1999); Mendes (2002).
67
passivo, por deixarem em segundo plano as interações do doente com o meio ambiente e
coletiva40. Nesse contexto, as leis biológicas continuam sendo quantificadas em uma média,
para a determinação do que é considerado normal e tudo o que se afasta desse padrão
permanece sendo visto como anormal41. Diante de tais questionamentos, até mesmo o
exclusão42.
década de 80. No trecho a seguir é possível constatar o que a comunidade científica tem
interrogado:
39
Silva (1999b)
40
Silva (1999b); Palma (2001)
41
Góis Júnior e Lovisolo (2003)
42
Palma (2001)
68
que consideramos estarem relacionados aos cuidados com o corpo em busca da boa forma,
relação entre saúde e atividade física; relação entre Educação Física Escolar e aptidão física;
relação entre Educação Física Escolar e saúde; relação entre educação; pedagogia e higiene;
higienistas.
tratamento quantitativo dos dados e passam a abarcar reflexões filosóficas; ensaios teóricos;
Pesquisas que abrem espaço para os aspectos culturais, sociais e históricos do ser humano e
69
Humanas.
Para Foucault (2002), essa constituição ocorre no século XIX a partir do que
denomina de “triedro dos saberes”, ou seja, a partir das ciências físicas e matemáticas, das
reflexão filosófica. Apesar de não estarem incluídas por esse triedro epistemológico, as
Ciências Humanas encontram o seu lugar no interstício desses saberes, nas fronteiras das
psicológica, a sociológica e a região das leis e formas de linguagem, definidas pela relação
historicidade.
43
Termo utilizado por Foucault (2002).
70
finitude que possibilitou ao homem constituir-se como objeto de saber, na medida em que o
ser humano vive, fala e produz. O campo epistemológico das Ciências Humanas é plural e
sombra.
Com relação à Educação Física, percebemos pelos artigos analisados, que a des-
matematização não ocorreu somente com as pesquisas que abarcam os aspectos culturais,
sociais e históricos do ser humano, mas também através dos artigos voltados para a
atividade física e dieta; benefícios da atividade física; relação entre aptidão física e fatores de
risco para a doença; suplementação alimentar; relação entre o estilo de vida, capacidade
com a idéia de que a Educação Física, a partir de meados da década de 80 do século XX,
que vigorava até o referido período e insere-se numa compreensão de ciência que busca
ciências biomédicas, mas abarcando também as análises no campo das ciências humanas.
71
Compreensões de corpo
predominante até meados da década de 80, contribui com a compreensão de que o corpo é
uma máquina energética, como no final do século XIX e início do XX, entretanto essa visão
dirige-se ao corpo de quem é atleta, apesar de alguns artigos estarem dirigidos a escolares,
atletas são os modelos para os outros corpos. Diferentemente do final do século XIX e início
portanto, de confiar nas forças da natureza. No século XIX, o modelo de máquina que
estavam todos submetidos às mesmas leis do movimento. Até o século XVIII, não existia
uma fronteira definida entre os seres e as coisas. As forças físicas, e não as forças mágicas,
44
(De Rose; De Rose, 1980), (Matsudo, 1980), (Guedes, 1980, 1982, 1984), (Soares; Matsudo, 1982), (Duarte,
1984) (Duarte; Matsudo, 1981), (Baldissera, 1982), (Guimarães; Crescente, 1984), (Guedes; Sampedro, 1985),
(Araújo et al, 1980), (Araújo, 1981a), (Ribeiro, 1982), (Araújo, 1981b).
45
Cabe ressaltar que no século XIX os estudos biológicos foram inspiração para a explicação sociológica
denominada de organicismo. Um referencial importante da Educação Física que trata desse período é o livro de
Soares (2001) e demonstra que no organicismo as analogias biológicas são utilizadas para se comparar a
sociedade ao organismo, evoluindo do inferior ao superior, do simples ao complexo e contribuindo com a idéia de
que a sociedade era regida por leis naturais.
72
preconiza uma animação própria dos organismos, considerada como uma força vital que os
que era invisível e o determinismo passou a reger a relação entre organismo e ambiente.
Como destaca Canguilhem (1977), a máquina animal ou é regulada pelo interior, como
propagava a fisiologia clássica de Claude Bernard, ou era regulada pelo exterior, seguindo
um modelo padrão a partir da ordem, como defendia Augusto Comte. O meio não se refere
somente ao fluido, ar ou água, em que o organismo está imerso e a partir de Augusto Comte
torna-se também calor, pressão, eletricidade, luz, umidade, teor de oxigênio, de gás
carbônico, dentre outros. O meio passou a ser tudo o que está em contato com a parte
externa do ser vivo e que exerce algum efeito sobre ele e como cada um desses fatores
1983).
existe um meio interno e de que o corpo possui condições próprias para se regular, de que
traz consigo sua própria defesa, o que prevalece na Biologia é a idéia de que o corpo
46 46
Cabe ressaltar que no século XIX surgiu o organicismo, explicação sociológica que utiliza analogias biológicas
e compara a sociedade ao organismo. O organicismo é discutido no livro de Soares (2001), quando a autora
ressalta que por essa compreensão, a sociedade evolui do inferior ao superior, do simples ao complexo e é regida
por leis naturais, constituindo-se um referencial importante para a Educação Física que trata desse período.
47
O conceito biológico de “meio” não existia no século XVIII (Foucault, 2002).
73
células revelam o interior do corpo humano vivo. Um corpo que não era possível de ser visto
a olho nu. Ao priorizarem o detalhe, o ser humano deixou de ser estudado através do corpo
vivo presente na natureza e passou a ser investigado nos laboratórios (Canguilhem, 1977).
células, mas houve de uma maneira geral, uma interpretação reducionista da vida, e a
conhecimento sobre a Educação Física justifica o aumento do rendimento, uma vez que o
treinamento. Como destaca Canguilhem (2004), essa representação emergiu desde o final
do século XIX, pois o que vigorava desde a tradição hipocrática até a fisiologia de meados do
qualidades dos seres vivos passam a se basear nos genes e nas proteínas. Para a genética, a
espécie. Para a bioquímica, essa atividade espalha-se na densidade de cada célula (Jacob,
1983).
e suas características específicas nessas análises, o todo é explicado apenas por essas
partes. Visão que refuta a idéia de totalidade e se faz presente nesse cenário epistemológico
74
pautado no mecanicismo, não somente em relação aos estudos biológicos, mas também em
Juvenal: Mens Sana in Corpore Sano continua incorporando uma visão dicotômica, como no
que a produção do conhecimento, nos artigos analisados, concebe o corpo humano de forma
clássicas, mesmo que, em meados do século XX, Schrödinger (1997) tenha apontado que os
postulados da física clássica não eram mais suficientes para o estudo dos seres vivos devido
interior ou pelo exterior, o corpo humano permanece com sua capacidade criativa ignorada e
observar na produção analisada e o método de Pignet que prevalecia no final do século XIX
somatotipo de cada pessoa, ou então, por outros métodos que determinam a gordura
corporal50.
regularidade nos contornos, sem exacerbar relevo muscular. Ser mesomorfo é sinal de
hipertrofia muscular, e ser ectomorfo diz respeito ao corpo magro, longilíneo, frágil e
delicado. Classificações que servem para designar quem está mais suscetível às doenças ou,
então, para estabelecer a relação do tipo atlético que faz mais sucesso em cada esporte. Já
As células gordurosas não produzem ATP para ser usado pelos músculos;
sua finalidade primária consiste em armazenar lipídios. Conseqüentemente,
o maior percentual de gordura é deletério (em termos de desempenho), e
por duas razões: (1) as células não contribuem para a produção de energia
e (2) gasta-se energia para deslocar a gordura (Fox, 1983, p. 376).
48
A adrenalina, a noradrenalina, a dopamina e a endorfina compõem o grupo bioquímico das catecolaminas.
Como destaca Araújo (1982), Cannon, na década de 30, descreveu os efeitos sistêmicos desses hormônios.
49
(Hegg et al, 1982), (Petroski et al, 1982), (Guedes, 1982), (Duarte e Petroski, 1983), (Soares et al, 1984).
50
(Ribeiro, 1980), (Sessa et al, 1980), (Matsudo, 1980), (Guedes, 1980; 1984; 1985), (Soares et al, 1984),
(Duarte, 1984).
51
(Hegg et al, 1982), (Petroski et al, 1982), (Guedes, 1982), (Duarte e Petroski, 1983), (Soares et al, 1984).
Como destaca Guedes (1982), o estudo do somatotipo surgiu nos anos 40 com Sheldon, através de métodos
fotográficos. Em 1967, Heath e Carter criam uma nova metodologia baseada em medidas antropométricas.
76
romana, advindo dos filósofos pré-socráticos, não é mais abarcado na sua completude,
relacionado ao que cada corpo é capaz de suportar, o que era adequado a cada pessoa, sem
se reduzir aos aspectos quantitativos, mas abrangendo o significado dos limites do próprio
corpo. O conceito de medida, nas publicações analisadas, não é mais guiado pelas
individualidades, mas sim por padrões de referências de outras culturas como no século XIX
são vistos prioritariamente pelos dados quantitativos e classificados a partir de uma média
suscita ainda um valor que lhe é atribuído, bem como um antivalor para se opor a este e se
treinados ou não, mais velozes, mais capazes de arremessar, menos pesados, mais altos,
52
No final do século XIX e início do XX, o índice de robustez de um indivíduo tinha como padrão de referência a
cultura européia. O Dr. Pignet, ao elaborar um método para determinar o valor físico da pessoa, se baseou no
exército francês (Kehl, 1920).
53
Somente o artigo de Hegg et al (1982) faz crítica à idéia de considerar as diferenças anatômicas e fisiológicas
vistas com hierarquias.
