03 Organização Do Tempo e Espaço Físico Na Escola
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O professor também necessita de tempo para conhecer melhor seus alunos, exercer sua formação
continuada dentro do ambiente escolar, participar de cursos e palestras de formação continuada, pre-
parar suas aulas, diários, avaliações, atividades didáticas e acompanhar e avaliar o projeto político-
pedagógico em ação.
O estudante também precisa de tempo para, entre outras coisas, se organizar e criar seus espaços
para além da sala de aula.
Além disso, essa organização do tempo escolar de cada escola deve levar em consideração a reali-
dade, a região e a estrutura de cada instituição e dos alunos. Por exemplo, em regiões onde a maio-
ria da população, o que engloba os alunos, trabalha na área rural, o calendário escolar deve levar em
conta as épocas de safra e entressafra.
As pessoas mais indicadas para a organização desse tempo escolar são os próprios professores, por
conhecerem as necessidades e a realidade da sala de aula. No entanto, verifica-se que, na maioria
dos casos, são especialistas e membros de outras áreas, os responsáveis por esta parte.
Assim, o resultado é que o tempo escolar fica muito compartimentado e hierarquizado. Isto significa
que a grade curricular, que fixa o tempo de cada disciplina, concede mais tempo – que normalmente
é apenas de uma hora ou menos – para disciplinas que são consideradas de mais importância em
detrimento de outras, que acabam ficando prejudicadas por terem menos tempo para serem desen-
volvidas.
Comentando sobre esse assunto e sobre o resultado imediato no desenvolvimento escolar dos alu-
nos, Enguita (1989) diz:
A sucessão de períodos muito breves – sempre de menos de uma hora – dedicados a matérias muito
diferentes entre si, sem necessidade de sequência lógica entre elas, sem atender à melhor ou à pior
adequação de seu conteúdo a períodos mais longos ou mais curtos e sem prestar nenhuma atenção
à cadência do interesse e do trabalho dos estudantes; em suma, a organização habitual do horário
escolar ensina ao estudante que o importante não é a qualidade precisa de seu trabalho, a que o de-
dica, mas sua duração. A escola é o primeiro cenário em que a criança e o jovem presenciam, acei-
tam e sofrem a redução de seu trabalho a trabalho abstrato. (ENGUITA, 1989, p.180)
Desse modo, vários autores, como Veiga (p. 30) concordam que é necessário reformular a forma em
que o tempo escolar é organizado, para alterar a qualidade do trabalho pedagógico.
É no espaço físico que a criança consegue estabelecer relações entre o mundo e as pessoas, trans-
formando-o em um pano de fundo no qual se inserem emoções [...] nessa dimensão o espaço é en-
tendido como algo conjugado ao ambiente e vice-versa. Todavia é importante esclarecer que essa
relação não se constitui de forma linear. Assim sendo, em um mesmo espaço podemos ter ambientes
diferentes, pois a semelhança entre eles não significa que sejam iguais. Eles se definem com a rela-
ção que as pessoas constroem entre elas e o espaço organizado.
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O espaço criado para a criança deverá estar organizado de acordo com a faixa etária da criança, isto
é, propondo desafios cognitivos e motores que a farão avançar no desenvolvimento de suas potencia-
lidades. O espaço deve estar povoado de objetos que retratem a cultura e o meio social em que a cri-
ança está inserida. Gandini (1990, p.150) diz que: “o espaço reflete a cultura das pessoas que nele
vivem de muitas formas e, em um exame cuidadoso, revela até mesmo as camadas distintas dessa
influência cultural”.
Reconhecendo que a criança é fortemente marcada pelo meio social em que se desenvolve, e que
também deixa suas próprias marcas neste meio, que tem a sua família como o seu principal referen-
cial, apesar de todas as relações que ocorrem em todos os níveis sociais, o espaço infantil deve prio-
rizar remeter a história da criança para o seu contexto e através disto promover a troca de saberes
entre as crianças. Segundo o Referencial Curricular Nacional da Educação Infantil (1998, vol 1, p. 21-
22): “as crianças constroem o conhecimento a partir das interações que estabelecem com as outras
pessoas e com o meio em que vivem.
O conhecimento não se constitui em cópia da realidade, mas sim, fruto de um intenso trabalho de cri-
ação, significação e ressifignificação”. As interações que ocorrem dentro dos espaços são de grande
influência no desenvolvimento e aprendizagem da criança.
O educador não deve ser visto como figura central do processo de ensino aprendizagem, mas sim
como alguém mais experiente que aprende e permite ao educando aprender de forma mais lúdica
possível. Devemos destruir a crença de que a criança só aprende se um professor ensinar, e de que
só o professor é responsável pelo desenvolvimento de todas as potencialidades da criança. A criança
através do meio cultural, das suas interações com o meio seja em um trabalho individual ou coletivo é
a verdadeira construtora do seu conhecimento. De acordo com Oliveira (2000, p.158):
O ambiente, com ou sem o conhecimento do educador, envia mensagens e, os que aprendem, res-
pondem a elas. A influência do meio através da interação possibilitada por seus elementos é contínua
e penetrante. As crianças e ou os usuários dos espaços são os verdadeiros protagonistas da sua
aprendizagem, na vivência ativa com outras pessoas e objetos, que possibilita descobertas pessoais
num espaço onde será realizado um trabalho individualmente ou em pequenos grupos.
Os espaços construídos para criança e com a criança devem ser explorados pela mesma, em uma
relação de interação total, de aprendizagem, de troca de saberes entre os pares, de liberdade de ir e
vir, de prazer, de individualidades, de partilhas, enfim, de se divertir aprendendo.
