Livro o Diario de Hass Volume 1
Livro o Diario de Hass Volume 1
Livro o Diario de Hass Volume 1
Pessoa, 2022
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Calmo, mas nem tanto, fui em direção à janela para fechá-la
e estranhei quando percebi que o ferrolho ainda estava passado.
Como isso é possível?, pensei rapidamente. No entanto, a resposta
para minha pergunta veio na mesma velocidade: O suporte
arrebentou! Foi isso, disse para mim mesmo enquanto empurrava
as duas folhas da janela de estilo colonial, aproximando-as do
batente. Meus olhos se arregalaram, quase saltando das órbitas,
quando vi o suporte afixado no lugar. Desacreditado, o puxei,
balançando para os lados, mas ele se manteve inerte. Estava tão
firme quanto os blocos da parede. Um calafrio atípico e incômodo
percorreu minha espinha.
Senti que, a partir daquele momento, eu não estava mais
sozinho no quarto.
Foram sete dias de insônia com a certeza de ter alguém à
espreita, no escuro, observando. Perdi a conta de quantas vezes
levantei desesperado para acender a luz ou iluminar aquele
bendito canto com a lanterna de um antigo celular. Nunca mais
consegui dormir de bruços. Quando teimava em fazer, uma aflição
imediata me acometia, como se a qualquer momento alguém fosse
me atacar pelas costas.
Uma história surgiu em minha mente, ocupando todos os
espaços, inclusive os meus sonhos, martelando dia e noite
insistentemente. Exausto, sentei-me em frente ao meu antigo
computador e comecei a escrever. As minhas mãos já sabiam o
caminho, eu era apenas um mero espectador.
Assim nasceu O Diário de Hass.
Sugiro a você, meu caro leitor, que leia este livro com pouca
luz. Aqueles que seguiram esta instrução, experimentaram algo
digno de relato. E eu gostaria que você fosse o próximo a viver esta
experiência.
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entei evitar, mas a minha maldição é mais forte do que
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Às vezes, na hora do recreio na escola, sentado num banquinho
distante dos brinquedos, entre uma mordida e outra no pão com
carne que só minha mãe conseguia fazer, observava os alunos
correndo, gritando, rindo…Todos felizes. Cada um com seu
grupo, menos eu. Não me encaixava.
Nunca soube explicar o motivo, mas, desde que me entendo
por gente, havia em mim o sentimento de não pertencimento.
Talvez fosse meu amadurecimento precoce que me fizesse ver
tudo aquilo como uma tremenda perda de tempo.
Havia em mim uma tristeza nostálgica que vinha à tona quase
todo final de tarde e, com ela, a sensação de estar muito longe de
casa, do meu verdadeiro lar…
Eu estava desconectado daquela realidade monótona.
Nessa época, eu não tinha muito critério com a minha
aparência. O cabelo castanho-escuro com uma pequena mancha
branca na franja vivia bagunçado. As roupas, eu escolhia pelo
conforto, mesmo que fossem um ou dois números maiores do
que o “adequado”. Sempre gostei de cores escuras e isso refletia
no que eu vestia, o que contrastava bastante com a pele clara, ou
melhor, pálida.
Versadi, a cidade onde eu nasci, era extraordinariamente
quente e úmida. O calor não dava trégua nem durante a noite.
Dormir com a janela aberta só era uma opção se quisesse servir
de jantar para os mosquitos. A solução na maior parte do ano era
um ventilador surrado posicionado a um palmo do meu rosto.
O paradoxo era que, mesmo que a temperatura lá fora atingisse
cinquenta graus, os meus banhos eram sempre escaldantes. A
resistência do nosso chuveiro sobrevivia no máximo dois meses
no calor e só um mês no inverno. Vivia esperando pelas épocas
frias para dormir tranquilo e sem acordar ensopado de suor toda
manhã. Só assim para desengavetar meus cobertores, ainda que
fosse por alguns dias. Mas o frio demorava a chegar e logo ia
embora, sem deixar nem uma brisa fresca como recordação.
A timidez me vestiu tão bem quanto um tênis confortável que
não aperta e nem causa calos. Estar sempre quieto no meu canto
evitou muitos problemas. Por isso não gostava de me expor.
Erguer a mão durante as aulas para tirar dúvidas estava fora
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de questão. Sempre desviava o olhar da professora e fingia estar
anotando algo quando ela insistia em fazer uma pergunta para a
turma, esperando algum dos alunos responder.
Para completar, eu não conseguia focar nas explicações das
matérias. Eram tediosas. Só de ver os professores passeando
de um lado para o outro segurando o livro aberto em suas
mãos, minha mente divagava. Isso fez com que eu conquistasse
imediatamente a antipatia e a indiferença de alguns professores.