77
realizados no Brasil, nesse período, são comparados com os realizados em outros países e,
geral, servem para designar quem é superior nos atributos investigados, em relação aos
do país é que são enfatizadas, locais onde estão instalados os Laboratórios de pesquisa.
esforço.
instrumento para a mente, a visão biologicista de corpo que o considera apenas a partir dos
somente como objeto, que precisa ser moldado, adestrado, para ser produtivo e eficiente ao
corpo pela ciência e tecnologia é expressa na intenção de projetar o corpo perfeito para uma
54
Guimarães (1980); Perez (1980); De Rose e De Rose (1980); Sessa et al (1980); Matsudo (1980); Araújo et al
(1980); Guedes (1980); Ferreira et al (1981); Osse et al (1981); Gomes et al (1981); Cisneros et al (1981);
Duarte e Matsudo (1981); Fontana e Reis (1982); Petroski et al (1982); Guedes (1982); Baldissera (1982);
Matsudo (1982); Soares e Matsudo (1982); Osse et al (1982); Petroski e Duarte (1983); Fontana (1983); Guedes
(1984); Lor et al (1984); Guimarães e Crescente (1984); Duarte (1984); Guedes e Sampedro (1985).
55
Soares (1986); Oliveira (1986); Santin (1990); Silva (1997); Della Fonte e Loureiro (1997); Silva (1999a),
Sant`Anna (1999), Vaz (1999), Barreto (1999), Nóbrega e Moreira (1999); Gomes da Silva (1999); Quint e
Matiello (1999); Medeiros (1999); Romero (2000), Mendes (2002).
78
de seres vivos. Intenções que são divulgadas e reconhecidas como merecedoras de reflexão.
relação entre corpo, ciência e tecnologia e suas implicações para a Educação Física.
Entretanto, pensar que a adição de produtos ao corpo traz necessariamente a sua reificação
e alienação, corrobora com a visão do corpo somente como objeto, sem levar em
consideração o que significa para cada ser humano algum instrumento que passa a
objetos que passam a fazer parte do nosso corpo. Quando nos habituamos a um objeto, este
se torna incluído no nosso corpo e como é dotado de sentido, nos faz perceber o mundo a
56
Nóbrega e Moreira (1999); Medeiros (1999), Quint e Matiello (1999); Silva (1999a); Vaz (1999), Mendes
(2002).
79
compreensão do corpo como uma máquina que possui princípios mecânicos específicos,
idéia de essência e por não possuir qualquer tipo de reflexão ética. Um corpo universal,
naturalizado, que não pensa, não sente, não experimenta emoções, desejos, que não possui
reducionista de corpo58.
questionada, pois não se vendem somente produtos, mas também um corpo esteticamente
perfeito.
57
Soares (1986); Oliveira (1986); Santin (1990); Silva (1996; 1997); Della Fonte e Loureiro (1997); Silva
(1999a); Vaz (1999); Barreto (1999); Nóbrega e Moreira (1999); Gomes da Silva (1999); Medeiros (1999); Quint
e Matiello (1999); Romero (2000); Mendes (2002).
58
Nóbrega e Moreira (1999); Gomes da Silva (1999); Silva (1999b); Mendes (2002).
59
Silva (1996); Silva (1997); Sant`Anna (1999); Barreto (1999); Quint e Matiello (1999); Schneider (1999); Anzai
(2000); Palma (2001).
80
pelos sujeitos nas suas ações e pela possibilidade de recusa ao que é imposto como ideal a
ser seguido60.
refutação e são problematizados pela revelação de que o clitóris, mesmo tendo sido
descoberto desde 1559, foi omitido física e através dos discursos, propositalmente, para
encobrir os desejos sexuais das mulheres. Porém, mesmo entrando em cena a partir da
década de 70 do século XX, seu aparecimento para além dos aspectos fisiológicos só ocorre
sexualidade, pois “avisaram que por natureza, as mulheres haviam sido destinadas às tarefas
saudável, heterossexual e de classe média, responsável por gerar e criar filhos fortes e
próprios desejos, de perder os limites do corpo e de acreditar que suas fantasias são
60
Sant`Anna (1999); Moreno (1999); Nogueira e Palma (2003).
61
Rago (1999).
62
Rago (1999, p. 64)
81
inadequadas. Enfim, de vivenciar com plenitude experiências sexuais que podem ser muito
falta de trabalhos que falam sobre afeto e respeito entre as pessoas que estão satisfeitas
com seus corpos e se sentem felizes63. Desse modo, observamos que, de acordo com os
afetividade.
interação social64.
que contribui com a mundialização cultural alicerçada por um padrão de normalidade através
analisados para superar o dualismo corpo e mente, a redução do corpo aos seus aspectos
63
Anzai (2000).
64
Carmo (1988); Barreto (1999).
65
Silva (1997); Mendes (2002).
66
Silva (2001d).
67
Santin (1990); Barreto (1999); Nóbrega e Moreira (1999); Gomes da Silva (1999); Quint e Matiello (1999);
Ortiz et al (1999); Romero (2000); Mendes (2002).
68
Santin (1990); Silva (1997); Nóbrega e Moreira (1999).
69
Nóbrega e Moreira (1999).
82
Percebemos ainda, que nos artigos analisados70 há uma ênfase nos referenciais
inclusão das pesquisas realizadas com abordagens das Ciências Humanas, a partir de
meados da década de 80, também são demonstradas por Soares (2003) ao analisar os anais
até o ano de 1985 na Educação Física, destaca que as mesmas não estão longe de críticas.
afastarem dos referenciais das Ciências Biomédicas para superar o biologicismo presente na
área, acabam contribuindo com a fragmentação dos saberes e pendem para o culturalismo.
os referencias das Ciências Humanas. Essa fragmentação dos saberes também prevalece nas
70
Soares (1986); Oliveira (1986); Carmo (1988); Santin (1990); Silva (1996); Silva (1997); Della Fonte e Loureiro
(1997); Silva (1999a); Sant`Anna (1999); Rago (1999); Vaz (1999); Barreto (1999); Nóbrega e Moreira (1999);
Gomes da Silva (1999); Silva (1999b); Moreno (1999); Medeiros (1999); Hasse (1999); Ortiz et al (1999); Quint e
Matiello (1999); Schneider (1999); Rodrigues (2000); Anzai (2000); Romero (2000); Carvalho (2001); Palma
(2001); Silva (2001d); Vieira e Sousa (2002); Mendes (2002); Vaz (2003); Nogueira e Palma (2003).
83
UFRJ, da Unicamp e da UNB, problematiza a fragmentação dos saberes e ressalta que “os
cientistas sociais são biofóbicos, porque desprezam tudo o que é da ordem da Biologia,
Na produção analisada da RBCE, essa fragmentação dos saberes pode ter sido
ocasionada por múltiplos fatores, dentre os quais destacamos a tradição da área estar
ressaltarem os aspectos históricos da vida não operam pela ruptura entre o biológico e o
cultural, como podemos perceber nos estudos sobre a Biologia, como os de Jacob (1992);
Canguilhem (1977); Maturana e Varela (2001) e Varela et al (2001) e que dialogam com as
teve como temática “A vida como fenômeno e como problema de pesquisa” e a ementa era
com outras áreas de conhecimento, como a Arte, em especial com a Literatura e a Pintura72,
o que já é percebido na leitura do livro de Soares (1998), quando a autora dialoga com as
imagens, através de pinturas, fotografias e gravuras, além dos diferentes gêneros literários,
objetividade estava imersa na ironia e o romance de Émile Zola que apresenta a realidade
Além disso, começam a aparecer mudanças que vêm ocorrendo nos estudos
biológicos que refutam a ruptura entre o biológico e o cultural73 tendo como referência os
humanidade, também contribui com a separação e oposição entre os saberes, o que já era
contestado por Merleau-Ponty (1991) e por muitos outros pensadores que tecem críticas à
ruptura natureza-cultura presentes nas áreas do conhecimento que não dialogam entre si. O
referido autor problematiza as explicações sociológicas que não se comunicam com qualquer
tipo de explicação das Ciências Naturais, ou então o que ocorre inversamente. O seu
71
Santin (1990); Silva (1997); Silva (1999a); Nóbrega e Moreira (1999); Silva (1999b); Palma (2001); Silva
(2001d); Mendes (2002); Vieira e Sousa (2002); Nogueira e Palma (2003).
72
Rago (1999); Moreno (1999); Nóbrega e Moreira (1999).
73
Santin (1990); Nóbrega e Moreira (1999); Palma (2001); Mendes (2002).
74
Silva (1997); Nóbrega e Moreira (1999); Mendes (2002).
85
Compreensões de saúde
principalmente, com o esporte de alto rendimento, como pode ser visualizado nas produções
analisadas até meados da década de 1980, as atenções são dirigidas para os atletas, àqueles
compreensão desse autor, essa vinculação entre ideais de saúde e a imagem do atleta pode
ser uma tentativa de confundir a saúde com a juventude, esquecendo que a velhice faz
Talvez queiram nos objetar que temos tendência para confundir a saúde com
a juventude. Não esquecemos, no entanto, de que a velhice é um estágio
normal da vida. Mas, com idades iguais, será sadio um velho que manifestar
uma capacidade de adaptação ou de reparação dos desgastes orgânicos que
outro não manifeste; por exemplo: uma perfeita e sólida soldadura do colo do
fêmur fraturado. Um velho saudável não é apenas uma ficção de poeta
(Canguilhem, 2002, p. 163).
década de 1980, contribui com a associação da saúde à juventude e não se preocupa com a
velhice. O que impera é a preocupação com os atletas, diante dos esforços físicos
considerados necessários para ampliar o desempenho esportivo. Esse modelo serve de guia
para quem não é atleta e a ênfase nas pesquisas é a de justificar os benefícios dos
75
Perez (1980); Madureira (1980); Ribeiro (1980); Ribeiro et al (1980); Cazelati et al (1980); Sessa et al (1980);
Matsudo (1980); Bonjardim e De Rose (1980); Pinto e De Rose (1980); Araújo et al (1980); Guedes (1980);
Araújo (1981a); Araújo (1981b); Ferreira (1981); Duarte e Matsudo (1981); Baldissera (1982); Araújo (1982);
Matsudo (1982); Soares e Matsudo (1982); Hirata et al (1983); Guedes (1984); Lor et al (1984); Guimarães e
Crescente (1984); Duarte (1984).