Desde que nasce a criança precisa de espaços que ofereçam liberdade de movimentos, segurança e
que acima de tudo possibilitem sua socialização com o mundo e com as pessoas que a rodeiam. Es-
paços estes de direito de todas as crianças sejam eles: públicos, privados, institucionais ou naturais.
Segundo Lima (2001, p.16): “o espaço é muito importante para a criança pequena, pois muitas, das
aprendizagens que ela realizará em seus primeiros anos de vida estão ligadas aos espaços disponí-
veis e/ou acessíveis a ela”.
Segundo Piaget citado por Kramer (2000, p. 29): “o desenvolvimento resulta de combinações entre
aquilo que o organismo traz e as circunstâncias oferecidas pelo meio [...] e que os esquemas de assi-
milação vão se modificando progressivamente, considerando os estágios de desenvolvimento”. Todo
ser humano carrega desde sua concepção conhecimentos e através da interação com o meio vai de-
senvolvendo estes conhecimentos. Piaget considera a interação indivíduo / meio apenas sem consi-
derar as interações entre as crianças e suas diferentes culturas. Vygotsky já enfatiza a troca de co-
nhecimentos que ocorrem através das interações entre individuo / meio/ individuo.
Segundo Vygotsky: “o ser humano cresce num ambiente social e a interação com outras pessoas é
essencial ao seu desenvolvimento”. (apud DAVIS e OLIVEIRA, 1993, p. 56).
Portanto um ambiente estimulante para a criança é aquele em que ela se sente segura e ao mesmo
tempo desafiada, onde ela sinta o prazer de pertencer a aquele ambiente e se identifique com o
mesmo e principalmente um ambiente em que ela possa estabelecer relações entre os pares. Um
ambiente que permite que o educador perceba a maneira como a criança transpõe a sua realidade,
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seus anseios, suas fantasias. Os ambientes devem ser planejados de forma a satisfazer as necessi-
dades da criança, isto é, tudo deverá estar acessível à criança, desde objetos pessoais como também
os brinquedos, pois só assim o desenvolvimento ocorrerá de forma a possibilitar sua autonomia, bem
como sua socialização dentro das suas singularidades.
Os espaços devem ser organizados de forma a desafiar a criança nos campos: cognitivo, social e mo-
tor. Oportunizando a criança de andar, subir, descer e pular, através de várias tentativas, assim a cri-
ança estará aprendendo a controlar o próprio corpo, um ambiente que estimule os sentidos das crian-
ças, que permitam a elas receber estimulação do ambiente externo, como cheiro de flores, de alimen-
tos sendo preparados. Sentindo a brisa do vento, o calor do sol, o ruído da chuva. Experimentando
também diferentes texturas: liso, áspero, duro, macio, quente, frio. Carvalho & Rubiano (2001, p.111)
dizem que: “a variação da estimulação deve ser procurada em todos os sentidos: cores e formas; mú-
sicas e vozes; aromas e flores e de alimentos sendo feitos; oportunidades para provar diferentes sa-
bores”.
Personalizar o ambiente é muito importante para a construção da identidade pessoal da criança, tor-
nar a criança competente é desenvolver nela a autonomia e a independência. Ao oferecer um ambi-
ente rico e variado se estimulam os sentidos e os sentidos são essenciais no desenvolvimento do ser
humano. A sensação de segurança e confiança é indispensável visto que mexe com o aspecto emo-
cional da criança. Oportunizando as crianças de interagirem e em certos momentos que desejarem
ficarem sozinhas brincando. David & Weinstein citados por Carvalho e Rubiano (2001, p.109) afirmam
que:
Todos os ambientes construídos para crianças deveriam atender cinco funções relativas ao desenvol-
vimento infantil, no sentido de promover: identidade pessoal, desenvolvimento de competência, opor-
tunidades para crescimento, sensação de segurança e confiança, bem como oportunidades para con-
tato social e privacidade.
O Brinquedo faz parte da vida da criança independentemente do nível social ou cultural a que per-
tence. Segundo Horn (2004, p.70): “o brinquedo sempre fez parte da vida das crianças, independen-
temente de classe social ou cultural em que está inserida”.
É intrínseco da criança o hábito do brincar. Até mesmo ao se alimentar, a criança brinca com os ali-
mentos. Portanto ao proporcionar diversos espaços para a criança brincar e agir dentro do espaço, se
estará propondo novos desafios que tornarão a criança um agente da sua própria aprendizagem de
forma mais lúdica.
Vygotsky citado por Rego (2002, p.80): “considera o brinquedo uma importante fonte de promoção de
desenvolvimento. Afirma que, apesar do brinquedo não ser o aspecto predominante da infância, ele
exerce uma enorme influência no desenvolvimento infantil”.
Portanto não devemos conceber a infância longe do brinquedo visto a importância do mesmo aqui re-
ferenciada. E principalmente de proporcionar o brinquedo em ambientes preparados para que a cri-
ança brinque com liberdade de ação e em total interação com outras crianças.
Brincar para a criança é principalmente estar presente no ambiente, se constituindo como individuo e
compartilhando significados. Brincar em um ambiente aconchegante, que retrate a identidade da cri-
ança e de livre acesso ao mesmo, é fundamental no seu desenvolvimento, visto que se estará promo-
vendo a interação entre criança / criança, criança / educador e até mesmo respeitando os momentos
em que a criança prefere brincar sozinha, pois só assim se respeitará a individualidade da criança.
