Eymael

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“Quem acredita sempre alcança”: Eymael se lança pela 6a vez à presidência da República

Uma pequena multidão se formava em frente ao San Marco Hotel, na Asa Sul brasiliense,
onde, naquela manhã de quarta-feira, 30 de março, aconteceria o lançamento das pré-candidaturas
da Democracia Cristã para as eleições de 2022. Dois ônibus e diversas vãs estavam lá paradas, e
delas afluíam militantes vestidos em coletes vermelhos, amarelos e negros.
Membros da Democracia Cristã? “Nem conheço o partido”, admite a técnica em
enfermagem Solange Soares. “É que o nosso sindicato costuma se hospedar aqui”, esclarece ela,
que viera de Uberaba, Minas Gerais, e, como a maioria ali, chegava à cidade para um protesto em
favor do reajuste salarial dos servidores públicos. Mas e o sr. José Maria Eymael, conhece? “Ah, o
da musiquinha? Esse eu sei quem é!”
Pouco a pouco, algumas pessoas que sabiam também do que se trata a Democracia Cristã
foram chegando. Entre elas, o publicitário Magyver Silva, 45 anos, que não se parecia tanto a um
sindicalista, mas sim a um político de gabinete, com o traje social e tudo. Ele estava ali para se filiar
à legenda liderada por Eymael.
“Escolhi o partido pelo jeito deles trabalharem, com o foco na família e no povo cristão”,
explicou. Em outubro, ele pretende tentar uma cadeira de deputado distrital em Brasília. Já para a
disputa do Executivo nacional, embora considere o governo Bolsonaro “maravilhoso”, depositará
pela primeira vez seu voto em Eymael. “Ele tem gabarito para chegar lá”, sentencia Magyver.

Vanguarda da velha guarda

Num auditório ornado com lustres cristalinos e um jardim de inverno com anjinhos e plantas
de plástico, a reduzida cúpula da Democracia Cristã aguardava a chegada de seu líder. A decoração
chamava a atenção: a bandeira nacional, a cruz, o símbolo da aliança e a foto de um sorridente
Eymael destacavam-se.
Aproximadamente 90 cadeiras esperavam por seus ocupantes, enquanto das caixas de som
emanava repetidas vezes a canção “Mais uma vez”, de Renato Russo, cujo verso mais conhecido
declara: “Quem acredita sempre alcança”.
Sem estardalhaço, Eymael chegou ao salão, sendo cumprimentado com deferência por seus
pares. Estava ao telefone, pois naquela mesma manhã um evento do Tribunal Superior Eleitoral
(TSE) reuniria, de forma virtual, os presidentes dos partidos para tratar das eleições. Ele pediu ao
seu interlocutor que agradecesse ao ministro Fachin pela inclusão, em seu discurso de posse, da
expressão “sociedade constitucional, livre, justa e solidária” - trecho da Constituição de 1988 que o
próprio Eymael sugeriu, segundo afirmou ao TAB.
Democrata cristão desde 1962, ele viu o partido ser dissolvido pela ditadura militar em
1965. E viu também a ditadura ruir nos anos 1980, quando foi deputado constituinte, tendo várias
de suas propostas aprovadas. Disputou a presidência da República em cinco oportunidades, e, aos
82 anos, caminha para a 6a tentativa. Porém não se considera um político da “velha guarda”.
“Não sou da velha guarda, sou da vanguarda”, afirma, sempre sorridente. E completa,
destacando inclusive o peso da experiência de um de seus adversários: “Nesta eleição, pela primeira
vez na história, dois brasileiros disputarão pela 6 a vez a presidência: o constituinte Eymael e o
constituinte Lula”.
Além de ter convivido com Lula durante a constituinte e de o ter apoiado nas eleições de
2002 – quando, afirma Eymael, ele foi também o responsável pela criação do bordão “A Esperança
vence o Medo” –, o democrata cristão foi colega de partido de outros dois personagens centrais da
República: de Jânio Quadros, nos anos 1960, e, no início dos anos 1990, de Jair Bolsonaro.
Mas ao contrário de alguns analistas políticos, ele rejeita as comparações entre os dois.
“O Jânio não planejava o que ia falar, as vezes era meio agressivo, mas era também
autêntico. E não visava criar problemas com suas falas. Nesse aspecto, o presidente Bolsonaro as
vezes claudica um pouco”, avalia Eymael.
Também em outro momento o então deputado federal Bolsonaro claudicou. Foi em 1993,
quando a Democracia Cristã, pela segunda vez, deixou de operar no Brasil. Tendo elegido 22
deputados e nas eleições de 1990, a mais bem-sucedida de sua história, a legenda recebeu consultas
do Partido Democrático Social (PDS) de Maluf, herdeiro da ARENA dos militares, para uma fusão.
Eymael opôs-se frontalmente, formando um bloco “de três ou quatro deputados” para resistir
à ideia. Entre eles, estava o jovem Bolsonaro. “Mas depois ele tornou-se adepto fervoroso da fusão.
Ele foi um dos responsáveis pela destruição da Democracia Cristã em 93”, lamenta Eymael.