86
terem a preocupação em definir o que era saúde, podemos perceber que ter saúde
serem muito influenciados pelos estudos fisiológicos e por estarem respaldados na tradição
empirista basicamente. Como ressalta Canguilhem (2004), no início do século XX, a palavra
saúde é ausente nos estudos fisiológicos. Os termos que prevalecem são: regulações,
homeostase e stress. Ao discutir sobre essa ausência, o referido autor retoma o pensamento
não é capaz de atribuir tempo para discussões sobre a vida, a morte, a doença e a saúde; o
que está implícito nas pesquisas analisadas. Saúde significava para os atletas possuir
treinamentos. Ser capaz de produzir energia por processos aeróbicos e anaeróbicos, remover
lactato do sangue para evitar o excesso de ácido lático e manter regular a pressão arterial.
Realizar trabalho muscular com intensidade máxima, possuir tecido adiposo dentro da média
considerada como normal, ter uma musculatura abdominal fortalecida para favorecer a
digestão, a respiração e a sustentação. Estar com saúde também era sinal de estar bem
psicologicamente.
76
Araújo (1981a).
87
bom desempenho físico, como podemos perceber nos artigos analisados. O nível de aptidão
física designava o nível de saúde de cada atleta e era especificado de acordo com as
outros77.
saúde. A atividade física era vista como forma de promover saúde, sendo enfatizada por ser
capaz de provocar somente adaptações benéficas nos principais sistemas orgânicos, como o
77
Guimarães (1980); Madureira (1980); Ribeiro (1980); Ribeiro et al (1980); Matsudo (1980); Bonjardim e De
Rose (1980); Pinto e De Rose (1980); Araújo et al (1980); Cazelati et al (1980); Ferreira et al (1981); Gomes et
al (1981); Duarte e Matsudo (1981); Fontana e Reis (1982); Guedes (1982); Baldissera (1982); Araújo
(1982);Soares e Matsudo (1982); Fontana (1983); Guedes (1984); Lor et al (1984); Soares et al (1984); Moura
(1984); Guimarães e Crescente (1984); Duarte (1984); Guedes e Sampedro (1985).
78
(Matsudo, 1980), (Baldissera, 1982), (Araújo, 1982), (Araújo, 1981a).
88
Educação Física e carrega consigo a idéia de que a vida está em risco, ou seja, suscetível a
doenças. Outro destaque que se apresenta nessa relação de variação quantitativa entre
saúde e doença é a questão das pessoas com o nível de gordura acima do esperado. Estas
são reconhecidas como doentes, por passarem a ser consideradas possuidoras de baixa
mesomorfos e os ectomorfos.
uma visão reducionista, ou seja, compreendida como um padrão único de beleza. Do ideal
de robustez preconizado no final do século XIX e início do XX, o conceito de saúde passa a
estar relacionado com a boa forma. A busca nesse momento passa a ser a de alcançar um
existência, como na Antiguidade greco-romana, ou seja, como um ideal de vida bela a ser
discursos a seguir:
79
Guimarães (1980); Perez (1980); Madureira (1980); Ribeiro (1980); Ribeiro et al (1980); Matsudo (1980);
Pinto e De Rose (1980); Araújo et al (1980); Cazelati et al (1980); Matsudo (1980); Ferreira et al (1981); Gomes
et al (1981); Duarte e Matsudo (1981); Fontana e Reis (1982); Guedes (1982); Baldissera (1982); Araújo
(1982);Soares e Matsudo (1982); Fontana (1983); Guedes (1984); Lor et al (1984); Soares et al (1984); Moura
(1984); Guimarães e Crescente (1984); Duarte (1984); Guedes e Sampedro (1985).
89
dos atletas por meio dos treinamentos, influenciados pelas políticas instauradas na época da
contribuírem com o desenvolvimento de uma raça forte e saudável, desde a época em que o
esporte era reconhecido como um elemento de aglutinação social por ser proibido se
regida pelos determinismos, como no final do século XIX e início do XX. Modelos de
alimentação, de formas de se exercitar e modos corretos para alcançar a aptidão física ideal
início do XX, mas também é influenciada pela Bioquímica, e os alimentos são reconhecidos
80
Petroski et al (1982, p. 93).
81
Guedes (1982).
82
Araújo (1982); Ribeiro (1980; 1982); Guimarães (1980); Perez (1980); Madureira (1980); Ribeiro et al (1980);
Pinto e De Rose (1980); Araújo et al (1980); Matsudo (1980); Ferreira et al (1981); Matsudo e Duarte (1981);
Duarte e Matsudo (1981); Osés et al (1982); Fontana e Reis (1982); Baldissera (1982); Petroski e Duarte (1983);
Fontana (1983); Soares et al (1984); Duarte (1984).
83
A primeira lei da termodinâmica refere-se à conservação geral da energia reforçando a idéia da produção do
trabalho a partir do fluxo de calor. Foi descoberta depois da segunda lei, que é a tendência à degradação de
energia, que leva à dissipação dos movimentos ordenados e também a não conservação da energia mecânica.
(Menezes, 2004, p. 65).
Conforme Jacob (1983), desde o final do século XIX, a 2ª lei da termodinâmica já tinha sido apropriada pela
biologia.
90
alimentos é estipulado de acordo com as atividades desenvolvidas, o que nos faz perceber
vida, não traz mais a preocupação com o sono, a bebida e ao uso dos prazeres sexuais;
restringe-se aos exercícios físicos e a alimentação. O próprio termo diaita, que estava
relacionado a esse conjunto, é reduzido à dieta, à ingestão adequada dos alimentos e são
ser os carboidratos, por serem reconhecidos como fonte de energia e por possuírem baixo
fonte de energia utilizada para o desempenho de cada esporte e são estipuladas de acordo
com os testes aplicados nas avaliações funcionais e laboratoriais, como podemos perceber
84
Ribeiro (1982).
91
publicam artigos na RBCE, apoiadas nos pareceres do American College of Sports Medicine86
colaboram com a propagação do ideal de alcançar a boa forma, sinônimo de saúde. Modelos
que são ditados e que corroboram com a auto-regulação dos indivíduos através de uma
relação heterônoma, através de discursos que não têm a preocupação com a percepção
exercícios físicos, deixa de ter o sentido de arte de viver, na qual o sujeito cuida do seu
corpo de acordo com a justa medida, ou seja, de acordo com as circunstâncias em que está
existência”, que perderam parte de sua importância e de sua autonomia quando com o
mesmo, passando a ser compreendida como uma sujeição ao saber do outro, restringindo-se
85
Ribeiro (1980, p. 05).
86
Ribeiro (1980), Bonjardim e De Rose Jr. (1980), Matsudo (1980), Araújo (1981b) e Moura (1984).
92
ainda que a prática do regime é prescrita por modelos a serem perseguidos e está inserida
emergem a partir da idéia de que o esporte pode também trazer malefícios ao corpo. O
excesso de treinamento e a iniciação esportiva precoce servem de alerta para que se iniciem
difundida com sucesso pelo método de Cooper, reforça o acréscimo de lesões observadas
como decorrentes da onda da malhação dos anos de 1980. Além disso, são apresentados
estudos desenvolvidos pela Medicina do Esporte que não demonstram a existência de uma
Outros argumentos também são apresentados, tais como o fato de que 90% dos
atividade física contribui pouquíssimo para o seu controle, como aponta um dos artigos88, e
prevenção da doença coronariana que, segundo outro artigo analisado, seria necessário para
atividade física e saúde, não foram evidenciados nas publicações da RBCE até a década de
1990. Os artigos mostram uma recusa à compreensão de que a aptidão física significa
saúde, à idéia de que a atividade física por si só é capaz de gerar saúde, bem como à
87
Gonçalves et al (1992); Gonçalves et al (1995) ; Gonçalves (1996).
88
Gonçalves et al (1992).
89
Nogueira e Palma (2003).
93
Mens Sana in Corpore Sano condizente com a noção de que a atividade física vigorosa
garante ao corpo saúde perfeita, liberando a alma para melhor contemplar as idéias também
Juvenal e o cenário em que essa máxima emerge não ser contextualizado. Constatamos que
A relação entre atividade física e saúde passa a ser reconhecida também, como
uma construção social e histórica. Antes da virada do século XIX para o XX, a atividade física
no Brasil era considerada nociva à saúde, como aponta um dos artigos92 e é reforçada pelas
palavras de Lucena (2001, p. 28), ao destacar que “em boa parte do século XIX, viveu-se
quase indiferente ao sport, dado que havia a crença de que o esforço físico era sempre
nocivo à saúde”. Os cuidados com o corpo em busca de saúde não faziam sentido para a
influência da higienização pautada nos moldes europeus. Essa influência européia pode ser
(2001, p.100) e que ressalta a relação da Educação Física brasileira com os “`cuidados
90
Rigo (1995); Gonçalves (1996); Della Fonte e Loureiro (1997); Pires et al (1998); Silva (1999b); Quint e
Matiello (1999); Schneider (1999); Carvalho (2001); Palma (2001); Ferreira (2001).
91
Barreto (1999).
92
Melo (2001).
94
seus corpos, encontramos críticas em alguns artigos analisados, que são reforçadas por Silva
justamente por divulgarem um ideal de saúde a ser perseguido aqui no país. Padrões que
mesmo com a existência das validações locais, continuam a ter unicamente como
população93.
através da aquisição de um corpo idealizado pela boa forma94; o que já tinha sido
problematizado por Carvalho (1995), ao discutir sobre a relação entre a atividade física e a
sociedade de consumo. Esses conceitos são difundidos pelo mercado com base no modelo
que a própria comunidade científica da RBCE divulgou e ainda divulga quando se baseia
imagens de juventude em liberdade, associam luxo e erotismo à saúde e são permeados por
93
Silva (2001d); Góis Júnior e Lovisolo (2003).