Segundo Carvalho & Rubiano (2001, p.109):
...é altamente recomendável que ambientes institucionais ofereçam oportunidade para as crianças
desenvolverem sua individualidade, permitindo-lhes ter seus próprios objetos, personalizar seu es-
paço e, sempre que possível participar nas decisões sobre a organização do mesmo.
De acordo com Horn (2004, p. 71): “o brinquedo satisfaz as necessidades básicas de aprendizagens
das crianças, como, por exemplo as de escolher, imitar, dominar, adquirir competências, enfim de ser
ativo em um ambiente seguro, o qual encoraje e consolide o desenvolvimento de normas e valores
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Brincando (e não só) a criança se relaciona, experimenta, investiga e amplia seus conhecimentos so-
bre si mesma e sobre o mundo que está ao seu redor. Através da brincadeira podemos saber como
as crianças vêem o mundo e como gostariam que fosse, expressando a forma como pensam, organi-
zam e entendem esse mundo. Isso acontece porque, quando brinca, a criança cria uma situação ima-
ginária que surge a partir do conhecimento que possui do mundo em que os adultos agem e no qual
precisa aprender a viver.
Ao brincar a criança expressa seus anseios, sua maneira de como está percebendo o mundo que a
cerca e principalmente está vivendo a sua infância. Tem também suas necessidades satisfeitas que
são: adquirir novos conhecimentos, habilidades, pensamentos e entendimentos coerentes e lógicos.
Reconhecendo-se em um meio e como parte do mesmo, ela cria sua própria brincadeira interagindo
com todos que a rodeiam. Temos aí então a importância de se oferecer um espaço povoado de obje-
tos disponíveis e acessíveis à criança.
Brincando nos espaços com seus brinquedos e objetos variados e escolhendo o espaço que deseja
brincar e com quem deseja brincar, é uma atividade enriquecedora visto que, as trocas de saberes
que ocorrerão naturalmente através das diversas linguagens sejam elas:oral, corporal, gestual, musi-
cal retratando a realidade de cada um. A criança ao agir com fantasia é estimulada a usar de criativi-
dade, usando como parâmetro o seu mundo infantil.
A Intervenção Do Educador
O brincar é sempre estruturado pelo ambiente, pelos materiais ou contexto em que ocorre. Ao educa-
dor cabe então participar como uma pessoa mais experiente, que deverá intervir quando necessário e
também ter uma participação quando perceber o interesse da criança em tê-lo como parceiro nas
brincadeiras, possibilitando assim, o desenvolvimento da criança, proporcionando momentos de inte-
ração, acesso à cultura, permitindo a criança principalmente viver a sua própria infância. De acordo
com Lima (2001, p.27) :
Um ambiente carente de recursos, onde tanto a criança quanto o adulto vêem somente paredes e es-
paços vagos é um ambiente sem vida, que não propõe desafios cognitivos à criança e não amplia o
conhecimento. Portanto ao educador cabe planejar os espaços para a criança e com a criança, vi-
sando o meio cultural em que a criança está inserida, promovendo interações em grupos para que
possam assim: criar, trocar saberes, imaginar, construir e principalmente brincar. O educador também
precisa estar atento ao ambiente pois, segundo Horn (2004, p.15) “o olhar de um educador atento e
sensível a todos os elementos que estão postos em uma sala de aula. O modo como organizamos
materiais e móveis, e a forma como as crianças e adultos interagem com eles são reveladores de
uma concepção pedagógica”.
A criança desde o nascimento necessita da mediação do outro para se desenvolver, portanto o meio
sozinho não dá conta de desenvolvê-lo e é aí que entra o papel do educador e dos colegas através
das relações. Segundo Carvalho (2003, p.154): “ao estruturar e organizar continuamente sua sala, o
educador favorece o envolvimento das crianças em brincadeiras entre elas, sem necessidade de in-
terferência direta; dessa forma ele fica mais disponível para aquelas crianças que procuram interagir
com ele”. Podemos dizer então que o educador se torna o mediador entre crianças e os objetos de
conhecimento, organizando e propiciando espaços e situações de aprendizagens que articulem os
recursos e capacidades afetivas, emocionais, sociais e cognitivas de cada criança aos seus conheci-
mentos prévios. O educador constitui-se portanto, um parceiro mais experiente, cuja função é propi-
ciar e garantir um ambiente rico, prazeroso, saudável de experiências educativa e social variadas.
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O que acontece é que muitas vezes o educador, tem a visão de que: proporcionar a criança o brincar
é deixá-la fazer o que quer e onde quer, sem considerar a brincadeira como um processo de organi-
zação, de recíproca, de troca de saberes. Cabe ao educador confiar nas crianças e valorizar o seu
agir contribuindo para ampliação das descobertas e não apenas estar ao seu lado permitindo toda e
qualquer ação.
O educador deve considerar a brincadeira segundo o Referencial Curricular Para a Educação Infantil
(1998, vol 1, p. 28): “como um meio de poder observar e constituir uma visão dos processos de de-
senvolvimento das crianças em conjunto e de cada uma em particular, registrando suas capacidades
de uso das linguagens, assim como suas capacidades sociais e dos recursos afetivos e emocionais
que dispõe”.
As aprendizagens que ocorrem dentro dos espaços disponíveis e ou acessíveis à criança são funda-
mentais na construção da autonomia, tendo a mesma como própria construtora de seu conhecimento.
O conhecimento se constrói a cada momento em que a criança tem a possibilidade de poder explorar
os espaços disponíveis a ela.
