Aprendizagem Completo
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Aprendizagem Completo
Aprendizagem
Diversidade, Dificuldades e Transtornos de Aprendizagem
Revisão Textual:
Prof. Me. Luciano Vieira Francisco
Revisão Técnica:
Prof.ª Me. Cássia Souza
Diversidade, Dificuldades e
Transtornos de Aprendizagem
OBJETIVOS DE APRENDIZADO
• Discutir as principais dificuldades e problemas de aprendizagem com especial atenção para
o respeito às diferenças individuais e à diversidade nos contextos educacionais.
• Conhecer os principais transtornos e dificuldades de aprendizagem, refletindo sobre o ex-
cesso de diagnósticos equivocados e a medicalização da educação.
UNIDADE Diversidade, Dificuldades e Transtornos de Aprendizagem
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Em todos os casos, precisamos ser cuidadosos e não nos esquecermos de que todos
podem aprender, desde que lhes sejam dadas condições apropriadas de ensino.
É fato que todos aprendemos com o mesmo tipo de cérebro humano e é fato
também que somos limitados em nossa condição humana. Por mais esforço que se
faça, um ser humano não pode desenvolver asas e aprender a voar, como também
não poderá aprender a correr mais rapidamente do que a velocidade de um carro,
mesmo com muito treino. Todos somos limitados por nossa natureza biológica em
algum aspecto. A essas condições dadas pela biologia de nossa espécie chamamos
de filogênese ou filogenia, que se refere ao que é possibilitado a um organismo de
acordo com a evolução de sua própria espécie (MARTINS; VIEIRA, 2010).
Além disso, nossa aprendizagem é também mediada por uma cultura. O que
aprendemos em nossa ontogênese dependerá em boa parte da cultura em que es-
tamos. Comportamentos, conhecimentos e valores podem ser muito diferentes nas
diversas culturas existentes. O que é valorizado em uma cultura, pode ser rejeitado
em outra. Usar o sinal de positivo com o polegar, sinal comum para brasileiros, pode
ser ofensivo em outras culturas, como mostrar o dedo médio em algumas culturas
pode ter outros significados que não tão ofensivos quanto na cultura brasileira.
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UNIDADE Diversidade, Dificuldades e Transtornos de Aprendizagem
Nesse sentido, mais recentemente temos discutido muito também sobre o con-
ceito de epigenética ou epigênese, isto é, a relação entre a genética e os fatores
ambientais. Esse conceito ajuda a avançar a compreensão da ação de genes, pro-
teínas, neurônios e do ambiente (incluindo a cultura) no desenvolvimento humano.
O que somos está previsto em nosso código genético, nosso ácido desoxirribonu-
cleico (DNA), mas em verdade o que lá está é só a receita de um bolo – e não o bolo
inteiro. Nosso DNA se expressa na interação com o meio ambiente. Fatores externos
como estresse, calor, frio, fome etc., podem influenciar não só no desenvolvimento
embriológico ainda no ventre materno, como por toda a nossa vida.
Problemas de Ensino e
Dificuldades de Aprendizagem
Antes de ingressar nas escolas a maioria das crianças não tem dificuldades de
aprendizagem acentuadas. Muitas diferenças passam despercebidas pelas famílias,
pois as aprendizagens acontecem de forma incidental e sem avaliações. É comum
que os pais observem que um filho aprendeu a falar ou andar antes do outro, mas
isso normalmente não é motivo de preocupação a menos que sejam diferenças muito
marcantes, como uma criança que ainda não aprendeu a falar aos 3 anos de idade,
já que normalmente as crianças começam a falar por volta do primeiro aniversário.
Contudo, a maioria das crianças passa a enfrentar problemas de aprendizagem
quando ingressa na escola e se compara a outras crianças, esperando que as
aprendizagens ocorram de forma semelhante (CIASCA, 2003).
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A aprendizagem infantil está intimamente ligada ao desenvolvimento da criança e
pode ser influenciada tanto pelo ambiente de aprendizagem formal, isto é, a escola
ou os professores, quanto por condições orgânicas, condições emocionais e a pró-
pria estrutura familiar. Existem diversas características individuais que influenciam na
aprendizagem, desde síndromes genéticas, distúrbios específicos de aprendizagem,
condições neurológicas e até mesmo características culturais, diferenças linguísticas
e de conhecimentos básicos (PAULA et al., 2006).
Igualdade não significa equidade em educação. Não basta oferecer tudo igual para
quem tem necessidades diferentes. Ofertar educação equitativa é dar mais a quem
precisa mais. Se para aprender a ler uma criança precisa de óculos, então é preciso
dar óculos para essa criança, não para todas as crianças. Nesse sentido, precisamos
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UNIDADE Diversidade, Dificuldades e Transtornos de Aprendizagem
entender que ao inserir crianças com necessidades especiais diferentes em uma mesma
sala precisamos dar aquilo que cada uma precisa – e não apenas colocá-las junto
às demais, correndo-se o risco de prejudicar e estigmatizar ao invés de ajudar essas
crianças.
Como uma professora pode lidar ao mesmo tempo com 25 crianças com
desenvolvimento típico, mas características e necessidades individuais diversas, e
mais uma criança com paralisia cerebral, uma criança surda, uma criança autista e
uma criança com síndrome de Down em uma única sala? Essa professora precisa
oferecer, pelo menos, cinco tipos diferentes de instruções para que possa garantir
que todos estejam sendo de fato atendidos. Não basta ofertar apenas um tipo de
instrução para todas essas crianças. Ademais, como saber se a professora tem
recursos e conhecimentos para lidar com todos? Como saber se sabe, por exemplo,
comunicar-se por Linguagem Brasileira de Sinais (Libras) e fazer uso de comunicação
alternativa e ampliada para crianças com paralisia cerebral e de ABA – Applied
Behavior Analysis – para a criança autista?
Não podemos nos esquecer que mesmo quando as crianças têm desenvolvimento
típico também podem ter mais dificuldades em aprender certos conteúdos. Aprender
a ler não é o mesmo que aprender a falar, não é o mesmo que aprender Geografia
e muito menos aprender a dançar. Diferentes aprendizagens implicam em diferentes
necessidades de recursos para essa aprendizagem. Quando vamos nos desenvolven-
do vamos adquirindo uma série de conhecimentos e habilidades que podem facilitar
algumas aprendizagens e não outras. As pessoas têm histórias de vida diferentes e
essas experiências e conhecimentos proporcionam diferentes formas de aprender.
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de palavras ouvidas a menos, fazendo com que as crianças mais pobres conheçam
pouco mais da metade do vocabulário que as mais ricas. Essas diferenças não são
apenas quantitativas, mas também qualitativas, o vocabulário também é mais variado
e complexo quando se tem mais anos de escolarização.
Os primeiros anos de vida são cruciais para o desenvolvimento infantil. Nos seis pri-
meiros anos as crianças desenvolvem a arquitetura cerebral com base nas experiências
e interações que têm com o ambiente. Experiências positivas fortalecem as conexões,
criando uma estrutura sólida para as futuras aprendizagens. A neuroplasticidade é
maior nesse período e ajudará, por exemplo, a contornar alguns possíveis problemas
que poderiam ser mais complicados se a criança fosse mais velha. Quanto mais cedo
as crianças receberem estimulação apropriada, melhor será para que tenham mais
chances de acompanhar seus pares de idade (COSENZA; GUERRA, 2011).
Por outro lado, a criança que começa com dificuldades, sentirá que não é capaz
e tentará evitar a leitura, dirá que não gosta de ler, abaixará a cabeça para não ser
chamada para ler. Evitará ter contato com livros, gibis e revistas e a professora pro-
vavelmente não a chamará para ler na frente da turma até para evitar expô-la. Mas
isso tudo fará com que ao longo do tempo as diferenças mínimas sejam ampliadas a
ponto de que o que era uma diferença entre saber ler poucas palavras também será
uma diferença entre fluência em leitura, compreensão de textos e um vocabulário di-
versificado e amplo, além de conhecimentos gerais obtidos pela leitura. Na Figura 1
está um esquema que ilustra o efeito Matheus.
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UNIDADE Diversidade, Dificuldades e Transtornos de Aprendizagem
Habilidades de leitura
Bons leitores
Maus leitores
Idade/Escolaridade
Contribuição Contribuição
do aluno do professor
Contribuição Contribuição
Aprendizagem
do aluno do professor
Contribuição Contribuição
do aluno do professor
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O que acontece com a maioria das nossas crianças brasileiras? Trazem para
a escola muito pouco e recebem menos ainda. As crianças chegam com poucos
conhecimentos de base e se deparam com instruções pouco claras e diretivas. Nas
escolas públicas há ênfase em proposições teóricas contrárias a materiais estruturados
e que deixam as crianças livres para aprenderem ao seu modo. O problema é que
só conseguiriam se tivessem uma base comum de partida, chegando com pouco
apenas ficam em desvantagem ainda maior com quem recebe instrução diretiva em
uma escola particular e já possuía bons conhecimentos de base (HAASE; JULIO-
COSTA; SILVA, 2015).
Não é difícil entender o porquê, então, muitas crianças passam a ter dificuldades
de aprendizagem quando ingressam nas escolas, instituições estas exigentes de que a
aprendizagem ocorra de modo relativamente igual para todos, mas nem todos têm as
mesmas condições de aprender com as mesmas instruções. Muitas crianças, portanto,
não têm dificuldades ou problemas patológicos de aprendizagem, mas sim problemas
de “ensinagem”. Ou seja, o problema está no ensino que recebem, nas condições ex-
ternas que afetam a aprendizagem. É claro que assim como não devemos culpabilizar
as crianças, não estamos também culpabilizando os professores, mas apenas alertan-
do para o fato de que na relação ensino-aprendizagem é preciso analisar também as
questões do ensino que influenciam no processo de aprendizagem.
Transtornos Específicos
de Aprendizagem e Outros
Transtornos do Neurodesenvolvimento
Definir o que são distúrbios de aprendizagem não é uma tarefa simples, pois há
diversos termos comumente usados para se referir aos problemas relacionados à
aprendizagem, por exemplo, “dificuldades”, “distúrbios”, “problemas”, “discapacida-
des” e “transtornos”. Como se trata de um tema de interesse interdisciplinar, diferen-
tes profissionais, como médicos, educadores e psicólogos utilizam terminologias e
enfoques distintos. Contudo, distúrbios e transtornos são tipicamente usados como
sinônimos para se referir a uma manifestação clínica de uma disfunção do sistema
nervoso central (SOUZA; SANTUCCI, 2009), persistindo mesmo com o ensino
apropriado. Portanto, são diferentes os problemas de aprendizagem, podendo ser
pontuais, de origem externa ao indivíduo e sanados com ensino apropriado.
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UNIDADE Diversidade, Dificuldades e Transtornos de Aprendizagem
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Segundo o Manual de diagnóstico e estatístico dos transtornos mentais
(AMERICAN PSYCHIATRIC ASSOCIATION, 2013), os transtornos de aprendizagem
estão classificados como transtornos do neurodesenvolvimento na classificação mais
atual do DSM-V. Os transtornos de neurodesenvolvimento englobam alterações dos
processos iniciais do desenvolvimento cerebral que persistem ao longo da vida. Têm sua
origem no período gestacional ou na infância e envolvem déficits na interação social e
nas habilidades de comunicação que dificultam, dentre outras coisas, a aprendizagem
dentro e fora das escolas. Os principais transtornos de neurodesenvolvimento são
Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH); Transtorno do
Espectro Autista (TEA) e Transtornos Específicos de Aprendizagem (TEAp)
(AMERICAN PSYCHIATRIC ASSOCIATION, 2013).
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UNIDADE Diversidade, Dificuldades e Transtornos de Aprendizagem
Muitos autistas podem ter inteligência normal ou até acima da média, com um
interesse predominante por diferentes temas, tais como dinossauros, carros, trens
e animais. Podem apresentar estereotipias comportamentais, comportamentos
repetitivos, alterações sensoriais e preferência por rotinas que, se quebradas, levam
a reações emocionais. Podem apresentar ecolalia, que é a repetição de palavras
(AMERICAN PSYCHIATRIC ASSOCIATION, 2013).
Existem pessoas com TEA que apresentam fala e comunicação verbal apropria-
das e com bom desenvolvimento nas escolas. Contudo, apresentam dificuldades qua-
litativas na comunicação e aproximação social, na leitura do ambiente e do contexto
social, na percepção das emoções, interesses restritos e alterações sensoriais.
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• Dislexia: é um dos subtipos mais conhecidos e se refere a uma dificuldade
acentuada na aprendizagem da leitura (decodificação) de palavras isoladas, nor-
malmente refletindo insuficiência do processamento fonológico. Ainda não se
sabe exatamente quais os mecanismos envolvidos na dislexia, mas a hipótese
mais vigorosa é de um déficit no processamento fonológico dificultaria também
o processamento de letras em paralelo;
• Disgrafia: é a dificuldade específica em relação à escrita, sendo manifestada
com dificuldades de ortografia e caligrafia. Como muitas crianças apenas são
consideradas como tendo a “letra feia”, esse transtorno acaba sendo menos
diagnosticado do que a dislexia e é menos conhecido;
• Discalculia: é o transtorno específico da Matemática e não está relacionado à
total falta de habilidades matemáticas, mas sim na maneira como a pessoa usa
esse conhecimento, por exemplo, para fazer cálculos.
Considerando que todos temos dificuldades em alguma coisa, pense em alguma dificuldade
de aprendizagem que você teve. Por que você teve essa dificuldade? Quais eram os fatores
envolvidos? Como você resolveu?
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UNIDADE Diversidade, Dificuldades e Transtornos de Aprendizagem
Nesses casos, a mudança necessária não está diretamente na criança, mas sim em
seu ambiente. Pode ser difícil de mudar todo o ambiente ao redor da criança, mas
é preciso explorar todas as possibilidades ao invés de apenas rotular uma criança
como tendo dificuldade de aprendizagem ou algum tipo de patologia. A rotulação
de crianças com problemas de aprendizagem é comum e antiga (ANTUNES, 2003),
isso causa uma série de marcas nas crianças e afeta suas relações interpessoais
presente e futuras. As crianças rotuladas deixam de ter um nome e passam a ser o
rótulo de uma patologia sem que tenham condições de mudar a própria condição.
Assista ao filme “Preciosa – uma história de esperança” –, de 2010 e dirigido por Lee
Daniels. Assista ao trailer: https://youtu.be/06ZF3zw1gHs
Nos últimos anos tem havido um crescente número de crianças que são medica-
das a partir de diagnósticos questionáveis e que não consideram toda a complexidade
dos processos de aprendizagem. Não é incomum, por exemplo, observar relatos de
crianças que tenham dificuldades de concentração na idade infantil. Muitos professo-
res e até mesmo psicólogos acabam desconsiderando o desenvolvimento das funções
executivas que acontece principalmente após os seis anos de idade e acreditam que
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crianças com quatro anos deveriam ficar sentadas por quatro horas sem se mexer,
prestando contínua atenção em uma aula. Isso não é possível e nem desejável. Rotu-
lar essas crianças como tendo TDAH é um risco enorme e que leva à estigmatização
em sala de aula e na vida de modo geral, além do encaminhamento errado da situa-
ção e do uso de medicamentos como a Ritalina, podendo, inclusive, prejudicar todo
o restante do desenvolvimento neurológico.
Quem são as crianças que são encaminhadas para atendimento psicológico? Se-
gundo Souza (2015), uma análise de prontuários de queixas escolares mostrou que
a média de idade das crianças atendidas era de 9,3 anos, sendo que 70% eram
meninos. O motivo mais frequente de encaminhamento era o que os educadores
denominam problemas de aprendizagem atrelados a problemas de atitudes em sala
de aula (26%), ou somente problemas de aprendizagem (24%), ou ainda problemas
de atitudes (19%). Ou seja, a soma dos motivos de encaminhamento mostra que 69%
das crianças apresentavam problemas na aprendizagem ou atitudes consideradas
inadequadas em sala de aula.
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UNIDADE Diversidade, Dificuldades e Transtornos de Aprendizagem
Essas queixas escolares, para Souza (2015), sumarizam um pouco dos principais
motivos de encaminhamento de crianças para serviços de atendimento psicológico
e revelam que, em sua grande maioria, as queixas ainda são atribuídas às crianças.
São as crianças que trocam letras, elas que não aprendem, brigam com os colegas,
desobedecem a regras estabelecidas, são nervosas ou choram muito, não sabem se
defender ou se defendem até demais. Essas queixas ignoram a importância e o papel
dos professores e das escolas nessa relação de ensino-aprendizagem.
Outro problema apontado por Souza (2015) é que muitas escolas acabam pra-
ticamente obrigando os pais a buscarem ajuda psicológica para seus filhos, sem
considerar seu próprio papel diante da aprendizagem. Isso leva os pais a procurarem
diversas alternativas e profissionais para entender o que acontece com seus filhos,
o que pode levar também a uma medicalização do processo de escolarização. Além
disso, tantas investigações que eximem o papel da escola só podem concluir que o
problema está na criança – e não na escola.
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Em Síntese
Com esta Unidade completamos nossa aprendizagem das principais teorias clássicas e
contemporâneas da aprendizagem, visando lhe introduzir neste campo instigante de
estudos que nos revela que a aprendizagem não acontece apenas nas escolas, mas em
todos os lugares e o tempo todo. Além disso, para aprender precisamos considerar o nos-
so corpo todo, o que certamente inclui o cérebro como o centro do processo da aprendi-
zagem. Somos seres biopsicossociais e precisamos entender que todas essas dimensões
afetam na aprendizagem.
O mundo está mudando e precisamos considerar essas mudanças nos processos de
ensino-aprendizagem. Precisamos considerar os diferentes tipos de aprendizagem e as
diferenças individuais que podem afetar a aprendizagem. Entendendo que nem sem-
pre essas dificuldades são patológicas, na maioria dos casos ocorrem apenas devido a
diferenças individuais e são influenciadas por questões ambientais, como a escola e os
professores. Bons docentes podem fazer a diferença ao oferecer condições apropriadas
de ensino para todos.
Esse entendimento é importante para evitar a rotulação e a patologização dos processos
educacionais, e a medicalização da educação pode trazer mais prejuízos do que benefí-
cios. Contudo, não podemos nos enganar e esquecer de quem de fato precisa de trata-
mento específico. Existem transtornos do neurodesenvolvimento e mais especificamen-
te transtornos de aprendizagem que necessitam ser identificados apropriadamente e
tratados para que todos possam ter condições de aprendizagem. Evitar a patologização
e a medicalização não pode levar à descrença nas evidências e ao negacionismo de dis-
túrbios que afetam a vida de milhares de crianças e que podem ser tratados apropriada-
mente, oferecendo melhores condições de vida.
Para concluir, nunca se esqueça de que todos podem aprender, desde que lhes sejam
dadas condições apropriadas de ensino. Que você possa continuar sempre aprendendo
por toda a sua vida!