94
Anzai (2000)
95
quem não se adequar aos padrões de uma saúde idealizada é considerado deficiente, sendo
seja por si próprio, seja através de atendimento especializado, não estabelecendo qualquer
relação com os contextos sociais desfavoráveis. E a relação entre saúde e doença que
aparece nessa compreensão é de oposição, pois o sujeito que está doente não pode ser
considerado sadio.
95
Gonçalves et al (1995); Gonçalves (1996); Della Fonte e Loureiro (1997); Quint e Matiello (1999); Anzai
(2000); Palma (2001); Melo (2001); Silva (2001); Silva (2001d) e Góis Júnior e Lovisolo (2003).
96
Gonçalves (1989); Della Fonte e Loureiro (1997); Palma (2001); Ferreira (2001).
97
Gonçalves (1989); Farinatti (1994); Della Fonte e Loureiro (1997); Quint e Matiello (1999); Carvalho (2001);
Palma (2001).
96
biológico por abarcar os aspectos sociais da saúde, esse conceito logo passa a ser
questionado também, nas publicações analisadas. Definir a saúde como estado de completo
bem-estar físico, mental e social e não somente como ausência de doença continua a
corroborar com a idéia de que existe um ideal de saúde a ser alcançado de modo estático e
perpetua a oposição com a doença. Outra crítica refere-se à fragmentação do ser humano e
Para Canguilhem (2004), essa necessidade de uma definição de saúde por parte
partir de seu próprio conceito. Essa atitude contribui com a ampliação histórica do espaço
exercido na administração da saúde dos indivíduos. Uma tradição que reforça a ambição
sócio-política dos médicos em ajustar a vida dos indivíduos. Portanto, como ressalta o
referido autor, a partir do momento em que a saúde se disse do ser humano por integrar
uma comunidade social ou profissional, seu sentido existencial foi ocultado por exigências de
contabilidade.
parâmetros considerados ideais para a saúde é associada a um caráter moralista, como pode
vida difundido como solução para o problema da saúde, reconhecida como algo somente
referência aos malefícios ocasionados pelas atividades de grande intensidade, também são
98
Farinatti (1994); Della Fonte e Loureiro (1997); Ramos (1999); Carvalho (2001); Palma (2001); Nogueira e
Palma (2003).
99
Vaz (1999).
97
desnutrição do povo brasileiro101 e, além das cidades do sul e do sudeste do país serem
evidenciadas por possuírem problemas sociais, o nordeste brasileiro é lembrado como uma
região onde a desnutrição crônica é alta. Além disso, a “Belíndia brasileira”102 é exibida em
outro artigo, cuja ascensão do país, no índice dos mais desenvolvidos pela divulgação da
Organização das Nações Unidas, contrasta com as desigualdades ainda identificadas entre as
analisado, por não atentar para as condições dignas de vida103. Também são questionados
Ressaltamos que após essas reflexões sobre os artigos analisados, que buscam
transporte, usufruto de tempo livre e liberdade são defendidos como condições de aquisição
da saúde e acesso a uma vida digna. Saúde é considerada como o resultado das formas de
sociais.
100
Gonçalves (1996); Della Fonte e Loureiro (1997); Quint e Matiello (1999); Ferreira (2001); Nogueira e Palma
(2003).
101
Anjos (1990); (Dinoá e Assis, 1990).
102
Pires et al (1998, p. 53).
103
Lovisolo (1999).
104
Della Fonte e Loureiro (1997); Ramos (1999); Schneider (1999); Carvalho (2001); Palma (2001); Nogueira e
Palma (2003).
98
Percebemos ainda, que apesar desses artigos demonstrarem uma ênfase nos
não. Outro ponto a destacar é que alguns autores que publicaram artigos na RBCE, no
105
Farinatti (1994); Palma (2001); Nogueira e Palma (2003).
106
Della Fonte e Loureiro (1997); Palma (2001).
99
Compreensões de educação
educativos.
existia a preocupação com uma educação capaz de melhorar o desempenho físico através do
função cardiovascular, reduzir o tecido adiposo e evitar a imobilidade, designada agora como
atividades desenvolvidas.
107
Guimarães (1980); Perez (1980); Madureira (1980); Ribeiro (1980); Ribeiro et al (1980); Sessa et al (1980);
Bonjardim e De Rose (1980); Pinto e De Rose (1980); Araújo et al (1980); Matsudo (1980); Guedes (1980);
Ferreira et al (1980); Matsudo e Duarte (1981); Araújo (1981a); Osse et al (1981); Cisneros et al (1981); Araújo
(1981b);Ribeiro (1982); Osés et al (1982); Fontana e Reis (1982); Hegg et al (1982); Petroski (1982); Guedes
(1982); Baldissera (1982); Araújo (1982); Matsudo (1982); Soares e Matsudo (1982); Osse et al (1982); Petroski
e Duarte (1983); Fontana (1983); Benito et al (1983); Guedes (1984); Lor et al (1984); Soares et al (1984);
Moura (1984); Guimarães e Crescente (1984); Duarte (1984).
100
marcas da pedagogia tecnicista para superar os créditos da pedagogia nova. Era preciso
ensino. Como destaca Saviani (1999), a base teórica da pedagogia tecnicista é alicerçada
dos estudos de Ivan Pavlov sobre o sistema nervoso108. Nessa proposição, com base na
percepção como uma operação de captação de uma realidade externa, por meio de um
órgãos dos sentidos na qual, a sensação, ao ter a função de instrumento que possibilita a
Ponty, 1990).
tem por objetivo racionalizar as práticas corporais e a atenção voltada aos esportes, reforça
108
No artigo de Kalinine; Giacomini e Augusti (2000), o sistema nervoso ainda é classificado de acordo com os
estudos de Ivan Pavlov. Ivan Pavlov (1849-1936) foi um fisiologista russo que recebeu o prêmio Nobel de
Medicina e Fisiologia em 1904.
No artigo de Silva e Kalinine (1999), um dos livros de Pavlov aparece nas referências bibliográficas.
101
o dualismo corpo e mente, mantém a idéia de inferioridade das práticas corporais diante das
contribui com a não observação dos desejos, necessidades e sentimentos dos alunos e são
para não despertar a afetividade, considerada como capaz de danificar essa relação de
independência.
dependente de seus pais. Os behavioristas insistiam que as pessoas deveriam almejar como
demonstra um dos artigos analisados109. Desvinculadas das outras disciplinas nas escolas e
nas universidades, as aulas de Educação Física eram reforçadas como meras atividades e
p.17). O referido autor apresenta alguns depoimentos de professores que lecionaram nesse
109
Rigo (1995).
102
treinamento esportivo; a Educação Física utilizava variados testes para definir a aptidão física
e fundamentar a prescrição dos exercícios, seja dos atletas, seja dos não-atletas, e que
Além disso, as avaliações das aptidões físicas já eram realizadas no final do século XIX e
robustez física indicava a aptidão teórica, ou seja, o valor funcional do organismo. E com as
(Fróes, 1923).
somatotipo considerado ideal para cada esporte110. Além de ser modelo para a educação
dos gestos e o corpo é visto como objeto de adestramento, não só nas escolas, mas em
polimorfo que continua contribuindo com a vigilância dos indivíduos, com a organização do
110
(Hegg et al, 1982), (Petroski et al, 1982), (Guedes, 1982), (Duarte e Petroski, 1983), (Soares et al, 1984).
111
Araújo (1981a); Gomes et al (1981); Ribeiro (1982); Araújo (1982).
103
ou interditado, como podemos perceber nas determinações presentes nos artigos que têm
como objeto de estudo as prescrições de exercícios112. A busca pela boa forma através da
os a partir dos determinismos. Porém, ao mesmo tempo em que se inicia uma preocupação
com as pessoas que anteriormente eram denominadas como anormais, doentes, com o
objetivo de reabilitá-las, a Educação Física contribui para separar as pessoas de acordo com
suas aptidões físicas, como podemos visualizar nos artigos analisados113, contribuindo com
discriminatória e excludente.
levar em consideração o contexto social em que a educação está inserida, como podemos
perceber nas produções analisadas114. Uma educação que busca a homogeneização dos
solidificando o rótulo que lhe é dado e afastando-o do convívio social. Para refutar as
112
Ribeiro (1980); Pinto e De Rose (1980); Araújo (1982).
113
Guimarães (1980); Perez (1980); Madureira (1980); Ribeiro (1980); Ribeiro et a (1980); Pinto e De Rose
(1980); Araújo et al (1980); Matsudo (1980); Ferreira et al (1981); Matsudo e Duarte (1981); Duarte e Matsudo
(1981); Osés et al (1982); Araújo (1982); Fontana e Reis (1982); Baldissera (1982); Petroski e Duarte (1983);
Fontana (1983); Soares et al (1984); Duarte (1984).
114
Rigo (1995); Della Fonte e Loureiro (1997); Matiello Júnior e Gonçalves (1997); Gomes da Silva (1999); Quint
e Matiello (1999); Schneider (1999); Barreto (1999); Medeiros (1999); Nóbrega e Moreira (1999); Silva (1999a);
Paiva (1999); Monteiro et al (1999); Anzai (2000); Rodrigues (2000); Romero (2000); Silva (2001d); Carvalho
(2001); Mendes (2002); Vieira e Souza (2002); Vaz (2003).
104
questionados por estarem atrelados à aquisição da aptidão física e por terem como modelo o
esporte de alto rendimento. Por conceberem a Educação Física escolar como promotora de
saúde, compactuando com uma visão reducionista de saúde e por desconsiderá-la como
com a qualificação para o trabalho com vistas a ampliar o rendimento, uma educação que
físicas e psicológicas que este pode proporcionar, apesar de ser aceito como um fenômeno
complexo, podendo contribuir com a emancipação dos seres humanos. Mesmo sendo
objetivação, pois o corpo é capaz de resistir ao que lhe é imposto. Como destaca Foucault
(1999), o corpo supliciado, torturado, disciplinado ou dócil, ao mesmo tempo em que é alvo
do poder é capaz de lutar e instaurar contra-poderes. O corpo humano, além de ser capaz
novas subjetividades.