O papel do adulto no espaço é o de um parceiro mais experiente que promove as interações, que pla-
neja e organiza atividades com o objetivo de através das relações dentro do espaço que oferece, bus-
car o desenvolvimento integral de todas as potencialidades da criança. O educador deve ter a sua
proposta voltada para o bem estar da criança, buscando sempre melhorar a sua prática elaborando
sempre novas alternativas de construir o conhecimento de um grupo como um todo, facilitando as in-
terações, promovendo e construindo espaços adequados para as crianças.
Muitas são as propostas apresentadas por vários autores mas que só serão praticadas o dia em que
o educador infantil tomar consciência da importância de oferecer espaços ricos de informações na
vida das crianças, passando a reconhecer a importância das trocas que ocorrem nos espaços ofereci-
dos como um fator essencial na vida da criança.
As transformações sociais vivenciadas pela Europa, sobretudo a partir do século XV, identificadas
com o movimento renascentista nos campos da cultura, da política e da ciência e com o fortaleci-
mento da classe burguesa no sistema capitalista repercutiram significativamente sobre as formas de
organização das instituições, em geral, e da educação, em particular.
Como expressa Macedo (2006), o espaço-tempo do currículo traz, sem dúvida, marcas de uma ho-
mogeneidade ditada tanto pela cultura do Iluminismo quanto por uma cultura de mercado, caracterís-
ticas do pensamento moderno.
Refletindo sobre essa perspectiva, o professor Pedro Goergen (2005) destaca que uma das importan-
tes heranças do início da modernidade para o mundo ocidental foi a ideia de que a mesma lógica que
explica os tempos e os espaços da natureza pode explicar os tempos e os espaços do homem. Ou
seja, a modernidade pretendeu fazer do tempo e do espaço natural o tempo e o espaço humano. Por
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essa lógica, obviamente sustentada numa concepção mecanicista de mundo, tempo e espaço pas-
sam a ser entendidos como categorias racionalizáveis, que se movem em perspectivas lineares e, por
isso, passíveis de algum controle.
As referências que sustentaram a abstração desse conceito positivista de mundo pela ciência mo-
derna podem ser encontradas, principalmente, nas formulações de conhecidos pensadores como Ba-
con (1214-1294), Copérnico (1473-1543), Bruno (1548-1600), Kepler (1571-1630), Galilei (1564-
1642) e Newton (1643-1727).
No campo da educação, essa racionalidade foi traduzida, sobretudo, nos trabalhos de Amos Come-
nius (1592-1670) e Jean Jacques Rousseau (1712-1778), para os quais a natureza é ponto de refe-
rência para explicar a vida humana, pois ela sempre ensina aos homens quais são as ordens e os
procedimentos mais adequados para suas ações.
Em sua Didática Magna, Comenius deixa isso bem claro quando afirma:
Se levarmos em consideração o que conserva o universo em seu ser com todas as suas particulares
individualidades, descobriremos que não é nada mais que a ordem, a disposição de todas as coisas,
as primeiras e as últimas, as superiores e as inferiores, as maiores e as menores, as semelhantes e
dessemelhantes, segundo o seu lugar, o tempo, o número, a medida e o peso devido e congruente
de cada uma.
Alguém definiu essa ordem, de modo correto e verdadeiro, como alma das coisas. De fato, o que está
ordenado, enquanto mantiver a ordem, conservar-se-á intacto e no mesmo estado; se, ao contrário, a
ordem vier a faltar, então começará a languescer, vacilar, ceder e a arruinar-se. Isso é evidenciado
por todos os exemplos oferecidos pela natureza e pela arte. (COMENIUS, 2002, p. 123)
Vê-se que Comenius ainda vivia a ambivalência dos conceitos medievais de tempo e espaço (alguém
definiu essa ordem) em transição com os conceitos produzidos a partir das influências da ciência mo-
derna (a ideia de ordem natural das coisas). Rousseau, por sua vez, assume uma posição mais defi-
nida sobre a sociedade e a educação.
A ideia central da educação, em Rousseau, é sua conformidade com a natureza e sua superação
pela formação de condutas sociais de moralidade e justiça. Veja-se o que ele diz em Do Contrato so-
cial:
A passagem do estado natural ao estado civil produziu no homem uma mudança considerável, substi-
tuindo em sua conduta a justiça ao instinto, e imprimindo às suas ações a moralidade que anterior-
mente lhes faltava. Foi somente então que a voz do dever, sucedendo ao impulso físico, e o direito ao
apetite, fizeram com que o homem, que até esse momento só tinha olhado para si mesmo, se visse
forçado a agir por outros princípios e consultar a razão antes de ouvir seus pensadores.
Embora se prive, nesse estado, de diversas vantagens recebidas da Natureza, ganha outras tão
grandes, suas faculdades se exercitam e desenvolvem, suas idéias se estendem, seus sentimentos
se enobrecem, toda a sua alma se eleva a tal ponto, que, se os abusos desta nova condição, não o
degradassem com freqüência a uma condição inferior àquela de que saiu, deveria abençoar inces-
santemente o ditoso momento em que foi dali desarraigado para sempre, o qual transformou um ani-
mal estúpido e limitado num ser inteligente, num homem (ROUSSEAU, 2002, p. 11-2).
Goergen (2005) entende que o que fez Comenius, e de certa forma também Rousseau, foi transferir o
novo método desenvolvido pelas ciências naturais para o campo da educação. Especialmente Come-
nius entendia que para realizar as tarefas educativas com mais eficiência e agilidade era preciso se-
guir os passos da ciência, ou seja, conquistar e controlar espaço e tempo.