Eles não se conformavam com a minha atuação em sala. Na
verdade, com a ausência dela.
Nessa época, eu era o típico aluno do fundão. Não fazia
anotações e, no meu caderno, tinha apenas umas dez páginas
rabiscadas e nenhuma delas era sobre o conteúdo das aulas, eu
nem me recordo de ter assinado o meu nome nele. Meu olhar
descansava com frequência pelo vidro da janela à minha esquerda
que dava de frente para a rua. Minha mente eventualmente dava
o ar da graça em sala de aula, pois seu hábitat natural era o
mundo da lua e milagrosamente eu conseguia tirar boas notas.
Bom, não eram as melhores, mas o suficiente para passar de ano.
A minha imaginação funcionava como uma âncora, me
puxando com tanta intensidade e proporcionando momentos de
tamanha imersão que eu não sabia fazer distinção entre o real e
o irreal. Isso tem seu lado bom e seu lado ruim. Ficar sozinho no
escuro, por exemplo, era horrível. As sombras sempre se mexiam
ou tinham olhos ou os dois.
Nas aulas, com o olhar fixo na janela, eu percorria dimensões
dentro da minha própria mente.
Numa dessas dimensões existia uma densa floresta: Oratu. As
árvores eram de uma cor escura, feito obsidiana, e careciam de
folhagem. Na floresta, sempre, independentemente do momento
em que eu pensasse nela, era uma noite fria. Este, sem dúvidas,
era o meu lugar favorito. Nela, eu me sentia vivo e conectado a
algo muito poderoso.
Entre suas árvores negras, eu corria tão rápido quanto um
lobo, desviando-me dos galhos e saltando os troncos caídos no
chão. Sentia a selvageria em meu sangue fazendo todo o meu
corpo reagir, os batimentos acelerados, os picos de adrenalina
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e as nuances de temperatura no vento. Era um sentimento de
poder que me deixava em êxtase. Eu queria sempre mais.
Aquela floresta e eu éramos um só.
Na clareira, no centro de Oratu, havia um lago de águas
escuras que refletia as poucas nuvens, as estrelas e a imensa lua
cheia. Um espelho d’água magnífico. Era como se o céu tivesse
doado uma parte de si para que pudéssemos contemplá-lo de
perto. Tão perto que podíamos tocar apenas esticando os braços.
Era ali onde eu ia quando queria relaxar. O cheiro daquela
parte específica da floresta me trazia a paz que nunca consegui
encontrar em outro lugar.
Numa dessas viagens a Oratu, embebido pela sensação de
poder, perdi completamente a noção do tempo ao perseguir um
animal. Ele era rápido e astuto, um coelho ou uma lebre, talvez...
Não conseguia vê-lo perfeitamente, mas seu cheiro deixava um
rastro que se destacava em meio à escuridão quase absoluta da
floresta. A minha concentração era plena e nada atrapalhava
meu foco. Quando estava conseguindo alcançá-lo, fui despertado
pelos gritos de minha professora.
— Hass! Acorda, Hass! — esbravejava, enquanto todos da sala
olhavam para mim, amedrontados pelo descontrole dela.
— Oi... — disse quase inaudível, com tanta vergonha que mal
erguia os olhos.
— Venha até aqui! — gritou enquanto sacava uma palmatória
de dentro da gaveta da mesa.
Na escola, os professores tinham a liberdade, com a anuência
dos pais, para disciplinar os alunos considerados malcriados
com uma palmatória de madeira, que parecia uma colher de pau
redonda com uns furinhos na concha.
Mesmo a contragosto, eu me obriguei a levantar e caminhei
até sua mesa vagarosamente enquanto notava todos os olhares
em mim. Minhas orelhas queimavam.
— Estenda sua mão! — gritou com uma voz estridente.
Geralmente eu não saio do sério tão rápido, mas esses gritos
eram tão desnecessários que me irritavam profundamente.
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— Hass, estenda a sua mão agora! — gritava ainda mais alto.
— Não — respondi, irritado. Ela e todos os alunos se
espantaram, afinal de contas, ninguém enfrentava a professora.
— Como é, mocinho? ESTENDA SUA MÃO AGORA! — berrou.
A veia saliente em seu pescoço dava a impressão que se romperia
a qualquer instante.
— Não fui malcriado! — respondi com um tom de voz alterado,
todo meu autocontrole havia ido embora. Uma pequena irritação
que estava dentro de mim tomou corpo. Com a respiração curta e
a testa franzida, eu a encarava profundamente, como um animal
prestes a atacar.