115
Barreto (1999).
116
Santin (1990); Rigo (1995); Medeiros (1999); Vaz (1999); Anzai (2000); Silva (2001 d).
117
Vaz (1999); Vaz (2003).
105
dos mais fortes sobre os mais fracos é rejeitada118. Entretanto, não é somente a educação
ativista são problematizados. O movimento ativista surgiu no final do século XIX e atingiu
internacional que influenciou as práticas educativas na busca pela superação dos moldes
guiada por atividades manuais e por jogos e está ligada a algum interesse da criança,
devendo ser realizada no ambiente que a circunda, pois este é considerado o local ideal para
valoriza-se uma organização mais livre dos conhecimentos por parte do aluno (Cambi, 1999).
refutar a memorização e o imobilismo e reconhecer que o corpo não é responsável por erros.
118
Mendes (2002).
119
Gomes da Silva (1999).
106
Com relação as críticas tecidas pelos artigos analisados, percebemos que tanto na
que rejeitam a idéia de que o corpo é sede de conhecimentos, mas que exibem
a técnica e a segunda, apesar de colocar o aluno no centro desse processo, reconhece que
persuasão das pessoas, com o propósito de mudanças de seus estilos de vida para
modo, toda estratégia de ensino e aprendizagem utilizada, seja na escola, seja em qualquer
outro cenário educativo, se for caracterizada por contribuir com a perda da autonomia dos
Porém, cabe ressaltar que mesmo o aluno sendo o centro do processo de ensino
torna-se difícil despertar a criticidade dos alunos para que possam colaborar com a aquisição
então, a falta de espaço para o questionamento das concepções ideológicas de saúde, por
120
Santin (1990); Rigo (1995); Gonçalves (1996); Silva (1996); Della Fonte e Loureiro (1997); Schneider (1999);
Medeiros (1999); Paiva (1999); Quint e Matiello (1999); Lovisolo (1999); Ortiz et al (1999); Nóbrega e Moreira
(1999); Silva (1999ª); Silva (2001d); Carvalho (2001); Palma (2001);Mendes (2002).
107
contribuir com uma educação tida como reprodutora, como é destacado em um dos artigos
analisados121.
sujeito em ser o responsável único pela sua saúde e colaborar com a regulação da vida dos
indivíduos. Essa pedagogia adota a prescrição de exercícios de forma isolada, sem considerar
o contexto social, sem levar em conta o sentido de cada atividade para o sujeito que a
Além disso, outros artigos analisados contestam a educação que se direciona para
o mercado, por não se preocupar com as desigualdades sociais e reforçar um ideal de beleza
a ser comprado por todos. Nesse tipo de educação, incluem-se tanto aqueles que se
aptidão física, quanto aqueles que, a partir da década de 90 do século XX são re-significados
pela idéia da promoção da saúde. Esses cenários educativos são contestados por
produtos e a perda dos valores culturais. Modelos que são transferidos sem qualquer tipo de
reflexão sobre o contexto social em que são inseridos. A educação, desse modo, é
questionada por ser reconhecida como produtora de grande efeito na propagação dos ideais
da promoção da saúde; uma educação que tem por meta reformular os hábitos das crianças
e dos adultos, com vistas a atingir um projeto de sociedade julgado como melhor pelos
intelectuais que elaboram esse modelo. Essa ambição de intervenção política desses
121
Della Fonte e Loureiro (1997).
122
Quint e Matiello (1999).
108
intelectuais é criticada pela ânsia de conscientizar a sociedade dos benefícios de uma vida
mercadológica, destacamos a crítica tecida por um dos artigos analisados, sobre o caráter
(1995). Um movimento que recebe bastante apoio dos meios de comunicação, contribuindo
com a comercialização da saúde, com a sua entrada para o mundo dos negócios. Nesse
sentido, num contexto que facilita as oportunidades de lucro para as empresas e para os
anunciantes que atingem o meio midiático, o personal training é reconhecido por expressar o
individualismo, limitando o acesso aos poucos que podem pagar por esse serviço124.
pois para se exercitar nos Ginásios era preciso pagar. A Ginástica se desenvolveu
comercializada. O acesso a poucos que podiam pagar por serviços especializados como o
personal training, também pode ser percebido no cenário do século XIX, quando o coronel
Francisco Amoros, secretário particular do Rei da Espanha, Carlos IV era responsável pela
educação de seu filho, o infante Don Francisco de Paula que possuía doze anos. A base
apresentados anteriormente em outros artigos analisados, sobre uma educação que colabora
123
Schneider (1999); Anzai (2000), Silva (2001a); Góis Júnior e Lovisolo (2003).
124
Góis Júnior e Lovisolo (2003).
125
Nogueira e Palma (2003).
109
educação contribuindo com os cuidados com o corpo em busca da boa forma, pelo reforço a
No Programa Agita São Paulo, seus autores predizem que atividades físicas
realizadas por 30 minutos ao dia, por um período maior de dias da semana, desenvolvidas
significar o passaporte para a saúde da população. Anúncios que associam o exercício físico
ao controle e prevenção de várias doenças, enaltecendo os benefícios que sua prática pode
trazer para o empresariado, sem gastar tempo do trabalho. Além da crítica a essa associação
sobre o excesso de trabalho no nosso país, esse programa é problematizado por contribuir
com a culpabilização dos sujeitos que não atingem os modelos exaltados como saudáveis
mais intensas; o valor das atividades estar pautado na relação de custo-benefício, entre o
reducionista de saúde que sustenta tal programa e a resistência das próprias pessoas a
vivenciarem as práticas corporais seguindo esse modelo ideal, contribuem, desse modo, para
Destacamos ainda que o Programa Agita São Paulo foi objeto de tese defendida
recentemente por Fraga (2005), cuja leitura colaborou com a compreensão de que os
126
Nogueira e Palma (2003).
127
(Nogueira e Palma, 2003).
110
existência desses discursos não somente no Brasil, mas em nível mundial e, paradoxalmente,
não condiz com um aumento real da prática de atividade física entre a população paulista ou
brasileira. A atenção ao corpo não é motivo de preocupações; o que passa a ser prioridade é
pessoa que não pratica atividade física, abrange ainda quem está em falta com o exercício
prática de atividade física, dissimulam outras formas de controle através da retórica político-
Programa Agita São Paulo e divulgados nacional e internacionalmente, não têm como
preocupação principal a sua materialização em práticas sociais, pois a falta de atividade física
ideal ou absoluta. A vontade de verdade não reside no que o discurso é capaz de fazer e se
reduz ao que se diz, afastando-se do discurso verdadeiro aquele que, além de anunciar algo,
tinha a intenção em contribuir com a sua realização, como na cultura clássica (Foucault,
2001).
pesquisadores que publicam artigos na RBCE apontam elementos para que a Educação Física
esportes, a Educação Física possui outros conteúdos, como os jogos, as danças, as lutas e as
abrindo espaço para a ludicidade, para a criação, para o prazer, para a fantasia. E nesse
que há uma ênfase numa educação afinada com princípios políticos e éticos129, mas
que os pesquisadores, no intuito de superar uma educação que se guie pelos aspectos
uma educação que contribua com a transformação social, com a superação das
segunda é influenciada pelos estudos de Paulo Freire. Podemos ainda destacar, que ambas
128
Santin (1990); Rigo (1995); Nóbrega e Moreira (1999); Anzai (2000); Carvalho (2001); Mendes (2002).
129
Rigo (1995); Della Fonte e Loureiro (1997); Matiello Júnior e Gonçalves (1997); Gomes da Silva (1999); Quint
e Matiello (1999); Schneider (1999); Barreto (1999); Medeiros (1999); Nóbrega e Moreira (1999); Silva (1999a);
Paiva (1999); Monteiro et al (1999); Anzai (2000); Rodrigues (2000); Romero (2000); Silva (2001d); Carvalho
(2001); Mendes (2002); Vieira e Souza (2002); Vaz (2003).
130
Santin (1990); Rigo (1995); Quint e Matiello (1999); Lovisolo (1999); Ortiz et al (1999); Silva (1999a);
Nóbrega e Moreira (1999); Silva (2001d); Carvalho (2001); Palma (2001); Mendes (2002).
131
Della Fonte e Loureiro (1997); Schneider (1999); Medeiros (1999); Paiva (1999).
132
Quint e Matiello (1999); Medeiros (1999); Silva (1999a); Silva (2001d).
112
restringindo apenas aos esportes, mas abarcando os jogos, as danças, as lutas, as ginásticas
Ressaltamos ainda, que nessa busca por uma educação crítica e autônoma,
si” que Foucault menciona, começa a ser reconhecido como fundamento da construção da
educação na Educação Física, baseada na máxima: Mens Sana in Corpore Sano135. Pelo que
podemos compreender, a dicotomia entre saúde e educação que permeia essa área do
conhecimento ocorre por um lado, por aqueles que defendem a saúde quando não vinculam
sua prática à educação. Por outro lado, por aqueles que estão envolvidos com a Educação
Física Escolar, quando protestam contra a idéia de conceber sua prática como promotora de
saúde.
corpo, saúde e educação, que relacionamos com os cuidados com o corpo em busca da boa
forma, realizadas pelos pesquisadores que publicam artigos na RBCE e suas possibilidades de
da Educação Física. Os artigos analisados colaboraram para que os aspectos culturais, sociais
e históricos do ser humano fossem inseridos nas publicações da RBCE, abrindo espaços para
133
Palma (2001).
134
Silva (2001d).
135
Lovisolo (1999).