As influências dessa racionalidade científica e técnica, estimuladas intensivamente pelo ideário liberal
no modelo capitalista, demarcaram os modos de organização dos espaços/tempos da educação ao
longo dos últimos séculos. Nessa perspectiva, o currículo materializou uma organização escolar ar-
quitetada à luz da objetividade e da funcionalidade do conhecimento científico, fortemente marcada
pela fragmentação do saber. No caso do Brasil, assim como em outros países de colonização luso-
espanhola, a "modelagem" da rotina escolar foi, inicialmente, uma construção jesuítica pensada sob a
influência das escolas medievais, derivadas, por certo, das concepções agostiniana e tomista. Elas
foram traduzidas nas escolas por via de métodos formais que determinavam uma rígida organização
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de classes, horários, disciplinas, movimentos e atitudes. Tempos e espaços escolares são entendidos
pelos religiosos como racionalidades instrumentais. São colocados a serviço de uma "ordem" que de-
veria ser estabelecida e, assim, controlada.
É somente no final do século XIX que as orientações de cunho positivista chegam com força no Bra-
sil, período em que as escolas têm seus currículos reformulados, passando-se a adotar disciplinas
consideradas científicas em substituição às chamadas literárias. Ainda que tenha havido essa mu-
dança na organização dos currículos, a rotina escolar seguiu enrijecida pelos padrões culturalmente
cristalizados.
Assim, hábitos assimilados pela rotina escolar, tais como fragmentação dos espaços/tempos de
aprendizagem, objetivação dos procedimentos de ensino, padronização de métodos pedagógicos,
agrupamento de alunos por idade ou nível de aprendizagem, fragmentação do currículo por discipli-
nas, estruturação de horários recortados e rígidos, hierarquização das relações intraescolares, distri-
buição dos conteúdos escolares por tópicos, determinação de espaços relativamente fixos para cada
aluno nas salas de aula, e tantos outros aspectos que marcam a chamada cultura escolar, são cons-
truções sociais engendradas desde a Idade Média e reconceitualizadas pela modernidade. Muitos as-
pectos dessa herança histórica ainda balizam a organização curricular das escolas e servem de ori-
entação para o estabelecimento de suas rotinas.
Ao discutir sobre tempos e espaços da formação e do trabalho pedagógico, Perronoud (2001) afirma
que a escola contemporânea continua com o modelo surgido como o mais racional do século XIX.
Para ele, cursos recortados em etapas anuais, etapas que devem ser percorridas numa ordem quase
imutável, crianças que, pelo princípio da escola obrigatória, entram todas na mesma idade, seguem o
mesmo programa e prosseguem cada ano, de uma etapa para outra, até o fim do curso, estudantes
escolarizados em estabelecimentos do mesmo tipo, dispersos sobre um território, a partir de uma
"carta escolar" que estabelece um lugar mais ou menos obrigatório, estudantes que seguem o mesmo
programa, emprego do tempo estruturado por uma grade de horários que atribui para cada semana
um tempo fixo, com momentos definidos para cada disciplina, são alguns dos traços mais universais
dessa organização que caracteriza o modelo da modernidade.
Sem dúvida, a educação contemporânea, em muitos aspectos, se complexificou, porém a escola não
deixou de submeter-se às exigências de uma racionalidade marcada pela técnica, pela funcionali-
dade, pela objetividade e pela hierarquia. Reproduzindo a lógica da sociedade capitalista, o modelo
considerado convencional vem somando visíveis insucessos em termos de resultados no campo da
aprendizagem, sobretudo na educação fundamental.
A escola, então, como um dos principais espaços de formação humana, reproduz, em sua organiza-
ção espaço/temporal, racionalidade bastante semelhante àquela produzida na primeira fase da socie-
dade moderna.
A partir da segunda metade do século XX, com as evidentes ampliação e disseminação da literatura,
produzida, sobretudo, no âmbito das teorias críticas e pós-críticas, vários pesquisadores têm denunci-
ado essa lógica que concebe tempo e espaço como categorias que são objetivadas e controladas a
critério dos interesses de classes.
Stenhouse (1985) diz que a pressão exercida sobre a escola para que mantenha sua própria ordem
mediante uma relação hierárquica conduz à gênese de uma ideologia cuja função consiste no con-
trole social. A tradução das estruturas profundas do conhecimento em objetivos de conduta é uma
das principais causas da distorção do conhecimento nas escolas.
Fruto de uma construção histórica e social, a escola moderna foi pensada para atender a formação
do homem-cidadão, do homem técnico, do intelectual e não mais a formação do bom cristão, como
acontecia na Idade Média. Para tanto, sua estrutura interna precisou também ser revista de modo a
se adequar aos objetivos impostos por aquele período. Sua racionalização se deu através da consti-
tuição de classes escolares por "classes de idade", através da organização do ensino mediante a dis-
ciplina e a prática de exames (CAMBI, 1999, p. 392).
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TEMPO E ESPAÇO NA ESCOLA
O professor Pedro Goergen (2005, p.13), quando destaca a forte influência da modernidade na for-
mação desses mesmos conceitos na organização da escola contemporânea, recorre a Foucault e re-
gistra:
Com seu olhar panóptico, a escola controla, separa, analisa, diferencia e regula os alunos que são
configurados, adaptados, enquadrados. O educando não é estimulado a conquistar o seu espaço, a
usar o seu tempo, mas a aceitar uma ordem já estabelecida que ele não sabe por quem nem por que
foi instituída.