A professora se revoltou ainda mais quando percebeu que
todos prestavam atenção nela. Aquela atitude vinda de uma
criança era uma afronta à sua autoridade máxima em sala de
aula. Ela precisava fazer algo a respeito.
Numa última ação, com intuito de firmar sua autoridade, ela
puxou meu braço e tentou me bater com a palmatória.
Nesse instante, a minha respiração mudou, estava mais rápida
e intensa. Eu podia escutar meus batimentos, como se meu
coração pulsasse dentro da minha cabeça. O tempo desacelerou
e tudo ficou devagar. Isso ativou um gatilho em mim.
A selvageria tomou conta do meu corpo e pude me sentir
conectado a algo poderoso, assim como em Oratu. A sensação
era a mesma.
A irritação se transformou em raiva, a raiva se tornou ódio
profundo e me consumiu imediatamente. O braço da professora
avançava em minha direção, mas, antes que pudesse me atingir
com a palmatória, eu o agarrei no ar. Perdi a completa noção do
que estava fazendo. Meus dentes estavam cerrados com tanta
pressão que meu ouvido zumbia.
Senti o poder emergindo. Uma corrente de adrenalina passou
por cada extremidade de meu corpo, fazendo-o se arrepiar e
pulsar. Estava em êxtase, envolvido por uma espécie de aura
trazida por esse sentimento. A minha mente também havia sido
afetada, funcionava freneticamente, e eu tinha a certeza de que
poderia fazer qualquer coisa. Com pouco esforço, apertei o braço
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da professora como se ele fosse um mero graveto. Seus dedos
se encurvaram em direção à palma da mão à medida que eu os
apertava. Minhas unhas se afundaram em sua carne macia até
chegar aos ossos. Não havia resistência.
A palmatória escapou de sua mão, caiu e um enorme barulho
ecoou pela sala. Em seguida, ouvi o som agudo do arrastar de
cadeiras. Os alunos, assustados com o que viam, se levantaram
rapidamente, empurrando-as de qualquer maneira.
Por mais que a professora se esforçasse, não conseguia se
soltar. O terror era visível em seus olhos arregalados e no rosto
pálido como giz. Meu olhar estava tão focado nela que os outros
alunos desapareceram do meu campo visual.
— Solta, está me machucando! — implorou com um tom de
voz baixo e choroso, quase sussurrando. Expressava dor e seus
olhos marejaram.
Segurei o braço dela por mais alguns segundos enquanto a
encarava profundamente, como se pudesse olhar as fossas de
sua alma.
— Eu… não fui… malcriado! — A minha voz havia mudado.
Estava pesada e era difícil falar. Pareciam duas pessoas falando
através de mim.
Não suportando mais a dor, ela caiu de joelhos na minha
frente. As lágrimas escorriam pelo canto de seus olhos, que agora
piscavam rapidamente.
Quando decidi soltá-la, vi que em seu braço havia uma marca
tão negra e profunda que era fácil ver o desnível na pele.
Aos poucos a sensação de selvageria e poder foram recuando.
A minha respiração normalizou e estava leve, assim como todo
o meu corpo. Ao olhar para o lado, percebi que meus colegas
estavam todos de pé me encarando. Ignorei todos, fui em direção
a minha cadeira e me sentei. Por fora, agindo como se nada
tivesse acontecido, mas, por dentro, a vergonha começava a me
corroer quase que imediatamente.
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Foi sem dúvida um erro da minha parte ter chegado a esse
ponto. Talvez fosse melhor ter deixado que ela me disciplinasse
e nada disso teria acontecido, mas cobrar esse discernimento de
uma criança é muito complicado.
Apesar de reconhecer que foi uma conduta equivocada, não
existia remorso, arrependimento ou culpa pelo ocorrido, eu só
estava envergonhado de ter sido exposto a essa situação.
A curiosidade sobre o que acabara de acontecer me perturbava.
Uma tempestade de perguntas surgiu na minha mente, e eu não
sabia qual tentar responder primeiro.
A professora tentou se recompor, saiu fungando da sala, foi
em direção ao corredor e, mesmo que tenha se esforçado para
disfarçar, as lágrimas escureceram o tom azul de sua camisa e
entregaram a sua dor.
Poucos minutos depois, Augusto, o zelador, apareceu na porta
da sala, olhou para mim, ergueu a mão e fez um sinal para que
eu o acompanhasse.
— Hass, o diretor pediu para eu te buscar. Pelo tom de voz
dele, você está bem encrencado. O que foi que aconteceu? —
perguntou seu Augusto, me encarando.
Mesmo ele sendo uma das poucas pessoas que eu conversava,
não o respondi, apenas continuei caminhando. Não tinha como
explicar para ele o que tinha acontecido, afinal, nem eu mesmo
sabia.