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UNIDADE Diversidade, Dificuldades e Transtornos de Aprendizagem
Material Complementar
Indicações para saber mais sobre os assuntos abordados nesta Unidade:
Livros
Na vida Dez, na Escola Zero
CARRAHER, T. N.; CARRAHER, D. W.; SCHLIEMANN, A. D. Na vida dez, na
escola zero. São Paulo: Cortez, 1988.
Por que o Construtivismo não funciona? Evolução, Processamento de Informação e Aprendizagem Escolar
HAASE, V. G.; JULIO-COSTA, A.; SILVA, J. B. L. Por que o construtivismo não
funciona? Evolução, processamento de informação e aprendizagem escolar.
Psicol. Pesq., Juiz de Fora, MG, v. 9, n. 1, p. 62-71, jun. 2015.
Filmes
Como Estrelas na Terra: toda Criança é Especial
O jovem Ishaan tem muita dificuldade para se concentrar nos estudos, e mal
consegue escrever o alfabeto. Depois de diversas reclamações da escola, o pai, que
acredita que Ishaan não faz as tarefas por falta de comprimisso, decide levá-lo a um
internato, o que leva o menino a entrar em depressão. Mas, um professor substituto
de artes, Nikumbh, logo percebe o problema de Ishaan, e entra em ação com seu
plano para devolver a ele a vontade de aprender e, sobretudo, viver.
https://youtu.be/ImK0Ncl3xuI
Preciosa – uma história de Esperança
1987, Nova York, bairro do Harlem. Claireece “Preciosa” Jones (Gabourey Sidibe) é
uma adolescente de 16 anos que sofre uma série de privações durante sua juventude.
Violentada pelo pai (Rodney Jackson) e abusada pela mãe (Mo’Nique), ela cresce
irritada e sem qualquer tipo de amor. O fato de ser pobre e gorda também não a
ajuda nem um pouco. Além disto, Preciosa tem um filho apelidado de “Mongo”,
por ser portador de síndrome de Down, que está sob os cuidados da avó. Quando
engravida pela segunda vez, Preciosa é suspensa da escola. A sra. Lichtenstein
(Nealla Gordon) consegue para ela uma escola alternativa, que possa ajudá-la a
melhor lidar com sua vida. Lá Preciosa encontra um meio de fugir de sua existência
traumática, se refugiando em sua imaginação.
https://youtu.be/06ZF3zw1gHs
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Referências
AMERICAN PSYCHIATRIC ASSOCIATION. Diagnostic and statistical manual
of mental disorders (DSM-V). 5th ed. Arlington, VA, USA, 2013.
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UNIDADE Diversidade, Dificuldades e Transtornos de Aprendizagem
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Teorias da
Aprendizagem
Aprendizagem em Contextos Educacionais
Revisão Textual:
Prof.ª Dr.ª Luciene Oliveira da Costa Granadeiro
Revisão Técnica:
Prof.ª Me. Cássia Souza
Aprendizagem em
Contextos Educacionais
OBJETIVO DE APRENDIZADO
• Discutir sobre as particularidades da aprendizagem em ambientes educacionais, princi-
palmente na escola, com ênfase para a escolarização inicial, a alfabetização e o ensino
de matemática.
UNIDADE Aprendizagem em Contextos Educacionais
Características da Aprendizagem
em Instituições Educacionais
Ao longo da história, a humanidade explorou o mundo, inventou, descobriu, inovou
e criou diversos conhecimentos e culturas. Inicialmente, esses conhecimentos eram
produzidos por pessoas e morriam com elas ou com seu pequeno grupo de familiares
e amigos. Mas logo os humanos perceberam, ainda que intuitivamente, que era ne-
cessário desenvolver mecanismos para que os conhecimentos úteis e que facilitavam
a vida pudessem ser armazenados e compartilhados entre todos (HARARI, 2015).
Assim, podemos dizer que essa é uma possível explicação para o surgimento das
primeiras ideias sobre a educação e as instituições educacionais.
Educar é estimular e promover a aquisição de conhecimentos, habilidades, com-
petências, valores e atitudes. Em outras palavras, educar é promover a aprendiza-
gem. Nas instituições educacionais, o ensino é organizado e sistematizado, e o que
será aprendido é previamente selecionado e planejado em função de regulamenta-
ções e orientações curriculares. É importante salientar que a educação não é nunca
descontextualizada, ela é sempre o reflexo das decisões de um determinado grupo
social e está atrelada, portanto, a um contexto social, cultural, histórico, político e
econômico. Os conhecimentos, habilidades, competências, valores e atitudes que
serão ensinados serão sempre determinados por pessoas que estão inseridas nesse
contexto e que tomam as decisões sobre o que e como deve ser ensinado.
As instituições educacionais foram criadas para perpetuar e transmitir os saberes cul-
turalmente acumulados. A função essencial dessas instituições é garantir que as novas
gerações possam aprender sobre o conhecimento já acumulado e desenvolver habilidades
para avançar ainda mais esses saberes, produzindo inovações. Para isso, essas instituições
precisam determinar os objetivos de aprendizagem e sistematizar práticas de ensino, já que
não se pode ensinar tudo o que já foi produzido. Imagine se, hoje, em pleno século XXI,
as escolas ainda ensinassem como lascar pedras ou viver em cavernas? O conhecimento
progride e precisamos selecionar o que será necessário ensinar em cada contexto e época.
Embora as escolas sejam as instituições educacionais mais facilmente reconheci-
das, elas não são as únicas. Existem diversas instituições educacionais como creches,
centros educacionais, faculdades, universidades, e outras não tão facilmente identi-
ficáveis como instituições educacionais, por exemplo, museus, parques, zoológicos,
ONGs, fundações e institutos culturais. Esses últimos, embora não tenham a função
de ensino sistematizado com um professor e vários alunos, como logo imaginamos
em uma escola, também são instituições educacionais que promovem oportunidades
de aprendizagem e conservam o conhecimento já produzido pela humanidade.
Trocando ideias...
Você já havia pensado em museus e zoológicos como instituições educacionais? Você
tem o hábito de frequentar museus? O que se pode aprender em um museu? Os
brasileiros costumam frequentar mais museus fora do país do que no Brasil. Por que
você acha que isso acontece? Como mudar essa situação?
Leia a seguinte reportagem, disponível em: https://bbc.in/3bZSorW
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Nesta unidade, vamos discutir sobre como nas instituições educacionais a aprendi-
zagem é pensada de modo sistematizado e delimitado. Em casa, nas famílias, a apren-
dizagem acontece de modo mais fluído e natural em diversas situações que acontecem
cotidianamente. No contexto educacional, as instituições seguem normas, diretrizes
que são fundamentadas em perspectivas teóricas como já discutimos nas unidades
anteriores. As diversas teorias estudadas até agora são a bússola que orienta diferentes
proposições sobre o que, como e quando ensinar, o que impacta nas aprendizagens.
Como você deve se lembrar, algumas proposições teóricas apresentam ideias antagô-
nicas, o que também se reflete nessas orientações que, por vezes, são contraditórias
e variam muito em diferentes culturas e governos, nas diferentes instituições e mais
focalmente no conhecimento específico e preferências de cada professor.
Importante!
Art. 211. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios organizarão em regime
de colaboração seus sistemas de ensino.
§ 1º. A União organizará o sistema federal de ensino e o dos Territórios, financiará as institui-
ções de ensino públicas federais e exercerá, em matéria educacional, função redistributiva e
supletiva, de forma a garantir equalização de oportunidades educacionais e padrão mínimo
de qualidade do ensino mediante assistência técnica e financeira aos Estados, ao Distrito
Federal e aos Municípios;
§ 2º. Os Municípios atuarão prioritariamente no ensino fundamental e na educação infantil;
§ 3º. Os Estados e o Distrito Federal atuarão prioritariamente no ensino fundamental
e médio;
§ 4º. Na organização de seus sistemas de ensino, a União, os Estados, o Distrito Federal
e os Municípios definirão formas de colaboração, de modo a assegurar a universalização
do ensino obrigatório;
§ 5º. A educação básica pública atenderá prioritariamente ao ensino regular.
Como se pode ver, a educação brasileira não é apenas função da União, mas sim
é o resultado de um regime de colaboração entre a União, Estados e Munícipios.
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UNIDADE Aprendizagem em Contextos Educacionais
Além do disposto na Constituição, você também deverá saber que existe uma
lei específica para estabelecer diretrizes e bases para a educação nacional. Essa é a
lei 9394/96, chamada de LDB (lei de diretrizes e bases). Na LDB, você encontrará
mais especificamente os princípios, finalidades, direitos e deveres que regem a edu-
cação brasileira. A LDB também recomenda o regime de colaboração para organizar
a educação nacional.
Importante!
Art. 1º. A educação abrange os processos formativos que se desenvolvem na vida fa-
miliar, na convivência humana, no trabalho, nas instituições de ensino e pesquisa, nos
movimentos sociais e organizações da sociedade civil e nas manifestações culturais.
§ 1º. Esta Lei disciplina a educação escolar, que se desenvolve, predominantemente, por
meio do ensino, em instituições próprias;
§ 2º. A educação escolar deverá vincular-se ao mundo do trabalho e à prática social.
Em todo o Brasil, as nomenclaturas podem variar muito, mas de modo geral sem-
pre há uma Secretaria de Estado da Educação e uma Secretaria Municipal de Educa-
ção. Algumas vezes, essas secretarias também cuidam de interesses correlatos, como
esporte e cultura. A União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação (Undime)
e o Conselho Nacional de Secretários de Educação (Consed) são entidades que reúnem
respectivamente os secretários municipais e os secretários estaduais de educação de
modo a buscar representar os interesses coletivos desses grupos e promover avanços
junto ao Ministério da Educação, fortalecendo o regime de colaboração.
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do Ministro de Estado da Educação, cabendo-lhe formular e avaliar a política nacio-
nal de educação, zelar pela qualidade do ensino, pelo cumprimento da legislação
educacional e assegurar a participação da sociedade no aprimoramento da educa-
ção brasileira. Cada Estado e Município pode também estabelecer seus próprios
Conselhos Municipais ou Estaduais de Educação semelhantes ao CNE e que au-
xiliem a participação da sociedade civil nas decisões sobre os rumos da educação
em nível subnacional.
Todos esses órgãos e entidades seguindo a legislação promovem novas leis, dire-
trizes, orientações e documentos normativos para que a educação nacional ocorra
conforme expressado na Constituição Federal. Assim, é importante que você se
familiarize com alguns deles para entender que nas instituições escolares, os profes-
sores, embora tenham flexibilidade na maneira como irão promover a aprendizagem
de seus alunos, devem, antes de tudo, responder às normas da própria escola que,
por sua vez, deve responder às regulamentações de uma diretoria de ensino ou
departamento de ensino – esse nome varia muito em todo o país, mas se trata de
um agrupamento administrativo regional de escolas que está abaixo da Secretaria
Municipal de Educação. Devem ainda seguir orientações da Secretaria Estadual de
Educação e, em última instância, do Ministério da Educação.
Você já tinha pensado em como a aprendizagem nas escolas é mais complexa do que apenas
decidir entre teorias da aprendizagem? Existem diversas regulamentações que orientam e
limitam o que e como se deve ensinar.
Nas instituições educacionais, a quantidade de dias letivos é definida por lei, assim
como a quantidade de horas necessária para as diferentes formações, níveis e moda-
lidades educacionais. O sistema educacional brasileiro é dividido em Educação Básica
e Ensino Superior. A Educação Básica, a partir da LDB, é estruturada por níveis
e modalidades de ensino, englobando a Educação Infantil, o Ensino Fundamental
obrigatório de nove anos e o Ensino Médio. Como modalidades de ensino, temos
a educação escolar indígena, educação especial, educação do campo, educação es-
colar quilombola, educação de jovens e adultos (EJA) e educação profissional. Cada
nível ou etapa e cada modalidade apresentam suas próprias regulamentações com
expectativas e objetivos de aprendizagem e formação.
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UNIDADE Aprendizagem em Contextos Educacionais
Esses materiais estruturados podem ser mais ou menos estruturados. Existem li-
vros didáticos e sistemas de ensino muito regrados com planos de aulas e orientações
para cada atividade e proposta de ensino. Outras escolas e professores preferem não
adotar materiais estruturados ofertando possibilidades de aprendizagem de maneira
mais incidental a partir de proposições de projetos que deverão ser criados ao longo
do semestre.
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A Importância e o Papel dos Professores
na Aprendizagem dos Alunos
Não há dúvidas de que os professores são o fator mais importante dentre todos
os que afetam a aprendizagem em contextos educacionais. Bons professores são ca-
pazes de identificar potencialidades e dificuldades, criando situações que favoreçam
a aprendizagem de seus alunos, engajando os extremos e promovendo a instrução
diferenciada para todos. O que torna um bom professor varia muito, será uma boa
faculdade ou serão os anos de experiência? Existem muitos debates sobre isso, mas
o fato é que é uma combinação de diferentes fatores que fazem com que alguém se
torne um bom professor (SOUZA, 2013).
Nenhuma sala de aula será igual nunca, mas sempre podemos identificar dentro
das diferentes turmas que existem alunos com mais dificuldades e outros com melhor
desempenho. Os bons professores podem identificar as dificuldades e criar ativida-
des extras, diferenciadas que facilitem a aprendizagem. Da mesma maneira, aqueles
que tenham mais facilidade e já tiverem concluído suas tarefas poderão ser estimu-
lados a cooperar com quem ainda não acabou, servindo com uma espécie de tutor,
que agiria como um scaffolding na zona de desenvolvimento proximal.
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UNIDADE Aprendizagem em Contextos Educacionais
fessor. É necessário que o professor possa se dedicar as suas práticas, testar seus
conhecimentos e modificar suas ações em função daquilo que está ensinando.
Não basta apenas conhecer didática para ser um bom professor. Ensinar envolve
mais do que apenas os conhecimentos técnicos, uma vez que também se ensinam
valores e atitudes por meio de nossos comportamentos. Professores servem muitas
vezes como modelos para seus alunos, em especial, na Educação Básica. É muito
comum que as crianças se identifiquem muito com seus professores e comecem a
imitar seus comportamentos e atitudes, assim como o fazem com seus pais também.
Nesse sentido, o professor precisa refletir não apenas sobre aquilo que deve ensinar
e como ensinar, mas também sobre o modo como ensina e se comporta.
Todo mundo tem um professor memorável. Seja por coisas boas ou ruins que ele fez. Qual
foi seu professor memorável? Aquele que marcou sua vida? Por que ele marcou sua vida?
Quais eram as características que o fizeram ser memorável?
Leia o livro: ABRAMOVICH, F. Que raio de professora sou eu? São Paulo: Scipione, 2019.
Nesse sentido, a avaliação educacional deve ser entendida como parte integrante
da relação ensino-aprendizagem, pois auxilia na orientação das ações pedagógi-
cas que objetivem superar as dificuldades dos alunos. Contudo, ainda prevalece no
Brasil um modelo que considera apenas a realização de exames escolares e não de
avaliação da aprendizagem. Isso significa que os estudantes são avaliados pelo pro-
duto final e não pelo processo da aprendizagem (MIQUELANTE, 2017). Em outras
palavras, os exames não ajudam de fato a melhorar a qualidade da aprendizagem,
apenas a testar o que já foi aprendido.
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Uma proposta alternativa foi elaborada por Benjamin Bloom (BLOOM; HASTINGS;
MADAUS, 1983) que identificou que a avaliação possui três funções principais, que
consistem em 1) avaliação diagnóstica: diagnosticar os conhecimentos prévios dos
alunos; 2) avaliação formativa: monitorar se os alunos estão atingindo os objetivos
curriculares propostos, auxiliando o professor na identificação de dificuldades e es-
tratégias de ensino alternativas; e por último 3) avaliação somativa: objetiva a clas-
sificação dos alunos no final de um módulo ou curso de acordo com o rendimento de
cada aluno.
• A avaliação diagnóstica (ou analítica): a avaliação diagnóstica, como o consta
no próprio nome, oferece um diagnóstico da realidade que se pretende exami-
nar, permitindo estimar os conhecimentos e habilidades iniciais que estão pre-
sentes antes de qualquer tipo de ensino. Essa é a avaliação adequada para dar
início ao ano letivo. O professor ou o avaliador aqui terá como objetivo verificar
quais são os conhecimentos prévios que os alunos ou avaliados têm antes de re-
ceberem o ensino. Esse tipo de avaliação permite atestar se pré-requisitos estão
satisfeitos e prever se alguns terão mais dificuldades do que outros.
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UNIDADE Aprendizagem em Contextos Educacionais
Um problema com esse tipo de avaliação, segundo Bloom, é que ela pode se resu-
mir apenas à mera classificação, o que acarreta danos ao processo educacional. Um
aluno pode ter aprendido muito e apenas ter recebido como avaliação um número
qualquer em um ranking, como se bastasse o número e não o conteúdo aprendido.
Esses três tipos de avaliação devem ser utilizados de forma integrada e planejada
para aumentar a eficiência e eficácia do sistema de avaliação e como consequên-
cia beneficiando os processos de ensino e de aprendizagem em instituições educa-
cionais. Em todos os casos, cumpre-nos lembrar de que vários fatores devem ser
considerados em todo processos de avaliação, como o número de alunos, objetivo,
conhecimento técnico do professor e do aplicador, materiais usados, currículo etc.
As decisões sobre o processo de avaliação também devem ser tomadas de modo claro
e discutido entre os diferentes agentes envolvidos, como professores, diretores, coorde-
nadores pedagógicos e sempre que possível pais e alunos. As avaliações nem sempre
são ideais e também podem conter muitas falhas ou serem inapropriadas para determi-
nada situação. Nesses casos, elas devem ser revistas, e melhoradas para que não afetem
negativamente os processos educacionais. De todo modo, é importante reconhecer que,
no contexto educacional, a avaliação se faz necessária e é um importante termômetro
que indica se a aprendizagem está de fato ocorrendo e como melhorá-la.
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Alfabetização, Literacia e Numeracia
Nas escolas, dentre todas as aprendizagens possíveis, talvez as mais importantes
sejam aprender a ler, escrever e contar. Essas são as habilidades fundamentais que
estão no início do processo de escolarização e delas tudo depende em alguma me-
dida. Se alguém não sabe ler e escrever e minimamente contar também não conse-
guirá aprender bem história, geografia, ciências etc. Assim, nos primeiros anos de
escolarização os principais objetivos educacionais são ensinar essas habilidades que
serão a chave para o sucesso dentro e fora das escolas.
A linguagem oral, por outro lado, já está prevista em nosso código genético, de
modo que aprendemos a falar mesmo com pouca estimulação. Ninguém precisar ir
para a escola para aprender a falar. Mas, para aprender a ler e escrever, é preciso ir
além do mero contato com a linguagem escrita, é preciso refletir intencionalmente
sobre a linguagem e entender como funciona o código alfabético (MORAIS, 2013).
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tadas, o que chamamos de pseudopalavras. Mas, elas seguem as regras de funcio-
namento do código alfabético e por isso você pode ler, mesmo sem compreender.