Ele não é convocado a desenvolver-se, a expandir-se, mas a aceitar e respeitar o controle, a vigilân-
cia dos seus gestos, do seu corpo, de sua mente. O espaço e o tempo são separados e divididos não
apenas para otimizar a aprendizagem e menos ainda para libertar, agregar e solidarizar, mas para
"vigiar e punir" (Foucault), para segregar e submeter, para transformá-los em células solitárias, acua-
das e fracas.
O espaço e o tempo na escola são usados como operadores de adestramento que, na leitura de Fou-
cault, se inspiram no modelo militar: A esta penalidade do espaço acrescenta-se a micropenalidade
do tempo (horário, atraso, ausência, interrupção) (FOUCAULT, 1989, p. 149).
O professor Miguel Ángel Santos Guerra, na obra Entre bastidores: o lado oculto da organização es-
colar (2002), apresenta vários argumentos para ilustrar como a escola, na modernidade, tornou-se
contraditória e paradoxal no tratamento das questões curriculares e de gestão de suas rotinas.
Ele destaca que a escola é uma instituição hierárquica que pretende educar na democracia e para a
democracia; a escola é uma instituição heterônima que pretende desenvolver sua própria autonomia
e a dos indivíduos; a escola é uma instituição com abundantes normas que pretende desenvolver a
participação; a escola é uma instituição transmissora que pretende transformar a sociedade; a escola
é uma instituição de recrutamento forçado que pretende educar em liberdade e para a liberdade; a
escola é uma instituição com concepção epistemológica de caráter hierárquico que pretende desen-
volver a criatividade; a escola é uma instituição sexista que pretende educar na diversidade e para a
diversidade; a escola é uma instituição fortemente escalonada que pretende desenvolver uma demo-
cracia educativa; a escola é uma instituição que alega certa neutralidade, mas colide com uma rede
de interesses pessoais e sociais e com disputas ideológicas e axiológicas mais ou menos camufla-
das.
Denunciando também o modelo da escola moderna com seu convencional currículo, Fernández En-
guita (1990) destaca as implicações dessa lógica no processo de formação das pessoas. Diz ele:
Mais do que escrever com uma caligrafia e uma ortografia corretas ou saber calcular raízes quadra-
das, na escola, aprende-se a levantar-se às oito para se apresentar às nove [...] a seguir rotinas coti-
dianas e a fazer coisas que não interessam ou aborrecem os alunos; a desenvolver uma jornada de
oito horas ou mais; a realizar o próprio trabalho individualmente e a ser avaliado por ele; a que lhe di-
gam o que deve aprender e como deve aprender, tal como num amanhã hipotético dir-lhe-ão o que
pode produzir e como deve produzir; a competir com os seus semelhantes e a considerar os seus fra-
cassos como êxitos próprios e vice-versa; a submeter-se a hierarquias e a autoridades; a aceitar que
o mundo está dividido entre os que sabem – os professores nas escolas, os patrões e diretores de
fábrica – e os que não sabem – os alunos, os operários e os empregados; a movimentar-se por re-
compensas extrínsecas – hoje, as notas, o ordenado, amanhã – e a desinteressar-se do conteúdo do
próprio trabalho etc. (tradução livre do autor) (ENGUITA, 1990, p. 18).
Semelhantes críticas são feitas também por autores como E. P. Thompson (1991), André Petitat
(1994), Escolano (1993-4), Nilda Alves (1998), Mayumi Lima (1994), Tyler (1991), Maria Tereza Ste-
ban (2006), Viñao Frago (2001) e Veiga-Neto (2002). Para eles, o modo como a escola se organiza
hoje tem a ver com o surgimento de uma sociedade industrial que vinculou o tempo natural ao tempo
racionalizado do relógio, que relacionou tempo e espaço da escola com tempo e espaço da fábrica,
que vinculou a formação escolar com qualificação para o trabalho.
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e ainda se orientam por esses princípios, continuam encontrando espaços importantes e conquis-
tando adesão de boa parcela das famílias.
Uma possível releitura dos conceitos de tempo e espaço na organização curricular para a escola con-
temporânea
A expressiva literatura produzida no campo da educação nas últimas décadas e os inúmeros eventos
acadêmicos que se propõem discutir questões relacionadas com currículo e trabalho escolar vêm
apontando fortes críticas ao modo como a escola se organiza, como ela estrutura seus tempos e es-
paços pedagógicos e sobre os resultados que ela vem alcançando no âmbito da aprendizagem e da
formação.
Essa literatura, independentemente do enfoque que assume, argumenta a favor das possibilidades de
autonomia da escola. Acredita que, apesar de seus limites institucionais, a escola tem relativa condi-
ção para pensar, projetar e implementar novos modos de organização curricular e pedagógica. So-
bretudo os textos que discutem currículo, organização escolar, autonomia e gestão da escola têm
contribuído muito nesse aspecto.
Tanto a sociologia da educação quanto outros campos de conhecimento relacionados com o fenô-
meno educativo estão empenhados em discutir e propor alternativas que visem a melhorar os proces-
sos de organização das dinâmicas escolares. A percepção que se tem é de que estamos em um mo-
mento interessante, que aponta para a possibilidade de mudanças tanto conceituais quanto práticas
na educação e, consequentemente, na reorganização dos tempos e dos espaços da escola.