113
capítulo, buscando superar a ruptura entre o biológico e o cultural. Uma sistematização que
não reduza os cuidados com o corpo em busca de saúde aos aspectos individualistas, nem
tampouco às condições sociais. Para tanto, iremos recuperar alguns princípios relacionados
saúde e educação que considere os cuidados com o corpo em busca de saúde como
Da Racionalidade
por compreendermos a Máxima de Juvenal como um fio condutor para a reflexão sobre a
liberar a verdade de todo sistema de poder, mas de separar o poder da verdade das formas
hegemônicas.
pensada como algo imutável, através de um único sentido e de modo universal, cuja
que vão sendo construídos historicamente, por sujeitos inseridos nas instituições, em vez da
idéia de que a verdade é produzida por um sujeito universal (Foucault, 1988; 2000; 2003;
2004).
presente na tradição científica e filosófica, cujo mundo dos sentidos é considerado erro. Para
uma vez que é produzida por um sujeito encarnado, situado no mundo em que vive, além do
compreensão de que o sujeito puro está afastado do objeto ou do objeto puro sem nenhuma
ligação com o sujeito e passa a se pautar na idéia de que o sujeito só alcança a verdade
verdades são situadas, inacabadas e não revela por completo à realidade, pois é sempre
Educação Física na produção científica da área, expressa nos artigos analisados da Revista
Com base nos artigos analisados, percebemos que a Educação Física, a partir de
pensamento deixam de ser hegemônicos e, além de existirem pesquisas realizadas com base
nas ciências biomédicas, também há as pesquisas baseadas nas ciências humanas. Para
117
ordem.
de 80, a Educação Física, passa a organizar o conhecimento de modo plural, mas o que
contribuindo com a disputa entre ambas, mesmo que tenha iniciado um processo de diálogo
naturais ou nas ciências humanas, pode ser identificada quando Tani (1998), destaca que:
ampliada que considere o diálogo entre diferentes tipos de conhecimento, de acordo com a
especificidade de cada abordagem, sem reforçar a disputa por uma ou outra, e contribuir
para torná-la capaz de compreender o que em nós e nos outros precede a razão” (Merleau-
com vistas a destruir o observador absoluto que sobrevoava o objeto sem habitá-lo, sem
A partir do final do século XIX surgem teorias e princípios que colaboraram com a
teoria quântica proposta pelo físico Max Planck, a teoria da relatividade proposta por Albert
átomos de Niels Bohr e que contribuíram com a mecânica quântica. Descobertas científicas
que problematizaram teorias e princípios da física clássica e que também colaboraram com
outra visão sobre a relação entre o sujeito e o objeto na produção da verdade. Assiste-se à
superação da idéia de que o rigor científico opera pela objetividade absoluta e definitiva,
científico, pois a ciência é uma das formas de compreensão do mundo e não deve ser
considerada como verdade absoluta, pois além de não ser a única possibilidade de acesso ao
vivida, quando destaca que “tudo aquilo que sei do mundo, mesmo por ciência, eu o sei a
partir de uma visão minha ou de uma experiência do mundo sem a qual os símbolos da
ciência não poderiam dizer nada. Todo o universo da ciência é construído sobre o mundo
saber e não as menospreza perante o que considera científico. Foucault reconhece que a
positividade das Ciências Humanas, ou seja, o momento em que uma prática discursiva se
ciências, o que o impede de considerá-las como ciência, haja vista que se refere às ciências,
às configurações epistemológicas que operam pelo modelo formado por volta do fim do
século XVIII. No caso das Ciências Humanas, mesmo não se enquadrando nesses moldes,
Essa configuração que lhes é peculiar não deve ser tratada como um
fenômeno negativo: não é a presença de um obstáculo, não é alguma
deficiência interna que as fazem malograr no limiar das formas científicas.
Elas constituem, na sua figura própria, ao lado das ciências e sobre o mesmo
solo arqueológico, outras configurações do saber (Foucault, 2002, p. 506).
Após essas reflexões sobre a não hierarquização dos conhecimentos e com vistas
partir de uma racionalidade que contribua para desatar as amarras, ultrapassar um saber
fechado e abrir-se para a comunicação, para a troca com diferentes lógicas de compreensão,
sedimentadas em matrizes disciplinares isoladas. Entretanto, cabe destacar que essa falta de
século XIX e início do XX, quando se buscava a contribuição das teorias da expressão
corporal, através dos estudos de Noverre, Delsarte e Dalcroze, e dos movimentos da dança,
também vem sendo problematizado por alguns pesquisadores que tiveram seus artigos
(1998; 1999; 2000), Fensterseifer (1999; 2000; 2001), Lima (2000), Silva (2001a), Nóbrega
educação a partir de uma racionalidade que ultrapasse os limites das fronteiras disciplinares
e que, em vez de se pautar numa lógica linear, abarque uma lógica recursiva cujos produtos
136
Silva (1997); Nóbrega e Moreira (1999); Palma (2001) e Mendes (2002).
121
e efeitos são, ao mesmo tempo, causas e produtores daquilo que os produziu, permitindo
ampliar os olhares sobre o corpo vivo como inscrição biológica e simbólica do humano,
historicidade na sua dimensão orgânica e nas interações com a cultura em que vivemos. O
idéia de seleção natural concebida como a sobrevivência dos mais fortes e que apoiaram as
teorias raciais que buscavam justificar as desigualdades sociais apoiadas nas leis biológicas,
foram interpretados a partir de um modelo universal, o que fez com que o processo de
capitalistas e colonizadores. Seus estudos serviram de base tanto para o darwinismo, como
utilizadas como provas científicas para justificar as desigualdades sociais e as várias formas
Jacob:
122
justificadas pelos estudos biológicos, podemos perceber através dos estudos de Jacob
(1992), Canguilhem (1977), Maturana e Varela (2001) e Varela et al (2001), que o conceito
relacionarmos com o ambiente em que vivemos, vamos construindo outra história mediante
nossas experiências de vida, de acordo com a sociedade em que estamos inseridos de modo
recebem contribuições das leis da Física Quântica. O ser vivo é considerado um sistema
aberto, que se isolado, morre. O ser vivo não pode deixar de se alimentar, de expelir desejos
com o reconhecimento de que os seres vivos são inseparáveis ao tempo, à sua história
(Jacob, 1983).
especificando seus próprios limites à medida que interagem com o ambiente cultural, social e
contingência.
medicina hipocrática, em vez de operar pelo fracionamento de suas partes. Nesse contexto,
das tradições orientais139 através dos artigos analisados e se aproxima das intenções de
atado ao mundo em que vive. O filósofo busca subsídios nos estudos neurológicos no intuito
intelectual advinda da decodificação de estímulos dos órgãos dos sentidos em que o cérebro
137
Santin (1990); Barreto (1999); Nóbrega e Moreira (1999); Gomes da Silva (1999); Quint e Matiello (1999);
Ortiz et al (1999); Romero (2000); Mendes (2002).
138
Santin (1990); Silva (1997); Nóbrega e Moreira (1999).
139
Nóbrega e Moreira (1999).
124
corpo com a experiência vivida. E a sensação não antecede a percepção, pois na própria
portanto, uma relação recíproca entre o sujeito que percebe e o objeto que é percebido.
puderam ser atualizados. Essas descobertas referem-se à plasticidade cerebral, em que não
cérebro, pois há uma conexão entre os neurônios. Seus estudos foram fonte de inspiração
para Varela et al (2001) nas pesquisas sobre a cognição, quando buscou aproximações das
apresenta, volta a ser considerado como parte da totalidade complexa que é a natureza e
liga-se aos outros seres vivos. Essa ligação do corpo humano com o restante da natureza é
essência dos seres vivos, o que é comum entre eles, o elemento que os liga ao restante da
natureza. Uma carne que não significa matéria, espírito, nem substância, mas refere-se à
Ponty (2004) destaca a necessidade da reaproximação do ser humano com sua animalidade,
que o corpo humano possui singularidades, mas que também desfruta de semelhanças
perante os outros seres vivos. Não estamos sós no mundo, nem apenas entre os seres
humanos. Cada ser vivo habita o mundo à sua maneira e essa diversidade de seres coexiste
conosco. A reaproximação do ser humano com a sua animalidade, em vez da sua contínua
125
recusa, é considerada por Merleau-Ponty de extrema importância, pois a vida animal nos
lembra dos nossos fracassos e limites e suscita a idéia de que vivemos na experiência do
outro, podendo contribuir com o reexame de certas distinções que são impostas e com o
humano com sua animalidade poderá ainda colaborar com a recusa da hierarquização entre
humano.
Merleau-Ponty ressalta que o corpo humano possui uma situação ambígua por
possuir uma história pessoal e coletiva. Ao mesmo tempo em que é só, não pode prescindir
dos outros. Essa ambigüidade faz com que precisemos “lutar o tempo todo para reduzir
nossas divergências, para explicar nossas palavras mal compreendidas, para manifestar
nossos aspectos ocultos, para perceber o outro” (Merleau-Ponty, 2004, p. 50). A situação de
busca de entendimento com os outros seres apresenta-se diante de nós o tempo todo e ao
mesmo tempo em que não conseguimos alcançá-la de modo definitivo, não a recusamos.
Essa tarefa inconclusa e a constante ameaça da vida humana são elementos que podem
contribuir com a aceitação das diversidades, mas também com o reconhecimento das
na arte e na experiência vivida pelo corpo é possível perceber que a condição humana é
até mesmo pelo que silencia, de atribuir sentido às suas experiências vividas, de
humano com sua animalidade. O corpo humano é animal, natureza e cultura, sujeito e
O acrobata
(Picasso, 1930)
pois este possui muitos segredos, é matéria do irrefletido, do impensado. Ao mesmo tempo
esportes e as ginásticas como narrativas corporais vivas situadas nos contextos onde estão
textos que não são explicadas em sua totalidade, contribuindo para desabrochar o ser
a partir das experiências vividas pelos sujeitos na sua relação com o mundo.
contém princípios que os médicos antigos deveriam incorporar, como a brevidade da vida, a
vagarosidade da arte, a necessidade de agir rapidamente devido a ligeireza com que ocorre
saúde é a nossa condição de estarmos vivos, faz parte da nossa existência, como podemos
por não chamar a atenção e é reconhecida como um mistério. Refere-se à harmonia intensa
140
Grifo nosso.