Contudo, se eu pedisse para você ler jnurnvurb, uenduneudnue, bdybpc, meenddps,
você não conseguirá, pois essas combinações de letras/sons não são possíveis em
português, assim essas são consideradas não palavras.
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UNIDADE Aprendizagem em Contextos Educacionais
Segundo Ehri (2013), o rótulo das fases reflete o tipo de conhecimento que as
crianças demonstram sobre o sistema alfabético. Portanto, as fases são: pré-alfabé-
tica, alfabética parcial, alfabética completa e alfabética consolidada:
• Fase pré-alfabética: As crianças usam inicialmente pistas visuais para ler e es-
crever palavras, sem recorrer às relações entre letras e sons. Elas leem palavras
familiares por reconhecimento de cores e formas salientes, mas são incapazes de
identificar diferenças nas letras. Nesta fase, elas podem escrever algumas palavras
de memória. Por exemplo, podem ler rótulos de refrigerantes e marcas famosas;
• Fase alfabética parcial: Quando aprendem algumas relações entre letras e
sons, as crianças passam a usar pistas fonológicas para ler e escrever palavras.
Nesta fase, as crianças ainda não sabem todas as relações entre letras e sons,
então, podem escrever palavras diferentes de forma idêntica como AA para re-
presenta Casa, Mala, Bala, Sala, já que conhecem apenas o som do A;
• Fase alfabética completa: Quando as crianças conhecem todos as relações en-
tre letras e sons, elas adquirem a habilidade de decodificação, que é a estratégia
mais eficiente de leitura. Assim, elas passam a ler e a escrever palavras com au-
tonomia. Contudo, elas podem ainda se confundir com a ortografia das palavras
e nessa fase podem escrever casa corretamente porque já viram repetidas vezes,
mas a palavra casamento pode ser escrita como kazamentu, porque elas não
escrevem ainda de forma ortográfica, mas sim como ouvem as palavras;
• Fase alfabética consolidada: A última fase representa a consolidação contínua
em que se dá o processamento de unidades cada vez maiores, como sílabas
e morfemas, o que permite uma leitura mais rápida, com precisão e fluência,
e uma escrita com precisão ortográfica. Nesta fase, a maior parte das pala-
vras é lida por reconhecimento automatizado, dessa forma, as crianças podem
usar seu conhecimento sobre palavras para ler cada vez mais rapidamente. Elas
aprendem a ler a palavra “mente” e com isso leem palavras como infeliz-mente,
alegre-mente, de forma mais rápida.
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mória para que se possam compreender textos. A compreensão também depende
de bons conhecimentos de vocabulário, pois, sem saber o que significam as palavras,
não se pode compreender a leitura. Por fim, a produção de escrita diz respeito às
particularidades da escrita como a coordenação motora, a caligrafia e a ortografia.
No Brasil, foi comum por muito tempo utilizar a expressão “alfabetização matemá-
tica”, mas ela é inadequada e não cumpre a função de designar o ensino de matemá-
tica básica. Na perspectiva das Ciências Cognitivas, entende-se que a palavra “alfa-
betização” deriva da palavra “alfabeto”, que designa o conjunto de letras do sistema
alfabético. O sistema alfabético é um sistema de escrita no qual as letras representam
os menores sons da fala chamados de fonemas. O termo alfabetização, portanto,
significa ensinar a ler e a escrever em um sistema alfabético e não pode ser entendido
apenas como o ensino básico de um determinado conhecimento.
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UNIDADE Aprendizagem em Contextos Educacionais
Em Síntese
Quando pensamos em aprendizagem, logo pensamos em aprendizagem nas escolas
ou instituições educacionais. Como vimos até então, a aprendizagem pode ocorrer em
todos os lugares e durante toda a nossa vida. Contudo, as instituições educacionais são
dedicadas a favorecer a aprendizagem de determinados conteúdos culturalmente pro-
duzidos e selecionados.
A aprendizagem nas instituições educacionais não é totalmente livre, ela segue normas
federais, estaduais, municipais e preferências dos professores que, apesar de seguirem
essas normas, também são livres para adotar concepções teóricas distintas ao ensinar.
Isso tudo faz com que a aprendizagem em instituições educacionais seja planejada e
sistematizada. Não se pode esquecer, contudo, que somos seres biopsicossociais, com
histórias de vida muito diversas e, por mais que estejamos em um mesmo contexto,
existem diversas condições internas e externas que afetam o ritmo, a velocidade e a
qualidade da aprendizagem como veremos na próxima unidade.
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Material Complementar
Indicações para saber mais sobre os assuntos abordados nesta Unidade:
Sites
Base Nacional Comum Curricular
A Base Nacional Comum Curricular (BNCC) é um documento de caráter normativo
que define o conjunto orgânico e progressivo de aprendizagens essenciais que todos
os alunos devem desenvolver ao longo das etapas e modalidades da Educação Básica.
https://bit.ly/2REhgfY
Política Nacional de Alfabetização
https://bit.ly/3cd5Wk9
Livros
Que raio de professora sou eu?
ABRAMOVICH, F. Que raio de professora sou eu? São Paulo: Scipione, 2019.
Política Educacional no Brasil: introdução histórica
VIEIRA, S. L.; FARIAS, I. M. S. Política Educacional no Brasil: introdução
histórica. Brasília: Liber Livro, 2007.
Análise das Estratégias de Escrita de Crianças Pré-Escolares em Português do Brasil
SARGIANI, R. A.; ALBUQUERQUE, A. Análise das Estratégias de Escrita de
Crianças Pré-Escolares em Português do Brasil. Psicol. Esc. Educ., Maringá , v. 20,
n. 3, p. 591-600, Dec. 2016.
Vídeos
Simpósios da Conferência Nacional de Alfabetização Baseada em Evidências (CONABE)
https://youtu.be/ybP8GrwDpX4
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UNIDADE Aprendizagem em Contextos Educacionais
Referências
BLOOM, B. S.; HASTINGS, J. T.; MADAUS, G. F. Manual de Avaliação Formativa
e Somativa do Aprendizado Escolar. S. Paulo: Livraria Pioneira, 1983.
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Teorias da
Aprendizagem
Bases Neuropsicológicas da Aprendizagem
Revisão Textual:
Prof.ª Me. Sandra Regina Fonseca Moreira
Revisão Técnica:
Prof.ª Me. Cássia Souza
Bases Neuropsicológicas
da Aprendizagem
OBJETIVO DE APRENDIZADO
• Apresentar os principais mecanismos cerebrais e processos psicológicos envolvidos na apren-
dizagem, a partir do ponto de vista da Neurociência Cognitiva e da Psicologia Cognitiva.
UNIDADE Bases Neuropsicológicas da Aprendizagem
Importante!
Para facilitar a leitura, nesta Unidade, usaremos cérebro e encéfalo como sinônimos.
Na verdade, o encéfalo é composto pelo cérebro, cerebelo e tronco encefálico que se
encontra na caixa craniana. Ele é o centro do sistema nervoso central juntamente com a
medula espinhal, também chamada de medula espinal.
Cérebro
Tronco
Encefálico
Cerebelo
Medula
Espinhal
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diferentes partes do cérebro. Broca foi apresentado a um paciente que compreendia
a linguagem, mas era incapaz de falar. Após a morte desse paciente, em 1861, Broca
examinou seu encéfalo e encontrou uma lesão no lobo frontal esquerdo. Assim,
relacionando com a perda de fala do paciente ainda vivo, Broca concluiu que essa
região do cérebro era especificamente responsável pela produção da fala. Essa área
do cérebro é conhecida como o centro motor da fala, isto é, de produção da fala, e
é denominada de área de Broca (BEAR, 2017). Mais tarde, o médico alemão Karl
Wernicke (1848-1905) descobriu outra área no lobo temporal que correspondia à
compreensão da fala, denominada de área de Wernicke.
Figura 2 – Representação das áreas de Broca (no lobo frontal) e Wernicke (no lobo temporal)
Fonte: Adaptado de Wikimedia Commons
Apesar de o estudo sobre o sistema nervoso ser antigo, somente no século XX,
a partir da década de 1970, é que se começou a usar a expressão “Neurociência”
ou “Neurociências” para se referir às diferentes disciplinas científicas que estudam o
sistema nervoso, como a Psicologia, a Medicina, a Biologia e a Física. Nesse período,
foi criada a Society for Neuroscience, reunindo pesquisadores que entendiam que
dada a complexidade do estudo do encéfalo, seria necessário unir esforços e adotar
uma abordagem interdisciplinar que ofertasse uma multiplicidade de metodologias de
pesquisas e formas de compreender o sistema nervoso (BEAR, 2017).
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UNIDADE Bases Neuropsicológicas da Aprendizagem
Nos anos 1950, essas e outras questões colocavam em xeque as propostas beha-
vioristas que ignoravam o que acontecia na “caixa-preta”, isto é, na mente, ou o que
acontece dentro de nossas cabeças. Além disso, vários estudos sobre a consciência
(Psicologia da Gestalt), o Inconsciente (Psicanálise), o desenvolvimento cognitivo (Epis-
temologia Genética) estavam sendo desenvolvidos na Europa e lançavam luz sobre o
que ocorria na “caixa preta”, contrariando as proposições behavioristas de que não
era possível estudar cientificamente a mente. Ademais, nesse período, surgem os
computadores, que possibilitaram também os estudos sobre a inteligência artificial e
se tornaram uma metáfora para explicar a relação mente e cérebro, sendo a mente
(software) a função do cérebro (hardware).
Na metade do século XX, muitos avanços estavam sendo feitos no estudo sobre
o cérebro humano. Em 1949, o psicólogo canadense Donald Hebb (1904-1985)
estudou as funções dos neurônios para os processos psicológicos, como a memória
e a aprendizagem. Ele propôs que o córtex cerebral funcionava a partir de cone-
xões neuronais modificáveis, sendo que essas possibilidades de conexões entre os
neurônios são múltiplas. Assim, o armazenamento da memória não repousa em um
único neurônio, mas sim nas conexões entre eles. Esse modelo é conhecido atual-
mente como modelo celular e molecular da memória (PINHEIRO, 2005). O córtex
cerebral é a camada mais superficial do cérebro, composta por corpos de neurônios
que formam a substância cinzenta. É a parte responsável por processamentos mais
refinados, como a memória, atenção, consciência, linguagem e percepção.
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Outra contribuição importante veio do psicólogo norte-americano Karl Lashley
(1890-1958). Apesar de ser considerado behaviorista e de ter trabalhado com o
pai do behaviorismo, John Watson (1878-1958), Lashley estudou os mecanismos
neurofisiológicos envolvidos na aprendizagem. Ele discordava de algumas posições
mecanicistas do behaviorismo e estudava o funcionamento do cérebro com vários
tipos de aprendizagem. Em 1929, Lashley já havia escrito um livro muito importante
chamado “Brain Mechanisms and Intellingence”, no qual apresentou dois princípios
importantes: o princípio de ação em massa e o de equipotencialidade.
O princípio de ação em massa significa que certos tipos de aprendizagem são
mediados pelo córtex cerebral (a camada mais externa do cérebro) como um todo,
ao contrário da visão de que toda função psicológica é localizada em um lugar espe-
cífico no córtex (teoria da especialização funcional). Em outras palavras, a ideia é de
que não são os neurônios individuais, ou conexões neuronais específicas, mas sim a
massa cerebral (córtex) como um todo que importa para o funcionamento cerebral
completo. A memória não pode ser localizada apenas em uma única área cortical,
mas distribuída por todo o córtex. Assim, a equipotencialidade se refere ao fato de
que se algumas partes do sistema forem danificadas, outras partes do cérebro têm o
potencial de substituir essas funções.
O princípio de ação em massa é contrário à ideia de especialização funcional.
Essa visão postula que as funções estão localizadas no interior do cérebro, e só
podem ser realizadas por áreas específicas do cérebro. Sabemos hoje que existem
algumas funções que são altamente especializadas, como as áreas de Wernicke e de
Broca, que respondem predominantemente para a compreensão da fala e capacida-
de de produzir um discurso coerente, respectivamente. Porém, outras funções, como
a memória, estão amplamente distribuídas pelo córtex cerebral.
Na União Soviética, Alexander Luria (1902-1977), um importante colaborador de
Vygotksy, também desenvolveu muitos estudos em Neuropsicologia, mostrando a
importância do cérebro para a aprendizagem. Luria desenvolveu a noção do sistema
nervoso como um sistema funcional. Segundo Luria, as funções cerebrais são orga-
nizadas a partir da ação de diversos elementos que atuam de forma articulada e que
podem estar localizados em áreas diferentes do cérebro, isto é, não se encontram
necessariamente juntas em pontos específicos do cérebro ou em grupos isolados de
células (OLIVEIRA; REGO, 2010). Assim, a função cerebral não é apenas função de
uma área em particular, ou seja, toda atividade cognitiva complexa é o resultado do
funcionamento total, e não de grupos neuronais específicos.
Luria (1981) pensou o Sistema Nervoso Central como estruturado hierarquica-
mente de uma forma vertical em três estruturas. As estruturas inferiores serviriam
de base para as atividades superiores. A primeira unidade funcional (UF) seria res-
ponsável pela vigília e pelo tônus cortical. A segunda unidade funcional seria res-
ponsável por receber, processar e armazenar as informações que chegam do mundo
externo por meio dos órgãos de sentido. A terceira unidade funcional tem a função
de regular e verificar as estratégias comportamentais e a própria atividade mental.
Os estudos de Luria são ainda importantes, em especial para os educadores, com
vistas a investigar a aprendizagem em crianças e adolescentes (PINHEIRO, 2005).
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UNIDADE Bases Neuropsicológicas da Aprendizagem
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condições para uma aprendizagem bem-sucedida e as diferenças na aprendizagem
em diferentes fases da vida (SPITZER, 2006). O cérebro humano é altamente
eficaz em possibilitar a aprendizagem por meio de duas propriedades básicas: a
neurogênese e a neuroplasticidade. Do ponto de vista neurobiológico, aprender
é modificar as conexões entre os neurônios, que são as principais células que for-
mam o sistema nervoso. Essa capacidade do encéfalo, de se modificar em função
das aprendizagens que ocorrem na interação com o meio ambiente, é o que deno-
minamos Neuroplasticidade. A neurogênese, por outro lado, se refere à capacida-
de de produzir novos neurônios, novas unidades de processamento.
Todos os humanos nascem com o mesmo cérebro geneticamente herdado e com
as mesmas capacidades, mas como não existem duas pessoas iguais, também não
existem dois cérebros completamente iguais. Ao nascer, a criança já tem prontos em
seu cérebro, os circuitos da aprendizagem, ainda que eles não estejam funcionando
em sua plenitude, o que deverá ocorrer com base nas interações ambientais e com
a maturação biológica (COSENZA; GUERRA, 2011). Ao longo do desenvolvimento,
os cérebros de diferentes pessoas se tornam cada vez mais diferentes entre si devido
às experiências e interações com o meio físico e social. Ao interagir com o meio
físico e social, as conexões entre os neurônios se modificam e tornam a arquitetura
cerebral de cada pessoa única.
Até mesmo irmãos gêmeos terão experiências distintas que impactam de diferentes
modos o desenvolvimento. Se, por exemplo, uma mãe tem dois filhos gêmeos e ambos
choram ao mesmo tempo, ela provavelmente terá que interagir primeiro com um, e
depois com o outro. O primeiro tem suas necessidades imediatamente satisfeitas, e
o segundo precisa aprender a esperar. É claro que não podemos dizer que esse fato
isolado tenha um efeito significativo. Contudo, esse exemplo serve apenas para que
você reflita sobre como, mesmo com uma base genética semelhante, o ambiente
pode influenciar de diferentes maneiras na arquitetura do cérebro. Nesse sentido,
enfatiza-se a importância de que as crianças tenham oportunidades de interações
que sejam potencializadoras do seu desenvolvimento (SARGIANI; MALUF, 2018).
A maior parte de nosso sistema nervoso é construída, em suas linhas gerais, ainda
no período embrionário e fetal. O desenvolvimento do sistema nervoso começa já
nas primeiras semanas de vida embrionária. Tudo começa com um minúsculo tubo
cuja parede é formada por células-tronco que vão dar origem a todos os neurônios
e também à maior parte das células auxiliares, as células gliais. O tubo neural tem
paredes finas e um comprimento pequeno, pois nessa fase todo o embrião não
chega a medir 10 milímetros. Contudo, em poucas semanas, ocorrerá uma imensa
transformação que possibilitará que a criança nasça com um sistema nervoso muito
parecido com o que ela terá na fase adulta. O desenvolvimento cerebral é muito
rápido, sendo produzidos cerca de 250.000 neurônios por minuto durante os nove
meses de gestação (COWAN, 1979).
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UNIDADE Bases Neuropsicológicas da Aprendizagem
O termo “janelas de oportunidade” ficou muito popular por enfatizar a ideia de pe-
ríodos únicos em que a aprendizagem de certas habilidades é mais efetiva. Contudo,
esse não é um termo apropriado, pois passa a ideia errônea de que se o cérebro não
for estimulado naquele período crítico, não será mais possível aprender determinado
conhecimento ou habilidade. Na realidade, o cérebro adulto não tem a mesma ca-
pacidade de plasticidade neural que na infância, mas ainda assim somos capazes
de aprender a vida inteira (CONSEZA; GUERRA, 2011). O que acontece é que
algumas funções podem ser melhor desenvolvidas se forem estimuladas em períodos
sensíveis, conforme se vê na Tabela 1. Por isso é melhor dizer que temos períodos
sensíveis do desenvolvimento.
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Por exemplo, você não se lembra de todos os tomates que já viu ou comeu ao longo
de sua vida, mas sabe identificar um tomate quando o vê. Essa aprendizagem de
regras acontece no córtex cerebral. Quando o cérebro processa detalhes, é possível
ver uma região mais interna do cérebro denominada hipocampo, e que tem facili-
dade para armazenar informações novas e importantes. Essa aprendizagem é mais
rápida e pontual, e normalmente acontece quando há um fato marcante (ex.: um
acidente comovente, ou fato histórico), ou quando são momentos importantes em
nossas vidas (SPITZER, 2006).
Lembrar-se de todos os detalhes seria muito custoso para o cérebro, e não seria
útil para guiar o futuro. Normalmente, os eventos em nossas vidas são repletos de
coincidências e aleatoriedades que não poderão ser replicadas em uma situação
futura, assim, não é importante guardar todos esses detalhes que apenas sobrecar-
regariam a nossa memória. Por outro lado, lembrar-se de regras gerais permite usar
esse conhecimento em diversas situações futuras. O que aprendemos na escola é
tipicamente armazenado em termos de regras gerais que poderão ser usadas para
diferentes fins. Essa ideia é acentuada em discussões mais contemporâneas quando
se propõe ensinar competências e estratégias de resolução de problemas, ao invés
de fatos e datas (SPITZER, 2006).