Até chegar à diretoria, as únicas coisas que eu pensava era
como pude sair do sério daquela maneira e por que aquela explosão
de ódio me consumiu a ponto de me fazer perder o controle.
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Não é errado ir de encontro a alguém que age com autoritarismo,
tinha que reagir, não podia simplesmente deixá-la me bater. Mas
me expor daquele jeito... Será que essa foi a maneira certa de
resolver?
Augusto me olhava de relance esperando alguma resposta,
mas minha mente estava focada em outras coisas.
Não me lembrava daquele corredor ser tão grande. Parecia que
estávamos caminhando há horas e não chegávamos. O silêncio
só era rompido pelo som dos nossos passos.
Na diretoria, já com o braço enfaixado, a professora estava
de pé, ao lado da mesa do diretor. Em sua mão direita, havia
um pequeno lenço branco que usava para limpar seus olhos,
inchados de tanto chorar.
Antes que alguém pudesse falar, eu me antecipei.
— Professora, me desculpe. — Apesar de não sentir culpa,
acreditei que seria o melhor a se fazer naquele momento, dado a
todos os olhares julgadores sobre mim.
— Hass, isso foi muito grave! Você está conosco desde os
quatro anos e nunca tivemos problemas com você. O que houve?
— questionou o diretor Marcos com sua voz grave e inconfundível,
fitando-me profundamente, com os olhos por cima de seus
grandes óculos quadrados.
— Ah… Eh… Não importa — disse, constrangido. A vergonha
me consumia. Daria meu braço esquerdo para que aquela
situação se resolvesse o quanto antes.
— Você agrediu a professora? — perguntou com um tom de
voz muito sério.
— Nã… Sim. — Hesitei em responder. Na verdade, eu não
havia agredido ela, não na minha cabeça de sete anos.
— Hass, terei de suspendê-lo por cinco dias. Vou ligar
agora para sua mãe vir te buscar. — A expressão em seu rosto
demonstrava estar profundamente desapontado.
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— Tudo bem. — Me sentia envergonhado pela situação, mas
não deixava de encará-lo.
— Hass, vai pegar suas coisas e volte o mais rápido possível
— ordenou enquanto discava os números no telefone para o meu
desespero.
Trazer minha mãe para escola era, para mim, meu pior
pesadelo. Não por ela ser uma má pessoa, mas eu me sentia
péssimo de estar sobrecarregando ainda mais o fardo que
carregava.
Sem pestanejar, saí depressa e fui buscar a mochila.
No momento em que abri a porta da sala, os alunos, alguns
ainda de pé, me encaravam congelados. Caminhei até minha
cadeira, que ficava no final da quinta fila. Todos os olhares estavam
voltados para mim, ninguém dizia uma palavra, mas bastou que
eu passasse pela porta para poder ouvir os murmurinhos:
— Minha mãe tinha razão em não querer que eu andasse com
ele — dizia um.
— Ele sempre foi esquisito. Talvez seja doido — disse outro
aluno.
Estas frases ecoavam na minha cabeça no caminho de volta.
Será que eles tinham razão? Talvez eu seja louco. Isso explicaria
muita coisa.
Fiquei de pé na sala da diretoria com a mochila nas costas,
esperando, e andava devagar de um lado para o outro enquanto
o diretor assinava alguns papéis.
— Dá para você parar num canto? — perguntou o diretor
enquanto me olhava por cima dos óculos.
Acenei com a cabeça e encostei na janela, onde era possível ver
a entrada da escola. Senti que fiquei uma eternidade esperando
até que minha mãe surgisse esbaforida no portão de entrada
da escola, mas o relógio pendurado acima da mesa do diretor
marcava que eu estava ali há pouco mais do que 45 minutos.
— Bom dia, diretor Marcos! O que… houve? — ela perguntou
pausadamente enquanto percorria os olhos pelo braço da
professora.
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— Olá, Lúcia, bom dia! Por favor, sente-se, precisamos
conversar — respondeu ele. Aquela expressão séria não lhe saía
do rosto.
O diretor começou a explicar o que havia acontecido, mas,
assim que foi mencionada a palavra agressão, ela se virou pra
mim.
— Você agrediu a professora? — O olhar incrédulo lhe
estampou o rosto.
Nesse momento a minha cabeça despencou em direção ao
chão e parecia pesar mais do que todo o meu corpo. Não conseguia
encará-la. Nunca senti tanta vergonha em toda a minha vida.
Nem mesmo há duas semanas, quando ela entrou no quarto
sem avisar e eu estava com a bunda de fora procurando uma
cueca na gaveta do guarda-roupa.