Genericamente, pode-se afirmar que os atuais conceitos de tempo e espaço como categorias filosófi-
cas formam parte, como conteúdo, dos complexos debates entre as concepções científicas mais clás-
sicas e os conceitos de um novo espírito científico1 do século XX, dos atuais debates entre moderni-
dade e pós-modernidade, dos debates entre as matrizes teóricas consideradas como universalizantes
e as matrizes da diferença, do hibridismo e da desconstrução, entre o pensamento da matriz hegemô-
nica eurocêntrica e o pensamento de uma nova cultura política pós-colonial.
Dadas a especificidade e as limitações deste artigo, serão destacadas tão-somente algumas das ca-
racterísticas que marcam a atual fase do debate, no contexto brasileiro, dando-se relevância às con-
tribuições que a literatura e os movimentos organizados em torno da educação oferecem para a relei-
tura dos conceitos de tempo e de espaço na organização curricular da escola contemporânea.
Todavia, antes de apresentar as características, destacamos três aspectos que, a nosso ver, marcam
a educação atual e, consequentemente, os modos de organização curricular das escolas.
O primeiro deles é que a contemporaneidade ainda não abandonou os conceitos mecanicistas e natu-
ralistas de tempo e espaço produzidos na primeira fase da modernidade. O segundo refere que parte
dos educadores se apropria de um discurso relativamente novo, mas, na prática, continua atrelado a
uma racionalidade técnica e instrumental, cristalizada nos últimos séculos pela sociedade ocidental.
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TEMPO E ESPAÇO NA ESCOLA
Um terceiro aspecto, que decorre dos dois primeiros, é que o processo de mudança ainda está es-
sencialmente no plano conceitual, portanto, de construção de possibilidades e que, por isso, somente
em pequena medida encontra ressonância na ação da escola.
De qualquer forma, as condições para a mudança estão relativamente postas. Atualmente, há maior
liberdade para que os sistemas educacionais reestruturem suas redes. A legislação, no que concerne
ao campo curricular e pedagógico, está mais flexível. As agências formadoras buscam assimilar as
contribuições teóricas mais recentes e trazem esse debate para o âmbito de seus currículos. As tec-
nologias estimulam experiências significativas.
O campo do debate em torno das questões da educação e da escola amplia-se visivelmente. Os pro-
cessos de formação continuada vêm auxiliando as escolas em seus planejamentos pedagógicos e na
ressignificação de suas práticas.
Vive-se na educação, portanto, um movimento de transição, quando velhos conceitos coexistem com
iniciativas que desafiam um modelo mais tradicional, mas que ainda não encontram sustentação sufi-
ciente para uma transformação mais efetiva da realidade.
Octavi Ianni (1998) considera que os espaços e os tempos da sociedade globalizada estão cada vez
mais desterritorializados e interconectados e, por isso, interdependentes. Com a sociedade global
mediada pelas redes virtuais de informação e de comunicação, os lugares já não são tão fixos e os
tempos estão ainda mais relativizados.
Ao se tomar como pressuposto a tese de que a aprendizagem é um fenômeno ao mesmo tempo indi-
vidual e social, que se produz pelo compartilhamento e pelo diálogo entre sujeitos como processos de
apropriação de significados, fica evidente que a efetividade da ação educativa está mais relacionada
com condições subjetivas de interlocução que os sujeitos elaboram com outros sujeitos e com o
mundo do que com construções de currículos lineares ou com formas engessadas de organização
dos tempos e dos espaços de aprendizagem propostos objetivamente pelos atuais currículos escola-
res.
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TEMPO E ESPAÇO NA ESCOLA
No âmbito da aprendizagem, o tempo que transcende o kronos3 é o das relações. É kairós, o tempo
das vivências que dá significado aos acontecimentos, atravessando a temporalidade cotidiana. É,
portanto, um movimento aleatório, inesperado e expressivo da existência, não apreendido pelo plane-
jamento racional, porque é imprevisível (SOUZA; CARDOSO, 2008). E o espaço, que transcende o
"ambiente físico", é o que se converte em lugar com seus significados, representações, valores e estí-
mulos. Como dizia Paulo Freire, o espaço retrata uma relação pedagógica.
Na obra Currículo, espaço e subjetividade: a arquitetura como programa, Frago e Escolano (2001)
fazem uma interessante reflexão sobre a dimensão simbólica dos espaços educativos. Para eles,
todo espaço é um lugar percebido e essa percepção é um processo cultural e ideológico de represen-
tações.
Toda linguagem arquitetônica expressa, além de uma ordem construtiva, um sistema de intenções,
valores e discursos, enfim, um verdadeiro jogo de simbolismos. Portanto, o espaço jamais é neutro,
ele sempre educa. Para discutir a questão dos espaços subjetivos presentes na arquitetura escolar,
Escolano (2001) parte da concepção de que o espaço escolar expresso e reflete determinados dis-
cursos, além de representar um elemento significativo do currículo, sendo uma fonte de experiência e
de aprendizagem.
Ainda sobre a dimensão espacial da atividade educativa, cabe destacar o entendimento da profa Ma-
ria Isabel Cunha (2008). Ela diz que é a dimensão humana que pode transformar o espaço em lugar.
O lugar se constitui quando atribuímos sentido aos espaços, ou seja, reconhecemos sua legitimidade
para localizar ações, expectativas, esperanças e possibilidades. Quando se diz "esse é o lugar de",
extrapola mos a condição de espaço e atribuímos um sentido cultural, subjetivo e muito próprio ao
exercício de tal localização. Os lugares extrapolam uma base física e espacial para assumir uma con-
dição cultural, humana e subjetiva. Entram em jogo as repre sentações que os sujeitos fazem dos lu-
gares e o sentido que atribuem aos mesmos (CUNHA, 2008, p. 184).