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UNIDADE Bases Neuropsicológicas da Aprendizagem
Nosso cérebro não é muito diferente disso. O cérebro não tem necessidade e
nem capacidade para processar todas as informações que chegam a ele a todo o
momento. Pare por um instante e olhe atentamente para o ambiente em que você
está agora. Quantas informações estão concorrendo com essa leitura? Você pode
estar em uma sala tranquila apenas lendo, ou pode estar lendo esse texto no com-
putador e também fazendo dezenas de outras coisas paralelamente, como as que já
narrei anteriormente. Além disso, você pode estar com fome, pode ter barulho na
sua casa, a iluminação pode influenciar, e muitos outros fatores.
Como o cérebro consegue lidar com todas essas informações a todo o momento?
Ele precisa de um filtro que permita se concentrar no que é essencial, e ignorar o que
não é necessário. Esse filtro é a atenção, que permite que o cérebro possa se dedicar
às informações importantes para que não ocorra uma sobrecarga no processamento
cognitivo. A atenção é uma importante função psicológica que permite discriminar
o que deve ser processado daquilo que não deve ser processado em dado momento.
Ela funciona como uma lanterna que ilumina o foco do nosso processamento da
informação. Assim, apenas parte das inúmeras informações ao nosso redor é pro-
cessada por vez, para evitar a sobrecarga em nosso cérebro.
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Um exemplo prático é pensar nas nossas roupas, que pressionam os nossos re-
ceptores táteis a todo momento, mas que, de modo geral, nós não percebemos essa
estimulação constante. Estamos habituados a sentir a pressão da roupa, porque ela
está sempre em contato com os nossos receptores táteis. Agora que chamei a aten-
ção para esse fato, você irá direcionar sua atenção para o peso das roupas e irá sentir
como, mesmo que confortáveis, elas estão pressionando, tocando seu corpo. Assim,
a metáfora da lanterna ajuda a entender que nós temos uma janela de percepção do
mundo, mas não conseguimos apreender tudo o que está diante de nós, e a lanterna
da atenção serve para iluminar pontos específicos, aspectos externos e internos que
nos interessam (COSENZA; GUERRA, 2011).
Tudo o que chega até nós por meio de nossos órgãos de sentido primeiramente
passa pelo filtro da atenção. Aquilo que for importante será processado, e o que não
for importante será ignorado. Quando algo recebe a atenção é processado e arma-
zenado pela memória. Aprender é criar memórias. A memória é a capacidade de
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O tempo todo nós dependemos da memória operacional para desempenhar
nossas tarefas cotidianas. A memória operacional funciona como uma espécie de
central de operação, em que todas as informações são mantidas e manipuladas na
consciência enquanto elas forem necessárias. Para esse processamento é possível
também que informações já arquivadas no cérebro possam ser trazidas à consciência
quando necessário. O processamento de informações na memória de trabalho tam-
bém é limitado e podemos processar ao mesmo tempo apenas cerca de 7 elementos
por vez. Essa limitação é chamada de capacidade de canal, e a maioria das pessoas
consegue processar entre 5 e 9 elementos por vez, com a média de 7. Quando pre-
cisamos processar mais informações, é comum fazermos agrupamentos (chunks) de
informação. Por exemplo, pense em como você memoriza um número de telefo-
ne, ou o número do seu CPF? Provavelmente você faz agrupamentos de números,
tornando os 11 números do CPF em um agrupamento do tipo 123-456-789-10.
É mais fácil processar 3 conjuntos de 3 algarismos e um de 2 algarismos, portanto,
4 chunks, do que 11 números.
Retomando o que já vimos até então, as informações que chegam até nós por meio
dos receptores sensoriais devem passar pelo filtro da atenção e em seguida por um
processo de codificação, quando ela é processada pelos neurônios, ao que chamamos
de memória operacional. Se as informações forem relevantes, poderão ocorrer alte-
rações estruturais em circuitos nervosos específicos, cujas sinapses se tornarão mais
eficientes permitindo o aparecimento de um registro. Para que a informação fique ar-
mazenada em nossa memória, formando um registro ou traço permanente, é necessá-
rio um esforço adicional. Nesse sentido, os estudos em Psicologia Cognitiva mostram
que são importantes os processos de repetição, elaboração e consolidação.
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As estratégias de aprendizagem que têm mais chances de obter sucesso são aquelas
que levam em conta a forma do cérebro aprender. É importante respeitar os proces-
sos de repetição, elaboração e consolidação. Também faz diferença utilizar diferentes
canais de acesso ao cérebro e de processamento da informação. Quanto mais opor-
tunidades de ver um mesmo conteúdo de diferentes formas, melhor será a aprendiza-
gem. Por isso, nos últimos anos têm ganhado espaço as abordagens multissenso-
riais, que visam propiciar condições diversas para que uma mesma informação seja
vista e revista por diferentes ângulos. Ao alfabetizar, por exemplo, uma professora
pode mostrar o desenho das letras, pedir para as crianças desenharem as letras,
passarem a mão sobre a forma das letras em lixas, dentre outras formas.
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importante na vida dos animais. Elas têm valor de sobrevivência para o indivíduo
e a espécie. As emoções se manifestam por meio de alterações na fisiologia e nos
processos mentais, mobilizando os recursos cognitivos existentes, como a percep-
ção e a atenção. Além disso, elas alteram a fisiologia dos organismos visando uma
aproximação ou afastamento, e frequentemente, determinando as ações que acon-
tecerão em seguida (COSENZA; GUERRA, 2011).
As emoções funcionam como um sinalizador interno de que algo significativo
está ocorrendo, e são também um eficiente mecanismo de sinalização intragrupal, já
que podemos reconhecer as emoções uns dos outros e, por meio delas, comunicar
situações e decisões relevantes aos demais indivíduos ao nosso redor. Não apenas
os humanos têm emoções, mas os outros animais também conseguem perceber
reações emocionais de seus semelhantes e reagir prontamente. As emoções têm um
importante valor de sobrevivência, permitindo que diante de um perigo uma reação
seja necessária (COSENZA; GUERRA, 2011).
Muitas vezes, em nossas culturas, não valorizamos muito o papel das emoções.
Elas são vistas como resíduos da evolução animal e tidas como um elemento per-
turbador para a tomada de decisões. Você já esteve em uma situação na qual suas
decisões racionais foram influenciadas pelas emoções? Por exemplo, quando tem
que fazer algo importante como uma prova, mas está com medo e esquece todas a
matéria estudada. Ou quando em um momento de raiva você diz coisas que nunca
falaria para alguém, e acaba se arrependendo?
As emoções têm um papel importante em nosso comportamento e também na
aprendizagem. Contudo, muitas teorias da aprendizagem ignoraram essa importân-
cia por muitos anos. As neurociências têm contribuído para a mudança dessa per-
cepção ao mostrar que os processos cognitivos e emocionais são profundamente
entrelaçados no funcionamento do cérebro, e enfatizado a importância das emoções
em nossos processos de aprendizagem e demais comportamentos. A ausência de
emoções nos tornaria seres inexpressivos como robôs, e a vida perderia todas suas
cores e sabores (COSENZA; GUERRA, 2011).
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UNIDADE Bases Neuropsicológicas da Aprendizagem
No nosso cotidiano, as informações sensoriais que nos chegam por meio dos re-
ceptores podem ser acompanhadas de uma valência emocional positiva, negativa ou
neutra. Por exemplo, ao ver um cachorro desconhecido, podemos ter uma reação
de medo (valência negativa), alegria (valência positiva) ou indiferença (neutro). Essas
valências são acrescentadas no processamento da informação quando atingem a
amígdala cerebral, que é responsável pelo processamento das informações.
Contudo, um estímulo emocional pode atingir o córtex cerebral antes das informa-
ções sensoriais conscientes. Nesse caso, podemos identificar erroneamente a emo-
ção que sentimos, ou a sua causa. Por exemplo, em um dia ruim, podemos confundir
o que de fato é o motivo de nossa irritação. Um pai que teve um dia cheio, com vários
problemas, pode chegar em casa e achar que seu filho o irrita porque está com os pés
no sofá, quando na verdade ele está irritado com o dia.
O ambiente escolar deve ser planejado para facilitar as emoções positivas, e evitar
as emoções negativas. É aconselhável criar condições que levem a um maior auto-
conhecimento emocional e orientem para a adequada manifestação das respostas
emocionais nas interações sociais (COSENZA; GUERRA, 2011). Muitas vezes nós
confundimos a origem de certas emoções ou não sabemos identificá-las apropria-
damente, o que pode influenciar em situações de aprendizagem sem que tenha-
mos conta disso. Antes de aprender uma matéria como estatística, podemos ter
uma ansiedade nessa aprendizagem, pensar que será muito difícil, e de fato isso irá
atrapalhar a aprendizagem. Enquanto controlar essa emoção e tentar ver as coisas
por outra perspectiva, pode facilitar a aprendizagem. Aprender a lidar com nossas
emoções também é chamado de inteligência emocional, e está ligado ao conceito de
funções executivas, como veremos a seguir.
Funções Executivas,
Autorregulação e Aprendizagem
As Funções Executivas (FE) são um conjunto de habilidades cognitivas que permi-
tem executar as ações necessárias, como planejamento e monitoramento, para atingir
um determinado objetivo. Em outras palavras, trata-se de habilidades necessárias
para aprender coisas novas, raciocinar ou concentrar-se diante de ambientes repletos
de distrações (LEÓN et al., 2013). As FE incluem o estabelecimento de metas, a ela-
boração de uma estratégia comportamental, o monitoramento das ações adequadas
e o respeito às normas sociais (COSENZA & GUERRA, 2011).
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Existem muitas divergências teóricas sobre como conceituar e estudar as funções
executivas. Uma maneira de estudá-las é dividir entre funções executivas principais
e funções executivas mais complexas. As FE principais são flexibilidade cogni-
tiva, controle inibitório (considerando autocontrole e autorregulação) e memória
de trabalho. As mais complexas são resolução de problemas e planejamento.
O desenvolvimento das FE inicia-se no primeiro ano de vida, e se intensifica entre
6 e 8 anos de idade, continuando até o final da adolescência e início da idade adulta.
23
23
UNIDADE Bases Neuropsicológicas da Aprendizagem
Em Síntese
Quando se fala em aprendizagem no século XXI não se pode ignorar os importantes
avanços feitos nas Ciências Cognitivas e em especial na Neurociência Cognitiva. É funda-
mental considerar-se que toda a aprendizagem sempre tem um aspecto neurobiológico.
Os seres humanos são biopsicossociais e isso implica em considerarmos a integração entre
as dimensões biológica, psicológica e social. Assim, não podemos ignorar o papel de
nenhuma dessas três dimensões.
A aprendizagem envolve mudanças na estrutura cerebral. As redes de neurônios são
modificadas em função das interações com o meio físico e social, que impactam em
diversas funções psicológicas como a atenção e a memória, e, em uma última análise,
modificam as sinapses entre os neurônios. A Educação no século XXI deve considerar
essas evidências para melhorar a qualidade do ensino, adequando-se ao tempo e às di-
ferentes necessidades do cérebro ao longo da vida.
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Material Complementar
Indicações para saber mais sobre os assuntos abordados nesta Unidade:
Vídeos
Palestra: Jeff Hawkins – Como a Neurociência mudará a computação
https://bit.ly/3hWKSzs
Palestra: Alison Gopnik – O que pensam os bebês?
https://bit.ly/3iXmGye
Filmes
O Começo da Vida
Um dos maiores avanços da neurociência é ter descoberto que os bebês são muito mais
do que uma carga genética. O desenvolvimento de todos os seres humanos encontra-se
na combinação da genética com a qualidade das relações que desenvolvemos e do
ambiente em que estamos inseridos.
https://youtu.be/lxw7pV3I2SU
Leitura
Funções Executivas e Desenvolvimento infantil: habilidades necessárias para a autonomia
https://bit.ly/3hWOscL
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25
UNIDADE Bases Neuropsicológicas da Aprendizagem
Referências
COSENZA, R.; GUERRA, L. B. Neurociência e educação: como o cérebro aprende.
Porto Alegre: Artmed, 2011.
DOHERTY, G. Zero to six: the basis for school readiness. Apllied Research Branch
R.-97-8E, Ottawa, Canada: Human Resources Development, 1997.
SPITZER, M. Brain Research and Learning over the Life Cycle. In: Schooling for
tomorrow: Personalising education, OECD, 47–62. Paris: OECD, 2006.
26
Teorias da
Aprendizagem
Teorias Contemporâneas da Aprendizagem
Revisão Textual:
Prof.ª Me. Sandra Regina Fonseca Moreira
Teorias Contemporâneas
da Aprendizagem
OBJETIVOS DE APRENDIZADO
• Apresentar e discutir os principais modelos e teorias sobre a aprendizagem humana desde
a década de 1990 até os dias atuais;
• Apresentar suas implicações e perspectivas futuras.
UNIDADE Teorias Contemporâneas da Aprendizagem
Pense em um homem que vivia no Brasil no século XVIII, sua vida era limitada
ao trabalho, provavelmente no campo, não frequentava escolas, não tinha e-mails,
televisão, celular, internet, rádio ou telefone. As informações que ele tinha acesso
depois da escola, se tivesse a sorte de ter frequentado alguma, eram normalmente
por conversas com outras pessoas ou nas missas nas igrejas. O conhecimento de que
ele dispunha era suficiente para se manter vivo, fazer seu trabalho, ganhar dinheiro,
se sustentar e cuidar da família. Um adolescente e até mesmo uma criança, naquela
época, já poderiam ter praticamente todo o conhecimento necessário para uma vida
típica e sem muitas inovações.
No século XXI, a vida é muito diferente. Ter um emprego as vezes não é o sufi-
ciente e muitas pessoas acabam tendo uma, duas, três ou quatro profissões diferentes.
Você mesmo pode ter mais de um emprego e ainda que já tenha finalizado seus es-
tudos na escola, está agora fazendo este curso. Ter uma profissão já não é mais algo
para a vida toda. Um carpinteiro sabia que seria carpinteiro até seus últimos dias e
talvez seu filho também, e assim por diante. Da mesma forma, um médico sabia que
seria médico até seus últimos dias e seus filhos provavelmente também. As profissões
eram vocações e duravam a vida toda. Hoje não mais, hoje um psicólogo pode ser
professor, psicólogo e ainda ter um canal no YouTube, por exemplo.
8
A ideia do mundo VUCA reúne as principais características que definem o mun-
do em que vivemos no século XXI, um tempo marcado por mudanças constantes,
rápidas, e por incertezas. Originalmente, esse conceito foi empregado pelo exército
norte-americano, na década de 1990, para se referir a possíveis contextos de guerra.
Depois do atentado ao World Trade Center, em Nova York, em 11 de setembro
de 2001, esse termo passou a ser utilizado não apenas para cenários de guerra,
mas para definir toda a nossa sociedade. Em sociologia, o teórico polonês Zygmunt
Bauman (1925-2017) discutiu essas características da sociedade em nossos tempos,
empregando o termo “modernidade líquida”. Segundo ele, em nossa sociedade
atual, não temos mais certezas, pois tudo muda e tudo pode mudar a todo momento.
Café Filosófico sobre Bauman: diálogo da segurança e do efêmero, com Leandro Karnal.
Disponível em: https://youtu.be/LoxeltkRspY
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9
UNIDADE Teorias Contemporâneas da Aprendizagem
“Uma teoria da aprendizagem para o futuro deve defender o ensino de uma prontidão para
responder, de maneira criativa, à diferença e à alteridade. Isso inclui a capacidade de agir
imaginativamente em situações de incerteza (ELKJAER, 2013, p. 91).”. Qual é a importância
do estudo da aprendizagem no século XXI? Nossas escolas e universidades estão formando
alunos para o século XXI? O que é preciso mudar?
Não podemos nos enganar e pensar que isso significa que não há mais regras,
fatos, ou que não devemos considerar o que já foi feito. Precisamos sim considerar
tudo o que já foi produzido, e criticamente analisar o que ainda é possível ser uti-
lizado hoje, o que podemos mudar, o que será necessário para lidar com o hoje e
enfrentar o futuro. Também não podemos pensar que as teorias clássicas da apren-
dizagem estavam completamente erradas e não tenham mais nenhuma validade.
Pelo contrário, elas continuam sendo muito importantes e são a base de muitas das
teorias contemporâneas. A diferença essencial entre elas é a contextualização e per-
tinência aos problemas e evidências contemporâneos.
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Nesse sentido, pensar sobre a aprendizagem hoje não pode ser apenas pensar em
aprendizagem como aquisição de conhecimentos. O conhecimento está disponível em
todos os lugares e vai se modificando o tempo todo. Hoje é preciso aprender como
continuar aprendendo e se atualizar continuamente. É preciso que possamos aprender
como localizar as melhores informações, distinguir entre o que é certo e o que não é. Ao
invés de apenas aprender fatos, é cada vez mais importante hoje aprender como localizar
esses fatos e pensar criticamente sobre eles. Não basta mais apenas aprender na escola o
que o professor diz e levar isso para toda vida. Precisamos aprender que a aprendizagem
continua por toda a vida e o que considerávamos como fato pode se modificar também.
Assim, é importante frisar que muitas das teorias clássicas tratavam mais da apren-
dizagem na infância e no período de escolarização. Nas teorias contemporâneas,
vamos pensar na aprendizagem ao longo da vida, no que é preciso aprender além
do que tradicionalmente aprendíamos nas escolas, o que será necessário para o
mercado de trabalho e a vida, em um futuro cada vez mais incerto. Como dito ante-
riormente, não aprendemos apenas na escola, mas sim em todos os lugares. Agora é
preciso enfatizar que não aprendemos também apenas durante o período da escola,
mas sim o tempo todo. E o que aprendemos, ou devemos aprender, pode mudar
sempre. As aprendizagens são duradouras, mas não são imutáveis. Nós podemos e
devemos mudar sempre que necessário.
No século XXI, é preciso estar preparado para se adaptar às mudanças e a esse
ritmo acelerado de obtenção de informações. Não basta mais ter feito um curso de
Office 98 para estar apto para o mercado de trabalho hoje se vão te exigir conheci-
mentos do Office 365 e sabe-se lá qual versão eles irão inventar em um futuro breve.
É por isso que a principal ideia que se discute nos dias atuais é a de um conceito que
surgiu na Europa ainda na década de 1970, mas se popularizou nos anos 1990: a
ideia de aprendizagem ao longo da vida (lifelong learning). Entender a aprendiza-
gem ao longo da vida é pensar em uma educação que transcende os limites de ins-
tituições, idade e nível social, e que, portanto, deve ocorrer o tempo todo, de forma
perene, contínua (LONDON, 2011).