— Olhe para mim! Você agrediu a professora? — dessa vez
esbravejou. Seu rosto estava escarlate.
— Não me agrediu. Ele segurou meu braço um pouco mais
forte e machucou… um pouco — para a minha surpresa, a
professora, ainda fungando, interveio por mim.
Isso fez com que os ânimos se acalmassem por um instante.
Mesmo se esforçando muito para disfarçar, a testa franzida
entregava o quão furiosa minha mãe estava.
— Posso ver seu braço? — Ela caminhou em direção à
professora com um sorriso forçado no rosto.
— Pode sim, mas tenha cuidado, ainda dói um pouco —
respondeu a professora.
Assim que ela desenfaixou, notei que a marca negra estava
maior e cobrindo o antebraço inteiro. Os olhos da minha mãe
se arregalaram quase saltando das órbitas, mas tentou disfarçar
logo em seguida, trocando a expressão de espanto do rosto por
uma mais apática.
De dentro da bolsa, minha mãe puxou um frasco azul... talvez
verde... não sei dizer que cor era aquela, ele possuía um leve
brilho oscilante.
— Tome, fará efeito em poucos minutos e a dor vai sumir —
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disse ela, entregando para a professora um único comprimido,
que o engoliu sem hesitar.
Minha mãe veio na minha direção e me entregou a bolsa dela.
— Segure! — disse ela com um olhar raivoso.
Com a bolsa apoiada no meu colo, ela abriu e vasculhou em
meio à bagunça algo muito específico. Era como uma mistura
de farmácia, com maquiagens, perfumes, cremes, chaves, um
livreto, balas e um chocolate que vi de relance lá dentro. Talvez
até pedisse se a situação fosse outra, mas não quis forçar a barra.
Tinha tanto treco dentro da bolsa que minha mãe demorou
uns dois ou três minutos para encontrar o que procurava: uma
pequena bisnaga branca que parecia um creme para as mãos.
Ela se voltou para a professora.
— Esse creme precisa ser aquecido antes de aplicar para fazer
o efeito desejado — disse ela, tornando a exibir um sorriso forçado
no rosto enquanto espremia o creme em suas próprias mãos e o
esfregava.
Minha mãe soprou ar quente para dentro de suas mãos e o
mesmo brilho que estava no frasco de remédio surgiu entre os
seus dedos.
— O que... — sussurrei enquanto forçava as vistas para tentar
ver melhor o que estava acontecendo.
Apesar de estarmos olhando para a mesma direção, o diretor
e a professora pareciam não ver o que eu estava vendo.
Assim que minha mãe percebeu que eu notei, tentou em vão
bloquear a minha visão, colocando o ombro direito na frente.
Era um pouco tarde para fazer aquilo, já havia visto e despertou
ainda mais a minha curiosidade.
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No caminho de volta, ouvi um sermão para uma vida inteira.
“Você não tem juízo? O que pensou que estava fazendo? Será que
eu não posso mais confiar em você, Hass? Você sabe o quanto eu
trabalho...”. Ela estava cuspindo fogo. A minha sorte é que ela
não era um dragão, ou eu já teria sido incinerado. Eu permaneci
calado até entrarmos em casa, quando a porta se fechou.
— O que a senhora fez com o braço da professora? — questionei
sem rodeios.
— Do que está falando? Quem a machucou foi você! —
retrucou, se afastando de mim, indo em direção à sala.
— Não estou falando disso, mãe! O que eram aqueles brilhos?
— perguntei de maneira mais incisiva, indo atrás dela.
— Brilhos? — Era uma tentativa frustrada de mudar de
assunto. Ela fingia procurar algo na estante próxima à televisão,
revirando as coisas, abrindo e fechando a mesma porta algumas
vezes.
— Que saíam daquele frasco e dá sua mão quando a senhora
soprou antes de tocar na marca no braço... — Ela não me deixava
terminar de falar.
— Como é? Qual brilho, Hass? Marca, qual marca? Não sei do
que está falando! — disse ela, enfurecida, sentando-se no sofá,
arrancando os sapatos dos pés e jogando-os longe.
— A senhora me disse que mentir é errado! — Meu tom de voz
havia se alterado.
— HASS, VÁ PARA O SEU QUARTO! — gritou ela, algo que
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raramente fazia. Levantou-se de uma só vez, respirando fundo
para se controlar. Dava para notar que a paciência dela estava
por um fio.
— O que... — Ela nem esperou que eu completasse a frase.
— Hass, pro seu quarto! Não vou repetir! — ordenou ela.