No livro de Chauí (2002b), o aforismo de Hipócrates é apresentado da seguinte maneira: “A vida é breve, a arte é
longa, o momento oportuno, fugidio, a prova vacilante e o juízo difícil”.
128
com o ambiente social e o natural, mas uma harmonia oculta. Trata-se de um movimento
é estar no mundo com os outros, sentir-se satisfeito com os afazeres da vida e manter-se
vida no silêncio dos órgãos através dos estudos de René Leriche, um cirurgião professor da
Faculdade de Medicina entre 1925 e 1940. Nessa compreensão, destaca que o estado de
problematiza a idéia da saúde relacionada somente ao silêncio dos órgãos utilizada por
vários autores em diferentes séculos, como Paul Valéry em 1942, Charles Daremberg em
1865 e por Diderot em 1751. Para Canguilhem, a saúde não é somente a vida no silêncio
dos órgãos, sendo também a vida nas relações sociais. É a verdade do corpo em situação de
exercício, expressão originária de sua posição como unidade de vida. Essa compreensão de
saúde como verdade do corpo, no sentido ontológico, não pode ser explicada com teoremas,
como reconhece o autor, mas reforça a idéia de que se deve admitir também a presença da
ciência, reconhecendo que a saúde não se restringe a uma área do saber, sendo também
atividade interrompida. Ser sadio significa não apenas ser normal numa situação
determinada, mas também ser normativo nessa situação e em outras situações eventuais.
Entretanto, o padrão de referência deixa de ser guiado a partir de uma média para definir a
normalidade, pois é sempre o indivíduo inserido num contexto que devemos tomar como
Todavia, cabe destacar que a busca pelo equilíbrio aparente do corpo humano, não exclui a
129
A lei geral da irreversibilidade contribui com a compreensão de que o corpo nunca voltará ao
ser humano, enquanto existe como ser situado no mundo, busca harmonizar-se com o
excedeu ou de adquirir o que está fazendo falta, de acordo com a normatividade de cada
corpo nas situações experienciadas na vida, mas nunca retornando ao estado anterior. Para
A saúde não se restringe somente aos aspectos individuais, nem muito menos
apenas aos aspectos coletivos. Ela está relacionada à constante busca pelo equilíbrio do
corpo humano com o ambiente em que vive, nos fazendo perceber que depende de
alguns artigos analisados e que consideram ambos os aspectos nas discussões sobre a
saúde141.
humana e por mais que se reconheça o papel do modo de vida, ligado às condições de
Conforme Canguilhem, para se estudar as variedades das doenças, não se pode deixar de
141
Farinatti (1994); Palma (2001); Nogueira e Palma (2003).
130
Medicina contemporânea, quando os doentes são tratados como objetos e não sujeitos de
sua doença.
Educação Física possa ampliar a relação entre saúde e estética a partir de um corpo
idealizado e possa atrelar-se a uma estética da vida bela, atenta às necessidades e desejos
como a anorexia, bulimia e até mesmo a vigorexia142, vivemos num momento em que a
mundo. Apesar de um estudo143 recente realizado pelo Ministério da Saúde e pelo Instituto
queda no Brasil nos primeiros anos desta década, a diminuição do número de casos de
desnutrição infantil não significa que o problema esteja sob controle no país.
Nesse contexto, muitas pessoas não têm acesso à alimentação, enquanto outras
cheiros e as pessoas que estão em volta. Não temos necessidade somente de ingerir
quantas vezes as pessoas nem se dão conta da importância da afetividade para a saúde.
Essa dimensão afetiva se insere na estética da vida bela e mantém relação com a
saúde, podendo colaborar com a reaproximação do ser humano com a sua animalidade e
com os outros seres humanos e nos fazer retomar o pensamento aristotélico sobre a
142
A vigorexia refere-se à obsessão por ganho de massa corporal através da malhação e da ingestão de
anabolizantes e vitaminas. Uma reportagem no Jornal do Brasil traz como destaque os primeiros sintomas e estes
referem-se às pessoas que não bebem, não fumam, jamais tomam refrigerantes, de três em três horas têm que
se alimentar e quando não conseguem ir até a academia malhar, ficam alucinadas (Ramalho, 2005).
143
< http://integração.fgvsp.br/pesquisas.htm> Acesso em: 05 fev. 2006.
131
importância do tocar para a saúde, como uma necessidade humana atrelada à nossa
amizade e confiança com seu médico. A saúde compreendida também como fenômeno da
existência, leva-o a destacar que a afonia não se reduz à recusa de falar, nem a anorexia à
recusa do tempo que há de vir, “retiradas da natureza transitiva dos `fenômenos interiores`,
o referido filósofo, a voz é adquirida novamente quando o corpo se abre mais uma vez ao
ser consideradas naturais, pois o ser humano é histórico. Como ressalta Merleau-Ponty:
além de estarem relacionadas à historicidade dos seres humanos ligados aos outros seres
vivos, também estão relacionadas à saúde. O estar com o outro, além de provocar prazer,
também pode trazer dor, angústia, desejo ou carência, alteração na freqüência cardíaca,
contribuir para despertar novos sentidos e contribuir com o reconhecimento dos limites e
possibilidades do próprio corpo e de quem está em nossa volta, mesmo que esse
Sabemos que as práticas corporais por si só, não são capazes de gerar saúde,
como podemos perceber nos artigos analisados144 e também em outras publicações da área
estas práticas podem trazer benefícios para nosso corpo; mas é preciso considerar a história
das pessoas, seus desejos, sem se deixar levar pelos modismos, nem pelos determinismos,
sem qualquer tipo de reflexão crítica. É necessário experimentar, conhecer várias práticas
corporais para perceber aquelas com as quais nos identificamos. É preciso reconhecer
nossos limites e possibilidades para que essas vivências não se transformem em sacrifícios
corporais. É preciso reconhecer ainda, que cada corpo também pode ter necessidade de ficar
em descanso, de não fazer nada, de sentir preguiça, ficar de pernas para o ar e buscar um
reflexões sobre a morte. Para Foucault (1988), as estratégias biopolíticas contribuíram com a
tornou-se o ponto mais secreto da existência. Portanto, trazer o aforismo hipocrático para
de se livrar dos terrores da morte, como defendia o poeta Juvenal. Vida e morte não estão
Heráclito ao dizer que “em nós, manifesta-se sempre uma e a mesma coisa: vida e morte,
144
Rigo (1995); Gonçalves (1996); Della Fonte e Loureiro (1997); Pires et al (1998); Silva (1999b); Quint e
Matiello (1999); Schneider (1999); Carvalho (2001); Palma (2001); Ferreira (2001).
133
poderá contribuir para que possamos desfrutar do tempo vivido. A brevidade da vida suscita
que seja vivida com dignidade e colabora com a idéia de que a vida pode ser prolongada
movimento”, são considerados construções culturais, como a arte. Criações que surgem da
necessidade de perpetuar o seu criador, que morre, mas ao mesmo tempo consegue
Educação Física pode ser considerada como a arte de cuidar do corpo, da saúde, da vida,
através do ensino dos jogos, das danças, das lutas, das ginásticas e dos esportes, tendo
como base o sentido grego de tékhne. A Educação Física, considerada uma técnica, uma
obra de arte, capaz de despertar a criação, sem possuir a intenção de dominar os seres
humanos, nos faz atentar para a compreensão de que a máxima socrática “Conhece-te a ti
145
Della Fonte e Loureiro (1997); Schneider (1999); Medeiros (1999); Paiva (1999); Quint e Matiello (1999); Silva
(1999a); Silva (2001d).
134
para que se exerça uma liberdade ética. O conhecimento de si pode colaborar para que cada
sujeito, em vez de seguir ordens passivamente, possa guiar suas próprias ações,
reconhecendo que são responsáveis por elas e pela reconstrução do mundo em que
despertar sentidos.
reconhecida como ação corporalizada, como uma ação relacionada à história pessoal e à
história da sociedade.
pensamento só são possíveis porque somos corpo. Desse modo, os jogos, as danças, as
lutas, as ginásticas e os esportes são reconhecidos como conteúdos da Educação Física. Esse
pecto pode ser observado nos artigos analisados que buscam superar a hegemonia do
146
Santin (1990); Rigo (1995); Nóbrega e Moreira (1999); Anzai (2000); Carvalho (2001); Mendes (2002).
135
o reconhecimento de que os criadores dos jogos, das danças, das lutas, dos esportes e das
ginásticas são perpetuados através de suas invenções e que a cada dia são re-significadas
por quem as vivencia, poderá ainda contribuir com o reconhecimento da brevidade da vida e
com o despertar do desejo de desfrutar do tempo vivido, pois só sabemos que a nossa
finitude traz possibilidade de gerar novas vidas, mas não podemos prever quando e onde irá
elucidação completa da realidade através das idéias, como defendia o pensamento socrático.