A ideia é superar visões anteriores que entendiam a aprendizagem como um pro-
cesso focal de aquisição de conhecimentos, expandindo a noção para a aprendiza-
gem contínua que engloba outros fatores que não apenas os cognitivos. Segundo
Jacques Delors, no relatório “Educação: um tesouro a descobrir”, da Unesco
(1998), esse conceito de educação ou aprendizagem ao longo da vida é a chave que
abre as portas do século XXI, pois elimina a distinção tradicional entre a educação
formal inicial e a educação permanente (ou continuada). Delors enfatiza a importân-
cia da articulação de quatro pilares da educação para o século XXI que, segundo ele,
não estavam recebendo a mesma atenção no século XX, com a prevalência dos dois
primeiros sobre os dois últimos. Os quatro pilares são:
• Aprender a conhecer: é o processo de aquisição de saberes, o prazer de com-
preender, construir e reconstruir o conhecimento. Inclui também a capacidade
de aprender a pensar e não apenas reproduzir um pensamento.
• Aprender a fazer: é o processo de aprender habilidades e competências, saber
lidar com desafios e criar soluções para eles. Inclui também habilidades de boa
comunicação e relação interpessoal.
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UNIDADE Teorias Contemporâneas da Aprendizagem
12
Erik Erikson (1902-1994), por exemplo, criou a teoria psicossocial do desenvol-
vimento, de matriz psicanalítica, na qual descreve oito estágios do desenvolvimento,
que vão desde o nascimento até a morte. Os quatro primeiros estágios cobrem do
nascimento até a infância, o quinto estágio se refere à adolescência, enquanto os
três últimos apresentam as características de adultos até a velhice. Em cada estágio,
Erikson (1998) descreve as crises psicossociais que caracterizam cada um deles,
por exemplo, discutindo como na fase adulta há uma necessidade de se pensar
na profissionalização e na produtividade. A discussão sobre as especificidades da
aprendizagem de adultos, portanto, é mais recente, e normalmente está atrelada à
profissionalização e ao mercado de trabalho.
Malcolm Knowles (1913-1997), por exemplo, ainda nos anos 1970, também apro-
fundou os estudos sobre a aprendizagem de adultos utilizando o termo andragogia
no sentido de educação de adultos, em oposição à pedagogia, como o estudo da
educação de crianças. Ele destacou diferenças importantes na forma como adultos
aprendem de maneira distinta das crianças. Os adultos, normalmente, precisam en-
contrar utilidade no que será aprendido, relacionando com as situações reais do seu
cotidiano. Eles aprendem melhor quando os conceitos são apresentados de forma
contextualizada e com alguma utilidade prática, em geral, relacionada à sua profis-
são. Além disso, adultos são responsáveis por suas escolhas e, portanto, precisam
participar do processo de decisão sobre o quê e como aprender, para que a motiva-
ção seja intrínseca. É importante também considerar que os adultos já acumularam
muitas vivências e conhecimentos prévios que devem ser reconhecidos e valorizados
para que se possam introduzir conhecimentos novos (KNOWLES, 1970).
Segundo London (2011), as teorias da aprendizagem contemporâneas, de modo
geral, consideram sempre o paradigma de aprendizagem ao longo da vida. Esse
conceito está muito relacionado com a ideia de aprendizagem de adultos e de edu-
cação para o mercado de trabalho, devendo também ser entendido no sentido de
que aprendemos e continuaremos aprendendo desde a infância até a nossa morte.
A aprendizagem ao longo da vida deve ser entendida como a maneira pela qual in-
divíduos ou grupos adquirem, interpretam, reorganizam, mudam ou assimilam um
conjunto de informações, habilidades, competências e sentimentos ao longo de toda
a vida; é o desenvolvimento contínuo de conhecimentos e habilidades que as pessoas
experimentam após a educação formal e ao longo de suas vidas. A premissa dessa
perspectiva é a de que não é viável equipar os alunos nas escolas ou faculdades com
todo o conhecimento e habilidades que serão importantes para que prosperem ao
longo da vida. Assim, é necessário que as pessoas continuem a buscar novas apren-
dizagens e a aprimorar seus conhecimentos e habilidades para lidar com os desafios
que o mundo impõe.
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UNIDADE Teorias Contemporâneas da Aprendizagem
Testar implicações
de conceitos em Experiência
situações novas concreta
Formação de Observações e
conceitos abstratos reflexões
e generalizações
Figura 1 – Representação do ciclo de aprendizagem
Fonte: KOLB, 1984, p 21
14
social e emocional ou da aprendizagem socioemocional. Como já mencionado
anteriormente, as abordagens teóricas no século XXI não são tão demarcadas quanto
eram as teorias do século XX. Abordagens como o behaviorismo, cognitivismo e
o construtivismo possuíam contornos mais delimitados, e mesmo quando teóricos
compartilhavam algumas ideias de diferentes abordagens, ainda assim era possível
classificar as suas teorias em uma ou outra abordagem. Esses limites têm sido cada
vez mais tênues, e atualmente os teóricos acabam transitando entre diferentes abor-
dagens, defendendo premissas gerais e outras específicas.
Ao longo das últimas décadas, as escolas foram cada vez mais sendo requisitadas a
cumprir funções que vão além da ideia de apenas transmitir todo o saber culturalmente
acumulado e selecionado. As escolas passaram a ser entendidas como um espaço
de socialização, em que se deve promover de forma explícita os aspectos sociais e
emocionais do desenvolvimento de crianças e adolescentes. Assim, a aprendizagem
social e emocional foi ganhando cada vez mais interesse e espaço por sua potencial
contribuição para o desenvolvimento integral dos aprendizes, e pela necessidade de
que essas habilidades sejam utilizadas em um mundo VUCA. Como já discutimos,
hoje não basta mais apenas aprender a saber e aprender a fazer, mas também é
necessário aprender a conviver e aprender a ser, o que depende em grande parte de
habilidades socioemocionais (COSTA & FARIA, 2013).
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UNIDADE Teorias Contemporâneas da Aprendizagem
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é fundamental para uma vida plena e para o exercício da cidadania em sociedades
democráticas contemporâneas.
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UNIDADE Teorias Contemporâneas da Aprendizagem
com base em seus próprios conhecimentos, os alunos começam a buscar ideias para
solucionar esse problema.
Nesse sentido, os alunos podem decompor o problema, identificar relações, funções,
estruturas, e com o auxílio do professor podem refletir sobre as melhores estratégias, e
decidir o que será possível fazer para solucionar o problema. A aprendizagem acontece
como consequência de todo esse processo. Dessa forma, pode-se realizar estudos indi-
viduais, grupos de discussões e registros de todo o procedimento. Por fim, é necessário
avaliar o trabalho desenvolvido e os resultados obtidos que deverão ser apresentados
para que se possa analisar os processos (BOROCHOVICIUS; TORTELLA, 2014).
Como você pode imaginar, essa proposta se assemelha mais a uma metodologia
de ensino do que a uma teoria da aprendizagem. Contudo, ainda podemos dizer que
se trata de uma teoria da aprendizagem, pois se propõe a explicar como ela ocorre
por meio das tentativas de encontrar soluções para uma determinada situação em
que se está enfrentando. A ideia é de uma relação dialética entre ensino e apren-
dizagem, portanto, ao falar de como aprendemos, também podemos efetivamente
descrever de que maneira é mais efetiva a aprendizagem.
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Outra forma de metodologia ativa é a aprendizagem entre times (Team Based
Learning – TBL), na qual criam-se equipes ou times dentro de uma mesma tur-
ma enfatizando a necessidade do trabalho em conjunto dentro de um mesmo time.
Os diferentes times podem ser responsáveis por um determinado projeto, problema
ou estudo de caso, e juntos devem buscar maneiras de resolver essa situação e pro-
duzir conhecimento de forma colaborativa. Além de possibilitar que os alunos apren-
dam a saber e a fazer, esse tipo de metodologia favorece o aprender a conviver e o
aprender a ser, pois essas situações possibilitam que os alunos reflitam sobre suas
próprias características individuais e em grupos, seus pontos fortes e fracos, e como
eles interagem com respeito à diversidade dos outros membros de seus times.
A aprendizagem baseada em problemas, ou essa concepção geral de metodolo-
gias ativas ajudam a repensar as situações de aprendizagem buscando transformar as
experiências em salas de aulas e mesmo em outros ambientes em que se tenham si-
tuações de aprendizagem. Ela integra conceitos de abordagens clássicas como o cog-
nitivismo e o construtivismo, e enfatiza a aprendizagem ao longo da vida, incluindo
também não apenas os aspectos cognitivos, mas a aprendizagem social e emocional,
estimulando o desenvolvimento de autonomia, resolução de problemas, tomada de
decisão, liderança, confiança, empatia, senso crítico, responsabilidade e cooperação
(BOROCHOVICIUS; TORTELLA, 2014).
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UNIDADE Teorias Contemporâneas da Aprendizagem
Hidden
Input
Output
Figura 2
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Essa visão recebeu também o nome de modelo conexionista. É importante frisar
que aqui conexões são entendidas como as sinapses entre os neurônios, diferente-
mente do que Thorndike postulou como modelo conexionista no começo do século
XX, em que as conexões eram as associações entre estímulos e respostas. Esses mo-
delos também são conhecidos como modelos de “redes neurais” porque se baseiam
na arquitetura do cérebro, representando a informação e os “estados mentais” por
padrões de atividade distribuídos por uma rede de unidades simples ao invés de por
estruturas simbólicas discretas como nos modelos computacionais. Os modelos co-
nexionistas são predominantes atualmente e explicam a aprendizagem de humanos,
animais e máquinas (LEFRANÇOIS, 2019).
Conectivismo
O Conectivismo é uma das teorias mais recente sobre a aprendizagem, conhecida
como uma teoria para a “Era Digital”. A proposta do conectivismo é que as tecnolo-
gias digitais reorganizaram a forma como vivemos, nos comunicamos e aprendemos
(SIEMENS, 2004). Por ser tão recente, essa proposta ainda é bastante limitada e
questionada por suas proposições. A ideia aqui de conectividade é semelhante à ideia
de conexão dos modelos conexionistas, mas com o foco na conectividade em redes
cibernéticas, isto é, o mundo interconectado pela internet.
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UNIDADE Teorias Contemporâneas da Aprendizagem
precisa muitas vezes enfrentar essa situação na qual ele não é mais a única ou prin-
cipal fonte de saber. O que o professor diz pode ser rapidamente contraposto com
uma simples pesquisa no Google ou outro site de buscas.
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Em Síntese
No século XXI, coexistem facilidades e dificuldades para a aprendizagem. Se por um lado
temos muitos recursos tecnológicos e abundante acesso a informações, por outro lado nem
sempre podemos confiar nessas informações e elas se modificam o tempo todo. As teorias
contemporâneas da aprendizagem não são tão delimitadas quanto no século XX, elas fo-
cam em aspectos fundamentais para a aprendizagem, como a necessidade de que se
entenda a aprendizagem ao longo da vida e não apenas os aspectos cognitivos inerentes
a essa aprendizagem.
Nesse sentido, o resgate dos aspectos socioemocionais é importante e ganha contor-
nos adicionais com as possibilidades de aprendizagem em comunidades, em redes na
internet. É fundamental que ao pensarmos em aprendizagem no século XXI pensemos
também em como está o nosso contexto, quais são as habilidades necessárias para viver
nesse momento histórico e o que será necessário para o futuro.
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UNIDADE Teorias Contemporâneas da Aprendizagem
Material Complementar
Indicações para saber mais sobre os assuntos abordados nesta Unidade:
Livros
Tempos líquidos
BAUMAN, Z. Tempos líquidos. Trad. Carlos Alberto Medeiros. Rio de Janeiro:
Jorge Zahar, 2007.
A teoria da aprendizagem experiencial como alicerce de estudos sobre desenvolvimento profissional
PIMENTEL, A. A teoria da aprendizagem experiencial como alicerce de estudos
sobre desenvolvimento profissional. Estud. psicol. (Natal), Natal, v. 12, n. 2, p.
159-168, Ago. 2007.
Como aprende o nativo digital: reflexões sob a luz do conectivismo
SILVA, E. M. O. Como aprende o nativo digital: reflexões sob a luz do conectivismo.
Revista intersaberes, v. 9, n. 17, p. 68-80, 2014.
Uma análise das duas revoluções cognitivas
VASCONCELLOS, S. J. L.; VASCONCELLOS, C. T. de D. V. Uma análise das duas
revoluções cognitivas. Psicol. estud., Maringá, v. 12, n. 2, p. 385-391, Ago. 2007.
Filmes
O Substituto (Detachment)
Apesar do dom de se apegar aos alunos, Henry escolhe ser professor substituto
para manter distância, mas essa barreira fica prestes a ser rompida ao começar a
trabalhar numa problemática escola pública. Ano: 2011. Direção: Tony Kaye.
https://youtu.be/s8AXzFF-bgs
24
Referências
BAUMAN, Z. Tempos líquidos. Tradução Carlos Alberto Medeiros. Rio de Janeiro:
Jorge Zahar, 2007.
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UNIDADE Teorias Contemporâneas da Aprendizagem
RIBEIRO, S. Tempo de cérebro. Estud. av., São Paulo, v. 27, n. 77, p. 07-22, 2013.
Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0103-
-40142013000100002&lng=en&nrm=iso>. Acesso em: 23/08/2020. http://
dx.doi.org/10.1590/S0103-40142013000100002.
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Teorias da
Aprendizagem
Teorias Clássicas da Aprendizagem
Revisão Textual:
Prof.ª Me. Sandra Regina Fonseca Moreira
Teorias Clássicas da Aprendizagem
OBJETIVO DE APRENDIZADO
• Apresentar e discutir as principais teorias clássicas sobre a aprendizagem humana, com
ênfase nas abordagens comportamentalista, cognitivista, construtivista e humanista.
UNIDADE Teorias Clássicas da Aprendizagem
Conheça mais sobre as abordagens discutidas aqui e outras lendo o livro de CARRARA, K. (org.).
Introdução à psicologia da educação: seis abordagens. São Paulo: Editora Avercamp, 2004.
8
por sua vez, foi o professor de Aristóteles. Não iremos discutir aqui em profundidade
suas ideias, proposições, convergências e divergências, mas apenas apresentar duas
formas distintas de pensar a aprendizagem que influenciaram e, podemos dizer que,
ainda influenciam a Filosofia e a própria Psicologia.
9
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UNIDADE Teorias Clássicas da Aprendizagem
Um livro com linguagem acessível e que apresenta de modo simplificado essas bases filo-
sóficas, bem como as demais abordagens e teóricos estudados nesse curso é de SCHULTZ,
D. P.; SCHULTZ, S.E. História da Psicologia Moderna. São Paulo: Cengage Learning, 2019.
10
primeiro laboratório de psicologia experimental em Leipzig, na Alemanha. Wilhelm
Wundt (1832-1920), o fundador da Psicologia Científica, dominava os dois campos
do conhecimento, Filosofia e Fisiologia, e ao criar o laboratório, deu as bases para
que a Psicologia pudesse definir seu objeto de estudos e métodos de investigação.
• Psicologia Experimental: estudo dos processos mentais básicos como a sensação e per-
cepção em laboratório, usando para a isso a introspecção, que é a reflexão sistemática
sobre os próprios processos mentais.
• Psicologia Cultural: estudos sobre fenômenos complexos como a aprendizagem, a lingua-
gem e as relações sociais, que se dariam por meio de observações naturalísticas, isto é, em
situações reais, como observando crianças aprendendo na escola.
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UNIDADE Teorias Clássicas da Aprendizagem
12
Behaviorismo
O Behaviorismo ou Comportamentalismo é uma perspectiva sobre a aprendiza-
gem que se concentra nas mudanças que ocorrem nos comportamentos observáveis
dos indivíduos, isto é, mudanças no que as pessoas dizem ou fazem. Os behavioristas
descrevem a aprendizagem em termos daquilo que se pode efetivamente observar, e
não no que se passa em nossas mentes, como pensamentos. Não significa que eles
ignorem completamente a existência dos processos mentais, mas sim que eles não
consideram que esses sejam fundamentais para explicar como as pessoas aprendem
ou se comportam (LEFRANÇOIS, 2019).
Durante pelo menos a primeira metade do século XX, essa foi a principal abor-
dagem da Psicologia nos EUA. No Brasil, essa também foi uma visão importante,
embora tenha perdido muito espaço na década de 1980, com o avanço de abor-
dagens construtivistas e cognitivistas, como veremos mais adiante. Embora exis-
tam muitos teóricos behavioristas, daremos destaque aqui para as contribuições
de John B. Watson, Ivan Pavlov, Edward L. Thorndike e B. F. Skinner. Pavlov e
Thorndike na verdade eram associacionistas, mas normalmente são apresentados
como behavioristas por sua contribuição ao surgimento dessa abordagem.
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UNIDADE Teorias Clássicas da Aprendizagem
Watson pautou suas ideias sobre aprendizagem nas pesquisas do fisiologista russo
Ivan Pavlov (1849-1936). Pavlov foi responsável pela chamada “Teoria do Reflexo”,
que foi formulada com base em seus estudos sobre a fisiologia do sistema gastroin-
testinal de cães. Em uma série de experimentos, Pavlov demonstrou que cães na-
turalmente salivam diante de comida, mas se a visão da comida for emparelhada
com a apresentação de um estímulo sonoro repetidas vezes, apenas ouvir o som
já passará a eliciar a resposta de salivação nos cães. Assim, Pavlov teorizou que se
houver o emparelhamento/associação de um Estímulo Incondicionado (EI – ver a
comida) e de um Estímulo Neutro não Condicionado (ENC – ouvir o som), repetidas
vezes, o comportamento reflexo (salivar) será eliciado com a apresentação apenas
do estímulo neutro – que então passará a ser chamado de Estímulo Condicionado
(EC). O comportamento reflexo em questão passa a chamar-se resposta ou Reflexo
Condicionado (RC). A esse procedimento de aprendizagem se dá o nome de con-
dicionamento clássico, condicionamento respondente, ou ainda aprendizagem
por substituição de estímulo (LEFRANÇOIS, 2019).
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A aprendizagem para Watson é baseada no modelo de Pavlov de condicionamento
clássico. Para ele, os homens nascem com um certo número de reflexos, como rea-
ções físicas e glandulares. Cada um desses reflexos é provocado por um estímulo,
por exemplo, ver comida e salivar, ou ser acariciado e ter sentimento de amor.
Assim, por meio do condicionamento clássico esses reflexos primários podem se tor-
nar complexos, como andar, falar, apaixonar-se, como o resultado de longas cadeias
de sequenciamento e articulação de reflexos básicos. Assim, toda aprendizagem tem
a ver com respostas que são selecionadas e encadeadas. Quanto mais complexa a
aprendizagem, maior o número de sequências de estímulo-resposta necessários.
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UNIDADE Teorias Clássicas da Aprendizagem
gatos faziam várias alternativas e modificavam suas novas respostas em virtude dos
erros. Isso foi crucial para o avanço no entendimento sobre a aprendizagem, que
até então era vista como se a resolução de problemas fosse resultado unicamente
por um insight que fazia com que o problema fosse resolvido de uma única vez, ao
invés de uma solução gradual, como na aprendizagem por tentativa e erro. Thorn-
dike identificou que a aprendizagem por tentativa e erro é um método básico de
aprendizagem usado por, essencialmente, todos os organismos para aprender novos
comportamentos ou resolver problemas (MOREIRA; MEDEIROS, 2007).