Tinha uma ferocidade estranha em sua voz que fez meu coração
gelar. Era melhor obedecer naquele momento, mas isso não seria
esquecido.
Eu estava com muita raiva, podia sentir meu corpo pulsar em
razão disso. Meus punhos estavam cerrados com tanta força que
minhas mãos tremiam.
Subindo os degraus da escada, senti algo escorrendo pelos
meus dedos. Abri a mão lentamente, de olhos arregalados,
observando incrédulo minhas unhas ensanguentadas. Elas
estavam grandes, grossas, pontiagudas e escuras. Três gotas
caíram no chão. Entre um piscar de olhos e outro, elas voltaram
ao normal.
Ainda no meio da escada, uma troca de olhares intensa
aconteceu. Durante alguns segundos, nos encaramos fixamente
e, pela primeira vez, pude notar um sentimento que até então não
havia manifestado em minha mãe: era medo!
Os dias se passaram, e eu permaneci pensativo sobre o que
havia acontecido. A vergonha que eu sentia por ter sido exposto
àquela situação já havia cessado, mas a minha curiosidade, não.
Questionava o porquê daquela marca negra e como eu havia
parado o braço da professora. De onde veio tanta força?
Olhava meu reflexo no espelho, fazendo poses, tentando ver os
músculos dos meus braços, para saber se eram tão fortes assim.
Foi uma cena triste, nessa idade parecia que meus músculos
estavam por dentro dos ossos.
Sem dúvida, o que mais me martirizava era tentar entender
por qual motivo minha mãe estava mentindo daquele jeito pra
mim. Do que ela tinha medo? O que estava acontecendo comigo?
A vida em casa ficou tensa. Nos dirigíamos a palavra apenas
quando necessário. O que aliviava essa tensão era que minha
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mãe trabalhava em dois turnos no hospital da cidade e não ficava
muito tempo dentro de casa.
Lembro que, depois daquele episódio na escada, quando
acabei me cortando com minhas próprias unhas, comecei a
observá-las com mais cuidado. Na manhã seguinte, elas estavam
normais, talvez um pouco maiores. Eu as inspecionava de perto,
procurando quaisquer vestígios do que havia acontecido, mas
não via nada.
Nos dois primeiros dias, quando havia cansado de apenas
observar, resolvi cortá-las. Foi aí que descobri algo interessante:
elas cresciam numa velocidade anormal! Não sei ao certo se foi
por conta desse incidente, ou se já eram assim, mas só agora eu
havia reparado.
Logo após cortá-las, percebi que depois de poucas horas elas
já cresciam de volta uma fração considerável. No final do dia, as
unhas voltavam ao tamanho de antes.
Porém, existia um detalhe. A cada novo corte, as unhas se
tornavam mais grossas e mais resistentes. Chegou num momento
que eu não conseguia mais cortar nem uma lasquinha delas.
Quando minha mãe me liberou do castigo, eu tinha um frasco
cheio de unhas.
Terminando a suspensão, voltei ao colégio e a primeira coisa
que fiz foi procurar pela professora para saber como estava. Não
cheguei a falar com ela diretamente, mas a vi pela fresta de uma
porta enquanto dava aula, berrando com outros alunos sem a
faixa no braço. Havia se recuperado.
No corredor, as pessoas me olhavam e cochichavam a meu
respeito. Esse episódio com a professora foi o suficiente para que
eu me tornasse oficialmente uma “má influência” e isso fez os
outros alunos se afastarem mais de mim.
Se tem um lado bom nisso tudo, seria esse, já que meu interesse
em socializar com os outros tendia a zero. O resultado dessa
história acabou me ajudando mais do que eu podia imaginar.
Talvez até tivesse valido a pena passar por toda aquela vergonha.
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Até então, parecia que essa fase da minha infância seria
superada, e eu seria uma criança normal, mas o que estava
prestes a acontecer mudou tudo.
Cerca de quinze dias depois do primeiro incidente, outra
coisa bem estranha aconteceu comigo. Numa tarde de domingo,
durante um passeio pelo parque com a minha mãe, resolvi sair
para explorar um pouco as redondezas. Nada muito longe, pois
assim ela não me perdia de vista nem um momento sequer.
Éramos apenas nós dois desde que me lembro.
Enquanto vagava próximo a algumas árvores, observando a
trilha que as saúvas faziam e chutando algumas pedras para
longe, escutei um som que me lembrou o choro de cachorro.
Apurei a audição e ergui a cabeça tentando ver de onde vinha.
Não demorou muito e ouvi alguns ganidos desesperados vindos
de longe. Parecia que o animal precisava de ajuda urgente, então
parti afoito na direção do som.