(1990; 1999a; 1999b; 2004) e pelos estudos de Varela et al (2001) sobre a cognição, se
com as reflexões de Merleau-Ponty sobre o mundo da percepção, mundo que nos é revelado
por nossos sentidos através das experiências vividas. Como seres situados no espaço
enovelamento entre o tangível e o tangente, sem operar por hierarquias entre os diferentes
tradição budista contribuem com os estudos de Varela et al (2001), Varela (1992). Na busca
e ao mesmo tempo estar ligado ao ambiente. Desse modo, o sujeito perceptor e o mundo
ações deixam de ser possíveis e o sentido do mundo também se modifica, sem ser possível
(2001), Varela (1992) colaboram com a compreensão de que a percepção não é limitada
pelo mundo que a rodeia, como também contribui para a atuação desse mundo envolvente.
através de relações recíprocas. Esses estudos, além de suscitarem uma educação que
considere o contexto em que está inserida, exacerbam a instauração de relações com outras
realidades, tendo em vista que o ser humano está ligado ao restante da natureza, possui
singularidades e também semelhanças com os outros seres vivos. Esses estudos colaboram
ainda, com a compreensão de uma educação que priorize a atenção ao próprio corpo situado
manter ou de modificar a apropriação dos discursos, com os saberes e os poderes que eles
137
trazem consigo” (Foucault, 2001, p. 44). As práticas sociais contêm saberes e poderes que
saberes que emergem das relações de poder e por elas são produzidas. Nesse sentido, uma
como podemos encontrar nos trabalhos de Nóbrega (1999); Porpino (2001); Tibúrcio (2005),
modos de viver e que têm como preocupação primordial a circulação das informações
corpo humano não está livre de todas as dominações. Todo discurso gerador de poder
possui no seu interior, um discurso do contra poder. O desafio posto é construir um contra-
práticas educativas de acordo com cada contexto. Discursos e práticas educativas que se
se
Héracles banqueteando-se
a energia que liga os seres humanos com o restante da natureza, bem como a superação
dos obstáculos que surgem no dia-a-dia. Uma educação que valorize os jogos, as danças, as
educação que reconheça as verdades transitórias de cada corpo, que aguce a curiosidade
139
aventuras. Uma educação que desperte para uma prática da diaita refletida sobre si mesmo,
em vez de se guiar por padrões normativos, e que não se restrinja à alimentação, à bebida,
à realização de práticas corporais e as preocupações com o sono, mas que possa também
desejantes, que refute a ideologia do homem saudável, pautada num modelo ideal e na
que ofereça possibilidades de atentar sobre as políticas do “Pão e Circo” que são
que abra espaços para o cuidado de si, para despertar emoções, sonhos, desejos,
numa estética da existência, na idéia de que a vida é uma obra de arte e requer a
conhecimento da Educação Física, pois permeiam essa área do conhecimento desde o final
sofrendo reformulações, rupturas e continuidades. Desse modo, uma teoria do Corpore Sano
diálogo entre os saberes. Uma sistematização que não opera por segregações entre teoria e
prática, ciência e filosofia, saúde e educação, corpo e mente, razão e sensível, natureza e
cultura.
Uma reflexão dessa natureza poderá ser reconhecida como uma teoria do corpo
Física. Uma teoria que rejeita a idéia de verdade totalizante e abarca a compreensão de que
conceitos que são apropriados pela Educação Física conforme visualizamos na produção
área pedagógica, acadêmica e profissional estão entrelaçadas, haja vista que as práticas de
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“Medidas da Parâmetros (pesquisa Não fala especificamente . Visto só pela diferença Treinamento Fisiologia Astrand, P. O.;
capacidade metodológicos descritiva) Rodahl, K.
aeróbica em na área de . a partir da avaliação .Depois faz relação com o Textbook of work
bicicleta avaliação Descrição de funcional (VO2 máx/ sexo, massa muscular e grau Medicina physiology Mac
ergométrica” cicloergométric parâmetros freqüência cardíaca / de treinamento do Esporte Graw Hill Book
o da metodológicos média 60 rpm de Co, NY, 1977.
Guimarães, J. capacidade de freqüência p/ indivíduos . Nível da função
N. F. trabalho por (testes de razoavelmente treinados) cardiovascular Fox, E. L. A
via aeróbica. esforço em simple
(Lab. de bicicleta Shepard / Canadian . Ênfase nos jovens sadios acuratetechnique
Performance (avaliação ergométrica) Journal (testes) for predicting
da UGF) funcional) maximal aerobic
Gráficos Fox (teste p/ . Reconhece a interferência do power, 1973.
1980 universitários homens com ambiente p/ a variação da FC
Cálculos idade em torno de 20 (horas de sono, ansiedade, Shepard, de
(V.1, n.2) anos e 70 Kg de peso) tabagismo, cafezinho, Gueki, R. J. –
Estatísticas exercícios físicos realizados Pedal frequency
Relação linear entre a FC antes dos testes, estados in bicycle
(Não apresenta e a carga de exercício gripais, uso de medicamentos ergometry, 1976
discussão sobre (método seguro) poderão anular os testes – (Canadá)
esses erro)
parâmetros) . Melhora na capacidade
circulatória . Determinismo do ambiente
Nº / Título Objeto de Método de Conceito de saúde Conceito de corpo Conceito de Áreas do Principais
do artigo / Estudo Pesquisa educação conhecim. Teóricos
Autor / Ano
60
Produção do Artigo sobre a Não fala Visto através de avaliações e Treinamento Fisiologia 8 referências do
“Ciências e conheciment temática especificamente pelas condições ambientais próprio autor
tecnologia do o em (Ensaio teórico) (precárias) Preocupado em
esporte na laboratórios . Relacionado à formar o atleta Medicina do
área na área 1º) apresenta a avaliação do consumo Visto a partir de um padrão p/ ganhar Esporte Bar-or, O.
biológica: a biológica sua perspectiva máximo de oxigênio americano NCHS recomendado medalha (futuro Pediatric sports
produção d o sobre a temática pela OMS campeão) ou Nutrição medicine for the
conhecimento em relação ao . Crescimento dos então o cidadão pratctioner. From
em tema do alunos foi utilizado na Desnutrição crônica é bastante p/ realizar o seu physiologic
laboratórios (o Congresso avaliação do estado alta na região do NE brasileiro. trabalho principles to clinical
de estudos” metabolismo “Esportes e nutricional a partir Nas cidades do SE e Sul, a applications, NY,
aeróbico – Mudanças na dos valores Z da prevalência de desnutrição 1983.
Anjos, L. A. A. biologia de América Latina” variável estatura p/ crônica é bem menor ficando (profissionais de
laboratório idade em relação ao entre 6 e 10% (mostra as EF nas escolas – Dricot, J. D. D.;
Fundação que pode ser . Fala que se padrão americano diferenças, mas não podem produzir Cariri Benigna.
Oswaldo Cruz realizada pode fazer NCHS recomendado hierarquiza, uma região em conhecimento M. J. Estudo
pelo ciência, mesmo pela OMS relação à outra) científico sobre o epidemiológico da
1990 professor c/ sem nosso povo) desnutrição no
os equipamentos Grupo A – desnutrido A documentação do estado da Paraíba,
v. 11, n.2 referenciais sofisticados moderado crescimento da criança fornece UFPB, 1985.
que eles os meios p/ a avaliação do
defendem) . Dá como Grupo B – c/ risco de estado nutricional, o que pode Gross, R. et al.
exemplo a desnutrição ser feito c/ uma simples Influence of
avaliação do balança e fita métrica economic
metabolismo Grupo C – melhor (No entanto, não aponta deterioration in
aeróbico, nutrido sugestões de como atingir Brazil on the
utilizando um políticas públicas p/ o caso da nutricional status of
ciclo ergômetro desnutrição) children in RJ,
mecânico c/ 35 Brazil, 1987.
alunos de escola
pública da
Baixada
Fluminense
162
Nº / Título Objeto de Método de Conceito de saúde Conceito de corpo Conceito de Áreas do Principais
do artigo / Estudo Pesquisa educação conhecim. Teóricos
Autor / Ano
121 Ensino da EF Bourdie, P.
para além É uma reflexão Não fala Crítica ao dualismo (natureza e . Reconhece que Sociologia Programa para uma
“Sociedade, do seu sobre as especificamente cultura), às fragmentações existe #s formas sociologia do
corpo e aspecto contribuições de de educar = Antropologia esporte. SP, 1990.
interdições: biológico, Marcel Mauss p/ (mas pelo seu Corpo biológico, cultural, social olhar repressor,
contribuições buscando a EF escolar referencial não e histórico uma fala que Filosofia Leroi-Gouhan, A. O
do estudo de contribuiçõe separa os aspectos orienta, imitação (fenomenolo gesto e a palavra 2:
Marcel Mauss s de Marcel (ensaio teórico) biológicos dos sociais, Corpo natural e cultural, do gesto correto, gia) memória e ritmos.
sobre as Mauss nem da natureza e individual e social etc. Lisboa, Edições 70,
técnicas do cultura) Psicologia 1987.
corpo” Gestos, técnicas do corpo – . EF escolar –
(ensino da Ciência= (bioculturais) – dimensões comunicação Lévi-Strauss, C. A
Rodrigues, S. EF) apresenta . explicação fisiológica social, biológica e psicológica entre professor e obra de Marcel
R. possibilidade de sobre a aluno Mauss. In: Mauss,
diálogo entre predominância do uso . Sinergias nervosas e (diversidade de M. Sociologia e
Escola Federal Sociologia, da mão direita é musculares constituem gestos, de Antropologia. SP,
de Engenharia Psicologia e incompleta. verdadeiros sistemas, técnicas do 1974.
de Itajubá Fisiologia Demonstra a relação solidários c/ todo um contexto corpo)
entre o sagrado e o coletivo. Mauss, M. Alocução
2000 profano na Proporcionar à sociedade de
determinação do uso Ser humano total=vive num análise crítica psicologia. In:
v.21, n.2 e 3 preferencial das mãos espaço e tempo determinados. dos usos do Mauss, M. Ensaios
(lado direito é corpo de Sociologia. SP:
valorizado Vida individual e coletiva Perspectiva, 1981.
excessivamente na (utiliza + 4 obras)
sociedade)
Merleau-Ponty, M.
De Mauss a Claude
Lévi-Strauss. In :
___Texto sobre
estrutura. SP, 1974
(Os pensadores)
163
164
DÉCIMO JÚNIO JUVENAL – poeta romano que nasceu aproximadamente entre os anos 50 e
60 e supõe-se que morreu entre 135 e 140 d. C.
x Estamos utilizando uma tradução da versão em francês da décima sátira feita por
Sueli Ratto. A numeração das páginas é atribuída com base na página da internet
http://www.nimispauci.com/index.php Acesso em: 20 jun. 2005.
x Em alguns trechos utilizamos a versão da décima sátira de Juvenal escrita em versos
e publicada pela Ediouro em [19..].
165
SÓCRATES - não possui nenhuma obra escrita. Platão utiliza os diálogos socráticos na
primeira fase de seus escritos para reavivar a memória de seu mestre.