Insight: é um termo em inglês usado inicialmente pela Psicologia da Gestalt para se referir ao
momento em que uma pessoa compreende algo de forma súbita, ou que consegue encontrar
a solução de um problema ou situação complicada. Seria um equivalente do termo epifania.
16
Skinner trabalhou principalmente com ratos e pombos, usando um procedimento
semelhante a caixa de gatos de Thorndike, que alterada por ele, ficou conhecida
como “Caixa de Skinner”. Nesses experimentos, ratos ou pombos eram primei-
ramente privados de água ou comida e colocados em uma caixa especial na qual
conseguiam o alimento ou água se realizassem pequenas tarefas, como pressionar
botões ou alavancas. Skinner considerava que os princípios obtidos com essas pes-
quisas com animais também se aplicavam a seres humanos, o que foi demonstrado
posteriormente por inúmeras outras pesquisas (SKINNER, 2003).
Dentre esses princípios, ele descobriu que um organismo terá a tendência de
repetir uma resposta que foi reforçada e irá suprimir uma resposta que foi punida.
Dessa forma, Skinner avança os modelos behavioristas anteriores propondo um mo-
delo de tríplice contingência, ou seja, como S-R-C (estímulo-resposta-consequên-
cia). Um determinado estímulo é seguido por uma resposta do organismo e a conse-
quência dessa resposta pode influenciar para que a resposta volte a acontecer, ou seja
eliminada nas próximas vezes. Em outras palavras, todo comportamento aumenta
ou diminui de frequência em virtude das consequências que a seguem (MOREIRA;
MEDEIROS, 2007), uma ampliação da Lei do Efeito de Thorndike.
Para Skinner, as consequências dos comportamentos podem ser classificadas como
reforço ou punição. Quando as consequências aumentam a probabilidade de que o
comportamento se repita, são chamados de reforços. Quando a consequência diminui
a probabilidade de que o comportamento se repita, então chamamos de punição. É
importante que entendamos que o que é reforço ou punição dependerá muitas vezes
da pessoa, pois o que é reforçador para um pode ser punição para o outro (SKINNER,
2003). Uma pessoa pode adorar chocolates, que será um reforçador para ela, enquan-
to outra pode detestar, e assim o chocolate funcionará como punição.
Para Skinner, novos comportamentos normalmente são aprendidos por um pro-
cedimento denominado de modelagem ou aprendizagem por aproximações su-
cessivas. Nesse procedimento, a pessoa que está ensinando deve reforçar as respos-
tas parecidas com a resposta final gradualmente, até que se chegue cada vez mais
próximo da resposta final esperada. Uma professora, por exemplo, pode elogiar as
primeiras tentativas de escrita de uma criança, e, aos poucos, ir apresentando como
se deve escrever convencionalmente, até que a criança chegue no comportamento
final de escrever de forma autônoma e convencional.
Alguns efeitos importantes da aprendizagem são descritos por Skinner (2003), como
a generalização, onde um comportamento aprendido para uma situação é transferido
para outras situações. Por exemplo, a criança pode aprender a chamar um animal de
quatro patas que late de cachorro, e daí generalizar isso para todos os animais de quatro
patas, incluindo gatos. Até que ela aprenda a discriminação, ou seja, determinar quando
é apropriado ou não um determinado comportamento, por exemplo, diferenciar gatos
de cachorros. Por fim, há também a extinção, quando um comportamento deixa de ser
reforçado e por conseguinte passa a não ser mais emitido, sendo esquecido.
Skinner também propôs mudanças no processo de ensino, uma vez que para ele o
professor sozinho não teria condições para dar reforços a todos os alunos ao mesmo
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UNIDADE Teorias Clássicas da Aprendizagem
tempo. A solução encontrada por ele foi criar o que denominou de “máquinas de
ensinar”, que eram instrumentos mecânicos capazes de cumprir essa função de re-
forços graduais, para auxiliar ao professor. Nessas máquinas, os alunos respondem
a uma questão ou problema, e se a resposta for correta recebem reforço imediato e
passam para a próxima questão. Do contrário, não recebem reforço e podem tentar
novamente. O reforço poderia ser algo como um som ou pontuação. (SKINNER,
1972). Podemos considerar que as máquinas de ensinar foram as primeiras tentativas
do uso de computadores na Educação. Além disso, as ideias de Skinner ainda hoje
são utilizadas na construção de muitos softwares e jogos educacionais.
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Segundo Bandura, a aprendizagem por imitação ocorre quando as pessoas olham
e prestam atenção no que uma pessoa (modelo) faz, para então se lembrar do que o
modelo fez e por fim transformar essa aprendizagem em ação, podendo reproduzir
o mesmo comportamento. Pensando na escola, podemos notar vários exemplos de
aprendizagem vicária, como o fato de adolescentes começarem a se comportar de
modo semelhante, ou mesmo as crianças que imitam o jeito de seus pares ou adultos
próximos ao andar e falar.
A teoria da aprendizagem social é muito influente na psicologia clínica e no desen-
volvimento de métodos de ensino de habilidades sociais, e, transposta para a educação,
faz com que nós reconheçamos a importância das aprendizagens indiretas ou implícitas
que ocorrem o tempo todo na escola e fora dela. As crianças aprendem muito mais do
que o conteúdo formal ao qual são ensinadas, elas aprendem a postura e o interesse do
professor que ensina, aprendem com seus colegas e aprendem coisas que nem sempre
são explicitadas ou passíveis de serem avaliadas, como emoções, valores e crenças. Além
disso, Bandura mostrou que nem sempre a pessoa necessita ser reforçada ou punida
para aprender, aprende-se mesmo “sem querer”, e aprende-se por automotivação, por
exemplo, quando se quer muito fazer algo e se observa atentamente para aprender.
Cognitivismo
O Cognitivismo se caracteriza principalmente por ser a abordagem do processa-
mento da informação, partindo da premissa de que a mente humana funciona como
um computador que processa e transforma os estímulos ambientais que nos chegam
por meio dos órgãos de sentido. Os psicólogos cognitivos estão preocupados com
os processos mentais superiores, e não apenas com o comportamento observável,
como os behavioristas. Eles discutem a importância da aprendizagem como proces-
so de aquisição de conhecimentos e a necessidade de aprender a aprender, isto é,
de ter controle intencional sobre os próprios processos de aprendizagem. Os profes-
sores, nessa perspectiva, podem dar aos alunos a oportunidade de fazer perguntas,
refletir, falhar e pensar em voz alta. Essas estratégias podem ajudar os alunos a
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UNIDADE Teorias Clássicas da Aprendizagem
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neurociências e adota o termo conexionismo, em alusão às conexões entre os neurô-
nios (sinapses) que são responsáveis pelo processamento de todas as informações no
cérebro. Dessa forma, o processamento cognitivo ocorre sempre de forma paralela
e distribuída, não linear e sequencial como se pensava antes. Ou seja, as informa-
ções que chegam aos nossos órgãos sensoriais não são tratadas em uma linha de
produção como se pensava, mas sim de forma dividida (compartilhada) entre vários
neurônios que trabalham todos ao mesmo tempo.
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UNIDADE Teorias Clássicas da Aprendizagem
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Outra contribuição importante da Psicologia Cognitiva são os estudos sobre a
metacognição. John Flavell (nascido em 1928), definiu a metacognição, ainda
nos anos 1970, como o conhecimento que as pessoas têm sobre seus próprios
processos cognitivos e a habilidade de controlar esses processos, monitorando,
organizando e modificando-os para realizar objetivos concretos. Em outras palavras,
a metacognição se refere à habilidade de refletir sobre uma determinada tarefa (por
exemplo, ler, calcular, pensar, tomar uma decisão) e sozinho selecionar e usar o me-
lhor método para resolver essa tarefa.
Assim, um bom professor deveria incentivar seus alunos a planejarem seus pró-
prios modos de estudo e avaliarem a si mesmos, se estão com dificuldades e como
buscar alternativas para superá-las. Em outras palavras, os professores deveriam en-
sinar as crianças para desenvolverem essa habilidade de refletir sobre o melhor modo
para aprender, ou seja, desenvolverem a metacognição. Nesse sentido, a abordagem
cognitiva enfatiza que os alunos devem aprender a aprender, ou seja, desenvolver a
metacognição, e assim controlar intencionalmente seus processos de aprendizagem,
podendo aprender de maneira mais eficiente e significativa.
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UNIDADE Teorias Clássicas da Aprendizagem
Gardner, nos anos 1980, com base em suas pesquisas, formulou a “Teoria das
Inteligências Múltiplas”, que considera que não existe um só tipo de inteligência.
Gardner considera que para abarcar adequadamente o campo da cognição humana,
é necessário incluir um conjunto muito mais amplo e mais universal de competên-
cias do que se considerava até então (GARDNER, 1994). Nesta direção, ele passa a
definir inteligência como a capacidade de resolver problemas ou de criar produtos
que sejam valorizados dentro de um ou mais cenários culturais (GARDNER, 1994).
Para Gardner (1994), todos somos capazes de conhecer o mundo, criar coisas e
resolver problemas por meio de “inteligências” como a linguagem, a análise lógico-
-matemática, a representação espacial, o pensamento musical e o uso do corpo.
Contudo, é comum que um tipo de inteligência predomine em cada pessoa. Inicial-
mente, as pessoas nascem com um vasto potencial de talentos que são moldados
pela cultura, o que em grande parte é fruto da educação. Assim, cientistas podem
ter mais habilidade lógico-matemática, enquanto atores podem ter mais habilidade
corporal-cinestésica. Inicialmente, Gardner descreveu sete tipos de inteligência:
lógico-matemática, linguística, musical, espacial, corporal-cinestésica, intrapessoal,
interpessoal; mais recentemente, ele introduziu duas novas: naturalista e existencial.
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possui superioridade nas habilidades linguísticas; elas só possuem inteligências dife-
rentes e precisam receber ensino que propicie o desenvolvimento de todas as suas
potencialidades. Além disso, nossos sistemas de educação costumam valorizar mais
algumas habilidades, como a linguística, em detrimento de outras, como a lógico-
-quantitativa, o que implica muitas vezes em sufocar talentos para determinados
tipos de inteligência. Para Gardner, é necessário que a educação forneça um maior
equilíbrio, não privilegiando apenas um tipo de conhecimento, mas sim dando con-
dições para que todos se desenvolvam em todas as suas potencialidades.
Construtivismo
O Construtivismo considera que a aprendizagem é um processo de “construção”
pessoal do aprendiz. Os construtivistas acreditam que o ambiente social e o am-
biente físico propiciam oportunidades de interação entre os sujeitos e os objetos de
conhecimento, gerando conflitos, e consequentemente, uma reestruturação, pelo
aprendiz, de suas construções mentais anteriores. Na escola, para os construtivistas,
o aprendiz constrói ativamente o conhecimento ao seu modo e o professor é um
mediador da relação ensino-aprendizagem, possibilitando as situações e experiências
que ajudarão os aprendizes a construírem suas aprendizagens.
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vimento cognitivo se inicia com a capacidade inata dos seres humanos que, assim
como outros seres vivos, têm de se adaptar ao ambiente. A mais elevada forma de
adaptação humana é a cognição (ou conhecimento) e por isso ele estuda o desenvol-
vimento cognitivo (LEFRANÇOIS, 2019).
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UNIDADE Teorias Clássicas da Aprendizagem
Adaptação é o termo utilizado por Piaget para descrever como uma criança lida
com novas informações que parecem conflitar com o que ela já sabe. Por exemplo,
um recém-nascido tem apenas esquemas simples como os reflexos de sugar, alcançar
e agarrar, mas precisa adaptá-los para que se tornem mais complexos, coordenados
e propositais, como andar, falar, escrever etc. A adaptação envolve dois processos:
assimilação e acomodação. A assimilação ocorre quando se responde a situações
usando atividades ou conhecimentos já aprendidos. Novos objetos ou situações são
assimilados ao esquema quando se pode responder a eles usando o conhecimento
prévio. Uma criança pode somar 2+2 porque aprendeu regras de adição previamen-
te. Frequentemente, os esquemas prévios não servem para todas as situações novas
e é preciso modificá-los, o que ocorre por meio da acomodação, que significa mudar
nossas estruturas cognitivas para incluir um conhecimento novo.
Para exemplificar o que seriam esses processos, podemos pensar em uma criança
fazendo duas coisas distintas: brincar e imitar. Quando a criança brinca, ela usa pre-
dominantemente a assimilação, quando ela imita, ela usa a acomodação. Piaget diz
que ao brincar, a criança usa os esquemas já disponíveis e ignora tudo aquilo que
não se encaixa na brincadeira, por exemplo, brinca que uma cadeira é um cavalinho,
assimilando o andar a cavalo e ignorando que se trata de uma cadeira. Quando a
criança imita, ela modifica seu comportamento em função das demandas que lhe são
impostas por algo ou alguém, assim aprendendo algo novo (LEFRANÇOIS, 2019).
Assista ao vídeo “Coleção Grandes Educadores – Jean Piaget” para entender melhor sobre
a teoria e suas principais contribuições. Disponível em: https://youtu.be/rRLukE2HGzA
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O principal representante desse enfoque é o psicólogo bielo-russo Lev Semenovich
Vygotsky (1896-1934), que elaborou uma teoria do desenvolvimento cognitivo sus-
tentando que todo conhecimento é construído socialmente, no âmbito das relações
humanas. A abordagem proposta por Vygotsky buscava integrar, em uma mesma
perspectiva, o ser humano enquanto corpo e mente, enquanto ser biológico e cul-
tural, enquanto membro de uma espécie animal e participante de um processo his-
tórico. Entendia que o funcionamento psicológico tipicamente humano é cultural e,
consequentemente, histórico. E que havia elementos mediadores na relação entre o
homem e o mundo, que seriam os instrumentos, os signos e todos os elementos do
ambiente, carregados de significado cultural e construídos nas relações humanas.
Importante!
É mais comum utilizar o termo “aprendizado” do que aprendizagem para se referir à psi-
cologia de Vygotsky, pois em russo o termo usado por ele equivale a algo como o proces-
so de ensino-aprendizagem, isso é, ele inclui sempre aquele que aprende, aquele que en-
sina e a relação entre essas pessoas. Para Vygotsky, aprendizado é o “processo pelo qual o
indivíduo adquire informações, habilidades, atitudes, valores etc., a partir de seu contato
com a realidade, com o meio ambiente e com as outras pessoas” (OLIVEIRA, 2010, p. 59).
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UNIDADE Teorias Clássicas da Aprendizagem
Assista ao vídeo “Coleção Grandes Educadores – Lev Vygotsky” para entender melhor
sobre a teoria e suas principais contribuições. Disponível em: https://youtu.be/T1sDZNSTuyE
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aprendizagem do que em metodologias expositivas nas quais permaneçam muito
passivas. Essa proposta é coerente com outra contribuição muito significativa de
Bruner para a Educação, que foi a proposição do currículo em espiral. A ideia
central da proposta é que os alunos recebam uma informação básica sobre determi-
nado assunto de forma que possam construir uma base para aprender mais sobre o
assunto em situações futuras (por exemplo, mais aulas, semestres, anos escolares).
Os assuntos devem ser apresentados cada vez com mais detalhes e complexidades
permitindo que o aluno possa pensar e repensar sobre o assunto até que atinja o
domínio ou maestria (BRUNER, 1973).
Em outras palavras, isso que dizer que qualquer coisa pode ser ensinada, pelo
menos nas suas formas mais simples, a alunos de todas as idades, uma vez que os
mesmos tópicos serão, posteriormente, retomados e aprofundados. Nesse sentido,
ele expande a ideia de Vygotsky de zona de desenvolvimento proximal (ZDP), para
alavancar a aprendizagem por meio de Scaffolding (andaime), ou seja, para ele, o
professor deve criar condições de ensino que funcionem como andaimes para auxiliar
a criança a superar a sua ZDP e atingir novos patamares de aprendizagem.
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UNIDADE Teorias Clássicas da Aprendizagem
Assista ao vídeo “Coleção Grandes Educadores – Henri Wallon” para entender melhor
sobre a teoria e suas principais contribuições. Disponível em: https://youtu.be/ebt2iaiV9U8
Humanismo
O Humanismo foca no estudo das particularidades de cada ser humano, na com-
plexidade e singularidade de cada pessoa e nos seus motivos e interesses em apren-
der. A premissa da abordagem humanista é considerar a aprendizagem em uma
perspectiva mais ampla de desenvolvimento integral da pessoa. Essa abordagem
surgiu como uma forte crítica às ideias behavioristas e psicanalíticas predominantes
nos EUA até a década de 1950. Assim, partilha também de alguns princípios das
abordagens cognitiva e construtivista, entendendo a aprendizagem como um pro-
cesso individual de representação e reestruturação cognitiva, mas considerando que
o aprendiz deve ser o principal ator do seu processo de aprendizagem, refletindo,
questionando e fazendo escolhas.
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Carl Rogers (1902-1987) é o principal expoente do Humanismo e seus traba-
lhos são mais conhecidos pela prática clínica do que a educacional. Contudo, ainda
nos anos 1920, Rogers propôs uma nova forma de ensino que tomava o aluno como
o centro do processo educativo, mediante um estilo de aula tão diferente quanto atra-
tivo e estimulante, e que consistia em suprimir as aulas expositivas, e em aprender
sozinho, ou em grupos de trabalho sem a autoridade do mestre, cada qual se ocu-
pando dos seu próprios interesses (PUENTE, 1978). Essa proposta, conhecida como
o “ensino centrado no aluno”, era pautada em grande parte pelas ideias de John
Dewey, por isso a semelhança com a proposta construtivista também. Rogers enten-
dia que a aprendizagem é sempre individual, singular e peculiar para cada aprendiz,
mas valorizava também as relações interpessoais, principalmente na construção da
personalidade do indivíduo e no autoconceito para aprender.
Para Rogers, a educação ocorre pelo contato, assim, o professor deve ser um
educador-facilitador que não adota apenas um único modelo para facilitar a apren-
dizagem, mas que coloca o interesse dos aprendizes em primeiro lugar. Ele aponta
três condições que facilitam a aprendizagem do aluno: a autenticidade do professor,
a sua aceitação ou o apreço pelo aluno e a compreensão da realidade singular do
aluno. Entre essas três condições existe uma interdependência dinâmica, mas a mais
básica delas é a autenticidade do professor. Rogers enumera ainda uma quarta con-
dição, que seria a percepção do aluno das condições do professor, essa condição
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33
UNIDADE Teorias Clássicas da Aprendizagem
Uma das principais críticas dos humanistas à educação escolar é a variável mo-
tivação, que para eles é muito esquecida na escola, e sem a qual não pode existir
aprendizagem significativa. Rogers alerta aos educadores contra a ênfase apenas
na motivação extrínseca, para ele, a motivação intrínseca do aluno é que deve ser
estimulada. Desse modo, motivados intrinsecamente, os alunos podem ter a apren-
dizagem autoiniciada, buscando descobrir quais são os seus problemas reais e vitais
e chegarem à aprendizagem significativa.