Um pouco mais à frente, avistei um garoto que apedrejava um
cachorro de rua. O animal estava com as costelas em evidência
e a barriga tão murcha que se curvava para dentro e parecia
tocar em suas costas. O corpo coberto de sarnas, com manchas
escuras, só sustentava pequenos tufos de pelos. Ele estava tão
debilitado que se encolheu num canto, tremendo, com as orelhas
baixas e com o rabo entre as pernas enquanto chorava.
Ele havia desistido de lutar, mas antes de se entregar ao
abraço frio da morte, ele mirou em minha direção com aqueles
olhos chorosos, implorando por ajuda. Um pedido de socorro
para sua alma. Talvez a sua desistência pela vida tenha sido o
jeito mais fácil que ele encontrou de se livrar da sua agonia.
Sua tristeza me comoveu e resolvi enfrentar aquele garoto.
Eu já tinha o visto algumas vezes, pois frequentávamos a mesma
escola. Ele deveria ter seus treze ou quatorze anos e sempre foi o
típico valentão, porém, nunca tivemos atrito.
— QUAL É O SEU PROBLEMA? — gritei com um nó tão forte
na garganta que parecia ter um limão preso ali.
Ao ser confrontado, o garoto congelou com a expressão de
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susto em seu rosto, os olhos ligeiramente saltados das órbitas e
boquiaberto. Ficou tão pálido quanto uma ovelha e deixou cair a
pedra que segurava em sua mão. Ele estava num canto remoto
do parque e não imaginou que alguém pudesse encontrá-lo. Logo
voltou ao normal quando percebeu que era apenas outra criança,
começou a rir e a debochar.
— Olha quem está aqui, se não é o maluco da escola. O que vai
fazer comigo? Vai me bater igual fez com a professora? Acha que
consegue? Tenta a sorte, idiota! — Ele abaixou e pegou a pedra
que deixara cair, olhou para o cachorro e para mim e ameaçou
jogar a pedra no cão.
— NÃO FAZ ISSO! — gritei mais uma vez.
— Quem vai me impedir? Você? O maluco da escola vai me
impedir? — perguntou em tom de deboche.
— Vou! — respondi firme.
Foi o suficiente para que ele corresse na minha direção e me
atingisse com um soco no rosto. Eu caí deitado, mas consegui
reagir depressa. Chutei o joelho dele com força e o garoto se
desequilibrou caindo de cara no chão. Quando levantou o rosto
da grama, seu nariz estava ensanguentado e pingando sobre sua
camisa de time. Trocamos socos e chutes enquanto rolávamos no
chão numa briga acirrada.
Por mais que eu buscasse me conectar com algo mais
poderoso, atrás daquela força, da selvageria, não consegui. O
único golpe que fez algum efeito contra o garoto foi um arranhão
que eu dei em seu rosto. Ele parou de tentar me socar e levou as
mãos em cima do machucado. Rapidamente se pôs de pé, pegou
uma pedra grande e me atingiu na cabeça. Nesse momento,
minha visão embaçou e um som agudo invadiu meus ouvidos,
mas, antes de apagar completamente, pude escutá-lo gritar.
Tudo ficou preto.
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Acordei numa cama de hospital com o cheiro de éter fortíssimo
invadindo o meu nariz e com a visão turva. Do meu lado direito,
estava minha mãe, sentada numa poltrona azul-marinho gasta
e pouco acolchoada. A expressão de cansaço em seu rosto era
tão marcante que, mesmo quando estava dormindo, era possível
perceber. Com a testa franzida e com as olheiras tão escuras que
lembrava um panda, ela dormia agarrada com um lenço e com
uma manta que mal lhe cobria as pernas.
Havia uma TV antiga fixada na parede, mas, com as minhas vistas
embaçadas e com o incômodo da claridade, era impossível assistir a
qualquer programa. A única coisa que percebi da imagem era que
estava em preto e branco, mas, pelo som, passava o jornal local.
Eu estava tão cansado que resolvi dormir outra vez. No
entanto, antes de adormecer, fiquei pensando naquele cachorro
que tentei defender e o que tinha acontecido com ele, e que fim
teria tomado o outro garoto.
Com essas ideias em mente, eu acabei dormindo. Pouco tempo
se passou e um pesadelo tomou conta do meu sono até então
tranquilo. Esse seria um dos maiores traumas da minha infância.
Nesse pesadelo, a briga não tinha acabado no momento em
que fui atingido na cabeça. O garoto continuou a me bater até
que parte do meu crânio se abriu e o meu cérebro ficou exposto e
com pequenas partes dele cobrindo o chão. O cachorro que tentei
defender se transformou num monstro. Sua boca era enorme e
seus dentes pontiagudos se estendiam de uma orelha a outra.