O contador de histórias

O evento começou com os hinos do Brasil, do DF e o da própria Democracia Cristã, quando


Eymael tomou o microfone e, com a empostação de um crooner, cantou a marchinha, animando a
audiência: “Nossos valores são os valores da família / na defesa de uma pátria irmã”.
Em seguida discursou o professor Lucas Salles, que lançava sua pré-candidatura ao governo
do DF. Ele narrou a história de Brasília, desde o sonho do velho José Bonifácio nos tempos do
Império até a instituição da capital por Juscelino Kubitschek.
Foi de Salles a iniciativa de entregar a Bíblia e a Constituição a Eymael, arrancando
aplausos da plateia. “Só o senhor pode fazer esse gesto nesta eleição, com todo respeito aos demais
candidatos”, disse, numa possível indireta a Ciro Gomes (PDT), que postou um vídeo em suas redes
virtuais exibindo os dois livros.
Quando chegou a sua vez de falar, Eymael foi logo avisando: “sou um contador de
histórias”. Se na propaganda eleitoral de TV seu tempo não passa de uns poucos segundos, na
cerimônia da Democracia Cristã ele pôde discursar à vontade, por quase uma hora.
Entre as muitas histórias que contou, estava aquela cujos frutos ouvimos a cada quatro anos
na propaganda eleitoral. A história do jingle “Ey-Ey-Eymael / um democrata cristão”.
Foi um momento de emoção, pois esta será a primeira eleição em que seu autor, José
Raimundo de Castro, não ouvirá a obra-prima em rede nacional. Morto aos 96 anos em dezembro
do ano passado, ele atuava simultaneamente como alfaiate, tesoureiro do partido e, é claro,
compositor popular.
“Em 1985, estávamos discutindo com que nome eu disputaria a prefeitura de São Paulo”,
contou Eymael. “Tínhamos uma certeza cartesiana: eu podia ser candidato como J.M., como José
Maria, mas jamais como Eymael. Nome difícil, um Y no meio… Aí o Castro disse: mas se a gente
ensinar o povo a dizer Eymael, o povo não esquece mais”.
O compositor pediu dois dias para compor o jingle, e “só pra não magoar o companheiro,
sem nenhuma expectativa de sucesso”, o tempo lhe foi concedido. Terminado o prazo, ele ligou
para Eymael e cantou a música ao violão.
“Quando ele terminou, disse a ele: Castro, a partir de hoje devo a você a minha história
política. Senti que ele tinha feito algo de gênio!”, arrematou o eterno candidato à presidência.
Simultaneamente, o DJ botou o jingle para tocar, sendo acompanhado por cada um dos democratas
cristãos no auditório, comprovando a genialidade pressentida por Eymael.

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