Nessa perspectiva, a escola deve constituir-se, portanto, de ambientes vivos com diferentes repre-
sentações, sentidos e significados. Sua organização espaço/temporal deve considerar a pluralidade
de vozes, de concepções, de experiências, de ritmos, de culturas, de interesses, etc. A escola, por
seu currículo e por sua dinâmica, deve conter em si a expressão da convivialidade humana, em toda
a sua complexidade.
Não se trata, pois, de abandonar a dimensão do tempo cronológico e dos espaços formais na organi-
zação da escola. Trata-se de reconhecer e considerar que cada sujeito tem seu ritmo próprio de
aprendizagem e, portanto, um modo singular de pensamento, movimento e ação e que essa aprendi-
zagem só ganha sentido na relação que esse sujeito estabelece com o outro, com o conhecimento e
com o mundo. À escola cabe o papel de integrar, por intermédio de sua dinâmica curricular e pedagó-
gica, os tempos e os espaços individuais aos coletivos.
Para Nóvoa (2001) e Popkewitz (1998), os tempos e os espaços devem ser vistos como dinâmicas
mais fluidas, com espessuras e tessituras que nos permitam viver diferentes temporalidades sobre-
postas e com espaços não mais limitados por suas margens físicas. São espaços e tempos represen-
tacionais, ideológicos, culturais, linguísticos, que produzem identidades, diferenças, relações, senti-
mentos, etc.
As discussões que estão em curso e que incluem novas questões ao tema do currículo, tais como
cultura, gênero, diferença, identidades, raça, interdisciplinaridade, etc., estão auxiliando nesse sen-
tido.
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TEMPO E ESPAÇO NA ESCOLA
Atualmente, algumas escolas, inspiradas em abordagens atuais que envolvem essas discussões,
buscam certa "reinvenção dos tempos e dos espaços pedagógicos", flexibilizando seus currículos e
imprimindo outras dinâmicas ao cotidiano, na tentativa de valorizar as singularidades dos ritmos de
aprendizagem e de apropriação dos saberes com mais sentido e significado. São ainda iniciativas iso-
ladas, mas que cumprem papel importante na direção da mudança.
Outra característica que vem marcando esse momento no campo do currículo, com forte implicação
sobre as categorias tempo/espaço, é a intensificação do debate sobre o tema infância e aprendiza-
gem. Autores5 que discutem essa temática assumem que as crianças precisam ser respeitadas como
sujeitos de direito em suas singularidades, suas diferenças de cultura, de história e de experiências.
O apelo feito por esses pesquisadores é para que as escolas capacitem seus educadores, repensem
seus processos pedagógicos, reorganizem suas dinâmicas e reestruturem seus ambientes de apren-
dizagem.
É convergente entre pesquisadores e educadores a proposta de uma escola mais aberta, com currí-
culo flexível, que considere as diferentes formas de inserção da criança na realidade social, que com-
preenda a existência e a manifestação das diferentes infâncias decorrentes das inúmeras realidades
sociais vivenciadas pelas crianças em sua individualidade, enfim, que lide bem com diferentes lingua-
gens, manifestações infantis, repertórios de vivências e expectativas.
Como destaca Lima (1989, p. 30), ao discutir a questão dos ambientes para a aprendizagem infantil,
afinal, "para a criança existe o espaço-alegria, o espaço-medo, o espaço-proteção, o espaço-mistério,
o espaço-descoberta, enfim, os espaços de liberdade ou de opressão".
No âmbito dos estudos pós-coloniais, Homi Bhabha (1998) defende que o lugar e o tempo da infância
constituem um entre-lugar e um entre-tempo. Ele utiliza as expressões para afirmar que a infância é
O espaço intersticial entre dois modos – o que é consignado pelos adultos e o que é reinventado nos
mundos de vida das crianças – e entre dois tempos – o passado e o futuro. É um lugar, um entre-lu-
gar, socialmente construído, mas existencialmente renovado pela ação coletiva das crianças. Mas um
lugar, um entre-lugar, pré-disposto nas suas possibilidades e constrangimentos pela História. É, por
isso, um lugar na História (BHABHA, 1998).
É notória a contribuição dos trabalhos desenvolvidos no âmbito da sociologia da infância e dos estu-
dos curriculares focados nas questões culturais e da diferença para essa releitura dos conceitos de
tempo e espaço.
Cabe destacar que parte das contribuições dos autores que discutem infância e aprendizagem tem
sido incorporada nos debates sobre educação para todo o ensino fundamental. As teses de que a es-
cola deve respeitar os tempos da criança, valorizar a ludicidade e o jogo nas atividades de aprendiza-
gem, perceber o movimento e a corporeidade como manifestações significativas no processo de en-
sino e considerar as experiências do mundo nos espaços vivido, refletido e concebido pela criança
são alguns postulados assumidos pela educação infantil e que aos poucos são introduzidos nas de-
mais etapas da educação básica.
Sustentadas por concepções que defendem uma espécie de epistemologia da prática6, surgem algu-
mas alternativas de reorganização do currículo escolar na tentativa de ressignificar as dinâmicas no
cotidiano. Ainda que essas iniciativas7 sejam isoladas e, em alguns casos, tenham certo interesse
político, são experiências que desafiam os modelos tradicionais e, por isso, contribuem significativa-
mente para o debate no nível mais amplo.
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