Ele babava tanto que gotejava no chão. A língua negra para fora
da boca continha feridas das quais vermes brancos brotavam aos
montes.
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Esse monstro se aproximou de mim e começou a me devorar
ainda vivo. Mordia e arrancava partes dos meus pés, subindo em
direção a minha coxa, rasgando a pele, músculos e tendões. A
dor era excruciante. Para piorar, eu não conseguia me mover por
mais que tentasse, estava paralisado.
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Acordei gritando em desespero.
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— Coma… O que é coma? — assustado, perguntei a ele. Agora
ele tinha a minha total atenção.
— Sim, Hass, você dormiu por três dias — ela respondeu com
a voz fraca.
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ponta do dedo contra o couro cabeludo, tentando sentir a textura
do corte.
— Sério? Está bem aqui ao lado do... cadê o... mas... — Ele
não conseguia completar a frase.
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— Tá certo, Lúcia, agora pare de me olhar assim! E você vai ter
que assinar um termo de responsabilidade. — Ainda massageando
a têmpora. — Você sabe que se algo acontecer com ele... — O
médico foi interrompido por ela.
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Quando finalmente chegamos em casa, minha mãe me
perguntava o tempo inteiro se eu estava me sentindo bem, se não
estava tonto ou enjoado. E, mesmo confirmando que estava tudo
bem, parecia que alguma coisa na minha voz despertava nela um
sinal de alerta.
Toda essa situação era muito estranha para mim. Não sabia
como me comportar com esse excesso de atenção repentina.
Não que minha mãe fosse displicente comigo, mas tê-la me
vigiando como gavião pairando no ar antes de dar um bote era
desconfortável. Toda vez que eu acreditava estar só, me assustava
com ela à espreita num canto a me observar. Eu entendia a
sua preocupação e ainda que sem sucesso, continuava a tentar
tranquilizá-la de alguma maneira.
— Oi, mãe, tudo bem? Não foi nada não — respondi, acelerado,
olhando para o corredor e tentando disfarçar enquanto o suor
escorria pela testa.
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muita frequência, me lembro dela sentada ao meu lado na cama
lendo alguns versículos até que eu pegasse no sono. Tive que
fingir estar dormindo para que minha mãe retornasse ao quarto
dela e descansasse pelo resto da noite. Fiquei com medo de dormir
e acordar gritando desesperado com ela ao meu lado, isso poderia
acender de novo o estado de alerta e vigília constantes.
Mas o que, afinal de contas, seria latim? Fui embora com essa
dúvida.
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me incomodava mais. No intervalo, sentado no mesmo banquinho
de sempre, algo chamou a minha atenção. O valentão, o garoto
com quem tinha brigado, não estava mais por lá.
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dormir, senti o divã diferente, parecia mais rígido. Acho que era
outro, pois não me lembrava daquela pequena curva que ele fazia
perto dos pés. Se bem que da outra vez que estive no consultório
eu só desmaiei e não tinha notado detalhe algum, nem mesmo
a cor. A psicóloga percebeu a janela de oportunidade e não a
desperdiçou.
— Estou vendo que esse é dos brabos, hein? Mas não precisa
ter medo, pode confiar em mim. — Tinha algo no tom de voz
dela que me transmitia segurança, paz e tranquilidade. Talvez eu
pudesse confiar nela.
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— Apenas entre nós, Hass. Sua mãe não precisa saber de
tudo que acontece aqui, eu apenas informo o básico e pego
algumas informações com ela para entender melhor o contexto —
respondeu com um ar complacente.
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— Hass, eu sei que você passou por uma situação traumática
e pesadelos são normais, porém, os seus estão te afetando muito.
Precisamos dar um jeito nisso. Concorda comigo? — perguntou
num tom de voz vibrante, e eu acenei positivamente com a cabeça.
— Vou precisar que você seja muito corajoso, tudo bem? — ela
disse me encarando, como se pudesse ver através de mim.
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— Hass, o que você viu? — perguntou a psicóloga.
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RESUMO DO QUE
ACONTECEU ATÉ AQUI
- Escola: a rotina chata e entediante de um
aluno antissocial;
- As viagens para Oratu não terminam bem;
- Incidente na escola: discussão e “ ataque” à
professora;
- Um brilho verde/azul muito suspeito: o que
era aqui? Bruxaria?;
- Novo incidente: luta com o colega da escola
para defender um cachorro;
- Recebendo alta depois de um coma de três
dias no hospital;
- Tortura diária: pesadelos vívidos;
- Um fio de esperança: início da terapia com
Hestefânia;
- Princeps Lycantrhopy e o coral macabro.
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