Realização
Necessidades
Pessoal
Auto-Realização
Moralidade,
criatividade, solução de
problemas, ausência de
preconceitos, aceitação dos fatos.
Estima
Auto-estima, confiança, conquista
respeito dos outros, respeito aos outros. Necessidades
Psicológicas
Amor/Relacionamento
Amizade, família, intimidade sexual
Segurança
Segurança do corpo, do emprego, de recursos
da moralidade, da família, da saúde, da propriedade. Necessidades
Básicas
Fisiológicas
Alimento, roupa, repouso, moradia.
Figura 26
34
A contribuição de Maslow é importante para que não nos esqueçamos que ao
avaliar uma situação de aprendizagem é importante considerar esses diferentes
fatores. Uma criança com fome e medo dificilmente terá motivação intrínseca e
conseguirá aprender da mesma forma que uma criança que não tenha essas ca-
rências. Além disso, assim como Rogers alerta, é preciso que a motivação para
aprender seja cada vez mais uma necessidade interna de auto-realização do que
uma exigência externa, que force o aprendiz a algo que ele não vê como sendo
uma necessidade.
Outro teórico humanista é Joseph Novak (nascido em 1932), que também tra-
balhou com o cognitivista David Ausubel, que formulou a teoria do mapa conceitual
ou mapa mental, e que, assim como ele, discute sobre a aprendizagem significativa,
ampliando essa noção ao adotar uma perspectiva humanista. Para Novak, a aprendi-
zagem significativa subjaz à integração construtiva, positiva, entre pensamentos, sen-
timentos e ações, conduzindo ao desenvolvimento integral da pessoa. A perspectiva
de Novak é que quando a aprendizagem é significativa, o aprendiz cresce, tem uma
sensação boa e se predispõe a novas aprendizagens na área. Por outro lado, quando
a aprendizagem é mecânica, o aprendiz acaba por desenvolver atitudes negativas em
relação ao conteúdo a ser aprendido e não atinge a aprendizagem significativa. A teoria
de Novak é importante porque enfatiza a predisposição para aprender como uma
das condições para a aprendizagem significativa, enfatizando a integração entre pen-
samento, sentimentos e ações.
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UNIDADE Teorias Clássicas da Aprendizagem
Em Síntese
Nesta unidade, discutimos as principais teorias desenvolvidas ao longo do século XX,
mostrando como cada abordagem teórica foca diferentes aspectos sobre a aprendiza-
gem. Os associacionistas focam na associação entre as ideias. Os behavioristas enfa-
tizam o comportamento observável e o papel das contingências para a aprendizagem.
Os cognitivistas abordam os processos mentais envolvidos na aquisição, no processa-
mento e no armazenamento do conhecimento. Os construtivistas ressaltam o papel
ativo dos aprendizes na construção do conhecimento. Os humanistas, por sua vez, en-
fatizam a importância de se considerar a pessoa integral e a individualidade na apren-
dizagem. Todas essas abordagens contribuem para entender melhor a complexidade
e importância dos processos de aprendizagem e as implicações educacionais. Na pró-
xima unidade, iremos mais além dessas abordagens, discutindo seus desdobramentos
em abordagens mais contemporâneas e que trazem particularidades da aprendizagem
no século XXI.
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Material Complementar
Indicações para saber mais sobre os assuntos abordados nesta Unidade:
Livros
O processo da educação
BRUNER, J. S. O processo da educação. 3. ed. São Paulo: Companhia Editora
Nacional, 1973.
Introdução a psicologia da educação: seis abordagens
CARRARA, K. (org). Introdução a psicologia da educação: seis abordagens.
1. ed. São Paulo: Avercamp, 2004.
Vídeos
Beyond Wit and Grit: Rethinking the Keys to Success
https://youtu.be/IfzrN2yMBaQ
Leitura
Aprendizagem por observação: perspectivas teóricas
e contribuições para o planejamento instrucional – uma revisão
BORGES-ANDRADE, J. E. Aprendizagem por observação: perspectivas teóricas e
contribuições para o planejamento instrucional – uma revisão. Psicol. cienc. prof.,
Brasília, v. 1, n. 2, p. 2-68, jul. 1981.
https://bit.ly/2RavJ2n
Teorias de ensino: a contribuição de David Ausubel
RONCA, A. C. C. Teorias de ensino: a contribuição de David Ausubel. Temas
psicol, Ribeirão Preto, v. 2, n. 3, p. 91-95, dez. 1994.
https://bit.ly/32dwnmf
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37
UNIDADE Teorias Clássicas da Aprendizagem
Referências
BRUNER, J. S. O processo da educação. 3. ed. São Paulo: Companhia Editora
Nacional, 1973.
CUNHA, M. V. John Dewey, a outra face da escola nova no Brasil. In: GHIRALDELLI,
P. (Org.). O que é filosofia da Educação? 3. ed. Rio de Janeiro: DP&A editora,
2002. p. 248-263.
DUMARD, K. Aprendizagem e sua dimensão cognitiva, afetiva e social. São
Paulo: Cengage Learning, 2015.
FLAVELL, J. H. Metacognitive aspects of problem solving. In: RESNICK, L. B.
(Ed.), The nature of intelligence. Hillsdale, NJ: Erlbaum, 1976, p.231-236.
GARDNER, H. Estruturas da mente: a Teoria das Múltiplas Inteligências. Porto
Alegre: Artes Médicas, 1994.
HILL, W. F. Aprendizagem: uma resenha das interpretações psicológicas. Rio de
Janeiro: Ed. Guanabara dois, 1981.
LEFRANÇOIS, G. R. Teorias da Aprendizagem: o que o professor disse. São Paulo:
Cengage Learning, 2019.
LIMA, L. T.; BARBOSA, Z. C. L.; PEIXOTO, S. P. L. Teoria humanista: Carl Rogers
e a Educação. Ciências Humanas e Sociais. Alagoas, v.4, n.3., 2018.
MOREIRA, M. B.; MEDEIROS, C. A. Princípios básicos de análise do compor-
tamento. Porto Alegre: Artmed, 2007.
NOVAK, J. D. Uma teoria de educação. Trad. de A. Moreira. São Paulo: Pioneira, 1981.
OLIVEIRA, M. K. de. Vygotsky: aprendizado e desenvolvimento um processo sócio-
histórico. 3. ed. São Paulo: Scipione, 1995.
PAPALIA, D.; OLDS, S. W.; FELDMAN, R. D. Desenvolvimento Humano. 8 ed.
Porto Alegre: Artmed, 2006.
PUENTE, M. De la. O ensino centrado no estudante: renovação e crítica das teorias
educacionais de Carl R. Rogers. São Paulo: Cortez & Moraes, 1978.
RONCA, A. C. C. Teorias de ensino: a contribuição de David Ausubel. Temas psicol.,
Ribeirão Preto, v. 2, n. 3, p. 91-95, dez. 1994.
SALDAÑA, M. R. R.; DEL PRETTE, A.; DEL PRETTE, Z. A. P. A importância da
teoria da aprendizagem social na constituição da área do treinamento de habilidades
sociais. In: GUILHARDI, H. J.; MADI, M. B. B.; QUEIROZ, P. P.; SCOZ, M. C.
(Orgs.). Sobre comportamento e cognição: Contribuições para a construção da
teoria do comportamento. Santo André: ESETec., 2002, p. 269-283.
SKINNER, B. F. Ciência e comportamento humano. São Paulo: Martins Fontes, 2003.
________. Tecnologia do Ensino. S. Paulo: Editora Pedagógica. 1972.
STERNBERG, R.J. Psicologia Cognitiva. 5. Ed. São Paulo: Cengage Learning, 2010.
VYGOTSKY, L. S. A formação social da mente. 6. ed. São Paulo: Martins Fontes, 1998.
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Teorias da
Aprendizagem
Aprendizagem Humana no Século XXI:
Uma Compreensão Abrangente
Revisão Textual:
Prof.ª Me. Sandra Regina Fonseca Moreira
Aprendizagem Humana no Século
XXI: Uma Compreensão Abrangente
• Introdução;
• Definição de Aprendizagem;
• Panorama Histórico das Diferentes Abordagens Teóricas
da Aprendizagem;
• A Relação entre Aprendizagem e o Desenvolvimento Humano;
• Processos Básicos e Dimensões da Aprendizagem;
• Tipos de Aprendizagem;
• Condições Internas e Externas de Aprendizagem.
OBJETIVOS DE APRENDIZADO
• Apresentar um panorama geral de diferentes concepções, teorias e modelos sobre aprendi-
zagem desenvolvidos ao longo da história;
• Introduzir uma compreensão contemporânea abrangente sobre a aprendizagem e suas
implicações educacionais.
UNIDADE Aprendizagem Humana no Século XXI:
Uma Compreensão Abrangente
Introdução
O que é aprendizagem? O que você aprendeu para chegar até aqui? Como nós apren-
demos? Como sabemos que alguém aprendeu algo? Por que algumas pessoas apren-
dem melhor e mais rapidamente do que outras? Onde ficam armazenadas as nossas
aprendizagens? O cérebro aprende ou o corpo todo aprende? Há maneiras de aprender
melhor? Quais são os fatores que determinam o que aprendemos? Há limites para a
aprendizagem? Existem coisas que não conseguimos aprender? Por que criar diferentes
teorias sobre a aprendizagem? Por que eu deveria aprender sobre aprendizagem?
Essas são só algumas das inúmeras perguntas que você poderia estar se fazendo
ao começar esse curso de Teorias da Aprendizagem. Tipicamente, nós não pen-
samos muito sobre a aprendizagem e sua importância, mas o fato é que, pensando
sobre ou não, viver é aprender e estamos aprendendo o tempo todo e em diversas
situações. Estudar cientificamente a aprendizagem, portanto, nos permite entender
melhor como ela ocorre, o que facilita ou dificulta esse processo e como melhorar,
inclusive, a nossa própria aprendizagem. O interesse pelo estudo científico da apren-
dizagem não é novo, segundo Bigge (1977, p. 3) “O homem não só quis aprender
como também, frequentemente, sua curiosidade o impeliu a tentar aprender como se
aprende”, e assim surgiram as diferentes teorias sobre a aprendizagem.
Quando pensamos em aprendizagem, logo pensamos na escola, mas aprender
é muito mais amplo do que as aprendizagens que ocorrem no ambiente escolar.
Nem sempre nós nos lembramos disso, ainda que aprendamos a todo momento e
em todos os espaços possíveis. Não há nada que você saiba hoje que não tenha sido
aprendido em algum momento. E continuamos aprendendo sempre. Nós aprende-
mos o nome de pessoas novas, aprendemos novos caminhos, aprendemos novos
fatos, aprendemos novos sabores, aprendemos que antes havíamos aprendido algo
errado e que agora teremos que aprender de novo. A aprendizagem, portanto, não
está apenas na escola, ela está em todos os lugares, desde que nascemos até morrer-
mos, tudo o que faremos envolve sempre algum tipo de aprendizagem.
Nas últimas décadas, o tema da aprendizagem se tornou fundamental, não apenas
para os profissionais e estudantes de áreas como a Psicologia, Pedagogia e Educação,
como também em contextos políticos e econômicos. Esse interesse não é ao acaso,
na realidade o que se observou, nas últimas décadas, foi um crescente reconheci-
mento e a valorização da Educação como um importante meio de transformação
individual e social. A Educação é, por exemplo, um dos componentes utilizados
pela ONU para estimar o índice de Desenvolvimento Humano (IDH) e classificar os
países como desenvolvidos, em desenvolvimento ou subdesenvolvidos. Países desen-
volvidos têm melhores índices educacionais que, por sua vez, estão associados ao
bem-estar, ao desenvolvimento econômico e à qualidade de vida.
“A educação é a arma mais poderosa que você pode usar para mudar o mundo” – Nelson
Mandela. O que você pensa que Mandela quis dizer com essa frase? Você concorda com ela?
Como o estudo científico da aprendizagem pode ser importante para mudar o mundo?
8
Por outro lado, outro fator importante para o crescente reconhecimento da impor-
tância dos estudos sobre a aprendizagem vem dos avanços das pesquisas científicas,
sobretudo, oriundas das chamadas Ciências Cognitivas. Essas pesquisas promove-
ram avanços significativos em nossa compreensão sobre os mecanismos envolvidos
nos processos de aprendizagem e de ensino ampliando os debates e lançando luz
sobre a importância de que a Educação seja cada vez mais baseada em evidências
científicas, superando-se ações baseadas em crenças ou ideologias (ILLERIS, 2013;
THOMAS, PRING, 2007). Esses fatores, aliados com as mudanças trazidas com os
contínuos avanços tecnológicos, culminam na necessidade de constantes revisões
das teorias de aprendizagem, na busca por uma compreensão mais abrangente e
atualizada sobre como aprendemos no século XXI.
Neste curso, nós iremos discutir a aprendizagem em uma visão abrangente e con-
temporânea. Considerando-se a importância e contribuições das teorias clássicas,
mas contextualizando-as em seu período histórico e reconhecendo as novas contri-
buições das teorias contemporâneas. Nesse sentido, daremos foco para as principais
contribuições das Ciências Cognitivas. Optamos também por discutir nessa discipli-
na apenas a aprendizagem humana, embora exista vasta produção cientifica sobre a
aprendizagem animal, em especial no campo da Etologia.
Para saber mais sobre aprendizagem animal leia o livro de John Alcock, Comportamento
Animal: Uma Abordagem Evolutiva. Porto Alegre: Artmed, 2011.
Definição de Aprendizagem
Tradicionalmente, podemos pensar em aprendizagem como o processo de aqui-
sição de conhecimentos e habilidades. Contudo, atualmente, entendemos a apren-
dizagem como um conceito muito mais amplo, que inclui, além das dimensões cog-
nitiva e comportamental, também as dimensões emocional, motivacional e social
(DUMARD, 2015). Nesse sentido, a aprendizagem assume a natureza de desenvol-
vimento de competências, isto é, a capacidade de lidar com os diferentes desafios,
existentes e futuros, na vida profissional e em muitos outros campos de atuação
(ILLERIS, 2013). Assim, é muito difícil obter uma visão geral unitária da atual com-
preensão sobre o tema da aprendizagem, ainda assim, podemos dizer que ela se
caracteriza, antes de tudo pela complexidade.
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UNIDADE Aprendizagem Humana no Século XXI:
Uma Compreensão Abrangente
BASE
Biologia
Psicologia
Ciência Social
Ciência Cognitiva
CONDIÇÕES
CONDIÇÕES
APRENDIZAGEM EXTERNAS
INTERNAS
Disposições Estruturas Espaço de
Idade Tipos de Aprendizagem aprendizagem
Situação subjetiva Obstáculos Sociedade
Situação objetiva
APLICAÇÃO
Pedagogia/Educação
Políticas de
aprendizagem
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trazidas pela aprendizagem, e que dependem das experiências, com as mudanças que
ocorrem devido ao envelhecimento ou maturação como veremos mais adiante.
Como afirma Lefrançois (2019), aprendizagem pode ser entendida como toda
mudança relativamente permanente no potencial de comportamento, que resulta da
experiência, mas não é causada por cansaço, maturação, drogas, lesões ou doenças.
A aprendizagem é aquilo que acontece no organismo (humano ou não) como resultado
da experiência, dos eventos internos ou externos que estimulam novas formas de
pensar ou agir. Do ponto de vista comportamental, podemos saber que uma apren-
dizagem aconteceu quando ocorre uma mudança duradoura no comportamento (ex.
saber ler e escrever).
Mudança no
Aprendizagem: toda as
comportamento: mudanças
Experiência: As situações ou mudanças relativamente
observáveis ou potencialmente
eventos internos ou externos permanentes organismo que
observáveis após a experiência
a que estimulam a aprendizagem resultam da experiência e
e que oferecem evidência
não de outros fatores
de que a aprendizagem ocorreu
Figura 2
Fonte: Adaptado de LEFRANÇOIS, 2019, p. 5
Definir aprendizagem, portanto, não é simples, mas ao longo das próximas uni-
dades iremos gradativamente revisitar e complementar essa definição, adicionando
novos elementos, com novas proposições teóricas e evidências. O importante nesse
momento é entendermos que a aprendizagem trata de um fenômeno complexo, mas
que, de modo geral, indica sempre uma mudança duradoura de comportamentos,
habilidades e atitudes em função das experiências. Como resultado da aprendizagem,
em nível neurobiológico, observam-se mudanças nas sinapses, e, em nível psicos-
social, observam-se mudanças de comportamentos.
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UNIDADE Aprendizagem Humana no Século XXI:
Uma Compreensão Abrangente
No século XXI, temos observado cada vez mais uma compreensão abrangente
da aprendizagem. Por abrangente entendemos uma visão que considere os princí-
pios universais como proposto pelas macroteorias e as especificidades das diferen-
tes aprendizagens como estudado pelas microteorias. Essa visão mais abrangente
busca incorporar as evidências encontradas pelos diferentes teóricos e olhar para a
complexidade do fenômeno da aprendizagem em situações diversas. Reconhece-se
que aprender envolve mais do que apenas aspectos cognitivos e comportamentais,
mas também os aspectos emocionais, motivacionais e sociais/culturais. Essa é a vi-
são defendida pela Ciência Cognitiva e a que adotaremos neste curso.
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Linguística
Educação Neurociência
Inteligência Filosofia
artificial
Antropologia Psicologia
Figura 3
Como você já deve ter percebido até aqui, a aprendizagem é uma questão muito
complexa, envolve muitos fatores e diversas áreas do conhecimento têm produzido
subsídios para entendermos o que é e como ocorre a aprendizagem. Essa é a principal
razão para que o nome dessa disciplina esteja no plural e não no singular: Teorias
da Aprendizagem. Uma teoria científica é um conjunto de afirmações relacionadas
e que tem como função principal resumir e explicar as observações feitas por cien-
tistas ou pesquisadores (LEFRANÇOIS, 2016, p. 7). Ao longo da história, diversos
pensadores e pesquisadores olharam de diferentes maneiras para o fenômeno da
aprendizagem e criaram suas hipóteses e teorias.
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UNIDADE Aprendizagem Humana no Século XXI:
Uma Compreensão Abrangente
chocolate, mas nem sempre de estudar, então se dermos um chocolate para ela toda
vez que ela estudar, ela poderá ficar mais motivada a continuar estudando.
Assim, como já discutimos antes, não existe apenas uma única definição de
aprendizagem utilizada como conceito unitário. Pelo contrário, ao longo da história,
observamos o desenvolvimento de um grande número de teorias mais ou menos
singulares ou sobrepostas. Algumas dessas teorias são mais vigorosas, estudadas há
muitas décadas e já apresentam evidências bastante sólidas, elas são chamadas de
teorias clássicas da aprendizagem. Outras teorias são mais recentes, ainda estão
em pleno desenvolvimento e se fundamentam nas teorias clássicas e em novas evi-
dências, vamos denominar a essas de teorias contemporâneas da aprendizagem.
As teorias de Piaget, Vygotsky e Skinner, por exemplo, talvez sejam as mais conhe-
cidas teorias da Psicologia e amplamente utilizadas por educadores. Elas inclusive são
muitas vezes a base das teorias que denominamos aqui de contemporâneas. O que
as torna clássicas é realmente a sua importância e solidez, uma vez que muitas
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de suas hipóteses continuam ainda vigorosas, com muitas décadas de evidências
acumuladas. O fato dessas teorias serem amplamente conhecidas também faz com
que elas sejam amplamente mal compreendidas. Há muitos erros, generalizações
e misconceptions sobre esses teóricos e suas teorias.
Você Sabia
Misconception é um termo em inglês que traduzido literalmente significa equívoco, mas
essa expressão é normalmente utilizada em inglês para se referir a um entendimento equi-
vocado sobre um fato ou evidência científica. Assim, algumas pessoas leem apenas parte
da obra de um autor e derivam ideias que não foram necessariamente trazidas por esse
pesquisador.
À guisa de exemplificação, Jean Piaget, por exemplo, em sua teoria postula que o
desenvolvimento precede a aprendizagem, ou seja, as crianças precisam desenvolver
certas formas de pensar para compreender certos fenômenos. Contudo, algumas
pessoas interpretam erroneamente que, então, não se deve ensinar algumas coisas
para crianças pequenas, porque elas ainda não estão “aptas” a aprender. Na reali-
dade, isso é uma transposição de uma teoria da aprendizagem para uma teoria do
ensino feita de modo muito equivocado. Veremos melhor essas nuances ao longo
dessa e das próximas unidades.
O fato de as crianças ainda não terem desenvolvido certas formas de pensar, não
as limita totalmente, e elas podem sim potencialmente aprender desde que o con-
teúdo que se quer ensinar seja adaptado a sua compreensão, assim como também
propuseram teóricos como Vygotsky e Bruner. Outra misconception muito comum
é a de que os teóricos behavioristas como Skinner pensam na aprendizagem de um
modo muito mecanicista e sem considerar toda a subjetividade dos aprendizes ou a
importância da cultura, veremos mais adiante que se trata também de outra má-inter-
pretação. Um equívoco muito comum, independentemente da teoria, é acreditar que
a aprendizagem ocorra como um processo uniforme para todos os indivíduos, sem
reconhecer que na verdade há muita variação em função de diversos fatores como
as características individuais, o que será aprendido e as condições de aprendizagem.
O fato é que as teorias são sempre explicações possíveis sobre a realidade, por-
tanto, são fragmentadas e não são verdades absolutas e imutáveis, elas podem sim
serem equivocadas ou ficar ultrapassadas. Como conjuntos de explicações teóricas
sobre a realidade, elas precisam ser constantemente colocadas à prova. Faz parte do
método científico criar hipóteses sobre o mundo, isto é, respostas provisórias e, em
seguida, criar condições de testar essas hipóteses de modo objetivo e que possa ser
replicado por outras pessoas. Uma vez que se testa uma hipótese, pode-se encontrar
evidências em favor ou contrárias. Se as evidências forem a favor, avança-se um
pouco mais e se testa novas hipóteses, se forem contrárias, rejeitam-se as hipóteses
iniciais e criam-se novas hipóteses. Assim, o trabalho de um cientista nunca acaba,
pois sempre é necessário se pensar em novas respostas para explicar os fenômenos
que se apresentam. As teorias são vivas e continuam a evoluir. O que se pensava há
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UNIDADE Aprendizagem Humana no Século XXI:
Uma Compreensão Abrangente
100 anos sobre a aprendizagem, deve ser atualizado sempre em função de novos
conhecimentos, fatos, contextos e tecnologias.
Hoje, você está aprendendo via uma disciplina online, nosso contato principal
de professor-aluno está se dando via esse texto e algumas aulas em vídeo. Nossa
interação é diferente da que nossos pais, avós e bisavós vivenciaram quando estuda-
ram. Por certo tempo, houve até mesmo ensino a distância via cartas, hoje as pes-
soas recebem cada vez menos cartas, mas passaram a receber centenas de e-mails
que antes nem existiam. As salas de aula estão se transformando, e, como nós,
especialistas em aprendizagem, podemos pensar na aprendizagem nesses diferentes
contextos? Como podemos compreender as melhores formas de se aprender um
determinado conteúdo? Será que todo mundo aprende igual? Será que aprendemos
melhor que nossos antepassados? Será que aprendemos pior?
Essas respostas ainda estão porvir, mas espero que desde já esse seja o começo
de uma revolução de aprendizagens para você. Que você possa refletir sobre as dife-
rentes formas e possibilidades de aprender. Nunca esquecendo de que quem aprende,
aprende sempre alguma coisa. Não aprendemos de forma indeterminada e no vazio.
Assim, precisamos entender as particularidades da aprendizagem de diferentes con-
teúdos e em diferentes contextos. Aprender uma habilidade é diferente de aprender
um conhecimento, um fato etc. Aprender matemática, por exemplo, é diferente de
aprender a dirigir. Contudo, usamos sempre o mesmo corpo, o mesmo cérebro,
a mesma cognição para aprender e, por isso, é possível estudar cientificamente a
aprendizagem e encontrar princípios comuns a todas as aprendizagens.
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desenvolvimento e aprendizagem. Esses termos são comumente utilizados pelas
pessoas há muito tempo, sem que elas de fato pensem nos aspectos teóricos ou
conceituais que os cientistas atribuem a eles. Quando essas palavras são utilizadas
por psicólogos, elas ganham uma definição específica que as tornam não mais ape-
nas palavras, mas sim conceitos ou construtos teóricos. Nesse sentido, ouvimos as
palavras aprendizagem e desenvolvimento ao longo de toda nossa vida e podemos
ter várias ideias sobre elas, que são anteriores às definições conceituais que iremos
adotar nessa disciplina. Assim, é importante partirmos de definições iniciais e delimi-
tarmos o que entendemos por aprendizagem e desenvolvimento nesse curso.
Distinguir esses dois conceitos não é tarefa fácil, existem muitos debates e discor-
dâncias. Skinner, por exemplo, não utiliza a noção de desenvolvimento, antes, utiliza
apenas o conceito de aprendizagem em sua teoria, entendendo esta como as mudanças
duradouras que são consequências das respostas dadas pelo sujeito aos estímulos
fornecidos pelo ambiente externo. Para Skinner, tudo aquilo que somos e sabemos
é fruto da aprendizagem. Para Piaget, o desenvolvimento é fundamental, e é porque
nos desenvolvemos que podemos aprender, ou seja, ele enfatiza mais o crescimento
de nossas potencialidades que são frutos da nossa biologia e os processos mentais
de construção e assimilação desse conhecimento. Vygotsky, por sua vez, propôs que
desenvolvimento e aprendizagem são importantes, mas, ao contrário de Piaget, ele
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UNIDADE Aprendizagem Humana no Século XXI:
Uma Compreensão Abrangente
afirmava que não é preciso esperar que ocorra o desenvolvimento para que se possa
aprender, pois quando se aprende se avança no desenvolvimento.
Como você pode ver, não se trata apenas do uso de termos diferentes, mas tam-
bém de posições epistemológicas e explicações distintas. Em síntese, quando fala-
mos em desenvolvimento, estamos pensando mais nas mudanças que ocorrem ao
longo do tempo, sejam elas físicas, motoras, cognitivas, emocionais ou da personali-
dade de uma pessoa. Enquanto quando falamos de aprendizagem, estamos falando
de um processo de aquisição que permite a ocorrência de mudanças duradoras na
nossa vida como fruto da nossa interação com o meio físico e social.
A distinção que você deve fazer, portanto, é a de que as pessoas que estudam e
teorizam sobre o desenvolvimento estão pensando sobre o modo como as pessoas
crescem e mudam quando elas vão envelhecendo, já aprendizagem é um desses
mecanismos de mudança. Podemos estudar o desenvolvimento físico, motor, social,
linguístico, cognitivo, moral e afetivo. Os mecanismos envolvidos no desenvolvimento
podem ser diferentes. Um mecanismo é o crescimento, que é o processo físico de
desenvolvimento, mais especificamente o processo de ficarmos cada vez maiores
fisicamente. Por outro lado, temos a maturação, que é um processo de desenvolvi-
mento físico, intelectual ou emocional, mais influenciado pela genética. Por exemplo,
quando envelhecemos, nossa estrutura óssea cresce e se modifica e a maturação
sexual permite que os órgãos sexuais se tornem aptos para a reprodução.
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teorias de aprendizagem social ou behavioristas acabam enfatizando mais o processo
externo, por vezes ignorando ou minimizando a importância do processo interno.
Uma visão que reúne as duas visões é proposta por Illeris (2013) que, ao inte-
grar esses dois processos, aponta para a importância também de três dimensões
da aprendizagem. A dimensão do conteúdo, que diz respeito àquilo que deve ser
aprendido, como conhecimentos ou habilidades, valores, atitudes, métodos, estra-
tégias etc. A dimensão do incentivo, que diz respeito à energia mental necessária
para o processo de aprendizagem, envolvendo os sentimentos, emoções e motiva-
ção para aprender. E por último, a dimensão da interação, que propicia os im-
pulsos que dão início aos processos de aprendizagem, podendo ocorrer na forma
de percepção, transmissão, experiência, imitação, atividade, participação. Essa é a
dimensão que propicia a integração pessoal em comunidades e na sociedade. Assim,
a aprendizagem começa com o corpo e ocorre por intermédio do cérebro, que tam-
bém faz parte do corpo, e apenas gradualmente o lado mental é separado como uma
área ou função específica, mas nunca totalmente independente e sempre inserida
em um meio físico e social.
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UNIDADE Aprendizagem Humana no Século XXI:
Uma Compreensão Abrangente
Para saber mais sobre a história da humanidade e todas as aprendizagens e conquistas que
tivemos e nos caracterizam como humanos leia o livro de Harari, Y. N. Sapiens: Uma Breve
História da Humanidade. São Paulo: L&PM, Edição, 2015.
Tipos de Aprendizagem
Aprender não é apenas arquivar conhecimentos em nossos cérebros como se es-
ses fossem uma biblioteca antiga repleta de livros dispostos em estantes enfileiradas.
Na realidade, esse conhecimento é distribuído em várias redes neurais formadas
pelas múltiplas conexões entre neurônios e que possibilitam a criação do que os
psicólogos cognitivos chamam de esquemas mentais. Esses esquemas são o resul-
tado da aprendizagem, são um modelo mental, que é o resultado do processamento
cognitivo daquilo que foi aprendido e que nos possibilitará recuperar informações e
usá-las no momento apropriado (EYSENCK, KEANE, 2017; ILLERIS, 2013).
Outros tipos de aprendizagens são descritos por teóricos como o psicólogo norte-
-americano David Ausubel (1918-2008), por exemplo, que diferenciou entre a apren-
dizagem mecânica e a aprendizagem significativa. Uma aprendizagem é mecânica
quando ela acontece apenas por memorização, repetição e não tem um significado
real para aquele que está aprendendo. Por oposição, a aprendizagem significativa é
aquela em que o aprendiz relaciona o que está aprendendo com conhecimentos pré-
vios que já possuía e assim encontra sentido e significado nessa aprendizagem que,
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portanto, torna-se importante e duradora. Obviamente que o objetivo da educação
deveria ser criar situações para a aprendizagem significativa, mas isso nem sempre é
o que acontece na maioria de nossas escolas.
Isso não significa que a memorização não seja importante, mas que existem
diferentes tipos de aprendizagem para diferentes conteúdos. Aprender um número
de telefone é basicamente uma questão de aprendizagem mecânica, enquanto aprender
sobre aprendizagem deveria ser algo prazeroso e significativo, uma vez que você irá
utilizar esse conhecimento por muito tempo.
Esses não são os únicos tipos de aprendizagem e nem as únicas formas possíveis
de defini-los. Algumas vezes teóricos diferentes podem oferecer classificações distin-
tas para um mesmo tipo de aprendizagem já previamente estudado. Veremos mais
tipos de aprendizagens ao longo deste curso quando introduzirmos as teorias nas
próximas unidades.
Condições Internas e
Externas de Aprendizagem
Caminhando para a conclusão desta Unidade é importante apresentar uma breve
revisão e síntese focando em aspectos importantes sobre a aprendizagem.
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UNIDADE Aprendizagem Humana no Século XXI:
Uma Compreensão Abrangente
Uma criança que ainda não sabe ler passa, todos os dias, por várias coisas escritas
ao seu redor, como placas, letreiros, jornais, anúncios etc. E ela nem percebe que
elas estão ali ou que têm quaisquer significados. Contudo, uma vez que ela aprende
que as letras representam sons e a escrita, portanto, tem uma função de armazenar
e transmitir mensagens, essa mesma criança muda seu comportamento e passa a
se interessar e tentar ler tudo aquilo que ela encontra. Algumas vezes notamos essa
súbita diferença entre o não saber algo e o de repente compreender após uma apren-
dizagem, e podemos chamar a isso de insight.
As mudanças da aprendizagem nem sempre são tão óbvias como saber o nome
ou não de um dromedário. Algumas vezes elas são sutis, são mudanças de disposição
como quando adquirimos um hábito ou quando a criança passa a notar as palavras
escritas. Essas aprendizagens têm a ver com o que denominamos de motivação para
aprender (DUMARD, 2015). Estar motivado é estar interessado, disposto a conhe-
cer algo novo. Por algum tempo, valorizou-se mais os processos cognitivos do que
os volitivos e afetivos, mas hoje sabemos que a motivação, assim como o afeto, é
fundamental para aprender, e que ela pode ser tanto intrínseca quanto extrínseca.
Assim, os pais podem, por exemplo, tentar incentivar com presentes, brinquedos
ou até mesmo dinheiro. Os professores, por sua vez, podem tentar incentivar com
elogios, boas notas e até mesmo punições, como impedindo que a criança participe
do recreio, das aulas de educação física ou de algum jogo. Contudo, nenhum desses
casos será tão efetivo ou recomendável quanto estimular a criança a desenvolver
a própria motivação intrínseca pela aprendizagem. Como você pode imaginar até
aqui, quando a motivação é externa ela quase sempre será efêmera, fugaz e menos
efetiva do que a motivação interna. Pais e professores devem buscar auxiliar as
crianças a desenvolver a motivação intrínseca pela aprendizagem. A curiosidade está
ligada a motivação interna, quando estamos curiosos queremos aprender por vontade
própria. Como especialistas em aprendizagem, precisamos estimular o aprender a
gostar de aprender, querer aprender mais pelo fato de saber o novo e não por um
presente, recompensa ou mesmo punição.
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Assim, a aprendizagem depende sempre de condições internas e externas para
que ocorra. Internamente, podemos pensar na motivação e nos conhecimentos pré-
vios que facilitam ou dificultam a aprendizagem. Externamente, podemos pensar em
diversos fatores como as condições de ensino, as desigualdades socioeconômicas
e também a própria motivação. Em situações ideais é muito fácil aprender, mas o
mundo não é feito de situações ideais, e sim de situações reais e possíveis. Sempre
existirão diversos obstáculos para a aprendizagem e como um especialista em apren-
dizagem você deve buscar sempre entender quais são os fatores que estão influen-
ciando naquela situação específica. Quais são os fatores que explicam o porquê dessa
aprendizagem estar ou não ocorrendo?
Esses fatores podem ser muito diversos, podem ser relacionados, por exemplo,
ao tipo de conteúdo a ser aprendido. Algumas coisas são mais difíceis do que outras,
por exemplo, aprender a apontar o lápis é muito mais fácil do que aprender a fazer
desenhos ultrarrealistas. Nesse caso, é preciso delimitar os conhecimentos neces-
sários para se aprender, o que é o objetivo final, e criar condições, dividindo os
conteúdos em etapas mais simples. É para isso que existem os currículos e planos
de ensino nas escolas. Seria muito difícil ensinar como construir foguetes em uma
aula, mas é possível dividir em vários anos e várias disciplinas e assim ao final de
4 ou 5 anos você se tornaria hábil em construir foguetes ou pelo menos a entender
como pode continuar a aprender sobre isso. A mesma coisa em uma situação mais
simples como ensinar a ler. Ensinar a ler com fluência e compreensão um livro como
“Dom Casmurro”, de Machado de Assis, é impossível em uma só aula no 1º ano do
Ensino Fundamental. Mas podemos ensinar as crianças primeiro quais são as letras
do alfabeto, quais são os fonemas que elas representam, depois como dividir palavras
faladas em fonemas e usar letras para escrevê-las. Até que se ensina às crianças a
cada vez mais desenvolverem fluência e compreensão de leitura e elas possam ler
com prazer e autonomia um clássico como Dom Casmurro.
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UNIDADE Aprendizagem Humana no Século XXI:
Uma Compreensão Abrangente
Essa é uma discussão muito profícua e que ganhará cada vez mais corpo e con-
sistência a medida em que avançarmos neste curso. Espero que você tenha cada
vez mais motivação intrínseca para que continue a devorar cada unidade e busque
sempre mais informações. Este curso foi planejado para que você tenha todas os estí-
mulos e condições apropriadas para a sua aprendizagem e para aprender a aprender,
isto é, ter o controle intencional sobre suas formas de aprendizagem, podendo assim
aprender mais e de forma melhor. Nas próximas unidades, veremos como diferentes
teorias da aprendizagem contribuem para isso, lançando luz em diferentes pontos e
fatores importantes. Também veremos como particularidades da aprendizagem em
diferentes contextos. Por hora, desejo a você uma aprendizagem muito eficiente e
prazerosa. Até a próxima unidade!
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Material Complementar
Indicações para saber mais sobre os assuntos abordados nesta Unidade:
Livros
Entre a ciência e a sapiência: o dilema da educação
ALVES, R. Entre a ciência e a sapiência: o dilema da educação. São Paulo:
Edições Loyola, 2006.
Caçadores de neuromitos
EKUNI, R.; ZEGGIO, L.; BUENO, O. F. A. (eds.) Caçadores de neuromitos. O que
você sabe sobre o seu cérebro é verdade? São Paulo: Mennon, 2015.
Vídeos
Traga a revolução da aprendizagem!
ROBINSON K., Sir. Traga a revolução da aprendizagem! (2010) TED Talks.
https://bit.ly/321uOYC
Leitura
Motivação intrínseca e extrínseca: diferenças no sexo e na idade
PANSERA, S. M. et al. Motivação intrínseca e extrínseca: diferenças no sexo e na
idade. Psicol. Esc. Educ., Maringá, v. 20, n. 2, p. 313-320, Ago. 2016.
https://bit.ly/2F8bv6E
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UNIDADE Aprendizagem Humana no Século XXI:
Uma Compreensão Abrangente
Referências
BIGGE, M. L. Teorias da aprendizagem para professores. São Paulo: Editora
pedagógica e universitária, 1977.
THOMAS, G.; PRING, R.. Educação baseada em evidências: a utilização dos acha-
dos científicos para a qualificação da prática pedagógica. Porto Alegre: Artmed, 2007.
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